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Oscar Federico Bauchwitz Dax Moraes Gisele Amaral (Organizadores) É a metafísica espelho da vida?

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AUTORES QUE CONTRIBUIRAMCOM ESTA PUBLICAO:

Ezequiel LudueaRenato dos Santos Barbosa

Ivana CostaWesley Rennyer M. R. Porto

Leonardo Bernardino Rodrigues LopesKldson Tiago Alves de Souza

Maria Simone Marinho NogueiraAna Carolina Aldeci

Rogrio Luiz Moreira JniorVictor Hugo Melo de Medeiros

Jos Gonzlez RosBruno Camilo de Oliveira

Antonio Edmilson PaschoalDaniel Freire Costa

Luana Alves de OliveiraThalles Azevedo de AraujoOscar Federico Bauchwitz

Larcio de Assis LimaTito Marques Palmeiro

Oscar Federico BauchwitzDax Moraes

Gisele Amaral (Organizadores)

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a metafsica espelho da vida? Ela reflete o que a vida? capaz de ser a sua imagem? Ser possvel estabelecer o valor ontolgico que possui uma e outra? O que a metafsica respeito vida, para que possa ser compreendida a partir da figura do espelho? A relao de Imagem e modelo no parece conservar, ao menos, uma diferena entre ambas, uma vez que a imagem em funo do modelo que ela mesma reflete? Tal diferena no acarretaria no desmonte da relao questionada? No haveria uma diferena intransponvel entre a metafsica e a vida, ou em outros termos, entre o pensamento e a realidade? Estas so algumas das questes originadas pela questo que este livro procura enfrentar-se, evidenciando de que forma, desde o pensamento antigo at o contemporneo, a filosofia nos faz pensar sobre a capacidade do ser humano de interpretar a prpria vida.

A METAFSICA ESPELHO DA VIDA?

A METAFSICA ESPELHO DA VIDA?

Oscar Federico Bauchwitz Dax Moraes

Gisele AmaralOrganizadores

Natal, 2018

grfica e editora

Diviso de Servios TcnicosCatalogao da publicao na Fonte.

Bibliotecria/Documentarista: Carla Beatriz Marques Felipe CRB-15/380

H765

a metafsica espelho da vida? / Oscar Federico Bauchwitz, Dax Moraes e Gisele Amaral. (Organizadores). Natal: Editora Caule de Papiro, 2018.

316 p.; 15 x 22 cm.

ISBN 978-85-92622-29-9

1. Metafsica. 2. Filosofia. I. Bauchwitz, Oscar Federico (Org.). II. Moraes, Dax (Org.). III. Amaral, Gisele (Org.).

RN CDU 111

Editora

Conselho Editorial

Reviso

Imagem da Capa

Capa e Diagramao Eletrnica

Rejane Andra Matias Alvares Bay

Francisco Fransualdo de Azevedo Celso Donizete Locatel Evaneide Maria de Melo Mrcia da SilvaAlessandra Cardozo de FreitasMrcio Adriano de AzevedoJos Evangelista FagundesHelder Alexandre Medeiros de MacedoJlio Csar Rosa de ArajoSamuel LimaSilvano Pereira de ArajoDilma Felizardo

Os autores

Detalhe "A condio humana II" (Ren Magritte, 1935)

Caule de Papiro

grfica e editora

Sumrio

Apresentao, 7

Los enigmas y el origen de la filosofa en la antigua grecia, 9

Ezequiel Luduea

Os sentidos de parhems na filosofia de Epicuro, 25Renato dos Santos Barbosa

Arte, naturaleza y el espejo de la vida en Platn, 39Ivana Costa

O mtodo antinmico no pirrnismo: uma herana protagrica, 67

Wesley Rennyer M. R. Porto

Elementos de uma metafsica negativa em Toms de Aquino, 81

Leonardo Bernardino Rodrigues Lopes

Liberdade, igualdade e amor: da metafsica tica do amor em Nicolau de Cusa (1401-1464), 91

Kldson Tiago Alves de SouzaMaria Simone Marinho Nogueira

A rvore das sefirot como possibilidade para a ascenso cosmolgica do homem em Pico della Mirandola, 109

Ana Carolina Aldeci

As ideias da razo, 131Rogrio Luiz Moreira Jnior

O homem possui uma necessidade metafsica?, 143Victor Hugo Melo de Medeiros

El cuerpo propio como espejo de la voluntad en la metafsica de Arthur Schopenhauer, 149

Jos Gonzlez Ros

A crtica de Nietzsche transcendncia metafsica, 169Bruno Camilo de Oliveira

A metafsica como um espelho da vida em Nietzsche, 187Antonio Edmilson Paschoal

O caminho heideggeriano de questionamento em Der Satz vom Grund (1957), 205

Daniel Freire Costa

A importncia de se ouvir o inaudito no dito sobre o princpio do fundamento, 221

Luana Alves de Oliveira

Martin Heidegger, Ernst Jnger e a confrontao sobre a metafsica da Gestalt do trabalhador, 241

Thalles Azevedo de Araujo

A metafsica como plasticidade do espanto, 261Oscar Federico Bauchwitz

Montaigne/Derrida e o problema da animalidade, 279Larcio de Assis Lima

Metafsica hoje?, 295Tito Marques Palmeiro

Apresentao

a metafsica espelho da vida? Esta a questo que orienta o presente livro, suscitando perspectivas de pocas e autores diversos que expem, seno respostas definitivas algo, em geral, estranho natureza da filosofia mas ao menos, reflexes que permitiro ao leitor visualizar o que est em jogo, quer dizer, o que est sendo verdadeiramente questionado. a metafsica espelho da vida? A metafsica reflete o que a vida? capaz de ser a sua imagem? Ser possvel estabelecer o valor ontolgico que possui uma e outra? O que a metafsica respeito vida, para que possa ser compreendida a partir da figura do espelho? A relao de imagem e modelo no parece conservar, ao menos, uma diferena entre ambas, uma vez que a imagem em funo do modelo que ela mesma reflete? Tal diferena no acarretaria no desmonte da relao questionada? No haveria uma diferena intransponvel entre a metafsica e a vida, ou em outros termos, entre o pensamento e a realidade? Estas so algumas das questes originadas pela questo que este livro procura enfrentar-se, evidenciando de que forma, desde o pensamento antigo at o contemporneo, a filosofia nos faz pensar sobre a capacidade do ser humano de interpretar a prpria vida.

Gostaramos, ainda, de agradecer ao Programa de Apoio a Eventos da Coordenadoria de Aperfeioamento de Pessoal Superior (PAEP/CAPES-MEC), Pr-reitoria de Ps-Graduao (PPG-UFRN) e ao Pr-reitor Prof. Dr. Rubens Maribondo, pelo apoio recebido para a realizao do V Colquio Internacional de Metafsica, evento tradicional do Programa de Ps-Graduao em Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,

bem como participao de colegas do Brasil e do exterior que submeteram os trabalhos que ora vem luz.

Os organizadores.

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Los enigmas y el origen de la filosofa en la antigua Grecia1

Ezequiel Luduea 2

The Sphinx must solve her own riddle.

R. W. Emerson

Hacia finales del siglo XIX el positivismo dej de fun-cionar, y de nuevo apareci esa antigua sensacin de que el universo es, en lo esencial, un misterio. Las reacciones fueron mltiples, tantas, al menos, como las doctrinas perpetradas por los positivistas. En el caso del estudio de la mitologa, subido a los hombros de Hegel, el positivismo haba llegado a una teora que pareci muy novedosa (aunque Platn se hubiera burlado de ella unos 2500 aos antes):3 Los mitos no son sino alegoras que pretenden simbolizar las distintas fuerzas de la naturaleza. Con esta doctrina, todava hoy sostenida con orgullo en algunas aulas, no slo se haca de la mitologa un fenmeno consciente y casi intelectual, sino que tambin se suprima de su anlisis ese otro elemento que interviene en toda mitologa: la fascinacin, difcilmente reconducible a un anlisis racional y cuantificable. El orientalista Victor Henry (1850-1907) seal

1 Esta es una versin reelaborada del trabajo presentado en el V Colquio Internacional de Metafsica, que tuvo lugar en la ciudad de Natal del 7 al 10 de noviembre de 2017, organizado por el Programa de Ps-Graduao em Filosofia (PPGFIL) de la Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Agradezco al Profesor Oscar F. Bauchwitz por su generosa invitacin y a los asistentes al coloquio por sus comentarios acerca de mi trabajo, en especial, al Profesor Alfonso Correa Motta.

2 (UBA-UNGS-UCALP).

3 Cf. Fedro 229b y ss.

Los enigmas y el origen de la filosofa en la antigua grecia

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que una de las dificultades de esa explicacin es que exige de los primeros hombres una capacidad intelectual singularmente sutil y un desarrollado talento para la metfora. Slo as simples fenmenos atmosfricos como un amanecer o un diluvio pueden ser traducidos en esa larga serie de matrimonios, adulterios, incestos y asesinatos que es la mitologa. En cambio, adverta Henry, todo sera ms creble si esa serie de sutiles metforas fuera en realidad intencional y estuviera destinada a velar el pensamiento envolvindolo en enigmas, es decir, a presentarlo con la forma de una adivinanza. Quiz el origen de la mitologa, arriesgaba Henry, est en el juego de las adivinanzas y todos los mitos hayan nacido de alguno de esos enigmas que circulan de a miles en los pueblos iletrados, diversiones infantiles en los que un hecho cotidiano y banal aparece disimulado con expresiones equvocas o metafricas.4 El origen de la mitologa, entonces, no habra sido un fro clculo de la razn; s habra sido un tipo de clculo, pero no fro, sino ldico.

A mitad del siglo XX, otro orientalista, Vicente Fatone (1903-1962) record la tesis de Henry. Public, hacia 1944, un pequeo ensayo de seis o siete pginas al que llam El enigma de los das y las noches,5 y jug a aplicar la hiptesis de Henry a la filosofa. Tambin la filosofa habra nacido del arte de proponer y descifrar adivinanzas. De hecho, la filosofa griega, segn quiere cierta tradicin, comenz con aquellos siete sabios que Platn menciona en su Protgoras.6 Platn

4 Cf. Henry, V., Quelques mythes naturalistes mconnus: Les supplices infernaux de lAntiquit, Revue des tudes gracques 5 (1892), pp. 281-305; en este caso: pp. 283-284; y Cruelle nigme, en Actes du dixime Congrs international des orientalistes: session de Genve, premire partie, Leiden, Brill, 1897, pp. 45-50; en este caso: pp. 45-46.

