21
CURSO CURSO : : Medicina Dentária DISCIPLINA DISCIPLINA: Medicina dentária preventiva INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE-SUL PACIENTES DE ALTO RISCO EM MEDICINA DENTÁRIA Realizado por Realizado por: Hugo Mesuras Nº 1196109 Paula Martins Nº 1196105 Rui Gago Nº 1191045

Doentes de risco no consultório dentário

  • Upload
    hugomd

  • View
    2.993

  • Download
    0

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Este trabalho para a disciplina de Medicina Dentária Preventiva (MDP) do curso de Medicina Dentária apresenta noções básicas sobre algumas patologias sistémicas que poderão ter repercussões na saúde oral ou que irão ter implicações nos procedimentos clínicos e terapêuticos por parte do médico dentista/médico estomatologista/odontologista durante as consultas dentárias.

Citation preview

Page 1: Doentes de risco no consultório dentário

CURSOCURSO: : Medicina DentáriaDISCIPLINADISCIPLINA:: Medicina dentária preventiva

INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE-SUL

PACIENTES DE ALTO RISCO EM MEDICINA DENTÁRIA

Realizado porRealizado por:: Hugo Mesuras Nº 1196109Paula Martins Nº 1196105 Rui Gago Nº 1191045

Janeiro/2002

Page 2: Doentes de risco no consultório dentário

INTRODUÇÃO

É cada vez mais frequente encontrar nos consultórios doentes com patologias sistémicas tratadas que podem obrigar o dentista a ter cuidados especiais, por isso é importante este ter umas noções de medicina interna.

Em caso de haver dúvidas no lidar com estes doentes o melhor é comunicar com o seus médicos assistentes. As correspondências com os médicos assistentes devem ser feitas por carta.

A história clínica é importante para fazer o despiste de todas as situações patológicas que o doente possa ter, e prevenir complicações que possam aparecer nos tratamentos de medicina dentária.

Podemos considerar como doentes de risco mais frequentes no consultório dentário os seguintes: doentes cardíacos, nomeadamente os que sofrem de insuficiência cardíaca, e aqueles com determinadas cardiopatias que requerem profilaxia da endocardite bacteriana; doentes com insuficiência respiratória; insuficientes renais crónicos; diabéticos; doentes com hipertiroidismo; doentes sob corticoterapia; grávidas. Para não tornar o nosso trabalho demasiado extenso, decidimos abordar os seguintes casos clínicos: Insuficientes renais crónicos a efectuar hemodiálise, diabetes mellitus, e profilaxia da endocardite infecciosa.

Os pacientes com insuficiência renal crónica apresentam um risco acrescido de infecção. Nestes pacientes, observa-se um estado de deficiência imunitária devido a uma alteração da imunidade celular e à utilização de dietas baixas em proteínas ( de que resulta uma diminuição da capacidade de produzir anticorpos). As situações patológicas na cavidade oral (doença periodontal, úlceras, patologias pulpares) e as manipulações dentárias dão origem a bacteriémias, situação que pode levar a um aumento da morbilidade em pacientes com insuficiência renal e também aos submetidos a hemodiálise. É assim essencial eliminar as fontes orais de infecção. A manutenção de uma higiene oral apropriada e a utilização regular de soluções para bochechar com actividade antifúngica e antibacteriana são medidas eficazes para reduzir o risco de infecção nestes pacientes.

A Endocardite raramente ocorre em pessoas com um coração saudável. Contudo doentes que possuem determinadas condições cardíacas são vulneráveis, e nestes a manipulação de focos sépticos, por exemplo durante um procedimento estomatológico, pode ser um factor desencadeante da endocardite por meio de uma bacteriémia (presença de bactérias na corrente sanguínea).

INSUFICIÊNCIA RENAL CRÓNICA

Etiologia e fisiologia da insuficiência renal crónica

Doença caracterizada por uma destruição progressiva dos nefrónios,a unidade funcional renal. Os nefrónios destruídos não se regeneram mas o rim tenta compensar a sua destruição através de uma hipertrofia dos que ainda estão

Page 3: Doentes de risco no consultório dentário

funcionais. Quando os mecanismos de compensação renal são ultrapassados começam a observar-se os sinais e sintomas de insuficiência renal. A insuficiência renal crónica é um processo gradual e progressivo e, como tal, pode ser descrita por sucessivos estádios clínicos e laboratoriais e que a seguir se indicam.

