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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES AVM – FACULDADE INTEGRADA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS: DEFINIÇÃO, BENEFÍCIOS, MÉTODOS DE UTILIZAÇÃO E CASOS DE SUCESSO. Marcela Macieira Bortone ORIENTADOR: Prof. Luiz Eduardo Chauvet Rio de Janeiro 2015 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

AVM – FACULDADE INTEGRADA

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS: DEFINIÇÃO,

BENEFÍCIOS, MÉTODOS DE UTILIZAÇÃO E CASOS DE

SUCESSO.

Marcela Macieira Bortone

ORIENTADOR: Prof. Luiz Eduardo Chauvet

Rio de Janeiro 2015

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

AVM – FACULDADE INTEGRADA

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS: DEFINIÇÃO, BENEFÍCIOS,

MÉTODOS DE UTILIZAÇÃO E CASOS DE SUCESSO.

Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Gestão Pública. Por: Marcela Macieira Bortone

Rio de Janeiro 2015

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AGRADECIMENTOS

Aos amigos e parentes, colegas de curso e

professores.

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DEDICATÓRIA

Dedico aos meus queridos pais José Mathias e

Erci Macieira, meu companheiro Lin Lima, minhas

irmãs Fernanda e Ludmilla, sobrinhas Helena e

Maria e a todos os amigos que torceram por mim.

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RESUMO

O presente trabalho discute as licitações sustentáveis e trata da importância de

ter-se atenção para com os impactos ambientais, no momento em que a

Administração Pública efetuar alguma compra ou contrato.

Comentaremos acerca da definição de licitação, pura e simplesmente, já no

primeiro capítulo, para, depois, passarmos ao campo das licitações sustentáveis,

conceituando-as. Ao longo do trabalho, abordaremos métodos utilizados para a sua

efetivação e exemplificaremos casos de sucesso adotados por diversas nações, com

enfoque no Brasil. Falaremos sobre a importância da ecoeficiência e o papel do

ICLEI na vanguarda do tema. Exporemos a respeito da história dessa organização,

explicando suas metas e sua atuação junto aos governos brasileiros.

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METODOLOGIA

A metodologia aplicada será de análise teórica, bibliográfica e de tipo

exploratória.

Buscaremos informações que dêem base aos nossos argumentos em livros de

diversos pensadores. Na verdade, como esse é um tema que só ultimamente vem

ganhando espaço no meio acadêmico, há vários bons autores, que apenas

recentemente defenderam suas dissertações e teses.

Este trabalho também buscará informações na Internet, em páginas de

organizações comprometidas com o combate aos impactos ambientais e,

consequentemente, preocupadas com as licitações sustentáveis. São páginas

geralmente com uma riqueza e uma variedade de informações muito úteis,

indispensáveis ao nosso debate.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 07

CAPÍTULO 1

Referencial Teórico 09

1.1 As licitações e a Lei 8.666/93 09

1.2 As licitações sustentáveis 12

1.3 Os benefícios das licitações sustentáveis 17

1.4 Métodos das licitações sustentáveis 20

CAPÍTULO 2

Alguns Métodos usados nas Licitações Sustentáveis 23

2.1 Instrumentos já adotados pela Administração Pública 23

2.1.1 Rotulagem 23

2.1.2 Pregões 24

2.2 Outras iniciativas da Administração Pública 24

2.3 Estratégias ainda não adotadas 25

2.3.1 Inserção de novos critérios ambientais 25

2.3.2 Ecoeficiência 26

2.4 Nova licitação, novos processos 28

2.5 Fechamento 31

CAPÍTULO 3

Casos de Sucesso 32

3.1 ICLEI 32

3.2 ICLEI no Brasil 35

3.3 Demais casos de sucesso no Brasil 39

CONCLUSÃO 46

BIBLIOGRAFIA 49

ÍNDICE 51

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INTRODUÇÃO

Como introdução ao trabalho, podemos apresentar o problema que nos ocupa

com alguns aspectos relevantes sobre o assunto:

- o conceito de licitações sustentáveis ainda não foi amplamente divulgado no

Brasil;

- há falta de conhecimento dos gestores públicos sobre o tema, bem como a

existência da crença de que as licitações sustentáveis custam caro aos cofres

públicos;

- persiste a dificuldade dos governantes em reduzir os impactos ambientais que

têm devastado o meio ambiente, trazendo escassez de recursos naturais;

- o Estado é cada vez mais importante agente econômico, com grande poder

de compra, capaz de disseminar novos critérios de produção e consumo e

- vários países e alguns governos locais no Brasil estarem, ainda que de modo

incipiente, realizando licitações sustentáveis com sucesso.

Com base neste breve diagnóstico, o presente trabalho aponta para o

problema de ter-se, na administração pública brasileira, baixa densidade de

informação e conhecimento acerca do que significa e das possibilidades do que se

define como licitação sustentável.

Um conjunto de questões se coloca, em face disto, em busca de respostas.

O que é licitação sustentável? Em que leis e normas se baseia o uso das

licitações sustentáveis no Brasil? Como é utilizada a licitação sustentável? Quais os

benefícios de seu uso na Administração Pública? Quais exemplos de casos de

sucesso existem no Brasil e no exterior que podem servir de modelo?

Respostas a estas questões certamente poderão ajudar a sistematizar

informações e conhecimentos, assim como difundir a licitação sustentável entre

acadêmicos, profissionais, policy makers e administradores públicos de um modo

geral.

Assim, apresentamos os principais objetivos a serem expostos neste trabalho:

Promover o conhecimento sobre as licitações sustentáveis e suas

possibilidades na Administração Pública brasileira.

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Demonstrar aos administradores públicos e à população a relevância do uso

das licitações sustentáveis;

Apresentar casos de sucesso que reforçam a necessidade de sua utilização e

Esclarecer por quais meios é possível implantar as licitações sustentáveis.

Em suma, discorreremos o trabalho da seguinte forma:

No primeiro capítulo, apresentaremos a definição de licitações e sua posição

no ordenamento jurídico. A seguir, esclareceremos o conceito de licitações

sustentáveis, sua importância, os benefícios de sua utilização e uma breve

introdução sobre as estratégias para sua implantação.

Já no segundo capítulo, trazemos os principais métodos usados nas licitações

sustentáveis, citando instrumentos adotados pela Administração Pública como, por

exemplo, a rotulagem e os pregões. Também demonstramos outras iniciativas

introduzidas pela Administração pública e estratégias ainda não adotadas, como, por

exemplo, inserção de novos critérios ambientais e a ecoeficiência. Ao término do

capítulo, citamos novos processos para uma nova visão sobre as licitações com um

fechamento ao final.

No Terceiro e último capítulo, expusemos casos de sucesso no Brasil e no

mundo, tendo como destaque, o ICLEI sigla para International Council for Local

Environmental Initiatives ou, em Português, Conselho Internacional para Iniciativas

Ambientais Locais.

Por fim, a conclusão sobre o trabalho apresentado.

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CAPÍTULO 1

REFERENCIAL TEÓRICO

1.1 As licitações e a Lei 8666/93

Para abordar o tema das licitações sustentáveis, é necessário, inicialmente,

definir licitação, pura e simplesmente, como consta no ordenamento jurídico

brasileiro.

As licitações surgiram com a necessidade da implantação de um modelo

gerencial na gestão administrativa, que fosse hábil para tornar mais eficazes as

funções precípuas da Administração, sem ignorar a progressão econômica e social

do país.

Com a demanda por compras e obras, algumas de grande vulto, tornou-se

mister a adoção de modos mais eficientes de aplicação do dinheiro público, sem

perder de vista a transparência necessária em um sistema democrático, como o

brasileiro. A licitação é só uma das importantes vias que caracterizam a

preocupação do legislador com essas necessidades, mas pode ser considerada a

mais importante e, embora só viesse a ser mais bem trabalhada na Lei 8666/93, já

constava na Constituição Federal de 1988.

Artigo 22 da Constituição Federal do Brasil:

Compete privativamente à União legislar sobre:

(...)

XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades,

para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União,

Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para

as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º,

III;

Aí, então, entra o papel da Lei 8666/93, frisado por Adilson Abreu Dallari,

quando afirma que “o instituto da licitação assumiu grande importância atualmente,

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devido ao aumento na esfera de atuação da Administração Pública”, através “do

desempenho de novas funções exigidas pela complexidade da vida moderna”.1

Portanto, ressalvados os casos de dispensa e de inexigibilidade, o que a Lei

8666/93 determina é a necessidade da Administração de se utilizar da licitação

pública sempre que forem necessárias obras, compras, concessões a terceiros de

prestação de serviço público em seu nome ou mesmo serviços, em geral.

A doutrina é extremamente rica no tocante às licitações e, com tamanha

riqueza, evidentemente, muitos autores acabam por dialogar entre si, concordando

ou não. Enquanto Sayagues Laso crê que a licitação pode “ser definida como um

procedimento relativo ao modo de celebrar determinados contratos, cuja finalidade é

a determinação da pessoa que ofereça à Administração condições mais vantajosas”

seja depois de um convite ou de “eventuais interessados para que formulem

propostas, as quais serão submetidas a uma seleção”2, Carlos Ari Sundfeld ensina

que “licitação é o procedimento administrativo destinado à escolha de pessoa a ser

contratada pela Administração ou a ser beneficiada por ato administrativo singular”,

ato administrativo este em que “são assegurados tanto o direito dos interessados à

disputa como a seleção do beneficiário mais adequado ao interesse público".3

Licitações são, portanto, um certame que toda e qualquer entidade

governamental deve agenciar “e no qual abrem disputas entre os interessados em

com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a

proposta mais vantajosa às conveniências públicas”4. É seu pré-requisito o ideal de

competição, que deve ser disputada de modo isonômico entre aqueles que

preencherem o conjunto de qualidades necessário à boa execução dos

comprometimentos assumidos.

Devido a essa necessidade de isonomia, a licitação deve ser orientada por

alguns princípios básicos. Dentre eles, podem ser citados, como os mais relevantes,

os seguintes:

1 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, 1992. p. 89. 2 LASO, Sayagues. La Licitación pública, 1978. p. 9. 3 SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e Contrato Administrativo, 1994. p. 15. 4 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 2004. p. 483.

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a) O princípio da legalidade: a Administração Pública deve agir de acordo

com a legislação. Todas as suas ações devem estar em convergência com a lei e,

acima de tudo, com a Constituição Federal;

b) O princípio da competitividade: toda e qualquer empresa pode

participar do ato licitatório, desde que suas funções sejam compatíveis com o

requerido pela Administração Pública;

c) O princípio da impessoalidade: não pode o administrador demonstrar

prévia preferência por nenhuma empresa. Todas as ações são executadas em nome

da Administração Pública – nunca em nome de um indivíduo apenas – e devem

conceber igualdade de condições a todos os participantes;

d) O princípio da economicidade: o recurso público deve ser utilizado da

melhor forma possível, o que nem sempre significa adquirir o produto mais barato.

