Economia Do Setor Publico No Brasil

Embed Size (px)

Citation preview

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    1/10

    7

    o r r u p ~ a o e p r o d u ~ a o

    de bens publicos

    Marcos Fernandes o n ~ a l v e s da Silva

    FGV EESP EAESP

    SUM RIO

    Este capitulo apresenta urn

    resumo da

    literatura recente sobre corrupc;ao. Seu principal

    objetivo e

    mostrar

    como a Ciencia Economica tern colaborado para a analise das causas e

    consequencias

    da

    corrupc;ao, principalmente no tocante a produc;ao de bens publicos. A cor-

    rupc;ao

    nao e

    simplesmente urn tipo de crime: ela

    e uma

    atividade economica

    que

    surge

    em

    alguns ambientes institucionais.

    Em

    primeiro lugar,

    apresentaremos

    urn resumo

    da

    literatu-

    ra sobre corrupc;ao aplicada ao problema da produc;ao de bens publicos e, em segundo, a relac;ao

    entre produc;ao de bens publicos, semipublicos e corrupc;ao. Argumentaremos

    que

    a corrupc;ao,

    seu controle e sua ilegalidade dependem

    da

    evoluc;ao institucional. Por fim,

    apresentaremos

    uma agenda de pesquisa para 0 Brasil e uma lista sucinta

    da

    literatura atual mais relevante.

    P L VR SCH VE

    Corrupc;ao; bens publicos; cac;ador de renda;

    escolha social; economia politica.

    INTRODU< Ao

    Ha basicamente, tres visoes sobre as causas e consequencias

    da

    corrupc;ao, tradicionais

    em economia.

    Elas sao complementares e formam, como procuraremos indicar neste capitulo,

    urn arcabouc;o te6rico util

    para

    a analise

    da

    relac;ao entre regras, instituic;oes, pay-offs compor-

    tamento corrupto e consequencias economicas

    da

    corrupc;ao. A

    primeira

    esta ligada ao

    conjunto

    de teorias sobre a ac ao de rent seeking a segunda

    a

    teoria economica

    da propina

    e a terceira,

    a relac;ao

    entre

    eficiencia, crescimento e desenvolvimento e corrupc;ao.

    Ap6s essa apresentac;ao, discorreremos sobre diversas interpretac;oes economicas

    do

    fenomeno

    da

    corrupc;ao, dando especial destaque para urn problema intrinseco a qualquer

    sociedade, qual seja, 0 controle sobre a decisao de produc;ao

    de

    bens publicos e semipublicos

    tomadas pelos agentes publicos, sejam eles politicos

    ou

    burocratas.

    I Este capitulo euma versao reduzida e alterada do Capitulo 3 do livro

    de

    Silva 2002) e Silva 2000).

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    2/10

    CORRUPc;.A.O E PRODUc;.A.O DE BENS PUBLICOS

    27

    ELSEVIER

    Tendo

    em vista a sugestao

    de

    uma agenda

    de

    investigac;ao para

    0

    Brasil, ao final desse

    ensaio apresentamos algumas linhas de pesquisa na area que consideramos prioritcirias e, em se-

    guida, listamos algumas referencias basicas - e abrangentes - que envolvem a discussao em

    torno

    da

    corrupc;ao e

    da

    produc;ao

    de

    bens publicos e semipublicos.

    QUAL

    E

    A RELA

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    3/10

    28 ECONOMl DO SETOR PUBLICO NO

    BRASIL

    ELSEVIER

    o custo associado a atividade ca

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    4/10

    CORRUPc;:AO E PRODUc;:AO DE B ENS PUB LICOS

    129

    ELSEVIER

    no papel de agente cac;;ador de renda, em

    grupos

    de patr6es-clientes. Casos recentes de

    corrupc;;ao no Ministerio da Saude no Brasil

    (esquema

    estabelecido

    entre

    1990-2004) sao

    exemplos

    desse tipo

    de

    incentivo.

    teoria

    economica

    da propina

    As teorias da corrupc;;ao

    como

    resultado de comportamento cac;;ador de renda fora da

    lei podem ser complementadas

    pela

    "economia politica da propina".5

    0

    estudo economico

    das instituic;;6es burocraticas e legais deve levar em considerac;;ao os fenomenos do suborno e

    da

    propina,

    principalmente

    devido ao fato

    de estarem

    ligados ao conlito

    inerente entre

    0

    bern publico e 0

    mercado.

