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 61 CORDENAÇÃO PROF . JOÃO ABRANT ES DOSSIER TÉCNICO O Treino Intervalado e a Corrida de Velocidade O Treino Intervalado é um método de treino normalmente relacionado com o desenvolvimento da resistência e com os corredores de meio-fundo e fundo. Contudo, é também possível utilizar este método de treino para o desen- volvimento da velocidade, desde que se façam as adaptações necessárias para que a utilização do método não prejudique os principais objectivos que devem estar sempre presentes no treino da velocidade: - INTENSIDADE MÁXIMA. - GRANDE QUALIDADE DA TÉCNICA DE CORRIDA. Vamos apresentar um estudo muito interessante sobre a utilização do treino intervalado nas corridas de velocidade. Contudo, antes de apresentarmos esse estudo vamos deixar um texto com as principais características das provas de velocidade e da técnica da corrida de velocidade. A CORRIDA DE VELOCIDADE Formas de Manifestação da Velocidade No âmbito do treino desportivo há diversas formas de manifestação da velocidade: Tempo de Reacção (reacção simples e reacção complexa); Capacidade de Aceleração; Velocidade Máxima; Velocidade Resistente; e Velocidade de Execução – acíclica. Se observarmos o comportamento da velocidade ao longo de uma corrida de 100 metros planos, é possível observar os diferentes tipos de manifes- tação da velocidade. MODELO: CORRIDA DE 100 METROS PLANOS (SCHMOLINSKY, 2000) Da análise deste gráfico de Schmolinsky, podemos tirar as seguintes con- clusões: - O Tempo de Reacção Simples é a resposta dos atletas ao tiro de partida. - A Capacidade de Aceleração varia conforme o nível dos atletas (os me- lhores atletas prolongam durante mais tempo a sua aceleração). A fase de aceleração começa após a partida de blocos e termina quando os atletas atingem a sua velocidade máxima. - A Velocidade Máxima é atingida entre os 30 e os 55 metros (quanto me- lhor é o atleta mais tarde atinge a sua velocidade máxima). A fase de velocidade máxima termina quando a acumulação de fadiga começa a fazer efeito impedindo os atletas de manterem uma intensidade máxima de corrida. - A Velocidade Resistente não é uma característica muito importante nos corredores de 100 metros, devido à curta duração da prova, contudo a partir dos 60 - 90 metros é possível verificar-se uma perda de velocidade devido à acumulação da fadiga (quanto melhor é o atleta mais tarde atinge a fase da velocidade resistente). - A  Velocidade de Execução está presente na saída dos blocos – movi- mento acíclico. TEMPO DE REACÇÃO Esta capacidade depende essencialmente de factores hereditários, havendo uma grande variabilidade de resposta entre os diferentes atletas. Apesar de ser treinável, os efeitos do treino manifestam-se essencialmente na estabili- dade da resposta. Tempo de Reacção Simples: É a capacidade do sistema neuromuscular reagir no menor tempo possível a um estímulo previamente conhecido e pre- visível (por exemplo a resposta ao tiro de partida), através de uma sequên- cia gestual pré-determinada. Tempo de Reacção Complexo: É a capacidade de um atleta responder com rapidez e eficácia a um estímulo que não é previamente determinado e que pode ter uma grande variabilidade (por exemplo as acções de um adversário em desportos de combate), através de uma resposta adequada a cada tipo de estímulo. CAPACID ADE DE ACELERAÇÃO É a capacidade de passar de uma situação de repouso (onde o atleta está parado, como nas provas de velocidade do atletismo ou da natação) ou em que se desloca a uma velocidade muito baixa (como em algumas situações nos desportos colectivos) até a um deslocamento à velocidade máxima no menor espaço de tempo possível, pois a aceleração é definida como a varia ção da velocidade por unidade de tempo.  VELOCIDA DE MÁXIMA CÍCLICA - CORRIDA Capacidade do sistema neuromuscular percorrer o maior espaço possível numa corrida de velocidade (movimentos cíclicos) no menor período de tempo possível, ou seja, à velocidade máxima. Depende, para além de ou- tros factores da capacidade de aceleração.  VELOCIDA DE RESISTENTE É a capacidade de continuar a realizar uma determinada tarefa motora em esforços de grande intensidade e de curta duração suportando a acumu- lação crescente da fadiga. Há duas situações diferentes em que se pode manifestar a velocidade resistente: - Quando um movimento cíclico se repete continuamente a uma intensi- dade elevada durante um determinado tempo (15 a 60 segundos), provo- cando uma acumulação crescente da fadiga, como por exemplo em cer- tas provas de atletismo e de natação. - Quando um movim ento cí clic o se repete vár ias vezes durante um cu rto período de tempo (menos de 15 segundos), com intervalos que não per- mitem uma recuperação completa. Apesar de cada repetição não ser sufi- cientemente longa para provocar elevados níveis de fadiga, a repetição desses esforços de grande intensidade vão provocar uma acumulação crescente da fadiga. Como por exemplo nos saltos do atletismo (várias tentativas) e, principalmente, nos desportos colectivos.

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CORDENAÇÃO PROF. JOÃO ABRANTES DOSSIER TÉCNICO

O Treino Intervalado ea Corrida de VelocidadeO Treino Intervalado é um método de treino normalmente relacionado com odesenvolvimento da resistência e com os corredores de meio-fundo e fundo.Contudo, é também possível utilizar este método de treino para o desen-volvimento da velocidade, desde que se façam as adaptações necessáriaspara que a utilização do método não prejudique os principais objectivos que

devem estar sempre presentes no treino da velocidade:- INTENSIDADE MÁXIMA.- GRANDE QUALIDADE DA TÉCNICA DE CORRIDA.Vamos apresentar um estudo muito interessante sobre a utilização do treinointervalado nas corridas de velocidade. Contudo, antes de apresentarmosesse estudo vamos deixar um texto com as principais características dasprovas de velocidade e da técnica da corrida de velocidade.

A CORRIDA DE VELOCIDADE

Formas de Manifestação da VelocidadeNo âmbito do treino desportivo há diversas formas de manifestação davelocidade: Tempo de Reacção (reacção simples e reacção complexa);Capacidade de Aceleração; Velocidade Máxima; Velocidade Resistente; eVelocidade de Execução – acíclica.

