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QUADRO VI
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
BETIM, 2009
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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SUMÁRIO
Decreto que regulamenta o registro do patrimônio imaterial em Betim 1. Introdução...........................................................................................................9 2. Contextualização histórica, sociológica e antropológica .............................................12 2.1. História dos congados e reinados..........................................................................12 2.2. O reinado interpretado pelas ciências sociais....................................................12
3. Histórico de Betim
3.1. A ocupação....................................................................................................22 3.2. Trajetória sócio-econômica e administrativa....................................................26 3.3. Geografia urbana e aspectos ambientais..........................................................32 3.4. Saúde pública.................................................................................................34 3.5. Educação........................................................................................................39 3.6. Cultura.............................................................................................................40 3.7. O epicentro geográfico do Reinado de Nossa Senhora do Rosário...............................45 4. O Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim – uma história................................46 5. O Reinado de Nossa Senhora do Rosário e sua relação com o Município de Betim...........56 6. Descrição dos lugares e suportes físicos e agenciamento do espaço para a atividade......59 6.1. A Capela do Rosário e seus ícones........................................................................59 6.2. A ocupação espacial pelo Reinado de Nossa Senhora do Rosário................................63 6.3. As relações extra-municipais do Reinado de Betim..................................................65 7. O Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim – formato, conteúdos, narrativas, significados.............................................................................................................66
7.1. O séquito real no Reinado de Betim...................................................................75
8. Os protagonistas do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim: trajetórias, papéis, funções, organização...................................................................................85 9. Os recursos para a realização do Reinado de Nossa Senhora do Rosário em Betim.............93
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10. Produtos do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim ......................................96 11. O Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim e suas relações com o público............97 12. Inventário.........................................................................................................100 12.1. Reinado de Nossa Senhora do Rosário..................................................................100 12.2. Imagem de São Benedito...................................................................................110 12.3. Imagem de Santa Efigênia.................................................................................114 12.3. Imagem de Nossa Senhora do Rosário..................................................................119 12.4. Bandeira de Nossa Senhora do Rosário................................................................124 12.5. Bandeira de Aviso............................................................................................129 12.6. Bastão do Capitão Pé-da-Coroa..........................................................................133 12.7. Indumentária da Guarda de Congo de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Betim....................................................................................................................138 13. Identificação de atividades correlatas....................................................................143 14. Delimitação e descrição da área de ocorrência.........................................................145 15. Salvaguarda e Valorização....................................................................................148 16. Documentação Fotográfica...................................................................................154 17. Registro audiovisual: ........................................................................................184 18. Referências.......................................................................................................185 19. Ficha Técnica....................................................................................................190 20. Trâmite do Registro...........................................................................................191 Proposta de registro de bem cultural imaterial em Betim..............................................193 Ata de aprovação provisória.....................................................................................194 Parecer Técnico sobre o Registro do Bem Cultural 1.....................................................195 Parecer Técnico sobre o Registro do Bem Cultural 2.....................................................196 Pareceres do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural sobre o Registro do Bem.........197 Notificação, comunicação e recibo............................................................................199 Ata de aprovação definitiva.....................................................................................202 Cópia do Decreto de Registro...................................................................................206 Inscrição no Livro de Registro..................................................................................209 21. Documentos diversos........................................................................................211
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LEI DE REGISTRO DO
PATRIMÔNIO IMATERIAL
A Lei Municipal Nº 2.944, de 24 de setembro de 1996, que institui a proteção do
patrimônio cultural de Betim, já prevê o registro do patrimônio imaterial. Esta
Lei já foi enviada ao IEPHA em 1998.
O Município regulamentou a matéria através do Decreto Nº 16.389, de 26 de
outubro de 2000.
O conjunto de peças legais foi avaliado pelo Sr. Carlos Rangel, do IEPHA, em 23
de novembro de 2009, e reconhecido como válido.
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1. INTRODUÇÃO:
A celebração religiosa anual denominada por seus protagonistas como “Reinado
de Nossa Senhora do Rosário” e popularmente conhecida como “congado” está em
atividade ininterrupta em Betim há três décadas. Isto, depois de ter estado inativa por
períodos intermitentes em meados do século XX, seja pela perda de lideranças
importantes, seja pelo próprio caráter do desenvolvimento da cidade (urbanização,
industrialização, configuração do catolicismo e de suas interfaces com outras
religiões, dentre outros aspectos).
A atual vitalidade desta celebração religiosa em Betim apresenta intensa
vinculação com o fomento garantido pelo poder público municipal, na esteira de uma
ampla discussão sobre a necessidade de revigorar as “tradições”1, de salvaguardar o
patrimônio cultural e, especialmente, de proteger e fomentar as manifestações
culturais das comunidades afrodescendentes.
Entretanto, como em outras cidades mineiras, a vitalidade do Reinado de Nossa
Senhora do Rosário apresenta nuanças advindas dos processos sociais e culturais
locais, que o tornam bastante específico e característico desta comunidade – Betim: é
uma atividade cultural “residual” no cenário urbano atual, dominado pelo mundo do
trabalho, pela aceleração das atividades cotidianas, pelas indústrias e pela tecnologia.
Muitos grupos que participam da celebração, aqui chamados “guardas”, têm sofrido
redução numérica e abandonado ou esquecido diversas práticas historicamente
relacionadas ao Reinado de Nossa Senhora do Rosário. A capacidade auto-organizativa
dos grupos para a realização da celebração também sofreu redução, assim como podem
1 O termo tradições é citado entre aspas porque, embora amplamente utilizado pelo senso comum para se referir a manifestações culturais originárias ou populares, não é considerado adequado pela equipe técnica responsável pela elaboração deste dossiê para definir os saberes dos protagonistas do Reinado de Nossa Senhora do Rosário. O termo tradição contém em si a idéia de que a manifestação em questão foi gestada no passado e hoje é repetida como outrora, o que reduz as possibilidades de que se reconheça essa manifestação como em constante atualização, recriação, interpretação e mudança. (GOLOVATY, 2005).
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ser identificados diversos outros fatores de desvitalização – mas também de recriação
– desta manifestação, conforme discussão ao longo deste Dossiê.
Assim, o poder público municipal vem empreendendo uma reflexão contínua e
ações junto à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, entidade que organiza
anualmente o Reinado de Nossa Senhora do Rosário no Município, a fim de
desenvolver uma política de fomento a esta manifestação, que tenha em consideração
o reconhecimento e fortalecimento da autonomia deste grupo cultural. O presente
estudo, que pretende fundamentar o registro do Reinado de Nossa Senhora do Rosário
como patrimônio cultural de Betim, inscreve-se entre as ações citadas, razão pela qual
a Fundação Artístico Cultural de Betim (FUNARBE), através de seus representantes no
Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim, apresentou a este Conselho a
presente proposta de registro.
O Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim, como se pode
depreender da análise de suas atas de reuniões ordinárias em 2009, discutiu diversas
vezes as ações e iniciativas desenvolvidas em prol ou em conjunto com a Irmandade
de Nossa Senhora do Rosário e o Reinado de Nossa Senhora do Rosário, tais como:
proposição do restauro da Capela de Nossa Senhora do Rosário; envolvimento da
Irmandade no processo de restauro, através da oficina-escola mantida pela Fundação
de Arte Ouro Preto; gestão do patrimônio móvel e integrado da Capela (especialmente
uma imagem oitocentista em madeira maciça e o altar-mor da Capela); organização e
fomento à celebração anual, realizada em agosto; apresentação de Projeto ao Fundo
Estadual de Cultura e ao Prêmio Culturas Populares 2009, do Ministério da Cultura,
visando obter fomento à atividade da Irmandade; dentre outras ações. Ainda, a Pró-
coordenadoria da Promoção da Igualdade Racial, recentemente criada em Betim,
desenvolve também ações em torno da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, tais
como a regularização de seu registro no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ)
e a recuperação do direito à propriedade de um terreno outrora doado pela Prefeitura
Municipal à Irmandade.
Por estar acompanhando e discutindo essas ações, o Conselho Deliberativo do
Patrimônio Cultural de Betim aprovou por unanimidade o registro provisório do
Reinado de Nossa Senhora do Rosário como patrimônio cultural de Betim em 04 de
novembro de 2009 e acompanhou todas as fases do processo de registro.
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A equipe responsável pelos estudos técnicos que subsidiam o registro,
composta pelas historiadoras integrantes do Departamento de Planejamento e
Pesquisa da FUNARBE, desenvolveu seus estudos durante todo o ano de 2009,
utilizando os seguintes expedientes: a) pesquisa, nos arquivos da FUNARBE, dos
materiais produzidos nas últimas décadas sobre a Irmandade de Nossa Senhora do
Rosário e sobre o Reinado de Nossa Senhora do Rosário, bem como sobre o patrimônio
material associado a este grupo e a esta manifestação: o templo e os bens móveis e
integrados; b) pesquisa documental no arquivo da Cúria Metropolitana de Belo
Horizonte, sob a égide da qual esteve a Irmandade, a Capela e sua principal
celebração ao longo do século XX; c) registros escritos e audiovisuais sobre o Reinado
de Nossa Senhora do Rosário; d) entrevistas com integrantes da Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário e outros agentes de memória radicados no Município e detentores
de saberes sobre a celebração e seus protagonistas.
Após a apreciação do registro provisório do Reinado de Nossa Senhora do
Rosário pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim, os estudos foram
intensificados e sistematizados no presente Dossiê. Para tanto, foram direcionadas a
este fim as reuniões periódicas que a FUNARBE realiza com a Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário, reuniões nas quais se faz formação continuada e se discute a
gestão dos bens culturais associados à Irmandade.
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2. CONTEXTUALIZAÇÃO
HISTÓRICA, SOCIOLÓGICA
E ANTROPOLÓGICA
2.1. História dos congados e reinados
O Reinado de Nossa Senhora do Rosário surgiu e se desenvolveu no Brasil, a
partir do século XVI, conforme a maioria de seus estudiosos. Segundo Lucas (2002),
pode ser considerado uma celebração luso-afro-brasileira, pois Portugal forneceu a
devoção a N. Sra. do Rosário, e povos africanos, especialmente os da cultura bantu
(Angola e Congo2), radicados no Brasil devido à escravidão, deram forma à festa, com
base em pilares culturais desenvolvidos na África e na própria experiência da
escravidão.
Ainda, alguns estudiosos, como é o caso de Martins (1991), defendem que a
festa pode ter se iniciado ainda na África, onde os portugueses introduziram o culto a
N. Sra. do Rosário com fins catequéticos. O século XVII é apontado como o período
mais provável da origem do culto a Nossa Senhora do Rosário. Atribui-se às investidas
estratégicas de conversão levadas a cabo por Domingos, o precursor da Ordem
Dominicana, sobre os negros “hereges” de Portugal. Apoiando-se no mito da visão da
santa sobre as águas do mar, o sacerdote elegeu a reza do rosário e o culto a Nossa
Senhora como forma de converter os negros ao catolicismo. Esse seria o evento
fundamental que aproximou os cultos afro e a tradição católica.
Em Minas Gerais, onde o Reinado desenvolveu-se sobremaneira, sendo este
Estado o que mais celebrações congadeiras concentra3, a festa chegou no século XVIII.
O registro mais antigo da sua ocorrência em Minas pertence a André João Antonil, que
2 Em razão da origem congalesa desses cultos e celebrações, é que os coroados são denominados “reis congos” (REILY, 2001).
3 São 326 em toda Minas Gerais, segundo Nery (2007).
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aqui esteve de 1705 a 1706 (ANTONIL, 1963) e suas primeiras ocorrências são
atribuídas ao território da atual Ouro Preto e associadas às histórias em torno de
Chico-Rei, personagem sobre cuja existência não se tem registros inequívocos.
Segundo Martins (1991), Chico Rei teria sido rei do pequeno reino africano Congo dos Quicuios, trazido como escravo para Vila Rica, juntamente com grande parte de sua corte, no princípio do século XVIII, e, de acordo com histórias locais, teria se tornado muito rico com a exploração de uma mina abandonada. Assim, comprou a sua liberdade e a de vários escravos, criando a primeira irmandade dos negros livres de Vila Rica. Para pagar a promessa a Nossa Senhora do Rosário, Chico Rei teria organizado a primeira festa dos negros no estado, ocorrida na Igreja de Santa Efigênia e Nossa Senhora do Rosário de Alto Cruz, na antiga Vila Rica, em 1747 (NERY, 2007, p. 3 e 4).
As explicações para o surgimento da celebração são muitas e variadas:
originalmente, a festa teria sido a narrativa das batalhas entre a nação dos congos,
dirigida pelo Rei Cariongo e o Príncipe Suena, contra os moçambiques, liderados pela
Rainha Ginga Nbandi; nesse caso, o nome adequado à festa seria mesmo “congado” e
dela é que advêm as inúmeras designações e hierarquias militares ainda presentes na
festa hoje: quartel, capitão, guarda, embaixador, soldado, farda, etc.. Com as
transformações e influências historicamente recebidas, inclusive da devoção ao
Rosário, a festa teria perdido o caráter de narrativa, e o Rei Cariongo e a Rainha Ginga
teriam sido unidos num só “reinado” em adoração à Nossa Senhora. Congos e
moçambiques não mais guerreiam entre si, mas exercem diferentes funções em honra à
santa de devoção. O formato mais antigo da festa, no nordeste, seria o congado,
enquanto em Minas, no século XVIII, a festa assumiu o formato de reinado.
Em outra versão, a festa seria uma representação do embate entre as
monarquias africanas e o colonizador do Brasil; ou a versão afrodescendente das lutas
entre cristãos e mouros na França, e, por isso, uma manifestação próxima à cavalhada
– esta adotada pelos brancos e senhores (KATRIB, 2004). Em alguns lugares de Minas
Gerais, essa última explicação pode ser reforçada pelo fato de que as congadas
estiveram associadas a antigas representações da luta entre mouros e cristãos, como é
o caso das Embaixadas de Campanha – MG (REILY, 2001) e da Contradança de Betim –
MG (FONSECA, 1975).
Segundo Reily (2001), as cortes eram organizadas no interior das irmandades
de negros, especialmente as irmandades de N. Sra. do Rosário. No período colonial,
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as irmandades eram as principais instituições a ligar a Igreja e a sociedade e suas
principais atividades envolviam caridade, mas também eventos religiosos e sociais. A
maioria das irmandades era organizada segundo critérios raciais4 e cada irmandade
promovia um festival anual para seu santo padroeiro. Esses festivais expressavam a
competitividade entre as irmandades, através da ostentação, mas também constituíam
uma forma de equalização entre as classes (NERY, 2007).
A organização dos escravos em irmandades era estimulada pelas autoridades
coloniais, as quais frequentemente podiam influenciar a definição de quem comporia
as cortes negras. Roger Bastide, por exemplo, concluiu que o rei congo tinha a função
de mediação entre as populações negras e as autoridades coloniais. Os negros tinham
assim uma forma de participação na ordem colonial, ainda que marginal. Outros
estudiosos acham que as cortes exerceriam um papel compensatório, criando para os
negros uma ilusão de autonomia. Porém, funcionando ou não como organizações
políticas, as irmandades tiveram importante papel na reunião de fundos para a compra
da liberdade de seus membros, além do evidente papel de recreação e uso do tempo
livre.
Em Minas, a festa teria se desenvolvido a partir da Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário da Freguesia da Senhora do Pilar de Ouro Preto, fundada em 1715,
e que teve seus estatutos aprovados pelo Bispo do Rio de Janeiro, Dom Frei Francisco
de São Jerônimo. Estes primeiros estatutos desapareceram, mas, em 1733, foram
confirmados com algumas modificações. Em 27 de janeiro de 1785, novos Estatutos
foram confirmados por D. Maria I, cujo capítulo II do compromisso, traz a seguinte
recomendação:
Haverá nesta Irmandade um Rei e uma Rainha (...), de qualquer nação que seja, os quais serão eleitos todos os anos em mesa e mais votos, e serão obrigados a assistir, com o seu estado, ás festividades de Nossa Senhora, e mais Santos acompanhando, no último dia, a Procissão, atrás do pálio.
4 As irmandades eram organizadas por critérios raciais: Irmandades do Santíssimo Sacramento ou de Nossa Senhora do Carmo, dos brancos; Irmandades de Nossa Senhora do Amparo, dos pardos; e irmandades de Nossas Senhora do Rosário, de negros. Mas as irmandades também se organizavam por critérios econômicos. Tratava-se de congregações de classes sociais ou mesmo ocupacionais. Se, de um lado, tínhamos as irmandades de Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e Santa Efigênia, de negros escravos, por outro tínhamos irmandades de Santo Antônio, dos mais abastados. Havia ainda irmandades de classes intermediárias, como a de artesãos (BOSCHI, 1986).
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Aqui, o rei e a rainha são esvaziados de sua antiga representação das
monarquias negras para assumir funções de interesse das autoridades coloniais na
ordenação social. Para cada festival, era escolhido o rei ou rainha do ano, geralmente
branco, cuja função era mobilizar os senhores e angariar fundos em favor das festas.
Entretanto, as festas não deixaram de ter um caráter de representação da força
numérica dos afrodescendentes e de expressão da sua leitura de mundo.
Nas origens dos festejos do Reinado do Rosário, os negros, organizados em
filas militarizadas, se dirigiam cantando e dançando, precedidos da bandeira com a
efígie da Senhora do Rosário, à residência dos reis da festa. Estes seguiam até a
capela com solenidade, sob palio, paramentados com as insígnias reais - cetro e coroa
de prata, acompanhados pelos negros. Chegados à capela e instalados num dossel, os
reis presidiam a mesa das promessas, que eram cumpridas em volta da igreja. Estas
eram feitas por milhares de pessoas, em retribuição a graças concedidas pela Senhora
do Rosário.
Embora as cortes coloniais possam ter tido um papel político, atualmente elas
têm um papel inteiramente simbólico, ou, como disse Carlos Rodrigues Brandão, são
“reinados vazios”. Esses símbolos persistem porque enobrecem aqueles que os
ostentam ou porque essas “inversões ritualizadas focalizam as hierarquias sociais”,
isto é, continuam questionando, na atualidade, a estratificação social.
A partir da antiga Vila Rica, o Reinado espalhou-se em território mineiro e
atravessou os séculos XVIII e XIX, até que, em 1930, o Arcebispo de Belo Horizonte,
D. Antônio dos Santos Cabral, resolveu combater as festas afro-brasileiras. A ameaça
de excomunhão espalhada pela Igreja, a quem desobedecesse as ordens contra a
realização dos Reinados e congados, assustou as comunidades, tendo como
conseqüência a paralisação dos eventos em quase todo o território mineiro. A cidade
de Divinópolis, rara exceção, tornou-se uma trincheira na luta pela manutenção da
tradição. O negro José Aristides, com apoio da Maçonaria, liderou a comunidade local,
continuando com a festa do Reinado, contra as ordens do Arcebispo. A partir de 1948,
as proibições amainaram e a festa voltou, progressivamente, a ser realizada.
Os protagonistas do Reinado de N. Sra. do Rosário têm também muitas e
variadas formas de explicar as origens e razões para a existência da celebração. Eles
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produzem narrativas que podem ser designadas como “mitos de origem” pelos
estudiosos. O mito de origem é, segundo Barthes (apud NERY, 2007, p. 6):
uma fala. (...) é um sistema de comunicação, ou seja, uma mensagem, um modo de significação, (...) conduzida por um discurso. O mito não é definido pelo objeto de sua mensagem, mas pelo modo como articula essa mensagem. Eis porque não poderia ser um objeto, um conceito, ou uma idéia: ele é um modo de significação.
A versão mais difundida do mito é que N. Sra. do Rosário apareceu na linha do
mar, tendo os brancos levado-a para uma igrejinha ao som de uma banda de música,
mas ela retornou ao mar. Os brancos tentaram de novo com violas e violões, mas ela
retornou ao mesmo lugar. Então, os negros tocaram suas caixas e levaram a santa à
igrejinha; e ela aí permaneceu.
Numa outra versão do mito, N. Sra. do Rosário aparece numa gruta e vários
grupos de congadeiros tentam atraí-la para fora, com seus tambores, cantos e danças:
os marujos, os catopés estão entre eles, mas apenas o moçambique consegue esse
intento. Daí a importância hierárquica das guardas ou ternos de moçambique no
Reinado: eles detêm prioridade na condução da santa e do séquito real.
Os diversos conceitos das guardas ou ternos do reinado são os seguintes:
Guarda de Congo: representa a luta do rei Carlos Magno e dos doze pares de
França, buscando a conversão dos mouros. Suas vestes são coloridas e variadas.
As Guardas de Congo puxam os dançantes, em movimento rápido, abrindo
caminhos. Os instrumentos musicais são: tamborim, zabumba, caixa, acordeom,
reco-reco e pandeiro.
Guarda de Moçambique: Protege os reis congos e festeiros grandes e participa
de todos os atos oficiais da festa. O branco é a cor predominante: veste roupas
brancas com um lenço na cabeça, saiote na cintura e gungas (chocalhos) nas
pernas. Valoriza os elementos tipicamente negros, tem o batido mais ralentado
e é considerada o "pé de coroa", aquela que vem imediatamente antes da corte
ou do reino, conduzindo-a. Instrumentos: tambores e patagonas, zabumba,
caixa, a patagunga (ou xiquexique), o reco-reco e a gunga (ou paiá, uma
correia afivelada nas canelas dos dançadores na qual são presos alguns guizos
que produzem sons ritmados conforme a dança) e coro de vozes.
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Guarda de Vilão: Também chamada de "Bate-Pau". É uma antiga dança
originária da França e adaptada em Portugal, nas festas juninas. Foi
incorporada ao Reinado para alegrar os festeiros e apresenta uma rica
coreografia, com bastões de até dois metros enfeitadas de fitas com que os
participantes simulam combates, numa estilização de lutas travadas pelos
negros, aos quais não era permitido o uso de arma branca. Usa cores vistosas.
Os instrumentos musicais são os mesmos utilizados pelo Congo.
Guarda dos Marinheiros ou Marujos: originária da Península Ibérica, compõe o
ciclo natalino e foi incorporada ao Reinado posteriormente. Representa a
conversão dos negros, cumprindo promessa a Nossa Senhora por terem
escapado do naufrágio de um navio negreiro preso nos arrecifes da costa
brasileira por força de uma tempestade. Suas vestes se assemelham ao
uniforme dos marinheiros. Os instrumentos musicais são quase os mesmos da
Guarda de Congo.
Guarda de Catopé: Tradicionalmente representa o índio brasileiro. Cumpre a
tarefa de divertir o público com seus cantos alegres e espirituosos.
Guarda de Candombe: reunião de Capitães de Guarda que, à batida dos
tambores, chamados Jeremias, Santana e Santaninha, fazem louvação à Nossa
senhora do Rosário e homenageiam as almas dos escravos. Geralmente, realiza
seus ritos nos chamados quartéis e só sai às ruas em ocasiões muito especiais.
Guarda de Penachos ou Caboclos: dança do ciclo natalino, de influência
indígena, incorporada ao Reinado, e representa a história da conversão de uma
tribo indígena e a morte e ressurreição do “Papai Vovô”.
Guarda de São Jorge: originária das Cavalhadas, é um desfile de cavaleiros que
antecede o cortejo dos reis, ternos e a procissão de Nossa Senhora do Rosário
no último dia da festa. Traz na frente uma ou mais bandeiras de Nossa Senhora
do Rosário. Está desaparecendo dos reinados mineiros.
Para Reily (2001), as narrativas de origem atestam a relação entre memória
social e os fatos documentados e estabelecidos do passado. Essas narrativas remetem
a origem do congado à África, aos antigos ou a explicam como uma dança dos
escravos ou uma dança para lembrar a escravidão. Em alguns casos, contrastam os
muitos impedimentos que havia à festa no tempo da escravidão, inclusive alegando
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que as celebrações aconteciam às escondidas, com a liberdade de expressão advinda
da abolição.
Algumas variantes destas histórias integram elementos de intervenção divina,
estabelecendo assim o caráter sagrado da dança e a proveniência divina das verdades
que encarna. Reily (op. cit.) encontrou congadeiros que explicam os instrumentos do
grupo como fruto de um milagre de Nossa Senhora do Rosário, que transformou
instrumentos simples em instrumentos fortes; outro congadeiro explica o surgimento
do congo como um milagre de ressurreição feito por são Benedito ao bater a sua
caixa; ao ressuscitar a filha de um rei com o som de sua caixa, São Benedito teria
mostrado o poder que tem a caixa no congado. Ou ainda, Nossa Sra. do Rosário e São
Benedito, representados como protetores dos escravos, teriam tirado comida das
casas-grandes para alimentar os escravos à noite.
Essas histórias criticam a desigualdade social, representando-a como contrária
ao desejo divino (por isso, os santos vêm em socorro dos negros). É esse também o
significado da história da retirada de N. Sra. do Rosário do mar: os mais simples é que
conseguiram convencê-la a acompanhá-los. Essa narrativa faz uma inversão da
hierarquia social vigente.
Algumas narrativas da origem do congado se referem à própria experiência da
escravidão, e não à relação com a divindade (a Santa). Segundo Reily (2001) um
congadeiro assim narrou o surgimento das congadas: quando a Princesa Isabel libertou
os escravos, estes sabiam que o rei era mau e que a atuação dele perpetuara a
escravidão. Não podendo atacar o palácio, para matá-lo, o que era a vontade dos
negros, estes foram juntos para a porta do palácio e tocaram seus tambores, até
enlouquecê-lo.
De qualquer maneira, percebem-se no Reinado de Nossa Senhora do Rosário
elementos da reverência respeitosa às monarquias ancestrais e do culto a divindades
de origem ou inspiração africana, associado ao culto aos santos católicos, além da
retomada das culturas musical e cinestésica dos povos africanos e da experiência da
escravidão.
2.2. O reinado interpretado pelas ciências sociais
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Os primeiros estudos sobre os reinados ou congados no Brasil advieram de uma
perspectiva teórica que buscava nas culturas do povo brasileiro subsídios para a
constituição de uma identidade nacional (NERY, 2007). As leituras destas
manifestações em geral utilizavam o conceito de folclore, isto é, classificavam-nas
como manifestações folclóricas. Entretanto, as críticas feitas ao conceito de folclore, a
exemplo daquelas desenvolvidas por Michel de Certeau (2002)5, têm dado ocasião a
que novas escolhas conceituais sejam experimentadas pelas ciências sociais,
mormente a história, a sociologia e a antropologia, em seus estudos sobre as devoções
ao Rosário no Brasil.
O termo cultura popular também tem sido amplamente utilizado para definir o
reinado ou congado, inclusive é a escolha atualmente feita pelas políticas públicas em
cultura no Brasil6, mas também sofre críticas dos estudiosos da história e da cultura.
Geneviève Bollème (1988), por exemplo, está entre os que questionam o termo,
argumentando que definir uma cultura como popular implica dizer que as culturas são
das classes sociais, isto é, do povo, das elites, das classes médias. Além de essa
perspectiva reduzir as culturas às classes, o que não permitiria compreender uma
circularidade dos elementos culturais entre as classes, conforme ensinou Ginzburg
(1987), ela também constituiria uma nova forma de discriminar e folclorizar as
culturas ditas do povo.
Mais recentemente, documentos internacionais, como a Convenção sobre a
Promoção e a Proteção da Diversidade Cultural (UNESCO, 2005), vêm adotando o
conceito de culturas locais originárias para manifestações como o reinado. Esse novo
conceito expressa uma assimilação, pelas nações e organismos internacionais, da
crítica ao conceito de identidade nacional, hegemonicamente adotado até
recentemente: acredita-se hoje que as culturas locais podem constituir uma
5 Em sua obra A cultura no plural, Certeau diz que o folclore pode ser definido como algo que já morreu nas culturas humanas, e que pode ser resgatado como algo exótico, relacionado às origens, porém que não mais ameaça as configurações atuais da cultura. O folclore, portanto, seria a cultura sem sua dimensão política, sem sua capacidade criativa e dinâmica presente. Por isso, o autor não considera o termo folclore adequado à interpretação das manifestações culturais, sejam elas quais forem, visto que a utilização deste conceito reduz as possibilidades de que essas manifestações sejam vistas de maneira mais integral.
6 Um dos programas de fomento à cultura no Brasil atualmente, por exemplo, é o Prêmio Culturas Populares.
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alternativa à fragmentação e desenraizamento das identidades, fenômeno muito
reconhecido e apontado na contemporaneidade.
Mas, no caso do reinado, quais seriam os limites do local, já que essa
manifestação acontece em diversas regiões do Brasil, e com importantes variações no
tempo e no espaço? Por isso, apesar dos debates conceituais e atenta a ele, neste
dossiê a equipe técnica reconhece o reinado ou congado como uma manifestação
cultural presente no território municipal, dotada da mesma dignidade que qualquer
outra cultura, preferindo abdicar de classificações reducionistas. E entende que seu
registro como patrimônio cultural intangível do município justifica-se por razões
políticas e sócio-históricas: é uma manifestação profundamente enraizada no tempo,
residual e ameaçada de desaparecimento, fortemente vinculada a um grupo étnico
cujas manifestações foram historicamente apagadas da trama cultural brasileira e,
especialmente, rica, complexa, dinâmica, atual e multifacetada, como qualquer
cultura.
Tanto é assim que, conforme mostram estudos recentes sobre o reinado ou
congado em Minas Gerais (REILY, 2001; NERY, 2007; VILARINO, 2007), esta expressão
cultural está em evidente diálogo com as culturas de massa e do entretenimento, às
vezes apresentando-se como produto exótico, apropriado ao consumo turístico.
Nery (2007, p. 2-3) compreende o Reinado de Nossa Senhora do Rosário, assim
como outras festas populares, como processos comunicacionais, que podem ser
interpretados pelos estudiosos através de uma metodologia que abranja quatro
elementos: a memória (registro da festa na confluência do passado e do presente), o
formato (como se organiza e se desenvolve a festa), o conteúdo (as mensagens
veiculadas) e as mediações (relações da festa com outras instituições que participam
da sua organização e os vínculos estabelecidos com a mídia ou com os serviços
midiáticos).
Reily (2001), por sua vez, adota a idéia de que o congado inscreve
corporalmente a memória social dos grupos que o praticam. O corpo seria, então, um
substrato cultural básico. Por essa razão, a autora discute em que medida as práticas
corporais podem funcionar como suporte dessa memória social, visto que também no
corpo podem ser inscritas posturas de submissão, mormente pela violência física. Reily
defende ainda que, através das práticas corporais, os grupos subalternos realizam
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críticas do poder e articulam suas experiências da injustiça social. “They often express
cathartic fantasies and social visions, which invert and re-invent the social order,
portending alternative—and more dignifying—social arrangements” (REILY, 2001, p.
6)7.
A performance seria, segundo a autora, o melhor veículo para memória social
alternativa pois a música e a dança conteriam mecanismos mnemônicos adequados a
essa finalidade social. A sensualidade na música e na dança faz com que o evento
pareça puro entretenimento, dissimulando o conteúdo social e político daquela
experiência cultural.
Para Reily, o congado atualiza a memória social corporal da abolição da
escravidão, nos parâmetros do catolicismo, sendo visto pelas lideranças religiosas e
políticas locais como uma forma de entretenimento pouco mais que inocente, quando
não-ortodoxa. “For the participants, however, the recreation of the celebratory
atmosphere of abolition serves as a forum for the enactment of their versions of the
black experience, and it places their bodies within their visions for society” (REILY,
2001, p. 6)8.
As formas como Nery (2007) e Reily (2001) interpretam o Reinado de Nossa
Senhora do Rosário são referendadas pela equipe que produz o presente dossiê e
encontram aqui um significativo lastro, pois orientam a abordagem teórica e
metodológica.
7 “Eles frequentemente expressam fantasias catárticas e visões sociais que invertem e reinventam a ordem social, propondo arranjos sociais alternativos e mais dignificantes” (tradução de Ana Claudia Gomes).
8 “Para os participantes, entretanto, a celebração da abolição serve como um fórum para a promulgação de suas versões da experiência negra e inscreve seus corpos dentro de suas visões sobre a sociedade” (tradução de Ana Claudia Gomes).
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3. HISTÓRICO DE BETIM
3.1. A ocupação
As mais remotas notícias sobre a ocupação da região de Betim, afora a
ocupação provável por indígenas semi-nômades, remonta ao início do século XVIII.
Toda a região hoje denominada Minas Gerais estava agitada à época; a descoberta de
riquezas minerais atraía aventureiros em busca de glória e outros tantos, em seu
rastro, ocupados em sobreviver.
O ambiente era de mobilidade espacial constante. A região onde hoje fica
Betim fazia parte de uma importante rota que vinha de São Paulo a Pitangui – e era a
rota dos bandeirantes atraídos pelas descobertas minerais na citada povoação – e
também da rota de abastecimento que vinha da Bahia às Minas.
A importância desta última rota só ganha dimensão a partir do olhar mais
atento dos historiadores sobre a diversificação econômica das Minas no auge da
mineração. As Minas vinham sendo vistas como lugar de escassez, de total
dependência do abastecimento proveniente de outras capitanias e concentração da
atividade econômica na mineração. Novos estudos têm demonstrado a importância da
produção própria e da circulação de mercadorias no interior da capitania.
Betim, antes de assim se chamar, fazia parte deste entrecruzar de caminhos.
Por aqui, chegavam os escravos transferidos do nordeste para as Minas, que eram
registrados na localidade das Abóboras, depois denominada, por isso, Contagem das
Abóboras. Em Contagem, também se registrava o gado entrado nas Minas e destinado
a abastecê-las. A contagem, evidentemente, tinha objetivos fiscais. Também por essa
razão o primitivo nome de Belo Horizonte era Curral D’El Rey, ou seja, o local onde o
gado era armazenado, depois distribuído, tendo sido devidamente taxado.
A descoberta de ouro em Minas Gerais, em 1690, quando já estava decadente a
indústria do açúcar no litoral nordestino, proporcionou novas atividades econômicas
ao sistema colonial português. A coroa proibiu qualquer plantação de alimentos ou
criação de gado na zona aurífera, para não desviar mão-de-obra da mineração. Assim
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os garimpos tornaram-se centros de compra de alimentação e de animais de
transporte. É claro que houve resistência a tal proibição, como mostra a instalação de
criadores de gado em Betim bem no início do século XVIII, conforme se comenta
adiante.
Era proibido aos tropeiros ou viajantes pousarem nas estradas ou caminhos do
município impedindo o trânsito. Tinham que afastar os animais do centro da estrada.
Era de interesse da coroa portuguesa que os caminhos às vilas fossem de fácil acesso,
pois dessa maneira, além de abastecê-las dos mais diversos gêneros, facilitava-se
também a saída do metal precioso para o erário real. Com esses intuitos, foram
emitidos bandos e outras ordens reais que se destinavam à construção de pousadas
para viajantes e a manutenção dos caminhos de acesso às vilas do ouro. Em um dos
primeiros núcleos de povoação da atual Betim, logo no início do século XVIII, foi
construído um casarão destinado ao uso como pousada e venda de secos e molhados,
especialmente para as tropas que por aqui passavam. Este casarão abriga atualmente a
Casa da Cultura Josephina Bento.
O fato de Joseph Rodrigues Betim ter solicitado uma sesmaria nesta região em
1711 não foi um acaso depois tornado conhecido por ter originado uma povoação.
Provavelmente, esta solicitação fez parte de uma estratégia dos grupos paulistas,
então em franco confronto com os portugueses preocupados em garantir a si próprios
a reserva da área em que se encontravam os minerais preciosos. Como se sabe, os
paulistas foram os pioneiros das descobertas, mas foram imediatamente confrontados
pelos “reinóis” que, como colonizadores, se sentiam no direito de se apossar das
riquezas.
Ora, em 1708 ocorrera um sangrento conflito entre bandeirantes paulistas e
portugueses, conhecido como Guerra dos Emboabas. Emboabas foi o nome dado pelos
paulistas aos “reinóis”, e significava “estrangeiros”, “invasores”. Apesar da maneira
razoável como o conflito se resolveu em prol dos paulistas, estes se sentiam
ameaçados: percebiam que cabia a eles a tarefa de localizar veios auríferos, mas que a
posse dos mesmos não se encontrava assegurada, na medida em que os “reinóis” a
cobiçavam. Daí intensificar-se a solidariedade entre estes aventureiros que, na
historiografia oficial, figuram como heróis.
A solicitação de sesmaria por Joseph Rodrigues Betim, ligado por parentesco e
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amizade ao famoso bandeirante Borba Gato, deve ter visado assegurar a posse de um
importante caminho e parada, vital para o empreendimento bandeirante. Ao contrário
do que diz em sua petição, Joseph Betim não desejava estabelecer-se nestas terras e
lavrá-las, como não o fez, mudando-se logo para Pitangui, antes mesmo de obter a
confirmação real da doação da sesmaria, o que se dava cerca de três anos após a
doação propriamente dita; nesta ocasião, avaliava-se o desenvolvimento da sesmaria,
isto é, se houvera estabelecimento do sesmeiro e escravaria, exploração do solo ou
subsolo, povoação... Joseph Betim não a obteve e nem mesmo a solicitou, segundo o
minucioso trabalho do historiador Geraldo Fonseca (1975). Este estudioso inclusive
contesta poder Joseph Betim figurar como fundador da povoação ou como responsável
pela ereção de duas capelas em sua sesmaria; obter autorização para erigir capelas
era, à época, processo complexo e lento, sendo improvável que o bandeirante o tenha
alcançado em dois anos durante dos quais deve ter permanecido nestas paragens. Não
se encontraram documentos que comprovem a solicitação da ereção das capelas por
Joseph Betim na sesmaria onde hoje se localiza o município de Betim, e sim em
Pitangui, onde o pioneiro logo depois se estabeleceu. Primitivos estudiosos destes
documentos podem ter se enganado quanto às capelas.
Assim, do primeiro proprietário das terras onde hoje fica Betim, ficou seu
nome, primeiro aplicado ao Ribeirão da Cachoeira, tornado Betim, depois adotado pelo
povoado surgido em torno da primeira capela. É muito provável que a memória social
local tenha “exagerado” a participação de Joseph Rodrigues Betim na primitiva
formação do povoado, porque o referido bandeirante era um verdadeiro potentado,
aparentado e ligado por relações de solidariedade com alguns dos mais destacados
bandeirantes brasileiros, o que conferiria uma origem “nobre” a Betim, preferível a
admitir que a povoação fora fundada por anônimos.
Nas primeiras décadas após a doação da sesmaria a Betim, a região consolidou-
se como local de passagem e parada dos tropeiros. Outros sesmeiros atuavam na
região porque, quando a Coroa Portuguesa doava sesmarias, fazia-o “por atacado”, a
fim de que os sesmeiros pudessem contar com uma vizinhança importante para a
segurança e o estabelecimento de vínculos sociais. Os sesmeiros aqui estabelecidos
juntamente com Joseph Rodrigues Betim em 1711 foram João de Souza Sotto Mayor
(criador de gado) e João Leite da Silva Ortiz.
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Entre 1711 e 1750, a sesmaria de Betim recebeu diversos núcleos de povoação,
coincidentes com os pontos de parada dos tropeiros. O primeiro deles a ganhar
importância foi o da Bandeirinha do Paraopeba. Seu nome deve ter se originado no
fato de o local em que se estabeleceu ter sido objeto de uma “bandeirinha”, isto é,
uma pequena expedição em busca de minerais ou um “ramo” de uma bandeira.
De fato, os bandeirantes paulistas, reunidos na Câmara de São Paulo em 1730,
deliberaram que, uma vez aberto o caminho das bandeiras até Sabarabussu, que
fossem enviados pequenos grupos que plantassem roças em pontos estratégicos, para
o suprimento das futuras expedições bandeirantes. Assim nasceram as bandeirinhas.
O arraial da Bandeirinha é o primeiro de Betim a aparecer na documentação
oficial, quando pede autorização para construir uma capela, em 1753, e a recebe em
1754. Para o período, a construção de uma capela era um primeiro sinal de
estabelecimento de um povoado. Isso independia da religiosidade propriamente dita
da comunidade, visto que a Igreja era responsável pelos registros de nascimento,
casamento e morte e por todos os ritos que conferiam identidade aos potentados e à
gente média do local. As pessoas andavam enormes distâncias até a capela mais
próxima, e era por isso que os “homens bons” de cada local se empenhavam na
construção de capelas em suas terras, a fim de evitar o desconforto de suas famílias e
agregados.
Quando solicitaram a construção de sua capela, quiseram que isso se desse
num monte, razão pela qual a capela ficou distante do pioneiro núcleo de povoação.
Assim, por volta de 1770, foi levantado um cruzeiro na Bandeirinha, o qual foi
benzido solenemente no dia de Santa Cruz. A partir daí, iniciou-se a Festa Anual de
Santa Cruz (fim de abril ou início de maio), que continua sendo realizada no atual
bairro Bandeirinha. No século XVIII, essa festa era tão concorrida quanto a da
padroeira.
A capela do arraial da Bandeirinha foi construída imediatamente, o que dá uma
medida da prosperidade da região. A construção e a equipagem da capela precisavam
obedecer a certas regras da Igreja e demandavam recursos, geralmente obtidos por
subscrições da comunidade. A capela foi erigida onde hoje se encontra a Praça Milton
Campos, de frente para o arraial da Bandeirinha – portanto com os fundos para o
futuro centro histórico de Betim – e recebeu o nome de Capela de Nossa Senhora do
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Monte do Carmo. Como já havia outras capelas na região, em Mateus Leme e Santa
Quitéria – hoje Esmeraldas – o novo templo tornou-se conhecido como Capela Nova do
Betim, nome que depois se estendeu ao arraial.
Entre 1760 e 1800, o arraial cresceu em importância, como indica a instalação
de forças policiais reais e a elevação da localidade a distrito em 1797, fato confirmado
pela Câmara de Sabará em 1801.
3.2. Trajetória sócio-econômica e administrativa
Ao longo desse período, despontou o primeiro verdadeiro potentado da extensa
região de Capela Nova do Betim, João Nogueira Duarte, proprietário da Fazenda Serra
Negra, cuja produção, extensão (730 alqueires) e escravaria (centenas) eram notórias
na capitania. Já na década de 1770, Nogueira Duarte detinha cargos de nomeação
direta da rainha D. Maria I, o que dá uma medida de seu reconhecimento oficial. O
pioneiro era português, tendo primeiro se estabelecido em Congonhas do Campo. A
importância de sua família e daqueles aos quais se ligou por casamento e negócios
está atestada em documentos oficiais. Seus descendentes constituíram importante
tronco genealógico em Betim, tendo muitos ocupado cargos militares e eclesiásticos
de destaque.
A partir de meados do Século XIX, Betim participou da retração econômica e
decadência que atingiu toda a antiga zona de produção aurífera. Desenvolve-se,
então, uma atividade econômica de subsistência, quase sempre fundamentada na
fazenda autárquica. Às margens do Rio Betim, se instalaram olarias e moinhos de
fubá, estes últimos beneficiários das quedas d’água, chegando somar 35. Restam na
cidade vestígios das edificações desses estabelecimentos, além de instrumentos
empregados na produção.
O viajante James Wells (1995) esteve em Capela Nova e em suas adjacências
durante o oitocentos, assim se manifestando sobre a localidade:
Capela Nova do Betim é avistada muito antes que eu a alcance. Sua longa rua de casas brancas e telhas vermelhas fica situada proeminentemente sobre um morro alto, cercado de vales fundos e de morros mais altos e cadeias de montanhas. A estrada desce da região alta que eu tinha atravessado, cruza um vale e sobe por uma ladeira larga e íngreme, com casas separadas, casebres e ranchos de cada lado. Chegando ao topo, ela
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se une a outra rua em ângulo reto, ou melhor, a uma longa praça aberta, com filas de casas de porta e janela amontoadas e uma igreja simples, caiada, em uma extremidade. Há diversas vendas e armazéns de secos e molhados e ranchos abertos para tropas de mula. (...) Uns poucos matutos, em seus matungos esquálidos, montados com seus dedões do pé enfiados em pequenos estribos e usando o inevitável poncho de baeta ou tecido azul listrado de vermelho; umas poucas mulheres negras ou mulatas, vestidas com saias de algodão e xales espalhafatosos e batas brancas, apregoando frutas ou doces em tabuleiros de porta em porta; uns poucos vadios nas vendas e armazéns; algumas cabeças nas janelas assistindo apáticas à cena para a qual passam diariamente olhando e os numerosos porcos, bodes, cachorros, galinhas, perus e galinhas d’angola da rua constituem a restrita vida presente nesta vila sonolenta (p. 121-2).
O século XX alvoreceu em Betim sob o signo da implantação da infra-estrutura
que posteriormente faria da região um pólo industrial. Em 1909, a Schnoor Engenharia
obteve empreitada junto ao Governo Estadual para construir 155 km da seção BH –
Henrique Galvão (atual Divinópolis) da Estrada de Ferro Oeste de Minas. O engenheiro
Antônio Gonçalves Gravatá, então funcionário da Schnoor, sugeriu a construção de
uma usina hidrelétrica na principal queda d’água do Rio Betim, que tinha 84 metros. A
hidrelétrica foi construída por Gravatá, em suas terras (Fazenda Cachoeira), com
recursos próprios e de seu empregador Emílio Schnoor. Inaugurada em 1914, com
capacidade de produção de 250 kw, a hidrelétrica chegou a fornecer energia para
Henrique Galvão. Em 1945, até Contagem recebia energia gerada pela usina.
Nem a ferrovia nem a hidrelétrica alteraram significativamente a atividade
econômica em Betim, que permaneceu especializada na produção de gêneros
alimentícios, principalmente arroz, milho, mandioca, feijão, cana-de-açúcar e algum
gado.
O território onde está Betim havia sido pertencente à Vila de Sabará, cuja
jurisdição era imensa, desde o início da ocupação. Em 1901, pouco depois da
instalação do regime republicano no Brasil, houve uma reforma político-administrativa
do Estado brasileiro, que se desdobrou na divisão do território em estados e
municípios. Foi então que surgiu o estado de Minas Gerais, com 11 grandes
municípios, sendo um deles o de Santa Quitéria ao qual Capela Nova ficou
subordinada, até perdendo algo da autonomia adquirida em 1897. Não houve
resistência do arraial à subordinação a Santa Quitéria porque os potentados locais,
João Nogueira Duarte à frente, mantinham boas relações com os líderes
santaquiterienses.
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Por volta de 1910, a cidade desenvolveu um novo desenho urbano em função
da passagem da linha férrea, que se instalou a aproximadamente uns setecentos
metros da parte posterior da Praça Milton Campos – até então tida como região
central. É comum no meio popular a afirmativa de que “a cidade cresceu para trás, nas
costas da Igreja [antiga Matriz onde hoje está a Praça Milton Campos]”. Percebe-se,
dessa forma, uma formação urbana que desloca o eixo central da cidade para a
confluência das avenidas Governador Valadares e Amazonas, em detrimento ao
“antigo” centro, na Praça. Este momento histórico trouxe uma inédita dinâmica sócio-
urbana para o município, mas a população do campo se manteve superior à urbana,
que, inclusive, manteve um crescimento vegetativo.
Betim tornou-se município por decisão estadual e federal em 1938. Isso não
foi fruto de mobilização local, mas de uma nova divisão administrativa do Brasil,
promovida neste ano. Essa nova divisão administrativa foi estudada por uma comissão
criada por Olegário Maciel desde 1932, obedecendo a determinação federal9. Minas
Gerais, nesta ocasião, passou a ter 71 municípios. Fonseca (1975, p. 105), embora
registre uma manifestação organizada pelo padre Osório Braga, numa ocasião em que
o governador Benedito Valladares passava por Betim, prefere creditar a emancipação
de Betim a uma querela do próprio Valladares com Santa Quitéria. O referido município
teria feito oposição ao líder político e este, para puni-lo, lhe teria tirado parte
significativa do território, ao criar o município de Betim.
O recém-criado município de Betim – que também era comarca, isto é, sede do
poder judiciário – compreendia os atuais territórios de Contagem, Campanha, Ibirité e
Ribeirão das Neves. Novas reformas em 1960 e 1962 reduziram o território de Betim
para a configuração atual – 376 km².
Nas décadas de 1940 e 1950, Betim volta a ter importante função de local de
passagem das rotas de abastecimento, desta vez destinadas à capital, Belo Horizonte.
O planejamento estadual destinou a Betim duas outras funções econômicas: a
industrialização de base ou de bens de capital, representada pelas siderúrgicas aí
instaladas, e a produção de alimentos para o abastecimento da capital. Juntamente
com Pedro Leopoldo, Santa Luzia, Nova Lima, Sabará, Vespasiano e Lagoa Santa,
Betim constituiria o chamado “Cinturão Verde” de Belo Horizonte. Entretanto,
9 Betim: 50 anos de emancipação (1938/1988). Revista editada pela PMB (Adm. Tarcísio Braga), p. 11.
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nenhuma destas duas intenções político-econômicas alterou substancialmente a
economia betinense, que permaneceu intensamente voltada para a subsistência. Pelo
Censo Demográfico de 1940-1950, feito pelo IBGE, 51% da população urbana de Betim
estava ocupada com “Atividades Domésticas e Escolares”, enquanto que 31,78%
classificavam-se sob a rubrica “Condições Inativas e outras”.
Ainda na década de 40, instalam-se as primeiras indústrias de Betim, ligadas à
constituição do Parque Siderúrgico Nacional10, nos anos 1940: Cerâmica Saffran
(1942), Ikera (1945), Cerâmica Minas Gerais (1947). Essa primeira industrialização
pode ser atribuída a uma elite industrialista local, mais integrada com a localidade,
mais comprometida com a absorção da mão-de-obra da região e, por seu caráter mais
tradicional, pouco agressiva sobre o tecido urbano. Fez parte da constituição do
Parque Siderúrgico Nacional a criação da Cidade Industrial de Contagem, cuja extensão
abrangeu Betim.
Nos anos 50, muda o eixo da industrialização brasileira – decresce o
investimento nas indústrias de bens de capital, como as siderúrgicas primeiramente
instaladas em Betim e volta-se o foco para a produção de bens de consumo duráveis,
para a substituição das importações. A partir daí, Betim, por sua oferta privilegiada de
infra-estrutura, destina-se a se tornar pólo de atração das indústrias. Entretanto, isso
se dá vagarosamente. Em 1954, a instalação de uma central geradora de energia da
CEMIG, e em 1959, a construção do trecho Belo Horizonte - Extrema (sul de minas) da
Rodovia Fernão Dias, que liga Belo Horizonte à capital paulista, começam a delinear as
mudanças intensificadas nas décadas seguintes.
A Rodovia Fernão Dias, construída no governo do então presidente Juscelino
Kubistchek, assume relevância no processo histórico em questão, por ter provocado
um considerável número de loteamentos na porção central da cidade, durante a
década de 1960. Algumas famílias, que já possuíam grandes áreas na região em volta
da Praça Milton Campos (antigo Largo da Matriz) e na extensão da Av. Governador
Valadares, promoveram a repartição dessas áreas com a finalidade de trazerem os
familiares do campo para a cidade, ou para vender os lotes a terceiros. Já outras, que
10 Estas indústrias pioneiras compuseram, juntamente com a Magnesita (Contagem), a Cerâmica Togni (Poços de Caldas), a Cerâmica João Pinheiro (Caeté), a Acesita (Coronel Fabriciano) e a Belgo-Mineira (Sabará), o setor de produção de refratários para a siderurgia mineira e para os parques siderúrgicos de São Paulo e Rio de Janeiro.
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habitavam no meio rural, compravam terrenos próximos ao centro, ou na extensão da
Rodovia, para praticarem o loteamento e se mudarem para o meio urbano.
Um dos maiores exemplos desta ação foi o loteamento do bairro PTB – sigla
que significa “Posto Telegráfico de Betim”, por existir na linha férrea, que passa em
frente ao bairro, tal posto. Praticamente durante toda a década de 1960 houve um
certo arranjo territorial, embasado nas ações de configuração dos lotes e bairros
novos, sendo a maioria implantados às margens da Rodovia.
Ainda na década de 60, chegam a Betim algumas indústrias de médio porte,
quase todas de capital privado, à exceção da REGAP, e se instalam no Bairro
Cachoeira, local tradicional da primeira industrialização de Betim, vinculado à
presença da Av. Amazonas, do Rio Betim e da Ferrovia Oeste de Minas. São elas:
Cortume Morumbi (1960), Fabril de Minas (sabões, 1962), Riomar (artigos de pesca,
1962), Fábrica São Geraldo (móveis, 1962), Fábrica São João (biscoitos, 1962),
Frigorífico Silveli Torres (1964), Confecções Dora (1964), Siderúrgica Amaral (1965),
Refinaria Gabriel Passos (1968), Asfalto Chevron (emulsão asfáltica, 1969), Sidero
Manganês de Pellets (1969, a partir de 1974, chamou-se Siderúrgica Wilson Raid).
A Refinaria Gabriel Passos foi instalada em Betim porque o local constitui uma
confluência de condições favoráveis à redistribuição de combustíveis. Entretanto, a
economia local não foi dinamizada pela presença da refinaria. Nos anos 70, apenas
uma indústria, a Asfaltos Chevron, havia sido atraída para o município em função da
REGAP.
No início desta mesma década, a Prefeitura Municipal de Betim contraiu
empréstimo junto à Caixa Econômica Federal para adquirir os terrenos que seriam
doados tanto à Fiat Automóveis quanto à Krupp. Houve disputa entre os estados
brasileiros e entre os municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte para
sediar a Fiat. O que favoreceu Betim foi, além de suas condições infra-estruturais e da
atuação política em seu favor, o esgotamento do espaço de Contagem. Ainda, um dos
fatores de atração da Fiat para o Brasil/Minas/Betim foi a intensa propaganda
desenvolvida pelo INDI (Instituto Nacional do Desenvolvimento Industrial) no
exterior. O folheto de propaganda de título “Introduction to Minas Gerais” diz:
Muitos mineiros são altos, delgados, esbeltos e de pele clara, mas não existem barreiras de cor em Minas, nem em mito nem em fato. Homens e mulheres de todas as nações e de todas as raças são recebidos
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abertamente em Minas. Encontra-se também uma ausência de consciência de classe e esta atitude está combinada com o senso democrático de que todos os homens são iguais (MACHADO, 1979).
O então presidente da Fiat, Giovanni Agnelli absorveu a propaganda, conforme
transparece de sua fala:
Um dos elementos principais para a instalação de um complexo industrial é a disponibilidade de mão-de-obra. Na zona de Minas Gerais, a disponibilidade é enorme e nos permitirá atingir uma média de 8 a 9.000 operários. Além do mais, o município de Betim comprometeu-se a criar escolas para a preparação do pessoal especializado, sob a orientação de instrutores italianos11.
As negociações para a implantação da Fiat em Betim foram bastante rápidas:
em fins de 1972, após ser eleito, o governador mineiro Rondon Pacheco, iniciou os
contatos com a empresa e declarou que um final feliz se anunciava; em 1973, é criado
o Fundo de Investimentos e Participações, que tem por finalidade destinar verbas do
Estado a diversos empreendimentos industriais; no orçamento de 1973 do Estado,
estão previstos gastos com a implantação da Fiat, antes mesmo de se concluírem as
negociações com a empresa, o que se deu no decorrer de 1973; os trabalhos de
terraplenagem e infra-estrutura começam neste mesmo ano, logo após a conclusão das
negociações; em 1976, já havia carros Fiat nas ruas.
Nos anos 70, a política econômica estadual conhecida como “Nova
Industrialização Mineira” colocou Betim em posição de destaque. Essa política,
concebida por planejadores estatais, visava tirar Minas Gerais da posição de centro
industrial periférico, fornecedor de insumos para o eixo Rio/São Paulo, tornando-o um
centro autônomo. Para isso, foi criada a Companhia de Distritos Industriais de Minas
Gerais (CDI), que planejou cinco distritos industriais na Região Metropolitana de Belo
Horizonte: Betim, Vespasiano, Contagem, Santa Luzia e Belo Horizonte.