    Considere, por

    exemplo, uma

    economia

    perfeitamente

    competitiva. Nessa situac;;ao,

    as

    relac;;6es de troca entre os agentes privados sao impessoais e visam a

    maxi

    mizar a

    func;;ao de

    utilidade de

    cad

    a urn. Urn prestador de servic;;o vende seus prestimos a qualquer outro

    agente

    desde

    que

    a

    venda

    seja satisfat6ria

    do ponto

    de

    vista privado;

    da

    mesma

    forma,

    0

    comprador

    de urn servic;;o demanda-o de qualquer

    agente, desde

    que a troca

    conduza-o

    ao maximo espera

    do

    de

    bem-estar. Alem disso,

    suponhamos

    a existencia

    do

    Estado perfeito,

    composto

    por bu

    rocratas profissionais cujo

    comportamento

    e

    estritamente

    publico, as decis6es

    tambem

    nao

    envolvem nenhum criterio pessoal. Os agentes publicos simplesmente maximizariam uma

    func;;ao

    de

    bem-estar

    social e

    proveriam,

    da forma mais eficiente possive , a

    sociedade

    de bens

    publicos (para 0 Teorema do Bem-Estar vide Capitulo 19).

    Urn

    mundo

    onde existe corrupc;;ao e

    propina

    afasta-se desse

    modelo puro,

    dado que ha

    o estabelecimento, de uma

    forma

    ou de outra, de relac;;6es pessoais e de interesse entre

    agentes

    publicos e privados.

    0

    mesmo

    pode

    ser aplicado a empresa privada,

    na

    qual relac;;6es pessoais

    6

    podem

    substituir as impessoais e gerar fraude.

    A

    propina, no

    contexto aqui considerado,

    pode

    ser definida, a

    despeito

    da

    generalidade,

    como 0 meio financeiro

    de

    se

    transformar

    relac;;6es impessoais

    em

    pessoais,

    geralmente

    visando

    a transferencia de renda ilegal dentro da sociedade

    ou

    a simples apropriac;;ao

    indevida

    de

    recursos de terceiros ou a

    garantia

    de tratamento diferenciado.

    A corrupc;;ao politica, dentro dessa visao,

    pode

    ser

    encarada

    da

    seguinte

    forma.

    Os agentes

    publicos,

    em

    geral, e os polIticos,

    em

    particular, agem como homus

    economicus.

    Os politicos

    tern como objetivo principal a

    eleic;;ao

    a reeleic;;ao e a obtenc;;ao

    de urn

    luxo

    de renda.

    0

    mercado

    polItico nao e perfeito, e os eleitores nao

    possuem

    controle total

    sobre

    as ac;;6es de seus esco

    lhidos. Ademais, existe muita assimetria de informac;;ao, e 0 pr6prio processo de negociac;;ao

    polItica logrolling, vide Capitulo 6) gera espac;;o para

    0

    pagamento de servic;;os de representac;;ao

    de interesse de

    lobbies.

    Supondo a existencia de algum controle sobre

    0

    comportamento dos polIticos, ha urn

    trade-off entre

    a obtenc;;ao

    de propinas

    e a possibilidade

    de

    reeleic;;ao. Por exemplo, caso fique

    claro a base eleitoral

    de

    urn deputado que ele mais defende 0 interesse de

    alguns grupos

    de

    pressao do que os interesses mais genericos das bases que

    0

    elegeram, aumentara a possibilidade

    de que

    0

    mesmo nao

    se reeleja; por

    outro

    lado, a propina implIcita a representac;;ao dos

    lobbies

    pode compensar, na margem, a perda da eleic;;ao seguinte.

    o controle sobre a

    prop

    ina dependera, em grande parte,

    da

    restric;;ao

    moral

    de cada

    polItico a mesma e do interesse publico

    com

    relac;;ao ao

    comportamento

    polItico accountability,

    vide

    Capitulo

    5).

