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  • Como superar adversidades no trabalho

    presses e

    Resili nciaR I C A R D O P I O V A N

  • Como superar adversidades no trabalho

    presses e

    Resili ncia

    R I C A R D O P I O V A N

    E D I T O R A

  • Meu principal agradecimento a Deus, que me permitiu estar aqui novamente, aprendendo e me desenvolvendo, para que um dia eu possa retornar a Seu lado.

    Devo gratido eterna minha amada companheira, mulher que h sculos me transforma com cada palavra que diz. Nossa jornada no se limita a esta vida, estamos juntos h muito e muito tempo. Dri, te amo muito. Obrigado por estar comigo novamente.

    Agradeo aos pequenos que, com sua sabedoria infantil e verdadeira, tanto me ensinam. Para sermos resilientes, temos que ser crianas, e essas crianas me mostraram o que ser resiliente. Jeh, Pepe, V e Bruno, obrigado pelos momentos encantadores que passamos e ainda iremos passar juntos.

    Algumas pessoas foram importantes neste processo de criao, pois foram mentores que dividiram suas experincias e sabedoria em momentos cruciais do livro. Agradeo a Mestra Miao Shang do templo Zulai, e os amigos Eduardo Nunes da SEICHO-NO-IE e Walter Marchesano da Seara Bendita.

    Meus agradecimentos tambm a algumas pessoas que no conheci, mas foram grandes inspiradores para meu crescimento pessoal e para que esta obra se concretizasse. Napoleon Hill, James Hunter, Martin Seligman, Janet Attwood, Eva Pierrakos e Richard Bach, obrigado por seus ensinamentos.

    To importante quanto os outros o agradecimento ao homem que abriu as portas do autoconhecimento para mim. Obrigado, Tadashi San, por ter feito grande diferena em minha vida e mostrar que o melhor caminho o do meio. Eu o amo muito.

    Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensinaCora Coralina

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    AGRADECIMENTOS

    Abraos Ricardo Piovan

  • 3SUMRIO

    A grande rvore e o bambu

    IntroduoEnfrentando as adversidades e presses no trabalho

    Primeiro princpioA pessoa resiliente tem conscincia de que dificuldadesfazem parte da vida e preciso conviver com elas.

    Segundo princpioA pessoa resiliente compreende a natureza humana e busca o contato com seu Eu Superior.

    Terceiro princpioA pessoa resiliente no desaprendeu a lutar e persisteem encontrar uma sada para as adversidades.

    Quarto princpioA pessoa resiliente encara o problema, toma as decisesnecessrias e investe sua energia para solucion-lo.

    Quinto princpioA pessoa resiliente entende que as adversidades da vida nostiram da zona de conforto e proporcionam crescimento.

    EplogoHavia um buraco fundo na calada ...

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  • A grande rvore e o bambu

  • 5O MESTRE E SEU JOVEM DISCPULO caminhavam em silncio pela estrada que ligava o templo ao vilarejo. Na noite anterior, uma forte tempestade havia cado na regio e havia muitas folhas e galhos espalhados pelo caminho. A certa altura, os dois foram obrigados a saltar o tronco de uma grande rvore que havia tombado e expunha um emaranhado de razes retorcidas.

    - H certas coisas que no compreendo disse o discpulo. Como possvel que uma rvore to forte, com razes assim robustas, tombe por causa da tempestade, enquanto outras plantas frgeis continuam de p?

    A grande rvore e o bambu

    O mestre parou de caminhar e olhou ao seu redor, como se procurasse alguma coisa. Depois de instantes, disse ao discpulo:

    -V aquela moita de bambus ali adiante, na margem do caminho?- Sim.

    - Durante as grandes tempestades, as varas do bambu se agitam de um lado para o outro, chegam quase a tocar o cho. Elas se submetem fora dos ventos, mas, quando a tormenta passa, esto novamente como sempre estiveram, firmes e intactas, como se nada tivesse acontecido.

  • 6A grande rvore e o bambu

    O discpulo contemplou a moita a alguns metros de distncia. Por um instante, lembrou-se das pescarias que fazia quando criana, usando uma fina vara de bambu. Lembrou-se de como a vara vergava, sem jamais quebrar, quando um peixe grande abocanhava a isca.

    O mestre continuou:- J a rvore que acabamos de saltar no resistiu tempestade porque seu tronco, grosso e rgido, era incapaz de se curvar. Ao longo de toda sua vida, ela veio resistindo, imvel, s tempestades violentas, perdendo muitas folhas e galhos. At que, um dia, no pde suportar seu prprio peso e sucumbiu. O

    discpulo, j habituado com as parbolas do mestre, permaneceu em silncio, aguardando o ensinamento que estava por vir.

    - Assim tambm com os homens -, prosseguiu o mestre. H os que procuram resistir s tormentas da vida e se enrijecem, se agarram com todas as foras ao que conhecem, recusam-se a mudar. E h os que aceitam as adversidades, adaptam-se s circunstncias e sofrem mudanas, mas continuam inteiros. Os primeiros temem as tempestades, mas no conseguem evit-las. Os segundos sabem que as tempestades so inevitveis, mas no as temem.

  • Enfrentandoas adversidades

    e pressesno trabalho

    INTRODUO

  • DESDE QUE COMEARAM A SOPRAR os primeiros ventos da globalizao econmica, no final dos anos 1990, fazer mais com menos tornou-se o lema das empresas. Para sobreviver em um mercado crescentemente competitivo, elas tm se obrigado a conquistar resultados cada vez mais ambiciosos, empregando para isso cada vez menos recursos. Como se no bastasse o desafio de atuar com esse paradoxo, preciso tambm lidar com um cenrio de mudanas constantes e incerteza permanente. O resultado disso que trabalhar nessas empresas tornou-se algo parecido com estar em uma panela de presso. presso para bater metas, para tomar decises rpidas, para responder a desafios complexos, para encontrar solues inovadoras...

    Essas presses recaem inicialmente sobre os lderes, em quem se deposita a responsabilidade por gerar resultados. Mas como nem todos os lderes esto preparados para lidar com isso, repassam as presses aos seus liderados, criando assim um efeito-cascata que atinge toda a empresa, do executivo de primeiro escalo ao mais humilde funcionrio. No toa que o nvel de estresse das pessoas esteja batendo sucessivos recordes. Estudos da International Stress Management Association (ISMA), entidade presente em vrios pases, incluindo o Brasil, retratam um trabalhador cada vez mais cansado, nervoso, ansioso e preocupado. Um retrospecto das pesquisas da ISMA realizadas em nosso pas nos ltimos cinco anos mostra os efeitos da presso corporativa sobre o comportamento e a sade dos brasileiros das mais diversas carreiras profissionais. Veja s:

    2004: 82% dos profissionais pesquisados apresentavam traos de ansiedade em diversos graus. O resultado surpreendeu os pesquisadores, que esperavam no mximo 60%, o que j um ndice alto. Outros sintomas de estresse identificados pela pesquisa foram: dores musculares, sentidas por 96% dos entrevistados; angstia, por 78%; momentos de agressividade, 52%; e problemas gastrointestinais, 32%.

    2005: 65% dos entrevistados consideravam seu nvel de stress de regular a pssimo. Para 58%, o trabalho foi indicado como maior fonte de stress em sua vida, e 48% disseram-se sobrecarregados de tarefas.

    2006: 10% das pessoas ouvidas afirmaram sentir-se deprimidas. Entre as causas apontadas por elas, ficaram em primeiro lugar as relacionadas a situaes do trabalho, como demisso, mudanas na empresa, perda de cargo e falta de perspectiva profissional.

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    INTRODUO

  • 9INTRODUO

    2007: 30% dos pesquisados disseram sofrer de burnout, esgotamento fsico e mental causado pelas presses no trabalho.

    2008: 38% dos entrevistados revelaram que evitam tirar frias por medo que decises importantes sejam tomadas durante sua ausncia, medo de serem transferidos de cargo ou demitidos.

    Esses dados apenas ilustram o que sentimos, e no de hoje: est cada vez mais difcil lidar com as presses no trabalho. No quero parecer pessimista, nem bancar o cavaleiro do apocalipse corporativo, mas, para ser bem franco, no acredito que a situao v melhorar. Voc acredita? Acho que tambm no. Tudo indica que, pelo menos nos prximos anos, a velocidade das mudanas continuar acelerada, a competitividade prosseguir se intensificando e as empresas continuaro perseguindo resultados cada vez mais ambiciosos, pois afinal precisam sobreviver.

    Nesse cenrio, mais do que nunca, est sendo valorizada a habilidade humana de superar adversidades e presses: a resilincia. A pessoa resiliente aquela que sofre crises, enfrenta mudanas ou situaes de forte stress e consegue dar a volta por cima, transformando sofrimento em competncia. sobre essa habilidade, to necessria nos dias atuais, de que trata o livro que voc comea a ler agora.

    RESILINCIA VEM DO LATIM RESILIO, que significa voltar ao normal. O conceito foi criado em 1807 pelo cientista ingls Thomas Young, que fazia estudos sobre a elasticidade dos materiais. Mais tarde, a resilincia foi incorporada pela Fsica como a capacidade que certos materiais tm de acumular energia quando submetidos a um esforo e, cessado o esforo, retornar ao seu estado natural sem sofrer deformaes permanentes. o que acontece, por exemplo, com a vara utilizada no salto em altura: quando o atleta toma impulso para saltar, a vara se curva, acumula energia, projeta o atleta sobre o obstculo e depois retorna ao seu estado normal.

    Nas ltimas dcadas do sculo 20, o termo resilincia foi abraado pela Psicologia para denominar a capacidade que certas pessoas tm de sofrer fortes presses ou situaes de grande stress e no quebrar emocionalmente. Alis, elas no apenas superam as adversidades como ainda se fortalecem com isso. Um dos pioneiros no estudo dessa habilidade, na dcada de 70, foi o psicanalista infantil ingls James Anthony. Ele observou que algumas crianas, embora vivessem em lares desajustados ou conflituosos, apresentavam sade

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    INTRODUO

    emocional e alta competncia. Desde ento, vrios estudiosos do comportamento humano tm pesquisado e procurado entender como funcionam os indivduos resilientes.

    Devido sua capacidade de superao, as pessoas resilientes alcanam feitos extraordinrios, que muitas vezes as colocam em evidncia. o caso, por exemplo, de Ayrton Senna. Quando comeou a correr na Frmula 3 inglesa, ele tinha uma sria dificuldade: dirigir em pista molhada. Bastava chover um pouco e no conseguia segurar o carro, que comeava a derrapar. Como na Inglaterra as chuvas so comuns, Senna no conseguia marcar pontos em praticamente uma entre quatro provas, o que limitava muito seu desempenho como piloto. Mas como sua capacidade de superao era muito grande, decidiu enfrentar essa adversidade, mesmo com o nervosismo e aborrecimento que ela lhe causava. Comeou a treinar sistematicamente em pista molhada, at adquirir a competncia necessria para domar o carro quando chovia. O resultado disso todos ns conhecemos bem: saber correr na chuva tornou-se sua especialidade.