Deve-se estar atento para os critérios de avaliação licitatória presentes na Lei

8666/93;

e) O princípio da publicidade: esse é o princípio destinado à

transparência. Todo cidadão deve estar apto a acompanhar os documentos

licitatórios e toda licitação deve ser amplamente divulgada, de forma a ser conhecida

por todos os possíveis interessados;

Deve-se ressaltar que esses princípios são inerentes não apenas à União,

como também aos Estados e municípios. Estes podem também “legislar sobre a

matéria, observando as normas de cunho nacional e tratando do que for específico

em suas licitações e contratações, segundo as peculiaridades locais”.5

Toda lei, entretanto, está sujeita a interpretações e com a 8666/93 não é

diferente. Foi citado, quando se falou sobre o princípio da economicidade, que nem

sempre o item mais barato deve ser o escolhido pela Administração Pública, porém

nem todos os administradores interpretam dessa forma, por mais que a lei seja clara

nesse sentido. Devido a uma interpretação questionável, muito se tem feito contra o

meio ambiente nacional, afinal, evidentemente, a sustentabilidade implica custos no

curto prazo.

Aqui, chega-se, por fim, ao assunto central deste trabalho – licitação

sustentável – e à tese defendida – a Administração Pública, ao escolher o vencedor

5 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo, 1990. p. 33.

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das licitações públicas, deve levar em conta os problemas ambientais ocasionados

por determinada empresa eventualmente contratada.

Agora, então, que a simples licitação já está conceituada e explicada, pode-se

passar à fase pós-introdutória, isto é, aos debates acerca da licitação sustentável.

1.2 As licitações sustentáveis

A lei 8666/93 não é tão cega quanto aos problemas ambientais como se pensa.

Se a prática afasta o fator ambiental de seu cotidiano, pode-se culpar o pouco

destaque dado pela legislação, mas não sua total inexistência.

Quando trata do que se entende por Projeto Básico, a lei 8666/93 deixa claro

que o fator ambiental deve constar na caracterização da obra ou serviço:

Art. 6º Para os fins desta Lei, considera-se:

(...)

IX - Projeto Básico - conjunto de elementos necessários e suficientes, com

nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de

obras ou serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos

estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado

tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação

do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução (...)

Os nossos grifos evidenciam a preocupação ambiental constante na legislação.

Além disso, a lei 8666/93 diz, em seu artigo 3º:

A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da

isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e a

promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em

estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da

moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação

ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

§ lº. É vedado aos agentes públicos:

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1. admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou

condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo,

inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou

distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de

qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do

contrato (alterado pela Lei nº 12.349/2010);

Mais uma vez os nossos grifos mostram que, dependendo da interpretação que

se der à lei, ela não omite as questões socioambientais. Sem dúvidas, então, uma

empresa que prejudica o ecossistema em suas ações está incluída em uma

circunstância que pode ser considerada impertinente.

É de responsabilidade da Administração Pública sugerir o objeto a ser

contratado, definindo-o clara e objetivamente, com as características inerentes ao

atendimento do interesse público, nele incluído, obrigatoriamente, segundo a própria

Constituição Federal, o respeito ao meio ambiente, em seus artigos 170 (a defesa do

meio ambiente é um princípio da atividade econômica) e 225 (o direito de todos a

um meio ecológico equilibrado):

Art. 170:

IV. livre concorrência

VI. defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado

conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de

elaboração e prestação.

(EC 42, de 19.12.20 03)

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder

Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e

futuras gerações:

§ l.º. Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

[...]

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IV. exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente

causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto

ambiental, a que se dará publicidade;

[...]

VI. promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a

conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII. proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que

coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou

submetam os animais a crueldade.

[...]

§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente

sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e

administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Álvaro Mirra frisa a convergência que deve haver entre a Constituição e as

legislações que tratam de licitação, ao dizer que:

“como todo direito fundamental, o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado é indisponível. Ressalte-se que essa indisponibilidade vem acentuada na Constituição Federal pelo fato de mencionar-se que a preservação do meio ambiente deve ser feita no interesse não só dos presentes, como igualdade das futuras gerações. Estabeleceu-se, por via de conseqüência, um dever não apenas moral, como também jurídico e de natureza constitucional para as gerações atuais de transmitir esse ‘patrimônio’ ambiental às gerações que nos sucederão e nas melhores condições do ponto de vista do equilíbrio ecológico.”6

O que se quer dizer é que o meio ambiente não deve ser uma preocupação por

parte do Estado apenas punitivamente falando, mas deve, acima de tudo, ser um ato

preventivo. Além das próprias contratações, são formas de prevenção as contidas

em licenciamentos, incentivos de créditos e incentivos fiscais.

Embora, aparentemente, ainda se discuta muito pouco acerca das licitações

sustentáveis no Brasil, estas são pautas em diversos acordos internacionais.

Citando três dos mais importantes, temos:

6 MIRRA, Álvaro Luis Valery. Impacto Ambiental – Aspectos da Legislação Brasileira. 2.ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.

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a) Agenda 21: documento oriundo da Eco-92, ocorrida no Rio de Janeiro, que

diz em seu capítulo 4: “A fim de alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção

do meio ambiente deverá constituir parte integrante do processo de desenvolvimento

e não poderá considerar-se de forma isolada”;

b) Declaração do Rio: consequência do mesmo contexto da Agenda 21, a

Declaração do Rio versa, em seu capítulo 8: “Para alcançar o desenvolvimento

sustentável e uma qualidade de vida mais elevada para todos, os Estados devem

reduzir e eliminar os padrões insustentáveis de produção e consumo, e promover

políticas demográficas adequadas”;

c) Declaração de Joanesburgo sobre Desenvolvimento Sustentável: ocorrida

após encontro na África do Sul, tal declaração afirma, em seu capítulo 3: “No início

desta Cúpula, crianças do mundo nos disseram, numa voz simples, porém clara, que

o futuro pertence a elas e, em conseqüência, conclamaram todos nós a assegurar

que, através de nossas ações, elas herdarão um mundo livre da indignidade e da

indecência causadas pela pobreza, pela degradação ambiental e por padrões de

desenvolvimento insustentáveis”.

Em especial a partir dos anos 70, muitos outros acontecimentos internacionais

se mostraram notáveis nesse aspecto. Em 1972, a ONU aderiu oficialmente ao ideal

em prol das licitações sustentáveis; em 1987, foi publicado o Relatório de

Brundtland, pela Comissão Mundial sobre Ambiente e Desenvolvimento; em 1997, a

Agenda 21 sofreu alguns ajustes, na Conferência Rio+5, na sede da ONU, nos

Estados Unidos; em 2000, tivemos o Milienium Development Goals (Metas do

Desenvolvimento do Milênio), implantado no decorrer da 55ª Assembléia da ONU –

tais metas foram adotadas por quase duzentos países e seu documento focava,

especialmente, a erradicação da miséria em tempos de globalização.

O Relatório de Brundtland define o que é uma licitação sustentável e reafirma

seu posicionamento crítico quanto ao modelo de desenvolvimento adotado não

apenas pelos países ricos, mas também pelos periféricos, em especial os em

desenvolvimento, destacando os meios inconsequentes através dos quais estas

nações buscam o crescimento e os riscos do uso abusivo dos recursos naturais que

as administrações ao redor do mundo têm adotado. Esses governos, segundo o

relatório, tendem a desconsiderar a capacidade de suporte dos ecossistemas.

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Contemplando seu conceito de origem entidades públicas e privadas vêm desenvolvendo estratégias e ações focadas na preservação dos três grandes pilares da sustentabilidade: social, econômico e ambiental. E, se antes a gestão sustentável era apenas uma tendência, hoje é uma política concreta, fundamentada em conceitos sólidos e realizada de maneira efetiva em diversos setores da economia. Além das entidades e organizações não governamentais que atuam exclusivamente na área, grandes empresas criam projetos que beneficiam seus colaboradores e a comunidade garantindo, também, retorno positivo à sua imagem. Depois de disseminada em grande proporção na iniciativa privada, os compromissos com a sustentabilidade chegam agora aos setores de compras em diversas esferas da Administração Pública. E, embora a Lei de Licitações 8.666/93 ainda não traga especificidades acerca do assunto, a nova política de Compras Públicas Sustentáveis já é uma realidade no Poder Público.7

Quando falamos de Brasil, o pioneiro na questão das licitações sustentáveis foi

o governo de São Paulo, que largou na frente no tema acerca das licitações

sustentáveis. Em 2004, foi lançado pelos paulistas o Comitê de Qualidade de

Gestão Pública e, em 2005, o Decreto Nº 50.170, no qual devemos destacar o artigo

4º, que diz:

Artigo 4º - Os critérios socioambientais referidos neste decreto deverão ser

observados:

I - nas descrições detalhadas de itens de material, especificações e memoriais

técnicos constantes:

a) do Cadastro Único de Materiais e Serviços - CADMAT;

b) do Sistema Integrado de Informações Físico-Financeiras - SIAFÍSICO;

c) de cadastros ou catálogos de materiais mantidos pelos demais órgãos e

entidades da Administração estadual;

I - nos Manuais de Serviços Terceirizados, desenvolvidos ou atualizados sob

coordenação da Casa Civil, de adoção obrigatória para toda a Administração

estadual.

§ 1º - O catálogo de materiais CADMAT deverá ser disponibilizado

integralmente para consulta no endereço eletrônico www.bec.sp.gov.br.

7 Texto retirado da Revista Negócios Públicos, de abril de 2012, na matéria “Licitações Sustentáveis - A Nova Realidade das Compras Públicas”.

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§ 2º - As licitações e contratações de serviços não abrangidos pelos Manuais

de Serviços Terceirizados, bem como as de obras, deverão adotar, no que couber,

especificações técnicas adequadas à promoção da sustentabilidade socioambiental.

Como dito, São Paulo foi apenas o pioneiro, mas não o único caso. Trataremos

de outros exemplos no decorrer do texto e só citamos a realidade paulista, aqui,

para não parecer que as licitações sustentáveis são viáveis apenas fora do Brasil.

Está já ultrapassada a ideia recorrente de que proteger o meio ambiente seria

uma preocupação apenas politicamente correta, que não teria reais necessidades

práticas. Passemos, pois, aos benefícios que as licitações sustentáveis já

proporcionaram ou que, ao menos, têm tudo para proporcionar, se utilizadas.

1.3 Os benefícios das licitações sustentáveis

Quando se fala em licitação sustentável, é um habitual argumento contra o de

que haveria o encarecimento das compras, caso os aspectos socioambientais

fossem considerados. Haveria, é claro, mas a economia a longo prazo seria muito

maior, dada a desnecessidade futura de gastos decorrentes dos danos causados ao

meio ambiente devido a licitações que, anteriormente, se afiguraram mais baratas.

A Revista Negócios Públicos, em sua edição de abril de 2012, publicou uma

matéria intitulada “Licitações Sustentáveis - A Nova Realidade das Compras

Públicas”, onde pode ser lida uma interessante entrevista com a coordenadora de

licitações sustentáveis do governo do estado de São Paulo, na época, Valéria

D’Amico.

