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Educação na Diversidade e Cidadania MÓDULO II Rede de Educação para Diversidade - REDE

ducacao Na Diversidade e Cidadania LIVRO PARTE 1

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  • Educao na Diversidadee Cidadania

    MDULO IIRede de Educao para

    Diversidade - REDE

  • Ministro da EducaoFernando Haddad

    Secretrio ExecutivoJos Henrique Paim Fernandes

    Secretrio de Educao a DistnciaCarlos Eduardo Bielschowsky

    Coordenador Geral da Universidade Aberta do BrasilCelso Jos da Costa

    Secretrio de Educao Continuada Alfabetizao e DiversidadeAndr Lazaro

    Governador do Estado de Minas GeraisAcio Neves da Cunha

    Vice-Governador do Estado de Minas GeraisAntnio Augusto Junho Anastasia

    Secretrio de Estado de Cincia, Tecnologia e Ensino SuperiorAlberto Duque Portugal

    Reitor da Universidade Estadual de Montes Claros - UnimontesPaulo Csar Gonalves de Almeida

    Vice-Reitor da UnimontesJoo dos Reis Canela

    Pr-Reitora de ExtensoMarina Ribeiro Queirz

    Coordenadora do CursoShirley Patrcia Nogueira de Castro e Almeida

    Coordenadora de TutoriaMaria Cristina Freire Barbosa

  • EDUCAO NA DIVERSIDADE E CIDADANIA - MDULO II

    Projeto GrficoAlcino Franco de Moura Jnior

    Andria Santos Dias

    EditoraoAndria Santos Dias

    Clsio Robert Almeida CaldeiraDbora Trres Corra Lafet de Almeida

    Diego Wander Pereira NobreJssica Luiza de Albuquerque

    Impresso, Montagem e AcabamentoDidtica Editora do Brasil Ltda.

    RevisoMaria Leda Clementino Marques

    Osmar Oliva PradoWanessa Pereira Froes Quadros

  • INTRODUO CONCEITUAL

    PARA A EDUCAO NA DIVERSIDADE

    E CIDADANIA

  • AUTORAS

    Maria das Graas Mota Mouro

    Doutoranda pela Universidade de Trs-os-Montes e Alto Douro - UTAD de Portugal, mestre em Educao pelo Instituto Superior Pedaggico Enrique Jos Varona de Cuba, graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes. Atualmente professora do Departamento de Educao, membro do Corpo Editorial da Revista Educao Significante e Coordenadora do Grupo de Pesquisas na Educao, Diversidade e Sade - GEPEDS da Unimontes.

    Renata Cordeiro Maciel

    Mestre em Educao pela Universidade Federal de Juiz de Fora, especializao em Psicopedagogia pela Faculdades Unidas do Norte de Minas, graduada em Pedagogia pela Unimontes. Atualmente professora do Departamento de Educao da Unimontes e integrante do GEPEDS (grupo de estudos e pesquisa em educao, diversidade e sade).

    Angela Ernestina Cardoso de Brito

    Possui graduao em Servio Social pela Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho -UNESP(1999) e mestrado em Metodologia de Educao pela Universidade Federal de So Carlos -UFSCAR (2003). Atualmente professora do Curso de Servio Social da Universidade Estadual de Montes Claros-UNIMONTES. Tem experincia na rea de presdio, famlia e Educao, atuando principalmente nos seguintes temas: escola, relaes raciais, racismo, famlia negra e inter-racial, educao, cultura, discriminao, racismo, processos societrios, educao informal e sociabilidade

    Maria Nadurce da Silva

    Graduada em Pedagogia pela Unimontes. Possui mestrado em Educao pela Universidade Catlica de Braslia (2004). Possui ps-graduao Lato sensu em Sociologia pela UFMG- Universidade Federal de Minas Gerais, 1994. Atualmente professor da Universidade Estadual de Montes Claros, professor colaborador do Instituto Superior de Educao de Montes Claros, nos cursos de Ps-graduao Lato sensu. professora adjunta da Universidade Presidente Antnio Carlos, Tem experincia na rea de Educao, atuando principalmente nos seguintes temas: prtica pedaggica, ensino-aprendizagem, Histria da Educao, violncia escolar, polticas pblicas da educao, gesto escolar, currculo, orientao educacional, avaliao do ensino entre outras ligadas educao e ao processo de ensino-aprendizagem.

  • SUMRIO

    Apresentao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 07

    Unidade I: Educao como direito fundamental direitos humanos e cidadania . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 09

    1.1 Primeiras palavras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 09

    1.2 Problematizando o tema . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

    1.3 Resumo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

    1.4 Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

    1.5 Atividades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

    Unidade II: Educao e diversidade: a importncia de educar para a diversidade aos diferentes segmentos populacionais . . . . . . . . . . . . . . 36

    2.1 Primeiras palavras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36

    2.2 Educar para respeitar as diferenas: o papel dos educadores. . . 39

    2.3 Estratgias de luta e enfrentamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

    2.4 O papel das universidades e da sociedade . . . . . . . . . . . . . . . . 42

    2.5 Resumo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

    2.6 Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47

    2.7 Atividades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51

    Unidade III: Educao na diversidade e os temas da diversidade/

    preconceito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

    3.1 Primeiras Palavras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

    3.2 Diversidade e Preconceito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57

    3.3 A Formao de uma identidade coletiva homossexual . . . . . . . 68

    3.4 Tolerncia e intolerncia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70

    3.5 O papel do professor frente diversidade cultural . . . . . . . . . . 72

    3.6 Resumo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75

    3.7 Referncias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77

    3.8 Livros sugeridos para debate . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79

    3.9 Atividades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81

  • 07

    APRESENTAO

    Caro(a) Cursista(a),

    Neste mdulo de 48h, abordaremos temticas que tratam da Introduo Conceitual da Educao na Diversidade e Cidadania.

    As temticas apresentadas abordam questes e conceitos relacionados a:

    ?Educao como direito fundamental Direitos Humanos e Cidadania

    ?Educao na Diversidade: A importncia de educar para a diversidade aos diferentes segmentos populacionais

    ?Educao na Diversidade e os temas da diversidade/preconceito

    Desejamos que as discusses e reflexes aqui desencadeadas contribuam para a formao de educadores e educandos comprometidos com o exerccio pleno da cidadania, com os direitos humanos, em especial, o direito educao na diversidade.

    Portanto, a Educao que se pretende para nosso milnio deve responder aos anseios de um mundo em constante transformao, que requer dos sujeitos o entendimento de si mesmos, a compreenso do outro e a convivncia num mundo de diferentes.

    Bons estudos!

    A Coordenao

  • 09

    11.1 PRIMEIRAS PALAVRAS

    Discutiremos aqui a temtica da educao como direito fundamental, para isso, iremos partir dos seguintes questionamentos: O que educao? De qual educao estamos falando? Qual a educao necessria na sociedade contempornea ou do conhecimento? Como a legislao trata a educao enquanto direito? A legislao brasileira assegura a educao como direito fundamental? Essa legislao respeita os direitos humanos? Prev tambm a formao do sujeito para exercer a sua cidadania?