    Nos esportes, alis, no faltam exemplos de resilincia. Aconteceu de tudo na vida de Ronaldo Lus Nazrio de Lima, o Ronaldo Fenmeno: contuses graves, crises na vida pessoal, casamentos mal-sucedidos, escndalos, fracassos nos momentos em que seu time mais precisava dele, a cobrana impiedosa da mdia... E quando todos achavam que o Fenmeno nunca mais seria o mesmo, l estava ele, marcando gols novamente. O iatista Lars Grael, no auge de uma carreira repleta de conquistas, teve a perna decepada pela hlice de um barco, em um trgico acidente em 1998. Anos depois, voltou a competir e ganhar medalhas. O erro das pessoas, em geral, se voltar para trs, disse Grael certa vez. Se eu fosse comparar minha vida anterior com a que levo hoje, com certeza teria entrado em depresso. Mas no adianta ficar olhando para trs. Temos que lidar com o aqui e agora. Poderia ter sido pior, e tenho a obrigao de me sentir no lucro".

    Mas casos de resilincia no so exclusividade dos esportistas, claro. Encontramos exemplos desse comportamento na vida de pessoas das mais diversas reas de atividade profissional. Das artes vem um exemplo notvel: Joo Carlos Martins. Pianista excepcional, aos 20 anos j dava seu primeiro concerto no Carnegie Hall, em Nova Iorque, uma das mais famosas casas de concertos do mundo. Tocou em grandes orquestras e tornou-se o maior intrprete de Bach da atualidade. Um dia, em um inocente jogo de futebol, Martins sofreu um acidente que rompeu um nervo da mo direita. custa de

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    um tratamento longo e doloroso, conseguiu voltar a tocar, mas anos depois o esforo repetitivo do piano lhe causou leses terrveis nas mos. Para continuar tocando, usava cada vez menos dedos, e para isso teve de desenvolver uma maneira prpria de executar msicas ao piano. A doena continuou a se agravar, at o ponto em que ficou impraticvel tocar; ento, tornou-se maestro. Hoje, como j no consegue mais segurar a batuta nem virar as pginas da partitura para reger uma orquestra, obrigado a memorizar a peas musicais nota por nota, numa demonstrao de incrvel capacidade e paixo pela msica. Essa incrvel biografia contada em um documentrio franco-alemo chamado Martins Passion ( traduzido em portugus como Paixo segundo Martins).

    A vida de pessoas resilientes, realmente, d belos filmes. Em minhas palestras, costumo exibir um trecho do DVD Homens de Honra, que conta a trajetria do marinheiro americano Carl Brashear, falecido em 2006. Quando entrou para a Marinha, em 1948, era o cozinheiro do navio, mas sonhava ser mergulhador. O problema que, por ser negro, Brashear teve de lutar bravamente contra o preconceito e persistir muito para ser aceito na escola de mergulhadores da Marinha, o que finalmente acabou acontecendo. Tempos depois, tornou-se o primeiro mergulhador negro dos Estados Unidos e tambm um dos melhores da corporao. Em 1966, porm, sofreu um acidente no navio e feriu gravemente a perna. O prognstico dos mdicos era sombrio: se Brashear escapasse da gangrena, ficaria com seqelas pelo resto da vida e jamais poderia voltar a mergulhar. Como o mergulho era sua paixo, ele no teve dvida: mandou os mdicos amputarem a perna e alguns meses depois j conseguia andar normalmente com uma prtese. Como ningum acreditava que um homem com perna postia pudesse agentar o peso do traje de mergulho em profundidade (que, na poca, pesava mais de 100 quilos), Brashear teve de ir ao tribunal militar para provar que sim, era capaz de voltar a mergulhar. E voltou.

    VOC TALVEZ ESTEJA ACHANDO, at aqui, que a resilincia uma habilidade digna de vida cinematogrfica, reservada a uns poucos privilegiados, notveis, destinados ao sucesso e fama. De modo algum! No que as pessoas bem-sucedidas tornam-se resilientes: a resilincia que as torna bem-sucedidas. E ser bem-sucedido no significa necessariamente ser um recordista esportivo, um msico premiado, um militar condecorado, um empresrio milionrio ou profissional que chega presidncia de sua empresa: o sucesso tambm est nas vitrias cotidianas, em superar obstculos, em vencer adversidades, em sobreviver s crises que podem acontecer na vida de qualquer pessoa.

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    INTRODUO

    Neste livro, voc conhecer belas histrias de resilincia protagonizadas por gente comum, como eu e voc. Pessoas como o comerciante Robson Zinder, que teve seu negcio completamente destrudo por um incndio e, mesmo sem a indenizao de um seguro, conseguiu se reerguer. Como Ana Lcia de Lima, analista de sistemas que de repente foi transferida para um setor sobre o qual no entendia nada e teve de lidar com um gestor despreparado e explosivo. Como Jefferson Lopes de Freitas, que teve de superar muitas adversidades para colocar-se no mercado de trabalho, ou Jair Moretti, que mudou sua vida e a da famlia para assumir um novo emprego e pouco depois perdeu o emprego.

    Voc tambm descobrir que a resilincia no algo com que se nasce, como um dom, mas uma habilidade que pode ser desenvolvida. Um dos objetivos deste livro, alis, ajud-lo a desenvolver o comportamento resiliente, e para isso proponho a adoo de cinco atitudes, que chamo de princpios da pessoa resiliente. So eles:

    Ter conscincia de que dificuldades fazem parte da vidae preciso conviver com elas

    Compreender a natureza humanae buscar o contato com seu Eu Superior

    Persistir lutando para superar as adversidades

    Encarar o problema, tomar as decises necessriase investir energia para solucion-lo

    Entender que as dificuldades da vidanos tiram da zona de conforto e proporcionam crescimento

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    Agora, eu o convido a conhecer esses princpios e comear a coloc-los em prtica, o que aos poucos lhe permitir incorporar a resilincia ao seu modo de ser. Quanto tempo isso pode levar realmente difcil dizer, pois no de uma hora para outra que conseguimos mudar a forma como nos comportamos. Os padres de comportamento se estabelecem a partir de crenas e paradigmas que criamos h muito tempo, muitas vezes no incio da vida, e que por isso mesmo tm razes profundas em nosso emocional. Mudanas comportamentais podem ser demoradas e acontecem ao longo de um processo de quatro estgios, como mostra a figura a seguir: inconsciente incompetente, consciente incompetente, consciente competente e competente inconsciente.

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    INTRODUO

    Para exemplificar esse processo, vou usar um caso que pode ser um tanto dramtico, mas simboliza bem o modo como as coisas acontecem. Suponhamos que uma menina pequena tenha sofrido abuso de um adulto, o padrasto por exemplo. Essa uma situao que causa muito sofrimento criana e pode originar a crena de que os homens no so confiveis. Naquela fase da vida da menina, essa crena a protegeu fez com que ela procurasse evitar a presena do padrasto. Mas os anos passam, ela se torna mulher e o paradigma de que os homens no so confiveis traz muitas dificuldades para sua vida afetiva, impedindo que se aproxime de outros homens. Ela no consegue ter um relacionamento amoroso e no entende por qu.

    Pois bem, essa fase em que a mulher no sabe que h algo de errado consigo corresponde ao estgio inconsciente incompetente, j que no tem conscincia de que lhe falta uma competncia ou condio que a torne apta para a vida amorosa. At que ela l um livro sobre relacionamento afetivo, assiste uma palestra ou tem uma conversa com um psiclogo, por exemplo, e conscientiza-se de que tem um problema que a impede de se relacionar: assim, entra no estgio do consciente incompetente. A mulher decide ento fazer uma terapia, por meio da qual a antiga crena de que os homens no so confiveis aos poucos se transforma em alguns homens no so confiveis. Com isso, deixa de opor resistncia aproximao dos homens, permite-se conhec-los e deixar-se conhecer, dispe-se a confiar e consegue estabelecer um relacionamento: entra, assim, no estgio competente consciente, no qual pratica uma competncia com conscincia. Passado certo tempo, nada resta da antiga crena de que os homens no so confiveis e a competncia para relacionar-se foi completamente incorporada ao comportamento da mulher: o que ocorre no estgio competente inconsciente, no qual exercemos a competncia automaticamente, sem esforo, sem ter que pensar.

    Devo tambm observar que a passagem por esses estgios no to direta quanto gostaramos que fosse. No meio do caminho, sofremos algumas recadas e voltamos ao estgio que julgvamos ter superado. o que ocorre comigo, na luta para transformar um indesejvel trao de comportamento: a arrogncia. Eu era uma pessoa arrogante e prepotente e no tinha conscincia disso. Quando sofria alguma contrariedade, ficava transtornado e tinha atitudes muito autoritrias para com os outros. Fui assim at fazer o curso Leader Training, no qual tomei conscincia de que me comportava de maneira arrogante. Evidentemente isso me limitava, pois criava conflitos que dificultavam meus relacionamentos pessoais e profissionais. Era preciso trocar a agressividade pela assertividade no trato com as pessoas.

  • INTRODUO

    Fiquei um bom tempo patinando no estgio consciente incompetente. Por quantas noites coloquei a cabea no travesseiro e, ao rever meu dia, constatei que havia sido arrogante com algum! Eu simplesmente no conseguia evitar esse comportamento e recaa nele sem perceber. Mas no desisti de meu propsito: continuei trabalhando com meu travesseiro, fazendo o necessrio para desenvolver a competncia desejada. Enfim, chegou um momento em que eu conseguia evitar a arrogncia e tratar as pessoas com assertividade ou seja, entrei no estgio competente consciente. Ainda assim, vez ou outra, ca de novo no comportamento arrogante. Realmente, uma dura batalha e precisamos ser muito persistentes. Acho que na prxima vida, quem sabe, eu consiga enfim atingir o estgio competente inconsciente....

    Assim, no desenvolvimento dos princpios da pessoa resiliente, tenha em mente que sair do primeiro para o segundo estgio j um grande passo. Da para frente, trata-se de prestar ateno em si mesmo, ter pacincia e persistncia para incorporar os princpios da resilincia at que eles faam parte de sua natureza. O que posso dizer que vale a pena ter esse aprendizado... Afinal, cada vez mais, precisamos da resilincia para encarar os desafios que surgem nos imprevisveis dias em que vivemos.

    Um abrao e boa leitura,Ricardo Piovan

  • 1P R I N C P I O

    A pessoa resilientetem conscincia de que

    dificuldades fazem parte da vida e preciso

    conviver com elas.

    PRIMEIRO PRINCPIO

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    PRIMEIRO PRINCPIO

    SE FIZERMOS UM RETROSPECTO DE NOSSA VIDA, chegaremos concluso de que j enfrentamos adversidades desde antes de nascer. Embora durante a gestao nos sintamos quentinhos, confortveis e seguros, de vez em quando somos afetados por uma tenso ou mal-estar de nossa me, pois no somos capazes de diferenciar o que nosso do que dela. O tempo passa, e aos poucos comeamos a nos sentir apertados e desconfortveis no tero materno. A cada dia, essa sensao de presso aumenta, at chegar o momento em que precisamos sair dali para continuar vivos. E quanta presso sofremos para sair, passando por um orifcio to pequeno!