- Reserva renal diminuída . Representa uma diminuição da função renal sem sintomas ou manifestações clínicas em que se observa uma diminuição da depuração da creatinina. Os níveis de creatinina na urina resultam da que é filtrada pelos glomérulos e este exame laboratorial avalia a função renal comparando a quantidade de creatinina no sangue com a quantidade excretada na urina, num período de 24 horas. Este ensaio informa sobre a taxa de filtração glomerular, que diminui à medida que a população de nefrónios decresce. Como consequência, observa-se também um aumento das concentrações plasmáticas de ureia.

- Insuficiência renal . Observa-se uma diminuição ligeira a moderada da função renal. Há evidência de incapacidade de manter o meio interno, observando-se a acumulação de produtos azotados no sangue, diminuição da capacidade de concentrar a urina e anemia ligeira.

- Falência renal. Há evidente deterioração da função renal com anormalidades crónicas no meio interno, nomeadamente, acumulação de produtos azotados no sangue, acidose metabólica, hipocalcemia e hiperfosfatemia.

- Síndrome urémico. Representa uma situação caracterizada por um conjunto de sinais e sintomas clínicos que se observam no paciente com insuficiência renal. Resulta principalmente da retenção e acumulação de produtos de excreção e da diminuição das funções endócrinas e metabólicas do rim. As manifestações sistémicas incluem perturbações gastrintestinais (náuseas, vómitos, anorexia, hálito e sabor a amónia, estomatites, esofagites, gastrites, hemorragia gastrintestinal ), neuromusculares (cefaleias, neuropatia periférica), hematológicas e imunitárias (anemia, deficiência na coagulação, aumento da susceptibilidade à infecção, diminuição da produção de eritropoietina, linfocitopenia), endócrinas e metabólicas (osteodistrofia renal, hiperparatiroidismo secundário, perturbação no crescimento/desenvolvimento), cardiovasculares (hipertensão arterial, falência cardíaca congestiva, cardiomiopatia, pericardites, arritmias) e dermatológicas(palidez, pigmentação, equimose, pruridos). Muitos dos sintomas clínicos da insuficiência renal e uremia têm repercussões na prática dentária, particularmente, as alterações hematológicas, do metabolismo ósseo e do estado imunitário. Muitas das alterações graduais e progressivas que se observam na insuficiência renal crónica são corrigidas por tratamentos que podem variar desde a dieta ,rica em carbohidratos e baixas em proteínas para minimizar a acumulação de produtos azotados tóxicos resultantes do metabolismo das proteínas, até substituição renal, e são frequentemente tratados com bicarbonato de sódio para reduzir a acidose e suplementos de Vitamina D para tratar a hipocalcémia. Num estado avançado de insuficiência há necessidade de recorrer à diálise (diálise peritoneal e hemodiálise) que constitui um meio artificial de remover produtos azotados e outros produtos tóxicos resultantes do metabolismo.

