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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Rosangela Helena Pezoti O Projeto Nova Luz e a participação dos sujeitos coletivos e políticos: um processo de reurbanização em questão DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL SÃO PAULO 2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Rosangela Helena Pezoti

O Projeto Nova Luz e a participação dos sujeitos coletivos e políticos: um processo de reurbanização em questão

DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL

SÃO PAULO

2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Rosangela Helena Pezoti

O Projeto Nova Luz e a participação dos sujeitos coletivos e políticos: um processo de reurbanização em questão

DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Serviço Social sob orientação da Professora Doutora Maria Lúcia Carvalho da Silva.

SÃO PAULO

2012

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Banca Examinadora

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AGRADECIMENTOS

Ao finalizar esta etapa da minha formação humana e acadêmica, quero

agradecer às pessoas que estiveram presentes, de alguma forma, na minha vida.

Especialmente, quero agradecer à minha família: minha mãe, Maria Thereza; meus

irmãos, Rubens e Rosana; meus sobrinhos, Bruno, Guilherme e Flávia; e

cunhados, Ana e Régis. Sem deixar de lembrar meu pai, Amélio, que não está mais

fisicamente entre nós.

Um especial agradecimento aos companheiros e companheiras do Serviço

Franciscano de Solidariedade (SEFRAS) e dos movimentos e fóruns em que atuo

como profissional e militante. Também aos colegas docentes e alunos do Curso de

Serviço Social da Universidade São Francisco.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da

Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP), em particular, minha orientadora, Profa.

Dra. Maria Lúcia Carvalho Silva, pela dedicação e incentivo no meu processo de

formação. E aos professores que participaram da banca de qualificação, Rosangela

de Oliveira Dias Paz e Eduardo Alberto Cusce Nobre, pelas valiosas

contribuições.

Às lideranças dos sujeitos políticos e coletivos envolvidos no Projeto Nova

Luz, pela preciosidade de seus depoimentos, vindos da vivência e da luta diária.

Aos queridos amigos e amigas da caminhada, em todos os tempos e

momentos, com presenças e ausências, cuidados e acolhidas, incentivos e palavras

de encorajamento.

A todos e todas, meu muito obrigada!

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O homem nasceu para aprender, aprender tanto quanto a vida lhe permita.

(Guimarães Rosa, 1983)

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PEZOTI, Rosangela Helena. O Projeto Nova Luz e a participação dos sujeitos coletivos: um processo de reurbanização em questão. Tese (Doutorado em Serviço Social) – Programa de Pós-Graduação em Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, 2012, 228 p.

RESUMO A presente tese constitui-se de um processo investigativo cujo objetivo é analisar o processo de revitalização do Projeto Nova Luz na cidade de São Paulo, a partir da visão dos diferentes sujeitos coletivos e políticos nele envolvidos. O Projeto Nova Luz insere-se em um contexto de mudanças na cidade de São Paulo decorrentes da necessidade de reurbanização de áreas que permitam a expansão imobiliária, especialmente, com requalificação da região central. Esses processos de reurbanização, em diversos locais, são acompanhados de medidas que resultam da expulsão da população moradora da região, denominada como gentrificação. Levantou-se como hipótese que o Projeto Nova Luz privilegia a imbricação da economia de mercado com o processo de higienização da região central da cidade de São Paulo, em detrimento dos princípios do direito à cidade e da proposição de políticas públicas com participação popular inerentes ao processo democrático constituído a partir da Constituição de 1988. Utilizou-se a abordagem qualitativa na pesquisa, através do levantamento bibliográfico e documental. Para a pesquisa de campo, definiu-se como sujeitos as principais lideranças dos sujeitos coletivos e políticos presentes e atuantes no processo de discussão do Projeto Nova Luz, ou seja, a Associação de Moradores da Santa Ifigênia e Luz, a Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia, o Movimento Estadual da População em Situação de Rua e a União dos Movimentos de Moradia. Para a seleção desta amostragem, utilizou-se da técnica “bola de neve” (snowball sampling). A partir da análise dos depoimentos dos entrevistados, identificou-se que o Projeto Nova Luz possui características de um projeto de renovação radical com gentrificação e que os mecanismos de participação popular previstos na Constituição de 1988 e no Estatuto da Cidade não são respeitados pelo Poder Público como espaços de decisão compartilhados com a sociedade civil.

Palavras-chave: Urbanização e reurbanização; gentrificação; Projeto Nova Luz;

participação popular.

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PEZOTI, Rosangela Helena. The Nova Luz Project and the participation of collective subjects: a process of reurbanization under consideration. Thesis (Social Service Doctorate) – Social Service Postgraduate Program, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, 2012, 228 p.

ABSTRACT This thesis consists of an investigative process which objective is to analyze the revitalization process of Nova Luz project in Sao Paulo, from the perspective of different collective subjects and politicians involved in it. The Nova Luz Project is inserted in a context of changes in Sao Paulo, arising from the need for reurbanization of areas in order to expand housing, especially, with redevelopment of the central region. These reurbanization processes, in many places, are accompanied by measures resulting in expulsion of resident population of the region, known as gentrification. Hypothesized that Nova Luz Project privileges the overlap of market economy in the process of cleaning the downtown area of Sao Paulo, against the law principles to the city and the proposal of public policies with popular participation inherent to the democratic process established by the Constitution of 1988. Qualitative approach was used in the research, through the bibliographic and documental gathering. For the field survey, were defined as subjects the main leadership of the collective subjects and politicians present and active at the discussion process of Nova Luz project, namely, Associação de Moradores da Santa Ifigênia e Luz, Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia, Movimento Estadual da População em Situação de Rua and União dos Movimentos de Moradia.For the selection of this sample was used the snowball sampling technique. From analysis of the testimonies of the interviewees it was identified that Nova Luz project has characteristics of a renovation project with gentrification, and the mechanisms of popular participation foreseen in the Constitution of 1988 and in the Statute of the City, are not respected by the Government as decision spaces shared with civil society. Keywords: Urbanization and reurbanization; gentrification; Nova Luz Project; popular participation.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 ‒ Estação da Luz (1910) .........................................................................110

Figura 2 ‒ Antiga Estação (1913) com a nova em construção (fundo) ..................111

Figura 3 – “Cracolândia” ........................................................................................117

Figura 4 – “Cracolândia” ........................................................................................118

Figura 5 – Terreno vazio entre a Av. Duque de Caxias e as Ruas Helvetia e Barão

de Piracicaba ........................................................................................121

Figura 6 – Terreno vazio entre a Av. Duque de Caxias e as Ruas Helvetia e Barão

de Piracicaba ........................................................................................121

Figura 7 – Churrascão na Cracolândia ..................................................................126

Figura 8 – Ato “Especulação Extermina, BASTA de trevas na Luz e em São

Paulo” ...................................................................................................127

Figura 9 ‒ Ocupação na região da Nova Luz ........................................................163

Figura 10 ‒ Fachada da ocupação Mauá ................................................................164

Figura 11 ‒ Interior da ocupação Mauá ...................................................................165

Figura 12 ‒ Rua Helvetia .........................................................................................171

Figura 13 ‒ Prédio conhecido como “Saravejo” ao fundo .......................................181

Figura 14 – Passeata do dia 14/1/2011 ...................................................................183

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LISTA DE MAPAS

Mapa 1 ‒ Mapa das 31 subprefeituras do MSP ....................................................... 62

Mapa 2 ‒ Mapa da Subprefeitura da Sé ..................................................................101

Mapa 3 ‒ Polígono da Luz – Projeto Nova Luz .......................................................133

Mapa 4 – Perímetro da ZEIS ...................................................................................156

Mapa 5 – Setores do Projeto Nova Luz ...................................................................159

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Rendimento mensal ..............................................................................103

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 ‒ População recenseada e taxas de crescimento – Centro......................102

Tabela 2 ‒ Censo da população de rua – Subprefeitura da Sé ...............................104

Tabela 3 ‒ Estabelecimentos e empregos formais no setor do comércio, serviços,

indústria de transformação e construção civil – 2010 ............................107

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABEPSS Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social

ACSI Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia

ADIN Ação Direta de Inconstitucionalidade

AI5 Ato Institucional nº 5

AIB Associação Imobiliária Brasileira

AMOALUZ Associação de Moradores e Amigos da Santa Ifigênia e Luz

AMSI Associação dos Moradores da Santa Ifigênia

APA Área de Proteção Ambiental

APP Área de Proteção Paisagística

AUE Áreas de Urbanização Especial

AVC Associação Viva o Centro

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

BIR Bens Imóveis Representativos

CADES Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento

Sustentável

CAPS Centro de Atenção Psicossocial

CFESS Conselho Federal de Serviço Social

CNDU Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano

COHAB/SP Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo

COLUZ Conselho do Programa de Investimentos Seletivos para Região

Adjacente à Estação da Luz

CONDEPHAAT Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico,

Artístico e Turístico do Estado de São Paulo

CONPRESP Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico,

Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo.

CPTM Companhia Paulista de Trens Metropolitanos

DEOPS Departamento de Ordem Política e Social

DEM Partido Democratas

DENARC Departamento de Investigação sobre Narcóticos

EIA Estudo de Impacto Ambiental

EIS Escritórios de Inclusão

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EMURB Empresa Municipal de Urbanismo

FVC Fórum Centro Vivo

FIPE Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas

FUNDURB Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano

GARMIC Grupo de Articulação da Moradia para o Idoso da Capital

HIS Habitação de Interesse Social

HMP Habitação de Mercado Popular

IDH Índice de Desenvolvimento Humano

IDHAD Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade

INTC Instituto Nacional de Ciências e Tecnologias

IPHAN Instituto do Patrimônio Artístico Nacional

IPTU Imposto sobre Propriedade Predial e Território Urbano

ISS Imposto sobre Serviço

ITBI Imposto sobre Tramitação de Bens Imóveis

ITTC Instituto Terra, Trabalho e Cidadania

MEPR Movimento Estadual da População de Rua

MSP Município de São Paulo

MSTC Movimento dos Sem Teto do Centro

nR Uso não Residencial

ONG Organização Não Governamental

ONU Organização das Nações Unidas

PAC Plano de Aceleração do Crescimento

PCdoB Partido Comunista do Brasil

PDEM Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo

PM Polícia Militar

PIB Produto Interno Bruto

PMSP Prefeitura do Município de São Paulo

PNDU Política Nacional de Desenvolvimento Urbano

PRE Plano Regional Estratégico

PROCENTRO Programa de Requalificação Urbana e Funcional do Centro de

São Paulo

PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

PSOL Partido Socialismo e Liberdade

PT Partido dos Trabalhadores

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PTB Partido Trabalhista Brasileiro

PUC Pontifícia Universidade Católica

PUE Plano Urbanístico Específico

PUZEIS Plano de Urbanização da Zona Especial de Interesse Social

PV Partido Verde

R Uso Residencial

RAIS Relação das Informações Sociais

RIMA Relatório de Impacto Ambiental

RPPN Reserva Particular do Patrimônio Natural

SECOVI Sindicato da Habitação

SEFRAS Serviço Franciscano de Solidariedade

SEHAB Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano

SEMPLA Secretaria de Planejamento

SINCOELETRICO Sindicato do Comércio de Material Elétrico

SIURB Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras

SMADS Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social

SMDU Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano

SMSP Secretaria de Coordenação das Subprefeituras

TAC Termo de Ajustamento de Conduta

ULC Unificação das Lutas dos Cortiços

UMM União dos Movimentos de Moradia

UNESP Universidade Estadual de São Paulo

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e

a Cultura

UNIFESP Universidade Federal de São Paulo

USP Universidade de São Paulo

ZCL Zona de Centralidade Linear

ZCLp Zona de Centralidade Linear de Proteção Ambiental

ZCLz Zona de Centralidade Linear Lindeira ou Interna à ZER

ZCP Zona de Centralidade Polar

ZCPp Zona de Centralidade Polar de Proteção Ambiental

ZEIS Zona Especial de Interesse Social

ZEP Zona Especial de Preservação

ZEPAG Zona Especial de Produção Agrícola e de Extração Mineral

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ZEPAM Zona Especial de Preservação Ambiental

ZEPEC Zona Especial de Preservação Cultural

ZER Zona Exclusivamente Residencial

ZERp Zona Exclusivamente Residencial de Proteção Ambiental

ZIR Zona Industrial de Reestruturação

ZLT Zona de Lazer e Turismo

ZM Zona Mista

ZMp Zona Mista de Proteção Ambiental

ZOE Zona de Ocupação Especial

ZOG Zona de Ocupação Especial

ZPDS Zona de Proteção e Desenvolvimento Sustentável

ZPI Zona Predominantemente Industrial

ZTLz Zona de Transição Linear da ZER

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 17

1 OS PROCESSOS DE URBANIZAÇÃO E REURBANIZAÇÃO: abordagens

conceituais básicas ..................................................................................... 25

1.1 Processo de Urbanização ........................................................................... 25

1.1.1 A constituição do espaço urbano .............................................................. 25

1.2 Industrialização e Urbanização .................................................................. 27

1.3 Processos de Reurbanização ..................................................................... 32

2 A POLÍTICA URBANA NO BRASIL ............................................................. 37

2.1 Relação Estado e Sociedade no Brasil: uma breve contextualização

histórica ........................................................................................................ 37

2.2 Marcos Legais da Política Urbana.............................................................. 41

2.2.1 Constituição de 1988 ................................................................................... 41

2.2.2 O Estatuto da Cidade .................................................................................. 44

2.2.3 O Ministério das Cidades e o Conselho das Cidades .............................. 50

3 A URBANIZAÇÃO E A ORGANIZAÇÃO DA POLÍTICA URBANA NA

CIDADE DE SÃO PAULO ............................................................................. 53

3.1 Constituição Urbana da Cidade de São Paulo .......................................... 53

3.2 São Paulo: cidade global? .......................................................................... 57

3.3 A Organização da Política Urbana ............................................................. 60

3.4 O Conselho Municipal de Política Urbana, as Conferências Municipais de

Desenvolvimento Urbano e o Fundo Municipal de Desenvolvimento

Urbano .......................................................................................................... 72

3.5 Os Planos Regionais Estratégicos das Subprefeituras e a Lei de Uso e

Ocupação do Solo (Zoneamento)............................................................... 77

3.6 O Plano Regional Estratégico da Subprefeitura da Sé ............................. 82

4 HISTÓRICO E CARACTERIZAÇÃO DA REGIÃO CENTRAL DE SÃO

PAULO E DO BAIRRO DA LUZ ................................................................... 88

4.1 Formação da Região Central ...................................................................... 88

4.2 As Intervenções do Poder Público na Região Central ............................. 91

4.3 Caracterização da Região Central ..............................................................100

4.4 O Bairro da Luz ............................................................................................108

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4.4.1 A formação e a urbanização do Bairro da Luz ..........................................108

4.5 Caracterização da Região de Abrangência do Projeto Nova Luz ............112

4.6 A “Cracolândia” do Bairro da Luz ..............................................................117

5 O PROJETO NOVA LUZ: surgimento e proposta......................................128

5.1 Antecedentes e Proposta ............................................................................128

5.2 As Intervenções no Bairro da Luz a Partir da Década de 1980 ...............128

5.3 Projeto Nova Luz: surgimento e proposta ................................................129

5.4 Trajetória Legal e Política ...........................................................................135

6 PERCEPÇÕES DAS LIDERANÇAS DOS SUJEITOS COLETIVOS DA

PESQUISA: construindo uma análise do Projeto Nova Luz ....................162

6.1 Relação das Lideranças dos Sujeitos Coletivos Envolvidos no Projeto

Nova Luz com o Estado ..............................................................................162

6.2 Mecanismos de Participação Popular e o Projeto Nova Luz: utilização e

alcance .........................................................................................................174

6.3 Estratégias de Enfrentamentos e Propostas das Lideranças dos Sujeitos

Coletivos ao Projeto Nova Luz ...................................................................179

6.4 Projeto Nova Luz: projeto de reurbanização em questão ........................186

CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................190

REFERÊNCIAS .......................................................................................................194

APÊNDICE ..............................................................................................................207

ANEXOS .................................................................................................................208

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INTRODUÇÃO

O tema deste estudo marca a trajetória profissional que venho construindo ao

longo dos anos e, pessoalmente, relaciona-se com a minha vinculação com a cidade

de São Paulo, na qual sou moradora, profissional e cidadã.

Durante a Graduação e o Mestrado em Serviço Social, atuei, como estagiária

e profissional, em diversas áreas do Serviço Social, porém, com uma atenção

especial aos processos de mobilização e participação social para a efetivação dos

direitos sociais.

A participação da sociedade nos Conselhos Gestores de Política Pública

tornou-se meu tema de estudo durante o Mestrado em Serviço Social, com a

Dissertação intitulada “Relação Estado e Sociedade: suas expressões no Conselho

Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente da Cidade de São Paulo1”.

Em 2008, ingressei no Serviço Franciscano de Solidariedade – SEFRAS, na

condução da proposta de formação para os trabalhadores e de articulação política

com os espaços de participação e os movimentos sociais.

Essa nova experiência me aproximou de alguns acontecimentos diretamente

ligados ao contexto urbano da cidade, especialmente, na região central e a

interlocução com grupos, organizações e movimentos que discutem e atuam nessa

mesma região, especialmente ligados à população em situação de rua.

A população em situação de rua, cotidianamente, vive um processo lento e

sistemático de expulsão da região central. Expulsão caracterizada como um

processo de higienização que, no dia a dia, concretiza-se pela ação da polícia2 na

abordagem de adultos e crianças que são encaminhados para albergues e abrigos,

mas, também, nos projetos de revitalização encampados pelos Poder Público e que

se multiplicam pela cidade.3

1Dissertação de Mestrado sob orientação da Profa. Dra. Myrian Veras Baptista, no Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2004.

2Vide notícia publicada em 14/04/2010 no jornal “O Estado de São Paulo”, “Morador de rua vira assunto de polícia” denunciando a ação da Guarda Civil Metropolitana na abordagem violenta junto à população.

3Em reunião da Executiva do Fórum de Assistência Social, em setembro/2010, comentou-se dos projetos de revitalização que estão sendo discutidos para a região de Santo Amaro e do Largo da Batata.

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Paralelo a essas articulações, passei a acompanhar as notícias relativas à

proposta de revitalização da região central da cidade, particularmente, do Projeto

Nova Luz.

Essa realidade, dinâmica, desafiadora e complexa, levou-me, motivada pela

minha orientadora Profa. Dra. Maria Lúcia Carvalho da Silva, a retomar o meu objeto

de estudo do Doutorado, tendo como tema as inúmeras determinações que

conformam o Projeto de Revitalização do Bairro da Luz.

O Projeto Nova Luz insere-se em um contexto de mudanças na cidade de

São Paulo, decorrentes da necessidade de reurbanização de áreas que permitam a

expansão imobiliária, especialmente, com requalificação da região central.

A urbanização da cidade de São Paulo se deu de forma acelerada e sem

planejamento, sem que fossem construídas as devidas condições para que a

maioria da população tivesse suas necessidades respondidas. A região central,

outrora ocupada pelas elites4, foi abandonada sistematicamente pelo Poder Público,

abrigando uma diversidade de moradores que buscaram no centro as condições

necessárias para viver na cidade de São Paulo.

Refletir sobre essa realidade torna-se um desafio, pois inúmeras questões

colocam-se nesses projetos de reurbanização e que envolvem, para além da

questão urbanística, a realidade de milhares de pessoas que construíram suas vidas

na região ou no seu entorno.

De modo especial, o Projeto Nova Luz, desde 2010, tem sido anunciado pelo

Poder Público como solução para os problemas que envolvem o bairro da Luz,

principalmente da região denominada como “cracolândia5”. Multiplicam-se as ações

organizadas pelo Poder Público para solucionar o problema causado pela

“cracolândia”, e a mídia, de modo geral, publiciza e opina sobre as mesmas, ora

criticando ações com pouca eficiência, ora enaltecendo a iniciativa e sua proposta

de resolutividade para os problemas.

O Projeto Nova Luz tornou-se pauta constante dos principais veículos de

comunicação em São Paulo e, também, da chamada imprensa alternativa.6 O Fórum

Centro Vivo, além de publicar em sua página notícias sobre a região central, tem

4Por elites, entende-se a classe privilegiada e detentora do poder econômico e político.

5Neste estudo, utilizaremos o termo “cracolândia” em referência à situação criada no bairro da Luz. Porém, discordamos desta abordagem que estigmatiza negativamente um bairro e um grupo de pessoas. Por isso, o termo será utilizado entre aspas.

6No último ano a pesquisadora contabilizou, pelo menos, 600 matérias relacionadas ao Projeto Nova Luz e à “cracolândia”.

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produzido dossiês (2006 e 2008) sobre as ações realizadas na região, denunciando

a violência exercida contra a população.7

Também na academia, principalmente na área da arquitetura e do urbanismo,

discutem-se os projetos de revitalização. Merecem destaque as pesquisas

realizadas pelo Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos da Faculdade

de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e o Observatório das

Metrópoles do Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia (INTC).

Porém, essa discussão aparece timidamente na área do Serviço Social,

particularmente nos cursos de pós-graduação. O debate sobre o direito à cidade tem

sido pautado, em grande parte, relacionado à moradia e nos sujeitos coletivos e

políticos que protagonizam essas lutas; porém muito pouco tem sido discutido sobre

esse direito, especialmente, quando se trata da região central da cidade.8

Também esses projetos de revitalização constituem-se como campo de

trabalho do Serviço Social, demandando um profissional que, além da sua formação

teórica-metodológica, técnica-operativa e ético-política, tenha conhecimentos mais

específicos sobre a política urbana.

Diante dos desafios colocados pela realidade, definiu-se como objeto para

esta tese o estudo do Projeto Nova Luz, no bairro da Luz da cidade de São Paulo,

desvelando os sentidos latentes e expressos do Projeto, na perspectiva do direito à

cidade e da proposição de políticas públicas com participação popular.9

Para este estudo, colocou-se como questão central se o Projeto Nova Luz, ao

se definir enquanto revitalização, contempla os princípios do direito à cidade e da

proposição de políticas públicas com participação popular.

Para responder a essa questão, levantou-se como hipótese que o Projeto

Nova Luz privilegia a imbricação da economia de mercado com o processo de

higienização da região central da cidade de São Paulo, em detrimento dos princípios

7Ver dossiês. Disponível em: <http://www.centrovivo.org.br>.

8Pesquisa realizada no banco de dados dos Cursos Pós-Graduados em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Universidade do Estado de São Paulo, em Franca, apontaram uma tese de doutorado tratando de questões relacionadas à região central da cidade: “O fenômeno de ocupação dos espaços públicos de São Paulo: estudo do Largo São Francisco”, de Maria Angela Noronha Serpa, 2004.

9Segundo Coutinho (2002, p. 17), a participação política relaciona-se com a socialização do poder, “o que significa que a plena realização da democracia implica a superação da ordem social capitalista, da apropriação privada não só dos meios de produção mas também do poder de Estado, com a consequente construção de uma nova ordem social, de uma ordem social socialista. De uma ordem onde não haja apenas a socialização dos meios de produção, mas também a socialização do poder”.

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do direito à cidade e da proposição de políticas públicas com participação popular

inerentes ao processo democrático constituído a partir da Constituição de 1988.

O objetivo, então, proposto foi de analisar o processo de revitalização do

Projeto Nova Luz na cidade de São Paulo, a partir da visão dos diferentes sujeitos

coletivos e políticos nele envolvidos.

O processo de pesquisa se inspirou no Método Histórico Crítico que

possibilitou articular o particular com o geral, responder ao dinamismo e às

contradições da realidade sem perder de vista os processos históricos.

Dentro dessa abordagem se utilizou a pesquisa qualitativa que, segundo

Martinelli (1999, p. 21-22), tem por objetivo

(...) trazer à tona o que os participantes pensam a respeito do que está sendo pesquisado, não só a minha visão de pesquisador em relação ao problema, mas também o que o sujeito tem a me dizer a respeito. Parte-se de uma perspectiva muito valiosa, porque à medida que se quer localizar a percepção do sujeito, torna- se indispensável – e este é outro elemento muito importante – o contato direto com o sujeito da pesquisa.

A pesquisa bibliográfica realizou-se, tendo como principais temas a

urbanização e a segregação, o processo de urbanização do Brasil e de São Paulo, a

política urbana pós-Constituição de 1988, e a participação popular, tendo como

principais autores Lefebvre, Villaça, Maricato, Rolnik, Coutinho, Fernandes e

Nakano, entre outros.

A pesquisa documental teve como fontes de informação os documentos

oficiais do Projeto Nova Luz (legislação, processo de licitação, etc.), as legislações

relativos ao uso do espaço urbano (Plano Diretor, Estatuto da Cidade, etc.) e o

mapeamento de indicadores da região central.

Buscou-se, também, documentos informativos, levantando-se as principais

notícias vinculadas pela mídia em dois jornais de grande circulação na cidade – A

Folha de São Paulo e o Estado de São Paulo –, bem como em jornais da imprensa

alternativa – O Trecheiro e Brasil de Fato.

Para a pesquisa empírica, definiu-se como sujeitos as principais lideranças

dos sujeitos coletivos e políticos presentes e atuantes no processo de discussão do

Projeto Nova Luz.

Wanderley (2006, p. 8), define que os sujeitos coletivos se “constituem como

sujeitos políticos ativos, que se apresentam na cena pública a partir da qualificação

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de demandas coletivas”. Suas representações colocam-se como mediadores entre o

espaço público e as demandas desses sujeitos.

Para a definição da amostragem desses sujeitos coletivos e políticos, utilizou-

se a técnica “bola de neve” (snowball sampling), na qual, o contato com os primeiros

participantes, denominados “sementes”, indica outras pessoas do relacionamento:

“os filhotes das sementes”. Segundo Goodman (1961), os “sementes” são sujeitos

com conhecimento da localidade, do fato ou das pessoas que, ao indicar outros

sujeitos, criam uma cadeia de referência.

A análise dos documentos do Projeto Nova Luz indicou, como primeiro

contato, pela atuação no Conselho Gestor de ZEIS e nas audiências públicas, a

liderança da Associação dos Moradores da Santa Ifigênia e Luz (AMOALUZ), Paula

Ribas. A AMOALUZ foi criada em 2010, com o objetivo de trazer a visão e a

expectativa dos moradores em relação ao Projeto Nova Luz.

A entrevista com Paula Ribas, realizada em 19/11/2011, aconteceu nas

dependências da Sala São Paulo com uma visita aos principais pontos do bairro da

Luz, quando foi possível fotografar os prédios e ruas que fizeram parte do

depoimento da entrevistada.

Paula Ribas indicou, como parceiros no processo de enfrentamento do

Projeto Nova Luz, a Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia, o Movimento

de Moradia e da População em Situação de Rua.

Contatos foram realizados com os mesmos durante o mês de janeiro de 2012,

mês em que ocorreram as ações repressivas na “cracolândia”. Toda a polêmica

criada pela mídia dificultou o agendamento das entrevistas e, em algumas ocasiões,

o cancelamento das mesmas.

Em 04/2/2012, ocorreu a entrevista com a liderança da Associação dos

Comerciantes da Santa Ifigênia, Paulo Garcia. A ACSI, que congrega comerciantes

da região da Santa Ifigênia, foi criada em 2007 para fazer o contraponto ao Projeto

Nova Luz. Na entrevista, Paulo Garcia também indicou como parceiros nesse

enfrentamento a Associação de Moradores e o Movimento de Moradia.

A entrevista com a liderança do Movimento Estadual da População em

Situação de Rua, Robson Mendonça, ocorreu em 11/2/2012. O Movimento Estadual,

criado em 2008, tem como proposta a organização da população em situação de rua

na conquista dos seus direitos. Na entrevista, Robson Mendonça, estava

acompanhado de educadores do Movimento que também expuseram suas opiniões.

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Na indicação dos parceiros no processo de discussão do Nova Luz, Robson

indicou, também, a Associação dos Moradores e dos Comerciantes.

A entrevista com a liderança da União do Movimento de Moradia, Sidnei

Antonio Euzébio Pita, ocorreu em 05/3/2012, referendando as indicações de parceria

dos entrevistados anteriormente. A União dos Movimentos de Moradia foi fundada

em 1987 com o objetivo de unir os movimentos na conquista da moradia.

Para o processo de coleta de informações, utilizou-se a entrevista

semiestruturada, com um roteiro norteador (apêndice 1), com o objetivo de trazer à

tona o que os participantes pensam a respeito do Projeto Nova Luz. As mesmas

foram gravadas, transcritas e enviadas aos entrevistados para sugestões de

mudanças e/ou acréscimos.

Para o tratamento dos dados, foi utilizada a análise de conteúdo que descreve

e interpreta o conteúdo das entrevistas. Para Chizzotti (2008), a análise de conteúdo

Consiste em relacionar a frequência da citação de alguns temas, palavras ou idéias em um texto para medir o peso relativo atribuído a determinado assunto pelo seu autor. É um tipo de análise da comunicação que pretende garantir a imparcialidade objetiva, socorrendo-se da quantificação da unidades do texto claramente definidas, para gerar resultados quantificáveis ou estabelecer a frequência estatística das unidades de significado. (CHIZZOTTI, 2008, p. 114).

A partir dos depoimentos dos entrevistados, foi possível analisar o Projeto

Nova Luz a partir de três eixos norteadores: a relação das lideranças dos sujeitos

coletivos e políticos com o Estado; a utilização e o alcance dos mecanismos de

participação popular; e as ações de resistência e as propostas alternativas ao

Projeto Nova Luz.

A tese está organizada em duas partes, com três capítulos cada, que

compreendem os estudos desenvolvidos neste processo investigativo. O capítulo 1,

Os Processos de Urbanização e Reurbanização: Abordagens Conceituais Básicas,

aborda os conceitos básicos de urbanização, a partir do processo de industrialização

das cidades, e os principais processos de reurbanização.

O capítulo 2, A Política Urbana no Brasil, trata da constituição da política

urbana no Brasil, a partir da Constituição de 1988, destacando a construção histórica

da relação do Estado com a sociedade civil, e a proposta de participação popular

através dos mecanismos previstos constitucionalmente.

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O capítulo 3, A Urbanização e a Organização da Política Urbana na Cidade

de São Paulo, aborda o processo de urbanização da cidade de São Paulo e a

constituição da sua política urbana, com destaque para a organização das

Subprefeituras, os Planos Diretores Estratégicos Municipais e Regionais e a Lei de

Zoneamento.

O capítulo 4, Histórico e Caracterização da Região Central da Cidade de São

Paulo e do Bairro da Luz, apresenta a constituição da região central da cidade de

São Paulo, as intervenções políticas e urbanísticas das últimas décadas e os dados

que caracterizam a região na atualidade. Apresenta, também, o Bairro da Luz e sua

caracterização nos dias atuais, com destaque para as intervenções na chamada

“cracolândia”.

Os capítulos 5 e 6, O Projeto Nova Luz: Surgimento e Proposta, e Percepções

das Lideranças dos Sujeitos Coletivos da Pesquisa: Construindo uma Análise do

Projeto Nova Luz, são dedicados ao Projeto Nova Luz. O capítulo V trata dos

antecedentes do Projeto, sua proposta e trajetória legal e política. No capítulo VI, o

Projeto Nova Luz é analisado a partir da percepção das lideranças dos sujeitos

coletivos e políticos envolvidos nos processos de enfrentamento do Projeto.

Nas considerações, apontam-se alguns aspectos pertinentes às análises

realizadas e possibilidades de aprofundamento de temas e pesquisas futuras.

Apesar do Projeto Nova Luz estar em andamento aguardando a licitação para

a concessão urbanística, espero que esta pesquisa contribua, não só para o Serviço

Social, como para outras áreas acadêmicas, ampliando o debate da sociedade

sobre os projetos que se multiplicam para a reurbanização de áreas centrais em

diversas cidades do país.

É propósito realizar a devolutiva aos sujeitos coletivos e políticos

entrevistados e a outras organizações e movimentos sociais da cidade.

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PARTE I

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1 OS PROCESSOS DE URBANIZAÇÃO E REURBANIZAÇÃO: abordagens

conceituais básicas

1.1 Processo de Urbanização

1.1.1 A constituição do espaço urbano

O processo de industrialização decorrente da implantação do capitalismo na

sociedade moderna tem sido o ponto de partida para as análises referentes à cidade

e ao desenvolvimento do espaço urbano. Porém, as cidades surgiram antes do

período de industrialização.

As primeiras cidades foram constituídas a partir de assentamentos

permanentes, formados por fazendeiros e habitantes com ocupações

especializadas, onde o comércio, o estoque de alimentos e o poder foram

centralizados. As primeiras cidades conhecidas surgiram no século III a.C., na

Mesopotâmia, ao longo do Rio Nilo, na Civilização do Vale Indo e na China,

resultantes do crescimento de pequenos vilarejos ou da fusão de pequenos

assentamentos.

O crescimento de impérios antigos e medievais levou ao aparecimento de

grandes cidades capitais, como Babilônia, Roma, Antioquia, Alexandria, Cartago,

Selêucida do Tigre, Changan e Constantinopla, sendo que algumas dessas cidades

superaram a marca de um milhão de habitantes.

Para Lefebvre (2001, p. 11), houve

(...) a cidade oriental (ligada ao modo de produção asiática), a cidade arcaica (grega ou romana, ligada à posse de escravos), depois a cidade medieval (numa situação complexa: inserida em relações feudais, mas em luta contra a feudalidade da terra).

A cidade oriental e arcaica caracterizou-se pela organização política da

sociedade, enquanto que a sociedade medieval, sem perder o caráter político, foi

principalmente comercial, artesanal e bancária, integrando os mercadores nômades.

Durante a Idade Média, as cidades começaram a acumular riquezas, como

objetos e tesouros, e tornaram-se centros de vida social e política onde se

acumulavam também os conhecimentos, as técnicas, as grandes obras e a arte.

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Morar na cidade passou a ser considerado um ato de liberdade, em relação às

obrigações rurais impostas pela comunidade feudal da época.

As cidades medievais, de forma contraditória, centralizavam as riquezas,

porém as atividades econômicas ligadas ao comércio dinamizavam essa mesma

riqueza, constituindo circuitos de troca e circulação de dinheiro. Algumas cidades,

tais como Veneza, Gênova ou Lübeck, tornaram-se Cidades-Estados poderosas, por

vezes tomando o controle de terras próximas ou estabelecendo extensos impérios

marítimos.

A expansão da circulação da riqueza constituiu uma rede de cidades ligadas

por estradas, por vias fluviais e marítimas, por relações comerciais e bancárias.

“O que se levanta sobre essa base é o Estado, o poder centralizado. Causa e

efeito dessa centralização particular, a centralização do poder, uma cidade

predomina sobre as outras: a capital” (LEFEBVRE, 2001, p. 13).

A passagem das atividades comerciais e bancárias e da produção artesanal

para a produção industrial e para o capitalismo concorrencial provocaram profundas

mudanças, não apenas nas cidades, mas em toda a sociedade.

Lefebvre (2001) aponta que as primeiras indústrias foram implantadas fora

das cidades, dependendo de múltiplas circunstâncias, locais e espaços geográficos.

As indústrias de tecelagem, extração mineral e metalurgia se instalaram perto de

fontes de energia – rios, florestas, minas de carvão –, de matérias-primas (minerais)

e de reservas de mão de obra (o camponês), produzindo seus próprios centros

urbanos. As antigas cidades concentravam os mercados, as fontes de capitais, as

residências dos dirigentes políticos e da burguesia industrial e a reserva de mão de

obra.

A cidade é produto da ação humana, e nasce com o processo de sedentarização e numa nova relação homem-natureza, pois, para fixar-se, o homem tem que garantir um domínio permanente do território, incluindo, dessa forma, a existência política, que é indispensável à materialização do espaço urbano (ROLNIK, 1995, p. 8).

Com o tempo, percebe-se que a cidade permite a concentração dos meios de

produção em um pequeno espaço: ferramentas, matérias-primas e mão de obra. A

indústria, então, se aproxima dos centros urbanos.

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Temos a nossa frente um duplo processo ou, preferencialmente, um processo com dois aspectos: industrialização e urbanização, crescimento e desenvolvimento, produção econômica e vida social. Os dois aspectos deste processo, inseparáveis, têm uma unidade e, no entanto, o processo é conflitante. Existe, historicamente, um choque violento entre a realidade urbana e a realidade industrial (LEFEBVRE, 2001, p. 16).

Esse choque provoca a deterioração dos centros urbanos, com o

deslocamento dos habitantes para periferias e a substituição das habitações por

imóveis ligados ao comércio e à indústria.

“Os subúrbios são urbanos, numa morfologia dissociada, império da

separação e da cisão entre os elementos daquilo que foi criado como unidade e

simultaneidade” (LEFEBVRE, 2008, p. 28).

1.2 Industrialização e Urbanização

Na segunda metade do século XIX, o capitalismo ingressa num novo estágio:

o capitalismo concorrencial com as mudanças políticas e técnicas decorrentes da

Revolução Burguesa e da Revolução Industrial.

O capitalismo concorrencial criará o mercado mundial, onde os países mais

avançados buscarão matérias brutas em países distantes e espalharão seus

produtos por esses mesmos locais. Países e povos situados fora da Europa são

integrados por vínculos econômicos e culturais.

Torna-se característica desse estágio um processo de urbanização sem

precedentes.

Se, em 1770, 40% dos ingleses residiam nos campos, aí só permanecem, em 1841, 26% deles. As cidades crescem notadamente: em 1750, só duas delas aglomeravam mais de 50.000 habitantes; em 1801, esse número era de 8 e, em 1851, de 29 (e 9 tinham mais de 100.000 habitantes). [...] A população total do Reino Unido [...] triplica entre 1750 e 1850, duplica entre 1800 e 1850. O crescimento demográfico e a urbanização conectam-se diretamente à industrialização – evidencia-o a hipertrofia das cidades industriais que, em apenas 40 anos (1801-1841), sofrem o seguinte acréscimo no seu número de habitantes: Manchester – 35.000/353.000; Leeds – 53.000/152.000; Birminghan – 23.000/181.000; Sheffield – 46.000/111.000 (NETTO, apud Engels,1986, p. II-IV).

A industrialização impôs mudanças no espaço urbano, onde o crescimento

econômico possui um custo social. Engels (1986) percorre e descreve os bairros

operários londrinos, onde ruas de casas miseráveis cruzam com as ruas largas das

mansões e dos parques públicos.

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A cidade (vista do alto) é um amontoado de casas desalinhadas encimado por um céu sempre nebuloso, mesmo nos dias mais belos. Somos tomados de um medo súbito, hesitamos em penetrar neste vasto Dédalo onde já se acotovelam mais de um milhão de homens, onde o ar viciado de exalações insalubres eleva-se, formando uma nuvem infecta que basta para obscurecer o sol quase por completo. A maioria das ruas são condutos sujos e sempre úmidos de águas pestilentas. Fechadas entre duas fileiras de casas, o sol jamais desce nelas (...) (ENGELS, 1986, p. 56).

Lefebvre (2001, p. 28, 29) distingue três períodos distintos, porém

concomitantes, em que a industrialização é determinante na organização da vida

social das cidades. No primeiro, a industrialização se “comporta como um poder

negativo” em que o social urbano preexistente à industrialização é negado pelo

econômico industrial e extinto na prática e na consciência. No segundo,

concomitante ao primeiro, a sociedade urbana se generaliza e se faz reconhecer

como realidade socioeconômica, a partir da organização da produção e do consumo.

No terceiro período, a realidade urbana necessita se reinventar e nasce a reflexão

urbanística, centrada no poder de decisão do Estado e do Mercado.

Assim, com a industrialização, o espaço urbano organiza-se a partir das

relações contraditórias produzidas pelo capitalismo. É produto da contradição de

classes e envolve interesses e necessidades diversas que irão estruturá-lo pelas

condições de deslocamento do ser humano, seja como portador de força de

trabalho, seja como consumidor. Esse mesmo espaço terá valorações diferenciadas:

a primeira relaciona-se com o valor dos produtos em si (edifícios, ruas, praças, etc.)

e a segunda, com o valor da sua localização. Ou seja, “A produção dos objetos

urbanos só pode ser entendida e explicada se forem consideradas suas

localizações. A localização é, ela própria também um produto do trabalho e é ela que

especifica o espaço intra-urbano” (VILLAÇA, 2001, p. 24).

A localização urbana passa a ser valorizada por dois atributos essenciais: a

rede de infraestrutura (ruas, iluminação, redes de água, telefonia) e pelas

possibilidades de acessibilidade para o transporte das mercadorias e do próprio ser

humano.

Portanto, no capitalismo, o espaço urbano é uma mercadoria cujos diferentes

pontos possuem acessibilidade diferenciada em relação ao conjunto da sociedade.

“A terra urbana interessa enquanto terra localização” (VILLAÇA, 2001, p. 74).

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Os usos do solo urbano são disputados pelos grandes segmentos da

sociedade de forma diferenciada, orientada pelo mercado e pelas relações

capitalistas, aprofundando a desigualdade e as diferenças.

Corrêa (1995) identifica os agentes sociais envolvidos na produção e disputa

do espaço urbano: os proprietários fundiários e dos meios de produção, os

promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais excluídos.

Os proprietários fundiários e dos meios de produção moldam o espaço

mediante as necessidades da demanda populacional de média e alta renda, ou seja,

aqueles que podem pagar para utilizar o espaço urbano. Os grupos sociais

excluídos irão produzir o seu próprio espaço, ao ocuparem terrenos públicos ou

privados, construírem favelas ou bairros periféricos sem nenhuma infraestrutura. A

heterogeneidade aparece na cidade nos modos de vida, nas formas de morar e

acessar os recursos existentes.

Essa forma de ocupação do espaço urbano irá caracterizar um processo de

segregação espacial. Para Villaça (2001, p. 132), a segregação espacial relaciona-

se ao processo no qual classes ou camadas sociais diferentes se concentram em

diferentes regiões ou conjunto de bairros. Para Lefbvre (2008, p. 121), é necessário

distinguir diferença e segregação na análise do espaço urbano:

Não é demais mencionar, para refutá-la, a confusão entre diferença, distinção, separação e segregação. A segregação é incompatível com a segregação, que a caricatura. Quem diz “diferença”, diz relações, portanto, proximidade, relações percebidas e concebidas, portanto, inserção numa ordem espaço-temporal dupla: próxima e distante. A separação e a segregação rompem a relação. Constituem, por si só, uma ordem totalitária, que tem como objetivo estratégico quebrar a totalidade concreta, espedaçar o urbano. A segregação complica e destrói a complexidade.

Lojkine (apud VILLAÇA, 2001, p. 147) distingue três tipos de segregação

urbana: a primeira, uma oposição entre o centro e a periferia, onde o preço do solo

do centro é mais alto do que o da periferia; o segundo, quando há uma separação

crescente entre as zonas de moradias das camadas sociais privilegiadas das zonas

de moradia popular; e o terceiro, uma divisão no espaço urbano em que o mesmo é,

geograficamente, divido por funções: zonas de comércio, de indústria, de moradias,

etc.

Para Villaça (2001), o processo de segregação na urbanização brasileira

caracteriza-se, principalmente, pela crescente separação das zonas de moradia das

classes economicamente privilegiadas.

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Esse é um processo dialético em que a segregação de uns provoca, ao

mesmo tempo e, pelo mesmo processo, a segregação de outros. As camadas de

mais alta renda controlam o espaço urbano por meio do controle de três

mecanismos: o mercado, particularmente o mercado imobiliário, de natureza

econômica; o Estado, de natureza política; e a ideologia.

O mercado imobiliário, de forma articulada, produz os bairros destinados às

classes dominantes, porém proporciona a interação com o centro principal com a

organização de subcentros comerciais e de serviços.

O controle do Estado se dá através de três mecanismos diferentes: o primeiro

é a localização dos serviços proporcionados pelo Estado e a presença dos

equipamentos que o representam (Prefeituras, Câmara dos Vereadores, Poder

Judiciário). O segundo é a disponibilização de uma infraestrutura com o

direcionamento de investimentos públicos necessários às melhorias urbanas e, por

último, a presença do Estado através da legislação urbanística feita pela e para a

burguesia.

Tais leis são voltadas para solucionar problemas de aparência e cumprir os requisitos das burguesias; nos bairros populares, quando existem, elas são extremamente permissivas (como exige o mercado), portanto, inócuas. Isso significa que, em tais bairros, tudo se passa como se elas não existissem, mesmo que existam (VILLAÇA, 2001, p. 39).

Porém, para o controle do mercado e do Estado sob o espaço urbano, a

ideologia tem papel central.

Para Chaui (1980, p. 33), a ideologia tem sua origem e função na luta de

classes, pois a ideologia é “um dos instrumentos da classe dominante para exercer a

dominação, fazendo com que esta não seja percebida como tal pelos dominados”.

Os homens, ao produzirem as condições materiais de sua existência,

instauram modos de sociabilidade e criam instituições para reproduzir esses modos.

Também produzem ideias e representações para compreender sua vida individual,

social e suas relações com a natureza e com o sobrenatural.

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As idéias da classe dominante são, em cada época, as idéias dominantes, isto é, a classe que é a força material dominante da sociedade é, ao mesmo tempo, sua força espiritual. A classe que tem à sua disposição os meios de produção material dispõe, ao mesmo tempo, dos meios de produção espiritual, o que faz com a elas sejam submetidas, ao mesmo tempo e em média, as idéias daqueles aos quais faltam os meios de produção espiritual. As idéias dominantes nada mais são do que a expressão ideal das relações materiais dominantes, as relações materiais dominantes concebidas como idéias; portanto, a expressão das relações que tornam uma classe a classe dominante; portanto, as idéias de sua dominação (MARX; ENGELS, 1977, p. 72).

A ideologia é, portanto, o processo pelo qual as ideias da classe dominante se

tornam ideias de todas as classes sociais, ou seja, se tornam ideias dominantes que

são determinantes na organização da estrutura urbana.

Para Carlos (2001), o espaço urbano irá se organizar sob duas formas: como

espaço para a produção, impondo uma configuração espacial que integra processos

produtivos, serviços, mercado e mão de obra; e como lugar de reprodução da vida

social e expressão do capitalismo, com a materialização das relações sociais,

políticas, jurídicas forjando as condições para a produção e reprodução material da

sociedade.

Desta forma, as cidades irão se estruturar tendo como ponto de referência

uma região central. “Nenhuma área é ou não é centro; como fruto de um processo –

movimento – torna-se centro” (VILLAÇA, 2001, p. 238), representando, não apenas

um ponto do mapa, mas um conjunto vivo de instituições sociais e de cruzamento de

fluxos de uma cidade.

O centro possui, portanto, um valor concreto, pois é a partir da localização

desse ponto que se associa a otimização do deslocamento de toda a comunidade e

a sua acessibilidade. São focos irradiadores da organização espacial urbana, com

grande concentração de comércio e serviço, e de empregos.

“O desenvolvimento do centro, bem como o do “não centro”, ou seja, de todas

as localizações da comunidade, continua a ser fruto de uma disputa, na qual entram

interesses contraditórios intra e interclasses” (VILLAÇA, 2001, p. 239).

As mudanças impostas pelo capitalismo exigem que as cidades, além de

possuírem os lugares para consumo, também consumam o próprio lugar,

reorganizando o espaço urbano, seja pelo deslocamento de grupos para

determinadas regiões, seja pela remodelagem do próprio espaço. Organizam-se,

também, subcentros, ou seja, um conjunto de comércio e de serviços que atendem a

população residente em um bairro ou nas proximidades.

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Em redor desses centros se repartirão, em ordem dispersa, segundo normas e coações previstas, as periferias, a urbanização desurbanizada. Todas as condições se reúnem assim para que exista uma dominação perfeita, para uma exploração apuradas das pessoas, ao mesmo tempo como produtores, como consumidores de produtos, como consumidores de espaço (LEFEBVRE, 2001, p. 33).

Lefebvre (2001, p. 30) distingue, ainda, que se ocupam dessa reflexão urbana

três grupos distintos: os “homens de boa vontade” (arquitetos e escritores), ligados

ao humanismo, que desejam criar, além de projetos, novas relações sociais. Em

muitos casos, esses projetos resultam em um “formalismo (adoção de modelos que

não têm nem conteúdo, nem sentido) ou num estetismo (adoção de modelos antigos

pela sua beleza, que se joga como ração para o apetite dos consumidores)”.

Há, também, o urbanismo dos administradores ligados ao setor público, que

se pretende científico e tende a negligenciar o fator humano.

Este urbanismo tecnocrático e sistematizado, com seus mitos e sua ideologia (a saber, o primado da técnica) não hesitaria em arrasar o que resta da cidade para dar lugar aos carros, às comunicações, às informações ascendentes e descentes. Os modelos elaborados só podem entrar para a prática apagando da existência social as próprias ruínas do que foi a cidade (LEFEBVRE, 2001, p. 31).

E, por fim, o urbanismo dos promotores de venda que o concebem para o

mercado, visando o lucro.

O fato novo, recente, é que eles não vendem mais uma moradia ou um imóvel, mas sim urbanismo. Com ou sem ideologia, o urbanismo torna-se valor de troca, apresentando um lugar e uma ocasião de adquirir uma vida cotidiana feliz (LEFEBVRE, 2001, p. 31).

1.3 Processos de Reurbanização

Nas últimas décadas, mundialmente, tem se ampliado os processos de

recuperação de áreas urbanas degradas, englobando propostas do capital

imobiliário de ampliação das moradias para população de maior nível de renda e a

preservação da memória arquitetônica e cultural. Somam-se a isso as profundas

alterações na economia mundial e a organização de uma economia globalizada, que

tem constituído uma hierarquia global entre as cidades e exigido a ampliação dos

setores ligados às atividades de gestão dessa mesma economia.

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Esses processos de recuperação das áreas urbanas degradadas são

conhecidos como revitalização, renovação ou reabilitação urbana. Dessas

intervenções, pode surgir, ainda, outro processo, conhecido como gentrificação.

Segundo Maricato (2001, p. 125), a renovação destina-se às ações que

“visam substituir edificações envelhecidas, desvalorizadas, que apresentam

problemas de manutenção, por edifícios novos e maiores que, invariavelmente, são

marcados por uma estética pós-moderna”.

Há uma mudança no uso do solo com a instalação de novos serviços, ligados

aos setores dinâmicos da economia: comunicação, publicidade, gerenciamento,

grandes centros comerciais, etc. A renovação pode ser pontual, fruto da iniciativa

privada, ou difusa, pela ação do Estado, quando abrange uma área ampla e

totalmente alterada, inclusive na sua malha urbana.

Esses empreendimentos expulsam os pequenos negócios e a população

moradora, especialmente pela forte valorização imobiliária que acompanha esse

processo.

Ao conceito de reabilitação, atribui-se “uma ação que preserva, o mais

possível, o ambiente construído existente (pequenas propriedades, fragmentação no

parcelamento do solo, edificações antigas) e, dessa forma, também os usos e a

população moradora” (MARICATO, 2001, p. 126).

Busca-se preservar a infraestrutura para que atenda as necessidades, e as

intervenções nos edifícios têm por finalidade garantir conforto ambiental,

acessibilidade e segurança estrutural.

Busca-se, também, a revitalização da atividade econômica e social, no

sentindo de tornar a área atrativa e dinâmica, com boas condições de habitabilidade.

“Em ambos os casos é dada importância à preservação do patrimônio

histórico, artístico e paisagístico de primeira grandeza, mas apenas no caso da

reabilitação o patrimônio comum ou „banal‟ é também preservado” (MARICATO,

2001, p. 126).

Essas intervenções caracterizam-se por interesses diversos: na renovação

ganha importância o capital imobiliário e os proprietários privados. Na reabilitação,

os maiores interessados estão na população residente e nos profissionais e

militantes ligados à história e memória da cidade.

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Renovar ou reabilitar é uma decisão política que implica em estratégias diversas que irão marcar diferentemente todos os detalhes dos planos, do gerenciamento e da construção. O resultado arquitetônico e urbanístico também será diverso assim como a apropriação social (MARICATO, 2001, p. 127).

O conceito de revitalização, em sua origem, aproxima-se da reabilitação, com

ênfase na preservação de bens culturais, identificados e protegidos. É um conceito

que ganhou um enfoque maior a partir da década de 1990 e esteve relacionado,

inicialmente, aos processos de reurbanização dos centros históricos.

De acordo com a Carta de Nairobi (1976), preservação significa a

identificação, proteção, conservação, restauração, renovação, manutenção e

revitalização, ou seja, todas as ações necessárias para salvaguardar os bens

culturais.

Segundo Vargas e Castilho (2006, p. 33), o processo de revitalização deverá

seguir critérios políticos, funcionais, sociais e ambientais, visando uma intervenção

que proporcione nova vitalidade ao local. Para tanto, o autor cita cinco critérios:

Humanização dos espaços coletivos produzidos;

Valorização dos marcos simbólicos e históricos existentes;

Incremento dos usos de lazer;

Incentivo à instalação de habitações de interesse social;

Preocupação com aspectos ecológicos e

Participação da comunidade na concepção e implantação.

No entanto, Del Rio (2001, p. 2) aponta que, no urbanismo contemporâneo, a

gestão das cidades, sob a lógica neoliberal e de acordo com as oportunidades do

mercado imobiliário, irá criar um novo modelo de revitalização urbana.

O modelo de revitalização urbana do urbanismo contemporâneo rompe com práticas precedentes e distancia-se tanto dos projetos traumáticos de renovação quanto das atitudes conservacionistas, ao mesmo tempo em que os incorpora e excede, em prol do renascimento econômico, social e cultural das áreas centrais.

Os processos de revitalização podem acontecer de forma parcial ou total.

Existem casos em que bares, casas noturnas, pequenos comércios, etc., são

retirados das áreas a serem revitalizadas com uma reconfiguração total do espaço.