Betim, cujo distrito foi denominado Paulo Camilo, recebeu mais investimentos,
tendo sido programada para ser o 2º pólo automobilístico do país. Segundo dados da
CDI até 1979, Betim havia recebido 72,60% dos investimentos nos distritos industriais
da RMBH e gerara 64,11% dos empregos diretos criados nestes mesmos distritos. É
importante ressaltar que Betim sofreu uma alta especialização produtiva, isto é,
11 Revista Tendência. “Por que a Fiat se instalou em Minas Gerais”. Agosto de 1973, nº 0, p. 50.
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grande parte de sua industrialização nesta época deu-se em função da indústria
automotiva.
O processo de industrialização continua acelerado nos anos 80. Ao final desta
década, a recessão da economia nacional faz diminuírem os investimentos, mas não os
estanca. A especialização automobilística da indústria continua alta, mas as
administrações municipais dos anos 90 e 2000, conscientes de que isso constitui uma
fragilidade para a economia local, buscam incentivar a diversificação industrial. A
recente criação do Distrito Industrial de Bandeirinhas faz parte deste contexto.
A economia rural betinense foi desagregada a partir dos anos 70. O número de
pessoas ocupado nesta atividade é irrisório em relação aos setores secundário
(indústria) e terciário (comércio e serviços), bem como sua participação na riqueza
produzida. Destaca-se a produção de leite e de horti-fruti-granjeiros, distribuídos
principalmente através do CEASA.
Conforme dados do Censo Demográfico 2000 do IBGE, o crescimento
populacional de Betim, a cada ano, está na ordem de 5,03%. O mesmo Censo, em seus
dados trabalhados, atesta que 26% dos chefes de família betinenses têm escolaridade
máxima de 4 anos, isto é, um total despreparo para a inserção qualificada no mercado
de trabalho industrial.
3.3. Geografia urbana e aspectos ambientais
Distante aproximadamente 30 quilômetros da capital, o município de Betim é
hoje um importante pólo de concentração industrial do Estado de Minas Gerais e a
segunda maior arrecadação de ICMS do estado, só perdendo para a capital, o
município está entre as maiores economias do Brasil.
Quanto aos aspectos físicos, o município de Betim está localizado na Bacia do
Rio Paraopeba, que o corta nas regiões oeste e sudoeste. O rio Paraopeba é um marco
na definição da paisagem e define também a divisa entre Betim e os municípios de
Igarapé, São Joaquim de Bicas e Juatuba.
Entre as diversas divisas municipais, podemos destacar a de Betim com o
município de Contagem, do ponto de vista hidrográfico. Esta divisa é feita pela
barragem da Várzea das Flores, a área de preservação de mananciais mais importante
de Betim, responsável por 15% do abastecimento de água da região metropolitana de
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Belo Horizonte e onde se produz a água de menor custo para o sistema. De
preservação fundamental, tem uso rural (sítios para fins-de-semana), lazer e urbano
(Bairro Icaivera).
O município possui diversas micro-bacias hidrográficas, dentre as quais
podemos destacar as sub-bacias do Rio Betim e do Riacho das Areias, que
compreendem boa parte da região mais urbanizada da cidade, inclusive as regionais
Centro e Alterosas.
Do ponto de vista climático, a temperatura média anual, fica em torno de 20
graus centígrados e o índice pluviométrico médio é de 1.450mm.
Em relação às áreas verdes e à fitogeografia, destacam-se no município dois
tipos de biomas: o do Cerrado e o da Mata Atlântica. Na divisa com o município de
Contagem, no bairro Icaivera, destaca-se na paisagem uma típica floresta de encosta,
com topografia bastante íngreme. Próximo à ponte do rio Paraopeba, podemos
constatar uma singular floresta de galeria, com a presença de muitas lianas e sub-
bosque pouco denso. Na divisa entre Betim e Ibirité, encontra-se um cerrado bastante
degradado pela formação de pastagens. Na estrada de Betim para Esmeraldas,
podemos encontrar uma formação de cerrado bem desenvolvida, apresentando na sua
paisagem os estratos arbóreo, arbustivo e herbáceo. Próximo ao centro da cidade,
encontra o Parque Ecológico Engenheiro Felisberto Neves, que apresenta vegetação
expressiva com porte arbóreo em torno de 25m.
Apesar dos grandes problemas ambientais existentes no município, a cidade
vem promovendo diversas ações de recuperação ambiental e reintegração social. A
gestão dos recursos ambientais está a cargo Conselho Municipal de Desenvolvimento
Ambiental (CODEMA). Várias iniciativas estão sendo realizadas como: saneamento
básico, coleta seletiva de lixo e aterro sanitário, o que possibilita ao município
receber o incentivo do ICMS Ecológico e buscar a melhoria da qualidade de vida para
sua população. Como exemplo, destaca-se a construção de interceptores de esgoto ao
longo do rio Betim, do riacho das Areias e de Estações de Tratamento de Esgoto (ETE)
em várias partes do município. Outra obra no setor ambiental é a Central de
Tratamento de Resíduos Sólidos: o lixo que chega ao aterro sanitário, depois de
triado, é prensado para ser vendido. O restante é enterrado.
Em relação à questão ambiental, podemos destacar a construção de várias
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avenidas sanitárias, dentre elas, a avenida Antônio Carlos, no bairro Teresópolis,
avenida Porto Alegre, ligação entre as avenidas Edméia Lazarotti e Belo Horizonte e a
avenida do Imbiruçu que liga a avenida Marco Túlio Isaac à via Expressa, facilitando o
acesso da população da região do centro de Betim e aos municípios de Contagem e
Belo Horizonte.
A população do município, que hoje totaliza quase 450 mil habitantes, tem
crescido com taxas superiores à população da Região Metropolitana de Belo Horizonte
e do Estado de Minas Gerais. Em 1970, quando o grau de urbanização da Região
Metropolitana de Belo Horizonte era de 92%, Betim apresentava-se ainda como um
município de população predominantemente rural, com um grau de urbanização de
46%, aproximadamente. Em curto período, o município passa por um profundo
processo de transformação socioeconômica: em 1980 o município, já apresenta um
grau de urbanização de cerca de 91%, ligeiramente inferior ao da Região
Metropolitana de Belo Horizonte, que resultava em torno de 96%.
Fato notável é que Betim continua com alta taxa de crescimento urbano,
mesmo passado o momento dos maiores impactos decorrentes da implantação da Fiat
Automóveis em seu território, nos anos 1970. Com isso, observa-se que o município,
por um lado, abriga um forte e moderno setor industrial e, por outro, configura-se
como receptor de consideráveis fluxos migratórios que se dirigem para a Região
Metropolitana de Belo Horizonte, compostos, em grande parte, por segmentos pobres
e não qualificados da população.
Apesar de Betim, nas últimas décadas, estar ocupando a 2ª e a 3ª posição
entre os municípios mineiros que mais arrecadam impostos, o que indica a vitalidade
de seu setor privado, a renda per capita do cidadão betinense é de R$ 203, 22 e o
Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) é de 0,775, um pouco superior
às médias estadual (0,719) e nacional (0,699), nas quais está contida uma
reconhecida desigualdade de grandes dimensões. Do ponto-de-vista do
desenvolvimento humano, o município ocupa, por exemplo o 135º lugar entre os 853
municípios mineiros (PNUD, 2000). Isso mostra que o modelo de desenvolvimento
econômico adotado nem sempre está associado à elevação geral dos padrões de vida.
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3.4. Saúde pública
Há poucos dados sistematizados sobre os primórdios da prestação de serviços
de saúde em Betim, especialmente se considerada tal prestação como uma função
estatal pública, como geralmente a entendemos hoje. Ao que parece, isso só acontece
de forma regular a partir do final dos anos 40, mantendo a rede pública uma oferta
bastante precária que só se universaliza relativamente nos anos 90.
O primeiro registro notável da prestação de serviços de saúde em Betim refere-
se aos idos de 1916, quando a Fundação Rockfeller, norte-americana, enviou uma
Comissão Internacional de Saúde ao Brasil para o estudo de doenças tropicais,
principalmente a ancilostomíase. As relações pessoais do engenheiro Antônio
Gonçalves Gravatá é que propiciaram a Betim ser a base da missão. Também
concorreram para isso o acesso ferroviário e a existência de uma pequena unidade
móvel de monitoramento do tripanosoma cruzi em Betim.
O relatório da missão deu conta de que 20% da população urbana betinense e
60% da rural (que alcançava mais de 70% do total na época) tinham ancilóstomos.
Além disso, 80% dos atendidos (o total de atendidos chegou a 1.435) tinham Doença
de Chagas. Consta que as pessoas se deslocavam até 40 km para receber atendimento,
o que dá uma medida da carência da população quanto aos serviços de saúde.
Grandes nomes da medicina brasileira estiveram em Betim para acompanhar os
trabalhos, a exemplo de Carlos Chagas e Adolfo Lutz. Após o fim da missão, uma de
suas casas portáteis permaneceu em Betim, de forma que a antiga unidade móvel ficou
melhor aparelhada e houve atendimento dos casos mais graves fora de Betim – em
Belo Horizonte. O médico responsável registrou sua decepção com as autoridades
brasileiras por não se terem decidido a tornar regular o atendimento aos doentes,
através de um dispensário definitivo.
Ao longo da primeira metade do século XX, registra-se a presença da epidemia
de gripe espanhola em Betim, o que causou a morte de 38 pessoas em 1918. Sabe-se
que não havia socorro público às vítimas e que este socorro partiu dos potentados
locais. Os farmacêuticos José Borges e Pedro Xavier de Assis – este último o Mestre
Pedro, muito querido da comunidade e que, além de boticário, era professor e erudito
– cuidaram do atendimento aos doentes. Nisso, tiveram o auxílio econômico do Dr.
Gravatá e dos fazendeiros José Nogueira Duarte e José Belém.
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Apenas em 1949, há registro da inauguração de um posto de saúde em Betim
pelo governador Milton Campos. Este posto, que ficou conhecido como Unidade
Central Dr. Hacketi (porque está localizado na rua homônima), localizado onde hoje
está o Centro de Referência em Saúde Mental de Betim (CERSAM), marcou o início da
prestação de serviços em saúde de maneira mais regular em Betim. O posto era
mantido pelo Estado, que, até a década de 70, inaugurou outros postos, no Angola, no
PTB e em Vianópolis. Além destes, Betim contava com o complexo de saúde da Colônia
Santa Isabel, cuja principal unidade era o Hospital Orestes Diniz12, para atendimento
principalmente dos internos e de seus parentes que foram se instalando nas
redondezas.
Nos anos 70, a Prefeitura Municipal de Betim inicia ações próprias no campo da
saúde, inaugurando seu primeiro posto de saúde, localizado na Rua Rio de Janeiro,
com um médico e um dentista, que atende prioritariamente aos funcionários da
própria Prefeitura. A população propriamente dita ficava aos cuidados dos postos
mantidos pelo Estado e pelo INAMPS.
Em 1978, foi inaugurada a FAMUB (Fundação Municipal de Urgência de Betim),
primeira unidade de saúde municipal a adotar o conceito de atendimento do urgência.
Nessa mesma época, foi criado o primeiro Código Sanitário de Betim, que disciplina
questões relativas à poluição, ao saneamento básico e ao funcionamento adequado,
do ponto-de-vista sanitário, das empresas de Betim. Esse código vigora até hoje em
Betim.
Em 1983, um evento externo provocou intensa reordenação da prestação de
serviços em Betim: a criação das Ações Integradas de Saúde (AIs). As AIs
representaram a parceria entre as esferas municipal, estadual e federal para a atenção
à saúde. Em conseqüência disso, o setor da saúde em Betim foi progressivamente
adotando uma linguagem mais consistente e neste início de década criou-se um
departamento de defesa do meio ambiente na Secretaria de Saúde (CODEMA),
inaugurou-se o posto do PTB e a primeira policlínica de Betim, Alcides Braz, que trazia
uma nova concepção em saúde pública – o atendimento em especialidades médicas.
12 Inaugurado em 1932, o Hospital Dr. Orestes Diniz contava com uma estrutura admirável, devido à atenção dedicada à hanseníase pelas autoridades sanitárias nos anos 30, e ainda em 1988 contava com 56 leitos. Após a desativação da Colônia, o hospital poderia ter sido acionado pela população de Betim, mas o estigma da hanseníase fez com que isso nem fosse considerado pelos cidadãos.
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Também desta época datam os gabinetes odontológicos escolares, abertos com
recursos de um convênio com a Fundação de Assistência ao Estudante (FAE).
Entre 1985 a 1988, foi elaborado o primeiro plano de saúde do município, com
um diagnóstico bastante acurado do setor. O plano, denominado Modelo Assistencial
para o Município de Betim, detectava a ausência prática de um sistema de saúde capaz
de absorver a demanda local. Betim contava então com cinco unidades de saúde
mantidas pelo Estado e nove mantidas pelo município, e o plano previa ampliar o
sistema para vinte e duas unidades, inclusive com a construção do hospital municipal
e a municipalização das unidades do Estado.
A organização sistêmica, que só se efetivaria nos anos 90, já estava delineada
neste plano, que previa a especialização de cada unidade em um tipo de atenção à
saúde e o funcionamento dos encaminhamentos por referência e contra-referência13.
Nem tudo o que se vislumbrou no plano foi implementado, mas houve significativo
avanço da atenção básica à saúde no município, com a criação de programas de saúde
para a mulher, a criança, hipertensos e diabéticos. Houve a implantação de mais três
policlínicas e seis postos de saúde.
Ao final dos anos 80, Betim enfrentou uma situação conflituosa no campo da
prestação de serviços em saúde: o Hospital N. Sra. do Carmo, fundado por sociedade
particular, enfrentava dificuldades financeiras, razão pela qual foi desativado. Houve
grande comoção da comunidade, devido à cidade não ter unidade hospitalar. Em
novembro de 1989, o hospital foi reativado, com subvenções municipais. Foi nesse
momento que a Prefeitura Municipal começou a negociar o convênio que viabilizaria a
construção do primeiro hospital público de Betim. Essa construção começou já no
início da década de 90, quando também se construiu a maternidade pública municipal
e se negociou com as instâncias estadual e federal para que Betim pudesse assumir a
gestão semi-plena de seu sistema de saúde, o que aconteceu em 1993.
Os anos 90 foram o período de implantação e consolidação de um sistema de
saúde em Betim. Em 1994, levantamentos diagnósticos apontavam que o princípio da
descentralização ainda não havia sido efetivado e que nem os servidores da saúde nem
os usuários consideravam o atendimento em saúde satisfatório. A Prefeitura elaborou
13 Quando o usuário entrasse em qualquer unidade, esta teria a responsabilidade de encaminhá-lo ao atendimento adequado, quando a necessidade do usuário não fosse da competência da unidade.
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o Plano Municipal de Saúde para 1995-6, que adota os seguintes princípios
orientadores para a saúde municipal: acesso, acolhimento, vínculo14, autonomia e
resolutividade15. O principal problema a ser enfrentado era o do relacionamento do
profissional de saúde com o usuário em estado de sofrimento.
Houve diagnóstico do perfil da saúde da população betinense. As doenças
respiratórias respondiam pela maior parte dos atendimentos na rede pública,
decorrência do clima e da poluição atmosférica. Das conclusões gerais desse
diagnóstico, decorreu que o governo deveria investir prioritariamente sobre as
doenças parasitárias, sobre a hanseníase, a saúde mental e as doenças
cardiovasculares – hipertensão à frente. A saúde bucal do betinense também deixava a
desejar: de cada usuário atendido pelo sistema, era encontrada uma média de cinco
dentes afetados, um índice semelhante ao da população nordestina na mesma época.
O diagnóstico revela que o município já havia atingido uma boa cobertura
vacinal; a situação do saneamento básico ainda era crítica: 80% desta contavam com
abastecimento de água, mas apenas 29% tinham acesso à rede de esgoto; a coleta de
lixo, tanto a domiciliar quanto a de resíduos hospitalares, acontecia três vezes por
semana, sendo que 22 bairros não tinham coleta.
A rede física de saúde de Betim foi praticamente toda reformada e construída
segundo o padrão das políticas de saúde pública. O atendimento em três níveis
(básico, secundário e terciário), sonhado desde meados da década de 80, realizou-se
nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), nas UAI (Unidades de Atendimento Imediato) e
no Hospital Regional e Maternidade Pública Municipal. O atendimento nas
especialidades médicas passou a ser feito na Unidade Divino Braga, foram criados os
Centros de Referência em Saúde Mental do Centro e do Teresópolis (o primeiro já
existia embrionariamente) e o Centro de Referência em Saúde Mental Infantil, além do
Centro de Convivência Cazuza, para as DST/Aids.
Foram municipalizadas as unidades de saúde mantidas em Betim pelo Estado,
por força do processo de municipalização nacional mesmo, e, em 1998, a Secretaria de
14 Sentir-se ligado ao sistema durante todo o tempo do tratamento, sem precisar demandar acesso em cada instância.
15 Alta capacidade de resolução do problema de saúde que gerou a demanda.
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Saúde assumiu a gestão plena do sistema de saúde local. Ainda no começo da década,
ocorreu o primeiro concurso público na área da saúde em Betim.
Nos anos 2000, o sistema de saúde de Betim tem sido reconhecido com
repetidos prêmios extra-municipais. Isso significa que está à frente do que se pratica
em muitos municípios do país, mas não que tenha atingido um nível satisfatório de
atendimento. Os principais problemas estão em que a procura por serviços públicos de
saúde supera em muito a capacidade de absorção do sistema e em que a política de
saúde não é assumida política e profissionalmente pela totalidade dos servidores.
Apesar dos problemas, os indicadores da saúde em Betim estão hoje em alto
patamar. As condições de saneamento básico, que se refletem diretamente na saúde
da população, alcançaram os seguintes índices em 2000: 96,18% da população eram
atendidos pela rede de abastecimento hídrico, 69,21% contavam com rede de esgoto e
95,22 eram atendidos pelo serviço de coleta de lixo.
Caiu significativamente a incidência de doenças reversíveis pelo investimento
no setor de saúde. A mortalidade geral está em 4,8 pessoas por cada mil nascidas
vivas e a mortalidade infantil baixou de 54,3 para 16,6 por mil nascidas vivas em 15
anos. Em 2002, Betim alcançou o índice de 3,01 consultas médicas por habitante/ano,
acima do recomendado pelo Ministério da Saúde (2 a 3 consultas por habitante/ano).
A expansão da rede de saúde teve continuidade, paralelamente ao
investimento em humanização. Novas unidades de saúde foram implantadas: Centro de
Referência em Habilitação “Anderson Gomes de Freitas”; Centro de Convivência
“Estação dos Sonhos”, para pacientes da saúde mental; Casa Lar, no Angola, que é um
lar abrigado para pacientes aposentados da saúde mental; finalmente, foi inaugurada
a nova UBS Teresópolis.
3.5. Educação
Setores da localidade de Capela Nova do Betim começam a se organizar para
reivindicar instrução escolar formal em 1832. Em 1838, começa a funcionar a primeira
escola de instrução primária (uma “aula”) ministrada pelo professor Francisco de Paula
Rodrigues. Esta primeira instituição escolar chamou-se Escola da Capela Nova de
Betim, criada por portaria de 18 de fevereiro de 1838.
Os primeiros professores, depois do pioneiro, foram: José Gonçalves do Amaral,
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Francisco de Paula Rodrigues Júnior, que teve uma carreira de 15 anos no magistério
de Betim, até se aposentar, João Gonçalves Martins, que sofreu boicote da população
capelanovense, inconformada com a saída de Francisco Júnior, Joaquim Primo da
Rocha, Augusto César Neves Murta, Joaquim Antônio da Fonseca, Symphronio de Souza
e Silva e Pedro d'Assis Xavier e Paula Júnior, o Mestre Pedro, considerado o mais
erudito professor capelanovense desta primeira “safra”.
As primeiras professoras foram Maria Augusta das Dores Maia, Amélia Zeferino
de Freitas Moreira, Rita Carolina de Jesus, professora leiga, que assumiu a cadeira
feminina em 1882, ministrando um ensino mais intuitivo e sendo, por isso,
questionada pela inspetoria, que já exigia formação técnica para professores. Ao longo
do século XX, Betim conheceu outras educadoras tradicionais para a memória local, já
num contexto de feminização do magistério. A mais conhecida delas, Josephina Bento
nasceu em Ouro Preto, 1903, onde estudou. Em Betim, lecionou primeiro em Santo
Afonso (1926-1929), e depois no Afonso Pena (1929-57), onde se aposentou.
Em 1850, é criada uma cadeira de ensino masculino de primeiro grau em Betim
o que aumenta a escolaridade de alguns betinenses para o equivalente aos oito anos
de escolaridade obrigatória atuais. A cadeira só foi ocupada em 1853, por Francisco de
Paula Rodrigues Júnior, filho do primeiro professor. A demora no preenchimento do
posto se deveu ao fato de que havia poucos professores qualificados e o concurso
necessário para preencher as vagas era muito rigoroso. Em 1854, dos 130 alunos
matriculados na aula de Francisco de Paula Rodrigues, apenas dois eram mulheres.
A legislação brasileira determinava a existência de instrução formal feminina a
partir de 1867 e, anteriormente, já permitia o ensino misto, que era rejeitado pelos
pais. Por isso, Antônio D'Assis Martins, quando deputado, solicitou escola feminina
para Betim (1872).
A partir de 1886, ocorrem ações de descentralização do acesso ao ensino: é
criada uma cadeira de ensino elementar em Pimentas; em 1890, cria-se a cadeira de
ensino do Engenho Seco; em 1901, o mesmo ocorre na localidade de Jacaré. Em 1921,
surge a primeira escola mista de Betim, em Bandeirinhas, seguida, em 1933, pela
escola mista de Vianópolis. Estas escolas foram os primeiros núcleos das atuais E. M.
Barão do Rio Branco e E. M. José Salustiano Lara.
Nos anos 40, proliferam escolas rurais e nos bairros mais populosos, e surge a
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primeira escola noturna, no bairro PTB, núcleo da atual E. M. Raul Soares. O
surgimento desta última escola não é fortuito: o bairro PTB nasceu como bairro
operário, e sua população, conseqüentemente, demandava uma escolarização fora dos
horários de trabalho.
Em 17 de julho de 1910, foi inaugurado o primeiro grupo escolar de Betim,
criado por Decreto de 02/01/1910, que recebeu a denominação de Grupo Escolar de
Capela Nova, depois Conselheiro Afonso Pena, e instalou-se no prédio onde hoje está
o Museu Paulo Gontijo. A construção do primeiro prédio deu-se pelo consórcio de
recursos públicos e privados.
Em 1957, instala-se em Betim a Fundação Nossa Senhora do Carmo,
responsável pelo primeiro ginásio betinense, o Ginásio Nossa Senhora do Carmo de
Betim, núcleo da atual E. E. Nossa Senhora do Carmo, então instituição de caráter
privado, isto é, mantida pelas mensalidades dos alunos.
O segundo Ginásio, primeiramente denominado Lia Salgado, foi inaugurado em
1958 pela Professora Haydée Matos Martins, funcionando provisoriamente e sendo
mantido pela Fundação Padre Rocha. Em 1964, D. Lia Salgado, esposa do então
governador de Minas Gerais, utilizando uma verba da qual as primeiras-damas
dispunham para fomentar a cultura, construiu um novo prédio para o Ginásio, que
recebeu o nome de Clóvis Salgado, permanecendo sob a responsabilidade do Estado
até os anos 2000, quando foi municipalizada. O antigo prédio dessa escola continuou
abrigando instituições educativas e culturais, até a atualidade, quando ali funciona a
Biblioteca Pública Municipal.
O Colégio Estadual de Betim iniciou suas atividades em 1965, com 430 alunos,
tendo como principal expoente da equipe de fundadores o professor Raphael Martins.
Denominado posteriormente Colégio Normal Oficial de Betim, devido a ter instalado o
Curso Normal para formação de professores, em 1975, o Colégio tinha 1.300 alunos e
45 professores.
O primeiro ginásio municipal, denominado Ginásio Municipal de Betim, hoje
Escola Municipal Raul Saraiva Ribeiro, foi criado em 1969 e mantido por recursos
públicos e privados visto que, naquele período, era incomum que municípios
mantivessem ginásios. Funcionou em seus dois primeiros anos no antigo prédio do
Grupo Escolar, tendo sua sede própria, onde se encontra até a atualidade, inaugurada
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em 1972. Em 1975, lei municipal mudou o nome da instituição para Autarquia Escola
Municipal Raul Saraiva Ribeiro, o que lhe permitia oferecer séries além do primeiro
grau.
A primeira grande iniciativa de ensino profissionalizante em Betim foi o Centro
Educacional de Betim, construído pela Legião dos Oblatos de Cristo Sacerdote e Nossa
Senhora das Vitórias, instituição sediada em Lagoa Santa. A instalação da escola em
Betim deu-se graças à doação de terreno pela Prefeitura em 1957 e à liberação de uma
grande soma pelo Ministério da Educação e Cultura. É interessante observar que essa
iniciativa foi contemporânea da industrialização em Betim e certamente tinha em
vista a qualificação profissional para a indústria. Porém não teve sucesso e o prédio
foi assumido pelo município.
Outra importante iniciativa de ensino profissionalizante foi o Colégio Comercial
Betinense. Criado em 1963 e inaugurado em 1964, com 25 alunos, ocupou o antigo
prédio do Grupo Escolar.
A primeira escola de educação infantil de Betim foi instalada em 1959, em
terreno doado pela Prefeitura, e recebeu o nome de Jardim de Infância Menino Jesus
de Betim, instituição privada. Em 1964, foi fundada a Escola Nossa Senhora da
Assunção, instituição privada, por Ester Assunção, discípula de Helena Antipoff, para
atender pessoas com deficiências.
As décadas de 70, 80 e 90 constituíram, principalmente, um período de
expansão e busca da universalização do acesso à escola básica em Betim. O processo
de municipalização fez com que a Rede Municipal ultrapassasse, em extensão, a Rede
Estadual. Praticamente universalizados o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, Betim
agora trabalha os seguintes desafios: universalização da Educação Infantil; correção
do fluxo dos estudantes no sistema, combatendo a reprovação e a evasão; elevação da
qualidade do ensino, buscando, nesse momento, a alfabetização de todos os
estudantes.
3.6. Cultura
Os registros sobre a vida cultural em Betim são escassos para períodos
anteriores ao século XX, exceto quanto à vida religiosa. Esta, predominantemente
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articulada ao catolicismo, foi intensa e bastante bem registrada. Graças a isso,
preservaram-se os primeiros registros relativos à Irmandade de Nossa Senhora do
Rosário e a suas atividades desde 1814.
Embora não haja registros sistemáticos ainda, sabemos que as folias de reis
também eram importantes manifestações, queridas e lembradas pela população. A
Folia de Reis de Santo Afonso, uma das primeiras a ser estudada na cidade, remonta a
1920.
Nas primeiras décadas do século XX, a cidade já contava com uma vida cultural
mais secular, a exemplo de salas de cinema, sendo a primeira delas mantida por Thiers
do Bom Conselho, na atual Rua Dr. Gravatá, e a mais importante delas, localizada na
atual Praça Tiradentes, foi mantida pela família Marcelino até as últimas décadas do
século XX. O cinema constituía uma efervescência em seu entorno, enquanto se
esperavam as sessões, promovendo o encontro entre os jovens.
Em meados do século XX, na atual região central da cidade, a vida cultural
estava muito articulada a dois tradicionais clubes desportivos e sociais: o Industrial e
o Vera Cruz. Estes mantinham sedes no centro e promoviam concorridos bailes, além
de movimentarem a população, dividindo-a em torcidas para os times de futebol,
ativos e importantes até a atualidade.
Também o carnaval foi uma importante manifestação cultural em Betim, entre
as décadas de 70 e 90, especialmente na configuração dos blocos carnavalescos e das
escolas de samba. O primeiro concurso de escolas de samba em Betim aconteceu em
1977, tendo como participantes os times Industrial, Democrata, Sete e São Cristóvão,
e a Escola Raul Saraiva. O Sete sagrou-se campeão. Nos próximos concursos, foram
campeões: Capela Nova (1978), Sete (1980), Cartolas (1981), Arco-Íris (1982), Capela
Nova (1987) e Sete (1990).
Os núcleos carnavalescos pioneiros, também os primeiros a se organizarem em
escolas de samba, foram Os Cartolas, os Unidos do Samba Sete, os Unidos de
Citrolândia e a Arco-Íris. Já no final dos anos 70, estes grupos movimentavam, por
iniciativa própria, o carnaval da cidade.
O bloco carnavalesco mais tradicional da cidade é o Virgens do Rodô, fundado
por sócios do Clube Atlético Rodoviário, também um dos pioneiros do município.
Criado em 1984 e ativo desde então, o bloco explora o humor através do desfile de
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homens vestidos de mulheres.
Um importante lugar de cultura em Betim, em meados do século XX, foi a então
Colônia Santa Izabel. Fundada nos anos 1930 para segregar pessoas atingidas pela
hanseníase, estas ali articularam importantes manifestações culturais, também
estimuladas pela concepção urbanística da colônia e pelos equipamentos públicos
disponíveis. A vivência da música, do teatro e do cinema no Cine Teatro Glória é muito
lembrada. Clubes de futebol também ali se desenvolveram, assim como despontaram
na colônia importantes artistas plásticos e compositores.
O Coral Tangarás de Santa Izabel é o mais antigo grupo cultural da colônia
ainda ativo. Fundado em 1936 e ligado à Paróquia de Santa Izabel, começou como
uma iniciativa do Frei Chico (Francisco Van Der Poel), possuindo hoje fortes raízes
comunitárias. O coral mantém uma média de 40 cantores entre 16 e 70 anos e possui
um acervo de cerca de 200 partituras, entre elas várias compostas por compositores da
própria colônia, além dos instrumentos que o acompanham.
Um dos mais importantes e antigos grupos culturais da cidade tem sido a
Corporação Musical Nossa Senhora do Carmo, tradicional banda de música, fundada em
1903. Passando por importantes mudanças conceituais ao longo do último século, a
banda continua abrilhantando os principais eventos públicos no município e é
fartamente premiada nos encontros de grupos afins em diversas regiões de Minas
Gerais e do país.
Há cerca de 50 anos, surgem os dois principais centros de cultura privados
radicados no município: o Salão do Encontro e a Missão Ramacrisna. Implantados nas
comunidades da Regional Norte e da Regional Vianópolis, respectivamente, têm ali
desenvolvido importantes atividades de articulação e formação das comunidades.
Ambos alcançaram projeção internacional.
A partir dos anos 80, a Prefeitura Municipal começa a desenvolver políticas
públicas na área da cultura. É criada a Fundação Artístico Cultural de Betim e seu
primeiro centro cultural, a Casa da Cultura Josephina Bento. Ao longo dos anos 90 e
2000, a Funarbe expande suas ações no território municipal, mantendo atualmente
onze centros culturais, entre bibliotecas e centros de formação e de memória. É
também nesse momento que a cidade cresce demograficamente e diferentes grupos e
manifestações culturais ganham visibilidade. Surgem, por exemplo, o Coral da Casa da
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
45
Cultura (1988) e depois o Coral Canto Livre, a Associação Betinense de Letras (1986) e
a Companhia de Dança Para-folclórica Capela Nova (1991). A importante atividade de
produção artesanal da cidade é organizada em feiras, uma política ainda descontínua,
mas bastante visível na cidade nas últimas décadas. Emergem as grandes festas
populares organizadas pela Prefeitura Municipal, a exemplo do Betim Rural e da Feira
da Paz. Multiplicam-se casas noturnas, bares e centros culturais privados, onde a
cidade vive a sua sociabilidade.
3.7. O epicentro geográfico do Reinado de Nossa Senhora do Rosário
O bairro Angola, onde está implantada a Capela de Nossa Senhora do Rosário,
formou-se e desenvolveu-se juntamente com o próprio templo, ao longo do século XIX.
A memória coletiva local compartilha a informação de que os escravizados e os
afrodescendentes em geral só tinham permissão para morar do outro lado do rio
Betim, onde exatamente está o bairro Angola. Assim, o atual centro da cidade ficava
reservado exclusivamente aos senhores. O nome do bairro deve-se, portanto, aos
responsáveis por sua primitiva ocupação.
Há rumores de que o bairro Angola abrigou quilombos, não havendo ainda
registros precisos quanto a isso. De qualquer maneira, uma significativa população
afrodescendente radicou-se na região e ali se encontram até a atualidade importantes
manifestações dessa população, como guardas de congado e terreiros de umbanda e
candomblé.
A Capela de Nossa Senhora do Rosário foi construída ao longo de um século,
entre 1814 e 1897, com subscrições da comunidade afrodescendente e doações,
conforme melhor descrito e analisado em outro item desse dossiê. Posicionada no
local mais alto do bairro Angola, como manda a tradição do Rosário, a Capela é a
única edificação oitocentista remanescente nessa região. No século XX, a região
recebeu novas camadas de ocupação, manifestas em importantes edificações
modernistas e art déco, e foi uma espécie de epicentro educacional da cidade. Ali
floresceu a educação popular (Grupo Escolar Sarah Kubitschek, conhecido como Escola
da Gilda), os primeiros ginásios (Clóvis Salgado e Nossa Senhora do Carmo) e a
primeira escola profissionalizante do município (atual CETAP). Ainda hoje, estas
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
46
escolas estão implantadas na região e, reiterando esta vocação, também a primeira
universidade implantada no município, em 1996, a Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais.
De vocação ainda eminentemente residencial, o Angola, dada sua atual
proximidade do hipercentro da cidade, vem diversificando suas atividades, recebendo
um grande aporte de moradias estudantis temporárias e os serviços a elas associados,
além do comércio.
4. O Reinado de Nossa
Senhora do Rosário de
Betim – uma história
O Congado ou Reinado é considerado uma manifestação cultural específica do
sudeste brasileiro, apesar de ocorrer em várias regiões do país, tendo surgido em
Minas Gerais já no alvorecer do século XVIII. Em Betim, os registros escritos começam
a ocorrer a partir de 1814, e se referem à existência da Irmandade de N. Sra. do
Rosário dos Homens Pretos de Betim e da construção de sua Capela.
Durante o período colonial, todos os habitantes procuravam filiar-se a alguma
comunidade ou irmandade católica, pois só assim teriam acesso aos ritos sócio-
religiosos básicos, como os registros de nascimento, casamento e óbito, bem como
acesso a uma sepultura cristã digna, visto os cemitérios estarem localizados nos
terrenos religiosos. As irmandades eram também grupos de poder e, não raro,
competiam entre si através da construção de templos majestosos, dos quais temos
exemplares frente-a-frente ou lado-a-lado nas chamadas cidades históricas mineiras.
Também os negros sentiam necessidade de organizar irmandades, que o eram,
primordialmente, segundo critérios étnicos. Há notícias de irmandades negras desde o
século XVI em Portugal.
Sobre a Festa de N. Sra. do Rosário de Betim propriamente dita, registros
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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escritos são raros e fazemos uso da memória social acessada através de fontes orais.
Sabe-se, por exemplo, que, até 1927, os congadeiros betinenses praticavam a
“Contradança”, antiga tradição popular afro-luso-brasileira. Eram formados 12 pares de
homens, sendo que, em cada par, um se vestia de mulher. Há uma referência, nesta
festa, aos 12 Pares de França, o que reforça as primitivas ligações entre o Reinado e as
festas representativas do embate entre cristãos e mouros, a exemplo das cavalhadas. A
festa ocorria nos dias 15 e 16 de junho e sua culminância se dava no pátio da Igreja
do Rosário (FONSECA, 1975). É provável que a Festa de N. Sra. do Rosário tenha
atravessado o século XIX e enfraquecido bastante na primeira metade do século XX16. É
em meados desse século que emerge o patriarca dos congadeiros betinenses, Joaquim
Nicolau.
Joaquim Nicolau, oriundo de Itaúna, foi grande liderança das festividades
religiosas de caráter afro-brasileiro em Vianópolis (regional administrativa de Betim),
como foi o caso do congado e das folias de reis. Nascido em 1876, na verdade se
chamava Joaquim Teodoro da Silva e só obteve registro civil aos 17 anos. Por isso, ao
falecer, com 111 anos, em 1987, oficialmente contava a idade de 94 anos. Era casado
com Ana Firmina de Jesus que, como Joaquim Nicolau, vinha de família ligada ao
Rosário. “Quando solteiro, fundou o reinado em Vianópolis, sendo seu capitão-mor
quando mudou para o centro de Betim e aí levantou, em 1954, o reinado que esteve
parado por 45 anos, devido à morte do seu antigo capitão” (PITANGUI, 1996, p. 10).
Segundo o atual Capitão Pé-da-coroa, S. Dalmo de Assis Martins, Joaquim
Nicolau participou, com seu pai, da construção da Capela de Nossa Senhora do Rosário
de Betim, na década de 1890:
O pai de Joaquim Nicolau é que foi o responsável por trazer a festa para o centro de Betim e o filho deu continuidade... Olha, que eu me lembre conversando com Sr. Joaquim é que foi o pai dele, não lembro o nome dele agora, é que trouxe o reino do rosário para Vianópolis e para Betim. (...) Então ele falou que o pai era escravo e estava próximo de acabar a escravidão. Seu Joaquim tinha 18 anos de idade nessa época, e ajudou o pai a construir a Capela, junto com outros escravos. O pai começou e S. Joaquim deu prosseguimento. Hoje muitos falam que foi S. Joaquim, mas S. Joaquim deu prosseguimento o que o pai começou. (Dalmo de Assis Martins, 12/12/09)
16 Época em que, inclusive, sofreu interdições da Igreja Católica regional.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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A continuidade das pesquisas sobre a história do Reinado em Betim deve
buscar precisar o papel da família de Joaquim Nicolau no século XIX. De qualquer
maneira, o Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim estava sediado, na primeira
metade do novecentos, em Vianópolis. Num primeiro momento, ao que consta, a festa
era realizada nas imediações de um cruzeiro.
Nos anos 40, Joaquim Nicolau vivia nas proximidades da ferrovia e da capela,
da qual cuidava depois de ter ajudado a construir. Aliás, o próprio terreno no qual se
situava a capela foi doado à Igreja por Joaquim Nicolau:
Saibam quantos este publico instrumento de escriptura virem que, no ano de nascimento de Nosso Senhôr Jesus Christo, de mil novecentos e trinta e oito (1938) aos cinco (5) dias do mez de Outubro, em meu cartório, neste distrito de Betim, município de Santa Quiteria, Comarca de Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, perante mim tabelião, compareceram partes entre si justas e contratadas, a saber: de um lado, como outorgante doador, o Snr. Joaquim Thêodoro da Silva, proprietário, residente em Vianopolis e do outro lado, como outorgado recebedora, a igreja situada em Vianopolis, neste distrito, representada pelo Snr. Padre Osorio de Oliveira Braga, (...). E logo pelo outorgante doador, foi dito a mim tabelião, que é senhor e legitimo possuidor de dois hectares e quarenta e dois ares (2,42) de terra situada em Vianopolis que adquirida por doação de José da Silva Luria e sua mulher, conforme documento apresentado a mim tabelião e todos os presentes. Possuindo pois o outorgante o referido immovel livre e desembaraçado de quaesquer ônus judiciaes ou extra judiciaes, (...) resolveu doal-o como de fato doado o tem á igreja de Vianopolis para patrimônio desta, (...) no valor de setecentos mil réis (700$000). (Jacy Silva, tabelião, Livro de notas nº 7 – Fls. 13 verso a 14v. Livro de Chancelaria da Paróquia de N. Sra. do Carmo. Arquivo da Cúria Metropolitana de Belo Horizonte).
Para garantir o Reinado do Rosário em Vianópolis, montou duas guardas, uma
de congo e uma de moçambique. As demais guardas que compunham a festa vinham
de municípios vizinhos e ficavam hospedadas na casa de Joaquim Nicolau. Ana Firmina
e suas filhas cuidavam das roupas do congado e da alimentação e acomodação dos
congadeiros.
A celebração é lembrada até hoje pela população de Vianópolis como o ponto
alto do calendário festivo regional. Elvira Cândida Ferino, 81, que nos informou sobre
a atuação de Joaquim Nicolau em Vianópolis, diz: “Nós ficava numa alegria quando
acontecia a festa, porque aqui não tinha nada!”
Quando Joaquim Nicolau mudou-se da região, nos anos 50, o Reinado de Nossa
Senhora do Rosário foi enfraquecendo até ser desativado. Nos anos 80, a comunidade
o reativou, porém reformas na Capela tornaram impossíveis as evoluções das guardas
no seu entorno, voltando a festa a ser desativada. A região, entretanto, detém
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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diversos congadeiros, entre eles os principais reis e rainhas atuantes hoje no Reinado
da região central, como Antônio Henrique Félix, 76, e Maria José da Conceição Félix,
70, atualmente rei e rainha de frente da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do
Rosário e que começaram a dançar com Joaquim Nicolau; e também músicos, como o
Sr. Durvalino Lúcio Moreira (Dorva), 71, cuja família atuou nas guardas de Joaquim
Nicolau.
Além do congado, Joaquim Nicolau também liderava folias de reis, tendo
atuado na Folia de Santo Afonso, ativa até a atualidade. É lembrado, tanto pelos
congadeiros quanto pelos foliões, como uma liderança firme e exigente nas tradições.
Suas guardas de congado, por exemplo, deviam ser sempre organizadas em filas; no
centro, apenas podiam ficar os capitães. Os dois dias de culminância da festa do
Rosário, um sábado e um domingo de agosto, eram uma maratona para a guarda de
Joaquim Nicolau:
De casa, no Teixeirinha, a guarda ia batendo até a igreja para levantar a bandeira. Voltava batendo até a casa, onde o vô dava café à turma. Então, ia de novo batendo, até a capela, para as matinas (Airton Lourenço dos Santos, neto de Joaquim Nicolau, 27/07/09). Hoje em dia, o pessoal não sabe que a festa do Rosário é de rua. Todo mundo só quer andar de carro (Luci Lourenço dos Santos, nora de Joaquim Nicolau, 27/07/09).
Joaquim Nicolau teve 12 filhos, que foram criados nas tradições do Rosário. Ao
se mudar para a região central de Betim, vivendo em diversos bairros, dentre eles
Teixeirinha, Chácara e Santa Inês, uniu-se a João Belarmino, que tentava reativar a
Festa do Rosário, sem sucesso, e, juntos, obtiveram esse intento. Apesar de ter se
mudado para São Joaquim de Bicas por um período de quatro anos, Joaquim Nicolau
permaneceu na liderança do Reinado do Rosário de Betim até o ano anterior à sua
morte. Em 1986, já bastante doente, apenas pôde ficar sentado, e assim recebeu os
cumprimentos especiais de todas as guardas.
Era difícil o vô chorar. Mas, nesse dia, eu vi ele chorar. (Airton Lourenço dos Santos, neto, 27/07/09).
A Capitã-Regente do Reinado e Vice-presidente da Irmandade sintetiza a
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
50
história da celebração em Betim nos anos 60 e 70, tendo ela chegado a esta cidade
em 1958:
Aí vim e aqui logo depois que eu cheguei, durou pouco e [meu pai] morreu e eu casei e fiquei e os outros [irmãos] voltaram pro Rio e aí eu casei, mas eu já acompanhava o congado, eu era solteira e já acompanhava eles. Aí deu uma parada, muito tempo ficou parado, parava e voltava; aí Seu Joaquim Nicolau mudou pra Bicas e eu sempre arrumava o andor e aí ele buscava o andor aqui na casa da Dona do Zé Chofer, aí a gente arrumava e ele levava pra Bicas; aí ele voltou pra cá e continuou a festa aqui, mas ele saía de lá, ele arrumava e a gente [o] buscava. Só que nós tínhamos uma rainha conga que vinha ajudar a fazer a festa, tinha Dona Elvira ou Olivia, confundo esses dois nomes, e tinha a rainha de promessas que era Dona Maria, chamava ela de Maria Preta; tinha Dona Efigênia que era rainha, tudo do tempo do Seu Joaquim Nicolau; vinha madrinha Ana, que era rainha perpétua, que essas 3 rainhas faziam a festa. Aí eles voltaram a parar, aí apareceu um Frei, Frei Cristovão aí [anos 1970], e o Frei Cristovão convidou Israel pra levantar de novo o congado, aí Israel juntou com a Edilca, Dona Lurdes, Zé Cheiroso, aí voltou com o congado e eu só ajudava por fora, porque eu tava criando naquele tempo, era muito menino e eu só ajudava por fora, aí a festa tomou pé, foi ficando, eram duas guardas só, uma guarda de congo do seu João Belarmino que hoje é do Raimundinho e uma guarda de moçambique que era de Seu Joaquim Nicolau, que o filho dele tomou a frente e morreu também. (Maria Ladyr Laranjeira de Melo, 15/12/09).
Joaquim dos Santos Rosário, seu filho, deu continuidade à guarda de
moçambique do patriarca por oito anos, depois passando-a a José Teodoro, que
permaneceu na liderança apenas durante dois anos, apesar de ser tão lembrado pelas
lideranças atuais. A guarda de Joaquim Nicolau, então, em 1997, passou às mãos de
Mário de Paula, integrante que despontava no interior da mesma, e este permaneceu
como capitão até sua morte, em 2008. A transmissão da liderança da guarda ao Sr.
Mário foi feita por Sebastião Pereira (o Tião Medonho), em cerimônia pública durante
a Festa do Rosário, documentada em registro audiovisual anexado a este dossiê.
Atualmente, essa guarda vem sendo conduzida pela viúva do Sr. Mário, D. Ernestina e
pelo 1º Capitão Ueverson Leandro Basílio de Paula.
A família de Joaquim Nicolau afastou-se um pouco do congado, até que o
marido de sua neta Lucilene, José Lúcio Nunes, reunindo descendentes do patriarca
em Betim e Itaúna, montou nova guarda de Moçambique, em 2005.
Desde a intervenção renovadora de Joaquim Nicolau, as guardas do congado
betinense vêm se originando umas no interior das outras. Duas guardas foram criadas
durante a sua liderança, além da que ele próprio mantinha: José Carrero fundou e
depois João Belarmino manteve uma guarda de Congo; e Geralda Soares Diniz, filha de
Joaquim Nicolau, tinha uma guarda de São Benedito. A guarda de José Carrero/João
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
51
Belarmino continua ativa até hoje, tendo como capitão Raimundo Moreira Barbosa (S.
Raimundinho).
Neste momento, a guarda de João Belarmino, devido à sua morte, já havia passado para o Sr. Raimundinho, sendo que depois o Sr. Dalmo fundou uma guarda de Moçambique, D. Neném outra também de Moçambique e Tião Medonho, que tinha sido capitão da guarda de São Benedito de D. Geralda, formou uma de marujo e, posteriormente, uma guarda-mirim (PITANGUI, 1996, p. 11).
S. Raimundinho começou a participar da guarda de João Belarmino como
frente-de-guia, passando depois a caixeiro, e foi designado capitão por Joaquim
Nicolau, quando da morte de João Belarmino. A guarda é composta principalmente
pela família de S. Raimundinho (ver entrevista com este protagonista, transcrita, em
anexo) e seus dançantes mais tradicionais, da época de João Belarmino, abandonaram
a guarda após uma disputa pela liderança entre S. Raimundinho e Antônio Isidoro (S.
Nico).
Segundo S. Raimundinho, S. Nico não pôde assumir a liderança da guarda
porque sua esposa não permitia isso (as mulheres têm diversos papéis no Reinado,
dentre eles receber a guarda em sua casa, preparar alimentação e cuidar da
indumentária). Então, S. Nico saía com a guarda para outras cidades, como seu
capitão, até que uma das cidades visitadas pediu que a guarda fosse ali registrada,
para ser frequentemente convidada. Não podendo registrar a guarda em seu nome, S,
Nico teria se retirado, ressentido, e, com ele, vários dos melhores dançantes teriam
também deixado a guarda.
Desde então, S. Raimundinho mantém a guarda especialmente com familiares,
e dela já se desmembraram pequenos grupos que hoje compõem a guarda de
moçambique liderada hoje por seu neto, o Capitão Ednilton e as guardas de congo de
D. Euli (mãinha) e de Efigênia.
A Guarda de Moçambique do Divino Espírito Santo, do Capitão Edinilton foi
fundada por D. Euli Ricardo Faria, que dela desistiu e fundou a Guarda de Congo de
São Judas Tadeu, em maio de 2006. Ela conheceu a Guarda do Sr. Raimundinho
através de visitas, participando das festas e, com o passar do tempo, resolveu fundar
sua própria guarda.
O Capitão da Guarda de Congo São Judas Tadeu, Davidson, também é neto do
Sr. Raimundinho. Sobre a fundação da mesma, temos:
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
52
Aí, como aqui no Citrolândia tava muito abandonado, todo mundo acha que no Citrolândia só era hanseníase ou era bandido, aí a gente começou a puxar a cultura pra cá, aí foi um meio que a gente achou, já que a mãe mexia [com Reinado] desde criança. (Adriana Faria, 16/12/09)
A guarda de Maria Izidora Manine, D. Neném, continua ativa, hoje liderada
pelo Capitão Swami dos Santos Silva, assim como a de Sebastião Pereira, o Tião
Medonho, liderada por sua esposa, Zélia Ricardo Pereira, e seu filho, o 1º Capitão
Arlen Ricardo Pereira.
Sebastião Pereira começou no congado com Joaquim Nicolau e depois com sua
filha Geralda, mas já era descendente de um tradicional congadeiro de São João Del
Rei. Formou sua própria guarda na Paróquia de Santa Isabel, nas Alterosas, de onde
veio seu padroeiro, São João Bosco. Como o padre dessa paróquia não era muito
simpático ao Reinado, Tião transferiu-se para o Parque das Indústrias, onde a guarda
foi acolhida pela igreja e teve continuidade.
Nos anos 1990, Tião Medonho foi a principal liderança do Reinado de Betim.
Sua forte atuação pode ser observada no registro audiovisual constante desse dossiê.
Com a morte de Sebastião Pereira, em 1999, aos 59 anos, sua guarda guardou luto por
três anos. Seu filho, o atual Capitão Arlen é que liderou a família para levantar a
guarda.
Na época, ele disse: não vamos deixar morrer nada que era do papai (Zélia Ricardo Pereira, viúva de Sebastião Pereira, 27/07/09).
D. Zélia é, desde então, a liderança da guarda, considerando-se a preeminência
dos mais velhos. Ela conta como se aproximou do Reinado:
Eu não gostava muito, achava bonito, mas não gostava não. Eu tinha a mesma impressão que o povo tem hoje de espiritismo. A minha entrada foi promessa para Nossa Senhora. Eu estava grávida e já com seis meses de gravidez, e o médico falou pra tirar (...). Desci a rua afora na Governador Valadares, entrei na Capela, ajoelhei e pedi para Nossa Senhora: a Senhora é mãe, tô nas suas mãos (...). Quando ele completar quatro anos, eu vou vestir ele todo de branquinho e azul e ele vai colocar um buquê de rosas lá em cima no altar de Nossa Senhora (...). E o menino tá aí (...). Aí eu comecei a ir, acompanhando do Tião. (Zélia Ricardo Pereira, 13/12/2009).
S. Dalmo, nascido na localidade de Urucuia, Esmeraldas, declara ser neto de
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
53
africano e diz ter iniciado suas atividades na tradição do congo e na magia ainda
adolescente. Atuando junto a Joaquim Nicolau, que anunciara a S. Dalmo seu futuro
papel como pé-da-coroa, acumulou diversos saberes sobre as tradições e segredos do
“reino do Rosário”. Atraído pelo papel exercido pelo moçambique no Reinado, fundou
sua Guarda de Moçambique e aguardou o momento da assumir a liderança ritual da
atividade em Betim, após José Teodoro e Mário de Paula. Atualmente, S. Dalmo é a
principal liderança conceitual do Reinado, realizando o controle da tradição, e sua
guarda é a mais numerosa.
Margarida Maria da Silva (D. Tita) é natural de Urucânia, próxima à cidade de
Ponte Nova, e declara ser neta de escravos. O avô e a avó participavam de festas
tradicionais na região, como o Bumba Meu Boi e Manta da Beata Santa Catarina. Ela
participava com a família e chegou a ser coroada princesa e rainha da festa. Em Betim
passou a freqüentar a festa nas casas do Sr. Raimundinho, do Sr. José Teodoro e mais
tarde do Sr. Mário.
D. Tita iniciou suas atividades no Reinado de Betim como dançante na guarda
de José Teodoro e depois na do Sr. Mário. Era responsável pelas crianças e, tendo sido
designada capitã, assumiu uma guarda de moçambique mirim que foi a sua primeira
guarda. Em 2001, por sugestão do Sr. Raimundinho, Sr. Dalmo e Sr. Mário, criou a
Guarda de Catupé de Santa Inês e N. Sra. do Rosário, que também admite adultos.
A Guarda de Congo de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Betim,
de Efigênia e do Capitão Aguinaldo, também é uma das mais recentemente criadas no
Reinado de Betim. Originou-se de uma dissidência na guarda do S. Raimundinho, na
qual Efigênia atuava.
A Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Desterro participou de algumas das
últimas celebrações do Reinado em Betim, estando ausente em 2009. Segundo relatos,
é composta por dançantes de Belo Horizonte.
Meio século depois da arrancada de Joaquim Nicolau, Betim tem doze guardas,
conforme a arquitetura abaixo:
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Guarda Capitão/Capitã Bairro
Guarda de Congo de Nossa
Senhora do Rosário
Raimundo Moreira Barbosa Angola
Guarda de Congo São Judas
Tadeu
Davidson Leandro Barbosa
Citrolândia
Guarda de Congo de Nossa
Senhora do Rosário dos Homens
Pretos de Betim
Aguinaldo Antônio de
Oliveira
Jardim Petrópolis
Guarda de Moçambique Nossa
Senhora do Rosário e Santo
Antônio de Pádua
Ueverson Leandro Basílio
de Paulo
Santa Inês
Guarda de Moçambique Nossa
Senhora do Rosário
Dalmo Martins de Assis Jardim Petrópolis
Guarda de Moçambique Divino
Espírito Santo
Ednilton Ambrósio da Silva Angola
Guarda de Moçambique Nossa
Senhora do Desterro (inativa)
Flávio Cristian Dutra Jardim Petrópolis
Guarda de Moçambique de
Nossa Senhora do Rosário
Swami dos Santos Silva Vila Bemge
Guarda de Moçambique de
Santa Efigênia
José Lúcio Nunes Jardim Brasília
Guarda de Marujos São João
Bosco
Arlen Ricardo Pereira
Parque das Indústrias
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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Guarda de Catopés de Santa
Inês
Margarida Maria da Silva Santa Inês
A liderança conceitual e ritual, também conhecida como função de pé-da-coroa
ou guardião da coroa do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim é atualmente
o Sr. Dalmo Martins de Assis. Após Joaquim Nicolau, essa liderança ficou
sucessivamente, com José Teodoro, Tião Medonho e Mário de Paula. José Teodoro
teria dela se afastado bastante rapidamente em decorrência dos efeitos do alcoolismo.
Tião Medonho a desempenhou com grande inspiração nos anos 1990 e Mário de Paula
então assumiu a função até que foi eleito presidente da Irmandade, e então S. Dalmo
a reivindicou para si. Sua presença na função não é uma unanimidade na Irmandade,
embora seja por todos respeitado, por seu domínio dos saberes rituais e grande
seriedade na condução dos assuntos relativos ao Reinado.
A transmissão da liderança é ritual e extremamente significativa para a
manutenção da coesão no interior do grupo. Em Betim, Pitangui (1996, p. 10 e 11)
registrou um depoimento sobre a transmissão da liderança, de Joaquim Nicolau para
José Teodoro:
Antes dele falecer. Nós tava lá no quarto, que ele tava perdendo a fala e o olho já virado já, ele tirou o rosário e pôs no meu pescoço e ficava falando: não pára não. Não pára não. Acenando pra nós assim que não parava. Aí, eu peguei o bastão e pus na mão dele, ele tornou a pôr o bastão na minha mão. Aí, o outro meu sobrinho que é capitão também e o meu irmão de lado. E a sala estava cheia de gente, todo mundo assistindo e ele falando: não pára não. Não pára não. (...) Pediu que não parasse, que nós continuasse e nós continuamos. O ano seguinte, nós fizemos o reinado. (Capitão-mor José Teodoro).
