51

Durante o desenvolvimento deste trabalho o autor recebeu ......Agradecimentos Agradeço primeiramente a Deus, por tudo. Agradeço também à Jéssica, por todo o apoio e amor, meus

  • Upload
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

  • Inexistência de difusão sublinear para uma

    classe de homeomor�smos do toro

    Guilherme Silva Salomão

    Tese apresentadaao

    Instituto de Matemática e Estatísticada

    Universidade de São Paulopara

    obtenção do títulode

    Doutor em Ciências

    Programa: Matemática Aplicada

    Orientador: Prof. Dr. Fabio Armando Tal

    Durante o desenvolvimento deste trabalho o autor recebeu auxílio �nanceiro da FAPESP

    São Paulo, março de 2019

  • Inexistência de difusão sublinear para uma

    classe de homeomor�smos do toro

    Esta versão da tese contém as correções e alterações sugeridas

    pela Comissão Julgadora durante a defesa da versão original do trabalho,

    realizada em 30/01/2019. Uma cópia da versão original está disponível no

    Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo.

    Comissão Julgadora:

    • Prof. Dr. Fabio Armando Tal (orientador) - IME-USP

    • Prof. Dr. Salvador Addas Zanata - IME-USP

    • Prof. Dr. Andrés Koropecki - UFF

    • Prof. Dr. Alejandro Kocsard - UFF

    • Prof. Dr. Alejandro Miguel Passeggi Diaz Robles - FEAUDELAR

  • Agradecimentos

    Agradeço primeiramente a Deus, por tudo. Agradeço também à Jéssica, por todo o apoio e

    amor, meus pais e minha família por todo o amor e incentivo.

    Quero agradecer também meu orientador, Prof. Dr. Fabio Armando Tal, por me acompanhar

    e ensinar ao longo desses anos. Agradeço também aos colegas de IME: Marco, Lucas e 79 pela

    amizade e companheirismo nessa jornada.

    Agradeço também à FAPESP pelo apoio �nanceiro do presente trabalho.

    i

  • ii

  • Resumo

    SALOMÃO, G. S. Inexistência de difusão sublinear para uma classe de homeomor�smos

    do toro. 2018. 120 f. Tese (Doutorado) - Instituto de Matemática e Estatística, Universidade de

    São Paulo, São Paulo, 2018.

    No presente trabalho iremos provar, usando a folheação de Brouwer-Le Calvez e a teoria de for-

    cing dela derivada, que dado um homeomor�smo do toro f : T2 → T2 isotópico à identidade tal queseu conjunto de rotação ρ(f̃) = {t ρ0 | 0 ≤ t ≤ 1} é um segmento de reta com inclinação irracionale tendo 0 como um ponto extremal, então existe M > 0 tal que |〈f̃n(x̃) − x̃, ρ⊥0 〉| < M, para todox̃ ∈ R2 e n ∈ Z, ou em outras palavras, f não possui difusão sublinear na direção perpendicular àdireção do conjunto de rotação

    Palavras-chave: homeomor�smos do toro, dinâmica topológica, conjunto de rotação, difusão su-

    blinear.

    iii

  • iv

  • Abstract

    SALOMÃO, G. S. Inexistence of sublinear di�usion for a class of torus homeomorphisms.

    2018. 120 f. Tese (Doutorado) - Instituto de Matemática e Estatística, Universidade de São Paulo,

    São Paulo, 2018.

    In the present work we will prove, using the Brouwer-Le Calvez foliation and the forcing theory

    derived from it, that given a torus homeomorphism f : T2 → T2 isotopopic to the identity suchthat its rotation set ρ(f̃) = {t ρ0 | 0 ≤ t ≤ 1} is a line segment with irrational slope and 0 is anextreme point, then there exists M > 0 such that |〈f̃n(x̃) − x̃, ρ⊥0 〉| < M, for every x̃ ∈ R2 andn ∈ Z, or in other words, f does not have sublinear di�usion in the direction perpendicular to thedirection of the rotation set.

    Keywords: torus homeomorphisms, topological dynamics, rotation set, sublinear di�usion.

    v

  • vi

  • Sumário

    Lista de Figuras ix

    1 Introdução e estrutura 1

    1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

    1.2 Estrutura do trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

    2 Teoria de Rotação 3

    2.1 Homeomor�smos do círculo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

    2.2 Conjunto de rotação para homeomor�smos do toro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

    2.3 Difusão Sublinear . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6

    2.3.1 Caso I: Apenas um ponto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

    2.3.2 Caso II: Interior não vazio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

    2.3.3 Caso III: Segmento de reta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

    2.3.4 Dehn twists . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

    2.4 Dinâmica Essencial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

    3 Folheação de Brouwer-Le Calvez e Forcing 13

    3.1 Homeomor�smos de Brouwer . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

    3.2 Folheação de Brouwer-Le Calvez . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

    3.3 Forcing . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

    4 Difusão sublinear 21

    4.1 Enunciado do problema . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

    4.2 Demonstração do Teorema A . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

    Referências Bibliográ�cas 37

    vii

  • viii SUMÁRIO

  • Lista de Figuras

    3.1 Um caminho transverso γ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

    3.2 γ2 acima de γ1 com respeito à γ0 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

    3.3 γ1 e γ2 com intersecção F-transversa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

    4.1 Ilustração do Lema 4.1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

    4.2 Construção de α′N . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

    4.3 Ilustração do conjunto U . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

    4.4 Ilustração das curvas β̂ e γ∗x̂ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

    4.5 Modi�cação de γ∗x̂ em γx̂ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

    4.6 Ilustração do cone Cρ0z̃0 (v) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

    4.7 Ilustração de f̃n(z̃0) ∈ Cρ0z̃0 (v) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 274.8 Demonstração do Lema 4.10 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

    4.9 Ilustração do Lema 4.18 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

    4.10 Ilustração do Lema 4.18 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

    4.11 Construção de βx̃ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

    4.12 Construção de β′ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35

    4.13 Intersecção de β′ com β′ + w3 − w1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36

    ix

  • x LISTA DE FIGURAS

  • Capítulo 1

    Introdução e estrutura

    1.1 Introdução

    Desde sua introdução por Poincaré, o conceito de número ou conjunto de rotação tem sido degrande utilidade no estudo de dinâmica, seja de aplicações do círculo, seja de aplicações de super-fícies. No presente trabalho nos concentraremos no conjunto de rotação para o toro bidimensinal.Introduzido na década de 1980 (veja [MZ89]), tem sido objeto de muitos estudos ao longo dosúltimos anos, com muitos resultados sendo obtidos por diversos autores. De forma geral, podemoscategorizar os resultados em dois tipos, o primeiro seria, quais conjuntos do plano podem ser re-alizados como conjunto de rotação, para alguma aplicação do toro? O outro tipo, que será o focodeste trabalho, seria, assumindo que o conjunto de rotação tem uma determinada forma, quaispropriedades podemos deduzir sobre a dinâmica da aplicação em questão?

    Intuitivamente, o conjunto de rotação informa as velocidades lineares com que uma aplicaçãodo toro faz os pontos rodarem. Contudo, é válido perguntar se existe algum tipo de comportamentorotacional que não é capturado por tal conjunto. Existem muitos resultados que mostram que,sob determinadas hipóteses e para determinados tipos de conjunto de rotação, não existem pontosque se movem com velocidades sublineares. Contudo, existem exemplos que ilustram que esse nemsempre é o caso, é possível construir aplicações que possuem velocidades sublineares não capturadaspelo conjunto de rotação.

    Nosso objetivo será mostrar que se um homeomor�smo do toro f tem como conjunto de rotaçãoum segmento de reta com inclinação irracional e tendo a origem como ponto extremal, então f nãopossui movimentos rotacionais na direção perpendicular ao conjunto de rotação. Mais precisamente,provaremos o seguinte:

    Teorema A. Suponhamos que ρ(f̃) = {t ρ0 | 0 ≤ t ≤ 1}, onde tan(ρ0) /∈ Q. Então existe M > 0tal que

    |〈f̃n(x̃)− x̃, ρ⊥0 〉| < M,

    para todo x̃ ∈ R2 e n ∈ Z.

    Note que o Teorema A apresenta a solução para o problema da difusão sublinear para um dosúltimos casos restantes entre os tipos de conjunto de rotação que sabemos que são realizados poralgum homeomor�smo. Existem conjuntos compactos e convexos para os quais ainda não foramobtidos resultados sobre difusão sublinear, contudo até o presente momento não foram encontradosresultados que con�rmem que tais conjuntos podem ser realizados como conjuntos de rotação.

    1.2 Estrutura do trabalho

    No Capítulo 2 apresentaremos os resultados básicos sobre teoria de rotação, bem como umabreve coletânea de resultados similares ao teorema principal deste trabalho, mas para outras hipó-teses sobre o conjunto de rotação. Também no Capítulo 2 apresentaremos um breve resumo sobre

    1

  • 2 INTRODUÇÃO E ESTRUTURA 1.2

    dinâmica essencial, além de alguns resultados que utilizaremos na demonstração do nosso teorema.O Capítulo 3 é dedicado ao estudo da principal ferramenta utilizada ao longo do texto, a Folheaçãode Brouwer-Le Calvez e a teoria de Forcing dela derivada. Apresentaremos as de�nições básicas,bem como os principais resultados e alguns teoremas auxiliares que serão utilizados na etapa �nal.Por �m, no Capítulo 4 apresentaremos a demonstração do Teorema A.

  • Capítulo 2

    Teoria de Rotação

    2.1 Homeomor�smos do círculo

    A teoria de rotação teve seu início com Henri Poincaré, [Poi81], onde foi de�nido o número derotação para homeomor�smos do círculo da seguinte forma:

    De�nição 2.1. Seja h : S1 → S1 um homeomor�smo que preserva orientação, onde S1 = R/Z.De�nimos o número de rotação de h como

    ρ(h̃) = limn→+∞

    h̃n(z̃)− z̃n

    ,

    onde h̃ : R→ R é um levantamento de h, z̃ ∈ π−1(z) para algum z ∈ S1 e π : R→ S1 é a aplicaçãode recobrimeto.

    É possível mostrar que tal limite existe e não depende da escolha do ponto z. Além disso, se h̃′

    é outro levantamento de h, então h̃′ = h̃+ k, para algum k ∈ Z, e portanto ρ(h̃′) = ρ(h̃) + k.Dois resultados que resumem bem o poder do número de rotação na descrição da dinâmica de

    h são os seguintes:

    Proposição 2.2. Temos que ρ(h̃) ∈ Q se e somente se h possui ponto periódico.

    Teorema 2.3. Se h : S1 → S1 é um difeomor�smo de classe C1 que preserva orientação, com deri-vada de variação limitada e número de rotação ρ(h̃) ∈ R \Q, então h é topologicamente conjugadoà rotação x 7→ x+ ρ(h̃) (mod 1).

    Veja [KH95] para as demonstrações, além de outros resultados que usam o número de rotaçãopara extrair informações sobre a dinâmica de h e classi�car os homeomor�mos segundo caracterís-ticas de seus números de rotação. Com isso em mente, é natural tentar estender tal conceito paraoutros espaços.

    2.2 Conjunto de rotação para homeomor�smos do toro

    Vejamos agora como de�nir o conjunto de rotação para homeomor�smos do toro T2 na classede isotopia da identidade. Sejam f : T2 → T2 um homeomor�smo isotópico à identidade, ondeT2 = R2/Z2, f̃ : R2 → R2 um levantamento de f para o recobrimento universal de T2 e π : R2 → T2a aplicação de recobrimento. Se x ∈ T2, denotamos por x̃ um levantamento de x para R2, isto é,x̃ ∈ π−1(x).

    De�nição 2.4 ([MZ89]). Chamamos o conjunto

    ρ(f̃) =

    {v ∈ R2

    ∣∣∣∣∣∃ x̃i ∈ R2, ∃ni →∞, tais que f̃ni(x̃i)− x̃ini → v}

    3

  • 4 TEORIA DE ROTAÇÃO 2.2

    de conjunto de rotação de f̃ .Em outras palavras, ρ(f̃) é o conjunto dos pontos de acumulação das sequências do tipo(

    f̃ni(x̃i)− x̃ini

    )i∈N

    com x̃i ∈ R2 e ni →∞.

    Tal conjunto também é conhecido como conjunto de rotação de Misiurewicz-Ziemian (veja[MZ89]). Existem outras de�nições para conjuntos de rotação, contudo a de�nição aqui apresentadatem se mostrado a mais útil no estudo da dinâmica de homeomor�smos do toro.

    Vale notar que se f̃ ′ é outro levantamento de f , então f̃ ′ = f̃ +p, para algum p ∈ Z2, e portantoρ(f̃ ′) = ρ(f̃) + p. Portanto podemos falar simplesmente no conjunto de rotação de f . Note aindaque ρ(f̃n) = nρ(f̃), portanto se ρ(f̃) = {(p/q, r/q)}, então ρ(f̃ q − (p, r)) = {0}.

    À primeira vista a de�nição pode parecer desnecessariamente complicada se comparada ao casodo círculo, portanto vamos analisar de onde surge tal formulação. Considere um levantamento f̃ def e a função contínua φ : T2 → R2 dada por φ(x) = f̃(x̃)− x̃, onde x̃ ∈ π−1(x). Note que a funçãoφ está bem de�nida (isto é, não depende da escolha do levantamento x̃ de x), pois, se tomarmosoutro levantamento x̃′ ∈ π−1(x), teremos x̃′ = x̃+ k, para algum k ∈ Z2, portanto

    f̃(x̃′)− x̃′ = f̃(x̃+ k)− (x̃+ k) = f̃(x̃) + k − x̃− k = f̃(x̃)− x̃.