Valéria diz que “a compra sustentável se manifesta na fase interna da licitação,

no momento em que, diante da demanda, a administração considera os itens

refletindo sobre projeto, utilização de material renovável e reciclável, processos

produtivos, logística, gestão de contratos, recebimento, manutenção, operação,

opções de reutilização, reciclagem e disposição final de resíduos”. Ela garante que,

apesar de o Governo de São Paulo não haver quantificado, certamente houve

economia com a inserção dos aspectos ambientais nas licitações.

D’Amico alega que, ao se preocupar com licitações sustentáveis, a

Administração Pública tem a oportunidade de aplicar, na prática, os ideais que

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valoriza teoricamente. Ela afirma que “exercendo o papel de consumidor, o Estado

pode introduzir na sua opção de consumo critérios e procedimentos adequados na

aquisição de bens, serviços, obras e serviços de engenharia, definindo à

administração pública um perfil de consumo compatível com as políticas de

Governo”. Consequentemente, vêm as economias que os críticos das licitações

sustentáveis ignoram. Convergindo com essa nova mentalidade de gestão,

juntamente com os critérios socioambientais, foco da preocupação do administrador,

têm-se, durante as aquisições e contratações de serviços e obras: a racionalização e

a diminuição no consumo de energia, de água, de geração de resíduos, do uso de

matérias-primas, de tecnologias agressivas ao meio ambiente, de emissão de

poluentes, tudo concordando com a não utilização de diversos produtos de alta

toxicidade nos atos licitatórios.

Nem todas as vantagens das licitações sustentáveis são visualizadas na

prática, porém não por culpa do conceito, mas por inadequação prática. Às vezes, a

legislação não consegue fazer valer os benefícios potenciais desse tipo de licitação.

Para esmiuçar melhor, temos na já comentada edição da Revista Negócios Públicos,

alguns dos benefícios das licitações sustentáveis, dentre os quais podemos citar:

a) diminuição do consumo da água;

b) obtenção e utilização de materiais complementares auxiliares da redução do

consumo de água;

c) identificação de hábitos viciosos de desperdício de água;

d) treinamento dos empregados da contratada, a fim de combaterem, de forma

sistemática, os vícios de desperdício, conscientizando os colegas sobre atos de

economia;

e) utilização de materiais que consumam menos energia, de modo a realizarem

melhor desempenho energético;

f) fiscalização permanente do PROCEL (Programa Nacional de conservação de

Energia Elétrica) e do INMETRO (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e

Qualidade Industrial);

g) a exemplo do caso de redução da água, diminuição dos gastos energéticos

por parte dos empregados das contratadas e proporcional conscientização por parte

dos colegas;

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h) colaboração nas atividades de separação de resíduos sólidos, para coleta

seletiva em resíduos próprios, nas cores internacionalmente identificadas;

i) observação, quanto aos equipamentos extremamente ruidosos, da existência

do Selo Ruído, como alternativa indicatória da potência sonora do equipamento,

medido em decibel - dB (A), em convergência com a solução CONAMA nº 0 20, de

07 de dezembro de 1994.

Além disso, por exemplo, a nutricionista da empresa contratada deverá,

invariavelmente, “adequar na formulação dos Cardápios a prática de reutilização de

partes não convencionais de alimentos, propiciando uma maior economia de

alimentos, uma melhoria na qualidade da alimentação e reduzindo a produção de

resíduos alimentares”.8

Essa preocupação com os alimentos não é por acaso. Isso porque, se há o

desejo da erradicação da fome em uma sociedade, as licitações sustentáveis se

mostram indispensáveis.

Na formulação do cardápio diário, observada a sazonalidade de alguns alimentos deverão ser observadas todas as possibilidades de aproveitamento dos gêneros alimentícios, desde o prato principal seus acompanhamentos/guarnições, sucos e sobremesas. A Nutricionista da contratada deverá evitar desperdícios de gêneros alimentícios, que podem ser aplicados na formulação de refeições que utilizam partes não convencionais de alimentos, desde que atendam às necessidades nutricionais diárias recomendadas (...) A Nutricionista da contratada deverá procurar estabelecer diariamente consumos das partes não convencionais dos alimentos que gerem esses benefícios. (...) A Nutricionista da contratada deverá privilegiar, quando da confecção dos cardápios, os produtos alimentícios próprios da época, levando em conta a sazonalidade dos insumos, devendo ainda submeter à contratante a aprovação de tais substituições.9

Enfim, as mostras de vantagens das licitações sustentáveis são inúmeras.

Posicionar-se contra esse tipo de licitação é uma forma de ver o mundo e a

vida nele presente de um ponto de vista preocupado apenas com o curto prazo.

Se, até o final dos anos 60, apenas um grupo diminuto de intelectuais e

ativistas se preocupavam com os abalos sofridos pelo ecossistema, essa situação

mudou radicalmente a partir dos anos 70, com todos os eventos e acordos 8 Idem. 9 Idem.

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internacionais já citados, que se alastram até hoje. Dentre esses eventos, um dos

pioneiros foi a já citada aderência por parte da ONU ao conceito de desenvolvimento

sustentável. Hoje, inúmeros cientistas e ambientalistas se preocupam

prioritariamente com as aceleradas emissões de gás carbônico à camada de ozônio,

fruto da histórica irreflexão humana acerca de seus atos.

Esses cientistas e ambientalistas por alguns anos lutaram sozinhos, mas, por

fim, ganharam respaldo de governos ao redor do mundo. Hoje, as administrações

que ainda não se preocupam com a licitação sustentável, devem mudar

imediatamente, até mesmo para seguir o curso das principais nações ditas

democráticas.

O que, portanto, procurou-se demonstrar, até o momento, neste trabalho, foi

interrelacionar as inúmeras legislações vigentes, acordos internacionais e demais

eventos preocupados com o ecossistema com os benefícios práticos da licitação

sustentável.

Para, então, finalizarmos estas ideias, ficamos com as felizes palavras de

Toshio Mukai:

Não se pode admitir, atualmente, que o homem se posicione como mero explorador das riquezas naturais colocadas à sua disposição. O entendimento mais aceito é de que o homem é apenas mais um dos elementos do meio ambiente, que, como os demais, interagem entre si, e que os recursos naturais passíveis de exploração são escassos, devendo ser corretamente utilizados, deforma a alterar o menos possível o equilíbrio natural.10

1.4 Estratégias de Licitações Sustentáveis

Diante do exposto, percebemos que as licitações são um procedimento

indispensável para a constituição de uma nação democrática, como a brasileira.

Pretendemos, neste momento, ser uma espécie de preâmbulo para a terceira parte

do trabalho, que enumerará alguns casos de sucesso referentes às licitações

sustentáveis, em especial quanto ao ICLEI (sigla em inglês de Governos Locais pela

Sustentabilidade).

Já se viu que licitação sustentável é aquela cujas compras se preocupam em

viabilizar a eficiência dos recursos materiais. Em outras palavras, as licitações 10 Mukai Toshio, Direito Ambiental Sistematizado, Forense Universitária, São Paulo, 1992.

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sustentáveis priorizam a real necessidade das compras por parte do Poder Público,

evitando, assim, a ineficácia de produtos que não cumprem as especificações

recomendadas.

Dizem as correntes críticas às licitações sustentáveis que estas se preocupam

somente com o aspecto ambiental, o que se trata de uma inverdade. Tais compras

consideram também a técnica e o preço, mas não se reduzem a estes aspectos

tradicionais. Preocupam-se também com a baixa contenção de materiais tóxicos

e/ou perigosos, o pouco e/ou ineficaz uso de recursos naturais, a maior vida útil do

produto, a reciclagem ou reutilização dos materiais, o baixo consumo de água e

energia em sua produção, a pouca geração de resíduos, etc.

Graças a essa percepção e ao aumento da demanda, cresce cada dia mais o

número de fornecedores comprometidos com esses ideais. Um problema é que a

maioria dos produtos sustentáveis são mais caros que os tradicionais, o que tende a

mudar se a demanda por esse tipo de compra continuar crescente. A propósito, se

há alguém que deve se comprometer com o aumento dessas compras, trata-se do

próprio governo, uma vez que este tem enorme poder de compra e portanto de

influenciar tendências de mercado.

Ademais, estimativas recentes demonstram que cerca de 10% do PIB brasileiro

são movimentados por compras e contratações realizadas por órgãos de governo,

sendo fundamental que aspectos de sustentabilidade social e ambiental sejam

considerados na utilização dos recursos públicos.

O Ministério do Meio Ambiente elaborou uma cartilha que serve como ponto

orientador para todos aqueles interessados nas práticas administrativas favoráveis

ao meio ambiente. Esse Manual é disponibilizado pelo citado Ministério em seu site.

De lá, podemos extrair algumas metas para as licitações sustentáveis:

• Exigir o cumprimento da legislação e regulamentação pertinente na procura por serviços e produtos; • Incentivar os fornecedores a oferecer produtos e serviços ambientalmente responsáveis a preços competitivos; • Incentivar os fornecedores a realizar a coleta ou reciclagem dos produtos usados; • Incentivar os fornecedores de serviços a considerar os impactos ambientais dos serviços de entrega; • Informar-se sobre o desempenho ambiental de produtos e serviços – as decisões sobre compras sustentáveis devem se basear em informações confiáveis e precisas sobre o ciclo de vida dos produtos

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e serviços, informações essas muito importantes para determinar se os mesmos possuem adequação ambiental para serem adquiridos; • Determinar a disponibilidade dos fornecedores - a disponibilidade de fornecedores de produtos ambientalmente corretos é um fator crítico para as compras sustentáveis. É necessário que se realizem levantamentos dos produtos e fornecedores, que se deixe claro a estes a política de compras sustentáveis da organização e que os incentive a fornecer alternativas mais sustentáveis.11

11 Retirado da página do Ministério do Meio Ambiente, url:www.mma.gov.br, acessado em 10/01/2016.

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CAPÍTULO 2

ALGUNS MÉTODOS UTILIZADOS PARA LICITAÇÕES

SUSTENTÁVEIS

Há diversas estratégias para incentivar as licitações sustentáveis. Dada a

impossibilidade de falarmos de todas, optaremos pelas principais.

2.1 Instrumentos já adotados pela Administração pública

2.1.1 Rotulagem

Um importante instrumento para a realização de licitações sustentáveis, já

adotado no Brasil, é a rotulagem. A chamada rotulagem ambiental visa à colheita de

informações acerca das características ambientais de produtos e serviços, com fim a

incentivar o consumo daqueles menos agressivos ao meio ambiente.

Tal rotulagem, dessa forma, encoraja a inovação ambiental industrial,

apresentando novas tecnologias e conscientizando os consumidores no sentido de

estimulá-los a comprar produtos que causam menores efeitos ao meio ambiente.

O Rio 92 alavancou o uso da rotulagem ambiental no mundo. No caso do

Brasil, a Associação Brasileira de Normas e Técnicas (ABNT), já em 1993, começou

um programa com esse fim, usando modelos de Selo Verde mundo afora para

utilizar um semelhante no país.

