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E remoinhos e cidades de leva e traz e dolores e

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Trabalho apresentado na Semana PUR de 2013.

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NOTA1

1 (...) “arranja-se uma peneira… e fica-se esperando um dia de vento bem forte, em que haja rodamoinho de poeira e folhas secas. Chegada essa ocasião, vai-se com todo o cuidado para o rodamoinho e zás! — joga-se a peneira em cima. Em todos os rodamoinhos há saci dentro, porque fazer rodamoinhos é justamente a principal ocupação dos sacis neste mundo…. Depois, se a peneira foi bem atirada e o saci ficou preso, é só dar jeito de botar ele dentro de uma garrafa e arrolhar muito bem. Não esquecer de riscar uma cruzinha na rolha, porque o que prende o saci na garrafa não é a rolha e sim a cruzinha riscada nela. É preciso ainda tomar a carapucinha dele e a esconder bem escondida. Saci sem carapuça é como cachimbo sem fumo”.

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O sol do meio-dia obriga os olhos a fecharem-se, enquanto que o único desejo é beber o mundo. Tudo paralisado nesse instante, nesse meio-dia de janeiro, quando as cigarras começam a enlouquecer.

O ar é impuro, às vezes um cheiro de fumaça invade tudo. E de longe vêm vozes indistintas, algumas risadas, e o forte rumor polifônico do trânsito. Tudo é suspensão.

O menino está lá diante do mundo, os olhos castigados pela luminosidade excessiva. As cigarras se esganiçando sem serem vistas e ouvidas dão a verdadeira dimensão da cidade ao meio-dia.

Presos nos engarrafamentos nos inebriamos com a

fumaça de nossos próprios cachimbos. Nos intervalos

entre tempos perdidos nos asfixiamos com a ideia

de que não há por onde escapar, aliás, desistimos –

para finalmente esquecer – da própria vontade de

escapar. Capturados em invisíveis botelhas de vidro

e inebriados, nos tornamos nervosos, é claro, pois

estar engarrafado é contra nossa natureza. Some-

se ainda o enorme feixe de luz que, lançado de um

ponto qualquer, atravessa as paredes de vidro e

se refrata difusamente ou se rebate em reflexos,

constituindo uma trama luminosa que, quando

difusa e fragmentária, nos desnorteia como baratas

tontas e, quando precisa e ofuscante, nos repele

até algum canto escuro ou nos deixa enfeitiçados

e anestesiados. No excesso de luminosidade e

transparência não conseguimos descansar. Criamos

então subterfúgios nas precárias zonas de opacidade

ou simplesmente nas efêmeras manchas de sombra.

Mas não permanecemos impassíveis! Nos

movimentamos, reagimos violentamente até, mas

são violências impotentes e, por isso mesmo, tão

terríveis e dolorosas, pois no mais das vezes se

direcionam contra nós mesmos, engarrafados,

entorpecidos. Buscamos então nos proteger,

produzindo, ironicamente, novos e menores, cada

vez menores, engarrafamentos; um dentro do outro;

na vã tentativa de nos distanciarmos de outros

que, como nós, buscam mais espaço dentro do

engarrafamento e não podem mais perder tempo,

sem ver que uma espacialidade mais ampla nos

aguarda fora, que talvez não seja mesmo fora, mas

apenas um avesso, mais travesso, e desengarrafado

desse mundo.

A cidade insaciável opera por engarrafamento,

onde cada garrafa seria mais uma camada que

pretenderia nos afastar e proteger dos outros

e que, no entanto, não faz outra coisa que nos

distanciar da possibilidade do desengarrafamento.

Nos preenchemos de medo de pular fora e por

isso nos trancamos ou simplesmente deixamos

de desejar beber o mundo. Nunca poderemos

nos saciar assim. Rodopiar, brincar, esconder,

fazer devir uma infância de nós, propagar uma

infância outra da cidade. Por isso nos envolvemos

seriamente em ânsia insaciável de construir e

fazer proliferar novas garrafas que nunca chegarão

a nos satisfazer. Produzir, produzir, produzir,

sem jamais saciar, sem poder verdadeiramente

gozar disso tudo, pois o enfumaçamento sem

vazamento, sem extra-vazamento, nos entope e

nos entorpe de excessos e acreditamos que talvez,

nesta condição, completamente envolvidos,

sintamos algum conforto dentro dessas garrafas

frias e duras.

Da cidade insaciável.