    Mas nossos problemas ainda no acabaram. Ao nascer, sentimos um desagradvel choque trmico: em questo de instantes, a temperatura ambiente, que era em torno dos 37 graus, cai para 21, 22 graus. Nossos olhos, que at ento s conheciam a penumbra, de repente so ofuscados pela luz. O corpo, que vivia envolvido pela suavidade da gua, enrolado em um lenol. Os pulmes, que nunca haviam funcionado, se inflam de uma coisa estranha chamada ar, e isso muito dolorido! Em resumo, logo nos primeiros instantes de vida neste mundo, j passamos por uma adversidade tremenda. Somos expulsos de um ambiente conhecido para um ambiente novo e muito hostil, mas sobrevivemos.

    Pela vida afora, enfrentamos ainda outros momentos de drsticas mudanas e dificuldades. Um deles logo na primeira infncia, quando entramos para a escola. At ento vivamos no espao seguro e familiar de nossa casa, rodeados por pessoas conhecidas, com quem j havamos nos habituado. E, de repente, nos levam para um lugar novo e nos deixam l, sozinhos, com gente que no conhecemos. No bastasse isso, temos que aprender novas regras, a nos comportar e ficar quietos quando a professora manda. Da para a frente, na vida escolar, somos submetidos a presses crescentes para realizar as tarefas, estudar, tirar boas notas, passar de ano... Hoje, j tendo passado por tudo isso, minimizamos a gravidade dessas crises da infncia. Mas, na poca em que passamos por elas, no foi nada fcil. Tivemos que desenvolver competncias para super-las.

    Na adolescncia, entre 16 e 17 anos, comea um outro tipo de presso, j no mais restrita aos pais e professores, mas feita por toda a sociedade, que nos diz: Voc j escolheu sua profisso?. To jovens, temos que decidir nosso futuro, para no momento seguinte j encarar um vestibular. E h vagas sobrando nas melhores universidades, no ? Quem dera. O vestibular testa os limites de nossos conhecimentos e competncias: como um grande funil,

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    PRIMEIRO PRINCPIO

    pelo qual nem todos conseguiro passar. Quando passamos, enfim, temos alguns anos de relativo sossego. Basta estudar para tirar boas notas, coisa que j nos acostumamos a fazer, e curtir as festas, os namoros, as viagens... uma poca memorvel, que chega ao final mais cedo do que gostaramos. Ento nos colocam um canudo de papel na mo e dizem: Agora hora de voc arrumar um emprego. E h vagas sobrando no mercado de trabalho, no? Os recrutadores de pessoal das melhores empresas fazem fila na porta das universidades, nos assediam com ofertas de emprego irrecusveis... Pois sim.

    O ingresso no mercado de trabalho mais um fator de presso, e a m notcia que, uma vez colocados nele, parece que perdemos de uma vez a paz. O que encontramos um cenrio de stress constante, com empresas que querem fazer cada vez mais com cada vez menos, metas crescentes a alcanar... Ultimamente, nas visitas que fao s empresas, tenho notado que as pessoas esto com uma certa fobia de reunies. Elas entram nesses encontros para prestar contas sobre suas metas e, quando a reunio termina, saem com o dobro de metas para alcanar! E as mudanas, ento? Quando estamos prestes a alcanar um objetivo profissional, a empresa em que trabalhamos sofre uma reestruturao, ou se funde com outra, ou vendida e mudam as regras do jogo, mudam os nossos superiores, muda a nossa situao.

    No vamos nos esquecer, claro, de outros percalos a que estamos sujeitos na vida adulta: perda de emprego, negcios que vo por gua abaixo, prejuzos financeiros, perda de pessoas queridas, o fim de um casamento, uma doena grave, uma sociedade que se desfaz, problemas familiares de todos os tipos... Ento chegamos terceira idade, quando enfim podemos parar de trabalhar e viver s custas da aposentadoria. E nossa penso vitalcia to polpuda, no? D e sobra para viver e manter o mesmo padro de vida que tnhamos antes. Alm disso, todos os anos a Previdncia corrige nossa aposentadoria de acordo com as perdas da inflao. At parece! O fato, meu caro leitor, que at no final da vida, depois de tantos anos de luta, temos de continuar enfrentando dificuldades. Haja resilincia para passar por tudo isso!

    Quando me ouvem fazer essa anlise da vida, as pessoas me dizem nossa, Ricardo, que viso pessimista. Pois no acho que estou sendo pessimista, e sim realista. A vida assim, quer gostemos ou no. Adversidades, presses, crises e tudo mais fazem parte dela. Pessimismo acreditar que no temos capacidade para enfrentar todos esses processos e temos, estou convicto disso.

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    PRIMEIRO PRINCPIO

    Conhea agora um pouco da histria de Robson Zinder, algum que desde cedo aprendeu a enfrentar os altos e baixos da vida.

    Sou de uma famlia de comerciantes de Florianpolis, em Santa Catarina, e desde garoto testemunhei a luta de meus pais para manter seu mercado. Com eles, aprendi que vida de comerciante no tem um equilbrio constante: est sujeita a problemas que, quando aparecem, precisam ser enfrentados. Hoje, percebo o quanto aprendi ao v-los encarar situaes difceis e encontrar uma soluo que no est fora, mas dentro de ns mesmos.

    Uma dessas situaes aconteceu quando eu tinha 13 anos. Naquela poca, a inflao no Brasil era muito alta, e o governo tentava control-la com planos econmicos. Ento, em 1986, foi decretado o Plano Cruzado, que mudou a moeda e tabelou o preo dos produtos no varejo. Esse plano causou um enorme prejuzo para o supermercado, pois as mercadorias que haviam sido adquiridas a um preo X tinham de ser revendidas a um preo menor, para obedecer tabela. Da noite para o dia, meus pais foram do cu ao inferno e se viram bastante endividados. O jeito foi vender uma das casas da famlia, alugar aquela em que morvamos e nos mudar para o depsito do supermercado. Entre prateleiras cheias de produtos at o teto, colocamos os nossos mveis, nossas roupas e objetos, e ali moramos cerca de um ano. Eu, que j ajudava meus pais no supermercado, acompanhei toda a luta deles para sair das dvidas e normalizar os negcios. Aquilo me marcou muito, mas de uma forma positiva, que me ensinou a valorizar todas as coisas boas que acontecem e deixar para trs os momentos de dificuldade.

    Com o avano da idade, meus pais resolveram fechar o mercado e alugar o salo onde a loja funcionava, que pertencia a eles. Fui tocar a vida sozinho. Montei um restaurante com meu irmo, mas no deu muito certo. Em 1997, depois que me casei, tomei a deciso de abrir meu prprio mercado, o que era meu sonho desde os tempos de criana. Aluguei uma parte do salo de meus pais e montei o negcio. Lembro que no tinha dinheiro nem para comprar prateleiras, e fui eu mesmo mont-las com a ajuda de um marceneiro. Quando abri o mercado, ele era pequeno e modesto, mas passados dez anos j ocupava o salo inteiro, como no tempo de meus pais. As coisas iam bem, eu me sentia financeiramente estabilizado e tinha timas perspectivas de futuro.

    Foi ento que, num domingo de fevereiro de 2007, minha vida sofreu uma grande reviravolta. Lembro-me de ter passado o dia com a famlia, fazendo planos para construir uma nova casa. noite, terminei a lista de compras no Ceasa e fui deitar. Quando deu meia-noite mais ou menos, o telefone tocou: algum que me avisava de um grande incndio no mercado.

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    PRIMEIRO PRINCPIO

    No deu tempo de pensar em nada. Corri para l e, quando cheguei perto, vi uma cena de filme americano. Havia uma confuso de gente, fumaa e luzes dos carros de bombeiro no meio da rua. Minha maior preocupao era com minha me e minha irm, que moravam no apartamento em cima do mercado, e para meu alvio as encontrei a salvo, no meio da multido. Eu nada tinha a fazer seno observar o trabalho dos bombeiros e ser consolado pelo pessoal do bairro, que desde 1967 prestigiava a loja da Famlia Zinder.

    Quando o incndio acabou, no comeo da madrugada, constatei que a perda era total. A casa de minha me, no andar de cima, no havia sido atingida, mas o supermercado estava completamente destrudo. Infelizmente, eu no tinha seguro tempos antes, passei por um aperto financeiro e tive de suspender a aplice para conter despesas. A situao era desesperadora, mas, por incrvel que parea, eu me mantinha calmo. S pensava em limpar todo aquele estrago.

    Na manh do dia seguinte, eu e alguns amigos j estvamos cobrindo a fachada do mercado com uma lona. Chamamos caambas de remoo de entulho e retiramos, naquele mesmo dia, tudo que havia l dentro. Minha adrenalina estava to alta que no senti graves queimaduras que apareceram nos ps e pernas, provavelmente causadas por resduos de produtos de limpeza que havia no cho do mercado e encharcaram meus tnis. noite, tive que ir para o hospital, para fazer curativos.

    S na tera-feira que a ficha caiu. Levantei antes das cinco da manh, peguei o carro e rumei para a Ceasa, como fazia todos os dias. Quando cheguei l e comecei a pensar no que tinha de comprar, falei para mim mesmo: O que estou fazendo? Meu supermercado foi destrudo!. Foi a que senti toda dor e frustrao que no havia sentido at ento. Chorei muito naquele dia e voltei para casa. Tinha de comear tudo de novo, do zero. Eu ainda no sabia como, mas estava decidido a reabrir meu mercado.

    DIZ UMA FRASE QUE CONHEO H MUITO TEMPO e j nem lembro de onde: O problema no o problema em si, mas sim a atitude que temos frente o problema. Com relao ao tipo de atitude, a psicologia identifica trs tipos de pessoas: os submissos, os reativos e os proativos.

    Submissos So os que se conformam passivamente com as intempries da vida e renunciam ao sucesso. Se acomodam, como se sofressem de uma espcie de sndrome de Gabriela e dissessem: Eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim, vou ser sempre assim. Gabriela(..) H tambm os que atribuem ao destino, vontade de Deus ou ao seu carma a

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    PRIMEIRO PRINCPIO

    responsabilidade pelo que esto vivendo e, assim, cruzam os braos, como se nada houvesse a fazer. bem verdade que devemos aceitar as adversidades como fatos naturais da vida, mas aceitao bem diferente de submisso. Submeter-se eximir-se de enfrentar uma adversidade. A nica atitude dos submissos lamentar-se. Vejo muitas pessoas submissas nas empresas que visito. Quando tm uma oportunidade, elas se queixam de uma situao difcil que esto vivendo, algo como puxa, Ricardo, no agento mais isso aqui, a empresa uma baguna, meu gestor um completo despreparado etc, etc, etc... Costumo dizer que elas tm quatro escolhas. Uma tomar atitudes para mudar o que no funciona na empresa e assim ter um melhor ambiente de trabalho. Outra mudar a si mesmas, internamente, para ser capazes de conviver com essas situaes da melhor foram possvel. Outra escolha mudar de empresa, se no houver como mud-la nem bastar mudar a si mesmo. Por fim, h tambm a escolha de continuar sofrendo e no fazer nada a respeito, que a escolha dos submissos alis, se formos pensar bem, tambm a dos reativos.