    A partir desses questionamentos, abordaremos a questo da educao como direito fundamental, considerando os direitos humanos e a formao para o exerccio pleno da cidadania. Assim pretendemos que ao final dessa unidade voc seja capaz de:

    ?conceituar educao e educao escolar;

    ?conhecer a legislao educacional, no que diz respeito educao como direito fundamental;

    ?conhecer a importncia dos direitos humanos para a educao;

    ?definir os elementos necessrios, de acordo com os direitos humanos, para a garantia de uma formao plena para a cidadania do aluno.

    UNIDADE 1EDUCAO COMO DIREITO FUNDAMENTAL/DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA

    Figura 1: Educao no sc. XXIFonte: rossetti.sites.uol.com.br/MontagemFinal.jpg

  • 1.1.1 Iniciando a conversa

    Abrindo a nossa conversa, abordaremos alguns conceitos de educao. Deve-se entender a educao, como um conceito complexo que se refere ao desenvolvimento humano ao longo de sua vida, desde o nascimento at a morte. Visto que, a educao aborda as mltiplas formas de organizao social que permitem o desenvolvimento e as transformaes da pessoa para que atinja graus mais elevados em sua realizao pessoal e social (TEIXEIRA, 2005).

    Para o filsofo Kant (1993, p. 69), "o homem a nica criatura que precisa ser educada". Essa fala nos permite compreender a educao como princpio fundante do ser humano, pois, este necessita desta para se constituir. Assim, deve ser entendida como um ato intencional. Isto nos mostra a importncia do ato educativo para a formao dos

    indivduos, no sentido de assegurar s n o v a s g e r a e s o a c e s s o a o c o n h e c i m e n t o h i s t o r i c a m e n t e acumulado.

    A educao base constitutiva na formao do ser humano, bem como na defesa, e na constituio dos outros direitos econmicos, sociais e culturais.

    Isso quer dizer, que o sujeito que passa por processos educativos, em particular pelo sistema escolar, normalmente um cidado que tem melhores condies de realizar e defender os outros direitos humanos (sade, habitao, meio ambiente, participao poltica, etc).

    Estamos discutindo aqui educao escolar, porm a educao deve ser pensada num sistema geral, uma vez que, ela ocorre em ambientes diversos, tais como: na famlia, na comunidade, na igreja, no trabalho, etc. Devemos entender que os processos educativos permeiam a vida de todas as pessoas, independente do contexto, credo, etnia, condies socioeconmicas, e culturais.

    A escola sendo parte integrante deste processo educativo, onde as aprendizagens bsicas so desenvolvidas, conhecida como educao formal. Na escola, enquanto espao de aprendizagem, se transmite conhecimentos essenciais, comportamentos, atitudes e habilidades. So ensinados e aprendidos, na tentativa de promover a integrao dos sujeitos na sociedade.

    Figura 2: Immanuel Kant (1724-1804)Fonte: 1.bp.blogspot.com/_uvZj0Wg6qeY/SMVGdrhXGfI/AAAAAAAAAc4/G1AsnRmr-XE/s400/kant.jpg

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    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

    Formao humana: A condio humana em parte espontaneidade natural, mas tambm deliberao artificial: chega a ser totalmente humano seja humano bom ou humano mau sempre uma arte. (SAVATER, 1998, p. 31).

    Educao escolar/formal: caracteriza-se por ser algo planejado e sistematizado, ocorre dentro da instituio escolar. A educao escolar/formal reflete sempre a sociedade dominante e, por esse motivo, a escola uma instituio reprodutora, pois representa a classe que a organiza e a mantm.

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    Introduo Conceitual para a Educao na Diversidade e Cidadania UAB/Unimontes

    Nas sociedades modernas, o conhecimento escolar quase uma condio para sobrevivncia e bem estar social.

    Dessa forma, uma das chaves de acesso ao sc. XXI sem dvida, a educao, de maneira geral, sustentada pela escola, mas concebida em uma nova roupagem.

    Assim, ela dever responder aos anseios de mundo em permanente transformao, que vai ou est a exigir dos sujeitos uma maior compreenso do outro e do mundo. A UNESCO define que condio indispensvel para enfrentar os desafios deste sculo. A educao ao longo de toda a vida baseia-se [portanto] em quatro pilares.

    Aprender a conhecer, combinando uma cultura geral, suficientemente vasta, com a possibilidade de trabalhar em profundidade um pequeno nmero de matrias. O que tambm significa: aprender a aprender, para beneficiar-se das oportunidades oferecidas pela educao ao longo de toda vida.

    Aprender a fazer, a fim de adquirir no somente uma qualificao profissional, mas, de uma maneira mais ampla, competncias que tornem a pessoa apta a enfrentar numerosas situaes e a trabalhar em equipe. Mas, tambm, aprender a fazer no mbito das diversas experincias sociais ou de trabalho que se oferecem aos jovens e adolescentes, quer espontaneamente, fruto do contexto local ou nacional, quer formalmente, graas ao desenvolvimento do ensino alternado com o trabalho.

    Aprender a conviver/viver juntos desenvolvendo a compreenso do outro e a percepo das interdependncias - realizar projetos comuns e preparar-se para gerir conflitos - no respeito pelos valores do pluralismo, da compreenso mtua e da paz.

    Aprender a ser, para melhor desenvolver sua personalidade e est altura de agir com cada vez maior capacidade de a u t o n o m i a , d e d i s c e r n i m e n t o e d e responsabilidade pessoal. Para isso, no negligencia na educao, nenhuma das potencialidades de cada i nd i v duo : memr i a , raciocnio, sentido esttico, capacidades f s icas e aptido para comunicar-se.

    Figura 3: Os pilares da educao, segundo a UNESCO.Fonte: ava.ead.ftc.br/conteudo/circuito1/Circuito_Novo/Periodo_01/materias_comuns/03-abordagens_sociopoliticas_da_educacao/bloco2/tema4/imagens/T04P02c.jpg

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    Para Delors (2004) deve-se, assinalar novos objetivos educao e, portanto,

    mudar a idia que se tem da sua utilidade. Uma nova concepo ampliada de educao devia fazer com que todos pudessem descobrir, reanimar e fortalecer o seu potencial criativo - revelar o tesouro escondido em cada um de ns. Isto supe que se ultrapasse a viso puramente instrumental da educao, considerada como a via obrigatria para obter certos resultados (saber fazer, aquisio de capacidades diversas, fins de ordens econmicas), e se passe a consider-la em toda sua plenitude: realizao da pessoa que, na sua totalidade aprende a ser (DELORS, 2004, s/p.).

    Nesse sentido, Delors (2004, p. 19), entende que, um dos pilares mais relevante da educao defendidos pela UNESCO aprender viver, pois, trata-se de aprender a viver juntos desenvolvendo conhecimento acerca dos outros, da sua histria, tradies e espiritualidade. O autor tambm afirma:

    Com o desenvolvimento da sociedade do conhecimento em que se multiplicam a possibilidades de acesso a dados e a fatos, a educao dever permitir que todos possam recolher, selecionar, ordenar, gerir e utilizar as mesmas informaes (DELORS, 2004, p. 20-21).

    Essa citao nos permite concluir que, a educao deve adaptar-se frequentemente dinmica das mudanas e transformaes da sociedade, entretanto, no deve deixar de transmitir as aquisies, bem como os saberes bsicos oriundos da experincia humana.

    1.2 PROBLEMATIZANDO O TEMA

    A educao, direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser promovida e incentivada com a colaborao da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho.

    Constituio Federal de 1988, artigo 205.