Page 4: Doentes de risco no consultório dentário

Manifestações orais

Há várias manifestações orais associadas com a insuficiência renal crónica e uremia que se podem observar numa percentagem elevada dos pacientes (que pode atingir 90%). Os pacientes queixam-se de hálito desagradável e sabor metálico (devido à presença de elevadas concentrações de ureia na saliva e a sua subsequente degradação a amónia) e também de boca seca (efeito que resulta da combinação de um envolvimento glandular directo, inflamação química, desidratação e respiração pela boca). A palidez da mucosa é talvez a observação oral mais comum nos pacientes com insuficiência renal que efectuam hemodiálise (devido à anemia). A estomatite urémica é frequentemente observada nos pacientes em fase avançada da doença. Parece ser uma queimadura de tipo químico ou uma perda da resistência da mucosa a influências normais e /ou traumáticas. Normalmente são lesões dolorosas e mais frequentes nas mucosas ventral e anterior da língua, mas cicatrizam espontaneamente com a resolução da uremia subjacente. Ocasionalmente, observam-se manchas brancas na cavidade oral que constituem uma acumulação de cristais de ureia. Seria de esperar uma maior incidência de cárie dentária nestes pacientes pelo facto de requererem uma dieta rica em carbohidratos e baixa em proteínas. Contudo, o índice de cárie é, frequentemente, mais baixo que na população geral. Este facto é atribuído à inibição da placa bacteriana que se observa em consequência dos elevados níveis de ureia na saliva. Também, alguns pacientes apresentam erosão da dentição devido a regurgitação, resultante da naúsea associada com tratamentos de hemodiálise. Podem também observar-se manifestações orais relacionadas com a osteodistrofia, presente em pacientes com insuficiência renal crónica em estado avançado. A osteodistrofia metabólica renal resulta de alterações no metabolismo do cálcio, fósforo e vitamina D e aumento da actividade da paratireóide. A absorção intestinal de cálcio está diminuída devido à incapacidade ou deficiência na conversão renal da vitamina D à sua forma activa (1,25-diidroxivitamina D3), resultando um decréscimo dos níveis plasmáticos de cálcio. Em resposta, observa-se uma hiperactividade das glândulas da paratiróide de que resulta um aumento na excreção urinária de fosfatos, diminuição da excreção urinária de cálcio e aumento da libertação de cálcio dos ossos (e consequente perda óssea). As manifestações da osteodistrofia e hiperparatiroidismo secundário na mandíbula e maxila incluem desmineralização, diminuição da trabeculação, aparência vítrica e perda da lâmina dura. Devido a esta perda óssea é comum a ocorrência de fracturas dos maxilares em situações de trauma, havendo também o risco de fractura durante procedimentos cirúrgicos orais. Ainda relacionados com a osteodistrofia, podem observar-se mobilidade dentária, má oclusão, hipoplasia do esmalte e calcificação da polpa. Com o aumento da disponibilidade e uso de tratamentos de hemodiálise muitas das manifestações orais da insuficiência renal e uremia são vistas com menor frequência.

Consequências na prática clínica dentária: Estes pacientes que estão a efectuar hemodiálise requerem atenção especial, principalmente em relação a três aspectos: risco de hemorragia, maior susceptibilidade à infecção e uso de fármacos.

Page 5: Doentes de risco no consultório dentário

O risco hemorrágico é atribuído a uma combinação de factores que incluem a utilização de anticoagulantes durante a hemodiálise e manutenção do acesso vascular e, também, o trauma mecânico a que as plaquetas estão submetidas durante a diálise; frequentemente, estes pacientes apresentam redução na contagem de plaquetas, diminuição da adesão plaquetar, aumento da actividade da prostaciclina e aumento da fragilidade capilar, factores que no conjunto podem levar a um risco hemorrágico acrescido. A tendência hemorrágica pode ser exacerbada pela anemia ( os níveis baixos de hematócrito influenciam negativamente o componente reológico das interacções plaquetas/paredes dos vasos sanguíneos). A contagem das células sanguíneas serve como um indicador para o médico dentista no manuseio do risco hemorrágico nestes pacientes. Devido à presença de anemia, a utilização de fármacos que causam depressão respiratória (como os analgésicos opiáceos) deve ser efectuada com precaução.