5 En: nsula 6 (1944), pp. 94-99.

6 Cf. Protgoras 343a.

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habla de su lacnica sabidura y recuerda esas dos primicias hechas de palabras que los siete sabios ofrecieron al dios Apolo en Delfos: nada en demasa y concete a ti mismo. Esas advertencias, graves y sabias, son una suerte de enigma; hay que descifrar cul es su sentido exacto, a qu estn haciendo referencia. Fatone seal dos textos antiguos en los que se advierte que una de las actividades principales de esos padres de la filosofa occidental era, precisamente, la de proponer y descifrar acertijos y adivinanzas: el Banquete de los siete sabios de Plutarco y las Vidas de Digenes Laercio.7

En la primera, Plutarco imagina una reunin de los sabios en Corintio y los hace pasar buena parte del banquete jugando a las adivinanzas.8 Clebulo es el mejor proponindolas; Bias, el mejor descifrndolas. De aqu que un mensajero llegue a la reunin con un problema para Bias, enviado por Amasis, el rey del Egipto. Plutarco nos cuenta que, en el pasado, este rey haba desafiado a Bias. Le haba hecho llegar un animal con la orden de que le cortara la parte ms daina y beneficiosa y que se lo enviara de vuelta. Pero, cul es la parte ms daina y, a la vez, ms beneficiosa de todo animal? Bias pens un rato, cort la lengua al animal y lo mand de vuelta. Todos quedaron asombrados.9 Por eso ahora el rey de Egipto manda un segundo problema. Esta vez, se trata de un desafo que otro rey, el de Etiopa, propuso al mismo Amasis. Le prometa pueblos y ciudades si slo beba, hasta la ltima gota, toda el

7 Cf. Ibidem, pp. 94-95.

8 Asumo que el Banquete de los siete sabios es obra de Plutarco. Sobre la discusin acerca de la autenticidad de la obra, cf. la Introduccin de C. Morales Otal y J. Garca Lpez a su traduccin castellana: Plutarco, Obras morales y de costumbres, vol. II, Madrid, Gredos, 1986, pp. 209 y ss.

9 Cf. Banquete de los, 146e-f.

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agua del mar. Claro, si no lograba hacerlo, entonces deba dejar parte de sus tierras. Bias casi no lo piensa: Amasis debe aceptar el desafo pero antes tiene que exigir que el rey de Etiopa contenga las aguas de todos los ros que van a dar en el mar, porque el desafo -seala- se refiere a la totalidad del mar en el momento presente y no a la que habr luego y luego y luego, cuando Amasis comience a beber.10

Bias era bueno resolviendo problemas y acertijos, pero Tales no se quedaba atrs. Y as lo muestra Plutarco en su Banquete. Alguna vez, el rey de Etiopa haba resuelto con ingenio una serie de difciles problemas: Qu es lo ms viejo? El tiempo, haba contestado el rey. Qu es lo ms grande? El universo. Qu es lo ms sabio? La verdad. Qu es lo ms hermoso? La luz. Qu es lo ms til? La divinidad. Qu es lo ms poderoso? La fortuna. Qu es lo ms fcil? El placer.11 Tales advierte que ninguna de esas respuestas es irrefutable y que todas contienen errores y grandes muestra de ignorancia. El tiempo no puede ser lo ms viejo, observa, porque una parte suya es el pasado, otra el presente y otra el futuro. Entonces, cmo el tiempo futuro habra de ser ms viejo que el tiempo presente? Y, cmo la fortuna sera lo ms poderoso, lo ms fuerte si cambia constantemente? Tales ofrece entonces sus respuestas pero, a diferencia del rey de Etiopa, da razones. Qu es lo ms viejo? La divinidad, porque no tiene principio. Qu es lo ms grande? El espacio (tpos), porque contiene el universo. Qu es lo ms sabio? El tiempo, porque ha descubierto ya varias cosas, y descubrir otras. Qu es lo ms hermoso? El ksmos, porque todo lo ordenado es parte de l. Qu es lo ms til? La virtud,

10 Cf. Banquete de los, 151b-d.

11 Cf. Banquete de los, 152e-153a.

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porque, bien usada, hace de todas las cosas algo til. Qu es lo ms poderoso? La necesidad, porque es invencible. Qu es lo ms llevadero? Seguir el curso de la naturaleza, porque hasta de los placeres la gente se cansa.12

Clebulo, por su parte, era clebre por su facilidad para componer enigmas en una forma precisa que los griegos llamaban grphos. Digenes Laercio recuerda, en particular, un antiguo grphos atribuido a Clebulo:

Uno es el padre, doce los hijos. Cada uno de stos

tiene dos veces treinta hijas de diverso aspecto ( ):

Las unas son de rostro blanco, negro las otras.

Son inmortales, pero todas se consumen ( , ).13

La solucin, dice inmediatamente Digenes, es el ao.

Se podra decir que este es el enigma ms antiguo que conservamos, escribe Fatone; con l comenz quiz la filosofa occidental. Lo curioso, seala, es que aparece, bajo diversas formas, tambin en los antiguos Vedas. La rueda del Orden, de doce rayos, gira alrededor del cielo sin gastarse. En ella hay, en parejas, setecientos veinte hijos. O: Dos hermanas de aspecto diferente se persiguen procurando un buen fin. Las dos se amamantan en la misma vaca. Con una de ellas, la vaca es de oro Con la otra es plida, llena de hermoso fulgor. O sta: La noche y el da, que constantemente se destruyen uno

12 Cf. Banquete de los, 153c-d.

13 Vida y opiniones de los filsofos ilustres I, 91. Cito segn la traduccin de C. Garca Gual (Madrid, Alianza, 2007, p. 75); la misma adivinanza est recogida en la Antologa Palatina (XIV 101).

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a otro, y que se amamantan unidos en la misma vaca.14 Ese antiguo enigma de los das y las noches, dice Fatone, tal vez no sea el primer y ms antiguo enigma, sino simplemente el nico que se haya planteado a los filsofos: el enigma de los das que mueren y son, sin embargo, inmortales. Es decir, el enigma de la muerte diaria y de la vida imperecedera. El enigma del tiempo y la eternidad, ante el cual los hombres han enarcado las cejas y se han hecho filsofos y han venido soportando, como Edipo, las burlas de Tiresias.15

La lectura del texto de Fatone me llev a buscar lo que los griegos, en general, dijeron sobre los enigmas y los grphoi. Y encontr que, al menos segn los textos que tenemos, el primero que pens sobre el enigma fue Aristteles. Segn el libro III de la Retrica, el enigma es, en esencia, una forma extrema de metfora.

De acuerdo con el discpulo de Platn, la metfora es un elemento clave de la prosa porque sta carece de los recursos que tiene la poesa. Y la metfora, y slo ella, tiene la virtud de producir claridad, placer y extraeza (t xenikn).16 De acuerdo al fin al que apunte, la metfora trabaja, dentro de un gnero de cosas, con lo mejor o con lo peor. Con lo mejor, si se busca exaltar algo; con lo peor si se quiere denostar ese algo. As, varios actos pueden valer como una peticin. Por eso, si queremos referirnos a alguien que pide algo, podemos decir que mendiga (la especie ms baja de peticin) o que suplica (la especie ms elevada dentro de ese gnero de la peticin). De esta manera, indicamos ese acto, el de pedir, que en realidad dejamos sin

14 El enigma de los das, p. 97.

15 Ibidem, p. 99.

16 Cf. Retrica III, 2, 3, 1405a.

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nombrar; lo nombramos sin nombrarlo. En este sentido, dice el Estagirita, las metforas ainttontai, las metforas enigma-tizan.17 De hecho, un buen enigma es una fuente de metforas verosmiles. Por eso, dice en la Potica (el otro lugar en donde habla de los enigmas), un texto hecho slo de metforas equivale a un enigma.18 Ahora bien, all menciona otra nota que define al enigma. Su naturaleza reside en que, hablando de algo que existe, une cosas cosas imposibles (adnata),19 es decir, cosas que generalmente se piensan como contradictorias.20 Esta caracterstica del enigma genera desconcierto, perplejidad.

De hecho, se ha indicado que dos notas esenciales de los acertijos reunidos en el libro XIV de la Antologa palatina, la coleccin de acertijos de la Antigedad ms rica que conserva-mos, son precisamente la analoga y la paradoja.21

La analoga como en la pieza 14:

Sopla un nico viento, y hay dos naves; diez marinos reman.

Y un nico timonel marca el rumbo.22

La solucin es el auls, la flauta de dos cuerpos. Las dos naves son las dos partes del auls, hechas de madera, como las naves. Hay un nico soplo, el del msico. Hay diez remeros, los

17 Cf. ibidem, 1405b.

18 Cf. Potica 1458a.

19 Ibidem.

20 Cf. Aristteles, Potica, trad. E. Sinnott, Buenos Aires, Colihue, 2006, pp. 168-169, n. 658.

21 Cf. Luz, Ch., What Has It Got in Its Pocketses? Or, What Makes a Riddle a Riddle?, en: J. Kwapisz et al., The Muse at Play, Berlin/Boston, De Gruyter, 2013, pp. 83-99; en este caso: 85-87; 89-91.

22 Mi traduccin, segn el texto editado por H. Beckby: Anthologia Graeca. Vol. 4, Mnchen, Heimeran, 1968.

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dedos y un nico timonel. Para descifrarlo se debe decodificar cada uno de los elementos y reubicarlos como partes de otra totalidad dentro de la cual cada uno de los elementos adquiere un nuevo sentido.

La paradoja es la clave que despierta la conciencia de que est frente a un enigma. En el caso del acertijo de Clebulo, la paradoja est, por ejemplo, en esas hermanas que son inmortales, pero todas se consumen. Otro ejemplo es la pieza 22 de la Antologa:

No hables y dirs mi nombre. O, necesitas hablar?

Grandiosa maravilla (mga thama)! Si hablas, de nuevo dirs mi nombre.23

Segn parece, el remitir a otra cosa y el hacerlo de manera paradjica es lo que define al enigma. En su Homo ludens, Huizinga dedica unas pocas palabras a los acertijos y lo relaciona con los sofismas. Los acertijos son problmata, algo que se tira a los pies de alguien para que lo recoja. De ah la idea de un juego de desafos, con premios y castigos.24 Pero Huizinga no explica por qu la relacin entre enigma y filosofa. En cambio, en algunos textos de Plutarco, pude encontrar indicios en este sentido.

En el Isis y Osiris de Plutarco, el enigma es un signo de la sabidura ms antigua. As, la antigua filosofa de los egipcios se oculta, en su mayor parte, en mitos y palabras que contienen oscuros reflejos y transparencias de la verdad ( ). Por eso, colocaban ante los templos esfinges, como si su teologa

23 Mi traduccin.

24 Cf. Huizinga, J., Homo ludens, London, Boston & Henley, Routledge & Kegan, 1980, p. 115.

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contuviera una sabidura enigmtica ( ), agrega Plutarco. Y concluye: Tan grande era la circunspeccin de la sabidura de los egipcios respecto a las cosas divinas ( ).25

Soln, Tales, Platn, Eudoxo, Pitgoras, los ms sabios entre los griegos, quedaron fascinados con esto -especialmente Pitgoras que, admirado y admirando a aquellos hombres ( ), imit lo simblico y misterioso de ellos al mezclar sus doctrinas con enigmas ( , ).26 De all, dice Plutarco, surgieron esos enigmticos preceptos pitagricos: no comer sobre un carro, no plantar una palmera, no atizar con la espada el fuego en la casa, etc.27

25 Isis y Osiris 9, 354B-C. Cito la traduccin de F. Pordomingo Pardo y J. A. Fernndez Delgado: Plutarco, Obras morales y de costumbres, vol. 6, Madrid, Gredos, 1995.