    A educao um direito de todos, no entanto, no Brasil, este direito apenas foi reconhecido na Constituio Federal de 1988, ou seja, anteriormente o Estado no tinha obrigao formal de garantir a educao de qualidade a todos os brasileiros.

    1.2.1 A Educao como direito fundamental

    Inicialmente, fundamental que se esclarea quais as implicaes prticas da enunciao em nossa Constituio, do direito educao como um direito fundamental de natureza social.

    Apesar da idia, de que a educao deve ser tratada como uma prioridade por nossos governantes, a realidade demonstra que a educao

    UNESCO: Organizao das Naes Unidas para a educao, a cincia e a cultura.

    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

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    escolar de qualidade ainda uma utopia, sobretudo, para os grupos historicamente marginalizados ou vulnerveis de nossa sociedade.

    A Constituio Federal de 1988 prev em seu artigo 6 o direito educao, como um direito fundamental de natureza social, vem detalhado no Ttulo VIII, Da Ordem Social, principalmente, nos artigos 205 a 214, dispositivos nos quais se encontram explcitos aspectos que envolvem a efetivao desse direito, tais como:

    [...] os princpios e objetivos que o informam, os deveres de cada ente da Federao (Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios) para com a garantia desse direito, a estrutura educacional brasileira (dividida em diversos nveis e modalidades de ensino), alm da previso de um sistema prprio de financiamento, que conta com a vinculao constitucional de receitas (DUARTE, 2007, p. 692).

    Para a autora, esses artigos tratam de parmetros que devem orientar a atuao do legislador e do administrador pblico, alm de critrios que o Judicirio deve adotar quando chamado a julgar questes que envolvam a implementao deste direito.

    Segundo Cury (2002, p. 254), Seja por razes polticas, seja por razes ligadas ao indivduo, a educao era vista como um canal de acesso aos bens sociais e luta poltica e, como tal, um caminho tambm de emancipao do indivduo diante da ignorncia. Dado este leque de campos atingidos pela educao, ela foi considerada, segundo o ponto de vista dos diferentes grupos sociais ora como sntese dos trs direitos assinalados os civis, os polticos e os sociais, ora como fazendo parte de cada qual dos trs.

    Entendemos que, os direitos fundamentais trazem consigo a conscincia de que os homens so sujeitos de direitos, dessa forma, digno de condies mnimas de existncia capazes de assegurar a sua dignidade. Nesta abordagem, o direito fundamental educao deve ser assegurado a todas as crianas e adolescentes, de forma indiscriminada e universal.

    Alm disso, h outros documentos jurdicos que versam a respeito do direito educao, dentre os quais destacamos: a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (Lei n. 9.394/96), o Estatuto da Criana e do Adolescente (Lei n. 8.069/90), o Plano Nacional de Educao (Lei n. 10.172/2001), entre outros.

    Segundo a Lei de Diretrizes e Bases, no seu Art. 2 A educao, dever da famlia e do Estado, inspirada nos princpios da liberdade e nos ideais da solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho.

    A no oferta de ensino regular gratuito e obrigatrio implicar o reconhecimento de responsabilidade da autoridade negligente, assim definido no artigo 208, pargrafo 2, da Constituio Federal. Em uma entrevista dada ao Portal e-educador, o jurista Dalmo Dallari afirma que j

    Introduo Conceitual para a Educao na Diversidade e Cidadania UAB/Unimontes

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    cresceu muito no Brasil a conscincia da necessidade de educao para os direitos humanos.

    Para o jurista, j existe hoje no Brasil um ambiente propcio a essa ampliao, estando bastante enfraquecida a resistncia dos grupos sociais privilegiados que se opem aos direitos humanos por medo da perda de seus privilgios.

    Ao acolher os princpios de um Estado social e democrtico de direito pela Constituio brasileira estabelece-se para a concretizao desse modelo, no apenas o respeito aos direitos individuais: liberdade de expresso, direito de voto, direito de ir e vir; mas tambm a realizao dos direitos sociais: educao, trabalho, sade, entre outros.

    Assim, no Estado social de direito, a elaborao e a implementao de polticas pblicas que constituem o grande eixo orientador da atividade estatal, pressupondo a reorganizao dos poderes em torno da funo planejadora, visando coordenao de suas funes para a criao de sistemas pblicos de sade, educao, previdncia social, etc.

    A Educao um direito fundamental e, deve ser assegurado por um sistema de educao pblica, que garanta a igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativos de todos e em todos os nveis de ensino.

    1.2.2 Direitos humanos e cidadania

    Antes de tudo, devemos conceituar Direitos Humanos, falar de seus fundamentos e da importncia de fundament-lo. Ento, entendemos os Direitos Humanos, como aqueles direitos comuns a todos os seres humanos, sem distino de etnia, nacionalidade, sexo, classe social, religio, ideologia,

    Figura 4: Violncia na escolaFonte: mcebraga.files.wordpress.com/2008/04/escola03.jpg

    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

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    nvel de instruo, orientao sexual e julgamento moral, ou seja, so os direitos fundamentais da pessoa humana.

    Esses direitos so fundamentais porque, por eles serem indispensveis pessoa humana, uma vez que, ela no capaz de existir, assim como de se desenvolver e participar plenamente da vida. Fundamentos estes que representam as mnimas condies necessrias para que uma pessoa possa ter acesso a uma vida com dignidade (DALLARI, 2004).

    A dignidade humana deve ser entendida como algo que caracteriza a essncia da humanidade do homem. De acordo com Kant (2004), a dignidade o valor de que se reveste tudo aquilo que no tem preo, portanto, uma qualidade prpria aos seres humanos.

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    Ideologia: conjunto de convices filosficas,

    sociais, polticas etc.de um indivduo ou grupo de

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    Fundamentos: Conjunto de princpios a partir dos quais se pode fundar ou deduzir

    um sistema, um agrupamento de conhecimentos.

    Figura 5: Direitos humanos indispensveis pessoa humanaFonte: www.sescsp.org.br/sesc/revistas_sesc/sesc/images_2006/direitos_humanos_2.jpg

    Figura 6: Os Retirantes de Cndido PortinariFonte: osubversivo.files.wordpress.com/2008/02/retirantes.jpg

    Introduo Conceitual para a Educao na Diversidade e Cidadania UAB/Unimontes

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    Nesta perspectiva, entendemos que, a dignidade um valor incondicional, incomensurvel e insubstituvel. Assim, o respeito a ela, deve existir sempre de maneira igual para todos e em qualquer lugar. Sendo assim, a dignidade humana constitui-se no ncleo dos direitos humanos, por fundamentar-se nessa idia.

    Assim, devemos fundamentar os direitos humanos, pois, atravs do conhecimento que temos dos mesmos que obtemos e asseguramos a sua legitimidade e validade.

    A proclamao da Declarao Universal de 1948, passado mais de meio sculo, percebe-se atualmente, uma crescente evoluo na identidade de propsitos entre o Direito Interno e o Direito Internacional, no que respeita proteo dos direitos humanos, notadamente um dos temas centrais do Direito Internacional contemporneo (MAZZUOLI, 2001, s/p).

    O autor ressalta que os direitos humanos, foram conquistados atravs de lutas histricas e inmeros tratados realizados. Entretanto, a sua assegurao ocorre num lento e gradual processo de internacionalizao e universalizao.