S. Dalmo assumiu essa liderança após uma disputa. Entretanto, ele remete a
Joaquim Nicolau a anunciação de que assumiria o lugar de guardião da coroa, a seu
tempo. Sem a anuência do patriarca, não parece ser possível estar nesse lugar.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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5. O REINADO DE NOSSA
SENHORA DO ROSÁRIO E
SUA RELAÇÃO COM O
MUNICÍPIO DE BETIM
O Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim está um tanto
isolado/desarticulado da totalidade do Município, constituindo o que a equipe técnica
responsável por este estudo convencionou chamar de “paisagem cultural residual”.
Isso significa, para esta equipe, que as manifestações associadas ao Reinado emergem
de forma restrita no cenário urbano, em certas épocas e locais, sendo pouco
compreendidas e apropriadas pela maioria da população.
Historicamente, na cidade, o Reinado já tinha este caráter, tendo enfrentado
diversos obstáculos para sobreviver, inclusive no seio da Igreja Católica, que recolheu
subvenções e patrimônio da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, adicionando-os
ao patrimônio de outros templos/comunidades. Entretanto, em meados do século XX,
especialmente em sua primeira metade, a acolhida da população aos festejos de
culminância do Reinado era muito calorosa, tanto no centro da cidade quanto em
Vianópolis e em Citrolândia, que têm sido importantes lugares de atuação dessa
manifestação. As pesquisas que utilizam a metodologia da história oral na cidade
registram uma memória afetiva do congado como momento alto no calendário cultural
das comunidades.
O relativo isolamento do Reinado de Nossa Senhora do Rosário no contexto
municipal vem se constituindo especialmente nas últimas décadas, no âmbito das
intensas modificações que atingem a vida urbana e a própria manifestação cultural.
Fatores como a preeminência do tempo do trabalho sobre os outros tempos da vida,
ou o controle do tempo do trabalho pelos empregadores, a urbanização e a
diversificação religiosa, com a emergência dos movimentos pentecostais, têm afetado
a vitalidade da celebração.
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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Há relatos de experiências de rejeição e preconceitos em relação aos ritos
associados ao Reinado por seus próprios protagonistas. Em 01 de agosto de 2009, a
FUNARBE organizou uma manifestação de guardas durante a inauguração do Centro
Popular de Cultura Joaquim Nicolau, no bairro Marimbá, na regional administrativa
Vianópolis, onde o Reinado foi ativo e forte entre os anos 30 e 80. As pesquisas na
região demonstravam a reminiscência afetiva do Reinado entre os agentes de
memória, pessoas idosas. Ladyr Laranjeira de Melo, capitã-regente, e Elisa Mota
Marques, secretária da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, relataram um
repentino esvaziamento do público do evento durante a apresentação das guardas,
especialmente entre os jovens. Segundo elas, as pessoas manifestavam medo e se
referiam ao Reinado como ligado ao “mal”.
Os eventos relacionados ao Reinado de Nossa Senhora do Rosário em Betim
têm pouco público entre as pessoas não-iniciadas. As próprias guardas locais e os
grupos convidados de outros municípios é que constituem o público. A novena
realizada nos dias que antecedem à culminância da celebração tem público convidado:
comunidades religiosas dos bairros do entorno da Capela de Nossa Senhora do Rosário
se responsabilizam pelas celebrações de cada dia novena. Após cada celebração
religiosa, quando são hasteadas bandeiras e as guardas fazem evolução no adro, o
público não ultrapassa poucas dezenas de pessoas.
Os cortejos organizados pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, para o
traslado de imagens ou procissões, apenas mobilizam público quando realizadas no
bairro Angola, local de significativa concentração de afrodescendentes em Betim, e
que tem vivido, anualmente, a experiência da passagem das guardas. É fator desse
fenômeno o fato de que as guardas de Betim não mais se dirigem a pé para suas
atividades, e sim em ônibus.
Algumas guardas realizam festas dedicadas aos seus santos de devoção nas
comunidades em que estão implantadas. É o caso da Guarda de Marujos São João
Bosco e da Guarda de Catopés Santa Inês (Festa de Santa Inês e Nossa Senhora do
Rosário, a 21 de janeiro). Nessas festas, estabelece-se uma importante relação com os
públicos localizados da cidade
Outra forma de contato dos protagonistas do Reinado de Nossa Senhora do
Rosário com a população do Município é a prática das visitas ou apresentações em
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eventos públicos e em atividades escolares. Apesar de estas serem importantes para
tornar mais legível essa manifestação à população local, é evidente que elas
promovem uma descontextualização, uma folclorização e uma didatização dos ritos
associados ao Reinado, adquirindo mais uma função de “abrilhantar” os eventos. Está
aqui compreendida também a espetacularização do Reinado ou Congado e sua redução
a objeto de consumo cultural.
Vale a pena também descrever as relações dos protagonistas do Reinado de
Nossa Senhora do Rosário com a mídia e com grupos político-partidários. As lideranças
da Irmandade mantêm relações constantes com as principais mídias locais, e nelas
buscam veicular a divulgação do Reinado, bem como matérias educativas sobre a
festa. Reivindicam que a Prefeitura desenvolva uma campanha de divulgação extensa,
quando o Reinado se aproxima. E mantêm vínculos com vereadores e diversos setores
do poder executivo municipal, junto aos quais buscam transporte para a visita a outras
celebrações do Rosário, patrocínio para as festas dedicadas aos santos de devoção,
dentre outras.
As relações com a mídia são importantes formas de pressão sobre o poder
público, conforme a fala de S. Raimundinho:
Isso começou [o patrocínio da Prefeitura Municipal], isso foi quando, não lembro não, isso foi quando Saulo Laranjeira pegou a minha guarda e levou em Belo Horizonte. Aí nós passou na televisão pela primeira vez e saiu no jornal, nós não tinha ajuda de Casa da Cultura, foi no tempo da Maria do Carmo me parece. Foi no tempo dela, no primeiro mandato dela. Eu fui para Belo Horizonte, eu fui com a minha guarda, nós fomos lá em Belo Horizonte, no Saulo Laranjeira, ai passamo na televisão! E no Jornal. Daí pra cá a Funarbe tomou conta de ajudar nós (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09)
Para além das especificidades das relações entre o Reinado e o Município, é
importante reiterar que a celebração é parte constituinte da história local e se
relaciona com as mudanças por que passa a cidade e sua população.
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6. DESCRIÇÃO DOS
LUGARES E SUPORTES
FÍSICOS E AGENCIAMENTO
DO ESPAÇO PARA A
ATIVIDADE
6.1. A Capela do Rosário e seus ícones
As principais manifestações culturais dos remanescentes africanos em Betim
têm como base espacial e lugar-síntese de suas atividades a Capela dedicada a Nossa
Senhora do Rosário, com seu amplo pátio, no qual se realizam as festas da Irmandade.
Embora sua inauguração só tenha ocorrido em 1897, é um templo com forte referência
à arquitetura colonial e sua construção foi precedida por uma história de luta de quase
um século. É um dos poucos exemplares da arquitetura do século XIX em Betim,
construído em local alto, como manda a tradição do Rosário (UFMG, 1997).
Uma petição encontrada no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro revela que “os
pretos da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário do Arraial do Betim, na Freguesia
de Nossa Senhora da Boa Viagem do Curral d’El Rei, Bispado de Mariana, em Minas
Gerais” pretendiam “continuar a ereção de sua Capela dedicada à mesma Senhora do
Rosário”, pedindo, para tanto, licença real. O pedido era assinado pelo procurador da
Irmandade, Antônio José da Silva, com data de 28 de setembro de 1814 (FONSECA,
1975).
Embora a expressão “continuar a ereção” possa dar a entender que a obra já
tivesse sido iniciada, a ausência de registros sobre qualquer construção leva à
conclusão de que a Irmandade na verdade quisesse apenas “prosseguir na arrecadação
de fundos e donativos para a construção”. E um dos indícios disso é o testamento de
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Manoel Antônio de Carvalho, falecido em Betim a 10 de outubro de 1828 (livro
existente na Matriz de Boa Viagem, Belo Horizonte). Era sua vontade “deixar de
esmola para a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, da Capela Nova do Betim, que se
pretende fazer, trinta mil réis”.
Em 1861, por ocasião da visita pastoral à Capela Nova do Betim, o Bispo de
Mariana, Dom Antônio Ferreira Viçoso tomou conhecimento do estado de atraso das
obras para a construção da Matriz local, e aceitou a proposta feita pelo vigário, de
utilizar para finalizar a construção da matriz recursos reunidos durante 50 anos pela
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário para a construção de sua capela. O vigário era
o guardião dos recursos e o Bispo lhe deu despacho favorável, com base na
Constituição do Bispado, e determinou que N. Sra. do Rosário recebesse um altar
ataviado e ornamentado na nova matriz, que se inaugurou em 1867, na atual Praça
Milton Campos.
Quarenta e sete anos após a obtenção da licença para a construção da Capela,
o vigário Cassimiro Moreira Barbosa, em correspondência ao bispo de Mariana, falava
da necessidade dessa construção, porque havia, sim, uma imagem de Nossa Senhora
do Rosário venerada pelos pretos, mas esta estava na matriz de Nossa Senhora do
Carmo, “igreja dos brancos, dos senhores, constituindo empecilho às suas preces e
oferendas”.
Somente em 1894 é que se dá início, efetivamente, à edificação da Capela em
honra de Nossa Senhora do Rosário. O livro de Receitas e Despesas (Arquivo da
Arquidiocese de Belo Horizonte) tem sua abertura em 1894, com este lançamento:
“Apontamentos das despesas feitas por conta e ordem do Revmo. Vigário Domingos
Cândido da Silveira, na qualidade de Presidente da Mesa de Nossa Senhora do Rosário,
com o começo do serviço no terreno aonde vai construir a Igreja da mesma Senhora...”
Em 1896, pedia o vigário autorização para benzer a Capela:
Tendo a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário desta Freguezia concluído a edificação de sua Capella, (...), e achando-se ella decente, vem, pelo abaixo assignado Presidente da meza administrativa da mesma Irmandade, pedir a V. Exa. se digne conceder-lhe faculdade para benzer a referida Capella na forma do Ritual Romano, a fim de que se comece já a celebração do culto na mesma. A meza administrativa, de acordo com a Irmandade, edificou também uma caza junto ao adro da Capella, a qual foi avaliada em um conto de reis, para servir-lhe de Patrimonio, e também se acha requerendo para que seja adjudicada à mesma Irmandade uma propriedade avaliada em quinhentos mil reis, em pagamento do que lhe ficou
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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devendo Pe. Francisco José Melgaço. A Irmandade, com este Patrimonio, e mais alguma couza que fôr adquirindo e com os annuaes dos Irmãos, que já são em número maior de cem, fica habilitada para manter a Capella e o culto. Já tem algumas alfaias e alguns ornamentos necessários para a celebração da Missa. Convem muito que se possa já celebrar Missa na mesma Capella, onde pode uma bôa porção de habitantes receber os Sacramentos, principalmente a Eucharistia dos Infermos a aquelle bairro da povoação (...) na estação chuvosa, (...). Capella Nova do Betim, 10 de janeiro de 1896/7 (borrado). O Presidente da meza administrativa da Irmandade. Vigario Domingos Candido da Silveira (Arquivo da Cúria Metropolitana de Belo Horizonte).
Esse trecho da documentação oficial traz mais uma informação sobre os
frequentes embates relativos ao patrimônio da Capela de Nossa Senhora do Rosário:
fazia parte do patrimônio da Irmandade, no momento da inauguração do templo, uma
casa. Tudo indica que esta casa foi apropriada pela Igreja de São Francisco de Assis,
instalada na própria Capela nos anos 1970, e hoje ocupando um templo construído nas
proximidades. A casa paroquial da comunidade de São Francisco de Assis está
exatamente ao lado do adro da Capela do Rosário.
Cerca de onze contos de réis foram gastos, na construção, até dezembro de
1896. E, em fevereiro do ano seguinte, tais despesas chegavam a doze contos,
quatrocentos mil e quinhentos réis, quando a Capela já recebia vidraçaria e nela se
realizavam cultos religiosos (FONSECA, 1975).
As querelas em torno do patrimônio da Irmandade tiveram continuidade em
meados do século XX. Em 1950, o Padre Osório de Oliveira Braga, o mais destacado
pároco na memória social local, escreveu ao bispo questionando a formação de uma
Comissão que arrogava a si a administração dos bens da Capela do Rosário:
Refiro-me a uma comissão que V. Exa. nomeára, com certesa, maldosamente, pedida pelo P. I. Assumpção, para zelar os bens da Capela do Rosário, nesta cidade. Eu não fiquei satisfeito e nem podia ficar contente com tal nomeação, que não deixa de envolver, vistos os autos, desprestigio e desconsideração da autoridade do Vigario da Parochia (...). Eu penso que mesmo quando sahiu o P. Assumpção, não havia necessidade de Comissão, já que tudo lá deveria ser confiado ao meu cuidado e vigilância; mas mesmo na hipótese que houvesse então tal necessidade, esta desaparece por completo agora, já que foi nomeado o cooperador que vai morar na casa parochial da Capela do Rosário. Eu e meu cooperador não podemos ficar sujeitos a uma “tal comissão”. Pe. Ozorio de O. Braga. Betim, 6.11.950 (Arquivo da Cúria Metropolitana de Belo Horizonte).
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Segundo as lembranças de D. Zélia Ricardo Pereira, não havia, ao final dos anos
60, a mureta de pedras que hoje cerca o adro da Capela do Rosário. D. Ladyr também
lembra as intervenções realizadas por Joaquim Nicolau nesse período:
Ele era capitão regente, ele que fazia a festa em Betim... era, ele era responsável por tudo, inclusive perto da festa, teve um ano que a igrejinha tava muito feia, ele mesmo pintou de cor-de-rosa. (...) Ele colocou a escadinha e pintou toda ela de cor-de-rosa e fez um banheirinho lá no canto, de madeira, porque ele achava um absurdo não ter banheiro ali pro povo e fez num cantinho, até hoje tem um buraco que tem um bocado de terra, ali era um banheiro daqueles de buraco, sabe? (Maria Ladyr Laranjeira de Melo, 15/12/09).
Sabe-se que, no momento da criação da Paróquia de São Francisco de Assis,
nos anos 70, a Capela do Rosário ficou como sua igreja central, até a construção da
Matriz. Segundo os relatos de Ladyr, Israel e Elisa, a capela esteve ameaçada de
demolição:
Eu fiquei sabendo que (...) o pessoal daqui do bairro Angola (...) reuniu pra ver como que eles iam resolver porque a igrejinha do Rosário estava pequena para atender os fiéis (...) e eles tinham a igrejinha da Gilda que era Igreja Nossa Senhora das Graças que eles achavam longe (...); então eles tiveram a idéia de demolir a igrejinha do Rosário para aumentá-la, fazer uma igreja maior; na época eles fizeram várias reuniões e o pessoal ficou meio dividido, tinha o pessoal da irmandade, alguns congadeiros, e tinha algumas pessoas que gostavam muito do congado (...); aí resolveram fazer um leilão, fazer alguma coisa e comprar um outro terreno, até que eles conseguiram através da prefeitura, ali, aquele terreno ali, era (...) o Matadouro, tinha um terreno ali, então eles, não sei se foi o prefeito, fez doação do terreno (...). Foi quando eles entregaram a igrejinha para a prefeitura, a igrejinha foi tombada, na época, em troca, eles deram o terreno para construir a igreja de São Francisco para atender a comunidade do Angola. (Elisa Mota Marques, 16/12/09).
Tornada, então, propriedade da Prefeitura, a capela passou por uma
restauração, concluída em 1988, e recebeu em seu pátio o marco comemorativo do
cinqüentenário da emancipação de Betim. Em 1996, passou por novo processo de
restauração, no qual foram dados como coloração original o branco e o ocre. Nesse
momento é que de fato aconteceu o tombamento da Capela como patrimônio cultural
municipal, visto que a Lei que institui o tombamento em Betim fora criada em 1996. A
partir de 2003, a capela foi novamente pintada de azul e branco, cores utilizadas
durante boa parte do século XX e que mais tradicionalmente identificam o Rosário.
No ano de 2007, a imagem de N. Sra. do Rosário mais tradicional da Capela
passou por uma restauração que revelou-a como uma peça maciça de madeira, com
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policromia e douramento, provavelmente a mesma que foi entronizada na Matriz de
Nossa Senhora do Carmo quando, no século XIX, o dinheiro da Irmandade foi
destinado à construção desta Matriz. As técnicas de escultura e de policromia
originalmente adotadas para a confecção desta imagem não se encontram mais
facilmente, inclusive seus olhos de vidro. Quando foi restaurada, a imagem continha
diversas repinturas grosseiras, que foram removidas, estando atualmente com sua
aparência original.
Também o altar-mor da Capela de N. Sra. do Rosário é um importante elemento
integrado ao templo, assim como imagens de gesso, algumas já com meio século, e de
grande importância afetiva para a Irmandade. São elas: São Benedito e Santa Efigênia,
Sagrado Coração de Jesus, São Sebastião, São José e Santo Antônio Claret.
Sobre São Benedito, Elisa Mota Marques nos conta que:
Eles reuniram, o pessoal do congado, Sr. Dalmo, Sr. Mário eles me pediram para guardar o santo aqui porque eu já estava guardando São Benedito. Na época, eles trouxeram o São Benedito pra nós, São Benedito tinha mais ou menos 20 cm de tamanho, aí eles chegaram aqui em casa e falaram comigo assim: olha aquele andor enorme com o santo pequenininho, e nós achamos incrível né, e eles falaram com a gente assim: nós vamos deixar esse santo aqui pra ele crescer; e nós não entendemos, eu e meu marido ficamos assim sem saber, será que esse santo vai crescer? Aí meu marido teve uma idéia: bem vamos fazer uma surpresa pro pessoal do congado, vamos arrumar um São Benedito bem grande. Aí nós fomos para Belo Horizonte (...) até que nós encontramos um São Benedito bem grande. Aí, naquele ano que eles chegaram aqui, eles viram o São Benedito, falaram assim: nossa ele cresceu, que maravilha. Aí é que nós entendemos o que eles queriam nos falar, porque pra eles, não pode, santo não se compra. Ao invés deles falarem, olha, compra um maior pra nós, eles, não, vamos deixar o santo aqui pra ele crescer e intuitivamente sem a gente perceber, nós fomos e compramos um santo grande. (Elisa Mota Marques, 16/12/09)
Há, então, duas imagens de São Benedito, uma pequenina, antiga, e uma
grande, mais recente, que é usada com mais freqüência pela Irmandade.
É necessário conhecer melhor os objetos associados ao ritual do Reinado
propriamente dito: bandeiras, coroas, cetros, bastões, instrumentos musicais e
indumentária.
6.2. A ocupação espacial pelo Reinado de Nossa Senhora do Rosário
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O epicentro das atividades da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e do
Reinado por ela organizado é a Capela. Ali acontecem as celebrações religiosas, como
novenas e missas, as evoluções do Reinado e também as reuniões da Irmandade. Na
circunvizinhança, estão sediadas três guardas: a Guarda de Congo de Nossa Senhora do
Rosário do Capitão Raimundinho (bairro Itacolomi); a Guarda de Catopés de Santa
Inês, da Capitã Margarida (Tita); e a Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário
e Santo Antônio de Pádua do Capitão Ueverson (Santa Inês). E é também nas
proximidades da Capela, no bairro Angola, que fica a casa da Secretária da Irmandade,
Elisa Mota Marques, onde acontecem cerimônias e de onde saem cortejos associados
ao Reinado. A casa da Secretária da Irmandade substitui, em Betim, a casa do
Presidente da Irmandade que, em outros reinados em Minas Gerais, é visitada pelas
guardas na abertura e no encerramento das festividades (NERY, 2007).
A Rua do Rosário, cuja toponímia está associada à própria festa, é importante
via de trajeto dos cortejos do Reinado de Betim, e nela as guardas obtêm a afluência
da vizinhança, numa das raras manifestações de público ainda alcançadas por esta
manifestação em Betim.
Atualmente, o bairro Jardim Petrópolis é também um importante lugar de
referência para o Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim. Ali está sediada a
tradicional Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário, do Capitão Dalmo
Martins, pé-da-coroa. Composta atualmente por cerca de 70 integrantes, é uma das
guardas com maior apropriação conceitual em Betim, mantendo inclusive um
expressivo séquito real. Também no Jardim Petrópolis está a Guarda de Congo de
Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Betim, do Capitão Aguinaldo,
fundada mais recentemente.
Fazem parte ainda dos pontos territoriais associados ao Reinado de Nossa
Senhora do Rosário de Betim os bairros Jardim Brasília, Vila Bemge, Vianópolis,
Parque das Indústrias e Citrolândia. Nesses locais, acontecem as festas específicas das
guardas ou vivem importantes participantes do Reinado, porém é na região central que
este de fato acontece. Este se estende, para além da Capela, em dois principais eixos:
um a sul, na direção da Casa da Cultura Josephina Bento, e um a leste, na direção do
Bairro Angola.
Nos dois dias de culminância da festa, sábado e domingo no mês de agosto, o
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Reinado realiza cortejos da casa da Secretária da Irmandade até a Capela, utilizando
diferentes roteiros nas principais ruas do bairro, e também se desloca, no domingo
pela manhã, da Casa da Cultura Josephina Bento até a Capela, pelas vias Governador
Valadares e Dr. Gravatá, atravessando todo o hipercentro do município.
6.3. As relações extra-municipais do Reinado de Betim
Uma das principais características do Reinado de Nossa Senhora do Rosário é o
estabelecimento de solidariedades horizontais entre os diversos grupos,
independentemente dos limites municipais. Nesse sentido, uma das práticas mais
comuns no Reinado é a das viagens durante o ciclo do Rosário para participar de
diversas festas em outras localidades.
Assim, são freqüentes os relatos de que uma guarda ativa em um lugar
desempenha a função de “levantar” ou apoiar a festa em outro lugar. A guarda do
Capitão “Marambaia”, de Igarapé, é uma das principais referências externas para o
Reinado de Betim atualmente, juntamente com dois belíssimos grupos de Conselheiro
Lafaiete. Por sua vez, as guardas de S. Dalmo e de S. Raimundinho são importantes
referências em outras localidades, verdadeiros alicerces de suas festas.
Eu sou registrado lá em Nova Cintra... Eu sou registrado por que a guarda de Nova Cintra acabou, eles pediram, o padre Djalma pediu para nós ir lá levantar, nós foi duas guardas lá, com as de lá, interando três guarda, eu fui a primeira guarda daqui de Betim a dançar em Nova Cintra (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
As visitações são recíprocas, isto é, se uma guarda visita a festa de outra, esta
deve retribuir a visita. Muitas vezes, as dificuldades para custear ou obter o transporte
para as visitas prejudicam essas solidariedades extra-municipais.
S. Raimundinho cita alguns dos lugares em que sua guarda costuma ir:
Nossa Senhora, pra tudo em quanto é lugar! Só não foi em Timóteo e Nova Cintra [este ano]. Em Lafaiete, nós participa. Costuma participar em Brumadinho, Ibirité, Timóteo, Fortuna de Minas (esse ano eu fui), Mucambeiro, não fui esse ano porque tava tendo aquela doença lá [Gripe Suína]. Nó, menina, nós vão em lugar demais... Esmeralda eu fui, falo Esmeralda, mas é Caracóis [distrito]. (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
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Um mapeamento precário das relações extra-municipais das guardas de Betim
registra os seguintes municípios: Belo Horizonte, Conselheiro Lafaiete, Contagem,
Esmeraldas, Igarapé, Nova Lima, Pará de Minas, Pedro Leopoldo, Sete Lagoas,
Timóteo, Vespasiano, Nova Cintra, Brumadinho, Ibirité, Mocambeiro, Santana do
Riacho (localidade de Lapinha da Serra), Diamantina, Queluz de Minas.
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7. O Reinado de Nossa
Senhora do Rosário de
Betim – formato,
conteúdos, narrativas,
significados
De acordo com a tradição do Reinado, a festa geralmente dura três dias, pois,
segundo os dançadores, ancorados no mito da origem, “foi no terceiro dia que a santa
saiu do mar.” Em Betim, em diversos momentos do século XX, inclusive nos idos
tempos de Joaquim Nicolau, a festa dura dois dias, um sábado e um domingo ao final
de agosto. Em 2009, realizou-se nos dias 29 e 30 de agosto. Entretanto, as lideranças
locais conhecem a tradição de duração da festa e das razões para isso. S. Dalmo, atual
capitão pé-da-coroa em Betim, assim explica as origens da festa:
Sobre o “reino do rosário” eu fui explicado por outras pessoas, mais velhas, não foi em nenhum livro não. Foi assim: N. Sra. do Rosário apareceu no mar por dó e piedade dos filhos, os negros que estavam na escravidão amarrado pela corrente. Ela surgiu e por isso até o terço de conta de lágrimas e eu sei que é verdade e é por isso que tem o terço. Diversos grupos foram buscar: os brancos luxuosos... Os grã-finos... Ela andou um pouquinho e parou, ela não quis seguir, aí foi o “reino do rosário”. Então eles conseguiram tirar ela lá do fundo; a santa chegou na beira do mar e começou a dar problema, foi o moçambique, o congo puxou os pretinhos, tirou as correntes e colocou as cabacinhas no lugar, nos pés para chocalhar, venerando ela, para agradar. Hoje nós faz de luxo, bonitinho... Eles levou essa santa, mas ela não ficou lá não. Por que a festa dura três dias? É porque levou ela para a igreja, então começou a briga com o dono dessa coroa, o rei Jericó17 e capitão-mor, por isso é que tem capitão-mor nos grupos, mas hoje você pergunta o que é capitão-mor, pouca gente sabe.
...Levou a Santa para igrejinha simples porque naquela época não tinha luxo, E cadê a Santa? Ela voltou para o mar, outra vez torna a buscar a Santa, então só no terceiro dia ela ficou. Então perguntaram para ela porque ela não queria ficar e ela explicou que era por causa das brigas, por
17 O rei Jericó, ou de Jericó, figura bíblica, não aparece comumente na literatura sobre o congado e o reinado. Esse aspecto específico da narrativa do Sr. Dalmo precisa ser melhor pesquisado.
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que cada um tava disputando quem tinha tirado a santa. O reino do rosário sempre tem uma coisinha... Foi aí que ela chorou, no terceiro dia ela chorou e nasceu então um ramo de conta de lágrimas, ninguém sabia que ramo era aquele, era para trazer benefício para todos, todas as raças. Ela era a glória e poder... Antes não tinha terço, o pessoal rezava com pedrinhas, os mais luxuosos com pedrinhas de cristal e os menos com pedrinhas mesmo... (Dalmo de Assis Martins, 12/12/09).
Na versão de seu Dalmo, observa-se a explicação mítica do uso das patagongas
nos pés e também para as disputas no interior do Reinado. Estas, muitas vezes
entendidas como sinal de enfraquecimento da celebração ou como aspecto
condenável, especialmente pelos que observam de fora, parecem ser consideradas
parte inescapável da vivência do Reinado por alguns de seus protagonistas, e,
inclusive, incorporadas às explicação míticas das origens. Segundo Vilarino (2007),
também é assim no congado belorizontino.
Ainda quanto à duração da festa, há relatos de que, durante um período nas
últimas décadas, esta se estendia até a segunda-feira, ocasião em que se arriavam as
bandeiras dos santos de devoção. Entretanto, dada a baixa freqüência dos grupos ao
encerramento da festa, esta passou a ser feita no domingo da culminância.
Esse é o momento mais esperado de um ciclo que se inicia com um mês de
antecedência, quando se anuncia a proximidade da festa com o levantamento da
bandeira de aviso, “sinal concreto da verticalidade, unindo terra e céu, vivos e mortos,
corpo e alma” (NERY, 2001). Em Betim, a bandeira de aviso, realizada em 2009 a 25
de julho, inclui diversas voltas no adro da Capela do Rosário, a entrada coordenada
das guardas, cada uma delas se dirigindo a seu santo de devoção situado nos altares,
e o ritual de hasteamento da Bandeira de Aviso da Mão Poderosa e da Bandeira de N.
Sra. do Rosário. Participam desse momento apenas as guardas de Betim (não há a
presença de guardas convidadas), e com parte de seus dançantes, já que muitos dos
componentes das guardas locais participam apenas da culminância da festa.
O rito tradicional de hastear a bandeira dias antes do começo das festividades tem sua origem desde o tempo da escravidão, quando as práticas religiosas dos negros eram discriminadas, e a bandeira de aviso era a única forma dos negros anunciarem a proximidade da festividade. Nessa época, tropeiros e viajantes ajudavam a espalhar a notícia quando avistavam a bandeira de aviso, com a imagem do principal santo de devoção das irmandades. O nome da bandeira - Mão Poderosa - denota poder, dons do Espírito Santo. Para a Irmandade do Rosário, através da Bandeira de Aviso da Mão Poderosa, Nossa Senhora do Rosário invoca todos os poderes e bênçãos da mão poderosa de Deus sobre os devotos das guardas e sobre a Festa do Rosário (LISBOA, 2009).
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O hasteamento das bandeiras é cercado de rituais, dentre eles os bandeireiros
das guardas circularem o mastro com suas bandeiras e todos os capitães, liderados
pelo capitão pé-da-coroa (atualmente Sr. Dalmo), encostarem seus cetros no mastro e,
coordenadamente, realizarem o movimento de subida e descida, em fervorosa oração
(ver, como exemplo, foto 29). S. Raimundinho explica o ritual:
Aquilo é uma firmeza no pé do mastro, é uma espécie de uma corrente entendeu? Aquilo durante o tempo que tá levantando, a gente não cruza os bastão na bandeira e desce e levanta, abaixo, três vez? Aquilo tudo é uma corrente de firmeza, sobe uma oração, pedindo nossa mãe força daquilo que a gente tá fazendo, né? Para abençoar aquela fé que a gente tá com ela ali, tudo isso a gente tá naquele momento pedindo: uns tá rezando Ave Maria, outro tá rezando Pai Nosso, outros tá rezando a Salve Rainha naquele momento, mas todo mundo com oração, no levantamento das bandeira, é uma firmeza no pé do mastro que a gente faz. (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
A tradição do Reinado prevê todo um processo de preparação para a
culminância: os integrantes das Irmandades cumprem uma série de compromissos,
como reza de terços, realização de leilões e da novena que termina na sexta ou
sábado, véspera da festa. Nesse dia, levantam-se os mastros dos santos festeiros. Para
este ritual, os ternos, em cortejo, buscam os reis e as rainhas que levarão as
bandeiras, e os conduzem ao local do hasteamento, que lembra a alegria dos negros
pela libertação da escravidão. Simboliza também a continuidade da eterna aliança
entre os congadeiros e Nossa Senhora do Rosário.
Em Betim, verifica-se a ocorrência da novena, em substituição à prática da reza
dos terços, verificada algumas décadas atrás, mas não mais dos leilões e outras
atividades destinadas a angariar fundos para a festa. Quase todo o financiamento da
celebração está, a partir dos anos 2000, a cargo do poder público, havendo relatos de
que, nas décadas anteriores, membros da Irmandade realizavam ações individuais,
como os próprios eventos e peregrinações em busca de donativos para realizar a festa.
Os cortejos de condução dos reis e rainhas, conforme citados no parágrafo anterior,
também não se verificam em Betim.
A novena é planejada e organizada pelos membros da Irmandade mais ligados
ao catolicismo, tendo à frente a Secretária da Irmandade, Elisa Mota Marques, e a
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
70
matriarca Zélia Ricardo Pereira, da Guarda de Marujos de São João Bosco. Apenas as
lideranças das guardas participam das celebrações da novena e justificam a ausência
dos dançantes e demais componentes através das jornadas de trabalho. A cada dia, um
padre das comunidades do entorno celebra missa, com a presença dos fiéis ligados a
essas comunidades. É uma ocasião para a Irmandade reencontrar e se confraternizar
com os eclesiásticos apoiadores do congado e os fiéis visitantes costumam fazer
oferendas aos protagonistas do Reinado.
Ao final de cada missa, é hasteada a bandeira do santo de devoção de uma das
guardas, conforme programação prévia. As guardas mantêm diversos santos de
devoção, e um deles, geralmente o que dá nome à guarda, é que tem sua bandeira
hasteada na novena.
Tem a Nossa Senhora do Bom Remédio, São Benedito, São Judas e o Pega Mim dos Arcanjos de Deus, e aqui no Citrolândia, agora, a gente tá levantando a do Frei Galvão, que o Padre também pediu pra gente fazer bandeira, nós fizemos, quer dizer que nós estamos com 5 bandeiras, cada uma mais gostosa do que a outra. (Euli Ricardo Faria, 16/12/09).
Como nem sempre a guarda escalada para o dia está completa para os rituais
do hasteamento, as diversas lideranças presentes ajudam a compor o cortejo, como se
formassem uma única guarda, sob o comando do capitão. A própria guarda de D. Euli,
embora, como todas as demais guardas, tenha levantado bandeira em sua casa, não
participou do hasteamento das bandeiras durante a novena.
D. Zélia informa que no tempo do Capitão-mor José Teodoro e de D. Geralda,
não havia a novena, ao menos oficialmente, na Capela, como atualmente. Os líderes
do Reinado se preparavam para a festa saindo para rezar o terço todos os dias. Ela
rememora o hasteamento das bandeiras nas últimas décadas e avalia o formato atual:
No passado, a gente levantava as bandeiras em um dia só, aí depois inventaram essa de cada um levantar. Só que isso tá dando problema, porque tem dias que vai guarda levantar sua bandeira, mas não participa da missa. O padre não vai lá celebrar a missa não é para os congadeiros, é só para os visitantes. No momento da celebração, tão lá fora, furando buraco [para os mastros], conversando, e a falha esse ano foi muito feia, faltou duas bandeira, me parece, três bandeira (Zélia Ricardo Pereira, 13/12/2009).
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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No sábado, ao anoitecer, as guardas começam a se concentrar na casa da
Secretária da Irmandade, Elisa Mota Marques, para o cortejo de traslado das imagens
de Nossa Senhora do Rosário (uma imagem alternativa que a Irmandade mantém,
utilizando-a nos cortejos e poupando a imagem principal, que fica na Capela, em seu
altar-mor) e de São Benedito. Na casa da Secretária da Irmandade, os andores das
imagens são cuidadosamente enfeitados antes da concentração.
As guardas vão chegando, uma-a-uma, das diversas regiões do município, e
apenas as guardas sediadas nos arredores (Guarda de Congo de Nossa Senhora do
Rosário, Guarda de Catopés de Santa Inês e Guarda de Moçambique de Nossa Senhora
do Rosário e Santo Antônio de Pádua) se deslocam a pé até o local de concentração. A
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário, do Capitão Dalmo, é a
encarregada de receber todas as guardas que se aproximam e cumprimentá-las, pelo
adentramento de uma guarda na outra e evoluções de bênçãos com as bandeiras. As
guardas também se cumprimentam entre si.
Após as saudações iniciais, cada guarda se dirige até onde se encontram os
andores e fazem reverências aos santos, cantando e batendo suas caixas. O ritual de
chegada das guardas se estende por algumas horas, até que finalmente todas se
reúnem em oração e saem em cortejo, pela Rua do Rosário, até a Capela. Aí, têm lugar
novas evoluções das guardas, neste dia já mais completas, e rituais junto aos mastros,
erguidos em volta de todo o adro. As evoluções da guardas em torno da Capela são
explicadas pelo Capitão Dalmo, pé-da-coroa, como um ritual de purificação da própria
Capela, “porque não se sabe quem está lá dentro” (Dalmo de Assis Martins, 12/12/09).
S. Raimundinho também aborda essa questão:
A gente já acostumou dar volta fechando o círculo da igreja ali... Então nós passa por detrás, nós não entra direto, a gente dá aquela volta, respeitando a igreja, fechando, passa no cruzeiro, vem, aí é que vai entrar dentro da igreja, pra depois que (...) a gente sempre cantando dá daquela volta, agora isso aí é os ponto do capitão que tira né, saudando. Nós não anda atrás, ao redor ali, sem não tá cantando nada não: ou tá pedindo licença ou agradecendo ou falando qualquer coisa sobre o início da festa ou a terminação, também é a mesma coisa: pra ir embora tem a despedida, passar ao redor da igreja, saudando pra vim embora agradecendo o que foi feito, correu tudo em paz, tudo bem, tudo tem um significado né! (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
Ou ainda, explica D. Efigênia:
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Chegando ali, a gente entra sempre pela direita e dá volta até o cruzeiro, em sinal de respeito, pedindo licença que a gente tá chegando na igreja, aí passa no cruzeiro, e saudamos o cruzeiro que é onde Jesus ficou crucificado e a gente saúda também as almas dali por conta que.. dos cativeiro que passou por ali (...) aí depois do cruzeiro a gente vai pra porta da igreja, pedindo licença por conta que os brancos entrava na igreja e os negros não podiam entrar (Efigênia Ágata da Silva, 20/12/09).
Encerrados os cantos e o soar das caixas, permanece na Capela, durante toda a
noite de sábado para domingo, parte da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do
Rosário, liderada pelo seu Capitão, Dalmo Martins – a este momento da festa, é dado o
nome de “matinas”. Durante a madrugada, diversos rituais de preparação da festa são
realizados, inclusive aqueles que pedem autorização e proteção aos “donos das
encruzilhadas” do entorno da Capela, para que a festa se realize sem incidentes.
A matina da festa que eu aprendi, seja um fechamento de festa ou abrimento de entrada de rua, isso se torna uma limpeza entendeu? Quer dizer... É o que eu entendo: a pessoa faz a matina ali de manhã cedo, é rezando em toda entrada e saída no começo da Festa. (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
No domingo, dia da festa, o capitão da guarda, figura responsável pela ordem
do grupo, primeira voz do congado depois do rei, chama os soldados com seu apito e
inicia as orações, cantadas por ele e respondidas por seus subordinados, onde se
misturam rituais do catolicismo com rituais afro-brasileiros. O cargo de capitão
significa que ele tem sabedoria para conduzir o grupo. Para esta condução, ele conta
com o poder do bastão: um instrumento de guia, de força e de fé. O bastão é a
firmeza de um capitão, significa o poder de superar crises e deve estar sempre em
contato com o solo para captar energias. No seu interior há essências medicinais,
algumas reveláveis, outras não.
Tradicionalmente, antes de ganharem as ruas, é realizado um ritual de benção
e de purificação dos dançadores e dos instrumentos que começam a soar dentro dos
terreiros. Nesse momento, são invocados os santos a quem pedem proteção. No ritual,
nota-se uma grande ligação com a umbanda. O ritual varia de grupo para grupo.
O ritual de preparação das guardas foi narrado por D. Euli e S. Raimundinho:
A gente (...) serve o café pros nossos dançantes, reúne todo mundo na sala pra fazer a prece, passa o conselho do que deve fazer, do que não deve: não beber, na nossa guarda a gente não aceita beber, você nunca vai ver isso, na hora da dança a gente não aceita e a gente conversa o que pode e o
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que não pode ser feito. Fazemos a prece em hebraico, porque é a língua morta dos anjos e os inimigos não pode entender essa linguagem, então é mais prático pra nós, e depois da oração em hebraico nos fazemos Pai Nosso e Ave Maria (Euli Ricardo Faria, 16/12/09)
Faz oração, nós rezamos, a primeira coisa que nós faz antes de sair pra qualquer lugar, oração, junta tudo no terreiro, reza primeiro, pra nós poder sair. Porque nó, nós não gosta nem de pegar dançante no meio do caminho... Porque vai sair de lá de casa então, a guarda sai dali com os dançante tudo feito a oração (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
Em Betim, o domingo começa, para a maioria das guardas, na Casa da Cultura
Josephina Bento, tradicional centro cultural da cidade. Ali, as guardas dos municípios
vizinhos são recebidas para um café-da-manhã e se concentram para a principal
procissão do Reinado de Nossa Senhora do Rosário na cidade. Uma imagem de Nossa
Senhora do Rosário, devidamente ataviada, fica num dos salões da Casa da Cultura,
onde receberá as reverências, cantos, toques das caixas e orações.
As guardas descem dos respectivos ônibus que as transportam até Betim e são
recebidas por uma das guardas de congo da cidade anfitriã. Em 2009, a guarda a
desempenhar este papel foi a de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de
Betim, de Efigênia e do Capitão Aguinaldo. Após os tradicionais cumprimentos das
bandeiras e bênçãos recíprocas, a guarda visitante ou recém-chegada adentra o
quintal da Casa da Cultura, onde um cruzeiro com as dimensões adequadas às
tradições do Reinado é o primeiro ponto de parada. Nesse cruzeiro, as guardas fazem
evoluções, orações, cantam e tocam suas caixas. A seguir, elas se dirigem ao interior
da Casa da Cultura, não sem antes cumprimentar, conforme os ritos, as guardas que já
estejam no quintal. Os cantos e orações junto ao andor de Nossa Senhora do Rosário
são fervorosos e expressam as identidades de cada guarda de Betim ou visitante.
O próximo momento é o cumprimento aos reis e rainhas, assentados ao longo
de uma extensa mesa no quintal da Casa da Cultura, na qual recebem com distinção
seu café da manhã. Os reis e rainhas do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de
Betim são:
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Nome Função
Adriana (Igarapé) Rainha (Guarda de Marujos São João
Bosco)
Alzira (PTB) Rainha (Guarda de Marujos São João
Bosco)
Anita (Marimbá) Rainha
Antônio Henrique Félix (Vianópolis) Rei de Frente (Guarda de Moçambique de
Nossa Senhora do Rosário)
Aparecida (Cachoeira) Rainha
Aparecida Joana D’arque Fatiro (Jardim
Brasília)
Rainha (Guarda de Congo de Nossa
Senhora do Rosário)
Cleide Almira Custódio (Pimentas) Rainha (Guarda de Moçambique de Nossa
Senhora do Rosário)
Cleuza Ângela Custódio (Pimentas) Princesa (Guarda de Moçambique de
Nossa Senhora do Rosário)
Elvira Cândido Ferino (Vianópolis) Rainha
Eneida Aparecida da Silva Rainha Conga
Filomena (Marimbá) Rainha
Isaura Nogueira (Vianópolis) Rainha Perpétua
Janaína Alves Faria Princesa (Guarda de Congo São Judas
Tadeu)
José Geraldo (Cachoeira) Rei
Maria (Itacolomi) Rainha (Guarda de Marujos São João
Bosco)
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Maria (Marimbá) Rainha
Maria (PTB) Rainha
Maria (Vila Bemge) Rainha
Maria da Conceição (Vila Bemge) Rainha
Maria José Félix (Vianópolis) Rainha de Frente (Guarda de
Moçambique de Nossa Senhora do
Rosário)
Matilde (Cidade Verde) Rainha
Monklin Delano Martins Rei Congo
Sebastião (Santa Inês) Rei
José Sílvio Henrique (Pimentas) Príncipe (Guarda de Moçambique de
Nossa Senhora do Rosário)
Zilda Ângela Eustáquio (Pimentas) Rainha (Guarda de Moçambique de Nossa
Senhora do Rosário)
7.1. O séquito real no Reinado de Betim
A performance dos reis e rainhas é bastante discreta no Reinado de Nossa
Senhora do Rosário de Betim, como, ademais, em celebrações similares. Eles recebem
atenção especial nos momentos de alimentação, o café-da-manhã e o almoço, e são
buscados em suas casas pela Capitã-regente Ladyr Laranjeira de Melo, porém não
foram observados muitos momentos específicos dos ritos em que recebam
homenagens. Aapenas no café-da-manhã, na Casa da Cultura, quando, assentados à
volta de uma mesa, recebem as reverências de todas as guardas, talvez numa reedição
das mesas de promessas citadas nos documentos da Irmandade de Nossa Senhora do
Pilar, da antiga Vila Rica. Em fotografias do ano de 2001, observa-se um ritual de
coroação na Capela do Rosário: o Capitão-da-guia, Raimundinho, aparece coroando
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várias cabeças (ver fotos 30 e 31).
A rainha Cleide Almira Custódio descreveu o seu próprio ritual de coroação,
acontecido nos anos 1980, em Vianópolis: ela foi convidada para ser rainha pela
festeira da região, D. Geralda, e foi coroada em ritual do qual participaram todos os
capitães de guardas presentes, diante do altar no qual figurava Nossa Senhora do
Rosário.
Mais recentemente, a coroação no Reinado de Betim é feita exclusivamente
pelo congo, especificamente o congo de S. Raimundinho, que é o mais referendado
pelo capitão-pé-da-coroa.
O séquito real, como a maioria dos participantes diretos do Reinado de Nossa
Senhora do Rosário de Betim, desempenha um claro papel nos eventos, porém não
participa das atividades de concepção e liderança. Não por acaso, o Rei e a Rainha
Congos não participam das atividades regulares da Irmandade, comparecendo apenas à
culminância da festa. Entretanto, segundo o Capitão Dalmo, eles detêm um importante
papel na proteção do grupo e precisam ter qualidades espirituais incomuns:
Fui eu que arrumei o rei e a rainha conga... Eles são superiores, eles podem acompanhar qualquer um dos grupos... Eles têm que saber orar... Se um dançante passar mal, eles têm que saber o que é preciso fazer... Se é um malefício ou doença marcada por Deus, eles são responsáveis por todo o grupo, inclusive pelos grupos de fora... Só pode ter um rei e uma rainha conga em cada cidade, precisa ser uma pessoa de bom coração e geralmente para ser rei e rainha tem que ser acima de 50 anos... Se é muito jovem, ele tem vaidades e se distrai da obrigação. Isso é coisa muito séria, rei e rainha, princesa... Eles guardam a tradição, inclusive os parentes deles [rei e rainha congos atuais] foram escravos... Muita gente da irmandade não gostou... E muitos reclamam até hoje, mas eles não sabe... (Dalmo de Assis Martins, 12/12/09).
A figura do Rei-do-Ano ou Rei Festeiro, tradicional em outros Reinados
mineiros, está em desuso em Betim há alguns anos. A principal função dessa figura,
angariar fundos para a realização da festa, tornou-se desnecessária depois que o poder
público assumiu o financiamento da celebração. Um dos últimos betinenses a
desempenhar essa função foi, segundo Ladyr Laranjeira de Melo, o “Zé Cheiroso”, que
já resistia a assumi-la devido à sobrecarga de responsabilidades na organização da
festa.
Também está vago o cargo de Rainha-da-Guia, que vinha à frente do
moçambique, puxando a festa com uma bandeira. A última a desempenhar a função,
Ricardina, faleceu, e a bandeira está sob a guarda de seus descendentes (ver foto 15).
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Não colocaram outra, a função era levar a bandeira da guia, ela gostava de sair sempre junto com o moçambique ou na frente das rainhas, ela era muito sistemática, tem um depoimento dela no museu antes de morrer. (Maria Ladyr Laranjeira de Melo, 15/12/09).
Findo o cumprimento aos reis e rainhas, as guardas betinenses e convidadas
fazem evoluções livres no quintal da Casa da Cultura, e tomam seu café-da-manhã, até
o momento da organização do cortejo que seguirá pela Av. Governador Valadares e
pela Rua Dr. Gravatá, até a Capela do Rosário. A chegada das guardas, o café-da-
manhã e os ritos aqui descritos se estendem das 8h às 12h, aproximadamente, quando
sai o cortejo.
Esse formato da manhã do domingo de Festa era diferente nos anos 60, quando
Joaquim Nicolau e Ana Firmina lideravam a culminância do Reinado. Segundo D. Zélia
Ricardo Pereira:
Onde hoje é o Luna [Supermercado Superluna, na Praça do Ceabe], nas imediações ali tinha uma árvore, uma mangueira, e o povo atravessava tudo a pé, ali era uma casa. O café era dado no último dia nessa casa (...). A esposa do S. Joaquim Nicolau é que arrumava tudo, D. Ana. (Zélia Ricardo Pereira, 13/12/2009).
O cortejo é organizado pela ordenação das guardas segundo o conceito
específico de cada uma (congos, catopés, marujos, vilões, moçambiques, etc.), sendo
que os congos abrem o cortejo, e os moçambiques se intercalam ao longo dele. A
Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do Capitão Dalmo Martins fecha o
cortejo, conduzindo o andor com a imagem de Nossa Senhora do Rosário e também o
séquito real.
Maria Ladyr Laranjeira de Melo explica as estreitas relações entre o congo e o
moçambique:
Olha, é porque a gente falava que é um limpa-trilha dele, o Moçambique é encarregado da coroa, vai mais devagar, carrega os andores e as coroas, as rainhas, são velhos, não são velhos, mas por respeito que eles têm né? O congo não, o congo dança, vai e volta. (Maria Ladyr Laranjeira de Melo, 15/12/09).
Efigênia Ágata da Silva apresenta ainda uma outra forma de explicar: “Porque o
congo tá na falange do caboclo e o moçambique tá as falanges dos preto velho que
são mais lentos, são aqueles velhos que andam mais devagar” (20/12/09).
O capitão Dalmo fala um pouco das funções desempenhadas pelas guardas
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nesse e nos demais cortejos realizados pelo Reinado de Betim:
Os caixeiros são treinados, é dado explicação do que eles têm que fazer... Tem a “meia-lua” para retirar os maus espíritos a inveja.... A bandeira da guia pára, aí eles dão a meia-lua... Se a meia-lua é feita por um congo, um congo de responsabilidade como a do compadre Raimundinho, aí nem precisa do moçambique fazer a meia-lua não, aí pode passar a “linha deles”, que significa caboclo... Muita gente não gosta que fala não, mas tem que falar a verdade: congo, catupé, marujo significa caboclo, caboclo civilizado porque existe caboclo selvagem... Caboclo civilizado abrindo caminho... E vem o andor, nós o moçambique não pode fazer a meia-lua porque vem trazendo o andor... Só ponto em orações, ponto cantado... Caixeiro treinado na frente da guia tem que saber o que faz... Moçambique é o responsável... (Dalmo de Assis Martins, 12/12/09).
Sobre a meia-lua, citada pelo Capitão Dalmo, S. Raimundinho esclarece:
Aquele cortejo de fazer aquela meia lua é pedindo uma licença os dono das encruzilhada, entendeu? Quando nós chega na linha, nós fazemos aquela reviravolta, fazemo aquilo, aquilo é um modo de pedir uma licença pra poder passar, dizer que ocê tá entrando dentro de uma porta e passando. É a mesma coisa d’eu chegar na sua casa e não dá sinal, se eu vou chegando e abrindo sua porta? Sem bater ? Ocê mora ali... Todas encruzilhada tem seu dono, todas ponte e passagem de ponte tem seu dono, quando chega num cruzeiro, ocê tem a saudação pra fazer no pé do cruzeiro, na porta da igreja, na hora que chega... (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
Nessa procissão, a imagem de Nossa Senhora do Rosário não é mais conduzida
a pé pelos membros da guarda. Ela segue num veículo utilitário, no qual também
alguns membros da guarda asseguram sua integridade.
Ao longo do trajeto, são raras as manifestações do público. Apesar da pujante
beleza da indumentária e dos adereços das guardas, de suas originais evoluções, das
performances dos dançantes e do ribombar dos treme-terras, o Reinado de Nossa
Senhora do Rosário de Betim tem poucos apreciadores.
A chegada à Capela do Rosário, a subida da colina que leva ao templo é,
seguramente, em Betim, o ápice da festa. Ali, sim, o soar das caixas faz aglomerar-se
a vizinhança, não muito numerosa, e a parcela da Guarda de Moçambique de Nossa
Senhora do Rosário do Capitão Dalmo Martins, que esteve em vigília durante toda a
madrugada e também pela manhã, recebe com os tradicionais cumprimentos as
guardas chegadas em cortejo. Sob o sol escaldante das 13/14h, as guardas evoluem no
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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entorno da Capela e a adentram, para reverenciar Nossa Senhora do Rosário e outros
santos de devoção.
Enquanto soam as caixas e as guardas executam suas performances, a Capitã-
Regente Ladyr Laranjeira de Melo e a Secretária da Irmandade, Elisa Mota Marques,
organizam a saída das guardas para o almoço. Esta refeição ritual tem sido oferecida
pelo poder público nas últimas décadas, em um dos seguintes lugares: Parque de
Exposições David Gonçalves Lara, que, por sua distância em relação à Capela, exigia
um segundo cortejo (o envelhecimento das lideranças do Reinado tem feito com que
essa alternativa seja abandonada); Escola Municipal Clóvis Salgado, vizinha da Capela;
e Restaurante Popular, igualmente próximo.
O envolvimento da comunidade na preparação da comida e na sua distribuição
ritual foi abandonado em Betim. D. Zélia Ricardo Pereira era uma das cozinheiras do
Reinado nos anos 70 e 80, e lembra que, no começo da década de 90, já cozinhava em
escolas municipais, com subsídios públicos, e a comida era servida no quintal da Casa
da Cultura. As guardas de S. Raimundinho e S. Dalmo também designavam cozinheiras
para preparar o almoço. Essa prática durou até 1999.
Aí, [...] falou que nós tava carregando [comida] para casa. Foi onde deu confusão. (Zélia Ricardo Pereira, 13/12/09).
No ano 2000, membros da Irmandade prepararam o almoço pela última vez. A
partir de 2001, a comida passou a ser preparada pelo Restaurante Popular da cidade,
sendo servida ora em escolas, ora no próprio Restaurante.
A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário discute em suas reuniões regulares
essa questão do preparo da alimentação, porém a argumentação mais forte lembra as
últimas experiências mal-sucedidas, nas quais a preparação do almoço sobrecarregou
alguns poucos membros do grupo. Também é alegada a necessidade de assepsia na
preparação do almoço, que tem ficado a cargo do Restaurante Popular da cidade,
independente de onde vá ser servido.
Devido às restrições alimentares praticadas pelos devotos, o cardápio tem sido
composto de: arroz, feijão ou tutu, macarrão, salada, farofa, carne de boi e carne de
frango, além de refrigerantes e frutas.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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À medida que as guardas vão se retirando para o almoço, as performances no
adro da Capela do Rosário vão esmaecendo. Muitas das guardas convidadas retornam
aos seus municípios de origem logo após o almoço. Os grupos remanescentes se
concentram na Capela ao final da tarde, e saem em novo cortejo, desta vez pelas ruas
do bairro Angola, lugar tradicional para o Reinado de Betim. Ao retornarem do cortejo,
já anoitecendo, as guardas se preparam para a Missa Conga.
Em Betim, a Missa segue uma liturgia mais tradicional, e agrega alguns
elementos próprios da experiência dos afrodescendentes no Reinado, como a
participação das guardas, conforme escala prévia, nos cantos, o rufar contido dos
tambores e o ofertório com frutas, rapadura, cana de açúcar, pães e doces. A Missa é
longa e desmobiliza a maior parte dos dançantes. Em sua experiência com a Missa
Conga em 2009, o padre celebrante interrompeu a liturgia algumas vezes, para chamar
a atenção dos congadeiros dispersos, alguns deles consumindo bebidas alcoólicas no
entorno do adro da Capela. Além dos próprios congadeiros, a Missa tem a participação
de algumas dezenas de visitantes, especialmente senhoras que vivem na vizinhança da
Capela. Tal situação pode ser considerada uma forma de expressão da face profana que
também compõe diversas festas católicas.
A matriarca Zélia Ricardo Pereira, da Guarda de Marujos São João Bosco, e seus
filhos, descendentes do patriarca Sebastião Pereira, o Tião Medonho, são
protagonistas na concepção e desenvolvimento da Missa.
Um registro audiovisual da Missa Conga de Betim em 1995 mostra D. Zélia
neste mesmo lugar de principal assistente do padre celebrante, e Tião Medonho, seu
marido, liderando as intervenções da guardas durante a Missa. Esta Missa, em 1995,
foi realizada na Praça Milton Campos, em frente à Casa da Cultura, em razão do
processo de restauro pelo qual passava a Capela do Rosário. O altar estava cercado por
plantas. Três guardas participavam da celebração, sendo a guarda de Tião Medonho,
vestida em tom predominante de verde, a liderança nos cantos e toques de caixas
durante a missa. É dele também, de Tião Medonho, a única execução de dança durante
a celebração.