A endocardite infecciosa é uma complicação que surge em pacientes submetidos regularmente a hemodiálise; ocorre em cerca de 2,7% destes pacientes e a percentagem aumenta para 9% nos que têm um processo infeccioso no local de acesso vascular. A mortalidade associada com a endocardite infecciosa é muito elevada (cerca de 45%) e o Streptococcus viridians é responsável por 17% dos casos observados em pacientes com insuficiência renal crónica. Normalmente, esta infecção afecta mais frequentemente válvulas cardíacas anormais; contudo, há uma elevada percentagem de endocardite infecciosa em pacientes submetidos a diálise sem evidência de perturbação valvular cardíaca. A American Heart Association estabelece um protocolo para a prevenção da endocardite infecciosa, modificado de acordo com a gravidade da insuficiência renal. O uso de fármacos nestes doentes a efectuar hemodiálise requer uma atenção especial. A diminuição da função renal pode modificar certos aspectos de farmacocinética de alguns fármacos ( biodisponibilidade, volume de distribuição, metabolismo, eliminação) e o tempo de semi-vida dos fármacos eliminados na urina está frequentemente prolongado .No entanto, os níveis sanguíneos e tecidulares de fármacos que são removidos pela diálise podem baixar durante a diálise. Mesmo para os fármacos metabolizados no fígado, a incapacidade do rim em excretar os metabolitos pode resultar num aumento da incidência de efeitos tóxicos. Normalmente, há necessidade de correcções apropriadas do esquema terapêutico (intervalo entre as administrações; dose administrada) para assegurar niveis sanguíneos eficazes e evitar a excessiva acumulação de fármacos.

Previamente ao tratamento.

- Contactar o nefrologista do paciente relativamente a valores recentes dos níveis de coagulação e discutir a necessidade de utilização de profilaxia antibiótica.

- Avaliar o paciente para hipertensão e/ou hipotensão.- Evitar usar o braço como acesso vascular para a administração de fármacos

e/ou medição da pressão arterial.- Conhecer a causa subjacente da insuficiência renal. - Ter acesso a uma contagem das células sanguíneas para avaliar eventual

situação de anemia; determinar o tempo de hemorragia.

Page 6: Doentes de risco no consultório dentário

- Se indicado, administrar fármacos hemostáticos.- Avaliar a presença de sintomas de uremia ( fadiga, náuseas, vómitos,

letargia, prurido).- Obter radiografias dentárias para avaliar manifestações de osteodistrofia.- Conhecer o tipo de acesso vascular.- Conhecer o ciclo de diálise; o tratamento dentário deve ser efectuado no dia

seguinte à diálise.- Ter informação de rotina relativamente a testes de pesquisa de hepatite B;

no caso de lesão hepática ter ainda informação relativamente a testes de função hepática e tempo de protrombina.

- Considerar a profilaxia antibiótica.- Considerar a pré-medicacão ansiolítica e sedativa em pacientes hipertensos.

Durante o tratamento:

- Efectuar um exame intraoral completo para avaliar a presença de manifestações orais.

- Eliminar eficazmente todas as fontes intraorais de infecção.- Utilizar medidas hemostáticas apropriadas em cirurgias orais e periodontais.- Colocar o paciente numa posição confortável.- Permitir que o paciente caminhe ou se levante, ocasionalmente, durante os

procedimentos dentários longos.

Após o tratamento:

- Utilizar medidas hemostáticas apropriadas ( medidas locais; fármacos )- Encorajar o paciente a efectuar uma higiene oral eficiente.- Instituir terapêutica para a xerostomia, se indicado.- Usar terapêutica antibacteriana pós-cirúrgica em procedimentos traumáticos.- Evitar o uso de fármacos com efeito depressor respiratório em pacientes com

anemia grave.- Ajustar a dosagem dos fármacos de acordo com o grau de insuficiência

renal.

DIABETES MELLITUS

CONCEITO- Insuficiência total ou parcial da concentração de insulina.

CLASSIFICAÇÃO- Tipo I – insulino dependente (diabetes infanto juvenil )- Tipo II – não insulino dependente

Page 7: Doentes de risco no consultório dentário

SINTOMAS

- Polidipsia (sede excessiva)- Poliúria (secreção excessiva de urina)- Nictúria ( maior quantidade de urina à noite )- Polifagia ( fome excessiva )- Alterações visuais ( visão embaciada )- Dores dos membros inferiores- Astenia (debilidade )- Perda de peso

Relação directa com a cavidade oral- Hipo salivação- Alteração do paladar- Sensação de ardor

SINAIS

- Aumento das parótidas ( principal sinal )- Candidíase- Lesões de tipo eritematoso e proliferativo ( estomatite prótetica ) associado

ao uso de próteses.

