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Campus Universitário Darcy Ribeiro, Gleba A, Módulo C, CEP: 70.904-970 Telefone: (061) 3368-5594 ou 3368-4091 Fax: (61) 3368-5146 E-mail: [email protected] Nº 20 Janeiro, fevereiro, março e abril de 2009 Economia Ecológica em Debate Economia Ecológica em Debate Índice A Sociedade Brasileira de Economia Ecológica na sua adolescência .......................... 3 O Pluralismo da Economia Ecológica e a Economia Política do Crescimento e da Sustentabilidade ....................................... 5 O que é Economia Ecológica: resgate de uma perspectiva ............................ 13 Os Fundamentos Críticos da Abordagem Econômico-Ecológica ................... 18 Notícias pág 22 - Chamada para o 11ª Conferência Bienal da International Society for Ecological Economis (ISEE), Oldemburg e Bremem , Alemanha , 22-25 de Agosto de 2010 - A ECOECO NA SBPC - ECOECO no Seminário Internacional “Crise Civilizacional: Distintos Olhares”, ocorrido na cidade de Palmas (Tocantins), no período de 22 a 24 de junho de 2009 - Curso de extensão “A Economia do Século XXI: uma Abordagem da Eco- nomia Ecológica” no Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS)-UnB - Economia Ecológica ganha destaque no Painel de Recursos do Progra- ma das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) - ECOECO no Lançamento do Compêndio de Indicadores de Sustenta- bilidade de Nações ISSN: 1983-1072

Economia Ecológica em Debate Economia Ecológica em Debate

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Campus Universitário Darcy Ribeiro, Gleba A, Módulo C, CEP: 70.904-970 Telefone: (061) 3368-5594 ou 3368-4091 Fax: (61) 3368-5146 E-mail: [email protected]

Nº 20Janeiro, fevereiro,

março e abril de 2009

Economia Ecológica em Debate

Economia Ecológica em Debate

Índice

A Sociedade Brasileira de Economia Ecológica na sua adolescência ..........................3

O Pluralismo da Economia Ecológica e a Economia Política do Crescimento e da Sustentabilidade .......................................5

O que é Economia Ecológica: resgate de uma perspectiva ............................13

Os Fundamentos Críticos da Abordagem Econômico-Ecológica ...................18

Notícias pág 22

- Chamada para o 11ª Conferência Bienal da International Society for Ecological Economis (ISEE), Oldemburg e Bremem , Alemanha , 22-25 de Agosto de 2010

- A ECOECO NA SBPC

- ECOECO no Seminário Internacional “Crise Civilizacional: Distintos Olhares”, ocorrido na cidade de Palmas (Tocantins), no período de 22 a 24 de junho de 2009

- Curso de extensão “A Economia do Século XXI: uma Abordagem da Eco-nomia Ecológica” no Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS)-UnB

- Economia Ecológica ganha destaque no Painel de Recursos do Progra-ma das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA)

- ECOECO no Lançamento do Compêndio de Indicadores de Sustenta-bilidade de Nações

ISSN: 1983-1072

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EC EC

Diretoria Executiva:Maria Amélia Enríquez (Presidente)

Paulo Gonzaga Mibielli (Vice - Presidente)

Diretores NacionaisKaren Kaechele

Clóvis CavalcantiSueli Chacon

Ademar Romeiro

Diretoria Núcleo Norte:Sergio Rivero

Oriana Almeida

Diretoria Núcleo Nordeste:Cecília Lustosa

Francisco Corrêa de OliveiraIhering Alcoforado

Diretoria Núcleo Centro-Oeste:João Paulo Andrade

José Aroudo MotaJoseph Weiss

Diretoria Núcleo Sudeste:Frederico BarcellosMarcelo Hercowitz

Diretoria Núcleo Sul:Clítia Helena Backx MartinsMaria Carolina Rosa Gullo

Valdir Frigo Denardini

Conselho Fiscal:Peter May

José Eli da VeigaManuel Osório Viana

Carlos Eduardo Young

Edição do Boletim:Pela diretoria: Paulo Mibielli e Maria

Amélia Enríquez

Secretaria: Gisella Colares

Projeto Gráfico e diagramação:Eduardo Oliveira

Foto da Capa: Cedida por Herman Daly

Site da EcoEco: www.ecoeco.org.brE-mail: [email protected]

Telefone: (61) 33685594

Expediente

O pagamento da anuidade é realizado por intermédio da As-sociação Internacio-

nal de Economia Ecológica (ISEE - www.ecoeco. org) ou pela própria ECOECO. Formas de pagamento e maiores informa-ções no site de filiação da ISEE ou no site da ECOECO (www.ecoeco.org.br).

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Edição Nº 20 — Edição Especial para o VIII Encontro ECOECO de 2009 EC EC

A Sociedade Brasileira de Economia Ecológica na sua adolescência

A ECOECO tem quinze anos. Os ado-lescentes questionam o sentido da vida de forma algo idealista, algo romântica – às vezes mais como rebeldes que revolucionários. São livres para experimentar quase tudo. Questionam se foi válido tudo que aprenderam dos seus pais.

A ECOECO é filha de uma linha clara de pensamento mundial com diversas heranças, de todas as escolas de pensamento econômico até dos legados vivos de eminentes economistas ecológicos como Nicholas Georgescu-Roegen, Herman Daly, Juan Martínez-Allier, Richard Nor-gaard, Robert Costanza e Joshua Farley, entre ou-tros. Assim, estamos aprofundando ensinamentos com vista a construir um conjunto consensuado de princípios para construir um norte para a ECOE-CO que oriente nosso trabalho profissional, tanto no nível individual como no âmbito da nossa so-ciedade, e talvez até nosso caminho para a vida.

Nesse sentido, os nossos afiliados têm entrado num debate sobre o que a ECOECO quer, enquanto organização composta de pesso-as com idéias divergentes e um mínimo de con-senso conceitual e ideológico, aberta a contri-buições de outras disciplinas.

Joseph S. WeissEng° Agr°, USP; Ph.D., Cornell University;

Pesquisador colaborador do Centro de Desenvolvimento Sustentável da UnB,

Diretor Regional da ECOECO

Apresentação

Mauricio Amazonas tem isso claro quan-do diz que, mesmo nascida de uma grande uni-versidade brasileira, “pouco esforço foi feito para difundir a economia ecológica, ... [sem cursos uni-versitários] em economia ecológica, [com] instru-mentos de comunicação ... reduzidos”, com sítio ainda em construção e um boletim de difícil pe-riodicidade. Quem sabe o instrumento mais aglu-tinador tenha sido o nosso livro “Economia e Meio Ambiente”, aceitando uma pluralidade de abor-dagens e conceitos, que possivelmente contribuiu à popularização entre profissionais do estudo da sustentabilidade.

As nossas reuniões bienais, abertas a todas e todos, quaisquer que sejam as profis-sões ou orientações, talvez tenham contribuído a esse amorfismo e falta de norte, aceitando apre-sentações e artigos que vão desde a economia ambiental neoclássica, até descrições de reali-dades locais muito relevantes à diversidade que é o Brasil, de profissionais preocupados com a nossa realidade ambiental, mas sem conteúdo conceitual nem metodológico. Isso poderá nos impedir de construir e difundir um campo novo do conhecimento, como pode estar acontecendo alhures. Nem sabemos se é isso que queremos.

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Boletim da Sociedade Brasileira de Economia EcológicaEC EC

Também, pouco temos acompanhado elementos teóricos ou linhas mundiais de pesquisa na pers-pectiva ecológico-econômica como a análise metabólica de matéria ou energia, de modelos ecossistêmicos ou sobre escalas sustentáveis do uso de recursos naturais.

Talvez um objetivo da ECOECO seja de dar espaço para o questionamento do cres-cimento econômico incondicional (que chamo de “PIBismo”), a defesa da sustentabilidade ou mesmo do decrescimento. Será que temos sido eficazes em oferecer esse espaço e que nossos participantes têm aproveitado dele? E se o ofere-cemos de fato, será que é apenas para o diálogo entre convencidos ou estejamos alcançando um público maior.

Nesse boletim especial para a VIII En-contro Nacional da ECOECO, essas questões nos remetem à importância de resgatar as ori-gens de economia ecológica, em texto original do nosso decano, Clovis Cavalcanti, que reporta a evolução da economia ecológica desde o pon-to de partida, em 1990, de um cada vez mais ameaçado sistema ecológico de sustentação da vida, chegando à visão ecológica da economia e ao lema de que “não se pode negociar com a natureza”.

Daí, passamos aos seus fundamentos atualíssimos na análise de Ademar Romeiro da passagem da concepção microeconômica da economia ambiental neoclássica a uma visão macroeconômica ecológica com uma nova cur-va de equilíbrio ambiental, levando à conside-ração de uma justa distribuição intertemporal de recursos naturais finitos.

Essa contextualização ressalta as pala-vras da última palestra de Herman Daly sobre suas propostas de passar da falida economia do crescimento à economia em estado estável. Ele rejeita os erros da economia que deixa de se reconhecer como um subsistema aberto, regi-do pelas leis da termodinâmica, de um sistema biofísico finito que cresce somente em dimensões

não físicas. Porém, continua otimista, como um revolucionário romântico1; se permite fazer pro-postas de políticas para deslocar a economia a uma em estado estável em termos ecossistêmi-cos, no mesmo espírito que propôs mudanças na sua despedida do Banco Mundial em 19942.

Conclui-se do debate interno em curso na ECOECO que ainda estamos num processo de amadurecimento da nossa ambição por uma sociedade profissional na liderança do debate nacional dessas questões. Além dessa conclu-são, tenho outras pessoais: de que, ao conseguir, na economia ecológica, integrar as questões da natureza e do nosso planeta à análise econômi-ca, especialmente por meio de conceitos da ter-modinâmica, ainda não conseguimos incorporar totalmente as questões da sociedade, do poder e da temporalidade.

