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ICEB - Instituto de Cultura Espírita do Brasil / Rio de Janeiro Ano III - n o 25 - Abril / 2011 - R$ 4,00 A CONSTRUÇÃO DA REALIDADE Jorge Pedreira de Cerqueira ATUALIDADE DA DOUTRINA ESPÍRITA Cesar Perri SAÚDE MENTAL ALGUMAS REFLEXÕES Teresa Crisitina Cabral EDIÇÃO COMEMORATIVA DE TERCEIRO ANIVERSÁRIO

EDIÇÃO COMEMORATIVA DE TERCEIRO ANIVERSÁRIOportaliceb.org.br/pdf/RCE_abr2011.pdf · maneira de ser. Finalmente Teresa Cristina Cabral, com sua formação de psicóloga espírita,

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ICEB - Instituto de Cultura Espírita do Brasil / Rio de Janeiro Ano III - no 25 - Abril / 2011 - R$ 4,00

A CONSTRUÇÃODA REALIDADE

Jorge Pedreira de Cerqueira

ATUALIDADE DADOUTRINA ESPÍRITACesar Perri

SAÚDE MENTALALGUMAS REFLEXÕES

Teresa Crisitina Cabral

EDIÇÃO COMEMORATIVA DE TERCEIRO ANIVERSÁRIO

EditorialEditorial

r e v i s t a

Cultura Espírita – 3 abril 2011 /

Deus é uma não-novidade que, apresentada pela óptica espírita, transforma-se em pro-

funda novidade. Não é uma pessoa física, não senta num trono, não tem humores, ora alegre e satisfeito, ora aborrecido e vingativo. O Deus espírita é presença integral em cada ponto, em cada não-ponto, do uni-verso. É lei – sábia, justa, perfeita. É misericórdia – usa o tempo para curar nossas imperfeições. Sua criação é perfeita. Suas criaturas são imperfeitas, mas atraí-das por Ele, inevitavel-mente, para a perfeição. É o Pai, tão íntimo e tão difícil de compreen-der. O Absoluto, o Amor Integral. Relativos, nossa inteligência não O com-preende, nosso senti-mento não O alcança. Mas caminhamos para Ele, pois nós mesmos “somos deuses”. Criador da luz, do ritmo que dita o pulsar do coração, o canto das cigarras. Deus-canção-universal. Para quem quiser ouvir. E quem puder ouvir, será como criança alegre, revoluteando os braços, afi -nal feliz, afi nal feliz!

Deus é a questão inicial-fundamental da Doutrina Espírita, tratada de maneira invulgar pela nossa coor-denadora Nadja do Couto Valle.

Nos tempos que correm, de tanto progresso, de tantos avanços, de tantas conquistas, no limiar da Era da Regeneração, nossa Doutrina permanece atual? Deve ser modernizada? Há aspectos que mereçam nova abordagem? Nosso querido amigo Cesar Perri, que exerce importante atividade no movimento espírita nacional e internacional, tem muito a nos dizer, pois que vive como poucos, em muitos lugares do mundo, as novas realidades que surgem, às vezes como verda-deiros desafi os à vivência espírita.

De fato, os tempos novos, as novas gerações que chegam, indicam que a realidade é um processo, uma construção, um desafi o. É preciso transitar de padrões defi nidos e aceitos para novas maneiras de ser, dita-

das pelos cenários que se modifi cam com grande rapi-dez. Quebrar paradigmas é preciso. Aprendizes do Espiritismo, compreendemos a necessidade de mudar. No entanto, temos padrões éticos, de moralidade, dos quais não poderemos nos afastar. Não se trata de con-servadorismo, nem de continuísmo. É preciso avaliar sempre. Quando não sabemos para onde queremos ir, qualquer caminho serve, dizem os especialistas em comportamento. Jorge Cerqueira estuda o tema, a

partir da sua formação técnica, porém marcada pela visão humanística, característica de sua maneira de ser.

Finalmente Teresa Cristina Cabral, com sua formação de psicóloga espírita, oferece-nos interessante abordagem sobre a saúde mental,

sempre um desafi o para nós mesmos que temos que aprender o usar o nosso livre-arbítrio na direção das leis de Deus, que Jesus sintetizou de maneira magní-fi ca no “amar a Deus sobre todas as coisas e ao pró-ximo como a nós mesmos”. Todas as vezes que nos desviamos desse roteiro, a saúde fraqueja.

Boa leitura e um mês muito especial quando come-moramos os 154 anos de O Livro dos Espíritos e o 3o aniversário da nossa Revista.

“O Deus espírita é presença integral em cada ponto, em cada

não-ponto, do universo.É lei – sábia, justa, perfeita.”