Ribeiro nos mostra que normas adotadas por ONGs ao redor do mundo se

tornaram quase universais, como, por exemplo, as séries 9000 e 14000, sobre

qualidade e proteção ambiental; a British Standard 8800 - BS 8800 e a Occupational

Health and Safety Assessment Series 18001 - OHSAS 18001, a respeito de

segurança e saúde no local de trabalho; a Social Account Ability 8000 – AS 8000,

sobre funcionários e condições de trabalho; a Account Ability 1000 - AA 1000, sobre

a responsabilidade social de forma geral, inclusive meio ambiente, e o Global

Reporting Initiative - GRI, com ênfase em aspectos ecológicos. No Brasil, o Instituto

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Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) emitiu 284

certificados de qualidade ambiental até 2004.12

Desse modo, a realização de licitações sustentáveis pelo Estado brasileiro é

facilitada, bastando inserir, como uma das exigências no processo licitatório, a

qualificação ambiental almejada.

2.1.2 Pregões

Paralelamente às chamadas rotulagens ambientais, os pregões vêm ganhando

importância central no tocante às estratégias para as licitações sustentáveis.

Em 2004, somente a administração direta consumiu, considerando compras de

material de consumo e contratação de obras e serviços, R$ 15,870 bilhões, 21% a

mais do que no ano anterior. O número de fornecedores, por sua vez, passou dos

200 mil (o que significou um aumento de 42%). Esse inchaço numérico se deu por

causa dos pregões eletrônicos, ferramenta que cresceu 500% no citado período,

propiciando uma economia de 31,5% por parte da Administração.

O pregão eletrônico tem outra relevante vantagem se comparado ao

tradicional: a agilidade. Enquanto o pregão eletrônico leva dezessete dias, o convite

leva vinte e dois e a concorrência chega a até quatro meses. Além disso, como o

pregão eletrônico funciona através de lances invertidos, a concorrência se torna

muito mais aberta, forçando as empresas a baixarem seus preços continuamente.

Nas outras modalidades licitatórias, o que ocorre é somente a sugestão de preço.

2.2 Outras iniciativas da Administração Pública

A Agenda Ambiental da Administração Pública também sistematizou as

medidas necessárias para contribuir com o consumo sustentável, que podem ser

praticadas por qualquer cidadão, em seu cotidiano.

Antes de tudo, é necessário, segundo a citada Agenda, que se cumpra as

legislações trabalhistas, ambientais e de Direitos Humanos, difundindo os

conhecimentos acerca das questões fundamentais de consumo e produção

sustentáveis. A Agenda Ambiental da Administração Pública fala ainda de:

12 RIBEIRO, Maisa de Souza. Contabilidade Ambiental. São Paulo:Saraiva, 2005.

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Capacitação sobre educação ambiental para prestadores de serviços de

manutenção técnica, de limpeza, de copa e outros.

• Formação ambiental que incorpore uma nova ética, para atuar na transformação de motivações individuais. • Gestão ambiental e qualidade total de processos de produção e de prestação de serviços. • Programas de capacitação em meio ambiente, de saúde e de segurança do trabalho. • Utilização de produtos reciclados e que não contenham CFC ou outras substâncias danosas ao meio ambiente. • Levar em conta a qualidade e durabilidade dos produtos a serem adquiridos. • Aplicação de sanção administrativa ambiental de impedimento para contratar com a administração pública por até três anos. • Especificação do objeto na licitação com requisitos voltados à conservação e preservação do meio ambiente. • Programas de gestão de resíduos sólidos pós-consumo. • Uso racional de energia e água.13

2.3 Estratégias ainda não adotadas

Apesar de já se observarem importantes mudanças no modo como a

Administração conduz as licitações, no sentido de privilegiar a proteção ao meio

ambiente, ainda é necessário avançar, para aplicar a sustentabilidade de mais forma

ampla e irrestrita. Nesse diapasão, listamos em seguida algumas estratégias,

sugeridas por estudiosos do tema ou já adotadas em outros países, que podem

contribuir para a efetivação das licitações sustentáveis.

2.3.1 Inserção de novos critérios ambientais

Na compra de diversos produtos, os critérios ambientais já são considerados

nas respectivas licitações. Mas ainda há algumas compras que desconsideram tal

preocupação e colocam em risco a longevidade do produto e o próprio impacto

ambiental. Como exemplo, recorreremos ao Trabalho de Conclusão de Curso,

apresentado ao IECAT (Instituto de Especialização em Ciências Administrativas e

Tecnológicas) do Centro de Universitário da FEI (Faculdade de Engenharia

Industrial), visando à adoção de compras sustentáveis no segmento público, de

Juliano Carvalho Dalapé, em que ele cita os veículos (flex-fuel, uso de álcool,

13 Retirado da página do Ministério do Meio Ambiente, url:www.mma.gov.br, acessado em 10/01/2016.

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biodiesel); o papel não clorado e reciclado (correspondência, dia-a-dia, publicações);

alguns alimentos orgânicos (merenda escolar, restaurantes populares); o plástico

reciclado (mobiliário, utensílios); a madeira certificada (mobiliário, construção civil); o

toner de impressoras e as tintas; os equipamentos não poluentes ou com reduzido

potencial poluente; os produtos florestais certificados; a energia renovável (consumo

de eletricidade), assim como a iluminação e as lâmpadas fluorescentes (descarte

adequado e reaproveitamento do mercúrio); o algodão não lavado com cloro

(vestimenta); etc.14

A Comissão Européia, citou outras medidas para reduzir os impactos negativos

ao meio ambiente, dentre os quais, podemos citar:

• Seleção de produtos, serviços ou obras mais adequados em função do impacto ambiental, disponibilidade de mercado de produtos e tecnologias e custos; • Escolha de um título ecológico para o contrato ou processo licitatório para conferir maior visibilidade e transparência perante a sociedade, fornecedores e prestadores de serviços; • Emprego de especificações técnicas claras e precisas, com inserção de fatores ambientais, rótulos ecológicos e especificações baseadas no desempenho como incentivo às novas tecnologias; • Comprovação de qualificação técnica para execução dos serviços por meio de sistemas de gestão ambiental; • Elaboração de critérios de seleção e comparação de propostas em que seja possível compatibilizar a proposta mais economicamente vantajosa e os critérios ambientais.15

2.3.2 Ecoeficiência

Como se sabe, nos dias atuais, a contínua insustentabilidade produtiva, em

especial nas nações mais industrializadas, é um dos fatores que mais contribui para

os impactos ambientais. O ecoproduto, com isso, surge como uma alternativa muito

mais vantajosa para o meio ambiente, por se tratar de um produto com menor gasto

de matéria-prima e maior quantitativo de conteúdo reciclável.

14 DALAPÉ, Juliano Carvalho. Compras Públicas Sustentáveis, São Bernardo do Campo, 2012, p. 19. 15 Retirado de OLIVEIRA, Flávia Gonçalves de. Licitações sustentáveis no subsetor de edificações públicas municipais: modelo conceitual, Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Engenharia Civil do Centro Tecnológico da Universidade Federal do Espírito Santo como requisito parcial para obtenção do título Mestre em Engenharia Civil, orientado pelo Prof. Dr. Ing. Marcel Olivier Ferreira de Oliveira, Vitória, 2008, p. 95.

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Os ecoprodutos, além disso, não contêm material tóxico nem produzem

poluição, primando pela tecnologia limpa. Paralelamente, consomem menos água e

energia durante o processo de produção, enquanto demandam uma embalagem

menor. Além de não impactarem negativamente as espécies em extinção, os

ecoprodutos podem ser reutilizados ou reabastecidos, caracterizando-se pela

durabilidade qualitativa. São, ainda, passíveis de coleta e desmonte depois de

consumidos.

A adoção dos produtos sustentáveis nas licitações, além das vantagens

ecológicas, propicia uma melhoria direta na imagem da Administração Pública; uma

maior conscientização ambiental; uma maior eficiência das licitações, já que estas

serão mais criteriosas e um maior desenvolvimento local, dentre vários outros

benefícios.16

Pode-se citar a sustentação política como vertente indissociável da

ecoeficiência. Nas palavras de Oliveira, “a sustentação política é fundamental para o

sucesso da implantação de um programa de licitação sustentável, pois sem ela é

possível que o processo sofra com descontinuidades administrativas”, contando

somente com o engajamento de alguns cidadãos mais conscientes. “A adoção de

uma declaração política oficial estimula a utilização de práticas de compras e

contratações sustentáveis e um maior compromisso assumido por toda a Autoridade

Pública”. Assim, além da necessidade “de um compromisso político assumido

perante a sociedade, é importante destacar a parceria necessária entre o

departamento de licitação e o ambiental”. Oliveira explica que “o órgão ambiental

detém grande parte do conhecimento para inclusão de critérios ambientais em

categorias de produtos e serviços, enquanto o órgão de licitação apresenta maior

ciência a respeito das práticas de compras, regulamentos e demais critérios”.17

Dentre os diversos produtos que são adquiridos pela Administração Pública,

alguns são de suma importância para a popularização das compras sustentáveis.

“Para produtos destacados como de alta prioridade pode-se estabelecer um

compromisso obrigatório para se alcançar as metas propostas pela Administração

Pública”. Por outro lado, para produtos considerados não prioritários, é admissível

escolher alguma ação menos radical, concedendo uma parcela de “autonomia aos

16 BIDERMAN, Rachel et al (Org.). Guia de compras públicas sustentáveis: uso do poder de compra do governo para a promoção do desenvolvimento sustentável. São Paulo: GVces; ICLEI; LACS, 2006. 17 OLIVEIRA, Flávia Gonçalves de. Obra citada, p. 98.

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compradores, mas sob uma campanha informativa em que se destaquem a

finalidade e os benefícios do emprego da licitação sustentável. Esta ação busca

envolver e motivar funcionários da Administração Pública, sem se conformar uma

imposição superior”.18

2.4 Nova licitação, novos processos

Caso se pretenda, de fato, adotar as licitações sustentáveis, é fundamental a

implementação de novos meios de compra, uma vez que o administrador deve estar

sempre preocupado com os cofres públicos. Esse pensamento ganha força quando

a oposição às licitações sustentáveis afirma que estas são mais caras, que o preço

pago pelos ecoprodutos é totalmente injustificável.