Se observarmos o comportamento da velocidade ao longo de uma corridade 100 metros planos, é possível observar os diferentes tipos de manifes-tação da velocidade.

MODELO: CORRIDA DE 100 METROS PLANOS (SCHMOLINSKY, 2000)

Da análise deste gráfico de Schmolinsky, podemos tirar as seguintes con-clusões:- O Tempo de Reacção Simples é a resposta dos atletas ao tiro de partida.- A Capacidade de Aceleração varia conforme o nível dos atletas (os me-

lhores atletas prolongam durante mais tempo a sua aceleração). A fase deaceleração começa após a partida de blocos e termina quando os atletasatingem a sua velocidade máxima.

- A Velocidade Máxima é atingida entre os 30 e os 55 metros (quanto me-lhor é o atleta mais tarde atinge a sua velocidade máxima). A fase develocidade máxima termina quando a acumulação de fadiga começa afazer efeito impedindo os atletas de manterem uma intensidade máximade corrida.

- A Velocidade Resistente não é uma característica muito importante noscorredores de 100 metros, devido à curta duração da prova, contudo a

partir dos 60 - 90 metros é possível verificar-se uma perda de velocidade

devido à acumulação da fadiga (quanto melhor é o atleta mais tardeatinge a fase da velocidade resistente).

- A  Velocidade de Execução está presente na saída dos blocos – movi-mento acíclico.

TEMPO DE REACÇÃOEsta capacidade depende essencialmente de factores hereditários, havendouma grande variabilidade de resposta entre os diferentes atletas. Apesar deser treinável, os efeitos do treino manifestam-se essencialmente na estabili-dade da resposta.Tempo de Reacção Simples: É a capacidade do sistema neuromuscularreagir no menor tempo possível a um estímulo previamente conhecido e pre-visível (por exemplo a resposta ao tiro de partida), através de uma sequên-cia gestual pré-determinada.Tempo de Reacção Complexo: É a capacidade de um atleta respondercom rapidez e eficácia a um estímulo que não é previamente determinado eque pode ter uma grande variabilidade (por exemplo as acções de umadversário em desportos de combate), através de uma resposta adequadaa cada tipo de estímulo.

CAPACIDADE DE ACELERAÇÃOÉ a capacidade de passar de uma situação de repouso (onde o atleta estáparado, como nas provas de velocidade do atletismo ou da natação) ou emque se desloca a uma velocidade muito baixa (como em algumas situaçõesnos desportos colectivos) até a um deslocamento à velocidade máxima nomenor espaço de tempo possível, pois a aceleração é definida como a variação da velocidade por unidade de tempo.

 VELOCIDADE MÁXIMA CÍCLICA - CORRIDACapacidade do sistema neuromuscular percorrer o maior espaço possívelnuma corrida de velocidade (movimentos cíclicos) no menor período detempo possível, ou seja, à velocidade máxima. Depende, para além de ou-tros factores da capacidade de aceleração.

 VELOCIDADE RESISTENTE

É a capacidade de continuar a realizar uma determinada tarefa motora emesforços de grande intensidade e de curta duração suportando a acumu-lação crescente da fadiga.Há duas situações diferentes em que se pode manifestar a velocidaderesistente:- Quando um movimento cíclico se repete continuamente a uma intensi-

dade elevada durante um determinado tempo (15 a 60 segundos), provo-cando uma acumulação crescente da fadiga, como por exemplo em cer-tas provas de atletismo e de natação.

- Quando um movimento cíclico se repete várias vezes durante um curtoperíodo de tempo (menos de 15 segundos), com intervalos que não per-mitem uma recuperação completa. Apesar de cada repetição não ser sufi-cientemente longa para provocar elevados níveis de fadiga, a repetiçãodesses esforços de grande intensidade vão provocar uma acumulaçãocrescente da fadiga. Como por exemplo nos saltos do atletismo (várias

tentativas) e, principalmente, nos desportos colectivos.

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DOSSIER TÉCNICO CORDENAÇÃO PROF. JOÃO ABRANTES

FACTORES CONDICIONANTES DA VELOCIDADE

Factores Gerais Condicionantes da VelocidadeFACTORES NERVOSOS:- Aumento da velocidade do ciclo muscular de alongamento-encurtamento

(CMAE) e boa capacidade de utilização da energia elástica.- Capacidade de recrutamento de um elevado número de fibras muscu-

lares.- Boa capacidade de alongamento e relaxação musculares e elevado ritmo

de alternância da contracção e descontracção musculares – elevada fre-quência do ciclo estimulação-inibição dos motoneurónios.

- Elevada frequência de activação das Unidades Motoras.FACTORES MUSCULARES:- Volume da massa muscular – máxima secção transversa.- Tipo e percentagem das fibras musculares – elevada percentagem de

fibras IIa e IIb.- Número de sarcómeros activos em série.

FACTORES PSICOLÓGICOS:- Mobilização da vontade.- Capacidade de concentração e de focalização da atenção.

A Frequência e a Amplitude da Passada de CorridaFREQUÊNCIA: Número de ciclos de passada por unidade de tempo. Écondicionada por:- Factores Hereditários: velocidade de transmissão do impulso neuromus-

cular.- Factores Técnicos: na fase da recuperação da perna durante o ciclo da

passada.- Factores Condicionais: níveis de força rápida, de coordenação e de flexi-

bilidade.AMPLITUDE: Comprimento de cada passada. A amplitude é condicionada

por:

- Factores antropométricos: altura dos membros inferiores- Factores Técnicos: extensão completa da perna na fase de impulsão dapassada.

- Factores Condicionais: níveis de força reactiva (CMAE).

FREQUÊNCIA DA PASSADA AMPLITUDE DA PASSADA

 A análise destes dois gráficos de Schmolinsky permite-nos tirar as seguintesconclusões:

- A frequência da passada aumenta rapidamente nos primeiros metros edepois baixa progressivamente ao longo da corrida, havendo uma quebramais abrupta no final.

- A amplitude aumenta até aos 30-55m, estabilizando no final da fase deaceleração.

- A fase inicial da aceleração deve-se ao aumento da frequência e da ampli-tude e a fase final apenas ao aumento da amplitude.