Rogério Mota

No 25 – ANO IIIABRIL 2011

EditorialCesar Reis ................................................................................................................................................................................. 03

Pelos Caminhos da EducaçãoNadja do Couto Valle ................................................................................................................................................................. 05

EntrevistaCesar Perri ................................................................................................................................................................................ 06

Lar Fabiano de CristoConhecendo as Unidades de Promoção Integral – Casa de Hercílio, em Machado / MG ........................................................ 08

Memória do ICEBAcervo do ICEB ......................................................................................................................................................................... 09

Crônicas de FamíliaAna Guimarães .......................................................................................................................................................................... 10

A Construção da RealidadeJorge Cerqueira ..........................................................................................................................................................................11

A Visão Espírita de DeusNadja do Couto Valle ................................................................................................................................................................ 12

Spiritisma Vidmaniero pri DioESPERANTO – Versão: Saulo Wanderley ............................................................................................................................... 14

Encontro com JesusYasmin Madeira ......................................................................................................................................................................... 15

Espiritismo e Ciência – “Saúde Mental: Algumas Refl exões”Teresa Cristina Cabral ............................................................................................................................................................... 16

Juventude Espírita / Certas Palavras Marcos Leite / Cesar Reis ......................................................................................................................................................... 17

AconteceuYvon Luz .................................................................................................................................................................................... 18

Diretor Cesar Reis

Coordenação GeralNadja do Couto Valle

RevisãoTeresa Costa

Jornalista ResponsávelYvon de Araújo LuzReg. 7939/29/84v

Diagramação e capaRogério Mota

ColaboradorasGlória Magalhães Joalina Alcântara

RedaçãoRua dos Inválidos, 182Centro - Rio de Janeiro/RJBrasilE-mail: [email protected]: www.portaliceb.org.br

ÍNDICE

DistribuiçãoClube de Artewww.clubedearte.org.br

Tiragem: 20 000 exemplares

Reprodução:Gráfi ca e Editora Stamppa Ltda.

sintonizewww.radioriodejaneiro.am.br

RÁDIO RIO DE JANEIRO — 1400 Khz - A emissora da fraternidade

Segunda — 12:00hTerça — 12:00hQuarta — 12:00hQuinta — 12:00h

- Despertar Espírita - Yasmin Madeira- Crônicas de Família - Ana Guimarães- Encontro com Jesus - Yasmin Madeira- Cultura Espírita - Assaruhy Franco e Cesar Reis

Em 1º de abril, as pessoas mentem! 6ª feira 13, nem pen-

sar! Passar embaixo de escada, que-brar espelho, gato preto (que na Idade Média seriam bruxas transformadas), entornar sal na mesa/no chão, coceira na palma da mão etc. etc. são supers-tições que, pela sua natureza, estabele-cem relação de causa e efeito estranha à lógica formal. Dizem respeito a certas ações, voluntárias ou não, como rezas, curas, feitiços, ritos mágicos, maldi-ções e outros rituais e recursos como astrologia, magia, tarot, adivinhação, cartomancia etc., aos quais as pessoas recorrem com o intuito de se protegerem dos perigos da vida, revelando uma pre-disposição para o chamado pensamento mágico, e até para a preguiça mental. Historicamente, algumas áreas, como química e astronomia, saíram do terreno mágico, como alquimia e astrologia, tidas como de pseudociências.

A superstição, que se opõe à razão/racionalidade e muitas vezes ao senso comum, estabelece uma relação causal entre acontecimentos e forças supranormais que infl uenciam o cha-mado destino, o poder invisível dos astros etc., contrariamente à razão, que analisa a relação entre eventos, suas causas imediatas e as leis naturais que as regem e/ou através de correlações para explicar os fenômenos. Com ela, o Espiritismo retirou tudo isso desse mundo mágico e trouxe para o terreno da plena racionalidade.

Mas por que as pessoas têm esse tipo de crenças supersticiosas? Basicamente por predisposição à fanta-sia, por uma possível preguiça mental e duas importantes emoções: o medo e a ansiedade. Para satisfazer tais necessi-

dades emocionais, as pessoas pagam o preço da falta de objetividade, embora saibamos que objetividade absoluta não existe. Tais crenças se viabilizam através das formas de comunicação humana: linguagem verbal, com pala-vras encantatórias, e linguagem não--verbal, com símbolos, gestos etc.; e identifi cam-se com arquétipos, dinami-zando-os, recorrendo a artifícios para a excitação do inconsciente, como man-dalas, mantras, atos simbólicos etc.