Em outros casos, ainda que ocorra a revitalização, algumas atividades são

mantidas. Mas, nos dois casos, acontece a exclusão de grupos.

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35

Os processos de revitalização estão ligados ao planejamento estratégico das

cidades que, na gestão pública, tem como características a modernização da cidade,

os projetos de embelezamento e as parcerias público-privado.

Os mesmos se confundem com outras atividades, como a de intervenção,

preservação e remodelação, as quais, por sua vez, encontram-se diretamente

ligadas a investidores privados, culminando em processos radicais de renovação do

espaço urbano. Experiências internacionais e experiências recentes no Brasil

revelam a existência dessas renovações radicais com gentrification, ou seja, a

substituição dos antigos moradores por outros de faixas mais altas de renda.

O termo gentrification surgiu na Inglaterra, na década de 1960, quando a

socióloga Ruth Glass analisava a transformação imobiliária em determinadas

regiões da cidade de Londres. Entretanto, foi no ensaio “The new urban frontiers:

gentrification and the revanchist city”10 que se analisou profundamente o processo

de gentrificação, consolidando-o como um fenômeno social das cidades

contemporâneas.

Na gentrificação ocorre um conjunto de processos de transformação do

espaço urbano que, quando concretizado, possui um caráter excludente e

privatizador, através da expulsão da população de baixa renda de determinados

bairros centrais e sua substituição por moradores de maior poder aquisitivo;

renovando moradias e alterando a forma e o conteúdo social desses espaços

urbanos.

Segundo BIDOU-ZACHARIASEN (2006, p. 22), numerosos autores

utilizaram-se desse termo relacionando-o a um processo de mudanças não apenas

física, mas sociais e econômicas.

As áreas a serem gentrificadas normalmente tiveram, outrora, relevante

importância histórica, dotadas em sua paisagem de um patrimônio arquitetônico

considerável e um alto potencial de investimento devido a sua localização e

equipamentos oferecidos. Porém, por motivos variados como a migração do centro

financeiro, essas áreas sofreram um processo gradual de degradação de seus

espaços, acolhendo camadas sociais de menor poder aquisitivo.

Esses processos não envolvem apenas o mercado imobiliário, mas

necessitam de uma ação conjunta com o Estado, através de programas

10

As novas fronteiras urbanas: gentrificação e o revanchismo das cidades, de Neil Smith.

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governamentais de incentivo a compra e investimento nessas áreas, para que deem

resultados. Esses programas governamentais, geralmente estão vinculados com

atividades culturais na região, incentivando a circulação de pessoas

economicamente favorecidas.

Segundo Arantes (2002, p. 52), esse processo de gentrificação ocorreu em

diversas cidades no mundo, como é o caso da cidade de Barcelona, que passou por

esse processo em decorrência dos Jogos Olímpicos de 1992. Também a cidade de

Londres, ao planejar a revitalização da área das docas, compôs uma empresa mista

para arrecadação de recursos, envolvendo o Estado e os empresários, o que gerou

uma elevação dos preços dos imóveis e a expulsão da população originária da

região.

No Brasil, há diversos indicadores da volta ao centro, no final da década de

1990. Projetos pontuais foram executados em Salvador, São Luis, Recife, Porto

Alegre, Rio de Janeiro, São Paulo, entre outras cidades. Também o Banco Mundial

se mostra interessado em financiar a recuperação de edifícios que componham o

patrimônio histórico da cidade.

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37

2 A POLÍTICA URBANA NO BRASIL

2.1 Relação Estado e Sociedade no Brasil: uma breve contextualização

histórica

Historicamente, o processo de desenvolvimento do Brasil foi marcado pela

distribuição desigual das riquezas socialmente produzidas e pela não participação

da população nas decisões políticas do país.

O Estado brasileiro caracterizou-se, em diferentes períodos, pelas relações de

cunho patrimonialista e clientelista, com a alavancagem de recursos públicos para

investimentos voltados aos interesses de grupos e/ou corporações privadas.

Essa tradição de relações sociais e políticas autoritárias permeou todo o

processo de desenvolvimento criando, segundo Fernandes (1989, p. 24), uma

sociedade estratificada, “com uma massa variável, com frequência numerosa, de

indivíduos excluídos da ordem”.

Segundo o autor, esses indivíduos excluídos da ordem caracterizam-se pela

inserção no mercado de trabalho de forma precária, com baixos salários e ausência

de direitos, e pela alienação política que, frequentemente, conduz à passividade,

inviabilizando a organização e a mobilização social, reforçando a subalternidade nas

relações sociais.

Consolidou-se, então, um padrão nas relações entre o Estado e a sociedade

caracterizado pela oligarquização do sistema de poder e pela marginalização da

população do espaço público.

A cultura política do país consolidou, como elemento da estrutura profunda do sistema político, uma noção genérica, difusa, embora abrangente e fortemente consistente, que supõe a oposição entre a sociedade como um ente amorfo, amebóide, disforme e caótico, e o Estado, como princípio organizador, regulador e principalmente, capaz de gerar a ordem necessária, não só a sobrevivência, mas ao desenvolvimento da sociedade (MOISES, 1990, p. 16).

Estruturou-se um “Estado patrimonialista” no qual a comunidade política

“conduz, comanda e supervisiona os negócios, como negócios privados seus, na

origem, como negócios públicos depois, em linhas que se demarcam gradualmente”

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(FAORO, 2000, p. 363). Com isso, cria-se um limite tênue entre o público e o

privado, sendo o Estado o espaço de defesa dos interesses privados.

Porém, mesmo com a centralização do poder político e econômico no Estado

e em grupos privilegiados, as forças sociais, historicamente, se articularam

contrárias a essa hegemonia conservadora, explorando as contradições internas do

sistema para o alargamento dos direitos civis, econômicos, políticos e sociais.

Podemos destacar, no período do Brasil Colônia (1500-1822), as rebeliões

nativistas organizadas pelos colonos contra as formas coercitivas utilizadas pelos

portugueses para exploração das riquezas naturais e a resistência da população

negra, que teve nos quilombos uma das estratégias de enfrentamento contra a

ordem escravocrata.

No período do Império (1822-1889), a estabilidade política da aristocracia

rural foi preservada com a brutal repressão aos movimentos organizados do período.

A Revolta da Cabanagem, no Pará, de 1835 a 1837, e a Revolta da Balaiada, no

interior do Maranhão entre 1838 e 1841, foram duramente reprimidas pela polícia,

que exterminou grande parte da população envolvida.

No final do Império, a estrutura social resultante de quase quatrocentos anos de história era de “uma classe dominante” composta de senhores de escravos e de terras; uma “classe média” de militares, profissionais liberais, funcionários públicos e pequenos produtores agrícolas e; de uma “classe baixa”, maioria da população, composta de escravos, trabalhadores semilivres, colonos e assalariados. Não havia projeto político que contemplasse os interesses dessa maioria. Ficando essa população sujeita, por longo tempo, à dominação das oligarquias agrárias e das elites liberais (MIRANDA; CASTILHO; CARDOSO, 2009, p. 181).

No início do período Republicano (1889), organizam-se os movimentos

camponeses de Canudos, na Bahia, e do Contestado, no Paraná e Santa Catarina,

contra a opressão do latifúndio, sendo, ambos, duramente reprimidos e

exterminados.

Com o início do processo de industrialização, acirraram-se as contradições

entre o capital e o trabalho, explicitando a exploração da força de trabalho e a

necessidade de organização da classe operária, influenciada pelas ideias

anarquistas trazidas pelos imigrantes europeus.

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39

A formação desses sujeitos coletivos, não previstos ou até mesmo condenados pela teoria liberal clássica, relaciona-se com os processos de socialização das forças produtivas, processos impulsionados pelo próprio capitalismo (COUTINHO, 1992, p. 23).

No início do século XX, organizam-se os primeiros sindicatos com as greves

gerais de 1905, 1907, 1917 e 1919, reivindicando melhores salários e condições de

trabalho e, em 1922, estrutura-se o Partido Comunista.

“O espaço da fábrica tornou-se local não só de reprodução da força de

trabalho, mas da participação política e de organização da classe trabalhadora”

(PEZOTI; FEDRIGO, 2009, p. 91).

As oligarquias agrárias e a burguesia industrial responderam com repressão

aberta contra a organização dos trabalhadores e, sob a ameaça da

ingovernabilidade, aprovaram as primeiras leis relacionadas à proteção do trabalho

e, posteriormente, as leis que vinculam os sindicatos à estrutura do Estado.

A estruturação de um parque industrial, com indústrias de pequeno e médio

porte, gerou a migração da população do campo para a cidade e o crescimento das

taxas de urbanização. O Governo Getúlio Vargas utilizou-se de mecanismos

estratégicos, que podem ser considerados uma repressão camuflada, na medida em

que buscava atenuar, com medidas paliativas, os conflitos da relação

capital/trabalho.

Segundo Frederico (2009, p. 6), a “intromissão do Estado nas relações de

trabalho decorreu de uma concepção autoritária que enquadrava o movimento

sindical nas malhas do Ministério do Trabalho”. Por outro lado, evidenciou que “as

partes envolvidas – os compradores e vendedores da mercadoria força de trabalho –

não são sujeitos iguais. O reconhecimento do trabalho assalariado como a parte

mais fraca da transação impôs limites legais à voracidade do capital”.

Nas décadas de 1945 até 1964, o movimento operário e os movimentos

sociais voltaram a crescer, participando das discussões dos problemas nacionais.

Contudo, o Golpe Militar de 1964 trouxe a intervenção nos sindicatos, a anulação

dos poderes do Legislativo, a suspensão das eleições, caracterizando o período pela

não existência do espaço público, centralizando todas as decisões no Governo

Militar.

Embora houvesse forte repressão por parte do Estado, este período também

foi caracterizado pela articulação de diversos movimentos que desejavam um novo

projeto democrático para o país. Alguns reivindicavam condições dignas de vida,

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como os movimentos por creche, habitação, transporte, saúde e melhoria nas

condições de habitação.

Esses movimentos organizaram espaços e ações de contestação e de

resistência, aglutinando mobilizações populares e operárias, como as greves da

Região do ABC Paulista e o Movimento das Diretas Já, bem como a organização de

centrais sindicais e partidos políticos. O fim dos governos militares abriu a

possibilidade de se construir novas formas de participação política na sociedade.

Organizaram-se, entre outros, os movimentos urbanos contra a carestia, pela

reforma urbana, contra a concentração de terra no campo e pela reforma agrária. A

década de 1980, considerada perdida economicamente, encerrou com altos níveis

de pobreza e desigualdade social, fruto da crise econômica prolongada e dos efeitos

da reestruturação produtiva alavancada, no nível mundial, pelo processo de

globalização e pelo ideário neoliberal. Do ponto de vista político, esta foi considerada

a década da democratização, da participação popular e da conquista de direitos.

Com a Constituição de 1988, a participação é assumida constitucionalmente e

institucionalmente pelo Estado com a criação dos diversos Conselhos e

Conferências de Políticas Públicas nas três esferas de Poder, do Orçamento

Participativo, das audiências públicas e de diversos mecanismos de participação

popular. Em contrapartida, a contrarreforma do Estado, orientada pelo ajuste

neoliberal, afetou a definição do conjunto de políticas públicas, limitando resultados

e introduzindo obstáculos ao exercício da gestão democrática e do controle social.

Portanto, o século XXI inicia-se com a expansão formal dos espaços de

participação, ao lado de enormes dificuldades de se tomar decisões substantivas

acerca de conteúdos que possibilitem a ampliação do acesso à riqueza, à cultura e à

participação política pela maioria.

Apesar de vislumbrarmos um período aparentemente democrático, a classe dominante brasileira é altamente eficaz para bloquear a esfera pública das ações sociais e da opinião como expressão dos interesses e direitos de grupos e classes sociais diferenciados e/ou antagônicos (CHAUÍ, 2000, p. 92).

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2.2 Marcos Legais da Política Urbana

2.2.1 Constituição de 1988

A transição democrática do final da década de 1970 e da década de 1980

exigiu a elaboração de uma nova Constituição para o país, pois, segundo Marini

(1985, p. 17), a de 1946 fora “rasgada” pelos militares; a de 1967 fora promulgada e

substituída pela Emenda de 1969 e pelo Ato Institucional nº 5 (AI5), de 13/12/1968,

com status constitucional. O fim do ciclo de governos militares foi marcado pela

eleição presidencial indireta em 1985, a revogação do AI5 e a necessidade de uma

nova Constituição.

A Assembleia Nacional Constituinte foi uma arena de disputa entre a

soberania popular e as classes privilegiadas através de suas elites políticas e de

seus partidos. A burguesia nacional e a comunidade internacional de negócios

elegeram seus representantes nos partidos da ordem e do Governo. Em

contraponto, os movimentos sociais também se articularam para tornar suas

demandas em direitos.

Em janeiro de 1985, o Movimento Nacional pela Constituinte, formado por

entidades, movimento e pastorais, lançou em todo o Brasil as Plenárias Pró-

Participação Popular na Constituinte, mobilizando a sociedade civil para participar

deste processo.

Bandeiras de luta que defendiam os interesses populares emergiam dos mais diversos fóruns de debate e articulação de entidades e movimentos, comitês, plenários pró-participação popular na Constituinte, criando um novo significado nas relações entre o campo jurídico-institucional e os movimentos sociais (SILVA, 1991, p. 5).

Em março de 1987, incorporou-se ao regimento interno da Constituinte a

iniciativa popular legislativa, possibilitando aos movimentos e entidades a

elaboração e defesa de emendas populares para a Constituição.

Nesse processo de intensas mobilizações da sociedade, organizou-se o

Movimento Popular de Reforma Urbana, que, posteriormente, se denominaria Fórum

Nacional de Reforma Urbana, congregando entidades, associações e movimentos

sociais envolvidos com os debates em torno da questão urbana.

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Retomando a bandeira da Reforma Urbana, este movimento reatualizava para as condições de um Brasil urbanizado, uma plataforma construída desde os anos 60 no país. As tentativas de construção de um marco regulatório federal para a política urbana remontam às propostas de lei de desenvolvimento urbano elaboradas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano nos anos 70, que resultaram no PL nº 775/83

11

(CYMBALISTA, 2001, p. 21).

O Movimento, dentre as contribuições junto às discussões da questão urbana

na Assembleia Nacional Constituinte, foi responsável pela elaboração da Emenda

Popular sobre Reforma Urbana12 junto à Plenária Pró-Participação Popular

Constituinte, da cidade do Rio de Janeiro.

A Emenda obteve cerca de 150 mil assinaturas em todo o país e foi defendida na Comissão de Sistematização da Constituinte pela Arquiteta Ermínia Maricato, no dia 27 de agosto de 1987, representando entidades que apoiavam a Emenda (SILVA, 1991, p. 6).

A Emenda Popular da Reforma Urbana apresentou como aspecto central a

função social da cidade que deve ser garantida pela justiça social e por condições

de vida urbana digna, asseguradas pelos direitos urbanos.

Os direitos urbanos compreendem, além do acesso aos equipamentos e

serviços básicos de moradia, transporte público, saneamento, educação, saúde,

entre outros, também o acesso à gestão democrática das cidades e a preservação

do patrimônio ambiental e cultural.

Dentre esses direitos, está o direito à propriedade, que deve ser condicionado

ao interesse social. A Emenda Popular, em seu parágrafo 2º, artigo 6º, definiu o

interesse social enquanto a “necessidade do imóvel para programas de moradia

popular, para instalação de infraestrutura, de equipamentos sociais e transporte

coletivo” (apud SILVA, 1991, p. 39).

11

Conforme Rezende (2001), a tentativa mais ampla de mudança no caminho trilhado pelo planejamento da cidade, acontece sob o Projeto de Lei Federal n° 775/1983, denominado Projeto de Lei Federal de Desenvolvimento Urbano. Elaborado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano do Ministério do Interior, inovou quanto ao tratamento dado a vários temas e, em especial, fornece contornos urbanísticos ao direito de propriedade, tendo o mérito de trazer para discussão importantes questões a serem observadas pelo planejamento urbano desde o nível federal até o municipal. A justificativa do projeto apóia na necessidade de um novo estatuto jurídico que melhor reflita as relações urbanas no Brasil, em face do distanciamento entre os mecanismos jurídicos e a realidade das cidades. É proposto, então, a criação de alguns instrumentos, entre eles o direito de superfície, o direito de preempção, o parcelamento, a edificação e a utilização compulsórias, o imposto predial e territorial progressivo e a transferência do direito de construir. Disponível em: <www.uff.br/lacta/publicações/rediscutindoapoliticaurbana.htm>. Acesso em: 4 jan. 2012.

12Segundo Silva (1991, p. 7), a Reforma urbana “é uma bandeira de luta que começa a se constituir em 1986. Tal como aparece em um dos seus primeiros documentos, é entendida enquanto uma nova ética social que assume como valor básico, a politização da questão urbana através da crítica e denúncia do quadro de desigualdade social que marca o espaço urbano das cidades do país”.

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Também aparece como direito urbano fundamental o direito à moradia,

cabendo ao Poder Público a responsabilidade pela elaboração da política

habitacional, da regularização fundiária, da regulação do mercado imobiliário, da

urbanização de áreas ocupadas ou em condição de sub-habitação e pelo

financiamento para construção.

A participação popular na gestão das cidades é apontada como direito

fundamental, sendo garantida pelos instrumentos institucionais do plebiscito,

referendo, projeto de lei de iniciativa popular, audiência pública e os conselhos

municipais de urbanismo.

A Emenda Popular da Reforma Urbana deu origem aos dois artigos (182 e

183) que formam o capítulo “Da Política Urbana” na Constituição de 1988, pela

primeira vez na história constitucional do país.

Pelo texto constitucional, a política de desenvolvimento urbano é

descentralizada e passa a ser competência do Poder Público Municipal, que deve ter

como objetivo a diminuição das desigualdades no espaço das cidades.

Art. 182 - A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

O Plano Diretor, que deve ser aprovado pela Câmara Municipal, é o

“instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana”

(parágrafo 1º), e a propriedade urbana “cumpre sua função social quando atende às

exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor”

(parágrafo 2º).

Ao determinar a função social da propriedade, a política urbana constitucional visou penalizar proprietários cujos terrenos são mantidos desocupados ou mal utilizados, e cuja ociosidade se sustente em função da especulação imobiliária, principalmente pela retenção dos vazios urbanos (SILVA, 1991, p. 21).

O parágrafo 4º faculta, ao Poder Público, a aplicação de penalidades, em

etapas sucessivas13, aos proprietários que não promoverem o adequado

aproveitamento do solo urbano, de:

13

Segundo Silva (1991, p. 26), a aplicação de penalidades em etapas sucessivas limita o controle da especulação imobiliária. A Emenda Constitucional da Reforma Urbana previa o uso alternativo das penalidades para evitar o uso indevido do solo.

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I ‒ parcelamento ou edificação compulsórios; II ‒ imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no

tempo; III ‒ desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de

emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

O texto constitucional não garante o direito à moradia, porém, estabelece o

“usucapião especial urbano” para propriedade de até 250 m2 que esteja de posse do

morador por mais de cinco anos, sem contestação, concedendo ao morador o direito

à posse.

Os artigos 182 e 183 foram regulamentados através do Estatuto da Cidade

(Lei nº 10.257/2001), importante marco jurídico para a realização da política urbana

comprometida com a efetivação da função social das cidades e da propriedade

urbana, com a democratização da gestão urbana e com a redistribuição das

riquezas sociais.

2.2.2 O Estatuto da Cidade

Segundo Cymbalista (2001, p. 21), durante a década de 1990, ocorreram

vários processos de negociação para a instituição do Estatuto da Cidade, com a

participação de diversos atores sociais, como o Fórum Nacional de Reforma Urbana,

instituições de classe, os Governos Municipais e os representantes do setor

imobiliário e da construção civil.

No final de 1990, o substitutivo do Estatuto da Cidade foi aprovado por

unanimidade na Comissão de Desenvolvimento Urbano e, no final de 2000, na

Comissão de Constituição e Justiça. No ano de 2001, o projeto foi aprovado na

Câmara dos Deputados, na Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal e na

Plenária do Senado Federal.

A aprovação do Estatuto significou um alívio para os defensores da reforma urbana. Os diversos entraves e multiplicidade de interesses envolvidos em todo esse processo chegaram a provocar situações de incerteza e insegurança quanto às reais possibilidades de finalização deste trabalho por parte do Congresso Nacional (SILVA, 2003, p. 111).

Em 10 de julho, a lei do Estatuto da Cidade foi sancionada pelo Presidente da

República, com um veto na seção VI do capítulo II, que trata da concessão de uso

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especial para fins de moradia. Esse direito foi restaurado na Medida Provisória nº

2.220, de 4 de setembro de 2001, que regulamenta a concessão de uso especial.

Essa mesma Medida Provisória cria, também, o Conselho Nacional de

Desenvolvimento Urbano (CNDU), enquanto órgão deliberativo e consultivo,

integrante da estrutura da Presidência da República, formado por um Presidente,

pelo Plenário, por uma Secretaria Executiva e por comitês técnicos de

assessoramento (artigos 10 e 11).14

Resultado significativo deste processo é o fato das diretrizes e os instrumentos de política urbana terem sido regulamentados com base nas experiências de política urbana, habitacional e de regularização fundiária e de participação popular vivenciadas em diversas cidades brasileiras na década de 90 (CYMBALISTA, 2001, p. 21).

O Estatuto da Cidade estabelece um conjunto de diretrizes para o

desenvolvimento da função social da cidade e da propriedade. Também estabelece

um conjunto de instrumentos para a implementação da política urbana.

O artigo 2º coloca como objetivo da política urbana “ordenar o pleno

desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana”,

estabelecendo um conjunto de diretrizes gerais, dentre as quais se destacam:

A garantia do direito a cidades sustentáveis, ou seja, a garantia do direito à

terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiente, à infraestrutura urbana,

aos serviços públicos, etc., tornando as cidades mais justas, humanas e

democráticas (inciso I);

A gestão democrática, por meio do exercício do direito político e da

cidadania, envolvendo diversos atores, sendo necessário mediar e

negociar os interesses na esfera pública, garantindo a participação na

14

Conforme artigo 10 da Medida Provisória nº 2.220/2001, são funções do Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano: I - propor diretrizes, instrumentos, normas e prioridades da política nacional de desenvolvimento urbano; II - acompanhar e avaliar a implementação da política nacional de desenvolvimento urbano, em especial as políticas de habitação, de saneamento básico e de transportes urbanos, e recomendar as providências necessárias ao cumprimento de seus objetivos; III - propor a edição de normas gerais de direito urbanístico e manifestar-se sobre propostas de alteração da legislação pertinente ao desenvolvimento urbano; IV - emitir orientações e recomendações sobre a aplicação da Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, e dos demais atos normativos relacionados ao desenvolvimento urbano; V - promover a cooperação entre os governos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e a sociedade civil na formulação e execução da política nacional de desenvolvimento urbano; e VI - elaborar o regimento interno.

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formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos

de desenvolvimento urbano (inciso II);

A cooperação entre os governos e a iniciativa privada com investimentos

que abarquem os interesses da sociedade, não de grupos específicos

(inciso III);

O planejamento do desenvolvimento da cidade, evitando e corrigindo os

desequilíbrios resultantes do crescimento urbano (inciso IV);

A oferta de equipamentos urbanos e comunitários, de transporte e serviços

públicos adequados e que promovam a equidade e a universalização do

acesso. A oferta destes serviços deve ser planejada e estar em

consonância com a diversidade dos territórios (artigo V);

A ordenação e controle do uso do solo, evitando: a utilização inadequada,

incompatível ou inconveniente dos imóveis urbanos; o parcelamento do

solo, da edificação ou o uso excessivo ou inadequado em relação à

infraestrutura urbana; a instalação de empreendimentos ou atividades que

possam gerar tráfego sem um planejamento anterior; a retenção

especulativa de imóvel; a deterioração de áreas urbanizadas; a poluição e

degradação ambiental; e a exposição da população em áreas de risco

(inciso VI);

A integração e a complementaridade das atividades urbanas e rurais

(inciso VII);

A ampliação do conceito de sustentabilidade para além do ambiental,

tratando da adoção de padrões de produção e consumo que sejam

compatíveis com a sustentabilidade social e econômica do município

(inciso VII);

A “justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de

urbanização” (inciso IX);

A adequação dos instrumentos da política econômica, tributária e financeira

dos gastos públicos, promovendo investimentos que garantam a justiça

social no conjunto das cidades (inciso X), assim como a adoção de

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mecanismos que devolvam aos cofres públicos os investimentos do Poder

Público que valorizem imóveis particulares (inciso XI);

A “proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e

construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e

arqueológico” (inciso XII);

A garantia da gestão democrática e participativa com a realização de

audiências pelo Poder Público e com participação da população

interessada na implantação de “empreendimentos ou atividades com

efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou

construído” (inciso XIII);

O direito à moradia através da regularização fundiária e urbanização de

áreas ocupadas por população de baixa renda (inciso XIV); a simplificação

da legislação de parcelamento e uso do solo (inciso XV); e a isonomia de

condições para os agentes públicos e privados na promoção de

empreendimento e atividades do processo de urbanização de interesse

social (inciso XVI).

Além dos princípios gerais para o desenvolvimento da política urbana, o

Estatuto da Cidade, em seu capítulo II, apresenta seus principais instrumentos: os

planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de

desenvolvimento econômico e social; o planejamento das regiões metropolitanas,

aglomerações urbanas e microrregiões; o planejamento municipal; os institutos

tributários e financeiros; os institutos jurídicos e políticos; e o estudo prévio de

impacto ambiental e estudo prévio de impacto de vizinhança.

No planejamento municipal (inciso II), destaca o plano diretor; a disciplina de

parcelamento, uso e ocupação do solo; o zoneamento ambiental; o plano plurianual;

as diretrizes orçamentárias e orçamento anual; a gestão orçamentária participativa;

os planos, programas e projetos setoriais; os planos de desenvolvimento econômico

e social.

O Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), a

contribuição de melhoria e os incentivos e benefícios fiscais e financeiros compõem

os institutos tributários e financeiros (inciso IV).

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A desapropriação; a servidão administrativa; as limitações administrativas; o

tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano; a instituição de unidades de

conservação; a instituição de zonas especiais de interesse social; a concessão de

direito real de uso; a concessão de uso especial para fins de moradia; o

parcelamento, edificação e utilização de compulsórios; o usucapião especial de

imóvel urbano; o direito de superfície; o direito de preempção; a outorga onerosa do

direito de construir e de alteração de uso; a transferência do direito de construir; as

operações urbanas consorciadas; a regulação fundiária; a assistência técnica e

jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociais menos favorecidos; o

referendo e o plebiscito; a demarcação urbanística para fins de regularização

fundiária; e a legitimação de posse são institutos jurídicos e políticos previstos no

inciso V.

O capítulo 3 apresenta o Plano Diretor como “instrumento básico da política

de desenvolvimento e expansão urbana” (artigo 40), devendo ser revisto, pelo

menos, a cada dez anos (parágrafo 3º). No processo de elaboração e fiscalização da

sua implementação, deverão ser garantidas:

I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;

II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos; III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações

produzidos (parágrafo 4º).

O Plano Diretor, além de conter princípios e regras que orientam a construção

de política urbana no município, deve trazer temas e questões relativos aos

aspectos urbanos, sociais, econômicos e ambientais para a formulação de proposta

para o município. O Plano deve contar com a participação da sociedade na sua

elaboração e implementação, em todo o processo de gestão da cidade.

Para a garantia da gestão democrática das cidades são previstos os

seguintes instrumentos (artigo 43):

I – órgãos colegiados de política urbana, nos níveis nacional, estadual e municipal;

II – debates, audiências e consultas públicas; III – conferências sobre assuntos de interesse urbano, nos níveis nacional,

estadual e municipal; IV – iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos de

desenvolvimento urbano.

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49

Segundo Cymbalista (2001, p. 40), uma das inovações do Estatuto da Cidade

está no conjunto de instrumentos de natureza urbanística voltados para

(...) induzir as formas de uso e ocupação do solo; a ampliação das possibilidades de regularização das posses urbanas (...); e, também uma nova estratégia de gestão que incorpora a idéia de participação direta do cidadão em processos decisórios sobre o destino da cidade.

No primeiro conjunto, os instrumentos procuram coibir a retenção

especulativa de terrenos enfrentando a formação de preços para o mercado

imobiliário, bem como há dispositivos que separam o direito de propriedade e o

potencial construtivo dos terrenos. O segundo conjunto trata da regularização

fundiária de áreas ocupadas e não tituladas da cidade, ou seja, os assentamentos

irregulares, ilegais ou clandestinos. E, o terceiro conjunto, incorpora os instrumentos

de participação direta dos cidadãos nos processos de decisões.

No desenvolvimento da política urbana, cabe à União legislar sobre as

normas gerais do direito urbanístico; promover programas de construção de moradia

e melhorias das condições habitacionais e de saneamento básico; instituir diretrizes

gerais para o desenvolvimento urbano; e elaborar e executar planos nacionais e

regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social

(Estatuto da Cidade, artigo 3º); sempre em sintonia com os estados e os municípios.

A aprovação do Estatuto da Cidade, segundo Nakano (2004, p. 13), trouxe

desafios fundamentais para a efetivação da Política Urbana no Brasil:

Realizar a Reforma Urbana, efetivando sistemas de regulação urbanística capazes de reverter o quadro excludente das desigualdades sócio-territoriais das cidades brasileiras;

Concretizar o cumprimento da função social as cidades e das propriedades urbanas;

Incluir grandes extensões das cidades clandestinas em uma nova legalidade que garanta esses direitos; e

Democratizar a gestão urbana incluindo os diversos grupos sociais nos processos de tomada de decisão sobretudo nos assuntos que afetam diretamente os interesses coletivos da cidade (...).

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2.2.3 O Ministério das Cidades e o Conselho das Cidades

Com o avanço no campo legal da política urbana, retomaram-se as propostas

de criação de uma instância federal específica para estas demandas.

Foi no Projeto Moradia, divulgado em 2000, que o Ministério das Cidades foi formulado mais claramente. O Projeto Moradia foi elaborado por 12 pessoas, entre especialistas e lideranças sociais, convidadas por Luiz Inácio Lula da Silva, por meio de uma ONG – Instituto Cidadania – que ele presidia. Após ouvir interlocutores de vários setores da sociedade, a equipe convidada formulou uma proposta – cuja redação final foi de Aloysio Biondi – da qual fazia parte a criação do Ministério das Cidades (MARICATO, 2006, p. 215).

O Ministério das Cidades, criado em 2003, tem sua estrutura organizada nos

três principais problemas que afetam as populações urbanas: a moradia, o

saneamento – água, esgoto, drenagem, coleta e destinação dos resíduos sólidos – e

as questões relacionadas ao transporte – mobilidade e trânsito. Uma quarta

secretaria foi criada, Programas Urbanos, para tratar da questão fundiária e

imobiliária.

Para iniciar um processo participativo de discussão e formulação da Política

Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU), o Ministério das Cidades convocou a

primeira Conferência Nacional das Cidades, precedida das conferências estaduais e

municipais.

A 1ª Conferência Nacional das Cidades15 aconteceu de 23 a 26 de outubro de

2003, em Brasília, com o lema “Cidade para Todos” e o tema “Construindo uma

Política Democrática e Integrada para as Cidades”. Contou com a participação de

2,5 mil delegados dos 27 estados e propôs diretrizes norteadoras para as políticas

setoriais e nacional para o desenvolvimento urbano. A Conferência aprovou as

atribuições, estabeleceu a composição e a eleição do Conselho das Cidades, e as

quatro Câmaras Técnicas que o compõem e que estão ligadas às quatro secretarias

nacionais.

A 2ª Conferência, realizada nos dias 30 de novembro a 3 de dezembro de

2005, teve a participação de 1820 delegados e 410 observadores de todos os

estados brasileiros. Debateu os temas da Participação e Controle Social; Questão

Federativa; Política Urbana Regional e Metropolitana; e Financiamento do

15

Informações sobre as Conferências disponíveis em: <http://www.cidades.gov.br>.

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51

Desenvolvimento Urbano. Também elegeu a nova composição do Conselho das

Cidades.

Merecem destaque as duas primeiras conferências pelos debates que

promoveram o avanço no processo de elaboração do Plano Nacional de

Desenvolvimento Urbano, contando com um expressivo número de participantes

representando diversos segmentos sociais.

A 3ª Conferência das Cidades, com o lema “Desenvolvimento urbano com

participação popular e justiça social” e o tema “Avançando na gestão democrática

das cidades”, ocorreu no período de 25 a 29 de novembro de 2007. A preocupação

central da conferência foi dar continuidade à construção do PNDU e realizar um

balanço das ações e políticas já desenvolvidas a partir das duas conferências

realizadas.

Com o lema “Cidade para todos e todas com gestão democrática, participativa

e controle social”, ocorreu nos dias 19 a 23 de junho de 2010 a 4ª Conferência

Nacional das Cidades. Os avanços e as dificuldades na implementação da PNDU

foram os temas centrais debatidos durante o evento, a partir dos eixos temáticos:

criação e implementação de conselhos das cidades, planos, fundos e seus

conselhos gestores nos níveis federal, estadual, municipal e Distrito Federal;

aplicação do Estatuto da Cidade, dos planos diretores e a efetivação da função

social da propriedade do solo urbano; a integração da política urbana no território:

política fundiária, mobilidade e acessibilidade urbana, habitação e saneamento; e a

relação entre os programas governamentais – como Programa de Aceleração do

Crescimento (PAC) e Minha Casa, Minha Vida – e a política desenvolvimento

urbano.

Enquanto deliberação da 1ª Conferência Nacional das Cidades, o Conselho

das Cidades foi criado no ano de 2004, pelo Decreto nº 5.031, de 2 de abril de 2004,

que, posteriormente, foi revogado pelo Decreto nº 5.790, de 25 de junho de 2006. O

Conselho é um órgão colegiado de natureza deliberativa e consultiva, integrante da

estrutura do Ministério das Cidades, que tem por finalidade “estudar e propor as

diretrizes para a formulação e implementação da Política Nacional de

Desenvolvimento Urbano, bem como acompanhar e avaliar a sua execução,

conforme dispõe a Lei nº 10.257, de 10 de junho de 2001, Estatuto da Cidade”

(artigo 1º).

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Atualmente, o Conselho das Cidades16 é constituído por 86 titulares – 49

representantes de segmentos da sociedade civil e 37 dos poderes público federal,

estadual e municipal, além de 86 suplentes, com mandato de dois anos. Inclui,

também, nove observadores representantes dos governos estaduais, que possuírem

Conselho das Cidades, em sua respectiva unidade da Federal (artigo 4º).

O Conselho das Cidades delibera acerca das mais diversas matérias relativas

à Política Nacional de Desenvolvimento Urbano e às ações e programas

desenvolvidos pelo Ministério das Cidades por meio de suas resoluções, que são

classificadas da seguinte forma:

Resoluções Recomendadas – recomendações relativas aos atos de outras

unidades administrativas das esferas do Poder Público e entidades da sociedade

civil;

Resoluções Normativas – reservadas à regulamentação e normatização dos atos

do Conselho das Cidades; e

Resoluções Administrativas – relacionadas aos atos administrativos, como

criação de comissões, grupos de trabalho e de campanhas específicas.

Segundo balanço divulgado pelo Ministério das Cidades17, dos 27 estados

brasileiros, 1618 possuem os Conselhos das Cidades regulamentados e em

exercício; e 11 estados19 não possuem conselho, dentre eles, o estado de São

Paulo.

16

Informações sobre o Conselho das Cidades disponíveis em: <http://www.cidades.org.br>. 17

Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/conselho>. 18

Estados do Acre, Bahia, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pará, Pernambuco, Piauí, Paraná, Roraima, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins.

19Estados de Alagoas, Amazonas, Amapá, Ceará, Espírito Santo, Paraíba, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rondônia, São Paulo e o Distrito Federal.

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53

3 A URBANIZAÇÃO E A ORGANIZAÇÃO DA POLÍTICA URBANA NA CIDADE

DE SÃO PAULO

3.1 Constituição Urbana da Cidade de São Paulo

A Vila de São Paulo foi o primeiro núcleo colonizador português fundado a

certa distância da área litorânea. A vila foi fundada em 1554, por padres jesuítas

que, a partir de São Vicente, subiram uma escarpa densamente recoberta pela Mata

Atlântica – a Serra do Mar – guiados pelos índios tupi-guaranis. No planalto,

fundaram um colégio “de onde se vislumbrava o vasto panorama da várzea do rio

Tamanduatehy, afluente do Rio Tietê, cujas cabeceiras se situam no Caminho do

Mar” (ROLNIK, 2003, p. 14).

Após a fundação de São Paulo, os senhores da Câmara iniciaram a

distribuição das terras visando a ocupação do território.

Segundo as clausulas ordenativas, lembrando que o centro administrativo era a região do Pátio do Colégio, a ocupação da vila deveria ser a partir deste centro, estabelecer uma área de seis quilômetros de raio para o centro administrativo e demais instituições. O próximo círculo seria composto pelo rocio e casario dos habitantes num raio de seis léguas e, por fim, o círculo externo seria conhecido como „termo desta Villa‟ ou „do Conselho‟, os arrabaldes da vila (PMSP, 2011a, p. 10.1-7).

Dessa área, expandiu-se a cidade de São Paulo devido ao aumento

populacional e a busca por novas terras, tendo dois fatores importantes: a criação de

igrejas e as formações das chamadas freguesias ao redor destas, que dariam

origem aos futuros bairros.

Devido ao pouco interesse que despertava na Corte Portuguesa, a vila viu o

poder político ser exercido pelos grandes proprietários de terra, recriando um

ambiente feudal em que as elites repartiam as terras e as riquezas entre si,

possibilitando pouco crescimento econômico na região.

Os homens da vila partiam para as Bandeiras, deixando o cuidado da terra e

dos filhos a cargo das mulheres, que tinham a vida norteada pela busca do sustento

diário e pela obediência religiosa.

O povoamento do território pelos portugueses só se consolidou, efetivamente,

durante o século XVIII. Por sua localização geográfica, tornou-se ponto de

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convergência entre três importantes caminhos abertos rumos ao litoral e ao interior:

o primeiro, seguia pelo Vale do Paraíba e serviu de rota das expedições para Minas

Gerais e para o norte e nordeste brasileiro. Um segundo caminho, passando por

Campinas e Mogi Mirim, se dirigia a Minas Gerais e Goiás. E, o terceiro, buscava a

região sul, atravessando Sorocaba e Itapetininga.

As expedições rumo ao interior demandaram o surgimento de entrepostos e

locais de pouso que, mais tarde, tornaram-se vilas que deram origens a cidades no

estado de São Paulo e em outros locais. São Paulo tornou-se um entreposto

comercial entre o litoral e o interior da colônia, sustentado por pequenas lavouras,

pelo comércio de escravos indígenas e de produtos básicos de sobrevivência.

O ouro encontrado nas terras paulistas e o solo fértil da região, que favorecia

o desenvolvimento de lavouras diversificadas, eram responsáveis pela sobrevivência

de grande parte da população. A partir do século XVIII ganha destaque a produção

da cana-de-açúcar e São Paulo torna-se um dos maiores produtores e exportadores

do produto para a Europa, promovendo o desenvolvimento de povoados e o

aumento do sistema viário.

Apesar desses fatores, por mais de três séculos de sua fundação, a cidade de

São Paulo correspondeu ao território situado entre os rios Anhangabaú e

Tamanduateí, não tendo grande importância para a economia do país, centrada no

Nordeste e no eixo Rio de Janeiro-Minas Gerais.

A partir de meados do século XIX, a posição econômica da cidade sofre

mudanças com a expansão do cultivo do café gerando transformações urbanísticas,

étnicas e política. A cidade conquista um papel estratégico na economia do país,

principalmente pela importância das conexões com o Porto de Santos e com o vasto

interior paulista.

A instalação da Faculdade de Direito no Largo São Francisco, em 1827, teve

um papel fundamental nesse processo, pois a instituição atraiu estudantes, muitos

vindos de outros estados ou do interior do país.

(Os estudantes) traziam consigo outras experiências, visões e um ímpeto juvenil que fazia falta à cidade. Mais do que isso, promoveram também um pequeno surto populacional, reordenando o fluxo demográfico do centro, aquecendo a economia com a introdução de novos e mais itens de consumo (PMSP, 2011a, p. 10.1-9).

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A atividade açucareira lançou as bases de uma estrutura agrária que viria a

sustentar por um longo período a produção de café. O auge da produção de açúcar

ocorreu por volta de 1850 e, a partir daí, a produção e exportação do café

avançariam tornando-se a principal atividade econômica da região.

A expansão da produção do café para o interior do estado e a necessidade de

melhorar o trajeto até o Porto de Santos exigiram a construção de ferrovias que

possibilitassem agilidade na comercialização do café.

A primeira rede ferroviária instalada em São Paulo, em 1867, viabilizou a

integração territorial do planalto (Jundiaí) à Baixada Santista (Santos); e, em 1875, a

Sorocabana ligava a cidade de São Paulo à de Sorocaba.

Esse é um momento de intensos fluxos migratórios e a instalação de

indústrias têxteis e alimentícias, que ocupavam a várzea por onde passavam as

ferrovias, constituindo as grandes regiões operárias de São Paulo20, formadas por

imigrantes que moravam em casas coletivas e pensões.

O primeiro grande grupo estrangeiro a chegar, em fins do século XIX, foi o

italiano. Entre 1888 e 1900 passaram por São Paulo quase mil imigrantes, dos quais

70% eram provenientes da Itália.21

A região dos Campos Elíseos foi escolhida pelos fazendeiros que ocuparam a

região e viriam a formar o primeiro bairro planejado da cidade. Ruas espaçosas,

alamedas arborizadas, mansões em estilo europeu marcaram o surgimento do bairro

dos Campos Elíseos e, mais tarde, de Higienópolis. Em seguida, a Avenida Paulista,

é inaugurada em 1891.

Nesse episódio se esboça o fundamento de uma geografia social da cidade, da qual até hoje não se conseguiu escapar. O setor sudoeste, que foi desenhado a partir do percurso Campos Elíseos/Higienópolis/ Paulista e depois se completaria com os loteamentos da Companhia City nos Jardins, configura uma centralidade da elite da cidade (ROLNIK, 2003, p. 19).

Também os fazendeiros de café, donos de enormes fortunas, vinham a São

Paulo efetuar negócios. Para isso, adquiriam terra e construíam suas residências em

locais próximos às estações, como no bairro da Luz. Armazéns e hotéis também

surgiram em locais estratégicos para o desenvolvimento da economia local.

20

Constituíram-se ferrovias como a Sorocabana, a Paulista, a Ituana e a Central do Brasil, formando-se às suas margens os bairros da Lapa, Bom Retiro, Brás, Pari, Belém, Mooca, Ipiranga.

21Informação disponível em: <http://www.memorialimigrante.org.br>.

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Nesse período, são implantados os serviços de água encanada, o transporte

por bondes elétricos, a iluminação pública e a pavimentação das ruas que aconteceu

de forma distinta nos espaços da cidade.

No final do século XIX, a cidade tinha três áreas para expansão:

a) A Zona Leste, plana, e cuja ocupação exigia a transposição do obstáculo representado pela barreira Tamanduateí-ferrovia-várzea inundável.

b) A Zona Oeste, que exigia a transposição do Vale do Anhangabaú. c) A cumeeira divisora de águas entre os dois rios (onde aliás já estava a

cidade) na direção do Bixiga e da Liberdade que não exigia a transposição de nenhum obstáculo. Tratava-se, entretanto, de um sítio estreito, vincado de vales (VILLAÇA, 2001, p. 116).

A cidade se expandiu em todas essas direções, porém de forma diferenciada.

Na direção da zona oeste, surgiram os loteamentos das camadas de mais alta

renda, e a zona leste, “desprezada por essas camadas e deixadas às classes

populares” (VILLAÇA, 2001, p. 116).

O desenvolvimento industrial da cidade se afirmava na zona leste, em

especial nos bairros do Brás e da Mooca, com algumas industrias às margens das

ferrovias, nos bairros da Barra Funda e Bom Retiro.

As elites ocuparam os bairros na direção oeste e, mais tarde, à sudoeste,

através da Vila Buarque e Higienópolis, chegando à Avenida Paulista.

Em 1924, inicia-se a implantação urbanística proposta por Prestes Maia, que

visava expandir a cidade, privilegiando o ônibus, em detrimento dos bondes e trens,

para tornar acessíveis ao centro todos os bairros da periferia. São implantadas, a

partir dos anos 1940, as avenidas Nove de Julho, 23 de Maio e Radial Leste; e

canalizados rios e córregos em que se implantam avenidas como a Nove de Julho,

sobre o córrego canalizado do Saracura, e a Avenida do Estado, sobre o Rio

Tamanduateí.

A expansão horizontal ilimitada, concepção coerente com o próprio modelo radioconcêntrico de sistema viário proposto pelo plano, foi o elemento que ajudou a configurar a metrópole que temos hoje. A possibilidade de autoconstrução e a expansão ilimitada dos loteamentos era a resposta, do ponto de vista da economia imobiliária, à crise, na medida em que permitia aos trabalhadores de baixa renda comprar um lote a prestações, num loteamento distante,e ir construindo pouco a pouco sua moradia (...) (ROLNIK, 2003, p. 34).

A partir dos anos 1940, inicia-se a verticalização da zona central e a

consolidação do setor centro/sudoeste como polos concentradores dos bairros para

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a população de alta renda. A expansão industrial, sobretudo das indústrias

metalúrgicas, metal-mecânica e elétrica, ocorre ao longo das rodovias, gerando uma

nova expansão no ABC, ao longo da Via Anchieta, e em Guarulhos, ao longo da Via

Dutra.

A cidade de São Paulo que, naquele momento já é o centro industrial mais importante do país, passa a ser também o mais importante centro financeiro e a maior cidade brasileira, suplantando o Rio de Janeiro. Em 1950, a cidade de São Paulo tem mais de 2 milhões de habitantes, e cresce mais de 5% ao ano durante das décadas de 50, 60 e 70, atingindo 6 milhões de habitantes em 1970 (ROLNIK, 2003, p. 34).

Com esse crescimento expressivo, nas décadas de 1980 e 1990, a

Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo (COHAB/SP), institui uma

política habitacional voltada à construção de conjuntos habitacionais exclusivamente

residenciais, na extremidade das periferias, segregando de forma explícita a

população residente. Na Zona Leste são criados os conjuntos Itaquera 1, 2, 3 e 4,

com 35 mil moradias, e Cidade Tiradentes, com 30 mil moradias.

A instalação desses conjuntos, além dos aspectos negativos na circulação

dos moradores e na drenagem do solo, criou um modelo de exclusão territorial.

Segundo Rolnik (2003, p. 58), os altos índices de violência da década de 1990

possuem relação direta com a constituição desses guetos para a população de baixa

renda, excluída dos serviços públicos de qualidade e das oportunidades de

emprego.

A autora refere-se à cidade como um “mosaico”, em que os padrões de

territorialização são marcados pela dualidade da exclusão e da inclusão, revelando

uma fragmentação dos espaços com diferenças marcantes no acesso à qualidade e

à quantidade de empregos, serviços e equipamentos.

Também as mudanças no capitalismo contemporâneo, a partir da década de

1970, com o neoliberalismo e a globalização e o fortalecimento de capitalismo

financeiro inseriram a cidade em uma ampla discussão do seu caráter “global”.

3.2 São Paulo: cidade global?

A financeirização do capital tem sido garantida por um sistema de

comunicação instantâneo entre agentes econômicos situados em diversos locais do

planeta e estruturado no sistema bancário e financeiro.

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Mas, a razão essencial da financeirização é outra: ela resulta da superacumulação e, ainda, da queda das taxas de lucro dos investimentos industriais registradas entre os anos setenta e meados dos oitenta (NETTO, 2006, p. 231).

Grande parte do capital está disponibilizado sob a forma de capital-dinheiro,

em detrimento ao capital investido na produção. O lucro desse capital se dá de

forma parasitária em escala global.

Soma-se a este fato o crescimento e a especulação do volume do capital

fictício, representado por ações, cotas de fundos de investimentos, títulos de dívidas

públicas que não guardam a menor correspondência com a massa dos valores reais;

fato este que vem a público, nas chamadas crises do mercado financeiro.

As finanças passaram a constituir, nos últimos trinta anos, o sistema nervoso do capitalismo – nelas se espelham, particularmente, a instabilidade e os desequilíbrios da economia dessa fase do estágio imperialista (AMIM, 2003, p. 32).

Essa dinâmica da economia gerou, também, novas dinâmicas de organização

das cidades, que precisam estar preparadas para dar suporte aos fluxos

econômicos.

Na década de 1990, sob o paradigma da globalização, surge o conceito de

“cidade-global” relacionando as transformações econômicas decorrentes da

globalização e o papel exercido pelos grandes centros urbanos neste processo

(FERREIRA, 2007, p. 20), caracterizando os grandes centros financeiros e

comerciais internacionais como Nova York, Londres, Tóquio.

A busca por uma categorização das cidades em diferentes níveis de

globalidade levou diversos autores a estabelecer um conjunto de atributos

necessários à cidade global, que variam muito de autor a autor. Ferreira (2007, p.

23) sistematiza os seguintes atributos:

Relação entre a economia global e a economia nacional;

Intenso volume de negócios transnacionais com a vinda de executivos a negócios

(turismo de negócios);

Abrigo de sede de grandes empresas, com ênfase nos setores financeiros,

bancários, telecomunicações e informática;

Bolsa de valores com transações regionais e internacionais, recebendo

importante fluxo de capital financeiro;

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Atividades terciárias de apoio às empresas de atuação globalizada: serviços

financeiros, de contabilidade, publicidade, consultoria de negócios, serviços

jurídicos internacionais, etc.;

Declínio nas atividades industriais fordistas;

Alto grau de especialização do emprego, em negócios e serviços financeiros. Ao

mesmo tempo, concentram atividades de baixa remuneração relativas a serviços

de apoio logístico, como limpeza e segurança;

Ampla e disponível infraestrutura de telecomunicações e informática,

concentrando-se em distritos com grande número de edifícios de alta tecnologia e

grande conectividade com os sistemas internacionais de comunicação22;

Sede de empresas com significativa parte de suas receitas provenientes da

exportação;

Importante atividade hoteleira voltada ao turismo dos negócios;

Infraestrutura para a recepção de grandes eventos do circuito cultural e esportivo.

Para Sassen (1998, p. 77), o que caracteriza esses centros urbanos é a

“intensificação das transações entre as cidades, sobretudo através do mercado

financeiro, investimentos e fluxos dos serviços”.

Estes fluxos globais, exigência do mercado financeiro, demandariam uma

rede de cidades capazes de estabelecer as conexões e os serviços necessários

para que se estabeleça de forma eficaz esta comunicação.

Apesar das divergências apontadas quanto à inclusão de São Paulo como

uma “cidade-global”23, a importância econômica da cidade é constantemente

associada ao conceito de “cidade-global”, sendo incorporada pela mídia, pela

academia, pelo mercado e pelo poder público.

A defesa dessa ideia baseia-se, além do fato de a cidade ter a maior

economia do país, na proliferação de edifícios de escritórios na região da Marginal

Pinheiros com tecnologia avançada de cabeamento; de receber um fluxo de

executivos a negócios; de possuir um moderno aeroporto e universidades de ponta,

22

A região da Marginal Pinheiros é considerada um dos “distritos” na cidade. 23

Ver capítulo 1 (FERREIRA, João Sette W. O mito da cidade-global: o papel da ideologia na produção do espaço urbano. Petrópolis (RJ): Vozes; São Paulo (SP): Unesp; Salvador (BA): Anpur, 2007).

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criando um consenso generalizado de que a cidade teria capacitação para ser

global. Com isso, os esforços, tanto do Poder Público quanto dos empresários, é de

fortalecer a vocação terciária da cidade voltada aos negócios e aos interesses

globais. Também de requalificar a região central, tornando-a atrativa, principalmente

no campo da cultura e do lazer, àqueles que a frequentam.

A lógica, quase perversa de focalizar as atenções para um único objetivo claramente voltado aos interesses empresariais supostamente „globais‟, se aproxima, em alguns momentos, de um impulso de „higienização social‟ semelhante aos momentos de maior preconceito socioespacial vista na cidade higienista do início do século passado (FERREIRA, 2007, p. 22).

3.3 A Organização da Política Urbana

A partir dos anos 2000, a cidade de São Paulo inicia uma nova história da sua

política urbana com a aprovação do Plano Diretor Estratégico do Município de São

Paulo (PDEM); a elaboração da nova Lei de Zoneamento; a descentralização da

gestão e do planejamento urbano com a instituição das 31 subprefeituras; e a

instituição do Conselho Municipal de Política Urbana.

Em 2002, a partir do aprofundamento do debate sobre o processo de

descentralização da Prefeitura do Município de São Paulo, foram criadas a

Secretaria de Coordenação das Subprefeituras (SMSP) e as 31 subprefeituras que,

anteriormente, eram denominadas de Administrações Regionais, criadas em 1973.24

As 31 subprefeituras são organizadas a partir de distritos com a seguinte

distribuição no município conforme Mapa 1:

Perus – Anhanguera e Perus

Pirituba – Jaraguá, Pirituba, São Domingos

Freguesia/Brasilândia: Freguesia do Ó, Brasilândia

Casa Verde/Cachoeirinha: Casa Verde, Cachoeirinha, Limão

Santana/Tucuruvi: Mandaqui, Santana, Tucuruvi

Tremembé/Jaçanã: Jaçanã, Tremembé

Vila Maria/Vila Guilherme: Vila Maria, Vila Guilherme, Vila Medeiros

Lapa: Barra Funda, Lapa, Perdizes, Vila Leopoldina, Jaguará, Jaguaré

24

Lei nº 13.399, de 01 de agosto de 2002, que dispõe sobre a criação de subprefeituras no município de São Paulo.