Porém, como Biderman e Oliveira já observaram, nos processos de compra

sustentável, são utilizados processos igualmente inovadores, que viabilizam a

proporcional economia da verba pública, como avaliações do custo ao longo do ciclo

de vida do produto; a minimização da necessidade de compra; a conservação dos

preços de compras a níveis competitivos e a agilidade do processo de licitação.19

As ferramentas de Análise do Ciclo de Vida

têm sido aprimoradas através de padrões internacionais, pois a metodologia avalia, entre dois impactos, qual deles é o mais significativo. Igualmente, a ACV tem sido empregada no desenvolvimento de políticas públicas de ecorrotulagem, regulamentação de análises ambientais e políticas de guias tecnológicos, entretanto, poucos dos países interessados na licitação sustentável detém a possibilidade de investir tempo e recursos suficientes nas pesquisas. Além da quantificação dos impactos ambientais, a Administração Pública tem se utilizado da ACV para a definição dos custos do ciclo de vida e para a seleção da proposta mais vantajosa. A abordagem “custo do ciclo de vida” consiste, portanto, em integrar na decisão de aquisição, ou seja, no julgamento da proposta, os custos envolvidos durante a vida do produto ou serviço. (...) Os custos do ciclo de vida devem ser equacionados na fase do julgamento das propostas e apesar de existirem ferramentas disponibilizadas no mercado para tal, o processo não é necessariamente difícil, e pode envolver uma simples comparação de custos óbvios e quantificáveis. A abordagem do custo do ciclo de vida pode ser posta em prática de forma a poupar, por exemplo, os

18 Idem. 19 BIDERMAN, Rachel et al (Org.). Obra citada, p. 42.

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custos de consumo de água, energia e combustíveis fósseis, e os custos de disposição final. Gastos com energia, água e combustíveis fósseis definem um critério claro de redução de custos aliado à diminuição de impactos sobre o meio ambiente. Custos de descarte de resíduos também devem ser considerados, pois, muitas vezes, uma proposta vantajosa pode se tornar onerosa, visto que pode envolver a necessidade de remoção de resíduos como também custos para uma disposição final segura. No caso da construção civil, por exemplo, a demolição de um edifício pode ocasionar além da necessidade de remoção de entulho, também a gestão de resíduos perigosos, como o amianto. No edital ou convite de licitação, é possível solicitar que os licitantes indiquem a quantidade de resíduos perigosos gerados e os custos de transporte e disposição, como também considerar os efeitos de utilização de materiais provenientes de reciclagem.20

Portanto, conforme mencionado por Oliveira e Coggburn21, as licitações

sustentáveis têm de enfrentar os preconceitos inerentes ao descaso com o meio

ambiente e, paralelamente, lutar contra as vantagens financeiras das licitações

tradicionais.

Porém, já foi mencionado que esse caráter mais caro das licitações

sustentáveis tem muito de aparência e pouco de realidade. Vejamos o caso da

cidade suíça de Zurique (exemplo citado por Biderman), que optou por comprar

cartuchos altamente recarregáveis e, com isso, apesar de ter pagado mais caro a

princípio, conseguiu uma economia a médio e longo prazo, pois em tais cartuchos

há mais tinta. Graças a essa escolha, Zurique economizou 30% em suas verbas

públicas.

É necessária também uma campanha mais intensa sobre o não desperdício

por parte da Administração Pública. Reaproveitar papéis, pastas, cartuchos, etc, são

sempre medidas positivas para a Administração e para o meio ambiente. Medidas

semelhantes, como as adotadas pela Agenda A3P, elaborada pelo Ministério do

Meio Ambiente, são sempre bem-vindas nessa campanha.

O preço de compra, por sua vez, precisa ser mantido em um nível razoável,

para não desestimular as compras sustentáveis. A Administração Pública, ainda

pautada na razoabilidade, deve estabelecer um preço máximo que esteja disposta a

20 OLIVEIRA, Flávia Gonçalves de. Obra citada, pp. 101-102. 21 COGGBURN; Jerrell D.; RAHM, Dianne, 2005. Environmentally preferable purchasing: who is doing what in the United States? Journal of Public Procurement, Florida,v. 5, 2005. p. 23-53.

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pagar para licitar sustentavelmente. Tais critérios, como são evidentes numa

sociedade democrática como a brasileira, devem ser totalmente transparentes.

Licitações por meios eletrônicos e licitações centralizadas são outros

mecanismos que podem favorecer a sustentabilidade. As primeiras já são previstas

na legislação brasileira, enquanto as segundas ocorrem derivadas de um setor

central, permitindo, segundo Biderman, a introdução de políticas e práticas

licitatórias mais coordenadas, com menor esforço. As licitações centralizadas

propiciam, ainda: 1) capacidade de monitorar e limitar a despesa total do orçamento

em compras novas com mais eficiência; 2) possibilidade de alcançar condições mais

favoráveis de compra simplificando diversos pedidos pequenos e 3) maior chance de

minimizar custos.22

Oliveira, que também cita Biderman, acrescenta que, além dessas vantagens,

“a licitação centralizada favorece um maior poder de negociação com os

fornecedores devido ao maior volume de bens e serviços a serem adquiridos. Esta

ação, por conseqüência, contribui para melhores condições de preço e qualidade”.

Concomitantemente, para Oliveira, “é possível uma maior profissionalização da

equipe de licitações, visto que passa a concentrar todos os esforços para a

realização do certame”.23

As licitações eletrônicas, que, como já mencionado, estão previstas na

legislação brasileira, são realizadas na Internet, o que diminui os custos e agiliza a

operação.

Oliveira explica e Biderman sistematiza algumas das vantagens das licitações

eletrônicas:

• redução no tempo administrativo e nas despesas com os procedimentos simplificados e mais eficientes; • um sistema mais direto de requisição; • uma maneira de comparar facilmente os preços; • simplificação da busca pela informação, por exemplo, pelo desempenho do produto ou pelo histórico ambiental dos fornecedores; • padronização dos processos e documentação; • alcance de uma gama maior de fornecedores e aprimoramento da competição; • mais transparência no processo de compra.24

22 BIDERMAN, Rachel et al (Org.). Obra citada, p. 48. 23 OLIVEIRA, Flávia Gonçalves de. Obra citada, p. 106. 24 BIDERMAN, Rachel et al (Org.). Obra citada, p. 50.

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Exemplificando: “A experiência internacional do estado de Massachussets, nos

Estados Unidos, reduziu custos de US$ 100-150 para US$ 20-30 com a adoção do

novo processo de licitação”. Da mesma forma, a “licitação eletrônica favoreceu a

redução de custos de marketing e de distribuição dos fornecedores de produtos

sustentáveis”. Além dos EUA, há experiência de ganhos conquistados em países

como a Austrália, o Japão e ainda em vários países membros da União Européia

como: Alemanha, Inglaterra e Escandinávia.25

Por fim, pode-se citar o exemplo das licitações compartilhadas, onde podem

ser “incluídos critérios ambientais de compras de bens e serviços, entretanto a

compra e/ou contratação é feita de maneira a atender várias entidades públicas com

as mesmas necessidades de bens e serviços”26, favorecendo, primeiramente, os

“preços mais competitivos e condições mais favoráveis de compra, considerando

que são quantidades maiores, especialmente quando se compram produtos

fabricados em massa (menos relevantes no caso de trabalhos de construção)” e,

além disso, em segundo, a “redução dos custos administrativos e melhoramento dos

serviços pelas entidades de compras, como conseqüência da concentração da

gerência de aquisição”27.

2.5 Fechamento

Esse capítulo procurou mostrar algumas estratégias possíveis no combate aos

impactos ambientais, evidenciando que, se quisermos um meio ambiente mais

saudável, as licitações sustentáveis são essenciais para isso – até porque é a

Administração Pública quem tem maior poder de compra no país, totalizando cerca

de 10% do PIB nacional.

Foram citadas algumas das estratégias possíveis a fim de promover as

licitações sustentáveis. Evidentemente, há diversas delas, mas essas nos

pareceram as mais importantes e as mais factíveis. A exceção é o ICLEI, que foi

mencionado rapidamente, mas não debatido a fundo. Tal atitude foi proposital, pois

acreditamos ser o ICLEI merecedor de um destaque maior. Uma boa parte do

capítulo a seguir será dedicado a ele.

25 OLIVEIRA, Flávia Gonçalves de. Obra citada, p. 109. 26 Idem, p. 107. 27 BIDERMAN, Rachel et al (Org.). Obra citada, p. 50.

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CAPÍTULO 3

CASOS DE SUCESSO

Embora já comentados anteriormente nesse trabalho, os casos de sucesso de

licitações sustentáveis merecem um capítulo à parte no presente trabalho. São

esses casos, afinal, que nos mostram a viabilidade desse tipo de proposta, expondo-

nos a possibilidade de sua execução. As licitações sustentáveis não são valiosas

apenas na teoria. São, acima de tudo, atos praticáveis, que podem ir além do campo

das ideias e alcançar nossa legislação e, posteriormente, nossa vida cotidiana.

3.1 ICLEI

Ao falar sobre casos de sucesso de licitações sustentáveis, vemo-nos

obrigados a citar o ICLEI, sigla para International Council for Local Environmental

Initiatives ou, em Português, Conselho Internacional para Iniciativas Ambientais

Locais. Trata-se de uma associação internacional que conta com governos e

associações comprometidos com o desenvolvimento sustentável.

Fundado em 1990, o ICLEI propicia consultoria técnica e treinamento de

pessoal capacitado e empenhado com o desenvolvimento econômico, sem prejuízo

do meio ambiente. Qualquer governo ou associação local pode aderir ao ICLEI, de

forma gratuita, e cada membro ocupa seu lugar no Conselho, que constitui um Plano

Estratégico para seis anos e elege um Comitê Executivo Internacional de

representantes dos governos locais.

Segundo a página do ICLEI na Internet, mais de 400 governos e associações

ao redor do mundo já fazem parte do grupo, unindo desde pessoas físicas até

agências estaduais, municipais e nacionais e organizações sem fins lucrativos e

ONGs. Deve-se frisar que o voto é direito das pessoas jurídicas apenas.

O ICLEI se encarrega do diálogo entre os programas globais e os governos

locais, através de acordos com as agências das Nações Unidas e demais

organizações internacionais.

O ICLEI contribui para a criação de políticas internacionais que fortaleçam os governos locais e apóiem iniciativas locais de desenvolvimento sustentável, representando governos locais em

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processos de política multilateral, nas conferências e reuniões das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável. O ICLEI, enquanto movimento, desenvolve e gerencia diversas campanhas e programas que abordam questões de sustentabilidade local e protegem bens comuns globais (como qualidade do ar, clima e água), fazendo a ligação entre a ação local e as metas e objetivos de acordos internacionais. Ajudamos os governos locais a promover conscientização política sobre questões-chave; a estabelecer planos de ação para atingir objetivos concretos e mensuráveis; a trabalhar para atingir as metais através da implementação de projetos; e a avaliar os progressos locais e cumulativos rumo ao desenvolvimento sustentável.28

O ICLEI se compromete com a construção de comunidades e cidades

sustentáveis e com a governança participativa e gestão da sustentabilidade, com

destaque, dentre outros, para o Programa de Comunidades e Cidades Resilientes, o

Programa de Cidades e Comunidades Seguras, Pacíficas e Justas, o Programa de

Governança Local, o Programa de Gestão de Sustentabilidade e o Programa de

Compras Sustentáveis.