    Temos que

    1

    n

    n−1∑k=0

    φ(fk(x)) =1

    n

    n−1∑k=0

    (f̃k+1(x̃)− f̃k(x̃)) = f̃n(x̃)− x̃n

    .

    Pelo Teorema Ergódico de Birkho� (veja [Wal00]), se µ é uma medida de probabilidade em T2invariante por f e ergódica, então

    limn→∞

    1

    n

    n−1∑k=0

    φ(fk(x)) =

    ∫T2φ dµ para µ-q.t.p. x ∈ T2,

    portanto

    limn→∞

    f̃n(x̃)− x̃n

    =

    ∫T2φ dµ,

    sendo tal limite válido para µ-q.t.p. x ∈ T2 e todo x̃ ∈ π−1(x). É possível mostrar que

    ρ(f̃) =

    {∫T2φ dµ | µ é medida invariante por f

    }(2.1)

    (veja [MZ89]). A ideia por trás é que o conjunto de rotação não mede apenas a velocidade deórbitas, isto é, ele não é a união das velocidades de todas as órbitas, mas também como f faz todosos pontos rodarem.

    De�nição 2.5. Dizemos que x ∈ T2 tem vetor de rotação v se

    ρ(f̃ , x) = limn→∞

    f̃n(x̃)− x̃n

    = v,

    com x̃ ∈ π−1(x).

    Note que, ao contrário do que ocorre no caso de S1, o limite da de�nição anterior pode nãoexisitir, e existem exemplos de tal comportamento. Note ainda que o limite, quando existe, nãodepende do levantamento de x escolhido.

    Temos duas perguntas naturais que surgem ao de�nirmos o conjunto de rotação:

  • 2.2 CONJUNTO DE ROTAÇÃO PARA HOMEOMORFISMOS DO TORO 5

    (1) Quais conjuntos podem ser realizados como conjunto de rotação para algum homeomor�smo?

    (2) Dado que uma aplicação tem um determinado conjunto de rotação, o que se pode dizer sobreas propriedades dinâmicas de tal aplicação?

    Vamos começar pela primeira questão. Um resultado inicial importante estabelece algumasrestrições sobre quais conjuntos do plano podem ser conjuntos de rotação:

    Teorema 2.6 ([MZ89]). O conjunto ρ(f̃) é compacto e convexo.

    Evidentemente, temos que int(ρ(f̃)) pode ser vazio ou não. Os dois principais exemplos deconjuntos de rotação com interior não vazio podem ser encontrados em [Kwa92], onde é provadoque todo polígono convexo com vértices de coordenadas racionais é realizado como conjunto derotação, e [Kwa95], onde um exemplo similar é construído, mas com in�nitos vértices. Outro casode interesse seria um conjunto de interior não vazio que não seja um polígono, como uma bola, porexemplo. Uma resposta, seja positiva ou negativa, ainda não foi encontrada. Para outros resultadosmais recentes veja também [BdCTH16].

    Em [FM90] foi conjecturado que se ρ(f̃) tem interior vazio então o conjunto só pode ser de umadas seguintes formas:

    (i) um único ponto;

    (ii) um segmento que contenha dois pontos racionais;

    (iii) um segmento de inclinação irracional com um ponto racional extremal.

    Note que é simples construir exemplos para os dois primeiros casos. Um exemplo para o terceirocaso pode ser encontrado em [Han89]. Outra forma de enunciar tal conjectura é, se ρ(f̃) tem interiorvazio, então ρ(f̃) não pode ser das seguintes formas:

    (i') um segmento com inclinação racional e nenhum ponto racional;

    (ii') um segmento com inclinação irracional e nenhum ponto racional;

    (iii') um segmento de inclinação irracional com um ponto racional no interior relativo do segmento.

    Em [FM90] a conjectura foi provada para o caso em que f é tempo 1 de um �uxo. No casogeral foi provado por Artur Avila que o caso (ii') é falso. Já o caso (iii') é verdadeiro, como vistoem [CT18a]. O caso (i') permanece sem solução até o presente momento, contudo avanços têm sidofeitos recentemente, veja [Koc16], [KPS16] e [PS18].

    Vamos agora abordar a segunda questão: quais propriedades dinâmicas de uma aplicação oconjunto de rotação nos oferece? Temos os seguintes resultados iniciais sobre realização de vetoresde rotação:

    Teorema 2.7 ([LM91]). Se v ∈ int(ρ(f̃)) então existe x ∈ T2 tal que v = ρ(f̃ , x).

    Teorema 2.8 ([MZ91]). Se v ∈ int(ρ(f̃)) então

    (a) existe X ⊂ T2 um conjunto não vazio, fechado e f -invariante tal que ρ(f̃ , x) = {v}, para todox ∈ X;

    (b) existe uma medida de probabilidade invariante por f e ergódica tal que∫T2 φ dµ = v, onde

    φ(x) = f̃(x̃)− x̃.

    Temos, pela igualdade em (2.1), que o resultado de [LM91] também é válido se v é um pontoextremal do conjunto de rotação, pois os pontos extremais do conjunto de rotação são realizados pormedidas ergódicas (veja também [Fra88]). Em particular, em [MZ89] é provado também que pontosextremais com coordenadas racionais são realizados por pontos periódicos. Tal resultado nos levaao seguinte questionamento: quando a existência de um vetor de rotação com coordenadas racionaisimplica a existência de um ponto periódico? Não existe um resultado geral sobre o assunto, mastemos alguns resultados que tratam de casos especí�cos.

  • 6 TEORIA DE ROTAÇÃO 2.3

    Teorema 2.9 ([Fra89]). Se v ∈ int(ρ(f̃)) ∩Q2, então existe x ∈ T2 periódico tal que ρ(f̃ , x) = v.

    Outro resultado importante, relacionado ao problema do presente trabalho, é o seguinte:

    Teorema 2.10 ([JZ98]). Se ρ(f̃) é um segmento de reta com inclinação irracional e v ∈ ρ(f̃)∩Q2,então existe x ∈ T2 ponto periódico tal que ρ(f̃ , x) = v.

    Note que é possível obter o resultado do teorema anterior da seguinte forma alternativa, usandotrabalhos recentes: como discutido anteriormente, temos que se o conjunto de rotação é um segmentode inclinação irracional, em [CT18a] foi provado que se existe v ∈ ρ(f̃) ∩ Q2, então v é um pontoextremal. Assim, aplicando um resultado de [Fra88] obtemos um ponto periódico com vetor derotação v.

    Existe um resultado geral para conjuntos de rotação que são intervalos, contudo tal teoremacarrega uma hipótese extra:

    Teorema 2.11 ([Fra95]). Seja f : T2 → T2 um homeomor�smo homotópico à identidade quepreserva área e f̃ : R2 → R2 um levantamento. Se ρ(f̃) é um intervalo e v ∈ ρ(f̃)∩Q2, então existex ∈ T2 periódico tal que v = ρ(f̃ , x)

    Outra informação relevante que o conjunto de rotação fornece é sobre a entropia de f .

    Teorema 2.12 ([LM91]). Se int(ρ(f̃)) 6= ∅, então f tem entropia topológica positiva.

    2.3 Difusão Sublinear

    Vamos agora apresentar o conceito central tratado no teorema principal deste trabalho. Primei-ramente, notemos que o conjunto de rotação mede a velocidade linear das órbitas. Mais precisa-

    mente, suponhamos que o ponto x ∈ T2, tenha vetor de rotação v, isto é, limn→∞ f̃n(x̃)−x̃n = v. Por

    de�nição, temos que dado um ε > 0, existe n0 ∈ N tal que∣∣∣∣∣ f̃n(x̃)− x̃n − v∣∣∣∣∣ < ε, ∀n ≥ n0

    e multiplicando a desigualdade por n obtemos∣∣∣f̃n(x̃)− x̃− nv∣∣∣ < nε, ∀n ≥ n0.Portanto, notando o termo nε na desigualdade, vemos como o conjunto de rotação mede a velocidademédia linear.

    Uma pergunta natural seria: existe algum tipo de velocidade menor que linear que o conjunto derotação não é capaz de detectar? Além disso, se um ponto tem vetor de rotação v, o que podemosdizer das velocidades em outras direções, como v⊥, por exemplo? As respostas dependem de comoé o conjunto ρ(f̃).

    Antes de passarmos aos casos para homeomor�smos do toro, vamos analisar qual a situaçãopara homeomor�smos do círculo. Se h : S1 → S1 é um homeomor�smo do círculo que preservaorientação, sabemos que o número de rotação está bem de�nido e não depende da escolha do pontoonde é calculado. Além disso, é possível provar que∣∣∣h̃n(z̃)− z̃ − nρ(h̃)∣∣∣ ≤ 1, ∀n ∈ N, ∀z̃ ∈ R2.Portanto, não há difusão sublinear neste caso, ou seja, a distância entre h̃n(z̃) − z̃ e nρ(h̃) �cauniformemente limitada. Intuitivamente, isso quer dizer que o conjunto de rotação captura de formasatisfatória as principais informações sobre a dinâmica de h.

    No caso do toro, comecemos de�nindo o conceito de desvio limitado.

  • 2.3 DIFUSÃO SUBLINEAR 7

    De�nição 2.13. Sejam x ∈ T2 e v ∈ R2, v 6= 0. Diremos que a órbita de x tem desvio limitado nadireção de ~v (ou não possui difusão sublinear na direção de ~v) se existe L > 0 tal que

    |〈f̃n(x̃)− x̃, v〉| < L, ∀n ∈ Z.

    Diremos ainda que f possui desvios uniformemente limitados se

    d(f̃n(x̃)− x̃, nρ(f̃)), ∀x̃ ∈ R2, ∀n ∈ Z

    Vejamos agora alguns resultados sobre difusão sublinear e propriedades similares, dependendodo tipo de conjunto de rotação.

    2.3.1 Caso I: Apenas um ponto

    Vejamos primeiramente o caso mais simples, onde o conjunto de rotação é constituído de apenasum ponto.

    De�nição 2.14. Se ρ(f̃) = {v}, diremos que f é uma pseudo-rotação.

    Se f é uma pseudo-rotação, o caso mais simples possível seria ρ(f̃) = {0}, que é conhecidocomo um homeomor�smo irrotacional. Esse é um caso onde é possível construir um exemplo queapresenta difusão sublinear. Antes de apresentarmos o enunciado, vejamos uma de�nição necessáriapara tal.

    De�nição 2.15. Seja X ⊂ R2. Diremos que X se acumula numa direção v ∈ S1 no in�nito seexiste uma sequência (xn)n∈N em X tal que

    limn→∞

    ||xn|| =∞ e limn→∞

    xn − x0||xn − x0||

    = v.

    A fronteira de X no in�nito é de�nida como o conjunto ∂∞X ⊂ S1 de todas as direções v tais queX se acumula em v no in�nito.

    O enunciado preciso é o seguinte:

    Teorema 2.16 ([KT14a]). Existe um difeomor�smo homotópico à identidade f : T2 → T2, declasse C∞ e que preserva área, com um levantamento f̃ : R2 → R2 tal que:

    (i) ρ(f̃) = {0};

    (ii) f é metricamente isomorfa à um shift de Bernoulli com respeito à medida de Lebesgue (emparticular, f é ergódica);

    (iii) Para Lebesgue quase todo ponto x̃ ∈ R2, tanto a órbita passada quanto a órbita futura de x̃ seacumulam em toda direção no in�nito, isto é,

    ∂∞{f̃n(x̃) | n ∈ N} = S1 = ∂∞{f̃−n(x̃) | n ∈ N}.

    Além disso, tanto a órbita passada quanto a órbita futura de x̃ visitam todo domínio funda-mental [0, 1]2 + v, com v ∈ Z2.

    Note que f̃ como no teorema acima possui desvio ilimitado em todas as direções.Existem resultados na direação contrária, que dão condições para a limitação das órbitas no

    caso em que ρ(f̃) = {0}. Um primeiro resultado parcial pode ser encontrado em [KT14b], e umresultado com hipóteses mais abrangentes é o seguinte:

    Teorema 2.17 ([CT18a]). Seja f : T2 → T2 um homeomor�smo homotópico à identidade tal quef preserva uma medida µ de suporte total e tal que existe f̃ : R2 → R2 um levantamento de f

  • 8 TEORIA DE ROTAÇÃO 2.3

    de forma que∫T2(f̃(x̃) − x̃) dµ = 0. Se todos os pontos periódicos de f forem contráteis e se o

    conjunto dos pontos �xos de f estiver contido em um disco topológico, então existe K > 0 tal que||f̃n(x̃)− x̃|| ≤ K, para todo n ≥ 1 e todo x̃ ∈ R2.

    Uma pergunta relacionada ao teorema anterior que permenece em aberto é se tal resultado éválido se a hipótese de preservação de uma medida de suporte total for retirada.

    No teorema anterior, um ponto periódico em T2 é dito contrátil se seu caminho da isotopia forhomotopicamente trivial em T2 (para a de�nição de caminho da isotopia, veja o Capítulo 3) ou,equivalentemente, se o vetor de rotação de tal ponto for nulo.