    A Segunda Guerra Mundial ( 1939 -1945 ) , que con so l i da efetivamente o Direito Internacional dos Direitos Humanos, como resposta barbrie do holocausto durante o nazismo. Criando assim, obrigaes e responsabilidades para os Estados com relao ao respeito s pessoas sujeitas sua jurisdio, passando a ser preocupao de interesse comum dos Estados.

    Dessa forma, os direitos humanos podem ser vistos como o limite de convivncia e pluralismo entre os povos.

    Com a criao da Organizao das Naes Unidas surgiu [...] um sistema global de proteo dos direitos humanos, tanto de carter geral (a exemplo do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Polticos), como de carter especfico (v.g., as Convenes internacionais de combate tortura, discriminao racial, discriminao contra as mulheres, violao dos direitos das crianas etc.). Revolucionou-se, a partir deste momento, o tratamento da questo relativa ao tema dos direitos humanos.

    O autor entende que, a partir desse momento o ser humano passa a ser um dos pilares antes reservados aos Estados, ou seja, o cidado antes vinculado sua Nao, passa a tornar-se, lento e gradativamente verdadeiro cidado do mundo" (BARROS-PLATIAU; GIS, 2000, p. 35).

    Internacionalizar: tornar-se internacional, difundir por vrias naes, universalizar.

    Holocausto: massacre de judeus e de outras minorias efetuado nos campos de concentrao alemes durante a Segunda Guerra Mundial.

    Pluralismo: Conjunto de idias segundo as quais os sistemas polticos sociais e culturais podem ser interpretados como resultados de uma multiplicidade de fatores.

    Figura 7: Luta contra a torturaFonte: images.google.com.br

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    Para Chau, A prtica de declarar direitos significa em primeiro lugar, que no um fato bvio para todos os homens que eles so portadores de direitos e, por outro lado, significa que no um fato bvio que tais direitos devam ser reconhecidos por todos. A declarao de direitos inscreve os direitos no social e no poltico, afirma sua origem social e poltica e se apresenta como objeto que pede o reconhecimento de todos, exigindo o consentimento social e poltico (1989, p. 20).

    Os direitos humanos com o qual se trabalha na contemporaneidade abrange todas as geraes de direitos, consideradas tambm fundamentais, sem hierarquizaes, prevalecendo sua universalidade, indivisibilidade e interdependncia, a partir de uma postura ativa do Estado como garantidor desses direitos.

    Para D'Amaral (2007, s/p), a educao direito bsico de toda democracia e fundamento da cidadania de cada ser humano e tambm direito inalcanvel para grande parte da populao brasileira.

    Figura 8: Cidado do mundoFonte: 1.bp.blogspot.com/_XJMWYE79AVw/SG_PTsEBk9I/AAAAAAAAAwA/bpMrHXEqtNY/s400/global%2B2.jpg

    Figura 9: Direitos humanos no BrasilFonte: aldoadv.files.wordpress.com/2007/05/cidadania.jpg

    Introduo Conceitual para a Educao na Diversidade e Cidadania UAB/Unimontes

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    Assim, a educao considerada um elemento bsico de cidadania, as dificuldades ou falta de acesso educao de qualidade, torna-se uma das grandes causas da excluso social a que esto submetidas as pessoas de alguns grupos sociais, dentre os quais, destacamos: a questo de gnero, sexo, raa e etnia, deficincia fsica e de sade, credo, etc.

    A educao no processo de concretizao dos direitos humanos e da cidadania, fundamentado na nossa constituio de 1988, ao aplicar a universalidade e indivisibilidade dos direitos humanos, tambm, confere a o E s t a d o e a o c i d a d o implicitamente, a tarefa de educar (dever) e ser educado (direito) em direitos humanos e cidadania. Entendemos que, os direitos humanos fundamentais s se efetivaro com a colaborao de todas as pessoas da sociedade e da vontade poltica do Estado.

    Por tratar-se de um direito reconhecido, faz-se necessrio que o mesmo seja garantido e, sendo a garantia primeira a sua inscrio em lei de carter nacional.

    Nesse sentido, pensar a educao como direito humano reconhecer que a educao escolar implica no envolvimento da escola em todo o ambiente cultural e comunitrio em que est inserida. Entendendo que, a educao escolar no se restringe apenas aos temas do professor, do currculo, da avaliao, da sala de aula, mas tambm, a aspectos relacionados sociedade em geral.

    Apesar da escola, no ser o nico espao em que se produz e reproduz o conhecimento, a maior responsvel pela sistematizao e codificao desse saber. Por ser um espao social privilegiado, no qual se definem a ao institucional pedaggica, a prtica e a vivncia dos direitos humanos.

    A escola na sociedade contempornea o local de estruturao de concepes de mundo e de conscincia social, de circulao e de consolidao de valores, de promoo da diversidade cultural, da formao para a cidadania, de constituio de sujeitos sociais e de desenvolvimento de prticas pedaggicas (UNESCO, s/d).

    Dessa forma, que a educao em direitos humanos dar-se- de forma que os princpios ticos fundamentais que o cercam, sejam indistintamente para todos ns da coletividade. A criao de uma cultura em direitos humanos deve ser o fator principal para a consolidao de uma formao que leve a uma cidadania plena.

    Figura 10: Constituio Brasileira de 1988Fonte: suapesquisa.com/o_que_e/constituicao.gif

    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

  • 19

    Desde, a Declarao Universal de 1948, que explicita: A instruo promover a compreenso, a tolerncia e a amizade entre todas as naes e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvar as atividades das Naes Unidas em prol da manuteno da paz (Artigo XXVI, 2. alnea).

    Nesta mesma trajetria, a Constituio Brasileira de 1988, institui no seu art. 205, que a "educao, direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser promovida e incentivada com a colaborao da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho". Dessa forma, est implcito que a trade: "direitos humanos", "cidadania" e "educao" so fundamentos de um Estado Democrtico que garanta o exerccio dos direitos e liberdades fundamentais inerentes condio humana.

    Como podemos observar a proteo dos direitos humanos s se efetiva dependendo em muito de um processo educacional capaz de formar novas geraes que se envolvam desde cedo no compromisso tico com o tema" (CINTRA JUNIOR, 1996, p. 32-33).

    Nessa viso, o papel da educao a formao para o exerccio da cidadania, considerada aqui no seu sentido amplo, como afirma Montoro (1999, p. 28): "No basta ensinar direitos humanos. preciso lutar pela sua efetividade. E, acima de tudo, trabalhar pela criao de uma cultura prtica desses direitos".

    A Indiferena

    Acesse o site abaixo para ler na ntegra a Declarao

    Universal dos Direitos Humanos.

    http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Declara

    o-Universal-dos-Direitos-Humanos/declaracao-universal-dos-direitos-

    humanos.htmlFigura 11: Declarao dos direitos humanos Fonte: 2.bp.blogspot.com/_vIZMJ9tIFZ4/R-wb7UVeIWI/AAAAAAAABXI/vQmohEZTdDM/s320/Direitos%2BHumanos.jpg

    DICAS

    Introduo Conceitual para a Educao na Diversidade e Cidadania UAB/Unimontes

  • 20

    Primeiro levaram os comunistas,

    Mas eu no me importei

    Porque no era nada comigo.

    Em seguida levaram alguns operrios,

    Mas a mim no me afetou

    Porque no sou operrio.

    Depois prenderam os sindicalistas,

    Mas no me incomodei

    Porque nunca fui sindicalista.