O canto de entrada da missa tinha a seguinte estrutura:
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Oh que coisa bonita! /Oh que coisa bonita!/ Essa reza, essa missa de amor de justiça18 /Oh que coisa bonita!
Essa missa contou com a participação da Folia da Imagem de São Sebastião do
Bairro Marimbá e da Capoeira Filhos de Nzambi. Ao final da celebração, o padre
celebrante benzeu as coroas, cetros e bandeiras das guardas presentes e a Folia abriu
o cortejo que realizou as voltas rituais em torno do altar, sendo seguida da Guarda de
Marujos de São João Bosco, do séquito real e de duas guardas de Moçambique. Nesse
momento, portanto, não havia guardas visitantes em Betim e já se observa que os
eventos do Reinado contavam com público restrito.
Atualmente, em Betim, após a Missa, as guardas novamente se concentram e se
ordenam para a descida dos mastros, realizada na segunda-feira em muitas festas
semelhantes realizadas em Minas. São os últimos movimentos do Reinado de Nossa
Senhora do Rosário em Betim, estendendo-se até as proximidades da meia-noite. Os
tambores vão silenciar até a abertura do novo ciclo.
Performances
Podemos acompanhar a evolução performática do Reinado de Nossa Senhora do
Rosário de Betim desde 1991, quando começam os registros audiovisuais dessa festa
no Município. Nesse momento, percebe-se que o canto, a dança e as evoluções das
guardas, a exemplo dos ritos devocionais em diversos pontos do trajeto, têm uma
importância superior à dos instrumentos musicais. Os cortejos têm um ritmo mais
lento, as guardas são menos numerosas e o tom de espetáculo, presente atualmente,
praticamente não se revelavam duas décadas atrás.
Atualmente, o desempenho do Reinado é apoteótico e, conforme Suzel Reily
(2001, p. 14 e passim), esta parece ser uma tendência nas festas similares em Minas
Gerais. Segundo a autora, na cidade de Campanha – MG, mesmo durante o principal
evento do Reinado, a Ascensão do Rosário, “quando o som dos tambores domina
completamente a paisagem sonora”, os grupos de congado atraem pouca atenção fora
de sua própria comunidade. Os congadeiros percebem isso e até a estrutura de sua
18 Esse verso é substituído por outros ao longo do canto.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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música tem mudado diante da percepção de como a cidade vê seu desempenho: de
1970 em diante, os congadeiros têm aumentado o tamanho de seus tambores.
Os treme-terras são de recente adoção nesses grupos, que originalmente, só
tinham caixas e taróis. Depois, cada grupo adotava um treme-terra juntamente com
acordeon e violino. Atualmente, os grupos têm 5 treme-terras, às vezes até mais de
oito. A inclusão destes instrumentos aumentou drasticamente o volume dos conjuntos,
tornando praticamente obsoletas as partes vocais e os instrumentos de corda. Também
por esta razão, metais foram adicionados ao elenco, dobrando a linha melódica em
cada nova repetição. E cada vez que um grupo adiciona um treme-terra, os outros são
instados a fazê-lo também, senão serão obscurecidos durante os festivais. Assim, a
competição entre os grupos tem sido o principal propulsor das mudanças, mas também
o desejo de atrair a atenção da comunidade. Se através de suas performances os
grupos de congado exigem ser vistos, agora, através do volume da sua música, eles
exigem também ser ouvidos.
A comparação entre os desempenhos do Reinado de Betim no início da década
de 90 e atualmente demonstra a mesma tendência. A riqueza da indumentária, com
muitas fitas coloridas, plumas, vidrilhos, especialmente nos congos; as evoluções
coreografadas, utilizando acessórios como arcos e bastões; e, finalmente, o som dos
treme-terras obscurece os cantos, não por acaso de difícil audição e registro durante
os eventos do Reinado.
A presença de instrumentos modernos e o abandono do fazer artesanal dos
objetos rituais e indumentárias do Reinado pode ser compreendida como fator de
desvitalização da manifestação. Paulino (2007) abordou essa problemática nas folias
de reis:
A máscara de látex é um elemento novo, mas que será utilizado segundo procedimentos já estabelecidos. Não é necessariamente o material com o qual as máscaras são confeccionadas que determinará a sua vitalidade dentro das Folias de Reis. Os elementos dados pela tradição nem sempre se encontram à vista e, para percebê-los, é preciso conhecer certos códigos e sinais que somente aqueles que foram devidamente iniciados em cada uma dessas manifestações tradicionais são capazes de compreender, ou seja, os fundamentos. Estes, sim, são os responsáveis pela vitalidade de uma manifestação (PAULINO, 2007, p. 3).
Comecemos uma descrição pelas guardas de congo, que em Betim são três. O
principal congo é o do Capitão Raimundinho, que abre os caminhos dos cortejos de
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Betim. Extremamente conceitual nas cores, na organização da guarda (ainda em fila,
com as figuras hierárquicas ao meio ou à frente), esse congo faz belas evoluções, já
obtendo dividendos pelo fato do Sr. Raimundinho ser uma figura performática, com
seu acordeon e seus passos charmosos. O congo de D. Euli e o Capitão Davidson, com
suas dezenas de jovens, destaca-se pela coreografia e, apesar da juventude dos
componentes, toca “a linha de congo” corretamente, conforme avalia o Sr. Dalmo. O
congo de Efigênia e do Capitão Aguinaldo destaca-se principalmente pela riqueza da
indumentária, especialmente o capacete da dona da guarda, cuja abundância de
plumas gerou rivalidades no Reinado de Betim em 2009.
O moçambique do Sr. Dalmo é uma guarda de postura séria e formal. Extensa,
formada por mais de 70 pessoas, é capaz de se dividir para desempenhar mais de uma
função simultânea, como acontece na manhã do domingo de culminância da festa:
enquanto uma parte da guarda permanece em vigília na Capela do Rosário, para
receber o cortejo, outra parte junta-se às demais guardas na Casa da Cultura, para o
café-da-manhã e o cortejo. Extremamente ordenado, esse moçambique também pode
ser caracterizado como de performance elegante, em seu azul-e-branco, incorporando
com maestria o lugar do moçambique no Reinado: guardião do séquito real e da
Imagem de Nossa Senhora do Rosário.
O moçambique do Capitão Ednilton, em seu vermelho-e-branco, tem o próprio
capitão como destaque, liderança nos cantos e na dança, com sua corporeidade
intensa. Mas é no moçambique do Capitão José Lúcio, onde estão os descendentes de
Joaquim Nicolau, que a performance espetacular atinge seu auge: a guarda conta com
diversas figuras carismáticas, que atraem irresistivelmente as lentes dos fotógrafos e
cinegrafistas que registram a festa. Conjuntamente, essas figuras realizam belas
performances nas quais a expressão dos corpos e o som dos chocalhos amarrados aos
tornozelos dominam a assistência. O Capitão José Lúcio posa para as câmeras, em
diversas ocasiões, ao longo de toda a década de 2000.
Os marujos de D. Zélia usam uma indumentária simples, calças pretas, camisas
vinho e boinas pretas, estão em pequeno número, mas se destacam pelo desempenho
dos capitães nos tambores e nos cantos. Os filhos de D. Zélia são os vozeirões do
Reinado de Betim. Em certos momentos rituais, nas missas e nos levantamentos e
descidas de mastros, todos os instrumentos musicais param para que Arlen e Paulo
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desempenhem seus lamentos cantados.
Os catopés de D. Tita são aqueles que menos aparecem no conjunto. Pouco
numerosos, com indumentária simples em verde-e-preto, desprovidos de uma
organização prévia, e freqüentemente apoiados por membros de outras guardas, eles
contam, entretanto, com uma das figuras carismáticas do Reinado de Betim, que toca
um reco-reco feito artesanalmente (Fotos 61 e 73).
As indumentárias das guardas são confeccionadas por empresa contratada pela
FUNARBE. Até meados dos anos 2000, a FUNARBE adquiria tecidos, e as guardas
confeccionavam suas roupas. Mas as costureiras, como as cozinheiras, estão pouco
disponíveis para trabalhos comunitários como este; um efeito provável das
configurações do mundo do trabalho numa cidade como Betim. D. Tita e Efigênia
ainda costuram, sendo que esta última faz questão de finalizar o fardamento da sua
guarda, com fitas multicoloridas, plumas e outros pequenos adereços.
A maioria das guardas solicita à FUNARBE roupas simples, calças e camisas nas
cores atinentes ao tipo de guarda e aos santos de devoção. Mas o tradicional
moçambique de D. Ernestina, que foi liderado até 2008 pelo capitão Mário de Paula e
foi fundado por Joaquim Nicolau, tem uma indumentária elaboradíssima, em azul-e-
branco, com turbantes, medalhas e outros adereços. Infelizmente, a guarda perdeu
muitos componentes e não tem, por isso, uma performance relevante no conjunto.
As lideranças do Reinado de Betim falaram de suas interpretações sobre a
concepção da indumentária:
As cores das roupas têm significado. Os terços também, se tem 3 ou 7 terços no pescoço, simboliza a graduação, quanto mais, maior é a graduação. (Dalmo de Assis Martins, 12/12/09).
Sabe, meu filho, eu gosto muito de olhar pra cor dos santos, igual o São Benedito, eu gosto de olhar a cor dele, então nós vai muito pela cor dos santos; igual Nossa Senhora dos Remédios, que é verde, vermelha, amarela e branca, então eu gosto de ir jogando aquelas cor na guarda, (...) porque cada santo tem uma túnica, uma coroa e eu trabalho muito em cima disso e eles acha muito interessante né? (...) a fita é 7 cor, porque eu guardo a conta de Deus, porque Deus fez o mundo em 6 dias e no sétimo ele descansou, então sou muito espiritualista, eu olho muito o dia dos santos e isso me ajuda muito. (Euli Ricardo Faria, 16/12/09)
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8. OS PROTAGONISTAS
DO REINADO DE NOSSA
SENHORA DO ROSÁRIO DE
BETIM: TRAJETÓRIAS,
PAPÉIS, FUNÇÕES,
ORGANIZAÇÃO
O Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim é protagonizado pela
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, um grupo de aproximadamente 20 (vinte)
pessoas, composto pelas principais lideranças de cada guarda e por um corpo de
caráter mais administrativo, que organiza tanto a rotina do grupo quanto realiza
diversas atividades de coordenação e concepção da festa anual.
São eles:
Nome Cargo/Funções/Trajetória
Israel de Jesus Pinto Capitão-mor do Reinado e Presidente da Irmandade,
eleito em 2008, participa da Irmandade desde os anos
70, já tendo ocupado a posição de rei festeiro. Já
ocupou as funções de capitão-mor e de Presidente da
Irmandade nos anos 70, quando ajudou a revigorar a
festa, com Frei Cristóvão.
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Maria Ladyr Laranjeira de
Melo
Vice-Presidente da Irmandade e Capitã-Regente –
Realiza funções como o serviço de apoio ao séquito
real, decoração da Capela e de seu adro pra a Festa,
condução das principais bandeiras da festa. Participa
da Irmandade desde o final dos anos 50, sendo uma
importante agente de memória do grupo.
Elisa Mota Marques Secretária da Irmandade, realiza funções como
registro administrativo, tesouraria, gestão dos
documentos, além de oferecer sua casa como um dos
pontos de concentração do Reinado para suas
atividades. É a guardiã das principais imagens
utilizadas nas atividades da Irmandade e responsável
por ataviá-las para os cortejos e cultos.
Benícia 2ª Secretária da Irmandade, desempenha funções
administrativas.
Monklin Delano Martins
Rei Congo; não participa das atividades regulares da
Irmandade e sofre algumas restrições no interior do
grupo, tendo sido indicado pelo Capitão Dalmo.
Eneida Aparecida da Silva Rainha Conga; não participa das atividades regulares
da Irmandade e sofre algumas restrições no interior
do grupo, tendo sido indicada pelo Capitão Dalmo.
Raimundo Moreira Barbosa Capitão-da-guia do Reinado e Comandante e Capitão
da Guarda de Congo de Nossa Senhora do Rosário.
Figura polêmica entre muitos integrantes da
Irmandade, é o preferido do Capitão Pé-da-coroa para
exercer as funções rituais do congo.
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Euli Ricardo Faria (Mãinha) Comandante da Guarda de Congo São Judas Tadeu;
não tem participado das atividades recentes da
Irmandade por conflitos com outros membros do
grupo, porém realiza constantemente atividades de
gestão da sua guarda.
Davidson Leandro Barbosa Capitão Guarda de Congo São Judas Tadeu, participa
regularmente das atividades da Irmandade,
representando a Comandante.
Aguinaldo Antônio de
Oliveira
Capitão da Guarda de Congo de Nossa Senhora do
Rosário dos Homens Pretos de Betim, não participa
regularmente das atividades da Irmandade, mas
conduz ritualmente a guarda nos eventos públicos.
Efigênia Ágata da Silva Comandante da Guarda de Congo de Nossa Senhora do
Rosário dos Homens Pretos de Betim, participa
regularmente das atividades da Irmandade.
Ernestina Francisca de Paula Comandante da Guarda de Moçambique Nossa Senhora
do Rosário e Santo Antônio de Pádua, participa
regularmente das atividades da Irmandade. Não
detém os saberes rituais relativos à manifestação e
sua guarda vem perdendo componentes.
Ueverson Leandro Basílio de
Paulo (Bimbo)
Capitão da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora
do Rosário e de Santo Antônio de Pádua, participa
pouco das atividades regulares da Irmandade, em
razão do trabalho, e conduz ritualmente a guarda.
Dalmo Martins de Assis Capitão Pé-da-Coroa, líder ritual do Reinado e da
Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário.
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Roberto de Oliveira Maia Designados pelo Sr. Dalmo como importante liderança
da Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário,
participa regularmente das atividades da Irmandade.
Ednilton Ambrósio da Silva Comandante e Capitão da Guarda de Moçambique
Divino Espírito Santo, embora jovem já detém gama
importante de saberes rituais, tem significativa
expressão oral e pode vir a ser uma das principais
lideranças da Irmandade.
Swami dos Santos Silva Capitão da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora
do Rosário, de D. Neném (Maria Izidora Manine),
participa regularmente das atividades da Irmandade.
Maria Izidora Manine Dona da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do
Rosário, guarda antiga e tradicional que vem
perdendo componentes.
José Lúcio Nunes Dono e Capitão Guarda de Moçambique de Santa
Efigênia, formada pelos descendentes de Joaquim
Nicolau. Também figura polêmica, recentemente
aderiu ao movimento religioso neopentecostal e
anunciou sua saída do Rosário, depois voltando atrás.
Arlen Ricardo Pereira Primeiro Capitão da Guarda de Marujos São João
Bosco
Zélia Ricardo Pereira Dona da Guarda de Marujos São João Bosco
Margarida Maria da Silva Capitã da Guarda de Catopés de Santa Inês e membro
do Conselho Fiscal da Irmandade; tem importante
atuação no zelo pela Capela.
Paulo Ricardo Pereira Segundo Capitão da Guarda de Marujos São João
Bosco
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Observa-se que esse grupo de lideranças detém uma autonomia apenas relativa
na organização do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim. Embora cada um
deles desempenhe certas tarefas e domine partes importantes da atividade, não há
atualmente uma autoridade inconteste que agregue o grupo em suas diferenças. A
legitimidade do Presidente da Irmandade, Israel de Jesus Pinto, eleito em 2008, foi
questionada recentemente, especialmente através de conversas de bastidores, o que
levou o corpo administrativo do grupo a realizar duas reuniões para tratar
especificamente desta questão, resgatando a trajetória do Presidente, que já se
estende por trinta anos junto ao grupo. Ele já foi rei festeiro e seu papel tem sido
especialmente o de estabelecer relações políticas e com o clero, em prol do grupo.
A Capitã-regente, apesar de sua trajetória junto ao Reinado desde o final dos
anos 1950, também sofre o mesmo tipo de questionamento. Seu papel é importante e
evidente na organização da festa, especialmente zelando pelos cuidados com o
séquito real, ao qual chama de “minhas rainhas”, e também na preparação do cenário
da festa: ela lidera a decoração da Capela do Rosário e de seu adro, ataviando as
imagens, cobrindo o pátio de fitas de papel coloridas e preparando estandartes
referentes aos santos de devoção, além dos mastros e bandeiras. Nos rituais, exerce
funções de liderança do grupo, como a condução das bandeiras de Nossa Senhora do
Rosário e da Mão Poderosa. Junto a ela, também atua Benícia (...), nas funções de
gestão.
A Secretária da Irmandade, Elisa Mota Marques, que também exerce a função
de tesoureira, completa esse grupo mais político e administrativo do que ritual no
interior da Irmandade. Além dessas funções, Elisa é importante conexão da Irmandade
com as comunidades religiosas circunvizinhas, que participam da festa. Ela também
sente resistências diversas vezes, embora goze de uma inserção maior do que os
líderes acima citados. Em 2009, foi questionada quanto ao aspecto da gestão dos
recursos da Irmandade e se empenhou em realizar uma prestação de contas oficial e
registrada em ata, que estancasse as desconfianças.
É uma hipótese da equipe técnica que produz o presente dossiê que o fato de o
Presidente, a Capitã-regente e a Secretária da Irmandade não serem negros dificulta a
sua legitimação.
Por sua vez, as lideranças afrodescendentes não parecem dispostas a exercer o
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papel político e administrativo assumido pelo grupo acima referido. Elas funcionam
mais como referências rituais, na organização e liderança das guardas. Há divergências
entre essas lideranças, e talvez as principais dentre elas se refiram às diferentes
filiações religiosas: em Betim, alguns líderes afrodescendentes professam um
catolicismo mais ortodoxo, que consideram uma devoção mais legítima ao Rosário, e
outros, a maioria, estão ligados à umbanda e mantêm terreiros. S. Dalmo e D. Zélia
abordam essa questão:
Olha, nós tão tendo esse problema no reino do Rosário: primeiro nós temos discriminação que é até crime. Espírita todos nós somos, uns pro bem, outros pro mal, precisa de falar, ficar tudo bem entendido... Porque dentro do reino do Rosário há pessoas que é evangélica e estava fingindo dentro do nosso reino... Temos pessoas que fala que é muito católica e não tem nada de catolicismo, e nós temos maçons... (Dalmo de Assis Martins, 12/12/09). ... Ficou aquela guerrinha, na religião e no ciúme, é igual os meninos; [S. Dalmo e S. Raimundinho] falam: nós não temos centro espírita, nós não trabalhamos com espiritismo, nossa fé é com Deus, Nossa Senhora, é a oração, é a fé, e eles criticam a gente por isso. Mas eu já falei, só porque eu danço o congado, eu sou negra, não tem nada a ver uma coisa com a outra, eu tenho que ter centro espírita, na minha casa não tem centro espírita. (Zélia Ricardo Pereira, 12/12/09).
A questão das diferentes filiações religiosas no interior do Reinado também
aparece como aspecto importante de outros reinados mineiros. Suzel Reily (2001)
assim tratou essa temática, conforme a entendeu no Reinado de Campanha – MG: “as
pessoas da cidade suspeitam que os congadeiros têm habilidades para manipular a
magia-negra, citando principalmente a macumba, mas negam que creiam no poder
dessas forças” (p. 9). Campanha não tem organizações religiosas afro-brasileiras
oficiais e, para a autora, há poucos macumbeiros no congado dessa cidade; eles,
entretanto, têm interesse em que essa ligação macumba-congado exista, porque
também é uma forma de preservar sua autonomia.
Vilarino (2007), por sua vez, defende que a maneira adequada de se entender
essa questão é a adoção do conceito de “dupla-pertença religiosa” no interior do
congado ou reinado. S. Raimundinho e D. Efigênia abordam essa questão:
Olha, eu, pelo menos, fui criado na católica, pra mim não tem religião acima dela, pra mim não (...), eu, pelo menos, não tô ali com mau intenção; durante o tempo que eu tô ali, eu tô feliz e louvando a Deus e Nossa Sra.; não tô pensando nada ruim. Eu fico, tem dias, se for preciso,
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eu fico sem comer e agüento (...) Mas todo mundo é nêgo que mexe no terreiro, tem gente [que] só não entra naquele momento de festa, mas quase a maior parte desse pessoal que dança reinado é espiritismo quase eles todo... (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
Reily (2001) sugere ainda que a atenção governamental aos congadeiros em
Campanha possa ser uma resposta sutil das elites à magia ou macumba presente no
congado: as elites supõem esse poder mágico entre os congadeiros e canalizam
recursos para o festival do Rosário, de forma que ele aconteça de forma controlada
(através da folclorização). Além disso, é claro, há interesses eleitorais nessa relação. É
como se a macumba fosse a ameaça dos pobres e a folclorização fosse a resposta dos
ricos. Porém, o resultado dessa relação é muito frágil, muito tênue. Ela faz pouco mais
que mascarar as tensões e frustrações advindas da divisão social e econômica da
população. Em um contexto de recursos limitados, os repasses ao congado, mesmo que
generosos, serão sempre considerados insuficientes. (p. 10).
Secundariamente, no Reinado de Betim, há também divergências oriundas do
prestígio que cada um desfruta no grupo, e outras relativas à condução dos rituais:
alguns líderes acusam outros de não organizarem suas guardas e os ritos conforme
manda a tradição. Uma guarda de congo mais tradicional acusa a outra de ter apenas
um fardamento vistoso e colorido, porém não dominar suas funções no conjunto; uma
guarda de moçambique mais tradicional acusa a outra de não respeitar as precedências
na liderança da festa e retirar-se antes da finalização do ritual; uma guarda de congo
mais tradicional atrasa-se sempre para os eventos que compõem a festa e provoca a
indignação das outras que, no entanto, reconhecem sua importância para o conjunto.
Ainda as filiações político-partidárias promovem cisões no grupo. Dependendo
da coloração partidária que dirige o Executivo Municipal, alguns líderes ascendem e
outros imergem na obscuridade ou desprestígio.
Todos esses aspectos geram uma certa dependência do grupo em relação a
gestores públicos para a efetiva organização da festa. Algumas gestões parecem ter
elegido interlocutores privilegiados no interior da Irmandade, e estes é que
determinam que tipo de recursos serão destinados pelo poder público à festa
anualmente. Isso empodera algumas lideranças da Irmandade em detrimento de
outras.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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Frequentemente, nas preces que abrem e fecham as reuniões da Irmandade, o
tema da união emerge nos discursos, e diz-se que ela é necessária e desejável. Nossa
Senhora do Rosário e os santos de devoção são invocados para promovê-la. As
divergências acompanham toda a realização da festa, até a culminância, embora um
observador externo dificilmente possa percebê-las. As novenas de 2009, por exemplo,
foram marcadas pela resistência de diversas guardas em pagar uma “remuneração” aos
padres das comunidades vizinhas para a celebração da missa, o que parece ser um
“combinado” das lideranças administrativas da Irmandade. E, na culminância da festa,
a condução da Missa Conga também parece ter gerado dissensões internas.
Alguns jovens vêm se destacando como importantes lideranças rituais na
Irmandade: Arlen e Paulo Ricardo Pereira, filhos de Tião Medonho e D. Zélia; Ednilton
Ambrósio da Silva e Davidson Leandro Barbosa, ambos netos do S. Raimundinho, e
também Ueverson Leandro Basílio de Paulo que, embora participe pouco das reuniões
regulares da Irmandade, demonstra já cultivar uma memória da Irmandade, na qual
atua desde a infância, além de já ter participado de restaurações dos bens
patrimoniais pertencentes ao grupo. Ednilton tem uma personalidade forte, faz
manifestações orais incisivas e bastante calcadas na tradição, e lidera uma nova
guarda bastante conceitual. Davidson é silencioso, discreto, porém persistente, e
arrancou do S. Dalmo a seguinte avaliação de sua participação no Reinado de Nossa
Senhora do Rosário em 2009: “toca congo mesmo; tem muita guarda por aí que não
sabe qual é a sua linha; essa guarda sabe” (Reunião de 24 de novembro de 2009).
Os executantes da festa, componentes das guardas, são principalmente os
familiares de suas lideranças. Algumas guardas de Betim, como a de D. Tita e a de D.
Zélia, têm atualmente poucos componentes, menos de vinte. As guardas de S.
Raimundinho e de Zé Lúcio têm forte inserção familiar, sendo que esta última é
também composta por um importante reforço dos descendentes de Joaquim Nicolau
em Itaúna. A guarda de S. Dalmo tem uma forte raiz comunitária no bairro Petrópolis:
são seus vizinhos e pessoas ligadas ao seu terreiro que mantêm essa guarda com
aproximadamente setenta integrantes. Também a guarda de D. Euli tem raízes
comunitárias, entre os jovens de Citrolândia. As guardas de Aguinaldo e Swami
necessitam, fortemente, de reforços extra-municipais, de Igarapé e São Joaquim de
Bicas no primeiro caso, e de Belo Horizonte no segundo.
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9. OS RECURSOS PARA A
REALIZAÇÃO DO REINADO
DE NOSSA SENHORA DO
ROSÁRIO EM BETIM
Nas duas últimas décadas, os recursos para a realização do Reinado de Nossa
Senhora do Rosário de Betim vêm sendo, crescentemente, providenciados pelo poder
público municipal. Segundo Zélia Ricardo Pereira, a FUNARBE inaugurou sua prática de
financiar a festa nos anos 1991/2. Pouco resta das antigas práticas de buscar
oferendas na comunidade e de se escolher um rei festeiro que liderasse atividades
como leilões, barraquinhas, etc. D. Zélia, da Guarda de Marujos de São João Bosco,
relembra como a festa era financiada no final dos anos 60, quando chegou a Betim:
Não era como hoje, eles que pediam, saíam aí pedindo ajuda para os participantes, saíam aí com o carro pedindo nas mercearias ajuda, era tudo feito por eles. Pro almoço, para as festas, pros enfeites, dava sacas de arroz, de feijão, porco para matar. (Zélia Ricardo Pereira, 13/12/09).
Contam alguns membros da Irmandade que os próprios integrantes do poder
público municipal começaram a desestimular as iniciativas desse grupo cultural, no
sentido de obter um financiamento comunitário. Tornou-se, ao que parece,
progressivamente vergonhoso para as gestões públicas municipais permitir que a
Irmandade fizesse peregrinações em busca de donativos. E isso, sem dúvida, se deu no
bojo de uma estatização do financiamento da cultura na cidade, nas últimas décadas,
e também de um movimento nacional de revalorização das culturas populares e
afrodescendentes.
Sair com as guarda na rua pra pedir esmola, a divulgação das nossa festa do rosário são muito fracas e nós, quando nós saia nas rua com a bandeira e batendo caixa, chamava atenção porque o povo ficava sabendo (...). Depois que a Funarbe tomou conta, proibiu: ocês nem precisa fazer isso, que nós vão ajudar [Funarbe]. A gente voltá atrás hoje, procê fazer isso tá mais
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difícil... São tudo fichado, se ocê precisa, não podem sair na rua, se ocê precisa deles, eles têm que pegar serviço, até dia de domingo tem gente que trabaia; nessa parte atrapaiou e piorou na outra, mas a tradição da festa era nós pedir esmola, é igual fazer uma mostra que ia ter a festa. É igual, todo mundo sabia. Nêgo chega perto de mim e pergunta: quando vai ser a festa de Nossa Sra. do Rosário? Ô meu fio, acabou ontem. Eu tinha promessa para cumprir! Mas porque a divulgação da festa é muito fraca, é isso que nós tão recramando. Cê não vê? A festa da Feira da Paz passa na televisão, passa no jornal, sai falando três por quatro, os cantor, os dia que vai ter, todo mundo fica sabendo; e agora, quando chega a espaiar, o negócio tá em cima da hora, ninguém fica sabendo. (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09).
Na fala do Sr. Raimundinho, a percepção de dois fatores prejudiciais à
vitalidade e autonomia da festa: a intervenção do poder público e os novos regimes de
trabalho, que não mais guardam dias de descanso simultâneos para todos.
Hoje, a Prefeitura é a gestora da Capela de Nossa Senhora do Rosário, que foi
tornada propriedade pública no momento de seu tombamento municipal e primeira
restauração, ao final dos anos 80. A Irmandade cuida da limpeza e manutenção dos
atavios, mas também a gestão municipal provê funcionários para a limpeza
periodicamente. As restaurações e intervenções de manutenção também são de
responsabilidade de Prefeitura.
Anualmente, a Prefeitura financia novos fardamentos para as guardas, e repõe
instrumentos. Também custeia a divulgação da festa, o roteiro das novenas, a
decoração da Capela e de seu adro, o transporte das guardas para todas as atividades
relativas à festa, e a alimentação no dia da culminância (café-da-manhã e almoço).
Diversas secretarias municipais investem recursos na realização da festa, tendo à
frente a FUNARBE, a Secretaria de Comunicação e a Secretaria de Administração. O
financiamento da festa é visto com restrições por membros da Irmandade, como deixa
clara a fala de S. Raimundinho:
Quer dizer: se ocê pediu 60 mudas de roupa vinha 30, e se ocê pedia 30 vinha 15, era assim. Mas por que que na cacunda do home [na frente do Prefeito} falava? Então nessas aí nós sabia que nós tava sendo lesado, né? Pedia os instrumento: não posso dá tantas caixa não porque o dinheiro que eles adoou não dava. Tudo isso nós sabe! Então onde nós [nos] considerava um boi de piranha: nós tamo ali, caía tudo no nosso nome, na nossa cacunda, como era pra irmandade, a festa da irmandade mas era tudo jogado... Nós não gastava tudo, só que a gente tá sabendo disso... Mas pelejando pra registrar as guardas porque se registrar as guardas igual tão falando aí pra nós, vai limpar ocês, ocês não vai ter conta com nada com nós: ocês receberam 3 mil para roupa para sua guarda, exemplo, se o senhor não comprou, se não tem dinheiro guardado, nós não tem como dar (...).
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Ano que vem nós vão registrar as guardas, ninguém mostrou boa vontade de fazer nada, só falava, e por isso nós tá desse jeito! (Raimundo Moreira Barbosa, 18/12/09)
A gestão municipal atual tem desenvolvido a percepção de que o total
financiamento público da festa tem implicações para a autonomia da Irmandade de
Nossa Senhora do Rosário e para a própria vitalidade da festa. As novas gerações não
saberiam mais como organizar a festa se o apoio público lhe fosse retirado; além
disso, elementos de paternalismo e dependência formam um círculo vicioso nas
relações entre o Executivo municipal e a Irmandade. Alterar essa fórmula exigiria novo
perfil das políticas públicas; estas, deveriam primar pelo investimento na formação e
no empoderamento da Irmandade, para que protagonize a sua festa de fato, em todos
os aspectos.
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10. PRODUTOS DO
REINADO DE NOSSA
SENHORA DO ROSÁRIO DE
BETIM
São produtos comumente advindos do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de
Betim:
a. Livreto de novenas, concebido por membros da Irmandade, a partir de
modelos, porém com interferência do grupo na escolha do tema anual, das temáticas
diárias, dos cantos e das manifestações orais. O livreto é impresso pela Prefeitura.
b. Registro fotográfico dos diversos eventos que compõem o mês de
culminância da festa, registro esse que vem sendo feito com regularidade desde o
início dos anos 90. Os arquivos dos anos 90 estão parcialmente perdidos, visto que a
Prefeitura é a responsável por sua produção e salvaguarda, e a mudança nas gestões
municipais faz com que documentos das gestões anteriores sejam destruídos ou
ocultados. Os arquivos dos anos 2000 estão intactos e compõem a documentação
audiovisual que integra este dossiê.
c. Registro audiovisual, de forma bruta ou editada, vem sendo produzido pela
Prefeitura também desde o início dos anos 90, e compõe a documentação que integra
este dossiê.
d. O principal produto, entretanto, é a própria festa, esta realmente
protagonizada pela Irmandade, ainda que com financiamento público e relativa
intervenção no formato final que a festa tem. A festa comunica os conteúdos e
significados realmente relevantes para seus atores.
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11. O REINADO DE
NOSSA SENHORA DO
ROSÁRIO DE BETIM E SUAS
RELAÇÕES COM O PÚBLICO
Os eventos relacionados ao Reinado de Nossa Senhora do Rosário em Betim
têm pouco público entre as pessoas não-iniciadas. As próprias guardas locais e os
grupos convidados de outros municípios é que constituem o público. A novena
realizada nos dias que antecedem à culminância da celebração tem público convidado:
comunidades religiosas dos bairros do entorno da Capela de Nossa Senhora do Rosário
se responsabilizam pelas celebrações de cada dia novena. Após cada celebração
religiosa, quando são hasteadas bandeiras e as guardas fazem evolução no adro, o
público não ultrapassa poucas dezenas de pessoas.
Os cortejos organizados pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, para o
traslado de imagens ou procissões, apenas mobilizam público quando realizadas no
bairro Angola, local de significativa concentração do público afrodescendente em
Betim, e que tem vivido, anualmente, a experiência da passagem das guardas. É fator
desse fenômeno o fato de que as guardas de Betim não mais se dirigem a pé para suas
atividades, e sim em ônibus.
Algumas guardas realizam festas dedicadas aos seus santos de devoção nas
comunidades em que estão implantadas. Nessas festas, estabelece-se uma importante
relação com os públicos localizados da cidade. Em muitos casos, a ligação da guarda
com a comunidade está fundada na implantação de terreiros de umbanda. As
declarações sobre essas ligações nem sempre são explícitas, porém se evidenciam na
utilização de certos termos específicos pelas lideranças da Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário, como “ramo” [de atuação], falange, orixá, donos de
encruzilhadas, dentre outros.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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S. Dalmo é a liderança do Reinado de Betim que mais assumidamente mantém
terreiro atualmente. No seu centro, recebeu a equipe de pesquisa e explicou seu
funcionamento.
Associado aos terreiros e às guardas, identificamos a realização de um trabalho
social na comunidade, como relatam as lideranças da guarda de D. Euli (a mãinha).
Esta guarda tem hoje 50 dançantes e é formada por maioria de jovens da própria
comunidade. Segundo Adriana Alves de Faria, que é tesoureira da guarda, o foco do
trabalho do grupo é a adolescência, principalmente os envolvidos com drogas. Os
jovens são estimulados a participarem da guarda e, segundo d. Euli, este estímulo é
dado principalmente com muita orientação, conversas e a possibilidade de passeios
em lugares para onde a guarda é convidada.
Aí nós abriu a guarda de São Judas Tadeu que é o padroeiro aqui do Citrolândia, como conversando com o padre Pedro, então ele achou muito importante a idéia e apoiou muito nós sobre isso. Ajudou também a tirar os meninos da rua, né, a maioria dos nossos dançantes eram meninos que usava droga, os adolescentes que ficavam na bagunça, o nosso foco na nossa guarda é esse tipo de pessoa, tirar as crianças da rua; a maioria da nossa guarda já ta quase todo mundo trabalhando, eles voltaram a estudar, tem um grupinho de pagode. A gente incentiva mais esse lado, a guarda nossa é mais pra isso, é um trabalho cultural com os meninos aqui do Citrolândia. (...) Muitos já deixou de matar, muitos já são pais de família, isso é um trabalho muito gratificante. Isso pra mim é muito maior do que briguinha de guardas, aquelas coisas miudinhas. (Euli Ricardo Faria, 16/12/09).
Outra forma de contato dos protagonistas do Reinado de Nossa Senhora do
Rosário com a população do Município é a prática das visitas ou apresentações em
eventos públicos e em atividades escolares. Apesar de estas serem importantes para
tornar mais legível essa manifestação à população local, é evidente que elas
promovem uma descontextualização, uma folclorização e uma didatização dos ritos
associados ao Reinado, adquirindo mais uma função de “abrilhantar” os eventos. Está
aqui compreendida também a espetacularização do Reinado ou Congado e sua redução
a objeto de consumo cultural.
Entre os atuais gestores da política cultural do Município, existe a hipótese de
que, nos vários policentros de Betim, existe público potencial para o Reinado. Gente
que migrou para o município nas últimas décadas e guarda um histórico de relações
com essa manifestação, em suas regiões de origem, mormente o interior de Minas.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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Uma divulgação mais capilar do Reinado de Nossa Senhora do Rosário no território
municipal e a constituição de condições de mobilidade para a população e para as
guardas do Reinado poderiam aprofundar as relações desta com seu público potencial,
sendo esta uma premência para o fomento do Reinado.
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12. INVENTÁRIO
12.1. INVENTÁRIO DO REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
Município: Betim
Distrito: Sede
Designação: Reinado de Nossa Senhora do Rosário
Categoria: Celebração
Endereço: Capela de Nossa Senhora do Rosário, Praça de Nossa Senhora do Rosário,
s/n, bairro Angola.
Agentes da Manifestação: Guardas componentes da Irmandade de Nossa Senhora do
Rosário de Betim
Líderes da Manifestação: Israel de Jesus Pinto, Maria Ladyr Laranjeira de Melo, Elisa
Mota Marques, Dalmo de Assis Martins, Zélia Ricardo Pereira, Raimundo Moreira
Barbosa.
Periodicidade: Anual
Contextualização da Manifestação: O Reinado de Nossa Senhora do Rosário é uma
manifestação concebida pelos escravizados e seus descendentes no Brasil, entre os
séculos XVI e XVIII, utilizando elementos do culto a Nossa Senhora do Rosário,
introduzido na África pelos portugueses com fins catequéticos, das antigas monarquias
africanas e de outras festas religiosas, a exemplo daquelas que representam as lutas
entre cristãos e mouros. Esta manifestação desenvolveu-se em várias regiões do Brasil,
com ênfase no sudeste e, especificamente em Minas Gerais, onde, mais propriamente,
pode ser designada “reinado”.
Durante o período colonial, a festa representava a experiência da escravização
e os esforços por auxílio mútuo encetados pelas irmandades devotadas a santos
negros; após a abolição, a festa adquiriu também um caráter de festejo pela libertação
e de atribuição do próprio ato de libertar a Nossa Senhora do Rosário.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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Em Minas Gerais, desenvolvem-se atualmente centenas de festas de Nossa
Senhora do Rosário anualmente, entre maio e novembro, porém especialmente em
agosto, setembro e outubro. Nessas celebrações, as comunidades afrodescendentes
continuam representando sua experiência social e cultivando a memória de sua
presença no Brasil.
Histórico: Em Betim, é provável que o Reinado de Nossa Senhora do Rosário tenha se
iniciado no século XIX. Entretanto, não encontramos registros da celebração,
propriamente, e sim da existência da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e de sua
luta secular pela construção de uma Capela onde pudesse viver com liberdade sua
devoção à santa.
Os primeiros registros do Reinado em Betim se referem ao século XX, nas
décadas de 20 e 30, quando Joaquim Teodoro da Silva, o Joaquim Nicolau, fundou a
celebração em Vianópolis, doou à Igreja Católica terreno para a construção da Capela
local, estreitou relações com o padre da região, Osório de Oliveira Braga, e liderou ali
o Reinado até cerca de 1950.
Transferindo-se para a região central de Betim, Joaquim Nicolau aliou-se a
outros tradicionais líderes do Reinado na cidade, o que prova que também na região
central existia a manifestação, para “levantar” a festa, que estava irregular. Por esta
razão, Joaquim Nicolau é o ancestral de referência para o Reinado de Nossa Senhora
do Rosário de Betim.
A partir dos anos 50, então, o Reinado tem acontecido regularmente.
Descrição: O Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim é caracterizado por
diversas festas dedicadas aos santos de devoção pelas guardas da cidade, e por um
ápice de eventos conjuntos, realizados entre o final de julho e o começo de setembro
de cada ano.
As festas das guardas envolvem outras guardas da própria cidade e de cidades
vizinhas e detêm características comuns ao Reinado como um todo, como a
alimentação preparada e fruída coletivamente, o hasteamento de bandeiras e a
celebração religiosa católica. Atualmente, há poucas dessas festas em atividade:
apenas a da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário, a da Guarda de
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102
Catopés de Santa Inês e a da Guarda de Marujos São João Bosco.
O ápice do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim começa pelo
hasteamento da bandeira de aviso, um mês antes da data de culminância
propriamente dita. Geralmente, a bandeira de aviso é hasteada na última semana de
julho, num sábado. As diversas guardas vão chegando à Capela de Nossa Senhora do
Rosário a partir das 20 horas, fazem evoluções rituais no adro do templo, executando
seus cantos, danças e instrumentos. Quando todas as guardas se encontram presentes,
especialmente a principal guarda de congo e a principal guarda de moçambique, a
Capitã-regente Maria Ladyr Laranjeira de Melo conduz a bandeira da Mão-poderosa até
o local de hasteamento. Alguns capitães se unem para erguer o mastro em cuja
extremidade foi afixada a bandeira e, então, todos os capitães, regidos pelo Pé-da-
coroa Dalmo de Assis Martins, fazem movimentos de subida-e-descida com seus
bastões encostados ao mastro, enquanto dizem fervorosas orações. Então, novamente
as guardas fazem evoluções em torno do mastro, passando suas bandeiras e seus
terços três vezes em torno do mesmo, cantam, dançam e executam instrumentos no
adro da Capela.
O ritual é finalizado por volta de meia noite e seu objetivo é anunciar a
proximidade do Reinado propriamente dito.
Nove dias antes da data prevista de culminância do Reinado, tem início a
novena de preparação dos irmãos que protagonizam a festa. Essa novena é preparada
principalmente pelo corpo administrativo da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário
de Betim e pela matriarca da Guarda de Marujos de São João Bosco, Zélia Ricardo
Pereira. Para cada noite da novena, é convidada uma comunidade religiosa dos bairros
adjacentes ao bairro Angola, onde acontecem os principais eventos do Reinado. As
comunidades, lideradas por seus respectivos padres, executam o culto e fazem
oferendas e homenagens à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário. A presença das
lideranças da Irmandade na novena é regular; porém, poucos dançantes a freqüentam,
alegadamente por razões de trabalho.
Ao final de cada missa da novena, é hasteada a bandeira do santo de devoção
de uma ou duas das guardas de Betim. O ritual de hasteamento das bandeiras é em
tudo semelhante ao da bandeira de aviso, exceto em que, geralmente, há poucos
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dançantes na novena. Os capitães e dançantes presentes costumam se reunir num
único grupo para fazer as evoluções em torno da Capela e do mastro. Além disso,
algumas guardas não participam da novena e do hasteamento da bandeira do santo de
devoção na Capela; elas realizam o ritual na casa de seus capitães. É o caso da Guarda
de Congo de São Judas Tadeu e da Guarda de Moçambique de Santa Efigênia.
O último dia da novena, um sábado, é também um dia de intensa preparação
para a culminância da festa. Neste dia, as atividades começam ao anoitecer, com o
cortejo de traslado das imagens de devoção da Irmandade, Nossa Senhora do Rosário,
São Benedito e Santa Efigênia, da casa da secretária da Irmandade, Elisa Mota
Marques, para a Capela do Rosário. As guardas fazem cumprimentos mútuos e
reverências às imagens na garagem da residência, e depois seguem em cortejo até a
Capela, que fica a 500 m da referida residência.
Uma vez na Capela, é celebrada a última missa da novena e hasteadas as
últimas bandeiras, incluindo a de Nossa Senhora do Rosário. Findos os rituais, por
volta da meia-noite, a Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário permanece
na Capela para as matinas. O ritual das matinas não foi observado, porém o capitão
responsável por ele informou que são feitos ritos em todos os pontos de entrada e
saída do entorno da Capela do Rosário, as encruzilhadas, solicitando permissão e
proteção dos “donos” dessas encruzilhadas para a realização da festa.
Pela manhã, algumas guardas de Betim recebem as guardas convidadas de
outros municípios para um café-da-manhã na Casa da Cultura Josephina Bento. Uma
guarda de congo recebe as visitantes, que adentram o quintal da Casa, realizando
rituais em torno do cruzeiro apropriado, que está neste quintal, e junto à imagem de
Nossa Senhora do Rosário, ataviada no interior da Casa da Cultura. Os reis e rainhas se
assentam em torno de uma grande mesa de café-da-manhã e aí recebem os
cumprimentos de todas as guardas, que executam cantos específicos e performances.
Finda a recepção das guardas, por volta de 11h todas saem em cortejo da Casa
da Cultura até a Capela do Rosário, fazendo o percurso da Av. Governador Valadares,
que tem continuidade na Rua Dr. Gravatá, de onde transpõem a ponte sobre o Rio
Betim e atingem a Praça de Nossa Senhora do Rosário, onde está localizada a Capela.
Durante o cortejo, as guardas fazem evoluções especiais nas esquinas/encruzilhadas e
na transposição da ponte. O cortejo leva as imagens de devoção da Irmandade e
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104
também o sino da Capela, que é ordinariamente guardado na Casa da Cultura.
O cortejo conta com pequeno público, apesar da riqueza da indumentária, dos
instrumentos e das performances.
No adro da Capela do Rosário, após fazerem as voltas regulamentares em torno
da Capela, as guardas depositam em seu interior as imagens de devoção e instalam o
sino na pequena torre sineira localizada ao lado da Capela. Então, em grande
apoteose, começam a sair para o almoço ritual, realizado na Escola Municipal Clóvis
Salgado, localizada nas proximidades da Capela.
Para o almoço, que evita carne de porco e cuida da boa hidratação dos
participantes da festa, os reis e rainhas têm mesa e assento especial, e são servidos
pela Capitã-regente. Após o almoço, algumas guardas visitantes retornam a seus
municípios, dada a distância a percorrer.
À tarde, novo cortejo conduzindo as imagens acontece no bairro Angola,
arredores da Capela do Rosário, local de tradicional presença afrodescendente. No
retorno do cortejo, por volta das 20 h, acontece a Missa Conga, que em Betim é uma
missa tradicional, com elementos alusivos ao Reinado, tais como: ofertório com frutas,
cantos efetuados pelas guardas com seus tambores rufando, participação do Rei e da
Rainha Conga e de outros protagonistas da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário
nas leituras, orações e cantos.
Após a Missa, acontece o ritual de arriamento das bandeiras dos santos de
devoção, com características muito semelhantes às dos rituais de hasteamento, com a
diferença de que antes da descida dos mastros acontece o pagamento de promessas:
diversas guardas e pessoas diferentes dão voltas em torno da Capela, pagando tais
promessas.
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Documentação fotográfica:
Cortejo de 30/08/2009 nas proximidades da Capela do Rosário. Foto: Max Vianinni
Evoluções das guardas no adro da Capela do Rosário em 30/08/09. Foto: Max Vianinni.
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Guarda de Moçambique de Santa Efigênia reverencia imagens na Capela do Rosário, após cortejo de
30/08/09. Foto: Max Vianinni
Importância da Manifestação: O Reinado de Nossa Senhora do Rosário é uma das
manifestações culturais de mais antigo registro em Betim, representando importante
espaço de expressão das comunidades e culturas afrodescendentes do Município. Faz
parte do calendário oficial de festividades municipais, juntamente com diversas outras
manifestações populares.
Vitalidade da Manifestação: A manifestação apresenta boa vitalidade.
Análise da Vitalidade: Apesar de o Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim
apresentar diversos sinais de mudanças em curso nas características normalmente
atribuídas a manifestações similares, como não mais preparar suas refeições, não mais
angariar recursos para a realização da festa, não mais possuir algumas figuras
presentes nos Reinados, dentre outras, continua uma manifestação ativa e regular
desde o final dos anos 50. Mudanças nas tradições, que podem ser associadas à idéia
de desvitalização da manifestação, também podem ser interpretadas como
apropriação, pelos protagonistas da celebração, de elementos constituintes de seu
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contexto. Ou seja, por que seguir a pé de bairros distantes para o centro da cidade,
onde é realizada a festa, se há transporte disponível para tal? Ou, por que pedir
donativos à comunidade, se o poder público se dispõe a financiar a festa? O Reinado
de Nossa Senhora do Rosário de Betim acontece em uma cidade próspera, onde eles,
os protagonistas do Reinado, estão economicamente marginalizados. A celebração é
um momento em que eles passam a primeiro plano e, durante o ano, utilizam o fato
de serem os protagonistas da Festa para obter apoios à sua manutenção como
cidadãos e festeiros. Em função de tudo isso, o Reinado de Nossa Senhora do Rosário
de Betim parece capaz de se perpetuar por tempo indeterminado, efetuando intenso
diálogo entre a tradição e a contemporaneidade.
Fatores de Degradação: O principal fator de degradação é a relação recíproca entre o
Reinado e o poder público como fonte de financiamento. A forma como este vem
sendo feito dá margem a paternalismo e enfraquecimento da capacidade da Irmandade
de Nossa Senhora do Rosário de realizar autonomamente sua festa, caso o poder
público viesse a se ausentar de suas atuais responsabilidades. Também pode ser
considerada fator de degradação a relação recíproca do Reinado com a mídia, que
promove uma certa espetacularização da festa.
Medidas de Conservação: São medidas de conservação do Reinado de Nossa Senhora
do Rosário de Betim:
1. Formação contínua da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, através da
reflexão sobre suas práticas e do contato com outros grupos similares, para a
troca de experiências;
2. Relativização das formas como o financiamento público da celebração vem
sendo feito, procurando retomar práticas coletivistas da Irmandade;
3. Formação e potencialização do público para a celebração, criando condições
para que o Reinado se torne mais visível e legível pela sociedade betinense e
das adjacências;
4. Fortalecimento dos vínculos entre a Irmandade e seus bens materiais, como a
Capela, as imagens e os objetos rituais, envolvendo-a na manutenção e
preparação desses bens para a festa.
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Proteção Legal Existente: Inventário (2005)
Proteção Legal Proposta: Registro como patrimônio imaterial do Município
Informações Complementares: Para aprofundamento das discussões presentes neste
fichamento, ver Dossiê de Registro do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim
(FUNARBE, 2009)
Referências:
FONSECA, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas: Betim, sua História. 1711-1975.
Betim: Prefeitura Municipal de Betim, 1975.
GOLOVATY, Ricardo Vidal. A folclorização da cultura popular: a folia de Santos Reis no
Jornal Correio de Uberlândia, 1984-2002. História e perspectivas, Uberlândia
(32/33): 221-244, Jan. Jul./Ago.Dez, 2005.
GOMES, Ana Claudia. Histórico da Vida Religiosa em Betim. Pesquisa encomendada
pela Articulação Comunicação & Marketing. Betim - MG, 2005 (texto não-publicado).
LISBOA, Adriana das Graças Araújo. Bandeira de Aviso. Mensagem eletrônica de 21 de
julho de 2009.
LUCAS, Glaura. Os sons do rosário: o congado mineiro dos Arturos e Jatobá. Belo
Horizonte, Editora da UFMG, 2002.
NERY, Vanda Cunha Albieri. Dançadores da Fé: processos comunicacionais e
simbologias no Reinado de Nossa Senhora do Rosário. Intercom. Sociedade Brasileira
de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXX Congresso Brasileiro de Ciências
da Comunicação. Santos: 29 de agosto a 2 de setembro de 2007.
PAULINO, Rogério Lopes da S. Máscaras vivas ou em extinção? Tradição e renovação
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
109
nas folias de reis. In: IV REUNIAO CIENTIFICA DE PESQUISA E POS GRADUAÇÃO EM
ARTES CENICAS, Belo Horizonte, 2007.
PEREIRA, Marcelo. Arturos: olhos do Rosário. Belo Horizonte: Mazza edições, 1990.
REILY, Suzel Ana. To Remember Captivity: The Congados of Southern Minas Gerais.
Latin American Music Review, Volume 22, Number 1, Spring/Summer 2001,
University of Texas Press, P.O.
UFMG / FUNARBE. Dossiê de Tombamento da Capela Nossa Senhora do Rosário. Belo
Horizonte: Convênio Fundação Artístico Cultural de Betim - FUNARBE / UFMG / NEAD
1997.
Ficha Técnica:
Levantamento: Adriana das Graças Araújo Lisboa, Ana Claudia Gomes, Eliziêr Borges
Marcelino e Otília Sales Neta (Departamento de Planejamento e Pesquisa da FUNARBE)
– Janeiro a Dezembro/2009.
Elaboração: Adriana das Graças Araújo Lisboa, Ana Claudia Gomes e Otília Sales Neta
(Historiadoras do Departamento de Planejamento e Pesquisa da FUNARBE) –
Novembro/2009 a Janeiro/2010.
Consultoria Técnica: Guilherme Alberto Rodrigues (Cientista Social pela UFMG) –
Janeiro/2010.
Documentação Fotográfica: Acervo da FUNARBE.
Revisão: Ana Claudia Gomes (janeiro/2010).
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12.2. INVENTÁRIO DA IMAGEM DE SÃO BENEDITO
1. Município: Betim
2. Distrito: Sede
3. Acervo: Capela do Rosário
4. Endereço: Praça Nossa Senhora do Rosário s/nº Angola
5. Proprietário: Prefeitura Municipal de Betim
6. Responsável: Prefeitura Municipal de Betim
7. Designação: Imagem de São Benedito
8. Localização Específica: Casa da Cultura Josephina Bento da Costa (localização
provisória, enquanto a Capela do Rosário não é dotada das condições de segurança
adequadas ao acondicionamento do bem). Rua Padre Osório Braga, nº 18, Centro.
9. Espécie: Imaginária
10. Época: Final do século XIX
11. Autoria: Sem referência
12. Origem: Sem referência
13. Procedência: Capela de Nossa Senhora do Rosário
14. Material/Técnica: Madeira / Gesso/ policromia.
15. Marcas/Inscrições/Legendas: Não tem
16. Histórico: São Benedito era descendente de negros etíopes escravos. Nasceu na
Itália, em 1526, e foi criado na fé cristã. Tornou-se irmão leigo franciscano e entrou,
como cozinheiro da Ordem, num convento em Palermo, onde depois se tornou superior
e mestre dos noviços. Ficou muito conhecido pela sua pregação do Evangelho e pelo
seu costume de ajudar os pobres, dando comida aos famintos e oferecendo agasalhos
para aqueles que passavam frio. No ano de 1589 ele faleceu, aos 65 anos. Foi
beatificado em 1763 e canonizado em 1807 pela Igreja Católica, tornando-se o santo
negro mais importante da história.
Sua devoção no Brasil data do século XVIII, e foi trazida por franciscanos
portugueses. Desde então, passou a ser muito venerado estando em capelas por todo o
litoral sudeste e nordeste bem como nas regiões de mineração, onde se encontrava um
grande contingente de escravos e ex-escravos.
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Em Betim a devoção ao santo é de longa data e se manifesta de maneira mais
intensa entre os membros da Irmandade Nossa Senhora do Rosário.
17. Descrição: A imagem, em gesso e madeira, possui uma base quadrada, azul, com
uma faixa dourada no centro. Está posicionada de pé, com pés calçados com sapato
preto, formando um pequeno ângulo. Veste hábito de cor amarronzada, com detalhes
dourados cintados por um cordão com quatro nós. Os braços da imagem apresentam-se
flexionados à frente, com mãos espalmadas para cima, segurando uma criança,
masculina, quase desnuda, deitada sobre um pano branco, com pontas douradas caídas
lateralmente. A criança sobre o pano possui rosto redondo, bochechas salientes e
cabelos curtos. A imagem é uma figura masculina, negra e de meia idade, cuja cabeça
está ligeiramente inclinada para esquerda, rosto redondo, boca cerrada e olhos rasos
de olhar contemplativo e imberbe.
18. Documentação Fotográfica:
Imagem de São Benedito Acervo fotográfico da FUNARBE 2009
Imagem de São Benedito Acervo fotográfico da FUNARBE 2009
19. Condições de Segurança - Por precaução, a imagem se encontra na Casa da
Cultura Josephina Bento, que possui vigia noturno. Esta, porém, não representa
condição de segurança adequada, pois o local não possui sistema de segurança
eletrônica.
20. Proteção Legal Existente - Inventário (1998)
21. Dimensões - A imagem possui 35 cm de altura e 13 cm de largura.
22. Estado de Conservação - A imagem apresenta estado de conservação regular,
apresentando lascados e sujidades.