Do ponto de vista da Educação, não se pode desconsiderar o papel e o estímulo da mídia, reforçando a predisposição para o mágico e para o fantástico, sobretudo no psiquismo infantil, fase em que são naturais tais predisposições. Esse estímulo – quando se superpõe aos que são pedagogi-camente desenhados para garantir a evolução natural no desenvolvimento da criança – infunde medo, ansiedade e até mesmo uma espécie de preguiça mental e de descuido no campo da lógica, com efeitos negativos até a adultez.

Muitos ritos, crenças, rituais e liturgias objetivam baixar o estado de alerta, de vigilância do indivíduo, ou nisso redundam, sobretudo em um estágio evolutivo em que o psiquismo exige relações no campo da concretude. A psicogenética de Jean Piaget nos alerta sobre o egocentrismo, estágio de infantilidade psíquica no qual a criança constrói explicações em função de suas experiências, considera que objetos existem em função dela, imita o compor-tamento dos adultos, o que nos remete à responsabilidade dos pais e adultos em torno delas, no sentido de inocula-rem crendices no psiquismo de seus fi lhos. Isso as tornará crianças e adultos

heterônomos, dependentes e inseguros como, por exemplo, não sair de casa sem ler o horóscopo, e poderão manter, vida afora, as características de cunho infantil da imaginação e da fantasia (que podem ser usadas profi ssionalmente, sob o controle da razão, nas artes e outros campos de atuação). Essa infl u-ência adulta patrocina o pensamento não-lógico, que não trabalha a reversibi-lidade, a modifi cação das coisas, e não incentiva o levantamento de hipóteses próprio do pensamento indutivo, que a escola deve privilegiar como estratégia metodológica.

Allan Kardec esclarece: “O Espi ri-tismo e o magnetismo nos dão a chave de uma imensidade de fenômenos sobre os quais a ignorância teceu um sem-número de fábulas, em que os fatos se apresentam exagerados pela imaginação. O conhecimento lúcido des-sas duas ciências que, a bem dizer, for-mam uma única, mostrando a realidade das coisas e suas verdadeiras causas, constitui o melhor preservativo contra as ideias supersticiosas, porque revela o que é possível e o que é impossível, o que está nas leis da Natureza e o que não passa de ridícula crendice.”1

“A evolução (...) impõe a instituição de novos costumes, a fi m de que nos desvencilhemos das fórmulas inferiores, em marcha para ciclos mais altos de existência.”2

Referências:1KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução Guillon Ribeiro. 71. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1991. Q. 555, Nota de Allan Kardec. Ver também q. 551 a 557.2XAVIER, Francisco Cândido. Pensamento e vida. Pelo Espírito Emmanuel. 6. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1982. p. 97.

r e v i s t a

Cultura Espírita – 5 abril 2011 /

ICEB - Aulas e Palestras Sábado - 13h30min às 17h15min.

Nadja do Couto Valle

r e v i s t a

Cultura Espírita – 6 / abril 2011

Despertar Espírita na WEB - Sábado, 19h, na tvcei.com

EntrevistaATUALIDADE DA DOUTRINA ESPÍRITA

Cesar Perri é diretor da Federação Espírita Brasileira (FEB), Secretário Geral doConselho Federativo Nacional e membro da Comissão Executiva do Conselho Espírita Internacional (CEI)

RCE – Dizem que o que acon-tece nos EUA ressoa no mundo inteiro. Como está o Movimento Espírita americano?

CP – Creio que não podemos generalizar a premissa para as várias áreas do conhecimento, inclusive em termos de Movimento Espírita inter-nacional. Pode-se afi rmar que a divul-gação feita em inglês pode alcançar mais ampla circulação no mundo atual. Mas, independentemente desta colocação, o Movimento Espírita tem se expandido nos EUA. O Conselho Espírita dos Estados Unidos tem pro-movido várias ações para colaborar com o apoio e estímulo a muitos gru-pos que surgem e se organizam. O Conselho Espírita Internacional, que edita nos EUA a “Revista Espírita” (The Spiritist Magazine), tem editado vários livros traduzidos para o inglês e acaba de montar uma EDICEI-USA, em Miami. Inclusive, em 2010, ano do Centenário de Chico Xavier, a EDICEI lançou, em inglês, as obras “Chico Xavier. Medium of the century” (Chico Xavier. Médium do século), de auto-ria do jornalista britânico Guy Lyon Playfair e “Among brothers of other lands” (Entre irmãos de outras terras), de Chico Xavier e Waldo Vieira.

RCE – Fala-se muito em pes-quisa universitária sobre reencar-nação e mediunidade. Há notícias

sobre a participação de espíritas em tais pesquisas?