    Logo a seguir chegou a vez de alguns padres,

    mas como no sou religioso, tambm no liguei.

    Agora levaram-me a mim

    E quando percebi,

    J era tarde.

    Bertolt Brecht

    A no existncia de uma cultura em direitos humanos contribui para a formao de pessoas acrticas, que, no refletem sobre os problemas da realidade social, agravando a falta de senso poltico e do pensamento crtico, ampliando assim, a injustia social.

    A educao em direitos humanos deve sustentar-se nos princpios ticos fundamentais para que sejam apreendidos por todos, norteando as aes das geraes presentes e futuras, visando a reconstruo dos direitos humanos e da cidadania em nosso pas. Para que, assim, o exerccio da cidadania e o respeito aos direitos humanos sejam assegurados.

    Ao tratarmos dos direitos humanos na educao devemos refletir sobre trs enfoques: a) direito educao; b) a educao para os direitos humanos e c) a educao segundo os direitos humanos. Passamos, em seguida a descrev-los.

    O primeiro enfoque refere-se ao direito de receber a educao, de forma que se efetiva o direito fundamental de todos de se beneficiar da educao. Tal abordagem trata de dfict ou obstculos como o analfabetismo, a evaso e o abandono escolar, a continuidade da desigualdade, etc.

    Neste sentido, Sacristn (2007, p. 134), nos alerta que preciso uma certa desconfiana preventiva que nos leve a revisar o como se satisfaz o direito educao e suas repercusses e a tomar medidas corretivas.

    Para compreender e realizar a educao na perspectiva de um direito implica consider-la capacitadora para exercer outros direitos, portanto tornar o ser humano capaz de exercer a plena cidadania. Enfim,

    A Secretaria Especial de Direitos Humanos SEDH fez em 2008 pesquisa indita com o objetivo de conhecer o que o brasileiro pensa sobre direitos humanos. interessante observar os resultados. Leia aqui a ntegra do estudo http://www.mj.gov.br/sedh/documentos/percepcaoDH.pdf

    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

    DICAS

  • 21

    podemos afirmar que o direito educao influencia as possibilidades da pessoa de realizar-se e de poder se inserir como membro til da e na sociedade. Dessa forma, os dficts de educao projetam na capacidade insupervel para as liberdades dos indivduos ou grupos que sofrem deles (SACRISTN, 2007, p. 136).

    O segundo enfoque, a educao para os direitos humanos, trata-se da abordagem dos temas que se relacionam com a temtica dos direitos humanos nas escolas, na formao geral, sua presena nos contedos dos currculos escolares. Essa viso avana no sentido de oferecer modelos de convivncia, respeito, solidariedade, com a inteno de que os educandos assumam esses ideais como critrios para sua vida individual e nas relaes com os outros.

    O terceiro enfoque, a educao segundo os direitos humanos, refere-se ao respeito que dado esses direitos nas prticas educativas, como elas devem ser de acordo com os direitos humanos, como se avaliar as pessoas (crianas, jovens e adultos), que papel desempenham em sua prpria educao, em que medida podem se fazer ouvir. Portanto, que a pessoa com seus direitos seja referncia do que devemos lhe dar e como faz-los.

    Nessa tica, podemos entender que a efetivao desse direito educao depende, atualmente, em maior medida do direito informao, pois as tecnologias da informao nos fora a redescobrir o seu significado em um novo contexto, onde os limites da influncia das instituies foram ampliados, tanto no ponto de vista do espao em que atuam, quanto ao tempo em que o fazem.

    1.2.3 A educao para a cidadania

    " preciso plantar a semente da educao para colher os frutos da cidadania".

    Paulo Freire

    A educao no sentido da formao para a cidadania deve adequar-se aos desafios educativos do nosso tempo. Faz-se necessrio identificar um conjunto de temas pertinentes, assim como problemas e desafios que se colocam sobre a questo. Dentre estes, ressaltamos a elaborao de programas de formao de professores no tema da cidadania. Para tanto, Reis (2001) aponta alguns aspectos que devem ser considerados:

    ?o reconhecimento da insuficincia dos contedos cognitivos e informativos na promoo de uma cidadania ativa, sendo realada a importncia das prticas que consideram valores e atitudes, conhecimentos e comportamentos;

    ?a circunstncia de que a aquisio de valores, mais do que

    Assista ao documentrio: Direitos Humanos, a

    Exceo e a Regra. s acessar o site:

    http://www.bancocultural.com.br/index.php?option=co

    m_content&task=view&id=4700&Itemid=365

    Diretor: Gringo CrdiaAno: 2008

    Durao: 10 minPais: Brasil

    SinopseEste curta faz parte do

    projeto Marco Universal. A partir de imagens

    selecionadas por Joo Roberto Ripper, o diretor

    faz um filme denncia sobre a situao dos Direitos

    Humanos no Brasil destacando os principais

    eventos e momentos marcantes da histria do pas nos ltimos 40 anos.

    PARA REFLETIR

    Introduo Conceitual para a Educao na Diversidade e Cidadania UAB/Unimontes

  • 22

    ensino direto, exige vivncias, sendo fundamental propiciar experincias diretas ou transpostas que permitam um desenvolvimento da responsabilidade social e moral;

    ?a exigncia de prticas escolares que favoream um equilbrio entre o desenvolvimento do sentido de pertena comunitria condicionante da participao no processo democrtico e no bem pblico e do sentido crtico sem o qual a qualidade da vida comunitria resulta empobrecida pelo conformismo;

    ?a importncia do gosto e do hbito da discusso que caracteriza a comunidade poltica em democracia, a formao de cidados ativos deve dar os meios e a informao que permitam a aprendizagem da obteno de consensos pela discusso;

    ?a insistncia em que a educao para a cidadania pode ter lugar em todos os ciclos de estudos, e por conseguinte em todas as idades, assegurando a transio progressiva para uma vida ativa no domnio pblico;

    ?a importncia dos sistemas educativos integrarem, nos currculos escolares, objetivos e contedos de formao para a cidadania que, sem prejuzo da adequao aos contextos atendam a programas obrigatrios com crditos acadmicos.

    Na viso do autor, do crescente entusiasmo da comunidade educativa frente s questes da cidadania nos leva a refletir quanto a urgncia de encontrarmos possveis solues tericas para vencer resistncias, materializar experincias e implantar iniciativas.

    Considerando, que na velocidade da transformao da sociedade, a cidadania depende cada vez mais de uma educao moral e tica.

    Portanto, a cidadania precisa se fazer mais presente nos discursos

    Figura 12: Cidadania para todosFonte: vivaterra.org.br/cidadania_1.1.jpg

    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

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    cientficos. Caso contrrio, existiremos somente como consumidores, o que vai depender da condio socioeconmica e dos valores de cada um.

    A partir do entendimento que a educao um meio de construo e reconstruo de valores e normas que contribuem para que as pessoas tenham dignidade.

    Numa educao tica, preciso resgatar e incorporar os valores de solidariedade, de fraternidade, de respeito s diferenas de crenas, culturas e conhecimentos, de respeito ao meio ambiente e aos direitos humanos (SIEGEL. 2005, p 41).

    Nessa viso, ser cidado ter conscincia de pertencimento, que

    fazemos parte do mundo e que nossas escolhas e aes afetam no apenas a ns mesmos, mas tambm, as outras pessoas e vice versa.