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Sé: Consolação, Santa Cecília, Bom Retiro, República, Sé, Bela Vista, Liberdade,

Cambuci

Butantã: Butantã, Morumbi, Raposo Tavares, Rio Pequeno, Vila Sônia

Pinheiros: Pinheiros, Alto de Pinheiros, Itaim Bibi, Jardim Paulista

Vila Mariana: Vila Mariana, Saúde, Moema

Ipiranga: Cursino, Ipiranga, Sacomã

Santo Amaro: Santo Amaro, Campo Belo, Campo Grande

Jabaquara: Jabaquara

Cidade Ademar: Cidade Ademar, Pedreira

Campo Limpo: Campo Limpo, Capão Redondo, Vila Andrade

M‟Boi Mirim: Jardim Ângela, Jardim São Luiz

Socorro: Socorro, Cidade Dutra, Grajaú

Parelheiros: Marsilac, Parelheiros

Penha: Penha, Cangaíba, Vila Matilde, Arthur Alvim

Ermelino Matarazzo: Ermelino Matarazzo, Ponte Rasa

São Miguel: São Miguel, Vila Jacuí, Jardim Helena

Itaim Paulista: Itaim Paulista, Vila Curuçá

Mooca: Brás, Água Rasa, Mooca, Pari, Belém, Tatuapé

Aricanduva: Carrão, Aricanduva, Vila Formosa

Itaquera: Itaquera, Parque do Carmo, Cidade Líder, José Bonifácio

Guaianases: Guaianases, Lajeado

Vila Prudente/Sapopemba: Sapopemba, São Lucas, Vila Prudente

São Mateus: São Mateus, São Rafael, Iguatemi

Cidade Tiradentes: Cidade Tiradentes.

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Mapa 1 - Mapa das 31 Subprefeituras do MSP Fonte: Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br>.

A partir da Lei nº 13.399 de 2002 e com a descentralização das atividades

para as Subprefeituras, a administração é exercida de forma direta,

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(...) com maior autonomia, mais eficiência, participação popular e desenvolvimento local, com a missão de consolidar os instrumentos de democratização do Poder Público, como o Orçamento Participativo, e fortalecer a democratização da gestão pública e a participação no âmbito regional.

25

A administração municipal, no âmbito das Subprefeituras, é exercida pelos

subprefeitos, nomeados pelo prefeito26, a quem cabe a decisão, direção, gestão e

controle dos assuntos municipais no nível local (artigo 3º).

Concomitante a este processo de descentralização da gestão municipal,

ocorreram as mobilizações e debates para aprovação do Plano Diretor Estratégico

do Município.

Segundo Villaça (2005, p. 5), a ideia de um Plano Diretor para tratar das

questões urbanas existe no Brasil desde 1930. Nesse ano, o urbanista francês

Alfred Agache elaborou o “Plano Agache” para a cidade do Rio de Janeiro, onde,

pela primeira vez, aparece o termo plan directeur. O plano, em francês, nunca foi

traduzido pelo poder público.

Na cidade de São Paulo, os dois únicos planos diretores que vigoraram

foram, segundo Villaça (2005, p. 5), “tão ilegítimos, quanto inúteis”. A Lei nº 7.688,

de 31 de dezembro de 1971, aprovou o primeiro plano no período da ditadura militar,

em uma Câmara Municipal em que vários vereadores haviam sido cassados. O

segundo, na gestão Jânio Quadros – Lei nº 10.676, de 07 de janeiro de 1988, foi

aprovado por decurso de prazo, mecanismo chamado de “entulho autoritário” ainda

em vigor na época. Sua validade foi contestada na Justiça e ficou sub-judice.27

O Plano Diretor Estratégico do Município foi aprovado pela Lei nº 13.430, de

13 de setembro de 2002, tendo como relator do Projeto de Lei o arquiteto e vereador

do Partido dos Trabalhadores, Nabil Bonduki, durante a gestão da Prefeita Marta

Suplicy (2001-2004) com a participação da sociedade civil.

25

Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras>. 26

A atual gestão municipal, do prefeito Gilberto Kassab, tem nomeado coronéis como subprefeitos. Em janeiro de 2011, dos 31 subprefeitos, 16 eram coronéis, conforme reportagem publicada pelo Estado de São Paulo – “Coronéis já chefiam 16 das 31 subprefeituras”.

27Expressão latina que designa alguma coisa que ainda está sob apreciação judicial, sem sentença final. Disponível em: <http://www.dicionarioinformal.com.br>.

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A participação popular, enquanto requisito constitucional para a instituição do

Plano Diretor e a fiscalização de sua implementação, deve ser garantida, tanto no

âmbito do Executivo Municipal quanto no do Legislativo.

De acordo com as diretrizes expressas no Estatuto, os Planos Diretores devem contar necessariamente com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos econômicos e sociais, não apenas durante o processo de elaboração e votação, mas, sobretudo, na implementação e gestão das decisões do Plano. Assim, mais do que um documento técnico, normalmente hermético ou genérico, distante dos conflitos reais que caracterizam a cidade, o Plano passa a significar um espaço de debate dos cidadãos e de definições de opções, conscientes e negociadas, por uma estratégia de intervenção no território (CYMBALISTA, 2001, p. 50).

Segundo Villaça (2005, p. 53), para a construção e aprovação do PDEM na

cidade, ocorreram audiências organizadas pelo Executivo Municipal e pela Câmara

dos Vereadores. As audiências convocadas pelo Executivo foram coordenadas pela

Secretaria de Planejamento (SEMPLA) e ocorreram antes que a proposta seguisse

para a Câmara dos Vereadores. O objetivo dessas audiências foi coletar subsídios e

críticas para compor o plano, porém tiveram um caráter técnico, sem a

disponibilização do plano antes da audiência, o que não contribuiu para uma maior

participação da população.

Na Câmara dos Vereadores, as audiências públicas do Projeto de Lei nº 290,

que instituiu o Plano Diretor Estratégico do Município, foram realizadas pelas

Comissões de Constituição e Justiça e Política Urbana, Metropolitana e Meio

Ambiente.

Apesar dos avanços para o aprimoramento da democracia, as audiências

públicas tiveram duas questões que ocuparam o debate: as “emendas noturnas”28 e

o coeficiente um.29 Villaça (2005, p. 51) analisa o processo participativo das

audiências destacando a ausência de pautas de interesse da população e a atuação

de grupos com interesses privados de uma minoria.

28

Segundo Villaça (2005, p. 21), as emendas noturnas foram as emendas que formaram o substitutivo transformando áreas de caráter estritamente residencial em áreas mistas e algumas ruas em corredores de uso especial favorecendo interesses privados.

29O Coeficiente de Aproveitamento é um número que, multiplicado pela área do lote, indica a quantidade máxima de metros quadrados que podem ser construídos em um lote, somando-se as áreas de todos os pavimentos. Disponível em: <http://www.urbanisdades.arq.br>.

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O que desmerece (o processo participativo) é a abismal diferença de atuação e poder político entre a minoria que atuou no debate dos problemas da minoria e, a ínfima minoria (principalmente se for proporcional à população) que pouco compareceu e quase nada debateu sobre os problemas de interesse da maioria. Não debateu, apesar de seu pequeno comparecimento, porque seus problemas não faziam parte da pauta dos debates.

O PDEM, aprovado em setembro de 2002, trata, no Título I, da conceituação,

da finalidade, da abrangência e dos objetivos gerais do plano. O mesmo é

conceituado como um “instrumento global e estratégico da política de

desenvolvimento urbano” (artigo 2º), que deve ser complementado pelos Planos

Regionais, a Lei de Uso e Ocupação do Solo, o Plano de Circulação e Transporte, e

o Plano de Habitação. A lei e os planos têm um prazo até 30/04/2003 para serem

encaminhados, pelo Executivo, ao Legislativo (artigo 6º). Os princípios que regem o

Plano Diretor são (artigo 7º):

I ‒ o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social, o acesso universal aos direitos sociais e ao desenvolvimento econômico;

II ‒ a compatibilidade do uso da propriedade com a infra-estrutura, equipamentos e serviços públicos disponíveis;

III ‒ a compatibilidade do uso da propriedade com a preservação da qualidade do ambiente urbano e natural;

IV ‒ a compatibilidade do uso da propriedade com a segurança, bem-estar e a saúde de seus usuários e vizinhos.

Também o objetivo da política urbana está definido na perspectiva da justiça

social, visando “ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e o

uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado e diversificado de seu território,

de forma a assegurar o bem estar equânime de seus habitantes (...)” (artigo 9º).

Segundo Nakano (2004, p. 14), à luz desses objetivos “a função social da

cidade de São Paulo se define a partir da justiça social, dos direitos sociais, do

desenvolvimento econômico, da preservação da qualidade do ambiente urbano e

natural e do bem estar coletivo”.

O Título II trata das políticas públicas, elencando seus objetivos, diretrizes e

ações estratégicas (artigos 20 a 100); classificando-as em políticas de

desenvolvimento econômico e social30; política ambiental31; e políticas de

desenvolvimento urbano.32

30

Trata das políticas de desenvolvimento humano e qualidade de vida; trabalho, emprego e renda; educação; saúde; assistência social; cultura; esportes, lazer e recreação; segurança pública; abastecimento e agricultura urbana.

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O bairro da Luz é citado no artigo 78, que trata das estratégias da Política de

Urbanização e Uso do Solo, no item V, com a criação das “operações urbanas

consorciadas para revitalizar a orla ferroviária de Pirituba, Água Branca, Luz e Vale

do Tamanduateí. Também, o item VI coloca como estratégia a requalificação (grifo

nosso) “do centro histórico e seu entorno, destacando a Várzea do Carmo, o Parque

Dom Pedro, a região do Mercado Municipal, da Rua 25 de Março e adjacências, a

zona cerealista e o entorno da Estação da Luz”.

O Título III, que trata do plano urbanístico-ambiental define que “a

urbanização do território do Município se organiza em torno de nove elementos,

quatro estruturadores e cinco integradores” (artigo 101).

Os elementos estruturadores são definidos como

(...) eixos que constituem o arcabouço permanente da Cidade, os quais, com suas características diferenciadas, permitem alcançar progressivamente maior aderência do tecido urbano ao sítio natural, melhor coesão e fluidez entre suas partes, bem como maior equilíbrio entre as áreas construídas e os espaços abertos (§ 1º).

São eles, a rede hídrica estrutural, a rede viária estrutural, a rede estrutural de

transporte público coletivo e a rede estrutural de eixos e polos de centralistas. Esta

última, constituída pelo centro histórico principal e pelos centros e eixos de comércio

e serviços consolidados ou em consolidação, e pelos grandes equipamentos

urbanos (parques, terminais, centros empresarias, aeroportos, etc.).

Os elementos integradores constituem “o tecido urbano que permeia os eixos

estruturadores e abriga as atividades dos cidadãos que deles se utilizam” (§ 2º). São

eles, a habitação, compreendida como principal elemento integrador como fixador da

população e articulador das relações sociais no território; os equipamentos sociais;

as áreas verdes; os espaços públicos; e os espaços de comércio, serviços e

indústrias.

O PDEM divide o município em duas macrozonas complementares: a

Macrozona de Proteção Ambiental e a Macrozona de Estruturação e Qualificação

Urbana (artigo 147).

31

Trata das áreas verdes; recursos hídricos; saneamento básico; drenagem urbana; resíduos sólidos; e, energia e iluminação pública.

32Trata da urbanização do solo; habitação; circulação viária e transportes; áreas públicas; patrimônio histórico e cultural; paisagem urbana; infraestrutura; serviços de utilidade pública; pavimentação; e serviço funerário.

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O macrozoneamento estabelece um referencial espacial para o uso e a ocupação do solo na cidade, em concordância com as estratégias da política urbana. Define, inicialmente, grande áreas de ocupação: zona rural (por exemplo, para produção de alimentos, exploração de minérios, produção de madeira) e a zona urbana (residências, indústrias, comércio e serviços, equipamentos públicos). (...) a partir da definição do perímetro urbano, o macrozoneamento define, ainda, em grande áreas de interesse de uso, as zonas onde se pretende incentivas, coibir ou qualificar a ocupação (CYMBALISTA, 2001, p. 41).

A Macrozona de Proteção Ambiental, em São Paulo, foi dividida em três

macroáreas que apresentam diferentes condições de preservação do meio ambiente

(artigo 150), que abrange as áreas de proteção aos mananciais nas partes norte e

sul do município, e nas áreas de proteção ambiental nas porções leste e oeste.

A Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana abrange as áreas não

delimitadas como Macrozona de Proteção Ambiental e é dividida em quatro

macroáreas, conforme graus de consolidação e qualificação (artigo 154). São elas:

A Macroárea de Reestruturação e Requalificação Urbana33, que inclui o centro, a

orla ferroviária, antigos distritos industriais e áreas no entorno das marginais e de

grandes equipamentos desativados.

(Esta área) foi urbanizada e consolidada a mais de meio século, período em que desempenhou adequadamente atividades secundárias e terciárias, e passa atualmente por processos de esvaziamento populacional e desocupação dos imóveis, embora seja dotada de infraestrutura e acessibilidade e apresenta alta taxa de emprego (artigo 155).

Nesta macroárea objetiva-se alcançar transformações urbanísticas estruturais

para obter melhor aproveitamento das condições locacionais e de acessibilidade

(§ 2º).

33

Formada pelos distritos da Barra Funda, Bela Vista, Bom Retiro, Brás, Cambuci, Liberdade, Mooca, Pari, República, Santa Cecília, Sé, Vila Leopoldina, pelas áreas das Operações Urbanas existentes e propostas, pelas atuais zonas de uso industrial Z6 e Z7 e ZUPI criadas por Lei Estadual, pelas áreas de Projetos Estratégicos e pelas Áreas de Intervenção Urbana ao longo das linhas de transportes de alta capacidade (artigo 154, § 1º).

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A Macroárea de Urbanização Consolidada34, formada pelos bairros estritamente

residenciais, ocupada pela população de renda alta e média alta, que tem

passado por um processo de verticalização e adensamento construtivo (artigo

156). Objetiva-se alcançar transformações urbanísticas que controlem a

expansão de novas edificações e a saturação da infraestrutura existente.

A Macroárea de Urbanização em Consolidação35 requer qualificação urbanística,

tem um grau básico de urbanização e tem condições de atrair investimentos

imobiliários (artigo 157). Objetiva-se “estimular a ocupação integral do território,

ampliando a urbanização existente e as oportunidades de emprego” (§ 2º).

A Macroárea de Urbanização e Qualificação36, ocupada, majoritariamente, pela

população de baixa renda, com infraestrutura básica incompleta, deficiência de

equipamentos culturais e sociais, concentração de favelas e loteamentos

irregulares (artigo 158). Nessa macroárea objetiva-se (§ 2º):

I ‒ promover a urbanização e regularização fundiária dos assentamentos habitacionais populares dotando-os de infra-estrutura completa e estimulando a construção de HIS;

II ‒ completar a estrutura viária, melhorar as condições de acessibilidade por transporte coletivo;

III ‒ garantir a qualificação urbanística com a criação de novas centralidades e espaços públicos, implantando equipamentos e serviços;

IV ‒ estimular a geração de empregos, por meio da localização industrial e de serviços em áreas dotadas de infra-estrutura de transportes e zoneamento de uso compatível.

34

Formada pelos territórios delimitados pelos distritos de Alto de Pinheiros, Butantã, Campo Belo, Consolação, Itaim Bibi, Jardim Paulista, Lapa, Moema, Morumbi, Perdizes, Pinheiros, Santo Amaro, Tatuapé, Vila Andrade e Vila Mariana, com exceção das áreas localizadas nas Operações Urbanas, e pelas Zonas Estritamente Residenciais existentes e criadas por esta lei (artigo 156, § 1º).

35Formada pelos territórios dos seguintes distritos, excluídas as partes dos distritos que integram a Macrozona de Proteção Ambiental: Água Rasa, Aricanduva, Belém, Campo Grande, Carrão, Casa Verde, Freguesia do Ó, Ipiranga, Jabaquara, Jaguará, Jaguaré, Limão, Penha, Pirituba, Rio Pequeno, Santana, São Domingos, São Lucas, Saúde, Vila Formosa, Vila Guilherme, Vila Maria, Vila Matilde, Vila Prudente, Vila Sonia (§ 1º).

36Formada pelos seguintes distritos, excluídas as partes dos distritos que integram a Macrozona de Proteção Ambiental: Anhanguera, Artur Alvim, Brasilândia, Cachoeirinha, Campo Limpo, Cangaíba, Capão Redondo, Cidade Ademar, Cidade Líder, Cidade Tiradentes, Cursino, Ermelino Matarazzo, Guaianazes, Iguatemi, Itaim Paulista, Itaquera, Jaçanã, Jaraguá, Jardim Helena, Jardim São Luís, José Bonifácio, Lajeado, Mandaqui, Parque do Carmo, Pedreira, Perus, Ponte Rasa, Sacomã, São Mateus, São Miguel, São Rafael, Sapompemba, Socorro, Tremembé, Tucuruvi, Vila Curuçá, Vila Jacuí, Vila Medeiros (§ 1º).

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A Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana compreende as

seguintes zonas de uso:

Zonas Exclusivamente Residenciais (ZER) – territórios destinados

exclusivamente ao uso residencial de habitações (artigo 160) nos bairros de alta

renda como, por exemplo, o Pacaembu, Jardim Europa, Jardim Paulistano, Alto

de Pinheiros, Sumaré, entre outros;

Zonas Industriais de Reestruturação (ZIR) – territórios em “processo de

reestruturação com a implantação de usos diversificados e ainda destinadas à

manutenção e instalação de usos industriais” (artigo 162), e que correspondem às

antigas porções industriais da cidade junto aos trechos do rio Tamanduateí, Tietê

e Pinheiros, dentre outras;

Zona Mista (ZM) – abrange a maior parte da área urbanizada do município,

caracterizada pela mistura de diversas formas de uso do solo e dos imóveis

urbanos.

“O PDEM define quatro categorias de usos que podem combinar-se na

Zona Mista. São elas: usos residenciais, não residenciais não incômodos, não

residenciais incômodos e usos mistos na mesma edificação ou lotes” (NAKANO,

2004, p. 14).

Zonas Especiais que compreendem porções do território com características ou

destinação específica e normas próprias. São elas:

o Zona Especial de Preservação Ambiental (ZEPAM) – “porções do território

destinadas a proteger ocorrências ambientais isoladas”, como áreas de

reflorestamento e remanescente de vegetação significativa (artigo 167-A).

o Zona Especial de Preservação Cultural (ZEPEC) – “porções do território

destinadas à preservação, recuperação e manutenção do patrimônio histórico,

artístico e arqueológico” (artigo 168).

o Zona Especial de Produção Agrícola e de Extração Mineral (ZEPAG) – “porções

do território municipal, em que haja interesse público expresso por meio desta

lei, dos planos regionais ou de lei específica, em manter e promover atividades

agrícolas e de extração mineral” (artigo 169).

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Dentre as Zonas Especiais, destaca-se a Zona Especial de Interesse Social

(ZEIS), definida, segundo artigo 171, como “porções do território destinadas,

prioritariamente, à recuperação urbanística, à regularização fundiária e produção de

Habitação de Interesse Social (HIS) ou do Mercado Popular (HMP)”.

As ZEIS são um instrumento urbanístico, “produto da luta dos assentamentos

irregulares pela não remoção, pela melhoria das condições urbanísticas e pela

regularização fundiária” (CYMBALISTA, 2001, p. 156). O principal objetivo para a

criação das ZEIS é permitir que parcelas da população que não possuam condições

de ocupar o solo tenham este direito, bem como de acessar um conjunto de serviços

e infraestrutura urbanos.

Porém, a maior parte das ZEIS demarcadas no território do município está na

periferia, e a minoria está nas áreas intermediárias e centrais da cidade onde se

concentram as principais ofertas de emprego e equipamentos de educação, saúde e

consumo.

O Poder Municipal deverá estabelecer um Plano de Urbanização para cada

ZEIS (artigo 175) e, no período de desenvolvimento e implementação do plano,

disponibilizar assessoria técnica, jurídica e social à população moradora (§ 2º). Em

todas as ZEIS, deverão ser constituídos Conselhos Gestores compostos por

“representantes dos atuais ou futuros moradores e do Executiva, que deverão

participar de todas as etapas de elaboração do Plano de Urbanização e de sua

implementação” (§ 1º).

Segundo Villaça (2005, p. 42), o Plano Diretor Estratégico do Município é

formado, basicamente, por um conjunto de princípios e conceitos, bem como por

dispositivos que devem ser cumpridos pelo Poder Executivo e pelo setor privado.

Embora tenha avançado na incorporação de propostas dos setores populares,

o PDEM incorpora propostas e interesses do setor imobiliário, que são contrários à

outorga onerosa37 e favoráveis à ampliação de coeficientes de aproveitamento de

determinadas regiões e de setores compostos pelas classes médias e altas que

defendem zonas exclusivamente residenciais.

37

A outorga onerosa do direito de construir, também conhecida como “solo criado”, refere-se à concessão emitida pelo município para que o proprietário de um imóvel edifique acima do limite estabelecido pelo coeficiente de aproveitamento básico, mediante contrapartida financeira a ser prestada pelo beneficiário. Disponível em: <http://www.urbanidades.arq.br>.

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71

Os dispositivos que cabem ao Poder Executivo dizem respeito à execução de

obras ou providências que devem ser encaminhadas. “Tradicionalmente, os

dispositivos que cabem ao setor privado são o zoneamento e o loteamento”

(VILLAÇA, 2005, p. 43), sendo que o PDEM fornece os instrumentos para a

execução dos mesmos.

Os instrumentos de gestão urbana e ambiental estão definidos no PDEM nos

artigos 198 a 256.38

Instrumentos urbanísticos são objetos técnico-jurídicos elaborados como elementos integrantes da formulação de políticas públicas urbanas. Embora concebidos em um contexto específico, são ferramentas que transcendem gestões político-partidárias e podem prestar-se a fim diferentes daqueles para os quais foram concebidos (SOUZA, 2011, p. 19).

Dentre eles, destacamos a concessão urbanística que será regulamentada,

na cidade de São Paulo, para as primeiras ações do Projeto Nova Luz.

Apesar de esse instrumento não estar previsto no Estatuto da Cidade, o

jurista Paulo Lomar (apud SOUZA, 2011, p. 28) o define como “uma espécie de

concessão de obra pública, por meio do qual o Poder Público transfere ao agente

privado a tarefa de executar operações urbanas”.

O artigo 239 do PDEM autoriza o Poder Executivo, mediante licitação, a

autorizar e delegar a realidade de obras de urbanização e reurbanização para

empresas ou um conjunto de empresas, através dos consórcios. Incluem-se nessas

obras o “loteamento, reloteamento, demolição, reconstrução e incorporação de

conjunto de edificações”.

38

Disciplina de parcelamento, uso e da ocupação do solo; gestão orçamentária e participativa; planos regionais; planos locais de bairro; programas e projetos elaborados em nível local; Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) progressivo no tempo; contribuição de melhoria; incentivos e benefícios fiscais e financeiros; desapropriação; servidão e limitações administrativas; tombamentos e inventários; concessão urbanística; concessão de direito real de uso; concessão de uso especial para fim de moradia; parcelamento, edificação ou utilização de compulsórios; consórcios imobiliários; direito de superfície; usucapião especial de imóvel urbano; direito de preempção; outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso; transferência do direito de construir; operações urbanas consorciadas; regularização fundiária; assistência técnica e jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociais menos favorecidos; referendo popular e plebiscito; relatórios de impacto ambiental e de impacto de vizinhança; Fundo de Desenvolvimento Urbano; negociação e acordo de convivência; licenciamento ambiental; avaliação de impactos ambientais; certificação ambiental; Termo de Compromisso Ambiental; Termo de Ajustamento de Conduta; Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável; Plano de Circulação Viária e Transporte; estabelecimento de padrões de qualidade ambiental; incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologia, voltados à melhoria da qualidade ambiente; criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público Municipal; Sistema Municipal de Informações sobre o Meio Ambiente; Relatório de Qualidade do Meio Ambiente; e Zoneamento Ambiental.

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O parágrafo primeiro estabelece que a empresa concessionária poderá obter

sua remuneração mediante exploração dos terrenos e edificações destinado a usos

privados e da renda da exploração dos espaços públicos (grifos nossos). Ficará,

também, por conta da empresa concessionária, o pagamento das indenizações

devidas por conta das desapropriações e pela aquisição de imóveis necessários à

realização das obras (parágrafo 2º).

Segundo Souza (2011, p. 33), durante as discussões sobre o Plano Diretor

questionou-se muito pouco o instrumento de concessão urbanística, pois “ninguém

tinha clareza que instrumento era aquele”, ocorrendo sua inclusão sem o

detalhamento da sua operacionalização, das situações em que poderia ser aplicado

e em que áreas da cidade, o que será retomado na discussão da lei que

regulamentará o instrumento, posteriormente.

O PDEM destaca, também que, para a gestão participativa e democrática da

cidade, é assegurada a “participação direta da população em todas as fases da

gestão democrática” (artigo 279) através das Conferências Municipais de

Desenvolvimento Urbano, as Assembleias Regionais de Política Urbana; o Conselho

Municipal de Política Urbana; as audiências públicas; os projetos de lei de iniciativa

popular; os conselhos reconhecidos pelo Poder Municipal; as assembleias e

reuniões de elaboração do Orçamento Municipal; os programas e projetos com

gestão popular; e as comissões de legislação participativa da Câmara Municipal de

São Paulo.

3.4 O Conselho Municipal de Política Urbana, as Conferências Municipais de

Desenvolvimento Urbano e o Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano

O PDEM estabelece que as Conferências Municipais de Política Urbana

devam ocorrer, ordinariamente, a cada dois anos (artigo 282). Tem como função

apreciar as diretrizes da Política Urbana e sugerir adequações das ações ao

Executivo, bem como propostas de alteração da Lei do Plano Diretor (artigo 283).

Os dados das Conferências Municipais foram obtidos a partir da segunda,

realizada em 200339, onde foram elaborados documentos que definiram novas

diretrizes para a política urbana da cidade, propondo soluções aos principais

39

Informações sobre as Conferências da Cidade de São Paulo disponíveis em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br>.

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problemas nas áreas de habitação, saneamento ambiental, transportes e mobilidade

urbana. Buscou-se identificar os principais problemas da cidade, através da voz dos

diversos segmentos, sugerindo possibilidades de melhorias.

A terceira conferência, ocorrida no ano de 2005, teve como objetivo central

elaborar uma política de ação urbana, buscando atuações conjuntas e participação

efetiva da sociedade civil.

A quarta conferência, em 2007, teve como objetivo incentivar a interlocução

entre municípios, Estado e Governo Federal, e estimular a participação da

sociedade na construção de metas para o desenvolvimento humano.

E, em 2009, ocorreu a quinta conferência da cidade de São Paulo, precedida

de reuniões preparatórias nas cinco regiões de São Paulo. As discussões da

conferência foram organizadas em quatro eixos: participação e controle social;

aplicação dos instrumentos de planejamento e gestão urbana; gestão integrada da

política urbana no território: Agenda 21; oportunidades para o desenvolvimento

urbano.

O Conselho Municipal de Política Urbana, previsto no artigo 284 do PDEM,

tem por competência:

I ‒ debater relatórios anuais de Gestão da Política Urbana;

II ‒ analisar questões relativas à aplicação do Plano Diretor Estratégico;

III ‒ debater propostas e emitir parecer sobre proposta de alteração da Lei do Plano Diretor Estratégico;

IV ‒ acompanhar a implementação dos objetivos e diretrizes do Plano Diretor Estratégico e a execução dos planos, programas e projetos de interesse para o desenvolvimento urbano e ambiental;

V ‒ debater diretrizes e acompanhar a aplicação dos recursos do FUNDURB;

VI ‒ acompanhar o Planejamento e a Política de Desenvolvimento Urbano do Município;

VII ‒ coordenar a ação dos Conselhos Setoriais do Município, vinculados à política urbana e ambiental;

VIII ‒ debater as diretrizes para áreas públicas municipais;

IX ‒ debater propostas sobre projetos de lei de interesse urbanístico;

X ‒ elaborar e aprovar regimento interno (artigo 285).

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Também institui a Câmara Técnica de Legislação Urbanística com as

atribuições principais de analisar e dirimir dúvidas na aplicação da legislação de

parcelamento e uso do solo; emitir parecer técnico sobre propostas de alteração do

Plano Diretor e da legislação de parcelamento e uso do solo; apoiar tecnicamente o

Conselho Municipal de Política Urbana, entre outras.

O Decreto nº 43230, de 22 de maio de 2003, regulamentou o Conselho

Municipal de Política Urbana da Cidade de São Paulo e a Câmara Técnica de

Legislação Urbanística40 com o objetivo, principal, de debater a política urbana do

município de São Paulo.

A composição do Conselho será de 48 membros (artigo 3), sendo 16

representantes das macrorregiões Norte 1, Norte 2, Oeste, Centro, Leste 1, Leste 2,

Sul 1 e Sul 2, sendo 8 indicados pela sociedade civil e 8 pelo Executivo Local.

Também 16 representantes indicados por entidades representativas de setores

econômicos e profissionais, por movimentos sociais e entidades da sociedade civil; e

16 representantes de órgãos públicos municipais. Os representantes da população

das macrorregiões serão eleitos por um mandato de dois anos, permitida a reeleição

por uma única vez (artigo 4). As reuniões do Conselho Municipal de Política Urbana

ocorrerão, ordinariamente, a cada três meses e, extraordinariamente, quando

necessário.

O Decreto também instituiu a Câmara Técnica de Legislação Urbanística,

formada, paritariamente, por representantes do Poder Executivo e da sociedade

civil, “propostos pelo Secretário Municipal de Planejamento Urbano ao Conselho

Municipal de Política Urbana, para apreciação e subseqüente designação pela

Prefeita” (artigo 14, parágrafo 1).

A atual gestão do Conselho Municipal de Política Urbana foi eleita em 19 de

junho de 2011, com representação das 8 Macrorregiões.

Também o Plano Diretor Estratégico prevê a criação do Fundo de

Desenvolvimento Urbano (FUNDURB), com a finalidade de “apoiar ou realizar

investimentos destinados a concretizar os objetivos, diretrizes, planos, programas e

projetos urbanísticos ambientais integrantes ou decorrentes da Lei do Plano Diretor

Estratégico” (artigo 235). O Fundo será administrado por um Conselho Gestor,

40

O Decreto nº 43.386, de 25 de junho de 2003, alterou o inciso VIII do parágrafo único do artigo 4º do Decreto nº 43.230. O Decreto nº 43.415, de 2 de junho de 2003, altera o artigo 4º do Decreto nº 43.230.

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75

formado por membros indicados pelo Executivo, garantida a participação da

sociedade (§ 1º).

Os recursos do FUNDURB serão aplicados na execução de programas e

projetos de interesse social; no transporte coletivo público urbano, no ordenamento e

direcionamento da expansão urbana; implantação de equipamentos urbanos e

comunitários, espaços de lazer e áreas verdes; proteção de áreas de interesse

histórico, cultural ou paisagístico; e na criação de unidades de conservação ou

proteção de áreas de interesse ambiental.

O Fundo foi regulamentado pelo Decreto nº 47.661, de 6 de setembro de

2006, com alterações no Decreto nº 51.437, de 26 de abril de 2010, e tem por

finalidade apoiar ou realizar investimentos destinados a concretizar os objetivos,

diretrizes, planos, programas e projetos urbanísticos e ambientais integrantes ou

decorrentes do Plano Diretor.

As receitas do Fundo serão provenientes de: dotações orçamentárias e

créditos suplementares; repasses ou dotações de origem orçamentária da União ou

do Estado de São Paulo; empréstimos ou operações de financiamento interno ou

externos; doações de pessoas jurídicas ou físicas e entidades internacionais;

acordos, contratos, consórcios e convênios, entre outros.

O Conselho Gestor do FUNDURB é formado pelo Secretário Municipal de

Desenvolvimento Urbano, de Planejamento, de Finanças, do Verde e do Meio

Ambiente, de Habitação, de Infraestrutura Urbana e Obras, do Governo Municipal,

de Coordenação das Subprefeituras, de Transportes e de Cultura; e por três

representantes do Conselho Municipal de Política Urbana.

Os conselhos de desenvolvimento urbano, as conferências de política urbana,

os debates, as consultas e audiências são instrumentos que podem romper com as

relações clientelistas que permeiam os investimentos de infraestrutura nos bairros.

Estes instrumentos podem interceptar assim a relação tradicional, que é a da corrupção na Câmara, para aprovar alterações no zoneamento, alterar determinadas leis de ocupação do solo, que privilegiam setores e determinadas áreas da cidade. E podem, ainda, estabelecer um diálogo e uma negociação em um jogo de atores mais direto (CYMBALISTA, 2001, p. 194).

O PDEM também estabeleceu a necessidade de o Executivo encaminhar ao

Legislativo a Lei de Uso e Ocupação do Solo e os Planos Regionais, até 2003, e a

revisão da PDEM até 2006.

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O Plano Diretor Estratégico Municipal foi elaborado para um período de 10

anos (2002 a 2012), passando por uma revisão em 2003 para inclusão dos Planos

Regionais das Subprefeituras. Sua revisão deveria ter acontecido no ano de 2006,

com o Executivo encaminhando à Câmara Municipal o projeto de revisão.

No ano de 2007, o Executivo Municipal encaminhou à Câmara dos

Vereadores o Projeto de Lei da Revisão, organizando-se 45 audiências públicas,

coordenadas pelo Executivo Municipal e pelas Comissões da Câmara, para a

discussão do Plano nas diversas regiões da cidade.

A votação da revisão mobilizou movimentos sociais e entidades que

defenderam a não revisão, pois o atual plano não foi efetivamente implantado. Em

2010, a revisão do plano se tornou inválida por decisão do juiz Marcos de Lima

Porta, da 5ª Vara da Fazenda Pública, em ação civil pública movida pela União dos

Movimentos de Moradia da Grande São Paulo e interior. A ação alega que a revisão

deixou de observar os princípios da gestão democrática da cidade e da participação

popular, restringindo a participação dos cidadãos na votação do projeto de lei da

revisão. A sentença considera que

A gestão democrática impõe à municipalidade que, do início até o término dos trabalhos do plano diretor, realize campanhas massivas de conscientização e convocação dos munícipes, não só para audiências públicas, mas sim, para promover a sua devida participação no processo administrativo como um todo.

Um dos pontos polêmicos do projeto de revisão do Executivo está na

alteração das regras de uso do solo em benefício da expansão imobiliária,

permitindo ou restringindo construções em algumas áreas.

A necessidade de revisão do Plano Diretor foi um dos pontos levantados

durante as audiências públicas do Projeto Nova Luz, tendo em vista a necessidade

de regulamentar um instrumento urbanístico ainda não aplicado na cidade de São

Paulo.

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3.5 Os Planos Regionais Estratégicos das Subprefeituras e a Lei de Uso e

Ocupação do Solo (Zoneamento)

O zoneamento é a prática mais antiga de planejamento urbano existente no

Brasil na regulação do uso do solo. Com a urbanização, além da ocupação do solo, o

zoneamento passou a classificar a intensidade do uso do solo, ou seja, o porte dos

edifícios a serem construídos, criando-se o coeficiente de aproveitamento do solo.

A partir de 1972, o zoneamento do município de São Paulo passou a abranger

a totalidade do seu território e de suas atividades.

Zoneamento é um mecanismo urbanístico antigo e difundido no Brasil. Oculta sua finalidade que é (e sempre foi) proteger o meio ambiente e os valores imobiliários de interesse (econômico ou de moradia) da minoria mais rica, contra processos que o degradam (VILLAÇA, 2005, p. 47).

O Executivo Municipal encaminhou os Projetos para a Lei de Zoneamento e

dos Planos Regionais, PL nº 529/03 e PL nº 522/03, respectivamente. Com os

debates das audiências públicas, criou-se um substitutivo com a fusão de ambos, o

PL nº 139/04.

Para a aprovação desse projeto, audiências públicas foram organizadas pelo

Executivo Municipal e pelas Comissões de Constituição e Justiça e Política Urbana,

Metropolitana e Meio Ambiente da Câmara dos Vereadores. O substitutivo foi

aprovado em 25 de agosto de 2004, dando origem à Lei nº 13.885, que “estabelece

normas complementares ao Plano Diretor Estratégico, institui os Planos Regionais

Estratégicos (PRE) das Subprefeituras e, dispõe sobre o parcelamento e disciplina e

ordena o uso e ocupação do solo” (artigo 1º).

A Lei nº 13.885 está estruturada em três partes: a primeira, estabelece as

normas complementares ao PDEM; a segunda, institui os planos regionais; e, a

terceira, dispõe sobre o parcelamento, disciplina e ordena o uso e ocupação do solo.

A Parte I apresenta diversos acréscimos ao PDEM, dentre eles, no título da

Gestão Democrática, a inclusão dos Conselhos de Representantes, previstos na Lei

Orgânica do Município, como participantes da gestão democrática da Política

Urbana Regional, com as atribuições de (artigo 41):

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I ‒ acompanhar, no âmbito do território da Subprefeitura, a aplicação do respectivo Plano Regional Estratégico e da ordenação e disciplina de Uso e Ocupação do Solo constantes da Parte III desta lei, bem como de outras legislações pertinentes;

II ‒ acompanhar a elaboração dos Planos de Bairros;

III ‒ opinar sobre planos e projetos específicos integrantes do Plano Regional Estratégico;

IV ‒ encaminhar propostas de Planos de Bairros e de revisão do PRE;

V ‒ opinar sobre os Projetos Urbanos das Áreas de Intervenção Urbana Estratégica;

VI ‒ opinar sobre os Projetos Estratégicos da região.

Esses Conselhos e as subprefeituras poderão propor Planos Estratégicos e

Planos de Bairro, com o objetivo de detalhar as diretrizes definidas pelos Planos

Regionais Estratégicos (artigo 42). Os Planos de Bairro poderão propor ações de

complementação da infraestrutura básica; implantação de equipamentos sociais;

soluções para o controle de tráfego; melhoria das condições de circulação de

pedestres; requalificação das calçadas; medidas para maior limpeza, arborização e

jardinagem de praças e ruas, para melhoria da coleta de lixo, da acessibilidade dos

equipamentos públicos e da qualidade ambiental; soluções para o atendimento da

população de rua; e adoção do perímetro de segurança no entorno das unidades

educacionais.

Os PREs deverão passar por revisão, por ocasião da revisão do PDEM, em

um processo democrático e participativo.

Na parte II, os PREs são definidos como “instrumentos determinantes das

ações dos agentes públicos e privados no território de cada Subprefeitura”,

constituindo-se como partes complementares do Plano Diretor Estratégico do

Município de São Paulo (artigo 48).

Os PREs devem considerar as desigualdades regionais, contemplando

proposições relativas às especificidades próprias em função da sua localização e

das articulações inter e intraurbanas, definindo no plano urbanístico-ambiental os

aspectos físicos, territoriais e sociais (artigos 49 e 50).

O Desenvolvimento Econômico e Social de cada Subprefeitura (...) é expressão de potencialidades econômicas, locais e sociais, de problemas decorrentes de investimentos desiguais ao longo dos anos, de peculiaridades próprias de cada região e de necessidades e opções da população que nela reside ou trabalha (artigo 52).

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A Lei apresenta a Política de Desenvolvimento Urbano Ambiental para cada

Macrorregião da cidade, a qual vamos destacar, por se tratar da região onde se

insere o Projeto Nova Luz, a região do centro. A mesma possui como objetivo para a

região central do município (artigo 89):

I ‒ estimular a instalação de atividades diversificadas de alta tecnologia, de atração nacional e internacional, reforçando o papel de centro metropolitano e de cidade mundial;

II ‒ fortalecer as funções turísticas de entretenimento, lazer, cultura e de negócios;

III ‒ reforçar a diversificação de usos na área central da cidade, incentivando o uso habitacional e atividades culturais e de lazer;

IV ‒ resgatar, valorizar e incentivar a preservação do patrimônio histórico, cultural e ambiental urbano, consolidando a identidade do centro metropolitano;

V ‒ recuperar áreas degradadas, em especial aquelas ocupadas por habitações precárias;

VI ‒ incentivar a multiplicidade de usos, por meio de instrumentos que permitam o aproveitamento do estoque imobiliário ocioso;

VII ‒ estimular a alteração de uso das edificações existentes para as necessidades específicas, segundo distritos da Subprefeitura;

VIII ‒ estimular a produção de novas unidades habitacionais para diferentes faixas de renda e destinadas a diferentes composições familiares.

Em relação às propostas na Rede Viária Estrutural, ou seja, aquelas que

garantem a interligação entre as Subprefeituras, são citadas a requalificação das

vias e espaços públicos que compõem o Programa Monumenta Luz; a implantação

de uma ligação na Avenida Ribeiro de Lima com Avenida Duque de Caxias,

passando sob o Jardim da Luz e a estrada de ferro; e a implantação de garagens

subterrâneas (artigo 89).

A Operação Urbana Centro, o Programa de Reabilitação da Área Central –

Ação Centro e o Programa Monumenta Luz, são definidos como instrumentos de

Intervenções Urbanas Regionais Estratégicas41 na promoção de transformações

urbanísticas (artigo 92).

A parte III apresenta, inicialmente, os objetivos, a conceituação e as

estratégias que ordenam o parcelamento, o uso e a ocupação do solo, conforme o

Plano Diretor Estratégico do Município.

A disciplina de uso e ocupação do solo tem por finalidade assegurar a

localização adequada para as diferentes funções e atividades urbanas; proporcionar

41

Esses Programas serão detalhados no capítulo 4 e 5 sobre os programas de intervenção na região central e no bairro da Luz.

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distribuição mais equilibradas das atividades econômicas; preservar e melhorar a

qualidade de vida urbana de toda a população; estimular e orientar o

desenvolvimento urbano; assegurar fluidez e o desempenho do sistema de

circulação, entre outros (artigo 95).

Conforme PDEM, o município é dividido em duas Macrozonas, de Proteção

Ambiental e de Estruturação e Qualificação Urbana. Essas macrozonas são

estruturadas em Zonas Especiais, enquanto porções do território com diferentes

características ou com destinação específica.42

Para a disciplina do uso e ocupação do solo, a Macrozona de Proteção

Ambiental subdivide-se nas seguintes zonas de uso (artigo 101): Zona Mista de

Proteção Ambiental (ZMp), Zona de Proteção e Desenvolvimento Sustentável

(ZPDS), Zona de Lazer e Turismo (ZLT), Zona exclusivamente Residencial de

Proteção Ambiental (ZERp), Zona Especial de Preservação (ZEP), Zona

Centralidade Polar de Proteção Ambiental (ZCPp), e Zona Centralidade Linear de

Proteção Ambiental (ZCLp).

A Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana é subdivida em quatro

Macroáreas – Reestruturação e Requalificação Urbana, Urbanização Consolidada,

Urbanização em Consolidação e Urbanização e Qualificação – passando a ser

subdivida também em zonas de uso (artigo 107): Zonas Exclusivamente

Residenciais (ZER), Zonas Predominantemente Industriais (ZPI), Zonas Mistas (ZM),

Zonas Centralidade Polar (ZCP), Zonas de Centralidade Linear (ZCL), Zonas

Centralidade Linear Lindeira ou interna à ZER (ZCLz), Zonas de Transição Linear da

ZER (ZTLz), e Zonas de Ocupação Especial (ZOE).

Dentre as Zonas Especiais, destacamos a Zona Especial de Preservação

Cultural (ZEPEC) e a Zona de Interesse Social (ZEIS), por sua localização no

perímetro do Projeto Nova Luz.

As ZEPEC são áreas do território “destinadas à preservação, recuperação e

manutenção do patrimônio histórico, artístico, arqueológico, podendo se configurar

como sítios, edifícios ou conjuntos urbanos” (artigo 114). As ZEPEC classificam-se

em três subgrupos (artigo 117), sendo que qualquer intervenção nos imóveis deve

42

Zona Especial de Preservação Ambiental – ZEPAM; Zona Especial de Preservação Cultural – ZEPEC; Zona Especial de Produção Agrícola e de Extração Mineral – ZEPAG; Zona Especial de Interesse Social – ZEIS; Zona Especial de Preservação – ZEP; Zona de Ocupação Especial – ZOE.

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ser regulamentada pelo Executivo com as devidas orientações dos órgãos de

preservação:

I ‒ Bens Imóveis Representativos (BIR) – imóveis ou conjuntos de imóveis de caráter histórico ou de excepcional valor artístico, cultural ou paisagístico, inclusive os que tenham valor referencial para a comunidade;

II ‒ Áreas de Urbanização Especial (AUE) – Conjuntos urbanos com características homogêneas de traçado viário, vegetação e índices urbanísticos, que constituem formas de urbanização de determinada época, que devem ser preservados por suas qualidades ambientais;

III ‒ Áreas de Proteção Paisagística (APP) – sítios e logradouros com características ambientais, naturais ou antrópicas, tais como: parques, jardins, praças, monumentos, viadutos, pontes, passarelas e formações naturais significativas, entre outras.

Os imóveis classificados como ZEPEC/BIR poderão ter isenção do Imposto

Predial e Territorial Urbano (IPTU) como incentivo à conservação ou restauro,

dependendo do projeto de restauro ou recuperação e do estado de conservação do

imóvel (artigo 119). Esses projetos poderão receber patrocínio de pessoas físicas e

jurídicas, que poderão pleitear incentivo fiscal (artigo 121); porém, esses incentivos

não se aplicam aos imóveis enquadrados como ZEPEC situados nos Distritos da Sé

e República (artigo 123).

A demolição, destruição proposital ou causada pela não conservação ou

descaracterização do imóvel enquadrado como ZEPEC acarretará a aplicação de

multa, a extinção da faculdade de transferência do potencial construtivo e o

cancelamento das isenções. Nesses lotes remanescentes de demolição ou

destruição do imóvel, somente será permitida a construção de edificação para uso

residencial; proibindo-se qualquer uso não residencial, a instalação de estações de

transmissão de telefonia fixa ou móvel, de anúncios e de remembramento ou

desdobro de lote (artigo 171).

As Zonas de Interesse Social (ZEIS) são formadas por lotes e glebas não

edificados; terrenos ocupados por favela; imóveis utilizados como cortiço; habitações

coletivas precárias; conjuntos habitacionais irregulares ocupados por moradores de

baixa renda; edificações deterioradas; lotes e glebas com área superior a 250 m2

nos quais o coeficiente de aproveitamento não atingiu o mínimo definido para a zona

que se situam; e as edificações em lotes ou glebas com área de terreno superior a

500 m2 e que tenham, no mínimo, 80% de sua área construída desocupada há mais

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de cinco anos; e os parcelamentos do solo e loteamentos irregulares ocupados por

moradores de baixa renda (artigo 136).

A Lei de Zoneamento também classifica o uso do solo do município de São

Paulo em duas categorias: Uso Residencial (R), que envolve a moradia; e Uso Não

Residencial (nR), que envolve o desenvolvimento de atividades comerciais, de

serviços, industriais e institucionais (artigo 150). Essas categorias são subdividas,

indicando-se as macrozonas e zonas especiais para sua instalação (artigos 151 a

173).

Quanto à participação da sociedade na implementação dos dispositivos da lei,

o artigo 1246 determina que os projetos de lei originários do Executivo “que

proponham alterações nos perímetros de zonas de uso ou caracterização de novos

perímetros, serão submetidos ao Conselho Municipal de Política Urbana

previamente ao seu encaminhamento à Câmara Municipal”.

3.6 O Plano Regional Estratégico da Subprefeitura da Sé

Conforme artigo 273 do PDEM, os planos regionais devem ser elaborados

pelas Subprefeituras com a assessoria técnica da Secretaria Municipal de

Planejamento Urbano (SEMPLA) e da Secretaria das Subprefeituras. A participação

popular está garantida, no parágrafo terceiro, em cada etapa do plano, ou seja, no

diagnóstico, concepção, aprovação, monitoramento, fiscalização e revisão de todas

as ações, com a disponibilização de todas as informações pelo Executivo Municipal.

O Plano Regional Estratégico da Subprefeitura Sé, anexo IX, livro IX, da Lei

nº 13.885/2004, divide-se em três títulos: das políticas públicas regionais, do plano

urbanístico-ambiental e do uso e ocupação do solo.

O PRE Sé estabelece os objetivos e as diretrizes de desenvolvimento

econômico, social, urbano e ambiental e de qualidade de vida, visando

(...) à correção dos desequilíbrios sociais e entre distritos, buscando alcançar o desenvolvimento harmônico da região, por meio de Projetos Estratégicos, Programas de Requalificação, Áreas de Intervenção Urbana e pela Operação Urbana Centro (artigo 1º).

Dentre os objetivos de desenvolvimento urbano e ambiental da região,

destacam-se (artigo 2º):

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Estimular a instalação de atividades diversificadas de alta tecnologia, de atração

nacional e internacional, reforçando o papel de centro metropolitano e de

cidade mundial (I) (grifo nosso),

Fortalecer as funções turísticas de entretenimento, lazer, cultura e negócios (II),

Valorizar e incentivar a preservação do patrimônio histórico, cultural e ambiental

urbano, consolidando a identidade do centro metropolitano (V),

Implementar o Programa de Reabilitação da Área Central – Ação Centro – nos

distritos da Sé, República, Cambuci, Bela Vista, Consolação, Santa Cecília, Bom

Retiro e Liberdade (VI), visando a:

a. Recuperação do ambienta urbano, em especial das áreas degradadas, por meio do incremento das atividades de zeladoria da Subprefeitura, da requalificação de edifícios de interesse histórico, do controle de inundações e do tratamento de resíduos sólidos recicláveis (grifo nosso);

b. Melhoria na circulação e dos transportes;

c. Reversão da desvalorização imobiliária e recuperação da função residencial;

d. Transformações do perfil econômico e social, por meio de ações de fomento da pluralidade econômica, da inclusão social, da segurança urbana e da cultura (grifo nosso).

Recuperar áreas degradadas, em especial aquelas ocupadas por habitações

precárias (XII);

Modernizar e tornar mais eficiente o sistema de iluminação pública no centro

(XVI).

O desenvolvimento econômico e social da região (artigo 3º) prevê o

aproveitamento do estoque imobiliário ocioso da região; o estímulo à produção de

unidades habitacionais para diferentes faixas de renda; o resgate do espaço público

para a apropriação coletiva; o apoio à organização dos grupos econômicos

instalados nos espaços centrais; a ampliação da oferta de habitação de interesse

social, entre outros.

Para o pleno desenvolvimento humano e qualidade de vida, o plano (artigo 4º)

prevê que seja assegurado o pleno direito à moradia digna para população de

baixa renda (grifo nosso); a complementação da rede de equipamentos sociais para

atendimento das novas famílias; criação de mecanismos de capacitação e formação

profissional, bem como de geração de emprego e renda residente no território; a

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readequação de abrigos e albergues públicos, incluindo novas abordagens e

metodologias de atendimento; e o reforço à segurança urbana com instalação de

bases comunitárias de segurança.

Para o desenvolvimento urbano com qualidade ambiental, o PRE tem por

objetivo (artigo 5º): implementar obras de melhoria urbana; valorizar a paisagem

urbana e melhorar a infraestrutura; assegurar a visibilidade dos bens tombados;

“promover intensas e extensas ações para diminuir os graves problemas ambientais

de drenagem, poluição atmosférica, poluição do solo, sonora e de desconforto

térmico, adotando planos e programas de gestão ambiental” (VIII).

O PRE estabelece objetivos, diretrizes e ações estratégicas para os

elementos estruturadores da subprefeitura, dos quais iremos destacar aqueles que

se relacionam ao bairro da Luz.

Em relação à rede estrutural hídrica ambiental, o plano tem como diretriz as

ações para manter a permeabilidade do solo e melhorar a drenagem urbana,

evitando alagamentos, bem como a arborização de espaços públicos para diminuir o

desconforto térmico e a poluição atmosférica.

Para a rede viária estrutural, o PRE estabelece melhorias adequadas aos

planos urbanísticos e projetos de intervenção, dentre as quais:

Promover o rebaixamento das vias centrais da Avenida Tiradentes nas proximidades da Rua São Caetano até a proximidade do Museu de Arte Sacra, privilegiando o pedestre, na área de influência do “Programa Monumenta Luz” (I);

Implantar a ligação da Avenida Ribeiro de Lima com Avenida Duque de Caxias, passando sob o Jardim da Luz e a estrada de ferro operada pelo CPTM, para permitir o fechamento da contra-rótula através da Rua João Teodoro, garantindo maior conforto ao percurso do pedestre na área de influência do “Programa Monumenta Luz” (II).

Para a rede estrutural de transporte público e coletivo, o PRE apresenta como

propostas para o bairro da Luz, a necessidade de promover a gestão junto ao Metrô,

por ocasião de implantação da Linha 4, para o aproveitamento urbanístico das áreas

remanescentes de desapropriação; a readequação da Avenida Rio Branco e São

João com a melhoria das condições de tráfego, a qualificação do transporte coletivo,

da sinalização, da acessibilidade e do mobiliário urbano.

Conforme PDE, a Subprefeitura da Sé encontra-se integralmente contida na

Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana, prevendo diretrizes e ações

estratégicas para a região central, especialmente, para o bairro da Luz: implantar

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projetos paisagísticos; a Trilha Histórica no Centro de São Paulo; e o Circuito

Cultural no perímetro do Programa Monumenta Luz.