    A corrupc;;ao em geral, associada a

    propina,

    esta ligada

    em ultima

    instfmcia as imperfeic;;6es

    de

    mercado.

    Normalmente, os governos sao grandes compradores de

    bens

    de capital e de

    5

    0 conceito

    economia

    polftica

    da propina

    e

    sugerido pela pr6pria Ackerman na

    referencia Rose-Ackerman (1978).

    A fraude edefinida aqui como a corrupc;ao no setor privado.

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    5/10

    13

    -

    ECONOMIA DO SETOR PUBLICO NO BRASIL

    ELSEVIER

    obras de infra-es trutura cujos pre;os sao definidos

    na

    forma de leiloes ou processos de licita;ao

    em que ha, em maior

    ou

    menor grau, assimetrias de informa;ao consideraveis. As obras publicas

    envolvem

    grandes quantidades

    de dinheiro

    manipuladas

    por diversos agentes publicos e

    privados,

    que

    podem estabelecer muitos argumentos justificando pre;os

    que

    podem implicar

    superfaturamento e divisao de propinas

    entre

    as partes envolvidas. Como ha urn problema

    de

    controle sobre 0 comportamento dos agentes publicos que tomam essas decisoes economicas

    e financeiras, abre-se

    margem

    para

    a corrup;ao.

    A solu;ao para 0 problema da propina esta, dentro desse

    ponto

    de vista, na avalia;ao do

    sistema de pay off (incentivos) que 0 conjunto de institui;oes gera na sociedade e que influencia

    a a ao dos politicos, burocratas e clientes em geral, alem

    da

    imposi;ao de sistemas de puni;ao.

    A r e l ~ o entre eficiencia crescimento desenvolvimento e c o r r u p ~ o

    A terceira e mais moderna interven;ao da economia sobre 0 tema da corrup;ao vern

    do

    7

    trabalho de Shleifer & Vishny. A preocupa;ao centra l aqui e a rela;ao entre institui;oes e

    corrup;ao e a rela;ao da mesma com 0 crescimento economico. 0 argumento basico sustenta

    que

    a corrup;ao aparece com maior vigor quando:

    As institui;oes geram excesso de regulamenta;ao e de centraliza;ao estatal.

    As institui;oes politicas nao estao sob controle

    da

    maior parte

    da

    sociedade.

    o maior

    impacto da corrup;ao,

    em

    termos economicos, estaria no

    seu

    custo para 0

    crescimento. A

    propina

    envolve alguma distor;ao no

    emprego

    da

    maquina

    publica e, alem

    disso, deve ser mantida

    em

    segredo, 0

    que

    gera urn custo adicional na sua obten;ao (coopta;ao

    e manuten;ao de uma rede de funcionarios a urn esquema de corrup;ao, manipula;ao de

    informa;6es or;amentarias etc.). 0 resultado da corrup;ao, em termos de custos, pode ser a

    redu;ao do crescimento economico, na medida em que favorece a aloca;ao de recursos em

    atividades improdutivas e gera custos

    de

    transa;ao desnecessarios.

    Ha

    outro

    canal por meio

    do

    qual os custos da corrup;ao afetam 0 crescimento: os

    investimentos

    externos em

    urn

    determinado

    pais sao prejudicados

    quando

    diversas agencias

    estatais, envolvendo politicos e burocratas, exigem propinas dos agentes privados para a

    implementa;ao de projetos. As empresas e os investidores preferem investir em paises em

    que

    0 nivel

    de

    corrup;ao e menor,

    dado que

    esses "custos informais"

    en

    tram como fator

    de

    desconto

    no

    calculo da rentabilidade

    de

    projetos.