- Na velocidade máxima há umas estabilização dos valores da frequência eamplitude.

- Na fase final da corrida a perda da velocidade deve-se à acumulação dafadiga, havendo um ligeiro aumento da amplitude e uma quebra acentua-da da frequência.

Capacidades Físicas Condicionantes da VelocidadeFLEXIBILIDADE: Influencia a velocidade pois uma boa flexibilidade permite

uma maior amplitude da passada de corrida, assim como uma melhor faci-

lidade e economia dos movimentos. Além disso, é também fundamental naprevenção de lesões.RESISTÊNCIA: Influencia o tempo de duração da velocidade máxima e prin-cipalmente a fase da velocidade resistente, assim como a manutenção deuma boa técnica de corrida durante as fases de maior acumulação de fadiga.FORÇA: É a capacidade física com maior influência na velocidade, poden-do até definir-se a velocidade como uma manifestação de força rápida (fre-quentemente explosiva) aplicada a uma tarefa específica.

RELAÇÃO ENTRE A VELOCIDADE E A FORÇA RÁPIDA

Este quadro mostra-nos a enorme influência da força explosiva em movi-mentos inferiores a 200ms que é mais ou menos o tempo de duração doapoio do pé no solo durante uma passada de corrida.

FACTORES ENERGÉTICOS CONDICIONANTES DA VELOCIDADE

FONTE ANAERÓBIA ALÁCTICA: É a principal fonte energética para a corri-da de velocidade, pois é utilizada em esforços de elevada intensidade e curtaduração (até 10 segundos). Esta fonte energética corresponde aos mecanis-mos directos para a ressíntese do ATP, molécula utilizada pelo músculo paraprodução directa de energia na libertação de uma molécula de fosfato. As con-centrações de ATP dentro do músculo são escassas (cerca de 4 mml/Kg demúsculo). Quando há trabalho mecânico, o ATP dentro do músculo baixa e o ADP sobe e as outras fontes energéticas começam a ser utilizadas. Além do ATP as células têm outra molécula de fosfato altamente energéticaque armazena energia, a fosfocreatina (PC). A diferença para o ATP é que aenergia libertada pela decomposição do PC não se usa directamente pararealizar trabalho celular, mas sim para ressintetizar o ATP no músculo, quepor sua vez vai ser utilizado. A creatina fosfato tem 16 a 20 mml/Kg de mús-culo, o que aumenta o tempo de utilização do ATP para cerca de 6 a 7segundos em indivíduos pouco treinados e para 8 a 9 segundos em atletastreinados, ou seja, este tempo de utilização que se deve à creatina fosfatovaria em função do treino ao contrário do que sucede com o ATP.

Capacidade Anaeróbia Aláctica: Corresponde ao “depósito de gasolina” destafonte, ou seja, depende da quantidade de creatina fosfato que existe dentro domúsculo. Pode-se dizer que o facto de ser ter uma maior quantidade de crea-tina no músculo significa ter uma melhor capacidade anaeróbia aláctica.POTÊNCIA ANAERÓBIA LÁCTICA: Depende da velocidade com que épossível produzir energia por esta reacção, ou seja, da velocidade daprópria reacção e esta, depende da velocidade dos enzimas que catalizama reacção.Fonte Anaeróbia Láctica: É a fonte energética mais utilizada em esforçosde grande intensidade, mas com duração suficiente para que haja acumu-lação de ácido láctico.Potência Anaeróbia Láctica:  A velocidade a que se produz energia nestafonte é mais baixa que na fonte anaeróbia aláctica porque este processo tem12 reacções enzimáticas que estão encadeadas. A velocidade global detodo este processo depende da reacção enzimática mais lenta (fosforafru-

toquinase).

Força até 200ms

Força Máxima

Indivíduo não treinado

Treino de Força ResistenteTreino de Força Explosiva

100ms 200ms 300ms 400ms 500ms Tempo (ms)

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Capacidade Anaeróbia Láctica: não depende da reserva de glucose massim da tolerância ao ácido láctico, pois o movimento é interrompido pelaacumulação do ácido láctico antes de se esgotarem as reservas de glucose. Apesar de ser fácil medir as concentrações de ácido láctico no sangue issonão diz nada a respeito do ácido láctico que foi produzido, pelo que é difícilmedir de forma directa a capacidade láctica.

A Técnica da Corrida de Velocidade

Cada passada de corrida (ciclo da passada) é composto por duas fases

diferentes:- Fase de Apoio: esta fase pode dividir-se na fase de apoio à frente (desdeque o pé toca no solo até passar na vertical do CG) e na fase de impul-são (desde que o pé passa na vertical do CG até deixar o solo). O seuprincipal objectivo é minimizar a desaceleração durante o contacto com osolo e maximizar a fase de impulsão.

- Fase de Voo: esta fase pode dividir-se na fase de recuperação (desdeque o pé perde o contacto com o solo até passar na vertical do CG) e nafase de balanço (desde que o pé passa na vertical do CG até voltar a tocarno solo). O seu principal objectivo é maximizar o trabalho da perna deimpulsão e preparar o atleta para o apoio seguinte.

FASE DE APOIO A fase de apoio é determinante na corrida de velocidade, pois só durante ocontacto do pé com o solo é possível produzir aceleração. Os principais

aspectos técnicos a ter em conta durante esta fase, estão relacionados comas características do CMAE (ciclo muscular de alongamento encurtamento)e com a força reactiva, que é a capacidade física que mais influencia estafase da passada de corrida.Ciclo Muscular de Alongamento Encurtamento A grande maioria dos gestos desportivos, como é o caso da corrida, envolvea realização de CMAE, que estão intimamente ligados a uma das compo-nentes da força rápida – a força reactiva. No caso da corrida de velocidade,antes do contacto com o solo há uma pré-activação dos músculos agonistasdo movimento, o que provoca a ligação de algumas pontes cruzadas entreas proteínas contrácteis, aumentando o nível inicial de “stiffness”, que per-mite resistir melhor ao elevado impacto durante a fase excêntrica, reduzindoa amplitude, o alongamento e a duração da fase de travagem havendo ummaior armanezamento de energia elástica nos tendões e músculos exten-sores das pernas, que é usada na fase concêntrica (impulsão), permitindo