    Até aqui, vimos resultados tratando do caso do conjunto de rotação ser apenas o ponto 0 (noteque se ρ(f̃) = {(p/q, r/q)}, então ρ(f̃ q− (p, r)) = {0}). Vejamos agora um resultado de classi�caçãode pseudo-rotações com movimento médio limitado, que inclui o caso onde o vetor de rotação nãoé racional:

    Teorema 2.18 ([Jäg09b]). Se f é uma pseudo-rotação conservativa (isto é, existe uma medida deprobabilidade de suporte total invariante por f) com vetor de rotação ρ ∈ R2 e tal que existe c > 0de forma que ||f̃n(x̃)− x̃− nρ|| ≤ c, para todo n ∈ Z e todo x̃ ∈ R2, então vale:

    (i) ρ é totalmente irracional se e somente se f é semiconjugada à rotação por ρ;

    (ii) ρ não é totalmente irracional e nem racional se e somente se f possui um circlóide periódico

    (iii) ρ é racional se e somente se f possui um ponto periódico.

    Veja também [Jäg09a] para outros resultados sobre pseudo-rotações.

    2.3.2 Caso II: Interior não vazio

    Suponhamos agora que o interior do conjunto ρ(f̃) tenha interior não vazio. Temos aqui umaresposta completa ao problema da difusão sublinear:

    Teorema 2.19 ([CT18a]). Se int(ρ(f̃)) 6= ∅, existe L ≥ 0 tal que

    d(f̃n(x̃)− x̃, nρ(f̃)) ≤ L, ∀x̃ ∈ R2, ∀n ≥ 1.

    Ressaltamos que o resultado acima foi obtido anteriormente no caso de ρ(f̃) ser um polígononão degenerado de vértices racionais, veja [Dáv16], e no caso de f ser um difeomor�smo C1+ε, veja[AZ15].

    2.3.3 Caso III: Segmento de reta

    Vejamos agora qual tipo de resultado já foi obtido quando o conjunto de rotação é um segmentode reta. Um primeiro teorema é o seguinte:

    Teorema 2.20 ([GKT14]). Seja f : T2 → T2 é um homeomor�smo homotópico à identidade quepreserva uma medida de probabilidade boreleana de suporte total. Se f̃ : R2 → R2 é um levantamentode f tal que ρ(f̃) = {0}× [a, b], com a < b, então existe M > 0 tal que 〈f̃n(x̃)− x̃, (1, 0)〉 ≤M , paratodo x̃ ∈ R2 e todo n ∈ Z. Além disso, existe um anel essencial invariante (que é necessariamentevertical).

    Note que o teorema anterior vale para qualquer segmento com dois pontos de coordenadasracionais: de fato, se A ∈ SL(2,Z), temos que ρ(Af̃A−1) = Aρ(f̃), portanto se ρ(f̃) é um segmentocontendo dois pontos de Q2, podemos encontrar uma matriz A ∈ SL(2,Z) de forma que Aρ(f̃) sejaum segmento vertical, como no teorema anterior.

    Outro resultado mais geral desse caso é o próximo teorema.

  • 2.4 DINÂMICA ESSENCIAL 9

    Teorema 2.21 ([Dáv16]). Se ρ(f̃) é um segmento de reta contendo dois pontos racionais, entãoexistem k ∈ N, F : R2 → R2 um levantamento de fk e M > 0 tais que

    |〈Fn(x̃)− x̃, v⊥〉| ≤M, ∀x̃ ∈ R2,∀n ∈ Z,

    sendo que v é um vetor tal que ρ(f̃) = {tv +A | t ∈ [0, 1]}, para algum A ∈ R2.

    Portanto, vemos que nesse caso não existe difusão sublinear na direção ortogonal à direção dadapelo conjunto de rotação. Intuitivamente, podemos dizer que o conjunto de rotação apresenta umaboa representação da dinâmica de f .

    Existem outros trabalhos que analisam o caso em que o conjunto de rotação é um segmento dereta, sob diversos aspectos. Em [KR17], os autores demonstram uma condição necessária e su�ciente,sob determinadas hipóteses, para um homeomor�smo do toro não apresentar difusão sublinear.

    Um resultado interessante apresentado em [Koc16] é o seguinte: se f for um homeomor�smomininal cujo conjunto de rotação não é apenas um ponto, então tal homeomor�smo apresenta desviolimitado na direção perpendicular ao conjunto de rotação.

    Outro resultado interessante pode ser encontrado em [JT17], onde os autores encontram con-dições necessárias e su�cientes para um homeomor�smo do toro, sob determinadas hipóteses, sersemiconjugado a uma rotação irracional no círculo, e tais condições envolvem a inexistência dedifusão sublinear em determinadas direções.

    Outro caso possível para o conjunto de rotação é ser um segmento de reta com inclinaçãoirracional e um ponto extremal de coordenadas racionais, que será o caso tratado neste trabalho.Note que tal caso era o único que restava sem solução, entre os conjuntos de rotação que sabidamentesão realizados por algum homeomor�smo do toro. O resultado obtido é o seguinte:

    Teorema A. Suponhamos que ρ(f̃) = {t ρ0 | 0 ≤ t ≤ 1}, onde tan(ρ0) /∈ Q. Então existe M > 0tal que

    |〈f̃n(x̃)− x̃, ρ⊥0 〉| < M,

    para todo x̃ ∈ R2 e n ∈ Z.

    2.3.4 Dehn twists

    Um caso importante que não será tratado neste trabalho é o caso em que f : T2 → T2 é umhomeomor�smo homotópico à um Dehn twist (um Dehn twist é uma aplicação do tipo (x, y) 7→(x + ky mod 1, y mod 1) para algum k ∈ Z∗). É possível de�nir um conjunto de rotação verticalnesse caso, para um levantamento f̂ de f para o cilindro S1 × R, denotado por ρV (f̂). Existemresultados similares aos listados aqui, mas no contexto de Dehn twists, veja por exemplo [AZTG12].

    2.4 Dinâmica Essencial

    Vejamos agora uma ferramenta que nos auxiliará no demonstração do resultado principal destetrabalho. As referências da teoria a seguir são [KT14c] e [KT18], contudo aqui iremos apresentarapenas uma pequena parte necessária para o desenvolvimento do nosso trabalho, sendo os principaisresultados a Proposição 2.24 e o Lema 2.25.

    Comecemos com algumas de�nições:

    De�nição 2.22. Diremos que um conjunto aberto U ⊂ T2 é inessencial se todo caminho fechadocontido em U é homotopicamente trivial em T2, caso contrário, U será dito essencial. Diremosque um conjuto qualquer E ⊂ T2 é inessencial se possuir uma vizinhança inessencial. Além disso,diremos que E é totalmente essencial se T2 \ E é inessencial.

    De�nição 2.23. Seja x ∈ T2 e f : T2 → T2 um homeomor�smo homotópico a identidade. Diremosque x é um ponto inessencial de f se ∪k∈Zfk(U) é inessencial para alguma vizinhança U de x. Sex não for inessencial, diremos que x é um ponto essencial de f , ou seja, ∪k∈Zfk(U) é essencial para

  • 10 TEORIA DE ROTAÇÃO 2.4

    toda vizinhança U de x. Diremos ainda que x é um ponto totalmente essencial de f se ∪k∈Zfk(U)é totalmente essencial para toda vizinhança U de x.

    Na seguinte proposição (veja [GKT15]) a norma ||x||∞ é de�nada por ||x||∞ = max{|(x)1|, |(x)2|},onde (x)1 e (x)2 denotam a primeira e segunda coordenadas, respectivamente, de um ponto x ∈ R2.

    Proposição 2.24 ([GKT15]). Seja O ⊂ R2 um aberto conexo tal que⋃n∈Z f

    n(π(O)) é totalmenteessencial e π(O) é inessencial. Então existem M ∈ N e K ⊂ R2 compacto tais que [0, 1]2 estácontido numa componente conexa limitada de R2 \K e

    K ⊂⋃

    |i|≤M, ||v||∞≤M

    (f̃ i(O) + v

    ).

    Demonstração. Como ∪n∈Zfn(π(O)) é totalmente essencial, sua pré-imagem por π, que denotare-mos por Ũ , é um conjunto conexo de R2 invariante por translações de Z2. Assim, dado ỹ ∈ Ũ ,existem dois arcos α̃, β̃ : [0, 1] → Ũ , tais que α̃ conecta ỹ a ỹ + (1, 0) e β̃ conecta ỹ a ỹ + (0, 1).Sejam

    Γ̃α̃ =

    +∞⋃i=−∞

    ([α̃] + (i, 0)) , Γ̃β̃ =

    +∞⋃i=−∞

    ([β̃] + (0, i)

    ),

    onde [α̃] = α̃([0, 1]) e [β̃] = β̃([0, 1]), e note que, como Ũ é invariante por translações de Z2,Γ̃α̃, Γ̃β̃ ⊂ Ũ , bem como todos os translados inteiros dos dois conjuntos também estão contidos emŨ .

    Fixemos um inteiro R > max{||x|| | x ∈ [α̃] ∪ [β̃]}. Então, como max{(x)2 | x ∈ Γ̃α̃} =max{(x)2 | x ∈ [α̃]} < R e min{(x)2 | x ∈ Γ̃α̃} > −R, temos que R2 \ Γ̃α̃ possui ao menos duascomponentes conexas, uma contendo o semi-plano {x | (x)2 ≥ R} e outra contendo o semiplano{x | (x)2 ≤ −R}. Analogamente, R2\Γ̃β̃ possui ao menos duas componentes conexas, uma contendo{x | (x)1 ≥ R} e outra contendo {x | (x)1 ≤ −R}.

    Agora seja

    F = (Γ̃α̃ − (0, R)) ∪ (Γ̃α̃ + (0, R+ 1)) ∪ (Γ̃β̃ − (R, 0)) ∪ (Γ̃β̃ + (R+ 1, 0)),

    e note que F ⊂ Ũ e R2 \F possui uma componente conexa W que contém [0, 1]2 e está contida em[−2R, 2R+ 1]× [−2R, 2R+ 1].

    Seja agora K = ∂W . Assim, K é um subconjunto compacto de Ũ . Como Ũ = ∪v∈Z2 ∪i∈Z(f̃ i(O) + v) é uma cobertura por abertos de K, escolhendo uma subcobertura �nita podemosconcluir a existência de M .

    Lema 2.25. Sejam f : T2 → T2 um homeomor�smo homotópico a identidade, f̃ : R2 → R2 umlevantamento e z0 ∈ T2 um ponto recorrente tal que ρ(f̃ , z0) é totalmente irracional. Então z0 é umponto totalmente essencial de f , isto é, para todo ε > 0, o conjunto Uε =

    ⋃∞i=0 f

    i(π(B(ε, z̃0))) étotalmente essencial.

    Demonstração. Se z0 for inessencial, temos que existe ε > 0 tal que Uε =⋃∞i=0 f

    i(π(B(ε, z̃0))) éinessencial. Veja que cada componente conexa de Uε está contida em um disco topológico. Como Uεé f -invariante, temos que f permuta as componentes conexas de Uε. Assim, como z0 é recorrente,sendo U0ε a componente conexa de Uε que contém z0, temos que existe N > 0 tal que f

    N (U0ε ) = U0ε ,

    e podemos assumir que N é o primeiro instante que a igualdade ocorre (isto é, f i(U0ε )∩U0ε = ∅, se1 ≤ i < N). Assim, temos que existe w ∈ Z2 tal que f̃N (Ũ0ε ) = Ũ0ε + w, onde Ũ0ε é o levantamentode U0ε que contém z̃0. Como z0 é recorrente, temos que existe subsequência nk tal que f

    nk(z0)→ z0.Assim, existe k0 tal que se k > k0 temos que fnk(z0) ∈ U0ε . Mas como temos f i(U0ε ) ∩ U0ε = ∅, se1 ≤ i < N , temos que nk = pkN , para k > k0. Assim, temos que f̃nk(z̃0) = f̃pkN (z̃0) ∈ f̃pkN (Ũ0ε ) =Ũ0ε + pkw. Portanto, f̃

    pkN (z̃0)− pkw → z̃0, o que implica que ρ(f̃ , z0) = w/N , o que é um absurdo.Suponhamos agora que z0 seja essencial, mas não totalmente essencial, isto é, existe ε > 0 tal

    que Uε =⋃∞i=0 f

    i(π(B(ε, z̃0))) é essencial, mas não totalmente essencial. Assim, existe uma curva

  • 2.4 DINÂMICA ESSENCIAL 11

    fechada homotopicamente não trivial em T2, isto é, α : R→ T2 tal que α(t) = α(t+ 1), para todot ∈ R, [α] ⊂ Uε, e α̃ : R → R2 um levantamento de α tal que α̃(t + 1) = α̃(t) + W , para algumW ∈ Z2∗ e todo t ∈ R. Seja U0ε a componente conexa de de Uε que contém [α]. Como z0 não étotalmente essencial, temos que T2 \ U0ε também é um conjunto essencial. Como z0 é recorrente,temos que existe N ∈ N tal que fN (U0ε ) = U0ε , portanto existem f̂ : R2 → R2 levantamento de f eÛ0ε levantamento de U

    0ε tais que f̂

    N (Û0ε ) = Û0ε , e temos também que f̂

    N (R2 \ Û0ε ) = R2 \ Û0ε . ComoU0ε é essencial mas não totalmente essencial, temos que Û

    0ε é limitado na direção W

    ⊥, portantoρ(f̂) ⊂ {tW | t ∈ R}, o que é um absurdo.