    Numa sociedade demo-crtica, a educao para a cidadania deve formar pessoas como agente de transformao. Para o filsofo Aristteles a democracia surgiu quando, devido ao fato de que todos so iguais em certo sentido, acreditou-se que todos fossem absolutamente iguais entre si.

    Isso nos remete a uma reflexo que nos permita uma

    Figura 13: SolidariedadeFonte: images.google.com.br/images?gbv=2&hl=pt-BR&q=solidariedade&sa=N&start=20&ndsp=20

    Figura 14: Aristteles (384 a.C. - 322 a.C.)Fonte: www.institutodehumanidades.com.br/img/aristoteles.jpg

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    melhor compreenso das origens histricas da situao de misria e excluso em que esto inseridos grande parte da populao brasileira. Salientamos que, a formao poltica seja presena constante no contexto escolar para propor caminhos de superao de situaes de opresso.

    O conceito de educao deve vincular-se intimamente ao de liberdade, de democracia e de cidadania. Salientamos que a democracia no pode referir-se apenas ordem do poder pblico, mas a todas as relaes sociais, econmicas, polticas e culturais. Os Parmetros Curri-culares Nacionais PCNs orienta que se trabalhe com os alunos os seus direitos de cidado utilizando a cultura. Prope, portanto, uma educao comprometida com a cidadania, para isso traam alguns princpios bsicos para a educao escolar, descritos em seus Temas Transversais (BRASIL, 1997) a seguir:

    ?dignidade da pessoa humana, que implica no respeito aos direitos humanos, repdio discriminao de qualquer tipo, acesso condies de uma vida digna, respeito mtuo nas relaes interpessoais, pblicas e privadas.

    ?igualdade de, que refere-se necessidade de garantir que todos tenham a mesma dignidade e possibilidade de exerccio da cidadania. Para tanto h que se considerar o princpio da eqidade, isto , que existam diferenas (tnicas, culturais, regionais, de gnero, etrias, religiosas, etc.) e desigualdades (socioeconmicas) que necessitam ser levadas em conta para que a igualdade seja efetivamente alcanada.

    ?participao, que como princpio democrtico, traz a noo de cidadania ativa, isto , da complementaridade entre a representao poltica tradicional e a participao popular no espao pblico, compreendendo que no se trata de uma sociedade homognea e sim marcada por diferenas de classe, tnicas, religiosas, etc.

    ?co-responsabilidade pela vida social, que implica em partilhar com os poderes pblicos e diferentes grupos sociais, organizados ou no, a responsabilidade pelos destinos da vida coletiva.

    Tais princpios, aplicados na educao escolar, funciona como mecanismo bsico para que o sujeito possa exercer a sua cidadania. Uma vez que para o exerccio da cidadania o acesso cultura letrada e domnio do saber sistematizado que constituem a razo de ser da escola.

    De acordo com os PCNs, a transversalidade diz respeito possibilidade de se estabelecer, na prtica educativa uma relao entre aprender na realidade e da realidade de conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questes da vida real (aprender na realidade e da realidade) (BRASIL, 1997, p. 40).

    A insero dos temas transversais exige uma tomada de posio diante de problemas fundamentais e urgentes da vida social. Pelo fato de que os mesmos do sentido social a procedimentos e conceitos prprios das reas convencionais, superando assim, o aprender apenas pela necessidade

    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

  • 25

    escolar (BRASIL, 1997).

    Para Sacavino (2008, p. 5): importante destacar a dimenso educativa da participao e sua funo pedaggica do ponto de vista da construo e afirmao da mentalidade contra-hegemnica. A participao tem de ajudar a perceber as estruturas dominantes de poder de que esto impregnados os diferentes aspectos da vida. um exerccio que pressupe que se revele a realidade e se ajude a construir vises lcidas desta a partir dos caminhos alternativos.

    A sociedade chama a educao para fazer a mediao entre tica e cidadania, na tentativa de formar os indivduos de acordo com os valores solicitados para a construo de uma sociedade mais justa e igualitria.

    necessrio ensinar s nossas crianas e jovens no apenas a ler e a escrever, mas a olhar o mundo a partir de novas perspectivas. Ensinar a ouvir, falar e escutar, a desenvolver atitudes de solidariedade, a aprender dizer no ao consumismo imposto pela mdia, a dizer no ao individualismo e sim paz. (CABRAL, 2008, s/p).

    Assim, uma educao cidad deve despertar o sujeito para a

    conscincia de seus direitos e deveres, lutando pela justia social. Faz-se necessrio construir espao voltado para uma educao na cidadania.

    Figura 15: O mundo e a imaginaoFonte: roadriver.files.wordpress.com/2008/11/borboleta1.jpg

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    RESUMO

    ?Deve-se entender a educao como um conceito complexo que se refere ao desenvolvimento humano ao longo de sua vida, desde o nascimento at a morte.

    ?A educao base constitutiva na formao do ser humano, bem como na defesa e na constituio dos outros direitos econmicos, sociais e culturais.

    ?A educao escolar integra o processo educativo, onde as aprendizagens bsicas so desenvolvidas, conhecida como educao formal.

    ?Na escola, enquanto espao de aprendizagem se transmite conhecimentos essenciais, comportamentos, atitudes e habilidades, so ensinados e aprendidos na tentativa de promover a integrao dos sujeitos na sociedade.

    ?A educao deve adaptar-se frequentemente dinmica das mudanas e transformaes da sociedade, entretanto no deve deixar de transmitir as aquisies, bem como os saberes bsicos oriundos da experincia humana.

    ?Na Constituio Federal de 1988 prev em seu artigo 6 O direito educao como um direito fundamental de natureza social.

    ?Os direitos fundamentais trazem consigo a conscincia de que os homens so sujeitos de direitos, dessa forma, digno de condies mnimas de existncia capazes de assegurar a sua dignidade. Nesta abordagem, o direito fundamental educao deve ser assegurado a todas as crianas e adolescentes, de forma indiscriminada e universal.

    ?Os Direitos Humanos como aqueles direitos, comuns a todos os seres humanos sem distino de etnia, nacionalidade, sexo, classe social, religio, ideologia, nvel de instruo, orientao sexual e julgamento moral, ou seja, so os direitos fundamentais da pessoa humana.

    ?A educao deve fazer a mediao entre tica e cidadania, na tentativa de formar os indivduos de acordo com os valores solicitados para a construo de uma sociedade mais justa e igualitria.

  • ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. 5. ed. So Paulo: Editora Perspectiva, 2000.

    ______. A condio humana. 7. ed. Rio: Forense Universitria, 1995.

    BARROS-PLATIAU, Ana Flvia & Gis, Ancelmo Csar Lins de. Direito internacional e globalizao. In: Revista Cidadania e Justia da Associao dos Magistrados Brasileiros, ano 4, n. 8, p. 27-42, 1. semestre de 2000.

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    CABRAL, Mrcia Regina. Educao e cidadania. In: Webartigos, 2008. Disponvel em: http://www.webartigos.com/articles/10791/1/educacao-e-cidadania/pagina1.html. Acessado em 24/06/2009

    CHAUI, M. Direitos Humanos e medo. In Direitos humanos e... So Paulo, Comisso de Justia e Paz: Editora Brasiliense, 1989.