CP – O pioneiro na pesquisa sobre tais fatos, em nosso país, foi Hernani Guimarães Andrade (1913-2003), fundador do Instituto Brasileiro de Pesquisas Psicobiofísicas em São Paulo. Há pesquisas sendo rea-lizadas por membros da Associação Médico-Espírita do Brasil. Em várias universidades brasileiras têm sido aprovadas dissertações de mes-trado e teses de doutorado com temas ligados ao Espiritismo e ao Movimento Espírita. Pessoalmente, como sou oriundo do meio acadê-mico e da pesquisa, considero muito importante as pesquisas feitas por não-espíritas, por pesquisadores neutros, para fi ns de validação dos princípios. A propósito, durante o 6º

Congresso Espírita Mundial, pro-movido pelo CEI e realizado em 2010, na Espanha, a pesquisadora americana Carol Bowman discor-reu sobre seus estudos: “Pesquisas sobre reencarnação em crianças” e a EDICEI lançou, naquela oportu-nidade, o livro de autoria dela, tra-duzido para o espanhol: “Las vidas pasadas de los niños”.

RCE – E na França, berço de Kardec, como vai o Movimento Espírita?

CP – Temos acompanhado o surgimento de uma nova etapa para o Movimento Espírita francês. Durante recente Reunião do CEI, realizada em Valencia, recebemos informações sobre a expansão, prin-cipalmente pelo interior do país, de novos grupos e de várias ações rea-lizadas pelo recente Conselho Espírita Francês. Este edita o boletim eletrônico “Voie spirite” (www.conseil-spirite.fr). Na Fran ça, está sediada a Enciclopédia eletrônica (Encyclopédie spirite): www.spiritisme.net

RCE – Faça um breve relato sobre os esforços do CEI quanto à divulgação, especialmente na produ-ção de livros em outros idiomas.

CP – O CEI teve a triste cons-tatação de que as obras de Kardec não estavam disponíveis em vários

r e v i s t a

Cultura Espírita – 7 abril 2011 /

Clube de Arte no Ar – Segunda-feira, 12h, na Rádio Rio de Janeiro 1400 AM

países, e que a obra psicográfi ca de Chico Xavier era praticamente desconhecida em muitas nações. Desde 2005, o CEI vem traba-lhando celeremente para traduzir e editar prioritariamente as obras de Kardec e de Chico Xavier, princi-palmente em inglês, francês, espa-nhol, alemão e russo. Durante o 6º Congresso Espírita Mundial foram lançadas várias obras da EDICEI (www.edicei.com) em vários idiomas, principalmente em espanhol. Na semana seguinte, em eventos rea-lizados em Constanza e em Milão, foram lançadas obras da EDICEI, respectivamente, em alemão e ita-liano. Atualmente a EDICEI já dis-põe de quase 150 livros em diversos idiomas.

RCE – Comente a importância do Congresso da Espanha.

CP – Consideramos muito importante para o Movimento Espí-rita internacional o 6º Con gres so Espírita Mundial, realizado em Valencia e promovido pelo CEI, contando com 1807 participantes, oriundos de 35 países, sendo que o maior número de inscritos era da Espanha (773). A TV CEI (www.tvcei.com.br) transmitiu ao vivo todo o evento, tendo registrado 13.044 acessos de 603 cidades, de 52 países, principalmente do Brasil, Espanha, Portugal, Estados Unidos, Colômbia, Alemanha, Argentina e Guatemala. A Federação Espírita Espanhola foi entrevistada pelos periódicos: El País, El Mundo, Pronto, Periódico Información, Levante, e Revista Más Allá. Durante o Congresso realizou-se a 1ª Feira do Livro Espírita da Espanha.

“O Conselho Espírita

dos Estados Unidos tem

promovido várias ações

para colaborar com o

apoio e estímulo a muitos

grupos que surgem e se

organizam.”

“Temos acompanhado o

surgimento de uma nova

etapa para o Movimento

Espírita francês.”

“Desde 2005, o CEI vem

trabalhando celeremente

para traduzir e editar

prioritariamente as obras

de Kardec e de Chico

Xavier, principalmente em

inglês, francês, espanhol,

alemão e russo.”

r e v i s t a

Cultura Espírita – 8 / abril 2011

Crônicas de Família, com Ana Guimarães – Terça-feira, 12h, na Rádio Rio de Janeiro 1400 AM

Lar Fabiano de CristoConhecendo as Unidades de Promoção Integral (01)

CASA DE HERCÍLIO, em Machado/MG

Hercílio da Silva Dias é o nome do patrono desta Unidade de Promoção Integral, fundada em

19/05/1975, escolhido por seu empenho em auxiliar todos os desafortunados com que se deparava.