  • 12 TEORIA DE ROTAÇÃO 2.4

  • Capítulo 3

    Folheação de Brouwer-Le Calvez e

    Forcing

    3.1 Homeomor�smos de Brouwer

    Ao longo deste capítulo estudaremos homeomor�smos do plano sem pontos �xos e alguns resul-tados sobre tais aplicações que serão importantes para o prosseguimento do trabalho.

    De�nição 3.1. Um homeomor�smo h : R2 → R2 que preserva a orientação e que não possui pontos�xos (h(x) 6= x,∀x ∈ R2) será chamado de homeomor�smo de Brouwer.

    Vejamos primeiramente uma de�nição que será usada ao longo do trabalho.

    De�nição 3.2. Uma linha de R2 é uma aplicação contínua φ : R → R2 injetiva e própria (isto é,se K ⊂ R2 é compacto, então φ−1(K) é compacto também).

    Pelo Teorema de Schöen�ies, temos que se φ : R → R2 é uma linha, então a função φ podeser estendida para um homeomor�smo φ∗ : R2 → R2 que preserva orientação, sendo que φ(t) =φ∗(t, 0). Assim, podemos de�nir a esquerda de φ, denotada por L(φ), como L(φ) = φ∗(R×(0,+∞)).Analogamente, de�nimos a direita de φ, denotada por R(φ), como R(φ) = φ∗(R× (−∞, 0)).

    O principal resultado sobre homeomor�mos de Brouwer é o seguinte:

    Teorema 3.3 ([Bro12]). Dados h : R2 → R2 um homeomor�smo de Brouwer e x ∈ R2, existe umalinha φ : R→ R2, com φ(0) = x, tal que h([φ]) ⊂ L(φ) e h−1([φ]) ⊂ R(φ), onde [φ] = φ(R).

    Uma linha como no teorema anterior será dita uma linha de Brouwer. Para uma demonstraçãomais recente veja também [Fra92]. Existem diversos resultados sobre homeomor�smos de Brouwerequivalentes ao Teorema 3.3. Vamos enunciar duas outras formas equivalentes abaixo.

    Teorema 3.4 ([Bro12]). Dados h : R2 → R2 homeomor�smo de Brouwer e x ∈ R2, existe U ⊂ R2aberto simplesmente conexo, com x ∈ U , tal que h|U : U → U é conjugada ao homeomor�smo doplano g(x) = x+ (1, 0).

    Um conjunto U como no Teorema 3.4 será chamado um domínio de translação. Uma outraversão de tal resultado é a seguinte:

    Teorema 3.5 ([Bro12]). Se h : R2 → R2 é um homeomor�smo de Brouwer, então todo pontox ∈ R2 é errante. Em particular, Ω(h) = ∅, onde Ω(h) é o conjunto dos pontos não-errantes de h.

    Portanto um homeomor�smo de Brouwer não possui qualquer tipo de recorrência.

    13

  • 14 FOLHEAÇÃO DE BROUWER-LE CALVEZ E FORCING 3.2

    3.2 Folheação de Brouwer-Le Calvez

    Antes de apresentarmos a ferramenta principal utilizada na demonstração do Teorema A, queserá introduzida na próxima seção, vejamos algumas de�nições e conceitos necessários para tal.

    De�nição 3.6. Seja M uma superfície orientada. Uma folheação topológica orientada com singula-ridades em M é uma folheação topológica orientada F de�nida em um subconjunto aberto de M .Tal conjunto será chamado domínio de F e será denotado por dom(F), o seu complemento será oconjunto das singularidade de F , e será denotado por sing(F).

    Como visto na seção anterior, se h : R2 → R2 é um homeomor�smo de Brouwer, por todoponto do plano passa uma linha de Brouwer. Uma pergunta natural seria: qual tipo de relaçãopodemos obter para linhas de Brouwer de pontos distintos? O próximo resultado mostra que épossível construir uma folheação topológica do plano onde cada folha é uma linha de Brouwer.

    Teorema 3.7 ([Cal05]). Sejam h : R2 → R2 um homeomor�smo de Brouwer e G um grupo discretode homeomor�smos do plano que preservam orientação, que age livremente e propriamente em R2.Se h comuta com os elementos de G, então existe F folheação G-invariante de R2 por linhas deBrouwer de h.

    Chamaremos uma folheação F como no teorema acima de uma folheação de Brouwer-Le Calvez.Observação 3.8. Evidentemente nosso interesse primário neste trabalho não serão homeomor�s-mos de Brouwer, contudo o Teorema 3.7 pode ser aplicado para homeomor�smos de superfície.Informalmente, se f : M → M é um homeomor�smo que preserva orientação (e M uma superfícieorientada), a ideia consiste em remover um subconjunto dos pontos �xos f da superfícieM , obtendoassim uma nova superfície, que denotaremos por N . Se N for conexa, seu recobrimento universalserá homeomorfo ao plano, e portanto podemos aplicar o Teorema 3.7 para o levantamento def |N , e sendo G o grupo de aplicações de recobrimento, obtemos uma folheação em R2, invariantepor G, que se projeta em uma folheação em N , e portanto obteremos assim uma folheação comsingularidades (os pontos �xos de f que retiramos) em M . Ressaltamos que essa é apenas a ideiageral da construção, alguns cuidados precisam ser tomados na hora de determinar quais pontos�xos precisam ser retirados, mas a construção completa será apresentada com detalhes na próximaseção.

    Iremos apresentar agora algumas de�nições e resultados sobre folheações que serão usadas nonosso trabalho. A referência para essa seção é [CT18a]. Denotaremos porM uma superfície orientadae F uma folheação topológica orientada (possivelmente com singularidades) de M . Denotaremostambém por φz a folha que passa pelo ponto z.

    De�nição 3.9. Um caminho emM é uma aplicação γ : I →M contínua, onde I ⊂ R é um conjuntoconexo contendo mais de dois pontos distintos. Denotaremos por [γ] a imagem de γ, de�nida como[γ] = γ(I).

    De�nição 3.10. Diremos que um caminho γ : J → dom(F) é transverso a F se para todo t ∈ Jexiste um homeomor�smo c : W → (0, 1)2, onde W é uma vizinhança de γ(t), compatível com aorientação e tal que c manda a restrição da folheação em W na folheação vertical orientada parabaixo em (0, 1)2 e π1 ◦ c ◦ γ é estritamente crescente em uma vizinhança de t, onde π1 é a projeçãona primeira coordenada.

    Intuitivamente, um caminho transverso atravessa as folhas sempre da direita para a esquerda(veja a Figura 3.1).

    Se M = R2 e F não tem singularidades, diremos que duas curvas transversas são equivalentesse elas atravessam as mesmas folhas. No caso geral, temos o seguinte:

    De�nição 3.11. Dois caminhos transversos γ : J → dom(F) e γ′ : J ′ → dom(F) são ditos equi-valentes se existem H : J × [0, 1]→ dom(F) transformação contínua e h : J → J ′ homeomor�smocrescente tais que:

  • 3.2 FOLHEAÇÃO DE BROUWER-LE CALVEZ 15

    Figura 3.1: Um caminho transverso γ

    (i) H(t, 0) = γ(t), H(t, 1) = γ′(h(t));

    (ii) ∀t ∈ J e ∀s1, s2 ∈ [0, 1], φH(t,s1) = φH(t,s2).

    Denotaremos γ ∼F γ′.

    A transformação H é dita uma homotopia holonômica. Intuitivamente, uma homotopia holonô-mica deforma um caminho preservando cada ponto em sua folha original, isto é, ela move os pontosao longo das folhas. É possível mostrar que a de�nição anterior é equivalente a existirem levanta-mentos de γ e γ′ no recobrimento universal de dom(F) que são equivalentes. Note ainda que duascurvas equivalentes atravessam as mesmas folhas, contudo tal condição não é su�ciente para duascurvas serem equivalentes (veja o contraexemplo da Figura 3 de [CT18a]).

    Observação 3.12. Note que se γ : R→ R2 é uma linha transversa, então toda folha φ que intersectaγ só pode intersectar a linha em um único ponto, e a folha φ cruza a linha γ da esquerda para adireita, isto é, se t′ ∈ R é tal que φ(t′) ∈ [γ], então φ(t) ∈ L(γ), se t < t′, e φ(t) ∈ R(γ), se t > t′.

    Dadas três linhas γi : R→ R2, i ∈ {0, 1, 2}, diremos que γ0 separa γ1 de γ2 se γ1 e γ2 estiveremcontidas em componentes conexas distintas de R2 \ [γ0].

    De�nição 3.13. Seja γi : R → R2 uma linha, com i ∈ {0, 1, 2}. Diremos que γ2 está acima de γ1com relação à γ0 se forem satisfeitos:

    (i) as três linhas são duas a duas disjuntas;

    (ii) nenhuma das linhas separa as outras duas;

    (iii) se λ1, λ2 são dois caminhos disjuntos ligando z1 = γ0(t1), z2 = γ0(t2) a z′1 ∈ [γ1], z′2 ∈ [γ2],respectivamente, e não intersectam as linhas, exceto pelos extremos, então t2 > t1.

    Vejamos agora a de�nição de intersecção F-transversal. Como antes, veremos primeiro o casoM = R2 e F sem singularidades. Note que φz denota a folha de F que passa por z.

    De�nição 3.14. Sejam γi : Ji → R2, i ∈ {1, 2}, dois caminhos transversos tais que φγ1(t1) =φγ2(t2) = φ. Diremos que γ1 intersecta F-transversalmente γ2 em φ se existem a1, b1 ∈ J1 coma1 < t1 < b1 e a2, b2 ∈ J2 com a2 < t2 < b2 tais que

    (i) φγ2(a2) está abaixo de φγ1(a1) com relação à φ;

    (ii) φγ2(b2) está acima de φγ1(b1) com relação à φ.

    Nesse caso, denotaremos γ1|[a1,b1] tF γ2|[a2,b2].

  • 16 FOLHEAÇÃO DE BROUWER-LE CALVEZ E FORCING 3.2

    Figura 3.2: γ2 acima de γ1 com respeito à γ0

    No caso geral, diremos que dois caminhos transversos se intersectam F-transversalmente seexistem levantamentos dos caminhos e da folha onde ocorre a intersecção para o recobrimentouniversal, e tais levantamentos satisfazem a de�nição anterior. Quando não houver possibilidadede confusão, diremos simplesmente que dois caminhos transversos se intersectam transversalmente.No caso de um caminho γ intersectar transversalmente a si mesmo, diremos que γ posui umaautointersecção transversa.

    Figura 3.3: γ1 e γ2 com intersecção F-transversa

    Note que se γ1|I1 tF γ2|I2 e γ2|I2 ∼F γ3|I3 , temos que γ1|I1 tF γ3|I3 . Note ainda que se

  • 3.3 FORCING 17

    γ1|I1 tF γ2|I2 em φ não temos necessariamente que γ1 e γ2 se intersectam em um ponto de φ.Contudo, γ1|I1 e γ2|I2 possuem ao menos um ponto de intersecção. Além disso, quando M = R2,é possível encontrar caminhos γ′1 ∼F γ1|I1 e γ′2 ∼F γ2|I2 tais que γ′1 e γ′2 possuem exatamente umponto de intersecção e tal ponto está na folha φ.

    3.3 Forcing

    Sejam agora M uma superfície orientada, f : M → M um homeomor�smo isotópico à iden-tidade, e denotemos por I o espaço das isotopias entre f e a identidade, isto é, se I ∈ I, temosque I = (ft)t∈[0,1], onde f0 = IdM , f1 = f , para todo t ∈ [0, 1] temos que ft é homeomor�smo deM e I é uma curva contínua no espaço dos homeomor�smos de M , munido com a topologia daconvergência uniforme em subconjuntos compactos. A trajetória de um ponto z ∈ M é de�nidacomo o caminho t 7→ ft(z), que denotaremos por I(z). Usando concatenação de caminhos, podemosde�nir, para n ∈ N,

    In(z) = Π0≤k

  • 18 FOLHEAÇÃO DE BROUWER-LE CALVEZ E FORCING 3.3

    Teorema 3.17 ([Cal05]). Sendo I uma isotopia maximal, existe uma folheação topológica com sin-gularidades F , com dom(F) = dom(I) tal que para todo z ∈ dom(I) a trajetória I(z) é homotópicaem dom(I) com extremos �xos a um caminho transverso a F , e esse caminho é único a menos deequivalência.

    Denotaremos por IF (z) a classe de caminhos transversos que ligam z a f(z) e que são homotó-picos a I(z) em dom(I) com extremos �xos. Denotaremos ainda

    InF (z) = Π0≤k

  • 3.3 FORCING 19

    Na demonstração do resultado principal deste trabalho, uma propriedade importante que usa-remos com constância é o fato que pontos típicos de medidas ergódicas são recorrentes (um ponto édito recorrente quando existe uma subsequência de sua órbita que converge para tal ponto). Vamosapresentar agora uma de�nição análoga para caminhos transversos.

    De�nição 3.24. Um caminho transverso γ : R → M será chamado F-recorrente se para todosegmento compacto J ⊂ R e todo t ∈ R existirem segmentos J ′ ⊂ (−∞, t] e J ′′ ⊂ [t,+∞) tais queγ|J ′ ∼F γ|J e γ|J ′′ ∼F γ|J .

    Uma importante consequência do Lema 3.23 é a seguinte, que conecta os conceitos de pontosrecorrentes e caminhos transversos recorrentes.

    Corolário 3.25 ([CT18a]). Se z ∈ dom(I) é um ponto recorrente de f , então IZF (z) é F-recorrente.