    8

    Estudos economicos sobre corrup;ao sao relativamente recentes. Contudo, as vantagens

    de trabalhar "economicamente" 0 tema sao indiscutiveis. Isso porque a corrup;ao envolve a

    busca de fins fiduciarios, a existencia de assimetrias de informa;ao e 0 problema

    da

    raciona

    lidade e da coopera;ao humanas. A economia pode oferecer urn c0rUunto de

    instrumentos

    para analisar a evolu;ao institucional e complementar abordagens

    de outras

    areas sobre 0

    tema.

    o

    enquadramento,

    dentro

    de uma

    analise economica,

    de

    conceitos como patrimonialismo

    e clientelismo

    pode

    ser feito com facilidade, posta que,

    do ponto

    de vista alocativo, 0

    importante

    e a eficiencia, e

    do

    ponto de vista normativo, a justi;a distributiva.

    No entanto,

    tal analise

    economica da corrup;ao deve ser

    ampliada

    a economia politica positiva,

    ja que

    0

    estudo

    das

    7

    Shleifer Vishny (1993).

    8 Embora seja

    importante

    observar que

    ha

    outras variaveis

    de

    risco

    que

    interferem

    na

    decisao

    de investimento

    e,

    muitas vezes, 0 tamanho de urn

    mercado

    nacional, os fundamentos macroeconomicos e

    outras

    variaveis criam

    incentivos

    adequados ao

    investimento,

    independente da ocorrencia

    endemica

    ou nao de c o r r u p ~ o

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    6/10

    f

    CORRUPI;AO E PRODUI;AO DE BENS PUBLlCOS

    131

    ELSEVIER

    regras

    e

    i n s t i t u i ~ o e s

    sociais e importante para a d e f i n i ~ o do sistema

    de

    incentivos que influencia

    9

    o processo de tomada de decisao dos agentes.

    o

    principal

    insi ht

    aqui

    e a necessidade

    de

    estudar

    as

    m o t i v a ~ o e s

    dos agentes

    e

    tentar

    explicar por que

    e1es

    podem sob

    determinadas

    s i t u ~ o e s institucionais, formar grupos de

    interesse com estrutura c1ientelIstica para implementar a ~ o e s de c o r r u p ~ a o

    A CORRupC;Ao E PROBLEMA DA PRODUC;Ao DE BENS PUBLICOS

    E SEMIPUBLICOS

    Nosso

    ponto

    basico aqui e mostrar que a escolha democratica e,

    portanto

    0

    Estado

    e 0

    governo democraticos possuem falhas

    que abrem e s p a ~ o

    para a

    s e p a r a ~ a o

    entre 0 publico e 0 es

    tatal, entr'e os

    interesses

    de

    grupos

    de

    pressao

    e os interesses coletivos , os quais sao, em

    verdade

    hipoteticos.

    0

    aparecimento da

    o r r u p ~ a o

    na maquina

    publica

    em geral- e

    na

    compra

    de s e r v i ~ o s em

    particular - esta associado

    ao

    fato

    de

    que

    nao podemos

    falar, a rigor,

    em

    a d m i n i s t r a ~ a o

    gerencial

    pura

    dentro do Estado, ao custo

    de ingenuamente

    supor que as

    estru

    turas

    de

    incentivo

    com

    as quais

    deparam-se burocratas

    polIticos e os

    agentes privados

    que

    agem sobre a

    maquina

    publica possam ser comparaveis as estruturas de mercado.