O primeiro é uma parceria para “apoiar o aumento da resiliência de instituições,

infra-estrutura e da vida econômica e social das cidades e municípios no mundo

inteiro”. O segundo, “já lançado na América Latina, busca fortalecer o papel dos

governos locais na construção da paz e na melhoria da segurança”. O Programa de

Governança Local foi criado em 1991, quando o ICLEI redigiu a aceitação do

Capítulo 28 da Agenda 21, que endossa a iniciativa local desta. “Desde então, mais

de 6.000 governos locais instituíram um processo de Agenda 21 (LA21) Local”. O

ICLEI continuou a promover o LA21 e a trabalhar “com centenas de governos locais

e suas associações para divulgar processos locais de planejamento do

desenvolvimento sustentável participativo”. O quarto programa citado, isto é, o

Programa de Gestão de Sustentabilidade, é, na verdade, um apoio do ICLEI a

“governos locais para desenvolver estruturas de gestão municipal que integram, de

maneira rotineira e sistemática, assuntos ambientais, sociais e econômicos em

processos decisórios municipais”, usando-se de instrumentos próprios para tal

(como o ecoBUDGET o Triple Bottom Line e o Sustainability Inventory). Por fim,

temos o Programa de Compras Sustentáveis, que é onde o ICLEI visa ao aumento

da demanda do mercado “por produtos ambientais e socialmente preferíveis, por

meio de apoio aos esforços de aquisições públicas ‘verdes’ por parte dos governos

28 Texto traduzido do Inglês. Original contido em <url: http://www.iclei.org/>, acessado em 19/12/2015.

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locais”. Mais de duzentos agentes europeus “de aquisições sustentáveis participam

da rede ‘Compre Verde’- (BIG-Net) e, em 2004, foi lançada a Campanha

Procura+”.29

O ICLEI não deixa, obviamente, de preocupar-se com a preservação dos bens

comuns globais. Para tal, ela criou, em 1993, a “Campanha Cidades para a Proteção

do Clima”, que convoca os municípios ao redor do mundo a implantarem políticas e

medidas a fim de alcançarem reduções significativas de suas emissões de gases de

efeito estufa, melhorando a qualidade do ar e desenvolvendo a habitabilidade

urbana. Mais de seiscentas cidades participam dessa campanha, unificando a

mitigação de mudanças climáticas em seus processos decisórios.

Paralelamente, há a Campanha da Água, que propicia uma base para os

governos locais fundamentarem seus empenhos de gestão hídrica local e

desenvolverem programas que ajudem a administração local da água. A campanha

tem como pré-requisito um conjunto de marcos de desempenho que estudam os

desafios da governança de recursos hídricos. A Austrália foi um dos primeiros

países a mostrar resultados positivos, ao criar uma forte campanha de gestão

hídrica, podendo ser adaptada para outras regiões do planeta.

Como agência ambiental e de desenvolvimento sustentável internacional para governos locais, o ICLEI fornece informações, providencia treinamento, organiza conferências, facilita o intercâmbio entre cidades e a constituição de redes, executa pesquisas e projetos piloto, além de prestar serviços técnicos e de consultoria. Servindo como centro de referência sobre desenvolvimento local sustentável, o ICLEI fornece a atualização de notícias, produz manuais de práticas e de políticas, manuais de formação e boletins de informação. (...) O ICLEI também publica uma série de estudos de caso e melhores práticas que reúnem histórias de sucesso do mundo todo. O ICLEI ajuda a fortalecer a capacidade dos gestores e representantes eleitos do governo local, para auxiliar no processo de transição para o desenvolvimento sustentável. O Centro Internacional de Treinamento do ICLEI (ITC) organiza seminários, oficinas e conferências e oferece treinamento à distância, viagens de estudo e programas de intercâmbio. São realizadas, tanto global como localmente, conferências periódicas que enfocam a capacitação e intercâmbio. Oitenta especialistas do ICLEI em 12 escritórios orientam os governos locais na criação de políticas de desenvolvimento sustentável. Desde 1995, o departamento Serviços de Energia do

29 Idem.

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ICLEI fornece aos governos locais, cobrando por serviço prestado, experiência e conhecimento necessários para reduzir as emissões de gás de efeito estufa e melhor a eficiência energética.30

O ICLEI possui uma diversificada página na Internet, incluindo ferramentas,

bancos de dados e materiais on-line, cujo objetivo, segundo eles próprios, é ajudar

os governos locais. Nessa página, vemos duas entrevistas acerca da organização.

Na primeira, Klaus Töpfer, sub-secretário geral e diretor executivo do Programa das

Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP), diz que ampara “inteiramente a

missão do ICLEI de promover e apoiar o papel das cidades no desenvolvimento

sustentável”, e que pode “constatar, com satisfação, que o ICLEI aborda o papel das

cidades em todos os níveis”. A segunda declaração é de Maurice Strong, ex-

secretário geral da Conferência Mundial Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,

na qual afirma que “uma das coisas mais instigantes e valiosas que ocorreram

durante o processo de preparação da Conferência Mundial sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento (UNCED) foi a criação do Conselho Internacional para Iniciativas

Ambientais Locais e o subsequente desenvolvimento da Iniciativa da Agenda 21

Local.”

Como já mencionado, o ICLEI está presente também na América Latina e, em

seu país de maior extensão territorial, o Brasil, não poderia ser diferente. O estado

brasileiro que mais se aproximou do ICLEI foi o de Minas Gerais, seguido, em menor

intensidade, do governo do Estado de São Paulo.

Falaremos um pouco mais disso a seguir.

3.2 ICLEI no Brasil

No Brasil, o ICLEI auxilia a coordenar o projeto “Promovendo as compras

públicas sustentáveis no Brasil”, existente nos estados de Minas Gerais e São

Paulo.

Em fevereiro de 2007, o governo de Minas Gerais celebrou o acordo com o

ICLEI, quando o citado projeto foi introduzido pela Embaixada Britânica ao fundo

WSSD do Ministério para Assuntos de Meio Ambiente, Alimento e Rurais do Reino

30 Idem.

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Unido (DEFRA). O projeto não apenas foi aprovado como recebeu £200 mil para se

desenvolver de forma mais consistente.

A gerente de projetos da entidade no Brasil, Paula Gabriela Freitas, relatou à

Revista Negócios Públicos, que a atuação mundial pioneira do ICLEI com o tema e a

boa reputação já conquistada ajudaram a garantir os recursos para o projeto. Paula

conta ainda que o ICLEI não apenas trata dos assuntos operacionais, mas também

cuida do orçamento do projeto: “O valor total da verba não é distribuída para o ICLEI

em somente uma parcela. Enviamos relatórios financeiros e de andamento para o

governo Britânico analisar a cada três meses”. Esses documentos indicam se o

projeto alcançou seus objetivos para aquele período.

Também são atribuições do ICLEI a implementação, administração e coordenação do projeto; a promoção da comunicação entre os parceiros; o desenvolvimento das metodologias e treinamentos; apoio às pesquisas; e coordenação e organização dos eventos. O programa “Promovendo as Compras Públicas Sustentáveis” tem o objetivo de canalizar toda a capacidade de conhecimentos e promover as compras públicas sustentáveis nas três regiões já apresentadas anteriormente. O objeto do trabalho prevê o consumo e a produção de forma responsável nos negócios públicos, nas compras onde houver oferta ou possibilidade de intervenção no mercado, tais como consumo de madeira, papel, água energia etc, destacados os três pilares da sustentabilidade: desenvolvimento social, econômico e ambiental. Conforme destacado no documento elaborado pela SEPLAG (Secretaria do Planejamento e Gestão), a expectativa é de que o resultado da maior abrangência das compras públicas sustentáveis reduzirá a pressão sob os recursos naturais e ecossistemas, bem como em bens comuns ambientais globais. A política também deverá reforçar a cooperação entre níveis diferentes do governo e propiciará transparência e eficiência aos processos de compras públicas.31

O ICLEI, de acordo com suas informações oficiais, investiu até 2008

aproximadamente £ 82 mil em atividades do projeto “Promovendo as compras

públicas sustentáveis no Brasil”, seguindo tanto o orçamento aprovado pelo governo

inglês quanto o plano aceito pelo Grupo de Trabalho do projeto.

A diretora da Superintendência de Recursos Logísticos e Patrimônio da

SEPLAG (Secretaria do Planejamento e Gestão), Ana Cristina Albuquerque, acredita

que os servidores da Administração mineira têm visto com bons olhos a nova política

31 Texto retirado da Revista Negócios Públicos, de maio de 2012.

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de licitações sustentáveis. “O evento de capacitação realizado neste ano reuniu mais

de 250 compradores do estado, interessados em conhecer como se realizam as

compras verdes e como podem contribuir para adotarem atitudes positivas e

contundentes de licitações sustentáveis”, afirmou ela à Revista Negócios Públicos,

indo além: “O estado de Minas Gerais é beneficiário indireto dos recursos, na

mesma proporção que os outros estados ou municípios”.

Para os críticos das licitações sustentáveis, que afirmam que haverá um

encarecimento das compras públicas, o governo de Minas Gerais respondeu

levantando números referentes ao projeto. O Estado economizou efetivamente mais

de R$ 32 milhões, com a adequada seleção de compras de bens e o devido

atendimento aos requisitos da sustentabilidade, contidos implicitamente na

apreciação de todo o ciclo de vida.

A parceria entre Minas Gerais e o ICLEI agradou a ambos. A organização pôs

notícias referentes ao governo mineiro em sua página na Internet (destacando, por

exemplo, o aquecedor solar e a lâmpada econômica urbana que virão embutidas

nas novas casas populares do estado) e Minas Gerais, por sua vez, fortaleceu sua

legislação contra os descasos ambientais, através do Decreto Nº 44.122, que dispõe

sobre a aquisição, por parte da Administração Pública, de madeiras, insumos e

derivados. Concomitantemente, o governo de Minas Gerais deseja a existência de

incisos no corpo da Lei 8666/93 que prevejam critérios socioambientais,

acompanhando, para tal fim, todas as minutas que passam e passaram pelo

Congresso Nacional.

A nova preocupação com os critérios socioambientais, ao contrário do que

temiam os críticos, veio a trazer mais transparência aos processos licitatórios. Com

isso, houve – não só em Minas, mas em outros estados – a capacitação de diversos

profissionais, a fim de realizarem compras que não prejudiquem o meio ambiente,

treinamentos esses já citados anteriormente no trabalho.

Portanto, não foi só o Estado de Minas Gerais que fez acordos internacionais.

Aliás, como já dito, o ICLEI promove convênios não apenas com estados e

municípios, mas também com associações, entidades e pessoas físicas, embora a

estas últimas seja vedado o direito a voto.

Uma forte entidade brasileira que celebrou parceria com o ICLEI foi a

Fundação Getúlio Vargas, entidade que desde 1944 promove pesquisas acadêmicas

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e levanta discussões de problemas relacionados ao desenvolvimento brasileiro,

além de preservar o patrimônio histórico ligado ao ex-presidente do Brasil que leva o

seu nome.

Desde 2004, a Fundação Getúlio Vargas defende as licitações sustentáveis,

por meio do seu Centro de Estudos em Sustentabilidade (Gvces), atuando

juntamente com a iniciativa privada, os cidadãos comuns e o poder público,

capacitando compradores, projetando, publicando e realizando cursos de

especialização em gestão de sustentabilidade e outras medidas.

Uma notável medida da Fundação Getúlio Vargas no sentido de promover as

licitações sustentáveis foi o Catálogo Sustentável, uma plataforma gratuita na

Internet, que tem por fim a promoção da racionalização e da maior eficiência da

divulgação de produtos e serviços sustentáveis. Apoiado pelo ICLEI, a Fundação

Getúlio Vargas busca, nas palavras da pesquisadora do Gvces, Luciana Betiol, à

Revista Negócios Públicos, “informar consumidores institucionais, entre eles

governos e empresas, e também o público em geral sobre as relações entre

consumo e meio ambiente. Para isso, o consumidor terá acesso através do catálogo,

às informações sobre a matéria-prima, o processo produtivo, a legislação pertinente

e aos impactos ambientais associados à produção e ao consumo de bens e

serviços”.