    Reativos - Estes so os que no aceitam as adversidades e se revoltam contra elas. Em vez de assumir a responsabilidade por solucionar seus problemas, sempre encontram a quem culpar. Por isso, esto constantemente reclamando de algum: do chefe, que um incompetente; dos subordinados, que fazem tudo errado; dos colegas, que no colaboram; da direo da empresa, que no toma as decises certas... No importa que o problema seja exclusivamente deles, pois mesmo assim insistem em neg-lo ou jog-lo nas costas de algum. Observe que os comportamentos descritos at agora tm um aspecto de manipulao, seja consciente ou inconsciente. A pessoa submissa, ao se fazer de vtima, tenta mobilizar os outros a resolverem os problemas dela ou perdo-las por sua incompetncia. o caso daquele funcionrio que no entrega o trabalho no prazo e inventa mil desculpas que o parceiro no fez a parte dele, que o setor tal no entregou as informaes necessrias a tempo, que surgiram dificuldades no processo etc etc. Com isso, o funcionrio tenta comover (ou seja, manipular emocionalmente) seu gestor para obter mais prazo. J a pessoa reativa, ao colocar em algum a culpa por seus problemas e dificuldades, procura transferir aos outros a responsabilidade por resolver tais situaes. Quem mais perde com isso ela mesma, pois no desenvolve as competncias necessrias para o seu crescimento pessoal e profissional, j que a culpa nunca dela e sim dos outros alm, claro, de continuar com os problemas, pois ningum os resolver para ela!

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    PRIMEIRO PRINCPIO

    Proativos - Em vez de curvar-se diante dos problemas, como os submissos, enfrentam a situao com a cabea erguida. Diferentemente tambm dos reativos, que dispendem energia para reclamar da adversidade e procurar culpados, os proativos assumem as responsabilidades que lhes cabem e investem energia na soluo da situao. Com essas atitudes, transformam as dificuldades em oportunidades de aprendizado, desenvolvem-se e fortalecem-se. Proatividade uma caracterstica das pessoas resilientes, como podemos observar no comportamento de Robson Zinder. Apesar da gravidade da situao que viveu, ele no perdeu um s instante para lamentar seu infortnio, nem para procurar culpados pelo que aconteceu. Sua atitude foi arregaar as mangas e comear logo a resolver a situao. Mais adiante neste livro, voc ver como ele deu a volta por cima, saindo de um rombo financeiro de quase meio milho de reais para reabrir seu mercado e voltar a prosperar.

    AGORA EU PERGUNTO: E VOC, LEITOR, em qual dos grupos est? No dos submissos, reativos ou proativos? importante que se situe com relao forma como reage s adversidades, e para tanto proponho que faa o teste abaixo. As instrues so as seguintes:

    1. Responda as questes abaixo conforme a seguinte escala: Sempre - 3Frequentemente - 2s vezes - 1Muito raramente - 0

    2. Marque sua resposta no quadrado em branco ao lado da questo. Por exemplo, digamos que na questo 1, Numa situao de stress, mantm a calma para resolver o problema, sua resposta seja s vezes, que corresponde ao nmero 1. Ento voc marcar 1 no quadradinho em branco dessa questo, que est na coluna B.

  • Numa situao de stress mantm a calma para resolver o problema ? Costuma desprezar as pessoas que no so importantes para voc ? Procura harmonizar-se com as pessoas a sua volta ? Valoriza datas comemorativas como Natal, Aniversrios e etc ? Analisa bem as situaes e apenas depois toma decises ? extremamente crtico quando as coisas no saem ao seu agrado ?Numa festa que conhece poucas pessoas, voc fica retraido ?Costuma protelar decises de problemas desagradveis ?Valoriza o senso de responsabilidade?Conversa com as pessoas olhando nos olhos ? Costuma se lamentar quando no atinge seus objetivos ? Costuma examinar a reao das outras pessoas ? questionador ? Procura sempre a perfeio nas suas tarefas ?Julga corretamente as pessoas e fatos ? extremamente rigoroso com os fracassos das pessoas ? do tipo que consegue dizer o que pensa? Sempre arranja boas desculpas para seus fracassos ? Costumeiramente expressa-se dizendo: "Voc deve fazer isso." ? Cumpre rigorosamente os regulamentos?Sabe lidar bem com as pessoas? Esfora-se para contentar os outros? Colhe vrias informaes e fatos e os analisa bem antes da tomada de deciso ? Evita o conflito com pessoas que o cercam ? Numa situao de contrariedade costuma questionar as pessoas antes de julgar ?Procura agir em busca do ideal?Costuma planejar antes de agir ?No se emociona numa conversa triste ?Expressa com firmeza sua opinio pessoal?Conversa com facilidade com as pessoas ?

    A B C

    123456789101112 13 14

    16171819 20212223 24252627282930

    15

    Total de pontos em cada coluna

    A B C

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    PRIMEIRO PRINCPIO

  • A Reativa

    1 10 20 30

    B Proativa

    1 10 20 30

    C Submissa

    1 10 20 30

    24

    PRIMEIRO PRINCPIO

    3. Depois de responder todas as questes, some os nmeros assinalados em cada uma das colunas e anote-os na linha Total de pontos.

    4. Por ltimo, transfira os totais obtidos em cada coluna para o gabarito abaixo. Compare as pontuaes obtidas em cada coluna e verifique qual dos comportamentos (submisso, reativo ou proativo) predomina em voc.

    Espero que voc tenha recebido bem o feedback que esse teste acaba de lhe proporcionar com relao s suas atitudes. Mas se bem conheo a natureza humana, pode ser que voc no esteja muito confortvel com o resultado obtido. Bem, isso normal. Nos treinamentos que dou, enfatizo muito a importncia do feedback para o desenvolvimento pessoal. Abordo a maneira de dar e receber feedback, e, neste ltimo caso, falo sobre as respostas emocionais que as pessoas normalmente tm ao receber um retorno a seu respeito que no consideram positivo.

  • Emoes no Feedback

    NEGAO

    RAIVA

    INDIFERENA

    RACIONALIZAO

    ACEITAO

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    PRIMEIRO PRINCPIO

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    PRIMEIRO PRINCPIO

    Num primeiro momento, a pessoa se nega a admitir que tem o comportamento apontado pelo feedback. Recusa-se a acreditar na informao que lhe dada e argumenta que a pessoa que a d est enganada. No caso do teste, a negao se manifesta com um pensamento do tipo esse teste est totalmente furado.

    Depois da negao vem a raiva com relao pessoa que deu o feedback. O grande problema, aqui, que voc ficar zangado comigo, j que sou o autor do livro... Mas tudo bem, essa raiva no dura muito. Logo substituda por um sentimento de indiferena, algo como ah, isso s um teste sem importncia, deixa pr l....

    Neste ponto importante observar que enquanto se deixar tomar por essas emoes, voc permanecer no estgio incompetente inconsciente de que tratamos na introduo deste livro, e de nada valer o alerta que estamos dando em relao ao seu modo de agir. Considere que esses comportamentos podem estar atrapalhando suas conquistas ou limitando seu desempenho. Peo, assim, que voc conceda ao teste o benefcio da dvida. Aja como quem est com a pulga atrs da orelha e comece a observar-se. Como voc reage quando algum o contraria: no tem atitude alguma, agride a pessoa ou procura resolver a situao da melhor forma possvel?

    Conforme observa a si mesmo, voc entra no estado de racionalizao, em que comea a perceber atitudes submissas ou reativas em relao s circunstncias que o desagradam. A racionalizao favorece sua entrada no estado de aceitao, no qual voc assume que tem atitudes que o limitam e pode ento iniciar um processo de mudana comportamental. Nesse caso, ter evoludo para o estgio consciente incompetente e dado um importante passo para seu desenvolvimento pessoal.

    Caso voc tenha dificuldade para alcanar os estados de racionalizao e aceitao, solicite ajuda. Pea a algum prximo para fazer o teste com voc, questione as alternativas e pea exemplos de situaes em que voc agiu desse ou daquele jeito. Contar com a viso dos outros essencial para quem deseja aprimorar a conscincia sobre si prprio. Afinal, como costumo dizer nos treinamentos e palestras que dou, Deus nos fez de tal modo que no podemos enxergar nossas costas, mas os outros podem. Portanto, devemos levar em considerao o que eles vem.

  • 2P R I N C P I O

    A pessoa resiliente compreende a natureza

    humana e busca o contato com seu Eu Superior

    SEGUNDO PRINCPIO

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    SEGUNDO PRINCPIO

    O conceito de natureza humana de que trato neste captulo vai ao encontro de vrias correntes filosficas e espiritualistas que dizem que o homem tem diferentes nveis de conscincia. Em minha viso, esses nveis so o Eu Superior, o Eu Inferior e o Eu Mscara, os quais irei explicar em seguida. No sou o primeiro nem o nico a usar esses termos: eles so os pilares do Pathwork of Self Transformation (O Caminho da Autotransformao), disciplina espiritualista que visa ao autoconhecimento, fundada pela austraca Eva Pierrakos (1915 1979) e seu marido John Pierrakos, psicanalista americano. Embora eu use os mesmos termos, a forma como os compreendo no rigorosamente a mesma como so abordados no Pathwork. O que apresento aqui a minha interpretao.

    Bem, vamos ento aos nveis de conscincia do homem, representados na figura a seguir:

    Eu Superior representado como o nvel mais interno porque corresponde nossa essncia. Quando estamos nesse nvel de conscincia, nos sentimos em contato com Deus e expressamos o que temos de mais elevado: amor, paz, felicidade, criatividade, generosidade, compaixo, altrusmo, autenticidade... Nos sentimos em unicidade com as outras pessoas, pois reconhecemos que elas tambm tm um Eu Superior, mesmo que naquele momento no estejam em sintonia com esse nvel de conscincia.

    Um pouco do comportamento baseado no Eu Superior pode ser observado em crianas pequenas. Nessa fase da vida, o ser humano no tem

    EUSUPERIOR

    FERN II O RUE

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    SEGUNDO PRINCPIO

    maldade, alegre, carinhoso, espontneo e autntico. Alis, quando falo em autenticidade, logo lembro de um episdio de meu filho quando tinha talvez uns quatro anos. Minha irm veio nos fazer uma visita e perguntou a ele: E ento, Pepinho, estava com saudades da titia? Meu filho olhou bem para a tia e disse sem a menor cerimnia: No! Todos ns achamos graa da resposta dele, pois foi uma reao espontnea e autntica de quem no sabe mentir, mas apenas expressar seus sentimentos.

    Ao usar o exemplo da criana, no estou querendo dizer que o Eu Superior sinnimo de ingenuidade ou infantilidade, mas apenas mostrar que esse o nosso nvel de conscincia primordial. Conforme amadurecemos, expressamos o contato com o Eu Superior com atitudes mais amadurecidas tambm, mas invariavelmente amorosas e autnticas. Quando sentimos compaixo por uma pessoa que sofre e a ajudamos, quando expresssamos ternura ou gratido, ou ainda quando perdoamos de corao algum que nos prejudicou, estamos em sintonia com nosso Eu Superior.