23. Características Iconográficas - A imagem possui características iconográficas que
identificam o Santo como pertencente à ordem franciscana, apresentando uma túnica
marrom cintada por um cordão de quatro nós que representam os votos de pobreza,
castidade, penitência e obediência. A imagem traz o menino Jesus nos braços,
fazendo alusão a um episódio milagroso da vida do santo, em que, segundo a tradição
católica, a Virgem Santíssima apareceu ao santo e colocou o Menino Deus nos braços
de Benedito, como sinal de sua devoção para com Jesus Cristo.
24. Intervenções/Responsável/Data:
Não temos registros de que a peça tenha passado por algum processo de intervenção.
25. Referência Bibliográfica:
AZZI, Riolando. "A Espiritualidade popular no Brasil: um enfoque histórico". In;
Revista Grande Sinal, Petrópolis, Vozes, Ano XLVIII, pp. 293-304, 1994.
DAVID, Solange Ramos de Andrade. "Manifestações populares do Catolicismo na
Revista Eclesiástica Brasileira -m1963-1980". In; REB, vol.63, fasc. 251, julho de
2003, pp.601-614.
Fonseca, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas – Betim – Sua História: 1711/1975.
Betim, Prefeitura Municipal de Betim, 1975.
PEPE, Enrico. Mártires e santos do calendário romano, São Paulo, Ave Maria, 2006
SGARBOSA, Mario. Os santos e os beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente. Com uma
antologia de escritos espirituais. Tradução Armando Braio Ara, São Paulo: Paulinas,
2003.
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113
26. Informações complementares:
Até o ano de 2009 acreditava-se que a imagem era de madeira, porém uma prospecção
feita na mesma por técnico especializado revelou que a peça é de gesso. Para
constatar tal informação sobre as técnicas, material e características estilísticas da
imagem propõe-se um restauro da mesma.
27. Ficha Técnica:
Levantamento/elaboração: Adriana das Graças de Araújo Lisboa. Revisão: Ana Claudia
Gomes. Dezembro/2009.
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12.3. Inventário da Imagem de Santa Efigênia
1. Município: Betim
2. Distrito: Sede
3. Acervo: Capela do Rosário
4. Endereço: Praça Nossa Senhora do Rosário s/nº Angola
5. Proprietário: Prefeitura Municipal de Betim
6. Responsável: Prefeitura Municipal de Betim
7. Designação: Imagem de Santa Efigênia
8. Localização Específica: Casa da Cultura Josephina Bento da Costa (localização
provisória, enquanto a Capela do Rosário não é dotada das condições de segurança
adequadas ao acondicionamento do bem). Rua Padre Osório Braga, nº 18, Centro.
9. Espécie: Imaginária
10. Época: Final do século XIX
11. Autoria: Sem referência
12. Origem: Sem referência
13. Procedência: Capela de Nossa Senhora do Rosário
14. Material/Técnica: Madeira / Gesso/ policromia.
15. Marcas/Inscrições/Legendas: Não tem
16. Histórico:
A tradição católica conta que Santa Efigênia pertencia à nobreza. Era princesa
da Núbia, filha do rei Egyppo, e converteu-se ao cristianismo, sendo batizada pelo
apóstolo Mateus, no século I. Efigênia passou desde então a ser indiferente aos
prazeres e requintes da corte, tornando-se religiosa. Após a sua conversão e a morte
de seu pai, seu tio – Hitarco – teria usurpado o trono do herdeiro legítimo – Efrônio –,
irmão de Efigênia, tentando desposá-la para consolidar o seu poder na Núbia. Efigênia
teria se recusado aos assédios do rei. Este, tomado pela ira, ordenou que fosse ateado
fogo à habitação religiosa onde vivia Efigênia e as religiosas que ela liderava. Mas a
casa foi milagrosamente salva pela intercessão de Efigênia que orou a Deus na ocasião
pedindo socorro. Efigênia foi também figura importante na recuperação do trono por
seu irmão, restabelecendo o bom governo na Núbia com a morte do usurpador.
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Ainda segundo uma narrativa mitológica, Efigênia teria abraçado a vida religiosa
seguindo a regra carmelita.
A devoção a Santa Efigênia chegou ao Brasil no século XVIII, através da Ordem
do Carmo, com o intuito de catequizar os negros, utilizando para isso a propagação de
santos de origem africana. Esta prática em torno da propagação dos votos de
obediência, pobreza e castidade de Santa Efigênia tinha como intuito a manutenção
da ordem social. Com isso a igreja voltava as suas ações para a tarefa de inserir no
interior da cristandade os chamados “homens de cor”. A multiplicação destas ações se
desdobrou na promoção de santos pretos, funcionando como exemplos de virtudes
cristãs a serem seguidas pelos seus devotos africanos e seus descendentes. As
histórias propagadas sobre Santa Efigênia na colônia associavam esta à Ordem
Carmelita. Tal associação denotava a relação que se queria estabelecer entre o Carmo e
a proposta de catequese dos escravos em questão, visto que seria cronologicamente
impossível associar Efigênia com os Carmelitas, pois a Ordem foi criada no século XIII,
e a Santa viveu no Século I, sendo convertida por intermédio de Mateus, discípulo de
Jesus Cristo.
É possível afirmar que a tentativa de monopólio da Ordem do Carmo sobre os
negros foi em vão, pois estes fizeram suas próprias releituras em relação à devoção a
Santa Efigênia, ligando-a a entidades religiosas africanas e criando até mesmo suas
próprias Irmandades em honra a Santa, que resultava na diminuição de fundos para as
Irmandades do Carmo. Porém mesmo sabendo das intenções dos carmelitas, não
podemos negar que foi através deles que a santa passou a ser venerada e seu culto
permanece até hoje. Em Betim, a devoção a Santa Efigênia é explícita na Irmandade
de Nossa Senhora do Rosário que também carrega o nome da Santa e de São Benedito.
17. Descrição:
Figura feminina de meia-idade, de pé, com cabeça inclinada para direita, olhos
negros, rosto oval, boca fechada, queixo arredondado, pescoço comprido, olhar
contemplativo. Braço direito semi-flexionado voltado para cima com mão espalmada
voltada. O braço esquerdo está flexionado com a mão em posição de segurar, com
miniatura de uma edificação sobre a mesma. Veste túnica marrom, cintada com uma
faixa central, onde observam-se motivos estelares de quatro pontas douradas e frisos
dourados entre as pontas. Cabeça encoberta por véu branco e sobre este um manto
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116
negro que vai da cabeça, entrelaça no pescoço e se estende até os pés, que têm
bordas douradas visíveis sobre a cabeça da peça em formato de capuz. A edificação
sobre a mão esquerda da Santa é de cor branca e possui telhado e torre central
vermelha. Possui base de madeira em quadrado chanfrado na cor verde.
18. Documentação fotográfica:
Imagem de Santa Efigênia Acervo fotográfico da FUNARBE 2009
Imagem de Santa Efigênia Acervo fotográfico da FUNARBE 2009
19. Condições de Segurança: Razoáveis. A Casa da Cultura possui vigilância noturna.
20. Proteção Legal Existente: Nenhuma
21. Dimensões: A imagem possui 40 cm de altura e 13 cm de largura.
22. Estado de Conservação: Regular
23. Analise do estado de conservação:
A imagem apresenta estado de conservação regular, apresentando lascados e
sujidades, necessitando de reparo emergencial.
24. Características Técnicas:
Peça aparentemente de gesso com base em madeira entalhada.
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117
25: Características Estilísticas:
Peça artesanal em gesso e madeira.
26. Características Iconográficas:
A imagem é representada vestindo um hábito carmelitano, que associa a mesma com a
ordem. Na veste da imagem, encontra-se uma faixa que representa um escapulário,
também aludindo a devoção da santa à Virgem do Carmo. A Imagem carrega sobre a
mão esquerda uma edificação que representa uma casa de religiosas, convento. Esta
representação simboliza o atentado sofrido por Efigênia, onde o rei da Núbia ordenou
que fosse colocado fogo no convento onde esta residia. Conta a história que Efigênia
clamou a Deus e o fogo cessou. Por isso a mão direita da imagem está posicionada
para cima, como alguém que eleva as mãos em um ato de oração. Essas características
iconográficas da imagem servem para simbolizar a mesma como a patrona contra
incêndios.
27. Intervenções/Responsável/Data:
Não temos registros de que a peça tenha passado por algum processo de intervenção.
28. Referência Bibliográfica:
AZZI, Riolando. A cristandade colonial: mito e ideologia. Petrópolis: Vozes, 1987
AZZI, Riolando. "A Espiritualidade popular no Brasil: um enfoque histórico". In;
Revista Grande Sinal, Petrópolis, Vozes, Ano XLVIII, pp. 293-304, 1994.
DAVID, Solange Ramos de Andrade. "Manifestações populares do Catolicismo na
Revista Eclesiástica Brasileira -m1963-1980". In; REB, vol.63, fasc. 251, julho de
2003, pp.601-614.
Fonseca, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas – Betim – Sua História: 1711/1975.
Betim, Prefeitura Municipal de Betim, 1975.
PEPE, Enrico. Mártires e santos do calendário romano, São Paulo, Ave Maria, 2006
SGARBOSA, Mario. Os santos e os beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente. Com uma
antologia de escritos espirituais. Tradução Armando Braio Ara, São Paulo: Paulinas,
2003.
29. Informações complementares:
Até o ano de 2009, acreditava-se que a imagem era de madeira, porém uma
prospecção feita na mesma por técnico especializado revelou que a peça é de gesso.
Para constatar tal informação sobre as técnicas, material e características estilísticas
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118
da imagem, propõe-se um restauro da mesma.
30. Ficha Técnica:
Levantamento/elaboração: Adriana das Graças de Araújo Lisboa. Revisão: Ana Claudia
Gomes. Dezembro/2009.
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119
12.4. Inventário da Imagem de Nossa Senhora do Rosário
1. Município: Betim
2. Distrito: Sede
3. Acervo: Capela do Rosário
4. Endereço: Praça Nossa Senhora do Rosário s/nº Angola
5. Proprietário: Pública
6. Responsável: Fundação Artístico Cultural de Betim - FUNARBE
7. Designação: Imagem de Nossa Senhora do Rosário
8. Localização Específica: Atualmente FUNARBE
9. Espécie: Imaginária
10. Época: Meados do século XIX
11. Autoria: Sem referência
12. Origem: Sem referência
13. Procedência: Capela de Nossa Senhora do Rosário
14. Material/Técnica: Madeira/Escultura/entalhe/Olhos de vidro
15. Marcas/Inscrições/Legendas: Não consta
16. Histórico:
A origem da devoção à Nossa Senhora do Rosário é muito antiga, surgiu dentro
dos mosteiros no século VIII, dado que muitos monges não sabiam ler os salmos e
passaram a rezar 150 Ave Marias, e no intervalo de cada dezena meditavam sobre as
passagens da vida de Cristo. Esta prática nos mosteiros era chamada de “coroa de
rosas a Maria”, pois, na devoção mariana, cada Ave Maria que se reza representa uma
rosa ofertada a Virgem. Depois, a prática ficou conhecida como Rosário. A propagação
da devoção a Maria do Rosário começou com o monge São Domingos de Gusmão;
certas versões históricas afirmam ter Nossa Senhora aparecido a São Domingos
segurando o Menino Jesus no colo e oferecendo-lhe o santo Rosário, e cuja
propagação e divulgação teria tomado impulso por pedido pessoal de Maria
Santíssima, que se apresentou ao monge como a Senhora do Rosário. Domingos desde
então fez do Rosário sua poderosa oração e foi inspirado a fundar a ordem dominicana
e por sua intensa propagação e devoção, a Igreja lhe conferiu o título de “Apóstolo do
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120
Santo Rosário”.
A devoção a Nossa Senhora do Rosário foi divulgada na Europa e na África
pelos frades dominicanos e, no Brasil, pelos frades capuchinhos. Em Minas Gerais,
onde a devoção data dos primeiros tempos da colonização, ela foi adotada como
padroeira de confrarias e irmandades, sobretudo as de negros, principalmente
relacionadas aos congados.
Em Betim, segundo as pesquisas do historiador Geraldo Fonseca, o primeiro
registro que temos da devoção a virgem é de 1814, onde a Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário, solicita, por meio de carta, a construção de uma Capela em honra
a virgem. Sobre a imagem propriamente dita temos, também a partir das pesquisas de
Geraldo da Fonseca, o registro do Inventário dos bens da Matriz de N. S. do Carmo do
Betim de 1854, onde descreve “uma imagem de Nossa Senhora do Rosário com seu
menino, com coroa e resplendor de prata e brincos, e rosário de pedra branca”. Como
o mesmo historiador arrola diversos documentos mostrando como as oferendas para a
construção da Capela de Rosário foram destinadas, pelo pároco local, à construção da
Matriz e, como compensação aos “devotos pretinhos”, Nossa Senhora do Rosário
ganharia um altar ataviado no novo templo, estima-se que a Imagem ora em
inventário, por suas características técnicas e estilísticas tenha sido a imagem referida
nos documentos.
17. Descrição:
Figura feminina, meia idade, posição frontal, cabeça em posição reta com um
furo para colocação de coroa, sobre véu bege com um leve douramento, possui coroa
dourada com pedras azuis e cristalinas, rosto em formato oval, bochechas salientes,
olhos escuros, traços da face: nariz, boca, e queixo finos, orelhas possuem furos para
a colocação de brincos, cabelos castanho-escuro longos, pescoço longo, braços
flexionados estendidos, mão esquerda segura um lençol bege com bordas douradas e
sobre ele o Menino Jesus em madeira entalhada de cor rosada, desnudo, possuindo um
furo na cabeça para colocação de coroa. Na mão direita da Senhora, observa-se um
Rosário de contas de lágrimas. Vestido, pernas retas, em baixo cinco querubins, três
ao centro e um de cada lado, estes com cabelos castanhos, face com bochechas
salientes, olhos claros e asas douradas, todos sobre uma nuvem azul céu sobreposta
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na base, a imagem possui túnica em cor verde e vestes longas na cor azul,
ornamentadas com motivos florais e bordas douradas, base escalonada na cor vinho.
18. Documentação fotográfica:
Imagem de N. Sra do Rosário na Capela homônima, durante o Reinado de Betim Data: 30/08/2009
Fotógrafo: Max Vianinni
Imagem de N. Sra do Rosário na Capela homônima, durante o Reinado de Betim Data: 30/08/2009
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Fotógrafo: Max Vianinni
Imagem de N. Sra do Rosário na sede da FUNARBE Data: 29/12/2009
Fotógrafo: Adriana Lisboa
Imagem de N. Sra do Rosário na sede da FUNARBE Data: 29/12/2009
Fotógrafo: Adriana Lisboa
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20. Condições de Segurança: Razoáveis
21. Proteção Legal Existente: Inventário (2004 e 2009)
22. Proteção Legal Proposta: Tombamento
23. Dimensões: 120 cm de altura x 42 cm x 34 cm.
24. Estado de Conservação:
A imagem apresenta ótimo estado de conservação, pois foi restaurada em 2006.
25. Analise do estado de conservação:
A imagem passou por intervenção de restauro há três anos, onde foram retiradas
espessas camadas de repintura e gesso que descaracterizava as características
estilísticas da imaginária. Nesta intervenção, foram feitas aberturas, limpezas e
tratamento de xilófagos. A imagem apresentou no início de 2009 uma galeria de
xilófagos, que foi tratada e reparada pela permanência em câmara apropriada por
quarenta dias.
26. Características Técnicas:
Peça em madeira entalhada com um furo na cabeça para colocação de coroa, com uma
espécie de metal elevado na mão esquerda para segurar o Menino Jesus que também é
de madeira entalhada e possui furo na cabeça para colocação de coroa. Observa-se que
foram utilizadas também técnicas de corte das faces para colocação de olhos de vidro.
27: Características Estilísticas:
A peça apresenta características estilísticas do barroco.
28. Características Iconográficas:
A imagem de Nossa Senhora do Rosário está em pé, com o Menino Jesus em seu braço
esquerdo. Na mão direita, a Virgem segura um Rosário que identifica a sua devoção. O
Rosário, o Menino Jesus e os Querubins entre as nuvens sobre os pés da imagem,
fazem uma alusão às aparições da virgem. Sendo assim, a iconografia é uma
representação de Maria segurando seu filho e entregando o Rosário aos seus fieis
como um pedido de oração.
29. Intervenções/Responsável/Data:
A imagem foi restaurada pelo Grupo Oficina de Restauro de 02 de maio a 31 de
outubro de 2007.
30. Referência Bibliográfica:
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AZZI, Riolando. "A Espiritualidade popular no Brasil: um enfoque histórico". In;
Revista Grande Sinal, Petrópolis, Vozes, Ano XLVIII, pp. 293-304, 1994.
DAVID, Solange Ramos de Andrade. "Manifestações populares do Catolicismo na
Revista Eclesiástica Brasileira -m1963-1980". In; REB, vol.63, fasc. 251, julho de
2003, pp.601-614.
Fonseca, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas – Betim – Sua História: 1711/1975.
Betim, Prefeitura Municipal de Betim, 1975.
PEPE, Enrico. Mártires e santos do calendário romano, São Paulo, Ave Maria, 2006
SGARBOSA, Mario. Os santos e os beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente. Com uma
antologia de escritos espirituais. Tradução Armando Braio Ara, São Paulo: Paulinas,
2003.
31. Informações complementares:
Como a Capela do Rosário passará por um processo de restauração nos próximos
meses, a Imagem de Nossa Senhora do Rosário encontra-se abrigada no prédio da
Fundação Artístico Cultural de Betim. Após o restauro e instalação de equipamentos de
segurança adequados a Imagem retornará para a Capela.
32. Ficha Técnica:
Levantamento/elaboração: Adriana das Graças de Araújo Lisboa. Revisão: Ana Claudia
Gomes. Dezembro/2009.
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12.5. INVENTÁRIO DE BANDEIRA DE N. SRA. DO ROSÁRIO DO
REINADO
1. Município: Betim
2. Distrito: Sede
3. Acervo: Irmandade Nossa Senhora do Rosário
4. Endereço: Praça Nossa Senhora do Rosário s/nº Angola
5. Proprietário: Irmandade
6. Responsável: Capitão da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário, Sr.
Dalmo de Assis Martins
7. Designação: Bandeira de Nossa Senhora do Rosário
8. Localização Específica: Residência do Capitão responsável. Rua Cascatinha nº 14,
Jardim Petrópolis, Betim - MG
9. Espécie: Imaginária
10. Época: Meados do século XX
11. Autoria: Joaquim Nicolau
12. Origem: Irmandade do Rosário
13. Procedência: Irmandade do Rosário
14. Material/Técnica: Madeira/Vidro/Papel/Tecido/biscuit
15. Marcas/Inscrições/Legendas: AVE MARIA
16. Histórico:
A origem da devoção à Nossa Senhora do Rosário é muito antiga, surgiu dentro
dos mosteiros no século VIII, dado que muitos monges não sabiam ler os salmos e
passaram a rezar 150 Ave Marias, e no intervalo de cada dezena meditavam sobre as
passagens da vida de Cristo. Esta prática nos mosteiros era chamada de “coroa de
rosas a Maria”, pois, na devoção mariana, cada Ave Maria que se reza representa uma
rosa ofertada a Virgem. Depois, a prática ficou conhecida como Rosário. A propagação
da devoção a Maria do Rosário começou com o monge São Domingos de Gusmão;
certas versões históricas afirmam ter Nossa Senhora aparecido a São Domingos
segurando o Menino Jesus no colo e oferecendo-lhe o santo Rosário, e cuja
propagação e divulgação teria tomado impulso por pedido pessoal de Maria
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
126
Santíssima, que se apresentou ao monge como a Senhora do Rosário. Domingos desde
então fez do Rosário sua poderosa oração e foi inspirado a fundar a ordem dominicana
e por sua intensa propagação e devoção, a Igreja lhe conferiu o título de “Apóstolo do
Santo Rosário”.
A devoção a Nossa Senhora do Rosário foi divulgada na Europa e na África
pelos frades dominicanos e, no Brasil, pelos frades capuchinhos. Em Minas Gerais,
onde a devoção data dos primeiros tempos da colonização, ela foi adotada como
padroeira de confrarias e irmandades, sobretudo as de negros, principalmente
relacionadas aos congados.
Em Betim, segundo as pesquisas do historiador Geraldo Fonseca, o primeiro
registro que temos da devoção a virgem é de 1814, onde a Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário, solicita, por meio de carta, a construção de uma Capela em honra
a virgem.
A devoção a Nossa Senhora do Rosário foi passando de pai para filho e hoje se
mantém forte através da Festa do Reinado de Nossa Senhora do Rosário, conhecida
também como Congado. Sobre a Bandeira de Nossa Senhora do Rosário, esta pertence
à Irmandade do Rosário e é um objeto considerado sagrado pela mesma. A bandeira,
porém, é passada de geração para geração, ficando sempre sob a salvaguarda de um
capitão da Guarda de Moçambique, que exerce a função de “Pé de Coroa”. A bandeira
foi confeccionada pelo Sr. Joaquim, um dos mais antigos ancestrais de que se tem
notícia da Irmandade. Segundo Sr. Dalmo, a Bandeira está sob sua responsabilidade
há 20 anos. A Bandeira de Nossa Senhora do Rosário é hasteada no primeiro dia da
festa logo após o término das novenas, o que ocorre normalmente no sábado.
17. Descrição:
Figura feminina jovem com olhar de piedade e rosto inclinado à esquerda para
baixo; sobre a cabeça observa-se uma coroa com cinco estrelas e em torno da mesma
doze estrelas. O braço esquerdo da virgem encontra-se estendido com mão de entrega
segurando um rosário. A figura possui mão direita de segurar, com menino Jesus
desnudo, este com cabeça aureolada e coroa. O Menino possui mão direita de entrega,
com um rosário, e mão esquerda posta. A imagem possui túnica em cor vermelha e
vestes longas na cor azul. Está representada sentada em um trono sobre uma base
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
127
arredondada na cor marrom. Ao lado esquerdo da virgem ajoelhada, encontra-se uma
figura feminina de jovem com as mãos em concha, sendo que a direita está recebendo
um rosário de Nossa Senhora, e na mão esquerda encontra-se uma chaga aberta. No
lado direito, ajoelhado, encontra-se uma figura masculina de meia idade com direita
recebendo o Rosário das mãos do Menino Jesus e mão esquerda esticada. Ambas as
figuras aos pés da Imagem central ventem hábitos nas cores marrom e bege. No fundo
da pintura observa-se um cenário de dois portais abertos. Por fim observa-se presa na
bandeira uma fita pendente na cor branca com listras prateadas.
18. Documentação Fotográfica
Bandeira de N. Sra. do Rosário no Centro de
Umbanda do Sr. Dalmo de Assis Martins
Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
Bandeira de N. Sra. do Rosário no Centro de
Umbanda do Sr. Dalmo de Assis Martins
Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
Detalhe da Bandeira de N. Sra. do Rosário no Centro de Umbanda do Sr. Dalmo de
Assis Martins Data: 29/12/09
Fotógrafo: Otília Sales Neta
19. Condições de Segurança: Razoável
20. Proteção Legal Existente: Nenhuma
21. Proteção Legal Proposta: Inventário
22. Dimensões: possui 48 cm de comprimento x 38 cm largura x 5 cm de suporte
23. Estado de Conservação: Bom
24. Analise do estado de conservação:
A madeira da moldura, bem como os tecidos, apresentam bom estado de conservação.
A madeira e o tecido em volta da moldura são renovados de tempos em tempos,
permitindo a conservação da peça.
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128
25. Características Técnicas:
Moldura de madeira e vidro com imagem de Nossa Sra. do Rosário em papel.
Circundando a moldura, um tecido na cor prata. Colado ao tecido em volta da moldura,
encontram-se flores brancas de biscuit.
26: Características Estilísticas: A figura é uma espécie de réplica de pintura.
27. Características Iconográficas:
A imagem de Nossa Senhora do Rosário está sentada, em um trono, como o Menino
Jesus em seu braço direito. Na mão esquerda a Virgem segura um Rosário que
identifica a sua devoção. As estrelas ao redor da cabeça da virgem são uma alusão à
passagem bíblica do Apocalipse, e representam a mesma como rainha do céu e da
terra. O Rosário e o Menino Jesus fazem uma alusão às aparições da virgem ao monge
São Domingos e à religiosa Santa Catarina. Sendo assim, a iconografia é uma
representação de Maria segurando seu filho e entregando o Rosário aos seus fiéis
como um pedido de oração. A bandeira possui uma fita para fazer reverências a Nossa
Senhora do Rosário.
28. Intervenções/Responsável/Data: A bandeira é reformada sempre que necessário
pelo seu guardião Sr. Dalmo Martins (Pé da Coroa).
29. Referência Bibliográfica:
AZZI, Riolando. "A Espiritualidade popular no Brasil: um enfoque histórico". In;
Revista Grande Sinal, Petrópolis, Vozes, Ano XLVIII, pp. 293-304, 1994.
DAVID, Solange Ramos de Andrade. "Manifestações populares do Catolicismo na
Revista Eclesiástica Brasileira -m1963-1980". In; REB, vol.63, fasc. 251, julho de
2003, pp.601-614.
Fonseca, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas – Betim – Sua História: 1711/1975.
Betim, Prefeitura Municipal de Betim, 1975.
PEPE, Enrico. Mártires e santos do calendário romano, São Paulo, Ave Maria, 2006
SGARBOSA, Mario. Os santos e os beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente. Com uma
antologia de escritos espirituais. Tradução Armando Braio Ara, São Paulo: Paulinas,
2003.
30. Informações complementares:
Fonte Oral: Dalmo Martins de Assis
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129
31. Ficha Técnica:
Levantamento/elaboração: Adriana das Graças de Araújo Lisboa, e Otília da Conceição
Sales Neta. Revisão: Ana Claudia Gomes. Dezembro/2009.
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130
12.6. INVENTÁRIO DA BANDEIRA DE AVISO
1. Município: Betim
2. Distrito: Sede
3. Acervo: Irmandade Nossa Sra. do Rosário
4. Endereço: Praça Nossa Senhora do Rosário, S/N, Angola – Betim - MG
5. Proprietário: Irmandade Nossa Sra. do Rosário
6. Responsável: Capitão da Guarda de Moçambique: Sr. Dalmo Martins
7. Designação: Bandeira de Aviso
8. Localização Específica: Residência do Capitão da Guarda de Moçambique/Pé-da-
Coroa Sr. Dalmo Martins. Rua Cascatinha nº 14, Jardim Petrópolis, Betim - MG
9. Espécie: Objeto sacro
10. Época: século XX
11. Autoria: Joaquim Nicolau
12. Origem: Betim
13. Procedência: Capela de Nossa Senhora do Rosário
14. Material/Técnica: Madeira/ tecido/ plástico/
16. Histórico:
O hasteamento da Bandeira de Aviso é um ritual com caráter de alerta,
avisando que a comunidade estará em festa, que é aberta a toda a população da
cidade. O rito tradicional de hastear a bandeira dias antes do começo das festividades
tem sua origem desde o tempo da escravidão, quando as práticas religiosas dos negros
eram discriminadas. A bandeira de aviso era a única forma dos negros anunciarem e
divulgarem suas festas religiosas. Nessa época tropeiros e viajantes ajudavam a
espalhar a notícia quando avistavam a bandeira de aviso, com a imagem do principal
santo de devoção das irmandades.
Em Betim a Irmandade do Rosário mantém a tradição de hastear uma bandeira
anunciando a grande festa do Reinado de Nossa Senhora do Rosário. Trinta dias antes
da festa, as 11 guardas da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, Santa Ifigênia,
São Benedito e Nossa Senhora Aparecida de Betim, se reúnem no Adro da Capela do
Rosário para o ritual de hasteamento da Bandeira de Aviso.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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A bandeira de aviso é hasteada num ritual de sons, cores e preces. Os capitães
e suas guardas benzem a bandeira, fazem reverências, rezam o terço, cantam, batem
as caixas, dançam, louvam e elevam preces e súplicas a Nossa Senhora e aos
padroeiros, pedindo assim proteção e bênçãos para as guardas e para festa que se
aproxima.
A festa acontece tradicionalmente em Betim no ultimo domingo do mês de
agosto, portanto o hasteamento da Bandeira de Aviso é um mês antes. A bandeira
permanecerá levantada até o dia da grande festa que é antecedida por uma novena em
honra a Nossa Senhora do Rosário.
A Bandeira de Aviso pertence à Irmandade do Rosário e é um objeto
considerado sagrado pela mesma, e passada de geração para geração, ficando sempre
sob a salvaguarda de um capitão da Guarda de Moçambique, que exerce a função de
“Pé de Coroa”.
A bandeira foi confeccionada na época do mais antigo ancestral de que se tem
notícia da Irmandade, Sr. Joaquim Nicolau. Após seu falecimento, seu filho José
Teodoro passou a ser o guardião da mesma, que foi passada para o Capitão Dalmo
Martins, atual “Pé–da–Coroa”. Segundo Sr. Dalmo, a Bandeira está sob sua
responsabilidade há 20 anos. A Bandeira precisa ser firmada, confirmada e “Batizada”
e, a partir daí, é considerada um objeto sagrado e irá ser usada nas festas anuais da
Irmandade. No ritual de confirmação, segundo Sr. Dalmo, ainda existem alguns
segredos mantidos pela irmandade. Também faz parte do ritual de confirmação a
participação em diversas missas. Segundo relatos, a Bandeira usada atualmente já foi
confirmada desde á época do Sr. Joaquim Nicolau.
17. Descrição:
Moldura de Madeira, com um forro de tecido; na lateral esquerda da moldura
existem orifícios por onde é colocada uma haste de metal, para adaptação no mastro.
No tecido nota-se uma pintura no formato de uma coroa, na cor vermelha com
detalhes dourados. Em torno da moldura, observam-se flores de plástico lilases e
brancas, predominando a cor branca.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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18. Documentação Fotográfica:
Bandeira de Aviso do Reinado
de Nossa Senhora do Rosário de Betim
Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
Bandeira de Aviso do Reinado
de Nossa Senhora do Rosário de Betim
Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
Bandeira de Aviso do Reinado
de Nossa Senhora do Rosário de Betim
Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
18. Condições de Segurança: Boas
19. Proteção Legal Existente: Nenhuma
20. Proteção Legal Proposta: Inventário
21. Dimensões: possui 58 cm comprimento x 46 cm de largura x 10 cm de suporte
22. Estado de Conservação: Bom estado de conservação.
23. Análise do estado de conservação:
Em 2005 foi feita uma repintura da coroa, mantendo a cor original. Ocasionalmente é
feita aplicação de produto na madeira, para impedir infestação de insetos.
24 Características Técnicas: Moldura de Madeira e tecido de algodão cru, com uma
pintura.
25: Características Estilísticas: possui uma técnica simples na pintura.
26. Características Iconográficas:
A iconografia é uma representação da Coroa de Nossa Senhora do Rosário. A cor
vermelha utilizada no desenho da coroa simboliza o Divino Espírito Santo. As flores de
plástico, predominando a cor branca em torno da moldura, representam as estrelas
apocalípticas, que iluminam Nossa Senhora como uma auréola, representado a mesma
como rainha do céu e da terra. A Bandeira é colocada no mastro e hasteada 30 dias
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
133
antes, para anunciar a festa do Reinado do Rosário.
27. Intervenções/Responsável/Data: A bandeira é reformada sempre que necessário
pelo seu guardião, Sr. Dalmo Martins (Pé da Coroa).
28. Referência Bibliográfica:
AZZI, Riolando. "A Espiritualidade popular no Brasil: um enfoque histórico". In;
Revista Grande Sinal, Petrópolis, Vozes, Ano XLVIII, pp. 293-304, 1994.
DAVID, Solange Ramos de Andrade. "Manifestações populares do Catolicismo na
Revista Eclesiástica Brasileira -m1963-1980". In; REB, vol.63, fasc. 251, julho de
2003, pp.601-614.
Fonseca, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas – Betim – Sua História: 1711/1975.
Betim, Prefeitura Municipal de Betim, 1975.
PEPE, Enrico. Mártires e santos do calendário romano, São Paulo, Ave Maria, 2006
SGARBOSA, Mario. Os santos e os beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente. Com uma
antologia de escritos espirituais. Tradução Armando Braio Ara, São Paulo: Paulinas,
2003.
29. Informações complementares:
Entrevistado: Dalmo de Assis Martins
30. Ficha Técnica:
Levantamento/elaboração: Adriana das Graças de Araújo Lisboa, Otília da Conceição
Sales Neta. Revisão: Ana Claudia Gomes. Dezembro/2009.
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
134
12.7. INVENTÁRIO DO BASTÃO DO CAPITÃO PÉ-DA-COROA
1. Município: Betim
2. Distrito: Sede
3. Acervo: Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário
4. Endereço: Rua Cascatinha nº 14, Jardim Petrópolis, Betim - MG
5. Proprietário: Capitão Dalmo de Assis Martins
6. Responsável: Capitão Dalmo Martins da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora
do Rosário.
7. Designação: Bastão do Capitão
8. Localização Específica: Residência do Capitão
9. Espécie: Material Ritual
10. Época: século XX
11. Autoria: José Vitorino dos Santos
12. Origem: Urucuia/Esmeraldas - MG
13. Procedência: Capitão da Guarda de Moçambique Nossa Senhora do Rosário
14. Material/Técnica: Madeira entalhada, revestida de tecido
15. Marcas/Inscrições/Legendas: Não possui
16. Histórico:
O bastão é considerado um dos principais objetos usados pelos capitães das
guardas. Atribui-se a ele poderes espirituais, de proteção. Seu uso inicial, segundo
relatos seria de apoio, espécie de bengala usada por negros africanos. De acordo com
o mito do reinado narrado, todos os objetos, o rosário, o bastão, a coroa foram
dotados de poder sagrado ao serem oferecidos pela santa. O bastão era um cajado de
Preto Velho, que foi dado a Nossa Senhora para que lhe servisse de “pinguela” e
devolvido como um bastão sagrado.
Com seus bastões sagrados, o capitão conduz a guarda. A passagem do bastão
a um sucessor possui significado místico ancestral. Acontece quando o patriarca, em
idade avançada, escolhe entre os seus subordinados, podem ser filhos, sobrinhos ou
alguém de confiança, que tenha melhores energias espirituais. O sucessor precisa fazer
um juramento de sempre ser fiel ao grupo e ao reino do Rosário. Cabe a ele continuar
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
135
mantendo viva a tradição.
Na confecção do bastão existem segredos mantidos, tais como as orações do
santo protetor da guarda. Também é levado em consideração o tipo de madeira e
normalmente são usadas madeiras mais regulares, de preferência sem espinho. Na
confecção do bastão, é feito um orifício, na parte superior, onde é colocada uma
oração. A oração colocada não deve ser revelada, pois representa a defesa do capitão
e da guarda. É a proteção que a guarda tem, é o seu poder espiritual. Há também
relatos da inserção de preparados com ervas no interior do bastão.
As cores das fitas usadas podem variar de acordo com cada guarda. As fitas
geralmente são as mesmas que tem na coroa de N. Sra do Rosário, azul, branco, rosa,
verde podendo variar, usando cores diversas, inclusive o preto, mas não é comum
utilizar esta última, pois simboliza luto. As fitas significam a defesa de uma guarda e
também são firmadas em um ritual. Segundo relatos, simbolizam a proteção na linha
africana, são as “linhas dos Santos” na linguagem africana.
Podem ser usados até sete (7) anéis no bastão. Também simbolizando defesa,
amarração, proteção. O número de anéis poderá variar de acordo com a hierarquia: Ex:
o 1° capitão pode usar até 7 anéis, os demais irão usar de acordo com a capacidade e
posição.
Os bastões devem ser confirmados em cerimônias que podem ser: de coroação
do capitão, em centros espíritas, novenas entre outros. A defesa do grupo (da guarda)
é confirmada por todos os pontos cantados (orações) que tem poder: “o bastão fica
forte e mais iluminado”.
Segundo Sr. Dalmo, no caso de saídas da guarda, tem que ter sempre um
bastão “firmando” a casa. A casa de um capitão não pode ficar sem um bastão, pois
este significa a proteção do líder e da guarda que ele conduz. O bastão usado por S.
Dalmo e que pertenceu a seu tio, foi benzido pelo padre Ozório Braga, figura
importante na história política e religiosa da Cidade de Betim.
Sr. Dalmo herdou seu bastão de seu tio-padrinho, que morava em
Urucuia/Esmeraldas, quando tinha 17 anos, estando o mesmo sob sua guarda há 43
anos. Entretanto o bastão já estava sob a guarda do tio há aproximadamente 15 anos.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
136
17. Descrição:
Bastão confeccionado em madeira lisa, pintado com um verniz preto, revestido de
fitas nas cores verde e amarelo e vermelho. Na parte superior, foi talhada uma figura
semelhante a uma caveira.
18. Documentação Fotográfica:
Bastão do Sr. Dalmo de Assis Martins Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
Caveira no bastão do Sr. Dalmo de Assis Martins Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
Caveira no bastão do Sr. Dalmo de Assis Martins Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
Caveira no bastão do Sr. Dalmo de Assis Martins Data: 29/12/09 Fotógrafo: Otília Sales Neta
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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19. Condições de Segurança: Razoáveis
20. Proteção Legal Existente: Nenhuma
21. Dimensões: Comprimento: 55 cm X 10 cm circunferência
22. Estado de Conservação: O bastão apresenta um ótimo estado de conservação.
23. Análise do estado de conservação:
As fitas estão sempre sendo renovadas pelo seu proprietário Sr. Dalmo Martins.
24. Características Técnicas: Madeira entalhada e envernizada
25: Características Estilísticas: Artesanal.
26. Características Iconográficas: O bastão apresenta a representação de uma
caveira, porém seu significado ritual não é revelado pelo Capitão Dalmo de Assis
Martins por constituir elemento específico de sua Guarda.
27. Intervenções/Responsável/Data:
O bastão passa por intervenções constantemente, onde são trocadas as fitas que o
envolvem.
28. Referência Bibliográfica:
Fonseca, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas – Betim – Sua História:
1711/1975. Betim, Prefeitura Municipal de Betim, 1975.
NERY, Vanda Cunha Albieri. Dançadores da Fé: processos comunicacionais e
simbologias no Reinado de Nossa Senhora do Rosário. Intercom. Sociedade Brasileira
de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXX Congresso Brasileiro de Ciências
da Comunicação. Santos: 29 de agosto a 2 de setembro de 2007.
29. Informações complementares:
Fontes Orais: Dalmo Martins de Assis e Rei Congo Monklin Delano Martins Ramos
30. Ficha Técnica:
Levantamento/elaboração: Adriana das Graças de Araújo Lisboa, Otília da Conceição
Sales Neta. Revisão: Ana Claudia Gomes. Dezembro/2009.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
138
12.7. INVENTÁRIO DA INDUMENTÁRIA DO CONGO DE NOSSA
SENHORA DO ROSÁRIO DOS HOMENS PRETOS DE BETIM
1. Município: Betim
2. Distrito: Sede
3. Acervo: Guarda de Congo de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos
4. Endereço: Rua Visconde de Itaboraí, Jardim Petrópolis, Betim - MG
5. Proprietário: Efigênia Ágata da Silva
6. Responsável: Efigênia Ágata da Silva
7. Designação: Indumentária da Guarda de Congo
8. Localização Específica: Residência da Dona da Guarda
9. Espécie: Indumentária
10. Época: século XXI
11. Autoria: Efigênia Ágata da Silva
12. Origem: Betim - MG
13. Procedência: Betim - MG
14. Material/Técnica: Tecido, fitas, fitilhos, vidrilhos, papelão, miçangas e plumas
15. Marcas/Inscrições/Legendas: Não possui
16. Histórico:
Cada guarda do Reinado de N. Sra. do Rosário tem uma composição de
indumentária que a caracteriza. Os congos representam com suas vestes a natureza,
arbustos e flores, pois abrem os caminhos para as demais guardas. Por isso, sua
indumentária costuma ser a mais colorida e elaborada de todo o conjunto. Apenas a
eles é permitido usar plumas, no Reinado de Betim. Os moçambiques têm composições
indumentárias mais sérias, geralmente com o branco predominante, e podem usar
turbantes ou toucas nas cabeças. Os marujos representam marinheiros e sua
indumentária lembra fardas militares, inclusive com a presença do quepe. As guardas
de catopés também usam indumentária simples, calça ou saia e blusa em duas
diferentes cores, conforme o santo de devoção. São essas as tipologias das guardas de
Betim. As cores dependem dos santos de devoção, que variam nas diferentes guardas,
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
139
e há uma grande ocorrência de branco e azul, associadas à Nossa Senhora do Rosário.
17. Descrição:
A indumentária da Guarda de Congo de Nossa Senhora do Rosário dos Homens
Pretos de Betim é composta de calça e blusa brancas e sapatos também
preferencialmente brancos. Sobre a roupa, há um colete curto, que cobre apenas os
ombros, e que é coberto de fitilhos em forma de laços. Das barras do colete, descem
fitas de grande espessura, nas cores verde, branco, vermelho, azul, rosa, laranja e
amarelo, em tonalidades variadas. Para a cintura, há saiotes, confeccionados com
faixas de tecido recheadas em papelão, das quais descem fitas em espessura mais fina
que as dos coletes, mas com a mesma paleta de cores. Nas cabeças, capacetes altos
em azul ou laranja, ou faixas, confeccionados com tecido recheado por papelão, das
quais emergem muitas plumas, nas mesmas cores da paleta citada. Para serem usadas
cruzadas sobre o tronco, colares com muitas fileiras de miçangas, um conjunto em
verde, outro em azul, outro em branco. Sobre tudo isso, um rosário de contas de
lágrimas. E na mão, um bastão, pois a protagonista é a segunda Capitã da Guarda.
18. Documentação Fotográfica:
Congo de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos em cortejo Data: 30/08/09
Fotógrafo: Max Vianinni
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Congo de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos em ritual junto aos mastros Data: 30/08/09
Fotógrafo: Max Vianinni
Efigênia Ágata da Silva saúda o altar na Capela do Rosário
Atentar para as plumas Data: 30/08/09
Fotógrafo: Max Vianinni
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
141
Efigênia Ágata da Silva junto ao altar na Capela do Rosário
Atentar para os colares de miçangas Data: 30/08/09
Fotógrafo: Max Vianinni
Efigênia Ágata da Silva saúda o altar na Capela do Rosário Atentar para o conjunto
Data: 30/08/09 Fotógrafo: Max Vianinni
19. Condições de Segurança: Razoáveis
20. Proteção Legal Existente: Nenhuma
21. Proteção Legal Proposta: Inventário
21. Dimensões: Tamanho GG
22. Estado de Conservação: Excelente.
23. Análise do estado de conservação:
A indumentária de Efigênia Ágata da Silva está em excelente estado de conservação
por ter sido confeccionada em 2009, ano de estréia da guarda. A indumentária pode
ser utilizada por poucos anos, dada a predominância do branco. A manutenção dos
elementos é feita anualmente.
24. Características Técnicas: Costura, montagem, colagem
25: Características Estilísticas: Não se aplica.
26. Características Iconográficas: O branco e o azul predominantes são uma alusão a
Nossa Senhora do Rosário. As plumas e as fitas representam elementos da natureza,
especialmente a vegetação, pois o congo é representado como aquele que abre
caminhos em regiões silvestres para o conjunto do Reinado. As cores desses elementos
são alusões aos santos de devoção e ao próprio significado a elas atribuído pelos
protagonistas do Reinado, conforme explica a própria Efigênia, responsável pela
finalização desta indumentária: “A nossa guarda ficou o azul, né? Porque é o manto de
Nossa Senhora... que... eu acho que além de ser a cor do manto de Nossa Senhora...
também é a cor do céu que nos clareia pra onde nós vai... cor da corrente celeste, cor
dos anjos, porque cada anjo veste de uma cor, então as fita significa as cores dos
anjos” (Efigênia Ágata da Silva, 17/12/09).
27. Intervenções/Responsável/Data:
Não houve.
28. Referência Bibliográfica:
NERY, Vanda Cunha Albieri. Dançadores da Fé: processos comunicacionais e
simbologias no Reinado de Nossa Senhora do Rosário. Intercom. Sociedade Brasileira
de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXX Congresso Brasileiro de Ciências
da Comunicação. Santos: 29 de agosto a 2 de setembro de 2007.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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29. Informações complementares:
Fontes Orais: Efigênia Ágata da Silva
30. Ficha Técnica:
Levantamento/elaboração: Otília da Conceição Sales Neta e Ana Claudia Gomes.
Revisão: Ana Claudia Gomes. Dezembro/2009.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
144
13. IDENTIFICAÇÃO DE
ATIVIDADES CORRELATAS
A manifestação que, em Betim, se apresenta como Reinado de Nossa Senhora
do Rosário, nasceu no Brasil no século XVII e, segundo algumas fontes, no século XVI,
em Pernambuco e na Bahia, e daí se espalhou pelo Brasil. Originalmente melhor
definida como “congado”, por representar o enfrentamento entre poderosas
monarquias africanas, no sudeste adquiriu as feições do “reinado”, onde os reis
outrora rivais se tornaram aliados, e os cantos e danças dos negros os homenageavam,
e também à Nossa Senhora do Rosário.
O congado ou reinado ocorre em todo o Brasil, com mais freqüência na região
Sudeste e especificamente em Minas Gerais, onde ocorrem mais de trezentas festas
similares, segundo Nery (2007). Alguns exemplos19: Itaúna, Itatiaiuçu, Carmo do
Cajuru, Divinópolis, Itapecerica, Ferros, Raposos, São João Del Rei, Sete Lagoas,
Jequitibá, Lagoa Santa, Ouro Preto, Sabará, Cláudio, Carmo da Mata, Lagoa da Prata,
Alpinópolis, Guapé, Passos, São Sebastião do Paraíso, Bom Despacho, Dores do Indaiá,
Cordislândia, Bocaina de Minas, Machado, Contagem, Belo Horizonte, Centralina,
Araguari, Uberlândia, Indianópolis, Ituiutaba, Monte Alegre de Minas, Uberaba,
Veríssimo, Montes Claros, São Romão, Moema, Paracatu, Conceição do Mato Dentro,
Morro do Pilar, Diamantina, Minas Novas, Chapada do Norte, Sabinópolis, São Gonçalo
do Rio Preto/Serro, Congonhas do Norte, Datas.
19 Informações coletadas do sítio eletrônico: http://www.descubraminas.com.br/destinosturisticos/hpg_pagina.asp?id_pagina=1750&id_pgiSuper (Acesso em 19/12/2009).
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
145
14. Delimitação e
descrição da área de
ocorrência
Embora atividades relacionadas ao Reinado ocorram em diversos pontos do
território municipal e em municípios vizinhos, para esta descrição e análise será
tomado o epicentro da celebração, isto é, a Capela de Nossa Senhora do Rosário, seu
entorno imediato e as ruas do bairro Angola e do hipercentro da cidade, onde se
realizam cortejos.
A Capela de Nossa Senhora do Rosário fica no limite entre o centro da cidade e
o bairro Angola, logo depois da ponte sobre o Rio Betim que, historicamente, dividiu
os dois bairros e as populações lusodescendentes e afrodescendentes. Situada no alto
de uma colina, a Capela agora não é visível ao longe, como provavelmente foi em seus
primórdios, devido ao adensamento residencial e comercial nas proximidades. A parte
frontal da Capela, ao longo da colina, foi ajardinada e contém uma longa escada,
pouco utilizada. No entorno imediato da Capela, há um pátio pavimentado em pedras
e cercado por um muro baixo de pedras.
De ambos os lados da Capela, bem como ao fundo, desenvolvem-se residências
e alguma edificações em mais de um pavimento. Ao pé da colina, virando-se à
esquerda, começa a Rua do Rosário, principal via do bairro Angola e por onde flui o
tráfego de veículos que se dirigem à região norte da cidade, onde estão importantes
equipamentos como a Pontifícia Universidade Católica, o Parque de Exposições David
Gonçalves Lara, a pista de kart e a represa Várzea das Flores. O primeiro quilômetro da
Rua do Rosário é importante corredor dos cortejos da Festa de Nossa Senhora do
Rosário e ainda concentra as residências de diversas famílias afrodescendentes ou
conhecedoras das manifestações do Reinado.
Embora importante corredor do tráfego local, a Rua do Rosário mantém
importante função residencial e diversos conjuntos de edificações típicas de meados
do século XX, em um pavimento.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
146
Imediatamente ao lado esquerdo da Capela do Rosário, ainda no alto da colina,
começa uma rua também importante para as manifestações do Reinado, por onde seus
protagonistas se dirigem à Escola Municipal Clóvis Salgado, onde têm acontecido os
almoços rituais nas últimas décadas. Trata-se de rua estreita, com raras passagens de
veículos e tipicamente residencial, como, de resto, o entorno imediato da Capela, na
colina.
O cortejo principal do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim dá-se ao
longo de razoável extensão do eixo histórico do centro da cidade de Betim, ligando as
duas edificações mais antigas desse conjunto, a Casa da Cultura Josephina Bento e a
Capela de Nossa Senhora do Rosário. A Casa da Cultura Josephina Bento fica à Rua
Padre Osório, nº 18, junto à Praça Milton Campos, de onde floresceu o núcleo urbano
de Capela Nova de Betim, no século XVIII. A atual Casa da Cultura é a única edificação
setecentista remanescente no território de Betim, em estilo colonial, e serviu
originalmente à parada dos tropeiros e ao comércio de secos e molhados.
O cortejo do Reinado de Nossa Senhora do Rosário parte da Casa da Cultura
para o norte, onde está localizada a Capela do Rosário, atravessando toda a extensão
da Av. Governador Valadares, uma das principais do hipercentro, que tem continuidade
na Rua Dr. Gravatá, que começa após a transposição da via férrea e termina na ponte
sobre o Rio Betim, onde começa a Rua do Rosário.
Todo o trecho percorrido tem importantes funções administrativas, comerciais
e de serviços, e, apenas secundariamente, residenciais. Na Av. Governador Valadares,
há um trecho especializado em serviços privados de saúde (clínicas, hospital e
farmácias). Nas proximidades do cruzamento desta avenida com a Amazonas, a função
comercial torna-se predominante, mas também se encontram aí a Câmara Municipal, o
Fórum Cível e o Museu Paulo Araújo Moreira Gontijo. Há poucas décadas, a Av.
Governador Valadares mantinha diversos conjuntos residenciais ecléticos e art decò,
intensamente descaracterizados para dar lugar às funções comerciais e de serviços
nessa região.
Finda a Governador Valadares, transpõe-se a via férrea, em cujo leito acontece
atualmente o transporte de cargas, e tem início a Rua Dr. Gravatá, especializada em
um comércio mais popular, de hortifrutigranjeiros, roupas, materiais de limpeza e
artigos veterinários. O conjunto arquitetônico aí construído no início do século XX, em
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
147
articulação com a via férrea e a Estação Capela Nova, está fortemente
descaracterizado.
O Rio Betim, que é transposto logo após a Rua Dr. Gravatá, foi um importante
manancial local até meados do século XX. Abundante, nele se praticava a pesca e a
lavagem de roupas. Hoje, está reduzido a um estreito canal, extremamente poluído
pelo lançamento de dejetos, especialmente domésticos, em seu leito. A Copasa está
realizando uma obra de despoluição do Rio.
Transposto o Rio, entra-se na Rua do Rosário, numa espécie de largo onde está
a Igreja de São Francisco de Assis, sede da paróquia à qual se filia a Capela de Nossa
Senhora do Rosário, e diversos pontos de comércio. O cortejo atravessa esse largo e
sobe a colina que dá acesso à Capela do Rosário.
Todo o trecho descrito, por suas funções hoje predominantemente comerciais e
de serviços públicos e privados, não tem muitos moradores que possam acorrer à rua
quando da passagem dos cortejos do Reinado de Nossa Senhora do Rosário.
A representação cartográfica da área de ocorrência do Reinado de Nossa
Senhora do Rosário inclui, além dos trechos descritos acima, os pontos onde estão
situadas as residências ou terreiros das principais lideranças do Reinado. A
justificativa para esta representação é que, nessas localidades, reside a maioria dos
dançantes e são realizados rituais de preparação para a festa, como orações e
hasteamento de bandeiras.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
148
15. SALVAGUARDA E
VALORIZAÇÃO:
O Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim apresenta dois problemas
principais:
1. O desenvolvimento de uma dependência em relação ao poder público para o
financiamento e organização da festa;
2. O enfraquecimento de algumas guardas tradicionais;
Ambos os problemas podem ser relativizados a partir de certos pontos-de-vista:
a dependência econômica em relação ao poder público não retira completamente as
reservas de autonomia dos protagonistas da festa porque estes se colocam como
sujeitos diante dessa situação: barganham, mantêm áreas não reveladas de sua
manifestação, o que impede um controle total externo destas, participam das relações
de poder, integrando o sistema partidário da cidade e mesmo fazendo alusões sutis
aos poderes mágico-religiosos que supostamente detêm, exercem pressões, dentre
outros aspectos.
Não raras vezes, quem estuda manifestações populares tradicionais ou
originárias desenvolve uma ortodoxia do olhar, deseja ver a tradição reproduzida
continuamente. Mas, provavelmente, as tradições só podem sobreviver quando elas se
reatualizam constantemente, quando são dinâmicas. Isso pode ser perfeitamente visto
no Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim. Considerando que seus
protagonistas não são mais homens e mulheres de um mundo rural, marcado por uma
vivência específica do tempo do trabalho e da religião, mas homens e mulheres de um
grande cidade marcada pela marginalização de amplos contingentes de sua população,
os protagonistas do Reinado certamente têm novos sentidos com os quais qualificar
sua principal manifestação.
Além de reviverem a memória social dos processos de escravização, dão,
através do Reinado, sentidos às suas novas experiências de exclusão, conforme diz
DOSSIÊ DE REGISTRO DE BEM CULTURAL IMATERIAL
REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
149
Reily (2001). Questionam essa experiência pois, como protagonistas do Reinado, são
personalidades públicas da cidade, reconhecidas e prestigiadas porque sabem lidar
com a cidade. Assim, não se pode dizer que o Reinado sobrevive em Betim
exclusivamente porque a gestão pública assim o quer, mas porque os protagonistas da
manifestação se fazem representar nos sistemas de poder.
Quanto ao enfraquecimento de algumas guardas, processo visível atualmente,
isso certamente tem a ver não só com os processos de lembrar/esquecer numa cidade
metropolitana, mas também com características bastante específicas dos reinados, que
é a veneração aos antepassados e a transmissão familiar dos saberes. As guardas que
estão enfraquecendo perderam grandes lideranças recentemente e, ainda assim, estão
buscando construir mecanismos de sobrevivência. Entre eles, podemos citar: relações
com a mídia, investimento nas performances, desenvolvimento de trabalho social por
algumas guardas, designação, ainda que tensa, de lideranças que possam dialogar com
os sistemas de poder da cidade e obter fomento ao Reinado. Além disso, existe
transmissão dos saberes do Reinado de Betim às crianças e jovens em todas as guardas
da cidade.
A expansão do movimento pentecostal é frequentemente apontada, pelos
próprios protagonistas do Reinado, como um fator de enfraquecimento da
manifestação: “fulano passou pra crente”, dizem eles. Quanto a isso, nada é possível
fazer, inclusive porque o cerceamento da liberdade religiosa não é desejável. Outro
problema é o fato de que a manifestação tornou-se incompreensível para a maioria da
população local, o que abre caminho à sua folclorização.
Ações de proteção, fomento, salvaguarda são possíveis nesse contexto, a partir
das seguintes diretrizes:
O poder público municipal deve manter o fomento financeiro à organização do
Reinado de Nossa Senhora do Rosário em Betim, porém revendo, em diálogo
com seus protagonistas, ações que desvitalizam a capacidade auto-organizativa
do grupo.