Esperamos que a ECOECO consiga integrar esses princípios, análises e propostas, heterodoxos e dissidentes, aos trabalhos dos nossos participantes, contribuindo assim ao nor-teamento da nossa sociedade e das sociedades do “Sul”, como também ao aprofundamento da nossa multidisciplinaridade.

1. De acordo com Ihering Alcoforado, na sua “nota sobre a con-tribuição de Daly à Economia Ecológica”, no Boletim Ecoeco no. 019, set-dez 2008

2. Citadas por Clovis Cavalcanti, no seu artigo “Minha Percepção de Herman Daly e sua Influência” no Boletim Ecoeco no. 019, set-dez 2008, a partir de AgirAzul 10–1995, “Herman Daly deixa o Banco Mundial e prega o abandono do livre comércio”, traduzido por Carlos Gustavo Tornquist.

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Edição Nº 20 — Edição Especial para o VIII Encontro ECOECO de 2009 EC EC

A Economia Ecológica, em seu cami-nho de construção histórica enquanto campo de pensamento, abriga uma fértil contradição, no melhor sentido da palavra. De um lado, ela tem sua motivação na observação concreta de que o processo de crescimento econômico capitalista se dá ensejando a destruição dos recursos na-turais e ambientais, o que, sendo este sua base material, aponta para sua insustentabilidade. Ao mesmo tempo tem também sua motivação na crítica teórica correspondente, de que a teoria econômica convencional, por não incorporar devidamente a questão dos recursos naturais e ambientais, também não se constitui em campo teórico suficiente para a compreensão do pró-prio fenômeno econômico em suas relações com suas bases ambientais.

Assim, a Economia Ecológica traz em suas origens um impulso questionador tanto do crescimento econômico, enquanto fenômeno, quanto da teoria econômica ortodoxa como base analítica. De outro lado, a maneira de se compreender o crescimento e realizar sua crítica variou de forma plural, indo desde posições radi-

cais de inspiração neomalthusiana, avizinhadas da tese do “crescimento zero”, indo até propo-sições defensoras de formas de desenvolvimento e crescimento econômico que se dessem em ba-ses sustentáveis. A evolução das idéias de crítica ambientalista ao sistema econômico, indo dos “limites ao crescimento” dos anos 1960 e 1970 às conceituações mais generalizadas e genéri-cas de Desenvolvimento Sustentável no final dos anos 1980 e 1990, foi acompanhada no interior da Economia Ecológica. Assim como as visões acerca do crescimento possuem diferentes mati-zes no interior da Economia Ecológica, também a questão da aceitação das teorias econômicas de base reúne distintas posições.

O quão da assim chamada teoria eco-nômica “convencional” pode ser aceita na cons-trução da Economia Ecológica? Curiosamente, a Economia Ecológica guarda em si a contradição referente ao fato de que, de um lado, busca um caminho de construção teórica própria, que su-pere as limitações da “economia convencional” e da “ecologia convencional”; de outro lado, ao abrir-se para um campo novo de formulação sis-

O Pluralismo da Economia Ecológica e a Economia Política do Crescimento e da Sustentabilidade

Maurício de Carvalho AmazonasEx-Presidente da ECOECO,

professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável

(CDS) da UnB

“... nosso objeto é o sistema econômico, em sua interação ecológica com o mundo...”

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Boletim da Sociedade Brasileira de Economia EcológicaEC EC

têmica e complexa, abre-se a necessidade de um completo diálogo pluralista e transdisciplinar e, nesse sentido, começando justamente por incor-porar elementos das próprias “economia con-vencional” e da “ecologia convencional”. Um movimento típico de objetos complexos, que de modo quimérico tenta ser a construção de um ser novo sem, contudo, deixar de ser a junção outros seres conhecidos pré-existentes.

De modo equivalente, o mesmo movi-mento se dá quanto aos posicionamentos políticos acerca do crescimento econômico. De posições, em sua origem “nítidas”, tanto de defesas inques-tionáveis quanto de condenações inquestionáveis ao crescimento, o amadurecimento das idéias conduziu às proposições de Desenvolvimento Sus-tentável, que na busca de sua própria realidade permanece habitando no plano mítico das idéias, e enquanto isso se mantendo como apenas um conjunto quimérico de elementos contraditórios, desenhado ao sabor dos olhares e valores de quem quer que queira atribuir sentido ao termo.

Assim sendo, são indissociáveis a ques-tão do Pluralismo Metodológico e a questão da Economia Política do Crescimento e da Susten-tabilidade. Ambos vivendo os conflitos próprios de objetos complexos e em evolução. Como construir marcos teóricos novos na Economia Ecológica, sem que o pluralismo que lhe sirva de base se converta em uma “colcha de retalhos” inerte, ou sem que se enrijeça como “mais uma” disciplina? Como construir a compreensão e ca-minhos concretos de Desenvolvimento Sustentá-vel, sem que este não passe de um jargão que abrigue qualquer coisa, ou sem que seja taxado como sinônimo das velhas formas tradicionais da atividade econômica?

Tais conflitos, próprios do objeto, aca-bam sendo transferidos para nós sujeitos, fomen-tando e às vezes mesmo inflamando nossos de-bates, na nossa busca comum pela construção de idéias e de um mundo melhor. Freqüentemen-te nos defrontamos com posições “anti-neoclás-sicas” e “pró-neoclássicas”, posições “anti-cres-

cimento” e posições “pró-crescimento”, muitas vezes como posições apriorísticas, neste caso pouco somando para a construção das idéias.

Pluralismo vs. Delimitações, na construção da Economia Ecológica

Diferenças e divergências de opinião existem e são necessárias, especialmente em um coletivo como a Economia Ecológica que, antes de qualquer coisa, prima pela heterogeneidade de visões e respeito às diferenças de idéias. Po-rém, muito longe de sermos uma suposta “col-cha de retalhos”, temos sim um tronco comum muito nítido e sólido que nos unifica e organiza, que é o reconhecimento de que o sistema eco-nômico contemporâneo é ecologicamente (i.e., entrópica e negentropicamente) desequilibrado, ou seja, que este modelo de crescimento (e não outras formas de crescimento observadas tantas vezes em tantos momentos históricos) conduz a uma utilização material e energética dos recur-sos ambientais que não é sustentável. Isso é co-mum a todos nós. E é nosso senso crítico. Em que pese termos divergências acerca de funda-mentos teóricos interpretativos da relação cresci-mento/sustentabilidade, divergências acerca dos graus de criticalidade que os fenômenos concre-tos possam ter tomado, e divergências acerca de quais melhores políticas e instrumentos devam ser derivados, tais divergências são todas saluta-res e nenhuma coloca em risco o que nos unifica. Nunca vimos alguém na Economia Ecológica defender que o modelo econômico contempo-râneo não seja ecologicamente desequilibrado, que não produza uma desordem ambiental que conduz à não-sustentabilidade. Em vários outros meios há quem pense assim (que o desequilíbrio ecológico do sistema econômico seja uma falsa questão), mas não na ECOECO.

Para que as diferenças da heteroge-neidade de visões se convertam em pluralismo metodológico é, contudo, necessário um exer-cício de abandono das respectivas perspectivas iniciais. Se uma pessoa olha um objeto e enxer-ga um círculo, e outra enxerga um retângulo, o

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Edição Nº 20 — Edição Especial para o VIII Encontro ECOECO de 2009 EC EC

diálogo será sempre inconciliável, enquanto um perceber apenas a dimensão da largura e o ou-tro perceber apenas a do comprimento, e não se abrirem a aceitar olhar pela perspectiva do ou-tro, sem a qual jamais vão perceber que se trata de um cilindro, e que o outro não está tão errado assim! Precisamos ter a abertura, mas também o esforço, de procurar conhecer e compreender a perspectiva do outro antes de condená-la.

Assim, na Economia Ecológica, o res-peito às diferenças e divergências, a rejeição ao policiamento ou enquadramento ideológico e in-telectual não é apenas uma questão de prática democrática institucional, mas sim um fundamen-to teórico e metodológico do próprio campo da Economia Ecológica. Sempre foi público, notório e cientificamente insistido pelos principais auto-res internacionais e “pais” da Economia Ecológi-ca que ela não é uma teoria pronta e unificada, e sim um campo transdisciplinar de saberes, que se unifica pela busca plural da compreensão do que é e como é a relação entre economia e eco-logia. Ou seja, o pluralismo metodológico sem-pre foi pedra angular da Economia Ecológica. A Economia Ecológica não é uma ciência normal. A rigor, a própria Ciência Econômica como um todo também não o é, muito embora a Econo-mia Neoclássica acredite que seja.

Esse pluralismo traz para a Economia Ecológica seu importante traço multidisciplinar, fazendo com que de fato dela participem por-tadores de saberes de diferentes disciplinas, que não apenas a economia. Mas não percamos de vista que, embora os sujeitos da Economia Eco-lógica não sejam todos economistas (e não seria bom que fossem), contudo o nosso objeto é o sistema econômico, em sua interação ecológica com o mundo, e portanto a economia, enquanto área do saber, se coloca centralmente. O Encontro da ECOECO realmente não é, e não deve ser, um encontro só de economistas, contudo é sim um encontro de Economia. Obviamente, eco-nomia entendida enquanto um objeto de estudo muito mais amplo e sistêmico, para bem além das fronteiras estreitas ontológicas e metodológi-

cas da economia neoclássica. Tomemos, porém o cuidado de, ao sermos pluralistas ao tratar das diferentes áreas disciplinares, não acabarmos sendo anti-pluralistas ao tratar das diferentes correntes dentro da própria economia, ou até mesmo trazer posições “anti-economistas” para dentro da Economia Ecológica. Se devemos ter senso crítico, a Economia Ecológica tem que dia-logar profundamente com a heterodoxia econô-mica, e jamais enxergá-la em uma mesma vala comum junto com a ortodoxia neoclássica, sob a alcunha de “economia convencional”.

Se a Economia, enquanto objeto de estudo (Economy), se coloca centralmente na construção da Economia Ecológica, isso faz com que Economia, enquanto área de saber (Eco-nomics), também se coloque. Como fazê-lo, se a Economia Ecológica se coloca em oposição à dita “economia convencional”? É fato que a Economia Ecológica deve ter como alvo a su-peração das limitações neoclássicas (e eu pró-prio faço disso uma profissão de fé). Contudo, será que seria possível descartá-la? Reprovar ou colocar, por ocasião de nossos Encontros e publicações, os trabalhos assim rotulados em uma caixinha separada? Discordo totalmente. Primeiro, porque toda superação se faz apenas com o enfrentamento dialógico, e nunca com a exclusão simples. Segundo, porque a própria li-nha demarcatória da Economia Ecológica com a Economia Neoclássica é muito difusa e confusa. Quem quer que faça análises comparadas das diferentes teorias sabe bem disso. A propósito, vemos vários autores da própria Economia Eco-lógica mundo afora não apenas advogarem, que a Economia Neoclássica tem lugar neste campo ecológico-econômico, mas chegarem mesmo a não reconhecer incompatibilidades epistêmicas entre a Economia Neoclássica e a Economia Ecológica, para minha contrariedade e discor-dância pessoal. Apesar da discordância, o fato tem que ser respeitado e enfrentado por meio do debate acadêmico.

Não precisamos ir muito longe. O pró-prio Daly tem suas construções que dialogam e

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são tributárias da microeconomia neoclássica, trazendo desta para sua análise de sistema todo um modo de construção baseado na racionali-dade maximizadora/otimizadora convencional. A propósito, em seu esforço de prover um novo olhar sobre o mundo econômico, Daly sempre teve habilidade de diálogo com o campo con-servador. Caso ainda mais complicado, Cos-tanza parece não ter problema em namorar e reproduzir o utilitarismo neoclássico e aplicá-lo à valoração de ecossistemas, como expresso no tão propalado artigo publicado na Nature, em 1997, valorando os principais ecossistemas do mundo com base nas “preferências dos con-sumidores”, ou seja, não tratando as funções ecossistêmicas enquanto tal, subsumindo-as em termos das “percepções utilitaristas” que os in-divíduos façam delas. Com isso, jogou fora os princípios ecológicos, ou seja, as leis da termo-dinâmica, em favor do que há de mais questio-nável e central para a Economia Neoclássica, que é o individualismo utilitarista. E isso vindo de um dos grandes nomes da Ecological Econo-mics. E há muitos outros! Temos sim que ter senso crítico. Mas isso não se faz estreitando uma porta com requisitos de princípios teóricos ecológicos e deixando o arsenal utilitarista neo-clássico entrar por outra.

Leis da Termodinâmica. Falemos então delas. Há a opinião corrente de que são elas que em última instância dão unidade à Economia Ecológica. Admitamos que sim. Eu próprio ad-vogo este ponto de vista. Porém, que uso deve-mos fazer destas Leis para esta unidade? Devem ser um princípio fundante e subjacente às análi-ses, ou devem instrumentalizar operacionalmen-te as análises? Bem, a esmagadora maioria dos trabalhos produzidos e apresentados na ECO-ECO não tem suas construções analíticas feitas com base nas leis da termodinâmica. Contudo, tais leis estão lá presentes, sim, como pano de fundo, sempre que se tenha como pressuposto que a atividade econômica desenfreada rompe o equilíbrio ambiental, ou seja, rompe com suas leis e regularidades ecológicas. Concordamos

que as Leis da Termodinâmica são o principal elemento de demarcação de nosso campo, mas isso tem que ser pensado em sentido lato, e não estrito. Ou seja, que as Leis da Termodinâmica são sim um Princípio (e enquanto tal têm de ser discutidos detidamente, pois princípio é ponto de partida), mas não são nem Meio nem Fim. En-fim, as Leis da Termodinâmica devem sim ser os principais elementos constitutivos do campo da visão pré-analítica (nos termos de Schumpeter) da Economia Ecológica, mas não forçosamente na etapa analítica e instrumental devem constituir-se como requisitos necessários e muito menos como suficientes.

Delimitações da Economia Ecológica e a questão do Crescimento e da Sustentabilidade

Bom, então há quem argumente que o relevante estaria na forma de se tratar devida-mente as “conseqüências lógicas” da adoção dos princípios da termodinâmica para a questão da sustentabilidade do crescimento econômi-co. Ok! E que a “devida” consideração de tais princípios conduziria inexoravelmente a se abra-çar teses de crescimento zero, estado estacioná-rio ou mesmo “decrescimento”, e que, portanto quem não condena o crescimento “por princí-pio” é porque milita no campo conservador da economia ortodoxa convencional. Opa! Errado, muito errado! Ora, um economista neoclássico pode, em teoria, incorporar a idéia de “limites” físicos dos recursos naturais em seus modelos na caixinha da “escassez” (em que pese a noção convencional de escassez seja em termos mone-tários e referido à escassez relativa, não há difi-culdade alguma em que esta esteja traduzindo a escassez física absoluta) e chegar a um modelo de equilíbrio-geral que mostre o “esgotamento” da possibilidade de crescimento. Pode. Por sua vez, economistas ecológicos de linha evolucio-nista, que se utilizam das leis da termodinâmica, podem perfeitamente mostrar como o crescimen-to é parte integrante e possivelmente necessária de trajetórias evolutivas sustentáveis. O que é ser

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Economista Ecológico? Um economista neoclás-sico conservador e conservacionista que defen-de o crescimento zero? Ou um termodinâmico evolucionista que defende formas alternativas de crescimento econômico? Eu particularmente me insiro no segundo grupo.

A questão do Crescimento Econômico e de sua relação com a Sustentabilidade é assim uma clara temática de Economia Política. En-quanto tal, conjugam-se elementos ideológicos valorativos da natureza do sistema econômico, tanto em termos de sua compreensão positiva, quanto em relação ao que queremos dele nor-mativamente. Em meio a posições que buscam “justificar o crescimento a qualquer custo” e as que buscam “negar o crescimento a qualquer custo”, quase que como petições de principio aprioristicas, faz-se necessário um exame dos fa-tos e das visões. Vejamos.

Primeiro, os fatos concretos, na linha “contra o crescimento”:

1- o atual modelo de crescimento econômico capi-talista que conhecemos até o presente é intensi-vo no uso dos recursos naturais e ambientais, de modo predatório.

2- se quiséssemos universalizar equitativamente o atual padrão de consumo de um cidadão médio dos EUA para o conjunto do globo precisaríamos de 3 a 5 planetas Terra, con-forme o recurso natural em questão. Penso que não temos como negar o “vilanismo” do “modelo de crescimento econômico capitalista que conhecemos até o presente”.

Os fatos concretos, na linha “a favor do crescimento”:

1- o atual modelo de crescimento econômico capitalista que conhecemos até o presente é profundamente desigual e excludente.

2- A superação deste quadro, até onde sabemos, requer Desenvolvimento. E Desenvolvimento requer Crescimento. Nem todo Crescimento

se traduz em Desenvolvimento, mas todo De-senvolvimento requer Crescimento. A história não mostrou até hoje algo diferente. Não há meios de se superar a pobreza e miséria que não tenham passado pelo crescimento eco-nômico. Penso que não temos como negar o lado virtuoso do crescimento econômico, quando este se desdobra para o conjunto da população.

Passemos então para a questão teórica. Duas as visões, no extremo, acerca da relação entre crescimento e sustentabilidade:

1- crescimento é contrário à sustentabilidade, uma vez que consome os recursos naturais e ambientais.

2- crescimento é favorável à sustentabilidade, uma vez que traz as condições de crescimento tecnológico que permite a progressiva redu-ção do uso relativo dos recursos naturais e ambientais.

Decerto, duas visões incompletas e sim-plificadoras, o que leva à necessidade de se ave-riguar a rigor o que se entende por crescimento e sustentabilidade.

A primeira visão, de “crescimento con-trário à sustentabilidade”, realiza um equívo-co ao confundir “crescimento econômico” com “crescimento do consumo material”. A rigor, existe uma incompreensão, muito presente em nosso meio ecológico-econômico quanto ao próprio conceito de crescimento. É sempre fei-ta apressadamente uma correspondência direta e mecânica entre “crescimento econômico” e “crescimento do consumo material”, ou seja, a “dimensão material/física do crescimento”. Não são a mesma coisa e devem ser distiguidos tan-to conceitualmente quanto efetivamente em suas conexões. Embora tenham uma óbvia correlação positiva direta, não são sinônimos e nem sua re-lação é rígida e estática. Esta não-correspondên-cia se expressa na hipótese da Curva de Kuznets Ambiental em “U invetido” (Fig. 1), onde as pri-

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Boletim da Sociedade Brasileira de Economia EcológicaEC EC

meiras fases do crescimento econômico impli-cam elevado e crescente impacto material, mas que, conforme o desenvolvimento avança, vai progressivamente reduzindo o consumo material até o ponto que inflexiona e começa a decrescer.

No nosso mundo material concreto, é fato que o “crescimento econômico” se faz impli-cando realmente em um correspondente “cresci-mento do consumo material”. Isso, contudo, não deve nos levar a tomar um pelo outro. Ao contrá-rio. A adoção de uma tecnologia que permita se alcançar o mesmo produto com menos consumo de recursos materiais é um fator de crescimento econômico, e não de decrescimento (isso se-ria, por analogia, o mesmo que achar que um trabalhador mais eficiente que outro preguiçoso devesse ter o valor de seu produto reduzido pelo fato de que levou menos tempo para produzi-lo). Ou seja, a adoção de tecnologias poupadoras de recursos naturais e ambientais produz cresci-mento econômico com decrescimento, relativo ou mesmo absoluto, do consumo material.

Isso a rigor não vai contra o que o pró-prio Daly tem em mente. Em sua formulação de steady-state, Daly, desde 1972, não advoga que se tenha “mais bem-estar”, “mais prosperidade” com “menos recursos naturais”, ou seja, reduzir o throughput? Daly não vai contra os fundamen-tos da idéia de ter-se “mais” com menos cada vez “menos”, mas vai contra os termos utilizados: assim como vários outros autores, Daly entende “crescimento econômico”, enquanto “crescimen-to do consumo material”.

Contudo, o conceito de crescimento econômico se reporta ao nível de atividade e de emprego de uma economia, envolvendo suas di-mensões materiais e imateriais. De fato, PIB en-quanto medida de crescimento revela a renda ou a demanda agregadas, ou se preferirmos keyne-sianamente, a demanda efetiva. O Cadu1 (Carlos Eduardo Young) tem insistido nesse ponto, com razão. A medida da atividade econômica e seu crescimento é uma convenção, uma construção social, que em si não corresponde em sinônimo à materialidade que lhe seja subjacente.

Ao que nos parece, quando Daly se co-loca contrariamente ao termo “crescimento”, ele está entendendo o crescimento material, físico, e não o crescimento como um conceito social-mente estabelecido de uma medida de ativida-de econômica, o qual também valeria em um mundo mais “desmaterializado” que ele próprio almeja. Por analogia de imagem, se nós todos desencarnássemos e vivêssemos em um mundo espiritual, imaterial, portanto, na economia de tal sociedade em que trocassem serviços mútu-os as nossas atividades e trabalhos, assim como o progresso destes decorrentes, também seriam contabilizados, e em tal situação nós estaríamos sim... crescendo...

Se problemas se colocam frente ao con-ceito de Crescimento, também se colocam frente ao conceito de Sustentabilidade. Como deve ser esta definida? Pelos limites postos pelas leis da termodinâmica? Todos nós admitimos que “este” modelo de crescimento, o modelo de cres-cimento capitalista contemporâneo, é tenden-cialmente não-sustentável, o que não quer dizer que toda e qualquer forma de crescimento seja insustentável. Alguém pode argumentar que a Lei de Entropia faz sim com que toda for-ma de crescimento seja insustentável. Não, o que a Lei de Entropia faz sim é que toda forma de existência seja insustentável. Do ponto de vista

1. Ex-presidente da ECOECO, professor do Instituto de Economia da UFRJ (nota do Editor)

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físico, nada é sustentável. E quem nos ensinou foi Georgescu-Roegen. Por isso, “Sustentabilida-de” não pode ser definida apenas do ponto de vista físico. Não se sustenta. A dimensão física é fundamental, mas insuficiente. A definição tem de ser social.

Mesmo do próprio ponto de vista mate-rial, ouso dizer que decorre das próprias Leis da termodinâmica, especialmente da segunda, que o crescimento é necessário para conformarem-se trajetórias sustentáveis. Isso porque, em sistemas vivos, não se pode considerar as leis da termo-dinâmica sem também considerar-se a Negen-tropia. Seria o mesmo que conceber um carro sem motorista. Só a 1ª e 2ª leis não bastam... A negentropia estabelece ordem em sistemas com-plexos, sujeitos à inexorável desordem entrópica, e é no âmbito destes sub-sistemas ordenados e de seu impacto entrópico externo que a Susten-tabilidade ganha melhor espaço de ser concebi-da. Fisicamente, nada é sustentável em absoluto, mas a sustentabilidade relativa “possível” requer a compreensão dos sub-sistemas negentrópicos que construímos. E a definição dos contornos de tais sub-sistemas é socialmente construída: eis uma ponte fundamental entre as leis da termodinâmica e o universo humano com suas definições sociais.

Crescimento, Desenvolvimento, Desigualdade e Sustentabilidade

Em nosso meio, freqüentemente encon-tramos posições que superficial e enfaticamente se colocam contra o Desenvolvimento, identifi-cando-o enquanto sinônimo de um crescimen-to destruidor. Outros já amenizam e procuram corrigir os anteriores, apontando, corretamente, que Desenvolvimento não é a mesma coisa que Crescimento. Mas autores que seguem a idéia de “desmaterialização” da economia advogam favoravelmente ao Desenvolvimento, e contraria-mente ao Crescimento, identificando que o De-senvolvimento é bom, que pode se dar em bases sustentáveis, e que o Crescimento, este sim, seria o vilão destruidor. Esta idéia de “desenvolvimento sem crescimento” apresenta dois enganos. Pri-

meiro, como acima dito, refere-se a crescimento enquanto “crescimento material” e não enquan-to “crescimento econômico”, este definido como demanda efetiva. Segundo, e decorrente do an-terior, se esquece que não há Desenvolvimento sem Crescimento! E se o Desenvolvimento pode em tese ser Sustentável, isso implica que o Cres-cimento neste embutido é também necessaria-mente Sustentável.

Longe aqui de querermos afirmar que Crescimento e Desenvolvimento sejam a mes-ma coisa. E sim que o problema não está no Crescimento em si mesmo. O problema está em que nem todo Crescimento se traduz em Desen-volvimento, e que nem todo Desenvolvimento se traduz em Desenvolvimento Sustentável. Mas, à medida que um Desenvolvimento Sustentável implica em Desenvolvimento e que um Desen-volvimento implica em Crescimento, a pergunta então está em se saber qual a modalidade de Crescimento é a que se coaduna com a perspec-tiva do Desenvolvimento Sustentável.

Aqui então a limitação da segunda vi-são, de “crescimento favorável à sustentabi-lidade”, ou seja, de que o crescimento traz as condições de progresso tecnológico que permite sustentabilidade. Admitimos que isso seja verda-de, que o crescimento seja de fato uma condição necessária à sustentabilidade: porém não é uma condição suficiente. Já o dissemos, nem todo crescimento de converte em Desenvolvimento, muito menos em um Desenvolvimento que seja Sustentável. Com isso, o abraço incondicional à tese do “crescimento sempre bom e sustentável” ou é inadvertidamente míope ou ideologicamen-te intencional.

Crescimento por si só não basta. Cres-cimento, para que constitua base de um Desen-volvimento Sustentável, tem de ser socialmente regulado, com base em critérios de equidade e justiça social. Em um mundo materialmente fini-to, isso implica que se tenha que rever e regular a desigualdade de acesso aos benefícios diretos e indiretos do uso dos recursos ambientais e na-

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turais, decorrente e associada à profunda desi-gualdade no padrão de consumo, entre os mais ricos e os mais pobres.

O padrão de consumo dos ricos, caso fosse generalizado para toda a humanidade, seria materialmente insustentável e impossível. Este padrão de consumo, alcançado e fomen-tado pela economia capitalista contemporânea, requer a profunda desigualdade estrutural para existir. É “sustentável” apenas enquanto for desi-gual. A progressiva busca da igualdade deverá, deste modo, ensejar a necessidade de profundas alterações nos padrões de consumo, para que possam ser generalizados. Tais alterações devem se dirigir aos padrões mais low profile, que ten-dem a ser mais sustentáveis. Assim, a consecu-

ção da sustentabilidade global deverá derivar da consecução de maior igualdade e justiça social e econômica. Com isso, a tese com que aqui encerramos é a de que o crescimento econômico dos países pobres, por mais que a imagem de imensos contingentes populacionais aumentan-do o seu consumo se afigure como uma ameaça ambiental planetária, será em si condição para se atingir a sustentabilidade, porquanto forçará a ruptura do atual padrão de consumo capitalista, ao passo que a perpetuação do atual padrão de consumo, ainda que se concentrando em uma elite cada vez menor, é convite para o aprofun-damento da insustentabilidade cabendo pensar-se realmente em uma “desmaterialização” abso-luta para os países ricos.

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A crescente percepção de que o sistema ecológico de sustentação da vida encontra-se cada vez mais ameaçado constitui o ponto de partida da reflexão que deu origem à Economia Ecológica (EE). Foi esse, com efeito, um consen-so do workshop realizado no Aspen Institute (Wye Island, Maryland, USA), em 24-26.5.1990, do qual resultou a proposta de uma nova aborda-gem da sustentabilidade1. Nesse contexto, a EE deveria diferir tanto da economia como da eco-logia convencionais, em termos da envergadura dos problemas de que deveria cuidar. Do mesmo modo, deveria penetrar a fundo na compreen-são das interações meio ambiente-economia. Não pode haver dúvida, assim, de que a EE vê a economia humana como parte – subsistema – do todo maior que é a natureza. Não se trata de aceitar um dogma de fé, mas de reconhecer

1. Participaram do encontro 38 pessoas, entre as quais Charles Perrings, Colin Clark (matemático), Cutler Cleveland, Enzo Tiezzi, Garrett Hardin, Herman Daly, Joan Martínez Alier, Kenneth Boul-ding, Richard Norgaard, Robert Costanza, Silvio Funtowicz, Talbott Page, Tomasz Zylicz. Fui um dos participantes (por descuido dos organizadores, suponho).

“...não se trata de aceitar um dogma de fé, mas de reconhecer inquestionável evidência: não existe socie-

dade (e economia) sem sistema ecológico, mas pode haver meio ambiente sem sociedade (e economia)..”

inquestionável evidência: não existe sociedade (e economia) sem sistema ecológico, mas pode ha-ver meio ambiente sem sociedade (e economia). Enquanto isso, a economia (ciência econômica) convencional trata apenas da espécie humana, esquecendo todas as outras, e a ecologia con-vencional enxerga todas as espécies, menos a humana. Ao constatar, em ambos os casos, a necessidade de se superar a estreiteza disciplinar que impede uma visão de conjunto da proble-mática ecológico-econômica, a EE surge sem dependência disciplinar, seja da economia, seja da ecologia, resultando, ao revés, de uma inte-gração entre elas. Sua visão de mundo teria que ser transdisciplinar, com foco nas relações entre ecossistemas e sistemas econômicos no sentido mais amplo possível. Como dizem Costanza, Daly e Bartholomew (in Costanza, org., 1991),

“[b]y transdisciplinary we mean that ecological economics goes beyond our normal conceptions of scientific disciplines and tries to integrate and syn-thesize many different disciplinary perspectives”.

O que é Economia Ecológica: resgate de uma perspectiva

Clóvis Cavalcanti Um dos fundadores da Economia Ecológica

no Brasil e atual Diretor Nacional. Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco

e professor da Universidade Federal de Pernambuco

Texto II

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Cabe aqui a observação de que nenhu-ma disciplina possui precedência intelectual sobre qualquer outra em matéria de realização da sus-tentabilidade. Isso se aplica à física, à biologia, à ecologia – e à economia. Por outro lado, a segmentação das disciplinas é uma convenção acadêmica, enquanto os problemas que interes-sam não se localizam no âmbito da disciplina A ou B. A universidade tem disciplinas (unidimen-sionais); o mundo real tem problemas concretos (multidimensionais; caso dos sócio-ambientais). Fronteiras disciplinares são construtos acadêmi-cos arbitrários. O aparecimento da EE se direcio-na para o tratamento desse embate. A conclusão não pode ser outra: a EE não constitui um ramo da economia (nem da ecologia, é claro). Tanto po-deria se chamar economia ecológica como eco-economia, ou ainda ecologia econômica. José Eli da Veiga tem proposto que se fale de uma perspectiva sócio-ambiental (ele prefere “socio-ambiental”). O fato de se haver adotado o termo “economia ecológica”, que pode facilmente le-var a confusão com a noção de economia am-biental, é motivo de não poucos equívocos.

Como economista dissidente, indagado sobre qual seja a principal tarefa da economia, sinto-me inclinado a seguir a corrente que dá ên-fase ao papel da economia de explicar compor-tamento humano condicionado pela escassez. A vida é uma sucessão contínua de escolhas que representam o confronto de diferentes valora-ções. Isto ocorre porque, de algum modo, os recursos – inclusive e, sobretudo, o tempo – são escassos. Portanto, a realização dos fins huma-nos é restringida pela escassez dos meios. Se um fim é preferido, isto envolve o sacrifício de outros. Não é por outra razão que uma das mais bem conhecidas definições da economia sublinha o fato de que a economia “é a ciência que estuda o comportamento humano como uma relação entre fins e meios escassos que têm usos alter-nativos” (ROBBINS, 1984: 16). Nas palavras de Alfred Marshall (1961: xv), por outro lado, a economia ou teoria econômica diz respeito prin-

cipalmente a seres humanos que são impelidos para a mudança e o progresso. Sua definição de economia, que ele iguala à economia política, consiste em dizer que ela se dedica ao exame “daquela parte da ação individual ou social que está mais estreitamente conectada com o alcan-ce e o uso dos requisitos materiais do bem-estar” (MARSHALL, 1961: 1). Esta é uma interpretação que se enquadra dentro dos moldes da econo-mia como uma disciplina que trata de escolhas, como na análise de comportamento do consu-midor sob condições de desejos ilimitados e re-cursos finitos. Implícita nessa visão encontra-se a idéia de que se comportar de maneira econô-mica significa tornar a atividade de uma pessoa ou de uma organização “eficiente”, ao invés de esbanjadora (KNIGHT, 1965: 510). Significa es-colher o menos custoso curso de ação ou aquele que maximiza os benefícios líquidos da ação.

Carlos Gabaglia Penna, professor da Engenharia Ambiental da PUC-Rio2, explica que, no mundo natural, o crescimento nunca é linear, e sim exponencial. E cita um exemplo clássico da realidade desse fenômeno: “imaginemos que um lago contenha uma espécie de alga que, ao co-brir toda a superfície do corpo d’água, sufocará a vida nele existente. A comunidade de algas do-bra de tamanho a cada dia. Suponhamos que, em 30 dias, as algas tomarão o lago todo. No 21º dia, as algas cobrem tão somente 0,2% da superfície (menos de 0,0001% no 10º dia). Em apenas mais oito dias, já terão coberto a metade e, no dia seguinte, o lago estará completamen-te tomado pelas algas, eliminando o oxigênio disponível da água”. Em outras palavras, cresci-mento geométrico leva sempre, na natureza, ao desastre (caso da bola de neve, do crescimento celular ilimitado, etc.). Por que teria que ser dife-rente no tocante ao sistema econômico, se ele, como postula a EE, é um subsistema da natu-reza? Para o subsistema valem as mesmas leis

2. No site http://arruda.rits.org.br/oeco/servlet/newstorm.ns.presentation.NavigationServlet?publicationCo

de=6&pageCode=90&textCode=27115 (acesso em 23.4.2008).

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que governam o todo. Esse é um princípio da EE aceito sem controvérsias.

Segundo Gabaglia Penna, a física, a te-oria dos sistemas (ou teoria do caos) e a termo-dinâmica, mais especificamente a Segunda Lei, dão suporte a essa argumentação. A expansão econômica significa normalmente maior transfor-mação de matéria e energia – o que, pelas leis da física, eleva a temperatura do sistema. Um siste-ma (ou subsistema) de temperatura elevada tem uma entropia maior do que a de um com baixa temperatura. “As crescentes conversões de mate-riais e energia em bens e serviços da sociedade de consumo estão inequivocamente aumentando a entropia do planeta. Ou seja, aumentando a desordem do sistema Terra, representada pela de-gradação do ambiente natural. Esta lei é tão imu-tável quanto a Lei da Gravidade”. Deve ser óbvia, para todos nós, economistas tradicionais ou não, a enormidade do impacto devastador da escala humana no resto da criação. Trata-se, como sa-lientam Daly e Farley (2004), de algo novo de-baixo do sol. Contribui para tanto um quadro de caráter social e cultural em que grande parte do aumento do consumo material é impulsionada pela propaganda – muitas vezes, da mais absurda futilidade. Isso não quer dizer que o crescimento seja necessariamente mau. Haverá crescimento indispensável – como no caso da produção para a satisfação das necessidades básicas, especial-mente dos pobres. De qualquer forma, crescer é usar o meio ambiente, inevitavelmente.

Vale aqui lembrar o que diz Alfred North Whitehead (1861-1947), em seu livro A Função da Razão (1985). Em suas palavras: “As formas mais elevadas de vida estão ativamente empe-nhadas em modificar o seu meio ambiente. No caso da espécie humana esse ataque efetivo ao meio ambiente é o fato mais notável de sua exis-tência”. Tal ataque se desdobra em três etapas: (i) viver (garantir nossa sobrevivência – “obrigação” de todo organismo vivo), (ii) viver bem (dispor do melhor ambiente possível; ninguém sobrevive no próprio lixo) e (iii) viver melhor (conquistar novos patamares de qualidade de vida; aprimorar-se;

progredir, prosperar). Cabe aqui então o fecho de Whitehead: “A função primordial da razão é direcionar o ataque ao meio ambiente”. E ainda: “A função da razão é promover a arte da vida”. Ou seja, atacar o meio ambiente, sim, mas de forma inteligente e com o propósito de se viver melhor. Penso que pouca gente possa discordar disso, mas talvez esteja errado em minha per-cepção.

Não deveria haver dúvida de que consi-derar o processo econômico no marco do meio ambiente é uma necessidade imperiosa, talvez mesmo uma banalidade. Contudo, a visão do-minante da economia (“economia convencio-nal”, digamos, ou visão econômica da economia) não funciona assim. O que se considera é uma situação como a da Fig. 1, na qual a natureza é uma externalidade. Nesse enfoque, o sistema econômico não encontra limites onde esbarrar. Ele pode tudo. Sua expansão não envolve custos de oportunidade.

Figura 1 - A economia-atividade como sistema isola-do (visão econômica da economia)

Famílias Empresas

Compras de bens e serviços (consumo)

Pagamentos a fatores produtivos (rendimentos)

Fluxos monetários

(modelo convencional do sistema econômico)

Quando muito, o que a economia conven-cional faz é imaginar o meio ambiente como apên-dice da economia-atividade, a qual é vista como o todo; neste caso, o ecossistema aparece como berloque, almoxarifado, dispensa (Fig. 2). Trata-se de uma tentativa de internalizar as externalidades. É aqui que surge o campo conhecido como economia ambiental: visão econômica da ecologia.

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Boletim da Sociedade Brasileira de Economia EcológicaEC ECFigura 2 – O meio ambiente como apêndice da

economia-atividade (visão econômica da ecologia)

Economia Meio ambiente

Já para a EE, a questão é conceber a economia-atividade como sistema aberto dentro do ecossistema (o ecossistema é o todo; a eco-nomia, uma parte. Ver Fig. 3). Matéria e ener-gia entram no sistema, passam pelo processo de throughput (transumo) e viram lixo. Nesse modelo não há criação de riqueza. Há transformação de matéria e energia de baixa entropia em matéria e energia de alta entropia – como estabelecem as incontornáveis leis da termodinâmica. À pers-pectiva da EE pode-se atribuir a característica de visão ecológica da economia. Segundo ela, o sistema econômico tem aparelho digestivo e cir-culatório (somente o segundo é imaginado no modelo da economia convencional).

Figura 3 - A economia-atividade como sistema aberto dentro do ecossistema (visão ecológica da

economia)

Energia Solar

Recursos

(fontes) degradadas(sumidouros)

Matéria e energia

Energiadissipada

Ecossistema

Sistema econômico

Modelo biofísico do sistema econômico(fluxos de matéria e energia)

Transumo

Uma implicação óbvia da perspectiva econômico-ecológica é que o sistema econômi-co, ao se expandir, incorre em custos de opor-tunidade ambientais positivos (o meio ambiente

é escasso). Se esses custos já foram tão ínfimos que se podia ignorá-los, o fato é que mais econo-mia implica menos meio ambiente. Seria bom que não fosse assim. É aqui que se chega à conclu-são de que a visão de mundo prevalecente, que dá ênfase inusitada ao crescimento econômico como solução para tudo, como prioridade abso-luta em relação a outros objetivos (a valorização do ter; o PAC do governo Lula), termina podendo ser classificada como fé, fetiche, mania, dogma. Sem dúvida, ao mesmo tempo, forma-se uma confusão entre crescimento (aumento) e desenvol-vimento (evolução, transformação, “promoção da arte da vida”).

A visão econômica da economia precei-tua que não há custos de oportunidade para o processo econômico, que esse é um falso dilema. Ao mesmo tempo, alguns economistas chegam a dizer, como no exemplo dado por J.R. McNeill (2000), que “o mundo, com efeito, pode conti-nuar seu negócio sem recursos naturais”. Na mi-croeconomia, como se sabe, prevalece o cálculo (conceito) do ótimo (eficiência máxima da aloca-ção de recursos escassos). Trata-se da regra de quando é para parar a expansão da escala (da firma). Enquanto isso, na macroeconomia preva-lece a busca do crescimento ilimitado. Ignora-se nela o ótimo do crescimento (ou quando o cres-cimento deveria parar). A perspectiva da EE é de que existirá uma escala máxima sustentável do sistema econômico com respeito ao ecossistema, escala essa a ser determinada pela comparação de benefícios econômicos com custos ambientais marginais – como se faz no caso do equilíbrio da firma. Ao se acionar a economia, de fato, não se pode ignorar que a depreciação dos ativos na-turais (capital natural) é real: custos de oportuni-dade. Aumentar a produção econômica implica sacrifício de recursos, tais como florestas, solo, água, ar, biodiversidade, estabilidade climática, etc. Isso é decorrência da visão ecológica da eco-nomia. Em síntese, trata-se de encontrar a escala ótima do macrossistema econômico, permitindo a separação entre (i) crescimento genuinamente econômico (quando os benefícios marginais do aumento da economia superam os custos mar-

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ginais ambientais do processo) e (ii) crescimento antieconômico (quando, pelo contrário, os bene-fícios marginais do aumento da economia se tor-nam inferiores aos custos marginais). Supõe-se, é claro, que, em algum momento, benefícios e custos marginais se igualem.

Tudo isso, no fundo, é a essência do que concebe a economia ecológica. Sua cosmovisão internaliza o sistema econômico na natureza. Ou, como diz um expoente da economia con-vencional (The Economist, coluna “Face Value”, 4.7.2009): “you cannot negotiate with nature”.

COSTANZA, Robert (org.). 1991. Ecological Eco-nomics: The Science and Management of Sustai-nability. Nova York: Columbia University Press.

DALY, Herman & FARLEY, Joshua 2004. Ecologi-cal Economics: Principles and Applications. Wa-shington, D.C.: Island Press.

KNIGHT, Frank.1965. “Anthropology and Econo-mics”, In Melville J. Herskovits, Economic Anthro-pology: The Economic Life of Primitive Peoples. New York: W.W. Norton. 1ª ed., 1940, Appendix: 508-523.

MARSHALL, Alfred. 1961. Principles of Econo-mics, vol. I. Londres: Macmillan, 9ª edição (va-riorum). 1ª ed., 1890.

McNEILL, J.R. 2000. Something New Under the Sun: Un Environmental History of the Thwentieth-Century World. New York: W.W. Norton.

ROBBINS, Lionel Baron. 1984. An Essay on the Nature and Significance of Economic Science. London: Macmillan, 3ª ed. 1ª ed., 1932.

WHITEHEAD, Alfred North. 1985. A Função da Razão. Trad. de Fernando Dídimo, Brasília: Edi-tora da UnB.

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A crítica de Georgescu-Roegen em sua obra magna “The Entropy Law and the Economic Process” visava os fundamentos da abordagem predominante, da qual até então ele era consi-derado um dos expoentes, a ponto de ser con-siderado por muitos um candidato ao prêmio Nobel. Fundamentalmente, sua crítica apontava para o irrealismo da visão analítica neoclássica ao não levar em conta a segunda lei da termo-dinâmica, a lei da entropia. Levá-la em conta implicaria em mudanças profundas nos modelos analíticos construídos até então (incluindo a ma-temática utilizada), como ele procurou mostrar na citada obra.

A continuidade da obra de Georgescu neste plano teórico continua em grande medida bastante limitada. Herman Daly (1991 e 1996) clama pelo desenvolvimento do que deveria ser uma macroeconomia “ambiental”, isto é, uma macroeconomia que levasse em conta a sus-tentabilidade ambiental. Em resposta pioneira a este desafio Heyes (2000), complementa-

Ademar Ribeiro Romeiro Ex-presidente da ECOECO.

Professor do Instituto de Economia da Unicamp.

do por Lawn (2003), propôs um modo de tra-tar as restrições ambientais nos livros-texto de macroeconomia, inserindo-as sob a forma de uma nova curva de equilíbrio ambiental (EE) no tradicional modelo IS-LM, o qual é definido por uma taxa de degradação ambiental igual a zero. Esta taxa, por sua vez, resulta da diferen-ça entre a quantidade de meio ambiente usada na produção e a taxa de auto-renovação do “estoque físico de meio ambiente”. A quantida-de de meio ambiente usada na produção (por exemplo, o quanto da capacidade de absorção de resíduos) varia em função da tecnologia uti-lizada. Esta será mais ou menos poupadora de meio ambiente dependendo da taxa de juros e do marco regulatório que obriga os agentes a pagar mais ou menos pelo que poluem.

Desse modo, a curva (EE) funciona como uma “isoquanta”: o equilíbrio ambiental pode ser obtido a partir de diferentes combina-ções entre taxa de juros (R) e níveis de produção (Y). O deslocamento ao longo da isoquanta

Os Fundamentos Críticos da Abordagem Econômico-Ecológica

Texto III

“...no esquema analítico da Economia Ecológica a consideração da entropia e das propriedades de siste-

mas complexos faz com que a degradação do meio ambiente e/ou esgotamento dos recursos naturais se-

jam vistos como problemas que só podem ser solucionados através de uma justa distribuição intertemporal

de recursos naturais finitos, o que pressupõe a definição de limites absolutos para seu uso (escala)...”

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se explica pelo fato de que, dado o marco re-gulatório e o leque de alternativas tecnológicas, quanto mais caro o capital menos poupadora de meio ambiente será a tecnologia adotada e vice-versa. O deslocamento da própria isoquanta é causado por variações ou no marco regulatório ou no leque de alternativas tecnológicas. Marcos regulatórios pouco rigorosos a deslocam para a esquerda e vice-versa. Por outro lado, inovações que mudam o leque de alternativas tecnológicas, reduzindo o custo do capital poupador de meio ambiente, deslocam-na para a direita: ou seja, ampliam os limites sob os quais o nível de ativi-dade econômica pode se manter em condições de sustentabilidade ambiental. No entanto, se o nível de atividade econômica e a pressão sobre o meio ambiente que produz é superior à capa-cidade de auto-renovação deste (se situa à direi-ta/acima da curva EE), a degradação ambiental crescente acaba por reduzir sua capacidade de suporte deslocando a curva EE para a esquerda.

R EELM

YIS

Na construção da curva EE há problemas em relação aos critérios usados, sendo que os autores optaram pela simplicidade operacional em detrimento da consistência ecológica. No en-tanto, analítica e didaticamente este trabalho de Heyes/Lawn é bastante interessante e certamente indica um caminho a ser desenvolvido. Mais re-centemente, outro trabalho de macroeconomia ambiental que merece menção é do economista canadense Peter Victor (2009). Neste trabalho ele procura mostrar as implicações teóricas de

uma macroeconomia do estado-estacionário1. São simuladas com base em modelos econômi-cos convencionais as possíveis repercussões de uma estratégia de desenvolvimento sustentável.

Os maiores avanços, porém, que con-tribuíram decisivamente para definir uma iden-tidade distintiva da corrente alternativa batizada de economia ecológica, ocorreram na crítica aos pressupostos teóricos neoclássicos aplicados à problemática do meio ambiente. O “insight” decisivo foi a ampliação do escopo da análise entrópica para uma compreensão mais profunda da estrutura e funcionamento dos ecossistemas (ANDRADE e ROMEIRO, 2009). Dos ecólogos (termo usado aqui no sentido amplo para de-nominar todos os especialistas das ciências na-turais) os economistas ecológicos aprenderam que, movidos pela energia solar, os ecossistemas evoluíram num processo de crescente complexifi-cação negentrópico (entropia negativa), possuin-do diversas propriedades entre as quais a resili-ência, isto é, capacidade de resistir a impactos e restabelecer o equilíbrio, embora em novas condições. Esta capacidade resulta em reações não-lineares aos impactos, o que torna pratica-mente impossível em sistemas muito complexos determinar seus limites, chamados de limiares ou capacidade de carga (tresholds/carrying capaci-ty). Daí decorre uma incerteza irredutível sobre riscos de perdas irreversíveis potencialmente ca-tastróficas.

1. https://correio.mme.gov.br/owa/redir.aspx?C=451818fce2a7458ab91395778809b892&URL=http%3a%2f%2fwww.pvictor.com%2fSite%2fHome_.html

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No esquema analítico neoclássico esta compreensão é desnecessária, uma vez a pos-sibilidade de degradação irreversível de ecos-sistemas (capital natural) é irrelevante. Capital e Capital Natural são amplamente substituíveis en-tre si. A degradação do meio ambiente e/ou es-gotamento dos recursos naturais são problemas que podem e devem ser solucionados através da criação de condições adequadas para uma efi-ciente alocação de recursos entre consumo e investimento, a ser levada a cabo por agentes econômicos racionais, cujas motivações são fun-damentalmente maximizadoras de utilidade.

A inexistência destas condições decorre do fato de que boa parte dos bens e serviços am-bientais se constitui de bens públicos (ar, água, capacidade de assimilação de dejetos, etc.) não tendo, portanto, preços. Seu uso por um dado agente econômico implica em uma externalida-de. É preciso, portanto, eliminar esta externali-dade internalizando-a através de alguma forma de ação coletiva que garanta a precificação destes bens e serviços ambientais. Uma vez pre-cificados os bens e serviços ecossistêmicos, seu uso de equilíbrio passa a ser dado pelo cálculo custo-benefício na alocação dos recursos entre investimentos em controle da poluição (evitando, portanto, utilização destes bens e serviços) e in-vestimentos em pagamentos pelo seu uso (polui-dor-pagador). Esta dinâmica de alocação de re-cursos tenderia a se processar de modo eficiente, não havendo problemas de incerteza e de risco de perdas irreversíveis potencialmente catastrófi-cas. Tampouco há limites ambientais absolutos à expansão da economia.

A solução ideal seria aquela que criasse as condições para o livre funcionamento dos me-canismos de mercado diretamente eliminando o caráter público desses bens e serviços através da definição de direitos de propriedade sobre eles (negociação coaseana). Esta solução, entretan-to, não é operacional na medida em que impli-caria a privatização de recursos como a água, o ar, etc. o que, entre outros obstáculos, esbarra-ria no elevado custo de transação decorrente de

processos de barganha que envolveria centenas ou mesmo milhares de agentes. A alternativa é a valoração econômica (precificação) destes bens e serviços pelo Estado (taxação pigouviana).

No esquema analítico da Economia Ecológica (EE) a consideração da entropia e das propriedades de sistemas complexos faz com que a degradação do meio ambiente e/ou esgo-tamento dos recursos naturais sejam vistos como problemas que só podem ser solucionados atra-vés de uma justa distribuição intertemporal de recursos naturais finitos, o que pressupõe a defi-nição de limites absolutos para seu uso (escala). Além disso, trata-se de um processo envolven-do agentes econômicos cujo comportamento é complexo em suas motivações (as quais incluem dimensões sociais, culturais, morais e ideológi-cas) e que atuam num contexto de incertezas e de riscos de perdas irreversíveis que o progres-so da ciência não tem como eliminar. Capital e Capital Natural são fundamentalmente comple-mentares. Desse modo, tanto a natureza como o papel da ação coletiva são completamente dis-tintos daqueles pressupostos no esquema analí-tico convencional. Trata-se de um processo de escolha pública onde caberá à sociedade civil, em suas várias formas de organização (o Estado entre outras), decidir sobre o que é sustentável, em ultima instância, com base em considerações morais e éticas (ROMEIRO, 2004).

No entanto, para a EE a precificação dos bens e serviços ecossistêmicos é necessária para orientar o processo de tomada de decisão, uma vez que se trata de sociedades monetizadas. Os diversos métodos de valoração desenvolvi-dos pelos economistas ambientais, que direta ou indiretamente avaliam a disposição a pagar dos agentes econômicos por este ou aquele bem ou serviço ambiental, podem (e devem) ser uti-lizados pelos economistas ecológicos. A diferen-ça fundamental está em que sua utilização por estes últimos é orientada pela compreensão da estrutura e funcionamento dos ecossistemas em jogo. Este esforço de compreensão leva à cons-tatação, em primeiro lugar, de que, via de regra,

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existem outros serviços ecossistêmicos envolvi-dos, produtos de diferentes funções ecossistêmi-cas em geral inter-relacionadas, além daquele cujo valor é obtido pelo método de valoração que seria normalmente utilizado pela economia ambiental (EA); em segundo lugar, da existência de limiares de resiliência (sustentabilidade). Des-se modo, o procedimento de valoração econô-mica sob a ótica da EE é um procedimento bem mais complexo, envolvendo muito mais variáveis e parâmetros (de sustentabilidade). Nesse senti-do, a modelagem econômico-ecológica é uma ferramenta que tende a se tornar imprescindível, uma vez que torna possível manejar um numero elevado de variáveis e parâmetros.

Em resumo, como elementos críticos dis-tintivos, definidores da identidade teórica da cor-rente teórica dissidente chamada de economia ecológica podem ser elencados os seguintes:

1- Partilha com outras correntes dissidentes a crítica aos pressupostos neoclássicos sobre o comportamento humano;

2- Considera a Lei da Entropia e os limites ter-modinâmicos à expansão material/energética do sistema econômico;

3- Leva em conta as propriedades de sistemas complexos e o risco de perdas irreversíveis po-tencialmente catastróficas.

Bibliografia Citada

ANDRADE, D.C. e ROMEIRO, A.R. Serviços Ecossistêmicos e sua Importância para o Sistema Econômico e o Bem-Estar Humano. Texto p/ Dis-cussão 155. IE/UNICAMP, 2009.

DALY, H. Towards an Environmental Macroeco-nomics. Land Economics, vol. 67, p. 255-259, 1991.

DALY,H. Beyond Growth. Beacon Press, 1996.

HEYES, A. A Proposal for the Greening of the Textbook Macro: IS-LM-EE. Ecological Econo-mics, vol. 32, p. 1-7, 2000.

LAWN, P.A. On Heyes`s IS-LM-EE Proposal to Es-tablish an Environmental Macroeconomics. Envi-ronment and Development Economics, vol. 8, p. 31-56, 2003.

ROMEIRO, A.R. Economia ou Economia Política da Sustentabilidade. IN: ECONOMIA DO MEIO AMBIENTE. Teoria e Práticas. Org. Peter May et al. Rio de Janeiro. Ed. Campus, 2004.

VICTOR, P. A. Managing without growth – slower by design, not disaster. Cheltenham, Reino Uni-do: Edward Elgar, 2009.

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Boletim da Sociedade Brasileira de Economia EcológicaEC EC

Chamada para o 11ª Conferência Bienal da International Society for Ecological Economis (ISEE), Oldemburg e Bremem , Alemanha , 22-25 de Agosto de 2010

Já está aberta a chamada de trabalhos para a 11ª Confe-rência Bienal da International Society for Ecological Econo-mis (ISEE), que acontecerá no período de 22-25 de Agosto de 2010 nas cidades de Oldem-burg e Bremem, na Alemanha (www.ecoeco.org). O tema central do Evento será “Avan-ços na Sustentabilidade em Tempos de Crise”. As sessões temáticas abordarão os seguin-tes campos:

1. mudança climática - cau-sas, impactos, mitigação, adaptação e opção de polí-ticas;

2. energia – energias renová-veis, fluxos de energia, pe-tróleo, políticas de estímulos à “energias verdes”, energia e entropia, energias alterna-tivas e distribuição de ener-gia e tecnologia;

3. biodiversidade e serviços ecossistêmicos - valoração e políticas de integração;

4. uso da terra - inclusive o manejo da zona costeira, uso das águas, restauração de ecossistemas e biorregio-

Notícias

nalismo5. ecologia – sistemas comple-

xos, modelagem economia/ecologia, ecologia teórica;

6. desmaterialização e decres-cimento – ecologia indus-trial, eco-eficiência, produ-ção e consumo sustentáveis;

7. desenvolvimento sustentável – desenvolvimento industrial e meio ambiente, inequida-des entre ricos e pobres, co-nhecimentos e direitos dos povos indígenas, dívida e colonialismo ambiental, PIB ambiental e pobreza, auto-realização e sustentabilida-de;

8. meio ambiente e valores éticos – normas, conceitos éticos, valores ambientais e tomadas de decisão;

9. conhecimento e aprendiza-do social – sistemas de co-nhecimento, mecanismos e dinâmicas de aprendizado social processo de mudan-ça econômica e política

10. negócios verdes – respon-dabilidade social corporati-va. Economia ecológica das empresas, ecologia indus-trial, comércio e tributação, incentivos e empreendedo-rismo

11. economia heterodoxa – oportunidades pós-crise para evolucionismo institu-cional, pos-keynesianismo, economia pós-autista, si-nergias com a economia ecológica.

12. transdisciplinaridade – ci-ência pós-normal, ciência e sustentabilidade, desenhos de pesquisas transdiscipli-nares, métodos participató-rios, desafios teóricos e me-todológicos.

13. ensino de economia ecoló-gica – desenvolvimento de currículo, experiências prá-ticas, ensino.

O prazo final para envio dos resumos é 31 de outubro de 2009. Não perca!!!

A ECOECO na SBPC

Duas atividades foram reali-zadas por iniciativa da ECOE-CO na 61ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), ocorrida em Manaus (AM) nos dias 12-17 de julho deste ano.

Turma que participou do mini-curso da ECOECO na 61ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada em

Manaus (AM) nos dias 12-17 de julho de 2009.

A primeira foi o mini-curso “In-trodução à Economia Ecológi-ca - a Economia na Perspectiva da Ecologia”. Ministrado por Amélia Rodrigues Enríquez e Clóvis Cavalcanti, o curso teve lugar nos dias 14-17, das 8h às 10h. Dele participaram 45 alunos, sendo 30 mulheres e 15 homens. Os participantes eram de diferentes áreas do conheci-mento – biólogos, agrônomos, geógrafos, administradores, so-ciólogos, turismólogos, antro-pólogos, psicólogos e um eco-nomista. A maioria (19 deles) provinha do Amazonas. Dos ou-tros estados, seguiam-se: 6 do Pará, 4 do RJ, 3 de SE e DF, 2 de RO, PE, SP e um de RR, PR, MG,

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Edição Nº 20 — Edição Especial para o VIII Encontro ECOECO de 2009 EC EC

MT. Não havia alunos de gra-duação. Apenas profissionais – pós-graduandos, doutores, mestres, professores universitá-rios, técnicos. Amélia e Clóvis mostraram as características do modelo ecológico-econômico e as implicações daí decorrentes para a compreensão do proces-so de desenvolvimento.

A segunda atividade consis-tiu no simpósio “Problemas do Desenvolvimento na Perspecti-va Econômico-Ecológica: Apli-cações ao caso da Amazônia”, realizado no dia 16, das 15h30 às 18h. Coordenado por Cló-vis Cavalcanti, que foi t ambém expositor da mesa, tomaram parte nele os professores Maria do Perpétuo Socorro R. Chaves (UFAM), abordando aspectos so-ciais; Philip M. Fearnside (INPA), que analisou questões relativas aos serviços ambientais; e Gon-zalo Vásquez Enríquez (UFPA), responsável por aspectos econô-micos da biodiversidade. Estive-ram presentes à sessão 88 pes-soas, com participação maior de profissionais e graduados. Não foi possível acomodar todos os que queriam entrar na sala, que comportava apenas 60 pessoas sentadas. Diversos interessados ficaram no lado de fora. Para maiores informações acesse (http://www.agencia.fapesp.br/materia/10788/economia-eco-logica.htm )

ECOECO no Seminário Internacional “Crise Civilizacional: Distintos Olhares”, ocorrido na cidade de Palmas (Tocantins), no período de 22 a 24 de junho de 2009

O seminário internacional “Cri-se Civilizacional: Distintos Olha-res” foi uma realização conjunta do Instituto Internacional sobre Política Civilizacional (IIRPC), do Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS)/ Universidade de Brasília (UnB), da Universida-de Federal do Tocantins (UFT) e Fundação Universidade do To-cantins no período de 22 a 24 de junho na cidade de Palmas, Estado do Tocantins.

O seminário reuniu pensado-res de diversas áreas e de di-versos continentes, voltando o foco das discussões para temas como desenvolvimento sus-tentável, aquecimento global, crise energética, conservação ambiental, eqüidade e gover-nança mundial, entre outros.

Presidente da ECOECO apresentou o tema “Eco-nomia e Sustentabilidade: A perspectiva da Eco-nomia Ecológica” no Seminário Palmas (Tocantins)

O objetivo foi contribuir para uma compreensão sobre as cri-ses globais geradas pelo mo-delo de civilização baseado no desenvolvimento econômico, modelo este que hoje se mostra em seu limite de esgotamento – no limite físico, pela degradação ambiental que ameaça as diver-sas formas de vida do planeta; e no limite ético, pela desigual-dade social entre as pessoas e as nações, bem como, propor

ações de enfrentamento e su-peração, que sejam mais que promover soluções locais para estes problemas, buscando a formação de um projeto mun-dial – naturalmente, respeitando o contexto de cada cultura.

A presidente da Sociedade Bra-sileira de Economia Ecológica, Maria Amélia Enríquez, foi con-vidada para participar da Mesa “Economia e Sustentabilidade: Quais Alternativas?” apresen-tando a conferência “Economia e Sustentabilidade: a perspecti-va da Economia Ecológica”.

A conferência despertou gran-de interesse entre os participan-tes que abordaram a presidente da ECOECO desejando obter maiores informações, como também, do reitor da Univer-sidade Federal do Tocantins, Alan Barbiero, que manifestou interesse em sediar um encon-tro regional sobre Economia Ecológica.

A presidente da ECOECO, Maria Amélia Enrí-quez e o Reitor da Universidade de Tocantins, Alan Barbiero. Convite para sediar um Encontro Regional da ECOECO.

Curso de extensão “A Economia do Século XXI: uma Abordagem da Economia Ecológica” no Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS)-UnB

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Boletim da Sociedade Brasileira de Economia EcológicaEC EC

No mês de maio, de 18 a 28/05/2009, a ECOECO, em parceria com o Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da UnB, ofereceu curso de extensão no âmbito do CDS intitulado “A Economia do Sé-culo XXI: uma Abordagem da Economia Ecológica”, com a participação de Clóvis Caval-canti, Cristóvam Buarque, Ma-ria Amélia Enríquez, Maurício Amazonas e Elimar Nascimen-to. Fundamentalmente, o curso visou proporcionar um espaço de reflexão e compreensão so-bre a natureza da economia capitalista no século XXI e o seu desaguar na crise mundial da atualidade, com base em refe-renciais teóricos da economia ecológica, de caráter interdis-ciplinar, que contemplem as várias dimensões da crise eco-nômica global e que incorpore as inter-relações no âmbito do desenvolvimento sustentável.

Partindo da percepção de que os modelos econômicos tradi-cionais mostram-se falhos em permitir uma visão integrada dos processos econômicos com outras dimensões, tais como, a ambiental, a social, a política e a cultural, procurou-se propor-cionar um referencial teórico interdisciplinar para a interpre-tação e análise da economia deste início de século XXI, a par-tir da economia ecológica, in-vestigando-se ao final a valida-de desta proposta interpretativa para a compreensão dos atuais caminhos do desenvolvimento econômico, sua relação com a sustentabilidade, e as relações da atual crise econômica com os rumos da sustentabilidade.

Voltado a alunos de pós-gra-duação, graduação e profissio-nais em áreas de interesse, o curso iniciou com uma demar-cação de visão teórica sobre as relações de coetaneidade entre sociedade capitalista, so-ciedade industrial e sociedade moderna (Elimar Nascimento), seguindo-se a discussão dos fundamentos epistêmicos e te-óricos da Economia Ecológica (Clóvis Cavalcanti), as teorias e instrumentos da Economia Eco-lógica (Maria Amélia Enríquez), a discussão sobre os conceitos e históricos de Desenvolvimen-to e de Sustentabilidade em seus contextos de globalização e de crise (Maurício Amazonas) e ao final a discussão das di-mensões do desenvolvimento, com destaque à do conheci-mento e da educação, para o processo de constituição de uma Economia Verde (Cristó-vam Buarque).

Gisella Collares (Assistente da ECOECO) e o Se-nador Cristóvam Buarque no curso de Extensão da ECOECO. CDS/UnB, 28 de maio de 2009

Apesar do curto período de di-vulgação, a ampla demanda fez com que tivéssemos que encerrar as inscrições com pro-messa de reeditar o curso no segundo semestre de 2009. O curso foi um grande suces-so de público, não apenas em termos quantitativo (45 pessoas

para 30 vagas originalmente), mas contou com a presença de muitos gestores públicos ligados às áreas não tradicio-nalmente afetas ao meio am-biente, como o MMA, Ibama, MDIC, Planejamento, Fazenda, MME, Min. da Integração, Fun-dação Banco do Brasil, entre vários, demonstrando a grande demanda dos gestores públicos em adquirir novas ferramentas interpretativas e discutir, de ma-neira qualificada, modelos al-ternativos de desenvolvimento. Acalorados debates se deram em busca de se compreender como a partir do atual mode-lo de desenvolvimento seria possível o desenho de políti-cas e de instrumentos visando a consecução de trajetórias de sua superação de modo a se obter que o crescimento ocorra respeitando seus limites biofísicos, e equacionando ao mesmo tempo a necessidade de sermos capazes de garantir trajetórias de crescimento que permitem a reversão da exclu-são econômica e pobreza, ou seja, trajetórias de crescimento que se convertam em desenvol-vimento, e que este se de em bases sustentáveis.

Como resultados imediatos, além da formação direta pro-porcionada, o curso marcou-se por apresentar e difundir os princípios e instrumentos da economia ecológica na comu-nidade acadêmica do Centro de Desenvolvimento Sustentá-vel e circundante, além de ter fomentado a apresentação de trabalhos por esta comunidade

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Edição Nº 20 — Edição Especial para o VIII Encontro ECOECO de 2009 EC EC

no VIII Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecoló-gica (5 a 7 de agosto de 2009, em Cuiabá-MT).

Economia Ecológica ganha destaque no Painel de Recursos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA)

O Painel de Recursos é uma iniciativa da Divisão de Tec-nologia, Indústria e Economia (DTIE) do Programa das Na-ções Unidas para o Meio Am-biente (PNUMA) que congrega especialistas de todo o mundo para debater e difundir pes-quisas de ponta no campo da produção e do consumo sus-tentáveis envolvendo recursos naturais , visando, em última instância, dar suporte às políti-cas em prol da “economia ver-de” (http://www.unep.fr/scp/rpanel/). São dois os objetivos fundamentais do Painel:

1- fornecer uma avaliação científica independente e coerente sobre as políticas relevantes para o uso sus-tentável dos recursos natu-rais e, em particular, para lidar com os impactos am-bientais a eles associados, durante todo o ciclo de vida;

2- contribuir para a melhor compreensão de como “dissociar” (decoupling) o

crescimento econômico da degradação ambiental.

Os pré-encontros para a for-mação do Painel iniciaram em 2006, mas o Painel se formou, de fato, em 2007. Neste ano de 2009 houve uma amplia-ção do grupo original (cons-tituído fundamentalmente por membros da Comunidade Eu-ropéia e norte-americana) que agora passou a ser composto por 26 representantes de to-dos os continentes. Os novos membros são provenientes, principalmente, de países do “Sul” como México, Argenti-na, Brasil e Quênia. Dos no-vos membros recém-incopro-rados, quatro são vinculados à Economia Ecológica, o que demonstra que os princípios dessa nova área estão desper-tando o interesse de importan-tes definidores das políticas globais, já que o Comitê Stee-ring é um dos principais patro-cinadores da iniciativa.

Novos membros do Painel de Recursos do PNUMA provenientes da Economia Ecológica. Da esquerda para direita: Kevin Urama ( Sociedade Africana). Walter Pengue (Sociedade Argentina-Uruguaia), Richard Norgaard (USA - Berkley). Maria Amélia Enríquez(ECOECO) e Baas De Lew (Secretário Ge-ral do Painel), Paris, Junho de 2009.

Atualmente há cinco grupos de trabalhos (Metais, “Decoupling”, Priorização” Biocombustíveis e Água) no Painel, cuja missão é elaborar e sistematizar os estu-dos científicos, com bases em ferramentas como análise do ciclo de vida e fluxo metabólico dos recursos (entre outros), de-bater com os membros do Pai-nel (a validade científica, tendo em conta as deferentes realida-des em termos de regiões, níveis de desenvolvimento etc.) e com outros atores relevantes até que seus relatórios estejam no ponto de publicação e de divulgação.

No dia 21 de julho deste ano foi lançado no auditório do SESI, na Federação das Indústrias do Paraná o “Compêndio de Indicadores de Sustentabilidade de Nações” organizado por Anne Louette. Na ocasião foi realizada uma mesa redonda sobre Indicadores de Sustentabilidade do qual participaram Anne Louette, Paulo Gonzaga M. de Carvalho (vice-presidente da ECOECO) e Maurício Serra (Departamento de Economia - UFPR). Essa publicação - a mais completa no gênero no país - estará em breve disponível no site http://www.compendiosustentabilidade.com.br

ECOECO no Lançamento do Compêndio de Indicadores de Sustentabilidade de Nações

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Anote na Agenda:

O VIII ECOECO terá como tema central Os desa�os da aplicação da economia ecológica para o desenvolvimento sustentável.

Grandes nomes da economia ecológica internacional já con�rmaram presença, como Juan Martínez Allier e Joshua Farley.

Veja a programação completa em www.ecoeco.org.br