uma maior utilização da força.Podemos diferenciar dois tipos de CMAE. O CMAE longo, caracterizado porum grande deslocamento angular das articulações coxo-femural, do joelhoe tibio-társica e uma duração total superior a 250ms (saltos para o lança-mento em basquetebol e para o bloco ou remate em voleibol, deslocamen-tos laterais em muitos desportos colectivos, primeiros apoios da corrida nafase de aceleração, etc). O CMAE curto, caracterizado por um pequenodeslocamento angular e por uma duração total entre os 100 e os 200ms(chamada para os saltos em atletismo e apoio do pé no solo na corrida develocidade).Principais Aspectos TécnicosDurante a fase do apoio à frente há uma desaceleração do movimento con-tínuo do corpo do corredor que deve ser minimizada. Para isso, o apoio deveser realizado pelo terço anterior do pé, que deve fazer um movimento muitorápido e dinâmico em “griffé” (movimento activo do pé da frente para trás,

para evitar a travagem durante o apoio, uma maior amortização e a conse-quente perda de velocidade).Durante a amortização (é nesta fase da passada que a energia elástica éarmazenada) a perna de apoio absorve o choque provocado pelo impacto,devendo flectir o mínimo possível para minimizar a fase excêntrica da pas-sada.Na fase de impulsão (a única em toda a estrutura da passada em que háuma aceleração do corpo), o principal objectivo é exercer a maior quanti-dade de força no solo no espaço de tempo mais curto possível. Esta força éproduzida pela contracção dos músculos da perna e pela libertação da ener-gia acumulada no momento da extensão da perna. Para que haja uma ace-leração máxima em cada passada é essencial que as articulações dotornozelo, do joelho e da anca estejam em extensão completa no final daimpulsão, em combinação com um balanço activo da perna livre e umaacção dinâmica e coordenada do trabalho dos braços.

FASE DE VOO

 A fase de voo começa no momento em que o pé perde o contacto com osolo no final da fase de impulsão. Nessa altura, joelho da perna de impulsãodeve flectir rápida e acentuadamente durante a fase de recuperação paraobter um balanço curto e pendular que vai permitir uma elevada frequênciada passada. Na fase de recuperação devem evitar-se movimentos de grandeamplitude com o pé a passar demasiado atrás e acima, tipo “calcanhar aorabo”.Na fase de balanço o joelho deve mover-se rapidamente para a frente e paracima (mas sem que a coxa suba mais alto que a horizontal) para permitiruma boa impulsão, o aumento da amplitude da passada e também parapreparar o movimento em “griffé” do próximo apoio.A Fase de AceleraçãoOs aspectos técnicos anteriormente mencionados dizem respeito essencial-mente à corrida de velocidade máxima. Na fase de aceleração há algumascaracterísticas particulares que devem ser respeitadas. O seu principal

objectivo é aumentar rapidamente a velocidade e provocar uma transiçãoeficaz para a corrida de velocidade máxima. A tendência natural dos atletasao iniciarem uma corrida de velocidade é olharem para a frente e levantaremo tronco, adoptando uma posição equilibrada, o que é um enorme erro, poisum “desequilíbrio controlado” e a inclinação do tronco à frente são aspectosfundamentais para uma aceleração eficaz nos primeiros passos de corrida. Assim, o atleta deve manter o tronco inclinado para afrente e levantar-se pro-gressivamente até aos 20 - 30 metros nas corridas de velocidade. Esteprincípio também é válido para atletas de outras disciplinas (corridas de bar-reiras) ou de outras modalidades (desportos colectivos), havendo umaadaptação ao tipo de tarefa específica.Durante a fase de aceleração a amplitude e a frequência da passada aumen-tam progressivamente, embora nesta fase a frequência tenha um papel maisimportante, pelo que a recuperação deve ser muito rápida e o pé da pernalivre não deve subir mais alto do que o joelho da perna de impulsão, procu-

rando rapidamente o solo.

O Treino da Técnica de CorridaUma boa técnica de corrida é fundamental para a realização de boas per-formances em provas de velocidade. É por isso que o conjunto dos exercí-cios de técnica de corrida fazem parte do programa de treinos de qualqueratleta de modalidades em que a corrida de velocidade é um factor decisivopara a prestação competitiva.O principal objectivo destes exercícios é o aperfeiçoamento da técnica nosentido de garantir uma maior eficácia da corrida, assim como um menordesgaste energético, além da correcção dos principais erros técnicos, quesão os seguintes:1 – A amplitude da passada não estar adaptada às características individu-

ais do atleta, o que resulta numa passada demasiado curta ou numa pas-sada demasiado longa.

Fase de Apoio Fase de Voo Fase de Apoio

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2 – O apoio do pé no solo feito de uma forma incorrecta, pela ponta do péou pelo calcanhar, por vezes a travar o movimento da corrida.

3 – O apoio do pé no solo pouco dinâmico e activo.4 – A flexão da perna de impulsão.5 – O atraso da bacia e do Centro de Gravidade em relação aos apoios.6 – Uma postura incorrecta do tronco, normalmente muito contraído e

demasiado inclinado para a frente ou para trás e com o olhar dirigidopara o chão.

7 – A trajectória do joelho da perna da frente durante a fase de balanço àfrente demasiado baixa ou demasiado alta (acima da horizontal).

8 – A trajectória da perna durante a fase de recuperação demasiado exage-rada, com a calcanhar a passar muito atrás, o que provoca uma perdade tempo, normalmente associada a uma inclinação do tronco à frente.

9 – A acção descoordenada dos braços relativamente ao movimento daspernas, normalmente associada a desequilíbrios na corrida, a movimen-tos laterais desnecessários e a uma excessiva contracção do atleta.