    CINTRA JUNIOR, Dyrceu Aguiar Dias. O judicirio brasileiro em face dos direitos humanos. In: Justia e democracia: revista semestral de informao e debate, n. 2, p. 10-33, jul./dez. 1996 ano 1 (publicao oficial da Associao Juzes para a Democracia). So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, segundo semestre de 1996.

    CURY, C. R. J. Direito educao: direito igualdade, direito diferena. In: Cadernos de Pesquisa, n. 116, julho/ 2002, p. 245-262.

    DALLARI, Dalmo de Jesus Abreu. Direitos humanos e cidadania. 2 ed. 8 tiragem. So Paulo.Moderna, 2004.

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    FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessrios prtica pedaggica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.

    HADDAD, Srgio. Relator Nacional para o Direito Educao

    29

    REFERNCIAS

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    KANT, Immanuel. Rflexions sur L'ducation. Introduction, traduction et notes par Alexis Philonenko. Paris: Libraire Philosophique J. Vrin, 1993.

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    MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direitos humanos, cidadania e educao. Uma nova concepo introduzida pela Constituio Federal de 1988. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponvel em: . Acesso em: 16 jun. 2009.

    MONTORO, Andr Franco. Cultura dos Direitos Humanos. In: Direitos humanos: legislao e jurisprudncia (Srie Estudos, n. 12), Volume I. So Paulo: Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado, 1999.

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    WEIS, Carlos. Direitos humanos contemporneos. So Paulo: Malheiros Editores, 1999.

    30

    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

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    ATIVIDADES

    Da justia democracia, passando pelos sinos

    Jos Saramago

    Comearei por vos contar em brevssimas palavras um fato notvel da vida camponesa ocorrido numa aldeia dos arredores de Florena h mais de quatrocentos

    1) Investigar quais as notcias jornalsticas, os programas televisivos, as msicas mais ouvidas pelos estudantes, para observar se os elementos so adequados para torn-los instrumentos de discusso sobre algum aspecto dos direitos humanos, em sua aula. Aps selecion-los, socialize-o no frum de discusso com seu tutor, colegas e professores.

    2) Criar jogos didticos e um texto simplificado da Declarao Universal dos Direitos Humanos. Postar no ambiente virtual.

    3) Monte um painel com situaes injustas e as normas por elas violadas, para que todos possam visualizar. Abaixo listamos alguns temas, como sugesto.

    ?Discriminao racial

    ?Poluio do meio ambiente

    ?Explorao do trabalho infantil

    ?Machismo

    ?Discriminao com pessoas de orientao sexual diferente, etc.

    4) Elaborar um slogan sobre o direito educao.

    5) Produzir um dilogo sobre os conceitos bsicos e prticas da educao para formao do cidado do mundo. Depois, socialize com o grupo.

    6) Relacione a educao como direito fundamental com Educao Bsica brasileira, considerando o acesso, qualidade, obrigatoriedade. Depois poste no ambiente virtual para conhecimento de todos.

    7) Promova uma discusso ampla com seus colegas, tutores e professores sobre a temtica: A universidade pblica para todos?

  • anos. Permito-me pedir toda a vossa ateno para este importante acontecimento histrico porque, ao contrrio do que corrente, a lio moral extravel do episdio no ter de esperar o fim do relato, saltar-vos- ao rosto no tarda.

    Estavam os habitantes nas suas casas ou a trabalhar nos cultivos, entregue cada um aos seus afazeres e cuidados, quando de sbito se ouviu soar o sino da igreja. Naqueles piedosos tempos (estamos a falar de algo sucedido no sculo XVI) os sinos tocavam vrias vezes ao longo do dia, e por esse lado no deveria haver motivo de estranheza, porm aquele sino dobrava melancolicamente a finados, e isso, sim, era surpreendente, uma vez que no constava que algum da aldeia se encontrasse em vias de passamento. Saram, portanto, as mulheres rua, juntaram-se as crianas, deixaram os homens as lavouras e os mesteres, e em pouco tempo estavam todos reunidos no adro da igreja, espera de que lhes dissessem a quem deveriam chorar. O sino ainda tocou por alguns minutos mais, finalmente calou-se. Instantes depois a porta abria-se e um campons aparecia no limiar. Ora, no sendo este o homem encarregado de tocar habitualmente o sino, compreende-se que os vizinhos lhe tenham perguntado onde se encontrava o sineiro e quem era o morto. "O sineiro no est aqui, eu que toquei o sino", foi a resposta do campons. "Mas ento no morreu ningum?", tornaram os vizinhos, e o campons respondeu: "Ningum que tivesse nome e figura de gente, toquei a finados pela Justia porque a Justia est morta".

    Que acontecera? Acontecera que o ganancioso senhor do lugar (algum conde ou marqus sem escrpulos) andava desde h tempos a mudar de stio os marcos das estremas das suas terras, metendo-os para dentro da pequena parcela do campons, mais e mais reduzida a cada avanada. O lesado tinha comeado por protestar e reclamar, depois implorou compaixo, e finalmente resolveu queixar-se s autoridades e acolher-se proteo da justia. Tudo sem resultado, a espoliao continuou. Ento, desesperado, decidiu anunciar urbi et orbi (uma aldeia tem o exato tamanho do mundo para quem sempre nela viveu) a morte da Justia. Talvez pensasse que o seu gesto de exaltada indignao lograria comover e pr a tocar todos os sinos do universo, sem diferena de raas, credos e costumes, que todos eles, sem exceo, o acompanhariam no dobre a finados pela morte da Justia, e no se calariam at que ela fosse ressuscitada. Um clamor tal, voando de casa em casa, de aldeia em aldeia, de cidade em cidade, saltando por cima das fronteiras, lanando pontes sonoras sobre os rios e os mares, por fora haveria de acordar o mundo adormecido... No sei o que sucedeu depois, no sei se o brao popular foi ajudar o campons a repor as estremas nos seus stios, ou se os vizinhos, uma vez que a Justia havia sido declarada defunta, regressaram resignados, de cabea baixa e alma sucumbida, triste vida de todos os dias. bem certo que a Histria nunca nos conta tudo...

    Suponho ter sido esta a nica vez que, em qualquer parte do mundo, um sino, uma campnula de bronze inerte, depois de tanto haver dobrado pela morte de seres humanos, chorou a morte da Justia. Nunca mais tornou a ouvir-se aquele fnebre dobre da aldeia de Florena, mas a Justia continuou e continua a morrer todos os dias. Agora mesmo, neste instante em que vos falo, longe ou aqui ao lado, porta da nossa casa, algum a est matando. De cada vez que morre, como se afinal nunca tivesse existido para aqueles que nela tinham confiado, para aqueles que dela esperavam o que da Justia todos temos o direito de esperar: justia, simplesmente justia. No a que se envolve em tnicas de teatro e nos confunde com flores de v retrica judicialista, no a que permitiu que lhe vendassem os olhos e viciassem os pesos da balana, no a da espada que sempre corta mais para um lado que para o

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    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

  • outro, mas uma justia pedestre, uma justia companheira quotidiana dos homens, uma justia para quem o justo seria o mais exato e rigoroso sinnimo do tico, uma justia que chegasse a ser to indispensvel felicidade do esprito como indispensvel vida o alimento do corpo. Uma justia exercida pelos tribunais, sem dvida, sempre que a isso os determinasse a lei, mas tambm, e sobretudo, uma justia que fosse a emanao espontnea da prpria sociedade em ao, uma justia em que se manifestasse, como um iniludvel imperativo moral, o respeito pelo direito a ser que a cada ser humano assiste.