    No

    entanto

    veremos que esta

    exatamente

    no aprofundamento

    da

    democracia

    com

    me1hores estruturas

    de controle

    e que garantam

    transparencia

    a

    s o l u ~ a o para 0

    problema do

    controle da c o r r u p ~ a o

    Para

    mostrar

    como

    as escolhas publicas sao

    intrinsecamente

    falhas e

    que

    naturalmente

    admitem

    c o r r u p ~ a o

    apresentaremos a visao implIcita de urn conjunto de abordagens de

    economia

    polItica positiva para em

    seguida indicar

    sua re1evancia

    no

    estudo do fenomeno

    da

    c o r r u p ~ a o

    As principais

    questoes que

    buscaremos responder

    sao:

    0

    agente

    publico,

    burocrata

    ou

    polItico

    pode

    ser

    comparado

    ao agente privado que

    atua em

    o r g a n i z a ~ o e s

    privadas?

    As escolhas e decisoes publicas possuem a mesma

    natureza

    das decisoes privadas?

    Podemos

    imaginar urn mode1o de autonomia burocratica aos

    moldes

    da autonomia

    re1ativa

    de

    decisao

    de urn agente

    do

    setor privado?

    As escolhas publicas nao sao estritamente tecnicas ou gerenciais. Nao ha

    neutralidade

    das decisoes publicas no que se

    refere

    aos interesses

    de

    grupos

    de pressao dentro

    e

    fora

    do

    Estado.

    Por

    exemplo a e 1 a b o r a ~ a o e a gestao de

    urn

    o r ~ a m e n t o

    publico

    e

    tanto

    urn

    processo

    tecnico (contabil e financeiro) quanto polItico vide

    Capitulo

    19). A d e s c o n s i d e r a ~ a o de sse fato

    pode

    implicar diagn6sticos inadequados e f o r m u l a ~ 6 e s legais e institucionais

    que pod

    em abrir

    e s p ~ o

    como bern ilustra

    a hist6ria

    recente

    do

    Brasil,

    para

    aparecimento

    de

    c o r r u p ~ a o

    no

    o r ~ a m e n t o

    Isto

    e, a

    e 1 a b o r a ~ a o

    de urn

    a r c a b o u ~ o

    legal-constitucional

    para

    nortear 0

    processo

    o r ~ a m e n t a r i o deve

    considerar a natureza polItica

    do mesmo pelo menos

    se 0 objetivo

    das

    leis

    e i n s t i t u i ~ o e s e controlar 0 desvirtuamento do

    o r ~ a m e n t o

    A analise

    das

    compras

    de

    bens e

    s e r v i ~ o s

    pe10

    governo

    deve,

    da

    mesma

    forma levar

    em

    c o n s i d e r a ~ a o

    que as escolhas publicas

    possuem urn

    carater especial:

    e1as

    sao sujeitas a criterios

    polIticos, lIcitos ou nao.

    A

    d e s c r i ~ a o da

    visao

    economica da

    polItica e

    das

    escolhas

    individuais

    e coletivas sera

    aqui 0

    ponto

    de partida

    para

    a

    a p r e s e n t a ~ a o de

    uma analise

    dos

    processos

    de compra

    de

    bens

    e s e r v i ~ o s para a p r o d u ~ a o de bens publicos. A teoria economica considera que nos processos

    9

    Economia politica positiva edefinida por n6s, a

    partir

    desta parte do ensaio, como

    0 estudo

    das al;6es economicas

    e de suas conseqiiencias) condicionadas e restritas a incentivos derivados das instituil;6es politicas,jurfdicas e sociais.

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    7/10

    32 -

    ECONOMI

    DO SETOR PUBLICO NO

    BRASIL

    ELSEVIER

    de

    escolhas individuais,

    as

    instituic.;6es e valores sao ex6genos. Todavia, esses

    elementos

    sao

    fundamentais,

    dado

    que

    implicamestruturas

    de incentivos que podem gerar resultados nao

    desejados. A simples existencia do Estado Fiscal cria, como ja afirmado, a possibilidade de alo

    cac.;6es

    politicas

    de

    recursos economicos escassos, as quais podem ser determinadas por criterios

    diversos.