De todas as atividades, aquela que envolve o maior número de pessoas e, por
isso, resulta em um tipo específico de sociabilidade, verifica-se no recolhimento de
donativos para a produção das refeições. Esse é um ponto que, a meu ver, chama
muita atenção. Por meio da “esmola”, são estabelecidas teias sociais marcadas pelo
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
150
traço da solidariedade. É onde, também, ‘democratiza-se’ a organização do evento:
todos ajudam, seja pela contribuição de dinheiro ou alimentos, seja pela mão-de-obra
dedicada à produção das refeições.
Deixar a cargo da Irmandade essa atividade não trará impacto negativo para o
evento como um todo. Acredito nisso ao ver a descrição da festa e os depoimentos
dos atores.
Deve ser mantida uma política de formação continuada dos protagonistas do
Reinado de Nossa Senhora do Rosário, através de: manutenção de
oportunidades para a troca de experiências com grupos de outras cidades;
manutenção de encontros regulares entre os grupos de Betim para a discussão
coletiva de seus desafios e propostas; pesquisas e publicações em torno do
Reinado; eventos formais de formação – cursos, oficinas, workshops.
Desenvolvimento de uma política de gestão, pela Irmandade de Nossa Senhora
do Rosário, de seus bens físicos e culturais.
Desenvolvimento de ações de formação de público para o Reinado, através de
mecanismos como: visitas contextualizadas das guardas betinenses a eventos
públicos da cidade; realização de educação patrimonial da comunidade
betinense, inclusive públicos escolares, para a legibilidade do Reinado;
divulgação cuidadosa dos eventos associados ao Reinado em Betim.
Apoio ao fortalecimento das ações das guardas em suas comunidades, a
exemplo de festas e ações sociais.
Cronograma de Ações de Fomento ao Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim
Ações / 2010 1º Trim. 2º Trim. 3º Trim. 4º Trim.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
151
Reuniões periódicas
(quinzenais) com a
Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário para
concepção e planejamento
das atividades do Reinado
em 2010
x x x x
Participação da Irmandade
de Nossa Senhora do
Rosário no processo de
restauro da Capela do
Rosário e de seu altar-mor,
através da metodologia de
Obra-escola da Fundação
de Arte de Ouro Preto
x x x
Apoio às visitas recíprocas
entre as guardas do
Reinado de Betim e de
outras cidades mineiras,
através da cessão de
transporte
x x
Financiamento de
materiais para a realização
do Reinado em 2010
(indumentária,
instrumentos, alimentação,
decoração da Capela,
transporte, fogos de
artifício)
x
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
152
Participação das guardas
do Reinado betinense em
eventos públicos
realizados pela FUNARBE e
pela Prefeitura Municipal
em diversas regiões da
cidade
x x x x
Apoio a atividades
escolares de estudo sobre
as culturas
afrodescendentes e a
encontros com guardas do
Reinado
x x x x
Publicação do Caderno da
Memória: Reinado de
Nossa Senhora do Rosário.
Patrimônio Cultural de
Betim
x
Realização da etnografia
de uma guarda do Reinado
local
x
Restauração da imaginária
de valor afetivo e
devocional da Irmandade
(três imagens)
x x
Apoio à divulgação e à
alimentação nas festas
específicas das guardas de
Betim
x x
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
153
Distribuir às bibliotecas do
município e à Irmandade
cópias do dossiê de
registro do Reinado de
Nossa Senhora do Rosário
de Betim
x
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16. DOCUMENTAÇÃO FOTOGRÁFICA
Foto 1: Reinado de Nossa Senhora do
Rosário de Betim no final dos anos 50
Foto 02: O ancestral Joaquim Nicolau e sua esposa Ana Firmina
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Foto 03: Capela do Rosário, meados do século XX, antes da restauração de
Foto 04: Cortejo do Reinado de Nossa Senhora do Rosário no início dos anos 80. Apenas uma guarda.
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Fotos 05 e 06: Capela do Rosário após o restauro de 1988
Foto 07: Interior da Capela Rosário pouco antes do restauro de 1988
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Foto 08: Imagem de São Benedito pertencente ao acervo da Capela do Rosário
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Foto 09: Imagem de Santa Edwiges pertencente ao acervo da Capela do Rosário
Foto 10: Imagem oitocentista em madeira policromada de Nossa Senhora do Rosário,
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Foto 11: Rainha acompanha o ancestral Joaquim Nicolau – Anos 70
Foto 12: O capitão Tião Medonho à porta da Capela do Rosário, com reis e rainhas. Anos 80
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Foto 13: Reis e rainhas do Reinado de Betim – Anos 80
Foto 14: Guarda de Marujos de São João Bosco, com o Capitão Arlen em primeiro
plano – Anos 80
Foto 15 - Guarda de Moçambique do Capitão Mário. À frente, Ricardina, última Rainha-
da-guia do Reinado de Betim
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Foto 16: Frei Chico celebrando a Missa Conga
Foto 17: Reinado do Rosário em Vianópolis, anos 80
Foto 18: Culminância do Reinado na Capela, Frei Francisco Van Del Poel celebra
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Foto 19: Missa Conga na Matriz de Nossa Senhora do Carmo em Betim. À frente, o Rei Manoel, Rei Perpétuo.
Foto 20: Capela do Rosário após o restauro de 1996
Foto 21: Reinado anos 80
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Foto 22: Interior da Capela do Rosário após o restauro de 1996
Foto 23: Frei Cristóvão, conhecido como “Frei Capeta” e o ancestral Joaquim Nicolau
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Foto 24: Cortejo do Reinado de Nossa Senhora do Rosário chega à Capela em 2001
Foto 25: Tradicional cumprimento entre guarda de congo e guarda de moçambique, 2001
Foto 26: Culminância da Festa do Reinado de Nossa Senhora do Rosário em 2003
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Foto 27: Performance de guarda convidada em 2003
Foto 28: Guarda de Marujos de São João Bosco em 2003
Foto 29 - Hasteamento da bandeira de aviso em 25 de julho
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Fotos 30 e 31 - Ritual de coroação em 25 de julho de 2003, ausente nas últimas festas. O responsável pela coroação é sempre o Capitão Raimundinho, do Congo.
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Foto 32: Cumprimento entre congo e moçambique. Marujos ao fundo.
Foto 33: Guarda de Conselheiro Lafaiete faz os tradicionais rituais junto ao cruzeiro da Casa da Cultura, por ocasião do café-da-manhã em 2004.
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Foto 34: Cortejo sobe ao alto da Capela. As evoluções são de guarda convidada.
Foto 35: Guarda de Catopés de Santa Inês, da Capitã Margarida Maria (D. Tita).
Foto 36: Guarda de Moçambique de Santa Efigênia, do Capitão Zé Lúcio e dos descendentes de Joaquim Nicolau, em 2004. Observar a presença dos treme-terras.
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Foto 37: O Capitão Mário de Paula, que assumiu a Guarda de Joaquim Nicolau, foi pé-da-coroa e presidente da Irmandade nos anos 2000.
Foto 38: Guarda do Capitão Flávio Christian, em 2004, ausente do último Reinado.
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Foto 39: Evolução de guarda convidada durante o café-da-manhã na Casa da Cultura, em 2004.
Foto 40: Cortejo do Reinado deixa a Casa da Cultura e segue pela Av. Governador Valadares, ao lado da Praça Milton Campos, em 2004.
Foto 41: Cortejo do Reinado atravessa esquina da Av. Governador Valadares com Av. Amazonas. Observar ritual da meia-lua.
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Foto 42: Aclive no topo do qual se encontra a Capela do Rosário. Público aguarda a chegada do cortejo em 2004.
Foto 43: Cumprimento entre guardas em 2004. Observar o padrão residencial do entorno da Capela do Rosário, ao fundo.
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Foto 44: Almoço na quadra da E. M. Clóvis Salgado. Destaque para a mesa dos coroados.
Foto 45: Entrega de material pela Funarbe aos protagonistas do Reinado em 2004. Da esquerda para a direita, o Capitão Mário, o Presidente da Funarbe, Osvander Valadão, o Capitão José Lúcio, o Vereador Aerty e o Capitão Flávio Christian. Atentar para a expressão do voto, pelos Capitães e para os treme-terras.
Foto 46: Cortejo transpõe a via ferre em 2005. Ao fundo, a Estação Ferroviária, bem tombado em nível municipal.
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Foto 47: Guarda de Catopés de Santa Inês, de D. Tita, em 2005.
Foto 48: Cortejo do Reinado atravessa a Rua Dr. Gravatá, em 2005.
Foto 49: Cortejo transpõe ponte sobre o Rio Betim, em 2005.
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Foto 50: Almoço do Reinado no Restaurante Popular de Betim, em 2005.
Foto 51: Moçambique do Capitão Ednilton, no Restaurante Popular em 2005.
Foto 52: Segundo cortejo (tarde) da culminância do Reinado de Nossa Senhora do Rosário deixa a Capela em 2005.
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Foto 53: Cortejo da tarde na Rua do Rosário, bairro Angola, em 2005.
Foto 54: Patagongas nos pés do Capitão José Lúcio Nunes, em 2007.
Foto 55: Cortejo do Reinado passa em frente à Matriz de Nossa Senhora do Carmo, em 2009. Guardas de Moçambique do Capitão Ednilton e de Congo do Capitão Davidson, ambos netos de S. Raimundinho.
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Foto 56: Congo do Capitão Ednilton e Moçambique do Capitão Ueverson (Bimbo) em 2009.
Foto 57: Capitão Swami, 2009.
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Foto 58: Capitão Raimundinho, 2009.
Foto 59: Cortejo transpõe a ponte sobre o Rio Betim e passa em frente à Igreja de São Francisco de Assis em 2009.
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Foto 60: Juventude, tradição e contemporaneidade no Reinado de Betim
Foto 61: Sr. Xxx, da Guarda de Catopés de Santa Inês, em 2009. Personagem sempre registrada pelas câmeras, devido à concepção e performance.
Foto 62: Congo do Capitão Aguinaldo, que estreou em 2009, passa a bandeira em torno do mastro, num dos rituais mais freqüentes no Reinado de Betim.
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Foto 63: Jovens do Congo de São Judas Tadeu, de D. Euli (Mãinha) e do Capitão Davidson.
Foto 64: Capitão Davidson, 2009.
Foto 65: Efigênia, 2009.
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Foto 66: Capoeira, sempre presente no Reinado de Betim nos últimos anos. Neste registro, 2009.
Foto 67: D. Ernestina (de perfil), 2009.
Foto 68: Detalhe da decoração da Capela na culminância, concebida e executada principalmente por Maria Ladyr e Benícia, 2009.
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Foto 69: Cortejo da tarde chega à Capela do Rosário, ao anoitecer. 2009.
Foto 70: Guarda de Moçambique do Capitão Dalmo chega à Capela após o cortejo da tarde, em 2009.
Foto 71: Capitão Dalmo ao centro, 2009. Registro raro.
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Foto 72: Capitão Dalmo conduz ritual junto ao mastro, 2009.
Foto 73: Sr. XXX da Guarda de Catopés de Santa Inês, uma das personalidades mais fotografadas do Reinado de Betim. 2009.
Foto 74: Capitão José Lúcio contempla estátua do ancestral Joaquim Nicolau, 2009.
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Foto 75: Capitães realizam ritual da “firmeza e da união” junto ao mastro, 2009.
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17. REGISTRO
AUDIOVISUAL:
1. Edição de filmes que registram a celebração nas décadas de 1990 e 2000.
2. Arquivos de áudio das entrevistas realizadas para a elaboração deste
dossiê.
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18. REFERÊNCIAS
Fontes Orais
Adriana Alves de Faria
Airton Lourenço dos Santos
Bernardo Gontijo Guimarães
Cleide Eunira
Dalmo de Assis Martins
Deyvidisson Leandro Barbosa
Efigênia Ágata da Silva
Elisa Mota Marques
Eneida Aparecida da Silva
Euli Ricardo Faria
Gilberto da Silva Santos
Israel de Jesus
Luci Lourenço dos Santos
Luciana Lourenço dos Santos
Lucilene dos Santos Nunes
Margarida Maria da Silva
Maria Ladyr Laranjeira Melo
Maria das Graças Assunção
Monklin Delano Martins
Nádia Mara Paiva
Patrícia Brito
Raimundo Moreira Barbosa
Zélia Ricardo Pereira
Zilda Angela Eustáquio
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19. BIBLIOGRAFIA
AGUIAR, Djanir Arantes. Cantos do mundo: viagens/histórias. Belo Horizonte: Cultura, 2000. ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e minas. Rio de Janeiro: IBGE / conselho nacional de geografia. Edição da Divisão Cultural, 1963. ASSIS, Terezinha. A construção da história de Betim: espaço geográfico construído por gente Betim: Prefeitura Municipal, 1996. 142p. BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário histórico-geográfico de Minas Gerais. ed. comemorativa dos dois séculos e meio da capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1971. BARBOSA, Waldemar de Almeida. História de Minas. Belo Horizonte: ed. Comunicação. vol. 3. BETIM. Prefeitura Municipal de Betim. BETIMCURA, Ethurb - Belo Horizonte: Grafenge, 1979. BOLLEME. Geneviéve. O povo por escrito. (Tradução de Antonio de Pádua Danesi). São Paulo: Martins Fontes, 1988. BORIS, Fausto. História concisa do Brasil. 9 ed. São Paulo: Edusp, 2001. 660 p. BOSCHI, Caio César. Os leigos e o poder. Irmandades leigas e política colonizadora em Minas Gerais. São Paulo: Ática, 1986. CASTRIOTA, Leonardo Barci. Alternativas contemporâneas para políticas de preservação. Topos - Revista de Arquitetura e Urbanismo. Belo Horizonte, v. 1, nº 1, p. 134-138, jul/dez. 1999. COLEÇÃO de Leis da Assembléia Legislativa da Província de Minas Gerais de 1849 – 2ª edição – Marianna Typographia Episcopal, 1856. COLEÇÃO Leis e Decretos do Estado de Minas Gerais – 1923 – Imprensa Oficial – Belo Horizonte, 1924. FALCON, Francisco. A formação do mundo contemporâneo. 18 ed. Rio de Janeiro: Campus, 1989. 130p. FAORO, Raimundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. 13 ed. São Paulo: Globo, 1998. (volume 2).
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FLORES, Moacyr. Tropeirismo no Brasil. Porto Alegre: Nova Dimensão, 1998. FONSECA, Geraldo. Origens da Nova Força de Minas: Betim, sua História. 1711-1975. Betim: Prefeitura Municipal de Betim, 1975. FREITAS, Flávia. Salve! Salve a Nossa Cidade... Memória de Betim. Betim: MM Impressão, s/d, 101p. FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: a interiorização da metrópole e do comércio nas minas setecentistas. São Paulo: HUCITEC, 1999. 289 p. GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela inquisição. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. GOLOVATY, Ricardo Vidal. A folclorização da cultura popular: a folia de Santos Reis no Jornal Correio de Uberlândia, 1984-2002. História e perspectivas, Uberlândia (32/33): 221-244, Jan. Jul./Ago.Dez, 2005. GOMES, Ana Claudia. Histórico da Vida Religiosa em Betim. Pesquisa encomendada pela Articulação Comunicação & Marketing. Betim - MG, 2005 (texto não-publicado). GOULART, José Alípio. Tropas e tropeiros na formação do Brasil. Rio de Janeiro: ed. Conquista, 1961. GRUPO OFICINA DE RESTAURO. Relatório das Atividades da Restauração Realizada na Imagem de Nossa Senhora do Rosário Pertencente à Capela de Nossa Senhora Do Rosário – Betim/MG. Betim, março de 2007 (Elizabete Alves e Adriano Reis Ramos). JORNAL A Voz de Betim. Ano I, nº 1, 15/08/1959. (Acervo do Museu Paulo Araújo de Oliveira Gontijo). JORNAL Carapintada. Dezembro/1998, p. 19. JORNAL Vanguarda. Belo Horizonte – Betim, 29/04/1962, pp. 1-6. (Acervo do Museu Paulo Araújo de Oliveira Gontijo). LISBOA, Adriana das Graças Araújo. Bandeira de Aviso. Mensagem eletrônica de 21 de julho de 2009. LUCAS, Glaura. Os sons do rosário: o congado mineiro dos Arturos e Jatobá. Belo Horizonte, Editora da UFMG, 2002. MAIA, Tom. O folclore das tropas, tropeiros e cargueiros no vale do Parnaíba. Rio de Janeiro: Funarte: Instituto Nacional de Folclore, 1981. MARTINS, Saul. Folclore em Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG, 1991.
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MARTINS, Sebastião. Caminhos de minas. São Paulo: Publicações e Comunicações, 1992. MAWE, John. Viagens ao interior do Brasil: principalmente aos distritos do ouro e dos diamantes. Belo Horizonte: Universidade de São Paulo, Livraria Itatiaia, 1914. MODESTO, Ana Lúcia & PITANGUI, Cleonice. Levantamento Cultural de Betim. Betim: FUNARBE, 1996. (mimeo). NERY, Vanda Cunha Albieri. Dançadores da Fé: processos comunicacionais e simbologias no Reinado de Nossa Senhora do Rosário. Intercom. Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Santos: 29 de agosto a 2 de setembro de 2007. PAULINO, Rogério Lopes da S. Máscaras vivas ou em extinção? Tradição e renovação nas folias de reis. In: IV Reunião Científica de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas, Belo Horizonte, 2007. PEREIRA, Marcelo. Arturos: olhos do Rosário. Belo Horizonte: Mazza, 1990. PIMENTA, Dermeval José. Caminhos de Minas Gerais. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1971. PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Atlas do Desenvolvimento Humano, 2000. Página visitada em 12/12/2009. PRADO Jr., Caio. História econômica do Brasil. 9 ed. São Paulo: Brasiliense, 1965. 354 p. PREFEITURA MUNICIPAL DE BETIM (Secretaria de Planejamento / Divisão de Planejamento). Informativo Municipal - Betim ano base 1999. Betim/MG: Prefeitura Municipal de Betim, 1999. 102 p. REILY, Suzel Ana. To Remember Captivity: The Congados of Southern Minas Gerais. Latin American Music Review, Volume 22, Number 1, Spring/Summer 2001, University of Texas Press, P.O. RIBEIRO, Cláudia Júlio. Estudo e avaliação do sistema de reciclagem e tratamento de lixo domiciliar de Betim. Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Engenharia da UFMG. 1997. (Dissertação de Mestrado). RODRIGUES, Maria Lúcia Estrada. A expansão industrial e o processo de produção do espaço em Betim. Universidade de São Paulo. 1980. (Dissertação de Mestrado). RUGANI, Jurema Marteleto. Betim, no caminho que vai das Minas à industrialização. Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Arquitetura da UFMG. 2001. (Dissertação de Mestrado).
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SECRETARIADO DAS VOCAÇÕES FRANCISCANAS DE BETIM. Francisco de Assis. Um ideal de vida. 1984. (Publicação franciscana sem referência de local e editora). SILVEIRA, Marco Antônio. Os arraiais e as vilas nas minas gerais. 4 ed. São Paulo: Atual, 1996. SINOPSE ESTATÍSTICA do Município de Betim – Estado de MG – Subsídios para Estudo da Evolução Política – Alguns Resultados Estatísticos – 1945. Principais Resultados Censitários – 1 – IX – 1940 – Rio de Janeiro – Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – 1948. SOUZA, Martha Veloso Cólen Mourthé de et al. Resgatando a História. Betim. Betim: Gráfica da Prefeitura, s/d. TAUNAY, Afonso. Relatos sertanistas. São Paulo: Livraria Martins editora, 1953. TRINDADE, Joelson Bitran. Tropeiros. São Paulo: Publicações e Comunicações, 1992. UFMG / FUNARBE. Dossiê de Tombamento da Capela Nossa Senhora do Rosário. Belo Horizonte: Convênio Fundação Artístico Cultural de Betim - FUNARBE / UFMG / NEAD 1997. VASCONCELLOS, Diogo L. Pereira de. História antiga das Minas Gerais. Belo Horizonte, 1974. VEIGA, José Pedro Xavier. Revista do archivo público mineiro. Imprensa Oficial de Minas Gerais. Ouro Preto, 1898. WEED, Maximiliam Prinzvon. Viagens ao Brasil. São Paulo: Nacional, 1940. WELLS, James W. Explorando e viajando três milhas através do Brasil. Do Rio de Janeiro ao Maranhão. Tradução de Myriam Ávila e Introdução de Christopher Hill. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1995. WESTPHALEN, Cecília Maria. O barão dos campos gerais e o comércio de tropas. Curitiba: CD, 1995. ZEMELLA, Mafalda. O abastecimento da capitania de Minas Gerais no século XVIII. 2 ed. São Paulo: HUCITEC, 1995.
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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19. FICHA TÉCNICA
Pesquisa e sistematização dos aspectos históricos e geográficos do município
Ana Claudia Gomes (Mestre em História pela UFMG (2002)
Rodrigo Cunha Chagas (Bacharel Licenciado em História PUC/MG)
Henrique Moreira de Castro (Geógrafo Especialista em Percepção Ambiental e Espaço
Urbano pela UFMG).
Pesquisa e sistematização dos dados históricos e antropológicos sobre o Reinado
Adriana das Graças Araújo Lisboa
Ana Claudia Gomes
Otília Sales Neta
Revisão técnica
Guilherme Alberto Rodrigues
Cientista Social e Mestrando / UFMG
Revisão lingüística
Ana Claudia Gomes
Documentação audiovisual
Acervo da Fundação Artístico Cultural de Betim
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Acervo da Secretaria Municipal de Comunicação
Edição da documentação audiovisual
Cristiano Menezes Aguiar
Transcrição das entrevistas
Luiz Otávio Milagres
Patrícia Brandão
Otília Sales Neta
Consultoria
Miguilim Assessoria Cultural Ltda.
Realização
Departamento de Planejamento e Pesquisa
Leila Íris Borges da Cruz
Fundação Artístico Cultural de Betim – FUNARBE
Aderbal Hipólito Lara Gomes – Presidente
Rodrigo Cunha Chagas – Superintendente
Prefeitura Municipal de Betim
Maria do Carmo Lara Perpétuo – Prefeita
Alex Tadeu do Amaral Ribeiro – Vice-prefeito
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20. TRÂMITE DO REGISTRO
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PROPOSTA DE REGISTRO DE
BEM CULTURAL COMO
PATRIMÔNIO CULTURAL
IMATERIAL DO MUNICÍPIO
Eu, Aderbal Hipólito Lara Gomes, Presidente da Fundação Artístico Cultural de Betim,
em entendimento com a Equipe-referência em Proteção ao Patrimônio Cultural do
Departamento de Planejamento e Pesquisa desta Fundação, venho respeitosamente a
este egrégio Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural solicitar o registro do
Reinado de Nossa Senhora do Rosário como patrimônio cultural imaterial do
Município.
Solicito, ainda, que este Conselho dispense a instrução da proposta ora apresentada,
dada a evidente importância e grande publicidade da manifestação Reinado de Nossa
Senhora do Rosário no Município de Betim, e devido ao fato de que o Departamento
de Planejamento e Pesquisa desta Fundação detém suficiente documentação técnica a
respeito da manifestação.
Atenciosamente,
Betim, 04 de novembro de 2009.
Aderbal Hipólito Lara Gomes
Presidente da Fundação Artístico Cultural de Betim
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ATA DE APROVAÇÃO
PROVISÓRIA
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PARECER TÉCNICO SOBRE O
REGISTRO DO BEM
CULTURAL
Considerando termos acompanhado a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Betim em seu processo de preparação do Reinado de Nossa Senhora do Rosário do ano 2009, realizado observações de campo, entrevistas e pesquisas bibliográficas que culminaram na elaboração do presente dossiê, manifestamo-nos favoravelmente ao registro deste bem cultural como patrimônio cultural imaterial do Município de Betim, enfatizando, como justificativas para tal:
A extensão temporal da ocorrência da manifestação em Betim; O diálogo do Reinado de Nossa Senhora do Rosário de Betim com
manifestações similares no estado de Minas Gerais e no Brasil, conforme verificamos através da literatura específica;
As características da sua vitalidade atual, a exemplo da beleza e originalidade da manifestação e a constante recriação/reinterpretação da tradição.
Os fatores de desvitalização da manifestação, a exemplo da baixa compreensão da sua ritualística pela comunidade do entorno, o que exige medidas de fomento, tais como o registro preconizado neste parecer.
Betim, 18 de dezembro de 2009.
Adriana das Graças Araújo Lisboa Bacharel / Licenciada em História pela PUC Minas
Ana Claudia Gomes Mestre em História pela UFMG
Otília Sales Neta Bacharel / Licenciada em História pela PUC Minas
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REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO
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PARECER TÉCNICO SOBRE O
REGISTRO DO BEM
CULTURAL
Tendo em vista o presente dossiê, que trata do Reinado de Nossa Senhora do Rosário, manisfesto-me favoravelmente quanto a eleição deste bem cultural como patrimônio cultural imaterial do município de Betim. Este documento foi elaborado conforme preceitos rigorosos e metodologia adequada. Orientou-se pelo levantamento variado e volumoso de dados, contemplando fontes de informações que incluem os atores sociais do evento, os registros oficiais do Estado, os registros da Igreja Católica e a observação in locus. O quadro analítico sobre o qual se apoiou é atual e relevante, assegurando ao documento o respaldo dos principais estudiosos do tema.
Justifico meu parecer favorável na medida em que a realidade sociocultural demonstrada por esse dossiê confirma que:
O Reinado de Nossa Senhora do Rosário é uma manisfestação enraizada nas práticas culturais do município de Betim e, por isso, constituinte da vida social da cidade;
O evento, assim como a entidade organizadora “Irmandade de Nossa Senhora do Rosário”, de Betim, é uma sólida expressão da cultura afrobrasileira remanscente do período colonial do Brasil;
A celebração festiva dedicada a Nossa Senhora do Rosário é uma importante manifestação de coesão comunitária e agregação de diferentes grupos de Congado da região, compondo uma atividade regular de sociabilidade vital para a sobrevivência desses grupos.
Belo Horizonte, 20 de dezembro de 2009.
Guilherme Alberto Rodrigues Araújo Cientista Social pela UFMG
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PARECERES DO CONSELHO
DELIBERATIVO DO
PATRIMÔNIO CULTURAL DE
BETIM SOBRE O REGISTRO
DO BEM CULTURAL
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NOTIFICAÇÕES/
COMUNICAÇÃO E RECIBOS
A Notificação à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário foi entregue pelas
autoridades municipais, Prefeita e Presidente da FUNARBE em ato público no dia
20 de novembro, durante as solenidades referentes ao Dia Nacional da
Consciência Negra.
A cópia inserida neste dossiê é um fac-símile do documento entregue em moldura
ao Presidente da Irmandade.
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PRONUNCIAMENTO DA INTENÇÃO DE REGISTRO DO REINADO DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO COMO PATRIMÔNIO CULTURAL DO MUNICÍPIO DE BETIM
A Fundação Artístico Cultural de Betim (FUNARBE) e o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim fazem saber que estão sendo desenvolvidos os procedimentos previstos na Lei nº 2.944 de 24 de setembro de 1996, que institui a política municipal de proteção ao patrimônio cultural, e regulamentados pelo Decreto nº 16.389, de 26 de outubro de 2000, que institui o registro de bens culturais de natureza imaterial que constituem o patrimônio cultural de Betim, para o registro do Reinado de Nossa Senhora do Rosário.
A proposta de registro partiu da própria Fundação, tendo em vista a exemplaridade e relevância do bem cultural indicado para registro para a memória e a identidade das comunidades culturais que o desenvolvem e o reconhecem, tendo sido aprovada pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim, em caráter provisório, no dia 04 de novembro de 2009, e em caráter definitivo, no dia 21 de dezembro de 2009. Ao deliberar sobre o registro definitivo, o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim teve em consideração os estudos técnicos, históricos e antropológicos, desenvolvidos pela equipe técnica da Fundação Artístico Cultural de Betim.
Em caso de eventuais manifestações da comunidade a respeito da intenção ora pronunciada, estas deverão ser protocoladas junto à Fundação Artístico Cultural de Betim, à Avenida Governador Valadares, 888, Centro, Betim, endereçadas ao Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim, num prazo de 30 (trinta) dias contados a partir da publicação da intenção de registro.
Betim, 21 de dezembro de 2009.
Aderbal Hipólito Lara Gomes
Presidente da Fundação Artístico Cultural de Betim
Presidente do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Betim
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PUBLICAÇÃO
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ATA DE APROVAÇÃO
DEFINITIVA
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RENÚNCIA DA IRMANDADE
DE NOSSA SENHORA DO
ROSÁRIO AO PRAZO DE
IMPUGNAÇÃO
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CÓPIA DO DECRETO OU
HOMOLOGAÇÃO DO
REGISTRO.
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INSCRIÇÃO NO LIVRO DE
REGISTRO
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21. DOCUMENTOS
DIVERSOS:
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CROQUIS DAS INDUMENTÁRIAS DAS
GUARDAS, SOLICITADAS EM 2009 E
REGISTRADAS PELA FUNARBE COM O
INTUITO DE MELHOR ORIENTAR A
INDÚSTRIA DE CONFECÇÃO
CONTRATADA PARA ATENDER À
IRMANDADE.
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GUARDAS CONVIDADAS
PELA IRMANDADE DE
NOSSA SENHORA DO
ROSÁRIO DE BETIM PARA
O REINADO NOS ÚLTIMOS
ANOS.
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TRANSCRIÇÕES DE
ENTREVISTAS
Sr Raimundo Moreira Barbosa
Data Nascimento. 20 /10/1939 70 anos
Natural: Esmeraldas Data Entrevista: 18/12/09
Desde quando eu fui criado criança...não dançava aqui dançava em sete lagoas.. já de menino...depois de Sete Lagoas vim parar em esmeraldas dançava em esmeraldas....em 59 eu casei vim pra Betim, três mês de casado em esmeraldas eu vim aqui para Betim. .. em 60 eu entrei na guarda que tinha aqui em Betim ... que era a guarda de S. João Berlamino ... que é essa que eu mexo com ela ..esses dançantes que dançava com esse João Berlamino, só resta eu dançando entrei em 60 e não parei se eu parar quer dizer que eu já quebrei a tradição.. eu até o ano não parei de dançar..... eu to junto...ai entrou os filhos vem crescendo ai entrou a minha família esse homem não lembro quando mais ele faleceu tem mais de 20 anos que esse João Berlamino faleceu... eu era caixeiro dele... ai me passaram pra tomar conta da guarda guando ele faleceu , eu falei não.. posso por que eu não tenho capacidade para isso.... O S. Joaquim Nicolau que era outra guarda que tinha aqui mais veia que era Sr Joaquim Nicolau e do seu João Berlamino ai S. Joaquim falou : seu Raimundo não pode deixar a tradição cair não então você entra pro cê ser , tomar conta da guarda primeiro ele mandou um outro capitão que chama... ainda ta vivo ainda.....não dança mais, seu Nico, nós trata ele de seu Nico mais chamava ...o nome dele certo eu não sei não é.... (Antonio Isidoro), nós chama ele de s. Nico ele é que era capitão desse João Belarmino ...eu era caixeiro mas através de a dona Dele não gostar porque é bagunçado no modo de movimento de gente... chega a época de folia de reis ta chuvendo ,tá sujando a casa e ela tinha muita coisa com a casa dela.. ai ele queria levar a quarda para ele tomar conta, porque ele era o capitão a dona dele não aceitou ai ele falou por minha conta a guarda pára... por que lá pra casa não vai dar para levar os instrumentos nem eu vou poder mexer ....esclusivo dançou comigo muito tempo ele. ele não como capitão nem como dono da guarda sempre ele precisava da guarda.... pra ir pra Eliane Ferreira ....eu emprestava os instrumentos , emprestava bandeira emprestava dançantes ai ele levava como se fosse dele a guarda só que não era dele era minha então quando foi para registrar essa guarda lá em Eliane ferreira não pode registrar porque não podia registrar e depois se eu não fosse? o responsável era eu....como eu sou registrado lá em Nova Cintra..eu sou registrado por que a guarda de nova Cintra acabou eles pediram , o padre Djalma pediu para nós ir lá levantar nós foi duas guardas lá,com as de lá, interando três guarda , eu fui a primeira guarda daqui de Betim a dançar em nova Cintra dessa época pra cá o S. Nico ia com nós mas como dançante..guando eles mandou assinar no livro lá como responsável pela guarda de Nova Cintra ele não pode assinar .. eles perguntaram quem é o capitão da guarda? ele falou assim sou eu (Nico)e quem é o dono da guarda?... seu Raimundinho, os instrumento fica tudo na casa dele o pessoal, sai é da casa dele, a maior parte é dele eu só apenas danço com ele... então ele é que tem que assinar então tem minha assinatura no livro lá dessa grossura como responsável pela festa de nova Cintra que foi nos que ajudou levantar ela lá... ai vai o S. Nico vai enfezou porque ele não podia assinar em Nova Cintra, não pode assinar em Eliane ferreira... aí ele falou assim: a parti de hoje eu não vou dançar mais...ele... não vou dançar mais!... e o que ele fez: tirou meus dançantes de cabeceira tudo que eu tinha... os
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melhor... dançante de cabeceira que a gente fala assim melhor pessoa.. eu tinha meu sanfoneiro, meus capitão da minha guarda... ai eu fiquei só com dançante que é de famia.. que é meus filho ... e dois companheiro meu que ta vivo até hj, que não dança mais que é o Zé mentira, se ele tivesse aqui era dançante mais veio que eu ainda... não dança mais e um tal de Oswaldo (s. Deco), nois chama ele não dança mais que passou pra evangélico... a dona dele tirou ele através de remédio ..da ele .gardenal ai ele ficou com a cabeça meia fraca... ela tirou ele passou ele pra outra religião e ele tá vivo até hj, mas não esquece da gente e eu continuei com minha famia.. com pouca gente... na época eu fiquei apertado de capitão pedi s. Dalmo a neta, fia dele... pra ele me ceder ela como capitoa , ela trabaiou três anos na minha guarda como capitoa... seu Nico tirou meus capitão tudo... ai eu eu fiquei de pé e mão quebrada ... mas a guarda não acabou... ai ele (Nico) formou uma de Catupé, não foi a frente, formou um Vilão não foi à frente, ai acabou com a guarda dele... os outro dançantes voltou tudo pra minha quarda tudo de novo e aonde que restou.. uns já morreram outros.....acho que tudo já morreu... os que dançava... quase a metade dessa guarda que eu tenho ai já morreu se eu tenho uns 7, 8 dançante que não dança mais é o muito ai deles vivo.... mais o resto todo já morreram. eu to movimentando com o resto da minha famia, eu tenho muito pouca gente de fora na minha guarda que não é família, se tiver uns 4,5 dançante é o muito o resto tudo é neto, fio , nora, genro e é aonde eu to mexendo com reinado, mas não tá fácil de tocar não! porque tem hora que você vê um pondo o pé no toco(atrapalhar a guarda) uns querendo, outros que vai sair, vai parar... mais enquanto eu tiver vivo .. meu dom é mexer com reinado e queria que eles tocasse pra frente...e graças a deus ai foi onde eu tomei ser dono da guarda em deus que comecei não parei não passou uma festa...teve uma vez ai que eu perdi um filho assim como hj, enterrei ele como hoje, e dançar como amanha ... mas por causa de que eu tava fazendo... não tava fazendo farra! era louvar nossa sra do rosário então pra mim... coisa demais mais já passei por isso... por esse sufoco...e lá vai a guarda igual oce tá vendo ai.... querendo sempre fazer o melhor, trabaiar direitinho ,sirvindo todo mundo.... mas é igual nem deus não serve todo mundo e o negócio não é fácil igual por causa do motivo de dos menino igual do dinilton ... é meu neto e falou em partir essa guarda... formar duas guarda eu pedi: não faz isso não ... porque pra dentro de Betim se eu tenho 50 pessoas, no dia que eu preciso eu tenho uns 10, 20 só, que me ajuda porque os outros nenhum pode... agora quando é pra sair pra fora o ônibus não cabe o pessoal... ai todo mundo mostra boa vontade pra sair...mas quando é aqui dentro...ai eles formaram o moçambique do divino.. eu tinha na base de 60 pessoas que dançava... formou o moçambique do divino mais me atrapaiou , o moçambique é tudo gente que dançava no meu congo... e na época eles falou: não vai sair mais que três pessoa: é a Lú com o Luis e as duas menina... o dinilton mais ocê não paga ninguém, não é registrado acabou saindo o dinilton, saiu a mãe dele que não dançava comigo no congo mais tinha uns tres menino dela, dois meninos dela que passou pro moçambique... já não foi só as pessoa que foi tratado, foi só desfalcando o congo... foi só desfalcando... ai mas eles falou: cê tem que forma 7 guarda pro oce tomar conta daqui dentro de Betim... falei uma já tá difícil... eu vou ter responsabilidade....isso ai já foi a mãinha que falou comigo e ela que fez toda força pra formar ... ela falou assim: to formando essa guarda ... ela formou essa guarda ela não tem uma guarda? ai o que ela fez em vez de forma uma guarda...em vez dela unir com a gente ela fez isso... afastou ... ela afastou ... falou que me dava dançante pra ajudar... que ela tinha 30 dançante....que ela me dava dançante pra ajudar... veio uma vez mas acho que as meninas dela não gostou.... não se deu com os meninos, acabou em vez dela unir a gente afastou.... daqui pra cá a guarda ficou mais prejudicada do que tudo ... porque eu que mexo com ela eu é que sei...se você é da minha quarda eu não posso te segurar.... porque você dança livre! Você é da minha guarda: não, eu vou dançar é com dinilton! ...há ocê não vai dançar com ele não, dança comigo! (os dançantes tem livre escolha, ele não pode obrigar ou obriga-los)... então a gente tem que trabaia com eles assim... dinilton (edinilton) vai sair num domingo e o congo não vai uma comparação... uma comparação, aí eu vou ajudo ele... pra quando eu precisar ele tá sempre ali... mas se for sair as duas guardas duma vez aperta... porque o pessoal que tá no moçambique era o pessoal que tava do Congo ( as duas guardas dividem os
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dançantes)....então eles dividiram... saíram um mucado, outros parou inclusive... um filho que era caixeiro meu... chama Daniel... trabaia lá no salão do encontro ele passou pra evangélico, depois que dividiu as guarda ele não gostou mais, isso de dividir a guarda ele não gostou....parou mas dinilton e vem lutando.. agora minhas neta que era meu pé de boi morava tudo lá dentro de casa, hoje cada um tem sua famia... aí fica difícil.. se o marido põe o pé no toco pra elas não vim, elas não vai poder passar por cima e vim... tudo isso vai só prejudicando a gente... mais eu lá vou fazendo de tudo pra não deixar a tradição cair por terra vez...que oce precisa... igual o dia da raça negra que era pra nos vim, porque que nós não foi? Não foi eu!... nós num foi...porque eu não tenho nada a fazer que me impede ... mais porque que eu não fui?.. porque eles ficaram revoltado porque não arrumou o ônibus para eles ir numa festa que eles...tinha dois ônibus ao lado dele... ai ocê entrou de férias... ai quem ficou aqui tratou com eles e pisou na bola....(questões de pedido de ônibus). Eles ficou tudo revoltado: eu não vou sair daqui também pra fazer nada não, a gente não tá tendo prestígio pra sair do lugar que nós ta acostumado a ir, nós trata .... ai padre Djalma liga recramando num sei se foi procê acho que foi pra Ofélia....ela falou: o negócio de condução não é comigo...primeiro nós pedia lá na secretaria de governo... nós pedia lá... muito difícil nós ir lá na funarbe... agora era assim a funarbe marcava pra nós cada guarda ter dois ônibus .. nós guardava um pro lugar de mais necessidade: Timóteo. Também eu não vou recramar ... porque não foi eu que pedi: o cara que faz festa lá (Luiz Fabiano) cartiou marra,... desde junho que ele falou... não precisa do ocês arrumar ônibus não... eu vou arrumar... não conseguiu levar.... S. Dalmo foi porque pagou do bolso dele...a gente já não cobra pra fazer a festa, ainda vai pagar ônibus ainda... se for pra pagar... tem vez que a gente sai os menino num tem um dinheiro pra pagar um refrigerante pro fio (filhos) dele vem aqui o Vô paga um refrigerante! ... o pai paga um tira gosto ali pros menino que ta com fome e ta chegando a hora do almoço... ta com fome... porque nós não tem renda de nada minha fia!.... se nos tivesse uma renda.,. de qualquer coisa, um ganho...igual tem guarda ai que eles falam que é registrada.... então entra uma verba pra cada guarda....quer dizer: nos não amola a funarbe, nós não amola a prefeitura.. nos não amola nada... porque nós tão ganhando pra comprar roupa comprar instrumento e sair, quer dizer todo ano entra aquela quantia... essa aquela verba nó tem que pensar: essa taxa aqui é da caderneta de n. sra do rosário ...um dançante adoeceu oce tem como.. cuidar dele... dar uma cesta básica... comprar um remédio.... uma comparação: nós não tem ganho de nada há não ser esse da prefeitura...o que a funarbe da pra nós: é roupa é calçado e fica nessa ....nós quer sair de ônibus... as vezes igual um lugar... pra sair La em Nova Cintra era 300 real nos não tinha.... o padre falou eu dou 200 real ocês intera os 100 ... como que eu vou interar os 100? só se for do meu bolso sozinho ai porque ninguém tinha condição... pra isso nós num foi fazer a festa que nós era obrigatório tá lá.....
Quais São os Santos de Devoção da Guarda?
Primeiro nós faz a festa de N. Senhora do rosário, São Benedito, Santa Efigênia, divino Espírito Santo, Nossa Sra. Aparecida que nós não pode deixar de fora, São Jorge Guerreiro, faz parte da nossa festa. São Sebastião é o santo que nós contém sobre o reino de n. Sra. mas todos os santo que existe pra nó faz parte do folclore congadeiro , no tem.
Quais os Instrumentos usados pela sua guarda?
Que eu conheço, na minha guarda que eu uso é os tambor que é as caixas que nos fala, os bastão que é os principal. Agora usa... Uma comparação o congo pode usar violão pode usar viola, mas nós usa sanfona nos pode usar o instrumento que pode usar na festa.
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A guarda faz algum ritual antes de ir para festa?
Faz oração, nos rezamos, a primeira coisa que nos faz antes de sair pra qualquer lugar, oração, junta tudo no terreiro, reza primeiro, pra nos poder sair. Porque nó nos não gosta nem de pegar dançante no meio do caminho (preferem que todos saiam do mesmo lugar)....porque vai sair de lá de casa então, a guarda sai dali com os dançante tudo feito a oração, nos fazemos oração antes de sair, pra qualquer lugar pedindo a nossa mãe pra levar em paz e trazer em paz, porque nos La vão pra fazer um trabaio nos não vão fazer bonito e nem vão para divertir, então obrigação um trabalho pra nossa irmandade, pertence a n sra do rosário. É o que nós fizemo.
Em relação às rezas/orações feitas nas encruzilhadas tem um motivo especial?
Tem! Tem um motivo especial. Quase toda encruzilhada, a gente não para rezar, nas encruzilhada quando tá em movimento (andando de ônibus), mas aquele cortejo de fazer aquela meia lua é pedindo uma licença os dono das encruzilhada , entendeu? quando nós chega na linha, nos fazemos aquela reviravolta, fazemo aquilo, aquilo é um modo de pedir uma licença pra poder passar, dizer que oce tá entrando dentro de uma porta e passando. É mesmo a coisa deu chegar na sua casa e não dá sinal, se eu vou chegando e abrindo sua porta? sem bater ? oce mora ali ,todas encruzilhada tem seu dono, todas ponte e passagem de ponte tem seu dono, quando chegada num cruzeiro ocê tem a saudação pra fazer no pé do cruzeiro, na porta da igreja, na hora que chega! Saudação de outras guarda né que a gente faz..a saudação de outras guarda. saúda as bandeiras deles, beija as bandeira deles, dá a nossa pra eles beijar , tudo isso é o ritmo que a gente aprendeu no reinado.
A guarda faz alguma festa, fora da festa da Irmandade?
Nós faz qualquer chamado. Fazia do Divino, a festa do Divino, mas não tá progredindo essa festa lá porque cê já deve ter ido lá em casa, tá em construção eles prometeu levantar aquilo pra nós, ta levantando hj amanha e ta La do jeito que oce tá vendo (prefeitura). Então nos fez duas vezes a festa do divino o tempo de trajetória do Divino Espírito Santo , mas foi festa pras guarda tudo, igual a dona Zélia, nos fazia, igual seu Mário fazia então depois de nós fez, nós foi o primeiro que fez depois que nós fez eles tudo pegou a fazer, é igual S. Dalmo, S. Dalmo levanta a bandeira de ano em ano na casa dele, ele tem essa tradição de levantar, ele faz. Nós já fez festa na casa dele. Ele tem essa tradição. Mas é igual ,...d. Zélia e Sr Mario fez depois que nós fez, eles foram na festa nossa duas vezes, que fizeram mais agora nós não tão fazendo ... nós não tão fazendo , nós fizemo no mês de julho. Nós não tão fazendo pro modo de que a casa tá Lá,... não tem nem condição. (as condições de moradia não está permitindo que a festa seja feita). Não tem nem condição... Como é que vai fazer a festa com a casa não ta por acabada?
Quais Imagens e objetos mantidos pela Guarda em sua casa?
Tem. Nós tem a N. Sra. Aparecida, nós tem o Divino Espírito santo , nós tem a santa Efigenia que é a que nós nos levantamo a bandeira no início da festa lá em cima. Tem uma imagem, da Santa Efigênia e toda procissão que nó faz vai ela e a de são Benedito. Não são Benedito não é a do Divino Espírito Santo eles dois que nós temo, Divino Espírito Santo é do Moçambique e Santa Efigênia que á a padroeira da nossa, que nós carrega.
Ritual da Festa da Bandeira de Aviso
Aquilo é uma firmeza no pé do mastro, é uma espécie de uma corrente entendeu?, Aquilo durante o tempo que tá levantando, a gente não cruza os bastão? na bandeira e desce e
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levanta, abaixo, três vez? Aquilo é tudo é uma corrente de firmeza sobe uma oração, pedindo nossa mãe força daquilo que a gente tá fazendo .... né para abençoar aquela fé, que a gente tá com ela ali, tudo isso a gente tá naquele momento pedindo: uns ta rezando ave Maria outro ta rezando pai nosso outros ta rezando a salve rainha naquele momento, mas todo mundo com oração, no levantamento das bandeira , é uma firmeza no pé do mastro que a gente faz.
Em relação ao ritual que se dá entorno da Capela tem a Quantidade Certa?
Não tem quantidade, a não ser promessa. A promessa tem quantidade. Para quem vai cumprir promessa tem quantidade., Oce pega coroa de n sra do rosário pra por na sua cabeça, oce fez a promessa pra ela , ela te valeu naquilo... fala: O minha nossa Sra eu vou dar três volta atrás da guarda de seu fulano, três vezes.. ai oce me avisa: oces vão me puxar aqui três vezes, então nós dá três vezes....tirando disso a gente já acostumou dar volta fechando o circulo da igreja ali....,então nós passa por de trás, nós não entra direto, a gente dá aquela volta, respeitando a igreja, fechando, passa no cruzeiro, vem ai é que vai entrar dentro da igreja, pra depois que. Naquele momento a gente sempre cantando a daquela volta que a gente dá dando, agora isso aí é os ponto do capitão que tira né, saudando. Nós não anda atrás ao redor ali sem não ta cantando nada não: ou tá pedindo licença ou agradecendo ou falando qualquer coisa sobre o início da festa ou a terminação também é a mesma coisa: pra ir embora tem a despedida passar ao redor da igreja, saudando pra vim embora agradecendo o que foi feito correu tudo em paz, tudo bem, tudo tem um significado né!
Como o Congado surgiu em Betim?
Daqui de Betim, o que eu sei é o que eu te falei: quando cheguei pra aqui.... já existia essa duas guardas: que era do João Berlamino e do S. Joaquim Nicolau , não tinha mais guarda daqui não, vinha guarda de fora, pra dançar aqui em Betim, fazer festa vinha de Belo Horizonte, vinha de Itaúna, porque o genro dele (Joaquim Nicolau) era de Itaúna, um tal de João Criolinho.... não sei se oce já ouviu fala nele? É lá de Itaúna, é gente do Zé Lúcio, .... era genro do S. Joaquim , casado com a Fia dele (Joaquim Nicolau) . Quando cheguei pra qui nós ia muito em Itaúna, vinha guarda de Itaúna: duas três fazer festa aqui... vinha de lá de Belo Horizonte , dançar aqui em Betim, que seu João Belarmino convidava nós convidava que s. João Berlamino convidava...e vinha muita guarda de fora que vinha aqui. Mas as guardas do local que tinha aqui era é essa: a do João Belarmino e do S Joaquim Nicolau, eu não conheci diz que ela foi formada mais em Vianópolis essa guarda. Mas não é essa que é a minha não, do S Joaquim né! Foi criada mais em Vianópolis, de lá ele mudou pra cá e trouxe o reinado de Vianópolis para Betim. Chegando aqui entrou com esse João Berlamino que diz que mexia mais era com Folia de Reis . Depois que s. Joaquim veio pra cá, que é igual eu to falando com você. Esse tal Zé Mentira, tem apelido de Zé Mentira , ajudou ele (João Belarmino) a formar esse Congo que hoje eu tomo conta dele. Só eu lá vai pra de 40 e tantos anos que eu to tomando conta dele (Congo) , O Zé (mentira) deve ter ai seus 79, quase 80 anos se não já passou só ele não dança mais , parou de dançar só que ta vivo ainda, mais não dança mais, agora eu não: eu entrei em 60 de ajudante, caixeiro de frente depois passei pra sanfoneiro dessa guarda, agora hoje ela ta no meu nome porque eles puseram e a nossa sra ta dando uma força, onde eu to aguentando levar, mas de velho ai não tá tendo mais nenhum dessa turma.
Qual a importância das Matinas?
A matina da festa que eu aprendi, seja um fechamento de festa ou abrimento de entrada de rua, isso se torna uma limpeza entendeu? Que dizer... é o que eu entendo: a pessoa faz a matina ali de manha cedo, é rezando em toda entrada, toda entrada e saída no começo da Festa. Aqui começa com uma espécie de abrimento de caminho, a matina se torna no meu modo de pensar é isso: a tradição de limpeza e começo da festa, quer dizer: é mesma coisa que oce vai passar aqui, oce já começou a limpar o caminho, quer dizer oce fez a matina ali,
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de manha cedo, uma tradição que sem ser isso eu nem sei explicar se é outra coisa que não sei.
Alguma guarda fica encarregada de fazer as matinas?
Tem. O moçambique, mas pode fazer com todas guardas, acompanhando se puder, Poe motivo de ajuda: então eu posso sair de lá de casa e ajudar na matina, outro pode sair da guarda vim ajudar aquele moçambique a fazer matina, não precisa ser só o moçambique não, se tem as guarda que tiver gente pra ajudar era bonito! Mas, fica difícil por causa que mora longe, tem que tá arrumando tempo. Mas uma guarda fica exclusivamente pra isso: pra fazer abrimento, par fazer fechamento.
Em relação à Capela quais modificações que ela já sofreu (ainda falta acrescentar)
No minha fia , a gente não guarda bem na cabeça. Se oce me perguntar a cor normal como era, eu não tenho bem na mente como era. Foi indo , foi indo é igual uma casa: oce começa numa casa, vai dando uma pintura.original, .... mas, eles puseram ela uma vez igual tá. Diz que era do jeito antigo. È igual a santa né: eles restaurou a santa pôs igual ela era. Mas eu não tenho assim: a cor dela era..... a gente na época não guardava, porque a gente ia assumir uma responsabilidade dessa que a gente tá assumindo aqui não! a gente dançava porque gostava, agora a gente gostava muito. Não prestava muito atenção. Dancei muito aqui nessa igreja velha. Como é que chamava? Matriz Nossa sra do Carmo, eu casei aqui... nessa igreja, n. sra do Carmo, o padre Ozório e que fez meu casamento . Pois então quem fez meu casamento foi o padre Ozório. O Padre Ozório acompanhava a festa (reinado), nós fazia a festa ele acompanhava, a festa nossa nós vinha aqui, dançava o reinado aqui vinha na igreja, Depois essa igrejinha nossa (capela) , quase que nós ficou sem ela também, porque eles passar aquela igreja são Francisco . Ali onde é a igreja são Francisco é um matador que tinha ali. Eles queriam fazer na igreja nossa sra do rosário tombar ela e fazer a igreja de são Francisco nos falou assim: O se oces fizer isso nos vão é perder. O prefeito era o Bio , que morava aqui, aí chamou os Congadeiro. S. Joaquim e esse João Belarmino falou: O, nos ajudou carregar pedra para fazer essa igreja aqui, se oces fazer isso passar a fazer a igreja de são Francisco aqui nós vão perder essa igreja. E como de fato perdia: Eles chamar a gente pra festa de são Francisco? Oce viu que não chama! Porque lá é patrocinador da Brahma ,Skol, é a Fiat, a Petrobras é só coisas grandes para entrar dinheiro. Patrocinador das coisas lá , nós não tem pra ajuda , se tivesse lá eles não iam aceitar.
Teve algum abaixo assinado?
Teve. Eles pediram para conversar, Sr Joaquim e se João Belarmino era parente desse Bio, não sei se era sobrinho! Era gente deles. Ele conversou com o Bio pra ele não deixar fazer a igreja lá em cima, porque se não a gente ia ficar sem a festa de nossa sra do Rosário. Ai, o Bio desapropriou o matador que já tava mesmo acabando né, tirou o matador, onde é a igreja São Francisco e combinaram o terreno lá, mas isso eles foram até o toco pra não deixar porque se não nos não tinha aquela igreja ali não! porque justamente seu João Berlamino e S. Joaquim Nicolau ajudou a levantar a igreja do começo... carregar pedra pra fazer ela. Eles foram os primeiro a por o pé no toco a não deixar e o pessoal viu que ele conversou com o prefeito, viu que ele apoiou, porque ele gostava do reinado (prefeito) foi onde que eles arrumaram ali onde era o matador.
Qual foi a primeira restauração da Capela?
Há primeira restauração acho que foi com a Maria do Carmo da 1 vez que ela ganhou não tenho certeza não acho que Foi! Só pintava ela passar cal, restaurar acho que foi no tempo dela ai. Ela era boazinha no tempo do Bio, no tempo do Oswaldo Franco... eu não lembro que ele s mandam restaurar! Limpar limpavam, queimar com cal .... mas fazer serviço mais
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atual, foi daí pra cá que ela vem decaindo, chuvendo igual oce vê lá ! já foi no mandado dela e então cada um que limpa aí ajuda alguma coisa.
Ritual da Festa: modificações ocorridas com o cortejo: A partir de quando que as guardas passaram a ir na Casa da Cultura ?
E menina quer ver : só não guardo o mês, ....e o ano também não guardo não.... Isso começou, isso foi quando não lembro não isso foi quando Saulo Laranjeira pegou a minha guarda e levou em Belo Horizonte. Ai nós passou na televisão pela primeira vez e saiu no jornal, nós não tinha ajuda de Casa da Cultura, foi no tempo da Maria do Carmo me parece. Foi no tempo dela, no primeiro mandato dela. Eu fui para Belo Horizonte, eu fui com a minha quarda, nós fomos lá em Belo Horizonte, no Saulo Laranjeira, ai passamo na televisão! E no Jornal. Daí pra cá a Funarbe tomou conta..de ajudar nós . Não tinha ajuda de nada não, nós saía pedindo esmola todos domingos, assim pra fazer festa... S. Zé Teixeira era festeiro ele ficou 7 anos ( não sei era S Joaquim ou José Teixeira), ele morava lá no Santa Inês, Lá em baixo,, e ele conversava muito com o 0swaldo Franco,isso é no tempo do Oswaldo Franco. Pedia Oswaldo Franco assim mantimento pra ajudar... aí daí pra cá é que começou. Ai nós pareceu na televisão. A funarbe então tomou conta: passou a dar nós instrumento . Os presidente eu não lembro mais não. A Lady deve explica mais ou menos quem é que tava. nessa época, porque ela já mexia com nós e ela era por dentro pra ajudar . No tempo do Oswaldo Franco é que esse negócio começou a crescer pra.nós .... por causa que esse homem me levou lá (Saulo Laranjeira) , primeira vez que nós foi no Saulo laranjeira e cresceu nós trabaiar com a funarbe dando nós apoio .Mas tem muitos anos já. Depois do Oswaldo vem a Maria.... acho que tem que olhar isso: Se é a Maria do Carmo que ganhou, aquele home que entrou no lugar dele (Oswaldo Franco) nós não gostou dele , o que desmanchou essa igreja (antiga Matriz) Alvinho Barbosa, que ele era prefeito entrou , ele que desmanchou essa igreja e depois queria mexer lá na nossa(Capela) mas não deixaram não.