    Mas os sinos, felizmente, no tocavam apenas para planger aqueles que morriam. Tocavam tambm para assinalar as horas do dia e da noite, para chamar festa ou devoo dos crentes, e houve um tempo, no to distante assim, em que o seu toque a rebate era o que convocava o povo para acudir s catstrofes, s cheias e aos incndios, aos desastres, a qualquer perigo que ameaasse a comunidade. Hoje, o papel social dos sinos encontra-se limitado ao cumprimento das obrigaes rituais e o gesto iluminado do campons de Florena seria visto como obra desatinada de um louco ou, pior ainda, como simples caso de polcia. Outros e diferentes so os sinos que hoje defendem e afirmam a possibilidade, enfim, da implantao no mundo daquela justia companheira dos homens, daquela justia que condio da felicidade do esprito e at, por mais surpreendente que possa parecer-nos, condio do prprio alimento do corpo. Houvesse essa justia, e nem um s ser humano mais morreria de fome ou de tantas doenas que so curveis para uns, mas no para outros. Houvesse essa justia, e a existncia no seria, para mais da metade da humanidade, a condenao terrvel que objetivamente tem sido.

    Esses sinos novos cuja voz se vem espalhando, cada vez mais forte por todo o mundo so os mltiplos movimentos de resistncia e ao social que pugnam pelo estabelecimento de uma nova justia distributiva e comutativa que todos os seres humanos possam chegar a reconhecer como intrinsecamente sua, uma justia protetora da liberdade e do direito, no de nenhuma das suas negaes. Tenho dito que para essa justia dispomos j de um cdigo de aplicao prtica ao alcance de qualquer compreenso, e que esse cdigo se encontra consignado h cinquenta anos na Declarao Universal dos Direitos Humanos, aqueles trinta direitos bsicos e essenciais de que hoje s vagamente se fala, quando no sistematicamente se silencia, mais desprezados e conspurcados nestes dias do que o foram, h quatrocentos anos, a propriedade e a liberdade do campons de Florena. E tambm, tenho dito que a Declarao Universal dos Direitos Humanos, tal qual se encontra redigida, e sem necessidade de lhe alterar sequer uma vrgula, poderia substituir com vantagem, no que respeita a retido de princpios e clareza de objetivos, os programas de todos os partidos polticos do orbe, nomeadamente os da denominada esquerda, anquilosados em frmulas caducas, alheios ou impotentes para enfrentar as realidades brutais do mundo atual, fechando os olhos s j evidentes e temveis ameaas que o futuro est a preparar contra aquela dignidade racional e sensvel que imaginvamos ser a suprema aspirao dos seres humanos. Acrescentarei que as mesmas razes que me levam a referir-me nestes termos aos partidos polticos em geral, as aplico por igual aos sindicatos locais, e, em consequncia, ao movimento sindical internacional no seu conjunto.

    De um modo consciente ou inconsciente, o dcil e burocratizado sindicalismo que hoje nos resta , em grande parte, responsvel pelo adormecimento social decorrente do processo de globalizao econmica em curso. No me alegra diz-lo, mas no poderia cal-lo. E, ainda, se me autorizam a acrescentar algo da

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  • minha lavra particular s fbulas de La Fontaine, ento direi que, se no interviermos a tempo, isto , j, o rato dos direitos humanos acabar por ser implacavelmente devorado pelo gato da globalizao econmica.

    E a democracia, esse milenrio invento de uns atenienses ingnuos para quem ela significaria, nas circunstncias sociais e polticas especficas do tempo, e segundo a expresso consagrada, um governo do povo, pelo povo e para o povo? Ouo muitas vezes argumentar a pessoas sinceras, de boa f comprovada, e a outras que essa aparncia de benignidade tem interesse em simular, que, sendo embora uma evidncia indesmentvel o estado de catstrofe em que se encontra a maior parte do planeta, ser precisamente no quadro de um sistema democrtico geral que mais probabilidades teremos de chegar consecuo plena ou ao menos satisfatria dos direitos humanos. Nada mais certo, sob condio de que fosse efetivamente democrtico o sistema de governo e de gesto da sociedade a que atualmente vimos chamando democracia. E no o . verdade que podemos votar, verdade que podemos, por delegao da partcula de soberania que se nos reconhece como cidados eleitores e normalmente por via partidria, escolher os nossos representantes no parlamento, verdade, enfim, que da relevncia numrica de tais representaes e das combinaes polticas que a necessidade de uma maioria vier a impor sempre resultar um governo. Tudo isto verdade, mas igualmente verdade que a possibilidade de ao democrtica comea e acaba a. O eleitor poder tirar do poder um governo que no lhe agrade e pr outro no seu lugar, mas o seu voto no teve, no tem, nem nunca ter qualquer efeito visvel sobre a nica e real fora que governa o mundo, e portanto o seu pas e a sua pessoa: refiro-me, obviamente, ao poder econmico, em particular parte dele, sempre em aumento, gerida pelas empresas multinacionais de acordo com estratgias de domnio que nada tm que ver com aquele bem comum a que, por definio, a democracia aspira. Todos sabemos que assim, e, contudo, por uma espcie de automatismo verbal e mental que no nos deixa ver a nudez crua dos fatos, continuamos a falar de democracia como se tratasse de algo vivo e atuante, quando dela pouco mais nos resta que um conjunto de formas ritualizadas, os incuos passes e os gestos de uma espcie de missa laica. E no nos apercebemos, como se para isso no bastasse ter olhos, de que os nossos governos, esses que para o bem ou para o mal elegemos e de que somos, portanto os primeiros responsveis vo-se tornando cada vez mais em meros "comissrios polticos" do poder econmico, com a objetiva misso de produzirem as leis que a esse poder convierem, para depois, envolvidas no acares da publicidade oficial e particular interessada, serem introduzidas no mercado social sem suscitar demasiados protestos, salvo os certas conhecidas minorias eternamente descontentes...

    Que fazer? Da literatura ecologia, da fuga das galxias ao efeito estufa, do tratamento do lixo s congestes do trfego, tudo se discute neste nosso mundo. Mas o sistema democrtico, como se de um dado definitivamente adquirido se tratasse, intocvel por natureza at a consumao dos sculos, esse no se discute. Ora, se no estou em erro, se no sou incapaz de somar dois e dois, ento, entre tantas outras discusses necessrias ou indispensveis, urgente, antes que se nos torne demasiado tarde, promover um debate mundial sobre a democracia e as causas da sua decadncia, sobre a interveno dos cidados na vida poltica e social, sobre as relaes entre os Estados e o poder econmico e financeiro mundial, sobre aquilo que afirma e aquilo que nega a democracia, sobre o direito felicidade e a uma existncia digna, sobre as misrias e as esperanas da humanidade, ou, falando com

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    Educao na Diversidade e Cidadania Caderno Didtico - Mdulo II

  • menos retrica, dos simples seres humanos que a compem, um por um e todos juntos. No h pior engano do que o daquele que a si mesmo se engana. E assim que estamos vivendo.

    No tenho mais que dizer. Ou sim, apenas uma palavra para pedir um instante de silncio. O campons de Florena acaba de subir uma vez mais torre da igreja, o sino vai tocar. Ouamo-lo, por favor.

    Publicado em Porto Alegre 2003: 18/12/2003

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