Em relação ao zoneamento, o PRE mantém os bairros e ruas das zonas

exclusivamente residenciais e industriais definidos no PDEM. Apesar de uma grande

variedade de habitações, comércios, serviços, escritórios e instituições, a faixa que

abarca o norte da Santa Cecília, o Bom Retiro, a República, a Sé, o norte da

Liberdade, o Cambuci, o núcleo central da Bela Vista e as quadras localizadas junto

à Paulista, predominam os usos não residenciais. Nos bairros de Higienópolis e

Pacaembu, localizados na Consolação, na Bela Vista e na Aclimação, localizadas

nas porções sul da Liberdade e do Cambuci, predominam os usos residenciais.

O centro é considerado zona de centralidade, e os empreendimentos a serem

realizados nas ZEPEC43, em especial aqueles que integram o Programa Monumenta

Luz, estão sujeitos a diretrizes dos órgãos de preservação do patrimônio cultural.

No perímetro do Projeto Nova Luz, insere-se uma Zona de Interesse Social 3

que, segundo Nakano (2004, p. 27), possui as seguintes definições:

‒ O coeficiente de aproveitamento mínimo é 0,3, o básico é 1 e o máximo é 4;

‒ No mínimo 50% da área a ser construída ou reformada em cada lote ou edificação deverá ser destinada à Habitação de Interesse Social (HIS), exceto nos lotes regulares com igual ou menor do que 500 m

2;

‒ A área máxima dos empreendimentos habitacionais multifamiliares horizontais e verticais é de 10.000 m

2;

‒ A exigência de recuo poderá ser dispensada desde que atendidas as boas condições de aeração e insolação;

‒ O aproveitamento do potencial construtivo acima do coeficiente básico até o coeficiente máximo 4 será gratuita para empreendimentos em que pelo menos 50% da área construída for destinada para HIS ou HMP.

Com essas definições para as ZEIS 3 nas áreas centrais, poderá haver um

significativo crescimento das habitações de interesse social, possibilitando que a

população de baixa renda tenha acesso à propriedade urbana. O aumento de

moradias demandará, também do Poder Público, a instalação de equipamentos para

efetivação das políticas públicas, assegurando desenvolvimento econômico com

desenvolvimento social da região.

43

Enquadram-se como Zonas Especiais de Preservação Cultural – ZEPEC as Unidades Urbanísticas Protegidas legalmente pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo – CONDEPHAAT, pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo – CONPRESP, e aquelas enquadradas como Z8-200 por lei municipal.

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O Plano Regional Estratégico da Sé define como áreas de intervenção

urbana: a Vila Buarque, o Parque Dom Pedro II e o Glicério, o Pari – Brás, a

Liberdade, a 23 de Maio e a Santa Ifigênia.

O PRE prevê também as ações do Programa Monumenta Luz, em parceria

com o Governo do Estado, para o restauro de edifícios de interesse histórico,

artístico e arquitetônico, e a requalificação dos espaços públicos; e dos Planos de

Reabilitação Integrada do Habitat com intervenções específicas em edificações

precárias ocupadas pela população de baixa renda.

O Plano propõe o estímulo aos proprietários, locatários e investidores a

promoverem a reabilitação de edificações e a construção de novos edifícios,

promovendo a reabilitação e qualificação dos espaços públicos com prioridade para

a zeladoria do quadrilátero formado pela Rua Sete de Abril, Rua Conselheiro

Crispiniano, Avenida São José e Avenida Ipiranga. Na Ferrovia Julio Prestes, o

objetivo é criar um parque linear envolvendo a faixa dos trilhos e a reurbanização do

seu entorno.

Para as Operações Urbanas Consorciadas, o PRE prevê que as mesmas

devem ser objeto de lei específica (artigo 45).

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PARTE II

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4 HISTÓRICO E CARACTERIZAÇÃO DA REGIÃO CENTRAL DE SÃO PAULO E

DO BAIRRO DA LUZ

4.1 Formação da Região Central

O centro histórico da cidade de São Paulo estruturou-se em torno das igrejas

do Carmo, São Francisco, São Bento e seus largos, sendo ocupado por um conjunto

de lojas e equipamentos culturais frequentados pela elite paulistana.

No final do século XIX e começo do século XX, passou por uma reforma

urbanística com a implantação do projeto do francês Bouvard, no vale do

Anhangabaú, que recebeu o Teatro Municipal e sua esplanada (1911), o Viaduto do

Chá (1892), o Viaduto Santa Ifigênia (1913) e o Mercado Municipal da Cantareira

(1932).

Também ocorreu o alargamento de suas ruas e a crescente ocupação do

Centro Novo (região em torno da Praça da República), com jardins, cafés, lojas e

equipamentos culturais. Essa região tornou-se expressão de um urbanismo moderno

destinado às elites em detrimento ao Centro Velho e às regiões periféricas em

formação na cidade.

É nesse momento que se constrói um dos primeiros fundamentos da ordem urbanística que governa a cidade, presente em alguma medida até nossos dias: uma região central investida pelo urbanismo, destinada exclusivamente às elites, contraposta a um espaço puramente funcional, normalmente “sem regra”, bem fora desse centro, onde se misturam o mundão do trabalho e da moradia dos pobres (ROLNIK, 2003, p. 17).

Em 1922, é realizado um conjunto de obras em comemoração ao centenário

da Independência, com a construção do Parque Dom Pedro II, na Várzea do Carmo;

da Avenida do Estado; do Parque da Independência; e do Museu do Ipiranga, que

valorizaram o centro, expulsando a população de baixa renda que constituía um

obstáculo para a expansão imobiliária da região (ELIAS, 2001, p. 63).

Em 1924, é inaugurado o primeiro arranha-céu, o Edifício Sampaio Moreira e,

em 1929, o Edifício Martinelli.

No final da década de 1930, mudanças significativas ocorrem no crescimento

da cidade com a substituição do transporte sobre trilhos pelos ônibus e automóveis,

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e pela formação de bairros afastados do centro, habitados pela população de baixa

renda, com seus imóveis construídos pelas próprias famílias.

A cidade, que se apresentava em estilo europeu, dá lugar a altos arranha-

céus e largas avenidas. Ocorre, também, a diminuição da imigração estrangeira e a

intensificação da migração interna, principalmente, de Minas Gerais, dos estados do

Nordeste e da própria região interiorana do estado.

A cidade contava com um único centro constituído de duas partes: o Centro

Tradicional (região do triângulo44), circunscrita pelas ruas Direita, XV de Novembro e

São Bento, e o Centro Novo, na região da Praça Ramos de Azevedo, Praça de

República, Rua Barão de Itapetininga e Avenida São Luiz.

A vida cultural, econômica e política de todos os grupos sociais da metrópole compartilhavam um espaço que abrigava simultaneamente a boca do lixo e a do luxo, a sede das grandes empresas e uma multidão de vendedores ambulantes, engraxates, pastores e pregadores do fim dos tempos; homens-sanduíche e magazines elegantes da Rua Barão de Itapetininga, os apartamentos luxuosos da Avenida São Luís e os chamados “treme-treme” feitos de kitchenettes e superpovoadas na baixada do Glicério e a Bela Vista (ROLNIK, 2003, p. 46).

Do ponto de vista urbanístico, os anos de 1970 marcaram o deslocamento do

centro de consumo das elites da região central em direção à Avenida Paulista e

Jardins. Tem início um processo de evasão de sedes de bancos e indústrias para a

Avenida Paulista.

A área urbana central assume progressivamente o setor da economia voltada

aos serviços, e os equipamentos públicos começam a exibir sinais de deterioração.

É nesse período, pela primeira vez na história, que o metro quadrado do Centro

Histórico deixa de ser o mais caro da cidade (conforme ROLNIK, 2003).

Também é nessa década que as intervenções viárias transformam o centro

da cidade em um nó articulador de toda a acessibilidade metropolitana.

Se por um lado essas grandes intervenções revelam a necessidade de atender à demanda por leito carroçável de uma São Paulo que priorizava o automóvel (o numero de automóveis multiplicou por dez entre 1960 e 1980), por outro lado a nova acessibilidade e a degradação espacial resultantes destas intervenções potencializaram a fuga das atividades de maior prestígio para o quadrante sudoeste da cidade (NAKANO, CAMPOS NETO; ROLNIK, 2004, p. 131).

44

Triângulo formado em torno das Igrejas do Carmo, São Bento e São Francisco.

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O metrô, ao fazer cruzar no centro as duas primeiras linhas da futura rede

(norte-sul e leste-oeste), confere à região grande acessibilidade para o transporte

público, com restrições de automóveis, implantação de calçadões, lançando as

bases para a popularização do centro e seu abandono progressivo pelas elites.

Na região central organiza-se, também, o ponto final das linhas radiais de

ônibus, que foram progressivamente ocupando partes das praças e parques da

região com terminais – Praça de Bandeira, Praça Pedro Lessa, Parque Dom Pedro,

Praça Princesa Isabel. A partir da década de 1980, foram implantados corredores de

ônibus em vias segregadas, que também têm como destino ou passagem a região

central.

A implantação dos calçadões, para responder ao grande fluxo de pedestres,

significou o aumento dos desequilíbrios no uso dos espaços: ruas superlotadas

durante o dia e abandonadas à noite, potencializando o esvaziamento para os usos

habitacionais. As dificuldades de acesso por táxi e automóvel já foram também

relacionadas à perda de estabelecimento comerciais e escritórios (conforme

NAKANO; CAMPOS NETO; ROLNIK, 2004, p. 136).

Na década de 1980, conforme Maricato (2001, p. 22), há a diminuição do

ritmo de crescimento da população urbana na região central, considerado como

negativo por alguns estudiosos, diminuindo o investimento no espaço público.

Majestoso pela sua história e seu patrimônio arquitetônico, o centro perde suas

principais estruturas econômicas e sofre com o esvaziamento de seus moradores,

tanto dos casarões tradicionalmente habitados pelos barões do café como dos que

conviviam em seu entorno.

O centro da cidade passa a ser ocupado por uma camada da população com

menor poder aquisitivo que buscava, principalmente, estar próxima ao trabalho, com

infraestrutura, fugindo do isolamento e da precariedade das regiões periféricas.

Casarões antigos são transformados em cortiços e ocupados de maneira irregular

ao longo dos anos; surgem dezenas de hotéis de alta rotatividade; o consumo de

drogas tem aumento expressivo; e a população em situação de rua passa a ocupar

calçadas e ruas. O Centro perde a importância do passado, ganhando os noticiários

apenas pelos altos índices de violência (KAMINSKI, 2001).

Apesar da desvalorização da região central, a mesma manteve o alto valor de

preço do solo, principalmente devido às possibilidades de uso comercial. A região

sedia, até hoje, o maior índice de empregos de toda a cidade. Por outro lado, deu-se

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91

um processo de abandono de equipamentos públicos, especialmente no sistema de

saúde e educação não universitária.

Porém, o abandono da área central pelas elites nunca foi total, principalmente

pelo valor simbólico e histórico das áreas centrais não ser reprodutível em outras

áreas. Em decorrência disso, foram investidos milhões na construção e reforma de

um conjunto arquitetônico e cultural na região central com a Sala São Paulo, a

Pinacoteca do Estado e o prédio do antigo Departamento de Ordem Política e Social

(DEOPS), pertencentes ao Governo do Estado de São Paulo. Também houve a

reforma do Prédio dos Correios, promovida pelo Governo Federal; a mudança da

prefeitura para um prédio no centro; a construção de um portal na Praça Patriarca,

entre outros investimentos.

4.2 As Intervenções do Poder Público na Região Central

Ao longo de sua história, o centro da cidade de São Paulo tem passado por

projetos de reestruturação que buscam adaptar a estrutura urbana existente a novos

usos e funções, como consequência do crescimento urbano e das mudanças

econômicas que acontecem na cidade como um todo.

Simões Júnior (1994, p. 31) identifica três períodos de intervenções

reestruturadoras e renovadoras no centro de São Paulo. No primeiro momento, nos

anos de 1920 a 1930, o centro passa por um grande projeto renovador visando

transformar a cidade, ainda com aspecto rural, em uma metrópole com padrões

europeus. Nesse período, a cidade de São Paulo tem sua economia e vida social

baseada na produção e exportação do café.

No segundo momento, nos anos de 1940 e 1950, a industrialização substitui o

ciclo econômico do café e o centro da cidade ganha edifícios, grandes avenidas,

automóveis, enfim, “eficiência na utilização do espaço e fluidez viária, paradigmas da

cidade voltada à produção de mercadorias no processo de industrialização”

(SIMÕES JÚNIOR, 1994, p. 31).

Por fim, o terceiro período, entre os anos de 1970 e 1980, em que a área

urbana central volta-se economicamente para o setor terciário de serviços e de

comércio. Ocorre a ocupação dos espaços públicos pelos pedestres através dos

calçadões; a valorização dos marcos históricos; a restauração de edificações de

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valor arquitetônico; o incentivo às atividades de lazer, cultura e turismo; e a

retomada do uso habitacional da região central.

Nesse período, surgem várias propostas de revitalização da área central da

cidade, visando readequar o espaço à chegada do metrô, em 1974. Os primeiros

projetos junto às estações de metrô remodelaram a Praça da Sé, incorporando a

Praça Clovis Bevilacqua e o Largo São Bento.

Em 1976, na gestão do prefeito Olavo Setúbal, é implantado o “Plano de

Revitalização do Centro”, que ampliou as ruas de uso exclusivo para pedestres;

reformou e restaurou o Edifício Martinelli, o Viaduto da Santa Ifigênia e o Pátio do

Colégio.

Ainda nesse período, é proposto um concurso visando a remodelação do Vale

do Anhangabaú, que “é transformado em uma imensa praça voltada ao lazer do

pedestre, recuperando em parte a sua função original quando de sua primeira

urbanização realizada por Bouvard45 na década de 1910” (SIMÕES JÚNIOR, 1994,

p. 38).

A obra é concluída em 1991, após quatro anos de interdições na área e um

custo estimado em US$ 150 milhões.

A remodelagem do Vale do Anhangabaú criou, também, a necessidade de

obras ao longo da Avenida São João, criando-se o Boulevard São João com a

implantação de calçadões entre as ruas Formosa e Conselheiro Crispiniano; de uma

avenida ligando a rua Conselheiro Crispiniano até a Avenida Duque de Caxias com

seu leito viário reduzido e as calçadas ampliadas, favorecendo o pedestre; e a

recuperação do Largo do Paissandu e da Praça Julio Mesquita.

Propostas também foram realizadas para a reurbanização do Parque Dom

Pedro II e a reforma do Palácio das Indústrias, abrangendo intervenções ao longo da

Avenida do Estado, de forma a transformá-la em uma alameda desde o Parque da

Independência até a Marginal Tietê, na altura do Campo de Marte, passando em seu

trajeto pelo Parque Dom Pedro II remodelado. A reforma do Palácio das Indústrias

foi concluída, mas a proposta original pouco avançou ao longo das últimas décadas.

Essas medidas, executadas durante o Governo Luiza Erundina (1989 a 1992),

propunham a volta ao centro, com programas habitacionais e de recuperação de

cortiços. Dois projetos de habitação social vertical foram realizados em 1990, em

45

Bouvard, Joseph Antoine arquiteto, nascido em Saint-Jean de Bournay, 1840, e falecido em Paris, 1920.

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sistema de mutirão e autogestão: o Conjunto Madre de Deus, da Mooca, e o

Conjunto Celso Garcia, no Brás.

Ao longo das décadas de 1990 e 2000, diversas propostas foram implantadas

visando organizar a paisagem urbana do centro, retirando o excesso de

equipamentos e mobiliários urbanos, bem como painéis e anúncios publicitários.

Estas propostas buscavam recuperar a qualidade ambiental para o cidadão, e é norteada não mais por aquele tipo de intervenção física transformadora do espaço, mas sim por uma nova abordagem onde se valoriza, se revitaliza e se recicla o que já existe mas que se encontra oculto ou imperceptível (Simões Júnior, 1994, p. 45).

O Governo do Estado de São Paulo também investiu na região central,

especialmente em equipamentos culturais, com a construção da Sala São Paulo; a

restauração do Teatro São Pedro; a reforma da Pinacoteca do Estado de São Paulo

e do Museu de Arte Sacra; a reforma do antigo edifício do Departamento de Ordem

Política e Social (DEOPS), que passou a ser o Memorial da Resistência; do Hotel

Piratininga, transformado no centro de estudos musicais Tom Jobim; a renovação do

Jardim da Luz e a instalação do Museu da Língua Portuguesa.

A instalação desses equipamentos culturais revelou, também, uma

priorização pela região do Centro Velho, especialmente, do bairro da Luz. Muitos

desses equipamentos culturais não são acessíveis à população residente nas

imediações, revelando medidas para a valorização imobiliária da região.

Outro investimento do Governo do Estado foi a construção da linha 4 do

metrô, que liga a região sudoeste da cidade à região central. A nova linha está

transformando a Estação da Luz no maior ponto de transbordo de transporte, com

conexões para as linhas de trem urbano.

Dentre as intervenções do Governo Municipal, nas décadas de 1990 a 2000,

podemos citar:

Programa Piloto de Ordenação da Paisagem da Área Central – eixo Sé-Arouche –

, que contou com a participação de comerciantes e empresários da região. O

projeto possibilitou a criação de novos critérios para a disposição de anúncios

publicitários46, bem como a restauração de fachadas de edifícios de valor histórico

46

Decreto nº 30.002 de 1991 cria normas complementares de intervenções relativas ao denominado Eixo Sé-Arouche, instituído pelo Decreto nº 29.851, de 21 de junho de 1991, e dá outras providências.

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com a concessão de incentivos aos proprietários, como a isenção parcial do

imposto predial e assessoria técnica permanente na execução da obra.

Operação Centro, com o objetivo de melhorar o padrão de limpeza e manutenção

dos logradouros, com a implantação de sistemas mecanizados de varrição e

lavagem de calçadas, calçadões e meios-fios, bem como a coleta permanente de

lixo em áreas centrais selecionadas.

Restaurações em edifícios públicos e em logradouros com a reforma do Teatro

Municipal, da Biblioteca Mario de Andrade, da Casa nº 1 e do Solar da Marquesa.

Também o restauro do Prédio dos Correios, do Edifício Sampaio Moreira na Rua

Líbero Badaró; do Largo do Café, entre outros.

Projeto Centro Sem Carros, proposta desenvolvida na Câmara Municipal em

1991, objetivando a melhoria da qualidade ambiental no centro da cidade e a

recuperação da sua paisagem, com a implantação de um programa de restrição à

presença de veículos na região. Essa proposta deu origem à Lei nº 11.317, de 21

de dezembro de 1992, autorizando a prefeitura a impor restrições à circulação de

veículos na área central da cidade, o que sempre gerou muitas polêmicas.

Ao mesmo tempo em que o centro passou a ser objeto da intervenção do

Poder Público, também a sociedade civil passou a se organizar para pautar sua

agenda de reivindicações.

Em 1991, foi inaugurada a Associação Viva o Centro (AVC), formada por

comerciantes e empresários da região que defendiam a valorização da região para

“usos econômicos das classes médias e altas, por meio da exploração do potencial

arquitetônico, urbanístico e simbólico da região” (CYMBALISTA, 2008, p. 14).

Segundo o sítio47 da Associação, seu objetivo é

(...) o desenvolvimento da Área Central de São Paulo, em seus aspectos urbanísticos, culturais, funcionais, sociais e econômicos, de forma a transformá-la num grande, forte e eficiente Centro Metropolitano, que contribua eficazmente para o equilíbrio econômico e social da Metrópole, para o pleno acesso à cidadania e ao bem-estar por toda a população.

Também nas décadas de 1980 e 1990, fortaleceram-se os movimentos de

moradia na região central que incorporaram em suas lutas não só a aquisição da

47

Disponível em: <http://www.vivaocentro.org.br>. Acesso em: 04 nov. 2011.

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moradia, mas, também, o direito de morar na região central. Organizaram-se a

Unificação das Lutas de Cortiços (1988), o Fórum dos Cortiços (1997), Movimento

de Moradia do Centro (1998), Movimento dos Sem Teto do Centro (2000) e outros

movimentos que passaram a organizar ocupações em prédios públicos e privados

no centro, influenciando na construção de programas habitacionais direcionados à

região central.

No final dos anos 1990, foi criado o Fórum Centro Vivo (FCV) como um

espaço de debate e articulação de pessoas ligadas às universidades, movimentos

populares, organizações não governamentais, etc. O FCV tem por objetivo

(...) articular todas as pessoas que lutam pelo direito de permanecer no Centro e transformá-lo num lugar melhor e mais democrático, contrapondo-se, assim, ao processo de renovação urbana e exclusão que vem ocorrendo em São Paulo.

48

Nesse contexto de tensões e disputas, em 1993, o prefeito Paulo Maluf lança

o Programa de Requalificação Urbana e Funcional do Centro de São Paulo –

PROCENTRO, ligado à Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano

(SEHAB) com o objetivo de deter o processo de declínio da região central,

principalmente nos distritos da Sé e da República.

Foi criada, também, a Comissão Executiva do Procentro, formada,

inicialmente, por dezesseis representantes de diversas secretarias, empresas

municipais e organizações não governamentais para a discussão dos problemas da

região central. Uma das ações desenvolvidas por essa comissão foi a elaboração de

um plano de mobilização de recursos locais e externos que previa a preparação e

envio de Carta Consulta ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para a

contratação de um empréstimo para custeio do Programa.

“A primeira versão desta Carta Consulta data de julho de 1996 e solicitava

autorização para realização de empréstimo de US$ 31,2 milhões do BID, com

contrapartida de US$ 20,8 milhões da Prefeitura” (CYMBALISTA, 2008, p. 17).

Em 1997, Celso Pitta assume a Prefeitura Municipal, gestão na qual o

PROCENTRO deu continuidade ao processo de aquisição de empréstimo do BID

elaborando outras versões do documento Carta Consulta, alterando os valores, mas

mantendo o mesmo embasamento, diagnóstico e propostas.

48

Disponível em: <http://www.centrovivo.com.br>. Acesso em: 04 nov. 2011.

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96

De acordo com Simões Júnior (1994, p. 58), o programa se organizou em seis

linhas de ação:

Restauração de fachadas e identificação do patrimônio histórico, arquitetônico e

cultural da região;

Melhoria da acessibilidade, dando nova orientação à circulação de pedestres, ao

transporte coletivo e de cargas e, principalmente, facilitando o acesso de veículos

particulares;

Reordenamento do mobiliário público, com a recuperação de calçadas,

iluminação, áreas verdes e regulamentando as atividades de ambulantes e da

limpeza pública;

Aumento da segurança com policiamento ostensivo e restrição de ambulantes;

Ampliação do perímetro referente à Operação Urbana Anhangabaú para uma

área bem maior, indo do Parque Dom Pedro II até o Largo do Arouche;

Incentivo às atividades culturais, de lazer e de turismo.

A proposta definia quinze polos prioritários de intervenção, onde eram

previstas as ações de recuperação do espaço público, como pisos e calçadas,

mobiliário urbano, garagens subterrâneas, intervenções viárias e restauros de

edificações históricas. As propostas concentravam-se nos distritos Sé e República,

com poucas intervenções no Pari, Zona Cerealista e na Luz.

A proposta constante da Carta Consulta previa a criação de um ambiente favorável aos investimentos privados e, delineava a possibilidade de financiamento ao setor pelo próprio BID, mencionando a possibilidade de criação posterior de um “modelo de financiamento de desenvolvimento de áreas centrais, no qual o agente financiador criasse linhas de crédito também àqueles do setor privado direta e indiretamente envolvidos com o Programa” (CYMBALISTA, 2008, p. 20).

49

49

Segundo Arantes (apud CYMBALISTA, 2008, p. 20), o modelo de renovação urbana definido pelos bancos multilaterais, com investimentos focalizados, agências gestoras e expectativas de captação tributária em áreas localizadas, inspira-se em grande parte nos distritos de negócios americanos, chamados Business Improvement Districts. Ainda segundo Leirner (apud CYMBALISTA, 2008, p. 21), as iniciativas de requalificação urbana com investimento concentrado, não apenas nas áreas centrais, mas nos distritos de negócios como um todo, têm cada vez mais como protagonistas governos locais que atuam como jogadores no mercado, captando ganhos direta ou indiretamente com a valorização imobiliária e a retomada dos negócios em determinada zona.

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A negociação da proposta junto ao BID desenvolveu-se durante quase todo o

período da gestão Pitta (1997-2000). Porém, a crise da dívida do município e as

denúncias de corrupção envolvendo a mesma, naquele momento, impediram a

assinatura do convênio entre o BID e a Prefeitura de São Paulo, que optou em

deixar a continuidade do processo para a próxima gestão.

A gestão Marta Suplicy, iniciada em 2001, enfatizou a necessidade de

reabilitação do centro, incorporando novos elementos e atores nas discussões e

propostas já realizadas: a descentralização administrativa com a criação de

subprefeituras com orçamento, técnicos e autonomia para construção de políticas

locais, e a implementação de uma política habitacional de moradias populares na

área central.

Iniciou-se, então, a formulação de um plano para toda a região central, que

deveria receber melhorias estruturais e sociais, sem que houvesse “usos a serem

substituídos ou necessidade de grandes intervenções urbanísticas e ressaltava-se o

imperativo da promoção da inclusão social” (CYMBALISTA, 2008, p. 25).

Em maio de 2001, foi lançado oficialmente o plano “Reconstruir o Centro”, que

previa recursos orçamentários de diversas secretarias sob coordenação da

Subprefeitura da Sé. Contudo, no contexto de crise financeira e de endividamento da

Prefeitura de São Paulo, as negociações junto ao BID foram retomadas.

Nesse período, mudanças ocorreram na coordenação geral do programa, que

foi transferido para a Empresa Municipal de Urbanismo (EMURB), que alterou o

projeto em função das pressões dos setores empresariais, restringindo o perímetro

de ação (distritos Sé e República e áreas adjacentes) e focalizando as ações e

recursos públicos para impulsionar novos investimentos privados na região central.

O Programa passou a se chamar “Ação Centro” e, a partir de 2002, passou por uma

revisão com consultoria do BID que exigiu “a adoção de modelo de administração e

gestão e interferiu no desenho de ações setoriais – especialmente a questão dos

programas habitacionais para baixa renda” (CYMBALISTA, 2008, p. 31).

Em outubro de 2003, o BID aprovou a concepção final do Programa “Ação

Centro” que continha ações em toda a região da Subprefeitura Sé, com maior

concentração nos distritos da Sé e República. Era composto de 130 ações

distribuídas em cinco eixos:

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Eixo 1 – Reversão da desvalorização imobiliária e recuperação da função

residencial com ações para valorização imobiliária e, ao mesmo tempo, um

programa habitacional para a população de baixa renda (Programa Morar no

Centro).

Eixo 2 – Transformação do perfil econômico e social com a atração de atividades

legais no centro, promovendo movimentação econômica na área com

investimentos privados e regularização do comércio informal. Nesse eixo, havia

também o subcomponente de “Atenção a grupos vulneráveis”, sob

responsabilidade da Secretaria de Assistência Social, e previa o conhecimento da

realidade, presença social nas ruas, expansão da rede socioassistencial.

Eixo 3 – Recuperação do ambiente urbano envolvendo ações de fortalecimento

da Subprefeitura da Sé e obras de manutenção e recuperação de espaços

públicos e edifícios históricos.

Eixo 4 – Transporte e circulação com intervenções de melhoria da acessibilidade

no centro, além da execução de obras e compra de equipamentos para reformar o

sistema de transporte.

Eixo 5 – Fortalecimento institucional do município visava dar apoio à transferência

de órgãos municipais para o centro, por meio de reforma, compra e instalação de

equipamentos para o funcionamento das instituições em prédios localizados no

centro.

Após a consolidação e aprovação das propostas do Programa “Ação Centro” pelo BID, em novembro de 2003, o projeto foi enviado ao Senado, recebendo em dezembro do mesmo ano autorização de empréstimo pela Comissão de Assuntos Econômicos (CYMBALISTA, 2008, p. 43).

Em junho de 2004, faltando apenas seis meses para o término da gestão

Marta, o contrato de empréstimo entre BID e a Prefeitura de São Paulo foi assinado,

executando-se diversas ações até o final de 2004.

Nesse mesmo período, tem início o Projeto “Reabilitação dos Bairros Centrais

com Inclusão Social”, financiado pela União Europeia, que previa a implantação de

quatro Escritórios-Antenas nos bairros da Santa Cecília, Belém, Bom Retiro e Pari.

Os escritórios-antenas desenvolveriam atividades de capacitação profissional e

apoio aos grupos vulneráveis do centro em articulação com os programas

habitacionais.

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99

Em 2005, com a mudança da gestão (Serra/Kassab), o projeto foi reformulado

e passou a ser coordenado pela Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social

(SMADS) e recebeu o nome de “Nós do Centro”. O objetivo do projeto foi a inclusão

social através do aumento do nível de renda e da melhoria do padrão de vida e da

situação social das pessoas moradoras dos bairros onde estão os Escritórios de

Inclusão (EIS).

O projeto previa a instalação de dez Escritórios de Inclusão nos distritos do

Glicéria, Pari, Bela Vista, Bom Retiro, Santa Cecília, Belém, Belém Catumbi, Brás e

Mooca; um Centro de Referência da Mulher; um Centro de Referência da

Diversidade e Centros de Empreendedorismo.

Para instalação desses serviços foram contratadas organizações não

governamentais que receberam os recursos da Prefeitura de São Paulo ou da União

Europeia.

Também na gestão Serra/Kassab, o Programa “Ação Centro” voltou a ser

chamado de PROCENTRO, com a paralisação dos trabalhos e a revisão geral das

ações por um período de dois anos.

O PROCENTRO manteve os cinco eixos da proposta original, mas alterou de

forma substancial as ações de cada eixo. Com base no Plano Plurianual de 2006-

2009,

(...) a gestão Serra/Kassab passa pela percepção de que as ações da Prefeitura devem impulsionar os investimentos da iniciativa privada, (...) através de incentivos e estratégias de concentração de recursos que potencializariam a valorização e, consequentemente, a vantagem para a iniciativa privada (CYMBALISTA, 2008, p. 61).

A requalificação do centro foi subdividida em três grandes espaços:

Luz/Roosevelt (Vetor Oeste), Vale do Anhangabaú (Vetor Central) e Parque Dom

Pedro II (Vetor Leste), com a concentração de recursos e seu direcionamento para a

região da Luz, dando origem, posteriormente, ao Projeto Nova Luz.

Encontram-se, ainda, em andamento e aguardando avaliação ou licitação, os

seguintes projetos para a região central50:

50

Informações do site da Prefeitura do Município de São Paulo. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br>. Acesso em: nov. 2011.

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Projeto de Requalificação do Parque Dom Pedro II, com algumas ações em

andamento, como a requalificação do Gasômetro; a demolição do Viaduto

Diário Popular; as desapropriações e demolições de imóveis irregulares ou

deteriorados; e a implantação do Museu da História do Estado e do Museu

Catavento.

Operação Urbana Lapa-Brás, em consulta pública, e prevê a requalificação

da orla ferroviária que se encontra subutilizada entre os bairros da Lapa e

Brás.

Programa Renova Centro, em desenvolvimento, e prevê ações de

adensamento populacional na área central.

Centro Legal com ações integradas entre a Prefeitura, o Governo do

Estado de São Paulo, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a

Sociedade Civil, visando diminuir os problemas estruturais e sociais na

região central, executando ações nas áreas de segurança pública,

iluminação, saúde, entre outros.

Circuito das Compras, em estudo, e visa à melhoria do atendimento e da

infraestrutura para os consumidores que vêm à região central.

4.3 Caracterização da Região Central51

A região central da cidade é administrada pela Subprefeitura da Sé, e

compreende os Distritos da Bela Vista, Bom Retiro, Cambuci, Consolação,

Liberdade, República, Santa Cecília e Sé.

Os limites territoriais da Subprefeitura Sé são:

Norte: Subprefeituras Santana e Vila Guilherme;

Oeste: Subprefeitura Lapa e Pinheiros;

Sul: Subprefeitura Vila Mariana;

Leste: Subprefeitura Mooca.

51

Dados do município, da região central e do Distrito do Bom Retiro coletados dos sites do Infocidade da Secretaria de Desenvolvimento Urbano da Prefeitura do Município de São Paulo (disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br) e do Observatório do Cidadão da Rede Nossa São Paulo (disponível em: <http://www.nossasaopaulo.org.br).

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Mapa 2 ‒ Mapa da Subprefeitura da Sé Fonte: Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br>.

Os bairros que compõem os distritos da Região Central da cidade são:

Distrito Bom Retiro – Bom Retiro, Luz e Ponte Pequena;

Distrito Santa Cecília – Santa Cecília, Campos Elíseos e parte da Barra

Funda;

Distrito da Consolação – Consolação, Higienópolis, Pacaembu e Vila

Buarque;

Distrito Bela Vista – Bela Vista e Bexiga;

Distrito Liberdade – Liberdade, Aclimação e Glicério;

Distrito República – República e Santa Ifigênia;

Distrito Sé – Sé; e

Distrito Cambuci – bairros Cambuci, V. Deodoro e parte da Mooca.

Na região central, as taxas de crescimento da população entre as décadas de

1980 a 2000 foram negativas, sendo que, no geral, as taxas de crescimento da

cidade estiveram sempre positivas. Somente na década de 2000 a 2010, a

população da região voltou a crescer conforme Tabela 1.52

52

Nessas décadas, as taxas de crescimento no município de São Paulo foram: das décadas de 1980 a 1990 – 1,16; de 1991 a 2000 – 0,88; e, 2001 a 2010 – 0,76.

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Tabela 1 ‒ População recenseada e taxas de crescimento – Centro

Unidades Territoriais

1980 Tx. Cresc.

80/91 1991

Tx. Cresc. 91/2000

2000 Tx. Cresc. 2000/2010

2010

Centro 526.170 -1,24 458.677 -2,24 373.914 1,43 431.106

Bela Vista 85.416 -1,56 71.825 -1,41 63.190 0,95 69.460

Bom Retiro 47.588 -2,47 36.136 -3,35 26.598 2,45 33.892

Cambuci 44.851 -1,72 37.069 -2,80 28.717 2,55 36.948

Consolação 77.338 -1,35 66.590 -2,20 54.522 0,51 57.365

Liberdade 82.472 -0,71 76.245 -2,29 61.875 1,11 69.092

República 60.999 -0,49 57.797 -2,11 47.718 1,79 56.981

Sta. Cecília 94.542 -0,88 85.829 -2,06 71.179 1,64 83.717

Sé 32.965 -1,74 27.186 -3,29 20.115 1,63 23.651

Fonte: Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br>.

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103

Apesar de possuir o Índice de Desenvolvimento Humano53 na categoria “muito

elevado” – 0,928, ficando em 5º lugar entre as subprefeituras54 do município, a

região apresenta as contradições da desigualdade presente em toda a cidade.

Da população geral do centro, 91,4% estão acima da faixa etária de 10 anos,

e 25% não possuem nenhum rendimento; 27% possuem rendimento até 2 salários

mínimos, conforme Gráfico 1.

Gráfico 1 – Rendimento mensal Fonte: Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br>, com adaptação da autora deste trabalho.

Em 2007, a taxa de alfabetização da região central era de 98,01% (329.926

dos 331.986 habitantes). Do total geral, 12% não estavam alfabetizados ou haviam

cursado até a 3ª série do Ensino Fundamental; 16% cursaram da 4ª à 7ª série; 15%

possuíam o ensino fundamental completo e ensino médio incompleto; 30%

possuíam ensino médio completo e superior incompleto; e, 27%, ensino superior

completo.

53

O Índice de Desenvolvimento Humano é utilizado para medir as condições de vida a partir dos indicadores de riqueza, alfabetização, educação, esperança de vida e natalidade. O índice é avaliado de 0 a 1, sendo que, quanto mais perto do 1, melhor a condição de desenvolvimento.

54A subprefeitura da Sé está abaixo, apenas, das subprefeituras de Pinheiros, Vila Mariana, Santo Amaro e Lapa.

25%

1%

6%

20%

25%

16%

7%

Gráfico X -Rendimento Mensal

Sem rendimento

até 1/2 sm

1/2 a 1 sm

1 a 2 sm

2 a 5 sm

5 a 10 sm

10 a 20 sm

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Dos 140.193 domicílios da região central, 54% são próprios; 40% alugados;

5% cedidos, e menos de 1% estão em outras condições. 14.800 domicílios estão em

cortiços e 463, nas favelas. Das 1.565 favelas existentes no município, duas

encontram-se nessa região. Apenas 516 domicílios não possuem rede de água e

esgoto, e 11 não possuem rede elétrica.

No ano de 2010, 5.541 crianças nasceram na região, sendo que, desse total,

6,7% morreram antes dos 28 dias de vida, e 10,3% morreram antes de completar o

primeiro ano de vida. Dos nascimentos, 8,52% estavam com baixo peso (464) e

7,6% nasceram de mães adolescentes (414).

Além dos dados da população recenseada, a Fundação Instituto de

Pesquisas Econômicas (FIPE) realizou a contagem da população em situação de

rua, em 2009, totalizando 13.666 no município. Desse total, 5.798 (42%) encontram-

se na região central, conforme Tabela 2.

Tabela 2 ‒ Censo da população de rua – Subprefeitura da Sé

Unidades Territoriais 2000 2009

Subprefeitura Sé 3.387 5.798 Bela Vista 152 263 Bom Retiro 157 455 Cambuci 74 53 Consolação 167 175 Liberdade 736 414 República 796 1.770 Santa Cecília 485 1.334 Sé 820 1.334

Fonte: FIPE, 2009.

O censo constatou, entre outros aspectos, que:

A maior parte dos moradores em situação de rua é do sexo masculino, com

idade média de 40 anos de idade;

São provenientes da região sudeste (57,7%), com forte concentração de

paulistas (45,8%). A maior parte dos migrantes vem dos estados da Bahia

(12,5%) e de Minas Gerais (8,2%);

75% declaram utilizar álcool, drogas ou ambos;

42,6% não possuem qualquer documento de identidade;

66,7% afirmaram já terem sofrido algum tipo de violência;

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16,5% dos moradores possuem companheiro(a) e 60% declaram ter filhos.

No entanto, somente um percentual de 0,8% declarou viver com os filhos

na rua;

23% dos moradores em situação de rua utilizam albergues na região.

A região conta com uma rede diversificada de equipamentos e serviços

públicos:

Abastecimento: 30 feiras livres, 02 mercados municipais, 03 sacolões

municipais e 03 Restaurantes Bom Prato.

Assistência Social: 01 Centro de Referência da Assistência Social, 01

Centro de Referência Especializado da Assistência Social, 02 Centros de

Referência Especializado da Assistência Social para População de Rua, 01

Loja Social, 03 Repúblicas para Adultos em situação de rua, 13 Centros de

Acolhida para População Adulta em Situação de Rua, 02 Espaços de

Convivência para População Adulta em Situação de Rua, 06 Centros de

Acolhida Especial (idoso, mulheres e catadores), 05 Núcleos de

Convivência para População Adulta em Situação de Rua, 09 Programas

Atenção Urbana para População Adulta em Situação de Rua, 01 Núcleo de

Convivência para População Adulta em Situação de Rua com Restaurante

Comunitário, 01 Bagageiro, 02 Núcleos de Inserção Produtiva para

População Adulta em Situação de Rua, 01 Núcleo de Defesa e Convivência

da Mulher, 02 Serviços de Assistência Social à Família, 01 Segurança

Alimentar Domiciliar para Idoso, 01 Restaurante Escola, 14 Centros de

Convivência da Criança e do Adolescente, 07 Serviços de Acolhimento

Institucional para Crianças e Adolescentes, 04 Atenção Urbana e Espaço

de Convivência para Crianças e Adolescente, 02 Centros de

Desenvolvimento Social Produtivo para Adolescentes, 01 Centro para

Juventude, 01 Espaço para Convivência de Crianças e Adolescentes, 01

Centro de Referência da Diversidade, 01 Centro de Referência do Idoso,

01 Núcleo de Medida Socioeducativa em Meio Aberto.

Cultura: 11 telecentros, 54 salas de shows e concertos, sendo, 01

municipal, 02 estaduais e 51 particulares; 38 museus, sendo 8 municipais,

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09 estaduais, 01 federal e 30 particulares; 13 bibliotecas, 29 centros

culturais, sendo, 03 municipais, 08 estaduais, 01 federal e 17 particulares;

37 galerias de arte, sendo, 04 municipais, 02 estaduais, 31 particulares.

Educação: 22 equipamentos da rede municipal, 28 da rede estadual e 182

da rede particular. Há uma demanda de 2.658 vagas em creche e, 523 no

ensino infantil, cadastradas e aguardando vaga na região.

Lazer: Rede Municipal direta – 04 clubes desportivos, 01 campo de

malha/bocha, 01 quadra. Rede municipal indireta: 03 clubes desportivos

com estádio, 02 centros educacionais e esportivos. Rede particular: 01

clube desportivo com ginásio e 09 clubes desportivos. 02 parques –

Aclimação e Luz.

Meio Ambiente: 04 Ecoponto.

Saúde: Rede Municipal: 02 hospitais e 362 leitos. Rede Estadual: 01

hospital e 144 leitos. Rede Particular: 32 hospitais e 7.161 leitos. 03

Assistências Médicas Ambulatoriais, 01 Assistência Médica Ambulatorial

Especialidade, 09 Unidades Básicas de Saúde com Estratégia de Saúde da

Família, 01 Centro de Atendimento Psicossocial Infantil, 01 Centro de

Atendimento Psicossocial Adultos.

Trabalho e emprego: 01 Centro de Apoio ao Trabalhador.

No ano de 2010, em relação ao município, a região central concentrou 22%

dos empregos formais no setor de serviços; 11,7% dos empregos formais no setor

de comércio; 8,6% no setor de transformação; e 8,4% dos empregos formais no

setor da construção civil, de acordo com a Tabela 3:

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Tabela 3 ‒ Estabelecimentos e empregos formais no setor do comércio, serviços, indústria de

transformação e construção civil - 2010

DISTRITO

COMÉRCIO SERVIÇOS

IND.TRANSFORMAÇÃO

CONSTRUÇÃO CIVIL

ESTABs

EMPREGs ESTABs EMPREGs

ESTABs EMPREGs ESTABs EMPREGs

MSP 103.766 871.752 125.499 2.225.175 29.020 578.500 10.473 272.589

Sé 11.987 102.027 21.031 494.830 3.009 50.288 543 23.023

Bela Vista 950 9.656 3.364 100.139 177 4.586 53 2.938

Bom Retiro 1.595 11.595 1.092 23.428 1.533 20.427 44 1.458

Cambuci 583 7.123 615 20.480 291 8.614 34 1.813

Consolação 1.027 13.139 3.622 73.201 154 2.471 92 4.137

Liberdade 624 6.676 1.599 32.198 171 1.673 42 925

República 2.700 18.273 5.159 124.415 225 3.179 133 7.145

Sta. Cecília 1.151 11.178 2.451 56.351 290 7.044 73 3.008

Sé 3.357 24.387 3.129 64.618 168 2.294 72 1.599

Fonte: Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br>.

O orçamento da Subprefeitura da Sé praticado no ano de 2010 foi de 53,91

milhões, com uma per capita de R$ 125,05 por habitante. Em 2011, foi previsto um

orçamento de 53,69 milhões, com uma per capita de R$ 122,94 por habitante.

Na região, está situado um vasto patrimônio histórico e cultural55 formado

desde a origem do processo de povoamento e desenvolvimento da cidade. Há um

conjunto de 34 prédios históricos, entre eles, a chaminé da primeira usina elétrica da

cidade na Rua João Mendes (1888); três casas de aluguel em estilo neoclássico na

Rua Bento Freitas (1897); o Fórum João Mendes e o Liceu Coração de Jesus,

ambos do início do século XX.

Também há 158 obras de arte em parques, praças, galerias e estações de

metrô, sendo algumas do século XIX, como o Obelisco da Memória, no Largo da

Memória (1814); e outras do início do século XX, como a Fonte Monumental da

Praça Júlio Mesquita; Schiavo na Praça Ramos de Azevedo; Giuseppe Garibaldi no

Jardim da Luz. Também algumas obras são de artistas consagrados como Tomie

Ohtake.

As igrejas e templos, desde a fundação da cidade, constituem um rico

patrimônio histórico da região. Totalizam 33, dos quais podem ser destacados:

Capela Nossa Senhora dos Aflitos (1774), Catedral Metropolitana (1911), Igreja da

Ordem Terceira do Carmo (1632), Igreja das Chagas do Seráfico Pai São Francisco

(1670), Igreja de Santo Antônio (1590), Igreja de São Francisco (1647), Igreja de

55

Informações disponíveis no site da Associação Viva o Centro: <http://www.vivaocentro.org.br>.

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Nossa Senhora da Boa Morte (1810), Mosteiro da Imaculada Conceição da Luz

(1774), Mosteiro de São Bento (1922), Sinagoga da Comunidade Israelita Kehilat

(1912) e a Igreja Presbiteriana da Unidade de São Paulo (1900).

Segundo Kowarick (2007), o deslocamento econômico ocorrido na década de

1990, por um lado, agravou o abandono da região central, mas também revelou

novos dinamismos e potencialidades.

Há uma vasta rede de hotelaria e restaurantes de padrão popular; o comércio

atacadista; a indústria de confecções no Bom Retiro e Brás; o comércio de máquinas

e ferramentas na Florêncio de Abreu; e o comércio popular da Rua 25 de Março e

adjacências. Há, ainda, o sistema financeiro da Rua XV de Novembro; as Bolsas de

Valores e de Mercadorias; a sede do Governo Municipal e de suas secretarias; a

Câmara dos Vereadores; e o Fórum da Praça João Mendes.

Milhares de pessoas circulam diariamente pela região central, propiciando um

dinamismo que se reflete no número de empregos, negócios, eventos culturais e

acadêmicos, mobilizações e manifestações que retratam o cotidiano da região.

4.4 O Bairro da Luz

4.4.1 A formação e a urbanização do Bairro da Luz56

O bairro da Luz era conhecido como Guaré, sendo uma área que sofria

alagamentos provocados pelo transbordamento do Rio Tamanduateí. Segundo Elias

(2001), a área começou a ser povoada, a partir de 1580, com a distribuição de terras

orientada pelo critério aristocrático, encerrando-se em 1870 com a ocupação de toda

a região por propriedades particulares e terrenos reservados ao patrimônio

municipal.

O nome atual do bairro deve-se à influência do português Domingos Luis

Carvoeiro e sua mulher, Ana Camacho, que ergueram uma capela dedicada a

Nossa Senhora da Luz, santa de sua devoção. Com o tempo, a capela foi

esquecida, ficando praticamente abandonada. Porém, a referência da capela como

ponto geográfico foi determinante para nomear o bairro.

56

Disponíveis em: <http://bairrodaluzsp.wordpress.com>; <http://stoa.usp.br/cienciacultura/weblog>; <www.pucsp/artecidade/site97_99/ac3/hist.html>.

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A importância da Capela de Nossa Senhora da Luz só foi retomada em 1774,

quando a religiosa Helena Maria do Sacramento dirigiu-se ao Morgado de Mateus

Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, governador da capitania de São Paulo,

alegando ter recebido uma visão que a ordenava construir um novo convento na

cidade de São Paulo. O governador acatou a ideia e cedeu um terreno localizado

próximo à Capela da Luz.

O trabalho de edificação do convento foi possível com a ajuda do franciscano

Antônio de Sant‟Ana Galvão, sendo inaugurado em 1774. Em 1788, o edifício foi

ampliado e anexo à antiga Capela da Luz.

Durante todo esse período, os moradores da região preocupavam-se,

também, em reformar e reconstruir as inúmeras pontes para transpor o Rio Tietê;

trajeto essencial para o deslocamento dos tropeiros e bandeirantes para o Sul de

Minas. A solução definitiva para a transposição do Tietê deu-se, em 1866, com a

inauguração da Ponte Grande.57

Também é desse período a proposta de criação do Parque da Luz, com a

nomeação, em 1798, do Sargento-mor Antônio Marques da Silva, como responsável

para a sua implantação. Em 1799, foram concedidas vinte datas de terras no bairro

da Luz para instalação do Jardim Botânico e a iniciativa contou com doações em

dinheiro feitas pelos moradores.

Após sua inauguração, em 1825, o Jardim viveu inúmeros problemas e

dificuldades na sua administração. A partir de 1850, inúmeras melhorias foram

implantadas e o Jardim, agora denominado “Jardim da Luz” passou a ser

reconhecido como um local de recreação da cidade, com apresentações musicais.

Em 1900 foi inaugurada a sede do Liceu de Artes e Ofícios no interior do

Parque, prédio que foi ocupado posteriormente pela Pinacoteca do Estado de São

Paulo.

Em 1930, o prefeito Pires do Rio determinou que se retirassem os portões e os muros do jardim. Os animais foram transferidos para o Parque da Água Branca, e o Jardim da Luz perdeu muito do seu encanto. A ausência de muros ou grades favoreceu a ação de criminosos que agiam no entorno da Estação da Luz. O Jardim passou a ser utilizado como zona de prostituição e consumo e tráfico de drogas, afastando o público (JORGE, 1988, p. 26).

57

Esta foi substituída somente pela atual Ponte das Bandeiras, inaugurada em 1942 pelo prefeito Prestes Maia, situada a 150 metros da antiga Ponte Grande.

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110

O bairro da Luz também ficou conhecido, no início do século XIX, pelas feiras

populares realizadas no Largo da Luz. Nessas feiras, que atraíam moradores da

cidade e das vilas vizinhas, comercializavam-se animais e vários tipos de

mercadorias, tais como artefatos de couro, arreios, e outros. Segundo Jorge (1988),

era um acontecimento social que, muitas vezes, superava as festas eclesiásticas.

A Estação da Luz, construída no período de 1860 a 1867, passou por

diversas ampliações até 1900, quando a antiga estação foi demolida para dar lugar a

um novo prédio, superior em capacidade e beleza. As obras, sob o comando do

engenheiro F. Ford, aconteceram em uma superfície de 7.520 m2, com 150 metros

de fachada e 39 metros de arqueamento da abóboda. Todo material foi importado da

Inglaterra, com uma estrutura de estilo vitoriano. A torre mais alta possui relógios

com 3,30 metros de diâmetro. Segundo Jorge (1988), o projeto foi pensado para

refletir o momento pelo qual passava a cidade, o período áureo da cafeicultura. A

inauguração se deu no dia primeiro de maio de 1901.

Figura 1 ‒ Estação da Luz (1910) Fonte: Disponível em: <www.estacoesferroviarias.com.br>.

Em 1946, a estação é destruída por um incêndio, passando por uma

reconstrução e ampliação, ganhando um andar além dos quatro existentes, e mais

dois conjuntos nas saídas dos passageiros, sendo reaberta em 1951.

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Porta de entrada dos imigrantes e de personalidades em São Paulo, a Estação da Luz ajudou a cidade a se transformar de pacata vila dos tropeiros para grande metrópole, tendo participação ativa na vida da cidade. (...) Em suma, é um edifício intimamente ligado à história da cidade, um patrimônio de valor inestimável (JORGE, 1988, p. 32).

Em 1875, também foi inaugurada uma estação de trem, localizada ao lado da

Praça General Osório, ligada à estrada de ferro Sorocabana. Essa primeira estação

foi demolida, dando lugar, em 1938, à Estação Júlio Prestes. Também os bondes

elétricos, que surgiram em 1900, possuíam linhas na Barra Funda e no Bom Retiro,

passando sempre nas proximidades da Estação da Luz.

Figura 2 ‒ Antiga Estação (1913) com a nova em construção (fundo) Fonte: Disponível em: <www.estaçoesferroviarias.com.br>.

A implantação do sistema de transporte ferroviário gerou profundas mudanças

na área, que se valorizou. No final do século XIX, houve investimentos municipais

em vias de acesso ao centro, calçamentos e iluminação, instalação de bondes e

melhorias no Jardim da Luz, que transformaram a região em um ponto de encontro

das elites.

O comércio no entorno da Estação da Luz diversificou-se para atender os

viajantes, com hotéis e restaurantes. Na Rua Mauá, surgiram hotéis luxuosos,

destinados aos viajantes do interior paulista.

Até 1920 foram construídos prédios culturais importantes, como o Liceu de

Artes e Ofícios, a Pinacoteca do Estado e o Museu de Belas Artes, consolidando a

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qualidade da área. Esse ritmo se seguiu até 1950, quando o centro se constituía no

principal circuito de negócios, compras e lazer das elites.

A ferrovia atraiu ainda a instalação de filiais de companhias estrangeiras das

distribuidoras de filmes, dada a facilidade de importação e remessa de filmes, além

de pequenas produtoras e lojas de equipamentos especializados. Décadas mais

tarde, a Rua do Triunfo se transformou em reduto do Cinema marginal, e a região

tornou-se conhecida como “boca do lixo58”, em referência a personagens do

“submundo” que viviam ali.

A partir da segunda metade do século XX, com o descolamento das grandes

empresas para a região da Avenida Paulista, o declínio das ferrovias e valorização

do transporte rodoviário, ocorre a desvalorização imobiliária da região e a

popularização da área.

O bairro, cuja degradação se deu ao longo de décadas de abandono por parte

do poder público, constitui-se para muitos – moradores, trabalhadores, transeuntes,

movimentos sociais e organizações – local de trabalho e moradia, espaço de luta

pela apropriação dos benefícios urbanos, sobretudo da habitação digna e do acesso

a bens e serviços.

4.5 Caracterização da Região de Abrangência do Projeto Nova Luz59

Conforme pesquisas quantitativas e qualitativas realizadas pelo Consórcio

Nova Luz60 para o Plano de Urbanização de ZEIS, a região do Projeto Nova Luz que

corresponde à ZEIS é formada por 11 quadras com 221 imóveis. Essa amostragem

corresponde a 67,7% dos imóveis da região do Nova Luz.