    A próxima proposição técnica também nos será útil na demonstração do resultado principal dotrabalho.

    Proposição 3.26 ([CT18a]). Sejam f : T2 → T2 um homeomor�smo isotópico à identidade,f̃ : R2 → R2 um levantamento de f e suponhamos que ρ(f̃) = {tρ0 | 0 ≤ t ≤ 1}, onde tan(ρ0) /∈ Q.Então existe um ponto ỹ0 ∈ dom(F̃) tal que para todo � ∈ {−1, 1} existe uma sequência (pl, ql)l≥0em Z2 × N satisfazendo:

    liml→+∞

    ql = +∞, liml→+∞

    f̃ ql(ỹ0)− ỹ0 − pl = 0, �〈pl, ρ⊥0 〉 > 0

    e existe uma sequência (p′l, q′l)l≥0 em Z2 × N satisfazendo:

    liml→+∞

    q′l = +∞, liml→+∞

    f̃−q′l(ỹ0)− ỹ0 − p′l = 0, �〈p′l, ρ⊥0 〉 > 0.

    Observação 3.27. Note que pela construção feita na demonstração da Proposição anterior (o Lema77 em [CT18a]), é possível obter que ρ(f̃ , y0) = ρ0, onde y0 = π(ỹ0)

    O próximo teorema é um importante resultado sobre a realização de vetores de rotação, que nospermite relacionar os conceitos de forcing e teoria de rotação.

    Teorema 3.28 ([CT18b]). Seja M uma superfície orientada, f um homeomor�smo de M isotópicoà identidade, I uma isotopia maximal de f e F uma folheação transersa à I. Suponha que γ : [a, b]→dom(I) é um caminho admissível de ordem r com uma autointersecção transversa em γ(s) = γ(t),onde s < t. Sejam γ̃ um levantamento de γ para o recobrimento universal d̃om(I) de dom(I) eT uma aplicação de recobrimento tais que γ̃ e T (γ̃) possuem uma intersecção F̃-transversa emγ̃(t) = T (γ̃)(s). Seja f̃ o levantamento de f |dom(I) para d̃om(I), e f̂ o homeomor�smo do espaçode recobrimento anular d̂om(I) = d̃om(I)/T levantado por f̃ . Temos então o seguinte:

    (i) Para todo número racional p/q ∈ (0, 1], escrito em forma irredutível, existe um ponto z̃ ∈d̃om(I) tal que f̃ qr(z̃) = T p(z̃) e ĨZF̃ (z̃) é equivalente a Πk∈ZT

    k(γ̃|[s,t]);

    (ii) Para todo número irracional λ ∈ [0, 1/r], existe um conjunto compacto Ẑρ ⊂ d̂om(I) invariantepor f̂ , tal que todo ponto ẑ ∈ Ẑρ possui número de rotação ρ(f̃ , z̃) = λ. Além disso, sez̃ ∈ d̃om(I) é um levantamento de ẑ, então ĨZF̃ (z̃) é equivalente a Πk∈ZT

    k(γ̃|[s,t]).

  • 20 FOLHEAÇÃO DE BROUWER-LE CALVEZ E FORCING 3.3

  • Capítulo 4

    Difusão sublinear

    4.1 Enunciado do problema

    Seja f : T2 → T2 um homeomor�smo do toro isotópico à identidade, f̃ : R2 → R2 um levanta-mento de f e π : R2 → T2 a aplicação de recobrimento.

    Suponhamos que ρ(f̃) = {tρ0 | 0 ≤ t ≤ 1}, onde tan(ρ0) /∈ Q. Denotando por (x)1 e (x)2a primeira e segunda coordenadas, respectivamente, de um ponto x ∈ R2, se ρ0 = ((ρ0)1, (ρ0)2),denotaremos ρ⊥0 = (−(ρ0)2, (ρ0)1).

    Queremos provar o seguinte:

    Teorema A. Nas condições acima, existe M > 0 tal que

    |〈f̃n(z̃)− z̃, ρ⊥0 〉| < M,

    para todo z̃ ∈ R2 e n ∈ Z.

    4.2 Demonstração do Teorema A

    Fixemos uma isotopia I : T2 × [0, 1] → T2 entre f e a identidade, tal que �x(I) 6= ∅, e Ĩ :R2 × [0, 1]→ R2 o levantamento de I tal que �x(Ĩ) 6= ∅. Pelo Teorema 3.16, podemos assumir queI é maximal. Seja F a folheação de T2 dada pelo Teorema 3.17, e F̃ seu levantamento para R2.Seja também µ0 uma medida ergódica associada ao vetor de rotação ρ0, e �xemos z0 um pontotípico de µ0 e z̃0 um levantamento de z0. Como µ0 é ergódica, podemos assumir que z0 é recorrente.Suponhamos ainda que ρ0 está no primeiro quadrante (os outros casos são análogos).

    Lema 4.1. Existem linhas F̃-transversas α−, α+ : R → R2 e v−, v+ ∈ Z2 tais que α−(t + 1) =α−(t) + v−, α+(t + 1) = α+(t) + v+, para todo t ∈ R, 〈v−, ρ⊥0 〉 < 0, 〈v−, ρ0〉 > 0, 〈v+, ρ⊥0 〉 > 0 e〈v+, ρ0〉 > 0.

    Demonstração. Vamos começar construindo α+ e v+. Sejam ỹ0 e (pl, ql)l≥0 dados pela Proposição3.26 tais que liml→+∞ ql = +∞, liml→+∞(f̃ ql(ỹ0)− ỹ0−pl) = 0 e 〈pl, ρ⊥0 〉 > 0. Fixemos α0 ∈ ĨF̃ (ỹ0).Sejam V0 ⊂ R2 uma vizinhança tubular de ỹ0 e h0 : V0 → (0, 1)2 um homeomor�smo que mapeiaa folheação em V0 na folheação vertical orientada para baixo em (0, 1)2 tais que (h0([α0] ∩ V0))1 =[(h0(ỹ0))1, 1) (isto é, h(α0 ∩ V0) cruza todas as folhas em (0, 1)2 à direita da folha que passa porh0(ỹ0)). Seja também ε > 0 tal que B(ε, ỹ0) ⊂ V0. Pela Observação 3.27 temos que ρ(f̃ , ỹ0) =ρ0, portanto existe l0 ∈ N tal que para l ≥ l0 temos 〈pl, ρ0〉 > 0. Pela Proposição 3.26 temosliml→+∞(f̃

    ql(ỹ0)− ỹ0 − pl) = 0, assim existe l1 > 0 tal que f̃ ql(ỹ0)− pl ∈ B(ε, ỹ0) e 〈pl, ρ⊥0 〉 > 0, sel ≥ l1. Sendo l′ = max{l0, l1}, vamos denotar N = ql′ e v+ = pl′ .

    Consideremos agora αN ∈ ĨNF̃ (ỹ0) tal que [α0] ⊂ [αN ] e αN é parametrizada por [0, 1]. Temosque, como f̃N (ỹ0) − v+ ∈ B(ε, ỹ0), f̃N (ỹ0) − v+ ∈ V0, portanto podemos modi�car αN em V0 deforma a obter um caminho transverso α′N : [0, 1] → R2 de forma que αN e α′N coincidem fora de

    21

  • 22 DIFUSÃO SUBLINEAR 4.2

    Figura 4.1: Ilustração do Lema 4.1

    V0 e α′N (0) = f̃N (ỹ0) − v+ (para modi�car αN em V0, basta modi�car h0(αN ∩ V0) em (0, 1)2 e

    levar de volta para V0 usando h−10 , veja a Figura 4.2). Agora, de�namos α′+ = Πk∈Z(α

    ′N + kv+).

    Como α′+ é um caminho transverso, se α′+ possui autointersecção, isto é, se α

    ′+(s) = α

    ′+(t), com

    s < t, podemos remover o trecho α′+|(s,t] e reparametrizar da forma adequada, obtendo assim umnovo caminho, que denotaramos por α+. Assim podemos assumir que α+ é um caminho simples eportanto, pela construção feita, temos que α+ é uma linha que satisfaz as condições pedidas.

    Figura 4.2: Construção de α′N

    A construção de α− e v− é análoga, usando a Proposição 3.26 com � = −1.

    Lema 4.2. Existe L0 > 0 tal que, para todo x̃ ∈ R2 \ sing(F̃) existe um caminho transversoγ̃x̃ ∈ ĨF̃ (x̃), tal que diam(γ̃x̃) < L0.

  • 4.2 DEMONSTRAÇÃO DO TEOREMA A 23

    Demonstração. Primeiramente, notemos que basta provar o resultado para pontos em [0, 1]2, já queĨF̃ (x̃ + w) = ĨF̃ (x̃) + w para todo x̃ ∈ R

    2 e todo w ∈ Z2. Agora, pela continuidade da isotopia Ĩ,temos que existe L > 0 tal que Ĩ([0, 1]2 × [0, 1]) ⊂ B(L, 0), ou seja, para todo ponto x̃ ∈ [0, 1]2 ocaminho da isotopia Ĩ(x̃) está contido em B(L, 0).

    Sejam agora as linhas transversas α+ e α− dados pelo Lema 4.1, e sejam também v1, v2, v3, v4 ∈Z2 de forma que B(L, 0) está contido em uma componente conexa limitada de R2 \ ([α+ + v1] ∪[α−+ v2]∪ [α+ + v3]∪ [α−+ v4]), que denotaremos por U , e U ⊂ R(α+ + v1)∩R(α−+ v2)∩L(α+ +v3) ∩ L(α− + v4) (veja a Figura 4.3).

    Figura 4.3: Ilustração do conjunto U

    A�rmamos que se φ é uma folha de F̃ que intersecta U , então [φ] ∩ U é conexo (ou seja, umsegmento de φ). De fato, pela Observação 3.12, como α+ e α− (bem como seus transladados) sãolinhas transversas, temos que a folha φ cruza cada linha no máximo uma vez, e sempre da esquerdapara a direita da linha. Sejam agora t1 < t2 tais que φ(ti) ∈ U . Note que para provarmos que[φ] ∩ U é conexo basta provarmos que φ(t) ∈ U , para todo t1 < t < t2. Como φ(t1) ∈ U e t > t1,temos que φ(t) ∈ R(α+ + v1) e φ(t) ∈ R(α− + v2). Analogamente, como φ(t2) ∈ U e t < t2, temosque φ(t) ∈ L(α+ + v3) e φ(t) ∈ L(α− + v4). Assim, φ(t) ∈ R(α+ + v1) ∩ R(α− + v2) ∩ L(α+ +v3) ∩ L(α− + v4). Além disso, como φ(t1) e φ(t2) estão em U , temos que nenhum ponto de φ|[t1,t2]intersecta [α+ + v1] ∪ [α− + v2] ∪ [α+ + v3] ∪ [α− + v4]. Portanto φ(t) ∈ U , provando assim que[φ] ∩ U é conexo.

    Sejam d̂om(Ĩ) o recobrimento universal de dom(Ĩ), π̂ : d̂om(Ĩ) → dom(Ĩ) a aplicação de re-cobrimento, Î um levantamento de Ĩ|

    dom(Ĩ) para d̂om(Ĩ) e F̂ o levantamento da folheação F̃ parad̂om(Ĩ). Como I é maximal, temos que Ĩ é maximal, e portanto f̂ : d̂om(Ĩ)→ d̂om(Ĩ) é um home-omor�smo de Brouwer, onde f̂ é o levantamento natural de f̃ |

    dom(Ĩ). Fixemos agora x̃ ∈ [0, 1]2 tal

    que x̃ /∈ sing(F̃) e x̂ ∈ d̂om(Ĩ) um levantamento de x̃. Sendo Φ(x̂) = {φ ∈ F̂| x̂ ∈ R(φ) e f̂(x̂) ∈L(φ)} ∪ {φx̂, φf̂(x̂)}, note que Φ(x̂) é o conjunto das folhas que intersectam a trajetória transversaÎF̂ (x̂), e além disso, Φ(x̂) é totalmente ordenado pela relação φ1 < φ2 se R(φ1) ⊂ R(φ2), pois f̂ éum homeomor�smo de Brouwer e as folhas de F̂ são linhas de Brouwer. Usando tal ordem, podemosparametrizar Φ(x̂) por um parâmetro s ∈ [0, 1] de forma que φ0 = φx̂ e φ1 = φf̂(x̂).

  • 24 DIFUSÃO SUBLINEAR 4.2

    Denotando o caminho da isotopia Î(x̂) : [0, 1] → d̂om(Ĩ) por β̂, podemos de�nir as seguintesfunções do parâmetro s

    t−(s) =

    {0, se s = 0

    inf{t ∈ [0, 1] | β̂([t, 1]) ∩R(φs) = ∅}, se s ∈ (0, 1]

    e

    t+(s) =

    {inf{t ∈ [0, 1] | β̂([t, 1]) ⊂ L(φs)}, se s ∈ [0, 1)1, se s = 1.