VALORES DA GLICÉMIA

- normal : 115mg/dl- alterada: entre 116 e 139 mg/dl- diabetes: 140mg/dl

COMPLICAÇÕES

- Instabilidade cardiovascular, desidratação, alterações do estado mental, coma, morte.

- Aumento do risco de infecções cutâneas, bucal e do trato urinário.- Alterações renais, visuais e cutâneas.- Doenças vasculares- Dificuldade de cicatrização.

Page 8: Doentes de risco no consultório dentário

AVALIAÇÃO ( em doentes com suspeita de diabetes )

- Sempre que o paciente apresente sinais e sintomas ou que apresente antecedentes a nível familiar ( deve ser feito exame de glicémia )

PACIENTES DIABÉTICOS

- Pesquisar sobre o início da doença, tipo de controle ou tratamento, se existem complicações provocadas pela doença.

RISCOS

- Pequeno Risco – glicémia inferior a 200mg/dl – normalmente não provoca complicações, bom controle metabólico, ausência de cetoacidose ou hipoglicemia.

- Médio Risco – glicémia 250mg/dl – pequenas complicações, razoável controle metabólico, não apresentando com frequência crises de hipoglicemia e cetoacidose.

- Grande Risco – glicémia 250mg/dl – várias complicações, controle metabólico deficiente, hipoglicemia e cetoacidose frequentes.

CUIDADOS ESPECIAIS

- Consultas curtas de preferencia de manhã, se necessário administrar tranquilizantes ou sedação complementar, continuar com a dieta normal antes do tratamento.

- Se a consulta demorar, interromper para uma refeição ligeira.

- Se após o tratamento houver dificuldades de alimentação sólida, aconselhar alimentos de consistência pastosa e líquidos.

- Reduzir ao mínimo a possibilidade de infecção.

Page 9: Doentes de risco no consultório dentário

- Usar profilaxia com antibióticos em pós-operatório cirúrgicos.

- Dar uma atenção especial no caso das doenças periodontais.

- Não usar vasoconstritores adrenérgicos.

- Consultar o Médico Assistente para saber se é preciso adequar a dose de insulina para o tratamento dentário.

CONDUTA

- Pacientes de baixo risco – O tratamento pode ser realizado, tomadas as precauções devidas, isto nos procedimentos clínicos não cirúrgicos. Nos procedimentos cirúrgicos deve ser acrescido de sedação auxiliar e adequação da dose de insulina pelo Médico.

- Pacientes de risco moderado – O procedimento clínico não cirúrgico com possível uso de sedação auxiliar. Procedimentos cirúrgicos menores com ajuste da dose de insulina pelo Médico. Cirurgias maiores além do ajuste da insulina há possibilidade de se recorrer à internação.

- Pacientes de grande risco – Adiar o tratamento até as condições metabólicas se equilibrarem, controle eficaz sobre as infecções bucais.

ENDOCARDITE INFECCIOSA

A endocardite infecciosa (E.I) é uma doença cardíaca grave que envolve a superfície interna do coração (endocárdio). Apresenta risco de vida, sendo causada por um agente microbiológico que vai provocar a vegetação de válvulas cardíacas ou endocárdio mural e que na maioria dos casos são bactérias; no entanto pode ser motivada por outros agentes etiológicos, daí ser mais correcta a denominação endocardite infecciosa do que endocardite bacteriana.

As manifestações clínicas da doença são: abatimento do quadro geral do doente, artrite, anemia, calafrios nocturnos, confusão mental, embolia, esplenomegália, febre, falta de apetite, perda de peso, petéquias, insuficiência cardíaca, sopro.

A endocardite pode ser diagnosticada pelo exame clínico com o auxílio de exames complementares: ecocardiograma, hemocultura, electrocardiograma, exame cardiológico e cateterismo.