    Eu Inferior Se o Eu Superior nossa essncia, que expressamos desde o comeo da vida, a partir da segunda infncia comeamos a criar o Eu Inferior. Como o nome sugere, esse nvel de conscincia corresponde parte de ns que egosta, vingativa, que agride, mente, engana enfim, tem sentimentos e atitudes baseados no medo e raiva, que se opem ao amor. E por que criamos o Eu Inferior? Porque em nossa interao com outros seres humanos, percebemos que s vezes somos penalizados por ter atitudes de generosidade e autenticidade. Deixamos um amiguinho pegar nosso brinquedo, mas ele no quer devolver: ento, por medo de ficar sem nossas coisas, comeamos a no emprest-las mais. Contamos para nossos pais que fizemos alguma coisa errada e eles nos repreendem; ento, para no ser repreendidos, aprendemos a mentir. Falamos para a tia que no estamos com saudades dela, mas vemos que ela d mais ateno para o nosso irmo que disse estar com saudades: ento, por medo de no ter a ateno dos outros, aprendemos a enganar. E por a vai.

    Talvez a fase da vida em que mais facilmente notamos atitudes do Eu Inferior na adolescncia, quando, para nos afirmar, temos um comportamento predominantemente egocntrico. Quem convive com adolescentes sabe muito bem do que estou falando! Minha filha, por exemplo, no podia saber que a tia viria nos visitar e j comeava com ameaas: Pai, fala pra tia no vir me encher o saco hoje, no quero ficar ouvindo lies de moral, eu sei cuidar da minha vida. Se ela vier aqui falar comigo, vou dizer o que ela

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    SEGUNDO PRINCPIO

    no quer ouvir. Eis o Eu Inferior em ao: arrogante, prepotente, agressivo... Mas, por trs dessas atitudes, sabemos que h sempre medo ou raiva no caso de minha filha, medo de que lhe chamassem a ateno por alguma coisa.

    A essa altura, acredito que voc j tenha identificado algumas atitudes tpicas de Eu Inferior, no ? Basta levarmos uma fechada no trnsito, sermos criticados pelo chefe ou prejudicados por algum para que esse nvel de conscincia se manifeste em ns com toda intensidade.

    Eu Mscara Esse nvel de conscincia nos faz dissimular nossos verdadeiros sentimentos e temores e projetar uma imagem que seja aceita pelo mundo. O Eu Mscara corresponde camada mais externa da figura porque, na prtica, funciona como uma forma de proteo contra a falta de segurana e de confiana em ns mesmos. Ou seja, procuramos aparentar o que no somos para nos proteger da infelicidade.

    Percebemos que se formos agressivos e prepotentes, as pessoas se afastaro de ns: ento, para evitar que nos sintamos isolados, aparentamos ser bonzinhos, mesmo que por dentro estejamos ardendo de raiva. Imaginamos que se admitirmos nossos erros e dificuldades, os outros nos julgaro fraco: ento, tentamos camuflar nossas inseguranas com um comportamento impositivo, que no admite contestao. De inmeras maneiras, adotamos atitudes para esconder aspectos de que no gostamos em ns mesmos e vivemos uma farsa o Eu Mscara. Observe que o medo tambm est includo a: medo de no sermos amados, aprovados, reconhecidos ou considerados.

    AGORA, VAMOS VER DE QUE MANEIRA manifestamos nossos nveis de conscincia no ambiente corporativo.

    Imagine que seu gestor tenha lhe solicitado um relatrio que compare as vendas do ano corrente com as do ano passado. O estudo ser apresentado diretoria, que precisa de dados para definir aes para o aumento das vendas no prximo ano. Mas voc, que anda muito atarefado, acaba no dando a devida ateno ao relatrio. Na pressa de apresentar o trabalho, no revisa o texto, que fica com vrios erros gramaticais, nem checa os dados das tabelas, que ficam com vrias inconsistncias. O gestor leva o relatrio reunio, e o resultado um desastre. A diretoria aponta os erros e inconsistncias, reclama do trabalho mal feito e insinua que o gestor incompetente, incapaz de elaborar um simples relatrio.

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    SEGUNDO PRINCPIO

    Bem, considerando que a maioria dos lderes no tem o devido preparo para dar feedbacks aos seus liderados, imagine como ser o retorno que o chefe lhe dar sobre a qualidade do relatrio, no ? Ele fica possesso e, investido da fria do Eu Inferior, acusa voc de incompetncia, irresponsabilidade e incapacidade preparar um simples relatrio ou seja, despeja a prpria bronca que recebeu. Agora eu pergunto: qual a sua reao? Ser que voc, sentindo-se agredido, bate boca com o chefe, contribuindo para aumentar a hostilidade da conversa? Ou faz cara de quem no tem culpa no cartrio e inventa uma histria qualquer para eximir-se da responsabilidade por sua falta de ateno? No primeiro caso, estar reagindo com seu Eu Inferior. No segundo, com o Eu Mscara.

    Voc talvez esteja a pensando: Mas tambm, por que o chefe tinha que vir com toda essa estupidez? Eu s agi em legtima defesa. Est certo, seu gestor poderia realmente ter agido de maneira diferente. Se estivesse no nvel de conscincia do Eu Superior, teria abordado voc com calma e respeito e procurado saber porque voc cometeu tantos erros no relatrio. Ento ele talvez percebesse que voc precisa de alguma orientao para realizar suas funes com maior eficincia, ou quem sabe de alguma condio ou ferramenta de trabalho, e aproveitaria a ocasio para fazer algo por seu desenvolvimento. Porm, o fato de o chefe vir com o Eu Inferior para cima de voc no justifica as reaes descritas acima. Ao reagir com seu Eu Inferior, voc s vai aumentar o conflito e talvez crie uma situao insustentvel com seu gestor. J ao reagir com o Eu Mscara, como se estivesse dizendo sei que sou imperfeito, mas fao de conta que sou perfeito, o que uma falsidade para com o chefe e consigo mesmo. E o que pior: em qualquer um dos casos, estar comprometendo seu desenvolvimento, pois, para crescer como pessoa e como profissional, preciso reconhecer suas limitaes e ir em busca das competncias necessrias para super-las.

    Alm do mais, meu caro leitor, no s o seu chefe que chuta o balde com os outros: voc tambm faz isso! Muito provavelmente depois daquele desastroso feedback, voc passa o resto do dia contrariado, remoendo cada palavra que ele lhe disse. Nem d seis horas da tarde e voc j est no carro, dirigindo para casa, com uma bela dor de cabea. Chega em casa com cara de poucos amigos, mal fala com a famlia... e a primeira contrariedade que tem, por menor que seja, suficiente para perder a pacincia com o filho, a esposa ou o marido. A eu pergunto: em que nvel de conscincia voc est nesse momento? Pois , voc assume seu Eu Inferior e desconta toda raiva e frustrao que est sentindo em cima de pessoas que nada tm a ver com o

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    SEGUNDO PRINCPIO

    que se passou antes. Faz isso em vez de estar no Eu Superior, o que seria muito melhor, pois lhe permitiria recuperar-se de um dia difcil com o carinho de seus familiares, dando amor a eles e recebendo amor em troca.

    Mas por favor, no estou dizendo isso para faz-lo sentir-se mal. Somos seres humanos e estamos constantemente caindo na armadilha da projeo, um fenmeno explicado pela psicologia. O que ocorre que voc ficou emocionalmente abalado com aquela discusso, e, no seu ntimo, culpa-se por sua falta de competncia em fazer o relatrio. Ento, basta o seu filho lhe contar que tirou nota baixa na escola, por exemplo, para voc projetar sua incompetncia nele e perder a pacincia. Se voc pensar bem, foi o mesmo que seu chefe fez: depois de ter sido repreendido pela diretoria por apresentar um relatrio mal feito, projetou a situao em voc. Fazemos isso com freqncia, projetando nossas limitaes e fraquezas uns nos outros. Agora, essa no , nem de longe, a atitude de uma pessoa resiliente, pois ela no foge de seus problemas, nem ignora suas dificuldades: em vez disso, enfrenta-os, e para tanto necessrio buscar a conexo com o Eu Superior. A histria da analista de sistemas Ana Lcia de Lima demonstra isso de maneira exemplar.

    Eu vinha fazendo uma slida carreira na rea de Tecnologia da Informao e estava muito satisfeita com o que havia conseguido em quase duas dcadas de trabalho. At que, certo dia, meu gerente me chamou para uma conversa e ofereceu uma oportunidade, segundo ele, imperdvel: assumir a gerncia de um setor administrativo da empresa em que eu trabalhava. No pude evitar de manifestar minha estranheza com o convite afinal, era uma profissional de Tecnologia da Informao e o departamento em questo no tinha nada a ver com isso. Mas meu chefe garantiu que eu tinha a qualificao necessria, e, depois de pensar alguns dias, aceitei o desafio. Afinal, eu nunca saberia no que a experincia iria dar se no a aceitasse. Ao mesmo tempo, tinha conscincia que estava assumindo um grande risco. O novo trabalho representava uma mudana radical em minha vida, e eu no fazia idia do que me esperava no futuro.

    Meus primeiros dias no novo setor foram um choque. Encontrei um departamento desorganizado e uma equipe totalmente desmotivada, mergulhada em problemas que no conseguia resolver e traumatizada com a gesto anterior, que havia sido desastrosa. Ainda se eu conhecesse as rotinas e prticas do setor.... Mas, para piorar, o que se fazia ali era um mistrio para mim. Eu perguntava para um e outro como os problemas eram solucionados, e eles demonstravam tambm no saber. Logo percebi que no podia contar nem com meu superior direto, o diretor da rea, pois tampouco ele sabia como as coisas funcionavam. Era o tipo de gestor que no ajuda nem orienta, apenas quer as

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    SEGUNDO PRINCPIO

    coisas feitas e os outros que se virem.

    Logo na segunda semana tive uma amostra de como seria difcil lidar com ele. Era preciso entregar para a corporao um relatrio dos trabalhos em andamento no setor, e a nica pessoa que fazia isso havia ficado doente. Fui falar com o diretor sobre a ausncia da funcionria e propor que adissemos a entrega do relatrio, e ele simplesmente respondeu com sarcasmo: Mas voc no aprendeu a fazer isso ainda! Como se em alguns dias de trabalho eu pudesse adivinhar que uma nica colaboradora centralizava a montagem de um importantssimo relatrio corporativo! Mas tudo bem, me virei como pude, fazendo perguntas para vrias pessoas, e consegui produzir um relatrio com 80% das informaes necessrias.

    Felizmente, o relacionamento com a equipe era bem diferente. Para comear, as pessoas me receberam muito bem. Aos poucos, fui comeando a conhec-las, entendendo seus problemas e dificuldades, e criou-se uma certa cumplicidade entre ns. Acho que elas sentiram que eu me preocupava com elas, estava empenhada em melhorar as condies de trabalho. Por vrias vezes eu as ouvi dizer que bom que voc est aqui com a gente. Tambm me sentia apoiada por todos, que sempre se mostravam prontos para colaborar e fazer o que fosse necessrio.

    Foi por essa equipe que eu agentei tudo por que passei com meu diretor, que era uma pessoa realmente muito difcil de se relacionar. Imagine o que ser incumbido de gerenciar um setor sobre o qual no conhece nada, perguntar certas coisas para o seu chefe e ouvi-lo berrar algo como mas voc no tem que perguntar isso para mim! Se eu fazia as coisas do jeito dele, ele reclamava; se fazia de outro jeito, reclamava tambm. Em tudo colocava defeito, nada estava bom. Era tambm uma pessoa agressiva e explosiva. Quando estava estressado devido a alguma cobrana de seus superiores, descarregava todo o stress em cima do primeiro que aparecesse. Em vrias ocasies ele se alterou e gritou comigo. Quando isso acontecia, eu procurava ter calma e tentava acalm-lo tambm. s vezes, procurava argumentar e pedia me deixa falar, me deixa falar. s vezes, ficava quieta, s ouvindo. Aquilo me abalava muito, mas eu tentava manter o controle emocional, pois sabia que confront-lo s iria piorar as coisas.