    Intuitivamente, t−(s) é o instante que β̂ esteve do lado direito de φs pela última vez, e t+(s) éo primeiro instante em que β̂ �ca sempre do lado esquerdo de φs. Note que, se s1 < s2, entãot−(s1) ≤ t+(s1) < t−(s2) ≤ t+(s2). Portanto temos que t− e t+ coincidem, exceto possivelmentenum conjunto enumerável de descontinuidades. Contudo, note ainda que se enumerarmos os pontosde descontinuidade como (si)i∈N, temos que

    ∑di ≤ 1, onde di = t+(si)− t−(si) (pois t±([0, 1]) ⊂

    [0, 1]).Agora vamos de�nir um caminho γ∗x̂ : [0, 1] → d̂om(Ĩ) que será transverso exceto nas descon-

    tinuidades de t− e t+ da seguinte forma: fazemos γ∗x̂ ser igual a β̂ nos pontos onde t−(s) = t+(s)e nos pontos onde t−(s) 6= t+(s) fazemos γ∗x̂ ser igual ao segmento da folha φs que liga os pontosβ̂(t−(s)) e β̂(t+(s)) (veja a Figura 4.4).

    Figura 4.4: Ilustração das curvas β̂ e γ∗x̂

    Agora, como γ∗x̂ é composto por pontos de folhas ou segmentos de folhas, temos que paracada s ∈ [0, 1] podemos encontrar Vs uma vizinhança tubular do ponto (ou segmento) de γ∗x̂ queintersecta a folha φs e εs ∈ (0, 1) de forma que Vs ⊂ B(εs, [γ∗x̂] ∩ [φs]). Assim, [γ∗x̂] ⊂ ∪s∈[0,1]Vs,e por compacidade temos [γ∗x̂] ⊂ ∪kj=0Vsj ⊂ ∪kj=0B(εsj , [γ∗x̂] ∩ [φsj ]), para algum k ∈ N (note queo diâmetro de B(εsj , [γ

    ∗x̂] ∩ [φsj ]) é uniformemente limitado, mesmo para os valores de sj tais que

    [γ∗x̂] ∩ [φsj ] é um segmento de folha, pois∑di ≤ 1). Assim, podemos particionar o intervalo [0, 1]

    em uma quantidade �nita de subintervalos fechados e modi�car γ∗x̂ em cada intervalo, dentro dasvizinhanças tubulares, mantendo os extremos dos intervalos �xos, de forma a obtermos um caminhotransverso γx̂ tal que [γx̂] ⊂ ∪kj=0B(εsj , [γ∗x̂] ∩ [φsj ]) (veja a Figura 4.5) .

    Note agora que como π̂(β̂) = Ĩ(x̃) está contido em U e, se φ é uma folha de F̃ , então

  • 4.2 DEMONSTRAÇÃO DO TEOREMA A 25

    Figura 4.5: Modi�cação de γ∗x̂ em γx̂

    [φ] ∩ U é conexo, então π̂(γ∗x̂) também está contido em U . Portanto, π̂(∪kj=0B(εsj , [γ∗x̂] ∩ [φsj ])) ⊂B(max{εsj}, U) ⊂ B(1, U), e portanto, denotanto π̂(γx̂) = γ̃x̃, temos que γ̃x̃ ⊂ B(1, U) e γ̃x̃ ∈ ĨF̃ (x̃).Como U é limitado, temos assim que existe L0 > 0 tal que diam(γ̃x̃) < L0, provando o resultado.

    Denotaremos por γ̃0 um representante de ĨZF̃ (z̃0) que passa por z̃0 e [γ̃0] sua imagem. Usando

    o Lema 4.2, podemos assumir que para cada n ∈ Z, o segmento de γ̃0 entre f̃n(z̃0) e f̃n+1(z̃0)tem diâmetro menor que L0. Podemos assumir ainda que γ̃0 está parametrizada de forma queγ̃0(n) = f̃

    n(z̃0), para todo n ∈ Z.

    De�nição 4.3. Seja v ∈ R2 um vetor unitário tal que v 6= ρ0 e v 6= ρ⊥0 , e denotemos por vs ovetor simétrico a v com respeito à direção de ρ0 (isto é, 〈vs, ρ0〉 = 〈v, ρ0〉 e 〈vs, ρ⊥0 〉 = −〈v, ρ⊥0 〉).Denotemos agora as retas geradas por v e vs que passam por z̃0 por rv e rvs (isto é, rv(t) = z̃0 + tv,para t ∈ R). Temos que R2 \ ([rv] ∪ [rvs ]) possui quatro componentes conexas, e denotemos por C1e C2 as componentes que intersectam a reta gerada por ρ0 que passa por z̃0. Chamaremos de conegerado por ρ0 com incliação v e origem z̃0 ao fecho de C1 ∪ C2, e denotaremos tal conjunto porCρ0z̃0 (v) (veja Figura 4.6).

    Note que na De�nição 4.3 temos que ∂(Cρ0z̃0 (v)) = [rv] ∪ [rvs ]No próximo lema denotaremos por B(L0, A) = ∪x̃∈AB(L0, x̃), onde A ⊂ R2.

    Lema 4.4. Dado v ∈ R2 como na De�nição 4.3, existe L1 > 0 tal que [γ̃0] ⊂ B(L0, Cρ0z̃0 (v)) ∪B(L1, z̃0), onde L0 é dado pelo Lema 4.2.

    Demonstração. Primeiramente, consideremos as retas rv e rvs , como na De�nição 4.3. Denotandopor d(rv, x) a distância entre a reta rv e o ponto x̃, temos que dn = d(rv, nρ0+z̃0) = d(rvs , nρ0+z̃0) =n||〈ρ0, v〉v − ρ0||, para n ∈ Z. Note que B(dn, nρ0 + z̃0) ⊂ Cρ0z̃0 (v).

    Temos que limn→∞f̃n(z̃0)−z̃0

    n = ρ0. Assim, fazendo ε = ||〈ρ0, v〉v − ρ0||, existe n1 > 0 tal que

    d(f̃n(z̃0), nρ0 + z̃0) = ||f̃n(z̃0)− z̃0 − nρ0||< nε = n||〈ρ0, v〉v − ρ0|| = d(rv, nρ0 + z̃0), ∀n ≥ n1

  • 26 DIFUSÃO SUBLINEAR 4.2

    Figura 4.6: Ilustração do cone Cρ0z̃0 (v)

    Procedendo de forma análoga para f̃−1, obtemos

    d(f̃−n(z̃0),−nρ0 + z̃0) = ||f̃−n(z̃0)− z̃0 − n(−ρ0)||< nε = n||〈ρ0, v〉v − ρ0|| = d(rv, nρ0 + z̃0), ∀n ≥ n2.

    Assim, fazendo n0 = max{n1, n2}, temos que d(f̃n(z̃0), nρ0 + z̃0) < dn = d(rv, nρ0 + z̃0), e comoB(dn, nρ0 + z̃0) ⊂ Cρ0z̃0 (v), temos que f̃

    n(z̃0) ∈ Cρ0z̃0 (v), para |n| ≥ n0 (veja a Figura 4.7).Por construção, temos que o diâmetro do segmento de γ̃0 entre f̃n(z̃0) e f̃n+1(z̃0) é menor que

    L0, assim temos que para |n| ≥ n0 tal segmento está contido em B(L0, Cρ0z̃0 (v)).Para n tal que |n| < n0, temos que f̃n(z̃0) pode estar fora do cone, mas como tais pontos existem

    apenas em quantidade �nita, temos que existe L′ > 0 tal que ||f̃n(z̃0) − z̃0|| < L′, para |n| < n0.Novamente, como cada segmento de γ̃0 tem diâmetro limitado por L0, temos que os segmentos deγ̃0 entre f̃n(z̃0) e f̃n+1(z̃0), com |n| < n0, estão contidos em B(L1, z̃0), onde L1 = L′ + L0.

    Lema 4.5. Se α̃ : [a, b] → R2 é um caminho admissível para f̃ , não existe w ∈ Z2∗ tal que α̃ tF̃(α̃+ w).

    Demonstração. Suponhamos que existem w ∈ Z2∗ e α̃ : [a, b] → R2 um caminho r-admissível taisque α tF̃ (α̃ + w). Dessa forma, temos pelo Teorema 3.28 que dado p/q ∈ (0, 1] escrito em formairredutível, f possuirá ponto periódico com vetor de rotação igual a pqr ·w, o que é um absurdo poisρ(f̃) ∩Q2 = {(0, 0)}.

    Lema 4.6. Não existe w ∈ Z2 tal que γ̃0 tF̃ (γ̃0 + w).

    Demonstração. Se w 6= 0, o resultado é consequência direta do Lema 4.5. Para w = 0, suponhamospor absurdo que γ̃0 possua uma autointersecção transversa. Assim, temos que existem intervalos

  • 4.2 DEMONSTRAÇÃO DO TEOREMA A 27

    Figura 4.7: Ilustração de f̃n(z̃0) ∈ Cρ0z̃0 (v)

    I, J ⊂ R tais que γ̃0|I tF̃ γ̃0|J . Podemos supor que I ⊂ (−N,N), para algum N ∈ N. Agoranotemos que, como z0 é recorrente, existem nk ∈ N e wk ∈ Z2 tais que f̃nk(z̃0) → z̃0 + wk ou,equivalentemente, f̃nk(z̃0)− wk → z̃0, e portanto f̃−N+nk(z̃0)− wk → f̃−N (z̃0). Além disso, comoρ(f, z0) = ρ0, temos que wk/nk → ρ0 e portanto existe k0 tal que wk 6= 0 se k > k0.

    Vejamos agora que, pela forma como γ̃0 foi parametrizada, temos que γ̃0(−N) = f̃−N (z̃0) eγ̃0(N) = f̃

    N (z̃0), e portanto γ̃0|[−N,N ] = Ĩ2NF̃ (f̃−N (z̃0)). Como f̃−N+nk(z̃0) − wk → f̃−N (z̃0), pelo

    Lema 3.23 temos que se k′ for su�cientemente grande, Ĩ2NF̃ (f̃−N (z̃0)) é equivalente a um subcaminho

    de Ĩ2N+2F̃ (f̃−1(f̃−N+nk′ (z̃0)− wk′)). Mas

    Ĩ2N+2F̃ (f̃−1(f̃−N+nk′ (z̃0)− wk′)) = Ĩ2N+2F̃ (f̃

    −N−1+nk′ (z̃0)− wk′)

    = (γ̃0 − wk′)|[−N−1+nk′ ,N+1+nk′ ]

    e podemos supor também que k′ > k0. Assim, existe I ′ ⊂ [−N − 1 + nk′ , N + 1 + nk′ ] tal que(γ̃0−wk′)|I′ ∼F̃ γ̃0|[−N,N ]. Como I ⊂ [−N,N ], temos que existe I

    ′′ ⊂ I ′ tal que (γ̃0−wk′)|I′′ ∼F̃ γ̃0|I ,mas γ̃0|I tF̃ γ̃0|J , portanto (γ̃0−wk′)|I′ tF̃ γ̃0|J , e dado que k

    ′ > k0, temos wk′ 6= 0, e assim obtemosum absurdo, pelo Lema 4.5.

    Lema 4.7. γ̃0 intersecta cada folha no máximo uma vez.

    Demonstração. Suponhamos, por absurdo, que existem t′ < t′′ tais que φγ̃0(t′) = φγ̃0(t′′). Portantotemos que γ̃0|[t′,t′′] é F̃-equivalente a uma curva transversa e fechada Γ. Mas como Γ possui algumsubcaminho Γ0 : J → R2 que é uma curva transversa, fechada e simples, temos que γ̃0 possuium subcaminho F̃-equivalente a Γ0. Como γ̃0 não possui autointersecção transversa, segue daProposição 20 de [CT18b] temos:

    (i)⋃s∈J [φΓ0(s)] = AΓ0 é um anel topológico aberto;

  • 28 DIFUSÃO SUBLINEAR 4.2

    (ii) {t ∈ R | γ̃0(t) ∈ AΓ0} é um intervalo, que denotaremos por I = (a, b), não necessariamentelimitado;

    (iii) se −∞ < a < b < +∞, então γ̃0(t′) e γ̃0(t′′) não podem ambas pertencerem a componentesconexas ilimitadas R2 \AΓ0 .

    Como z0 é recorrente e tem vetor de rotação ρ temos, como na prova do Lema 4.6, que existemtk → +∞, w+k ∈ Z

    2, com ||w+k || → +∞ e sk → +∞, v−k ∈ Z

    2, com ||v−k || → +∞ tais queγ̃0(tk) ∈ AΓ0 +w+k e γ̃0(sk) ∈ AΓ0 +v

    −k . Primeiramente notemos que, como Γ é uma curva transversa,

    fechada e simples, toda folha φ que intersecta Γ0 o faz em apenas um ponto. Disto segue queou toda folha que intersecta Γ tem seu ω-limite contido na componente conexa limitada do seucomplementar, ou então toda folha que intersecta Γ0 tem seu α-limite contido na componente conexalimitada do seu complementar. Iremos assumir, sem perda de generalidade, que a primeira situaçãoocorre, sendo que o segundo caso é tratado de forma análoga. Mas pela invariância da folheação portranslações inteiras segue que uma propriedade análoga vale para as folhas que intersectam Γ0 +w,para vetores inteiros w. Temos portanto que, se [φ] ⊂ AΓ0 e [Γ0 + w] ∩ [Γ0] = ∅, então temos que[φ] ∩ AΓ0 + w = ∅, pois o ω-limite de uma folha na intersecção estaria contido em dois conjuntosdisjuntos.

    Assim, para k grande o su�ciente, como [Γ0+w+k ]∩[Γ0] = ∅, temos que φγ̃0(tk) está contida numacomponente conexa ilimitada de R2 \AΓ0 , e o mesmo vale para φγ̃0(sk). Assim, pela Proposição 20de [CT18b], temos que γ̃0 possui autointersecção transversa, o que é um absurdo.