Ele era natural da cidade de Machado – MG, tendo nascido em 20/03/1906. Filho de Pedro Pereira Dias e de Balbina Josefi na da Silva Dias, teve quatro irmãos: três homens (Eurico, Astrogildo, Plínio) e uma irmã (Hilda). O Sr. Pedro foi agricultor e possuía uma “gleba agrícola” no distrito de Caiana, em Machado.

Hercílio fez seus primeiros estudos em Machado, mas completou o antigo 2º grau em Juiz de Fora, no Colégio Grambery. De novo em Machado, foi bancário. Ali conheceu Virgínia Carolina Nannetti com quem se casou em 27/12/29.

Estava em Poço Fundo, como Gerente do Banco Machadense (atual Unibanco), quando seu pai faleceu. Depois da partilha da gleba deixada por este, Hercílio se viu dono das terras chamadas Cachoeira, para onde mudou sua residência, após deixar o Banco.

Decorridos alguns anos de luta no campo, vendeu sua propriedade e comprou outra do mesmo tipo, entre Alfenas e Gaspar Lopes (MG), na qual viveu cinco anos. Necessitou vendê-la, então, devido aos prejuízos acumu-lados. Foi residir em Alfenas, para que os fi lhos pudes-sem estudar. Ali, até 1950, trabalhou para um espanhol, comerciante de gado. Depois, voltou a Machado, para uma chácara que comprara.

Malsucedido de novo, Hercílio vendeu-a e foi morar na área urbana, passando a trabalhar em diversas fazendas.

A essa altura, começou a apresentar-se bastante adoentado. Seu fi lho mais velho (Wagner Nanneti, ex--presidente da CAPEMI, falecido em 2004) transportou-o para o Rio de Janeiro, em busca de recursos médicos inexistentes em Machado. O diagnóstico que lhe fi zeram foi de câncer no pulmão. Tendo melhorado um pouco, foi submetido à radioterapia, que lhe permitiu viver ainda durante três meses. Sofria muito. Pediu então par regressar

a Machado, onde passou o Natal, tendo mesmo visitado algumas pessoas queridas durante a ligeira melhora obtida em janeiro/fevereiro de 71. Desencarnou em 18/03 daquele ano.

Sua esposa lhe dera três fi lhos: Mari Aparecida, Wagner e Wander. Curiosamente, ele que fora sempre muito generoso e cheio de consideração para com os necessitados, e tanto se empenhou em atender a estes, acabou por nada deixar para a família.

Hoje, a Casa de Hercílio é uma referência na cidade de Machado, no atendimento aos mais necessitados, atendendo a 65 famílias e 33 idosos, num total de 323 pessoas, da primeira infância à terceira idade.

Atividades lúdicas e pedagógicas são oferecidas às crianças e adolescentes, além de ofi cinas de informática, música e violão. Na iniciação profi ssional destaca-se a produção de artigos da mais alta qualidade em ponto de cruz, vagonite, crochê, costura e lanofi x.

r e v i s t a

Cultura Espírita – 9 abril 2011 /

Acervo do ICEB

Encontro com Jesus, com Yasmin Madeira – Quarta-feira, 12h, na Rádio Rio de Janeiro 1400 AM

A substituição de valores huma-nos é uma necessidade social

e psicológica. O desgaste físico e mental, que é inevitável depois de certo tempo, exige necessariamente a recomposição dos quadros atuantes, a fi m de que não haja interrupção ou solução de continui-dade no ritmo de trabalho e rendimento. Tudo isto, como se sabe, está na ordem natural da vida e, portanto, a redistribui-ção ou mesmo a substituição de “obrei-ros na vinha do Senhor” não deve causar inquietação ou desalento em ninguém. É a “rendição da guarda”, quando é che-gado o momento.

Convém, no entanto, observar bem o fenômeno que está ocorrendo, pois o que se nota, em toda parte, em todas as coletividades – empresariais, recreati-vas, políticas, e assim por diante – sem excluir as próprias comunidades religio-sas, é uma febre incontida de mudança, querendo alterar tudo, às vezes radical-mente, alijando capacidades prestantes ou deixando à margem pessoas, que, embora tenham passado da casa dos 50 ou 60 anos, pouco importa, ainda são efi cientes, ainda têm energia, lucidez e equilíbrio para fazer muita coisa. E fazem mesmo. Neste particular, a situação é uma decorrência, até certo ponto, do impetuoso surto tecnológico do momento, criando uma espécie de hipertrofi a dos valores novos. (...)