MONICA MARIA VIVIANI BROCHADO - EDUARDO KOKUBUNPUBLICADO EM: MOTRIZ - VOLUME 3, NÚMERO 1, JUNHO/1997

RESUMO

 A realização de exercícios intervalados reduz a fadiga e aumenta o trabalhomuscular realizado, razão pela qual tem sido recomendada como método detreino para a velocidade. Em estudos que trataram de exercício de alta inten-sidade e duração de até aproximadamente 10 segundos, observou-sedecréscimo rápido na performance e aumento do lactato, especialmentequando a recuperação é curta (30 a 60 segundos). As mudanças bio-mecânicas devidas à fadiga têm sido estudadas somente em exercícios demaior duração e menor intensidade, especialmente em corridas de fundo emeio-fundo. O presente estudo pretendeu verificar a possibilidade de identi-ficar mudanças cinemáticas e no lactato sanguíneo em corridas de veloci-dade máxima, em diferentes regimes de pausa, no treino intervalado.Seis sujeitos executaram 3 séries de 5 repetições de 50 metros, em máximavelocidade máxima, com regimes de pausa de 30, 60 e 120 segundosrespectivamente.Cada sujeito foi analisado:a) Após a primeira, terceira e quinta repetição e aos 1, 3, 5, 7 e 10 minutos

de recuperação amostras de sangue para análise de lactato sanguíneopor método eletroquímico.

b) Imagens em vídeo da primeira, terceira e quinta repetição utilizando-se atécnica de "panning" acompanhando toda a corrida, com marcas dereferência colocadas a cada 5 metros. Foram extraídas a velocidade, afrequência e a amplitude de passadas, para cada trecho de 5 metros.

Não houve diferença significativa entre as concentrações de lactato nosdiferentes regimes de pausa. Contudo, com pausas de 30 segundos, houvediminuição da velocidade e da frequência e aumento da amplitude ao longodas cinco repetições, enquanto que com pausas de 120 s, essas diferençasforam atenuadas. Observou-se também que a frequência foi, entre as va-riáveis analisadas, a mais sensível às condições experimentais.

INTRODUÇÃO

 A realização de exercícios intervalados reduz a fadiga e aumenta o trabalhomuscular realizado (ASTRAND et al., 1960; CHRISTENSEN et al., 1960). Temsido demonstrado que a actividade metabólica durante o exercício interva-lado é influenciada pela intensidade e duração dos períodos de exercício e

pausa (PLISK, 1991).

Medições de lactato sanguíneo e consumo de oxigénio indicaram que essasvariáveis eram maiores quando:a) a duração dos períodos de esforço é maior;b) a duração dos períodos de recuperação é menor.Esta característica do treino intervalado é utilizada como meio de treino develocidade, pois neste tipo de treino, é necessário assegurar a realização deesforços com elevada intensidade (PROENÇA, 1989). Em estudos quetrataram de exercício de alta intensidade e duração de poucos segundosobservou-se decréscimo rápido na performance e aumento do lactato, espe-cialmente quando a recuperação é curta (WOOTON & WILLIAMS, 1983). Poroutro lado, foi demonstrado que, à medida em que as repetições se suce-dem, há aumento na predominância da fosfocreatina como substrato

energético (ÉSSEN, 1978; GAITANOS, 1993). A corrida de velocidade, em particular os 100 metros planos, apresenta 4fases bastante características (JONATH, 1977):1) período de reacção;2) fase de aceleração positiva, durante a qual o corredor aumenta a sua

velocidade, através do aumento da frequência e da amplitude da passa-da, atingindo a velocidade máxima entre os 25 e os 50 metros, cerca de6 segundos após a partida (HAY, 1981) ou até mais tarde (60 metros) emcaso de corredores de elite (RADFORD, 1990);

3) fase de velocidade máxima constante, durante a qual a aceleração é zero,e a amplitude e a frequência de passadas permanecem constantes;

4) fase de aceleração negativa ou desaceleração ao final da corrida, devidaà deterioração da técnica da corrida, em função da falhas na coorde-nação neuromuscular e à diminuição de fosfagénio no músculo (MURASE

et al., 1976).

Existe uma relação inversa entre a frequência e a amplitude da passada,durante a corrida de 100 metros planos (JONATH, 1977):- Nos primeiros 10 a 20 metros as passadas são mais frequentes, porém

mais curtas.- Após os 60/70 metros a amplitude e a frequência são uniformes.- Nos últimos 10/20 metros a frequência cai acentuadamente, e a amplitude

aumenta ligeiramente. Atletas e técnicos buscam obter uma óptima combinação entre a frequênciae a amplitude de passada para o melhor desempenho possível durante todaa corrida (GAMBETTA, 1981).O presente estudo pretendeu verificar se é possível identificar mudanças ci-nemáticas e no lactato sanguíneo em corridas de velocidade máxima, emdiferentes regimes de pausa, no treino intervalado.

O Treino Intervaladona corrida de velocidadeEfeitos da duração da pausa sobre o lactato sanguíneo e a cinemática da corrida

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METODOLOGIA

Foram sujeitos do presente trabalho, seis estudantes universitários habitua-dos a realizar corridas de velocidade, sendo 5 do sexo masculino e 1 dosexo feminino, com 21,0±4,0 anos de idade, 1,72±0,08 m de altura e pesode 65,0±7,8 kg.Os sujeitos executaram três séries de 5 repetições máximas de corrida de50 metros e com pausas de recuperação de 30 (P30), 60(P60) ou 120(P120)segundos. As séries foram realizadas com pelo menos 24 horas de interva-lo e a ordem de execução foi aleatória.Para efeito de análise, em cada série foram recolhidas amostras de sanguepara medição da concentração de lactato sanguíneo. Foi também realizadauma filmagem para análise de imagem em vídeo da corrida,

Análise do lactato sanguíneoO sangue foi recolhido do lóbulo de orelha sem hiperemia em tubos capi-lares heparinizados calibrados para o volume de 25 ul. O sangue foi imedia-

tamente transferido para microtubos de polietileno com tampa - tipoEppendorff - de 1,5 ml, contendo 50 ul de solução de NaF 1% e armazena-do em gelo. A análise do lactato foi realizada em duplicata através de analisador electro-químico marca Yellow Spring (E.U.A.) modelo YSL 2300 STAT.

Filmagem A corrida foi filmada em VT em toda a extensão, com velocidade de obtu-rador de 1/1000 e a 30 quadros por segundo, utilizando-se a técnica de"panning" descrita por GERVAIS e cols (1989). Resumidamente, sobre umalinha paralela a 1 metro atrás do plano de corrida, foram colocados cones desinalização de modo que coincidisse o eixo óptico da câmara com o cone emarcas de 5 m de distância no plano de corrida.Da imagem de vídeo foram obtidas:- A velocidade média de corrida.