26 Isis y Osiris 10, 354E-F. Traduccin citada.

27 Isis y Osiris 10, 354E-F. Segn el testimonio de Jernimo, ya Aristteles se haba referido a esos preceptos como enigmas: Tambin son pitagricas esas sentencias, de que todas las cosas de los amigos son comunes... y aquellas expresiones enigmticas que expone Aristteles en sus libros con sumo cuidado: no pases por encima de una balanza, es decir, no menosprecies la justicia; no remuevas el fuego con una espada, esto es, no provoques a un alma henchida por la ira con palabras injuriosas; no deshojes nunca una corona, es decir, las leyes de la ciudad deben ser respetadas; no te comas el corazn, es decir, hay que alejar la tristeza del alma. Cuando hubieras partido, dice, no te vuelvas, es decir, no desees la misma vida despus de la muerte; no camines por las vas pblicas, es decir, no sigas los errores de la mayora; no admitas las golondrinas en tu casa, es decir, no hay que convivir bajo el mismo techo con hombres charlatanes y parlanchines; a los que soportan una carga hay que echarles la carga encima, pero no colaborar con los que se la quitan, es decir, hay que incrementar las exigencias para quienes se encaminan a la virtud y abandonar a los que se entregan al ocio.

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Plutarco tambin habla de los enigmas y acertijos a pro-psito del rito bquico. En otra obra, alguien recuerda que las mujeres que buscan a Dioniso, cuando la cena toca a su fin, se lanzan unas a otras acertijos y adivinanzas ( ). El motivo de esta prctica reside en que la cena ritual tiene lugar cuando las mujeres dejan de buscar a Dioniso y dicen que se ha refugiado junto a las Musas y est escondido entre ellas. Por eso, hay que mantener durante la bebida una conversacin que tenga cierta theora e inspiracin ( ). Los enigmas y acertijos elevan la conversacin, el lgos, introduciendo en l theora y algo propio de las Musas: y as cuando una conversacin tal acompaa a la embriaguez, se esconde lo que tiene de agreste y frentico, benvolamente retenido por las Musas.28

Ahora bien, ese elemento se da incluso en la sobremesa de la gente vulgar y sin educacin. Tambin la gente vulgar e inculta ( ), cuando termina de cenar, eleva su pensamiento ( ) a otros placeres muy lejos del cuerpo cuando plantea enigmas29 Los enigmas exigen el ejercicio de la dinoia. Y este ejercicio satisface un deseo que no tiene que ver con el cuerpo, cuyas necesidades quedan cubiertas gracias al vino. Por eso la gente juega a los enigmas: porque el amor a la contemplacin y al saber que por naturaleza hay en el alma de cada uno busca cierto goce y placer propios (

Sobre los pitagricos, ed. Ross, 7b. Cito la traduccin de A. Vallejo Campos: Aristteles, Fragmentos, Madrid, Gredos, 2005.

28 Charlas de sobremesa VIII, 717a. Cito la traduccin de F. Martn Garca: Plutarco, Obras morales y de costumbres, vol. 4, Madrid, Gredos, 1987.

29 Sobre esta costumbre griega, cf. Ateneo, Banquete de los eruditos 448B y ss.; Aristfanes, Avispas 15 y ss., y Herdoto VI, 129.

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), una vez librados del cuidado () y preocupacin () por el cuerpo.30 Tambin Clearco de Solos, el discpulo de Aristteles que compuso un tratado sobre los acertijos, destacaba el papel de la dinoia: Una adivinanza es un problema planteado en broma (), que requiere que su solucin se halle, a travs de una bsqueda ( ), mediante la reflexin ( )31

Ahora bien, estos usos del enigma, el de la filosofa, el del rito, el del hombre comn, son todos ellos formas deliberadas de transmitir algo indirectamente; formas que exigen el ejercicio de la inteligencia; artificios que buscan crear esa impresin que para Platn y para Aristteles es el motor de la filosofa: el asombro (t thaumzein).32 Diciendo una cosa por otra, someten lo cotidiano -una flauta, el silencio, lo que alguna vez pudo haber causado asombro pero que la costumbre ha ido destiendo- al efecto de una luz extraa que, como en un juego, les devuelve por un momento el asombro originario que todas las cosas (y ms las ordinarias) despiertan en los nios. En este sentido, Plutarco advierte que los filsofos ven en las cosas inanimadas un enigma de lo divino ( ) y, as, consideraron justo no despreocuparse en absoluto de ellas ni despreciarlos.33 Los enigmas y acertijos son, pues, una imitacin de ese enigma primero que es el universo, que todo el tiempo parece decir una cosa por otra y que, bien mirado, tiene siempre algo de paradjico.

30 Charlas de sobremesa V, 672F-67B. Traduccin citada.

31 Banquete de los eruditos X, 69, 448C. Cito la traduccin de L. Rodrguez-Noriega Guilln: Ateneo, Banquete de los eruditos, vol. 3, Madrid, Gredos, 2006.

32 Cf. Teeteto 155d y Metafsica I, 982b.

33 Isis y Osiris 76, 382a. Traduccin citada.

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Este costado del enigma, el de la formulacin de enigmas, supone un sujeto que quiere, ms o menos a propsito, velar su pensamiento: puede ser un juego o puede ser una manera de ocultar lo que se piensa (para una mayora que no podr llevar su dinoia a buen puerto). De hecho el otro significado del trmino prblema es el de poner algo delante para protegerse, por ejemplo, un escudo. En el Teeteto, bromeando, Scrates se pregunta si Protgoras, ese hombre absolutamente sabio, no habr hablado en enigmas para la mayora ( ) y guardado la verdad en secreto para sus discpulos.34

En los textos de Plotino, Platn es el filsofo enigmtico por excelencia. El clebre epkeina ts ousas, por ejemplo, no es, para el filsofo egipcio, sino un enigma. De hecho, si por un momento olvidamos la solemnidad con que los estudiosos aconsejan leer a Plotino, uno podra entender que la doctrina de lo Uno supuesta en este enigma es desarrollada por Plotino en forma de grphos (basta cambiar el tono de la voz): No est sometido ni a la ousa ni a s mismo, ni la ousa es para l su principio, pero aunque es Principio de la ousa, no la cre para s, sino que tras crearla, la dej estar fuera de s, como alguien que no necesitaba para nada del Ser. 35

Podemos leer el pasaje con entonacin de grphos, pero el lector de las Enadas advierte en l otra cosa. Es claro que, para Plotino, Platn habl en enigmas por necesidad. Cuando lo que se quiere decir no puede ser dicho, parece que, un poco naturalmente, la nica manera de decirlo es jugando. Y, en este

34 Teeteto 152C. Cito la traduccin de A. Vallejo Campos: Platn, Dilogos, vol. 5, Madrid, Gredos, 1988. Cf. tambin Carta VII, 332c-e.

35 Enada VI 8 [39], 19. Mi traduccin.

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caso, la nica forma de descifrar el enigma es ver por uno mismo. Algo as ocurre, segn Plotino, en los misterios: Los misterios son meras imitaciones; as que con ellas los sabios de entre los profetas expresan enigmticamente el modo como aquel Dios es visto. Pero el sacerdote sabio, descifrando el enigma, puede, llegando hasta all, hacer real la contemplacin del sagrario.36

Este uso del enigma se refiere al caso del que busca expre-sar algo a travs de un medio que, por su misma naturaleza, no est hecho para expresar ese algo. Un ejemplo de esto puede ser el Platn de Plotino. Pero tambin puede ser, por ejemplo, la luna de Digenes Laercio. Pienso en ese pasaje en el que se refiere la muerte de Carnades. Es uno de los pocos lugares en que Digenes parece casi conmovido: en el momento de su muerte hubo un eclipse de luna, como si el ms bello de los astros despus del sol quisiera indicar ( ) su compasin por l.37

Tampoco los amantes del discurso de Aristfanes en el Banquete pueden evitar el enigma. Cuando logran encontrarse, es decir, cuando las dos mitades de un nico ser se reencuentran,

pasan toda la vida juntos; sin siquiera saber decir qu esperan obtener el uno del otro. Pues a ninguno se le ocurrira que se trata simplemente de los placeres de la unin sexual; es decir, que es slo por el deleite fsico que el uno goza al unirse al otro con tanto ardor. Es claro que el alma de cada uno busca otra cosa, algo que no puede expresar ( ). Y eso que quiere slo puede

36 Enada VI 9 [9], 11. Uso la traduccin de J. Igal: Plotino, Enadas, vol. 3, Madrid, Gredos, 1998.

37 Vida y opiniones de los filsofos ilustres IV, 64. Traduccin citada.

Los enigmas y el origen de la filosofa en la antigua grecia

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adivinarlo ( ), darlo a entender confusamente ( ).38

Por ltimo, para terminar de ilustrar esta necesidad del enigma, quiero citar un texto del final del libro I de las Vidas de Digenes. Se trata de una carta que Fercides de Siro, a punto de morir, habra enviado a Tales:

Que tengas una buena muerte cuando lo disponga tu destino! La enfermedad me ha tenido domi-nado desde que recib tu carta. Estoy infectado de gusanos por entero y la alta fiebre me da ataques. He encomendado a mis sirvientes, pues, que, des-pus de darme sepultura, te lleven a ti mi obra. Si, de acuerdo con los otros sabios, t la apruebas, puedes publicarla ( , ). Pero, si no, no la publiques ( , ), porque a m mismo no me convence. No hay una precisin en los trminos ni estoy seguro de saber la verdad ( ), sino slo lo que uno logra explicar cuando se pone a hablar sobre los dioses ( ). Lo dems hay que pensarlo ( ), pues todo lo expreso por enigmas ( ). Encontrndome cada vez ms afligido por la enfermedad no he dejado entrar a ninguno de los mdicos ni a mis camaradas. Cuando se pararon ante la puerta y preguntaron qu tena, saqu un dedo por la cerradura y les mostr cmo

38 Banquete 192C-D. Mi traduccin (modificada): Platn, Banquete, Buenos Aires, Colihue, 2015.

Ezequiel Luduea

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estaba Y les predije que volvieran al da siguiente para el entierro de Ferecides.39

El hombre puede tratar de imitar ese enigma que es el universo, buscando despertar el asombro originario que despierta en los nios o en los filsofos. Elabora as ese juego extrao de los enigmas que produce una extraeza que pone en marcha el pensamiento. Pero quiz del otro lado, si es que hay un otro lado, no haya algo o alguien que, como Protgoras o Platn no quiera decir las cosas claramente. Quiz haya algo o alguien que, como la luna de Digenes, hace lo que puede para comunicar algo incomunicable. Si la cosa fuera as, entonces el juego de los enigmas no slo buscara despertar el asombro y la inquietud del pensamiento para que el ser humano vuelva a mirar. En el fondo, y sin darse mucho cuenta, sera un reflejo del gesto originario de eso que llamamos el universo o el ser, el gesto de los amantes de Platn que buscan algo que no pueden expresar, sino slo adivinar.