A E.I. ocorre geralmente quando o endocárdio está susceptível a infecções, ou seja, quando existem anomalias na superfície que permitem que agentes patogénicos adiram e se multipliquem no endocárdio. Estudos experimentais sugerem que a lesão do endotélio conduz à deposição de plaquetas e fibrina e consequentemente uma lesão trombótica não bacteriana do endocárdio. Quando ocorre uma bacteriémia os organismos aderem a estas lesões e multiplicam-se

Page 10: Doentes de risco no consultório dentário

no interior do complexo plaquetas-fibrina, levando a uma vegetação infecciosa. As anomalias congénitas e valvulares especialmente as que resultam em correntes pulsáteis de alta velocidade podem danificar o revestimento endotelial e predispor à agregação de plaquetas e deposição de fibrina nesses locais, que apresentam assim um risco elevado de colonização bacteriana.

Os agentes etiológicos significativos para o desenvolvimento de E.I. são: Streptococcus -hemolíticos (grupo viridans), Staphylococcus aureus, Chlamídias e Fungos, sendo os primeiros quase exclusivamente responsáveis pela E.I. que é resultante da introdução de agentes de origem oral. O regime profilático contra a E.I. prévio aos procedimentos dentários visa a eliminação efectiva destes microorganismos.

Os objectivos da profilaxia antibiótica são reduzir a intensidade da bacteriémia, ajudando o sistema retículo endotelial a eliminar os microorganismos da corrente sanguínea, assim como reduzir a adesão bacteriana a válvulas cardíacas lesadas e a vegetações (trombo de fibrina-plaquetas). A extensão da bacteriémia é proporcional ao grau do trauma, à concentração de microorganismos no local e ao grau de inflamação gengival.

Desde 1955 que a American Heart Association (A.H.A.) tem apresentado recomendações e protocolos respeitantes à profilaxia da E.I., sendo por estas que se guia a American Dental Association neste domínio. Devemos ter em mente que é da responsabilidade do médico dentista o conhecimento destas recomendações e este deve estar sempre informado em relação às mudanças periódicas no protocolo que são desenvolvidas a partir do progresso no conhecimento das causas e fisiopatologia da endocardite bacteriana.

Actualmente o regime profilático encontra-se bastante mais simplificado. A última actualização data de 1997 e dentre as principais alterações constam as seguintes: a) ênfase dada a que muitos casos de endocardite não são atribuíveis a um procedimento invasivo; b) as condições cardíacas são estratificadas em categorias de risco alto, moderado ou desprezível, baseadas no efeito potencial em caso de desenvolvimento de endocardite; c) os procedimentos que podem causar bacteriémia e para os quais a profilaxia é recomendada são mais claramente especificados; d) um algoritmo foi criado para definir mais claramente em que situações é indicada a profilaxia para pacientes com prolapso da válvula mitral; e) para procedimentos orais/dentários a dose inicial de amoxicilina é reduzida para 2 g., a dose de seguimento do antibiótico já não é mais recomendada, a eritromicina já não é recomendada para os indivíduos alérgicos à penicilina mas a clindamicina e outras alternativas são propostas; f) para procedimentos GI/GU, os regimes profiláticos foram simplificados. Estas alterações foram instituídas para definir mais claramente quando é ou não recomendada a profilaxia, melhorar a aceitação do médico e do paciente, reduzir o custo e potenciais efeitos laterais GI, e aproximar-se de recomendações mais uniformes a nível mundial.

Page 11: Doentes de risco no consultório dentário

É essencial sabermos que tipo de condição cardíaca apresenta o doente para sabermos classificá-lo como sendo de alto risco, risco moderado ou risco desprezível, definindo mais claramente quando a profilaxia está ou não recomendada.

Quadro 1: Condições cardíacas para as quais a profilaxia é ou não recomendada

Profilaxia da endocardite recomendada :

Categoria de alto risco

Válvulas cardíacas protéticas, incluindo válvulas bioprotéticas e homotransplantadas

História prévia de endocardite infecciosa Doença cardíaca congénita cianótica ( e.g. estados de ventrículo único,

transposição de grandes artérias, tetralogia de Fallot ) Shunts ou canal pulmonar sistémico reconstruído cirurgicamente

Categoria de risco moderado

Outras malformações cardíacas congénitas como: defeito do septo ventricular, defeito primum do septo auricular, coartação da aorta, válvula aórtica bicúspide.