    Corolário 4.8. γ̃0 é uma linha.

    Demonstração. Pelo Lema 4.7 temos que γ̃0 é um caminho simples, e como ||f̃n(z̃0)|| converge parain�nito quando n→ ±∞ temos o resultado.

    Portanto, como γ̃0 é uma linha, estão bem de�nidos os conjuntos L(γ̃0), R(γ̃0), l(γ̃0) e r(γ̃0).

    Lema 4.9. Seja A uma componente conexa de r(γ̃0) (ou l(γ̃0)). Então A é um conjunto ilimitado.

    Demonstração. Pelo Lema 4.7 , temos que γ̃0 é uma linha e cruza cada folha no máximo uma únicavez. Assim, o conjunto

    ⋃t∈R[φγ̃0(t)] das folhas que passam por γ̃0 é homeomorfo a R2 e portanto

    simplesmente conexo. Logo, todas as componentes conexas do complementar de tal conjunto sãoilimitadas.

    Lema 4.10. Se K ⊂ R2 é compacto, então o conjunto IK = {t ∈ R | [φγ̃0(t)] ∩K 6= ∅} também écompacto

    Demonstração. Sejam φ uma folha tal que φ(s̄) ∈ K, para algum s̄ ∈ R, e V w− , V w+ ∈ Z2 tais queK ⊂ R(α− + V w− ) e K ⊂ L(α+ + V w+ ) (veja a Figura 4.8), sendo α− e α+ as linhas transversasdadas pelo Lema 4.1 (note que podemos encontrar tais linhas pois K é compacto, e portantolimitado). Temos então que φ(s̄) ∈ R(α− + V w− ) ∩ L(α+ + V w+ ), e portanto, pela Observação 3.12,φ(s) ∈ R(α− + V w− ), para todo s > s̄, e φ(s) ∈ L(α+ + V w+ ), para todo s < s̄, isto é, [φ] ⊂R(α− + V

    w− ) ∪ L(α+ + V w+ ). Contudo, como α− tem vetor diretor v− tal que 〈v−, ρ⊥0 〉 < 0 e

    〈v−, ρ0〉 > 0 (e α+ tem vetor diretor v+ tal que 〈v+, ρ⊥0 〉 > 0 e 〈v+, ρ0〉 > 0) e, pelo Lema 4.4,[γ̃0 +w] está contido em B(L0, C

    ρ0z̃0

    (v) +w)∪B(L1, z̃0 +w), onde o cone Cρ0z̃0 (v) é gerado por ρ0 e vé um vetor unitário tal que 〈v, ρ0〉 > 0 e 0 < 〈v, ρ⊥0 〉 < 〈v+, ρ⊥0 〉, temos que existe t̄ = max{t ∈ R |(γ̃0 +w)(t) ∈ R(α−+V w− )∪L(α+ +V w+ )}, e assim φ só pode cruzar γ̃0 +w antes de t̄. Procedendo deforma simétrica podemos obter um limitante inferior para o instante em que φ pode cruzar γ̃0 +w,provando assim a a�rmação.

    Corolário 4.11. Sejam ζ : [a, b] → R2 um caminho transverso e w ∈ Z2. Se [ζ] ∩ l(γ̃0 + w) 6= ∅ e[ζ] ∩ r(γ̃0 + w) 6= ∅, então ζ tF̃ (γ̃0 + w).

  • 4.2 DEMONSTRAÇÃO DO TEOREMA A 29

    Figura 4.8: Demonstração do Lema 4.10

    Demonstração. Pela Proposição 3.22, basta provar que o conjunto Iζ = {t ∈ R | φ(γ̃0+w)(t) cruza ζ}é compacto. Mas isso segue diretamente do Lema 4.10.

    Lema 4.12. Se γ̃′ : R→ R2 é tal que γ̃′ ∼F̃ γ̃0, então γ̃′ é uma linha.

    Demonstração. Pelo Lema 4.7, como γ̃′ ∼F̃ γ̃0, temos que γ̃′ intersecta cada folha no máximo uma

    vez, portanto γ̃′ é uma curva simples. Agora seja K ⊂ R2 um conjunto compacto. Como γ̃′ ∼F̃ γ̃0,temos que existe uma reparametrização de γ̃′ de forma que φγ̃0(t) = φγ̃′(t), para todo t ∈ R. Noteainda que γ̃′ ser própria é uma propriedade que não depende da parametrização da mesma. Assim,pelo Lema 4.10, temos que existe M > 0 de forma que φγ̃′(t) ∩K = ∅, para todo |t| > M . Assim, set′ ∈ (γ̃′)−1(K), temos que |t′| < M , e assim temos que γ̃′ é uma curva própria, provando o lema.

    Lema 4.13. Dado w ∈ Z2∗, se γ̃0 e γ̃0+w intersectam uma mesma folha φ, então existem sequênciast+k , s

    +k ↗ +∞, t

    −k , s

    −k ↘ −∞ e curvas transversas γ̃

    ′i : R→ R2, i = 1, 2 tais que:

    (i) γ̃′1 ∼F̃ γ̃0 e γ̃′2 ∼F̃ γ̃0 + w;

    (ii) γ̃′1(t+k ) = γ̃

    ′2(s

    +k ) e γ̃

    ′1(t−k ) = γ̃

    ′2(s−k ), para todo k ∈ N.

    Demonstração. Como γ̃0 é recorrente, podemos encontrar sequências t+k , s+k ↗ +∞, tais que γ̃0(t

    +k )

    e (γ̃0 + w)(s+k ) estão na folha φ+k = φ + w

    +k , para algum w

    +k ∈ Z

    2 (e da mesma forma, sequênciast−k , s

    −k ↘ −∞ com a mesma propriedade). Sejam, para cada k ∈ N, W

    +k uma vizinhança tubular

    da folha φ+ w+k de forma que γ̃0(t+k ), (γ̃0 + w)(s

    +k ) ∈ W

    +k e W

    −k uma vizinhança tubular da folha

    φ + w−k de forma que γ̃0(t−k ), (γ̃0 + w)(s

    −k ) ∈ W

    −k . Como ||w

    ±k || → ∞, podemos assumir que as

    vizinhanças são mutuamente disjuntas. Assim, fazendo em cada vizinhança uma modi�cação noscaminhos similar à feita no Lema 4.1 (veja a Figura 4.2) podemos obter caminhos transversos γ̃′1 eγ̃′2 que satisfazem as propriedades (i) e (ii) do enunciado.

    Observação 4.14. Note que pelo Lema 4.12, temos que γ̃′1 e γ̃′2 são linhas.

    Lema 4.15. Se γ̃0 e γ̃0 + w cruzam uma mesma folha, então toda componente conexa de L(γ̃′1) ∩R(γ̃′2) e de R(γ̃

    ′1) ∩ L(γ̃′2) é limitada, onde γ̃′1 e γ̃′2 são as curvas dadas pelo Lema 4.13.

  • 30 DIFUSÃO SUBLINEAR 4.2

    Demonstração. Assumamos, por contradição, que o resultado não é verdadeiro. Podemos, sem perdade generalidade, assumir que existe uma componente conexa ilimitada O de R(γ̃′1) ∩ L(γ̃′2). O casoonde existe uma componente conexa ilimitada de L(γ̃′1) ∩R(γ̃′2) é similar. Como γ̃′1 e γ̃′2 são linhase se intersectam, toda componente conexa do complementar de [γ̃′1] ∪ [γ̃′2] possui em sua fronteirapontos que estão em [γ̃′1] mas não em [γ̃

    ′2] e também pontos que estão em [γ̃

    ′2] mas não em [γ̃

    ′1].

    Sejam P1 e P2 pontos em ∂O ∩ [γ̃′1] ∩ (R2 \ [γ̃′2]) e ∂O ∩ (R2 \ [γ̃′1]) ∩ [γ̃′2], respectivamente. Sejamφ1, φ2 : R → dom(Ĩ) as folhas de F̃ que passam por P1 e P2 respectivamente, e assumamos queφ1(0) = P1 e φ2(0) = P2. Note que φ1(0) ∈ L(γ̃′2), e como toda folha de F̃ que intersecta γ̃′1 ouγ̃′2 deve cruzar tal caminho da esquerda para a direita, temos que φ1((−∞, 0)) está contido emL(γ̃′1) ∪ L(γ̃′2). Além disso, se φ1((−∞, 0)) é ilimitado, então o α-limite de φ1 estará contido eml(γ̃′1) ∪ l(γ̃′2). Ainda, se ε for su�cientemente pequeno, então φ1(ε) pertence a O. Analogamente,é possível mostrar que φ2((0,+∞)) está contido em R(γ̃′1) ∪ R(γ̃′2), seu ω-limite está contido emr(γ1) ∪ r(γ2) e, se ε for su�cientemente pequeno, então φ2(−ε) pertence a O.

    Sabemos que, como γ̃0 e γ̃0 +w não possuem intersecção F̃-transversa, o mesmo vale para γ̃′1 eγ̃′2, já que estes caminhos são equivalentes a γ̃0 e γ̃0 +w, respectivamente. Portanto, pelo Corolário4.11, temos que γ̃′1 não pode intersectar tanto r(γ̃

    ′2) quanto l(γ̃

    ′2). Vamos assumir inicialmente que

    γ̃′1 não intersecta r(γ̃′2).

    Seja t0 tal que γ̃′1(t0) = P1. Pelo Lema 4.13 existem t− < t0 < t+ e s− < s+ tais que γ̃′1(t−) =

    γ̃′2(s−) e γ̃′1(t+) = γ̃

    ′2(s+). Seja s

    ′− o maior real menor que s

    + tal que γ̃′2(s′−) = γ̃

    ′1(t′−), com t

    ′− < t0,

    e seja s′+ o menor real maior que s′− tal que γ̃′2(s

    ′+) = γ̃

    ′1(t′+), com t

    ′+ > t0. Temos que, orientados de

    forma adequada, γ̃′1([t′−, t′+])∪γ̃′2([s′−, s′+]) é a imagem de uma curva fechada simples C1, separando o

    plano em duas componentes conexas, sendo uma delas limitada, P1 pertence a imagem desta curva,e se ε é pequeno o su�ciente então φ1(−ε) e φ1(ε) pertencem a componentes conexas distintasdo complementar da curva. Mas temos que, se H1 é a componente conexa de l(γ̃′2) que contém oα-limite de φ1, então F1 = H1 ∪ φ1((−∞,−ε)) não intersecta [γ̃′1] ∪ [γ̃′2]. Além disso, pelo Lema4.9 temos que H1 é um conjunto ilimitado, portanto F1 também é ilimitado, e assim está contidonuma componente conexa ilimtada do complementar de C1. Note ainda que φ1(−ε) está na mesmacomponente conexa do complementar de C1 que F1. Contudo, O está contido no complementar de[γ̃′1] ∪ [γ̃′2], e portanto no complementar de C1, e O também é ilimitado. Note que φ1(ε) ∈ O e queφ1(−ε) e φ1(ε) estão em componentes conexas distintas do complementar de C1. Portanto O e F1estão contidos em componentes conexas distintas do complementar de C1 e ambas são ilimitadas,o que é um absurdo.

    Assumamos agora que γ̃′1 não intersecta l(γ̃′2). Seja s0 tal que γ̃

    ′2(s0) = P2. Podemos, como

    antes, encontrar t′′− < t′′+ e s

    ′′− < s0 < s

    ′′+ tais que γ̃

    ′1([t′′−, t′′+]) ∪ γ̃′2([s′′−, s′′+]) é a imagem de uma

    curva fechada simples C2, e tais que se ε é su�cientemente pequeno, φ2(−ε) e φ2(ε) pertencem acomponentes conexas distintas do complementar da curva C2. Note que, se H2 é a componenteconexa de r(γ̃′2) que contém o ω-limite de φ2, então F2 = H2∪φ2((ε,+∞) não intersecta [γ̃′1]∪ [γ̃′2].Procedendo como anteriormente mostramos que as duas componentes conexas do complementar deC2 são ilimitadas, obtendo assim uma contradição.

    Lema 4.16. Se r(γ̃0) ∩ l(γ̃0 + w) 6= ∅, então:(i) [γ̃0] ∩ l(γ̃0 + w) 6= ∅;

    (ii) [γ̃0 + w] ∩ r(γ̃0) 6= ∅.Demonstração. Note que se γ̃0 e γ̃0 + w não cruzam uma mesma folha o resultado é trivial. Su-ponhamos então que γ̃0 e γ̃0 + w cruzam uma mesma folha, e sejam as linhas γ̃′1 e γ̃

    ′2 dadas pelo

    Lema 4.13. Note que, como γ̃′1 ∼F̃ γ̃0 e γ̃′2 ∼F̃ γ̃0 +w, temos r(γ̃0) = r(γ̃

    ′1) e l(γ̃0 +w) = l(γ̃

    ′2). Seja

    p̃′ ∈ r(γ̃′1) ∩ l(γ̃′2). Como r(γ̃′1) ⊂ R(γ̃′1) e l(γ̃′2) ⊂ L(γ̃′2), temos que p̃′ pertence a R(γ̃′1) ∩ L(γ̃′2) eportanto, pelo Lema 4.15, pertence a uma componente conexa limitada de R(γ̃′1) ∩ L(γ̃′2). Mas acomponente conexa C de r(γ̃′1) que contém p̃

    ′ é ilimitada, pelo Lema 4.9, e portanto precisa inter-sectar [γ̃′1] ∪ [γ̃′2]. Como C é disjunta de [γ̃′1], temos que a mesma intersecta [γ̃′2], o que implica queexiste t̄ tal que [φγ̃′2(t̄)] ⊂ r(γ̃0) e como γ̃

    ′2 ∼F̃ γ̃0 + w, isso implica que algum ponto de γ̃0 + w está

    na folha φγ̃′2(t̄), e portanto também está em r(γ̃0). A prova que l(γ̃0 +w) intersecta γ̃0 é análoga.