39 Vida y opiniones de los filsofos ilustres I, 122. Traduccin de C. Garca Gual, modificada.

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Os sentidos de parhems na filosofia de Epicuro

Renato dos Santos Barbosa1*

A expresso parhems composta pela partcula invari-vel par e pelo pronome da primeira pessoa do plural hems. Par, de acordo com P. Chantraine (1999, p. 856-857), significa prximo, ao lado, que acompanha ao lado. Por extenso tambm significa o que possvel. Segundo D. Sedley par carrega algo semelhante ao sentido causal () encontrado frequentemente na Carta a Pithocles (1983, p. 16). Entendendo assim, Arrighetti (1960) traduz o parhems epicurista por nostro potere (nosso poder, i.e, o poder do homem) e esta a traduo adotada de agora em diante.

O objetivo deste trabalho mostrar os sentidos da noo de parhems na obra de Epicuro e sua relevncia para o epicurismo. Para tanto, este texto se divide em dois tpicos principais: 1) poder ser livre; 2) poder conhecer. Estes tpicos caracterizam a noo de parhems nos textos de Epicuro, apresentando-a como um termo tcnico que fundamenta o conjunto doutrinrio epicurista.

Poder ser livre

A passagem 133 da Carta a Meneceu a mais conhecida em que a noo de parhems aparece. Neste contexto, parhems se relaciona diretamente com as noes de liberdade e responsabi-lidade, temas amplamente discutidos nas reas de metafsica e

1 Doutorando em filosofia pelo programa de doutorado integrado UFRN-UFPE-UFPB (Bolsista Capes)

Os sentidos de parhems na filosofia de Epicuro

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tica. O objetivo especfico deste tpico mostrar dois aspectos presentes na noo de parhems que ilustram o modo como o assunto da liberdade e responsabilidade so compreendidos e abordados por Epicuro.

Parhems e a escolha deliberada

Na Carta a Meneceu (133-135), depois de caracterizar a excelncia da autrkeia, Epicuro argumenta que a vida boa e bela se traduz nos resultados obtidos atravs do percurso investigativo epicurista. Nesta passagem Epicuro pontua diversas teses e atitudes que conformam o carter do epicurista exemplar, cuja assero final : melhor ser infortunado (atychen) raciocinando bem (eulogstos) do que afortunado (eutychen) raciocinando mal (alogstos) (Men., 135). Esta afirmao d pistas para a interpretao do sentido da noo de parhems enunciada nos pargrafos anteriores quando afirma que algumas coi-sas acontecem necessariamente (anankn), outras por acaso (tches) e outras esto em nosso poder (parhems) (Men., 133). A presena da noo de tche (contida nos termos eutychen/atychen), apresentada neste passo e desenvolvida nos seguintes, relacionada a de lgos (contida nos termos eulogstos/alogstos) com a inteno de criticar a vida desarrazoada, inconsistente com escolhas e decises, levada ao sabor das circunstncias. O bom raciocnio se coloca em oposio quilo que vem por acaso ou fortuna, seja bom ou ruim. Uma vez posto o poder livre do homem sob a noo de parhems, Epicuro esboa algumas das caractersticas desta noo, dentre as quais se destaca a deliberao ou o bom raciocnio nas resolues.

A correlao entre o bom raciocnio (eulogstos) como carac-terstica intrnseca noo de parhems pode ser inferida da leitura da doxografia de Aetius: Epicuro diz que tudo acontece

Renato dos Santos Barbosa*

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por necessidade, por escolha deliberada (proaresin) ou por acaso (Aetius I, 29, 5 p. 326, 3 D. (Stob. ecl. phys. 6,17= Us 375). Esta passagem tem, obviamente, como pelo menos uma das fontes o texto da Carta a Meneceu, ainda que a expresso parhems tenha sido substituda pelo termo proaresin (escolha deliberada). A preferncia por proaresin revela a compreenso que os antigos (Sc. IV de nossa era) tinham da noo de parhems e que se configura como um dos sentidos impressos por Epicuro sob esta noo. Sendo assim, a noo de parhems vincula-se de modo fundamental tica epicurista, tambm chamada pelos seguidores de Epicuro de cincia do que deve ser escolhido (hairseos) e rejeitado (ka phygs) (DL, X, 30), na medida em que parhems condio para toda escolha e recusa.

Para algum efetivamente deliberar e escolher necessrio que seja causa de seus pensamentos e aes. Em ltima instn-cia, o indivduo que recebe e processa os estmulos, articula os pensamentos e os pratica o responsvel pelo curso de ao escolhido. Embora a noo de parhems possibilite uma aborda-gem por meio de seu aspecto deliberativo, ela no se esgota na apreciao dele a noo de parhems contm em seus limites a de proaresin. fcil supor que uma ao irrefletida ou mal pensada no estaria livre da atribuio de responsabilidades. Um comportamento pode ser considerado reprovvel por ser desarrazoado quando poderia, pelo contrrio, ser realizado de acordo com as regras do bem pensar. Esta interpretao conduz a considerao do aspecto causal de parhems.

O sentido causal de parhems

O epicurista exemplar do final da Carta a Meneceu reinvin-dica seu direito a ser causa de suas decises e escolhas segundo o bom raciocnio. Metrodoro, discpulo de Epicuro, escreveu uma

Os sentidos de parhems na filosofia de Epicuro

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obra cujo ttulo Sobre ser melhor que a causa da felicidade esteja em nosso poder (parhems) do que vir das circunstncias (Koerte, Frag. 5). O ttulo desta obra de Metrodoro apresenta a noo de parhems enfatizando seu aspecto causal: a eudaimona, em consonncia com a afirmao final do epicurista exemplar, deve ter como causa o indivduo que delibera e age de conformidade as suas deliberaes. E ainda que as circunstncias determinem a ao individual, no h iseno de responsabilidade por falta de deliberao.

A continuao do passo 134 da Carta a Meneceu, confirma o sentido causal de parhems atravs da escrita do prprio Epicuro: nosso poder independente (adspotos [sem senhor]) e as coisas que por ele acontecem so naturalmente acompa-nhadas de censura e seu contrrio [i.e. elogio]. A expresso t memptn ka enanton (a censura e seu contrrio) indica que o que acontece por meio do nosso poder passvel de atribuio de responsabilidade. possvel concluir atravs dessa passagem que parhems revela tambm um sentido causal, visto que, o que est em poder do homem se descreve como um conjunto de possibilidades que, se efetivadas, so atribuveis ao homem como causa.

No Per Phseos (Sobre a Natureza) h uma alternncia de usos entre parhems, di hems e ex hemn autn2. Essa incons-tncia entre as expresses citadas nessa obra pode ser justificada pela inteno de Epicuro de esboar uma explicao completa da natureza e que, por isso mesmo, como comenta Sedley, no era

2 (Arr. [31. 28] 7, IX, 20)/ ([31.29] 7, X, 20; na parte 25 do fragmento 7, X a expresso ex hemn substituda por parhems); Esta alternncia no tira o mrito da noo de parhems como noo fundamental, visto que as noes de tomo e de vazio tambm apresentam variaes. Cf. Hdt. 40-41.

Renato dos Santos Barbosa*

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um polido manual da doutrina, mas um trabalho exploratrio escrito num estilo livre e coloquial (1983, p. 18). A expresso dihems significa por ns e de maneira mais evidente que parhems mostra seu sentido causal em passagem conclusiva de uma discusso sobre os estmulos sensveis (pathologiks) e as causas (aitiologiks): eis aqui o que estabelecemos sobre o que diz respeito as causas e aos movimentos que acontecem por ns (dihems) e ao que acontece por natureza e o que acontece devido ao que nos rodeia (perichon) (Arr. Frag. [31. 33] 7 XIV ). No mesmo livro Epicuro escreve ainda: [ ] [ 3 (Arr. [31.7] frag. 3, I), traduzido por Arrighetti por o princpio de causalidade que depende de ns (p. 321). E, por ltimo, possvel observar a relao direta de parhems com a noo de apogegennemna (que foi traduzido por produtos, movimentos da alma ou ainda desenvolvimentos) e, deste modo, seu sentido causal: consequentemente, o que ns produzimos (apogegennemna) est, em primeiro lugar, absolutamente em nosso poder (parhems) (L-S 20 C)4. Nestas e noutras passagens de sua obra, Epicuro apresenta uma viso sobre a phsis que se coaduna com a tese da liberdade humana entendida como a capacidade do homem de ser causa real de suas aes. Da noo de parhems depende a possibilidade do incitamento a uma vida autrquica e feliz, projeto da tica epicurista. Sem esta noo fundamental o conjunto doutrinrio epicurista incorreria no mesmo erro que critica nos fsicos fatalistas de seu tempo.

Parhems tambm est presente no mbito do que Digenes Larcio chama de cannica5, parte introdutria do

3 Literalmente: a causa segundo ns [de acordo conosco].

4 Referente aos textos estabelecidos e traduzidos por LONG, A. A. e SEDLEY, D., 1987.

5 Contedo da obra de Epicuro intitulada Cnon, cf. DL, X, 30.

Os sentidos de parhems na filosofia de Epicuro

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conjunto doutrinrio que trata dos mtodos de saber elaborados por Epicuro na tentativa de estabelecer critrios e justificativas para teses fsicas e ticas.

Poder conhecer

O poder para agir livremente e o poder de conhecer as coisas so requisitos necessrios para uma vida segundo a filo-sofia epicurista. Estas duas capacidades so expressas na noo de parhems. A parte final deste trabalho tem como objetivo mostrar, no contexto dos mtodos de saber epicuristas, que parhems a noo que justifica o dogmatismo de Epicuro ao mesmo tempo em que assegura a liberdade de agir e pensar do homem.

Indcio para a contestao do fatalismo

Segundo Digenes Larcio, Epicuro escreveu uma obra chamada Cnon, nica obra a tratar da cincia do critrio (kri-terou)6 (DL, X, 30). Nela Epicuro estabelece os critrios da aisthsis, (sensao), prolpseis (prenoes), pthes (afeces) e as phantastiks epibols ts dianoas (projees imagticas do pensamento). Estes critrios regem os mtodos de investigao epicurista, outro tema importante do Cnon. Embora este ttulo no tenha sido preservado, possvel encontrar informaes sobre os mtodos de saber epicurista nas Cartas a Herdoto e a Pithocles, na obra Contra os Matemticos (VII, 211-216) de Sexto Emprico e tambm na doxografia de Digenes Larcio (DL, X, 31-34).