Muita gente não sabe, entretanto, que a velhice, em última análise, é um “estado de espírito”, como disse um pen-sador. Há pessoas que estão chegando, se já não chegaram aos oitenta, mas continuam jovens de espírito, não se deixam esmagar psicologicamente pelo “peso dos anos”, não se sentem anuladas diante de quem quer que seja, ao passo que outras, bem mais moças, envelhe-cem antes do tempo, porque não têm vigor espiritual, já perderam o encanto da vida. O conceito de velhice, então, con-vém repetir, é realmente mais um “estado

de espírito” do que uma contingência depressiva. Depende muito das reações individuais.

Seja como for, a verdade nua e crua é que, atualmente, na vida prática, as pessoas de “mais idade” (nem che-gam a ser velhas ...) ainda que estejam em boas condições de saúde, já não têm muitas possibilidades nesta “civilização tecnológica”. O mercado de trabalho em qualquer parte, hoje em dia, é mais para gente nova. (...)

O movimento espírita, que é um movimento humano como tantos outros, embora voltado para o lado espiritual, também está sujeito a renovações. Seria contraproducente, contudo, fazer distinções ostensivas, e com preocupa-ções anulatórias, entre “ala velha” e “ala moça”, abrindo faixas de antagonismo ou competição em nossas fi leiras. Se há uma doutrina que não nos autoriza a levar ao pé-da-letra a noção de velho ou de moço, é exatamente o Espiritismo, por ser uma doutrina reencarnacionista. Não estão aí muitos adultos que pensam e procedem como “meninos terríveis”, enquanto mui-tos jovens nos dão exemplo de amadure-cimento espiritual tanto nas ideias quanto nas atitudes? É ou não é verdade? Existe uma idade biológica, como existe uma idade mental, não há dúvida, mas as vivências do Espírito encarnado ultrapas-sam nossas estimativas de tempo, ape-sar de sabermos que, durante certa fase da existência, o Espírito sofre as infl uên-cias e contenções naturais da organiza-ção somática, com toda a carga de hor-mônios e outros fatores de atritos. É uma experiência de adaptação. A idade real do Espírito, porém, tanto faz em corpo de jovem, como de ancião, é problema que escapa aos cálculos usuais (O Livro dos Espíritos – Q.78).

A velhice do corpo nem sempre é indicio de envelhecimento espiritual. Quantos confrades que já estão na “idade provecta” e continuam trabalhando (...)

como se fossem moços. Não podemos, portanto, trazer para a seara espírita as restrições que se fazem lá fora às pes-soas mais idosas. Não! O próprio movi-mento espírita, no fi m de tudo, seria o mais prejudicado. Exemplos não nos fal-tam. (...)

O ideal não é dividir gerações, é unir, valorizar cada vez mais as apti-dões, a experiência e as energias de duas gerações de idealistas, pois há muita gente de valor moral e intelectual, quer de um lado, quer do outro. Pelo fato de aparecerem, ali ou acolá, uns tantos jovens desarvorados, não se deve ali-mentar prevenção contra todos. Nossa juventude é uma juventude responsável e, por isso mesmo, não se confunde com as exceções comprometedoras. Ela é mal interpretada na maioria dos casos. Mas o valor da juventude não invalida o papel em que se situam fi guras veneran-das do movimento espírita, fi guras que, já estando avançadas em idade, enfren-taram crises e aguentaram cargas pesa-das, mas não caíram nem deixaram que as instituições caíssem. São confrades que, a todos os títulos, fazem jus ao res-peito e à estima da coletividade espírita. E ainda se mantêm fi rmes, não “saíram de circulação”, oferecendo belo exem-plo de perseverança. A reencarnação, felizmente, apaga as discriminações de idade entre nós, embora reconheçamos uma realidade biológica, com suas pos-sibilidades e suas limitações. Há lugar para todos, pois a seara espírita é muito grande ...

Deolindo Amorim – 29/02/1972

r e v i s t a

Cultura Espírita – 10 / abril 2011

Ana Guimarães

Cultura Espírita, com Assaruhy Franco e Cesar Reis – Quinta-feira, 12h, na Rádio Rio de Janeiro 1400 AM

Crônicas de Família

Em meio ao tumulto do aeroporto de Congonhas, em São Paulo, eu a vi. Estava

sentada numa cadeira de rodas, elegante no seu vestido azul e casaco de lã cinza. O cachecol escondia-lhe o colo e deixava em destaque o rosto ainda juvenil, apesar dos cabelos completamente nevados.

De imediato, o pensamento voou e foi pousar nos idos da minha infância descuidada e feliz.