Disfunções valvulares adquiridas como doença cardíaca reumática ou doença do colagéneo vascular

Cardiomiopatia hipertrófica Prolapso da válvula mitral com regurgitação valvular e/ou espessamento

dos folhetos

Profilaxia da endocardite não recomendada :

Categoria de risco desprezível (risco não maior do que na população em geral)

Defeito secundum isolado do septo auricular Defeitos do septo auricular, do septo ventricular ou ducto arterioso

manifesto corrigidos cirurgicamente (sem resíduos há mais de 6 meses) Cirurgia prévia de enxerto de by-pass da artéria coronária Prolapso da válvula mitral sem regurgitação valvular Sopros fisiológicos, funcionais ou inocentes Doença de Kawasaki prévia sem disfunção valvular Febre reumática prévia sem disfunção valvular Pace-makers cardíacos (intravenosos e epicardiais) e desfibrilhadores

implantados

Page 12: Doentes de risco no consultório dentário

A profilaxia antibiótica deverá ser feita quando o procedimento dentário possa envolver sangramento da mucosa, em doentes cuja condição cardíaca é de risco alto ou moderado.Ocasionalmente, hemorragia inesperada pode ocorrer durante o tratamento dentário num paciente susceptível. Nesta situação deverá ser administrada profilaxia antibiótica logo que possível, principalmente nas 2 horas seguintes. Profilaxia dada após 4 horas de bacteriémia não terá benefício.

Quadro 2: Procedimentos dentários para os quais a profilaxia é ou não recomendada

Profilaxia da endocardite recomendada :

Extracções dentárias Procedimentos periodontais incluindo cirurgia, destartarização e alisamento

radicular, sondagem, reavaliação, manutenção Colocação de implantes dentários e reimplantação de dentes avulsionados. Cirurgia ou instrumentação endodôntica (canal radicular) apenas para além

do ápex Colocação subgengival de fibras/fitas antibióticas Colocação inicial de bandas ortodônticas mas não brackets Injecções de anestesia local intraligamentar Limpeza profilática dos dentes ou implantes onde o sangramento é

previsível

Profilaxia da endocardite não recomendada :

Dentisteria restauradora*(operatória e protética) com/sem fio de retracção# Injecções de anestesia local (não intraligamentar) Tratamento endodôntico intracanalar; colocação e preparação de pinos Colocação de diques de borracha Remoção pós-operatória de suturas Colocação de aparelhos protéticos/ortodônticos removíveis Tomada de impressões orais Aplicação de flúor Tomada de radiografias orais Ajuste de aparelhos ortodônticos Exfoliação de dentes decíduos

* Isto inclui a restauração de dentes careados (obturação de cavidades) e a substituição de dentes ausentes

# O juízo clínico pode indicar o uso de antibióticos em circunstâncias específicas que podem criar sangramento significativo

Page 13: Doentes de risco no consultório dentário

Quadro 3: Regimes profiláticos para procedimentos dentários, orais, esofágicos ou do tracto respiratório (não recomendada dose de seguimento)

Situação Agente Regime*

Profilaxia geral padrão: AmoxicilinaAdultos: 2 g ; Crianças: 50mg/Kg IO 1h antes do

procedimento

Incapaz para medicação oral Ampicilina

Adultos: 2 g IM ou IV ; Crianças: 50 mg/Kg IM ou IV

nos 30 min. anteriores ao procedimento

Alérgico à penicilina

ClindamicinaAdultos: 600 mg ; Crianças:

20 mg/Kg IO 1h antes do procedimento

Cefalexina* ou Cefadroxil*Adultos: 2 g ; Crianças: 50mg/Kg IO 1h antes do

procedimento

Azitromicina ou ClaritromicinaAdultos: 500 mg ; Crianças:

15 mg/Kg IO 1h antes do procedimento

Alérgico à penicilina e incapaz para medicação oral

ClindamicinaAdultos: 600 mg ; Crianças:

20 mg/Kg IV nos 30 min. anteriores ao procedimento

Cefazoline#Adultos: 1g ; Crianças: 25 mg/Kg IM ou IV nos 30 min. anteriores ao procedimento

* A dose total para as crianças não deverá exceder a dose dos adultos

# As cefalosporinas não devem ser utilizadas em indivíduos com reacção de hipersensibilidade do tipo imediato (urticária, angioedema, ou anafilaxia) às penicilinas.