No incio da Carta a Herdoto, Epicuro estabelece duas regras fundamentais para qualquer investigao: a) que os termos

6 Os epicuristas tambm chamam a Cannica de doutrina do princpio e doutrina elementar, cf. DL, X, 29-30

Renato dos Santos Barbosa*

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referentes a cada noo sejam fixados; e b) que a pesquisa seja conduzida de acordo com as afeces e percepes (Hdt. 37-38; Adversus Mathematicos, I, 57.). Em seguida, o filsofo diferencia dois campos de investigao, o primeiro referente aos dados que so passveis de confirmao sensorial (t prosmnon) e o segundo referente as coisas ocultas apreciao direta dos sentidos (delon) (Hdt. 38). Ainda que os entes deste ltimo campo no se sujeitem a observao sensvel, eles podem ser considerados por meio dos mtodos da explicao nica (monachn trpon) e das mltiplas explicaes (pleonach trpou). Epicuro faz afirmaes sobre os tomos e o vazio por meio da reduo ao absurdo da opinio con-trria (Asmis, 1976), vetando qualquer possibilidade de explicao diversa. Este tipo de raciocnio caracteriza o mtodo da explicao nica, enquanto que o mtodo das mltiplas explicaes se carac-teriza por inferncias possveis que tm como base a observao dos fenmenos cuja evidncia assegura confirmao. Explicaes astronmicas ou meteorolgicas so, quando muito, consideradas possveis. Uma explicao possvel quando se coaduna com o conjunto dos fenmenos confirmados sensorialmente e impossvel quando no coerente com eles.

No entanto, os mtodos utilizados para trazer luz infor-maes sobre a parte no manifesta da natureza (delon) no se restringem apenas microfsica dos corpos e a astronomia, mas tambm pe prova teorias como o fatalismo ou o ceticismo. Digenes Larcio menciona um trecho da Pequena Eptome em que Epicuro rejeita a adivinhao, usando a noo de parhems como instrumento de contestao.

, , .

Os sentidos de parhems na filosofia de Epicuro

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A advinhao irreal, e se fosse real considerara-mos que nenhum dos seus acontecimentos est em nosso poder. (DL, X, 135)

Epicuro sugere que a crena na adivinhao no coe-rente com as evidncias prticas da responsabilidade e do poder deliberativo dos homens. Desse modo, a prtica divinatria contestada pela evidncia do poder do homem, de acordo com o modelo de contestao utilizado por Epicuro nas Cartas a Herdoto e a Pithocles e apresentado por Larcio e Sexto Emprico.

Para explicar esta passagem necessrio alguns aponta-mentos sobre a adivinhao e o destino.

A adivinhao e o destino

A mantik (adivinhao) pressupe a noo de heimarmne (destino) como fator determinante para os cursos das vidas, visto que, apenas se o futuro est determinado de antemo que se pode fazer previses sobre eventos da vida humana. Pressuposio risvel aos olhos do epicurista exemplar, mas que Sneca reverencia em Sobre a Providncia: O destino nos guia e a primeira hora dos recm-nascidos determina quanto tempo fica com cada qual. Uma causa depende de outra causa, o interminvel encadeamento dos fatos arrasta consigo assuntos privados e pblicos7 (5, 7). Neste dilogo, Sneca justifica a Luclio porque os homens bons sofrem. A resposta depende da noo de destino e dos deuses que testam os homens para torn-los melhores. Posto que o destino est traado desde o nascimento, os praticantes da adivinhao consideram-na

7 Fata nos ducunt et quantum cuique temporis restat prima nascentium hora disposuit. Causa pendet ex causa, privata ac publica longus ordo rerum trahit (De Providentia, 5, 7).

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factvel. Entretanto, ao rejeitar a realidade da adivinhao, Epicuro rejeita o destino e entende que o homem motor e princpio de causas que se destacam do encadeamento causal do meio ambiente. Utilizando as noes de constituio inicial ( ) e produtos (), ele opera uma separao entre o indivduo que produto das relaes causais fora dele e o que produto de si mesmo.

Para os epicuristas, os deuses no se preocupam com os homens, a noo de destino risvel, o acaso inconstante (staton) e a necessidade irresponsvel (anypethynon). Resta apenas o prprio homem para assumir a responsabilidade por suas aes. Epicuro defende estas ideias dizendo que para o epicurista exemplar evidente que a necessidade irresponsvel e que o acaso inconstante, e os acontecimentos que derivam de nosso poder sem senhor [livre] (adspotos) so naturalmente acompanhados de censura e louvor. (Men. 133).

A evidncia de parhems

A passagem que encerra o tpico anterior aponta para uma lista de evidncias. O termo grego em que se baseia a traduo portuguesa8 evidente hran, o qual M. Conche (1977) traduz por il voit (ele v), i.e., o epicurista exemplar v as carac-tersticas de irresponsabilidade e instabilidade da necessidade (annke) e do acaso (tche) e da liberdade acompanhada da censura e do elogio. O termo hran nesta passagem tem funo tcnica no pensamento de Epicuro, indicando aquilo que subjaz as palavras (Hdt. 37) e se imprime na alma sob a forma de prlepsis (prenoes). As prenoes so marcas deixadas na alma por via das interaes sensveis. O pensamento articula essas

8 Traduo, introduo e notas, Copyright 1987 by Mrio da Gama Kury.

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impresses sensveis, combina-as e reorganiza-as na produo de noes complexas como as de causa ou liberdade. Epicuro no Per Phseos critica a tese de que tudo acontece por necessidade (annke) (e por isso no existe liberdade), afirmando que o ato de tentar convencer o interlocutor que esta tese verdadeira j configura prova contra ela, pois a verdade dela invalidaria a eficcia da admoestao9. Se o determinista insiste em sua defesa porque ele opta por manter sua tese enquanto na prtica continua a culpar ou louvar. Mas se ele agisse dessa forma, deixaria intacto o mesmo comportamento que, no que diz respeito a ns prprios, cria a prenoo (prlepsin) de nossa responsabilidade (L-S 20 C 4). De acordo com Epicuro, o deter-minista se auto-refuta por meio de seu prprio comportamento, cuja observao a raz da prlepsin de reponsabilidade, i.e, da causa que segundo ns mesmos.

A prenoo de responsabilidade explica porque o epicu-rista exemplar v que parhems livre e acompanham-no a cencura e o elogio. Vale lembrar que Clemente de Alexandria definia a prlepsis como uma intuio (epibol percepo clara e imediata) sobre qualquer objeto evidente (enargs) e sobre o conceito evidente do objeto10 (255 Us). Os apectos causal e deli-berativo de parhems tm carter de evidncia. Por conseguinte, as noes gerais de liberdade e responsabilidade se configuram como evidncias prticas fundamentais (MOREL, 2013, p. 15).

possvel confirmar o carter de parhems como indcio para a refutao do fatalismo pela leitura das passagens 94-96, 98 e 108 da Carta a Pithocles. Parhems aparece nestas passagens

9 Um argumento tipo peritrop, cf. Sentenas Vaticanas 40

10 Cf. traduo italiana de Ilaria Ramelli (2007) para

Renato dos Santos Barbosa*

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sob a forma de parhemn, sua declinao no dativo. Jean Bollack traduz parhemn por prs de nous (perto de ns) e explica em seus comentrios que os fenmenos distantes, e por isso mesmo inacessveis apurao dos sentidos, so confrontados com a experincia dos fenmenos prximos que ns dominamos (BOLLACK, 1978, p. 129). Como comentado acima, a meteoro-logia e astronomia epicurista so possveis por meio do mtodo das mltiplas explicaes: a causa de dado fenmeno pode ser explicada de vrias maneiras, desde que no seja contestada pelo conjunto dos fenmenos que esto ao alcance da averiguao dos sentidos, i.e., que podem ser conhecidos pelo homem. O uso de parhemn como indcio para validao ou invalidao de opinies no contexto dos mtodos de saber epicurista revela mais uma vez o sentido de indcio ou evidncia da expresso parhems, posto que utilizada por Epicuro como referncia (paradigma) de suas explicaes.

Concluso

Cumpre notar que o aspecto causal de parhems presente na prolpsis da responsabilidade humana tratado por Epicuro como um fato e, de acordo com Morel (2010, p.10), isto no para ser demonstrado, pois evidente por si mesmo. Alm disso, a expresso parhems apresenta o sentido de indcio ou evidncia para a contestao da mantik, do fatalismo e do mito semelhana de seu uso nos mtodos de saber. Os aspectos deliberativo (1.1) e causal (1.2) so comumente ligados noo de liberdade e quilo que est sob o poder do homem realizar, enquanto que o de evidncia ou indcio (2.1) pode parecer estra-nho primeira vista, mas se harmoniza perfeitamente com a noo de poder humano: o que se pode conhecer, o que se pode

Os sentidos de parhems na filosofia de Epicuro

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manipular e averiguar por estar no campo de possibilidade de atuao do homem.

Ser autrquico, atarxico e desfrutar de uma vida bela e excelente, frutos da filosofia epicurista, dependem, portanto, da escolha pelo exerccio de reflexo e prtica. Sobretudo, dependem da compreenso de que a vida est aos cuidados e responsabilidade dos viventes, os quais possuem a capacidade de conhecer e de agir com liberdade. Excluir a noo de parhems do conjunto do pensamento epicurista, retira as bases da tica e deixa a fsica sem razo de ser.

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Renato dos Santos Barbosa*

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Arte, naturaleza y el espejo de la vida en Platn

Ivana Costa1

Los espejos estn presentes en la obra de Platn como juegos pticos: a veces ldicos, a veces engaosos, y tambin como ejemplos que buscan interpretar el funcionamiento de la visin o incluso aproximarse a la comprensin de las diversas facultades del alma. Aparecen en una doble valencia metafrica: como artefactos que se emplean para simular o engaar y como realidades naturales en las que se reflejan diferentes aspectos de nuestra vida animal, los ms bajos y los ms altos. Los espejos estn involucrados en el tratamiento de los deseos ms oscuros y de las funciones humanas ms divinas, y su mecnica se vuelve descripcin analgica del modo en que se produce el deseo, por el que accedemos a la sabidura y a lo divino en nosotros. Nos concentraremos en el anlisis de la analoga del espejo en el Alcibades I para tratar de responder a la pregunta: puede ser la metafsica para Platn un espejo de la vida?

Espejos que distorsionan y engaan

Platn emplea a veces a los espejos como artefactos que suelen inducir a engao. El espejo engaa incluso en su formula-cin lingstica: la palabra espejo, se afirma en el Crtilo2, en el marco de una investigacin etimolgica un poco estrafalaria, es una de esas que fueron retocadas con el agregado o con la eliminacin de letras para que sonara mejor, para embellecerla:

1 Universidad de Buenos Aires Universidad Catlica Argentina.

2 Crtilo 414c.

Arte, naturaleza y el espejo de la vida en Platn

40

No te parece absurdo que en espejo (ktptron) se agregue una r? Efectivamente, sin la r, katpton, la palabra podra leerse como el compuesto de kat + psis, a travs del ojo o con el ojo). Pero este adorno es obra de quienes no se preocupan en nada por la verdad y modelan la boca para que, insertando muchos cambios en los nombres primarios, logran finalmente ninguno de los seres humanos comprenda lo que significa un nombre. Antes de ser instrumento para el maquillaje y la simulacin, espejo es ya una palabra maquillada, que nos aleja de la supuesta verdad que tendra el trmino en su pureza original, antes de que una pronunciacin afectada venga a distorsionarla.