Além do Catálogo, o Gvces também elaborou o “Guia de Compras Públicas:

uso do poder de compra do governo para a promoção do desenvolvimento

sustentável”, organizado pelos professores do Centro de Estudos Rachel Biderman,

Mano Monzoni e Rubens Mazon, em parceria com a diretora do ICLEI-LACS32,

Laura Valente de Macedo. “O Guia é uma tradução do Manual Procura+,

desenvolvido pelo ICLEI Europa” e já citado em linhas anteriores. “A obra foi

adaptada ao contexto nacional e apresenta a legalidade da Licitação Sustentável

baseada na legislação nacional, bem como, experiências obtidas nas

Administrações Federal, Municipal e Estadual”.33

Levantamento realizado pelo Secretariado para América Latina e Caribe do ICLEI revelou que diversas iniciativas isoladas de

32 LACS: sigla para “Latin America and the Caribbean Sustentability” (em Português: Sustentabilidade para a América Latina e o Caribe). Conforme consta na página do ICLEI na Internet: “O ICLEI-LACS foi criado em junho de 2000, com a assinatura do convênio entre ICLEI-Brasil e a cidade do Rio de Janeiro. O escritório tornou-se operacional em julho de 2001. A personalidade jurídica do ICLEI–LACS é o ICLEI-Brasil, organização não-governamental criada para atender exigências legais”. 33 Idem.

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Compras Públicas Sustentáveis vêm acontecendo no Brasil, promovidas por departamentos ou indivíduos em diferentes instâncias de governo, como no Estado de São Paulo e em sua capital e, também em Minas Gerais. De acordo com Paula Gabriela, atualmente o ICLEI está concluindo a elaboração do projeto Iniciativa Nacional de Compras Públicas Sustentáveis — INCPS, em âmbito nacional. O trabalho conta com a parceria do Ministério do Meio Ambiente, do Ministério do Planejamento, do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas, do PNUMA— Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e, potencialmente, da Caixa Econômica Federal. “Está previsto que o INCPS capacitará Estados e Municípios”, diz. Embora não tenha a missão de angariar recursos, uma das maneiras usadas pelo ICLEI para custear as despesas de seus projetos é buscar ajuda financeira por meio da apresentação de projetos para entidades que têm interesse em apoiar iniciativas de desenvolvimento sustentável. Os governos interessados em desenvolver a política de Compras Públicas Sustentáveis podem entrar em contato com o ICLEI para estudar suas necessidades locais e, possivelmente, estabelecer parceria com a entidade.34

Retomando, para concluir, a parceria entre ICLEI e Minas Gerais, ficamos com

a última declaração de Renata Vilhena, ciente da responsabilidade da Secretaria de

Estado do Planejamento e Gestão – SEPLAG – de Minas Gerais, à Revista

Negócios Públicos. Ela afirma: “Pretendemos avançar quanto ao mecanismo e às

medidas efetivas de controle que impliquem diminuição ou contenção do consumo

de água, energia e em relação às obras e serviços contratados pelo estado. As

condições serão explicitadas nos instrumentos editalícios, com previsão de

penalidades pelo descumprimento e fiscalização desta condição na execução

contratual”.

3.3 Demais casos de sucesso no Brasil

É verdade o que dizem os críticos e os pessimistas quanto às licitações

sustentáveis no Brasil: em nível nacional, ICLEI à parte, vê-se ainda uma lentidão

nos processos de constituição dessas licitações. Porém, elas existem e, embora não

componham a maioria de nossas licitações, atingiram relevante destaque na vida de

algumas cidades.

34 Idem.

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Dentre as principais inovações legislativas no Brasil nesse setor, podemos

citar:

a) o Programa Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), que, desde

1999, incentiva a Administração Pública a considerar o impacto ambiental em seus

atos licitatórios;

b) o Decreto 2.783 de setembro de 1998, que, embora desconhecido pela

maior parte dos órgãos públicos, proíbe-os de adquirirem produtos que denigram a

camada de ozônio;

c) o Decreto Federal 5.940, de outubro de 2006, estabelecedor da segregação

dos resíduos recicláveis jogados fora pela Administração Pública e do seu

encaminhamento às cooperativas e associações que reúnem catadores de materiais

recicláveis;

d) no Estado de São Paulo, o Decreto Nº 41.629, de 1997, vedando a obtenção

por órgãos públicos de materiais com substâncias degradantes da camada de

ozônio;

e) também no Estado de São Paulo, o Decreto Nº 49.674, de 06.06.05, que

fiscaliza o uso de madeira nativa legal em obras e serviços de engenharia;

f) no mesmo Estado, o Decreto Nº 42.836, de 02.02.98, alterado pelo Decreto

nº48.092, de 18.09.03, que obriga a frota do Grupo Especial da Administração Direta

e Indireta a adquirir automóveis a álcool, aceitos, excepcional e devidamente

justificados, os veículos movidos a bicombustível ou gasolina, caso inexistam

modelos na mesma classificação que funcionem com álcool. Com isso, vê-se o

álcool anidro substituindo o chumbo tetraetila;

g) no Estado do Rio de Janeiro, a Lei 3.908, de 25 de Julho de 2002, que veda

os alimentos, nas merendas escolares, que tenham passado por modificações

genéticas;

h) o Decreto 42.318 de 2002 (o Programa de Qualidade Ambiental Municipal),

em São Paulo, capital;

i) o Decreto Nº 48.075, de 28 de dezembro de 2006, que dispõe sobre o caráter

obrigatório da utilização de agregados reciclados, provenientes de resíduos sólidos

da construção civil, tanto em serviços quanto em obras que visam à pavimentação

das vias públicas de São Paulo, capital;

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j) Portarias da prefeitura de São Paulo, incentivando a madeira certificada,

proibindo o comércio de mogno, criando o conselho que revisa os critérios para

compra de mobiliário, incentivando a substituição do uso de asbestos na construção,

etc;

k) o Pregão eletrônico, que pode fortalecer a conscientização da preocupação

ambiental nas licitações públicas.

O Pregão, pura e simplesmente – não o eletrônico – é conceituado por Jorge

Fernandes como “o procedimento administrativo por meio do qual a Administração

Pública seleciona fornecedor ou prestador de serviço, visando à execução de objeto

comum no mercado, permitindo aos licitantes, em sessão pública presencial ou

virtual, reduzir o valor da proposta por meio de lances verbais e sucessivos”.35

O Pregão foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Medida Provisória nº. 2.026/2000 e, durante a vigência dessa medida, reeditada dezoito vezes, o pregão constituía modalidade de licitação somente aplicável no âmbito da União. Com o advento da Lei 10.520/2002, o pregão foi expressamente estendido a todas as esferas da federação e esta lei passou a constituir, juntamente com a lei 8.666/93, o corpo normativo geral sobre licitações no Brasil. Diante das exigências de agilidade e eficiência características da Administração Gerencial, a disciplina legal do pregão evoluiu, se adequando à nova realidade tecnológica e introduzindo no Brasil as compras virtuais por meio do Pregão Eletrônico. O Decreto 5.450/2005 fortaleceu ainda mais o instituto do pregão, não somente instituindo a modalidade eletrônica, mas, principalmente, tornando obrigatória a utilização da modalidade pregão, preferencialmente eletrônico, para a aquisição de bens e serviços comuns pela União36

Assim, o que se pretende com os pregões eletrônicos é banir os itens que

estejam em desacordo com a legislação ambiental, desenvolver novos itens de

consumo, identificar as madeiras de espécies ameaçadas, entre outras medidas que

promovem a sustentabilidade.

Já o Programa Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), citado mais

acima, vem mostrando muito bons resultados no âmbito de sua atuação. Algumas

ações de sua Comissão Gestora merecem especial destaque, como:

a) a Instituição da Rede A3P, um canal de comunicação promovedor do

intercâmbio técnico e difusor de dados ambientais. Essa Instituição, além da troca

35 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Sistema de Registro de Preços e pregão presencial e eletrônico. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 455. 36 Texto retirado da Revista Jus Vigilantibus, de 7 de setembro de 2009, escrito por Agnelo Rocha Nogueira Soares.

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de experiências, visa ainda à sistematização das informações a respeito da

performance ambiental dos órgãos e ao incentivo de programas formadores de

mudanças organizacionais;

b) a Minuta de Recomendação do CONAMA (Conselho Nacional do Meio

Ambiente), inserindo junto ao Ministério do Meio Ambiente a importância de algumas

atividades administrativas dos órgãos públicos;

c) Compras Verdes, que são um grande e sistemático levantamento a respeito

de serviços que possam vir a proporcionar melhorias ambientais, sem abrir mão da

economia de recursos, identificando os mais importantes aspectos ambientais,

buscando a orientação do procedimento decisório para as áreas de compras;

d) Base legal: classificação, no ordenamento jurídico do país, da viabilidade de

realizar ações de licitação sustentável;

e) Minuta de Portaria, designando a obrigatoriedade de se usar o frente e o

verso dos papéis quando a Administração Pública for se utilizar dos serviços de

reprografia, a partir de certa quantidade;

f) Proposta para obrigar a Administração Pública a comprar modelos de

impressora que, automaticamente, imprimam frente e verso dos papéis (modo

duplex).

Um estado que precisa, talvez mais que os outros, abrir os olhos para as

licitações sustentáveis é o Amazonas, devido, é claro, à sua imensa floresta. Nesse

sentido, o estado já adquiriu mais de 10 mil carteiras com madeira certificada.

Ainda na Região Norte, o governo do Acre considerou prioritária a compra de

madeira certificada na reforma pela qual passou o Palácio do Governo do Estado. O

mesmo ocorreu com a compra de mobiliário.

Como já foi falado a respeito de outras experiências com madeiras legais, essa

atitude do Acre pode parecer repetitiva, mas, antes que se tome essa conclusão

equivocada, vale citar que madeira legal e madeira certificada são objetos

diferentes. A madeira de espécie nativa é considerada de origem legal se

acompanhada da Nota Fiscal e do Documento de Origem Florestal (DOF). Madeiras

de espécies exóticas com procedência legal não necessitam do DOF, porém

obrigatoriamente devem ser acompanhadas da nota fiscal da carga. São tipos de

madeiras exóticas o pinus, o eucalipto, a teça, etc. A madeira certificada, por sua

vez, adiciona em seu processo de produção, além dos requisitos legais, exigências

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socioambientais, estipuladas por certificadoras credenciadas pelo Conselho de

Manejo Florestal. As madeiras certificadas, mais caras que as demais, podem ser

oriundas de florestas nativas e de reflorestamentos com espécies exóticas.

Na Região Sul do país, vê-se uma parceria entre prefeituras dos três estados

com produtores familiares, formando um modo alternativo de subsistência para o

pequeno produtor, além de uma alimentação mais saudável para as crianças nas

escolas. Essas merendas, a propósito, são compradas e subsidiadas pelos

governos, que adquirem boa parte da produção agrícola local.