Segundo estimativas dessa pesquisa, residem, na área de abrangência do

Projeto Nova Luz, cerca de 12.000 pessoas, com uma densidade demográfica de

58

“A „Boca do Lixo‟ paulistana se situa no bairro de Santa Ifigênia, e foi assim batizada pela crônica policial devido ao tradicional bate-bolsa ao longo de umas vinte quadras entre as avenidas Rio Branco e Duque de Caxias. Os personagens míticos do centro da cidade serão vivenciados em diversos filmes do chamado Cinema marginal ou Cinema de invenção, principalmente na década de 70. Os bares localizados na Boca do Lixo, como o „Soberano‟, citado no livro „Essa Rua chamada Triunfo‟, de Ozualdo Candeias, ocupavam um importante papel, pois serviram de ponto de encontro de diversos cineastas, que queriam subverter o cinema tradicional” (GONÇALVES JÚNIOR, 2002).

59Diagnóstico realizado para subsidiar o Estudo de Impacto Ambiental do Consórcio Nova Luz, 2011.

60Segundo o Plano de Urbanização de ZEIS (julho/2011b), as pesquisas foram realizadas em dois momentos pelo Consórcio Nova Luz: Arrolamento (agosto de 2010) e Cadastro de Moradores e de Atividades Econômicas (abril 2011).

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220,6 habitantes por hectare61; número considerado elevado para os padrões da

região central62. Entre as Avenidas São João e Rio Branco, onde a presença de

edifícios residenciais é maior, a densidade ultrapassa a 400 hab/ha.

Estima-se a existência de 7,1 mil unidades habitacionais ou domicílios, das

quais 37% encontram-se sem residentes, ou seja, desocupadas. A grande maioria

da população residente mora em apartamentos (94%), e 4% residem em cômodos

de habitações coletivas localizadas, em sua maioria, em edificações abandonadas.

A média de pessoas por domicílio é de 2,72, com um percentual de domicílios

ocupados por 2 pessoas (29,2%) ou residindo sozinhas (26,9%), seguido por

domicílios com 3 pessoas, que perfazem 20,7%.

Quanto às condições de ocupação dos domicílios, 50% das famílias residem

em domicílios alugados, enquanto 42% em domicílios próprios, em sua maioria, já

pagos (32%). 3% residem em domicílios ocupados.

Em agosto de 2010, a média do aluguel praticado na área era de R$ 566,00,

sendo o mínimo verificado de R$ 160,00, e o máximo, de R$ 1.100,00. O valor das

prestações dos imóveis próprios se mostrou inferior ao dos alugados, apresentando

média de R$ 408,00, com um mínimo de R$ 111,00 e máximo de R$ 1.300,00.

Dos moradores da região, 70% moram no bairro há mais de 2 anos, sendo

que, destes, 45% residem há mais de 10 anos no mesmo bairro, caracterizando os

vínculos que moradores possuem com a região.

Dos residentes na área do Nova Luz, 88% são brasileiros e quase 80% são

naturais do estado de São Paulo, com alguma presença de migrantes dos estados

do Nordeste. Dos moradores imigrantes, que correspondem a 12%, a grande

maioria são provenientes da Bolívia e do Peru.

Da população por grupos de idade, há uma maior proporção de pessoas com

mais de 25 anos e menores parcelas de jovens e crianças. A média de idade é de 42

anos, sendo a mínima de 18 e a máxima de 80 anos. Portanto, a maioria da

população está na fase adulta e em idade produtiva, na busca de estudo e trabalho.

61

A densidade demográfica é a relação entre o número de pessoas por unidade de área. Quanto maior for a densidade demográfica em uma área, mais importante é o uso residencial.

62O distrito da República possui uma densidade demográfica de 207,4 hab/ha.

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Quanto à renda da população residente, a Pesquisa Censitária realizada em abril de 2011, revela que o rendimento médio mensal declarado da população residente ocupada é de R$ 1.323,00. De acordo com a pesquisa divulgada pelo DIEESE, em março de 2011, este valor acompanha o rendimento médio da cidade, indicando que a média de rendimento dos trabalhadores ocupados foi de R$ 1.377,00 e dos assalariados de R$ 1.437,00 (PMSP, 2011b, p. 80).

Quanto à escolaridade da população residente no Nova Luz, a população

alfabetizada acima de 5 anos de idade era de aproximadamente 94,9%. Da

população alfabetizada, 31,20% estudaram de 9 a 11 anos, e 28,30%, de 5 a 8

anos.

Segundo dados da Relação de Informações Sociais (RAIS) do Ministério do

Trabalho e Emprego, em 2008, havia 1.781 estabelecimentos ou empresas

comerciais, industriais e de serviços, ofertando 13.237 vagas de trabalho com

vínculo formal. Além desses dados, o diagnóstico realizado pelo Consórcio Nova Luz

(2011c:78) estimou um total de empregos na região do Nova Luz, onde foram

“identificados 23.374 empregos, indicando a presença de cerca de 10.000

trabalhadores informais, que perfazem 43% do total” .

De acordo com a característica econômica da região central, destaca-se no

perímetro do Nova Luz a predominância do Setor Terciário, com atividades de

comércio e serviços. As empresas voltadas à transformação industrial e construção

civil correspondem somente a 1,74% do total e representam 3,3% dos empregos do

Nova Luz.

Trata-se de apenas de 31 empresas de ramos diversificados e de pequeno porte, com exceção de uma com pouco mais de 100 trabalhadores. O setor de serviços representa 47,9% dos empregos da Nova Luz e 34,08% das empresas (...) O Comércio como um todo responde por 48,8% do total de empregos na Nova Luz. Os estabelecimentos comerciais perfazem 64,1% do total de estabelecimentos (PMSP, 2011b, p. 79).

No ramo de serviços, merece destaque o segmento de Alojamento e

Alimentação, representado por hotéis, pensões, bares e restaurantes que atendem

um público diversificado, desde empregados da região, consumidores, turistas e

frequentadores dos equipamentos culturais.

No ramos de comércio, duas atividades se destacam por serem pontos

tradicionais de compra no município: o comércio varejista e atacadista de veículos

automotores, peças e acessórios, com estabelecimentos especializados no ramos

de motocicletas, localizados principalmente na Rua General Osório; e o comércio

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varejista e atacadista nos ramos de computadores, periféricos, suprimentos de

informática, componentes eletrônicos, telefonia, comunicação e material elétrico.

Esse comércio localiza-se na Santa Ifigênia e proximidades.

Quanto à infraestrutura da área do Projeto Nova Luz, 100% dos domicílios

são atendidos pelos serviços de distribuição de água, coleta e tratamento de esgoto

e energia elétrica. Os resíduos domiciliares são coletados 6 dias por semana, no

período noturno, a partir das 18h.

Observou-se na região número considerável de empresas que geram resíduos como papel, papelão, plástico e isopor. Por não haver coleta seletiva, os catadores informais rasgam os sacos para procurar recicláveis, coletam o que lhes interessa e deixam o restante espalhado, ocasionando sujeira nas ruas e um trabalho extra por parte das equipes de coleta e varrição. Parte do material coletado pelos catadores é transportado à Cooperativa COOPERE (Av. do Estado 300), uma das maiores da cidade e a mais próxima da área do Projeto (PMSP, 2011b, p. 86).

Em relação à Segurança Pública, a Guarda Civil Metropolitana conta com

uma Central de Monitoramento, responsável pelos 94 logradouros das regiões

denominadas de Centro Novo, Centro Histórico, Anhangabaú, Nova Luz e 25 de

Março. Também na Rua da Abolição localiza-se o 7º Batalhão da Polícia Militar e, na

Rua Aurora, o 3º DP da Polícia Civil.

Dos equipamentos de Educação, na área do Projeto Nova Luz, situam-se a

Creche Esperança Nova Aurora e a Escola de Música do Estado de São Paulo.

Outros equipamentos encontram-se no entorno da área, principalmente de educação

básica, obrigando crianças e adolescentes a se deslocarem em busca dessas

escolas.

Em relação à infraestrutura de atenção à saúde, na região do Nova Luz

inexistem serviços de urgência e emergência e leitos hospitalares. Também os

equipamentos de Assistência Social estão em número reduzido.

No entorno do Projeto Nova Luz, destacam-se os principais equipamentos na

área da cultura e do lazer, dentre os quais a Pinacoteca, o Parque da Luz, o

Complexo Cultural Júlio Prestes e o Museu da Língua Portuguesa.

A região do Nova Luz localiza-se próxima aos grandes corredores de ligação

da cidade, como a Avenida Prestes Maia e a Avenida Radial Leste.

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As vias que delimitam o empreendimento e a Avenida Rio Branco correspondem, em sua maioria, ao Sistema Viário Estrutural da cidade de São Paulo, segundo o Plano Regional da Subprefeitura da Sé. Estas vias possuem importância funcional, promovendo ligações viárias e articulações entre as regiões da cidade. As vias internas ao perímetro, com exceção da Avenida Rio Branco, correspondem às vias coletoras e locais, que favorecem principalmente, o tráfego local, sendo menos procuradas por veículos de passagem (PMSP, 2011b, p. 124).

Em praticamente todas as quadras do Nova Luz, existem estacionamentos

particulares, tanto de uso exclusivo quanto de uso misto (estacionamentos

associados a qualquer outro uso). Ao todo, a área conta com 6.349 vagas em

estacionamentos privados e 908 vagas em estacionamentos livres (na rua),

totalizando 7.257 vagas.

O transporte coletivo de ônibus oferece uma variedade de linhas, sendo que,

“nas vias que compõem seu perímetro, circulam 115 linhas municipais”. Há, também,

o Terminal de ônibus Princesa Isabel (PMSP, 2011b, p. 124).

Quanto às linhas de trens, três das seis linhas da Companhia Paulista de

Trens Metropolitanos (CPTM) passam pela Estação da Luz: Linha 07 – Rubi – que

liga a Estação da Luz com o município de Jundiaí; Linha 10 – Turquesa – que liga a

Estação da Luz com o município de Rio Grande da Serra; e a Linha 11 – Coral – que

liga a Estação da Luz com o município de Mogi das Cruzes.

Essas três linhas possuem ligação com outras três: Linha 8 – Diamante –

integrada com a Linha 7, liga a Estação Júlio Prestes com o município de Itapevi;

Linha 9 – Esmeralda – integrada com a Linha 8, liga a Estação Grajaú com o

município de Osasco; e Linha 12 – Safira – integrada com a Linha 11, liga a Estação

Brás com a Estação Calmon Viana.

O sistema de metrô da Companhia do Metropolitano de São Paulo faz uso da

estação da Luz, sendo ponto de transbordo gratuito entre o metrô e o trem. Também

as Estações República e Santa Cecília estão localizadas no perímetro do Nova Luz.

As linhas que servem as estações são: Linha 1 – Azul (Estação da Luz) – liga

a região Norte da cidade com a região Sul; Linha 3 – Vermelha (estações República

e Santa Cecília); liga a zona Oeste e Leste; e, recentemente inaugurada, a Linha 3 –

Amarela (Estações Luz e República), que liga o Centro à região Sudoeste.

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4.6 A “Cracolândia” do Bairro da Luz

Na última década, a região em que se localiza o Projeto Nova Luz tem sido

conhecida e divulgada pela mídia, como “cracolândia”. Nome que não se refere a um

lugar específico ou precisamente delimitado, mas a uma condição que afeta diversas

pessoas que circulam pela região.

As notícias sobre a “cracolândia” ocuparam a mídia com maior frequência

desde os anos 200063, em que ações do Departamento de Investigações sobre

Narcóticos (DENARC) foram responsáveis pelo fechamento de hotéis e pensões, e a

prisão de suspeitos de favorecer o tráfico na região.64

Reportagem publicada na Folha de São Paulo, em 14/12/200165, destacava

que “a região central de São Paulo ganhou este apelido no início da década de 90,

quando o crack – um subproduto da cocaína – se tornou uma droga da moda entre

as classes C e D na cidade”, conforme figuras 3 e 4.

Figura 3 – “Cracolândia” Fonte: Disponível em: <www.maerovitc.blog.terra.com.br>.

63

“Parque da Luz terá circuito eletrônico de vigilância 24 horas por dia” e “Repressão policial pulveriza a cracolândia”. Disponíveis em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.

64Reportagem da Folha de São Paulo, em 3/9/2000, aponta que o DENARC fechou 38 hotéis e pensões; prendeu 19 foragidos e 176 suspeitos de tráfico. Também apreendeu 15 kg de cocaína, 111 pedras de crack e 191 gramas de maconha. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.

65“Saiba por que a região central de SP é chamada de cracolândia” (FELTRIN, Ricardo. Folha de São Paulo, Caderno Cotidiano. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>).

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Por conta do preço, o crack tornou-se popular entre adultos, crianças e

adolescentes em situação de rua, que passaram a se concentrar nas ruas da região

da Luz e Campos Elíseos, “sujas, mal iluminadas e, por isso mesmo, pouco

freqüentadas”.66 A “cracolândia” era identificada e localizada nas ruas dos

Protestantes, dos Gusmões, General Osório, Vitória, do Triunfo, dos Andradas e

Aurora.

Figura 4 – “Cracolândia” Fonte: Disponível em: <http://www.colinasfm.com.br>.

Nos anos 2001 e 2002, ações realizadas pelas Polícias Civil e Militar

buscavam inibir o tráfico na região67, com a instalação de uma base móvel da Polícia

Militar. Também os comerciantes da região se mobilizaram e doaram luzes para

iluminar as ruas e inibir os crimes.

66

Saiba por que a região central de SP é chamada de “cracolândia” (FELTRIN, Ricardo. Folha de São Paulo, Caderno Cotidiano. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.)

67“Apreensão recorde de cocaína na cracolândia” e “Megablitz na cracolândia tem poucos resultados”. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso/cracolandia>.

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Contudo, nesses anos, denúncias surgiram na mídia quanto ao envolvimento

de policiais no comando do tráfico da região, resultando na prisão de policiais e na

mudança do comando da Polícia Militar da região.

Em 200568, as Polícias Federal, Civil e Militar lançaram a “Operação Limpeza”

visando ocupar e erradicar o tráfico na região da “cracolândia”. Nos primeiros dias

da operação, foram presos estrangeiros em condição ilegal e traficantes;

apreendidos veículos em situação irregular; e fechados hotéis e restaurantes.

Nos anos de 2006 e 2007, as ações das polícias se repetiram, assim como a

fiscalização em hotéis, pensões e restaurantes.69 As ações repressivas na região

foram intensificadas em meio às discussões sobre o Projeto Nova Luz, em que o

prefeito Gilberto Kassab declara, em sabatina promovida pela Folha de São Paulo,

que “a cracolândia não existe mais. Agora é Nova Luz. Ela é realidade”.70

Em 2008, novas ações são realizadas pela prefeitura e pela Polícia Militar.71

Surgem, também, as primeiras notícias e polêmicas sobre a possibilidade da

internação involuntária de crianças, adolescentes e adultos. Nesse período, a

imprensa dá destaque às ações realizadas nas Ruas Conselheiro Nébias e nas

Alamedas Nothmann e Cleveland.72

Novamente, em 2009, ganham destaque na imprensa as ações da Operação

“Ação Integrada Centro Legal”, envolvendo as polícias Civil e Militar e diversas

secretarias. Mesmo com a apreensão de inúmeras pessoas e o encaminhamento

para os recursos de saúde, as notícias destacam a ineficácia das ações.73

68

“Polícia deve ocupar região da cracolândia até sexta”. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u106577.shtml >.

69“DENARC faz operação na cracolândia e prende 20 em SP” em 17/3/2006; “Polícia e prefeitura realizam fiscalização na área da cracolândia”, em 12/6/2006. Disponíveis em: <http://www.folha.sp.com.br/cotidiano>. “Megablitz da prefeitura na cracolândia vai durar 16 dias”, em 2007. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso/cracolandia>.

70“Kassab diz que processo de revitalização acabou com a cracolândia”, em 31/5/2007. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso/cracolandia>.

71“PM e Prefeitura fazem nova ação na cracolândia”, em 25/3/2008. Disponível em: <http://www.folha.sp.com.br/cotidiano>. “Operação com 400 homens prende 24 pessoas”. Disponível em: <http://www.estadão.com.br/noticias/impresso/cracolandia>.

72“Cracolândia – usuário poderá ser internado”, em 2008. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/notícias/impresso/cracolandia>.

73“Polícia Civil realiza operação na região da Nova Luz”, em 05/07/2009. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>. “Polícia faz operação na cracolândia, um dia depois da blitz, rotina do vício volta à região”, em 7/7/2009; “Mesmo ocupada, cracolândia resiste”, em 23/7/2009. Disponíveis em: <http://www.estadão.com.br/noticias/impresso/cracolandia>.

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Vinte órgãos públicos e mais de 250 policiais não foram suficientes para acabar com a cena que se vê há 20 anos na região conhecida como cracolândia, no centro de São Paulo. Seis horas após o início da nova operação destinada a revitalizar uma das áreas mais degradadas da capital, centenas de viciados voltaram às ruas, com cachimbos em mãos e cobertas nas costas, em pontos tradicionais do consumo de crack. A operação “Ação Integrada Centro Legal” nem havia arrefecido, por volta das 16 horas, quando dependentes voltaram a se aglomerar nos arredores do Shopping da Luz e na esquina das Ruas Conselheiro Nébias e Vitória (outubro/2009).

74

Em fevereiro de 2010, uma ação da Polícia Civil detém 300 usuários na

“cracolândia” que são liberados, na sequencia, por falta de funcionários para

atendimento. A ação tornou pública a desarticulação entre os Governos Estadual e

Municipal, que buscavam, isoladamente, dar respostas à situação da região.75

Nesse mesmo ano, com a demolição do prédio do Shopping Luz, antiga

Rodoviária de São Paulo, o terreno desocupado passa a ser o local de concentração

dos usuários do crack, enquanto não se iniciam as obras do Complexo Cultural que

abrigará três teatros e a sede da Companhia de Dança e da Escola de Música do

Estado de São Paulo76, conforme imagens divulgadas pela imprensa e abaixo:

74

Disponível em: <http://www.estadão.com.br/notícias/impresso/cracolandia>. 75

“Polícia Civil faz operação contra o tráfico na cracolândia” e “Kassab admite falha na integração com Estado na cracolândia”, em fevereiro/2010. Disponível em: <http://www.estadão.com.br/noticias/impresso/cracolandia>. Também “Polícia faz operação contra o tráfico na cracolândia” e “Policiais prendem e soltam viciados em operação na cracolândia”, em 25/2/2010. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.

76“Obra parada da Nova Luz, em São Paulo, vira abrigo de centenas de usuários de crack”, em 14/09/2010. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.

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Figura 5 – Terreno vazio entre a Av. Duque de Caxias e as Ruas Helvetia e Barão de Piracicaba Fonte: Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br>.

Figura 6 – Terreno vazio entre a Av. Duque de Caxias e as Ruas Helvetia e Barão de Piracicaba Fonte: Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br>.

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A antiga cracolândia voltou às origens, agora concentrada nos escombros da obra de demolição dos imóveis que vão ceder lugar ao futuro Complexo Cultural da Luz, em São Paulo. O cálculo é que de 200 a 400 pessoas encontraram abrigo detrás das paredes que ainda estão de pé entre a Avenida Duque de Caxias e as ruas Helvétia e Barão de Piracicaba, na área que já foi ocupada pela antiga rodoviária.

Logo após as denúncias quanto à falta de uso do terreno, o mesmo é

cercado, permanecendo desta forma até os dias atuais.

As ações no campo da Segurança Pública permanecem durante todo o ano

de 201177, e o Poder Público Municipal retoma a discussão polêmica sobre a

internação compulsória, o que mobiliza a sociedade em posições contrárias e

favoráveis.78

Também o governo municipal firmou parceria com a Fazenda da Esperança,

em Guaratinguetá, para o tratamento de usuários de droga79; inaugurou uma clínica

de tratamento, com uma ala para crianças e adolescentes, no bairro do Heliópolis80;

e iniciou a construção de um centro para jovens na região da cracolândia para o

atendimento de 200 adolescentes/dia.81

Em janeiro de 2012, a Ação Integrada Centro Legal é retomada com ações

planejadas em pela Prefeitura e pelo Governo do Estado de São Paulo. A estratégia

divulgada pela impressa prevê três etapas:

A primeira consiste na ocupação policial, cujo objetivo é “quebrar a estrutura logística” de traficantes que atuam na área. Além de barrar a chegada da droga, policiais foram orientados a não tolerar mais consumo público de crack. Usuários serão abordados e, se quiserem, encaminhados à rede municipal de saúde e assistência social. Em uma segunda etapa, a ação ostensiva da PM, na visão de Prefeitura e Estado, vai incentivar consumidores da droga a procurar ajuda. Na terceira fase, a meta será manter os bons resultados.

82

77

“Operação da polícia esvazia região da cracolândia em São Paulo”, em 08/4/2011. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso/cracolandia>.

78“SP busca solução jurídica para tirar viciado da cracolândia”, em 21/6/2011. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso/cracolandia> e “Procurador critica ação do Tribunal da Justiça na cracolândia”, em 08/10/2011. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.

79“Esperança na cracolândia”, em 19/6/2011. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.

80“Clínica em brinquedos e berços para atender crianças viciadas em crack!”, em 23/9/2011. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.

81“Prefeitura de São Paulo vai abrir centro para jovens na cracolândia de SP”, em 17/11/2011. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/cotidiano>.

82“Governo quer acabar com cracolândia pela estratégia de “dor e sofrimento”, em 05/01/2012. Disponível em: <http://www.estadao.com.br>. “Antes é preciso separar usuário de traficante, diz PM”, em 05/01/2012. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br>.

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A região foi ocupada pela Polícia Militar (PM) e pela Guarda Civil

Metropolitana, que permaneceram nas ruas até o final de janeiro. A ação começou

nas proximidades da Rua Helvétia e no entorno da Praça Júlio Prestes, um dos

principais pontos de concentração dos usuários, que ficaram vazios. Porém, os

usuários migraram para outras ruas, nos arredores da Praça Princesa Isabel e da

Rua Santa Ifigênia, e mais tarde retornaram para o mesmo local, mesmo com a

presença da polícia.83

A ação iniciada na “cracolândia” ocorreu sem que o complexo voltado para a

acolhida e o tratamento de usuários de droga fosse inaugurado pela prefeitura.84 O

novo espaço, com inauguração prevista para fevereiro, será um centro de

convivência para 1.200 pessoas, incluindo crianças e um serviço de acolhimento 24

horas (albergue). O complexo terá também um Centro de Atenção Psicossocial

(CAPS) e um posto de saúde.

A medida gerou polêmicas, sendo considerada higienista por especialistas85

que atuam na área da dependência química. Dartiu da Silva, diretor do Programa de

Orientação e Atendimento a Dependentes da Universidade Federal de São Paulo

(UNIFESP), apontou que a ação da PM atrapalha o trabalho dos agendes de saúde

que buscam criar vínculos com os usuários para encaminhá-los para tratamento.

O coordenador do Núcleo de Estudos sobre a Violência e Políticas

Alternativas da Universidade do Estado de São Paulo (UNESP), José dos Reis

Santos Filho, declarou que “o Estado deve ocupar o espaço perdido para o tráfico,

mas é preciso saber antes quais são as alternativas que existem para acomodar os

usuários”.

Por outro lado, Carlos Salgado, conselheiro da Associação de Estudos de

Álcool e Drogas, vê positivamente a ação da polícia, como primeira etapa. Segundo

ele, “a operação da polícia é parte relevante. É positivo reorganizar o ambiente

geográfico, de forma a tornar a droga menos disponível”.

As ações divulgadas pela mídia apontam, em primeiro lugar, a vinculação

com a proposta da Prefeitura Municipal de São Paulo de mudar a imagem da região

83

“PM ocupa cracolândia, mas só afasta usuários de droga por alguns metros” e “Prefeitura recolhe 7,5 toneladas de lixo na região da Cracolândia”, em 05/01/2012. Disponível em: <http://www.estadao.com.br>.

84“Sem centro de apoio, ação da PM espalha craqueiros na cidade”, em 05/1/2012. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br>.

85“Especialistas divergem sobre os rumos da operação no centro”, em 06/1/2012. Folha de São Paulo, Caderno Cotidiano.

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124

para viabilizar o Projeto Nova Luz.86 Também, enquanto uma reação dos Governos

Municipal e Estadual ao programa federal de enfrentamento do crack lançado pelo

Governo Federal.87

Em conversas, Alckmin repedia que a dependência química é a pauta do

momento e manifestou o temor de que o governo Dilma assumisse a bandeira de

combate ao tráfico de drogas.

O Governo Federal, em dezembro de 2011, lançou o Plano Integrado de

Enfrentamento ao Crack e outras drogas, com ações na área de saúde e de

segurança pública.

Com o slogan “Crack, é possível vencer”, as ações foram divididas em três

eixos: atendimento aos dependentes e seus familiares, combate ao tráfico de droga

e prevenção. As ações serão organizadas articulando a União, Estados e

Municípios.

O plano prevê um total de 308 consultórios de rua em todo o país, até 2014,

formados por médicos, enfermeiros e psicólogos que devem atender os usuários. A

previsão é de instalação de 8 consultórios na cidade de São Paulo.

Também está prevista a criação de enfermarias especializadas nos hospitais

do Sistema Único de Saúde. Até 2014, o Ministério da Saúde deverá repassar os

recursos para criação de 2.462 leitos, que serão usados para atendimento e

internações de curta duração durante as crises de abstinência e em caso de

intoxicações graves.

Na área de segurança, o objetivo do plano é a integração das áreas de

inteligência da Política Federal, Polícia Rodoviária Federal e polícias estaduais, além

do aumento no policiamento nos pontos de uso de drogas. Também serão

intensificadas as ações de combate ao tráfico nas regiões de fronteira.

No eixo prevenção, serão planejadas ações em escolas, bairros e campanhas

de comunicação. Somente no Programa de Prevenção do Uso de Drogas nas

Escolas, a proposta é capacitar 210 professores e 3.300 policiais para prevenção do

uso de drogas em 42 mil escolas públicas.

86

“Projeto Nova Luz está emperrado na prefeitura”, 06/1/2012. Folha de São Paulo, Caderno Cotidiano.

87“Kassab e Alckmin temiam ação do governo federal”, em 06/1/2012. Folha de São Paulo, Caderno Cotidiano.

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125

Outra medida é facilitar o acesso ao serviço Viva Voz, de orientação sobre

drogas pelo telefone. O número passará do atual 0800-5100015 para um de três

dígitos, o 132.

Enquanto o Poder Público, nas três esferas, lança ações de combate ao

crack, a sociedade se divide quanto à eficácia e à necessidade de ações como vem

ocorrendo na “cracolândia” do bairro da Luz.

Pesquisa realizada pelo Estado de São Paulo88 apontou que 84,7% das

pessoas entrevistadas apoiam a Operação Centro Legal, porém 67,9% não

acreditam que as medidas darão conta dos problemas. As medidas policiais são

totalmente aprovadas por 63,2% dos entrevistados, enquanto 4,5% aprovam e

15,2% desaprovam. 77% dos entrevistados afirmaram que a ação da polícia apenas

dispersou os dependentes, opinião compartilhada pela Coordenadora do Núcleo de

Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Daniela Skromov:

O problema pode simplesmente ter sido adiado. Para onde vão essas pessoas depois de saírem da prisão e das internações? Talvez elas tenham sido somente retiradas de vista e podem depois retomar para o mesmo lugar onde estavam.

A partir da denúncia de atos de violência na Operação Centro Legal, mais de

100 entidades e movimentos sociais uniram-se e formaram o Movimento Luz Livre89.

O movimento organizou dois atos, em janeiro de 2012, para denunciar os métodos

utilizados contra os usuários de crack.

No dia 14 de janeiro, cerca de duas mil pessoas ocuparam parte do Bairro da

Luz, onde fica a maior concentração do uso do crack. O evento foi chamado de

“Churrascão na Cracolândia” e, além do churrasco, aconteceram atividades como

roda de samba, oficina de Kraft, performances de grupos de teatro, sarau de

poesias, etc., conforme foto abaixo:

88

“Pesquisa aponta que 84,7% defendem ação policial na cracolândia”, em 03/02/2012. Disponível em: <http://www.estadao.com.br>.

89Maiores informações no site: <http://luzlivre.wordpress.com>.

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Figura 7 – Churrascão na Cracolândia Fonte: Disponível em: <http://noticias.r7.com>.

No dia 25 de janeiro, o Movimento organizou o ato “Especulação Extermina,

BASTA de trevas na Luz e em São Paulo”. A manifestação começou em frente à

Catedral da Sé, com cerca de três mil participantes, que seguiram, conforme foto

abaixo, em direção à Prefeitura e, em seguida, para a Luz, onde o ato foi encerrado

com uma manifestação cultural.

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Figura 8 – Ato “Especulação Extermina, BASTA de trevas na Luz e em São Paulo” Fonte: Disponível em: <www.sintrajud.org.br>.

O Movimento divulgou um manifesto90 em que denuncia a “ostensiva

ocupação militar da região da Luz” e o “processo violento de higienização e

criminalização da pobreza” promovidos pelos governos Municipal e Estadual.

A política de causar “dor e sofrimento”, nas palavras do próprio coordenador de Políticas sobre Drogas do governo, Luiz Alberto Chaves de Oliveira, tem o claro objetivo de “limpar” aquelas pessoas dali de modo a abrir espaço para a implementação do Projeto Nova Luz, que prevê a demolição de um terço das construções da região para a reconstrução e valorização do espaço com vistas ao lucro da especulação imobiliária, financiadora esta dos políticos que ocupam o poder.

Além do manifesto, as denúncias de abuso e violência policial foram levadas

à Organização das Nações Unidas (ONU) por quatro entidades: a Conectas, a

Pastoral Carcerária, o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e o Instituto

Práxis de Direitos Humanos.

90

Disponível na página do Movimento: <http://luzlivre.wordpress.com>.

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128

5 O PROJETO NOVA LUZ: surgimento e proposta

5.1 Antecedentes e Proposta

5.2 As Intervenções no Bairro da Luz a Partir da Década de 1980

Concomitante às intervenções na região central, ações foram realizadas no

bairro da Luz, especialmente nas áreas da cultura e da preservação do patrimônio

histórico.

O Projeto “Luz Cultural” ocorreu no período de 1984 a 1986, sob coordenação

da Secretaria de Estado da Cultura, com o objetivo de dinamizar a área através do

aproveitamento integrado e organizado de sua infraestrutura. As ações foram

organizadas a partir do mapeamento dos equipamentos culturais da região e

possuíam dois eixos: a valorização do potencial cultural da região com a divulgação

e ampliação das atividades, e a incorporação dessas atividades na vida cotidiana

dos moradores.

As atividades propostas pretendiam incentivar um movimento dentro da própria comunidade, que através do uso efetivo dos espaços e equipamentos culturais, fosse capaz de gerar demandas específicas para a melhoria do ambiente urbano (MOSQUEIRA, 2007, p. 139).

Em contraponto a muitas intervenções realizadas de forma centralizada pelo

Poder Público na região central, o Projeto “Luz Cultural” valorizava o potencial de

participação da comunidade e seu potencial para gerar as mudanças necessárias.

Nos meados da década de 1990, o Governo do Estado de São Paulo lançou o

projeto “Polo Luz” com a integração das Linhas da Companhia Paulista de Trens

Metropolitanos (CPTM) da Zona Leste às Estações Luz, Brás e Barra Funda e a

recuperação/implantação de equipamentos culturais. Com esse projeto, a Luz

“reforçaria sua vocação de pólo difusor da transformação urbana” (MOSQUEIRA,

2007, p. 140).

Com esse propósito, o Governo do Estado investiu na reforma da Pinacoteca

do Estado de São Paulo e na abertura do Complexo Cultural Júlio Prestes com a

inauguração da Sala São Paulo com participação da iniciativa privada.

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Aconteceram, ainda, as reformas e adequações do Jardim da Luz, do Museu

da Luz, do Museu de Arte Sacra, do Edifício do Departamento Estadual de Ordem

Política e Social (DEOPS) e do Museu da Língua Portuguesa junto à Estação Julio

Prestes.

Em 2002, o Governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso

conveniou-se com Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para a

execução do Programa de Preservação do Patrimônio Histórico Urbano –

Monumenta no Brasil. Segundo Mosqueira (2007, p. 147), o programa firmou-se com

o objetivo de “atacar as causas da degradação do patrimônio histórico em centros

urbanos onde se localizam bens tombados pelo Instituto de Patrimônio Artístico

Nacional (IPHAN)”.

O Programa coordenado pelo Ministério da Cultura, em junho de 2002, tem

como parceira a Prefeitura do Município de São Paulo para a recuperação do

Conjunto Histórico da Região da Luz.

A proposta desenvolvida “Perfil do Projeto – Área da Luz” objetivava

recuperar a centralidade do bairro na cidade através da recuperação do patrimônio,

da requalificação do espaço urbano, da capacitação e educação patrimonial, e do

financiamento para recuperação de imóveis particulares.

A primeira iniciativa desse projeto foi a recuperação, em 2002, da chaminé

remanescente da primeira usina elétrica da cidade, na Rua João Teodoro; única

obra realizada até 2004.

Com a renovação do convênio até 2007, algumas obras foram realizadas,

como a restauração do coreto, da ponte do bonde e do prédio do Ponto Chic no

Jardim da Luz; restauro e conservação da Capela da Imaculada Conceição da Luz;

reurbanização da Praça Fernando Prestes; restauro das fachadas dos edifícios

Ramos de Azevedo e Paula Souza; a recuperação da Casa Administrativa do Jardim

da Luz; entre outras.

5.3 Projeto Nova Luz: surgimento e proposta

Durante a gestão Serra/Kassab (2005-2008), evidenciou-se o interesse de

intervir na região da Luz. Essa gestão herdou, não só o Plano Diretor e os Planos

Regionais Aprovados, mas, também, “um contrato com o BID no valor de US$ 100,4

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130

milhões, com US$ 67 milhões em contrapartidas municipais, para realizar as

transformações na região central de São Paulo” (SOUZA, 2011, p. 38).

As principais ações dessa época, lideradas pelo subprefeito da Sé, Andrea

Matarazzo, foram direcionadas para a limpeza urbana e o policiamento conforme

apontado pelo jornal Folha de São Paulo, em março de 2005, em reportagem

intitulada “Cracolândia ganha repressão e ações sociais”.91 Ao longo deste ano,

foram anunciadas com frequência propostas em relação à necessidade de

revitalização da área conhecida como “cracolândia”, apontando a intenção de atrair

a iniciativa privada para o processo de transformação da área.

Mesmo não tendo divulgado um plano urbanístico com diretrizes de transformação para a área, o então prefeito José Serra encaminhou para a Câmara Municipal, em setembro de 2005, um projeto de Lei de incentivos fiscais em um perímetro específico. Concomitantemente, assinou um decreto de utilidade pública para a mesma região (CYMBALISTA, 2008, p. 67).

O Decreto nº 46.291, aprovado em 2005, declara de utilidade pública, no

Distrito da República, 750 imóveis particulares para desapropriação judicial ou

adquiridos mediante acordo, em função do plano de urbanização em uma área de

105.033,59 m2 nas ruas Mauá, dos Andradas, dos Timbiras, parte da Praça Alfredo

Iça e Avenida Casper Líbero abrangendo 11 quadras.

Também em dezembro de 2005, é aprovada a Lei nº 14.096, que cria o

Programa de Incentivos Seletivos para a região adjacente à Estação da Luz com o

objetivo de atrair empresas e transformar o bairro da Santa Ifigênia em um polo de

tecnologia.

A lei destina-se a investidores, pessoa física ou jurídica, previamente

habilitados no Programa de Incentivos Seletivos, que realizem despesas no valor

igual ou superior a R$ 50.000,00, compreendendo:

Elaboração de projeto, limitado a 5% do valor do investimento;

Aquisição de terreno;

Execução de obras (materiais e mão de obra);

Melhoria em instalações incorporadas aos imóveis;

Aquisição e instalação de equipamentos.

91

Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br>.

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131

Os investidores terão direito a uma Certificação de Incentivo ao

Desenvolvimento abrangendo:

a) 50% do valor dos investimentos, que inclui construção, restauração,

preservação de imóvel residencial e de atividades comerciais, previstas

em lei.

b) 80% do valor dos investimentos destinados às atividades de prestação de

serviços previstas na lei.

Com esses certificados, os investidores terão direito à redução de 50% do

Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU); 50% do Imposto sobre Tramitação de

Bens Imóveis (ITBI); 60% do Imposto Sobre Serviço (ISS) de construção civil ou

outros serviços do imóvel objeto do investimento.

Em outubro de 2005, a Prefeitura abriu um cadastro on-line para empresas

interessadas em investirem no bairro da Santa Ifigênia. No total, 23 empresas se

cadastraram e apresentaram proposta, sendo sancionada, em dezembro de 2005, a

Lei Municipal nº 14.096, que concedia a essas empresas o benefício do Programa

de Incentivos Seletivos para a Região Adjacente à Estação da Luz.

Em fevereiro de 2007, o Poder Público anunciava um plano para revitalizar a

Região da Luz, e o Conselho do Programa de Investimentos Seletivos para Região

Adjacente à Estação da Luz (COLUZ) lança o Edital de Chamamento para

Habilitação, Análise e Seleção de Projetos de Investimento a serem implantados na

Região Adjacente à Estação da Luz. O edital detalha os critérios para a

apresentação de propostas para o Programa.

Em julho de 2007, são abertas as inscrições para empresas interessadas em

investir na região, tendo, inicialmente, 62 empresas interessadas. Em julho de 2008,

a prefeitura anuncia as empresas beneficiadas pelo Programa92, sendo onze

empresas de sistemas, cinco investidores imobiliários, três call centers, uma gráfica,

uma empresa de publicidade, um shopping center e um equipamento cultural. A

92

IBM Brasil Ind. Máquinas e Serviços Ltda., BRProperties S/A, Instituto Moreira Salles, Mercado Eletrônico S/A, E-safetransfer S/A, Digisign Ltda, Meta Serviços em Informática Ltda., Fess Kobbi Ass. de Marketing e Comunicação Ltda, Klar Ind. de Com. De Elétrico Eletrônicos Ltda., TMS Call Center S/A, Partifib Projetos Imobiliários, DMF Construtora Incorporadora Ltda., BRQ Soluções em Informática S/A, Pyxsinfo Tecnologia Ltda., Audatex Brasil Serviços Ltda., Magma Sistemas Consultoria S/A, Microsoft Informática Ltda., Bravo Telecomunicações Ltda., Atento Brasil S/A, TNL CONTAX S/A, BRACOR Empreendimentos Imobiliários Ltda.

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entrega dos Termos de Concessão de Incentivos Fiscais ocorreu em fevereiro de

2009.

Também o Decreto nº 46.291/2005 é reeditado93, ampliando a área

considerada de utilidade pública para 269.300,73 m2 abrangendo, não apenas a

Subprefeitura da Sé, mas áreas vizinhas como a Avenida do Estado, Santos

Dumont, ruas Francisco Borges e David Bigio.

Junto com o decreto de Utilidade Pública e a ampliação da área passível de desapropriações, começaram as especulações sobre grupos imobiliários interessados em transformar a “cracolândia” em um bairro novo. (...) As inúmeras críticas referente aos atrasos do Projeto Nova Luz e à ampliação do perímetro para desapropriações, fizeram com que o Poder Público Municipal buscasse novas soluções (SOUZA, 2011, p. 44).

O Sindicato da Habitação (SECOVI) é chamado pelo Poder Público para

contribuir no processo, e um grupo de empresários contratou o urbanista e arquiteto

Jaime Lerner, ex-governador do Paraná, para desenvolver um estudo para

revitalização da Região da Luz.

O projeto de Lerner, segundo Souza (2011) era baseado no modelo

urbanístico de Paris, gerando o primeiro movimento de indignação nos comerciantes

da região da Santa Ifigênia.

Além do SECOVI, a construtora Odebrecht chegou a produzir material para empreendimento na região, com áreas térreas repletas de lojas e andares superiores com apartamentos cujas metragens variavam de 65 a 120 metros quadrados. O projeto para a Santa Ifigênia foi desenvolvido pelo arquiteto Márcio Lupion a pedido da grande construtora (SOUZA, 2011, p. 48).

Mas as dificuldades da prefeitura estavam na falta de recursos para viabilizar

o projeto de Lerner e as desapropriações necessárias para o empreendimento. O

SECOVI passou a considerar o instrumento de concessão urbanística como

possibilidade para resolver esses problemas.

Durante todo o ano de 2008, ano de eleições municipais, a imprensa

concentrou-se em trazer os problemas envolvendo os usuários de crack na região e

o abandono das áreas desapropriadas pela Prefeitura.

Somente em junho de 2008, foi divulgado o Projeto Urbanístico Nova Luz,

com a missão de

93

Decreto nº 48.349 de 2007.

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133

(...) definir as bases para a requalificação da região e a implementação de equipamentos e serviços que reforcem suas características comerciais, culturais e sociais (...) valorizando os atributos positivos dessa área e transformando as áreas deterioradas e subutilizadas para fortalecer as atividades econômicas existentes.

94

Segundo o Projeto, a região em que ocorrerão as intervenções possui cerca

de 500 mil metros quadrados e forma um polígono circunscrito pelas avenidas

Ipiranga, São João, Duque de Caxias, Rua Mauá e Avenida Casper Líbero,

conforme mapa 3.

Mapa 3 ‒ Polígono da Luz – Projeto Nova Luz Fonte: Relatório de Impacto Ambiental/2011

Estão previstas ações de demolições de alguns quarteirões, com a

transferência da população moradora desses imóveis para as Zonas Especiais de

Interesse Social (ZEIS) e a concessão de cartas de crédito para que essas famílias

possam comprar imóveis em outros locais.

94

Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br>. Acesso em: 04 nov. 2001.

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134

Também prevê a ampliação e a requalificação de áreas verdes e espaços

livres de uso público, construção de novos edifícios, recuperação e restauro do

patrimônio histórico.

A área na qual a Prefeitura está investindo em requalificação é composta e

circundada por um dos mais importantes polos culturais do Centro, formado pela

Sala São Paulo, a Pinacoteca do Estado, a Estação Júlio Prestes, o Parque da Luz,

o Museu da Língua Portuguesa e a Museu de Arte Sacra.

Abriga, atualmente, um dos mais importantes centros de comércio de São

Paulo, a Rua Santa Ifigênia, no segmento de eletroeletrônicos, além de comércio

especializado em peças e partes automotivas, lojas de instrumentos musicais e

equipamentos de som e luz.

Está previsto que a região receberá o Complexo Cultural – Teatro da Dança,

ocupando o quarteirão localizado entre a Praça Júlio Prestes e a Avenida Rio

Branco, com as laterais para a Avenida Duque de Caxias e Rua Helvétia, incluindo a

antiga rodoviária da cidade, onde funcionava o Shopping Center Luz. O Complexo

Cultural abrigará três teatros e a instalação das sedes da Escola de Música do

Estado de São Paulo – Tom Jobim e da SP Companhia de Dança.

Também está prevista a instalação do Centro Paula Souza, que terá, além da

sede da instituição, uma nova escola técnica e um centro de capacitação de

professores, em um complexo que ocupará um terreno entre as ruas Timbiras,

Andradas, Aurora e General Couto de Magalhães.

A valorização obtida pelos investidores da Nova Luz, graças às desapropriações generosas da prefeitura, seria exacerbada com a chegada da nova linha do Metrô, e a implementação de outras obras pela prefeitura, como a revitalização do Minhocão, de tal forma a criar na cidade um novo bairro central de alta classe e com fantástica valorização imobiliária (FERREIRA, 2007, p. 196).

As diretrizes para o Projeto Urbanístico e que, posteriormente, foram

retomadas no edital público do projeto, lançado em 2009, apontam para a

constituição deste novo bairro:

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Potencialização do comércio existente na região, com especial atenção ao setor

de tecnologia, representando pelos empresários da Rua Santa Ifigênia e entorno;

Diversificação dos perfis habitacionais, de forma a construir um ambiente

heterogêneo;

Recuperação de áreas degradadas ou deterioradas visando a melhoria do meio

ambiente;

Ampliação das áreas públicas destinadas a praças e ao convívio social;

Melhoria das condições gerais de mobilidade e da infraestrutura da região;

Recuperação do patrimônio histórico, cultural e artístico existente no local;

Criação de um ambiente social que promova o desenvolvimento social e

econômico.

5.4 Trajetória Legal e Política

Para dar andamento à proposta de reurbanização da região, em fevereiro de

2009, o Executivo Municipal encaminhou à Câmara dos Vereadores o Projeto de Lei

nº 0087/2009, que dispõe sobre a concessão urbanística no município de São Paulo,

bem como autoriza o Executivo a aplicá-la nas áreas do Projeto Nova Luz.

Segundo reportagem publicada na Folha de São Paulo95, o Projeto de Lei visa

“privatizar” bairros para as revitalizações, acelerando os processos de

desapropriação. O interesse do mercado estaria na valorização das regiões

revitalizadas, como, por exemplo, no bairro da Luz, onde o metro quadrado da

edificação valorizaria em 100% em cinco anos.

Em 06 de março de 2009, as Comissões Permanentes de Política Urbana,

Metropolitana e Meio Ambiente e de Constituição, Justiça e Legislação Participativa,

presididas pelos Vereadores Carlos Apolinário e Ítalo Cardoso, respectivamente,

chamaram uma Audiência Pública96 com o objetivo de discutir a constitucionalidade

do Projeto de Lei.

95

“Gestão Kassab quer „privatizar‟ bairros para revitalização”. Folha de São Paulo, 26/2/2009. 96

Segundo as notas taquigráficas da audiência, disponibilizada no site: <http://www.acsisanta.com.br>, estavam presentes e fizeram ou não uso da palavra José Fernando Brega, Procurador e chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano; Antônio Carlos Cintra do Amaral Filho, Procurador e chefe da assessoria jurídica da Secretaria do

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136

A Audiência contou com a presença do Prof. Adilson Dallari97, que tratou da

constitucionalidade do projeto de lei, destacando que a concessão urbanística está

prevista na Constituição de 1988 e no Estatuto da Cidade. Pontuou que é preciso

reforçar a participação popular nos projetos que envolvem a concessão para que os

investimentos sejam de interesse público, não do mercado especulativo imobiliário.

Segundo ele, “a concessão urbanística fortalece muito a capacidade de

planejamento do Poder Público” (2009, p. 10).98

Quanto às desapropriações, aponta que a vantagem da concessão

urbanística está no ressarcimento, autorizado pelo Poder Público, mas realizado

pelo investidor privado. Que a finalidade do Projeto Nova Luz deve estar no

urbanístico, mas deve levar em conta o aspecto social e as pessoas que habitam a

região.

As manifestações realizadas pela plenária, além de reafirmarem a ilegalidade

do projeto de lei, levantaram questões quanto à exploração do espaço público pela

iniciativa privada; a ampliação dos canais de controle do projeto pelo Poder Público

e pela população; a necessidade de detalhar como se darão as desocupações e a

relação com as ZEIS; a ausência de definição de conceitos como “área degradada”

e “esvaziamento urbano”, entre outras. Também se sugeriu a divisão do projeto de

lei, sendo que um deles trataria da concessão urbanística e, o outro, da concessão

urbanística do Projeto Nova Luz.

A plenária também se manifestou quanto à pouca divulgação da audiência e a

ausência dos movimentos sociais presentes na região central.

Governo Municipal; Valéria Rossi, da Secretaria do Estado do Planejamento; Regina Marceli Bacareti, da Secretaria do Estado do Planejamento, da assessoria técnica do Sr. Secretário Francisco Vidal Luna; José Batista Neto, assessor da Secretaria da Coordenação das Subprefeituras, Babenco, Diretora do Instituto do Patrimônio; André Goldman, assessor da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente; José Alexandre Sanches, assessor da Secretaria de Governo; Associação dos Comerciantes de Santa Ifigênia; Camila Garcia, diretora; Paulo César Garcia, diretor; e Carlos Eduardo, assessor; Marco Antônio Ramos de Almeida, da Associação Viva Centro; Antônio Timóteo, da Terceiro Milênio; Iênidis Benfatti, da ONG Viva Pacaembu por São Paulo; Eduardo Merge, da Assuapi; João do Nascimento, da Agenda 21 Jabaquara/Vila Mariana/Ipiranga; Nancy Yoshii, da Associação Cultural Desportiva Nikkei; Eduardo Fontes, do Movimento pelo Direito à Moradia; Antônio Geraldo Souza Rinaldi, da Associação dos Lojistas de Santa Ifigênia; Airton Góes, do Movimento Nossa São Paulo; Vereadores e Vereadoras Agnaldo Timóteo, João Antônio, José Olímpio, Carlos Apolinário, Zelão, Juscelino Gadelha e José Police Neto, Sandra Tadeu, Juliana Cardoso, Jamil Murad e Claudio Fonseca.

97Professor Titular de Direito Administrativo da PUC/SP.

98Notas taquigráficas da ata da Audiência Pública da Comissão Permanente de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente e Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa da Câmara Municipal de São Paulo, realizada em 06/03/2009. Disponível em: <http://www.acsisanta.com.br>.

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Em 17 de março de 2009, nova Audiência Pública99 foi chamada pela

Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente com o objetivo de

discutir o conteúdo do Projeto de Lei nº 0087/2009. A Associação dos Comerciantes

da Santa Ifigênia organizou um protesto público que saiu da Santa Ifigênia e seguiu

até a Câmara Municipal empunhando faixas e cartazes com dizeres como “São

Paulo está à venda” e “Grite agora ou chore depois”.100

“Munidos de apitos e cornetas, os manifestantes seguiram ao lado de dois

caminhões de som, demonstrando seu descontentamento com a proposta,

caracterizando-a como uma tentativa de “leiloar” a cidade” (SOUZA, 2011, p. 70).

A exposição do projeto foi realizada por Miguel Luiz Bucalem, Secretário

Municipal de Desenvolvimento Urbano, e Rubens Chammas, Diretor de

Desenvolvimento e Intervenção Urbana da Empresa Municipal de Urbanização

(EMURB). A exposição tratou de aspectos gerais da concessão urbanística, como

sua regulamentação e procedimentos, e as intervenções propostas para o Projeto

Nova Luz.

A plenária manifestou-se, em sua grande maioria, retomando a necessidade

de separar os temas do Projeto de Lei: concessão urbanística e concessão

urbanística do Projeto Nova Luz. Também se manifestou pela revisão do Plano

Diretor do Município; a necessidade de ampliar a consulta da população da região

do Nova Luz e de envolver os Conselhos de Habitação, de Políticas Urbanas e a

Câmara Técnica de Legislação Urbanística; os critérios para as desocupações; e a

ausência de ações eficazes do Estado em relação à “cracolândia”.

Muitas falas indignadas trataram do descaso do Poder Público com a

população moradora da região que será desapropriada, não só proprietários, mas,

também os inquilinos; a falta de informações sobre as mudanças no comércio,

99

Segundo notas taquigráficas da ata da audiência, disponível no site: <http://www.acsisanta.com.br>, estavam presentes e fizeram ou não uso da fala os Vereadores José Police Neto, José Ferreira dos Santos, Jamil Murad, João Antônio, Claudio Fonseca, Roberto Trípoli, Toninho Paiva, Chico Macena, Claudio Fonseca, Nabil Bonduk, Eliseu Gabriel, Juscelino Gadelha, Ítalo Cardoso, Paulo Frange – PTB. Também Elizabeth Sampaio da Associação dos Comerciantes do bairro de Santa Ifigênia, Agnaldo Doratiotto, da Associação dos Comerciantes do Bairro da Santa Ifigênia; Ana Maria, do Conselho Municipal de Habitação; Eduardo Merge, da Assuapi; Lucila Lacreta, do Movimento Defenda São Paulo; Iênidis Benfatti, da Associação Viva Pacaembu; Paulo César Garcia, da Associação dos Comerciantes do Bairro de Santa Ifigênia; Sra. Terezinha Barros, do Cades Jabaquara; Karina Uso, do Instituto Police; João Paulo Fernandes, da Associação dos Comerciantes do Bairro de Santa Ifigênia; Igor Carvalho, munícipe; Benedito Roberto Barbosa, da União dos Movimentos de Moradia de São Paulo; Antônio Pedro, da FACESP; e Malcon Forest, da AMAR.

100“Comerciantes protestam contra projeto de Kassab”. Folha de São Paulo, 17/3/2011.

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especialmente da Rua Santa Ifigênia; e o uso pela mídia e pelo Poder Público da

situação da “cracolândia” para desqualificar a região e justificar o projeto.

Uma semana depois da segunda audiência pública, o projeto de lei nº 87 de 2009 foi submetido à votação e aprovado – em primeira discussão – no dia 25 de março de 2009, durante a 15 sessão extraordinária realizada na Câmara Municipal. Dos 50 vereadores presentes na sessão, 38 votaram a favor e 12 se abstiveram – as bancadas do PT e do PCdoB. As bancadas da oposição preferiram a abstenção ao projeto de lei como um sinal de protesto: muitas das propostas, sobretudo as reivindicações de separação do projeto de lei em dois, não foram acatadas (SOUZA, 2011, p. 77).

Diante da relatoria das Comissões da Câmara e das manifestações nas

Audiências Públicas, o Executivo Municipal enviou um Substitutivo para o Projeto de

Lei nº 087/2009 tratando, apenas, da regulamentação da concessão urbanística. A

concessão urbanística para o Projeto Nova Luz foi enviada através do Projeto de Lei

nº 158/2009.