Por otra parte, las imgenes que devuelve el espejo parecen ser las de una visin miope o al menos muy reducida de una situacin. En Leyes X3 se interpela al ateo que piensa que a los dioses no les importa la justicia humana; el que se ha vuelto ateo piensa as razona el Ateniense porque lo que ve es que los perversos triunfan a fuerza de impiedades, y esa indiferencia de todos los dioses le aparece al ateo reflejada como en un espejo. Sin embargo este reflejo proporciona una visin equvoca, que omite y desconoce el plan general en el que esas injusticias, en apariencia no castigadas, encuentran su sentido. El espejo que devuelve una imagen incompleta induce entonces a la miopa egocntrica del que ya no cree en los dioses porque slo observa una parte sesgada: T eres una pequea partcula que, aunque minscula, tiende y apunta siempre al todo, y se te oculta que todo el devenir se produce por el conjunto, para que la vida del universo posea una existencia

3 Leyes X 905b.

Ivana Costa

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feliz. El devenir no se produjo por ti, sino t por el universo4. Esta otra pintura completa y ms amplia es imposible de ver en los espejos, los cuales pueden llevar al equvoco de manera sistemtica. Justamente para ilustrar uno de los modos en que se da la opinin falsa, en el Teeteto5, Platn acude al ejemplo patente del error al que induce la imagen especular. El ejemplo es as: yo conozco a Teeteto y a Teodoro es decir: ya tengo una representacin mental de ellos (como seales, en un trozo de cera que viene a ser mi memoria); ahora los veo venir pero a la distancia, sin llegar a verlos realmente bien, y entonces trato de hacer coincidir la visin presente con la seal, para que encajen como en una huella; pero resulta que no lo logro y hago una transposicin, como los que ponen sus zapatos en el pie equivocado, y dirijo la visin de cada uno en direccin de la seal del otro, como con las experiencias visuales que se dan en los espejos, en las que la derecha cambia a la izquierda.

Por supuesto que a estas observaciones relativas al error en la percepcin no sigue una interpretacin mgica o sobrenatural acerca del poder engaador del espejo. En el Timeo, despus de ofrecer una explicacin sobre el funcionamiento de la visin como el choque entre dos fuegos (o dos haces lumnicos), el del sujeto y el del objeto, se propone una aclaracin de por qu se produce la ilusin ptica que invierte derecha e izquierda: Lo que se encuentra a la izquierda aparece a la derecha porque, contra lo que es usual en el choque de dos rayos, las partes entran en contacto con las partes opuestas de la visin y lo que est a la derecha aparece a la derecha y lo que se encuentra

4 Leyes 903c.

5 Teeteto 193c.

Arte, naturaleza y el espejo de la vida en Platn

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a la izquierda, a la izquierda, cuando la luz cambia de posicin al unirse con el otro rayo6.

Platn tambin se detiene en el carcter reproductivo del espejo. En el Sofista, cuando trata de definir al sofista aludiendo a su tcnica de la simulacin, a su arte de fabricar imgenes, se refiere a una reproduccin de tipo artstica, semejante a la dupli-cacin que vemos en el agua y en los espejos, o a las dibujadas, grabadas y otras por el estilo7. El espejo es considerado como un aparato que reproduce imgenes, semejante en capacidad a las artes figurativas. Y sus productos resultan ser, por lo tanto, algo que ha sido elaborado como semejante a lo verdadero. Si es semejante a lo verdadero, entonces no es verdadero sino slo parecido. La reproduccin artificial de las artes y la del espejo no da por resultado originales sino copias. Esta es la idea que se plantea en Repblica X para reafirmar un esquema ontolgico tripartito: hay ciertas realidades en la naturaleza (formas), hay copias de esas realidades (los artefactos) y copias de segundo nivel (las imitaciones de pintores y escultores que reproducen artsticamente aquellos artefactos). Es el pasaje del clebre ejemplo de la cama que se fabrica mirando la forma o idea de cama. Pero aqu en Repblica X el Scrates platnico menciona a otra clase de artesano.

Se trata, dice, de un artista hbil y sorprendente, que hace todo lo que produce cada uno de los trabajadores manuales (), capaz de hacer cualquier objeto y producir todo lo que surge de la tierra, todos los animales, todo el resto de cosas y a l mismo; capaz de hacer la tierra, el cielo, los dioses, todo

6 Timeo 46a-c.

7 Sofista 239d-e.

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lo que hay en el cielo y en el Hades bajo la tierra 8. Platn alude a un tipo de reproduccin artstica diferente: si al tomar un espejo lo quieres girar hacia todas partes, podrs hacer rpidamente el sol y lo que est en el cielo, y rpidamente la tierra, y a ti mismo y al resto de los animales, objetos, plantas y todas las cosas. En la descripcin de este artfice de mara-villas que gira y logra reproducir la totalidad de lo que lo rodea parece anticipar la mecnica del praxinoscopio, un artefacto pre-cinematogrfico creado en 1877 y comercializado durante dcadas como juguete, que consiste en un eje giratorio con un espejo cnico central rodeado de figuras parciales que, al girar, se muestran en movimiento. Las imgenes as producidas son la versin primitiva de lo que hace un hoy camargrafo en una rotacin panormica. Es cierto que lo que le interesa sealar a Platn es que eso producido son apariencias, no cosas verdaderamente reales9, sin embargo reconoce que gracias a la capacidad de reproduccin del espejo, ese artesano resulta ser como le replican sus compaeros a Scrates un sofista (sophists) realmente admirable.

El valor pedaggico de los espejos

Por supuesto que hay otra cantidad de pasajes del corpus en los que Platn no juzga negativamente sino que, por el contrario, reivindica el papel de las imgenes: ellas no son solamente copias distorsionadas de algn original sino nuestra va de acceso a los originales, a lo real. Aunque las imgenes no son cosas netamente reales, a veces pueden aproximarnos al conocimiento de lo que es ms real. Esa perspectiva aparece reiteradamente en dilogos de madurez y de vejez. Considerado desde esta perspectiva, el

8 Repblica 596d.

9 Rep. 596e: phainmena, ou mntoi nta g pou ti aletheai.

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espejo aparece con funciones positivas, sobre todo pedaggicas. Una de estas ocurrencias, en Repblica III, presenta una ana-loga con el espejo para reclamar la necesidad de conocer las formas de la moderacin, de la valenta, de la liberalidad, de la grandeza de espritu y tambin sus imgenes en la vida social y poltica, que es el objetivo especfico e irrenunciable del dilogo. El argumento es que aprendemos a leer y a escribir, y por lo tanto a descifrar un sentido, cuando tomamos conciencia de que las letras son unas pocas en todas sus combinaciones; por eso si aparecieran alguna vez en el agua o en espejos, al principio no reconoceramos las imgenes de las letras hasta que reconociramos las letras mismas; anlogamente, cuando conozcamos aquellas formas podremos reconocer sus imgenes, tal como cualquiera que sabe leer reconoce a las letras reflejadas en el espejo10.

Mucho ms decisiva (ya no slo analgica) es la funcin pedaggica que cumple el espejo en el Timeo: all se lo presenta como una herramienta de control y como instrumento educativo de la parte apetitiva del alma, esa fiera salvaje a la que hay que tener atada de por vida. Como se sabe, en el Timeo Platn retoma el esquema de un alma tripartita establecido en Repblica IV y reafirmado en el Fedro: en el alma humana conviven una parte o funcin racional, otra irascible y otra apetitiva. En el dilogo de la vejez, cada una de ellas aparece situada en una determinada

10 Rep. 402a-c. Scrates insiste en que no seremos msicos ni guardianes ni nada hasta que conozcamos las formas de la moderacin, de la valenta, de la liberalidad, de la grandeza de espritu, sus cualidades asociadas y tambin sus opuestos combinados en todos lados y las percibamos estn donde estn a ellas y a sus imgenes, sin desesti-marlas por pequeas o por grandes, sino que creamos que se trata de la misma tcnica y del mismo estudio.

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parte del cuerpo: la racionalidad en la cabeza y lo irascible en el pecho, separado prudentemente de la razn por el istmo del cuello. Y a la apetitiva los dioses auxiliares del demiurgo la colocaron en el vientre, para lo cual construyeron como una especie de pesebre, y all ella se cra, amarrada, lo ms lejos posible de la parte deliberativa, de modo que cause el menor ruido y alboroto y permita reflexionar al elemento superior11. A su vez, sabiendo que el alma apetitiva no iba a comprender el lenguaje racional y que, aunque lo percibiera de alguna manera, no le era propio ocuparse de las palabras, sino que las imgenes y apariciones de la noche y del da la arrastraran con sus hechizos, se construy a su lado el hgado que tiene las caractersticas fsicas de un espejo: es denso, suave, brillante para poder reflejar los pensamientos de la inteligencia pero traducidos en imgenes capaces de atemorizar y apaciguar a la parte del alma que es motor de los apetitos12. Cada vez que vuelvo a este pasaje no puedo menos que pensar en el papel que juegan hoy las pantallas: televisores, computadoras, tablets, celulares, en la crianza de los chicos. Tan cuestionadas por la moderna pedagoga, nadie podra negar sin embargo el xito que tienen las pantallas reproductoras de imgenes para apaciguar a las bestias, para que causen el menor alboroto y dejen reflexionar al elemento superior del hogar. No s si el hgado habr alcanzado alguna vez este poder de acallar a los sujetos menos racionales de la casa, pero no dejan de sorprenderme los intentos de Platn por hallar una solucin a este conflicto recurrente, tan tpico y cotidiano para los padres de hoy como alejado de su propia experiencia domstica.

11 Timeo 71a.

12 Timeo 71b.

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Algo ms sobre el espejo reproductor de imgenes que Timeo imagina en el vientre: incluso la funcin estrictamente digestiva del hgado y de los rganos a l vinculados se presenta aqu como un complemento de esta otra funcin suya pedaggica, que se realiza adems en virtud de su propia mecnica especular. Por un lado se afirma que el bazo se form al lado del hgado para tenerlo siempre limpio, tal como se limpian los espejos13. O sea que tambin el bazo es instrumento de esta misma fun-cin de control. Por otro lado, la dulzura y la amargura que son propias del hgado se describen como el efecto fisiolgico concreto y correctivo del ms abstracto mensaje o moral inhe-rente a las imgenes que en l se reflejan y que constituyen el contenido de su misin educativa. Timeo seala que el hgado, cuando utiliza su amargura, se acerca y la amenaza; provoca toda clase de alteraciones fsicas: coloracin amarillenta, contraccin, aspereza, obturacin de sus cavidades y accesos, causando dolores y nuseas. Por el contrario, cuando alguna inspiracin de suavidad proveniente de la inteligencia dibuja las imgenes contrarias aplica la dulzura y entonces endereza todo el rgano, lo suaviza y libera, y hace agradable y de buen carcter a la parte apetitiva del alma, dndole un estado apacible14.