    Essas situaes me deixavam pssima e eu questionava muito minha permanncia naquele trabalho. Por um lado, nada parecia valer a pena: o local era longe de casa, eu no me identificava com as atividades do departamento, o chefe me destratava... Por outro, havia as pessoas. Quando me viam desanimada, elas vinham falar comigo, perguntavam se estava tudo bem, me ofereciam seu apoio. O

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    SEGUNDO PRINCPIO

    que eu estava passando era o mesmo que elas passavam h muito mais tempo, ento era possvel me colocar em seu lugar e entender como vinha sendo sofrido para elas enfrentar tudo aquilo. Eu pensava: No posso virar as costas para a equipe. Eles me receberam de braos abertos, contam comigo, confiam em mim. Assim, tomava coragem e continuava l.

    Se havia algo que estava valendo a pena em toda aquela histria, alis, eram as mudanas que estavam acontecendo com as pessoas. Quando cheguei elas estavam meio perdidas, sem saber ao certo como realizar suas funes. Mas aos poucos fomos mudando os processos, organizando o fluxo do trabalho, e a produtividade aumentou. As pessoas adquiriram mais segurana para exercer suas funes e o ambiente tornou-se mais leve, mais tranqilo. O nimo dos colaboradores mudou, e alguns at voltaram a estudar e sonhar em progredir.

    Quanto ao diretor.... Minha estratgia para lidar com ele era ir levando. Compreendia que ele se impunha pela fora porque no sabia faz-lo de outro modo, por despreparo ou falta de autoconfiana talvez. Quando estava atacado, eu me segurava para no bater de frente. Quando estava mais calmo, eu tentava falar, com muito jeito, sobre a maneira como me tratava. Dizia algo do tipo puxa, difcil conversar com voc. Numa dessas conversas, percebi que ele ficou at meio sem graa e, para minha surpresa, admitiu que perdia o controle emocional s vezes. Quando eu comear a extrapolar, chame a minha ateno, ele disse. Pois sim! Isso ele dizia quando estava calmo, mas quando se descontrolava no havia quem o fizesse parar de gritar. Era muito difcil.

    s vezes, eu tinha esperana que seu comportamento mudasse. Em certa ocasio, ele at surpreendeu quando disse que, algumas vezes, percebeu que estava exagerando pela expresso em meu rosto. De minha parte, tambm comecei a mudar. Fui adquirindo mais autoconfiana e aos poucos comecei a me colocar para ele de forma mais assertiva, a defender com mais firmeza aquilo em que acreditava. Mas as discusses ainda aconteciam, embora com menor freqncia do que no comeo.

    Eu no imaginava que essa histria teria um desfecho surpreendente, mas teve: ele foi demitido, e justamente por causa de seu temperamento difcil e a maneira como tratava as pessoas. De uma hora para outra as presses acabaram, tudo mudou.

    Hoje, olhando para tudo por que passei, vejo que tive um grande aprendizado, apesar de sofrido e difcil. Tive de me virar sozinha e descobrir um caminho das pedras que j existia. Essa foi uma habilidade que desenvolvi l, pois

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    SEGUNDO PRINCPIO

    at ento havia trabalhado em setores bem estuturados, onde as coisas funcionavam bem e bastava seguir os processos estabelecidos. Tambm estava acostumada a expressar minhas opinies e ter a concordncia das pessoas, e com aquele diretor tive que desenvolver a habilidade de argumentar, de convencer, de provar que estava certa. Reconheo que foi ele que me provocou e fez com que me desenvolvesse. De certa forma, sou grata a ele, pois me proporcionou uma oportunidade de crescimento.

    incrvel como em pleno Sculo 21, com globalizao e tudo mais, aconteam situaes como a vivida por Ana Lcia e sua equipe. Chefe que se impe pelo grito parece coisa de era medieval! Mas, infelizmente, h gestores despreparados para liderar pessoas por toda a parte. Na verdade, o problema mais abrangente: h profissionais despreparados para relacionar-se por toda parte... E como lidar com as pessoas? Certamente que no com o Eu Inferior, pois isso s traria o acirramento dos conflitos. Nem com o Eu Mscara, que nos impede de solucion-los. Imagine se Ana Lcia devolvesse no mesmo tom as grosserias do chefe: ela no duraria no cargo nem um ms, nem teria aprendido tudo o que aprendeu nessa difcil fase de sua vida. Se usasse o Eu Mscara, dissimularia o efeito que lhe causavam as exploses do diretor, e ele jamais iria se tocar que estava exagerando.

    Para mim, Ana Lcia agiu com a sabedoria do Eu Superior quando evitava bater de frente com o diretor e, quando ele estava mais calmo, procurava conversar sobre a maneira como ele a tratava: nesses momentos, foi paciente e autntica. E foi por influncia do Eu Superior tambm que decidiu permanecer no emprego para ajudar a equipe, numa atitude de considerao para com as pessoas. Veja como essa influncia foi decisiva para que Ana Lcia resistisse s presses e adversidades e adquirisse um aprendizado valioso no final, que o que ocorre com as pessoas resilientes.

    RECONHEO QUE NO FCIL agir de acordo com o Eu Superior, mas est ao alcance de todo ser humano faz-lo. E um dos caminhos que levam a isso, em minha opinio, entender o mecanismo que deflagra as reaes emocionais do Eu Inferior e procurar control-lo. Nesse sentido, considero muito til o trabalho do psiclogo e jornalista americano Daniel Goleman, autor do livro Inteligncia Emocional.

    Segundo Goleman, nossas reaes aos estmulos externos originam-se em duas regies do crebro: a amdala, que gera respostas emocionais, impulsivas e imediatas para a nossa proteo; e o neocrtex, que gera respostas baseadas na anlise da situao e avaliao de conseqncias. Ou

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    SEGUNDO PRINCPIO

    seja, a amdala emoo e impulsividade, enquanto o neocrtex racionalidade.

    Pois bem, quis a natureza que a amdala estivesse, digamos assim, na linha de frente do crebro e fosse a primeira a reagir diante de situaes que nos causam stress. Faz sentido: se ela no estivesse nessa posio privilegiada, no teramos reaes instantneas capazes de nos livrar de perigos e ameaas nossa segurana. Se a espcie humana conseguiu chegar ao Sculo 21, na verdade, graas a essa estrutura cerebral que fez o homem primitivo sair correndo quando atacado por um animal selvagem ou defender-se do golpe de um inimigo.

    Citando estudos realizados por neurocientistas, Goleman explica como se processam essas reaes. Primeiro, nossos sentidos captam um estmulo do meio externo, como por exemplo a viso de um objeto que vem em nossa direo ou um rudo de exploso. O estmulo chega primeiramente ao tlamo, estrutura em que a informao traduzida para a linguagem cerebral, gerando um impulso nervoso. Em uma frao de segundo, o impulso transmitido amdala, que faz uma varredura de toda experincia da pessoa com o objetivo de identificar se o estmulo percebido ou no um sinal de perigo. Goleman define a amdala como uma sentinela psicolgica que s sabe fazer um nico tipo de pergunta: Isso alguma coisa que me fere? Algo que temo ou odeio? Se a resposta for sim, ela faz um seqestro neural, ou seja, mobiliza o crebro para uma reao de emergncia, que totalmente instintiva e emocional.

    Eis porque temos reaes agressivas e at mesmo violentas quando levamos uma fechada no trnsito, somos criticados ou prejudicados por algum. A amdala interpreta esses estmulos como ameaa e dispara o gatilho para uma resposta irracional, s vezes at descontrolada. Tudo isso se passa to rapidamente que o neocrtex nem tem chance de saber o que est acontecendo, muito menos elaborar uma reao racional a respeito. Ele s entra em cena momentos depois, quando j fizemos um estrago com nossa exploso emocional e ficamos perplexos com a intensidade da reao que tivemos.

    E quantas vezes passamos por isso... Lembro-me de uma situao que vivenciei com um cliente de minha empresa de sistemas. Durante uma reunio, ele comeou a fazer crticas ao projeto que eu apresentava e apontar defeito em tudo. A certa altura, chamou minha empresa de incompetente, e a

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    meu sangue ferveu. A palavra incompetente foi o estmulo auditivo que disparou o alerta da amdala e me fez ter uma reao do tipo chutar o balde: fechei o notebook e sa da sala emocionalmente alterado, dizendo que jamais trabalharia para aquela empresa. Graas a essa reao emocional e intempestiva, perdi o cliente e oportunidade de desenvolver um projeto crucial para o crescimento da minha empresa. Hoje compreendo que se tivesse ficado quieto at o neocrtex se manifestar, poderia ter explicado melhor o projeto ao cliente e feito as correes necessrias para atender suas necessidades. Com isso, teria um novo produto para comercializar e talvez tivesse mantido o cliente comigo at hoje.

    Todos ns temos exploses emocionais de que mais tarde nos arrependemos. So os seqestros neurais que a amdala faz, deflagando uma intensa reao antes que o neocortex tenha a oportunidade perceber o que est acontecendo para ento refletir e gerar uma resposta racional. Em minha opinio, a pessoa que deseja desenvolver um comportamento resiliente no pode ser refm de sua amdala: deve manter o controle de suas reaes emocionais e, racionalmente, esperar o melhor momento para agir. Essa atitude, alis, exatamente a que Ana Lcia tinha quando sofria os ataques verbais do chefe.

    Sugiro agora cinco passos que ajudaro voc a desenvolver seu controle emocional. So inspirados nas idias de Daniel Goleman, com o acrscimo de minha experincia pessoal.

    1. Observe-se. Durante pelo menos uma semana, procure perceber quais so as situaes ou pessoas que fazem seu nimo inflamar-se. A conscientizao sobre os fatores que alteram seu emocional permitir que voc os identifique quando estiverem agindo e possa pensar antes de simplesmente reagir.

    2. Escolha um exemplo para seguir. Pode ser algum que voc conhece e que sabe lidar, sem perder o controle, com situaes semelhantes s que tiram voc do srio. Se possvel, pergunte pessoa como ela trata essas situaes. Depois, pratique mentalmente (imagine) a maneira como o seu exemplo lida com as questes que mexem com voc. Por exemplo, imagine que o chefe ou colega critica seu trabalho e voc tem uma resposta pensada e controlada. Ao exercitar esse processo, voc vai se tornando apto a agir de maneira mais racional e assertiva quando as situaes de fato acontecerem.

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    SEGUNDO PRINCPIO

    3. Perceba as sensaes fsicas que sinalizam a iminncia um possvel descontrole emocional. Talvez seja um aperto no estmago ou no peito, talvez uma tenso que se espalha pelo corpo. Considere essas sensaes como um sinal para voc se policiar e no perder o controle.