Pacientes de risco devem fazer bochechos com 15 ml de solução de clorohexidina a 0,2% durante cerca de 30 seg. ou aplicação de clorohexidina em gel(1%) na margem gengival seca, 5 minutos antes dos procedimentos dentários. Isto pode permitir a diminuição dos níveis de bacteriémia (mas não da sua incidência) e actuar como um complemento à profilaxia antibacteriana.

CONCLUSÃO

Pelo grande número de transfusões e trocas de sangue a que são expostos os insuficientes renais crónicos, e por um certo grau de imunossupressão que apresentam têm maior risco de contrair infecções víricas como a hepatite B e C,SIDA e tuberculose. Devem ser encorajados a efectuar exames de rotina para a detecção deste tipo de infecções. Em pacientes com lesão hepática , o médico dentista deve ter em conta os resultados de testes de função hepática e de coagulação, previamente a extrações dentárias ou cirurgia periodontal. Os

Page 14: Doentes de risco no consultório dentário

pacientes com insuficiência renal grave são afectados frequentemente por patologias cardio-vasculares(devido a alterações no volume de fluidos, retenção salina),nomeadamente, falência cardíaca congestiva e hipertensão. Embora estes pacientes sejam normalmente medicados com antihipertensores, o médico dentista deve tomar precauções de modo a evitar ansiedade excessiva durante os procedimentos dentários e considerar a utilização de pré-medicação sedativa e monitorizar a pressão sanguínea antes e durante o tratamento. Por outro lado, a hipotensão resultante da deplecção de fluidos e a insuficiência adrenal são efeitos laterais comuns relacionados com o processo de hemodiálise e têm sido descritas situações de angina, enfarte do miocárdio e arritmias. Deste modo, os procedimentos dentários devem ser efectuados no dia seguinte ao do tratamento de diálise, quando o paciente tolera melhor o tratamento.

Os cardiologistas, clínicos gerais e profissionais de saúde oral devem enfatizar a importância dos cuidados regulares de saúde oral na redução do risco de doenças cardiovasculares agudas como a endocardite bacteriana por microorganismos orais. Vários estudos têm demonstrado a importância da saúde periodontal como modelo primário de prevenção da endocardite infecciosa. Lesões periodontais com sangramento e supuração durante a sondagem constituem uma porta de entrada constante de microorganismos para a circulação. Finalmente é importante compreender que mesmo tomando as medidas apropriadas para prevenir a E.I. esta poderá ocorrer. Os doentes devem ser informados deste facto e avisados para se dirigirem ao seu médico de família se alguns dos sinais e sintomas da doença aparecerem.

Page 15: Doentes de risco no consultório dentário

BIBLIOGRAFIA

1. ACC/AHA Guidelines for the Management of Patients with Valvular Heart Disease – II. General Principles. 1998http://216.185.112.5/presenter.jhtml?identifier=2860

2. Scientific Advisory : American Heart Association Statement On Oral Health and Cardiovascular Disease. 06-20-2000http://216.185.112.5/presenter.jhtml?identifier=2957

3. Bacterial Endocarditis-AHA Recommendationhttp://www.americanheart.org/presenter.jhtml?identifier=4436

4. Dental care and heart diseasehttp://216.185.112.5/presenter.jhtml?identifier=4548

5. De Rossi SS, Glick M : Dental considerations for the patient with renal disease receiving hemodialysis. JADA 1996; 127:211-19

6. Santos, Leônidas Galbas : Diabete melito - Aspectos práticos de interesse do cirurgião dentistahttp://www.medisa.pt/

7. Araújo, Norma Cristina : Endocardite bacteriana e Odontologia: um risco ao Cirurgião Dentistahttp://www.medisa.pt/

8. Endocarditis Prophylaxis Informationhttp://216.185.112.5/presenter.jhtml?identifier=11086

9. Prevention of Bacterial Endocarditis (New Guidelines). 15-9-1998http://www.swu.ac.th/dent/news7.html