- A amplitude e frequência de passadas, em segmentos de 5 metros, naprimeira (R1), terceira (R3) e quinta (R5) repetições de cada série.

Para o cálculo de velocidade, foi realizada a contagem do número dequadros na passagem do quadril do sujeito pelos alvos de referência. A frequência de passadas foi obtida, contando-se o número de contactos dopé no solo, entre os alvos de referência. Quando não houve coincidênciaentre o contacto do pé com o solo com a passagem pelos alvos de referên-cia, foram computadas fracções de passadas. A amplitude de passadas foi obtida através da divisão da distância (5 me-tros) pelo número de passadas.O VCR utilizado para análise das imagens apresentava 60 quadros por segundo,o que permitiu uma contagem mais precisa dos quadros em cada segmento.

Análise estatísticaForam obtidas as médias e desvios padrões das concentrações de lactatosanguíneo, da velocidade, da amplitude e da frequência de passada. Foiaplicada análisede variância para medidas repetidas, tendo como variáveisdependentes a concentração de lactato sanguíneo, a velocidade, a frequên-cia e a amplitude de passada, e como variáveis independentes a pausa (30,60 ou 120 segundos), o número de repetições e a distância percorrida narepetição (excepto lactato). A localização das diferenças das médias foi real-izada através da análise de contraste posthoc.

 Velocidade de corridaEm relação à velocidade de corrida, a análise de va riância revelou interacçãosignificativa entre:- O regime de pausa e número da repetição- A pausa e a distância.- A repetição e a distância.

 A análise post-hoc, mantendo-se a distância fixa indicou que:· em P30 (pausa de 30 segundos), a velocidade diminuiu ao longo das

cinco repetições (R1 > R3 > R5) ;· em P60 (pausa de 60 segundos), a menor velocidade foi observada na 5ª

repetição R5 (R1 = R3 > R5);· em P120 (pausa de 120 segundos), não houve diferença entre as

repetições· a velocidade em R1 (1ª repetição) não diferiu significativamente entre os

três regimes de pausa;· já em R3 e R5, a menor velocidade foi observada em P30 (pausa de 30

segundos).Esses resultados indicam que em P30 (pausa de 30 segundos) houve piordesempenho, já a partir da terceira repetição.Em P60 (pauda de 60 segundos), isto ocorreu somente na última repetição.Mantendo-se o número de repetições fixas, a análise post-hoc indicou:· em qualquer regime de pausa, diferença entre a velocidade de 5, 10, 15,

20 e 25 m. Não houve diferença entre as velocidades até o final da

repetição, excepto em P30 (pausa de 30 segundos), entre 45 e 50 metros.· menor velocidade a partir de 15 metros, em P30, que persistiu até o finalda repetição.

· diminuição da velocidade nos últimos 5 metros em P30.Esses resultados indicam que a fase de aceleração da corrida compreendeos primeiros 25 m. Além disso, corrobora o achado de que em P30, há piordesempenho.

Frequência de passadas A análise post-hoc revelou:· menor frequência em P30 quando comparado com P60 e P120 (P30 <

P60 = P120);· diminuição progressiva da frequência ao longo das repetições (R1 > R3

> R5) ;· diferença entre 5, 10 e 15 m e estável entre 15 e 45 metros.

Amplitude de passadaNão houve nenhuma interacção significativa entre os factores na amplitudede passadas. Contudo, detectou-se um efeito significativo das repetições edas distâncias. A análise post-hoc revelou:· menor amplitude na 1ª repetição em relação ás demais, com excepção de

P30, onde a 5ª repetição foi igual à 1ª;· aumento até 25 metros, permanecendo estável até aos 45 metros, quan-

do há um novo aumento.Considerando que a velocidade máxima é alcançada nos 25 metros, e que a fre-quência de passadas atinge o seu ponto máximo aos 15 metros, o aumento naamplitude parece ser o factor determinante mais importante da velocidade.

Lactato sanguíneo

 A análise de variância revelou efeito significativo das colectas, porém nãohouve significância para as pausas.Outro facto que chama a atenção é a elevada concentração (12,1 mml) delactato, mesmo com regime de pausa de 120 segundos e esforços de 7segundos. Segundo a classificação proposta por PEREIRA (1989) estasrepetições podem ser considerados exercícios em elevada acidose.

DISCUSSÃO A utilização da técnica de "panning" descrita por GERVAIS e cols (1989) eadaptada neste estudo, permite a filmagem de toda a extensão da corrida,mantendo uma aproximação em relação ao sujeito que favorece a identifi-cação precisa das diversas fases da passada.Os cones de sinalização usados como alvos de referência destacam-se bemdo fundo irregular, podendo ser facilmente identificados na projecçãoquadro a quadro.

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DOSSIER TÉCNICO CORDENAÇÃO PROF. JOÃO ABRANTES

  Apesar da filmagem ter sido feita com câmara que registava 30 quadros porsegundo, a reprodução do vídeo foi feita em VCR que projecta 60 quadros porsegundo, o que permitiu uma melhor diferenciação das fases, com maior pre-cisão na contagem de quadros e consequentemente na determinação do tempo. A posição de maior flexão do joelho da perna de apoio foi escolhida comoposição inicial e final de uma passada, uma vez que era mais facilmenteidentificada do que o instante em que o pé toca o solo. Para contagem dosquadros em cada trecho de 5 metros, tomou-se como ponto de referência oquadril do sujeito quando em alinhamento vertical com os alvos/cones. A colocação da câmara, perpendicular à marca de 45 metros da corrida,teve a intenção de proporcionar uma melhor visão no trecho final, onde seesperava observar as maiores modificações no padrão de corrida. No entan-to, os últimos 5 metros de corrida mostraram um padrão atípico. Especial-mente a última passada era executada visivelmente de maneira a alcançarda forma "mais fácil" a linha de chegada, com uma amplitude bem maior, seo sujeito estava mais longe, ou bem mais curta, se estava próximo da linha.Este facto ocorreu apesar dos sujeitos terem sido orientados para cruzarem