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Um anjo negro, alucinado em gargalhadas, com seus pés descalços e olhos vermelhos passa, quase invisível, por entre as garrafas que rolam aceleradas rumo a destinos certeiros, mesmo quando rolam sem

sair do lugar. Aproxima-se aos pulos de homens que caminham na sarjeta varrendo o lixo que não cabe nas garrafas e por ali deve escoar até um improvável fora, que nunca será inteiramente fora. O anjo se encanta pelos pequenos objetos flutuantes ao notar que, como nas mensagens colocadas em garrafas e jogadas ao mar na esperança de um dia serem

lidas, os engarrafados colocaram nos pequenos objetos desejos de pular fora e sumir na escuridão – coisa que para o anjo é algo muito interessante. Existem outros caminhos além dos caudalosos rios que

jorram subterrâneos à cidade, ele pensa (pois conhece atalhos, reconhece as encruzilhadas, vem e vai se infiltrando pelos poros da

cidade), e se aproxima do lixeiro oferecendo ajuda. Da pilha de lixo, cada pequeno objeto é, para o anjo, um desejo a ser liberto, e os

homens se espantam ao ver que o lento e primoroso gesto de catar faz do catar outra coisa que o limpar, e de cada unidade de lixo pequena relíquia. Entre o lixeiro e o anjo existe apenas uma casca de vidro transparente onde se cola um rótulo. É o que ele percebe, o lixeiro, e se sente (finalmente) engarrafado. Os outros riem, de nervoso, por

constatarem a mesma coisa. Gostariam de pular para o outro lado, mas não conseguem. E o anjo, por sua vez, não está ali para salvar

ninguém, ele só quer brincar de fazer nós. Aliás (e isso não é difícil perceber), a túnica branca e as asas são apenas um disfarce para

chamar atenção, uma de suas táticas para ficar visível, quando quer. Mais tarde sonharão os homens com garrafas quebradas e o falso anjo se

saciará com os efeitos que produziu.

Da arte de saciar.

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Por um urbanismo saci (ou da tinhosa arte de quebrar garrafas)...

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A GUARDA TOMA

A guarda toma, a guarda tira A guarda toma, a guarda tira O Estado dá a ordem E o choque quem toma é o pobre. (ANARCO FUNK, “A guarda toma”, 2012)

CHOQUE DÓI (GIA -Grupo de Interferência Ambiental)

CHOQUE MATA (Manifestação em apoio à Aldeia Maracanã – jornal EXTRA 11/04/13)

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GRUPODEPESQUISAMODERNIDADEECULTURA THAIZASENNADEFREITASLIGEIRODECARVALHO FREDERICOGUILHERMEBANDEIRADEARAUJO PRISCILAMEDEIROSDEOLIVEIRA RONIERIGOMESDASILVAAGUIAR HEITORLEVYFERREIRAPRAÇA ISABELASOUZADASILVA FLÁVIADESOUSAARAÚJO IACID’ASSUNÇÃOSANTOS LETÍCIACASTILHOSCOELHO ANACABRALRODRIGUES NATALIAVELLOSOSANTOS MARINACAVALCANTITEDESCO ANAMARIAGOMESDEALMEIDA SAMUELTHOMASJAENISCH GABRIELSCHVARSBERG RAPHAELSOIFER LIVIAABDALLA

FUNDÃO, JUNHO 2013

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1 - O SaciJosé Bento Renato Monteiro Lobato

Trecho retirado de “O Saci”, página 22 de um

exemplar da editora Globo. 2007.

2 - Prefeitura antecipa de 2016 para 2014 o prazo para a retirada de

carroças das ruas de Porto Alegre

Carlos Etcjichury

Reportagem publicada no jornal gaúcho Zero Hora no dia 27/05/2010

3 - Plano Estratégico da Prefeitura do

Rio de Janeiro 2009-2012

Extrato deste importantíssimo documento publicado pela prefeitura da cidade do Rio de

Janeiro e acessado em 2103 no seguinte endereço: www0.rio.rj.gov.br/planoestrategico/

I

4 - Site oficial da Unidade de Polícia Pacificadora do Estado do Rio de

Janeiro

www.upprj.com

5 - Site oficial do Programa Porto Maravilha

Www.portomaravilha.com.br

6 - Site oficial Rio 2016

Www.rio2016.com.br

7 - Secretaria Especial da Ordem Pública (SEOP)

Prefeitura do Município do Rio de Janeiro

Http://www.rio.rj.gov.br/web/seop

8 - Rua de mão única.Obras Escolhidas V. 2

Walter Benjamim

Trecho de Imagens do Pensamento, arrancado da página 237 de um exemplar publicado

pela Editora Brasiliense em 1987.