Tem algum ritual, algum segredo da Festa que as pessoas não ficam sabendo?
Segredo não, tem muita coisa que ocorre que a gente é tá por fora mas a gente ta sabendo que tá havendo alguma, eu falo com você assim: não provo nada.... mais um papel que sai de dentro. daqui... na época de festa que deu um “bololô” danado, que eles deram nós comida azeda, eles tava contando a quantia de dinheiro que foi reservado para fazer a festa. Eles não gastaram aquele dinheiro. E nos não fica sabendo: o que que sobrou, pra onde foi a sobra? No tempo da Maria do Carmo no primeiro ano deles.... não foi do Carlaile , duas vezes sabe o eles fazia: não tem essas festa que sai aí de Betim? a o que eles fazia: eles pediam mantimento.... guando acabava a festa.... eles doavam aqueles mantimento tudo pras guarda ,agora nós não ta sabendo com isso que eles tão pedindo, pra onde que eles tão pedindo, quer dizer duas vezes nó ganhamo. Duas vezes nós juntou cada Capitão .. e entregue cesta básica pra cada guarda, ai eu dava a lista pra você de quantas pessoas eu tinha, S. Dalmo dava a lista.... agora esse tão fazendo a mesma coisa (providenciando a comida), mas não tão dando agora não, quer dizer tem, coisa que nós porque embaixo no papel tava rezando a quantia....fizeram um levantamento na época que deu problema até para quem trabaiava na Funarbe, lá na Casa da Cultura... porque eles falou onde esse papel foi parar? È que nós, os congadeiro descobriu: era segredo! Vamos supor : Nós falava em 25 mil doado pra fazer a festa do rosário... uma comparação né?: nós não quer saber se oces gastou aqueles 25 mil tudo com nós... quanto ocês gastou ou quanto ocês não gastou... e quanto sobrava..as coisa de primeiro no tempo da Maria do Carmo eles dava água pra nós levar...o que sobrasse dava: era fruta, o que sobrasse dava, mantimento o que sobrasse dava ...o que sobrou da festa ele dava, cada um leva. Era assim... agora se sobra eles pega uma caminhonete... quando lá, nós não sabe pra onde que vai aquilo...é água, é refrigerante... da festa do almoço porque ces num compra comidaiada a treeinada que eles compra não (governo anterior)... né , mas a gente num sabe pra onde que vai aquilo... quer dizer tem coisas que nós fica sabendo que a gente tá sendo lesado
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entendeu? (enganado)...., .. só que a gente não tem prova e nem sabe conversar a respeito disso .... então nós tão igual boi de piranhã....boi de piranha CE sabe o que : oce joga o boi dentro d’agua ... aquele veio que já tá pra morrer....pras piranha começar a comer ele .. quando elas começa a comer ele ....eles passa a boiada boa por trás ai elas come tudo... assim em certa parte tá nós...... nós tão sabendo disso... porque se fosse pra levar tudo tim tim por tim tim nós rebemos pra fazer a festa... Sabe por causa de que que eu falo: teve uma época que eles tratou umas coisas com nós : vão supor s. Raimundo eu vou dar 4 caixa, 60 metro de roupa, você : ai chamavam o Carlaile :.... isso aqui é pra guarda seu Raimundo, aquilo é pra guarda do s. Dalmo, aquela é pra guarda da dona neném, pra guarda da d titã , essa pra guarda de S. Mario, essa é pra guarda de d. Zélia... mostrava só o que ia comprar... ai nos ficava tudo alegre! vai vim tudo que. .. tamo vendo ali: o home chegava... por ele tava liberado... quando ele virava as costas (Carlaile) .... o, não vai dar pra comprar isso aqui pro ces ... não vai dar para comprar aquilo pro ces..
Quer dizer: se ocê pediu 60 mudas de roupa vinha 30, e se ocê pedia 30 vinha 15, era assim. Mas porque que na cacunda do home [na frente do Prefeito} falava? Então nessas aí nós sabia que nós tava sendo lesado, né? Pedia os instrumento: não posso dá tantas caixa não porque o dinheiro que eles adoou não dava. Tudo isso nós sabe! Então onde nós [nos] considerava um boi de piranha: nós tamo ali, caía tudo no nosso nome, na nossa cacunda, como era pra irmandade, a festa da irmandade mas era tudo jogado... Nós não gastava tudo, só que a gente tá sabendo disso... Mas pelejando pra registrar as guardas porque se registrar as guardas igual tão falando ai pra nós, vai limpar ocês, ocês não vai ter conta com nada com nós: ocês receberam 3 mil para roupa para sua guarda, exemplo, se o senhor não comprou, se não tem dinheiro guardado, nós não tem como dar (...). Ano que vem nós vão registrar as guardas, ninguém mostrou boa vontade de fazer nada, só falava, e por isso nós tá desse jeito!
Participação das guardas em festas em outras cidades
Nossa Sra pra tudo em quanto é lugar! só não foi em Timóteo e Nova Cintra. Em Lafaiete (conselheiro Lafaiete) nós participa. Costuma participar em Brumadinho, Ibirité, Timóteo, Fortuna de Minas (esse ano eu fui), Mucambeiro, não fui esse ano porque tava tendo aquela doença lá (Gripe Suína), No menina nós vão em lugar demais....Esmeralda eu fui, falo esmeralda mais é Caracóis.
Qual é a função do Pé-da-Coroa
É do moçambique né? A função dele é carregar as rainha, os rei é o pé da coroa que é . responsável
A guarda tem algum rei e rainha
Rei não tem não, mas tem rainha do moçambique. Todos são nosso né: o rei congo a rainha conga são nossa. Nos tem o não lembro o nome dela é a rainha do Moçambique. Esqueço o nome dela... é Daquinha ela é a rainha da nossa: que dizer todo lugar onde vai o congo ela vai, onde vai o moçambique ela vai...
Os Nomes da Rainhas e Reis que se lembra
O nome não lembro de cor as rainha quem pode dizer os nome é Sr Dalmo ele que puxa ela.,.ele tem o nome das rainha toda..
O Sr acha importante participar das Novenas? Qual a importância das novenas?
Primeiro a firmeza, uma corrente, exclusivo eu participo muito pouco mas não é dizer por causa que eu não gosto: porque a distância do local e a hora, mas da minha famia vai dois
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três quatro cinco.Não é dizer que tem as novena e eu não participo. Eu vou ne algumas... não é Nelas todas não! é nove dia de penitência da corrente, é importante....
Dentro do reinado existem pessoas com poder espiritual? sobre as Crenças religiosas na Irmandade
Olha eu pelo menos fui criado na católica pra mim não tem religião acima dela par mim não! Entendeu? É uma coisa é uma religião também que essa dança de congado pra mim eu pelo menos não to ali com mal intenção. Durante o tempo que eu to ali, eu to feliz e louvando a deus e nossa Sra. , não to pensando nada ruim. Eu fico três dias se for preciso sem comer e guento. Eu to com velho e é mesmo coisa que eu tivesse deitado. Então que dizer que pra mim é uma benção é que eu me sinto bem! mais que tem fortaleza sobre... , mas todo mundo é nego que já mexeu, mexe no terreiro, tem gente espiritual, só não entra naquele momento de festa, mas quase a maior parte desse pessoal que dança reinado é espiritismo! Né! quase eles todo..mas falar que ta ali por causa do ramo (Terreiro???) não! Se chegar aquele dia, eles não tão naquele ramo. Mas ai entende um pouco de terreiro, já freqüentou, já tem uma “escora” do lado que é de terreiro, então tem! chega no dia tem aquela oração, aquela “escora” pra te dar uma força, te ajudar, tudo isso existe no congado! Mas não é que é igual ao que muita gente fala: aquilo é só macumbaria!Não. não tem nada disso, espiritualmente terreiro pra festa de congado é diferente. Terreiro é terreiro, festa de congado é festa de congado. Mas par quem não compreende pensa que tudo é uma coisa só. Ate o ritual parece NE? Muita vestimenta, muito rosário, muita coisa. oce vai no terreiro tem gente com o rosário ... cruzado, e guia para tudo em quanto é lado. Então eles vê muita coisas. Mas aquilo ali é uma proteção deles também. Pra queles orixá do terreiro, tá ajudando, te protegendo de muitas coisas! Até o modo de nos dançar,o modo da gente vestir cresce inveja nos outros também: Por quer que a guarda tá querendo ser mais bonita que eu? Por que dança melhor! Mesma coisa (exemplo) se oce ta bem aqui no seu serviço vem nego por de trás .....e dá por mal empregado que oce daqui. Então tem isso. Então oce tem que rezar de manha cedo na sua casa.
A guarda tem alguma cor específica ou cores que não podem usar?
Não, que não pode usar? Não, não tem. a gente acha bonito os enfeites , nós usa a única cor que nós quase não usa na guarda é preto. Só se for pra luto. Preto nós não usa , roxo muito pouco. N, os usa muito é branco que é a paz verde esperança, a gente usa por causa das cor das fita: nos Poe a amarelo muita gente não gosta mas o amarelo é o ouro a riqueza, é onde a gente usa e acha que vai correspondendo nessas partes.
Quais as lideranças atuais na irmandade?
O no momento, eu vou te falar francamente não é querendo me exibir não, primeiro que eu trabalho na frente, é chamado de “limpa trio” que vai... aonde eu cair eu jogo todo mundo! Se oce vê que eu esbarrei aqui, quem vem lá trás , vai cair por que não vai passar na minha frente. Fazer festa sem movimento. Então eu considero os responsável ... que eu acho se nós parar, eu falo dos que tem guarda: é eu e o compadre Dalmo. Porque, pode até ter a festa se nós dois parar eu tenho certeza igual eu to te falando se for buscar quarda de fora não vai aquentar o batente não.
Expressões ou palavras de origem africana
Tem muito cantos que usa sim. Mais ai é mais difícil, isso ai é da parte de um capitão, talvez um capitão canta pro oce. Na língua aí pra sua guarda na sua guarda se oce não entender da língua dos africanos. Ocê não consegue saber que ele tá cantando pro CE .Ma aí já
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Que Tradições da festa existiam ante e não existem mais?
È Sai com as guarda na rua pra pedir esmola e dar iniciamento... Porque a divulgação das nossa festa do rosário são muito fracas e nós quando nos saia pedindo esmola nas rua e com a bandeira e batendo caixa, chamava atenção. Por que o povo ficava sabendo: o que que oces tão fazendo? O que vai ter? A festa de Nossa Sra do Rosário? Quando? Dia tanto de outubro! Quando? Dia tanto de agosto! Essa tradição morreu! nós não tem isso mais! Porque depois que a funarbe tomou conta inté proibiu de nós fazer... Oces não precisa fazer isso que nós vão ajudar(funarbe). Mas vou adiante e volto atrás: hoje pro oce fazer isso ta mais difícil. Por causa que os dançante tá tudo fichado, se oce precisa de dançante ocê não pode sair na rua (pedir esmola) se oce precisa deles, eles vai pegar serviço naquele horário. Dia de domingo, mas tem nego que trabaia. Só saia aos Domingos... Nessa parte atrapaiou numas e melhorou na outras: Não sai mais.... mas a tradição da festa era nós pedir esmola na rua, pegar a bandeira e mostrar quando ia ser a festa. É igual, todo mundo sabia.Hoje em dia, nego chega perto de mim e pergunta Quando que vai ser a festa de nossa do rosário? Acabou ontem. O meu Deus, eu tinha promessa para cumprir..... Mas porque ? Por causa da divulgação da festa é muito fraca é isso que nós tão recramando. Agora oce não vê a festa da feira da paz: passa na televisão, passa no rádio, passa no jornal, sai falando três, quatro mês antes! os cantor, os dia que vai ter, todo mundo fica sabendo (programação da Festa). E agora guando chega nossa festa quando chega a esparramar o negocio tá em cima da hora, ninguém fica sabendo. Então voltava a tradição de andar na rua poderia animar mais, mas eu já vi que essa tradição pra nós já não dá .por causa do pessoal que trabaia. Na época que nos andava ai gente da minha idade veio era só home trabaiava em só em roça, chegava dia de domingo tava em casa. Hoje não! Os rapaz que oce precisa de dançante :Hoje não posso, não que eu vou largar serviço duas, que eu horas nessa parte ai
Quantos dançantes a guarda tem?
Hoje contanto com tudo eu tenho 45, 50 dançantes tudo. Eu tenho gente que é do Bairro Petrópolis, tem dançante de Belo Horizonte, é... Capelinha, Romero Gil, Angola Itacolomi. Isso tudo é dançante que eu tenho espaiado: num eu tenho 12 no outro eu tem 10 no outro eu tenho 6 mais tem que juntar na hora vir embora maior dificuldade. Isso exclusivo nós vamo mudar o roteiro. Tem pegar dançante meu lá no Petrópolis. A vezes deixa de vir por causa de ônibus.
Nome: Efigênia Ágata da Silva Data Nascimento: 5/02/54
Endereço: Rua Visconde de Itaboraí, 521
Data Entrevista: 21 de Dezembro de 2009.
Como foi sua Trajetória no Congado?
Ai depois nos mudamos pra cá pra vimos para Betim.
Onde o pai era dançante em Belo Horizonte?
Era no Bairro Zurica. Acho que era Zurica mesmo, (Belo Horizonte) era uma favela lá beirando o rio, na guarda de S. Cassiano, ai nos vimos pra cá, ele entrou na guarda dançando com S. Emílio que era um capitão daqui aqui...aqui já era guarda de congo ...guarda do S. Emílio... não lembro o nome da guarda só lembro do capitão Emílio(Betim)??.
Isso foi em que época?
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Eu tinha aí meus 15 anos... ai eu não me lembro... Eu cheguei aqui com onze anos... deve ter sido mais ou menos em 74 (1974) Por aí..deve ser...aí então passou o tempo, a gente não dançava não...só papai.. que a guarda dele lá era só de homem... não entrava mulher (guarda onde o pai era dançante em BH)...aí depois que eu conheci a guarda do seu Zé Luiz .. que era o moçambique, que S. Dalmo ficou com ele, ai depois do s. Zé Luis a gente começou ficou na guarda do s. Dalmo por 17 anos... aí saí da guarda de S. Dalmo e fumo dançar com a guarda de S. Raimundinho, que é o congo de Santa Efigênia. Ai depois disso S. Dalmo ficamo assim 17 anos, Raimundinho ficamo 10.. ai depois meu marido adoeceu eu fui obrigada a abandonar.... com ele doente a gente saia mas tinha aquela coisa de ficar pensando nele... ai abandonei, também com altos e baixos, tive desentendimento na guarda de S. Raimundinho a gente acabou abandonando.. por conta mais, por conta do desentendimento que eu tive com o capitão Jose,,, ai onde eu resolvi o Aguinaldo resolveu fundar essa quarda nossa, que ágora que a gente tem né, e ai quando teve assim.. pra não ficar com desavença, porque ta numa guarda de mal dos outro dançando... só porque tem obrigação com n. sra do rosário... então a gente tem que gostar do que tá fazendo...aí como eu já tinha um amor grande pela santa, ai resolvemos fundar essa que é a guarda de congo n. sra do rosário dos homens pretos de Betim.. fundamo o ano passado . Que eu entendo é que a guarda tinha que ser muito unida... uma irmandade.. como se fosse o rosário de Maria mesmo, com as conta tão unida tom de tá tão unido como se fosse um rosário de verdade... mais um dia a gente chega lá...
Quantos dançantes tem a guarda? São todos do mesmo Bairro?
A nossa tem 20 dançante. Não. Tem o Aguinaldo que mudou pra lá pra Igarapé temos dançante que é daqui do Bairro (Jardim Petrópolis) e temos dançante do Granja São João.
A guarda tem cor(es) específica(s) e quais são essas cores?
A nossa guarda ficou o azul né.Porque é o manto de N. Sra... que..eu acho que além de ser a cor do manto de n sra... também é a cor do céu que nos clareia pra onde nós vai... cor da corrente celeste, cor dos anjos, porque cada anjo veste de uma cor, então as fita significa as cores dos anjos .. só ainda não temos a fita preta assim de cor... porque o pessoal gosta muito de falar assim: que a guarda que tem uma fita preta tá do lado do cão... não é bem assim o lado de.. tem alguma coisa errada coma fita preta....a fita preta o pessoal não acostumou mas eu acho que mais tarde o pessoal vai acostumar que a fita preta que também nos traga luto né ... de como nos perdemos alguma coisa a fita nos traga tristeza...e até que hj em dia não é mais luto é luxo... o preto se tornou luxo.. então acho que um dia vai tá todas as fitas sem separação de cor no saiote do congo.
Descrição do ritual do entorno da capela e do hasteamento das Bandeiras.
... aí Chegando ali a gente entra sempre pela direita e dá volta até o cruzeiro, em sinal de respeito, pedindo licença que a gente tá chegando na igreja, ai passa no cruzeiro, e saudamos o cruzeiro que é onde Jesus ficou crucificado e a gente saúda também as almas dali por conta que.. dos cativeiro que passou por ali e orar também ali tudo, porque... aí depois do cruzeiro a gente vai pra porta da igreja, pedindo licença por conta que os brancos entrava na igreja e os negros não podiam entrar, porque depois que eles voltavam pra senzala é que ele iam louvar o deus deles.. é o por isso que tem aquele negócio de pedir licença na porta da igreja tá aberta mais a gente tem que pedir licença.. é o respeito.. a gente tá pedindo licença pra entra na igreja... ai logo que a gente pede licença e já pode entrar na igreja.. a gente tem licença pra entrar ... a gente canta ali:
O dá licença, o dá licença mamãe, O dá licença..
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a gente pedido licença a nossa Sra do rosário para entrar. Aí quando a gente vai pedir as outras guardas a gente canta:
O dá licença, O dá licença. O dá licença capitão, O dá licença...
Aí a gente tá pedindo as outras guardas que tão ali presente, que os capitão ta vendo a gente chegar ... então a gente tá pedindo licença pra gente passar.
E sobre o levantamento das bandeiras, quando a gente ta levantando a bandeira a gente tá levantando os santos aos céus ai é por isso levanta as bandeiras e a gente entra cantando e quando chega as bandeiras os capitães tudo no pé do mastro é sinal que as guardas estão unidas, todos os capitães são unidos um com o outro, ai vai passar sua bandeira e o seu bastão ali no pé do mastro da guarda, agora se eles não chegou, eles não estão unidos, tão ali presentes, mas não estão com o espírito de união de uma guarda com a outra, a irmandade ta desunida. E as voltas em volta de igreja significa as promessas que o pessoal faz, tem gente que faz de 3, 7, 9 a gente vai dando vai dando as voltas com os caras que estão ali com a coroa e com a promessa.
Existe algum segredo no ritual, que uma pessoa comum não consegue enxergar?
Tem o dom das pessoas, que as vezes um enxerga e outros não. Igual quando o capitão medonho morreu, eu durante uns 5, 6 anos, eu vi ele encontrar com as guardas, com o saiote dele, muito bonito. Ele sempre vinha encontrar com a gente, isso quando eu dançava na guarda do Raimundinho, ai sempre falava, “se o Tião morreu, o que ele vinha encontrar com a gente?” ele vinha encontrar com todas as guardas na descida daquele morro, então uns vê e outros não vê, vai é da força do pensamento, do ligamento que a gente tem com a irmandade daquela pessoa e também costuma ouvir, igual esse ano eu fui surpreendida, quando Seu Dalmo ia levantar a bandeira dele, que tava tudo atrasado e batendo, ai tinha um congo muito maravilhoso batendo na frente dele, ai eu curiosa voltei pra encontrar com a guarda, porque eu queria ver qual era o congo que tava batendo muito maravilhosamente e quando eu cheguei lá não tinha congo nenhum, era só a bateria, poucos vultos muito bem claro na frente, mas a bateria era excelente, era um congo, ai eu voltei e falei com a Maria: “Maria, tem um congo na frente da guarda do padrinho, só que não dá pra ver”, ai Maria correu pra dentro da igreja, contou o padre... e o padre falou comigo, é porque o congo vivo não vinha, então esse congo é parecido que veio pra ajudar a levantar a bandeira, eu tenho muito mania de ouvir e as vezes ver, mas não é sempre porque tem hora que a gente é tão mais desligado que não presta atenção do que está acontecendo ao redor, mas quando a gente ta bem concentrado, com a beleza boa, de coração limpo a gente vê tudo que está acontecendo.
Essa experiência sensitiva, desde que idade a senhora vê isso? A Sra tem desenvolvimento mediúnico?
Eu sou médium.
Mas a senhora já desenvolveu?
No terreiro do padrinho, mas eu também vou nas igrejas
E tem Incorporação?
Tem
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Quem você normalmente incorpora?
Eu tenho o preto velho que eu falo que é o Carreirinho, que é bem pequenininho, muito doido e a cabocla Gira, é uma cabocla que sempre ta na frente, abrindo a gira. Agora tem 10 anos também que eu voltei a ... sou meia passiva, de fato magnética, já participei dá reunião mediúnica de cura, to sempre levando a religião.
Que idade você tinha quando percebeu isso?
Eu começei de velha, eu já tinha aquela mania de ver as coisas, teve uma vez que a gente tava brincando na mangueira, ai veio um calango verde, ele passou na minha mão, ai eu falei com meus irmãos que ia acontecer alguma coisa com mamãe ou com o papai. Ai por falta de sorte minha, mamãe queima com uma taturana no cafezal, ai quando ela veio os meninos pegaram e falaram: “a Efigenia... a senhora, é por isso que a lagarta queimou a senhora”. Eu nem pensava em nada, é aquelas coisas que a gente tinha, sei lá. Ai depois tudo que acontecia na família, a família acusava que era eu e nisso eu acho que a gente vai pondo uma coisa na cabeça, eu não fiz, mas deus fez. Ai hoje em dia o pessoal tem muita... de mim, coisa que eu não faço, mas acontece, num é eu que faço não. É porque as vezes a gente ta tão vulnerável quando a pessoa diz que a gente fez um mal, que as pessoas começam a desejar pra si próprio, ai acontece o que elas desejou.
Como foi o processo na sua família, se eles entenderam um pouco?
Até hoje eles não me entendem, tem conflito. Tudo que acontece de ruim com eles, acham que é eu.
E eles moram onde?
Minha mãe mora aqui em cima
São quantos irmãos?
Somos em 12, mas o meu... da irmandade com eles é mais desligado porque eu fui abandonada pela minha tia e eu não sabia, eu registrada em nome da minha mãe.
Como assim? Sua mãe teve você e entregou pra sua tia?
É... deixou com minha tia pra ela criar, quando ela voltou, ela queria um filho homem, ela não quis filha mulher, ai me deixou com minha mãe (criação). Ai sempre foi assim, sempre fui criada diferente dos outros, porque minha tia já era espírita, meu pai também era, minha mãe já não mexia não, foi mexer depois. Ai sempre teve aquela coisa de eu ser sempre rejeitada no meio, a minha irmã me tratava por nega preta fedorenta, não falava nada, ai quando minha irmã era noiva do meu marido, ai chegou uma vizinha falando que não era pra casar ela com o meu marido porque ele não valia nada. Ele ia ser o marido da minha irmã, como a vizinha falou que ele não prestava pra ser marido da minha irmã, ai eles foram lá e terminaram o casamento da minha irmã e me obrigou a casar com o meu marido, ai minha vida foi essa ai. Meu marido não tinha nada, me colocaram casando, me colocou no paiol de rato pra morar, que um quarto era o paiol e o outro dividiu comigo, a gente tava deitado na cama e o rato andando. ai um dia lá chegou alguém e perguntou pra mim assim, se eu tinha feito lua de mel, ai ele respondeu, no paiol do rato, as pessoas parecem que nunca gostaram de mim sabe? Eu queria ser amada por todo mundo, tinha jeito de amar, mas a pessoa nunca deu atenção, ai a gente cresceu, ai tudo que falavam, eu queria ser filha da minha tia. Tinha agressão com minha mãe, meu pai, meus irmãos, ai eu falava que queria ser filha da tia Bia, o tempo foi passando, casei, tive os meus três filhos, mas eu jamais gostei do meu marido, respeitava por causa do casamento. Mas sempre arrumavam pais diferentes pros meus
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filhos, o ultimo falam até que é filho do seu Raimundinho, ai deu pra superar tudo, só que a gente sempre ta sentido com essas coisas que a gente não deve. Ai um dia eu tava reclamando com minha tia, a gente tava limpando a igreja, ai eu cheguei chorando e reclamando com ela, ai ela falou pra mim não ficar com raiva da mina mãe: “você era bem pequenininha e não lembra, sua mãe ficou doente e não pode te criar”, ai eu levei maior susto, porque a mãe que eu conheci toda vida foi outra, a que eu sou registrada em nome dela. Ai eu fiquei com aquela coisa, então quem é minha mãe? Mas eu também sabia que minha tia também tinha abandonado uma menina, ... sabia que era eu ai um dia por acaso a minha menina larga o marido de tanto telefonema que vinha da casa da minha mãe pra cá, ai deu a separação da minha filha com o marido dela, ai ela arrumou esse tal de Aguinaldo. Ai um dia minha mãe pergunta assim: “oh, que dia que Aguinaldo vai larga a Lia?” eu sempre fui lerda e mandei ela perguntar pra ele, ai cheguei aqui em casa e contei pra minha menina normalmente, sem nada demais, depois minha filha passou pela minha mãe e não falou nada, minha mãe reclamou, ai minha outra irmã falou: “liga não mainha, neto da senhora é de filho que nasceu da sua barriga”, ai contou cinco e nos somos 6. ai eu fiquei parada atrás do muro, cheguei no portão, minha mãe abaixou a cabeça, minha irmã virou de costas e eu fingi que não tinha ouvido, ai eu fui embora, no outro dia cheguei de supetão na casa da minha mãe, ai o filho da Tânia que é neto do Raimundinho me viu chegando e perguntou: “oh mãe, Dono Efigenia não é nossa tia não?” ela pegou e falou que não, ai eu fiquei em pé, pensei o que eu ia falar, é aquela coisa que a gente não tem reação, ai eu peguei e resolvi arrastar o pé no chão, ai a Tânia que é nora do seu Raimundinho falou que o filho tinha acabado de perguntar por mim e eu falei pra ela, eu já tava aqui quando ele perguntou, quando ele falou pra você que eu não sou tia dele, você disse que não, só que até que provem o contrário, eu sou. Ai as coisas foi passando e eu querendo saber na verdade quem era, porque eu não queria acreditar que era minha tia a minha mãe biológica, ai eu chegava na casa de mãe e mãe ficava falando assim, se num gosta eu faço assim, nem olho mais pra cara dela ai eu costumava ir umas 3, 4 vezes por dia pra pirraçar ela, mas já tinha certeza que eu não era filha verdadeira dela, mas sempre não querendo acreditar. Até que um dia as coisas foi de vento e popa, minha mãe discutindo e discutindo, fui levar pra ela um colchão, ela começou a me xingar a toa, sem nenhum motivo, ai eu perguntei: “mãe, é verdade o que a Taninha disse pro Rodrigo que eu não sou tia dele”, foi ai que eu fui juntando as coisas, que eu não tinha nada haver com a família e até hoje a minha mãe não gosta de mim.
E qual é o parentesco que a senhora tem com o Raimundinho?
Nada, sou dancei na guarda dele, era dançante
Guarda do Zé Luiz, quem é Zé Luiz?
Não, é guarda do seu Emilio
A guarda do Emilio é a de Belo Horizonte?
Não, do Caquiano???
Mas tinha uma guarda de congo aqui que era do Seu Emilio, com quem ta essa guarda hoje?
Eu não sei, não sei se é essa que ta com o Raimundinho, não sei onde foi parar essa guarda.
Emilio era o capitão?
Era o capitão da guarda.
E quem mais estava na guarda além dele?
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Isso eu não sei, porque depois que a gente foi pra guarda do Seu Dalmo, ah, do Seu Zé Luiz, fui eu que fui dançar na guarda dele, que é a guarda que tá com o Seu Dalmo.
E esse Zé Luiz era capitão?
Era capitão, ai tinha a rainha que era filha do seu Zé Luiz também ela abandonou, hoje em dia ela é crente, o Luiz, o Ricardo
Hoje em dia sua guarda tem alguma rainha?
Não, ainda não, mas eu acho que rainha pra congo é muito difícil. Porque a gente não tem tempo de ficar com elas, elas tão sempre dançando mais no moçambique, eles que tomam conta, ai por enquanto a gente não tem uma rainha não.
Tem alguma imagem da irmandade que você guarda aqui na sua casa?
Não, tenho não, eu só troquei pelo Santo Expedito, mas hoje ele ainda não faz parte não, é só a bandeira que eu guardo aqui, ele ainda não faz parte da irmandade, porque eu ainda não levei ele na igreja pra ser benzido e nem pra fazer o andor.
Quem que você lembra que já foi presidente da irmandade?
Zé Cheiroso, Seu Geraldo, Seu Mário, Seu Dalmo, eu acho que o vô também foi presidente, que é o Seu Joaquim Nicolau, eu não tenho certeza assim não. O Zulu também já foi presidente.
S. Geraldo, quem é S. Geraldo?
S. Geraldo já morreu há muito tempo, eu não lembro assim de detalhes dele não, ele ate dançava com o boi, mas sei que já passou muitos presidentes ai.
Sua guarda tem a ver com a promessa feito do capitão Aguinaldo pra você se curar, porque você teve um derrame e alem disso também tem a ver com a desavença com o Seu Raimundinho. Explique melhor essa história
Tem sim, a desavença foi com o Zezé (Capitão da guarda do S. Raimundinho), porque eu tava abraçada um gay, achou que eu tava namorando e ele tirou o gay com a maior ignorância da minha mão e falou que na guarda não era lugar de namorar, porque o gay não fazia parte da guarda também não. A gente encontrou e começou a conversar e o Zezé achou que não entendeu bem que o cara era um gay e tava bêbado, ai veio fazer gracinhas, mas quem foi lá falar com o Zezé que eu tava namorando foi o meu sobrinho e meu marido tava bem no alto da igreja esperando a gente chegar.
Seu marido já faleceu?
Já faleceu, foi dia 31 de Janeiro, vai fazer 3 anos
Seu marido era congadeiro?
Meu marido não, ele nunca teve religião não.
E qual a religião do congado?
Todos são católicos, mas sempre tem alguns que mexem com o espiritismo, ele falam que não mexem, mas mexe.
Como é a relação com as outras religiões no congado?
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Todo mundo respeita o seu jeito, porque igual São Geraldo mesmo foi caboclo, e rápido, por isso que sempre que o povo ta na frente correndo e volta aqui atrás abrindo caminho, porque tem uns caboclo que vai na mata a fora abrindo os caminhos né, pro que der pra passar. Então todos esses são marcados pela religião espírita, falam que não, mas tem. Porque o congo ta na falange do caboclo e o moçambique ta as falanges dos preto velho que são mais lentos, são aqueles velhos que andam mais devagar.
O ritmo da batida também é diferente?
É diferente, então cada um ta levando seu reinado a uma religião espírita, que mesmo que falam que não tem médium, tem sim, é os caras que vão no terreiro sem ninguém saber, igual a guarda do Seu Raimundinho ta sempre no terreiro da Tunica que ta lá perto dele mesmo, só que eles ficam falando que não. O Seu Raimundinho tava ate no terreiro da mainha, Dona Euli, acho que no Citrolândia, ela já me convidou varias vezes pra ir lá, mas eu não quis.
Qual a ligação do Seu Raimundinho com a Dona Euli?
Eu acho que eles eram muito unidos, de modo que a Dona Euli conseguiu dividir o congo no meio, ... do moçambique que eu acho que ta com o Edinilton, que aquela guarda era uma só, ai depois que ele uniu com o Dona Euli, ele partiu. Dona Euli partiu o congo e fez o moçambique ali no peito e na raça.
Quem fundou o moçambique então foi a dona Euli?
Foi ela, ai eles desentenderam, ela saiu fora e abriu um congo pra ela. Eles eram muito ligados, a gente sempre ia nas reuniões com ela, ficavam sempre os dois explicando lá, até que ela conseguiu dividir o congo com o moçambique, ai eles desentenderam e separaram. Ai eles ficaram com o congo e o moçambique tudo junto com o Raimundinho e ela veio e abriu o congo com o Davidson o filho da neném, neto do Seu Raimundinho. Ai o Davidson, o Ednilton, tinha um outro, a Esther e a outra menina são tudo irmãos.
Quais são os filhos do seu Raimundinho?
Neném, Geralda, Zezé, Sarará, Claudinho que é o meu cunhado e o outro passou pra crente, o Daniel também é filho dele com a Dona Pepita, depois que terminou com ela, arrumou uma nova, mas num tem filho não. Primeiramente o Seu Raimundinho tava andando com a, esqueci o nome dela. Ai depois dessa que ele foi pegar a Lúcia. Ai por tanto que essa aqui do Filadélfia, a Dona Pepita tem mais raiva dessa do que da Dona Lúcia, porque quando o Seu Raimundinho começou a andar com ela, ele era bem com a Dona Pepita.
Seu Dalmo mora aqui?
Ele fica aqui por causa do terreiro, ele mora lá em Bicas.
Quem mora aqui?
Aqui mora a Maria, irmã dele.
Tem muito terreiros aqui em Betim?
Olha, tem bastante, só que a gente não é assim. Tem um no Alterosas, acho que no Niterói que é da Dulcineia, tem o da Dona Efigênia que foi onde eu desenvolvi, diz que fica no Chácara, mas tem que descobrir, porque ela tinha mudado pro Bandeirinhas e voltou agora, só que eu não sei não. Tem o do seu Dalmo que é assumido. O da Toninha também é assumido, é
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lá no Angola que o Seu Raimundinho sempre ta lá, tem o da Doneia também e o do Roney que é onde eu vou sempre, aqui no Jardim Casa Branca.
Qual desses são de candomblé?
Do Roney e da Doneia
Qual a diferença de um terreiro de Candomblé para um de Umbanda?
É porque no candomblé trabalha com os santos, todos os orixás de luzes, que eles trocam de roupa, usam aquelas roupas bonitas e vão dançar, só tem dança no Candomblé e as comidas, as oferendas, mata bichos e tudo. E a Umbanda não tem as roupas legalmente, trabalha com qualquer linha, a Umbanda trabalha mistura de linhas e o Candomblé é purificado, tem que raspar a cabeça, aquela coisa tudo.
Então o reinado da irmandade é permeado por isso tudo, tanto pela religião católica como as religiões afros?
É, por isso até que o Charles sempre fala assim, quem ... é do caboclo mais levado que o pé para pouco no chão, quando as pessoas estão dançando é completamente encostado, porque tem pessoas que encostam e tem pessoas que dão cabeça de verdade, ai quando a pessoa ta mais pra incorporado do que encostado, ele ... no chão, ele tem o elevado, onde o corpo eleva mais ainda para cima.
Aqui em Betim, qual guarda você acha que tem mais essa coisa da incorporação no dançar?
É difícil viu, porque todas é encostada, todas as de congo daqui é encostada. Só que o Seu Raimundinho não é médium, o caboclo é só de frente dele, que abre o caminho pra ele na guarda, porque se tiver boa firmeza, dá ate pra ver o caboclo com ele. Agora dança mais pro incorporamento do que pra tudo.
É o que você falou, e pessoa precisa ter sensibilidade pra perceber, ela tem que abrir o coração dela e enxergar. Porque são coisas no campo da sensibilidade...
É, eu acho muito difícil eu ta dançando, quando eu estou dançando sem esta encostada, eu fico mais de vigia no que vai acontecer, agora quando eu estou encorpada.
Esses ensinamentos que o Seu Raimundinho apóia vocês, ensina também a questão do batismo, como é que bate, porque tem uns ritmos diferentes?
Tem que ter o ritmo diferente, o congo tem um ritmo elevado mais alto e o moçambique mais devagar, mais pesado.
E o movimento da meia lua, pra que existe isso?
Pra fechar a caminho e pra abrir, se fazer a meia lua fechada, pra fechando o caminho pra outra guarda que vem atrás, se a gente faz ela aberta, a gente ta abrindo, deixando o caminho aberto pra guarda que vem.
Quando fecha a guarda, o que acontece com a guarda?
Ela fica marrenta, ai se for esperto, vai fazer uma meia lua também pra abrir, ai quando a gente fecha, deixa a guarda mais presa no andar.
Quando uma guarda fecha, automaticamente vocês já percebem? Já fazem a meia lua aberta?
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Já percebi
Então tem essas disputas dentro, e vocês fazem isso pra disputar ou pra testar, o que acontece? Como é isso?
Eu acho que acaba alguém testando, pra ver se o outro ta sabendo, o que num ta sabendo fica preso, ai tem que pedir ajuda pros orixás da frente e quando vê que a guarda ficou presa que tá atrás dele, eles mesmo fecham e eles mesmo abrem. Porque quando vê que a guarda que tá atrás não ta andando, é porque o da frente já fechou aquele, ai tem que voltar atrás, para, voltar e abrir o caminho. O povo vem cá na guarda que tá na frente, roda, ai conforme seja, acaba até indo mais além da guarda que ta lá atrás pra buscar ou fica parado até ela chegar. Porque as vezes quando a gente quer amarrar uma guarda, as vezes ela tá muito na frente, a gente pede pra Santa Bárbara: “oh Santa bárbara, Santa Bárbara exige, eu num sei o que o lobo tem, quem quer correr não pode” ai num tem jeito dele andar, ai ele apia (para). Ai a gente costuma tá sempre com um capitão mais... ai ele num cansa, ai ele consegue deter a guarda.
Esse ano por exemplo, foi mais retido ou deixou rolar?
Ah, aconteceu coisa bem ... esse ano. Igual a festa foi bem mais pesada, que já foi até avisada lá no seu Dalmo, o preto velho falou que ia ser de quebra-pau e como de fato foi bem difícil esse ano, ai a gente, sobre a nossa guarda que é novata, que nos saímos da casa da cultura, nos foi pro Marambaia (guarda de Igarapé), ai na igreja cá nos pegamos o Seu Dalmo pra fazer a procissão, ai a guarda da Zélia veio pra tomar o moçambique de nós, que era o moçambique do Seu Dalmo, ai eles vieram e já deram uma meia lua fechada, já fez de jeito que o Dalmo pra trás e nos seguia, ai eu falei com o Aguinaldo: “esse moçambique é nosso, que quando nos formamos a guarda, nos formamos pra puxar o moçambique do Seu Dalmo e o marujo quer tomar ela, então nos não vamos deixar, então volta atrás de dá uma meia lua em cima”. Ai nos voltou, prendemos a guarda da Zélia e pegamos nosso moçambique de volta, ai como eles viu que nos entendia um pouco, eles saíram e foram lá pro Gagueiro??? e pegaram a 3ª guarda lá na frente e veio cá atrás tomar nosso moçambique que era o último, se o cara fez uma meia lua na frente, ele toma o moçambique que tá com a gente, tem que tá esperta ai pra ta notando a maldade do pessoal, porque eles vem com maldade pra tirar e por a gente pra baixo.
Essa guarda da Dona Zélia tem alguma ligação com o candomblé ou Umbanda?
Olha essa daí a gente não sabe, porque eles tá só pra lá, Dona Zélia ta sempre ... dentro da igreja, ai não dá pra saber. Também tem a guarda da Tita, ela é bem esperta, tem que ter muito cuidado com a guarda dela, ela entrou com a guarda dela na frente e queria que o congo entrasse atrás, ai eu falei com o Aguinaldo que nos não vai entrar e nossa bandeira também não vai entrar, se o moçambique entrou primeiro, se o dela que é o catopé entrou primeiro, deixa só que o dela vem... ai nos ficamos do lado de fora e não entramos, ai desde essa época pra cá eu vejo que a Tita ta “meia” fria comigo, as vezes a gente encontra, a gente encontra no posto de consulta lá e ela dá um jeito de nem conversar.
A Tita também tem ligação com algum terreiro? Qual terreiro?
Tem, lá na casa dela mesmo, foi até quando ela coroou os netos dela lá na casa dela, então pra aquele lado ali, tem um terreiro de Allan Kardec ali no Santa Inês, mas eu acho que ela freqüenta outro, porque o ... tá do lado de fora da casa.
E o que significa quando estão do lado de fora da casa?
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É porque eu acho que ela não abre seção dentro da casa dela, se ela for trabalhar ali, vai ser só do lado de fora mesmo, só ali que ela trás algum preto velho.
Obs: A Tita tem um Altar do lado de fora da casa dela.
Ela também não assume?
Não assume não, quem assume mesmo é o seu Dalmo. A Dona Maria também não assume não, mas ela fala que não, mas tem muito conhecimento dos orixás, ela fala muito, fala das migrações, mas a gente acaba percebendo.
Ela até falou comigo que ta com uma cabeça de cachorro lá que a caveirinha ilumina, ela até tentou me levar pra lá, mas acabou de expulsando, porque quando as pessoas mexem com certas coisas assim é magia negra e magia negra é sempre oculta, a pessoa não assume. Porque é feito muito pesada, igual a gente ta vendo na televisão o cara pondo agulha nos outro ai. Então quem ta na magia negra num assume não.
Seu Dalmo falou que durante a festa tinha alguém que ensaiando pó a gente não sabe porque a gente não conhece né?
Ah, eu vou dar nomes ao bois, é o neto do Seu Raimundinho que jogou pó na Rayane do seu Dalmo e no Miltinho, depois disso dizem que andou dando uma brigaiada direto, depois do pó que o menino jogou.
E como é que joga o pó?
É fácil, eu coloco na mão e te dou a mão. Você pega na minha mão simplesmente, mas eu ai to com a maldade. Outra coisa é eu chegar, jogar na sua cabeça, no seu corpo, do seu pé, tem muito jeito de prejudicar as pessoas, porque na festa a gente não ta ligado na base, a gente ta ligado só nas coisas bonitas, é onde os outros apanha a gente, no descuido, é por isso que a gente tem que ta sempre dançando, mas atento. Mas quem jogou o pó mesmo foi o Jonathan, que é o neto do seu Raimundinho.
Por trás do reino do Rosário ainda tem muita coisa que a gente não consegue entender, porque depende muito dessa abertura de mente.
Tem que ter uma visão espiritual. Até as caixas costumam falar se você prestar atenção, as vezes o cara ta batendo ali sem um pingo de firmeza, então a primeira coisa que a caixa canta, “tatu ta no mato”, você ta sem entender, mas a caixa ta te contando que ta acontecendo alguma coisa, então você viu uma caixa, bateu e deu pra você entender que o “tatu ta no mato” ta errado, porque tem alguma coisa te avisando pra você tomar cuidado, porque num é o tatu que ta no mato? é o caçador que ta atrás de você.
As matinas tem a ver com isso?
A matina é pra fechar os maus né, não deixar nada de mal acontecer na guarda, eles tão de vigia, mas os caras ta fazendo as matinas, mas os rapazes tão namorando atrás da igreja, então tá desse jeito, hoje em dia o foco não ta virado somente pra religião.
E a função da matina, é de uma guarda só ou todas as guardas contribuem?
Eu acho que a responsabilidade ta só com o Seu Dalmo que ta no pé da coroa, porque eu não vejo, nunca fui. Também nunca vi a guarda do Seu Raimundinho, em todo o tempo que eu estive nela fazer matina. Sempre é a do Seu Dalmo, de primeira era a guarda do Vô, agora depois que o Seu Dalmo pegou o pé da coroa que ficou sendo ele.
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Me conta um pouquinho dessa questão do pé da coroa. Para quem foi passado essa função?
Foi o Vô, Joaquim Nicolau, ai depois eu num sei se passou mesmo pro Seu Mario e depois pro Seu Dalmo agora, porque quando o Vô morreu, já deixou o espírito que o Seu Dalmo ia ser o pé da coroa, ai deixou escrito ou falado, num sei, só que o Seu Dalmo não tinha assumido, ele ficou esse tempo todo sem assumir, foi assumir agora que teve a encrenca ai que eu num sei, que ele tomou o pé de coroa pra ele e se ele não sair, não tem festa. Não tem festa sem a coroa.
Hoje além do S. Dalmo que é o pé da coroa, quem mais é liderança dentro da irmandade?
Acho que fica sendo o S. Raimundinho e o Seu Dalmo mesmo, esse daí é osso duro de roer (Raimundinho), ele tá sempre na frente, sempre tomando. Igual na briga que tivemos, eu tive apoio mesmo só do S. Dalmo, o restante tudo ficou do lado do S. Raimundinho, eles acharam que a gente não conseguia, ai Nossa senhora do Rosário é maior e a gente conseguiu, agora espero que a gente consegue ir pra frente, bem tranqüilo mesmo, na realidade com muito esforço. Igual eu falei, vou ver se consigo do meu dinheiro mesmo fazer uns 20 rosários, pra cada um dos participantes da guarda e vou conseguir, a gente tem muito tempo ainda, pra comprar as miçangas. Igual eu já fiz um pro Aguinaldo, um pra Lisa e tem os dos meninos que tá aqui.
Israel de Jesus Pinto
Presidente da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário
No governo de quem que você acha que a Funarbe começou a patrocinar?
Acho que deve ter sido no do Tarcisio Braga, porque o Tarcisio também é muito voltado para essa parte, gosta muito. Na época também não tinha muito recurso, o governo não tinha recurso.
O que você acha que morou para a festa, para a organização da festa ou teve alguma coisa negativa também?
Não, eu to te falando, foi muito bom porque veio mais gente, e quanto mais gente, tem um ditado no jurídico: “o que abunda não prejudica”, então gente que vem entusiasmado, que gosta é bom, da discussão nasce a luz, então vem mais pessoas, com mais idéias, igual veio a Elisa do Norte de Minas querendo, sonhando e viu, então quisera que viesse varias Elisas com a mesma intenção, então isso ajuda muito. Como eu tava te contando que no inicio era só o Seu Joaquim, coitado, ele fez sem recurso financeiro, pouco cultura. Só a religião, a espiritualidade, muita, mas o município não tinha condições. Primeiro o município pertencia a Esmeraldas, então com muita dificuldade, mas hoje não, hoje a Funarbe tem recursos, a Funarbe tem pessoas envolvidas que gostam como vocês que ta aqui pra ajudar, que ta aqui pra colaborar, rasgaram o coração. As vezes eu ate acho que eles pedem demais, eu achei ate que esse ano eles excederam os pedidos e vocês atenderam, isso é bom, que pode ser que mesmo eles vendo a parte do governo com o espírito de ajudar, de dar sem medida, porque deu sem medida. Pra que tenha a festa, precisam que tenham eles, entendeu? E para ter eles com a má vontade que as vezes eles tem, é difícil, e com a parte do governo como vocês estão fazendo é muito bom, ajuda demais. É muito bom porque divide as tarefas, que pra uns sozinho, um peso carregar sozinho, mas se dividir a tarefa é bom demais. Porque tem mais
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gente, tem mais idéias, colorindo mais. Igual essa menina, que fez a ...
Quais as imagens que são pertencentes irmandade?
Num sei também não, porque toda vida teve aquela imagem de Senhora do Rosário lá, quando tinha missa que era lá em cima, muito bonita, então a gente não mexia, a gente não tinha esse movimento de imagem também. O Frei Chico que foi o primeiro vigário da paróquia na época também não era muito ligado, primeiro era tudo de uma paróquia só, que era do Padre Ozorio, ele celebrava aqui na Nossa Senhora do Carmo, tinha a capela de Nossa Senhora do Rosário pra esse fim, pra festa, que as vezes tinha até ou não. Então ficava mais separado não, então o Padre ficava com a de cima e quando dividiu a paróquia, já era o professor Rafael, Padre Rafael Martins, os Franciscanos que já estavam lá no seminário assumiu a parte de lá, mas assim em detalhes as imagens eu não sei não
Pode repetir o processo de doação do terreno?
O processo de doação do terreno foi uma permuta que houve, o terreno lá em cima era da diocese, era da Cúria, porque antigamente, aquilo que foi doado por alguém foi até terreno da santa, tanto é que é na extensão do Angola todo, porque quando na construção do distrito, então tinha, aonde vieram ... localizaram era no Angola, tanto é que vieram esse ano do povo de Angola, que era os preto que ficava do lado de lá, o pessoal do lado de cá, que num tinha nem a ponte no rio, era a ponte de madeira no Rio Betim. Quando alguém daqui, da parte rica precisava de alguém lá: “vão lá no povo de Angola”, povo de Angola é os preto, por isso virou bairro, Bairro Angola. Então ia buscar o pessoal lá, e o terreno ao longo da Igreja do Rosario, falava terreno da santa, tanto é que podiam cercar, chegavam lá e cercarem um pedaço, onde mora o João Grarmino, onde morou esse pessoal, os Gana. Porque eu nasci na Serra Negra, onde eu tenho terreno hoje, meu pai era empregado, então quando o patrão do meu pai vendeu a fazenda, mandou o pai embora e viemos pra Betim. Eu me lembro que era menino e eles falavam com o papai, chama: “o Chico, cerca um pedaço pra você”, “eu não, eu não comprei”, papai tinha essa cisma, hoje não, o pessoal até corre, acampa, é os sem terra, sem teto e tudo. Tanto é que papai nunca teve uma casa em Betim, pagou aluguel e quando ele teve foi quando eu comprei e dei pra ele morar. As pessoas falavam pra cercar e morar.
Então todos os terrenos ali em volta as pessoas iam, cercavam e se apropriavam?
É, ao longo do Angola ali pra frente, então ... de documentos ali.
E o terreno da própria capela, era maior ali?
Não, ali em volta o terreno, eu me lembro, o terreno ali, o Camilo Tour, esse que eu to falando com você, Amin... eu até me lembro do nome dele é desse turcos que vinham andando e parou em Betim, então na época conta que cercou muitos terrenos, até o terreno em volta da capela ali era dele, ai o Tião, Sebastião Alves, pai da Cecília que mora aqui do lado, ele tinha comprado um terreno aqui embaixo, na Rua Dr. Gravatá, ai eu fiz uma pergunta pro Camilo, lá em cima era do Camilo, o Tião Branco, porque Dona Ana, mãe da Cecilia não queria ficar aqui embaixo e trocou, o Tião Branco foi lá pra cima e o Camilo ficou com o terreno do Tião Branco cá embaixo onde tinha até um açougue, esse terreno era do homem que é dono daquela fazenda em frente do cemitério do Cachoeira. Então ali onde ta o CETAP foi um terreno que ficou muito tempo parado, e depois que eu fiz direito que vai encaixando as pedras, então o pessoal cercava e fazia o usucapião e tornava dono, quer dizer, era posse mansa e ninguém impedia e depois de um tempo ele pedia o usucapião como faz até hoje, se ninguém requereu nada, depois de 5 anos pode fazer um usucapião, então o que aconteceu naquela região foi isso.
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Mas aquele terreno da casa paroquial nunca pertenceu a capela?
A casa já tinha ela, eu me lembro que quando mudamos da roça, eu me lembro, eu acho que já era, acho que da igreja, mas não usavam a casa. Então o pessoal do DNER alugaram aquela casa, acho que foi até a republica do pessoal quando tava construindo a Fernão Dias.
Então o pessoal, topógrafos?
É, 50, 51 tava lá quando eles vieram pra cá, foi nessa época que eles alugaram aquela casa, mas eu nem sei a quem o DNER alugou aquela casa, era menino, nem sei como é que foi. Eu fui lá uma vez catar feijão pra eles, o pessoal da topografia um dia pintaram aquela casa, 58, por ai. Num sei explicar, mas o terreno já era da diocese e ai que fez a permuta, o ... até embaixo, onde tinha do matadouro e mandou pra câmara e fez a permuta ... lá na prefeitura pra conservar como Patrimônio Histórico e cadê ir pra diocese pra construir a Igreja ...
Qual a importância da festa do congado hoje pra Betim?
Eu acho que é o ícone da religião é a festa do Rosário, porque ela tem tradição, esse pessoal que vieram pro Angola, que aportaram na região ali, eles vinham festejar Nossa Senhora do Rosário junto com Seu Joaquim Nicolau, tinha a festa da padroeira e a festa de Nossa Senhora do Rosário, eram as duas únicas festas que tinham, depois que veio São Cristovam, São Geraldo, Nossa Senhora Aparecida e veio outras comunidades e foi criando outras comunidades, mas era Nossa Senhora do Rosário e Nossa Senhora do Carmo
Hoje você continua na função de capitão-mor?
Eu tava no posto de capitão-mor e fui indicado para presidente com a ausência do Seu Zé do Alberto, Zé do Alberto Martins.
Você pode me falar o nome dos presidentes que a irmandade já teve?
Olha, eu não lembro, mas tinha o Zé do Alberto. Juridicamente é ele, mas vamos registrar, eu fui a na receita afim de levantar os dados, já tava no nome do Alberto Martins, ele faleceu e nos papeis não mexeu, ficou parado
E depois?
O Seu Delio, Seu Mario, Seu Dalmo e eu
Transcrição entrevista: Zélia Pereira Ricardo
Data: 09/12/2009
Como é que surgiu o congado aqui em Betim?
Aqui em Betim, o congado surgiu com um grupo de pessoas né, com a família do Seu Joaquim Nicolau e ele dividiu, eu creio que nessa época eu ainda não estava em Betim, mas a gente ouve a historia, meu marido também contava que ele veio pra cá antes de mim, que ele formava os grupos que eram a família dele, a família dele foi a fundadora do congado aqui em Betim. Morava em Vianópolis, o congado começou em Vianópolis, até vim pra Betim.
Você sabe mais ou menos em que época foi isso?
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Ah, eu num to bem certa não viu, porque eu vim pra Betim em 1967 e já existia com o congado. Eu creio que por volta de 60 já existia o congado, e a festa não era como hoje, eles que pediam, saiam ... é os participantes saiam nas mercearias, que distribuíam cartas pedindo ajuda, era tudo feito por eles.
Pediam especialmente pra que?
Pro almoço, pras vestes, pro enfeite pra Igreja que era uma capelinha pequenininha. Era muito bonito, porque o povo dava saco de arroz, saco de feijão, porco pra matar, era uma festa muito participativa naquela época. Que era tudo ganhado, não era fácil como hoje não
E em relação a guarda da senhora, como é a história da guarda, quando foi fundada, porque ela foi fundada?
A minha guarda hoje, a guarda do passado, a primeira que era ... era mesmo os Marujos, ela começou lá no Alterosas, na Igreja do São João Bosco, só que o padre Francisco não gostava, como não gosta até hoje, então eles começaram, os Marujos lá, no Alterosas na Igreja do São João Bosco, então com o passar o tempo as pessoas foram separando, que foi a capitã que era a Tânia, primeira capitã da guarda que era a Tâninha, filha da Rainha João, Dona Maria, é a Lilica que era participante também, que eram as irmãs, o Tião, a Marcilene, o Toninho que hoje é ate professor de faculdade.
E o Tião, a família dele já era?
A família do meu pai, do pai dele. Meu pai já era um congadeiro de primeira.
Você é de qual região?
Sou de Bom Despacho, já conhecia, meu pai tinha a guarda do Penachos, é aquelas penas de pavão, era linda demais
Então quando a senhora veio, você, o Tião Medonho, todo mundo já tinha raízes no congado
Já tinha raiz.
E em relação ao Tião Medonho, a raiz dele estava relacionada com alguém aqui de Betim ou de outra cidade?
Daqui mesmo, ele ficou conhecendo o congado em Bom Despacho antes da gente casar, depois quando nos voltamos pra cá, ele fez amizade com a família do Seu Joaquim Nicolau, e ai ele entrosou junto com Seu Joaquim Nicolau, onde foi fundada as guardas.
A senhora tinha falado que a primeira guarda de Marujos que foi nas Alterosas e por causa do Padre Francisco ele foi acabando, quanto tempo ela atuou no Alterosas?
Atuou no Alterosas uns 2 anos, que eu não participava não, porque eu não gostava naquela época não, eu achava bonito, mas não gostava não, eu tinha a mesma impressão que o povo tem hoje, de espiritismo.
A senhora até então achava bonito, mas ficava como expectadora! Como foi a entrada da senhora para a guarda?
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A minha entrada pra guarda foi um pedido na Nossa Senhora, eu estava grávida e já com 6 meses de gravidez o Dr. Geraldo queria interromper minha gravidez, ai eu falei com ele, “Você não é Deus, eu não vou tirar não porque isso aqui já é uma vida que está dentro de mim”, ai ele falou pra mim: “Você vai morrer”. Ai eu falei: “tem importância não, seu eu morrer, vou morrer nas bênçãos de Deus”. E desci para o rua afora, a Governador Valadares e entrei no santíssimo da Igreja Nossa Senhora do Carmo, tinha 7 dias que o Padre Luiz Fernando tava em Betim, entrei na Capela, ajoelhei e falei com Nossa Senhora, “a senhora é mãe e to nas suas mãos, se a senhora quiser que esse filho seja meu, ele vai ser meu, mas eu caminhar com as minhas pernas pra tirar eu não vou não, quando ele completar 4 anos, vou vestir ele todo de branquinho e azul e ele vai colocar um buquê de rosas lá em cima do altar da Igreja do Rosário” e num voltei no medico mais não, e falavam: “você tem a ir no medico”, ai eu passei a fazer o controle lá no Sara Kubitschek e o menino ta ai. A promessa eu fiz para Nossa Senhora do Rosário.
Já tinha a imagem dela?
Já tinha a imagem dela lá na capela, até me lembro que o padre que subiu o menino lá foi o Frei Luiz, que colocou ele lá em cima pra ele colocar o buque pra Nossa Senhora, ai no 4º ano eu cumpri a promessa e comecei a ir, acompanhando o Tião.
E o Tião Medonho já estava participando?
Já estava participando, eu fazia tudo pra ele, mas não gostava muito de ir, ai através de um pedido que eu fiz pra Nossa Senhora que eu estava nas mãos
Então a senhora mudou pra cá em?
Não, eu já morava aqui
Mas freqüentavam lá?
É, eles saiam de lá, tudo saiam de lá, depois que passou para aqui.
A Igreja lá era de Santa Izabel? e antes ela chamava, São João Bosco?
Chama são João Bosco, que é o padroeiro de lá, mas sempre fala Santa Izabel, num sei porque, mas é São João Bosco, é a coisa mais linda, nos fizemos festa lá esses dias, dia dele, a comunidade aqui participou
Que lembranças a senhora têm da capela do Rosário mais antiga? Como que era a capela?
Ela era assim, do mesmo tamanho, só que com cores, eu acho que o que mudou ali mesmo foi as cores e não tinha aquelas pilastras em volta, era um espaço livre onde as pessoas deixavam caminhão, de frente a capela, onde que acho que afetou a estrutura dela, mas a capela era aquilo mesmo, porém menos arrumada do que hoje.
A senhora lembra se tinha uma casa de apoio para capela?
Não, acho que não. Não porque quando fazia a festa, o café era dado em uma casa do outro lado da linha, que a gente tinha que atravessar a linha, onde hoje é o Luna (supermercado). Parece que é até onde é a imediação da Lady, ali. Tinha uma arvore muito bonita, uma mangueira onde o povo atravessava tudo ali debaixo daquela mangueira pra ir tomar café, era uma casa não era um centro de apoio não, eu não me lembro do nome da senhora não.
Era nessa casa então que ele servia o café?
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Era, no ultimo dia da festa, terminava a festa, descia as bandeiras e ia todo mundo para essa casa tomar o café
Então não tinha o café os outros dias não?
Tinha, cada um dava o café da sua casa.
O almoço era feito onde?
No caso do Seu Joaquim Nicolau, a Dona Ana (esposa do Joaquim Nicolau) que era responsável pela comida, a esposa dele, ela que juntava o pessoa pra fazer a comida. Porque eles pediam.
Qual era a importância da bandeira do aviso para a festa e como é a participação da guarda na bandeira do aviso?
Uma parte de muita responsabilidade, que no entendo não ta havendo muito compromisso por parte dos capitão não, a bandeira do aviso é o primeiro sinal de que a festa é chegando, a gente levanta essa bandeira, levanta a mão poderosa pedindo a proteção de Nossa Senhora pra festa que vai iniciar, mas infelizmente na nossa cidade ta havendo o descontrole dentro dos capitão, um chega atrasado, num tem responsabilidade. Igual esse ano eu falei, “gente, vai esperar dar meia noite pra levantar a bandeira?”. Quase que dá meia noite pra levantar a bandeira, é uma falta de compromisso com Nossa Senhora muito grande, eu fico abismada quando eu vejo uma coisa assim e o pior é que são umas pessoas de frente, principais que deixam acontecer isso.
As principais orações são em torno de pedir proteção?
De pedir proteção, porque esse ano nem rezar o terço a gente rezou, porque já era quinze pra meia noite e se num levantasse a bandeira, ia ter que levantar no outro dia.
Nesse pedido de proteção quando está erguendo as bandeiras, tem evolução que as pessoas fazem.
É um cumprimento né
Você poderia explicar?
É uma saudação, está saudando a chegada de Nossa Senhora no reino
E o ritual do pessoal passar o terço, levar os colares, como é que é isso?
Pede a benção né, como um filho pede benção à mãe, a gente, é que o terço é nossa arma, o bastão é nosso guia. Então a gente passa o bastão na bandeira, as rainhas costumam passar o ... pedindo a benção de nossa senhora, é um rito de muita humildade, tem que ser feito com muita humildade e respeito
Nesse dia é erguida a bandeirada mão poderosa, e ela só retirada no final da festa. Que mais que tem na bandeira do aviso que a senhora poderia dar mais detalhes?
Não, a bandeira é só pra anunciar a chegada da festa, é 30 dias que ela fica erguida antes da festa.
Fala um pouco das novenas para nós!
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As novenas são nove dias, cada guarda levanta sua bandeira e no passado a gente levantava todas as bandeiras em um dia só, com o passar do tempo, inventaram a cada dia levantar, mas isso ta dando problema, porque tem dias que vai guarda, levantam sua bandeira, mas não participam da missa, o padre que vai celebrar missa, não é pro congado, é pros visitantes, congadeiros mesmo não participam, na hora da celebração, ao invés de ta participando, estão lá fora furando buraco, conversando e a falha esse ano foi muito feio, faltou duas ou três bandeiras e isso ai não ficou sendo uma novena do Rosário, porque faltou três bandeiras pra serem levantadas e isso quebrou muito a irmandade.
Mas como eram anos anteriores?
Todas levantavam as bandeiras no mesmo dia. Isso foi até, acho que depois que o capitão-mor faleceu que teve essa virada. Porque agora cada um levanta a bandeira num dia pra fazer uma festa maior.
Então era levantado num dia só, então não tinha novena?
Não, não tinha novena não, as vezes os Tião saia daqui todo dia pra ir pra igreja rezar terço, num era assim como hoje que tem missa todos os dias da novena não.
E a senhora calcula que isso foi quando?
Acho que foi depois que o ... Teodoro faleceu e a Dona Geralda que por melhor, houve essa divisão, de levantar as bandeiras em um dia só.
E a senhora sabe precisar quando o ... Teodoro morreu?
Num sei não
As pessoas iam rezar o terço, mas não tinha missa como tem hoje?
Não,não tinha não. E hoje a gente tem esse privilégio de ter a celebração e num tem a participação do congado. É, igual eu falo que a festa é mais o sábado e o domingo, porque o sábado vai lá, levanta a ultima bandeira, de Nossa Senhora do Rosário, domingo via pra festa o dia todo, fica lá o dia todo, já desce as bandeiras todas no mesmo dia, o que num acontecia, que era na segunda-feira que iam lá descer as bandeiras.
E quando tudo isso mudou?
Num lembro não, foi junto com essa mudança também. Pessoal que faz as coisas assim, depois que eu já fazia, que eles comunicaram que tinha feito. Seu ... vai levantar as bandeiras tudo depois da festa, porque segunda feira todo mundo trabalha, até me parece que essa idéia foi do Seu Raimundinho e do Seu Dalmo, arrumação essa foi dos dois
Os dois questionaram que estava complicado, porque as pessoas precisavam trabalhar. Como são proposta essas mudanças na Irmandade?
Não, os dois falou, acabou. Raimundinho e Seu Dalmo falou, acabou. Eles sentem o dono da irmandade.
E porque eles são os mais velhos e guardam a tradição?
Guardam a tradição, guardam a coroa. Igual quem era pé de coroa era Seu Mário, o Seu Dalmo tanto fez, que o Seu Mario para não ... passou a coroa para Seu Dalmo.
Então quem passou a coroa para Seu Dalmo, foi o Seu Mário?
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Foi o Seu Mário, ele que era o pé da coroa e o seu Raimundinho era o vice do Seu Dalmo, na época que eles fizeram essa troca, Seu Dalmo era presidente e o Raimundinho era o vice. Ai depois Seu Mario ganhou a eleição e ficou então aquela guerrinha.
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Entrevista Reis Congos
Data da Entrevista: 05/01/2010
Local: Rua Teófilo Otoni, 904 – B. Fernão Dias /Igarapé
Rainha Conga: Eneider Aparecida da Silva 20/09/43 Natural de Caputira (próximo a Manhuaçu) Veio para Igarapé em 1996.
Nome: Monklin Delano Martins Ramos
Foram coroados como reis em uma cerimônia, conduzida pelo Capitão Raimundinho na Capela de Nossa Senhora do Rosário no dia 30/07/2005.
Que qualidades a pessoa tem que ter para ser rei ou rainha do congado?
...Ser honesto, saber rezar, ter fé em deus, gostar de fazer as coisa, gostar do congado, amar a vida conjugal não ter briga em casa... eu acho que o principal pra nós é isso...
A idade também é levada em consideração?
Rainha conga: Não, não tem idade pode ser menino de um ano, dois anos que tem entendimento é válido entende e quer
Entendimento em conhecimento espiritual?
Rainha conga: Entender o que que é o congado, o que é religião, saber rezar e amar a deus sobre todas as coisas e a mãe e o pai juntos e o próximo, eu acho que o importante é isso né...
Qual foi sua trajetória na irmandade, no reino do rosário?
Rainha conga: Primeiramente eu fui ajudante... a reunir... a levantar uma guarda... nós levantamos primeiro uma guarda...depois aprendemos a cantar ..aprendemos a desenvolver cada um no seu lugar, cada um no seu modo... a bater uma caixa... tudo isso tem muito meio de a gente aprender e indo na festa.. na casa do seu Dalmo que é muito amigo da gente pertence a família dele também e chegou aqui convidou a gente... convidou não! exigiu Intimou eu e mais o Monklin a ser rei congo e rainha conga... ai a gente já gosta.. tava afim mesmo ... ai nós fomos ficamos lá até hj e vamo ficar enquanto eles quiser.
Em relação a sua história, sua vida como você começou no reinado do rosário?
Toda vida eu fui católica, já fez a cruzada?? e. um belo dia minha irmã foi rainha conga, rainha festeira lá na minha terra.. eu vendo esse congado eu me apaixonei.. ai foi um dia... devia tá 7 anos , ai casei,e hoje junto com minha vontade, meu desejo.. minha vitória e quando não tem congado.. não tem saídas.. ai o domingo não é nada..eu gosto de participar.. mas gosto de ouvir também o que falam né...se eles estão satisfeitos ou não.(as guardas).. se gostam de mim ou não... mas pelo que vejo são poucos que me aceitaram como rainha conga.. mas esse pouco se achar importante ... o importante é amar a Deus sobre todas as coisas, e isso eu amo demais.
Rei e rainha não é pra enrolar terço no braço... dentro da igreja tem que tá ali rezando...Na procissão eu rezo na faixa de 7, 8 até 10 terços....conforme acabo um ofereço, pego outro e ai vai...... inclusive o padre... como ele chama? É .. “mas a sra reza hein!” ele do meu lado e olhando assim né ................... o que eu acho a responsabilidade de um rei congo de uma rainha conga numa guarda é muito grande... e eu não vou rezar só .. por exemplo eu sou da
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guarda do S. Dalmo ..vou rezar só pro S. Dalmo, não! eu tenho reza pro S. Dalmo e pra todos que estão ali presente.. seje de Betim, seje que vem de fora. Gente da África veio me visitar aqui, veio da África (está se referindo a visita dos “Arautos de Fátima” um grupo africano que visitou sua casa recentemente)... então é bom demais é a melhor coisa que tem.. a gente saber amar a deus , saber levar.. cada coisa no seu devido lugar.
Como foi sua coroação como rainha conga? Teve um ritual?
Rainha conga: Teve. O congo do s. Raimundinho, o S. Dalmo e mais congadeiros tiveram lá...
Como foi sua trajetória no rosário?
Rei Monklin :Foi aqui mesmo, no bairro industrial que pertence a Contagem. Logo, logo quando eu mudei pra lá surgiu uma guarda de congado.. chegou um congadeiro formou a guarda, eu tinha 14 anos naquela época, ai eu participei nessa guarda até o capitão regente vim a falecer.. ai ele faleceu os filhos não quiseram tocar a guarda..ai vendeu os instrumentos tudo pra folia de reis... ai fiquei aquele tempão todo sem freqüentar uma guarda.. ai na minha mudança de contagem pra qui(Igarapé) há 10 anos atrás... um moço aqui atrás (vizinho) acompanhava uma guarda de congo.. uma guarda de congo de Sabará.. toda vez que ele precisava de guarda ele pedia uma guarda emprestada para pagar visita... aí uma época que ele pediu uma guarda emprestada pra pagar uma visita em Montes Claros.. quando os festeiro lá falou no auto falante o nome dele e não falou o nome do dono da guarda teve briga... ela queria que falasse o nome dela e não o nome dele.... ele tava com a guarda emprestada.. era dele que tinha que falar o nome..ele tava com a guarda emprestada igual eu já pedi várias vezes também.. ai conclusão: ele chegou e veio reclamar comigo quase chorando, ....ai eu falei não o meu fio espera aí: aqui dá pra formar uma guarda (Igarapé), vamo formar uma guarda sossegado. aqui dá pra formar uma guarda sossegado.. ai formamo uma guarda de são João Batista ali na outra rua e que toca até hoje, ai freqüentei lá e frequento lá ainda.. continuo frequentando lá.. mesmo eu tendo aqui (está se referindo a uma outra guarda que ele também criou) eu frequento lá... Porque a daqui tá assim tá meio lá meio cá, mas eu frequento lá...nesse meio tempo ai eu formei essa guarda de moçambique rosário de Maria e a de lá é guarda de moçambique nossa sra do rosário e são João Batista.. a guarda aqui é de nossa sra do rosário e de nossa sra aparecida.
Há quanto tempo foi criada a guarda de moçambique rosário de Maria?
De 2000 pra cá ,vai fazer 10 anos que ela tá fundada. A outra foi fundada em 97 e essa foi fundada de 2000 pra cá.
Como foi o processo da escolha de vcs como reis congos e como foi a coroação.
Rei Monklin :A coroação, como a rainha disse no início é nos tava aqui era 7 horas da noite, quando chegou S. Dalmo e dois capitão da guarda dele, ele pegou e disse pra nós: “vim fazer um convite pra quarda de vocês e não quero que diz não. Não quero escutar a palavra não”. Então o que que é o convite, pode dizer ai, já que não pode dizer a palavra não.” Pro ces ser rei congo lá de Betim, na minha quarda” ... então não pode dizer não... então tem que falar que sim né! E aceitamo. Ai eu disse pra ele: “eu tenho uma guarda aqui, eu mexo como uma guarda aqui!... e o dia que eu tiver mexendo com a guarda aqui e oces tiver precisando de mim lá?” “Não tem problema! Se oce quiser movimentar a sua guarda aqui, não tem problema ocês faltar, se sua guarda sair pro mesmo lugar que a minha for, sua guarda emenda na minha!” Então eu falei se for nessas condições ai tá tudo bem, pra mim não tem problema não. Porque emendar uma guarda na outra não tem problema nenhum, e tamo lá até hoje.
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Qual o papel do rei e da Rainha Conga no Congado?
Rei Monklin :Firmar todas as guardas naquela festa que eles está ali. Firmar todas as guardas, está sempre em oração pra todas as guardas e todos os convidados que estão ali.. a firmeza da guarda está em nossas mãos.. é onde rei e rainha não pode tá com terço enrolado no braço... e a coisa que mais vê lá em Betim é isso... mas ninguém obedece.. lugar de terço é pra rezar, não é para bater papo com ele enrolado no braço não...não sabe rezar terço.
Tradicionalmente como são escolhidos um rei e uma rainha conga?
Tradicionalmente é pela idade mesmo... pela idade.. tem que ter uma idade acima de 30 anos, começando de dentro de casa tem que ter uma boa convivência com a família, já tem que começar de dentro de casa.
Em relação a aceitação da escolha do rei e da rainha conga: O que vocês atribuem essa aceitação?
Eu não sei nem porque (aceitação ou não), isso é uma “Demanda”.(Rei Monklin).
Rainha conga: Pelo que nós ficamos sabendo, pra tirar eu e o Monklin, foram até o rei Manoel ele falou: “foram coroado”, “foram”, então.......... deus levou..e os outros tão aí...então eu não sei porque... diz que nós somos de outra cidade, o que tem haver? Eu sou de igarapé na verdade....
Rei Monklin : ela foi buscada aqui não foi lá se oferecer...
Rainha conga: ... se graças a deus eu sempre to ajudando... de carro ou não levantava 4 horas da manha pra pegar ônibus... 11 horas meia noite pegava o ônibus pra vim pra cá graças a deus .... agora se eu não vou mais
Eu acho assim se eu considero a nossa Sr como nossa rainha
Porque um rei e rainha não pode ser pessoa muito nova?
Rei Monklin :Rei não não pode não.Por causa da responsabilidade, a pessoa nova geralmente vai apanhar responsabilidade,,, então no ato religioso é depois dos 30 anos... e eu sei que isso acontece com todo mundo... a pessoa antes dos 30 anos não tem responsabilidade... não tem .. ai é depois do 30 anos que tem que ter uma religião e agarrar ela com unha e dente... e isso é coisa rara agora.. uma pessoa novo ter uma religião e seguir aquilo ali.. é muito difícil. Antigamente tinha ai.. filha de Maria você não vê isso mais, congregado mariano , você não ver isso mais! Cruzadinha , você não vê isso mais em igreja católica! Catecismo você não vê isso mais é coisa rara.... ai por tanto primeira comunhão: os grupo(escola) antigamente começava ali com seis ou sete ano e mudava o ano dele e já tinha que fazer primeira comunhão dava o catecismo tudo ali... e hj? Você vê isso? Não vê.. só ver besteira dentro de grupo só acabou
Rainha conga: Eu já quis dar catecismo pras crianças mas o padre não deixou. Aliás ele (o padre) não gosta nem de festa nossa aqui.
Rei Monklin : É não gosta não
Neste ano ele queria processar o Monklin por causa da festa.
Rei Monklin : Mas eu fiz assim mesmo.
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Rainha conga: ele queria processar porque falou que só ia ter a Festa lá no Bairro aparecida. Uai nossa sra é mãe de todos pode ter festa no mundo inteiro ( o Padre queria impedir que eles realizassem a tradicional festa da guarda que acontece no dia 12 de Outubro na rua (casa) deles). Rua por rua que quiser fazer
Rei Monklin :Ele queria me processar, então a festa vai sair se quiser processar... até hj o processo não chegou não
Rainha conga: pensando bem ele não gosta de congadeiro de jeito nenhum.
Rei Monklin :Rei ele diz que congado é macumba
Rainha conga: os escravos trazia né remédio natural então eles achavam que tudo isso é magia negar era macumba. Quando fala que congado é macumba que essa macumba vem pra dentro de minha casa. Ano passado nós tivemos aqui 2000 mil pessoa(Festa da Guarda), tomaram café da manhã, o almoço, quem quis jantar esperou quem não quis foi embora (inaudível)... acho que foi só duas guarda que não jantara, aqui nos mais a vizinhança aqui, o pessoal de Igarapé... aqui ficou assim o (sinal de cheio)
Rei Congo: aqui até evangélico veio na festa.
Confecção do Bastão e das Coroas
Por tanto aqui é o seguinte as coroas e os bastão que eu faço aqui já fiz pra várias guardas... eu pensei comprar uma coroa feita de metal igual vê muitas por aí aquilo não é tradição, naquela época não tinha aquele material, tinha era conta de lágrima, papelão.. a tradição é essa.... a tradição lá do início .. cora bastão é tudo é nós que fazemos aqui...
Rainha conga: lá em Timóteo uma coroa grande 50 por 50 grande só que não soube colocar
Qual o material usado na coroa?
Conta de lágrima e arame 16
No bastão é usado madeira, madeira que não seja de espinho, principalmente madeira que seja de arvore”doce” madeira maciça não pode ter miolo,
Porque não pode ser madeira que tem espinho e não pode ter miolo?
Madeira de espinho não trás bondade, ela trás é maldição né...e o miolo e que tem ser furado... par caber a oração. A oração é colocada... o bastão é uma coisa sagrada... é uma coisa sagrada... fura com a maquina ali.. numa profundidade.. coloca a oração é tampado ali com cola por cima...
Bastão da Rainha Conga:
Madeira maciça, isso aqui é ,amoeira pé de amora . ele é preparado lixado, envernizado, três mão de verniz nele ai, ficar bem, Ele é furado aqui em cima furado, colocado a oração, colado com cola.
E tem uma oração específica ou é a mesma oração?
Depende. Qualquer um pode colocar a oração que quiser a nossa aqui é oração de são Jorge... proteção e o oração de nossa sra do Rosário... oração de princesa?? O nosso bastão é de rei tem que ser oração de proteção: de São Jorge.
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E qual a simbologia das Fitas?
Geralmente não pode ter fita preta né! Não pode ter fita preta: a fita branca vem trazer a paz, a fita azul e também trazer a paz.. a amarela também: tudo é fita de paz que nós coloca nele aqui também e a fita vermelha aqui é de proteção... é a de São Jorge, é a fita protetora do bastão, isso aqui nós não explica pra ninguém não viu! ... o Azul é pra trazer a paz também...o azul, branco, amarelo...
Rainha conga: o Azul é de nossa Sra. do Rosário, o amarelo e o verde de N. Sra Aparecida, o branco a paz
Qual material é esse usado na Coroa do Bastão?
Latão. Essa coroa eu compro em São Paulo no santuário nacional, essa coroa não sã feita aqui não.(inaudível).
Rainha conga: quando a demanda tá muito grande (Está se referindo a falta de união e desentendimentos entre os membros da Irmandade) já quebrou duas coroas minha, quando a coisa da guarda lá tá pegando fogo tá pegando em nós...
Rei congo: Tudo vem ne nós e se a gente não souber despachar? Por isso é que uma pessoa nova não pode ser rei congo... não vai saber despachar...
Rainha conga: é por isso que eu to levando minha neta: explicando, conversando
(Transcrição inconclusa).
Entrevistado: Dalmo Martins de Assis
Nasceu em Urucuia/Esmeraldas em 1939. Tem 70 anos
Profissão: Motorista mas Exerce a Função de Babaorixá no Centro Espírita Nossa Sra. do Rosário e é cadastrado pela Federação Mineira de Umbandista. Seu terreiro está localizado na Rua Cascatinha, 14, no Bairro Jardim Petrópolis.
Segundo Sr, Dalmo ele nasceu dentro de uma tradição de congo e só mais tarde é que fundou uma Guarda de Moçambique, por ser quem é responsável pela Coroa. Neto de Africano, foi inicializado na magia ainda adolescente. A construção da Capela foi iniciada pelo pai do Sr Joaquim Nicolau, mas não lembra o seu nome, Ele juntamente com o filho(Joaquim Nicolau) então com 18 anos e mais alguns escravos iniciaram a construção da Capela e Joaquim Nicolau deu prosseguimento.
O pai de Joaquim Nicolau é que foi o responsável por trazer a festa para o centro de Betim e o filho deu continuidade....Olha que eu me lembre conversando com Sr,Joaquim é que foi o pai dele, não lembro o nome dele agora é que trouxe o reino do rosário para Vianópolis e para Betim. Eu pedi licença para formar um moçambique, a gente não chega numa casa sem pedir licença, eu pedi licença, ele fez questão de me contar, me ajudou muito, me disse que mais tarde você meu filho é que vai tomar conta do reino do rosário, então eu falei assim: quem sou eu? Então ele falou que o pai era escravo e estava próximo de acabar a escravidão. Seu Joaquim tinha 18 anos de idade nessa época, e ajudou o pai a construir a Capela, junto com outros escravos. O pai começou e S. Joaquim deu prosseguimento. Hoje muitos falam que foi S. Joaquim, mas S. Joaquim deu prosseguimento o que o pai começou.Ele em explicou e
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mostrou onde está o “segredo” do reino do rosário”, mas é segredo e eu não posso falar, como o reino funciona. Eu formei o reino de moçambique pedi licença para o S. João Belarmino também era o mais velho também e passou o congo para o compadre Raimundinho. Então eu venho vindo nesse trabalho maravilhoso, nessa luta, com muita dificuldade. Mas ao mesmo tempo com muita alegria, comemorando N..Sra. do rosário. Ele (S. Joaquim) me explicou que o reino de N. Sra. do Rosário, São Benedito, Santa Efigênia, Santa Clara e São Domingos, reino do rosário não é só em Betim, mas em outras cidades.
... Aqui com fé em N. Sra. Do Rosário, em Deus eu entrei com 16 anos, mas desde que eu nasci lá em Urucuia (Esmeraldas) que eu já freqüentava o congo. Toda vida eu fui apaixonado pelo moçambique por causa do transporte da coroa, da fé.
Sobre o “reino do rosário” eu fui explicado por outras pessoas, mais velhas, não foi em nenhum livro não. Foi assim N. Sra. do Rosário apareceu no mar por dó e piedade dos filhos, os negros que estavam na escravidão amarrado pela corrente. Ela surgiu e por isso até o terço de conta de lágrimas e eu sei que é verdade e é por isso que tem o terço. Diversos grupos foram buscar os brancos luxuosos. Os granfinos, ela andou um pouquinho e parou, ela não quis seguir, aí foi o “reino do rosário, quando falo congado é reino do rosário. “Congado” é quem mexe “com o gado”, é boiadeiro, então é “reino do rosário”. Então eles conseguiram tirar ela lá do fundo, a santa chegou na beira do mar e começou a dar problema, foi o moçambique, o congo puxou os pretinhos tirou as correntes e colocou as cabacinhas no lugar, nos pés para chocoalhar, venerando ela, para agradar. Hj nós faz de luxo, bonitinho, ele levou essa santa mas ela não ficou lá não. Por que a festa dura três dias? É porque levou ela para a igreja, então começou a briga com o dono dessa coroa o rei Jericó e capitão-mor, por isso é que tem capitão-mor nos grupos, mas hj você pergunta o que é capitão-mor pouca gente sabe.
...Levou a Santa para igrejinha simples porque naquela época não tinha luxo, E cadê a Santa? Ela voltou para o mar, outra vez torna a buscar a Santa, então só no terceiro dia ela ficou. Então perguntaram para ela porque ela não queria ficar e ela explicou que era por causa das brigas, por que cada um tava disputando quem tinha tirado a santa. O reino do rosário sempre tem uma coisinha, foi ai que ela chorou , no terceiro dia ela chorou e nasceu então um ramo de conta de lagrimas, ninguém sabia que ramo era aquele, era par trazer benefício para todos, todas as raças. Ela era a glória e poder...antes não tinha terço, o pessoal rezava com pedrinhas, os mais luxuosos com pedrinhas de cristal e os menos com pedrinhas mesmo...
...E assim surgiu o rosário, todo congadeiro usa um terço no pescoço, mas muitos não sabem o porquê... Então eis aí o mistério do rosário de Maria ... os padres sabem as lagrimas que ela chorou por ver o ser humano amarrado, judiado, apanhando. Hj tá esse reino maravilhoso, não só no Brasil, mas em toda parte do mundo. O que importa mesmo é a fé, é a união.
Função do Capitão-mor: todos os grupos precisa do capitão para comandar o grupo, todo respeito ao capitão... para fazer qualquer apresentação, levantar bandeira. O rei Jericó representa nossos reis, rainhas , princesa, barão, baronesa. Betim tem quase tudo. Os reis mandam mais que qualquer um, que o capitão, que um presidente do grupo, é por que eles tem a raiz, a tradição.
O simbolismo dos objetos/as cores
As cores das roupas tem significado. Os terços também se tem 3 ou 7 terços no pescoço simboliza a graduação quanto mais maior é a graduação. Pode até fazer um teste ele irá explicar, aconselhar onde tá o reino, ele saber rezar o terço. As vestes brancas simboliza a paz, por exemplo quase todo o moçambique é de branco ou branco com azul. O azul é a cor do céu, pode olhar que é a cor do manto de nossa senhora. O turbante representa a África, foi o africano que veio trazendo para o Brasil essa origem, o espiritismo, então precisa de não misturar as coisas: O reino do rosário é um, o espiritismo é um mas ta tudo ligado. Cada um
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significa um ritmo, um objetivo. Na igreja católica por exemplo o congadeiro é autorizado a ir em qualquer religião que ele for convidado: ele não pode deixar de ir e sem cobrar um centavo. Ele pode até não ir com muita gente, pode ir com menos. Pode ir levantar bandeira, rezar um terço. Se tem uma casa assombrada rezar o terço para N. Sra... vão rezar um terço lá, Quer dizer por que não é coisa espiritual? È coisa espiritual sim, só que não há incorporação, pode ser no cemitério... é obrigação nossa como congadeiro ir lá e bater, despedindo de um irmão de uma irmã que faleceu. Esse é o ritual dos congadeiros é saber rezar o terço. Congadeiro que é congadeiro tem que saber rezar o terço... eu rezo bonitinho, eu tanto oro no de 5 como no de 15 mistérios. Nem se ficar dias falando vamos conseguir falar tudo que passa no ritual do congado.
Em relação às crenças religiosidades
...Olha nos tão tendo esse problema no reino do Rosário: primeiro nós temos discriminação que é até crime. Espírita todos nós somos uns pro bem outros pro mal, precisa de falar ficar tudo bem entendido... porque dentro do reino do rosário há pessoas que é evangélica e estava fingindo dentro do nosso reino... temos pessoas que fala que é muito católica e não tem nada de catolicismo, e nos temos maçons...essas pessoas se respeitam o ritual está dentro do nosso coração, mas tem pessoas fazendo covardia dentro do reino do rosário, mas não quer dizer que todo o reino do rosário tem isso... sendo que todos nós somos espírita.
As funções dos reis e rainhas
O rei Congo e a rainha são os maiores, são superiores, inclusive não pode deixar de fazer entrevista com o rei e a rainha. Fui eu que arrumei o rei e a rainha conga...eles são superiores, eles podem acompanhar qualquer um dos grupos...eles tem que saber orar...se um dançante passar mal, eles tem que saber o que é preciso fazer... se é um malefício ou doença marcada por deus... eles são responsáveis por todo o grupo, inclusive pelos grupos de fora...só pode ter um rei e uma rainha conga em cada cidade...precisa ser uma pessoa de bom coração e geralmente para ser rei e rainha tem que Sr acima de 50 anos... se é muito jovem ele tem vaidades e se distrai da obrigação.. isso é coisa muito séria rei e rainha, princesa ... eles guardião a tradição, inclusive os parentes deles (Rei e rainhas congos atuais) foram escravos... Muita gente da irmandade não gostou... e muitos reclamam até hj, mas eles não sabe... O rei e a rainha perpétuos (Vianópolis) são muito bons em oração e muito amorosos... mas para o rei congo não pode...nós temos muita gente aí que nem rezar sabe. O rei e rainha perpétuos foram escolhidos pelo S Joaquim...S Joaquim representava a responsabilidades que era par ficar com eles, então eles são maravilhosos, eu gosto muito deles... se chamar amanhã, amanhã eles estão aqui...eles podem fiscalizar, chamar atenção se tiver alguma coisa errada... nos grupos mostrar o caminho certo... orar para aquele dançante que está desorientado... todos eles acompanham a coroa...
Pé–da coroa
...Quem era o pé da coroa antes de mim era o S. Joaquim Nicolau, durante toda vida ele foi abaixo de deus aqui na terra o dono da “banca”???.... ele me autorizou, tá escrito e depois quem era para ficar responsável pelo pé da coroa era o Israel ...mas tiraram o Israel, sabe como é né... ai depois S. José Teodora, filho caçula do S. Joaquim ficou responsável, aí ele abandonou o pé da coroa, ele adoeceu, bebia muito, abandonou aí passou para o Sr Mário (era para mim que ia passar mas o Sr. Mário tava começando) aí deixei S. Mário... aí seu Mário candidatou para presidente, foi eleito e eu que tava de presidente na época... aí ele ficou de presidente...ficar de presidente e pé da coroa não tinha jeito...aí ele ficou de presidente e pé da coroa, então eu disse o Sr não aquenta não S. Mário. Então quando ele ganhou as eleições para presidente eu pedi então para eu voltar para o meu lugar no pé da coroa.O compadre então formou o moçambique dele e aí eu passei pro meu lugar lá trás... deu uma polêmica
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danada.
Funções desempenhadas dentro das guardas
Os caixeiros são treinados, é dado explicação do que eles tem que fazer...tem a “meia lua” para retirar os maus espíritos a inveja.... a bandeira da guia para aí eles dão a meia lua...se a meia lua é feita por um congo, um congo de responsabilidade como a do compadre Raimundinho, ai nem precisa do moçambique fazer a meia lua não, aí pode passar a “linha deles” que significa caboclo... muita gente não gosta que fala não, mas tem que falar a verdade: congo, Catupé, marujo significa caboclo, caboclo civilizado por que existe caboclo selvagem... caboclo civilizado abrindo caminho...e vem o andor, nós o moçambique não pde fazer a meia lua porque vem trazendo o andor... só ponto em orações, ponto cantado... caixeiro treinado na frente da guia tem que saber o que faz...moçambique é o responsável ...
Euli Ricardo Faria. Data da entrevista: 16/12/09
A guarda surgiu, eu já mexia desde criança, era coisa de família né. Comecei com o Raimundinho. Ai eu achei melhor fundar a minha né, fundei no Divino Espírito Santo, que seria melhor pra nos trabalhar e o David sempre morando aqui com nos e ele achou melhor que nos abrisse, ai nos abriu a guarda de São Judas Tadeu que é o padroeiro aqui do Citrolândia, como conversando com o padre Pedro, então ele achou muito importante a idéia e apoiou muito nos sobre isso. Ajudou também a tirar os meninos da rua né, a maioria dos nossos dançantes eram meninos que usava droga, os adolescentes que ficavam na bagunça, o nosso foco na nossa guarda é esse tipo de pessoa, tirar as crianças da rua, a maioria da nossa guarda já ta quase todo mundo trabalhando, eles voltaram a estudar, tem um grupinho de pagode. a gente incentiva mais esse lado, a guarda nossa é mais pra isso, é um trabalho cultura com os meninos aqui do Citrolândia, só ta faltando um pouquinho de apoio né, mas ao pouquinho ele vem. O apoio aqui no Citrolândia era muito pouco e os adolescentes ficavam sem um lugar de ir. Convidei eles, levando sempre a religião, o que é religião, o que é o santo e eles foram incentivando e eles gostando, a gente sempre viajando, sempre ensaiando e aqui foram gostando, ficando, muitos daí tão chegando e isso é muito gostoso, porque estamos sempre ajudando os adolescentes que tão em problemas com família, drogas na rua. Isso ta ajudando muito eles, pais alcoólatras, a gente foca muito nisso, nossa guarda é mais adolescente, são poucos adultos, ai a gente faz uma troca com eles pra poder incentivar, porque dinheiro, uma cesta básica e coisas assim a gente não tem, minha vontade era de montar um projeto, pelo menos uma cesta para cada um deles por mês, ai o que a gente faz, a gente faz uma viagem, no quem vai no congado direitinho com a gente, ai uma vez por ano, ou duas se der a gente arruma um ônibus e faz uma viagem pra ele passear, ai eles num preocupam com nada, sabe como? a gente vai em Ouro Preto, Mariana, esse tipo de lugar, ai a gente procura fazer um incentivo e eles gostam muito da guarda, é um meio de passear, porque assim eles não ficam só aqui na comunidade, é um meio de conhecer outros lugares, nossa guarda trabalha mais é com isso...a fundação foi 18 de Maio de 2006.
Os Santos de Devoção da Guarda
Tem a Nossa Senhora do Bom Remédio, São Benedito, São Judas e o Pega Mim dos Arcanjos de Deus e aqui no Citrolandia agora a gente ta levantando a do Frei Galvão que o Padre também pediu pra gente fazer bandeira, nos fizemos, quer dizer que nos estamos com 5 bandeiras, cada uma mais gostosa do que a outra. Gosto muito de carregar pra termos a segurança, a gente crê muito que é sempre protegido porque nos vamos em paz, voltamos em paz, a viagem é muito tranqüila, não é cansada e eles adoram isso.
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Quantos integrantes hoje?
Hoje temos 50 integrantes e estamos tirando crianças abaixo de 5 anos e a gente tem uma princesa, Janaina Alves de Faria que é fora dos dançantes que vai com a gente.
Como foi o processo de formação da Guarda?
(Adriana) O processo de fundar guarda é igual quando a “mãe” fundou, porque na verdade a guarda do ... que anda com o Seu Raimundo do moçambique era da mãe, ela foi fundadora dessa guarda, mas como tava muito conflito, a gente abriu mão dela e resolvemos abrir a nossa aqui. Ai como aqui no Citrolândia tava muito abandonado, todo mundo acha que no Citrolândia só era hanseníase ou era bandido, ai a gente começou a puxar a cultura pra cá, ai foi um meio que a gente achou, já que a mãe mexia desde criança mexia, ai em um mês a gente fazia cultura e começava a trabalhar aqui, porque aqui dentro do nosso bairro a gente sofre preconceito, com o Osvander que apoiou alguém, a gente sempre tomava opinião de alguém, não fazia as coisas da minha cabeça, o Alex Amaral também ajudou bastante.
a gente sempre promove quadrilha pra levantar verba, a gente ta sempre organizando alguma coisa pra não só depender da Funarbe, ai a gente trabalha nesse sentido.
E a Guarda de São Judas Tadeu, como foi o processo de fundação?
A fundação que a gente fala é que a gente organiza, junta o pessoal pra poder ... as mães falam, “meu filho ta na rua, quem sabe podendo dançar com a senhora”, são coisas assim, eles vem, eu vou, são coisas assim, as vezes um dançante some, eu gosto muito de ir ver o que ta acontecendo, então eu acho que é um modo deu tratar eles e é assim que eu vou mexendo com o povo. Pra alguns é bem visto, pra outros é mal visto, mas pra aqueles que aceitam é muito gostoso, desde já eu busco muito apoio, busco muito aquisição, ajuda, eu vou ajudando e ele vão me ajudando. Vou na igreja, converso com o Padre, é mãe de todo mundo. Estamos trabalhando com um grupo de jovens que estão mexendo com pagode, então procuramos apoio dos vereadores, então vai incentivando os jovens, procurando apoio para os jovens. Porque o jovem hoje em dia tá muito discriminado, ta parando de estudar, não ta tendo projeto e não ta tendo apoio nenhum do Citrolândia e nem nada então é onde ta tendo apoio, ta tendo cultura, onde ta procurando o jovem a ser apoiado, é porque eu sou muito faladeira e são os jovens, ontem mesmo teve um, ai ele brincando, tudo na brincadeira: “ah, mas eu cheiro e tal” e então eu vou conversando, o que isso te da, porque fez coisa dessa pra você crescer, aparecer e o que a droga te dá? Ai ele pensou: “ah”, quanto você gasta de droga? Sou muito comunicativa nesse lado, então ele me falou quanto que ele ganhava por mês, ai então perguntei quanto você ganha e quanto você gasta de droga por mês? E quais são seus sonhos? Ai ele: “ah, uma casa e uma moto”, pois é, muito bem, você pode ter, basta o homem crer e acreditar. Pela conta que eu fiz, você ganha R$600 e gasta R$300 com droga, então você pode guardar esses R$300 e pagar a prestação da moto ou os materiais pra casa, ai ele pensou, pensou, então ta bom, vou te dar 7 dias, os 7 dias se você ficar sem a droga, eu vou te ajudar e ai ontem ele chegou, almoçou: “Mãinha, fiquei 7 dias sem cheirar, sem mexer com a maconha” tem coração e isso é importante, “é mas você conseguiu”, “eu não amor, você que conseguiu, eu só abri a janela, eu te mostrei aonde você está perdendo, a droga te faz você perder ou morrer por ela”. Então a gente vai pondo as pontinhas e eles vão pra casa, medita, e muito é o que estão largando a droga assim. “mas eu fico entediado, nervoso”. Mas o que eu posso fazer por você, eu mexo com a Guarda, igual São Judas Tadeu, ele é defensor das causas urgentes, ele ajuda, porque ele também foi muito acusado, então quem sabe pedindo pra ele, trabalhando pra ele, ele não vai ajudar vocês? E é assim tenho conseguido muito e eu tenho muito orgulho do meu trabalho. Eu vou mostrando eles a verdade da vida e eles vão conscientizando de que aquilo que eles fazem dá errado. Muitos já deixou de matar, muitos já são pais de família, isso é um trabalho muito gratificante. Isso pra mim é muito maior do que briguinha de guardas, aquelas coisas miudinhas, eu sou podre, eu nunca estudei, eu nunca
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fui na escola, eu fui criada na roça, esses dias eu tava contando pra eles mesmo, que a gente montava no cavalo pra ir na folia, nos tinha a guarda de Santa Barbara, era batida na espada. Essa era de Mutum, meu pai mexia com ela lá em Mutum, então eu era uma das rainhas, a rainha de frente, aquilo pra mim ... e eu contando pra eles e eles acha interessantes, “Mainha, mas e as roupas, aonde vocês arrumam essas coisinhas”, sabe meu filho, eu gosto muito de olhar pra cor dos santos, igual o São Benedito, eu gosto de olhar o cor dele, então nos vai muito pelo cor dos santos, igual Nossa Senhora dos Remédios, que e verde, vermelho e amarela e branca, então eu gosto de ir jogando aqueles cor na guarda, “nossa mãe, que interessante” e é, porque nos estamos trabalhando com a cor dos santos, porque cada santa tem uma túnica, uma coroa e eu trabalho muito em cima disso e eles acha muito interessante né. “mas não sabia que santo tinha cor”, mas tem, a cor das roupas, da túnica, da bandeira. Eu jogo muito a cor da bandeira no santo, a fita é 7 cor, porque eu guardo a conta de Deus, porque Deus fez o mundo em 6 dias e no sétimo ele descansou, então sou muito espiritualista, eu olho muito o dia dos santos e isso me ajuda muito. Já criei 18 filhos dos outros que as mãe abandonava, por ultimo agora to com 3 aqui que os pais morreram e ele não tinham pra onde ir, minha casa é sempre muito cheia, são pessoas que a gente não conhece, mas não tem coragem de dar, então eu acho meu trabalho muito gratificante não tem preço discutindo com outras pessoas perto do que vou ganhar com a guarda. Igual eu ensino, não dança pro povo, dança pro santo, quanto mais divino vocês dança, mais graças divina vocês recebe. Ai dança bonitinho, sai bonitinho, e eu acredito na força interior, então é eu gosto muito disso. Então a gente na verdade sempre tão chamando pra apoiar alguém de fora, um aniversario, as vezes o David paga a van com o próprio dinheiro pra num ficar incomodado, eu sou muito tímida e se alguém me chamar atenção eu vou me sentir muito mal. A vezes nos consegue ônibus. E eu num gosto de ficar muito chamando atenção, fui até numa reunião uma vez ate sobre os marcos da igreja e eles querendo comprar bambu pra por e eu falei assim que não gente, não precisa disso, porque Deus deu nos o melhor e deixa que os mastros eu dó. Foi logo quando eu entrei, fui no deposito, encomendei os mastros.
A guarda da senhora faz alguma festa?
Ainda não festeja por falta de apoio, porque o povo do Citrolândia ainda ta meio cru na base e pra pedir ajuda é meio chato, é como o grau que eu to falando, pra mim ficar lá na Funarbe, “ah eu quero fazer a festa”, “porque esse ano já é a festa”, não, eu espero o momento certo, eu espero ano q vem, eu to conversando com eles, com o santo, eu quero fazer, mas só se for da vontade dele, eu to querendo fazer dia 28 de Outubro que é a festa dele, ai o Padre já jogou o Frei Galvão que ai a festa via levantar junto, o Padre vai apoiar nos também e isso é muito bom, Deus abençoando que se o restaurante de RS 1 tiver ai, conversar com a Maria do Carmo, que ela vai apoiar nos, porque o povo La fora gosta muito de mim, eles falam sempre, “mãe, você num faz festa não” eles sempre ligam pra nos, trazer de 2 a 3 guardas de fora, mas de Betim não, eu penso em chama pessoas que nos apoiou lá fora, e o que eu queria era um apoio moral, infelizmente aqui em Betim não tem isso.
A guarda sempre recebe convite, você pode informa onde vocês participaram esse ano?
Nos participamos de Nova Cintra, Pará de Minas, teve 3 que cancelaram as festas devido a gripe suína e o restante foi falta de ônibus. A festa de Betim mesmo em Agosto a gente participa
Vocês tem algum ritual na hora que vocês saem?
Com certeza absoluta
Podem descrever?
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A gente pega o café em casa, a gente serve o café pros nossos dançantes, reúne todo mundo na sala pra fazer a prece, passa o conselho do que deve fazer, do que não deve, não bebe, na nossa guarda a gente não aceita beber, você nunca vai ver isso, na hora da dança a gente não aceita e a gente conversa o que pode e o que não pode ser feito, fazemos a prece em hebraica, porque é a língua morta dos anjos e os inimigos não pode entender essa linguagem então é mais pratico pra nos, e depois da oração em hebraica nos fazemos Pai Nosso e Ave Maria.
Entrevistada: Maria Lady Laranjeira Melo Data Nascimento: 21/02/43 66 anos
Natural de Pilão Arcado/Bahia mais foi criada em Juazeiro na Bahia. Está na cidade de Betim desde 1958.
Como foi sua trajetória na Irmandade?
Nos viemos da Bahia pro Rio, nos morávamos no Rio, meu pai era topógrafo, então ele veio pra Betim fazer a topografia da Fernão Dias com o DNER e ai eles ficaram aqui e eu fiquei no Rio estudando, trabalhava numa fabrica e estudava. Ai quando meu pai adoeceu me buscou, porque ele ia operar e queria os filhos tudo juntos, ai vim e aqui logo depois que eu cheguei, durou pouco e morreu e eu casei e fiquei e os outros voltaram pro Rio e ai eu casei, mas eu já acompanhava o congado, eu era solteira e já acompanhava eles. Ai deu uma parada, muito tempo ficou parado, parava e voltava, ai Seu Joaquim Nicolau mudou pra Bicas e eu sempre arrumava o andor e ai ele buscava o andor aqui na casa da Dona do Zé chofer, ai agente arrumava e ele levava pra Bicas, ai ele voltou pra cá e continuou a festa aqui, mas ele saia de lá, ele arrumava e agente buscava, só que nos tínhamos uma rainha conga que vinha ajudar a fazer a festa, tinha Dona Elvira ou Olivia, confundo esses dois nomes, e tinha rainha de promessas que era Dona Maria, chamava ela de Maria Preta, tinha Dona Efigênia que era rainha, tudo do tempo do Seu Joaquim Nicolau, vinha madrinha Ana que era rainha perpetua, que essas 3 rainhas faziam a festa. Ai eles voltaram a para, ai apareceu um Frei, Frei Cristovão ai, e o Frei Cristovão convidou Israel pra levantar de novo o congado, ai Israel juntou com a Edilca, Dona Lurdes, Zé Cheiroso, ai voltou com o congado e eu só ajudava por fora, porque eu tinha, tava criando naquele tempo, era muito menino e eu só ajudava por fora, ai a festa tomou pé, foi ficando, eram duas guardas só, uma guarda de congo do seu João Belarmino que hoje é do Raimundinho e uma guarda de Moçambique que era de Seu Joaquim Nicolau, que o filho dele tomou a frente e morreu também, depois Seu ... fez uma também que era ... dele e assim, ai pouco ano depois entrou mais uma guarda de Dona Geraldo, que era de São Benedito que era a guarda da filha de Seu Joaquim Nicolau. A Guarda dela era de Congo.
....O marido era o formigão, todo mundo fala Formigão,ai ela foi ficando ruim, ficando muito doente, debilitada de ficar andando, passou pro Tião Medonho, ai apareceu o Tião e ela passou a guarda dela pra ele. Ai foi ate depois quando ela morreu o povo não quis mais dançar, ai ele montou a dele lá no João Bosco junto com o povo de lá, tinha um padre q eu dançava na guarda que ajudava eles, e ai ele morreu e foi acabando com a guarda, de repente Dona Zélia, montou, agente deu muito conselho pra ela vim com a guarda pra não deixar morrer né, ai Dona Zélia veio com o guarda. Porque hoje é do São João Bosco, ainda continua do São João Bosco.
Nessa época do Joaquim Nicolau, você acompanhava de que forma?
Eu acompanha, só acompanhava, ajudava no que pudesse, eu tinha criança pequena, eu tinha 8 meninos pequenos.
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E porque a senhora se interessava?
Porque eu gosto, eu gosto muito mesmo.
Tem relação com sua infância
Não, porque eu gosto mesmo, é amor mesmo
Qual era a função do Sr. Joaquim Nicolau?
Ele era capitão regente, ele era capitão, ele que fazia a festa em Betim... era, ele era responsável por tudo, inclusive perto da festa, teve um ano que a igrejinha tava muito feia, ele mesmo pintou de cor-de-rosa. (novidade)... tem muitos anos, eu não lembro, pior é isso. Ele colocou a escadinha e pintou toda ela de cor-de-rosa e fez um banheirinho lá no canto de madeira porque ele achava um absurdo não ter banheiro ali pro povo e fez num cantinho, até hoje tem um buraco que tem um bocado de terra, ali era um banheiro daqueles de buraco, sabe?
E sobre a festa e sobre a construção da capela quem a senhora atribui, iniciou com o Joaquim Nicolau ou deu continuidade de algum parente dele?
O Zé Teodoro continuou quando ele faleceu, ai eu já entrei ajudando, já pedi auxilio pra Funarbe que na época era a Dona Neiva, eu já acompanhava, mas vendo as dificuldades dele eu conversei com a Dona Neiva, aí o Zulu deu muita força porque tava lá
O que o Zulu era na época?
Zulu trabalhava na Funarbe, ai ela aceitou ajudar e eles queriam me colocar como presidente, eu não queria responsabilidade assim, direto, então Zulu era o presidente e eu a vice.(...) da irmandade, eles arrumaram advogado, Dr. Valter, fizeram a irmandade, mas antes o Israel já tinha, quando levantou com o Frei Capeta que eles falaram, Frei Cristovão que eles chamam de Frei Capeta, ele foram no cartório e registraram, ele ate hoje é o capitão-mor, ele era o capitão-mor daquela época, no tempo do Seu Joaquim, o Israel, ele já era o capitão-mor.
E hoje quem é o capitão-mor?
É ele (Israel), continua sendo, só quando morre é que muda, igual regente, o dia que eu morrer tem que arrumar outro. Ai é que foram criando as guardas, Dona Neném era dançante do Seu Joaquim Nicolau, então ela montou Moçambique do Bemge, depois Se Dalmo, veio antes da Dona Neném, ai ficou Seu Dalmo, o povo do Seu Joaquim que tomou conta que foi o Gê, ficou ele, o Raimundinho com a guarda do outro e veio as filhas do seu Joaquim e seu Dalmo, ai ficou 4 guardas.
Em que época foi isso?
Na época do Oswaldo Franco, foi a Neiva lá.
Na época do surgimento desses guardas, já era época do Oswaldo franco?
É, ai surgiu, agora, depois foi montando as outra, foi do Carlaile pra cá, Seu Mario teve uma confusão na Guarda do Seu Raimundo, outro morreu, ai Seu Mario continuo com uma turma de Moçambique, é a briga do ...
Porque, o que aconteceu?
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Porque ele quer dizer que a guarda dele é antiga e nunca foi, antiga é a de Seu Joaquim, tem uns dançantes dele lá, mas nunca foi, quem assumiu foi o Zé (Teodoro) , quando o Zé morreu o Seu Mario continuou.
E a guarda do Seu João Berlamino não é da mesma época que a do S. Joaquim?
È, ela era junto, era ele que puxava Seu Joaquim Nicolau, o Berlamino puxava o Joaquim porque o Moçambique só sai quando não tem jeito, mas sempre tem que ter um congo pra puxar.
E porque sempre tem que ter um congo?
Olha, é porque agente falava que é um limpa trilha dele, o Moçambique é encarregado da coroa, vai mais devagar, o congo não, o congo dança, vai e volta, é mais devagar....Carrega os andores e as coroas, as rainhas, são velhos, não são velhos, mas por respeito que eles têm né.
Em relação aos Reis e as Rainhas dentro do reinado do Rosário, me explica a função de cada um deles. Capitão-mor, qual a função dele? de qualquer guarda, é superior Esse ai, eu sou responsável pela guardas também sabe? Posso chamar atenção, ajudar no que precisar, correr atrás sabe?
Além disso, o que mais tem nas guardas?
Tem o pé-da-cora, que é o Seu Dalmo, tem o capitão da guia, Seu Raimundinho
As guardas tem limite de capitães?
Não, não tem limite não, hoje em dia tem 4, 5 capitães nas guardas, porque na falta de um não poder sair, o outro sai, sabe? Tem q ter mesmo, na hora de sair, o outro sai igual seu Joaquim tinha, e tem guarda bandeira, que eles saem com duas espadas atrás, eles guardam tudo, ai se vem um carro, é igual policia sabe? Tem outro nomezinho, mas eu falo guarda bandeira
Depois, quais outras funções têm dentro de uma guarda?
Dentro de uma guarda? Capitão, guarda bandeira, bandeireira tínhamos uma da guia, essa ai que puxava a festa, ela morreu e a bandeira tá na casa dela, era a Dona Dina.
E depois que ela faleceu não colocaram outra rainha da guia?
Não colocaram outra,a função era levar a bandeira da guia, ela gosta de sair sempre junto com o Moçambique ou na frente das rainhas, ela era muito sistemática, tem um depoimento dela no museu antes de morrer.
Os reis congos mandam na festa, manda, é obrigado a todos os dançantes a obedecerem eles.
Depois dos reis congos, quem mais?
A Rainha perpetua
Quem são as rainhas perpétuas atualmente?
A Zilda (Vianópolis), Dona Maria, Izaura e a Cleide, e Cleuza é princesa e a neta da dona Maria, Anita é rainha, Dona Matilde é rainha, tem as velhinhas do PTB Maria de Conceição e
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Dona Maria. Tem a dona Elvira do PTB que tá muito doente
Quais as funções dos reis e das rainhas nas festas?
Antigamente eles ajudavam até na comida, hoje não, antigamente eles convidavam na festa, mas hoje num tem rei e nem rainha do ano porque a Funarbe passou a ajudar, e sempre o rei do ano, o Zé Cheiroso nem queria ser por causa de arruma isso tudo.
E os reis?
Eu lembro do, Seu Antônio que é rei, tem o Silvio, Seu Sebastião, que eu lembro só esses 3, mas tinha demais.
E quando um rei morre, como é o processo pra escolha de um novo?
No caso do rei congo é obrigado a arrumar, e é o povo da irmandade que arruma entre eles, fazendo acordo.