a linha em velocidade máxima. As modificações apresentadas no último tre-cho, portanto, não devem ser atribuídas exclusivamente à fadiga.Os resultados acima analisados indicam que repetições de 50 metros apre-sentam características semelhantes às provas de 100 metros e outrasrepetições de curta distância, podendo-se identificar as fases de aceleraçãoe velocidade máxima constante. Uma fase de desaceleração não foi identifi-cada, provavelmente em função do curto espaço do esforço. A fase dereacção não foi analisada neste estudo, pois a partida foi feita sem bloco, daposição em pé. Devido à posição da câmara, perpendicular aos 45 metros,o instante da partida era identificado com dificuldade. Além disso, em funçãoda pausa (especialmente em P30) e de não haver blocos, os corredores nãocaracterizavam uma posição imóvel antes da partida. A fase de aceleração compreende os primeiros 25 metros de corrida, valorque se aproxima daqueles obtidos por HAY (1981). Este padrão não é afecta-do nem pelos diferentes regimes de pausa, nem pelo número de repetições

executados. O aumento de velocidade na fase de aceleração deve-se tanto aoaumento de frequência, quanto ao aumento da amplitude de passadas. Háaumento rápido da frequência de passadas até os 15 metros, achados estesque estão de acordo com os de JONATH (1977), chegando a um máximo de2 a 2,2 passadas por segundo, dependendo da repetição, o que não alcançaos 4,5 a 5,0 passos, ou 2,25 a 2,5 passadas por segundo apresentados porvelocistas de nível mundial (GAMBETTA, 1981).O aumento da amplitude de passada também é rápido e se estende até os 25metros. A passada aumenta cerca de 60% nesse trecho, passando de cercade 2,5 para cerca de 4 m. RADFORD (1990) observou aumentos de até 100%na amplitude da passada de velocistas de elite, na fase de aceleração.

 A fase de velocidade máxima constante compreendeu o trecho a partir dos25 metros de corrida, onde frequência e amplitude de passadas são cons-tantes, o que está de acordo com a literatura (JONATH, 1977).

Considerando-se que não se tratava de corredores de elite, que alcançamsua velocidade máxima apenas aos 50/60 m (RADFORD,1990), supõe-seque a fase de velocidade máxima constante deste estudo represente avelocidade máxima dos sujeitos.Nos últimos 5 metros da corrida houve diminuição de velocidade, no regimede pausa de 30 segundos, caracterizando uma fase de desaceleração. Essadiminuição de velocidade se deveu à diminuição da frequência de passadasque não foi compensada pelo aumento da amplitude da passada.  A alteração do regime de pausa afectou o desempenho. Em todos osregimes houve diminuição da frequência de passadas ao longo dasrepetições, contudo somente no regime P30 houve um efectivo decréscimode velocidade, portanto não compensado.Este achado indica que a diminuição da frequência de passadas pode serum importante indicador da fadiga precoce. De facto, em exercícios inten-sos, há fadiga selectiva de fibras musculares de contracção rápida com

decréscimo na velocidade de contracção e relaxamentos musculares(ÉSSEN, 1978).O aumento na amplitude da passada a partir da 3ª repetição demonstra queas adaptações feitas por velocistas em caso de fadiga são similares àquelasobservadas por WILLIAMS e cols (1991) e SILER e MARTIN (1991) em corre-dores de longa distância.Esses achados indicam que o aumento da amplitude de passadas é umaestratégia compensatória para a fadiga. Segundo ENOKA (1988) exige-semenos energia para aumentar a amplitude da passada, dentro de limitesrazoáveis, do que para aumentar a frequência.Tomando-se a velocidade máxima, obtida na fase de velocidade máxima cons-tante das diversas repetições, como índice de eficiência da corrida, observa-se que, apesar de haver diminuição de rendimento, esta diminuição não é tãogrande como a detectada por WOOTTON e WILLIAMS (1983) em exercíciomáximo de duração semelhante (6 segundos), porém executado em ciclo-ergómetro. Com pausa de 30 segundos, comparada a pausa de 60 segundos,eles obtiveram uma potência média de apenas 79,5% na 5ª repetição, quan-

do comparada à 1ª repetição. No presente estudo, com pausa de 30 segun-dos, chegou-se ainda a 91,5% de eficiência no 5º tiro. Em estudo de MCCARTNEY e cols. (1983) foi observado maior declínio no desenvolvimento depotência, com maior velocidade de pedal em cicloergómetro. A corrida de velocidade, como a executada neste estudo, requer máximavelocidade de contracção, o que pode ter resultado em maior razão dedegradação de PCr e glicogénio muscular. A acumulação intramuscular deresíduos pode ter ocorrido em ritmo acelerado, o que pode ter efeito inibidornos processos biomecânicos associados à contracção muscular, contribuin-do para a fadiga observada. A maior deterioração do desempenho com pausa menor, observada nesteestudo, confirma os achados de ASTRAND e cols. (1960) e CHRISTENSENe cols. (1960), que verificaram que quanto maior a pausa entre os períodosde exercício, maior era o total de trabalho executado.Em esforço de curta duração, como no presente estudo, a diminuição das

reservas de PCr está correlacionada com a diminuição da potência (MILLERe cols., 1987). Considerando que se trata de corrida em máxima velocidade,a taxa de hidrólise da fosfocreatina também é máxima (HIRVONEN e cols.,1987), o que poderia levar a PCr a concentrações de até 10% daquelas derepouso (BERGSTRON e cols., 1971; GOLLNICK e HERMANSEN, 1973). A restauração dos fosfagênios de alta energia apresenta um t1/2 de 20 a 170segundos (HARRIS e cols., 1976), de forma que pausas de 30 e 60 segun-dos não permitem a sua reposição total. Nem mesmo a pausa de 120 segun-dos pode garantir a total recuperação das concentrações de PCr. A degradação de glicogénio muscular pela glicose não oxidativa é activadaem 3 a 5 segundos e a consequente taxa de produção de lactato está rela-cionada com a hidrólise da fosfocreatina e com a concentração de ADPintramuscular (MADER e cols., 1983). Portanto, em exercício intenso e comduração de 7 segundos, como o presente, haveria, além da diminuição dasconcentrações de PCr, um acúmulo de lactato, ou acidose, que é propor-

cional à fadiga (DAWSON e cols., 1978).Neste estudo, observou-se um aumento contínuo do lactato ao longo dostiros, o que poderia ser a causa para a deterioração do desempenho. Porém,houve maior deterioração em P30 do que nos outros regimes de pausa enão houve diferenças nas concentrações de lactato, nos diversos regimesde pausa. Este facto parece confirmar as conclusões obtidas por MC CART-NEY e cols. (1983) em estudo com exercício máximo de curta duração, ondealterações ácido/básicas parecem exercer pouca influência na performance. Ao final da primeira e terceirarepetições, as concentrações de lactato foramde respectivamente 2,2 e 6,4 mml. Interpolando-se esses valores, a concen-tração de lactato antes do terceiro tiro é de 4,4 mml. Segundo JACOBS(1986), concentrações de lactato sanguíneo superiores a 5 mml estão asso-ciados com a fadiga induzida pela acidose. Assim, mesmo com regime de pausa de 120 s, pode ter havido fadiga. Estahipótese é compatível com a diminuição da frequência de passadas e