Conocerse a s mismo en el espejo del otro

A los espejos est reservada una pedagoga mucho ms valiosa y profunda en el corpus. En el Alcibades I, el verse a s mismo como a travs de un espejo se revela crucial para llegar a definir la propia naturaleza humana. El Scrates platnico (o acadmico, ya que la autenticidad del dilogo es todava materia

13 Timeo 72c.

14 Timeo 72b-d.

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de controversia) conversa con un Alcibades inslitamente atento y obediente, que entiende que todava no conoce lo suficiente como para afrontar sus deberes y sobre todo sus ambiciones polticas. El Alcibades histrico, tremenda personalidad, impul-siva y polmica, aparece ahora como un discpulo que busca con paciencia los conocimientos que le faltan. Scrates lo orienta hacia el ms urgente de todos, el que indica el precepto dlfico: el concete a ti mismo. Por eso, en la primera parte del dilogo, lo conduce a identificar ese s mismo con el alma, de acuerdo con la premisa tantas veces explorada en dilogos de madurez y de vejez acerca de la prioridad y hegemona del alma por sobre el cuerpo. Este conocimiento a obtener se enmarca en un modelo tcnico, segn el cual todo conocimiento se dirige a un objeto que puede ser mejorado a travs de la tcnica conveniente y adecuada a esa naturaleza. En la segunda parte del dilogo, en la que aparece el espejo, se utiliza la analoga de la visin para especificar todava ms de qu se trata el conocerse a s mismo; justamente Scrates busca precisar en qu consiste el s mismo mismo, al que se va a identificar con lo divino del alma, es decir, con su funcin intelectual que es su aspecto divino. El Scrates platnico propone a Alcibades este juego analgico:

Sc. Examina t tambin. Si como quien aconseja a un hombre le dice a nuestro ojo: mrate a ti mismo, cmo entenderamos lo que se nos aconseja? No es acaso que intente mirar hacia aquello que, al mirarlo, el ojo est en condicin de verse a s mismo?

Alc. Es evidente.

Sc. Observemos entonces: mirando hacia cul de los seres veramos aquello y a nosotros mismos juntamente?

Alc. Es evidente, Scrates, que los espejos y cosas parecidas.

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Sc. Tienes razn. Pues bien, no hay tambin en el ojos con el que vemos cosas de este tipo?

Alc. Desde luego.

Sc. Has observado, entonces, que el rostro de quien mira fijamente a los ojos se deja ver como en un espejo en la mirada de quien est enfrente, y le llamamos precisamente pupila, puesto que es como una imagen de quien mira al rostro?

Alc. Tienes razn.

Sc. Un ojo, entonces, al contemplar a otro ojo y dirigiendo la mirada hacia lo que es lo ptimo de l y con lo que ve, as se conocera a s mismo.

Alc. As parece.

Sc. Y si de hecho mirara hacia otra cosa de las propias del ser humano o una de los seres, excepto hacia aquello con lo que resulta que esto es semejante, no se ver a s mismo.

Alc. Tienes razn.

Sc. Por consiguiente, un ojo, si est en situacin de verse a s mismo, tiene que mirar por s mismo a un ojo y hacia aquel lugar de la mirada en el que sucede que surge la excelencia de un ojo, y esto es probablemente visin?

Alc. As es.

Sc. Entonces, mi querido Alcibades, si un alma est tambin en situacin de conocerse a s misma tiene que mirar por s misma a un alma, y especialmente hacia ese lugar de esta en el que surge la excelencia de un alma, la

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sabidura (sopha), y hacia eso otro con lo que esto resulta que es semejante?

Alc. As me parece, Scrates.

Sc. Podemos decir entonces que hay algo del alma ms divino que esto, en el que estn el saber y el pensar?

Alc. No podemos.

Sc. Entonces esto de ella se asemeja al dios, y quien mira hacia esto conoce tambin todo lo divino, dios y la inteligencia (phrnesis), y as se conocera en especial a s mismo.15

El espejo aporta aqu, en primer lugar, la dimensin reflexiva que exige el precepto dlfico, pero dado que el gnthi heautn est dirigido ahora al ojo como si fuera un hombre, es el ojo el que debe encontrar su propio espejo. Lo ms parecido al espejo es la pupila de otro ojo en el que se est mirando. Segn la analoga, ese espejo, la pupila, no es cualquier parte del ojo sino lo mejor de l, su excelencia, su parte ptima; por lo tanto, si ahora dirigimos el precepto dlfico hacia el alma a su vez prioritaria y hegemnica respecto del ojo y del cuerpo en general ella tambin buscar su reflejo en la excelencia de otra alma, y esto, lo ptimo de un alma, es aquello en lo que reside la sabidura, el saber y el razonar16. Esa parte se afirma en el dilogo se parece a dios (133c) por eso se concluye que quien la mira y reconoce todo lo que hay de divino, dios y la inteligencia y as se conoce cabalmente a s mismo. De la enorme cantidad de aspectos destacables en este pasaje subrayo

15 Alcibades I 132e-133c, traduccin castellana de scar Velsquez (2013), con ligeras variantes.

16 Cf. sopha en Alc. 133b y t eidnai te ka phronen en Alc. 133c.

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un elemento que sigue siendo filosficamente notable de la enseanza platnica que se le trata de inculcar a Alcibades: uno se conoce a s mismo vindose en otro; la persona se ve a s misma cuando ve a otra y llega a descubrir lo divino en el alma, que adems se asemeja a dios.

El uso analgico y el sentido que se da aqu al espejo en el reconocerse recuerdan otro pasaje en el que Scrates habla de alcanzar lo divino mirndose en otra persona. El destinatario de esa leccin es Fedro, otro de los discpulos malditos del Scrates histrico, acusado igual que Alcibades por la ominosa muti-lacin de las estatuas de Hermes que precedi a la catastrfica expedicin ateniense sobre Siracusa, antes del final de la Guerra del Peloponeso. En el Fedro, Scrates le explica a un Fedro muy jovencito cules son los cuatro diferentes tipos de locura divina (porque no siempre aclara la locura es mala), y cuando tiene que describir a la ms importante de todas, a la locura ertica, y tiene que explicar lo que pasa en el momento en que un amado finalmente llega a estar invadido de esta locura, sumido en la perplejidad, pero en el colmo del deseo, dice Platn:

Entonces s que es verdad que ama, pero no sabe qu, ni sabe qu le pasa, ni expresarlo puede, sino que, como a quien se le peg de otro una oftalma, no acierta a qu atribuirlo y se olvida de que, como en un espejo, se est mirando a s mismo en el amante.17

Cuando amante y amado estn ya los dos envueltos por la locura ertica aparece el otro aspecto relevante mencionado en el Alcibades: la precisin normativa acerca de cul es la excelencia del alma, su mejor parte, aquella en la que conviene

17 Fedro 255d.

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mirarse para que la de los amantes sea realmente una vida feliz. Aqu Platn establece que si los dos se dejan guiar por la parte del alma que conduce a una vida ordenada y a la filosofa se encontrarn dueos de s mismos, llenos de mesura, subyugando lo que engendra la maldad y dejando en libertad a aquello en lo que lo excelente habita18. En los dos casos, en el Alcibades y en el Fedro, la aproximacin a lo divino se alcanza mirndose en el espejo de otro semejante.

Foucault: el descubrimiento de la subjetividad

A pesar de que el papel del otro en el conocimiento de s resulta bastante patente, una de las interpretaciones ms influyentes del Alcibades en la filosofa contempornea y en las ciencias sociales sigue siendo la de Michel Foucault, que se concentra sobre todo en la reflexividad, en el volverse sobre uno mismo, que aparece en el dilogo. Foucault se interesa en esta indagacin platnica sobre todo por el hecho de que, a su juicio, anticipa la moderna concepcin de subjetividad. En La hermenutica del sujeto, su curso en el College de France dedicado al cuidado de s, en el que refiere al Alcibades, afirma que aqu Platn introduce una concepcin novedosa dentro de su obra y en la literatura griega al proponer la nocin de alma-sujeto en lugar de la de alma-sustancia que aparecera, por ejemplo, en el Fedn. Segn Foucault, Platn no se pregunta en el Alcibades, como suele hacer en otros dilogos, qu es lo esencial de la naturaleza humana o qu es el ser humano sino qu es el s mismo, lo que hoy llamaramos la cuestin del sujeto. Y desde su perspectiva, lo decisivo sera aqu el deslizamiento conceptual que se produce hacia el s mismo, la operacin reflexiva por la

18 Fedro 256a-b.

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cual la persona se vuelve a la vez sujeto y objeto. Leemos en La hermenutica del sujeto: [Cul es] esta relacin denotada por el pronombre reflexivo, heautn? Cul es el elemento que es el mismo desde el punto de vista del sujeto y del objeto?19 La respuesta cree encontrarla Foucault en la expresin (aut t aut), que aparece en dos pasajes clave del razonamiento que conduce a la analoga del espejo en el Alcibades, en 129a-b y en 130c-d, y que ha sido fuente de grandes dolores de cabeza para los intrpretes antiguos y modernos.

En el primero de estos pasajes, Scrates le pregunta a Alcibades: Cmo podra descubrir (aut taut)? Porque si lo conociramos, fcilmente descubriramos lo que somos, pero seremos incapaces mientras lo ignoremos. Para Foucault, aut t aut designa la reflexividad en virtud de la cual la persona se constituye como sujeto; sera ese elemento idntico que est presente de un lado y del otro de las relaciones reflexivas, cuidado de s y conocimiento de s, como sujeto y como objeto20. La reflexividad del conocimiento de s y del cuidado de s es para Foucault el elemento clave. Efectivamente el auts presente en ambas expresiones, cuidado de s (epimleia heauto) y concete a ti mismo (gnthi seautn), est poniendo de relieve una dimensin reflexiva, una vuelta sobre s; sin embargo observar la analoga del espejo exclusivamente a la luz de la reflexividad reduce el alcance de nuestra interpretacin.

A Foucault no le interesa particularmente la exgesis de la metfora el espejo del Alcibades21; su inters est ms bien

19 M. Foucault (2001: 52).

20 Ibidem.

21 Su premura por llegar al final del dilogo, en la segunda hora de la cuarta sesin del curso, la del 13 de enero de 1982, no va acompaada por un anlisis

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en la bsqueda de una forma de subjetividad que, a su juicio, confiere un criterio tico y esttico a la existencia, justamente el tipo de subjetividad que Foucault encuentra en algunos autores griegos y romanos de los primeros siglos de la era cristiana y que, al parecer, contiene una prefiguracin de la subjetividad moderna. Segn el intelectual francs, todo esto ya lo estara anticipando el Alcibades en la medida en que para Platn la verdad del s mismo est en nosotros; el dilogo constituira la prehistoria de esa forma de subjetividad que l cree ver encarnada en la tardo-antigedad, en la que el cuidado de s se lleva a cabo tal como se confecciona una obra de arte: la propia vida tica como realizacin esttica. Esta conclusin exige, sin embargo, que en la analoga del espejo no haya nada ms que reflexividad; que la subjetividad all expresada se limite a una mera relacin. Esto lo han comprendido bien algunos seguidores de Foucault, que reivindican precisamente esta enseanza en La hermenutica del sujeto: El s mismo con el que tenemos relacin no es ms que la relacin misma (). Es, en suma, la inmanencia o, mejor, la adecuacin ontolgica de s mismo con la relacin. No hay sujeto sino slo relacin (reflexividad)22.