E a revi fotografada nas páginas da minha recordação: não teria mais de 1,55m de altura, em cima dos sapatos de salto alto. Achava-a linda! Vivaz como um pássaro, circulava por toda a extensão do colégio do qual era diretora. Nada escapava aos seus olhos atentos. Reconhecia cada aluno chamando-o pelo nome (entre quatrocentas e quinhentas crianças). Era gentil e serena. E apesar de perder-se em meio aos educandos, pelo seu tamanho, era profundamente respeitada e amada.

Tentei aproximar-me, mas a perdi de vista em meio ao tumulto. Então, dirigi-me ao voo anunciado naquela hora. Ao entrar no avião, agradável surpresa. Lá estava ela sentada na primeira fi la de

cadeiras... Não resisti, abaixei-me e segurei-lhe as mãos pequeninas e enrugadas, que tantas vezes acariciaram meus cabelos e secaram minhas lágrimas de criança travessa.

− A senhora não vai se lembrar de mim. Fui aluna do Colégio Visconde de Cairu, onde a senhora era diretora.

Um par de olhos serenos como os de uma criança me fi xaram e um sorriso bom iluminou-lhe o rosto, enquanto falava suavemente:

− Nunca me esqueço dos meus alunos... − declinou o meu nome.

E a idosa mestra que mediava os cem anos de idade, deixou-me perplexa diante daquela memória.

Reverenciar os berços e amparar as crianças é necessário, porém curvarmo-nos diante de uma cabeça nevada é imperativo e não podemos desconsiderar.

Ali, diante dos meus olhos, estava alguém cuja vida foi um Evangelho de feitos junto à infância e à juventude, renunciando ao matrimônio para melhor servir e amar os fi lhos dos outros.

Mesmo ignorando as razões, os porquês que conduziram a vida dos nossos idosos, tenhamos por eles solicitude e gratidão, entendamos terem sido os semeadores da primeira hora e os que plantaram as árvores que hoje nos dão frutos e sombra.

“Oh! Que saudade que eu tenho!

Da aurora da minha vida.

Da minha infância querida

Que os anos não trazem mais.”

(Gonçalves Dias)

r e v i s t a

Cultura Espírita – 11 abril 2011 /

Jorge Pedreira de Cerqueira

Gosto de pensar no Espírito do homem como uma cons-

trução inacabada que evolui sempre e que, cada vez mais, torna-se por-tadora de beleza, harmonizando-se com a Criação. A evolução de sua percepção da realidade e a aquisição de valores éticos aprimorados, mais condizentes com a necessidade de convivencialidade e de alteridade, faz com que seu comportamento se modifi que e que ele se torne não só mais fraterno, mas, sobretudo, incor-pore esses valores em sua matriz instintiva, tornando-se um homem melhor, naturalmente sem que tenha consciência disso. Torna-se mais belo interiormente, sem aperceber-se desse fato.

A construção do Espírito é, pois, um processo de aprendizagem contí-nua, de construção gradativa de sua própria realidade, de conhecimento de si mesmo, de aprimoramento con-tínuo de sua conduta. Evoluindo da conduta instintiva, passando pelas atitudes racionais até atingir a intui-ção, o homem caminha por um pro-cesso de ser e estar, num eterno vir a ser. Este processo de contínua aprendizagem assegura a susten-tação de sua evolução e se desen-volve pelas experiências sucessi-vas que Deus lhe proporciona, pela misericórdia da reencarnação.

Nos estágios inferiores, o homem tem baixa percepção de si mesmo e precisa ser adaptado ao padrão da lei natural, que lhe traz o constrangimento da dor diante dos desvios apresentados. Nos estágios superiores, o homem age por pura consciência, não necessitando ser constrangido e adaptado às dores

provenientes da justiça de Deus. O homem foi criado para a felicidade e não para a dor. Quanto mais ele-vada sua consciência, maior sua responsabilidade perante o Criador. De acordo com o Irmão X, no livro Estante da vida, psicografado por Francisco Cândido Xavier e publi-cado pela FEB, para aqueles que ainda não compreendem, isto é, têm percepção limitada de sua realidade, a justiça de Deus vem pelo alvará da

misericórdia. Todavia para aqueles que já têm consciência de sua reali-dade e destinação, a misericórdia de Deus se faz sentir pela aplicação da justiça.

A grande difi culdade e, por que não dizer, o grande desafi o do homem para se tornar melhor a cada dia, é conviver na coletividade, enquanto encarnado, com os mais diferentes tipos de Espíritos, em diferentes graus de evolução. Essa é sua grande prova. Desenvolver valores morais nos diferentes cená-

rios em que vive: na família, no trabalho, na comunidade, na socie-dade, nas organizações humanas, nas organizações religiosas, enfi m, na relação com o mundo. É na convivência com o mundo material que o Espírito se ilumina, evolui, expande sua percepção e constrói sua realidade.