  • 4.2 DEMONSTRAÇÃO DO TEOREMA A 31

    Observação 4.17. Note que podemos obter um resultado simétrico ao anterior, com r(γ̃0 + w) ∩l(γ̃0) 6= ∅.

    Seja p uma singularidade de F e �xemos p̃ um levantamento de p. Temos que p̃ é �xo por f̃ esuponhamos que p̃ ∈ l(γ̃0).

    Lema 4.18. Sejam w,w′ ∈ Z2 tais que 〈w, ρ⊥0 〉 > 0 e p̃+ w′ ∈ l(γ̃0), então (p̃+ w′) + w ∈ l(γ̃0).

    Demonstração. Suponhamos, por absurdo, que (p̃+w′)+w ∈ r(γ̃0). Note que (p̃+w′)+w ∈ l(γ̃0+w),portanto temos que l(γ̃0 + w) ∩ r(γ̃0) 6= ∅ (veja a Figura 4.9). Assim, pelo Lema 4.16, temos que[γ̃0 + w] ∩ r(γ̃0) 6= ∅.

    Figura 4.9: Ilustração do Lema 4.18

    A�rmamos que isso implica que r(γ̃0 + w) ⊂ R2 \ l(γ̃0): de fato, se r(γ̃0 + w) ∩ l(γ̃0) 6= ∅,temos novamente pelo Lema 4.16 que [γ̃0 + w] ∩ l(γ̃0) 6= ∅. Obtemos assim pela Proposição 3.22que γ̃0 tF (γ̃0 + w), o que é um absurdo pelo Lema 4.6, provando a a�rmação. Assim, como(p̃+ w′) + 2w ∈ r(γ̃0 + w) e r(γ̃0 + w) ⊂ R2 \ l(γ̃0), obtemos (p̃+ w′) + 2w ∈ r(γ̃0). Portanto, porindução, temos que (p̃+ w′) + nw ∈ r(γ̃0), para todo n ∈ N.

    Denotemos agora v′w = w/||w||. Sendo θ o menor ângulo entre v′w e a reta gerada por ρ0, sejaagora vw um vetor unitário tal que seu ângulo com a reta gerada por ρ0 é θ/2. Assim, temos quepara n su�cientemente grande, (p̃+w′) +nw está na componente conexa de R2 \ (B(L0, Cρ0z̃0 (vw))∪B(L1, z̃0)) contida na esquerda da reta gerada por ρ0 que passa por z̃0 (veja a Figura 4.10). Mas,pelo Lema 4.4, temos que [γ̃0] ⊂ B(L0, Cρ0z̃0 (vw))∪B(L1, z̃0), portanto (p̃+w

    ′) + nw ∈ l(γ̃0), o queé uma contradição.

    Note que com uma demonstração análoga podemos obter o seguinte:

    Lema 4.19. Sejam w,w′ ∈ Z2 tais que 〈w, ρ⊥0 〉 < 0 e p̃+ w′ ∈ r(γ̃0), então (p̃+ w′) + w ∈ r(γ̃0).

  • 32 DIFUSÃO SUBLINEAR 4.2

    Figura 4.10: Ilustração do Lema 4.18

    Como a inclinação de ρ⊥0 é irracional, podemos de�nir a seguinte ordem em Z2:

    De�nição 4.20. w � w′ ⇔ 〈w − w′, ρ⊥0 〉 > 0.

    Observação 4.21. Note que tal ordem é de�nida simplesmente projetando Z2 na reta gerada por ρ⊥0e usando a ordem natural de tal reta. Além disso, temos que tal projeção é densa na reta.

    Denotaremos por Zr = {w ∈ Z2 | p̃ + w ∈ r(γ̃0)} e Zl = {w ∈ Z2 | p̃ + w ∈ l(γ̃0)}. Note que,como (p̃+ Z2) ∩ [γ̃0] = ∅, temos Z2 = Zl ∪ Zr. O lema seguinte mostrará que as projeções de Zr eZl na reta gerada por ρ⊥0 estão contidas em duas semirretas disjuntas.

    Lema 4.22. Os conjuntos Zr e Zl de�nidos acima satisfazem as seguintes propriedades:

    (i) Se w ∈ Zl e w′ � w, então w′ ∈ Zl;

    (ii) Se w ∈ Zr e w′ ≺ w, então w′ ∈ Zr.

    Demonstração. Para provar (i), tomemos w ∈ Zl e w′ � w. Temos assim que 〈w′−w, ρ⊥0 〉 > 0. Comow ∈ Zl, temos por de�nição que p̃+w ∈ l(γ̃0) e assim, pelo Lema 4.18, temos que p̃+w+(w′−w) ∈l(γ̃0), e portanto w′ ∈ Zl.

    A prova de (ii) é análoga.

    Lema 4.23. Seja w ∈ Z2 tal que w ≺ 0. Existe w∗ ∈ Z2 tal que w∗ ∈ Zl e w∗ + w ∈ Zr.

    Demonstração. Denotemos 〈A, ρ⊥0 〉 = {〈w, ρ⊥0 〉 | w ∈ A}. Usando tal notação, temos que 〈Z2, ρ⊥0 〉 =〈Zl, ρ⊥0 〉 ∪ 〈Zr, ρ⊥0 〉 e 〈Z2, ρ⊥0 〉 é denso em R. Vamos provar que 〈Zl, ρ⊥0 〉 é limitado inferiormente.Por absurdo, se 〈Zl, ρ⊥0 〉 for ilimitado inferiormente, temos que existem wn ∈ Z2, n ∈ N, tais que〈wn, ρ⊥0 〉 → −∞. Mas, pelo Lema 4.22, se wn ∈ Zl, temos que w′ ∈ Zl, se w′ � wn, e portanto

  • 4.2 DEMONSTRAÇÃO DO TEOREMA A 33

    temos que 〈Zl, ρ⊥0 〉 = 〈Z2, ρ⊥0 〉, o que é um absurdo. Portanto 〈Zl, ρ⊥0 〉 é limitado inferiormente.Analogamente, temos que 〈Zr, ρ⊥0 〉 é limitado superiormente. Denotemos l∗ = inf〈Zl, ρ⊥0 〉 e r∗ =sup〈Zr, ρ⊥0 〉. Temos que l∗ = r∗. De fato, se r∗ < l∗, temos um absurdo, pois teríamos (r∗, l∗) ∩〈Z2, ρ⊥0 〉 = ∅, e 〈Z2, ρ⊥0 〉 é denso em R. Se l∗ < r∗, temos que existem wl ∈ Zl e wr ∈ Zr tais quewr−wl � 0. Portanto temos, pelo Lema 4.18 que wl+(wr−wl) ∈ l(γ̃0), o que é um absurdo. Assim,l∗ = r∗. Como l∗ = inf〈Zl, ρ⊥0 〉, temos que existe uma sequência wn ∈ Zl tal que 〈wn, ρ⊥0 〉 → l∗.Assim, como 〈w, ρ⊥0 〉 < 0, temos que existe n′ ∈ N tal que 〈wn′ + w, ρ⊥0 〉 < l∗. Portanto, tomandow∗ = wn′ , temos que w∗ ∈ Zl e w∗ + w ∈ Zr, provando o lema.

    Observação 4.24. De forma análoga ao Lema anterior, dado w � 0, podemos obter w∗∗ ∈ Z2 talque w∗∗ ∈ Zr e w∗∗ + w ∈ Zl

    Lema 4.25. Seja w ∈ Z2∗. Se w � 0, γ̃0 intersecta uma folha em r(γ̃0 +w) e γ̃0 +w intersecta umafolha em l(γ̃0). Se w ≺ 0, γ̃0 intersecta uma folha em l(γ̃0 + w) e γ̃0 + w intersecta uma folha emr(γ̃0). Em particular temos que γ̃0 e γ̃0 + w não são F̃-equivalentes.

    Demonstração. Vejamos o caso em que w ≺ 0. Pelo Lema 4.23, temos que existe w∗ ∈ Z2 tal quep̃+w∗ ∈ l(γ̃0) e p̃+w∗+w ∈ r(γ̃0), e assim p̃+w∗+w ∈ r(γ̃0)∩ l(γ̃0 +w). Pelo Lema 4.16, temosque [γ̃0] ∩ l(γ̃0 + w) 6= ∅ e [γ̃0 + w] ∩ r(γ̃0) 6= ∅, provando o resultado.

    A prova para w � 0 é análoga, usando a Observação 4.24.

    Lema 4.26. Dado t1 > 0, existe 0 < ε < 12 tal que, se z̃′ ∈ B(ε, z̃0), então todo representante de

    ĨZF̃ (z̃′) contém um subcaminho F̃-equivalente a γ̃0|[0,t1].

    Demonstração. Segue diretamente pelo Lema 3.23.

    No que se segue, diremos que f não possui desvio limitado na direção positiva de ρ⊥0 se existemsequências x̃k ∈ R2 e (nk)k∈N crescente tais que limk→∞〈f̃nk(x̃k)− x̃k, ρ⊥0 〉 = +∞. Analogamente,diremos que f não possui desvio limitado na direção negativa de ρ⊥0 se existirem x̃ e (nk)k∈N comoantes tais que o limite anterior for igual a −∞. Note que se f não possui desvio limitado na direçãode ρ⊥0 então f não possui desvio limitado na direção positiva de ρ

    ⊥0 ou f não possui desvio limitado

    na direção negativa de ρ⊥0 .

    Lema 4.27. Se f não possui desvio limitado na direção positiva de ρ⊥0 , então, dado 0 < ε <12 ,

    existem x̃ ∈ R2, N ∈ N e P ∈ Z2 tais que:

    (i) x̃ ∈ B(ε, z̃0)

    (ii) P � (−2, 0)

    (iii) f̃N (x̃) ∈ B(ε, z̃0 + P )

    Demonstração. Temos pelo Lema 2.25 que o conjunto Uε =⋃∞i=0 f

    i(π(B(ε, z̃0))) é totalmenteessencial, e como ε < 12 , temos que π(B(ε, z̃0)) é inessencial. Assim, aplicando a Proposição 2.24,obtemos um compacto do plano K e M ∈ N tal que [0, 1]2 está contido numa componente conexalimitada de R2 \K, que denotaremos por A, e K ⊂

    ⋃|i|≤M, ||v||∞≤M

    (f̃ i(B(ε, z̃0)) + v

    ). Como f não

    possui desvio limitado na direção positiva de ρ⊥0 , existem P′ ∈ Z2 e l ∈ N tais que l > 2M , 〈P ′, ρ⊥0 〉 >

    〈−(2, 0), ρ⊥0 〉+ 2M e f̃ l([0, 1]2)∩ ([0, 1]2 +P ′) 6= ∅. Como [0, 1]2 ⊂ A e f̃ l([0, 1]2)∩ ([0, 1]2 +P ′) 6= ∅,temos que f̃ l(A) intersecta A+P ′. Como A é limitado, temos que f̃ l(∂A)∩ (∂A+P ′) 6= ∅, e como∂A ⊂ K, obtemos f̃ l(K) ∩ (K + P ′) 6= ∅. Seja agora ỹ ∈ f̃ l(K) ∩ (K + P ′). Então existem ni ∈ Z,|ni| < M e vi ∈ Z2, ||vi||∞ < M , para i = 1, 2, tais que

    ỹ ∈ f̃ l(K)⇒ ỹ ∈ f̃ l(f̃n1(B(ε, z̃0)) + v1) = f̃ l+n1(B(ε, z̃0)) + v1ỹ ∈ K + P ′ ⇒ ỹ ∈ f̃n2(B(ε, z̃0)) + v2 + P ′.

  • 34 DIFUSÃO SUBLINEAR 4.2

    Assim obtemos

    f̃−n2(ỹ) ∈ (f̃ l+n1−n2(B(ε, z̃0)) + v1) ∩B(ε, z̃0 + v2 + P ′)f̃−n2(ỹ)− v1 ∈ f̃ l+n1−n2(B(ε, z̃0)) ∩B(ε, z̃0 + v2 − v1 + P ′).

    Assim, fazendo N = l + n1 − n2 e P = v2 − v1 + P ′, obtemos o resultado.

    Note que podemos provar um resultado análogo para o caso em que f não possui desvio limitadona direção negativa de ρ⊥0 .

    Com todos os resultados provados até agora podemos �nalizar a demonstração do Teorema A.

    Demonstração do Teorema A. Suponhamos por absurdo que f não possui desvio limitado na dire-ção de ρ⊥0 . Vamos assumir que f não possui desvio limitado na direção positiva de ρ

    ⊥0 (o outro caso

    é análogo). Vamos relembrar também que assumimos que ρ0 está no primeiro quadrante.Como (1, 0) ≺ 0, temos pelo Lema 4.25 que γ̃0 e γ̃0 + (1, 0) não são F̃-equivalentes, e além disso

    γ̃0 intersecta uma folha em l(γ̃0 + (1, 0)). Seja t0 um instante em que tal intersecção ocorre, ou seja,γ̃0(t0) está em uma folha, que den