Quizs esta forma de entender el conocimiento de s se ajuste en alguna medida a cierto ideal de poca helenstica o imperial, pero no resulta convincente como descripcin del

detallado o novedoso de la analoga, y la atencin se diluye hacia el complejo problema de la cronologa, tambin irresuelto.

22 G. Agamben (2016: 104-5) cita La hermenutica del sujeto, y vincula las ideas foucaulteanas acerca del s mismo y de la vida como obra de arte con el supuesto de que no existe un sujeto antes de la relacin consigo mismo; el sujeto es esa relacin y no uno de los trminos de ella. Otras conclusiones que Agamben presenta all para reforzar la tesis (p.e.: El s, en cuanto coincide con una relacin reflexiva no puede ser nunca sustancia, no puede nunca ser sustantivo) nos alejan ms an del Alcibades, que afirma en rigor lo contrario.

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pensamiento de Platn. Por eso la interpretacin foucaulteana aplicada sin reservas al Alcibades resulta un intento por lo menos incompleto. En las ltimas dcadas, en el mbito de los estudios platnicos, diversos autores buscaron otros caminos exegticos retomando, una vez ms, la clave que provee la expresin (aut t aut) y analizando su valor dentro del argumento que culmina con la analoga del espejo. En primer lugar, es necesario detenerse en la diferencia sutil pero relevante que plantea el dilogo entre conocer lo que cada uno es y conocer , el s mismo mismo. Volvamos al argumento. Scrates, en dilogo con Alcibades, se pregunta qu quiere decir cuidar de uno mismo; no es igual dice cuidar de uno mismo que de las cosas que a uno le pertenecen; e insiste: no podramos conocer qu arte nos hace mejor si no sabemos qu somos en realidad nosotros mismos: t pot esmn auto (128e1011). Como seala Christopher Gill, all autoi, nosotros mismos, tiene un significado manifiestamente intensivo, no reflexivo; y es esta demanda de intensificacin la que interesa al argumento23; justamente como respuesta a ella aparece la expresin, (aut taut), en 129b1:

De qu manera se podra descubrir el s mismo mismo (aut taut)? Porque probablemente as descubriramos qu somos nosotros, pero seremos incapaces mientras lo ignoremos.

La indagacin procede entonces distinguiendo entre aquello que somos y los instrumentos que empleamos: Alcibades y sus razonamientos, el zapatero y sus trinchetas, el obrero y sus herramientas Nosotros somos almas que empleamos como instrumento al cuerpo, y no es lo mismo lo que somos (alma)

23 Retomo el anlisis de C. Gill (2006: 349-351).

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que nuestro instrumento o vehculo (el cuerpo). No obstante, esta respuesta todava no es suficiente. Entonces encontramos la segunda ocurrencia de , en 130d:

se debera examinar en primer lugar lo s mismo mismo; pero ahora, en vez del s mismo hemos estado examinando lo que es cada cosa, y ello tal vez sera suficiente, ya que podramos afirmar que no hay nada ms soberano que el alma.

Ms all de lo que cada cosa es en el dialogo (o ) (aut hkaston)24 la pregunta sigue siendo por ese , el verdadero s mismo, el s mismo mismo que revela lo realmente esencial: no simplemente nuestra alma, a secas, sino la excelencia del alma. Cuando se interpreta no como mera expresin de alguna clase de reflexividad sino como demanda de intensificacin tendiente a dar con lo realmente esencial hacemos coincidir la interpretacin con la conclusin del razonamiento de Scrates: podremos cuidar de nosotros cuando sepamos qu es lo que realmente o verdaderamente somos25. Y eso que realmente somos no es para el platnico autor del Alcibades una pura relacin ni tampoco el alma a secas, sino la inteligencia, la parte divina del alma, aquello que en nosotros se parece a dios.

La exagerada preponderancia otorgada a la dinmica refle-xiva del conocimiento de s y del cuidado de s, la interpretacin

24 Alc. I 130d: en primer lugar haba que someter a consideracin lo que es el s mismo mismo. En cambio, ahora, en lugar del s mismo hemos estado considerando lo que es cada cosa, y ello tal vez sera suficiente, ya que podramos afirmar que no hay en nosotros nada ms soberano que el alma.

25 Es la tesis de Gill (2006: 349-351), reafirmada en Gill (2007), y referida all tambin a N. Denyer (2001: n.a 129b1-3), a B. Inwood (2005: 335-338), y a una sugerencia de C. Rowe.

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foucaulteana eclipsa los dos aspectos ms relevantes, a nuestro juicio, de la analoga del espejo: el nfasis en la excelencia del alma, vinculada a su naturaleza divina, y el valor del otro en el conocimiento de s. Veamos ambas cuestiones, en orden inverso.

La mirada del otro en la formacin del yo

Quizs el texto en el que mejor se refleje ya que hablamos de espejos la enseanza del Alcibades sea la Magna Moralia, atribuida a Aristteles. All se afirma que de la misma manera que nosotros, cuando queremos ver nuestro propio rostro lo vemos mirndolo en un espejo, as tambin tenemos que mirar al amigo si queremos conocernos a nosotros mismos. Pues, como decimos, el amigo es otro yo26. Se trata de una nocin de auto-conocimiento que, con toda claridad, se opone a la pers-pectiva cartesiana, la cual prioriza la conciencia o conocimiento de uno mismo por encima de cualquier otro tipo de conciencia. Para Descartes, la nica idea que est ms all de toda duda es precisamente sta, formulada en primera persona: pienso, existo. C. Gill, en su estudio histrico sobre la nocin de self en el mundo helenstico y romano, nos recuerda que tambin en el pensamiento post-cartesiano encontramos varias versiones de esta concepcin, incluyendo la idea de que una persona, en tanto sujeto, tiene acceso inmediato e infalible a su propia expe-riencia mental, y que la perspectiva de la primera persona tiene autoridad exclusiva en todos los aspectos de la vida psicolgica y tica27. La concepcin platnico-aristotlica reivindica, en cambio, el valor de la mirada del otro en el auto conocimiento como es evidente en la analoga del espejo, retomando as una

26 Magna Moralia 1213a20-24 (el subrayado es mo).

27 Gill (2006: 356).

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idea muy antigua, vislumbrada ya en la tradicin homrica: la del valor de los otros para la constitucin del yo.

Los estudios sobre la nocin de alma y del yo en la literatura homrica florecieron desde fines del siglo XIX y durante gran parte del siglo XX, y estuvieron dominados por una corriente historiogrfica que tendi a subrayar la ausencia de una concepcin unificada de las funciones que hoy llamaramos psicolgicas28. El dato incontrastable de que psych no aparece nunca en la Ilada o la Odisea describiendo funciones en el ser humano vivo, sumado al hecho de que las emociones, los impulsos a la accin, las reflexiones se manifiestan a travs de mltiples agentes que llevan a cabo ms bien operaciones fisiolgicas29, cimentaron la visin de una antropologa fragmentada, sin unidad psquica. No obstante, siguiendo algunas intuiciones que se encuentran ya en autores de los aos 50 pero sobre todo en algunos estudios ms recientes30, encontramos que en Homero ya existe una perspectiva unificadora de la persona: por ms que no se le atribuya de manera explcita la tarea de dar cohesin a todas las partes psico-fisiolgicas que la conforman, el pronombre (eg) permite vislumbrar la concepcin de un yo que es ncleo de todas esas funciones31, e incluso la de un cierto conocimiento personal no reflexivo. Aun sin una clara idea de autoconciencia, aunque no est conceptualizada filosficamente ni identificada claramente con la psych, la unidad del yo est presente en el

28 Los trabajos pioneros de E. Rohde (1890-1894), W. Otto (1923) y J. Bhme (1929), y los de B. Snell (1948) y C. Eggers Lan (1967) insisten, con diversos matices, en la inexistencia de un concepto de alma en los poemas homricos.

29 Phrnes, kr, thyms, nos, etc. actan como y/o son sede fsica de estas funciones.

30 Cf. los trabajos de D. Furley (1956), S. Darcus Sullivan (1988) y J. Bremmer (2002), entre otros.

31 Cf. A. Adkins (1970: 22 y 27).

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pronombre (eg), a menudo enfatizado por el pronombre : (eg auts): yo mismo32. El hroe homrico repite con cierta frecuencia yo mismo, aunque no llegue a explicitar ni a reflexionar en qu consiste ese yo mismo.

Lo que me interesa aqu es que el eg de los personajes de la Ilada suele aparecer representado por sus partes, psquicas o fsicas, y ellas son mentadas poticamente como un otro que conforma al yo. Es muy frecuente encontrar a un hroe dialo-gando con su nimo que lo reprende, o con su corazn furioso, a quien quiere hacer callar, o exhortando a sus (propias) manos a matar, a sus (propias) rodillas a levantarse; en fin, haciendo todo lo que lo constituye como esa singular personalidad heroica. Adems, estos dilogos interiores de un yo con otro yo su nimo, sus piernas, sus manos, su corazn se elaboran en analoga con otra dialctica, la del hroe con otros semejantes en cuya mirada se observa para dar va libre a determinadas emociones o para definir cursos de accin. Todas las relaciones que establece el yo del hroe homrico con otros, ya sean internos (su corazn, su nimo) o externos, incluso trascendentes (los dioses), se elaboran en analoga con la que el yo tiene con otros yo semejantes a l. Una idea que tambin reencontramos en la Modernidad, no ya en la visin cartesiana sino en la dialctica hegeliana de la formacin del yo a travs del nosotros y del nosotros a travs del yo33.

Vista desde esta perspectiva, la mecnica especular del conocerse a s en el otro que propone el platnico Alcibades a

32 Cf. H. Schwabl (1954: 48) quien admite, no obstante, que no hay person Bewusstsein.

33 Tomo esta sugerente analoga de El yo y el alma en Homero (2015), disertacin de Javier Adrogu defendida en la Universidad de Buenos Aires, an indito. En ella aparecen profusamente documentadas las ocurrencias de diversas funciones psicolgicas en la Ilada y la Odisea.

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la filosofa posterior podra encontrar remotos antecedentes en la forma literaria con la que se ilustra la constitucin del yo de los hroes homricos.

Lectura humanista y lectura teolgica del paradigma ptico

Queda pendiente el anlisis de la intuicin platnica del carcter divino de una parte del alma (el otro elemento eclipsado por la interpretacin subjetivista del Alcibadas). Volvamos a la analoga del espejo: si mi ojo tuviera que conocerse a s mismo debera verse a s mismo viendo, y eso se lograr fijando la vista en la pupila de otro al que est viendo; al ver su pupila se ver a s mismo viendo. E igualmente, el espejo del alma es otra alma (actuando como alma), con la que entramos en dilogo. sta es la base de la que Brunschwig llam34, la interpretacin horizontal y humanista de la analoga de la visin, a la que l opuso algunas objeciones con el propsito de mostrar que esa relacin dialctica no es conditio sine qua non del conocerse a s mismo. A su juicio, deberamos preferir una i