No dia primeiro de abril de 2009, data da 19ª sessão extraordinária, houve três aprovações consecutivas de um único projeto de lei. Aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa e pela Comissão de Política Urbana – por seis votos a um e uma abstenção – o projeto de lei 158 foi encaminhado ao plenário para votação. A oposição (PT e PCdoB) tentou obstruir a votação e adiá-la. Mas a força do governo foi maior e, dos 46 vereadores presentes à sessão, 40 votaram a favor e apenas seis votaram contra. Após aprovação em primeira sessão, por meio de uma representação do Partido dos Trabalhadores (PT), o presidente da Comissão de Política Urbana, Carlos Apolinário (DEM), decidiu solicitar mais duas audiências públicas para discutir o novo projeto de lei (SOUZA, 2011, p. 78).

A Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia, buscando barrar a

aprovação dos projetos de lei na Câmara Municipal, enviou uma representação junto

ao Ministério Público do Estado de São Paulo e o Conselho de Ética da Câmara

denunciando que o relator dos Projetos de Lei, Vereador José Police Neto (PSDB),

recebeu doações de empreiteiras e imobiliárias para sua campanha política em

2008.

Em 24 de abril de 2009, a imprensa noticiou amplamente que a maioria dos

vereadores que aprovaram o Projeto Nova Luz nas Comissões da Câmara recebeu

doações da Associação de Imobiliárias Brasileira (AIB), ligada ao Sindicato da

Habitação do Estado de São Paulo.101

101

Reportagem publicada na Folha de São Paulo, em 24/4/2009, aponta que os partidos receberam os seguintes recursos da Associação de Imobiliárias Brasileira – DEM – 1,32 milhões; PSDB – 1,51 milhões; PV – 1,35 milhões; e PT – 566 mil.

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Em maio, a ABI assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) junto

ao Ministério Público Eleitoral, comprometendo-se a não realizar doações a

candidatos e partidos políticos. O Tribunal Regional Eleitoral abriu inquérito para

investigar as doações realizadas pela AIB para as campanhas políticas.102

No dia 03 de abril de 2009, realizou-se a primeira audiência pública sobre o

projeto de lei nº 158, que autoriza o Executivo a aplicar a concessão urbanística na

área do projeto Nova Luz.103 O diretor de intervenção urbana da EMURB, Rubens

Chammas, apresentou o projeto de revitalização e, novamente, os presentes

questionaram a legalidade do instrumento da concessão urbana, as garantias de

permanência de inquilinos e proprietários, e pronunciamentos favoráveis e contrários

dos vereadores presentes.

A segunda audiência ocorreu no dia 14 de abril de 2009104, com os presentes

bastante exaltados em decorrência dos rumos que o projeto de lei estava tomando

para a aprovação. O presidente da Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia,

Paulo Garcia, referiu-se à audiência “como um teatro, que visa apenas passar a

imagem de que a Câmara é democrática”.

Após o pronunciamento de Rubens Chammas, novas manifestações

ocorreram questionando os projetos que, segundo os presentes, ferem o direito à

propriedade; denunciando o envolvimento dos vereadores com a AIB; a não

participação popular e dos Conselhos na discussão e definição do projeto; a

insegurança de permanência de proprietários e inquilinos. Novamente os vereadores

também se manifestaram com argumentos favoráveis e contrários ao Projeto de Lei.

102

Em 12/5/2009, o Tribunal Eleitoral de São Paulo considerou as doações realizadas pela AIB ilegais, pois desrespeitam a lei eleitoral. Em outubro, 13 vereadores tiveram seus mandatos cassados por irregularidades e, no mesmo mês, o Juiz da Primeira Zona Eleitoral do Estado de São Paulo suspendeu a cassação, determinando que os vereadores aguardassem o julgamento sem perder o mandato.

103Informações coletadas das notas taquigráficas da audiência pública realizada em 3 de abril de 2009. Disponível em: <http://www.acsisanta.com.br>.

104Informações coletadas das notas taquigráficas da audiência pública realizada em 14 de abril de 2009. Disponível em: <http://www.acsisanta.com.br>.

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No dia 22 de abril, os vereadores se reuniram para a segunda votação dos projetos de lei nº 87 e nº 158. Antes da aprovação do projeto nº 87, foi votado o substitutivo encaminhado pela bancada do PT: 12 vereadores (das bancadas do PT e PCdoB) foram favoráveis. No entanto, 40 parlamentares foram contrários à proposta assinada pelo vereador Chico Macena (PT). Durante a realização da 25 sessão extraordinária, o projeto de lei nº 87, do relator Police Neto, foi aprovado por 42 vereadores, inclusive pela bancada do PCdoB, que considerou que o Governo atendeu algumas de suas reivindicações. Dez vereadores da bancada do PT votaram contra. Em seguida, o plenário aprovou o substitutivo do projeto de lei nº 158, autorizando o Poder Público Municipal a aplicar a concessão urbanística na área do Projeto Nova Luz. Na votação, 41 vereadores votaram favoráveis ao projeto de lei, inclusive a bancada do PCdoB. Somente a bancada do PT votou contra (SOUZA, 2011, p. 88).

Apesar das denúncias e pressões, os projetos de lei foram aprovados e

sancionados pelo Prefeito Gilberto Kassab, através das Leis nºs 14.917 e 14.918.

A Lei nº 14.917, que dispõe sobre a concessão urbanística no município de

São Paulo, em seu artigo 1º, define a concessão urbanística como:

(...) um instrumento de intervenção urbana estrutural destinado à realização de urbanização ou de reurbanização de parte do território municipal a ser objeto de requalificação da infraestrutura urbana e de reordenamento do espaço urbano com base em projeto urbanístico específico em área de operação urbana ou área de intervenção urbana para atendimento de objetivos, diretrizes e prioridades estabelecidas na lei do plano diretor estratégico.

Entre as diretrizes que justificam a concessão urbana, destacam-se: elevar a

qualidade do ambiente urbano; racionalizar o uso da infraestrutura instalada;

prevenir distorções e abusos no desfrute econômico da propriedade urbana e coibir

o uso especulativo da terra; permitir a participação da iniciativa privada; recuperar

áreas degradadas e deterioradas; adequar a urbanização às necessidades

decorrentes de novas tecnologias e modos de vida, entre outros (artigo 1º, parágrafo

1).

Define que a concessão urbanística se dará por contrato administrativo, por

meio de licitação, realizado com pessoa jurídica ou consórcio de empresas (artigo

2º), para intervenções no sistema viário, da estrutura fundiária, de instalações de

equipamentos urbanos, da localização de logradouros públicos, demolição, reforma,

ampliação ou construção de edificações nos termos especificados no plano

urbanístico específico (artigo 3º). Inclui como objeto de concessão a exploração do

solo, do subsolo e do espaço aéreo, inclusive com implantação de garagens

subterrâneas e a gestão das redes de infraestrutura instaladas em áreas municipais

(artigo 3º, parágrafo 4º).

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Estabelece que toda concessão urbanística deverá ser autorizada por

legislação específica (artigo 5º) e deverá ser precedida de estudos de viabilidade

econômica, mercadológica, situação fundiária, impacto ambiental e de vizinhança;

estudos dos custos e benefícios sociais, urbanísticos e ambientais; e

(...) a realização de uma audiência pública na área central do município e na de cada uma das subprefeituras em que será realizada a intervenção urbana, possibilitando a interação com proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados eventualmente interessados (artigo 7º).

Estabelece, também, os critérios para abertura de edital de licitação, sua

participação e julgamento das propostas, bem como as condições para o contrato de

concessão urbanística. Define a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano

(SMDU) como responsável pelas atividades de planejamento da concessão

urbanística e a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (SIURB) pela

outorga da concessão urbanística, cabendo-lhe a abertura da licitação, a

contratação, a supervisão e a fiscalização da concessão (artigos 36 e 37).

O artigo 38 estabelece a criação de um Conselho Gestor, para fiscalização de

cada concessão urbanística, com representantes do Poder Público e da sociedade

civil,

(...) de forma a propiciar a participação dos cidadãos interessados, tais como moradores, proprietários, usuários e empreendedores, cabendo ao Conselho Gestor as providências necessárias para a verificação e acompanhamento do cumprimento das diretrizes da intervenção urbana e do respectivo contrato de concessão.

O Conselho Gestor será instituído após a celebração do contrato de

concessão urbanística, e os membros da sociedade civil serão indicados pelo

Conselho Municipal de Política Urbana. A presidência do Conselho será indicada

pelo Executivo.

A Lei nº 14918/2009, aprovada da mesma data, autoriza o Executivo a aplicar

a concessão urbanística na área da Nova Luz, definida como o “conjunto de

intervenções urbanísticas necessárias para a execução de projetos urbanísticos

específicos no perímetro definido pelas Avenidas Casper Libero, Ipiranga, São João,

Duque de Caixas e Mauá, no Distrito da República” (artigo 1º, parágrafo único).

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Estabelece como diretrizes para a concessão urbanística (artigo 2º):

I – Preservação e recuperação do patrimônio histórico, cultural e artístico existente no local:

II – equilíbrio entre habitação e atividade econômica, de forma a propiciar a sustentabilidade da intervenção;

III – implantação de unidades habitacionais destinadas à população de baixa renda, de acordo com as normas urbanísticas aplicáveis às Zonas Especiais de Interesse Social;

IV – incentivo à manutenção e expansão da atividade econômica instalada, especialmente nos setores ligados à tecnologia;

V – execução planejada e progressiva de projeto urbanístico específico, de forma a evitar, durante o período da intervenção, o agravamento dos problemas sociais e minimizar os impactos transitórios negativos delas decorrentes.

Também estabelece a realização pelo Executivo Municipal de um cadastro de

moradores e das atividades econômicas, identificando as condições das moradias e

a presença de empregos na região (artigo 2º, parágrafo 2º). Prevê que o projeto

urbanístico irá definir os imóveis desapropriados levando em conta os aspectos do

tombamento; custo da intervenção na edificação; atendimento social da propriedade

e compatibilidade do imóvel com o entorno (artigo 2º, parágrafo 3º).

Prevê, ainda, no artigo 4º, a constituição do Conselho Gestor da Nova Luz,

com formação paritária entre o Poder Público e a sociedade civil com a função de

fiscalizar e acompanhar as intervenções da concessão urbanística.

Após a aprovação das leis, a Prefeitura de São Paulo lança do Termo de

Referência105 para a Contratação de Serviços Técnicos Especializados para

Elaboração do Projeto Urbanístico Específico e Estudos Ambientais e Econômicos

necessários à viabilização da concessão urbanística na área da Nova Luz.

O objeto do Termo de Referência (2009, p. 6) especifica como produtos:

elaboração do Projeto Urbanístico com a definição dos objetivos, diretrizes e

parâmetros de interesse público da intervenção a ser objeto de concessão

urbanística; o Plano de Urbanização das ZEIS; os Estudos de Viabilidade

Econômica, Mercadológica e de Situação Fundiária da área; os Estudos de Impacto

Ambiental; e o Plano de Comunicação.

Em agosto de 2009 é aberto o Edital para Concorrência106 com as condições

de habilitação, apresentação da proposta técnica, prazo para execução dos

105

Termo de Referência lançado em julho de 2009. Disponível em: <http://www.acsisanta.com.br>. 106

Edital da Concorrência 01/2009/SMDU. Disponível em: <http://www.acsisanta.com.br>.

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serviços, formas de contratação e pagamento. Com um teto máximo de preço de

12,7 milhões, quinze consórcios interessam-se pela concorrência. A entrega das

propostas, previstas para setembro e outubro, é adiada por determinação do

Tribunal de Contas do Município para os meses de dezembro e fevereiro.

Em dezembro de 2009, cinco consórcios são habilitados e, em maio de 2010,

dois são classificados, ganhando a concorrência o Consórcio AECON. O consórcio

foi formado pelas empresas107:

Concremat Engenharia – empresa de engenharia com experiência em projetos de

desenvolvimento urbano e infraestrutura, como o PAC Favela, no Rio de Janeiro,

a recuperação dos Igarapés de Manaus e o Rodoanel, em São Paulo.

Cia. City – empresa de planejamento urbano, fundada em Londres em 1911. Teve

influência na paisagem urbana nacional com a implementação de bairros-jardim,

como o Pacaembu, Jardim América, Ato da Lapa e Alto de Pinheiros.

AECON Technology Corporation – empresa especializada em serviços técnicos

profissionais e de gerenciamento nos segmentos de transporte, edificações, meio

ambiente, energia, água e serviços públicos.

Fundação Getúlio Vargas – entidade voltada ao ensino e pesquisa, com trabalhos

nas áreas de conhecimento de administração, economia e finanças e políticas

públicas.

No mês seguinte, o prefeito Gilberto Kassab assina a ordem de serviço que

autoriza o Consórcio AECON a iniciar o plano de urbanização.

Em 17 de dezembro de 2010, a SMDU publicou uma apresentação on-line,

visando cumprir a etapa da primeira consulta pública, do Projeto Preliminar da

Reurbanização da Nova Luz.108 O documento apresenta, entre outros, os problemas

e as oportunidades de intervenção na região.

As estratégias traçadas para o desenvolvimento do Projeto seguem por três

vertentes: a primeira, a instalação de um centro de tecnologia, formado pelo

comércio de eletrônicos da Santa Ifigênia, a Escola Técnica Estadual Nova Luz e as

possíveis empresas de tecnologia que se instalariam no bairro. A segunda, a um

centro de mobilidade formado pelo comércio de moto-peças, novos modos de

107

Fonte das informações disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br>. Acesso em: nov. 2011. 108

Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br>.

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transporte não definidos e eventos comerciais não especificados. A terceira, um

centro cultural e de entretenimento formado por equipamentos que estão fora do

perímetro do Nova Luz – Pinacoteca, Museu de Arte Sacra e o Museu da Língua

Portuguesa – e um centro comunitário, um cinema e um centro de compras.

Após espacializar sua visão de transformação, o documento detalha cada um dos setores oriundos do raciocínio “âncoras-ligações-espaços públicos de qualidade”. Nele, os espaços pretendidos para os setores do projeto Nova Luz são inspirados em projetos europeus e norte-americanos: para o eixo Vitória, La Rambla em Barcelona; para o Setor Cultural e Entretenimento, Santa Margheritae Veneza; para a praça de vizinhança ZEIS do setor Triunfo, Victoria Manalo em São Francisco; e para o Setor Nébias, Bryant Park em Nova Iorque (SOUZA, 2011, p. 102).

Um mês depois, novo documento é divulgado com a data para a audiência

pública do Projeto Nova Luz: 14 de janeiro de 2011. O documento também

apresentava, além das informações anteriores, os critérios de permanência das

edificações, ou seja, aquelas que seriam mantidas, tombadas ou renovadas.

A Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia e a Câmara dos Dirigentes

Lojistas contrataram o jurista Kiyoshi Harada para redação e encaminhamento da

Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) junto ao Tribunal de Justiça do Estado

de São Paulo, solicitando uma liminar para suspensão da eficácia dos dispositivos

legais da Lei nº 14.917. O encaminhamento deu-se via Sindicato do Comércio de

Material Elétrico (SINCOELETRICO).

Em 25 de abril de 2011, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

suspendeu a lei de concessão urbanística aprovada em 2009, após decisão do

Desembargador Souza Lima, em resposta à ADIN proposta pelo SINCOELÉTRICO.

Após a Justiça ter notificado a Prefeitura quanto à sua decisão, ela recebeu um pedido de agravo regimental e, poucos dias depois da liminar, um novo despacho foi assinado pelo Desembargador Souza Lima cassando a própria liminar (SOUZA, 2011, p. 124).

Os comerciantes tentaram, ainda, duas ADIN, uma por meio do Ministério

Público, outra por meio do SINCOELETRICO, sem obter sucesso. Buscou-se, então,

junto aos partidos políticos de oposição ao Governo Municipal, a possibilidade de

proposição de uma ADIN via partido político para o Supremo Tribunal Federal. O

deputado estadual Carlos Gianazzi (PSOL) concordou em analisar a possibilidade

de confecção da ADIN por intermédio do Partido Socialismo e Liberdade.

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Paralelo aos processos judiciais, a Prefeitura do Município de São Paulo e o

Consórcio AECON deram prosseguimento aos trabalhos contratados em licitação,

as audiência públicas e as reuniões previstas com a comunidade local.

A primeira audiência pública é agendada para 14 de janeiro de 2011, no

auditório da Faculdade de Tecnologia de São Paulo, localizada na Avenida

Tiradentes. Os comerciantes fecharam as lojas da Santa Ifigênia, mobilizaram a

população local e seguiram em passeata até o local da audiência. Diante da

manifestação, o Poder Público cancelou a audiência, alegando que o espaço

reservado não comportaria as pessoas que compareceram.

A audiência é remarcada para 28 de janeiro de 2011, no Palácio das

Convenções do Anhembi, e os comerciantes organizam nova passeata que seguiu

em caminhada do centro até o local.

A audiência, coordenada pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento

Urbano, é marcada por manifestações, inclusive com o bloqueio da fonte de energia

para a ligação dos equipamentos em vários momentos.109 Mesmo com todas as

manifestações, a coordenação da audiência mantém o procedimento de

apresentação da proposta do Projeto Nova Luz pela AECON, o que provoca o

abandono do local pelos presentes.

Sem nenhum constrangimento, o Poder Público alega, ao final da audiência,

que todo o procedimento legal foi cumprido, protocolando o documento que

comprova a realização da mesma.

No dia 06 de junho de 2011, nova audiência foi realizada, desta vez a pedido

do deputado Carlos Gianazzi (PSOL), na Assembleia Legislativa do Estado de São

Paulo, para esclarecimentos sobre o andamento do Projeto Nova Luz.

Compareceram representantes da sociedade civil, mas ninguém do Executivo

Municipal.

Diversas manifestações são organizadas na região da Santa Ifigênia, o que,

provavelmente, obriga o Poder Público a rever suas estratégias de diálogo com a

comunidade local. São organizadas reuniões, ora com os comerciantes, ora com os

moradores, as associações e movimentos da região.

109

Documento com a transcrição das notas taquigráficas da Audiência Pública está disponível no site: <http://www.novaluzsp.com.br>.

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As reuniões com os comerciantes da região aconteceram nos dias 14, 18, 22,

28 e 31 de março e 04 de abril110, todas com o objetivo de apresentar o Projeto Nova

Luz e escutar as demandas e necessidades dos comerciantes. Em todas as

reuniões estiveram presentes representantes da Secretaria Municipal de

Desenvolvimento Urbano e do Projeto Nova Luz; sendo que as representações dos

comerciantes foram convidadas em datas distintas.

Na reunião do dia 14 de março, estiveram presentes representantes da

Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia; nos dias 18 e 22 de março, os

representantes da Câmara dos Dirigentes Lojistas da Santa Ifigênia; no dia 28 de

março, os representantes do Sindicato do Setor Elétrico; e, nos dias 31 de março e

04 de abril, representantes do setor de motos e acessórios.

Das discussões e reivindicações realizadas nas reuniões destacam-se: a

necessidade de padronizar o tamanho das lojas/galerias e do projeto prever dois

shoppings, um na Santa Ifigênia e o outro na General Osório; a organização de

estacionamentos, de zonas azul e de locais para armazenamento das mercadorias;

e a manutenção da concentração de atividades de um mesmo segmento.

Configuraram-se como preocupação gerais: os critérios que serão utilizados

para as desapropriações e deslocamentos nos casos de renovação dos imóveis; a

compra preferencial para os atuais proprietários e locatários; as medidas que

deverão ser tomadas em relação aos usuários de crack, a população em situação de

rua e os catadores de materiais recicláveis. Os argumentos que pautam a

preocupação com esses grupos foram fundamentados na necessidade de tornar o

bairro seguro e agradável para que os consumidores façam suas compras com

tranquilidade.

As reuniões com os moradores, as associações de moradores e movimentos

sociais ocorreram nos dias 24, 28, 30, 31 de março e 06 de abril, com o objetivo de

apresentar o Projeto Nova Luz e suas fases de execução. Também se encaminhou

nessas reuniões a organização do Conselho Gestor da ZEIS.111

Todas as reuniões contaram com a presença de representantes da Secretaria

Municipal de Desenvolvimento Urbano, da Secretaria Municipal de Habitação e do

Consórcio Nova Luz.

110

Atas das reuniões disponíveis para consulta no site: <http://www.novaluzsp.com.br>. 111

Conselho Gestor constituído em atendimento ao disposto nos Artigos 175 e 178 do Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo (Lei nº 13.430/02) e no Decreto nº 42.871/03.

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Os representantes de moradores, associações de moradores e movimentos

sociais foram convidados para reuniões distintas, destacando-se a presença da

Associação dos Moradores e Amigos da Santa Ifigênia e da Luz (AMOALUZ) em

todas as reuniões. Também estiveram presentes os representantes da Associação

de Moradores da Santa Ifigênia (AMSI), da União dos Movimentos de Moradia

(UMM), do Fórum dos Cortiços e Sem Teto de São Paulo, do Movimento Sem Teto

do Centro, do Grupo de Articulação da Moradia para o Idoso da Capital (GARMIC) e

da Unificação das Lutas de Cortiços (ULC).

As principais pautas discutidas centraram-se na necessidade de organização

de um cadastro e a forma como foi realizado o cadastro pelo consórcio; a

necessidade de discussão com outros tipos de comércio que não estão

representados nas associações; a inclusão nos processos de discussão dos

locatários, da população moradora nos cortiços e nas ocupações; os critérios para

as demolições que não levam em conta o patrimônio “imaterial”; necessidade de

ampliação do número de Habitações de Interesse Social (HIS) com a discussão das

dimensões das unidades e acessibilidade.

Porém, a grande preocupação dos moradores e associações está relacionada

à garantia da permanência nos imóveis renovados e os critérios de desapropriação,

pois os moradores atuais possuem rendas diferentes que precisam ser

contempladas. Também se cobrou a ampliação da participação da população e

maior transparência do Poder Público nas decisões.

A partir de abril de 2011, as reuniões112 foram ampliadas convidando-se os

moradores dos 24 edifícios existentes na ZEIS, com a proposta de formação do

Conselho Gestor da ZEIS.

A reunião do dia 12 de abril, com representantes da Secretaria Municipal de

Desenvolvimento Urbano, do Consórcio Nova Luz e de moradores dos edifícios das

ZEIS, trouxe como pauta a formação do Conselho Gestor, suas atribuições e

processo de eleição.

Explicitou-se, também, na fala dos moradores, a grande preocupação com a

permanência após o processo de urbanização do bairro; os critérios para as

desapropriações e deslocamentos de edifícios que serão renovados; e a

insegurança quanto à ocupação dos edifícios pelos movimentos de moradia.

112

Atas disponíveis para consulta no site: <http://www.novaluzsp.com.br>.

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148

Nas reuniões seguintes113, com representantes da Poder Público, dos

moradores, associações de moradores e movimentos sociais, discutiu-se a lei que

dispõe sobre o Conselho Gestor, a representatividade das associações e

movimentos, a composição numérica do Conselho, a necessidade transparência nas

informações do Poder Público, o processo eleitoral e as estratégias de mobilização

dos moradores.

Durante a organização do processo de formação do Conselho, a proposta

inicial do Poder Público apontava a formação com três membros do Poder Público e

três membros da sociedade civil. Sentindo-se não contempladas em sua

representatividade, as associações de moradores apresentaram uma contraproposta

solicitando a composição do Conselho com a mesma quantidade do Conselho de

Paraisópolis (18 membros da sociedade civil e 18 do Poder Público), o que foi

apontado como inviável pelo Poder Público. A sociedade civil trouxe, além do

argumento da representatividade, a necessidade de ampliação e publicização do

processo de participação, o que exigiria transparência nas decisões.

O Poder Público, por outro lado, negociou com o argumento de que reuniões

com grupos ampliados são improdutivas. Por fim, as eleições foram convocadas

para o dia 14 de junho, das 15h00 às 21h00, para a eleição de 8 representantes da

sociedade civil. Os representantes das associações e movimentos sociais realizaram

um cadastro prévio das suas organizações.

A Portaria nº 208/11/SEHAB regulamentou o processo eleitoral designando os

integrantes do Conselho Gestor da ZEIS, Santa Ifigênia, “encarregados de

implementar o plano de urbanização como parte integrante do projeto intitulado

Nova Luz”. Foram indicados para o Conselho, por parte do Poder Público:

Secretaria Municipal de Habitação e Superintendência de Habitação

Popular - Titular: Alonso Antonio López Silva; Suplente: Jacqueline Helena

Mazoni; Titular: Maria José Garcia Brandão Calderine; Suplente: Patrícia

Spedaletti de Deus.

Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana - Titular: Gláucio Attorre

Penna e Suplente: Denise Lopes de Souza.

113

Reuniões realizadas nos dias 18 e 19 de abril; 03, 09, 10, 17, 24 e 31 de maio; e 07 de junho. Atas disponíveis para consulta no site: <http://www.novaluzsp.com.br>.

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149

Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano - Titular: Luis Oliveira

Ramos e Suplente: Maria Stela Cardeal de Oliveira.

São Paulo Urbanismo - Titular: Camila Maleronka e Suplente: Rosa Maria

Miraldo.

São Paulo Obras - Titular: Carolina Moretti Fonseca e Suplente: João

Leopoldo Wernek Camargo.

Companhia Metropolitana de Habitação - Titular: Ângela Luppi Barbon e

Suplente: Maria Ângela Gioia.

Subprefeitura da Sé - Titular: Luciano Daniel e Suplente: Joceli Adair da

Silva.

Por parte da sociedade civil, eleitos entre os moradores:

Titular: Nelson Matias de Souza e Suplente: José Carlos Kenji Suzuki.

Titular: Camila Almeida e Suplente: Jaqueline Alves.

Titular: Luiz Antonio Tozzini e Suplente: Márcio Figueiredo Souza.

Titular: Assad Nader e Suplente: Edimar Mariano Santos.

Foram eleitos pela sociedade civil, representando as organizações locais:

Paula Andrea Ribas Carlino, representante da Associação de Moradores e

Amigos da Santa Ifigênia e da Luz (AMOALUZ), e Suplente: Simone

Ferreira Gatti.

Ivaneti de Araújo, representante da Associação Comunitária de Moradores

na Luta por Justiça, e Suplente: Nelson da Cruz Souza.

Sidnei Antonio Euzébio Pita, representante da União dos Movimentos de

Moradia, e Suplente: Valdina de Assis Andrade da Silva.

Robson Cesar Correia de Mendonça, representante do Movimento

Estadual da População de Rua (MEPR), e Suplente: Marcos Vinicius

Gonzales.

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A primeira reunião do Conselho Gestor realizou a leitura, discussão e

aprovação do Regimento Interno. Na reunião de 06 de julho, a sociedade civil

cobrou a disponibilização das atas com tempo hábil para leitura e colocou como

inclusão na pauta a necessidade de discussão de um cadastramento dos moradores

residentes na ZEIS.

Os representantes do Poder Público insistiram na necessidade de que o

Conselho discutisse as diretrizes que devem compor o Plano de Urbanização da

ZEIS. As diretrizes foram lidas e os representantes da sociedade civil voltaram a

insistir na necessidade de resultados do cadastro já realizado pelo consórcio, não

sendo possível discutir diretrizes sem o conhecimento da realidade.

Na reunião de 13 de julho, os representantes da sociedade civil entregaram

um documento ao Poder Público solicitando: a organização de um cronograma de

trabalho para o Conselho; a versão impressa do Plano Urbanístico da ZEIS já

divulgado; a discussão do cadastro dos moradores; e as atas das duas primeiras

reuniões e sua publicização.

Discutiu-se, novamente, que elaborar diretrizes sem dados para subsidiar as

decisões é um trabalho irresponsável e que o Conselho não pode se propor a fazer.

Várias tentativas de imposição de ideias e encaminhamentos por parte do Poder

Público foram realizadas, mas os representantes da sociedade civil discordaram dos

mesmos. Em determinado momento, o Conselho Assad Nader se dirige à

Conselheira Ângela Luppi Barbon, com o seguinte argumento: “Ângela, a gente tá

aqui junto com o Poder Público buscando soluções, não aceitando imposições”.

Nas reuniões seguintes do Conselho, a sociedade civil elaborou documento

próprio com as diretrizes para o Plano de Urbanização da ZEIS e discutiu com os

técnicos da Secretaria de Habitação o cadastro e a forma de cadastramento que

seria realizada nos edifícios da ZEIS.

Das 11 diretrizes propostas, inicialmente, pelo Poder Público, foram

ampliadas para um total de 37 e algumas deverão ser transformadas em propostas

efetivas e entrar no edital de licitação do Projeto Nova Luz. Dentre elas, podemos

destacar114:

114

Conforme Boletim dos Conselheiros da ZEIS3 do Projeto Nova Luz – setembro/2011.

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Revisão dos critérios para definição dos imóveis a renovar e a permanecer,

a fim de não considerar apenas elementos construtivos, mas também a

atividade produtiva existe e usos que representam a memória do bairro e

da região;

Priorizar, no faseamento, a produção de interesse social sobre as demais

intervenções;

Criação de instrumentos que garantam a permanência da população

residente;

Criação de instrumentos que garantam a realocação do morador de sua

habitação atual apenas quando a habitação definitiva estiver pronta, sem

ter que se dirigir a habitações provisórias;

Criação de instrumentos que garantam a permanência de comerciantes e

prestadores de serviços nos térreos dos novos empreendimentos, em caso

de terem os seus estabelecimentos demolidos e/ou transformados;

Desenvolver um sistema de acompanhamento social pós-ocupação para a

população de menor renda, através de gestão compartilhada entre poder

público e movimentos de moradia, a fim de garantir a sua adaptabilidade à

nova habitação, à convivência em condomínio e à emancipação

econômica;

Criação de instrumentos que coíbam a compra e venda de habitações

sociais produzidas na ZEIS, a fim de que, no futuro processo de

valorização imobiliária da região, o subsídio destinado à população de

baixa renda não seja encaminhado para a classe média, através da venda

das habitações;

Desenvolvimento de políticas habitacionais alternativas à modalidade casa

própria (como a locação social) para a população de 0 a 3 salários

mínimos, que é a maioria na área e que não consegue arcar com o sistema

de financiamento formal.

A reunião de 17 de agosto, com a presença do Secretário Municipal de

Desenvolvimento Urbano, foi bastante tensa, pois a Prefeitura havia apresentado o

Projeto Nova Luz consolidado, inclusive com o Plano de Urbanização da ZEIS sem

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qualquer discussão com o Conselho. Os membros da sociedade civil apresentaram

um documento, remetido ao Ministério Público e à Defensoria Pública do Estado de

São Paulo, questionando a forma como o Conselho estava sendo usado para

legitimar as arbitrariedades do Poder Público.

Após várias discussões e explicações, encaminhou-se que o Projeto Nova

Luz estaria presente nas próximas reuniões do Conselho para apresentação do

Plano, das obras e da fases de implantação.

Paralelo a este processo de participação da sociedade civil, o Projeto Nova

Luz e a Prefeitura de São Paulo continuaram suas ações em vista da construção do

Plano Urbanístico para a região e as articulações com o Poder Legislativo.

A Câmara do Vereadores, através da Comissão de Finanças e Orçamento,

presidida pelo vereador Antônio Carlos Rodrigues, convocou, em 12 de abril de

2011, uma Audiência Pública115 para prestar esclarecimentos do Projeto Nova Luz

convidando representantes do Projeto Nova Luz e o Secretário Municipal de

Desenvolvimento Urbano, Miguel Luiz Bucalem.

O Secretário do Desenvolvimento Urbano realizou a exposição do Projeto

Nova Luz, contextualizando sua importância para a expansão das atividades da

cidade e, frisando, que os efeitos das desapropriações serão minimizados para

causar poucos transtornos116 aos moradores e comerciantes.

As colocações durante a audiência foram bastante tumultuadas, causando a

suspensão da mesma em diversos momentos. Entre as questões colocadas

destacam-se: a ausência de participação da população no processo de elaboração

do Plano; a incerteza da permanência de moradores e comerciantes; as

desapropriações e os parâmetros para avaliação dos imóveis; a falta de estratégias

do Poder Público em relação aos usuários de crack, frisando-se que o Projeto Nova

Luz não resolverá essa questão.

115

Presentes na Audiência Pública, conforme ata, José Roberto Bernasconi da Sinaenco; José Valter Melo, do Instituto de Engenharia; Vereadores Roberto Tripoli, Celso Jatene, Claudio Fonseca, Wilson Gouveia, Aníbal de Freitas, Marco Aurélio Cunha, Chico Macena, Atilio Francisco, Juliana Cardoso, Paulo Frange, José Police Neto; Deputado Adriano Diogo; Joseph Hanna e Tony, da ACSI, Paula Ribas, da AMOLUZ, Flavio Vieira Da Silva, assessor do Dep. Estadual Luiz Cláudio Marcolino; José Roberto Besnacone, do Sinaenco; Aryhee Sherry; Luiz Tadeu Obeid, da ACSI, disponível no site: <http://www.acsisanta.com.br>.

116Ata da Audiência Pública, página 11. Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br>.

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Críticas foram realizadas, também, aos vereadores presentes que, por conta

de financiamentos de campanha, aprovaram a Lei de Concessão Urbanística

favorecendo a especulação imobiliária e a expulsão da população da região.

Em junho, nova apresentação foi realizada na Câmara dos Vereadores, com

explicações sobre o faseamento de implementação da concessão e as

oportunidades de participação dos atuais proprietários de comércio.

Em maio, o Projeto Nova Luz disponibilizou a versão preliminar do Estudo de

Viabilidade Econômica, Mercadológica e Situação Fundiária do Projeto Nova Luz.

O estudo apresenta as possibilidade de valorização nos imóveis residenciais

e comerciais, desde que sejam garantidas diversas amenidades na região, como

hipermercado, bares, bancos, unidades de educação, etc., e uma mudança de

imagem da região.

Aponta que o mercado tem um potencial de 2,6 mil novas unidades

habitacionais, distribuídas da seguinte forma:

20% de Habitações de Interesse Social, com 37 e 50 m2, para famílias com

renda superior a 7 e 10 salário mínimos, respectivamente;

58% de Habitações de Mercado Popular para famílias com renda superior a

15 salários mínimos; e

22% de habitações de alto padrão para famílias com renda superior a 30

salários mínimos.

Também um potencial de venda de 563 m2 de edificações para fins

comerciais.

Aponta como principais deficiências para a valorização imobiliária a imagem

ruim da região, as atividades comerciais que desvalorizam o entorno, a localização,

e o trânsito que dificulta o acesso dos automóveis da região Sul e Leste (PMSP,

2011a, p. 69).

Elabora um estudo detalhado dos custos da execução do Projeto com

infraestrutura, implantação de áreas verdes, restauro de edifícios tombados com a

recuperação de fachadas e a construção de equipamentos sociais – escolas de

teatro, dança e música; informática; correio; centros de assistência da assistência

social, do idoso; unidade básica de saúde; creche; escolas de ensino infantil,

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fundamental; centro integrado de promoção humana. Destaca que o custo previsto,

com base no mês de junho/2010, para as desapropriações é de R$ 672 milhões.

De forma bastante clara, aponta que a fonte de receita para a concessionária

será a especulação imobiliária, com a venda de terrenos e imóveis.

Assim, muito embora seja razoável imaginar que o futuro concessionário possa obter receitas adicionais, como receitas provenientes da exploração comercial de alguns estabelecimentos (tais como, estacionamentos) ou ainda receitas provenientes da venda de potencial construtivo adicional, as receitas da concessão foram estimadas considerando somente aquela obtida com a venda dos terrenos em estoque. Cabe registrar que essa premissa não significa afirmar, obviamente, que a finalidade da concessão urbanística no perímetro da Nova Luz seja a especulação imobiliária. E também não significa afirmar que o objetivo da concessão urbanística seja a revenda de imóveis desapropriados. O objetivo da concessão urbanística, muito pelo contrário, continua sendo a implantação das obras e intervenções previstas no projeto urbanístico específico, necessárias para a melhoria urbanística daquela região (PMSP, 2011a, p. 99).

Destaca que, mesmo com todas as possibilidade de receita por parte da

concessionária, haverá a necessidade de um contrapartida da municipalidade no

valor de 259 milhões para que o projeto se torne viável.

O estudo apresenta também os riscos que podem afetar as atividades da

Concessionária, de modo específico aqueles ligados ao mercado imobiliário.

(...) a futura Concessionária (ou outra empresa que atue sob sua responsabilidade), visando à execução do projeto urbanístico específico, se dedicará principalmente à compra de terrenos, incorporação, construção e venda de empreendimentos imobiliários residenciais e comerciais. (...) Há riscos que afetam de modo geral o mercado imobiliário, tais como interrupções de fornecimento de suprimentos e volatilidade do preço dos materiais e equipamentos de construção, disponibilidade de mão-de-obra, mudanças nas condições de oferta e procura de empreendimentos imobiliários, greves e regulamentos ambientais e de zoneamento; além dos riscos específicos que afetam as atividades da Concessionária e de outras empresas do setor imobiliário (PMSP, 2011a, p. 124).

Em julho de 2011, são divulgados o Estudo de Impacto Ambiental e o

Relatório de Impacto Ambiental117, conforme exigência para o licenciamento

ambiental para ações e atividades modificadoras do meio ambiente rural ou

urbano.118

O relatório apresenta de forma bastante detalhada os impactos das

modificações que serão realizadas nos logradouros; no sistema viário; nas árvores e

117

Disponíveis para consulta no site: <http://www.novaluzsp.com.br>. 118

Conforme Resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente 001/1986, 11/1986, 006/1987 e 009/1990.

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nas praças; no abastecimento de água, esgoto, drenagem urbana, energia,

telecomunicações, rede de gás; no mobiliário urbano; nos equipamentos públicos; e

na gestão dos resíduos. Foram identificados e analisados 40 impactos

socioambientais organizados nos eixos: meio físico (8), meio biótico (4) e meio

socioeconômico (28).

O documento apresenta uma estratégia de implantação progressiva, por fases

a cada 5 anos, totalizando 15 anos, visando não agravar os problemas sociais e

minimizar os impactos transitórios negativos.

Todos os impactos negativos são mitigáveis em qualquer de suas fases: Planejamento, Implantação e Operação. Ressalta-se que o impacto do descolamento territorial de moradores de rua é um problema social de caráter estrutural e conjuntural atingindo várias áreas do município (PMSP, 2011c, p. 165).

Em casos como o deslocamento da população de rua e de outros grupos, o

documento irá apontar que são necessárias ações sociais e econômicas de

responsabilidade do Poder Público. Portanto, o documento irá afirmar que os

problemas sociais não serão resolvidos apenas com a intervenção urbanística,

cabendo ao Poder Público ações para sua superação.

Nesse mesmo período, é disponibilizado o Plano de Urbanização das Zonas

de Interesse Social Consolidado, definindo que, no perímetro do Projeto Nova Luz, a

ZEIS corresponde a 11 quadros, com 221 imóveis, conforme mapa 4.

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Mapa 4 – Perímetro da ZEIS Fonte: Plano de Urbanização da ZEIS Consolidado.

Prevê um total de 7.131 unidades habitacionais, sendo 40% de Habitações de

Interesse Social, 40% de Habitações do Mercado Popular e 20% destinadas a outros

serviços.

Aponta, detalhadamente, os critérios para a renovação ou demolição dos

edifícios, assim como quais permanecerão em cada quarteirão.

O plano destaca a importância do acompanhamento pelo Conselho Gestor da

ZEIS, mas, de forma contraditória, não incorpora as diretrizes discutidas pelo

Conselho e, somente nos meses seguintes à sua divulgação, é apresentado e

debatido com o mesmo.

Também aponta a permanência da população moradora na região e, com o

desenvolvimento imobiliário, uma tendência de mudança nos padrões de renda, de

consumo e de comportamento nos segmentos sociais “menos favorecidos” (PMSP,

2011b, p. 96).

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É importante apostar na tendência de aumento de um mercado mais exigente, tanto em relação aos bens de consumo individual quanto aos equipamentos públicos de uso coletivo. A diversidade cultural e de faixas de renda na Nova Luz será um dos diferenciais do projeto. Um modelo de cidade compacta e contemporânea desejada, com um melhor acesso ao mercado de trabalho, à informação, à educação, à cultura, ao lazer e ao entretenimento, além da infraestrutura urbana que existe e com a que será instalada, morar na Nova Luz será sinônimo de uma vida urbana de qualidade (PMSP, 2011b, p. 96).

O Plano de Urbanização119 do Projeto Nova Luz é apresentado em setembro

de 2011, em cerimônia com a presença do Prefeito Gilberto Kassab, que se

comprometeu a dar início às obras no ano de 2012.

O Plano apresenta como objetivos do Projeto Nova Luz:

Preservar, recuperar e valorizar o patrimônio histórico, cultural e artístico no

local;

Promover o equilíbrio entre habitação, atividades econômicas e

equipamentos púbicos;

Implantar unidades habitacionais destinadas à população de baixa renda,

de acordo com as normas urbanísticas aplicáveis às Zonas de Interesse

Social (ZEIS);

Manter e expandir as atividades econômicas instaladas, especialmente nos

setores ligados à tecnologia;

Ampliar a proporção territorial entre áreas públicas e privadas;

Ampliar as áreas públicas destinadas a praças e ao convívio;

Estimular a diversidade funcional da área, bem como incentivar as

atividades terciárias relacionadas com os setores de cultura, lazer e

entretenimento;

Promover intervenções de forma planejada e progressiva com o objetivo de

evitar, durante o período de obras, o agravamento de problemas sociais e

minimizar os impactos transitórios negativos delas decorrentes.

119

Plano de Urbanização do Projeto Nova Luz, 2011e. Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br>.

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Com base nesses objetivos, a visão do Projeto Nova Luz apresenta-se como:

(...) um bairro sustentável, dinâmico e diversificado, para morar, trabalhar e se divertir. Um local onde as pessoas estarão cercadas por elementos históricos e culturais, entretenimento, espaços abertos convidativos, passeios e praças. Um bairro que oferece oportunidades de estudo e trabalho, é facilmente acessível de toda a cidade e tem mobilidade privilegiada para o pedestre (PMSP, 2011e, p. 63).

O Plano apresenta as macrodiretrizes para se alcançar os objetivos e a visão

do Nova Luz:

Valorizar e recuperar o patrimônio histórico edificado, o patrimônio cultural

e imaterial;

Promover melhor utilização do potencial construtivo planejado para a área

com o aumento da densidade demográfica;

Priorizar os deslocamentos a pé e de bicicleta, a acessibilidade universal e

o uso do sistema de transporte público;

Implantar equipamentos públicos que ofereçam suporte ao incremento

populacional previsto;

Ampliar e qualificar as áreas verdes públicas, os espaços de lazer e de

convivência;

Qualificar o ambiente urbano;

Oferecer oportunidades para garantir a permanência dos moradores atuais

e atrair novos;

Fortalecer as atividades econômicas existentes e atrair novos negócios;

Promover a ocupação multifuncional;

Realizar a adequação e o ordenamento da infraestrutura e dos serviços

públicos;

Implantar o projeto com base em padrões de desenvolvimento sustentável.

A proposta urbanística está estruturada na criação de quatro setores,

interligados entre si, e com serviços específicos:

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Mapa 5 – Setores do Projeto Nova Luz Fonte: Plano de Urbanização do Projeto Nova Luz.

O setor Nébias está localizado na parte sudeste e nele está prevista a

produção de apartamentos com pátios internos e varandas. Nesse setor haverá uma

grande variedade de comércio de bairro e espaços para atividades recreativas,

tornando-se atrativo para profissionais e famílias jovens. O projeto prevê a criação

de uma praça entre as ruas Conselheiro Nébias e Barão de Limeira. A Praça Julio

Mesquita, localizada no final da Rua Vitória, será restaurada e ligada à praça

Nébias.

No setor Mauá, a Avenida Duque de Caxias, no seu trecho de confluência

com a Rua Mauá, será transformada em um grande bulevar de apoio para os

usuários dos equipamentos culturais. As calçadas alargadas oferecerão ligação para

a Estação da Luz, aos futuros empreendimentos da Escola de Ballet e ao Centro de

Entretenimento, que terá um conjunto de teatros, cafés e restaurantes. O centro

contará com um pátio interno que dará suporte para a realização de eventos e

atividades, tais como feiras locais, pequenos concertos, teatro ao ar livre, entre

outros.

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O setor Rio Branco terá como principal acesso a Avenida Rio Branco, onde se

prevê a diminuição das faixas de rolamento, aumento das calçadas e arborização

para facilitar a circulação e permanência de pedestres. O projeto prevê a

concentração de um conjunto imobiliário de alto valor, predominando a localização

de escritórios comerciais com lajes de, no mínimo, 500 m2.

O setor Triunfo será, predominantemente, residencial e estará inserido no

núcleo histórico da região. Esse setor terá apartamentos para diversas rendas,

especialmente, com as habitações sociais e um conjunto de equipamentos

comunitários, incluindo escolas, bibliotecas, creches, unidade de saúde, entre

outros.

Com base nos setores, o plano urbanístico prevê os usos pretendidos para a

região:

Usos residenciais estarão concentrados nos setores Triunfo (ZEIS) e

Nébias;

Usos destinados aos serviços/escritórios foram concentrados na Avenida

Rio Branco e nas vias do perímetro, por oferecerem fácil acesso e boa

visibilidade;

Usos culturais e aqueles destinados ao entretenimento se localizarão no

setor Mauá, adjacente aos equipamentos culturais e às estações de trem e

metrô;

Usos comerciais deverão ocorrer em todas as áreas térreas dos novos

edifícios, em todos os setores previstos. Para fortalecer os eixos comerciais

das Rua Santa Ifigênia e General Osório, o Projeto Nova Luz propôs dois

eixos secundários, predominantemente paralelos a essas vias, formados

pela conexão entre pátios propostos nos miolos de quadras;

Usos institucionais se localizarão, predominantemente, no setor Triunfo, na

ZEIS. Também haverá áreas institucionais junto ao setor Nébias e no setor

Mauá, nas duas quadras entre as Rua dos Protestantes e a General Couto

Magalhães, já desapropriadas pela Prefeitura.

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A implantação prevê a execução planejada e progressiva das intervenções,

evitando o agravamento dos problemas sociais e minimizando os impactos

transitórios negativos.

Para cada fase, foi organizado um volume de obras buscando conciliar a

oferta de áreas residenciais e não residenciais à demanda de relocação gerada pela

aquisição de áreas necessárias para intervenção.

“Dessa forma, sempre haverá um estoque de áreas para acomodar os

moradores e as atividades econômicas deslocadas, em cada fase numa solução de

continuidade” (PMSP, 2011e, p. 63).

A implantação da totalidade das intervenções está prevista em 15 anos,

dividida em três fases estimadas em 60 meses cada.

A sociedade civil representada no Conselho Gestor, diante do anúncio do

Projeto Nova Luz, publicou em seu boletim120:

O prefeito Gilberto Kassab apresentou o projeto Nova Luz “Consolidado”, sem a aprovação do Conselho Gestor, como determina o Plano Diretor, e sem a participação da população diretamente afetada pelos impactos do projeto no centro. Essa atitude arbitrária causou forte reação e repúdio por parte dos representantes da sociedade civil no Conselho Gestor da ZEIS da Santa Ifigênia. (...) A proposta do Conselho é minimizar os impactos causados na vida de tantas pessoas que moram, trabalham e utilizam a região da Luz e Santa Ifigênia, bem como incluir e minimizar as diferenças.

120

Conforme Boletim dos Conselheiros da ZEIS3 do Projeto Nova Luz – setembro/2011.

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162

6 PERCEPÇÕES DAS LIDERANÇAS DOS SUJEITOS COLETIVOS DA

PESQUISA: construindo uma análise do Projeto Nova Luz

Na análise dos dados obtidos neste estudo, conforme exposto na introdução,

a partir das vozes e percepções das lideranças dos sujeitos coletivos e políticos, ou

seja, Associação dos Moradores da Luz e Santa Ifigênia, Associação dos

Comerciantes da Santa Ifigênia, Movimento Estadual da População de Rua e União

dos Movimentos de Moradia, envolvidos no Projeto Nova Luz, analisamos as

relações dessas lideranças no processo de participação deste Projeto.

Nesse sentido, a análise se fundamenta em três eixos: os fatos que marcam a

relação dos sujeitos coletivos envolvidos no Projeto Nova Luz com o Estado

representado pelo Executivo, o Legislativo e o Judiciário na cidade de São Paulo; a

utilização e o alcance dos mecanismos de participação na definição das políticas

urbanas; e as formas de resistência desses sujeitos coletivos ao modelo do Projeto

Nova Luz e suas propostas para a região.

6.1 Relação das Lideranças dos Sujeitos Coletivos Envolvidos no Projeto Nova

Luz com o Estado

O bairro da Luz, na região central da capital paulista, vivencia as tensões de

um processo de revitalização urbana que pretende criar um novo bairro, o “Nova

Luz”. Revitalização que deveria priorizar a diversidade de moradores, trabalhadores

e comerciantes da região, conforme opinião dos entrevistados, que se colocaram

como exemplos dessa diversidade.

Aqui (na região da Luz) reside uma gama de moradores muito grande, existe uma diversidade de moradia. Segundo a prefeitura, nós somos 11.600 moradores, mas eu acredito que tenha mais, porque as ocupações e os cortiços não foram contados e não estão nesta lista. A diversidade de moradia precisa ser contada, olhada e respeitada. A gente tem, também, uma diversidade cultural muito grande. Sou filha de imigrantes, meu pai é argentino, meu avô é italiano e, este é outro perfil de morador desta região, Ser migrante ou imigrante, pois há pessoas aqui do Brasil inteiro que trabalham, moram e têm suas vidas.

121

121

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011.

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A maioria dos lojistas da região são pequenos lojistas, como eu, que têm um negócio familiar. Eu sou um bom exemplo da dinâmica da região. Você tem grandes lojistas, mas no conjunto são pequenas empresas que geram muitos empregos. Você tem boxes comerciais, por exemplo, que tem seis funcionários trabalhando.

122

Paula Ribas, liderança da associação de moradores, cita, ainda, a diversidade

nas formas de moradia com destaque para as ocupações realizadas pelo Movimento

de Moradia. Posição compartilhada pela liderança da União do Movimento de

Moradia, Sidnei Antônio E. Pita.

Aqui tem apartamentos de um por andar, em um lugar bom e tem muitos cortiços, moradias de baixa renda, quitinetes ou apartamentos de um quarto. Este amarelo é uma ocupação, há muitos anos era um antigo hotel que estava abandonado.

123

Figura 9 ‒ Ocupação na região da Nova Luz Fonte: Realizada pela autora deste trabalho, 19 nov. 2011.

122

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012. 123

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011.

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Dentre as ocupações, destaca-se a ocupação que se localiza na Rua Mauá,

354, no antigo hotel Santos Dumont, ocupado desde 2007 pelo Movimento dos Sem

Teto do Centro (MSTC), e abriga cerca de 1000 pessoas espalhadas em seis

andares. Cada quarto de hóspede tornou-se um apartamento para as 253 famílias

moradoras, conforme fotos que se seguem:

Figura 10 ‒ Fachada da ocupação Mauá Fonte: Realizada pela autora deste trabalho, 19 nov. 2011.

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Figura 11 ‒ Interior da ocupação Mauá Fonte: Realizada pela autora deste trabalho, 19 nov. 2011.

A percepção dos entrevistados sobre a necessidade de inclusão da

população local no projeto de revitalização Nova Luz é referenciada pela definição

deste processo que deve seguir critérios124 que visem uma intervenção que

proporcione nova vitalidade ao local com a inclusão e participação da população.

Em relação ao Projeto Nova Luz, a necessidade de melhorias no bairro é

consenso entre os entrevistados, porém, questiona-se, principalmente, a utilização

do instrumento de concessão urbanística por parte do Executivo Municipal que não

garantiria o direito à propriedade.

A lei de concessão urbanística tira o poder de propriedade. Esta lei está aprovada pra cidade toda e está começando aqui na Luz. Existe um projeto, o Nova Luz, e pra tua casa já existe um plano pra ela. Ou você faz um acordo com os consórcios que estarão aqui por licitação e vende pra eles, ou, por uma ação judicial, você será desapropriado e obrigado a sair do teu imóvel.

125

124

Critérios citados no primeiro capítulo. 125

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011.

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166

O Projeto Nova Luz é filho de uma lei inconstitucional, que é filha de outra lei igualmente inconstitucional. Nós não somos contra a revitalização, somos contra a forma como o Poder Público tem tentado implantar tudo isso (...). A lei 14.917 altera o direito à propriedade, altera as questões ligadas à livre concorrência, altera a maneira como o Poder Público vai proceder na questão da revitalização e desapropriação em áreas que ele julga que estão subutilizadas.

126

O método utilizado pela lei que regulamenta a concessão urbanística também

é questionado, pois prevê as desapropriações realizadas pela empresa

concessionária que estará executando o projeto com a autorização do Executivo

Municipal.

Como funcionam as desapropriações? A prefeitura avalia que seu imóvel está em um perímetro comercial ou outra coisa; e ela vai dar um destino pro lugar que você tem imóvel. Você tem duas possibilidades: ou você vende pra eles no preço que eles acham ou você vai ter que se tornar um sócio da prefeitura. Só que você tem que fazer o que eles querem com teu imóvel.

127

Se a gente pensar no Nova Luz, vão ser desapropriadas várias áreas, pessoas vão ter que deixar seus apartamentos, suas moradias, até ser reformado. Vão ser encaminhadas pra onde? Pra albergue? Pra abrigo da prefeitura? Dizer que vão dar um valor de R$ 300,00 pra pagar aluguel é suficiente?.

128

As desapropriações são uma forma de excluir a população de baixa renda da região central e expulsá-la para a periferia.

129

O lucro da concessionária vai se dar pela venda do terreno... do terreno que eu sou o dono! Quando isto ocorre, o primeiro prejudicado é o proprietário, porque vamos ser desapropriados e não tentem me convencer que será pelo valor de mercado! Olha que loucura, eu sou desapropriado do imóvel do qual sou proprietário e, se eu quiser retornar para a região, preciso comprar o ponto que antes era meu!