    4. Desative o seqestro de amdala assim que perceber os sinais fsicos. Esse passo to importante pode ser dado com uma estratgia muito simples: o famoso conte at dez. Essa receita to popular quanto antiga, ensinada por nossos avs, uma sbia maneira de conter o impulso emocional da amdala at que o neocrtex entre em ao, possibilitando uma reao mais ponderada. Ento, quando sentir uma forte presso emocional, pergunte a si mesmo se aquela situao tem de ser resolvida naquele instante. Einsten j dizia: Um problema no pode ser resolvido no mesmo estado emocional em que foi criado ou descoberto. Nesses momentos, costumo dizer uma frase muito til que aprendi e desejo transmitir a voc: Vou pensar nisso e falo com voc depois.

    Caso voc no tenha xito em conter suas reaes emocionais exacerbadas, no desanime. Perdoe-se e tire proveito da situao: reflita sobre o que ocorreu e o que poderia ter sido diferente. Da prxima vez, quem sabe voc consegue reagir de modo mais racional e assertivo. Nessa situao, pode ser bastante til realizar o passo 2. Procure saber como o seu bom exemplo lidaria com a situao e pratique a atitude desejada mentalmente. Acima de tudo, lembre-se daquilo que falamos no comeo deste livro: voc est saindo do primeiro estgio de mudana comportamental, isto , do inconsciente incompetente para o consciente incompetente. Ou seja, est adquirindo a conscincia de que precisa mudar alguns comportamentos, mas ainda no tem competncia para faz-lo e s o exerccio contnuo o levar ao estgio consciente competente.

    NA MEDIDA QUE CONTEMOS NOSSOS IMPULSOS emocionais mais primitivos, que so tpicos do Eu Inferior, vamos abrindo espao para a conscincia do Eu Superior. Isso nos proporciona autoconhecimento, que pr-condio para o nosso desenvolvimento pessoal e profissional e nos abre para procurar ajuda e elaborar um plano de ao para corrigir nossas falhas.

    Outro benefcio de acessar o Eu Superior que podemos compreender a limitao do prximo. O gestor despreparado ou o colega que vive provocando voc so seres humanos em evoluo tambm, com foras e fraquezas, habilidades e dificuldades como qualquer pessoa. Ao lidar com eles

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    em sintonia com seu Eu Superior, voc pode perdo-los por suas falhas e talvez ajud-los a perceber suas limitaes.

    Quando somos capazes de acessar o Eu Superior em momentos de presses e adversidades, no s no trabalho mas na vida pessoal tambm, estaremos realizando o maior processo de cura que o ser humano pode realizar aqui na Terra, pois estaremos vivenciando a nossa essncia, o amor, a autenticidade, a compreenso, a liberdade. Estaremos, enfim, em sintonia com Deus. No incio podemos ter a sensao que estamos perdendo a batalha ou que o outro est levando vantagem sobre ns, mas, passado o momento de tenso, sentimos um calor no seu peito - o calor da paz por ter agido corretamente, o calor da felicidade.

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    A pessoa resilienteno desaprendeu a lutar

    nem desiste de encontrar uma sada para as

    adversidades

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    Se a resilincia a capacidade de superar presses e adversidades, evidentemente a pessoa resiliente no desiste de lutar at livrar-se da situao adversa. At a, no falei nenhuma novidade, no? Ocorre, no entanto, que muitas pessoas desaprendem a lutar, como dizem alguns estudiosos do comportamento humano. Conforme enfrentam dificuldades marcantes e/ou constantes, certas pessoas chegam a um ponto em que desistem de superar os problemas e se acomodam. Ento fazem da acomodao o seu padro de comportamento, como se tivessem aprendido que diante de certas situaes nada adianta fazer a no ser conformar-se.

    Tomemos como exemplo um aluno que tem fraco desempenho na escola. Apesar de estudar para as provas e fazer as tarefas regularmente, s consegue tirar as notas mnimas para passar de ano. Se essa situao se repete por determinado tempo, a tendncia que ele crie o paradigma de que no adianta fazer esforo afinal, por mais que se empenhe, no consegue atingir os melhores resultados. Mais tarde, quando entra na vida adulta e no mundo corporativo, a pessoa continua presa ao velho paradigma e pensa no adianta me esforar muito aqui na empresa, os resultados que conseguirei sero apenas medianos.

    Martin Seligman, pesquisador e professor da Universidade da Pensilvnia, autoridade mundial em psicologia positiva, chama o comportamento exemplificado acima de desamparo aprendido. Pessoalmente acho essa expresso um tanto estranha, desamparo aprendido. Em todo o caso, como vou citar neste captulo os estudos e concluses de Seligman, coerente que eu use os termos que ele usa. Ainda assim, eventualmente vou usar a expresso desaprender a lutar como sinnimo de desamparo aprendido, pois em essncia as duas tm o mesmo signficado.

    Por meio de uma rdua pesquisa, Seligman comprovou que algumas pessoas realmente desaprendem a lutar e passam a desistir facilmente de seus objetivos. O pesquisador tambm identificou as diferenas de comportamento e modo de pensar que existem entre as pessoas que desaprenderam a lutar e as que nunca deixaram de lutar. Publicado no livro Otimismo Aprendido, o trabalho de Seligman tem tudo a ver com a questo da resilincia, e sem dvida uma leitura bastante indicada para voc, leitor.

    Antes de lhe contar sobre essa pesquisa, desejo apenas manifestar minha opinio sobre experimentos com animais, que so aplicados no trabalho do pesquisador americano. Penso que os animais so criaturas divinas que merecem todo nosso respeito e considerao e devem ser protegidos

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    contra abusos que possam lhes trazer sofrimento. No entanto, temos de nos render aos benefcios que sua participao em pesquisas traz para milhes de pessoas que tambm sofrem com os mais diversos problemas e doenas. A questo polmica e no pretendo discuti-la, pois no objeto deste livro, mas apenas chamar a ateno para a necessidade de refletirmos sobre os limites desses experimentos.

    Bem, voltando ao trabalho de Seligman, a pesquisa que ele realizou foi denominada tridico, envolveu trs grupos de ces e teve duas fases, que so descritas a seguir.

    Fase 1 Ensinando o desamparo

    Os ces grupo 1 foram colocados, um de cada vez, em caixas com paredes baixas, de modo que pudessem fugir da experincia se quisessem. Foram ento submetidos a choques de baixa intensidade, o suficiente para causar desconforto. Incomodados, saltaram para fora das caixas, j que tinham algum controle da situao e podiam livrar-se dos choques.

    Os ces do grupo 2 foram colocados em caixas de paredes altas e receberam choques na mesma freqncia e intensidade do primeiro grupo. Devido altura das paredes, no conseguiram saltar para fora da caixa nem livrar-se dos choques. Passados alguns minutos, sentaram-se e suportaram o incmodo sem reao alguma.

    O ces grupo 3 no receberam choques.

    Fase 2 Verificando o aprendizado do desamparo

    Dessa vez, os trs grupos de ces foram colocados em caixas de paredes baixas e submetidos a choques.

    Os do grupo 1 repetiram a ao da primeira fase: saltaram as paredes e livraram-se dos choques. Os do grupo 3, que no haviam recebido choques anteriormente, tiveram a mesma reao e saltaram as paredes.

    Seligman suspeitava que os ces grupo 2 (que foram submetidos a choques e mas impedidos de fugir) aprenderiam o desamparo, isto , aps vrias sesses do experimento, perderiam a habilidade de reagir e lutar. E estava certo: seis dos nove ces pertencentes a esse grupo simplesmente sentaram e no lutaram para sair da caixa, mesmo que naquela fase elas

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    tivessem paredes baixas. Eles no tentaram livrar-se dos choques e, por isso, sequer descobriram que poderiam pular para fora da caixa.

    A concluso do pesquisador foi que situaes inescapveis, sobre as quais os ces no tinham nenhum controle, levaram desistncia. A experincia deixou claro que os animais do segundo grupo aprenderam que suas aes eram inteis e, quando a situao se repetiu, sequer tentavam uma reao, tornando-se passivos e apticos.

    Mais tarde, uma verso dessa experincia foi realizada com seres humanos por um aluno de Seligman, Donald Hiroto. Participaram da pesquisa trs grupos de pessoas, colocadas individualmente em uma sala.

    Fase 1 - Ensinando o desamparo

    Assim que as pessoas do grupo 1 entraram na sala, um rudo muito alto e incmodo comeou a soar. Havia ali um controle com alguns botes que, apertados em determinada sequncia, interrompiam o rudo. Depois de alguns minutos dentro da sala, todos os participantes descobriram como desligar o som.

    O grupo 2 foi submetido ao mesmo processo, com a diferena de que nenhuma combinao de botes desl igava o som. Ou seja, independentemente do que as pessoas fizessem, no eram capazes de interromper o rudo. Passado algum tempo de tentativas em vo, elas desistiam e ficavam ouvindo o barulho aterrorizante.

    As pessoas do grupo 3 no foram submetidas a som algum.

    Fase 2 Verificando o aprendizado do desamparo

    Dessa vez, as pessoas dos trs grupos foram levadas sala com um som ensurdecedor. Apenas o sistema de desligamento havia mudado: era uma caixa que devia ser tocada em determinado ponto.

    Pois bem, as pessoas grupo 1 imediatamente foram at a caixa e comearam a toc-la at descobrir como desligar o som. As do grupo 3, que da vez anterior no haviam sido submetidas ao som alto, tambm se dirigiram at a caixa e comearam a manuse-la at conseguir interromper o rudo.

    Agora, adivinhe o que aconteceu com as pessoas do grupo 2, que na fase anterior no conseguiram desligar o som. A maioria delas se dirigiu at a

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    caixa e a manuseou por algum tempo, mas depois desistiu. As pessoas ficaram ali, sentadas, ouvindo o barulho ensurdecedor!

    Seligman e Hiroto inferiram que, se as pessoas aprendiam o desamparo naquela situao (equivale a dizer que desaprendiam a lutar contra a situao), o mesmo poderia acontecer em relao a situaes difceis da vida pessoal ou profissional. Ou seja, se suas aes no tivessem resultado contra problemas ou adversidades, elas poderiam desaprender a lutar e, por fim, perder a capacidade de lutar.

    luz dessa reflexo, fico pensando no estrago que um gestor despreparado pode causar quando d feedbacks negativos ou ofensivos sua equipe. Agir assim ensinar o desamparo s pessoas, pois elas comeam a achar que nada do que fazem suficiente para a realizao de seus objetivos. A est a receita para criar uma equipe incapaz de lutar ou pior do que isso, incapaz de fazer diferente para obter resultados diferentes. Infelizmente, como consultor que trabalha junto a empresas, vejo muitos funcionrios que desistem e curtem sua dor, como as pessoas que se conformaram em ouvir o som ensurdecedor...

    FELIZMENTE, NEM TUDO EST PERDIDO. Vamos voltar s experincias de Seligman e Hiroto, pois ainda no contei tudo. O que vimos at agora foram os resultados gerais. Alguns resultados se destacaram do padro, o que levou os pesquisadores a aprofundar os estudos e fazer novas descobertas.

    Seligman observou que, no grupo dos ces colocados na caixa de paredes altas, um em cada trs animais no desistiu de lutar para livrar-se dos choques na fase 2 do experimento. Na experincia de Hiroto aconteceu o mesmo: uma em cada trs pessoas que foram impedidas de desligar o som na fase 1 no desistiram de interromp-lo na fase 2.