    Por

    exemplo, agentes

    que

    vislumbram a possibilidade de

    receber

    privilegios com

    concorrencias publicas dirigidas agirao racionalmente se levarem em considerac.;ao os beneficios

    criados pelas regras

    do jogo

    -

    ou

    pela

    ausencia das mesmas.

    Entretanto,

    0

    resultado

    dessas

    ac.;6es

    racionais,

    do

    ponto de vista social e da eficiencia economica, pode

    ser

    custoso para a

    sociedade,

    como

    mostramos,

    no

    inicio

    do

    capitulo.

    A economia aplicada ao

    estudo

    da politica e conhecida como teoria economica da politica.

    lO

    A analise a ser desenvolvida, a partir de agora, neste capitulo, partira basicamente dos resultados

    apresentados por

    trabalhos significativos nesses campos

    de

    pesquisa como, por

    exemplo,

    os

    de Buchanan & Tullock, Arrow, Downs e Olson.

    Inicialmente, consideremos

    0

    fato de que, pelo paradoxo de Arrow, e impossivel agregar

    ordenac.;6es

    de

    preferencias

    no

    nivel publico, social ou coletivo. As ordenac.;6es individuais e

    privadas de

    preferencias

    nao criam a possibilidade

    de uma

    ordenac.;ao coletiva racional.

    Portanto,

    nao

    ha a possibilidade de escolhas coletivas e publicas racionais,

    dada

    a existencia,

    2

    por

    exemplo,

    de

    intrasitividade.

    Ha,

    na

    verdade,

    a possibilidade de escolhas privadas dentro do Estado, feitas

    por

    politicos

    e burocratas,

    que

    podem ter suas

    ac.;6es

    mais ou

    menos

    controladas

    pela

    Constituic.;ao e pelas

    leis.

    Como vimos na breve descric.;ao da

    teoria

    dos cac.;adores de renda, rent seeking (vide

    tambem

    0 Capitulo 6

    surge

    tipicamente

    como

    uma atividade "parasitaria" do Estado. 0 Estado

    arrecada

    tributos e transfere-os, legal ou ilegalmente, por meio da produc.;ao

    de bens

    publicos,

    como seguranc.;a, e

    bens

    semipublicos, como estradas e obras de infra-estrutura, para deter

    minados segmentos da sociedade, os quais se organizam na

    forma de grupos

    de pressao.

    Por

    isso,

    nao

    e possivel

    imaginar

    urn Estado, ou governo, gerencial

    puro.

    Vma visao do problema da corrupc.;ao e

    da

    produc.;ao de bens publicos e semipublicos,

    calcada em Olson,13 descartaria qualquer possibilidade de urn Estado gerencial

    puro.

    0

    Estado

    e

    0

    mercado

    politico

    nao

    sao petfeitos: politicos e

    burocratas representam

    seus interesses

    dentro do

    governo e os interesses

    de

    agentes privados

    que

    se

    organizam

    coletivamente

    para

    agir sobre a

    maquina governamental,e

    tal ac.;ao tern como objetivo cac.;ar renda de grupos

    da

    sociedade menos organizados. Essas transferencias podem

    ser

    acompanhadas

    de

    conflitos

    distributivos

    entre

    diversos

    grupos

    de interesse

    que

    competem entre si para

    garantir

    maiores

    beneficios. Entretanto, faz-se necessaria a exposic.;ao mais detalhada do argumento

    que

    sustenta

    a impossibilidade de urn Estado gerencial.

    E

    preciso mostrar por

    que

    0

    burocrata

    deve

    ser

    submetido

    ao

    controle de leis severas, ao custo de, na ausencia de tal

    procedimento,

    amargarmos

    os custos do clientelismo e da corrupc.;ao.

    Resta-nos

    apenas

    discutir

    como podemos criar

    mecanismos

    que

    aumentem 0

    controle

    sobre a burocracia (vide

    tambemo

    Capitulo 6 e sobre os politicos. A economia, mais uma vez,

    fornece

    poderosos instrumentos

    para

    a

    soluc.;ao

    desse tipo

    de

    problema.