130

O lucro da empresa concessionária estaria, então, garantido pela venda dos

terrenos e dos empreendimentos construídos na região131; o que caracteriza o

Projeto Nova Luz, segundo Robson Mendonça132, como “um projeto de especulação

imobiliária”.

A liderança da Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia, pela sua

atuação jurídica para provar a inconstitucionalidade da lei de concessão urbanística,

126

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012. 127

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011. 128

Entrevista Robson Mendonça em 11/02/2012. 129

Entrevista com Sidnei Antonio Euzébio Pita em 05/03/2012. 130

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012. 131

Esta afirmação encontra-se referenda no Estudo de Viabilidade Econômica realizado pelo Projeto Nova Luz. em 2011, citado no capítulo 4.

132Entrevista em 11/02/2012.

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167

aponta a vinculação do Sindicato da Habitação com o Poder Municipal nas primeiras

discussões do Projeto Nova Luz.

O Projeto Nova Luz começou aqui, na Sala São Paulo, em uma reunião com o André Matarazzo (subprefeito da Sé) e o SECOVI (...).

133

Essa relação com o SECOVI também aparece com o Poder Legislativo em

que a imprensa noticiou o recebimento de verba, por parte de vereadores e partidos

políticos, da Associação Imobiliária Brasileira (AIB), que teria influenciado na

votação, tanto na Lei nº 14.917 quanto na Lei nº 14.918.

Então, por que a Câmara votou a favor da lei de concessão urbanística? Porque estava determinado... Você tem 142 vereadores que votaram a favor com o prefeito. Naquela ocasião, a impressa noticiou fartamento que partidos da Câmara tinham recebido verba para se eleger vindas do setor imobiliário, da AIB. O juiz conseguiu identificar tudo isso, cassou o mandato do prefeito e de 23 vereadores, mas, mesmo assim, o processo de discussão da concessão continuou, passou pela Comissão de Justiça por 5 votos a 4. Todos os cinco que votaram pela constitucionalidade, todos foram cassados, todos receberam dinheiro da ABI. Claro que é um jogo de cartas marcadas desde o início.

134

Souza (2011) referenda a afirmação do entrevistado ao demonstrar pela

tabela (anexo 3), a relação das doações da AIB a parlamentares e partidos e o

placar das votações dos Projetos de Lei. Trata-se de dados que evidenciam a

prevalência de interesses privados sobre o bem público.

Paulo Garcia comenta, também, sua impressão quanto à postura dos

parlamentares:

Todo este processo (de aprovação da Lei) não é fácil de entender, precisa de muita ajuda, tivemos muita gente trabalhando, bons momentos, apoio, e percebemos que, conforme as coisas andavam, alguns apoios “viraram gelatina”. Na primeira audiência que teve na Câmara, alguns vereadores se pronunciaram. Um que eu acho que é interessante e que mostra a conduta de todos é o Agnaldo Timóteo. Ele assumiu o microfone e se posicionou do nosso lado, com um discurso que falava tudo e não dizia nada, mas ficamos felizes de ter gente de dentro do nosso lado. Mas, quando a gente viu quem tava votando e como (...).

135

As decisões do Poder Judiciário também são alvo de questionamentos, pois a

Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia tem realizado inúmeras

representações junto ao Ministério Público Estadual e o Tribunal de Justiça.

133

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012. 134

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012. 135

Entrevista em 4/2/2012.

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168

Já ouvimos que, corre-se o risco de judicializar o processo de revitalização no Nova Luz. A judicialização já se deu lá trás, quando se fez o Projeto Nova Luz e na discussão do Projeto de Lei nós já entramos com representação no Ministério Público dizendo onde estava o erro. O Ministério Público pediu à Procuradoria Geral que entrasse com a ADIN, coisa que eles fizeram, naquela ocasião. A ADIN foi julgada procedente em primeira instância e, depois, o Tribunal de Justiça voltou atrás! O que aconteceu com o juiz? Será que faltou assessoria pra ele? Será que, quando ele fez o pedido estava em um mau dia? Não sei qual o motivo que uma pessoa, em um caso tão importante, faz o pedido e retrocede. Muita coisa aconteceu nos bastidores, não tenho dúvida.

136

A indignação de Paulo Garcia com o Executivo, o Legislativo e o Judiciário,

que tratam uma questão pública de acordo com os interesses privados, nos remete

à análise de Faoro (2000) sobre o Estado patrimonialista, constituído,

historicamente, no Brasil.

Em sua análise, o Estado passa a intervir de acordo com os interesses de

uma minoria e, a “sociedade se compreende no âmbito de um aparelhamento a

explorar, a manipular e a tosquiar nos casos extremos” (Faoro, 2000, p. 363). O

Estado Patrimonialista, então, se utiliza das intervenções sobre os mecanismos

jurídicos para sobrepor seus interesses aos interesses da maioria (Faoro, 2000, p.

373).

No caso do Projeto Nova Luz, acentua-se esta característica, amparada pelo

Poder Público Municipal, em que os interesses do capital imobiliário se sobrepõem

aos interesses da população. A difícil interlocução com os sujeitos políticos e

coletivos da região e a falta de transparência nas decisões caracterizam uma prática

autoritária, que se serve da lei para legitimar seus interesses.

A lei de concessão urbanística tornou-se o principal instrumento jurídico para

a intervenção na região, ainda que questionada no seu processo de aprovação e na

sua aplicação que transfere à iniciativa privada o poder de obter seus lucros, a partir

da implantação de um projeto urbanístico que exclui grande parte da população

presente na região.

Os entrevistados também levantaram algumas estratégias utilizadas pelo

Executivo Municipal para convencer a opinião pública sobre a necessidade do

Projeto Nova Luz. Merece destaque toda a polêmica, promovida pela mídia, em

relação à “cracolândia”.

136

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012.

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169

A “cracolândia” não é um lugar, é um grupo itinerante. Por que eles se

instalaram aqui e não na Santa Ifigênia? Porque tem uma ótima iluminação

lá (...). Agora, vem de noite aqui, é tudo escuro. Se a prefeitura tivesse uma

ação de cuidar do centro de São Paulo, talvez isto não acontecesse.137

Existem grupos de pessoas oriundas de diversos pontos da cidade e de

outros estados que, a própria pessoa faz questão de contar que a polícia

falava “sai daqui, aqui não é o seu lugar, vai pra Luz”. Independente do

ponto do centro expandido, se a polícia encontrasse alguém consumindo

crack, mandava pra cá, não prendia. Quem construiu o conceito da

“cracolândia” foi o Poder Público. A prefeitura tinha interesse que isto

acontecesse e, em acontecendo, facilitaria que as pessoas aceitassem, sem

muita rebeldia, o Nova Luz.138

Aquele pessoal que fica lá (na “cracolândia”), todo mundo sabe que os

usuários foram levados pra lá pela polícia. Quando eles usavam droga na

Sé e em outras regiões, foram empurrados pra lá (...).139

A “cracolândia” surgiu pela situação de abandono da região da Luz, pela

falta de interesse do Poder Público em cuidar da região.140

Pela percepção dos sujeitos pode-se inferir que a construção desta imagem

negativa da região associada à “cracolândia” deve-se ao Poder Público, reforçando

a necessidade de um projeto de revitalização.

A operação de combate ao crack, iniciada em janeiro de 2012, é questionada

pelos entrevistados que a apontam como forma de pressão para a liberação do

licenciamento ambiental pelo Conselho Municipal do Meio Ambiente e

Desenvolvimento Sustentável (CADES), além dos questionamentos quanto à

eficácia das ações desenvolvidas pelas polícias.

Há uma coincidência muito grande. Porque o licenciamento ambiental para o término do edital para a concessão urbanística, agora em janeiro, estava chegando ao final para os conselheiros do CADES assinarem. Olha que momento mágico! Mostrar aos investidores que eles podem comprar e investir que eles vão ter um Nova Luz, limpo, limpo de gente suja... Suja no entendimento deles.

141

137

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011. 138

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012. 139

Entrevista Robson Mendonça 11/2/2012. 140

Entrevista Sidnei Antônio E. Pita 05/3/2012. 141

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012.

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Porque se fala que o bairro da Luz está cheio de “craqueiro”, de “noia”, a polícia fala muito que prendeu traficante. Eu não vi um traficante preso na “cracolândia”, eu vi prender “aviãozinho”, o gerente. Porque pegar uma pessoa com 20 ou 30 pedras, ela não é traficante. Isso é enganação... É dizer que resolve a questão daquela região tirando o direito dos usuários de ficar parado, fazendo ele vir e ir pra todo lado. Porque estes usuários não vão deixar, desta maneira, de adquirir o produto, até porque a droga é vendida inclusive por policiais (...).

142

Em seu depoimento, Paula Ribas143 afirma que a mídia construiu uma “cena

de cinema” para mostrar a “cracolândia” vinculada ao Projeto Nova Luz.

Os usuários ficam na Rua Helvetia de dia e de noite, sendo que, à noite a circulação é maior; mas que esta é uma rua que tem moradores e circulação de carro e pessoas como qualquer outra da região central. Lógico que precisa ter cuidado, mas isto não é só aqui (...).

142

Entrevista Robson Mendonça em 11/2/2012. 143

Entrevista em 19/11/2011.

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Para ilustrar esta fala, abaixo, uma foto da Rua Helvetia com seus prédios

residenciais e a circulação de carros.

Figura 12 ‒ Rua Helvetia Fonte: Realizada pela autora deste trabalho, 19 nov. 2011.

Esta vinculação de uma imagem negativa do bairro da Luz com a

“cracolândia” pelo Poder Público e pela mídia pode ser explicada pelo que Villaça

(2001, p. 344) denomina de “naturalização de processos sociais”, sendo a

deteriorização do centro um destes processos.

O centro de uma cidade é vital para dominação e controle por meio do espaço urbano (...). O processo rotulado de “deteriorização” pela idéia dominante refere-se ao estado de quase-ruína em que são deixados muitos edifícios dos centros tradicionais, em virtude de seu abandono pelas camadas de alta renda, que produziram novos centros (VILLAÇA, 2001, p. 344).

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Nícolas144, educador do Movimento Estadual da População de Rua, traz esta

mesma análise durante a entrevista com Robson Mendonça:

No projeto Nova Luz tudo foi pensado... Fez-se a degradação de várias áreas, se deixou tudo degradado e depois se vende a imagem de um projeto que é a solução.

Esta opinião é compartilhada por Rolnik (2011, p. 01):

A coisa mais importante que aconteceu nessa área foi a construção de uma política de abandono. O abandono foi fruto de uma política, não da falta dela. Para poder caracterizar o bairro mais antigo da cidade de São Paulo como “cracolândia” e assim ter uma justificativa para realmente terminar, acabar com o bairro e no seu lugar implementar um projeto de atração, de grandes investimentos imobiliários, abrindo uma frente de expansão para grandes empresas.

Portanto, os meios de comunicação, com seu poder institucional, atuam

transmitindo conteúdos que visam formar a opinião pública em favor dos interesses

de uma classe que, neste caso, aplica-se ao Projeto Nova Luz, segundo afirmação

de Meksenas:

Em período de regularidade da democracia representativa, a sobrepujança do Poder Executivo em relação à sociedade civil só é possível à medida que esse poder converge, em metas e interesses, ao poder institucional da comunicação (2002, p. 182).

Há mais de uma década, notícias são vinculadas relacionando o bairro da Luz

à situação da “cracolândia”, criando uma imagem negativa da região e gerando as

condições necessárias para que o Projeto Nova Luz seja recebido como a solução

para uma questão de caráter social que não será resolvida com um projeto

urbanístico.

Paulo Garcia145 destaca outra estratégia utilizada pelo Poder Executivo para

pressionar, especificamente, os comerciantes da região da Santa Ifigênia

evidenciando uma possível ilegalidade na venda de produtos na região, o que

desqualificaria, também, as reivindicações do setor.

144

Entrevista em 11/2/2012. 145

Entrevista em 4/2/2012.

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173

Em 2009, quando nós começamos as discussões para votação nas audiências, a prefeitura mandou pra cá, em um dia, todos os fiscais que ela tinha. A gente teve, na época, 230 intimações por falta de alvará de funcionamento. Foi um susto danado... Não sabíamos a gravidade da situação que estava por vir... Montamos uma comissão e fomos à subprefeitura da Sé perguntar o que estava acontecendo. Como é que, em um ano, fazem 20 intimações e, em um dia, quase 250? Estavam já apertando o cerco, porque quem não tem alvará fica muito mais vulnerável. A prefeitura não dá (o alvará), porque tirar alvará é uma piada e, depois, cobra. Cobra, informalmente, por muito tempo e depois quer que, de um dia pro outro, a pessoa se formalize.

Além dessas estratégias, os entrevistados apresentaram suas percepções em

relação aos reflexos que o Projeto Nova Luz, mesmo nessa fase de execução do

projeto urbanístico, provocou na região, como o aumento do valor dos imóveis para

compra e aluguel e a retração comercial.

Os novos empreendimentos que vieram pra cá após o Nova Luz custam muito caro e elevaram os preços dos imóveis. Hoje, você compra uma quitinete por 160 ou 170 mil e eu estou falando de 40 ou 45 m

2. Um quarto

de cortiço custa pelo menos R$ 700,00 de aluguel. A moradia no centro é um problema e ficará pior com o Projeto Nova Luz.

146

Desde 2005, o mercado imobiliário na região travou. Você não deu incentivo aos moradores e aos comerciantes da região para investir em reformas. Em 2005 não tinha mais ponto na Rua dos Andradas e na Triunfo, e o comércio já estava chegando na Rua dos Protestantes e, se não fosse este processo do Nova Luz, esta onda de expansão do comércio já teria chegado à Estação da Luz. A prefeitura tem que fazer o seu papel, que é deixar o empresário se expandir, fomentar, dar condições e incentivar.

147

Essas medidas, sem um planejamento prévio, interferiram na dinâmica da

região e na vida de moradores e trabalhadores.

Portanto, diante das experiências acumuladas pelos sujeitos políticos

coletivos neste processo, o Projeto Nova Luz é caracterizado como um projeto de

gentrificação em benefício da especulação imobiliária que será realizada por grupos

ligados ao mercado imobiliário.

O Projeto Nova Luz, o que ele pretende fazer? Trazer um modelo de ser feliz, trazer um modelo de viver bem. Só que, para isto, é preciso ter dinheiro; dinheiro para manter os aluguéis ou comprar os imóveis. O Projeto Nova Luz vai excluir quem não estiver neste padrão, é uma expulsão. No campo do urbanismo, isto é chamado de gentrificação. O Projeto Nova Luz é um projeto de gentrificação que tem como foco a especulação imobiliária. É pra isto que ele veio.

148

146

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011. 147

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012. 148

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011.

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Este projeto não passa de especulação imobiliária... Porque quando você cria um projeto que tem mais shopping, mais estacionamento, mais megaprédios e mais parques e, não se pensa, por exemplo, em banheiro público e acessibilidade, é um problema! (...) vai ser a expulsão do morador da região central, que é o que eles pretendem. Mais uma higienização no centro da cidade (...). Porque quando se fala em projeto de revitalização, revitalizar é dar vida, e se não pensar na vida do ser humano, é um fracasso total.

149

Mais uma vez se percebe que o objetivo é expulsar a população do centro da cidade. O Projeto Nova Luz irá atender os interesses de uma minoria, quem tiver dinheiro, poderá permanecer no bairro.

150

Entende-se que o processo de expulsão da população do bairro da Luz

poderia não ocorrer, caso a participação popular fosse respeitada nos espaços

institucionais legais, e se estes fossem, efetivamente, decisórios.

6.2 Mecanismos de Participação Popular e o Projeto Nova Luz: utilização e

alcance

O Estatuto da Cidade prevê, em seu artigo 43, inciso II, a gestão democrática

envolvendo diversos atores, garantindo a participação na formulação, execução e

acompanhamento dos planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano.

Esses mecanismos são referendados no Plano Diretor do Município de São Paulo,

porém, conforme afirma Maricato, com relativa participação e controle sobre a

Administração e Câmara Municipal.

Não há que se criar ilusões sobre o Plano Diretor instituído por lei municipal. Sua elaboração permite aos participantes conhecer a cidade, entender as forças que a controlam. Seu processo participativo permite incorporar sujeitos ao processo político e ao controle (sempre relativo) sobre a Administração e a Câmara municipal. No entanto, é preciso não perder de vista a natureza deste poder municipal que inclui, entre suas maiores forças, a especulação imobiliária (MARICATO, 2007, p. 4).

No Projeto Nova Luz, identificou-se a utilização desses mecanismos, porém,

as percepções dos entrevistados e a análise da documentação de registro, tanto das

audiências públicas quanto das reuniões do Conselho Gestor da ZEIS, revelaram as

possibilidades desses mecanismos, mas, também, os limites no alcance dessa

participação.

149

Entrevista Robson Mendonça 11/2/2012. 150

Entrevista Sidnei Antonio Euzébio Pita em 05/03/2012.

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175

Para a aprovação do Projeto de Lei nº 87 de 2009 sobre a concessão

urbanística, por se tratar de matéria do Plano Diretor, se previa a realização de, pelo

menos, duas audiências públicas. Após o desmembramento do Projeto, mais duas

audiências foram realizadas.151

A Associação dos Comerciantes esteve presente nas audiências, sendo que,

na última, a opção foi pela não participação.

As audiências públicas são uma piada e eu aprendi tardiamente que tudo é uma piada. A última que teve fizeram no Pacaembu, onde você tinha que passar por duas revistas, tinha cachorro e mais policial que participante, mas nós optamos em não participar. Nesta, eles estavam com medo da gente, pelo trabalho que demos no Anhembi, onde mobilizamos 4.000 pessoas e deixamos claro que tudo aquilo era uma palhaçada.

152

A participação nessas audiências trouxe um descrédito em relação à eficácia

da participação popular via estes mecanismos institucionais.

Como eu encaro hoje a participação popular? A coisa é pronta... Você tem um projeto pronto e um processo de convencimento via mídia, qualquer instrumento, pra dizer que aquilo é bom. Se no final você não consegue convencer ninguém, não importa, é aquilo mesmo que vale sem discutir o assunto. O governo fala que é bom, todo mundo fala que não é, está errado, e no final vai ser. Que participação é esta? Participação é você poder participar do processo e, inclusive modificá-lo. Isto que a gente tem não é participação e o poder público não está acostumado com isto.

153

A percepção de Paulo Garcia é referendada por Maricato ao tratar da

distância entre o discurso e a prática quando se trata da participação política da

população.

É preciso lembrar sempre da distância imensa que separa o discurso da prática entre nós. Invariavelmente, os textos dos Planos Diretores são sempre muito bem intencionados, afirmando uma cidade para todos, harmônica, sustentável e democrática. A implementação do Plano, entretanto, tende a seguir a tradição: o que favorece alguns é realizado, o que contraria é ignorado. E os esquecidos continuam esquecidos caso não estejam lá para ressaltar suas necessidades, sem a ilusão de desenhar a cidade de todos ou a cidade dos sonhos (MARICATO, 2007, p. 4).

O processo de formação e consolidação do Estado Brasileiro, historicamente,

rejeitou a participação popular. A abertura democrática da década de 1980 e a

criação do direito e de instâncias de participação popular para intervenção nas

151

Detalhamento deste processo de aprovação do Projeto de Lei encontra-se no capítulo 4. 152

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012. 153

Entrevista Paulo Garcia em 04/2/2012.

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políticas públicas abriram a possibilidade de participação na gestão pública. É

necessário, porém, que os cidadãos, as organizações e os movimentos estejam

dispostos a participar e questionar papéis cristalizados por velhas práticas.

Os registros das audiências154 apontam que, com ou sem a presença e os

questionamentos da sociedade, as mesmas cumpriram o seu papel burocrático e

jurídico. Portanto, a opção pela não participação da Associação dos Comerciantes

da Santa Ifigênia como forma de protesto significou um questionamento às práticas

autoritárias do Poder Executivo.

Contudo, esses protestos não podem se tornar uma postura exclusiva e

permanente para que não se enfraqueçam as lutas coletivas. Ou seja, as estratégias

de enfrentamento precisam ser sempre revistas.

Após as audiências públicas, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano

convocou reuniões com comerciantes, moradores e movimentos sociais para,

separadamente, apresentar e discutir o Projeto Nova Luz. Das reuniões com

moradores, estruturou-se o Conselho Gestor de ZEIS do Projeto Nova Luz (julho de

2011), considerado uma conquista pela representante da Associação de Moradores

AMOALUZ Paula Ribas.155

Nossa maior conquista é ter conseguido o Conselho Gestor da ZEIS. O primeiro conselho gestor de ZEIS3 do Brasil. Por que eu estou dando tanta ênfase... Porque o Projeto Nova Luz parece bonzinho porque tem um conselho de moradores. Não, já é um direto adquirido que está no plano diretor das cidades. Nós fizemos muita pressão, muito embate com a prefeitura até fundar este conselho. Quem compõe este conselho? A sociedade civil organizada (...).

Para esta liderança, temas importantes foram discutidos e os representantes

da sociedade civil conseguiram influenciar em algumas decisões.

Este conselho foi formado este ano (2011), há seis meses, e tivemos algumas conquistas: minimizar de 70% para 20 ou 30% as demolições no bairro (...). Em setembro, discutimos o cadastro de moradores e criamos as 37 diretrizes para o Projeto de Urbanização da ZEIS.

Porém, Paula Ribas evidencia a necessidade de criar estratégias para a

apresentação de propostas pela sociedade e sua votação, trazendo o indicativo das

tensões e disputas que permeiam este espaço.

154

Registros citados no capítulo 4. 155

Entrevista em 19/11/2011.

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No Conselho criamos a estratégia de discutir entre a sociedade civil e levar as propostas prontas e acordadas entre nós, isto obriga o poder público a discutir e tratar com respeito nossas reivindicações. Também não levamos nenhuma decisão pra votação, porque se empatar, o voto de desempate é do Poder Público.

156

O otimismo em relação à participação no Conselho Gestor foi substituído, em

agosto de 2011, pela indignação diante do anúncio e apresentação do Projeto Nova

Luz pelo prefeito Gilberto Kassab. O relatório final do Consórcio Nova Luz foi

entregue sem nenhuma discussão ou participação dos representantes do Conselho

Gestor de ZEIS para alterá-lo ou aprová-lo. No site da AMOALUZ, Paula Ribas

expressou sua indignação:

O secretário de desenvolvimento urbano e o prefeito Gilberto Kassab apresentaram nesta quinta-feira, 10 de agosto, o projeto Nova Luz consolidado, indicando o início das fases de licenciamento para posterior abertura do edital de licitação da concessão urbanística, que viabilizará a execução do projeto. Contudo, segundo o Termo de Referência que rege o contrato do Projeto Nova Luz, o Plano de Urbanização da ZEIS precisa ser aprovado pelo Conselho Gestor das ZEIS, antes da fase do início dos licenciamentos, junto aos órgãos responsáveis. E este procedimento legal não foi cumprido. O Conselho Gestor da ZEIS da Santa Ifigênia, segundo o cronograma do Termo de Referência, deveria ter sido formado no início do processo para acompanhar todas as fases do projeto, contudo, foi formado apenas dois meses após grande pressão sobre o Poder Público devido ao atraso da sua formação. O conselho, que é composto por membros do Poder Público e da sociedade civil, aprovou até agora apenas as diretrizes que orientarão o Plano de Urbanização de ZEIS. Ou seja, há ainda muito trabalho para ser feito antes de finalizar o projeto e se iniciar as fases de licenciamento e licitação (AMOALUZ

157).

Indignação presente, também, na fala da liderança do Movimento Estadual da

População de Rua, Robson Mendonça158, ao expor que as reuniões do Conselho

Gestor não são abertas à população com a justificativa de que a abertura das

reuniões poderia criar muitos debates e discussões. Essa situação cria insegurança

nos representantes da sociedade civil.

A não abertura das reuniões traz uma insegurança muito grande. Porque levamos as nossas propostas e eles não publicam e, às vezes, alteram nossas propostas. As reuniões precisam ser abertas ao público para que haja transparência total do processo.

156

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011. 157

Disponível no site: <http://www.amoaluz.com.br>. Acesso em: 12 ago. 2011. 158

Entrevista em 11/2/2012.

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178

A postura dos representantes do Poder Executivo também é questionada

quanto à falta de transparência e o autoritarismo.

O Poder Público questiona tudo o que a gente vai falar ou se retira quando tem alguma questão a ser discutida no Conselho (...). Também o representante do Consórcio, quando ele vai falar, se você questiona um prédio ou sobre habitação social, ela sempre fala que está tudo mil maravilhas. Se você questiona que tem 10 apartamentos, ela responde que pode ter 20 ou 30 porque tem condições.

159

Os representantes do Poder Público aparecem, sempre, com propostas prontas e sem abertura para o diálogo. O que a sociedade civil traz também não é colocado em discussão (...).

160

As dificuldades enfrentadas pelo Conselho Gestor das ZEIS do Projeto Nova

Luz não são exclusivas deste conselho. Estudos apontam os limites e possibilidades

das práticas conselhistas destacando que a criação e a participação da sociedade

civil nestes espaços têm por pressuposto a capacidade da sociedade em deliberar

as políticas públicas, orientando-as para a equidade, a justiça e a democracia. Para

Raichelis (2003, p. 22), este processo significou uma “revolução no cotidiano da

gestão pública”. Porém, a autora coloca que os governos não abrem mão do

monopólio do poder de decisão sobre as políticas públicas.

Apesar de, legalmente, o Conselho Gestor de ZEIS possuir um caráter

deliberativo, observa-se que as propostas para o Projeto Nova Luz vêm pré-

formatadas e resolvidas em instâncias em que o Conselho não participa, incidindo a

sua ação sobre decisões pontuais e de pouca influência sobre o processo como um

todo.

Esse é um processo crucial que vai exaurindo a sustentação, a legitimação, a aceitação e o acolhimento dos conselhos como instâncias válidas de manifestação concreta da democracia participativa, que é uma das vertentes mais importantes do processo de consolidação da prática democrática, especialmente em uma sociedade como a nossa, num momento em que ainda se procura construir a democracia (BRANCO, 2003, p. 46).

Pelas falas dos depoentes, pode-se afirmar que a capacidade dos sujeitos

coletivos de influir nos processos decisórios necessita se aprofundar, tanto nos

espaços institucionais ocupado pelas audiências públicas e pelos conselhos, quanto

159

Entrevista em 11/2/2012. 160

Entrevista Sidnei Antonio E. Pita em 05/3/2012.

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179

no campo político com a mobilização e articulação das forças locais tendo em vista

as conquistas a serem obtidas nos embates com o Estado.

Também os representantes do Estado precisam reconhecer o direito à

participação da sociedade civil, rompendo com práticas cristalizadas que centralizam

o poder de decisão no Poder Executivo, levando-o a conduzir os espaços de

participação como meros instrumentos burocráticos para o cumprimento de aspectos

legais.

6.3 Estratégias de Enfrentamentos e Propostas das Lideranças dos Sujeitos

Coletivos ao Projeto Nova Luz

Os sujeitos coletivos envolvidos no Projeto Nova Luz, apesar da diferença na

organização de suas ações, se reconhecem como parceiros neste processo, sem

perder a crítica sobre as diferenças de cada um.

Quem está nesta luta? A sociedade civil organizada nos movimentos de moradia, da população de rua, da criança e do adolescente; e o comércio também está pra defender os seus interesses. Sabemos das diferenças, mas, o importante é sentar pra dialogar, onde cada um precisa ceder um pouco.

161

Nesta luta estão, além dos Movimentos de Moradia, a associação de moradores, dos comerciantes e outros movimentos, que estão contrários ao Projeto Nova Luz.

162

Nossos parceiros na luta têm sido o Movimento de Habitação, o Movimento de Cortiço, e até os próprios comerciantes. Estes têm sido parceiros pra defender as nossas propostas. Não é uma luta sozinha.

163

Este Nova Luz mostrou uma coisa interessante que é igualar as pessoas, igualar as camadas. É o primeiro movimento que eu vi acontecer, mas eu nunca participei de movimento nenhum e participo por questão de sobrevivência, mas, tem passeatas nossas que tem sem-teto, sem-terra, “noia”, comerciante rico, comerciante pobre, morador, gente que quer ser morador, gente que já foi morador, todo mundo apitando na chuva.

164

Para os sujeitos da pesquisa, qualquer projeto de intervenção no bairro

precisa se apropriar da diversidade que deve ser atendida de forma diferenciada.

161

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011. 162

Entrevista Sidnei Antonio Euzébio Pita em 05/03/2012. 163

Entrevista Robson Mendonça em 11/2/2012. 164

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012.

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180

Na Luz precisa ser feito um trabalho diferenciado, pra público diferenciado. Lá tem pessoal de cortiço, em pensão, os nigerianos, os chilenos, os nordestinos, precisa de um trabalho de inclusão para cada grupo destes

165.

Coletivamente ou individualmente, esses sujeitos organizam ações de

resistência ao Projeto Nova Luz e possuem propostas para o bairro, privilegiando

seu foco de atuação.

No entendimento de Paula Ribas, da AMOALUZ, a associação tem uma

missão: comunicar. Por isso, mantém um blog com informações do Projeto Nova Luz

e das atividades da associação, além de realizar eventos para discussão com os

moradores da proposta do Projeto. No dia da entrevista, a Associação estava

promovendo um cinema gratuito para crianças e adolescentes, com a contribuição

do Sindicato dos Bancários. Após o filme, aconteceria a discussão do Projeto Nova

Luz.

Este papel de diálogo com a sociedade civil é muito difícil, porque tem pouca informação... Tem uma ação que a associação faz que é o bate-papo do megafone: eu pego o megafone, vou pro edifício e chamo: “você morador, sai na janela pra gente conversar do Nova Luz”. A gente faz muito esta ação na feira, porque feira é lugar de morador. A comunicação tem um grande desafio, que é atingir as várias camadas sociais que tem aqui

166.

A participação no Conselho Gestor de ZEIS, para Paula Ribas, tem como

principal objetivo garantir o direito dos moradores de permanecer no bairro da Luz,

inclusive com a expansão das moradias através da recuperação de prédios

fechados e abandonados.

Como exemplo, Paula Ribas167 cita um dos prédios próximo à Rua Mauá:

Aqui da Mauá dá pra ver aquele prédio que vai ser demolido e tem muitos moradores; ele é conhecido como “Saravejo”, mas a síndica não quer nenhuma ajuda, não quer conversar ou se envolver. O teto do prédio já caiu e está em péssimas condições, totalmente insalubre e com moradores de renda muito baixa. É preciso pensar em alternativas para situações como esta.

165

Entrevista Robson Mendonça em 11/2/2012. 166

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011. 167

Entrevista em 19/11/2011.

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181

A foto abaixo ilustra o estado de deterioração e de insalubridade em que se

encontra o prédio.

Figura 13 ‒ Prédio conhecido como “Saravejo” ao fundo Fonte: Realizada pela autora deste trabalho, 19 nov. 2011.

Uma alternativa para a expansão das moradias é trazida pelo educador

Nicolas, do MEPR, que propõe esta expansão ao longo das linhas férreas,

aproveitando a infraestrutura existente e mantendo a população próxima aos seus

locais de trabalho. Essa alternativa é também considerada por Robson Mendonça

quando afirma que

Há muito emprego no centro e as pessoas querem permanecer aqui, mas a ideia é expulsar os pobres para a periferia, o que não precisa acontecer. Você tem uma região ao longo da linha férrea, até o Brás, super degradada em que poderiam ser feitas milhares de moradias. E já tem todos os serviços na região – água, luz, telefone, internet, o que seria bem mais fácil de resolver do que colocar só gente de bem no centro, o que pode não dar certo.

168

168

Entrevista com Robson Mendonça em 11/2/2012.

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182

Para Paula Ribas, além da moradia, o acesso aos bens e serviços é

indispensável, especialmente, no campo da cultura.

Aqui na região está sendo construído o Teatro da Dança, muito perto da Sala São Paulo e do Museu da Resistência. Estes equipamentos precisam ser acessíveis à população da região, não apenas pra quem tem dinheiro e pode pagar.

169

Igualmente, a preservação do “patrimônio imaterial170” da região que envolve

a história e a tradição do bairro da Luz.

Outra questão que está presente na região é o seu patrimônio imaterial que envolve, por exemplo, um comércio que tradicionalmente está no bairro e que, com o Nova Luz, vai ser demolido. Por exemplo, o Bar do Léo na Rua Aurora está lá há muito tempo, faz parte da vida do bairro e está em uma área que será demolida.

171

Para a Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia, a oposição ao Projeto

Nova Luz se dá através da ação jurídica. O pedido de cassação do prefeito e dos

vereadores que receberam recurso do Sindicato da Habitação, bem como as Ações

Diretas de Inconstitucionalidade foram movidas por advogados contratados pela

associação para este fim.

Paulo Garcia172 destaca, também, o papel da informação neste processo e a

opção pela independência financeira e política para a realização das suas ações.

Desde o início nós optamos pela independência. Independência financeira, nós não temos uma estrutura que fica cobrando mensalidade. Nós temos um grupo que supre as necessidades e este grupo se amplia, caso tenha outras necessidades. Tudo pontual. A gente enche a associação quando é necessário e assim vai. A gente não se juntou a nenhum partido, não aceitou ajuda de nenhum sindicato, não teve interferência externa nenhuma. Isto nos deu liberdade pra fazer tudo isto... A gente tem o documento da cassação do Kassab, isto não tem em nenhum lugar. A gente nunca pediu um favor para a prefeitura pra depois ser cobrado. Nós, como associação, pedimos a cassação do Kassab, dos vereadores, pedimos interferência da Justiça. Onde a gente via que estava errado, denunciava (referência) 183.

169

Entrevista Paula Garcia em 19/11/2011. 170

A UNESCO define como Patrimônio Cultural Imaterial "as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas – junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados – que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural." Este é transmitido de geração em geração e constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo assim para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade. Disponível no site: <http://www.portal.iphan.gov.br>.

171Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011.

172Entrevista em 4/2/2012.

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183

Outro modo de informar foram as passeatas organizadas pela ACSI que, além

da mobilização para pressionar a Câmara dos Vereadores e o Executivo Municipal,

traziam faixas informando sobre a lei de concessão urbanística, conforme foto

publicada no próprio site da Associação:

Figura 14 – Passeata do dia 14/1/2011 Fonte: Disponível em: <http://www.acesisanta.com.br>.

Para Paulo Garcia, o Projeto Nova Luz seria desnecessário se houvesse uma

política de zeladoria urbana que garantisse a manutenção e o acesso com qualidade

ao espaço público. Esta mesma posição é compartilhada por Robson Mendonça, do

MEPR:

A última coisa que você precisa é deste Projeto Nova Luz. Precisamos de calçada, de segurança, de iluminação, de cuidado com o que é de responsabilidade do Poder Público.

173

173

Entrevista Paulo Garcia em 4/2/2012.

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184

É preciso pensar em um projeto que tenha banheiro público e acessibilidade, senão é um problema. Vamos ver uma coisa bem simples, quem vai ao Pátio do Colégio, pra ter acesso àquela praça, só não sendo cadeirante ou tendo ajuda, porque não tem acessibilidade pra quem tem deficiência.

174

Para a liderança da ACSI, a vocação comercial do bairro precisa ser

incentivada dando condições para que os comerciantes invistam em seus negócios

gerando mais empregos.

A prefeitura tem que deixar o empresário se expandir, fomentar, dar condições, incentivar, é este o papel do Poder Público.

175

Contudo, o papel do Poder Público está, também, na regulação do mercado

para garantir os direitos dos consumidores, a livre concorrência, a qualidade dos

bens e serviços, entre outros. O desenvolvimento econômico deve ser fomentado no

bairro, porém, com a garantia do bem-estar social e dos interesses dos

consumidores.

Assim como as associações que trazem uma discussão mais ampla do

projeto Nova Luz, apresentando as demandas de moradores e comerciantes, o

Movimento Estadual da População de Rua pauta suas ações no atendimento da

população de rua e nas denúncias de violações de direito.

O MEPR contesta a divulgação de dados sobre a “cracolândia”, coloca-se

como interlocutor junto à imprensa e o Poder Público, e organiza denúncias de

violações de direitos cobrando políticas públicas para o atendimento das demandas

desta população. Para isso, a representação do movimento se estende a outros

conselhos e fóruns, como o Fórum da Agenda 21, o Conselho de Segurança do

Centro, a Promotoria do Centro, entre outros.

O Movimento Estadual da População de Rua tem cadeira no Conselho Gestor da ZEIS, mas, precisa fazer parte de outros espaços pra levar as necessidades que encontramos na Luz. Por isso, fazemos parte do Fórum da Agenda 21, do Conselho de Segurança do Centro, da Promotoria do Centro e de alguns outros espaços e conselhos ligados ao centro de São Paulo e arredores.

176

174

Entrevista Robson Mendonça em 11/2/2012. 175

Entrevista Paulo Garcia em 04/2/2012. 176

Entrevista Robson Mendonça 11/2/2012.

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185

A União dos Movimentos de Moradia177, também, possui representação em

diversos conselhos e fóruns e, nos últimos anos, tem se mobilizado para as

ocupações de imóveis vazios na região central.

Na região central há muitos prédios vazios e o Movimento de Moradia tem ocupado estes prédios. Nos últimos meses foram, pelo menos, 10 ocupações. Precisamos pressionar o Poder Público para criar soluções para a falta de moradia na cidade.

178

Quanto à situação da “cracolândia”, há uma opinião geral de que este é um

problema de saúde pública, que não se limita ao bairro, e que o uso da força policial

não pode ser predominante, assim como o Projeto Nova Luz.

Se a Prefeitura tivesse uma ação de cuidar do centro de São Paulo, talvez isto não acontecesse, e o mais importante, é preciso fazer um trabalho de saúde pública na “cracolândia”. Porque isto não é caso de polícia, mas de saúde, aqui tem muitas pessoas doentes. O crack mata em dois ou três anos e leva a pessoa a um quadro de insanidade mental. São pessoas doentes que roubam pra dar conta do vício e precisam de ajuda

179.

Em relação à “cracolândia” é preciso pensar o antes, o durante e o depois. Primeiro, é preciso arrumar vaga pra tratamento, mas para tratar humanamente estas pessoas. Após o tratamento é preciso pensar o depois; pensar em ações da Saúde, da Assistência Social, uma rede que não funciona hoje.

180

A indignação diante das ações policiais em janeiro de 2012, criaram o

Movimento Luz Livre que, além das ações realizadas no mês de janeiro e

fevereiro181, vem congregando mais de 100 entidades e movimentos sociais na

discussão dos problemas do bairro da Luz e das intervenções propostas e

realizadas pelo Poder Público.

O Movimento, além de reuniões periódicas, mantém um site com informações

sobre os principais acontecimentos do bairro e do andamento do Projeto Nova

Luz.182

Essa articulação do Movimento Luz Livre vem referendar a necessidade da

articulação de estratégias no campo institucional e jurídico, como também no campo

da mobilização social, com destaque para a divulgação de informações que

177

Entrevista Sidnei Antonio Euzébio Pita em 05/3/2012. 178

Entrevista Sidnei Antonio Euzébio Pita em 05/3/2012. 179

Entrevista Paula Ribas em 19/11/2011. 180

Entrevista Robson Mendonça em 11/2/2012. 181

Ações descritas no capítulo 4. 182

Disponível em: <http://luzlivre.wordpress.com>.

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186

contribuam no entendimento do Projeto Nova Luz pelo maior número possível de

pessoas que se envolvam no debate e na discussão das medidas que vêm sendo

tomadas.

As propostas apresentadas pelos sujeitos coletivos para a reabilitação do

bairro da Luz, se ouvidas e discutidas com o Poder Público, poderiam trazer

importantes contribuições para se planejar as intervenções no bairro.

As expectativas para um projeto de revitalização colocam-se, basicamente, no

cuidado e recuperação dos espaços públicos; na organização de políticas que

garantam moradia popular; a valorização do patrimônio cultural; o acesso aos bens e

serviços pelos moradores; entre outros. Porém, a participação da população na

definição desse processo é a reivindicação central das lideranças ouvidas.

Os mecanismos de participação discutidos neste estudo possibilitam esta

participação, no entanto, não podem ser reduzidos a meros instrumentos para dar

respostas jurídicas e burocráticas à administração pública. Devem ser exercitados

exaustivamente, enquanto campo de negociação, tendo como foco principal o bem

comum.

6.4 Projeto Nova Luz: projeto de reurbanização em questão

O Projeto Nova Luz denomina-se como um projeto de revitalização urbana

que tem como missão “definir as bases para a requalificação da região e a

implementação de equipamentos e serviços que reforcem suas características

comerciais, culturais e sociais”.183 Ao se caracterizar como um projeto de

revitalização, o mesmo deveria seguir critérios que proporcionassem uma nova

vitalidade ao local, principalmente, com a “humanização dos espaços coletivos

produzidos; o incentivo à instalação de habitações de interesse social; e, a

participação da comunidade na concepção e implantação do projeto” (VARGAS;

CASTILHO, 2006, p. 33).

A pesquisa documental e empírica realizada neste estudo revelou que o

Projeto Nova Luz possui características de um projeto de renovação radical do bairro

da Luz com gentrificação.

183

Conforme Projeto Urbanístico Nova Luz. Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br>. Acesso em: 04 nov. 2011.

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187

O projeto privilegia a imbricação da economia de mercado com o processo de

higienização da região central da cidade de São Paulo, em detrimento aos princípios

do direito à cidade e da proposição de políticas públicas com participação popular

inerentes ao processo democrático constituído a partir da Constituição de 1988.

O Projeto Nova Luz será executado em um bairro com relevância histórica

para a cidade e com um vasto patrimônio arquitetônico e cultural, mas que, durante

décadas, esteve abandonado pelo Poder Público, que não criou ações efetivas e de

continuidade para a sua preservação. Inúmeros projetos de intervenção urbanística

ocorreram na região central e no bairro da Luz, sem, contudo, uma efetiva

reabilitação da região.

Os serviços de zeladoria urbana, que deveriam ser garantidos cotidianamente

pelo Poder Público, foram negligenciados em ruas sem reparos no calçamento e

iluminação; prédios e praças públicas sem os cuidados básicos de preservação; e

áreas vazias onde haviam prédios que foram demolidos.

Somam-se a esses fatores os fortes indícios de que a imagem do bairro

vinculada à “cracolândia” deu-se de forma premeditada pelo Poder Público e foi

amplamente divulgada pela mídia como uma estratégia para a aprovação, pela

opinião pública, do Projeto Nova Luz.

O Projeto Nova Luz tornou-se a solução para a eliminação da “cracolândia”,

utilizando-se da repressão policial, sem o aprofundamento do debate sobre o

crescimento dos usuários de crack e a construção de políticas públicas que

efetivamente deem respostas a essa situação.

Conforme Bidou-Zachariasen (2006, p. 22), na gentrificação, o mercado

imobiliário tem uma ação conjunta com o Estado, que, através de programas de

incentivos, busca atrair investimentos para a área. No caso do Projeto Nova Luz,

desde a sua concepção inicial, o Sindicato da Habitação esteve presente na

negociação, discussão e elaboração de um projeto para a região, além da sua

influência na decisão dos vereadores durante a aprovação das leis que

regulamentaram a concessão urbanística e a sua aplicação no bairro da Luz. A falta

de transparência, tanto do Executivo Municipal quanto do Legislativo, com o

Sindicato da Habitação, coloca em questão os objetivos do Projeto que, para os

entrevistados, visa beneficiar a especulação do mercado imobiliário.

Essa posição é citada no Estudo de Viabilidade Econômica, Mercadológica e

Situação Fundiária, do Projeto Nova Luz, em que as empresas ou consórcios que

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188

ficarem responsáveis pela execução do Projeto Nova Luz terão seus lucros da

venda de terrenos e empreendimentos, mas contará, também, com um alto

investimento público. O potencial de investimento na região tem por base a sua

localização e acesso, bem como o vasto acervo de equipamentos culturais.

O estudo também explicita o potencial do mercado imobiliário do bairro, com a

criação de 2,6 mil unidades habitacionais, onde estão previstos 20% de habitações

de interesse social para famílias com renda de 7 a 10 salários mínimos e, 58% das

habitações de mercado popular para famílias com renda superior a 15 salários

mínimos. Essas novas unidades não contemplariam os moradores da região,

proprietários e locatários, que possuem uma renda média mensal de R$ 1.323,00,

equivalente a dois salários mínimos.

Também o Plano Urbanístico da ZEIS-3 da Santa Ifigênia, que teria como

objetivo permitir que parcelas da população que não possuem condições de ocupar

o solo tenham este direito, foi aprovado durante reunião do Conselho Gestor, em

março de 2012, sem que questões pendentes fossem devidamente esclarecidas e

debatidas, como as garantias e os procedimentos de realocação dos atuais

moradores da região na própria área de intervenção.

A pressão para aprovar o Plano Urbanístico o mais rápido possível deixou de lado pontos essenciais, inclusive exigências do próprio Plano Diretor de São Paulo. A aprovação do Plano, para a Prefeitura, era o último entrave à publicação do edital de licitação da concessão urbanística da Nova Luz.

184

A indefinição dos procedimentos para a realocação dos moradores e a

projeção de moradias para famílias com ganhos superiores a 7 salários mínimos

caracterizam um processo de exclusão da população residente no bairro, tanto

proprietários quanto locatários. Nesse modelo, o processo de transformação do

espaço urbano possui um caráter excludente e privatizador, expulsando a população

de baixa renda com a sua substituição por moradores de maior poder aquisitivo.

Também a gestão democrática com a participação popular na definição da

política urbana, conquista das lutas sociais e legitimada na Constituição de 1988 e

no Estatuto da Cidade, através dos mecanismos de participação, como as

audiências públicas e os conselhos gestores, apesar de previstos e executados

mostram seus limites.

184

Notícia divulgada no site: <http://www.apropriacaodaluz.com.br>. Acesso em: 02 abr. 2012.

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189

O Conselho Gestor da ZEIS-3 tem sido o único espaço aberto à participação

e deliberação ativa da sociedade civil, apesar da ZEIS-3 incluir apenas 11 das 45

quadras do projeto. Além deste Conselho, é necessária a instituição do Conselho

Gestor para o projeto de concessão urbanística do bairro da Luz, conforme artigo 4

da Lei nº 14.918/2009, para a fiscalização e acompanhamento do Projeto Nova Luz.

Contudo, a tradição autoritária e centralizadora do Estado na definição das

políticas públicas transformou esses mecanismos em espaços de escuta da

reivindicação da população, sem respostas efetivas pelo Poder Público ou a

construção de propostas e decisões compartilhadas.

Valorizar e priorizar a participação dos sujeitos coletivos nos espaços dos

conselhos e audiências públicas torna-se imperativo para o enfrentamento do

Projeto Nova Luz, conforme falas das lideranças dos sujeitos coletivos e políticos

envolvidos no processo.

A divulgação de informações; o debate com moradores, comerciantes e

trabalhadores do bairro; a mobilização em eventos para pressionar o Poder Público

são formas, entre outras, imprescindíveis para a articulação e resistência às

imposições do Poder Público e do mercado imobiliário.

Nesse sentido, a fala de Coutinho ilumina este processo de participação

coletiva em construção:

O fortalecimento da sociedade civil abre assim a possibilidade concreta de intensificar a luta pelo aprofundamento da democracia política no sentido de uma democracia organizada de massas, que desloque cada vez mais “para baixo” o eixo das grandes decisões hoje tomadas exclusivamente “pelo alto” (COUTINHO, 1980, p. 36).

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190

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das últimas décadas do século XX até presentemente, multiplicam-se

os processos de reurbanização das cidades que, diante de novas necessidades,

buscam readequar seus espaços. Esses processos, denominados de reabilitação,

renovação, revitalização ou gentrificação, possuem características e propósitos

políticos distintos, dependendo dos interesses envolvidos.

As regiões centrais de grandes cidades, após décadas de abandono que

levaram à sua degradação, passam por estes processos visando a recuperação do

seu patrimônio histórico e arquitetônico, bem como a possibilidade de expansão do

potencial imobiliário.

Apesar desta “política de abandono”, as regiões centrais conservam uma

enorme vitalidade pelas inúmeras pessoas que optam em morar no centro, a

expressiva vida econômica com a geração de milhares de empregos e pela

diversidade cultural e de lazer.

O Projeto Nova Luz insere-se na proposta de reurbanização da região central

de São Paulo, especialmente, pelos esforços que o Poder Público e a iniciativa

privada vêm desenvolvendo para que a cidade faça parte do circuito das cidades-

globais.Torna-se, então, imperativo que a região central recupere o seu valor

histórico, propiciando possibilidades de lazer e entretenimento para aqueles que

nela vivem ou a visitam por diferentes razões.

O estudo desenvolvido nesta tese teve como questão central e norteadora

investigar se o Projeto Nova Luz, ao se definir como um projeto de revitalização,

contempla os princípios do direito à cidade e da proposição de políticas públicas

com participação popular.

A partir da pesquisa bibliográfica e documental e, principalmente, das

percepções das lideranças dos sujeitos políticos e coletivos envolvidos no processo

do Projeto Nova Luz, verificou-se que a proposta não atende aos requisitos de um

processo de revitalização, mas de um processo de renovação com gentrificação. Ou

seja, a população moradora e que está presente na região com alguma atividade

econômica, sejam proprietários de imóveis ou inquilinos, não se encontra

contemplada na atual proposta.

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191

O Projeto também não prevê a valorização do patrimônio material e imaterial

do bairro, formado desde o início da constituição da cidade de São Paulo e,

permanentemente, ampliado com as vivências de moradores e frequentadores da

região.

Esta proposta reafirma o caráter segregador que acompanhou todo o

processo de urbanização no Brasil, onde as elites instalaram-se em bairros centrais,

expulsando a população de baixa renda para as periferias, distantes dos serviços

públicos e das oportunidades de trabalho, de lazer, etc. Especialmente na região

central, denunciam-se ações higienistas, com a expulsão, principalmente, da

população em situação de rua e dos moradores de cortiços e de ocupações.

Para que o Projeto Nova Luz não se defina como um projeto de gentrificação,

é necessário romper com a cultura política brasileira, que possui resquício do

autoritarismo, que enfraquece o processo de democratização. As intervenções do

Poder Público necessitam de transparência, principalmente, quando relacionadas

aos interesses da iniciativa privada.

Com a Constituição de 1988, a política urbana deveria se estruturar para

atender os interesses sociais da cidade, tornando-as justas e sustentáveis para

todos. Projetos de reurbanização, como o Nova Luz, deveriam ser construídos com

ampla participação da sociedade, que dispõe de espaços de discussão e decisão

sobre essas políticas.

Esse processo participativo possibilitaria maior transparência às decisões

tomadas, possivelmente, evitando que o Estado criasse estratégias para privilegiar o

capital imobiliário especulativo em detrimento ao bem comum. Essa também é uma

prática histórica na sociedade brasileira, em que os interesses privados se

sobrepropõem aos interesses públicos, através de parcerias realizadas entre o

Poder Público e a iniciativa privada.

O que se observa, porém, nesses espaços de participação, é que o Poder

Público, por uma tradição autoritária e centralizadora, ignora a participação da

sociedade nos processos decisórios, muitas vezes, tratando esses espaços de

forma burocrática para o atendimento da lei.

Para o Serviço Social, o campo das políticas urbanas abre a possibilidade de

atuação nos projetos de reurbanização, seja na realização de estudos dos aspectos

sociais das regiões, seja no atendimento da população moradora que demanda

orientações e encaminhamentos.

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192

A presença e intervenção críticas do profissional do Serviço Social nas

políticas urbanas exigem que apreenda as inúmeras determinações que conformam

essas políticas, procurando mediá-las através da efetivação dos direitos sociais.

Para tanto, o profissional do Serviço Social necessita estar atento e envolvido

nos processos participativos vivenciados pelos sujeitos coletivos e políticos, em suas

diferentes lutas sociais. Nesse sentido, busca contribuir para o fortalecimento desta

organização e participação coletiva visando o controle social sobre as políticas

públicas.

É reconhecido que muitos são os assistentes sociais atuantes em projetos de

reurbanização em áreas centrais e periféricas de cidades brasileiras, fazendo-se,

desse modo, necessários novos estudos e pesquisas para o aprofundamento desse

campo de intervenção profissional.

Em relação ao Projeto Nova Luz, o presente estudo situa-se na fase de

execução dos Projetos Urbanísticos e dos Estudos para sua execução, baseando

sua análise, principalmente, no recorte das percepções das lideranças dos sujeitos

coletivos e políticos envolvidos, no momento, em todo o processo participativo desta

fase.

A continuidade ou não do Projeto Nova Luz, o envolvimento de outros sujeitos

coletivos e políticos, como o Movimento Luz Livre, Fórum Centro Vivo e a

Associação Viva o Centro e outros, em razão das ações na “cracolândia”, trarão

novos elementos para a análise futura deste Projeto e seus impactos na vida dos

moradores e frequentadores do bairro da Luz.

Neste momento, é consenso entre os entrevistados que o bairro necessita de

ações para sua reabilitação, que compreendem intervenções desde a zeladoria

urbana, até a valorização da sua história e tradição.

Nesse aspecto, a imagem negativa atribuída ao bairro da Luz, associado à

“cracolândia”, precisa ser desconstruída. A “cracolândia” não será resolvida com o

Projeto Nova Luz, nem com intervenções repressivas por parte da polícia, pois se

trata de uma questão de saúde pública. É um fenômeno complexo, que desafia o

Poder Público e que necessita de uma ação integrada entre as várias esferas de

governo e as políticas sociais, bem como da sociedade civil.

Os meios de comunicação devem promover esclarecimentos sobre a

“cracolândia” enquanto uma situação que ocorre em vários bairros da cidade de São

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Paulo, e não apenas no Bairro da Luz. A criminalização dos usuários de crack não é

o caminho para a construção de políticas públicas que deem conta desta realidade.