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10 - Se me olvidó que te olvide

Loita de la Colina

Por Beppo y Cigala 2004

REFERÊNCIAS

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9 - Aforismo (sexto)

pista #16 del álbum del año 2006, “matar o no matar” de la argentina

Liliana Felipe

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Amilcar Bettega

Belo texto publicado na página 8 do Caderno Ilustríssima do Jornal Folha de São Paulo, no dia 12

de junho de 2013

REFERÊNCIAS

12 - Apunte Calejero

Girondo Oliverio

Texto retirado da coletânea TEXTOS SELECTOS, organizada por Anibal

Jarkowski e publicada pelo Editorial Corregidor de Buenos Aires em 2010

13 - Nomes a Menos

Poema de Paulo Leminski encontrado por acaso em um dia de chuva que fazia cinza o azul, ao folhear a coletânea TODA A POESIA, publicada pela Cia das

Letras em São Paulo, 2013, o azul já azulejava.

18 - GIA - Grupo de Interferência Ambiental

19 - Maracanã: policial é flragrado usando arma de

choque contra manifestante

Reportagem publicada pela versão eletrônica do jornal EXTRA em 11 de abril de 2013.

Extra.globo.com/esporte/copa-2014/maracana-policial

11 - Lençóis secando na Grama 14 - Secretaria Especial da Ordem Pública (SEOP)

Prefeitura do Município do Rio de Janeiro

Http://www.rio.rj.gov.br/web/seop

Amilcar Bettega

Livre rasura do texto de Amilcar Battega publicado na página 8 do Caderno Ilustríssima do Jornal

Folha de São Paulo, no dia 12 de junho de 2013

15 - Lençóis secando na Grama

16 - A guarda toma e o choque mata

Música do primeiro CD do grupo AnarcoFunk, lançado em 2013

17 - Mascote da Copa Popular Contra as Remoções 2013Libertariamente roubado do blog dos amigos

soteropolitanos que adoram um samba: giabahia.blogspot.com.br em 2013 Criação do Comitê Popular da Copa e coincidência

sacizeira encontrada no blog da Raquel Rolnik:http://raquelrolnik.wordpress.com/2013/06/13/copa-

das-confederacoes-manifestacoes-denunciam-violacoes-de-direitos/

20 - Portal da Prefeitura do Município do Rio de Janeiro

Http://www.rio.rj.gov.br/web/seop. Acesso em junho 2013

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Ronaldo SoaresPublicado na Revista Veja em 20 de

setembro de 2009.Veja.abril.com.br/200509/entrevista.shtml

24 - Djalma Gomes Filgueira

Blog deste auditor interno da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do

Porto do Rio de Janeiro CDURP.Acessado em junho de 2013

21 - Entrevista do ilustre prefeito Eduardo Paes

22 - CHOQUE DE ORDEM

Música do GRUPO NOSSO GRITO.

Em 2013 estava disponível em: letras.mus.br/grupo-nosso-grito/1856771

Bela e clássica obra em que somos apresentados a Diadorim e Riobaldo.

O exemplar aqui utilizado foi publicado pela Editora Nova Fronteira em 2006.

23 - Grande Sertão: Veredas

João Guimarães Rosa

REFERÊNCIAS

O trabalho em questão trata da experiência de uma oficina coletiva de construção de discursos cidade. Aqui exposto em modalidade textual/visual, é também apresentado em formato audiovisual e exposição fotográfica, ambos igualmente presentes na XIX SPUR. As três modalidades expositivas, ainda que aportando significados próprios, constituem discursos imbricados e complementares sobre o processo e o resultado da oficina. A experiência de construção de uma cartografia de afectos enquanto forma de interpelação e criação de sentidos, realizada durante a montagem do filme Perlenga Cangaço (2012), levou o Grupo de Pesquisa Modernidade e Cultura (GPMC), do qual os autores fazem parte, à realização da oficina “Cidadeando: uma aventura poiética com som, imagem e movimento”, durante o simpósio Corpo Cidade (2012) e, em desdobramento, ao projeto “Caos-Grafias Cidade: experienciações sobre modos de conceber e dizer cidades” (2013), no qual este trabalho diretamente se insere. Desde então, o viés das caos-grafias, enquanto potência às criações de conteúdo e forma, norteia o Grupo às suas experimentações epistemológicas/metodológicas sobre os processos conflituosos que constituem territórios singulares ditos como cidade. No âmbito de tal perspectiva reflexiva, tendo como tópico a crítica ao discurso hegemônico que afirma o que é cidade de modo peremptório, postulando-se como único, este trabalho assume especificamente as caos-grafias enquanto modo de criação e exposição de dizeres cidade outros, em dissonância com, e postando-se em disputa a esse discurso dominante. Para isso, problematiza a própria linguagem com o propósito de rasurar os dizeres hegemônicos através de experiências construídas como jogo com escrituras ditas cidade. Esse jogo pode ser considerado uma inovação processualística que, certamente, constitui a principal contribuição aos modos de pensar cidade que o trabalho produz.

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