    10

    Tambem podemos,

    de

    forma mais definida, circunscrever

    uma

    parte da teoria economica

    da

    poHtica no programa

    designado

    por Public hoice ou Economia Constitucional.

    11

    Buchanan Tullock (1962); Arrow (1951); Downs (1957); Olson (1965,1982).

    12 x c e ~ a o

    a esta

    a f i r m a ~ a o

    seria a existencia

    a priori

    de consenso,

    0

    que equivaleria considerar a sociedade

    ou

    urn

    grupo

    social com todos seus membros possuindo

    as

    mesmas

    o r d e n a ~ e s de

    preferencias, logo como se fosse urn in

    dividuo unico.

    13

    Olson (1965).

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    8/10

    CORRUP

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    9/10

    34

    -

    ECONOMI DO SETOR PUBLICO

    NO BRASIL

    ELSEVIER

    para isso talvez seja a introdw;ao

    de

    incentivos aos contratos: se

    0

    agente tern priori incentivo

    para

    agir

    em seu pr6prio interesse, uma mudanc;a no sistema de incentivos pode dirigir

    seu

    comportamento a urn

    resultado 6timo

    do ponto

    de

    vista do

    principal

    e

    dele

    mesmo. Os

    incentivos devem

    ser

    concebidos de tal modo a levar a parte que

    age

    de forma

    oculta

    a assumir

    plenamente as

    o n s e q i i l ~ n i s

    de suas ac;oes.

    No

    caso,

    por exemplo, de uma

    relac;ao

    entre

    0

    governo (principal) e 0

    burocrata

    (agente),

    urn

    contrato eficiente entre as partes pode ser a

    existencia

    de

    leis

    que limitem

    ao

    maximo 0 poder

    discricionario

    do agente.

    0

    problema

    central,

    no que se refere

    a

    corrupc;ao,

    esta em

    como criar uma

    arquitetura

    contratual que limite

    5

    priori

    0

    comportamento incontrolavel

    do burocrata.

    Pelas raz6es expostas, esse

    tipo

    de analise e perfeitamente aplicavel ao estudo da corrup

    c;ao no

    setor

    publico,

    em

    especial no que se

    refere a

    produc;ao de bens publicos e semipublicos.

    CONSIDERAC;OES FINAlS: UMA AGENDA DE PESQUISAS

    P R

    BRASIL

    A literatura

    sobre

    corrupc;ao e vasta; em particular,

    aquela

    referente as relac;6es entre a

    produc;ao de bens publicos e semipublicos e corrupc;ao. Como urn dos objetivos deste capitulo

    e dar

    uma

    visao

    geral-

    mas

    que

    sera sempre

    incompleta

    -

    do

    tema e

    da literatura,

    saliento

    aqui alguns trabalhos que

    podem

    ser

    fonte

    para

    a

    pesquisa aplicada

    no

    Brasil:

    6

    Rose-Ackermanl contem

    uma

    exposic;ao abrangente

    sobre 0 tema,

    considerando prin

    cipalmente

    economias

    em

    desenvolvimento

    e em transic;ao do socialismo para 0 capi

    talismo. Esse livro

    pode ser

    utilizado

    como

    uma

    referencia

    basica.

    l

    Silva ? oferece uma introduc;ao

    didatica

    ao estudo da corrupc;ao do ponto de vista eco

    nomico, acessivel particularmente para nao economistas com alguma formac;ao basica

    .

    .

    em

    mICro e

    macroeconomla.

    Silva 8

    con

    tern uma ampla discussao

    sobre

    a produc;ao de bens publicos e semipublicos,

    processos

    de

    compras governamentais

    no

    Brasil e corrupc;ao.