    Outro resultado que chamou a ateno de Seligman foi que um entre nove ces no submetidos a choques na fase 1 no tentaram livrar-se dos choques na fase 2. Com a experincia de Hiroto deu-se o mesmo: uma em cada nove pessoas que no ouviram o rudo na fase 1 no tentaram deslig-lo na fase 2, simplesmente ficaram imveis na caixa, agonizando o desconforto.

    Evidentemente, os pesquisadores fizeram a si mesmos uma srie de perguntas diante desses resultados. Por que alguns desistem facilmente e outros no desistem nunca? O que est por trs dessas diferenas de

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    comportamento? Depois de vrios anos de experincias nessa linha, Martin Seligman chegou concluso de que a explicao para tais diferenas est no modo como pensamos. Ele identificou trs dimenses do pensamento das pessoas que desistem (PD) e das pessoas que no desistem (PND). Reproduzo neste captulo o que o pesquisador diz sobre as dimenses permanncia e abrangncia, que considero totalmente pertinentes e condizentes com o que penso. J no caso da dimenso personalizao, abstenho-me de fazer comentrios, pois no concordo plenamente com suas colocaes. Quero deixar claro que tenho o maior respeito pelo trabalho desse destacado pesquisador do comportamento humano, mas no estou alinhado com suas idias sobre essa dimenso.

    Dimenso permannciaDe acordo com Seligman, as pessoas que desistem acreditam que os

    infortnios so permanentes, levando ao fracasso definitivo. Ao pensar dessa maneira, elas impedem a si mesmas de tomar atitudes que permitiriam reverter a situao, pois em sua mente j definiram qual ser o desfecho. J as pessoas que nunca desistem acreditam que os infortnios so passageiros ou circunstanciais. Veja no quadro a seguir alguns exemplos das diferenas de pensamento entre os dois grupos:

    Estou acabado.

    Os projetos nunca terminamno prazo combinado.

    O Carlos de Compras sempre resmunga.

    Meu chefe um f.d.p.

    Estou exausto,mas amanh outro dia.

    Os projetos no terminam no prazo combinado quando no lhes dedicamos o

    tempo certo para o planejamento.

    O Carlos de Compras resmungaquando no enviamos os contratos

    devidamente preenchidos.

    Meu chefe est de mau humor hoje

    Pessoas que desistem (PD) Pessoas que nunca desistem (PND)

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    Fazer referncia s adversidades com termos definitivos como nunca ou sempre determinar a permanncia deles em nossa vida. Se, por outro lado, usarmos expresses que sugerem uma situao temporria ou transitria como s vezes ou ultimamente, estamos sugerindo a ns mesmos que tudo aquilo ir passar e/ou tem soluo.

    O uso do verbo ser tambm se associa a situaes definitivas. Por exemplo, dizer que determinado processo complicado sugere que ele assim mesmo e pronto, no tem jeito. Mas se em lugar do verbo ser usarmos o estar o processo est complicado -, admitimos que a situao momentnea e que uma soluo poder surgir.

    Temos de nos observar e evitar pensamentos que tornem as dificuldades permanentes. Se algum critica uma apresentao que fao, por exemplo, posso elaborar essa situao de duas maneiras: nunca fao boas apresentaes ou ultimamente no tenho feito boas apresentaes. No primeiro caso defino a mim mesmo como um pssimo apresentador e crio uma crena definitiva a respeito de minha habilidade de fazer apresentaes. No segundo admito uma dificuldade temporria e abro um espao para analisar por que no venho fazendo boas apresentaes. A anlise me leva concluso de que no tenho me preparado adequadamente, o que me leva soluo: basta me preparar para fazer boas apresentaes. Observe tambm que no primeiro caso no h porqus e sim definies, enquanto no segundo h porqus e espao para correes.

    Da dimenso permanncia fazem parte tambm os pensamentos a respeito dos bons acontecimentos da vida. Veja estes exemplos:

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    TERCEIRO PRINCPIO

    Observe que nesse caso as coisas se invertem. As PND referem-se aos bons acontecimentos com termos que sugerem permanncia, como o sempre e o verbo estar. Na mente dessas pessoas, os eventos felizes esto associados a caractersticas e habilidades que elas possuem; isso as faz acreditar que os acontecimentos podem se repetir e as estimula a contiuar sendo bem sucedidas.

    J as PD referem-se a bons eventos como se eles fossem circunstanciais, decorrentes da sorte, de situaes favorveis ou de um esforo extraordinrio. Por acreditar nisso, elas facilmente desistem de alcanar seus objetivos, j que acontecimentos bem sucedidos so uma casualidade que no se repete.

    A questo agora : o que fazer para mudar seu modo de pensar, caso voc tenha se identificado mais com os padres mentais das pessoas que desistem? Um recurso que considero bastante interessante a tcnica do cancela, que aprendi no treinamento Silvas Mind Control. Jos Silva, apesar do nome brasileiro, um americano que viveu no Texas e desenvolveu tcnicas para mudar os padres mentais limitantes que criam e agravam nossos problemas.

    Pessoas que desistem (PD) Pessoas que nunca desistem (PND)

    Tive sorte hoje

    Meu concorrente cometeu um erro e ganhei a concorrncia

    Hoje meu chefe elogiou meu trabalho, ele estava de bom humor

    O Pedro concluiu o projeto no tempo correto, ele se esforou

    Sempre tenho sorte

    Sou melhor que meu concorrente, ganhei mais uma vez a concorrncia

    Hoje meu chefe elogiou meu trabalho, realmente fiz um excelente relatrio

    O Pedro concluiu o projeto notempo correto. Ele tem talento.

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    A tcnica muito simples: toda vez que voc flagrar a si mesmo pensando ou dizendo uma frase tpica de pessoa que desiste, logo em seguida diga em alto e bom som: CANCELA, CANCELADSSIMO, CANCELADRRIMO. O treinamento ensina apenas o CANCELA, e eu acrescentei os dois adjetivos exagerados por conta prpria, para dar mais nfase... Em seguida, reformule a frase que acabou de dizer, usando os termos que as pessoas que no desistem costumam usar. Se, por exemplo, voc pensa algo como meus projetos nunca terminam no prazo, diga em seguida CANCELA, CANCELADSSIMO, CANCELADRRIMO e depois arremate com o projeto para implantar a folha de pagamento no terminou no prazo porque no planejei adequadamente o processo.

    Repare que, ao usar essa tcnica, voc deixa de determinar fracassos permanentes como as PD fazem e, de quebra, esclarece para si mesmo as causas de suas dificuldades. Isso o ajudar a evitar a repetio das dificuldades e solucion-las.

    Dimenso abrangncia

    Enquanto a dimenso permanncia associa-se com o tempo, a abrangncia relaciona-se com o espao, ou seja, a extenso de nossos problemas. Para as pessoas que nunca desistem, os problemas so localizados, restritos a uma rea da vida ou do trabalho. Para as pessoas que desistem, os problemas aumentam de tamanho e contaminam a vida pessoal e profissional.

    Para entender melhor como essa dimenso funciona, vou lhe contar um caso que se passou com uma empresa para a qual dei consultoria. Ela precisou fazer um corte no quadro de pessoal e demitiu dois funcionrios do mesmo departamento, Jssica e Amaral (os nomes so fictcios). Ambos ficaram bastante abalados com a dispensa e, por algumas semanas, se sentiram deprimidos, sem nimo para procurar um novo emprego nem desempenhar qualquer atividade que lembrasse o antigo trabalho. Apesar de bastante chateada, Jssica continuou sendo a me e esposa carinhosa de sempre, sua vida social prosseguiu normalmente e a sade manteve-se tima. Passados trs meses conseguiu um novo trabalho que lhe permitia conciliar ainda melhor a carreira com o papel de me. J Amaral se fechou em seu drama, distanciou-se do filho e da esposa, comeou a evitar as reunies familiares, afastou-se dos amigos, pegou uma gripe que no tinha fim, no jogou mais o futebol de que tanto gostava... E levou vrios meses para arrumar outro emprego.

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    Os comportamentos de Jssica e Amaral so bons exemplos de como as pessoas lidam com a abrangncia de suas dificuldades. Embora abatida com a perda do emprego, Jssica no permitiu que seu problema profissional interferisse em outras reas da vida que estavam indo bem. Com isso, conseguiu inclusive manter um certo equilbrio. Em contrapartida, Amaral universalizou seu problema, permitindo que contaminasse a vida familiar, a vida social e at a sade. Isso s fez piorar sua situao como um todo e dificultou ainda mais as coisas.

    Veja a seguir o que pensam as pessoas PD e PND com relao abrangncia:

    E voc, consegue perceber que abrangncia d aos seus problemas? Caso chegue concluso de que voc os universaliza, use a mesma tcnica do CANCELA para modificar seus padres de pensamento.

    Vamos agora conhecer a histria de Jefferson Lopes de Freitas, um homem que nunca desistiu de seus objetivos. Nascido com problemas fsicos - o principal uma deformidade na perna direita , teve de passar por 23

    Pessoas que desistem (PD) Pessoas que nunca desistem (PND)

    Todos os diretores da empresaso arrogantes

    As pessoas me acham incompetente

    Os treinamentos que a empresa oferece so inteis

    Este problema est acabando comigo

    O diretor de tecnologia arrogante

    Maurcio me acha incompetente

    O treinamento de gestode conflitos intil

    Este problema est dificultandoo andamento de meu novo projeto

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    cirurgias durante a infncia. Sua luta para ser capaz de andar, porm, foi apenas uma das que teve de empreender na vida.

    Sempre acreditei que o fato de ser portador de necessidades especiais no me impedia de fazer nada que os outros fizessem. Desde pequeno desejava me integrar sociedade, trabalhar, constituir famlia, levar uma vida normal, embora naquela poca nem existisse o termo incluso social. Queria mostrar s pessoas que, apesar de ser um pouco diferente delas, eu tambm tinha qualidades e capacidades.

    J na adolescncia, l pelos 14 anos, pensava em arrumar trabalho. Meu pai tinha cuidados exagerados comigo, o que me deixava um pouco incomodado, e eu queria ter um mnimo de independncia, ganhar algum dinheirinho para as minhas coisas. Comecei ento a procurar atividades como auxiliar de escritrio, boy ou ajudante, que eram funes que no exigiam esforo fsico e eu poderia realizar bem, j que tenho boa mobilidade. Passei meses visitando empresas ocasionalmente para deixar meu currculo, e nunca consegui nada. Percebia que as oportunidades de trabalho eram negadas devido minha condio.

    Por algum tempo, deixei de procurar emprego, pois afinal era muito jovem e tinha que completar os estudos. Ento chegou o momento de fazer uma faculdade, que era outro grande objetivo. Meus pais no tinham condies de pagar um curso superior, mas no desisti da idia e tanto fiz que acabei conseguindo uma bolsa integral para o curso de Cincias da Computao.

    Bem, eu j era um adulto, j fazia uma faculdade, e retomei o objetivo de conseguir meu primeiro emprego. Busquei oportunidades em escolas de informtica, onde eu poderia dar cursos, mas no conseguia nada. Na poca, ainda havia preconceito contra deficientes fsicos. Certa vez, por exemplo, vi o anncio de uma vaga para instrutor de informtica no jornal de domingo. No dia seguinte, bem cedo, j estava na porta da escola antes de ela abrir: