ECONOMIA SOLIDÁRIA COMO MEIO PARA SE ALCANÇAR O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Esse trabalho objetiva enfrentar a problemática acerca da seguinte questão: se o cooperativismo de economia solidária, que deve ser apoiado por política pública em razão do artigo 174, parágrafo 2º, da Constituição Federal do Brasil, é um meio eficaz para se alcançar o desenvolvimento sustentável, princípio consagrado também na Carta Magna, no artigo 225 - que garante a esta e às futuras gerações o direito ao meio ambiente equilibrado. O estudo é atual e justifica-se visto que o sistema econômico vigente é uma construção social que cada vez gera maior desigualdade social e econômica ao valorizar o capital acima do homem. Consequentemente, não apenas a questão social, mas também a ambiental é colocada em segundo plano, gerando alto risco à manutenção dos recursos naturais essenciais à vida, que são finitos...

Citation preview

  • ECONOMIA SOLIDRIA COMO MEIO PARA SE ALCANAR ODESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL

    Carlos Alberto da Silva*Jos Victor Franklin Gonalves de Medeiros**

    ResumoEsse trabalho objetiva enfrentar a problemtica acerca da seguinte questo: se o cooperativismo de economia solidria, que deve ser apoiado por poltica pblica em razo do artigo 174, pargrafo 2, da Constituio Federal do Brasil, um meio eficaz para se alcanar o desenvolvimento sustentvel, princpio consagrado tambm na Carta Magna, no artigo 225 - que garante a esta e s futuras geraes o direito ao meio ambiente equilibrado. O estudo atual e justifica-se visto que o sistema econmico vigente uma construo social que cada vez gera maior desigualdade social e econmica ao valorizar o capital acima do homem. Consequentemente, no apenas a questo social, mas tambm a ambiental colocada em segundo plano, gerando alto risco manuteno dos recursos naturais essenciais vida, que so finitos. Para solucionar tais problemas, o cooperativismo de economia solidria est sendo construdo com o fim de implementar uma nova forma de organizao econmica, fundada na cooperao e na solidariedade entre todos os membros da sociedade e o respeito vida, derivando disso o respeito e a proteo ao meio ambiente. Para tal investigao sero abordados e apresentados conceitos do cooperativismo de economia solidria, distinguindo-o do cooperativismo tradicional, Por fim, ser feita correlao entre os princpios do cooperativismo de economia solidria e os elementos indispensveis para a promoo da sustentabilidade, identificando se h divergncias e semelhanas que impeam ou afirmem a economia solidria como caminho para se atingir o desenvolvimento sustentvel. Concluiu-se, por meio desse estudo, que o cooperativismo de economia solidria um meio eficaz para se alcanar o desenvolvimento sustentvel e concretiza dois objetivos da Repblica Federativa do Brasil fixado na Carta Magna, quais sejam, a erradicao da pobreza e a preservao do meio ambiente.

    Palavras-chave: desenvolvimento sustentvel; economia solidria; cooperativismo.

    ResumenEste trabajo tiene como objetivo abordar el problema en la siguiente pregunta: si la economa solidaria cooperativa, que debe ser apoyada por polticas pblicas por la razn del artculo 174, prrafo 2, de la Constitucin Federal de Brasil, es un medio eficaz para lograr el desarrollo sostenible, un principio consagrado tambin en la Carta Magna, en el artculo 225 - que garantiza esta y futuras generaciones el derecho a un medio ambiente equilibrado. El estudio est actual y se justifica debido a que el sistema econmico actual es una construccin social que genera cada vez mayor desigualdad social y econmica, valorando el capital sobre el hombre. En consecuencia, no slo lo social sino tambin el medio ambiente se coloca en el fondo, resultando un alto riesgo para el mantenimiento de los recursos naturales esenciales para la vida, que son finitos. Para resolver estos problemas, la economa solidaria de las cooperativas se est construyendo con el propsito de implementar una nueva forma de organizacin econmica, basada en la cooperacin y la solidaridad entre todos los miembros de la sociedad, y el respeto por la vida, que resultan en el respeto y en la proteccin al medio ambiente. Para esta investigacin, se discutir y presentar conceptos de cooperativismo de la economa solidaria, distinguindola de las cooperativas tradicionales. Por ltimo, la correlacin entre los principios cooperativos de la economa solidaria y los elementos esenciales para promover la sostenibilidad y identificar si existen diferencias y similitudes que impiden o afirman la economa solidaria como una forma de lograr el desarrollo sostenible. Se concluy a travs de este estudio que la economa solidaria cooperativa es un medio eficaz para lograr el desarrollo sostenible, y se da cuenta dos objetivos de la Repblica Federativa de Brasil establecidos en la Constitucin, a saber, la erradicacin de la pobreza y la preservacin del medio ambiente.

    Palabras clave: desarrollo sostenible; economa solidaria; cooperativismo.

    * Mestre em Direito pela PUC-SP. Graduado pela Universidade Estadual de Maring. E-mail: [email protected] ** Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Oeste do Paran. E-mail: [email protected]

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 53

  • INTRODUO

    Ao longo da histria da humanidade, criaram-se vrias formas de organizao da produo e comercializao dos produtos. Nos tempos mais primitivos, temos notcias do modo de produo inicialmente comunitrio em seguida o escravo. Posteriormente, simultaneamente ao trabalho escravo no mundo ocidental, ganha relevncia o trabalho remunerado. No perodo que se convencionou chamar de Idade Mdia, que transcorreu durante aproximadamente mil anos, o trabalho servil. A Revoluo industrial na Idade Moderna com a predominncia do trabalho assalariado. Tambm nesse perodo que, emerge na Europa Ocidental uma experincia na organizao da atividade produtiva denominada cooperativismo, a qual passou a ganhar grande expresso, tanto em quantidade como em qualidade, a partir do sculo XVIII, inicialmente na Inglaterra para logo em seguida atravessar o canal da mancha em direo da Europa e dali para os mais diversos recantos territrios do planeta Terra.

    Atualmente a relevncia do cooperativismo est mantida e fica evidenciada quando a ONU (Organizao das Naes Unidas) declarou o ano de 2012 como sendo o ano internacional das cooperativas. Segundo a prpria ONU, a importncia destas sociedades de pessoas se d principalmente pela gerao de empregos, reduo da pobreza e integrao social, incentivando os indivduos, comunidades e governos a promoverem a formao e crescimento das cooperativas.

    No coincidentemente, nesse mesmo ano foi realizada a Conferncia das Naes Unidas sobre Desenvolvimento Sustentvel, a Rio+20, que teve por objetivo a renovao do compromisso poltico com o desenvolvimento sustentvel, que resultou em um documento final de 53 pginas, acordado por 188 pases, ditando o caminho para a

    cooperao internacional sobre desenvolvimento sustentvel.

    Diferentemente do modo de produo vigente, a economia solidria busca assegurar valores que visam promover o bem-estar coletivo. Esse um dos itens necessrios para se alcanar um desenvolvimento sustentvel.

    Tambm se busca a implementao da almejada sustentabilidade para que se possa assegurar as geraes futuras o bem estar. Seguindo os passos internacionais da sustentabilidade, o Brasil vem adotando diversas polticas pblicas, cabendo aqui destacar que foi criada no mbito do Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE) em 2003, a Secretaria Nacional de Economia Solidria SENAES. O objetivo, segundo o prprio MTE, a gerao de trabalho e renda, objetivando a incluso social e a promoo do desenvolvimento justo e solidrio.

    Considerando a relevncia da sociedade de pessoas como alternativa para a promoo social, de vital importncia que o Estado amplie as polticas pblicas em diversas frentes, como j vem sendo realizado no caso do Programa Nacional de Alimentao Escolar. Essa e outras medidas so meios eficazes para se alcanar o desenvolvimento sustentvel.

    1. DO CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO SUSTEN- TVEL

    O vocbulo desenvolvimento sustentvel, que exprime o princpio a ser estudado nesse primeiro tpico, foi utilizado pela primeira vez na Conferncia Mundial de Meio Ambiente, que se realizou na cidade de Estocolmo, capital da Sucia, em 1972. Desde ento, foi repetido nas conferncias posteriores sobre meio ambiente, ganhando destaque a Conferncia das Naes Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em junho de 1992 no Rio de

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 54

  • Janeiro (ECO-92), por empregar o termo em onze de seus vinte e sete princpios. Mais recentemente, a Conferncia das Naes Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentvel, que ocorreu no Rio de Janeiro RJ em junho de 2012 (RIO+20), reafirmou e destacou os princpios j consagrados nos documentos supramencionados (FIORILLO, 2013, p. 70-71).

    O legislador constituinte de 1988, atento preocupao a nvel internacional e aos movimentos sociais ambientalistas, defende que o desenvolvimento econmico deveria caminhar no mais alheio preservao do meio ambiente, ciente que os recursos naturais so finitos. Em conformidade com essa proteo dada pelo constituinte, Fiorillo chama ateno para o fato de que, ao contrrio do que se pratica na sociedade atual, a contnua degradao implicar diminuio da capacidade econmica do Pas, e no ser possvel nossa gerao e principalmente s futuras desfrutar uma vida com qualidade (FIORILLO, 2013, p. 79). Nesse sentido, a Carta Magna propugna que:

    Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e preserv-lo para as presentes e futuras geraes.

    Portanto, para concretizarmos as diretrizes ambientalistas fixado no artigo transcrito, ser possvel atravs do desenvolvimento sustentvel que possui grande relao com meio ambiente ecologicamente equilibrado.

    Por esta razo, indispensvel a conceituao de meio ambiente para melhor compreenso, visto que esse passou a ter relevncia para o mundo jurdico, posto que sua preservao, recuperao e revitalizao tornam-se preocupao do Poder Pblico (SILVA, 2013, p. 21):

    O meio ambiente , assim, a interao do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas. A integrao busca assumir uma concepo unitria do ambiente, compreensiva dos recursos naturais e culturais. (SILVA, 2013, p. 20)

    Destaque-se que o princpio do desenvolvimento sustentvel, consagrado no art. 225 da Constituio Federal de 1988, no tem como objetivo findar qualquer desenvolvimento econmico, que um valor consagrado na sociedade do atual momento. O princpio preza pela coexistncia harmnica do avano econmico e da preservao ambiental. Tanto que tal caracterstica trazida como inerente ao ser humano, conforme prescrio do art. 1 da Declarao sobre o Direito ao Desenvolvimento da ONU:

    Artigo 11. O direito ao desenvolvimento um direito humano inalienvel, em virtude do qual toda pessoa e todos os povos esto habilitados a participar do desenvolvimento econmico, social, cultural e poltico, para ele contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados.2. O direito humano ao desenvolvimento tambm implica a plena realizao do direito dos povos autodeterminao que inclui, sujeito s disposies relevantes de ambos os Pactos Internacionais sobre Direitos Humanos, o exerccio de seu direito inalienvel soberania plena sobre todas as sua riquezas e recursos naturais. (DECLARAO..., 1986)

    Nesse sentido, o conceito de sustentabilidade segundo Juarez Freitas, caracteriza-se por determinar

    [...] a responsabilidade do Estado e da sociedade pela concretizao solidria do desenvolvimento material e imaterial, socialmente inclusivo, durvel e equnime, ambientalmente limpo, inovador, tico e eficiente, no intuito de assegurar, preferencialmente de modo preventivo e

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 55

  • precavido, no presente e no futuro, o direito ao bem-estar. (FREITAS, 2012, p. 41)

    Para melhor compreenso da consagrao desse princpio na Carta Magna, importante trazer uma breve contextualizao histrica. A sustentabilidade qualificou o desenvolvimento alterando, inclusive, os princpios que regem a ordem econmica da Repblica do Brasil, no mais cabendo o conceito de desenvolvimento fundado na concepo do Liberalismo, ideologia que tem por principal caracterstica a defesa do Estado mnimo, que gerou enorme acumulao de renda em decorrncia da dominao exclusiva dos economicamente poderosos. Essa doutrina foi enfraquecida, com o advento da crise de 1929, exigindo-se interveno do Estado para o equilbrio do mercado econmico, e, por consequncia, tambm no socorro dos bens ambientais, tornando-se ambos parte de um mesmo objetivo (FIORILLO, 2013, p. 72-73). O artigo 170, inciso VI da Constituio Federal resultado dessa exigncia de um Estado intervencionista que assegure uma ordem econmica onde a livre concorrncia e a defesa do meio ambiente caminhando juntas:

    Art. 170. A ordem econmica, fundada na valorizao do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existncia digna, conforme os ditames da justia social, observados os seguintes princpios:[...]VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e servios e de seus processos de elaborao e prestao;

    Conforme ensinamentos de Fiorillo (2013, p. 71-79), considerando que os recursos naturais no so inesgotveis, as atividades econmicas no podem se desenvolver alheias a isso, visto que numa sociedade desregrada, deriva de parmetros de livre concorrncia e

    iniciativa, o caminho inexorvel para o caos ambiental uma certeza. O autor no busca com isto descartar o valor do desenvolvimento econmico, mas apenas destacar a importncia de sua coexistncia com a preservao ambiental.

    No se pode ignorar que por vezes o desenvolvimento econmico entra em conflito diretamente com a preservao ambiental, visto que "essa cultura ocidental, que hoje busca uma melhor qualidade de vida, a mesma que destruiu e ainda destri o principal modo de obt-la: a Natureza" (SILVA, 2013, p. 25).

    No tarefa simples, todavia dever estabelecido pela prpria Constituio e pela Lei 6.938 de 31/08/1981, em seu artigo 4, inciso I, o objetivo de compatibilizao do desenvolvimento econmico-social com a preservao da qualidade do meio ambiente e do equilbrio ecolgico. Para Jos Afonso da Silva (2013, p. 27) a conciliao desses dois valores consiste na promoo do desenvolvimento sustentvel.

    Para Paulo Affonso Leme Machado (2014, p. 67), diferem-se as noes de sustentabilidade ambiental e de desenvolvimento sustentvel, pois aquela no necessariamente dever considerar o desenvolvimento em seus aspectos econmicos e sociais, que considerada apenas quando se trata de desenvolvimento sustentvel, que, segundo o autor, " uma viso que pode convergir ou divergir da percepo da "sustentabilidade ambiental".

    O termo desenvolvimento relacionado por esse mesmo autor a uma conotao finalstica, ou seja, "no basta crescer, mas preciso saber se h razo para mudar, se h realmente bases para que esse desenvolvimento signifique uma melhoria" (MACHADO, 2014, p. 68). Assim, a sustentabilidade torna-se um qualificador do desenvolvimento.

    Ainda explana que o antagonismo que h entre os termos desenvolvimento e sustentabilidade no pode ser omitido pelos especialistas que atuem no exame de

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 56

  • programas, planos e projetos de empreendimentos, devendo-se levar em considerao, sob o risco de desvalorizao do meio ambiente e o comprometimento do equilbrio ambiental (MACHADO, 2014, p. 70).

    Por outro lado, autores como Juarez Freitas no fazem distino quanto utilizao dos termos, ao se referir ao princpio do desenvolvimento sustentvel (ou da sustentabilidade, como se prefere) (FREITAS, 2012, p. 31).

    Entretanto, o desenvolvimento no precisa ser contraditrio com a sustentabilidade. [...]. Dito de outro modo, uma vez reconcebido, o desenvolvimento pode-deve ser sustentvel, contnuo e duradouro. (FREITAS, 2012, p. 42)

    Aps as diferenciaes tericas, para os fins desse trabalho ser adotado os termos desenvolvimento sustentvel e sustentabilidade como sinnimos, em considerao ao prprio valor vida consagrado pela Economia Solidria, de modo que o desenvolvimento no se exprime apenas em termos econmicos, sendo um princpio e um dever de todos consagrado no Art. 225 da Constituio Federal de 1988 o de preservar o meio ambiente equilibrado, essencial sadia qualidade de vida.

    2. DO COOPERATIVISMO DE ECONOMIA SOLIDRIA

    Vive-se, atualmente, em uma sociedade onde a percepo da maioria das pessoas de que o modo como est organizada a produo vigente tido como natural. Sabe-se que no capitalismo a competitividade inerente sua estrutura, isto , no s faz parte, como tambm inseparvel desse sistema. Ele traz consigo diversas desvantagens com relao aos direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana. Singer sintetiza o porqu

    de esse sistema econmico gerar tamanha desigualdade:

    Tudo isso explica por que o capitalismo produz desigualdade crescente, verdadeira polarizao entre ganhadores e perdedores. Enquanto os primeiros acumulam capital, galgam posies e avanam carreiras, os ltimos acumulam dvidas pelas quais devem pagar juros cada vez maiores, so despedidos ou ficam desempregados at que se tornam inempregveis, o que significa que as derrotas os marcaram tanto que ningum mais quer empreg-los. Vantagens e desvantagens so legadas de pais para filhos e para netos. [...] O que acaba produzindo sociedades profundamente desiguais. (SINGER, 2002, p. 8-9)

    Isso tambm aponta para o fato de que a produo inconsequente das mercadorias no visa exclusivamente satisfao das necessidades humanas, mas para saciar um consumo patolgico. Em decorrncia disto, cada vez maior a extrao dos recursos naturais. essencial salientar que estas fontes so finitas. Logo, quanto mais intensiva for a produo de mercadorias, maior ser o desequilbrio ecolgico gerado pela explorao dos recursos naturais, e trazendo como consequncia a possibilidade de exausto desses recursos fornecidos pelo ecossistema.

    Por outro lado, a economia solidria foi criada com o fim de implementar uma nova forma de organizao econmica, como alternativa para a soluo da enorme desigualdade gerada pelo modo de produo capitalista, tendo como fundamento a cooperao e a solidariedade entre todos os membros da sociedade e o respeito vida, em um sentido amplo, derivando disso o respeito e a proteo ao meio ambiente e a satisfao plena racional das necessidades do homem, isto , na perspectiva de proporcionar qualidade de vida e bem-estar a todos os cidados desta e das futuras geraes. Apesar de no haver total uniformidade, Carleial e Paulista sintetizam o que h de

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 57

  • comum quanto ao conceito de economia solidria:

    As tentativas de conceituar a economia solidria se demonstraram insuficientes para abranger a pluralidade de dimenses que ela engloba, mas esse fato no nos impede de identificar alguns postulados comuns, aceitos pelo conjunto dos autores que tratam do tema, entre os quais possvel apontar: o objetivo de produzir um bem ou servio de modo sustentvel e sem ter por finalidade o lucro; gesto independente do Estado; estruturas associativas; processo decisrio democrtico com nfase na participao e na cooperao, assim como primazia das pessoas e do trabalho sobre a remunerao do capital. (CARLEIAL; PAULISTA, 2008, p.14)

    Nesse sentido, Laville e Gaiger (2009, p. 162) tambm admitem a existncia de variadas acepes de economia solidria, destacando que em todos os locais onde o cooperativismo estudado e praticado, o conceito organizado "ao redor da ideia de solidariedade, em contraste com o individualismo utilitarista que caracteriza o comportamento econmico predominante nas sociedades de mercado". Igualmente, Singer aponta a solidariedade como fator que o distingue das demais sociedades de produo econmica, individualizando a economia solidria ao afirmar que seu conceito

    [...] se refere a organizaes de produtores, consumidores, poupadores, etc., que se distinguem por duas especificidades: (a) estimulam a solidariedade entre seus membros mediante a prtica da autogesto e (b) praticam a solidariedade para com a populao trabalhadora em geral, com nfase na ajuda aos mais desfavorecidos (SINGER, 2003, p. 116).

    De acordo com Lisboa (2004, p. 15), a economia solidria um conjunto de pessoas, onde as atividades econmicas esto fundadas na ajuda recproca de seus associados, onde todos contribuem para o bem-estar de cada um, tendo como

    caractersticas a mnima presena de relaes de assalariamento, e que dependem da contnua realizao do seu prprio fundo de trabalho para sua reproduo. Complementando, em destaque s pessoas que se uniram em busca de uma vida melhor frente s dificuldades econmicas e sociais decorrentes da excluso proporcionada pelo capitalismo, conceitua-se a economia solidria nos seguintes termos:

    [...] conjunto de atividades econmicas e prticas sociais desenvolvidas pelos setores populares no sentido de garantir, com a utilizao de sua prpria fora de trabalho e dos recursos disponveis, a satisfao de necessidades bsicas, tanto materiais como imateriais (ICAZA; TIRIBA, 2003, p. 101)

    Diante dos conceitos transcritos possvel identificar as principais caractersticas da economia solidria. Primeiramente, a gesto diferencia-se das outras organizaes econmicas porque deve ser associativa democrtica, ou seja, cada associado equivale a um voto, indiferentemente de quota-parte, atribuindo a cada um empoderamento isonmico. Muito embora as caractersticas acima elencadas sejam importantes, imprescindvel que os associados da economia solidria sejam capazes de cessar com a viso individualista e busquem o bem-estar coletivo, por meio da cooperao. Rompendo com essa lgica egosta, destaca-se a solidariedade como um elemento imprescindvel para sua concretizao, o que a diferencia das demais organizaes. Outro elemento de relevante importncia assegurar sua independncia, sem a necessidade de autorizao estatal para a criao de associaes vinculadas economia solidria (LAVILLE e GAIGER, 2009; SINGER, 2003). Acrescenta Lisboa (2004) que admitido nas associaes de economia solidria o uso de assalariamento, mas que esse no poder

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 58

  • preponderar, devendo ser utilizado o mnimo possvel. Por fim, importa mencionar que no h um conceito de economia solidria acabado, mas, ao contrrio, est em construo, visto que essa expresso recente e foi utilizado pela primeira vez na dcada de 1990:

    O termo foi cunhado na dcada de 1990, quando, por iniciativa de cidados, produtores e consumidores, despontaram inmeras atividades econmicas organizadas segundo princpios de cooperao, autonomia e gesto democrtica. (LAVILLE; GAIGER, 2009, p. 162)

    Destarte, atravs dos princpios acima mencionados, da cooperao, da solidariedade e do bem-estar coletivo, e que orientam a implementao desse modo de produo, resta claro que o caminho para a economia solidria a unio de pessoas por meio da cooperativa autogestionria, ou seja, por meio de administrao democrtica, onde as principais decises so deliberadas em assembleias, e cada scio representa um voto, no levando em conta quota de cada um, exigindo de cada cooperado que se informe dos problemas da sociedade e das possveis solues. De acordo com Moth, a autogesto pode ser definida da seguinte forma:

    A autogesto um projeto de organizao democrtica que privilegia a democracia direta. Esta constitui um sistema em que voluntariamente, sem perceber remunerao e sem recorrerem a intermedirios, os cidados debatem todas as questes importantes, em assembleias. (MOTH, 2009, p. 26)

    Nesses moldes, a economia solidria defende que o cooperativismo o meio para colocar em prtica seus princpios, isto , para implementar esse modo de produo, o caminho a unio de pessoas por meio da cooperativa autogestionria:

    A economia solidria evoca a longa histria associativa dos trabalhadores, iniciada no comeo do sculo XIX. Desde ento, essa vertente tem cumprido um papel de alargamento da experincia humana, ao manter vigentes outros princpios de produo de bens, de organizao do trabalho e de circulao da riqueza, distintos da racionalidade estrita do capital. (LAVILLE; GAIGER, 2009, p. 163)

    A propsito, Singer (2002, p. 10) apresenta outros dois princpios da economia solidria ao conceitu-la como "outro modo de produo, cujos princpios so a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito liberdade individual", de modo que os trabalhadores so tambm os proprietrios, assim como todos os proprietrios so trabalhadores de uma determinada cooperativa.

    Dessa forma, se faz necessrio para a compreenso do tema salientar que as cooperativas, independentemente se empresariais ou de economia solidria, segundo a previso legal, so consideradas sociedade de pessoas, destinadas a atividades econmicas, existindo propriedade conjunta e gesto democrtica, segundo o estabelecido no artigo 4 da Lei 5.764 de 16 de dezembro de 1971:

    Art. 4 As cooperativas so sociedades de pessoas, com forma e natureza jurdica prprias, de natureza civil, no sujeitas a falncia, constitudas para prestar servios aos associados, distinguindo-se das demais sociedades pelas seguintes caractersticas:I - adeso voluntria, com nmero ilimitado de associados, salvo impossibilidade tcnica de prestao de servios;II - variabilidade do capital social representado por quotas-partes;[...]V - singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federaes e confederaes de cooperativas, com exceo das que exeram atividade de crdito, optar pelo critrio da proporcionalidade;

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 59

  • Complementando o disposto na legislao e sintetizando suas caractersticas, atravs da noo de cooperativa consagrada pela Aliana Cooperativa Internacional e trazida pelo autor Rui Namorado em sua obra que verifica-se o verdadeiro objetivo desta sociedade de pessoas:

    Uma cooperativa uma associao autnoma de pessoas unidas voluntariamente para prosseguirem as suas necessidades e aspiraes comuns, quer econmicas, quer culturais, atravs de uma empresa comum democraticamente controlada. (NAMORADO, 2009, p. 96)

    Por sua vez, o cooperativismo vinculado economia solidria, autogestionrio, o qual coloca o homem como finalidade da atividade econmica, se distingue do cooperativismo chamado tradicional. Essa vertente, tambm denominada de cooperativismo empresarial, busca manter a estrutura vigente no sistema empresarial capitalista, utilizando predominantemente a fora de trabalho assalariada e tambm a heterogesto. Imprime como uma das metas fundamentais o crescimento das sobras. Esta classificao das cooperativas fica mais evidente na explanao de Diva Benevides Pinho:

    As primeiras, tambm denominadas tradicionais, esto voltadas para a competio do mercado e funcionam como empresas empenhadas na profissionalizao da gesto, administrao racional, aumento do capital, crescimento econmico e em moderna tecnologia para obter ganhos de escala e de eficincia, principalmente via fuso e incorporao.[...]A Economia Solidria destaca a pessoa humana como o sujeito e o fim da atividade econmica, procurando recuperar a dimenso tica e humana das atividades econmicas e opondo-se a um modelo econmico nico para todas as culturas e todas as sociedades. Tenta, ento, desenvolver princpios mnimos

    adaptveis a cada realidade. (PINHO, 2004, p. 133 e 174)

    O cooperativismo de economia solidria traz consigo tambm alguns princpios que devem ser respeitados, sendo indispensvel destacar aqui os seguintes: a) a livre associao, no havendo qualquer discriminao de raa, gnero, classe social, posio poltica ou religiosa para a adeso empresa, respeitado, todavia, critrios que possam ser estabelecidos pelo estatuto da cooperativa; b) controle, organizao e gesto democrtica, que resulta principalmente no fato de cada associado possuir um nico voto e de igual valor ou peso dos demais, independente de posio ou quotas-partes; c) participao econmica dos associados, de forma equitativa, com fim de alcanar equilbrio entre o acmulo para formar capital e os benefcios aos associados. Tais princpios esto expressos nos art. 4 da Lei das Cooperativas (Lei 5.764/1971), e seus respectivos incisos, tambm listados por Daniel Rech (2000). Cabe destacar, tambm, o compromisso que h por parte da cooperativa com toda a comunidade, sendo o objetivo maior da cooperativa no o lucro, mas sim o bem-estar social, estando as reais necessidades do homem acima das necessidades materiais.

    nesse sentido que o cooperativismo de economia solidria e seus valores caminham de acordo com a Constituio Federal de 1988 objetivando a superao das diferenas sociais e um desenvolvimento sustentvel, como se pode observar atravs dos incisos abaixo, e do j citado artigo 225, tambm da Carta Magna:

    Art. 1 A Repblica Federativa do Brasil, formada pela unio indissolvel dos Estados e Municpios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrtico de Direito e tem como fundamentos:[...]III - a dignidade da pessoa humana;

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 60

  • Art. 3 Constituem objetivos fundamentais da Repblica Federativa do Brasil:I - construir uma sociedade livre, justa e solidria;II - garantir o desenvolvimento nacional;III - erradicar a pobreza e a marginalizao e reduzir as desigualdades sociais e regionais;IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raa, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminao.

    relevante observar atravs dos dispositivos supracitados a importncia dada pela Lei Magna s cooperativas, no apenas por meio da relao existente entre os valores da Economia Solidria e dos objetivos, fundamentos e princpios desta nao, mas tambm por ser a primeira Constituio brasileira que mencionou esta sociedade em diversos dispositivos, dentre os quais nos resta indispensvel citar os seguintes:

    Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes:[...]XVIII - a criao de associaes e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorizao, sendo vedada a interferncia estatal em seu funcionamento;

    Art. 174.[...] 2 - A lei apoiar e estimular o cooperativismo e outras formas de associativismo.

    Complementando, a doutrina demonstra o quo importante o cooperativismo passa a ser para Estado brasileiro aps a promulgao da Constituio Federal de 1988, afirmando Capettini que no se trata de mera meno, mas sim de contedo principiolgico:

    Certamente no se trata de singela meno constitucional ao cooperativismo. O texto constitucional menciona e d contedo a tal meno: o contedo principiolgico. Portanto, pode-se retirar da dico constitucional que o Estado deve apoiar e incentivar o cooperativismo de forma a trata-lo como importante instrumento para cumprimento da valorao do trabalho. (CAPETTINI, 2011, p. 97-98)

    Diante de tamanha relevncia demonstrada, a Economia Solidria ganha cada vez maior visibilidade no cenrio nacional, sendo que, em levantamento realizado em 2007 e publicado em 2009, os empreendimentos econmicos solidrios j contavam com mais de um milho e seiscentos e cinquenta mil associados, com um faturamento mensal que ultrapassava o valor de R$ 650.000.000,00 (seiscentos e cinquenta milhes de reais) (ANTEAG, 2009), e o nmero desses empreendimentos mais do que dobrou entre o perodo de 2005 a 2012 (SENAES, 2013, p. 1). Isso em decorrncia do destaque dado pessoa humana como o sujeito e o fim da atividade econmica, procurando recuperar a dimenso tica e humana das atividades econmicas e opondo-se a um modelo econmico nico para todas as culturas e todas as sociedades.

    3. DA CORRELAO ENTRE SUSTENTABILIDADE E ECONOMIA SOLIDRIA

    Destaca-se inicialmente que para se alcanar um desenvolvimento sustentvel no se deve considerar apenas o meio ambiente equilibrado, mas tambm leva-se em considerao a erradicao da pobreza, de modo que o desenvolvimento econmico gere distribuio equitativa de renda. o que ensina Jos Afonso da Silva ao analisar o art. 225 da Constituio Federal, que consagra o princpio do desenvolvimento sustentvel, reiterando, primeiramente, o prprio artigo, ao tratar do meio ambiente ecologicamente

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 61

  • equilibrado, mas tambm traz como requisito da sustentabilidade a satisfao das necessidades essenciais da populao :

    Isso nos pe diante da necessidade de fazer algumas consideraes sobre a sustentabilidade. E podemos comear mostrando que esse um conceito que tem fundamentos constitucionais, pois quando o art. 225 da CF impe ao Poder Pblico e coletividade o dever de defender e preservar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado "para as presentes e futuras geraes" est precisamente dando o contedo essencial da sustentabilidade.E essa uma clusula que imanta todos os pargrafos e incisos daquele artigo. Requer, como seu requisito indispensvel, um crescimento econmico que envolva equitativo redistribuio dos resultados do processo produtivo e a erradicao da pobreza (CF, art. 3), de forma a reduzir as disparidades nos padres de vida e melhor atendimento da maioria da populao. Se o desenvolvimento no elimina a pobreza absoluta, no propicia um nvel de vida que satisfaa as necessidades essenciais da populao em geral, ele no pode ser qualificado de sustentvel. (SILVA, 2013, p. 27-28)

    Ainda, no apenas na legislao vigente no Brasil, j explanada nesse trabalho, mas tambm em mbito internacional, torna-se evidente a importncia da erradicao da pobreza e distribuio igualitria e inclusiva de renda. Exemplo relevante e recente o documento onde constam as Diretrizes da Economia Verde e da Erradicao da Pobreza, elaborado na Conferncia das Naes Unidas sobre Desenvolvimento Sustentvel realizado em 2012 (RIO +20), em seu pargrafo 58:

    Afirmamos que as polticas de economia verde no contexto do desenvolvimento sustentvel e da erradicao da pobreza devem:[...]d) promover o crescimento econmico sustentado e inclusivo, fomentar a inovao, oportunidades, benefcios e

    capacitao para todos e respeitar os direitos humanos;[...]o) promover padres de consumo e produo sustentveis;p) perseverar nos esforos para um desenvolvimento equitativo e inclusivo, atravs de meios que superem a pobreza e a desigualdade. (MACHADO, 2014, p. 79-80)

    Ora, mais que evidente que internacionalmente tem destaque o cooperativismo na perspectiva de um mecanismo na luta pela sustentabilidade. O autor Haynner Batista Capettini traz a Resoluo n 49 da Assembleia Geral das Naes Unidas, onde se enfatiza:

    Alerta aos governos para que, ao formular estratgias nacionais para o desenvolvimento, estudem a fundo a possibilidade que oferecem as cooperativas de contribuir para a soluo dos problemas sociais e ambientais. Alerta tambm aos governos para que considerem a possibilidade de revisar as limitaes jurdicas e administrativas que se impem s atividades das cooperativas, com vistas a eliminar as que no sejam aplicveis a outras atividades ou empresas. (CAPETTINI, 2011, p. 93)

    Ademais, quanto ao consumo e produo sustentvel, alnea "o" das Diretrizes da Economia Verde e da Erradicao da Pobreza, acima citado, Rodrigues mostra a grande preocupao existente entre os estudiosos do direito ambiental acerca desta temtica:

    justamente por causa da aplicao deste princpio atividade desenvolvimentista, produtora de consumo e eliminao de resduos em massa, que a doutrina ambiental tem procurado fixar a atividade econmica e a sociedade de consumo em trs pontos fundamentais: a) evitando-se a produo de bens suprfluos e agressivos ao meio ambiente; b) convencendo o consumidor da necessidade de evitar o consumo de bens "inimigos" do meio ambiente; c) estimulando o uso de "tecnologias limpas" no exerccio da

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 62

  • atividade econmica. (RODRIGUES, 2005, p. 172)

    Em completa sintonia, no sentido de obter bem-estar coletivo, o cooperativismo de economia solidria busca o denominado consumo solidrio, englobado nesse conceito tambm o consumo para o bem-viver, que busca ser satisfatrio sem agredir ao meio ambiente:

    Por fim, o consumo solidrio aquele praticado em funo no apenas do prprio bem-viver pessoal, mas tambm do bem-viver coletivo, em favor dos trabalhadores que produziram aquele bem ou servio e da manuteno do equilbrio dos ecossistemas. (MANCE, 2003, p. 45)

    Isso tudo leva concluso de que o desenvolvimento sustentvel exige muito mais do que um sistema econmico que apenas coexista com o meio ambiente sem prejudic-lo, mas, diante de um estudo mais aprofundado, observa-se que exige tambm soluo aos problemas econmico-sociais da populao. Afinal, como o desenvolvimento pode ser considerado sustentvel se for para apenas uma minoria, desconsiderando a desigualdade social? A sustentabilidade requer ateno ao art. 3 da Constituio Federal e seus incisos, j citados nesse trabalho. Para Ignacy Sachs, existem oito critrios de sustentabilidade, e no apenas o ambiental, mas tambm o social, cultura, ecolgica, territorial, econmico, poltica (nacional), e poltica (internacional), destacando-se, para os fins desse estudo:

    1.Social:- alcance de um patamar razovel de homogeneidade social;- distribuio de renda justa;-emprego pleno e/ou autnomo com qualidade de vida decente;- igualdade no acesso aos recursos e servios sociais.[...]6.Econmico:- desenvolvimento econmico intersetorial equilibrado;

    -segurana alimentar; (SACHS, 2009, p. 85-86)

    Observa-se que, nos elementos indispensveis para que se obtenha sustentabilidade de maneira eficaz, h estreita semelhana e objetivo comum do desenvolvimento sustentvel e do cooperativismo de economia solidria, sendo que ambos lutam pela natureza ou pela vida de modo amplo e genrico, pelo bem-estar ou qualidade de vida do homem, e por fim, pela solidariedade, nesse contexto, intergeracional, sem a qual no ser possvel ao direito garantir um futuro digno s prximas geraes:

    Esto reunidos os elementos indispensveis para um conceito operacional de sustentabilidade eficaz, a saber: (1) a natureza de princpio constitucional diretamente aplicvel, (2) a eficcia (encontro de resultados justos, no mera aptido para produzir efeitos jurdicos), (3)a eficincia (o uso de meios idneos), (4) o ambiente limpo (descontaminado e saudvel), (5) a probidade (incluso explcita da dimenso tica), (6) a preveno (dever de evitar danos certos), (7) a precauo (dever de evitar danos altamente provveis), (8) a solidariedade intergeracional, com o reconhecimento dos direitos das geraes presentes e futuras, (9) a responsabilidade do Estado e da sociedade e (10) o bem-estar (acima das necessidades materiais). Nenhum desses elementos pode faltar ao conceito, sob pena de reducionismo indesejvel. (FREITAS, 2012, p. 41, grifos nossos)

    E, do mesmo modo que h a preocupao por parte do desenvolvimento sustentvel com os critrios sociais e ambientais, o Frum Brasileiro de Economia Solidria, que consiste na articulao entre os empreendimentos solidrios, entidades de assessoria e fomento, e gestores pblicos, elencou a busca de uma relao de intercmbio respeitoso com a natureza como um dos princpios gerais da economia solidria (FRUM BRASILEIRO DE ECONOMIA

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 63

  • SOLIDRIA, 2003), demonstrando sua preocupao intergeracional com as questes ambientais:

    A Economia Solidria constitui o fundamento de uma globalizao humanizadora, de um desenvolvimento sustentvel, socialmente justo e voltado para a satisfao racional das necessidades de cada um e de todos os cidados da Terra seguindo um caminho intergeracional de desenvolvimento sustentvel na qualidade de sua vida. (FRUM BRASILEIRO DE ECONOMIA SOLIDRIA, 2013)

    O autor Juarez Freitas (2012, p. 66) utiliza-se da argumentao de que, como o abandono da pobreza liberta para alar voos maiores, nada mais sustentvel do que investir naquilo que promove emancipao econmica. A partir disso, verifica-se que a correlao entre sustentabilidade e economia solidria no se limita a mera semelhana de princpios e valores, vai muito alm. Assim, o desenvolvimento, para que atinja o patamar de sustentvel, no existe sem interferncia na economia.

    Segundo esse autor, a sustentabilidade gera uma nova economia. Nesse entendimento, existe uma interdependncia entre a economia solidria e o desenvolvimento sustentvel, no sentido de que s um pensamento sustentvel pode levar quebra de paradigmas econmico-sociais, no sentido de priorizar o ser humano e a vida em detrimento das questes materiais, respeitando, por consequncia, os recursos naturais fundamentais manuteno da vida na Terra, e somente por meio de uma nova economia ser possvel garantir a sustentabilidade s futuras geraes:

    Por todos os ngulos, a sustentabilidade gera uma nova economia, com a reformulao de categorias e comportamentos, o surgimento de excepcionais oportunidades, a ultrapassagem do culto excessivo dos bens posicionais, o planejamento de

    longo prazo, o sistema competente de incentivos e a eficincia norteada pela eficcia. [...] Portanto, ignorar a relao umbilical entre economia e sustentabilidade significa deixar de ver o princpio numa de suas dimenses vitais. (FREITAS, 2012, p. 66-67)

    Igualmente, o cooperativismo de economia solidria no ignora o desenvolvimento necessrio economia, entretanto, no visando principalmente os lucros. Singer (2004) sintetiza no conceito de desenvolvimento solidrio esse processo de fomento ao crescimento econmico e, ao mesmo tempo, de um processo sustentvel, que preserve a natureza e vise o fim da desigualdade social:

    Entendemos por desenvolvimento solidrio um processo de fomento de novas foras produtivas e de instaurao de novas relaes de produo, de modo a promover um processo sustentvel de crescimento econmico, que preserve a natureza e redistribua os frutos do crescimento a favor dos que se encontram marginalizados da produo social e da fruio dos resultados da mesma.[...] Em suma, o desenvolvimento solidrio busca novas foras produtivas que respeitem a natureza e favoream valores como igualdade e auto-realizao, sem ignorar nem rejeitar de antemo os avanos cientficos e tecnolgicos, mas submetendo-os ao crivo permanente dos valores ambientais, da incluso social e da autogesto. (SINGER, 2004, p.7)

    Destarte, torna-se absolutamente insustentvel o modo como o desenvolvimento vem se dando no atual sistema de produo, devido valorizao do capital sobre o homem e a vida de modo geral, resultando na reteno de 40% (quarenta por cento) da renda nas mos de apenas 1% (um por cento) da populao, enquanto mais de um bilho e duzentos milhes de pessoas no mundo vivem abaixo da linha da pobreza (PNUD, 2013, p. 1). H interferncia tambm nos

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 64

  • recursos naturais e na biodiversidade, fundamentais para a existncia humana, onde no Brasil a taxa de desmatamento da Amaznia cresceu 28% (vinte e oito por cento) de 2012 a 2013 (INCRA, 2014), mesmo que em 2005 estudos j alertavam para o fato de que, no havendo reduo nesses nmeros, em 2050 restaro apenas 40% de florestas da bacia Amaznica (SOARES-FILHO et al, 2005).

    Ainda, por fora da incidncia dos artigos 170, 192, 205, 218, 219 e do 1 do artigo 174, todos da Constituio Federal de 1988, constata-se que a sustentabilidade um valor supremo consagrado na prpria Carta Magna de 1988, conforme ensinamentos de Juarez Freitas, pois, ao se analisar o desenvolvimento contido no seu prembulo, em acordo com os demais princpios constitucionais, que desenvolvimento seria seno o sustentvel? "No pode ser aquele da viso antropocntrica soberba e degradante da natureza [...]. o desenvolvimento sustentvel [...] que surge como um dos valores supremos." (FREITAS, 2012, p. 109 e 110). Dentre os artigos mencionados para compreenso do desenvolvimento sustentvel como valor de estatura constitucional, destacam-se, alm do prembulo, os que seguem abaixo:

    PREMBULONs, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrtico, destinado a assegurar o exerccio dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurana, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justia como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a soluo pacfica das controvrsias, promulgamos, sob a proteo de Deus, a seguinte CONSTITUIO DA REPBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.

    Art. 170. A ordem econmica, fundada na valorizao do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existncia digna, conforme os ditames da justia social, observados os seguintes princpios:[...]VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e servios e de seus processos de elaborao e prestao;VII - reduo das desigualdades regionais e sociais;

    Art. 174. [...] 1 - A lei estabelecer as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporar e compatibilizar os planos nacionais e regionais de desenvolvimento.

    Art. 219. O mercado interno integra o patrimnio nacional e ser incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e scio-econmico, o bem-estar da populao e a autonomia tecnolgica do Pas, nos termos de lei federal.(grifos nossos)

    Abre-se um parntese para uma explicao indispensvel. Como se sabe, o Prembulo da Constituio possui apenas carter enunciativo, por consequncia, no possui fora obrigatria. Todavia, detm papel relevante no mbito de interpretao e aplicao do direito constitucional. Como ensinam Gilmar Mendes e Branco (2012, p. 87), a inconstitucionalidade est no "desconcerto com princpio mencionado pelo Prembulo e positivado no corpo da Constituio", o que, evidentemente, o caso do desenvolvimento sustentvel.

    Por ser valor supremo, refora a ideia de que o desenvolvimento sustentvel no pode se ater apenas s questes ambientais. Alm disso, tem o dever de defender e preservar s futuras geraes todos os demais objetivos fundamentais consagrados na Constituio Federal de 1988:

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 65

  • Por sua abrangncia, a sustentabilidade remete realizao, em bloco, dos objetivos fundamentais da Repblica. Nessa medida, o valor da sustentabilidade recomenda, como critrio de avaliao das polticas pblicas e privadas, a reduo das desigualdades sociais e regionais, a proteo da dignidade humana e dos seres vivos em geral, assim como a interveno reguladora contra regressivismos desequilibradores do sistema ecolgico, por mais arraigados que estejam nos crebros oligrquicos dominantes. (FREITAS, 2012, p. 110)

    Nesses termos, indispensvel lembrar o compromisso que h, por parte da cooperativa, com a comunidade em que est inserida. A recente Lei das Cooperativas de Trabalho (Lei n 12.690 de 19 de julho de 2012) traz a educao, formao e informao, interesse pela comunidade, e preservao dos direitos sociais, do valor social do trabalho e da livre iniciativa como princpios que devem reger o cooperativismo, assim como a Lei das Cooperativas (Lei n 5.764 de 16 de dezembro de 1971) em seu artigo 4, inciso VIII, menciona a necessidade da cooperativa possuir fundo de Assistncia Tcnica Educacional e Social. A propsito, o art. 205 da Constituio Federal traz que a educao dever do Estado e da famlia, entretanto, promovida com a colaborao da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho. Assim, dever de toda cooperativa de economia solidria atuar conforme as referidas normas:

    Nas cooperativas, as sobras tm sua destinao decidida pela assembleia dos scios. Uma parte delas colocada num fundo de educao (dos prprios scios ou de pessoas que podem vir a formar cooperativas) [...].[...] a empresa solidria no est a servio de seus scios atuais apenas, mas de toda a sociedade, no presente e no futuro. Por isso importante que ela

    persista no tempo e no deixe de ser solidria.[...]O objetivo mximo dos scios da empresa solidria promover a economia solidria tanto para dar trabalho e renda a quem precisa como para difundir no pas (ou no mundo) um modo democrtico e igualitrio de organizar atividades econmicas. (SINGER, 2002, p. 14-16, grifos nossos)

    Por certo que, para a transformao em um desenvolvimento almejado, necessrio participao democrtica, sempre que possvel direta, efetiva dos cidados por meio de tomada coletiva de deciso bem informada e consciente, para que as polticas pblicas sejam as escolhidas "no processo de tomada coletiva de deciso, sob o signo juris tantum da cooperao sensata, cientfica e razovel" (FREITAS, 2012, p. 189, grifos nossos). Melhor maneira de se atingir esta finalidade atravs da autogesto, j explanada anteriormente, que conscientiza os scios, visto que cada um possui um voto, tendo de se preocupar com os problemas de sua empresa, agregando aos trabalhadores prticas no autoritrias que gerar cada vez mais democracia poltica. A respeito dos benefcios oriundos da autogesto, e de sua relao com o sufrgio universal, Paul Singer pontual:

    Pelo visto, a autogesto exige um esforo adiciona dos trabalhadores na empresa solidria: alm de cumprir as tarefas a seu cargo, cada um deles tem de se preocupar com os problemas gerais da empresa. [...] O fato de todos ficarem a par do que est em jogo contribui para a cooperao inteligente dos scios, sem necessidade de que sejam incentivados por competies para saber quem o melhor de todos.[...]O sufrgio universal, que vige em muitos pases, possibilitou a prtica da democracia poltica, que de certo modo inverte a relao de poder (ao menos formal) entre governo ou autoridade

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 66

  • pblica e cidados. (SINGER, 2002, p. 21-22)

    A propsito, apesar da relevncia

    dada pela Constituio da Repblica a esse novo cooperativismo, adotando-o "como uma das ferramentas de garantia e da ordem democrtica" (CAPETTINI, 2011, p.98), bem como de se mostrar o meio adequado para se alcanar o desenvolvimento sustentvel e alternativa na busca pela igualdade e uma vida melhor em um sentido amplo, h algumas barreiras, inclusive no mbito do direito, que dificultam sua formao e crescimento.

    Primeiramente, h enorme burocracia para constituio e manuteno da sociedade cooperativa, algo que est distante da realidade dos que buscam form-la. Veja-se, dentre outras, h obrigatoriedade das cooperativas constiturem-se por deliberaes da Assembleia Geral dos Fundadores, com seus regimentos internos definidos em estatuto, com obrigao de registrar seus atos constitutivos na Junta Comercial para obter personalidade jurdica, bem como a sociedade tem por obrigao manter os livros de Matrcula, de Atas de Assembleias Gerais, de Atas dos rgos de Administrao, de Atas do Conselho Fiscal, de Presena dos Associados nas Assembleias Gerais, alm de outros livros que so exigidos pela legislao comercial e fiscal.

    Acrescente-se a isto o fato de limitar aqueles que, estando em um nmero pequeno de associados, pretendem constituir uma cooperativa de economia solidria e no o podem fazer, pois no possuem nmero mnimo pessoas exigidas pela legislao em vigor. Quanto a isso, mesmo que a Lei n 5.764/1971 imponha a necessidade de vinte associados, admite-se o nmero mnimo de treze pessoas fsicas, exigido pelo Cdigo Civil (vale ressaltar, posterior, pois promulgado em 2002), com fundamento no estmulo dado pela Carta

    Magna, em seu artigo 174, pargrafo 2, ao cooperativismo. No que se refere cooperativa de trabalho, que segundo artigo 2 da Lei 12.690/2012 a sociedade constituda por trabalhadores para o exerccio de suas atividades laborativas ou profissionais com proveito comum, a exigncia cai para o nmero de sete scios. Apesar disso, esse um nmero que, por vezes, no condiz com a realidade do cooperativismo de economia solidria, tornando-se um empecilho e um fator desmotivador j na sua concepo.

    Tudo isso demonstra que, mesmo no momento em que urge atitudes estatais que priorizem o desenvolvimento sustentvel e social em detrimento de um sistema onde todas as decises se baseiem exclusivamente em lucro e acumulo de renda, o ordenamento e polticas pblicas brasileiras ainda tm muito a evoluir para que se possa cumprir os objetivos da Repblica de constituir uma sociedade livre, justa, solidria, sem pobreza ou desigualdade social.

    CONCLUSO

    As mudanas de grandes impactos em curto espao de tempo nos mais diversos campos uma das marcas da atual sociedade. Essas transformaes, se de um lado trouxeram muitas comodidades s pessoas, por outro acarretaram problemas de diversas ordens, inclusive colocando em risco a prpria vida do ser humano. Diante de tais dilemas, a partir da dcada de setenta do sculo passado, determinados segmentos sociais passaram a ter a preocupao de conciliar desenvolvimento econmico e sustentabilidade ambiental.

    Nesse contexto, foram suscitados muitos questionamentos ao modo de organizao da economia dominante. Um deles a heterogesto, onde a grande maioria sujeita-se a decises as quais no obteve qualquer participao no poder

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 67

  • decisrio. A justificativa para a gesto hierrquica assenta-se na meritocracia de que os mais capazes detm o poder de elaborar o modo de produo de forma mais competente.

    Nesse sentido, a economia solidria inova ao defender a autogesto. Com essa caracterstica supre a necessidade de uma nova forma de organizao da produo econmica que se caracterize pela busca da igualdade, fundada nos valores da cooperao, solidariedade e gesto democrtica, valorizando o homem e a vida acima do capital, em sintonia com a Constituio Federal, que consagra no seu artigo 225 o princpio do desenvolvimento sustentvel, garantindo a esta e s futuras geraes o direito ao meio ambiente equilibrado, assim como estabelece no artigo 174, pargrafo 2, o dever do Estado de apoiar o cooperativismo e demais formas de associativismo, e elenca, no artigo 3, os objetivos da Repblica, constando, alm do desenvolvimento nacional, a construo de uma sociedade livre, justa e solidria, visando promoo do bem coletivo e a erradicao da pobreza e da desigualdade social.

    Considerando esses objetivos da nao acima listados, o desenvolvimento a qual a Carta Magna faz referncia no artigo 3, inciso II, no pode ser outro seno o sustentvel e social, que garanta atual e s futuras geraes os recursos que hoje se possui, no levando em conta o crescimento econmico como nico critrio de avaliao. Assim tambm a economia solidria, na busca pela concretizao de seus princpios do bem-estar comum e valorizao da pessoa sobre o capital, tem a necessidade de produo de bens ou servios de modo sustentvel, observando sempre os recursos naturais, que, alm de essenciais manuteno da vida, no so infindveis. Sendo assim, solidariedade no apenas com relao s cooperativas, mas para com a sociedade de modo geral, e, por consequncia, com as

    futuras geraes, de modo que tambm no prejudique as condies atuais e vindouras do meio ambiente.

    A economia solidria em nada contraria os caminhos para o desenvolvimento sustentvel, pelo contrrio, tomando como marco terico Freitas (2012) e Singer (2002) observa-se uma correlao entre os valores e princpios do cooperativismo de economia solidria e os elementos indispensveis para a sustentabilidade, dentre os quais, destacam-se: a) ambos carregam contedo principiolgico com fundamento constitucional; b) buscam um ambiente limpo, valorizando a vida em seu sentido amplo, ciente da importncia de cada ser vivo e da escassez dos recursos naturais; c) visam o bem-estar e a satisfao das necessidades do homem acima das necessidades materiais, derivando disso padres de consumo sustentveis; d) solidariedade intergeracional, reconhecendo que somente assim ser possvel assegurar o direito ao bem-estar a esta e s futuras geraes.

    So esses objetivos e valores em comum acima citados, com base nos preceitos constitucionais supramencionados, e os dados apresentados nesse trabalho - que mostra 40% da riqueza do mundo nas mos de apenas 1% da populao, tendo como consequncia mais um stimo da populao vivendo em situao de pobreza extrema, associado ao aumento em cerca de 28% do desmatamento da Amaznia do perodo de 2012 a 2013 -, que levam resposta do objeto desse estudo, se o cooperativismo de economia solidria um meio eficaz para se alcanar o desenvolvimento sustentvel. Por conseguinte, conclui-se que o cooperativismo de economia solidria um meio vivel e eficaz para se alcanar o desenvolvimento sustentvel, e tambm que ambos esto interligados, sendo indissociveis na promulgao dos objetivos elencados no artigo 3 da

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 68

  • Constituio Federal, anteriormente mencionados, tendo o Estado papel de estrema relevncia na formulao de polticas pblicas e de normas nas quais o desenvolvimento sustentvel e social no figure em segundo plano, conforme determina o citado artigo 174, pargrafo 2, da Lei Suprema.

    Referncias

    ANTEAG Associao nacional dos Trabalhadores e Empresas de Autogesto e Participao Acionria. Atlas da Economia Solidria no Brasil 2005- 2007. Editora Todos os Bichos: So Paulo, 2009.

    BARBOSA, Evandro Brando, e FRAXE, Therezinha de Jesus Pinto. Coisas: Produo, Distribuio, Consumo e Sustentabilidade. Contribuciones a La Economa. mar. 2013. Disponvel em: . Acesso em: 10 abr. 2014.

    BEZERRA, Adriana, e outros. Ousar a solidariedade: partilha de prticas de economia social e solidria no Brasil e no Quebec.2008.

    BOGARDUS, Emory. Problemas de Cooperao. Editora Lidador: Rio de Janeiro, 1964.

    BRASIL. Decreto n 1.637, de 5 de janeiro de 1907. Crea syndicatos profissionaes e sociedades cooperativas. Disponvel em: < http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-1909/decreto-1637-5-janeiro-1907-582195-publicacaooriginal-104950-pl.html>. Acesso em: 08 out. 2014.

    BRASIL. Decreto n 22.239, de 19 de dezembro de 1932. Reforma as disposies do decreto legislativo n. 1.637. de 5 de janeiro de 1907, na parte referente s sociedades cooperativas. Disponvel em: . Acesso em: 08 out. 2014.

    BRASIL. Lei n 5.764, de 16 de dezembro de 1971. Define a Poltica Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurdico das sociedades cooperativas, e d outras providncias. Disponvel em: . Acesso em: 08 out. 2014.

    BRASIL. Lei n 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulao e aplicao, e d outras providncias. Disponvel em: . Acesso em: 08 out. 2014.

    BRASIL. Constituio da Repblica Federativa Do Brasil de 1988. Braslia, 5 de outubro de 1988. Disponvel em:

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 69

  • . Acesso em: 08 out. 2014.

    BRASIL. Lei n 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Cdigo Civil. Disponvel em: . Acesso em: 08 out. 2014.

    BRASIL. Lei n 12.690, de 19 de julho de 2012. Dispe sobre a organizao e o funcionamento das Cooperativas de Trabalho; institui o Programa Nacional de Fomento s Cooperativas de Trabalho - PRONACOOP; e revoga o pargrafo nico do art. 442 da Consolidao das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1 de maio de 1943. Disponvel em: . Acesso em: 08 out. 2014.

    CAPETTINI, Haynner Batista. O cooperativismo na ordem constitucional. In: BRAGA FILHO, Edson de Oliveira (Coord.) Sustentabilidade e cooperativismo: uma filosofia para o amanh: Anais do I Congresso Internacional do Instituto Brasileiro de Pesquisas e Estudos Ambientais e Cooperativos. Belo Horizonte: Frum, 2011. p. 91-101.

    CENCI, Ana Righi; BEDIN, Gabriel de Lima; FISCHER, Ricardo Santi. Do Liberalismo ao Intervencionismo: o Estado como protagonista da (des)regulao econmica. In: Constituio, Economia e Desenvolvimento: Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucional. n. 4, Curitiba, 2011. p. 77-97.

    DECLARAO sobre o Direito ao Desenvolvimento - 1986. Universidade de So Paulo Usp: Biblioteca Virtual de Direitos Humanos. Disponvel em: . Acesso em 12 jun. 2014.

    FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. rev., amp. e atual. em face da Rio+20 e do novo Cdigo Florestal) So Paulo: Saraiva, 2013. p. 70-81.

    FRUM BRASILEIRO DE ECONOMIA SOLIDRIA. Carta de princpios da Economia Solidria. III Plenria Nacional da Economia Solidria. [S.l.: s.n.], 2003.

    FRANKE, Walmor. Direito das sociedades cooperativas: direito cooperativo. Saraiva: So Paulo, 1973.

    FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Frum, 2012.

    HOLYOAKE, George Jacob. Os 28 teceles de Rochdale. WS Editor: Porto Alegre, 2000.

    ICAZA, Ana Mercedes Sarria; TIRIBA, Lia Vargas. Economia Popular. In: CATTANI, Antonio David (Org). A outra economia. Porto Alegre, Veraz Editores: Porto Alegre, 2003.

    INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Taxas anuais do desmatamento - 1988 at 2013. Disponvel em: < http://www.obt.inpe.br/prodes/prodes_1988_2013.htm> Acesso em 30 set. 2014.

    KALUF, Marco Aurlio Bellato. Estmulo econmico ambiental via cooperativismo. In: BRAGA FILHO, Edson de Oliveira (Coord.) Sustentabilidade e cooperativismo: uma

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 70

  • filosofia para o amanh: Anais do I Congresso Internacional do Instituto Brasileiro de Pesquisas e Estudos Ambientais e Cooperativos. Belo Horizonte: Frum, 2011. p. 131-141.

    LAVILLE, Jean-Louis; GAIGER, Luiz Incio. Economia Solidria. In: CATTANI, Antonio David; LAVILLE, Jean-Louis; GAIGER, Luiz Incio; HESPANHA, Pedro (Orgs.) Dicionrio Internacional da Outra Economia. Almedina: Coimbra, 2009.

    LISBOA, Armando de Melo. Socioeconomia solidria: marco conceitual latino-americano. In: IX Encontro Nacional de Economia Poltica. Uberndia, MG.: Sociedade Brasileira de Economia Poltica, 2004. Disponvel em: Acesso em 29 set. 2014.

    LUZ FILHO, Fbio. O Direito Cooperativo. Irmos Pongetti Editores: Rio de Janeiro, 1962.

    MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 22. ed. rev., amp. e atual. So Paulo: Malheiros, 2014. p. 61-87.

    MANCE, Euclides Andr. Consumo Solidrio. In: CATTANI, Antonio David (org). A outra economia. Porto Alegre, Veraz Editores: Porto Alegre, 2003.

    MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 7. ed. rev. e atual. So Paulo: Saraiva, 2012. p. 86-89.

    MOTH, Daniel. Autogesto. In: CATTANI, Antonio David; LAVILLE, Jean-Louis; GAIGER, Luiz Incio; HESPANHA, Pedro (Orgs.) Dicionrio Internacional da Outra Economia. Almedina: Coimbra, 2009.

    NAMORADO, Rui. Os Princpios Cooperativos. Editora Fora do Texto: Coimbra, 1995.

    NAMORADO, Rui. Cooperativismo. In: CATTANI, Antonio David; LAVILLE, Jean-Louis; GAIGER, Luiz Incio; HESPANHA, Pedro (Orgs.) .Dicionrio Internacional da Outra Economia. Almedina: Coimbra, 2009

    NAMORADO, Rui. Cooperativismo - um horizonte possvel. In: GEDIEL, Jos Antnio Peres (Org.). Estudos do direito cooperativo e cidadania. Programa de Ps-Graduao em Direito da UFPR: Curitiba, 2005.

    PERIUS, Verglio Frederico. Cooperativismo e Lei. So Leopoldo: Editora Unisinos, 2001.

    PINHO, Diva Benevides. O Cooperativismo no Brasil: da vertente pioneira vertente solidria. Saraiva: So Paulo, 2004.

    PNUD - Programa de las Naciones Unidas para el Desarrollo. Humanidad Dividida: Cmo hacer frente a la desigualdad en los pases en desarrollo. Nova York, 2013. Disponvel em: Acesso em 30 set. 2014.

    POLONIO, Wilson Alves. Manual das Sociedades Cooperativas. 4. ed. Editora Atlas: So Paulo, 2004.

    RECH, Daniel. Cooperativas: uma alternativa de organizao popular. DP&A Editora: Rio

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 71

  • de Janeiro, 2000.

    RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito Ambiental: Parte Geral. 2. ed. rev., atual. e amp. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 170-173.

    SACHS, Ignacy; Stroh, Paula Yone. Caminhos para o desenvolvimento sustentvel. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.

    SENAES Secretaria Nacional de Economia Solidria. Sistema Nacional de Informaes de Economia Solidria SIES disponibiliza nova base de dados (2013). Disponvel em: < http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A416FABB6014173C4E66C7839/Acontece%20SENAES%202013%20-%20n34%20ed%20espercial.pdf> Acesso em 29 set. 2014.

    SILVA, Jos Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 10. ed. atual. So Paulo: Malheiros, 2013. p. 19 -29.

    SINGER, Paul. Introduo Economia Solidria. 1. ed. Editora Fundao Perseu Abramo: So Paulo, 2002.

    SINGER, Paul. Economia solidria. In: CATTANI, Antonio David. (Org.). A outra economia. Veraz Editores: Porto Alegre, 2003.

    SINGER, Paul. Desenvolvimento capitalista e desenvolvimento solidrio. In: Revista Estudos Avanados. So Paulo: IEA/USP, n 51, 2004. p. 7 - 21.

    SINGER, Paul. A recente ressurreio da economia solidria no Brasil. In: SANTOS, Boaventura Souza (Org.). Produzir para viver: Os caminhos da produo no capitalista. Reinventar a emancipao social: para novos manifestos; 2. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2005. p. 81-129.

    SOARES-FILHO, Britaldo Silveira; NEPSTAD, Daniel Curtis; CURRAN, Lisa; CERQUEIRA, Gustavo Coutinho; GARCIA, Ricardo Alexandrino; RAMOS, Claudia Azevedo et al. Cenrios de desmatamento para a Amaznia. Estud. av., So Paulo, v. 19, n. 54, 2005. Disponvel em: . Acesso em 01 out. 2014.

    VEIGA, Jose Eli da. Desenvolvimento sustentvel: o desafio do sculo XXI. 3 ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2008.

    Recebido em 04/05/2015Aprovado em 22/05/2015

    Revista Orbis Latina, vol.5, n1, janeiro-dezembro de 2015. ISSN: 2237-6976 Pgina 72

    2. DO COOPERATIVISMO DE ECONOMIA SOLIDRIA