    9

    Por fim, Di Tella Savedoif t razem uma analise abrangente sobre corrupc;ao e oferta

    de servic;os publicos,

    dando

    especial atenc;ao a

    urn

    estudo

    de

    caso, qual seja, corrupc;ao

    em

    hospitais publicos

    na

    America Latina. Esse

    tipo

    de

    estudo

    de

    caso

    pode

    ser estendido

    para Educac;ao

    (vide Capitulo

    21) e outros setores

    governamentais.

    No nosso entender, a agenda de pesquisa no Brasil deve, nos

    pr6ximos

    anos, ser dedicada

    aos

    seguintes

    temas:

    Governo eletronico, bolsa de compras e controle da corrupc;ao. Esse

    t6pico

    torna-se

    cada

    vez mais importante,ja que ha tecnologia disponivel

    hoje

    para a reduc;ao

    de

    custos

    de transac;ao dentro do governo e para 0 aprimoramento

    das

    estruturas de governanc;a

    e

    accountability.

    . \

    5

    Nossa analise poderia

    ser

    descrita como cetica (ou ate mesmo

    dnica) por considerar

    apenas agentes

    que

    nao tern

    suas decisoes res tritas

    por

    valores morais. Esse e urn tema

    importante,

    alias,

    em

    etica e economia. Co nsideramos

    que, na analise da c o r r u p ~ o

    do

    crime e

    da

    economica em geral, os valores morais tern importancia. Todavia,

    aqui estamos

    somente considerando

    agentes

    que

    possuem

    condicionada a contratos e incentivos. Mas

    uma

    das

    formas de

    se

    incluir num modelo de contratos e incentivos valores morais e encara-los como regras auto-impostas,

    mas esta e

    uma

    discussao

    da

    qual esquivamo-nos

    propositadamente,

    pois ela foge

    em

    demasia ao

    tema

    focado neste

    capitulo.

    16

    Rose-Ackerman (1999).

    7 Silva (2000, 2002).

    18 op cit.

    1997a, 1997b e 1997c

    19 Di Tella Savedoff (2001).

  • 8/10/2019 Economia Do Setor Publico No Brasil

    10/10

    f

    CORRUPI;AO E PRODUI;AO DE DENS PUDLICOS - 35

    LS VI R

    Demoeracia eletronica, participar;ao

    popular

    e accountability

    Nao

    se

    pode

    confundir

    aumento da eficacia gerencial

    dentro do

    Estado - que

    pode ser urn imp

    acto

    natural

    da

    implementar;ao de governos eletronicos -

    com

    os aspectos normativos

    derivados das

    externalidades geradas pela

    ador;ao

    de TI na

    esfera publica

    (para externalidade

    vi e

    Capitulo 2 . Ha relar;6es

    entre

    democracia eletronica e controle da corrupr;ao que

    pre-

    cisam

    ser

    estudadas, particularmente no

    que

    se

    refere

    aos

    processos

    de execur;ao

    orr;amentaria.

    Governo

    eletronico

    no

    Executivo,

    no

    Legislativo e

    no

    Judiciario.

    Governo

    eletronico

    nao

    e

    urn

    conceito

    que

    se reduz a informatizar;ao

    de

    processos licitat6rios, mas envolve

    a informatizar;ao de processos e

    procedimentos em

    geral. Precisamos fazer estudos de

    caso e modelos

    que

    nos permitam

    mostrar

    quais seriam os impactos

    da

    ador;ao de go

    vern

    os eletronicos sobre

    0

    controle da corrupr;ao.

    Corrupr;ao, risco, competitividade e custos de transar;ao.

    Estudos

    setoriais e macro

    economicos

    sobre

    os impactos

    da

    corrupr;ao

    podem

    ser

    importantes

    para

    estimar

    seus

    custos diretos e

    indiretos sobre

    a atividade economica

    em

    geral e

    para

    0

    investimento,

    em

    particular.

    Por

    fim, mas

    nao por

    ultimo, pois a

    agenda de

    pesquisa

    e ampla, sugiro que

    se con

    centrem esforr;os

    no estudo da

    corrupr;ao sobre

    0

    Judiciario.