Ainda no sul, vemos o Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor, organização

associada à Igreja Luterana Brasileira, que treina os pequenos agricultores

familiares com o manuseio do cultivo agrícola orgânico, o que possibilita que mais

de 8 mil estudantes de Criciúma, Florianópolis e Palmeira ingiram alimentos

produzidos por outras 230 famílias ao longo da região, números relativamente bem

expressivos.

Em Minas Gerais, mesmo se desconsiderarmos o ICLEI, as licitações

sustentáveis também vêm ganhando cada vez mais espaço. Com o intuito de

atualizar sua gestão de compras e contratações e se tornar um exemplo a ser

seguido por outras Administrações, o estado tem trabalhado para ampliar os

negócios públicos inteligentes, tendo como pré-requisito o amparo aos Direitos

Humanos, à saúde e ao meio ambiente, através da racionalização dos recursos

disponíveis.

A secretária de Estado do Planejamento e Gestão — SEPLAG, Renata

Vilhena, disse à Revista Negócios Públicos, que o Governo de Minas Gerais tem

empreendido inúmeras ações em suas aquisições de bens e serviços e execução de

obras, primando por melhores práticas em consonância com os princípios e

diretrizes disseminados pelo desenvolvimento sustentável.

Uma das iniciativas adotadas pela administração estadual é o Projeto Gestão

Estratégia de Suprimentos — GES,

instituído em 2006 e ainda em fase de implantação. Segundo documento elaborado pela secretária Renata Vilhena, em parceria com a diretora da Superintendência de Recursos Logísticos e Patrimônio da SEPLAG, Ana Cristina Albuquerque, o GES tem como objetivos o desenvolvimento e a implantação de metodologias e práticas de gestão de suprimentos, com base nas melhores ações que visam a redução de custos e gastos com materiais, serviços e obras; a definição de modelos de gestão de suprimentos; o aprimoramento dos mecanismos de relacionamento com os diversos

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segmentos do mercado fornecedor; a capacitação dos servidores estaduais para atuarem como agentes multiplicadores do modelo; e, finalmente, a revisão de sua cadeia logística e de gestão dos bens. Para a implantação das práticas de consumo e produção sustentáveis adotadas no estado, foram estabelecidos cinco grandes grupos de despesas: as “famílias de compras” de materiais de escritório, de equipamentos de informática, de obras de pavimentação (Projeto Pro-MG), e refeições (fornecidas em penitenciárias, escolas, hospitais etc) e de medicamentos.37

Nas compras de objetos pertencentes a alguma das cinco famílias citadas

acima, consideram-se como quesitos aqueles relacionados à diminuição dos

impactos que esses serviços e produtos causam ao ecossistema e as relações que

essa licitação terá com a erradicação da pobreza, a igualdade de oportunidades, as

condições laborais, a manutenção dos Direitos Humanos, o preço e o comércio

justos, etc.

O estudo que os critérios de aquisições sustentáveis permitem que se faça

acerca dos serviços e dos bens ajuda a especificação do perfil de cada grupo de

produtos. No grupo de materiais relacionados à informática e escritório, por exemplo,

a Revista Negócios Públicos diz, em sua matéria, que esses aspectos foram

avaliados em aquisições de processadores e telas. Além disso, 25% da demanda

devem ter como procedência o papel reciclado. Já em outros grupos, podemos

mencionar:

a) a tentativa de racionalização do uso da água;

b) a conscientização quanto ao respeito pelo meio ambiente e pelas usinas de

asfalto;

c) a minimização da poluição sonora;

d) o melhor aproveitamento dos alimentos, diminuindo o quantitativo de

resíduos;

e) a implementação de ações que tornem os gastos energéticos mais

eficientes;

f) a implementação de programa de coleta seletiva de resíduos sólidos, com

uso de materiais recicláveis e produtos biodegradáveis;

g) o emprego de produtos e materiais alternativos na área de pavimentação.

37 Texto retirado da Revista Negócios Públicos, de maio de 2012, na matéria “LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS: Modernidade em Compras Públicas”.

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Renata Vilhena afirma, em seu relatório: “Observamos que a prática de valores

éticos e socioambientais que envolvem a licitação se estende na gestão contratual, e

reflete a responsabilidade da administração no desempenho do papel de

consumidor. Assim, devem ser entendidas, por exemplo, a exigência de declarações

de que o licitante se encontra regular perante o Ministério do Trabalho; a vedação à

contratação de fornecedores imposta em razão da prática de atos de preconceito de

raça de cor, de sexo ou de estado civil etc; assim como exigências relativas ao

atendimento às normas de saúde e segurança do trabalho”.38

As experiências, portanto, passam por todas as regiões brasileiras, mas ainda

têm pouco contato entre si, parecendo tratar-se de casos isolados, remetendo-nos à

impressão de que são fatos pontuais. É claro que essas pontualidades, se unidas,

formarão um todo, mas, para isso, devem-se entender as reais necessidades da

licitação sustentável.

Vimos que São Paulo e Minas Gerais são estados à frente dos demais no

Brasil, devendo ser exemplos nacionais. O que, portanto, se tentou nesse capítulo

foi citar casos de sucesso referentes a licitações sustentáveis, no mundo e,

principalmente, no Brasil, mostrando que é possível legislar e atuar, pensar e agir:

teoria e prática como fatores indissociáveis.

38 Entrevista retirada da Revista Negócios Públicos, de maio de 2012, na matéria “LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS: Modernidade em Compras Públicas”

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CONCLUSÃO

O presente trabalho visou à problematização da questão das licitações

sustentáveis, expondo-as como essenciais para toda e qualquer compra ou

contratação de serviço por parte da Administração Pública.

O que se conclui, após leitura das páginas antecedentes, é que é, sim,

possível comprar produtos para a Administração Pública sem deixar de lado a

preocupação com os impactos ambientais. Os críticos sempre se posicionaram

contrariamente a tal tipo de licitação alegando a desnecessidade de se enfatizar o

tema da sustentabilidade, uma vez que há outras prioridades, como o preço. Este,

segundo tais teóricos, deve ser sempre o ponto nevrálgico no tocante às compras

por parte da Administração Pública, uma vez que os cofres públicos não podem ser

explorados demasiadamente em nome da ecoeficiência ou de temas análogos.

O que essas pessoas não perceberam, entretanto, é a economia realizada

com a compra de ecoprodutos. Elas vêem o preço inicial e concluem,

precipitadamente, que o ônus para as verbas públicas será maior. Os exemplos

citados ao longo desse trabalho, porém, em especial o caso de Zurique, mostram

que, em longo prazo, há uma considerável economia por parte do Poder Público

quando este opta pelos ecoprodutos. Estes são mais eficientes e, normalmente,

rendem muito mais. A posterior economia é indiscutível, ainda que, em um primeiro

momento, se gaste mais com esse tipo de compra que com as licitações tradicionais.

Ainda assim, o preço imediato de um produto sustentável, desconsiderando-

se a economia futura, é, de fato, caro. Esse é um problema que só se resolve com o

aumento da demanda. Para tal fato ocorrer, porém, precisa-se de alguém para dar o

primeiro passo, o estímulo inicial. Cabe à Administração Pública esse papel de

vanguarda, pois sendo detentora de grandes recursos deve representar um agente

de transformação do paradigma atual de desenvolvimento.

Acontece que, apesar dos estímulos de diversas organizações quanto à

adoção de licitações sustentáveis, nossa legislação ainda é muito pouco

contundente quanto ao tema. Na lei 8.666/93, que é específica para licitações, há

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apenas uma rápida passagem que toca no assunto, sem prever nenhuma ação mais

incisiva.

Entretanto, vê-se que diversas medidas já vêm sendo tomadas no Brasil –

embora haja muito mais em outros países – que norteiam os rumos das licitações

públicas para o caminho da sustentabilidade, como a parceria de alguns estados

com o ICLEI, o Comitê de Qualidade de Gestão Pública adotado por São Paulo, as

parcerias entre diversas prefeituras no sul do país, a adoção do Centro de Apoio ao

Pequeno Agricultor (também na Região Sul), os esforços realizados pelo governo de

Minas Gerais através da Secretaria de Estado do Planejamento e Gestão —

SEPLAG – do estado, etc.

Percebe-se, assim, que é possível mudar essa mentalidade e fazer

compreender que os impactos ambientais têm sido cada vez mais preocupantes e

ninguém melhor do que a Administração Pública para iniciar uma série de combates

a esses danos. Para tanto, porém, é preciso que se avance mais nas estratégias

adotadas para tornar as licitações sustentáveis. Nesse sentido, foram apresentadas,

neste trabalho, algumas propostas, muitas, inclusive, já adotadas pela Administração

Pública, como a rotulagem de ecoprodutos, os pregões eletrônicos, etc.

Viu-se que há muitas medidas ainda não adotadas pela Administração

Pública brasileira, como a inserção de novos critérios ambientais, a priorização da

ecoeficiência e os novos processos que possibilitariam mais facilmente as licitações

sustentáveis, estes últimos expostos no título 2.4.

Por fim, permanece o elogio ao ICLEI, órgão que mereceu espaço no capítulo

3 e que adota medidas de efetivo combate aos agravos ambientais, dentre elas a

prática das licitações púbicas. O ICLEI, como visto, atua em inúmeros países, sem

ignorar o Brasil.

Fica, então, após todas essas páginas e linhas, o simples desejo de

mudança. As licitações tradicionais não podem mais ter espaço em um mundo que

cada vez mais cobra de seus governantes medidas efetivas contra os impactos ao

meio ambiente. O Brasil, por sua vez, que gradativamente desponta no cenário

internacional, deve mostrar-se focado nessas mudanças pelas quais o mundo

clama.

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Na segunda década desse novo milênio, mais do que nunca as atenções

estarão voltadas para a maior porção de terra da América do Sul, em especial

devido aos grandes eventos esportivos que estão ocorrendo em nosso país.

A Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, por exemplo,

abriram e continuarão abrindo as cortinas brasileiras para o mundo. O que eles

verão, pela janela, é nossa escolha.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 00 AGRADECIMENTOS 02 DEDICATÓRIA 03 RESUMO 04 METODOLOGIA 05 SUMÁRIO 06 INTRODUÇÃO

CAPÍTULO 1

Referencial Teórico 09

1.1 As licitações e a Lei 8.666/93 09

1.2 As licitações sustentáveis 12

1.3 Os benefícios das licitações sustentáveis 17

1.4 Métodos das licitações sustentáveis 20

CAPÍTULO 2

Alguns Métodos usados nas Licitações Sustentáveis 23

2.1 Instrumentos já adotados pela Administração Pública 23

2.1.1 Rotulagem 23

2.1.2 Pregões 24

2.2 Outras iniciativas da Administração Pública 24

2.3 Estratégias ainda não adotadas 25

2.3.1 Inserção de novos critérios ambientais 25

2.3.2 Ecoeficiência 26

2.4 Nova licitação, novos processos 28

2.5 Fechamento 31

CAPÍTULO 3

Casos de Sucesso 32

3.1 ICLEI 32

3.2 ICLEI no Brasil 35

3.3 Demais casos de sucesso no Brasil 39

CONCLUSÃO 46

BIBLIOGRAFIA 49

ÍNDICE 51