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CORDENAÇÃO PROF. JOÃO ABRANTES DOSSIER TÉCNICO

aumento da amplitude observadas neste estudo, como estratégia compen-satórias para a fadiga.O facto de não ter sido detectado efeito do regime de pausa sobre o lactatosanguíneo, apesar do aparecimento da fadiga, merece consideração. Noestudo de WOOTTON e WILLIAMS (1983) verificou-se que a diminuição dapausa provocou aumento da fadiga (diminuição de cerca de 29% na potên-cia média) e também do lactato (11,52±1,52, com 30s de pausa e10,29±1,84, com 60s de pausa), bastante diferente do presente estudo,onde se observou diminuição de cerca de 5%, apenas, na velocidade e ne-nhuma diferença significativa nas concentrações de lactato (11,73±2,53, emP30, 11,45±2,24, em P60 e 10,95±3,42, em P120). Algumas razões para essas diferenças serão discutidas a seguir. A diferençano tipo de exercício é bastante significativa. Em cicloergómetro somente seexercitam as pernas, que actuam contra a resistência imposta pelos pedais.Já na corrida é possível contar com a inércia do movimento. Além disso, amovimentação dos membros superiores pode ter aumentado a remoção dolactato produzido nos membros inferiores.

Não pode ser descartada a possibilidade de ter havido alteração na con-centração muscular de lactato. A passagem do lactato do músculo para osangue depende de transportadores específicos que existem em númerolimitado. Em exercícios de elevada intensidade, como o do presente estudo,portanto, a produção muscular de lactato pode ter sido maior do que acapacidade de transporte.MILLER e cols. (1987) verificaram que a reposição dos fosfagénios estavadirectamente relacionada com a recuperação da força máxima após exercí-cio de curta duração. Não tendo sido observadas diferenças nas concen-trações de lactato, nos três regimes de pausa, é possível que a deterioraçãodo desempenho, neste estudo, tenha se devido à insuficiente reposição dePCr, que não foi medida.

Outra possível localização da fadiga pode ter sido o sistema neural, centralou periférico. A alteração mais frequente relacionada à fadiga central é a

diminuição na frequência de disparos dos potenciais eléctricos e o aumen-to no tempo de relaxamento, o que ocasiona uma redução na velocidade decontracção da fibra muscular.Esta diminuição permite que o músculo mantenha a produção de força, comvelocidade de contracção mais lenta, postergando a falência total na trans-missão dos impulsos neurais (ENOKA, 1988). Esta estratégia compen-satória, no entanto, não é suficiente para manter a performance em activi-dades que exigem níveis máximos de força, pois essas oferecem poucasoportunidades de manipulação de frequência de disparos, ou recrutamentoe interacção de músculos sinergistas (ENOKA, 1988).Já a fadiga a nível periférico pode ocorrer na excitação ou contracção. A fadi-ga nos processos de excitação pode surgir em função de falhas no sarcole-ma, nos túbulos T, na ligação dos túbulos T com o retículo sarcoplasmáticoou do próprio retículo sarcoplasmático. O efeito de eventuais falhas em qual-quer dessas estruturas seria o de reduzir a quantidade de cálcio no citosol

para activar o complexo miofibrilar (GREEN, 1990). Pelo menos em veloci-dades altas, e especificamente em velocidade máxima, o rendimento estárelacionado com a formação das pontes de actina-miosina, que pode seralterada pela concentração tanto de ADP quanto de iões de hidrogénio(GREEN, 1990).Em resumo, os resultados do presente estudo indicam que para corrida má-xima de 50 metros, que tem duração de 7 segundos, pausas de 30 ou 60segundos são insuficientes para manter o desempenho máximo. Mesmo umapausa de 120 segundos pode não ser suficiente para o desempenho máximo,pois há elevada lactatémia, sugerindo que a glicose anaeróbia é accionada.De facto, houve evidência no presente estudo de que o organismo se utilizade alguma estratégia compensatória de fadiga. Portanto, para garantir umtreino eficiente de velocidade, que requer recuperação total, manutenção daintensidade máxima e principalmente um elevado grau de perfeição no movi-mento (PROENÇA, 1989), seriam necessárias pausas mais prolongadas.

CONCLUSÕESObservando os resultados do presente estudo, constata-se que é possívelverificar modificações cinemáticas em corridas de velocidade realizadascom diferentes regimes de pausa. A ocorrência da fadiga pode ser associa-da à diminuição da velocidade, como ocorreu em pausas de 30 segundos. A diminuição da frequência, no entanto, pareceu ser o factor mais sensívelao tratamento experimental. Poderia portanto ser útil na identificação desinais de fadiga, mesmo quando não há diminuição significativa de veloci-dade ou alteração de concentração de lactato sanguíneo. As modificações observadas para a amplitude mostraram ser capazes decompensar a diminuição da frequência, mantendo a velocidade, somentequando a fadiga não era tão grande. Isto se percebe ao verificar que compausa de 30 segundos, na 5ª repetição, onde houve o pior desempenho, aamplitude voltou aos valores observados na 1ª repetição.O facto de não terem sido observadas modificações no lactato sanguíneosugere que, para o treino intervalado de corrida de velocidade, medidas desua concentração parecem não ser eficientes indicadores de fadiga, como

ocorre em outros tipos de exercício.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASASTRAND, I.; ASTRAND, P.O.; CHRISTENSEN, E.H. & HEDMAN, R. Intermittent muscular work. Acta.

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