Ao finalizar este estudo, que priorizou dar voz às lideranças dos sujeitos

coletivos e políticos participantes do Projeto Nova Luz, reconfirma-se a relevância da

participação popular na definição das políticas urbanas, pois o Estatuto da Cidade

aponta a participação como possibilidade para a construção de cidades justas,

democráticas e sustentáveis.

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Documentos Públicos EDITAL de Concorrência 01/2009/SMDU. Disponível em: <http://www.acsisanta.com.br/edital_08_09.pdf>. Acesso em: 6 ago. 2011. PMSP. Estudos de viabilidade econômica, mercadológica e de situação fundiária - Subproduto 5.6. Projeto Nova Luz, São Paulo, jul. 2011a. Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br/files/201108_EVEMSF.pdf>. Acesso em: 6 ago. 2011. ______. Plano de Urbanização de ZEIS. Projeto Nova Luz, São Paulo, jul. 2011b. ______. Estudo de impacto ambiental. Projeto Nova Luz, São Paulo, v. 2, jul. 2011c. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/meio_ambiente/arquivos/nl_eiarima_cap101_a_102.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2011. ______. Estudo de impacto ambiental. Projeto Nova Luz, São Paulo, v. 4-5, jul. 2011d. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/meio_ambiente/arquivos/nl_eiarima_vol4_e_5.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2011. ______. Plano de Urbanização do Projeto Nova Luz. Projeto Nova Luz, São Paulo, jul. 2011e. (Projeto Urbanístico Específico, Subproduto 5.1: PUE Consolidado). Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br/files/201108_PUE.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2011. PMSP; EMURB. Nova Luz: Programa de Requalificação Urbana. São Paulo, mar. 2009. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/desenvolvimento_urbano/sp_urbanismo/arquivos/ouc/ouc_apresentacao_72_roceouc.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2011. PMSP; EMURB. Programa de Requalificação Urbana Nova Luz. Plano Urbanístico. São Paulo, jun. 2008. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/caderno_plano_urbanistico_1255718689.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2011. PMSP; SMDU. Projeto preliminar – urbanístico e ZEIS. Projeto Nova Luz, São Paulo, dez. 2010. Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br/files/20101217_NovaLuz_PMSP_SMDU.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2011. PMSP; SMDU. Visão e diretrizes urbanísticas. Projeto Nova Luz, São Paulo, nov. 2010. Disponível em: <http://www.novaluzsp.com.br/files/20101117_NovaLuz_PMSP_SMDU.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2011.

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TERMO de referência para contratação de serviços técnicos especializados para elaboração do Projeto Urbanístico Específico e Estudos Ambientais e Econômicos. 2009. Disponível em: <http://www.acsisanta.com.br/edital_NovaLuz.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2011. Legislação Federal BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. BRASIL. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 06 ago. 2012. BRASIL. Medida Provisória nº 2220, de 04 de setembro de 2001. Dispõe sobre a concessão de uso especial de que trata o parágrafo primeiro do artigo 183 da Constituição, cria o Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/mpv/2220.htm>. Acesso em: 06 ago. 2012. Legislação Municipal SÃO PAULO. Lei nº 13.399, de 1º de agosto de 2002. Dispõe sobre a criação de subprefeituras no Município de São Paulo e dá outras providências. <http://www.nossasaopaulo.org.br/portal/files/Lei13399.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2012. SÃO PAULO. Lei nº 13.430, de 13 de setembro de 2002. Dispõe sobre o Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/upload/pinheiros/arquivos/lei_13430.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2012. SÃO PAULO. Decreto nº 43.230, de 22 de maio de 2003. Regulamenta o Conselho Municipal de Política Urbana da Cidade de São Paulo e a Câmara Técnica de Legislação Urbanística. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/chamadas/DECRETO_N_43230_1272388881.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2012. SÃO PAULO. Lei nº 13.885, de 25 de agosto de 2004. Estabelece normas complementares ao Plano Diretor Estratégico, institui os Planos Regionais Estratégicos das Subprefeituras, dispõe sobre o parcelamento, disciplina e ordena o uso e ocupação do solo do Município de São Paulo. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/desenvolvimento_urbano/legislacao/planos_regionais/index.php?p=822>. Acesso em: 06 ago. 2012.

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SÃO PAULO. Lei nº 14.096, de 8 de dezembro de 2005. Dispõe sobre a criação do Programa de Incentivos Seletivos para a região adjacente à Estação da Luz, na área central do Município de São Paulo, nos termos que especifica. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/chamadas/Lei_14096_1265210569.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2012. SÃO PAULO. Lei nº 14.917, de 7 de maio de 2009. Dispõe sobre a concessão urbanística no Município de São Paulo. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/desenvolvimento_urbano/legislacao/index.php?p=821>. Acesso em: 06 ago. 2012. SÃO PAULO. Decreto nº 51.437, de 26 de abril de 2010. Altera os artigos 1º e 6º do Decreto nº 47.661, de 6 de setembro de 2006, que regulamenta o Fundo de Desenvolvimento Urbano – FUNDURB. Disponível em: <http://www3.prefeitura.sp.gov.br/cadlem/secretarias/negocios_juridicos/cadlem/integra.asp?alt=27042010D%20514370000>. Acesso em: 06 ago. 2012. Sites consultados ASSOCIAÇÃO DOS COMERCIANTES DO BAIRRO DA SANTA IFIGÊNIA. Disponível em: <http://www.acsisanta.com.br/>. Acesso em: 10 out. 2011. BAIRRO DA LUZ. Disponível em: <http://bairrodaluzsp.wordpress.com>. Acesso em: 15 ago. 2011. CENTRO VIVO. Disponível em: <http://www.centrovivo.com.br>. Acesso em: 04 nov. 2011. CIDADES. Ministério das Cidades. Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/>. Acesso em: 15 ago. 2011. COMUNIDADE CIÊNCIA E CULTURA (Licenciatura do IFUSP). Disponível em: <http://stoa.usp.br/cienciacultura/weblog>. Acesso em: 13 jan. 2012. ESTADO DE SÃO PAULO ON-LINE. Disponível em: < http://www.estadao.com.br/>. Acesso em: 5 nov. 2011. FAUUSP. Disponível em: <http://www.usp.br/fau/fau/>. Acesso em: 10 ago. 2011. FOLHA DE SÃO PAULO ON-LINE. Disponível em: <http://www.folha.uol.com.br/>. Acesso em: 5 nov. 2011. FORUM NACIONAL DE REFORMA URBANA. Disponível em: <http://www.forumreformaurbana.org.br/>. Acesso em: 15 jan. 2012. INSTITUTO PÓLIS. Disponível em: <http://www.polis.org.br/>. Acesso em: 05 ago. 2011.

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LUZ LIVRE. Disponível em: <http://luzlivre.wordpress.com/>. Acesso em: 20 ago. 2011. PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO. Lugares da memória. Disponível em: <www.pucsp.br/artecidade/site97_99/ac3/hist.html>. Acesso em: 10 ago. 2011. PREFEITURA DE SÃO PAULO. Disponível em: <http://www.capital.sp.gov.br/portalpmsp/homec.jsp>. Acesso em: 10 nov. 2011. REDE NOSSA SÃO PAULO. Disponível em: <http://www.nossasaopaulo.org.br/portal/>. Acesso em: 10 jan. 2012. SCIELO. Disponível em: < http://www.scielo.br/>. Acesso em: 10 out. 2011. URBANIDADES. Disponível em: <http://urbanidades.arq.br/>. Acesso em: 10 out. 2011. VIVA O CENTRO SÃO PAULO. Disponível em: <http://www.vivaocentro.org.br/>. Acesso em: 04 nov. 2011.

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APÊNDICE 1 – ROTEIRO NORTEADOR DAS ENTREVISTAS

1. Identificação das lideranças dos sujeitos coletivos e políticos entrevistados:

Identificação do entrevistado e do movimento/associação que representa.

2. Conhecimento do movimento/associação sobre o Projeto Nova Luz:

Concepção do Projeto,

Ações em andamento,

Situação atual.

3. Posicionamento do movimento/associação em relação ao Projeto.

4. Ações que vem sendo realizadas pelo movimento/associação para contribuir ou

resistir ao Projeto Nova Luz.

5. Parceiros do movimento/associação nas ações de resistência.

6. Propostas do movimento/associação para o Bairro da Luz.

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ANEXO 1 – LEI Nº 14.917 DE 2009. DISPÕE SOBRE A CONCESSÃO URBANÍSTICA NO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO185 GILBERTO KASSAB, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 22 de abril de 2009, decretou e eu promulgo a seguinte lei: Art. 1º A concessão urbanística constitui instrumento de intervenção urbana estrutural destinada à realização de urbanização ou de reurbanização de parte do território municipal a ser objeto de requalificação da infra-estrutura urbana e de reordenamento do espaço urbano com base em projeto urbanístico específico em área de operação urbana ou área de intervenção urbana para atendimento de objetivos, diretrizes e prioridades estabelecidas na lei do plano diretor estratégico. Parágrafo Único - São diretrizes que podem justificar a realização de intervenção urbana mediante a concessão urbanística: I - elevar a qualidade do ambiente urbano, por meio da preservação dos recursos naturais e da proteção do patrimônio histórico, artístico, cultural, urbanístico, arqueológico e paisagístico; II - racionalizar o uso da infra-estrutura instalada, em particular a do sistema viário e de transportes, evitando sua sobrecarga ou ociosidade; III - promover e tornar mais eficientes, em termos sociais, ambientais, urbanísticos e econômicos, os investimentos dos setores público e privado; IV - prevenir distorções e abusos no desfrute econômico da propriedade urbana e coibir o uso especulativo da terra como reserva de valor, de modo a assegurar o cumprimento da função social da propriedade; V - permitir a participação da iniciativa privada em ações relativas ao processo de urbanização; VI - recuperar áreas degradadas ou deterioradas visando à melhoria do meio ambiente e das condições de habitabilidade; VII - estimular a reestruturação e requalificação urbanística para melhor aproveitamento de áreas dotadas de infra-estrutura, estimulando investimentos e revertendo o processo de esvaziamento populacional ou imobiliário; VIII - estimular o adensamento de áreas já dotadas de serviços, infra-estrutura e equipamentos, de forma a otimizar o aproveitamento da capacidade instalada e reduzir custos; IX - adequar a urbanização às necessidades decorrentes de novas tecnologias e modos de vida; X - possibilitar a ocorrência de tipologias arquitetônicas diferenciadas e facilitar a reciclagem das edificações para novos usos. Art. 2º Para os fins desta lei, concessão urbanística é o contrato administrativo por meio do qual o poder concedente, mediante licitação, na modalidade concorrência, delega a pessoa jurídica ou a consórcio de empresas a execução de obras urbanísticas de interesse público, por conta e risco da empresa concessionária, de modo que o investimento desta seja remunerado e amortizado mediante a exploração dos imóveis resultantes destinados a usos privados nos termos do

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Fonte: disponível em: <http://www.LEISMUNICIPAIS.com.br>. Acesso em: jun. 2011.

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contrato de concessão, com base em prévio projeto urbanístico específico e em cumprimento de objetivos, diretrizes e prioridades da lei do plano diretor estratégico. Parágrafo Único - A empresa concessionária obterá sua remuneração, por sua conta e risco, nos termos estabelecidos no edital de licitação e no contrato, dentre outras fontes, por meio da alienação ou locação de imóveis, inclusive dos imóveis desapropriados e das unidades imobiliárias a serem construídas, da exploração direta ou indireta de áreas públicas na área abrangida pela intervenção urbana ou qualquer outra forma de receita alternativa, complementar ou acessória, bem como pela receita de projetos associados. Art. 3º Podem ser objeto de concessão urbanística, entre outras intervenções estruturais, as obras relativas a modificação do sistema viário, da estrutura fundiária, de instalações e equipamentos urbanos, inclusive sistema de transporte público, e da localização de logradouros públicos, a demolição, reforma, ampliação ou construção de edificações nos termos estabelecidos no respectivo projeto urbanístico específico. § 1º A área resultante de urbanização ou de reurbanização mediante concessão urbanística deverá ser dotada, conforme o caso, de infra-estrutura de abastecimento de água potável, disposição adequada de esgoto sanitário, distribuição de energia elétrica e iluminação pública, sistema de manejo de águas pluviais, de transporte público de passageiros e viário público com pavimentação adequada, atendidas as normas de acessibilidade e preferentemente com piso drenante, rede de telecomunicações, rede de gás canalizado e equipamentos comunitários destinados à educação, cultura, saúde, segurança, esporte, lazer e convívio social. § 2º O reparcelamento de área necessário para a execução do projeto urbanístico específico da concessão deverá observar as normas gerais da legislação nacional e municipal aplicável ao parcelamento do solo para fins urbanos, as da lei do plano diretor estratégico e as da lei da operação urbana consorciada ou do respectivo projeto estratégico na qual esteja inserida a área objeto da concessão urbanística. § 3º Conforme as necessidades de cada caso, a intervenção urbana pretendida, de acordo com o projeto urbanístico específico referido no art. 8º desta lei, poderá ser objeto de mais de uma concessão urbanística. § 4º Poderá integrar o objeto da concessão urbanística tanto a exploração do solo quanto do subsolo e do espaço aéreo, inclusive a implantação de garagens subterrâneas e a gestão das redes de infra-estrutura instaladas em áreas municipais. Art. 4º A concessão urbanística fica sujeita ao regime jurídico das concessões comuns regidas pela Lei Federal nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, com as complementações constantes desta lei, e das concessões patrocinadas previstas na Lei Municipal nº 14.517, de 16 de outubro de 2007, e na Lei Federal nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, sem prejuízo da aplicação das normas com ela compatíveis das leis que lhe são correlatas.

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§ 1º São correlatas com o regime jurídico das concessões comuns e a elas aplicáveis subsidiariamente as normas pertinentes e com elas compatíveis das Leis Federais nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e nº 10.257, de 10 de julho de 2001, bem como da Lei Municipal nº 13.278, de 7 de janeiro de 2002. § 2º Se o contrato de concessão urbanística estabelecer contrapartida do Poder Público Municipal com recursos provenientes de financiamento ou doação oriundos de agência oficial de cooperação técnica ou organismo financeiro multilateral de que o Brasil faça parte, poderão ser admitidas na licitação as condições decorrentes de acordos, protocolos, convenções ou tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, bem como as normas e procedimentos daquelas entidades, inclusive quanto ao critério de seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, o qual poderá contemplar, além do preço, outros fatores de avaliação, desde que por elas exigidos para a obtenção do financiamento ou doação, e que também não conflitem com o princípio do julgamento objetivo e sejam objeto de despacho motivado do órgão executor do contrato, despacho esse ratificado pela autoridade imediatamente superior. Art. 5º Toda concessão urbanística deve ser autorizada por lei específica, que estabelecerá os parâmetros urbanísticos aplicáveis, e só pode ter por objeto uma área contínua destinada a intervenção urbana com base na lei do plano diretor estratégico, mesmo que não haja necessidade de alteração de parâmetros urbanísticos e demais disposições legais aplicáveis. § 1º Cada autorização legislativa, no âmbito da respectiva lei específica, deverá conter o perímetro específico e as diretrizes específicas da concessão urbanística por ela autorizada, que orientarão a transformação urbanística pretendida para a região, de acordo com as suas características e potencialidades. § 2º O Poder Legislativo poderá sustar a autorização legislativa de que trata este artigo caso a concessão urbanística não observe o perímetro específico e as diretrizes específicas autorizadas. Art. 6º Não se aplica às obras efetuadas com base nesta lei o disposto nos arts. 1º e 2º da Lei nº 10.671, de 28 de outubro de 1988. Parágrafo Único - As leis de melhoramento viário incidentes sobre a área da concessão urbanística não impedirão a modificação dos logradouros existentes, nos termos desta lei, nem impedirão a edificação nas áreas por eles atingidas, não sendo aplicáveis a tais casos as vedações estabelecidas pelos arts. 4º e 5º da Lei nº 11.228, de 26 de junho de 1992. Art. 7º A autorização para a abertura de licitação para a concessão urbanística será precedida de estudos e providências de responsabilidade do poder concedente para a definição dos objetivos, diretrizes e parâmetros de interesse público específico para a elaboração do projeto urbanístico específico da intervenção a ser realizada por meio da concessão, compreendendo, no mínimo, o seguinte:

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I - estudos de viabilidade econômica, mercadológicos e da situação fundiária da área; II - estudos de impacto ambiental ou de vizinhança; III - relatório circunstanciado dos principais conteúdos dos estudos efetuados e das providências a serem executadas com o demonstrativo quantitativo e qualitativo dos custos e benefícios sociais, urbanísticos e ambientais da intervenção urbana a ser realizada; IV - realização de uma audiência pública na área central do Município e na de cada uma das Subprefeituras em que será realizada a intervenção urbana, possibilitando a interação com proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados eventualmente interessados. Art. 8º O projeto urbanístico específico da intervenção urbana a ser realizada por meio da concessão urbanística, em conformidade com a lei do plano diretor estratégico, conterá, conforme o caso, os seguintes elementos: I - definição das modificações no sistema viário; II - localização e definição da infra-estrutura urbana e dos equipamentos comunitários; III - localização e definição dos espaços públicos de uso comum e especial; IV - definição dos parâmetros e diretrizes urbanísticos, ambientais e sociais; V - programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada pela intervenção urbana. § 1º O projeto urbanístico específico deve ser submetido para análise e deliberação, em caráter preferencial, preliminarmente à abertura da licitação, para a definição das diretrizes relativas à preservação do patrimônio cultural e histórico, parcelamento do solo, trânsito, preservação do meio ambiente e adequação dos parâmetros de uso e ocupação do solo, devendo ser submetido, ao final, à Câmara Técnica de Legislação Urbanística (CTLU). § 2º As diretrizes emitidas nos termos do parágrafo anterior vincularão as análises posteriores dos órgãos municipais quanto aos pedidos de licenciamento de edificações formulados pelo concessionário. § 3º O Poder Executivo poderá realizar concursos ou publicar edital de chamamento de pessoas físicas ou jurídicas interessadas em apresentar projetos, estudos, levantamentos e investigações que subsidiem a modelagem da concessão urbanística, os quais serão remunerados na forma prevista no art. 21 da Lei Federal nº 8.987, de 1995. Art. 9º O projeto de concessão urbanística será objeto de consulta pública, com antecedência mínima de 30 (trinta) dias da publicação do edital da respectiva licitação, mediante publicação de aviso na imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico, no qual serão informadas as justificativas para a contratação, a identificação do objeto, o prazo de duração do contrato e seu valor estimado e as minutas do edital e do contrato, fixando-se prazo para fornecimento de sugestões, realizando-se uma audiência pública ao término deste prazo.

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Art. 10 O concessionário pode utilizar os instrumentos jurídicos autorizados na legislação vigente em conformidade com os respectivos limites legais, tais como, o direito de preempção, o consórcio imobiliário, o direito de superfície, a cessão real de uso e outros conexos para adequado cumprimento da concessão urbanística. Parágrafo Único - A utilização do direito de preempção, do direito de superfície e da concessão real de uso sobre imóvel de domínio público depende de prévia autorização legal. Art. 11 A Prefeitura Municipal efetuará a declaração de utilidade pública e de interesse social dos imóveis a serem objeto de desapropriação urbanística para a execução do projeto urbanístico específico mediante concessão urbanística nos termos autorizados na alínea "i" do art. 5º do Decreto-lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, e no art. 44 da Lei Federal nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979. § 1º O concessionário, com fundamento no art. 3º do Decreto-lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, e na declaração a que se refere este artigo, promoverá a desapropriação judicial ou amigável dos imóveis a serem desapropriados, pagando e negociando integralmente a respectiva indenização, bem como assumindo a condição de proprietária dos respectivos imóveis, com poderes para promover as alterações registrárias necessárias para a realização de incorporações imobiliárias e a implementação do projeto urbanístico específico, nos termos do contrato de concessão urbanística. § 2º A desapropriação, uma vez obtida a imissão na posse, será irretratável e irrevogável, sendo defeso ao Poder Público Municipal ou ao concessionário desistir ou renunciar aos direitos e obrigações a ela relativos. Art. 12 Quando permitida, no edital de licitação, a participação de empresas em consórcio, serão observadas as seguintes normas: I - comprovação de compromisso, público ou particular, de constituição de sociedade de propósito específico, subscrito pelas consorciadas; II - indicação da empresa responsável pelo consórcio durante a licitação e até a constituição da sociedade de propósito específico; III - apresentação dos documentos exigidos para aferição da capacidade técnica, da idoneidade financeira e da regularidade jurídica e fiscal e as condições de liderança da empresa responsável pelo consórcio; IV - impedimento de participação de empresas consorciadas na mesma licitação, por intermédio de mais de um consórcio ou isoladamente. § 1º A empresa líder do consórcio é a responsável perante o poder concedente pelo cumprimento do contrato de concessão urbanística, sem prejuízo da responsabilidade solidária das demais consorciadas. § 2º A empresa licitante vencedora fica obrigada a constituir, antes da adjudicação do certame, sociedade de propósito específico para assumir os compromissos de concessionária até a completa execução da intervenção urbana dentro do prazo fixado no contrato de concessão urbanística antes de sua assinatura.

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§ 3º Poderá ser exigido pelo edital de licitação que a Prefeitura do Município de São Paulo receba 1 (uma) ação da empresa de propósito específico, com poder de participação nas decisões da empresa com a finalidade de controle do cumprimento do objeto da concessão urbanística, nos termos do edital. Art. 13 O poder concedente, antes da abertura da licitação, poderá proceder à pré-qualificação jurídica, técnica, econômico-financeira e conexas das empresas ou consórcios de empresas que queiram participar da licitação de concessão urbanística a fim de efetuar análise mais detida da qualificação técnica das interessadas. § 1º A adoção do procedimento de pré-qualificação será feita mediante proposta da autoridade competente do poder concedente, aprovada pela autoridade imediatamente superior. § 2º Na pré-qualificação serão observadas as exigências legais relativas à concorrência, à convocação dos interessados, ao procedimento e à análise da documentação. Art. 14 Observado o disposto no art. 5º, a licitação da concessão urbanística deverá ser autorizada pelo Prefeito, mediante despacho fundamentado, que efetuará a definição do objeto, área de abrangência, prazo e diretrizes a serem observadas. Art. 15 A licitação será aberta na modalidade concorrência mediante edital elaborado pelo poder concedente, observados, no que couber, os critérios e as normas gerais da legislação própria aplicável às concessões comuns, que conterá, especialmente: I - o objeto, metas e prazo da concessão; II - a descrição das condições necessárias à adequada execução da intervenção urbana; III - os prazos para recebimento das propostas, julgamento da licitação e assinatura do contrato; IV - prazo, local e horário em que serão fornecidos ou disponibilizados, aos interessados, os dados, estudos e projetos necessários à elaboração dos orçamentos e apresentação das propostas; V - os critérios e a relação dos documentos exigidos para a aferição da capacidade técnica, da idoneidade financeira e da regularidade jurídica e fiscal; VI - as possíveis fontes de receitas alternativas, complementares ou acessórias, bem como as provenientes de projetos associados; VII - os direitos e obrigações do poder concedente e da sociedade concessionária em relação a alterações a serem realizadas no futuro, para garantir a continuidade e a atualização da intervenção urbana aos fins de interesse público a que se destina; VIII - os critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros a serem utilizados no julgamento técnico e econômico-financeiro da proposta; IX - a indicação dos bens reversíveis e dos que forem objeto de imediata incorporação ao patrimônio público, de suas características e de outras condições conexas;

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X - a expressa indicação do concessionário como responsável pelo ônus da concretização das desapropriações necessárias à completa execução da intervenção urbana, ou para a instituição de servidão administrativa ou urbanística, observada a preferência dos expropriados para a aquisição de novas unidades, conforme definido no edital; XI - a exigência de constituição de sociedade de propósito específico, antes da adjudicação do certame, com o objetivo único e exclusivo de realização da intervenção urbana prevista no edital; XII - a exigência, se for o caso, de o concessionário ressarcir os dispêndios correspondentes aos estudos, investigações, levantamentos, projetos, obras e despesas ou investimentos já efetuados, vinculados à concessão, de utilidade para a licitação, realizados pelo poder concedente ou com a sua autorização, antes da assinatura do contrato de concessão urbanística; XIII - as condições de liderança da empresa responsável, na hipótese em que for permitida a participação de empresas em consórcio; XIV - a minuta do respectivo contrato de concessão urbanística, que conterá as cláusulas essenciais referidas no art. 19 desta lei e outras porventura necessárias e adequadas; XV - os dados relativos às obras da intervenção urbana, dentre os quais os elementos básicos do projeto referido no art. 8º desta lei; XVI - as garantias a serem exigidas para assegurar o adequado e completo cumprimento do contrato de concessão urbanística a que se referir o edital limitadas ao valor das obras da intervenção urbana. § 1º Entende-se por atualização da intervenção urbana, a que se refere o inciso VII do "caput" deste artigo, o uso de métodos, técnicas, instalações e equipamentos que correspondam aos padrões de modernidade propiciados pelo progresso tecnológico, bem como a sua melhoria e a ampliação de acordo com as diretrizes da lei do plano diretor para atendimento das necessidades dos usuários da cidade. § 2º Poderá ser prevista a obrigação de o concessionário incluir, na alienação dos imóveis resultantes da concessão, cláusulas que possibilitem o atendimento dos objetivos da intervenção urbana, inclusive no que se refere à manutenção de características de construção e de uso do bem, por prazo determinado, nos termos definidos no edital. § 3º A concessionária poderá promover a realização de incorporações imobiliárias nos imóveis desapropriados, a fim de possibilitar, ainda em fase de construção, a alienação das futuras unidades dos empreendimentos imobiliários, bem como sua dação em garantia de financiamentos. Art. 16 O julgamento da licitação de concessão urbanística poderá ser precedido da etapa de qualificação das propostas técnicas, desclassificando-se as empresas licitantes que não alcançarem a pontuação mínima, as quais não participarão da fase seguinte da licitação. Parágrafo Único - O exame das propostas técnicas, para fins de qualificação ou julgamento, será feito por ato motivado, com base em exigências, parâmetros e indicadores de resultado pertinentes ao objeto, definidos com clareza e objetividade no edital.

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Art. 17 No julgamento da licitação para a concessão urbanística será considerado um dos seguintes critérios: I - a maior oferta, nos casos de pagamento ao poder concedente pela outorga da concessão; II - a melhor proposta técnica, com preço fixado no edital; III - melhor proposta em razão da combinação dos critérios de maior oferta pela outorga da concessão com o de melhor técnica; IV - melhor oferta de pagamento pela outorga após qualificação de propostas técnicas; V - menor valor da contrapartida a ser paga pela Administração Pública, no caso de concessão patrocinada; VI - melhor proposta em razão da combinação do critério do inciso V com o de melhor técnica, de acordo com os pesos estabelecidos no edital, no caso de concessão patrocinada. § 1º O edital de licitação conterá parâmetros e exigências para a formulação de propostas técnicas. § 2º O poder concedente recusará propostas manifestamente inexeqüíveis ou financeiramente incompatíveis com os objetivos da licitação. § 3º Em igualdade de condições, será dada preferência à proposta apresentada por empresa brasileira. Art. 18 Considerar-se-á desclassificada a proposta que, para sua viabilização, necessite de vantagens ou subsídios que não estejam autorizados em lei e à disposição de todos os concorrentes. § 1º Considerar-se-á também desclassificada a proposta de entidade estatal alheia à esfera político-administrativa do poder concedente que, para sua viabilização, necessite de vantagens ou subsídios do poder público controlador da referida entidade. § 2º Inclui-se nas vantagens ou subsídios de que trata este artigo qualquer tipo de tratamento tributário diferenciado, ainda que em conseqüência da natureza jurídica da licitante, comprometa a isonomia fiscal que deve prevalecer entre todos os concorrentes. Art. 19 São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: I - ao objeto, à área e ao prazo da concessão; II - ao modo, forma e condições de realização da intervenção urbana; III - aos critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade da intervenção urbana; IV - aos cronogramas físico-financeiros de execução das obras vinculadas à concessão; V - à forma e meios de remuneração da concessionária por meio da exploração da intervenção urbana e de projetos associados; VI - critérios objetivos de avaliação de desempenho;

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VII - à garantia do fiel cumprimento, pela concessionária, das obrigações relativas às obras vinculadas à concessão; VIII - aos direitos, garantias e obrigações do poder concedente e da concessionária, inclusive os relacionados às previsíveis necessidades de futura alteração da intervenção urbana e conseqüente modernização, aperfeiçoamento e ampliação dos equipamentos e demais instalações; IX - à forma de fiscalização das instalações, dos equipamentos, dos métodos e práticas de execução da intervenção urbana, bem como à indicação dos órgãos competentes para exercê-la; X - às penalidades contratuais e administrativas a que se sujeita a concessionária e sua forma de aplicação; XI - aos casos de extinção da concessão urbanística; XII - aos bens reversíveis e àqueles que forem objeto de imediata incorporação ao patrimônio público; XIII - aos critérios para o cálculo e a forma de pagamento de indenizações devidas à concessionária, se for o caso; XIV - às condições para prorrogação do contrato, se couber; XV - à obrigatoriedade, forma e periodicidade da prestação de contas da concessionária ao poder concedente, sem prejuízo do disposto no art. 38 desta lei; XVI - à exigência da publicação de demonstrações financeiras periódicas da concessionária na forma estabelecida pela Prefeitura Municipal; XVII - às obrigações da concessionária para adequada realização do controle social pela sociedade civil, sem prejuízo do disposto no art. 38 desta lei; XVIII - ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais; XIX - outras cláusulas, termos e obrigações peculiares ao objeto da concessão urbanística. Parágrafo Único - O prazo da concessão a ser fixado no edital da licitação, em cada caso, deverá atender ao interesse público e às peculiaridades relacionadas ao valor do investimento. Art. 20 O contrato de concessão urbanística poderá prever o emprego de mecanismos privados para resolução de disputas decorrentes ou relacionadas ao contrato, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei Federal nº 9.307, de 23 de setembro de 1996. Art. 21 Incumbe à concessionária a execução da intervenção urbanística concedida, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade. § 1º Sem prejuízo da responsabilidade a que se refere este artigo, a concessionária poderá contratar com terceiros, sob sua exclusiva responsabilidade, o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares à intervenção urbanística concedida, bem como a implementação de projetos associados nos termos que forem autorizados no edital e no contrato de concessão urbanística.

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§ 2º Os contratos celebrados entre a concessionária e os terceiros a que se refere o parágrafo anterior reger-se-ão pelo direito privado, não se estabelecendo qualquer relação jurídica entre os terceiros e o poder concedente. § 3º A execução das atividades contratadas com terceiros pressupõe o cumprimento do projeto urbanístico específico a ser executado e das leis municipais, estaduais e nacionais sobre a intervenção em qualquer de seus aspectos. Art. 22 A subconcessão pode ser admitida, nos termos previstos no contrato de concessão, desde que expressamente autorizada, por escrito, pelo poder concedente exclusivamente para atender ao interesse de perfeita execução do objeto do contrato de concessão urbanística. § 1º A outorga de subconcessão será sempre precedida de concorrência. § 2º O subconcessionário se sub-rogará em todos os direitos e obrigações da subconcedente dentro dos limites da subconcessão. Art. 23 A transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a imediata caducidade da concessão de pleno direito. § 1º Para fins de obtenção da anuência de que trata o "caput" deste artigo, o pretendente deverá: I - atender às exigências de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à assunção da concessão; e II - comprometer-se a cumprir todas as cláusulas do contrato de concessão urbanística em vigor. § 2º O poder concedente autorizará a assunção do controle da concessionária por seus financiadores para promover sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços nas condições estabelecidas no contrato de concessão. § 3º Na hipótese prevista no § 2º, o poder concedente exigirá dos financiadores que atendam às exigências de regularidade jurídica e fiscal, podendo alterar ou dispensar os demais requisitos previstos no § 1º, inciso I, deste artigo. § 4º A assunção do controle autorizada na forma do § 2º deste artigo não alterará as obrigações da concessionária e de seus controladores ante o poder concedente. Art. 24 Em contratos de financiamento, a concessionária poderá oferecer em garantia os direitos emergentes da concessão, inclusive os derivados das ações de desapropriação, até o limite que não comprometa a operacionalização e a continuidade da intervenção urbana concedida até sua completa realização. Art. 25 Incumbe ao poder concedente: I - regulamentar, no que couber, e fiscalizar a execução e a manutenção da intervenção urbana concedida;

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II - modificar unilateralmente as disposições contratuais para atender a interesse público; III - zelar pela boa qualidade da intervenção urbana e pela efetiva concretização dos interesses públicos a que se destina; IV - declarar de utilidade pública ou de interesse social para o fim de desapropriação, promovendo-a diretamente ou mediante delegação à concessionária, hipótese em que será desta a responsabilidade pelo pagamento integral das indenizações devidas e despesas conexas; V - intervir na concessão urbanística, retomá-la e extinguir a concessão nas hipóteses e nas condições previstas em lei e no contrato. Art. 26 Incumbe à empresa concessionária: I - cumprir e fazer cumprir as disposições legais, regulamentares e contratuais da concessão; II - executar a intervenção urbana de acordo com o projeto urbanístico específico, as disposições da concessão e as normas legais; III - proceder à aquisição e venda ou locação dos imóveis destinados a usos privados, inclusive mediante incorporação imobiliária; IV - exercer o direito de preempção, em nome da Prefeitura Municipal e nos termos da lei, para aquisição de imóveis sujeitos a este direito com base na lei do plano diretor e no Estatuto da Cidade; V - receber em doação de proprietário de imóvel situado no perímetro da concessão urbanística para viabilização financeira do aproveitamento do imóvel nos termos previstos no projeto urbanístico específico da concessão sob o compromisso de, em troca e após a realização das obras, o donatário doar ao doador unidades imobiliárias devidamente urbanizadas ou edificadas como pagamento da alienação do imóvel à empresa concessionária; VI - zelar pela integridade dos bens vinculados à concessão urbanística; VII - manter em dia o inventário e o registro dos bens vinculados à concessão; VIII - promover as desapropriações, judicial ou amigavelmente, na forma autorizada na concessão, efetuando o pagamento das indenizações devidas aos proprietários e possuidores afetados, sob sua inteira e exclusiva responsabilidade, e promovendo os atos registrários eventualmente necessários à realização de incorporações imobiliárias; IX - manter regularmente escriturados os seus livros e registros contábeis e organizados os arquivos, documentos e anotações, de forma a possibilitar a inspeção a qualquer momento pelos encarregados da fiscalização; X - franquear o acesso dos encarregados da fiscalização, a qualquer momento, aos locais das obras, equipamentos e instalações da concessionária; XI - prestar contas periódicas à Prefeitura Municipal e à sociedade civil do cumprimento integral e fiel da concessão. Art. 27 No exercício da fiscalização, o poder concedente terá acesso aos dados relativos à administração, contabilidade, recursos técnicos, econômicos e financeiros da concessionária. § 1º A fiscalização da concessão será efetuada pelo poder concedente ou por entidade conveniada ou contratada e, periodicamente, conforme previsto em norma regulamentar, por comissão composta de representantes do poder concedente, da concessionária, dos proprietários e usuários.

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§ 2º Na hipótese do § 1º deste artigo, a entidade conveniada ou contratada somente será responsável pela colheita e compilação de dados e elementos técnicos, que serão submetidos e analisados pela Administração para o aferimento da regularidade da execução do contrato de concessão. Art. 28 O poder concedente poderá intervir na concessão com o fim de assegurar a sua adequação aos objetivos de interesse público, bem como o fiel cumprimento das normas contratuais, regulamentares e legais pertinentes, observado o devido processo legal. Parágrafo único. A intervenção far-se-á mediante ato do poder concedente que conterá a designação do interventor, o prazo da intervenção, os objetivos e limites da medida. Art. 29 Declarada a intervenção, o poder concedente deverá, no prazo de trinta dias, instaurar procedimento para investigar e comprovar as causas determinantes da medida e apurar responsabilidades, assegurado o exercício do direito de defesa à concessionária. § 1º Se ficar comprovado que a intervenção não observou os pressupostos legais será declarada sua nulidade, devendo o objeto da concessão urbanística ser imediatamente devolvido à concessionária, sem prejuízo de seu direito à indenização. § 2º O procedimento a que se refere o "caput" deste artigo deverá ser concluído no prazo de até cento e oitenta dias, sob pena de considerar-se inválida a intervenção. Art. 30 Cessada a intervenção, se não for extinta a concessão, a administração da intervenção urbana será devolvida à concessionária, precedida da prestação de contas pelo interventor que responderá pelos atos praticados durante a sua gestão. Art. 31 Extingue-se a concessão por: I - advento do termo final do contrato; II - encampação; III - caducidade; IV - rescisão; V - anulação; VI - falência ou extinção da empresa concessionária. § 1º Extinta a concessão, retornarão ao poder concedente todos os bens reversíveis, direitos e privilégios transferidos à concessionária conforme previsto no edital e estabelecido no contrato. § 2º Extinta a concessão, haverá a imediata assunção da intervenção urbana pelo poder concedente, procedendo-se aos levantamentos, avaliações e liquidações necessárias. § 3º A assunção da intervenção urbana autoriza a ocupação das instalações e a utilização, pelo poder concedente, de todos os bens reversíveis.

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§ 4º Nos casos previstos nos incisos I e II do "caput" deste artigo, o poder concedente, antecipando-se à extinção da concessão, procederá aos levantamentos e avaliações necessários à determinação dos montantes da indenização porventura devida à concessionária nas hipóteses de reversão ou de encampação. § 5º Nos casos previstos nos incisos II a VI deste artigo, fica o poder concedente autorizado a alienar os imóveis adquiridos pelo concessionário em cumprimento das obrigações constantes do projeto urbanístico específico, diretamente ou por meio da contratação de nova concessão urbanística, hipótese em que tais bens serão alienados ao concessionário, para a devida destinação. Art. 32 A reversão dos bens no advento do termo final do contrato far-se-á com a indenização das parcelas dos investimentos vinculados a bens reversíveis que ainda não tenham sido amortizados ou depreciados que tenham sido realizados para que a intervenção urbana concedida atenda plenamente aos fins de utilidade e interesse públicos que constituem sua razão de ser. Art. 33 Considera-se encampação a retomada da concessão pelo poder concedente durante o prazo da concessão, por motivo de interesse público, mediante lei autorizativa específica e após prévio pagamento da indenização na forma do artigo anterior. Art. 34 A inexecução total ou parcial do contrato de concessão acarretará, a critério do poder concedente, a declaração de caducidade da concessão ou a aplicação das sanções contratuais, respeitadas as demais disposições desta lei. § 1º A caducidade da concessão pode ser declarada pelo poder concedente quando: I - a intervenção urbana estiver sendo realizada de forma inadequada ou deficiente, tendo por base as leis municipais, as normas, critérios, indicadores e parâmetros definidores de sua boa qualidade, sem que as irregularidades sejam sanadas em tempo hábil ou sem justificativa, nos termos do edital; II - a concessionária descumprir cláusulas contratuais ou disposições legais ou regulamentares concernentes à concessão; III - a concessionária paralisar a intervenção urbana, total ou parcialmente, ou concorrer para tanto, ressalvadas as hipóteses decorrentes de caso fortuito ou força maior; IV - a concessionária perder as condições econômicas, técnicas ou operacionais para a manutenção e atualização da concessão; V - a concessionária não cumprir as penalidades impostas por infrações, nos devidos prazos; VI - a concessionária não atender a intimação do poder concedente no sentido de corrigir as irregularidades; VII - a concessionária for condenada em sentença transitada em julgado por sonegação de tributos e contribuições. § 2º A declaração da caducidade da concessão deverá ser precedida da verificação da inadimplência administrativa em procedimento sumário, assegurado o direito de defesa.

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§ 3º Não será instaurado procedimento de inadimplência antes de comunicados à concessionária, detalhadamente, por escrito, os descumprimentos contratuais específicos referidos no § 1º deste artigo, dando-lhe um prazo para corrigir as falhas e transgressões apontadas e para o enquadramento nos termos contratuais. § 4º Instaurado o procedimento e comprovada a inadimplência, a caducidade será declarada por ato do poder concedente, independentemente de indenização prévia, calculada no decurso do processo. § 5º A indenização de que trata o § 4º deste artigo será devida na forma aplicável à reversão de bens e do contrato, descontado o valor das multas contratuais e dos danos causados pela concessionária. § 6º Declarada a caducidade, não resultará para o poder concedente qualquer espécie de responsabilidade em relação aos encargos, ônus, obrigações ou compromissos com terceiros ou com empregados da concessionária. Art. 35 O contrato da concessão pode ser rescindido por iniciativa da concessionária, no caso de descumprimento das normas contratuais pelo poder concedente, mediante ação judicial especialmente intentada para esse fim. Parágrafo Único - Na hipótese prevista no "caput" deste artigo, a intervenção urbana concedida não poderá ser interrompida ou paralisada até o efetivo trânsito em julgado da sentença judicial. Art. 36 A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano - SMDU coordenará as atividades de planejamento da concessão urbanística, observadas a compatibilidade com o Plano Diretor Estratégico e a articulação com outros planos urbanísticos já existentes, ficando incumbida da elaboração da proposta de lei específica, dos estudos e providências de responsabilidade do poder concedente e do projeto urbanístico específico, previstos nos arts. 5º, 7º e 8º desta lei, solicitando a colaboração de outros órgãos municipais, de acordo com suas competências específicas. Art. 37 A Secretaria Municipal de Infra-Estrutura Urbana e Obras - SIURB fica incumbida da outorga da concessão urbanística nos termos desta lei e da lei específica da concessão, observadas as disposições, objetivos, diretrizes e prioridades estabelecidos no Plano Diretor Estratégico, bem como as demais leis municipais aplicáveis, cabendo-lhe a abertura da licitação, a contratação, supervisão e fiscalização da concessão. Art. 38 Para a fiscalização de cada concessão urbanística, o Executivo constituirá um Conselho Gestor, de formação paritária, com representantes da Municipalidade e da sociedade civil, de forma a propiciar a participação dos cidadãos interessados, tais como moradores, proprietários, usuários e empreendedores, cabendo ao Conselho Gestor as providências necessárias para fiscalização, verificação e acompanhamento do cumprimento das diretrizes da intervenção urbana e do respectivo contrato de concessão.

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§ 1º O Conselho Gestor a que se refere o "caput" deste artigo será instituído após a celebração do contrato de concessão urbanística. § 2º Dos membros do Conselho, 50% (cinqüenta por cento) serão representantes do Executivo e 50% (cinqüenta por cento) serão representantes da sociedade civil, indicados no Conselho Municipal de Política Urbana - CMPU. § 3º O Executivo indicará a Presidência do Conselho. § 4º Será garantida a publicidade dos atos do Conselho Gestor, inclusive por meio da publicação das atas das reuniões ordinárias e extraordinárias no Diário Oficial da Cidade e no site oficial da Prefeitura Municipal de São Paulo. Art. 39 Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação. PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 7 de maio de 2009, 456º da fundação de São Paulo. GILBERTO KASSAB, PREFEITO CLOVIS DE BARROS CARVALHO, Secretário do Governo Municipal

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ANEXO 2 – LEI Nº 14.918 DE 2009. AUTORIZA O EXECUTIVO A APLICAR A CONCESSÃO URBANÍSTICA NA ÁREA DA NOVA LUZ186 GILBERTO KASSAB, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 22 de abril de 2009, decretou e eu promulgo a seguinte lei: Art. 1º Fica o Executivo Municipal autorizado a aplicar a concessão urbanística na área delimitada pelo perímetro da Nova Luz, na forma e atendidas as normas previstas na legislação municipal específica. Parágrafo Único - Para os fins desta lei, considera-se Nova Luz o conjunto das intervenções urbanísticas necessárias para a execução de projeto urbanístico específico no perímetro definido pelas Avenidas Casper Líbero, Ipiranga, São João, Duque de Caxias e Rua Mauá, no Distrito da República. Art. 2º Constituem diretrizes específicas da concessão urbanística autorizada pela presente lei: I - preservação e recuperação do patrimônio histórico, cultural e artístico existente no local; II - equilíbrio entre habitação e atividade econômica, de forma a propiciar a sustentabilidade da intervenção; III - implantação de unidades habitacionais destinadas à população de baixa renda, de acordo com as normas urbanísticas aplicáveis às Zonas Especiais de Interesse Social; IV - incentivo à manutenção e expansão da atividade econômica instalada, especialmente nos setores ligados à tecnologia; V - execução planejada e progressiva do projeto urbanístico específico, de forma a evitar, durante o período das intervenções, o agravamento de problemas sociais e minimizar os impactos transitórios negativos delas decorrentes. § 1º As diretrizes específicas ora fixadas orientarão a elaboração do projeto urbanístico específico da concessão urbanística e a fiscalização, por parte do poder concedente, da execução do contrato de concessão urbanística. § 2º De forma a viabilizar as diretrizes específicas ora estabelecidas, o Executivo Municipal efetuará o cadastro dos moradores e das atividades econômicas instaladas no perímetro da concessão urbanística, identificando, especialmente, as condições das moradias e a presença de empregos e geração de tributos por parte dos estabelecimentos. § 3º Caberá exclusivamente ao projeto urbanístico específico definir, dentre os imóveis situados no perímetro da concessão urbanística, quais deverão ser objeto de desapropriação, demolição, reforma ou construção, levando em conta os seguintes aspectos: I - restrições decorrentes de tombamento; II - custos decorrentes da intervenção sobre a edificação;

186

Fonte: disponível em: <http://www.LEISMUNICIPAIS.com.br>. Acesso em: jun. 2011.

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III - viabilidade econômica da intervenção; IV - atendimento à função social da propriedade, especialmente no que se refere à qualidade da edificação e do uso instalado, inclusive em relação ao atendimento das posturas municipais; V - compatibilidade do imóvel com o entorno previsto no projeto urbanístico específico. § 4º Preferentemente à desapropriação, o concessionário deverá efetuar entendimentos com o proprietário do imóvel, para eventual composição amigável, na qual poderão ser empregados os institutos admissíveis em direito, inclusive o consórcio imobiliário previsto no art. 46 da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001. § 5º Nos termos a serem definidos pelo projeto urbanístico específico, tanto quanto possível, a implantação progressiva da concessão urbanística dará prioridade, no tempo, à intervenção sobre imóveis desocupados, aos que apresentem ocupação menos consolidada e aos imóveis que, de alguma forma, causem prejuízos à adequada fruição urbana. § 6º Na implantação progressiva da concessão urbanística, quando necessária a intervenção sobre imóvel onde haja atividade econômica cadastrada, caso não seja oferecido ao proprietário do estabelecimento, para locação ou venda, por valor de mercado, imóvel razoavelmente compatível para a transferência provisória ou definitiva da atividade instalada, o concessionário ficará inteiramente responsável pela indenização relativa à desapropriação do respectivo fundo de comércio. Art. 3º Aplica-se às áreas do perímetro do Projeto Nova Luz, no que couber, a Lei nº 12.349, de 6 de junho de 1997 - Operação Urbana Centro, especialmente os seus arts. 3º, 4º, 6º, 7º e 9º. § 1º Poderão ser adotados, no perímetro do Projeto Nova Luz, os parâmetros urbanísticos decorrentes da adesão à Operação Urbana Centro, nos termos da Lei nº 12.349, de 1997, ficando facultado ao Poder Executivo considerar a respectiva contrapartida financeira como compreendida nas obras realizadas em função do projeto ou no eventual valor pago ao poder concedente pela outorga da concessão urbanística. § 2º Não se aplicam ao Projeto Nova Luz o inciso I do "caput" do art. 4º e o § 1º do art. 6º da Lei nº 12.349, de 1997. Art. 4º Fica o Executivo Municipal obrigado a constituir o Conselho Gestor da Nova Luz, de formação paritária, com representantes da Municipalidade e da sociedade civil, de forma a propiciar a participação dos cidadãos interessados, tais como moradores, proprietários, usuários e empreendedores, cabendo ao Conselho Gestor as providências necessárias para fiscalização, verificação e acompanhamento do cumprimento das diretrizes gerais e específicas da intervenção urbana integrantes do projeto urbanístico específico e do respectivo contrato de concessão urbanística. § 1º O Conselho Gestor a que se refere o "caput" deste artigo será instituído após a celebração do contrato de concessão urbanística.

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§ 2º Dos membros do Conselho, 50% (cinqüenta por cento) serão representantes do Executivo Municipal e 50% (cinqüenta por cento) serão representantes da sociedade civil, indicados no Conselho Municipal de Política Urbana - CMPU. § 3º O Executivo Municipal indicará a Presidência do Conselho Gestor. § 4º Será garantida a publicidade dos atos do Conselho Gestor, inclusive por meio da publicação das atas das reuniões ordinárias e extraordinárias no Diário Oficial da Cidade e no site oficial da Prefeitura Municipal de São Paulo. Art. 5º Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação. PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 7 de maio de 2009, 456º da fundação de São Paulo. GILBERTO KASSAB, PREFEITO CLOVIS DE BARROS CARVALHO, Secretário do Governo Municipal

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ANEXO 3 – PLACAR DAS VOTAÇÕES DOS PROJETOS DE LEI Nº 87 E Nº 158 DE 2009 (SOMBREADO OS VEREADORES COM PEDIDO DE CASSAÇÃO DE MANDATO EXPEDIDO PELO TER-SP)187

Vereador (Partido)

PL nº 87 25/03

PL nº 158 1/04

PL nº 87 22/04

PL nº 158 22/04

Doações AIB em R$

Abou Anni (PV) Sim Sim Sim Sim 100 mil

Adilson Amadeu (PTB) Sim Sim Sim Sim 200 mil

Adolfo Quintas (PSDB) Sim Sim Sim Sim 100 mil

Agnaldo Timóteo (PR) Sim Sim Sim Sim -

Alfredinho (PT) Abstenção Ausente Não Não -

Antônio Carlos Rodrigues (PR)

Sim Sim Sim Sim 240 mil

Arselino Tatoo (PT) Abstenção Ausente Não Não 10 mil

Atílio Francisco (PRB) Sim Sim Sim Sim -

Aurélio Miguel (PR) Sim Sim Sim Sim -

Carlos Alberto Bezerra Júnior (PSDB)

Sim Sim Sim Sim 100 mil

Carlos Apolinário (DEM) Sim Sim Sim Sim 200 mil

Celso Jatene (PTB) Sim Sim Sim Sim -

Chico Macena (PT) Abstenção Não Não Não -

Claudinho (PSDB) Sim Sim Sim Sim 100 mil

Claudio Fonseca (PPS) Sim Sim Sim Sim -

Claudio Prado (PDT) Sim Sim Sim Sim -

Dalton Silvano (PSDB) Sim Sim Sim Sim 100 mil

Domingos Dissei (DEM) Ausente Sim Sim Sim 145 mil

Donato (PT) Abstenção Ausente Não Não -

Eliseu Gabriel (PSB) Sim Sim Sim Sim 200 mil

Floriano Pesaro (PSDB) Sim Sim Sim Sim 40 mil

Francisco Chagas (PT) Abstenção Ausente Não Não -

Gabriel Chalita (PSDB) Sim Sim Sim Sim -

Gilson Barreto (PSDB) Sim Sim Sim Sim 100 mil

Goulart (PMDB) Sim Sim Sim Sim 50 mil

Ítalo Cardoso (PT) Abstenção Ausente Não Não 30 mil

Jamil Murad (PCdoB) Abstenção Não Sim Sim -

João Antonio (PT) Abstenção Não Não Não -

Jooji Hato (PMDB) Sim Sim Sim Sim 100 mil

José Américo (PT) Abstenção Não Não Não 50 mi

José Ferreira – Zelão (PT) Abstenção Não Não Não -

José Olímpio (PP) Ausente Sim Ausente Ausente -

José Pólice Neto (PSDB) Sim Sim Sim Sim 270 mil

Juliana Cardoso (PT) Abstenção Não Não Não 40 mil

Juscelino Gardelha (PSDB)

Sim Sim Sim Sim -

Mara Gabrilli (PSDB) Ausente Ausente Sim Sim 40 mil

Marcelo Aguiar (PSC) Sim Sim Sim Sim -

Marco Aurélio Cunha (DEM)

Sim Sim Sim Sim -

Marta Costa (DEM) Sim Sim Ausente Ausente 180 mil

Milton Ferreira (PPS) Sim Sim Sim Sim -

Milton Leite (DEM) Sim Sim Sim Sim -

Natalini (PSDB) Sim Sim Sim Sim 100 mil

Netinho de Paula (PCdoB) Abstenção Ausente Sim Sim -

Noemi Nonato (PSB) Sim Sim Sim Sim 30 mil

187

Fonte: SOUZA, 2011, p. 94-95.

Page 228: DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL - tede2.pucsp.br Helena... · processo de revitalização do Projeto Nova Luz na cidade de São Paulo, a partir da ... do Estado de São Paulo ... à

227

Paulo Frange (PTB) Sim Sim Sim Sim 200 mil

Penna (PV) Sim Ausente Sim Sim -

Quito Formiga (PR) Sim Sim Sim Sim -

Ricardo Teixeira (PSDB) Sim Sim Sim Sim 150 mil

Roberto Tripoli (PV) Sim Sim Sim Sim -

Sandra Tadeu (DEM) Sim Sim Sim Sim 30 mil

Senival Moura (PT) Ausente Ausente Ausente Ausente -

Souza Santos (PSDB) Ausente Sim Sim Sim -

Toninho Paiva (PR) Sim Sim Sim Sim 50 mil

Ushitaro Kamia (DEM) Sim Sim Sim Sim 130 mil

Wadih Mutran (PP) Sim Sim Sim Sim 50 mil