A Lei de Deus é imutável. É Lei de amor, é Lei de justiça. Não exis-tem exceções ou privilégios diante dela, apesar de haver misericórdia infi nita na aplicação da justiça. Todos os seus fi lhos devem evoluir diante da aplicação dessa Lei. A misericór-dia na aplicação da justiça permite que a dor-reparação adapte e edu-que o homem, proporcionando-lhe aprendizado contínuo até que possa atingir o estado de angelitude, de consciência pura, de total conheci-mento de sua realidade.

A missão do homem na Terra é, pois, evoluir continuamente em espiritualidade, construindo gradati-vamente sua realidade, aprendendo a amar a Deus sobre todas as coi-sas e ao próximo como a si mesmo, assegurando paz, equilíbrio e har-monia em todos os cenários em que ele gravita. Nesta missão estão implícitos dois grandes fatores que devem ser perseguidos e controla-dos pela ação do homem em seu caminho evolutivo: a necessidade de ter humildade e de agir com cari-dade. A humildade e a caridade são, pois, as virtudes que asseguram ao homem a paz interior, o equilíbrio e a harmonia com o Universo.

Jorge Pedreira Cerqueira é administrador de empresas e expositor espírita.

A CONSTRUÇÃO DA REALIDADE

“A construçãodo Espírito é, pois, um

processo de aprendizagem contínua, de construção gradativa de sua própria

realidade, de conhecimento de si mesmo, de

aprimoramento contínuo de sua conduta.”

r e v i s t a

Cultura Espírita – 12 / abril 2011

A inda como Professor Rivail, Allan Kardec já dispunha de

preciosas anotações nas áreas da fi lo-sofi a, das ciências e da religião, sobre a constituição geral do Universo, a vida além-túmulo e as leis morais, estando já praticamente pronto O Livro dos Espíritos. Em uma nevada noite de inverno de 1856, o amado Codifi cador se interrogava se devia começar pelas indagações fi losófi cas ou pelas conclu-sões científi cas, vivendo o que Pascal (1625-1661) comentara sobre a última coisa que se decide ao fazer um tra-balho: saber o que se deve colocar em primeiro lugar. Porque o conheci-mento humano modifi ca-se ao longo do tempo, e ele não desejava escravizar o Espiritismo à exaltação do cérebro desatrelado do sentimento. Relata-nos o Espírito Irmão X que, em prece comovente, o Codifi cador foi envolvido por raios de amor e, em sua intimidade profunda, ouviu “vigoroso apelo íntimo: — Não menosprezes a fé!... Não come-ces a obra redentora sem a Bênção Divina!...”1 Foi assim que, “nimbado de luz”, consagrou o primeiro capítulo de O Livro dos Espíritos à existência de Deus.

E a primeira pergunta espelha a natureza da Doutrina Espírita, decla-rada formalmente pelo Codifi cador como Filosofi a Espiritualista no frontispício de O Livro dos Espíritos, que remonta à fi gura exponencial de Sócrates, missionário que preparou o caminho para a Mensagem de Jesus e do Espiritismo2. E a natureza da pergunta remonta aos diálogos que o fi lósofo grego desenvolvia, anotados por Platão, e que sempre buscavam a essência das coisas: “Que é Deus?”3 A visão espírita de Deus, pois, acompa-nha e anuncia a natureza racionalista da Doutrina, e a defi nição dada pelos Espíritos Orientadores da Humanidade a Kardec reafi rma a identifi cação do pen-samento socrático com essa revigora-ção das linhas teológicas. Responderam eles: “Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas.” Para Sócrates, Deus é a Razão Perfeita, defi ni-ção antecipada em cerca de dois e meio milênios, que privilegia a imaterialidade,

a espiritualidade, ao tempo em que seus contemporâneos e antecessores busca-vam uma physis, uma causa material do Universo, de toda a criação. Na Grécia clássica, o conhecimento é buscado pela via da indagação, como método, enquanto que o pensamento cristão con-sidera que o conhecimento revelado não é passível de análise. Mas o Espiritismo, sendo cristão, “helenicamente”, faz tudo passar pelo crivo da razão, inclusive a fé. Assim, assume também Deus como objeto de conhecimento, ainda que com as ressalvas impostas pela própria razão, alargando os limites da extensão do conhecimento, que “diz respeito à possi-bilidade de podermos atingir o absoluto e a natureza íntima das coisas, inclusive Deus e a alma, como estatui o chamado dogmatismo de Platão e Hegel;(...)”4

Tendo-se revelado insufi cientes as formulações fi losófi cas quanto as culturais e científi cas, concluiu-se pela legitimidade da Sua existência a par-tir de quatro grupos de considerações, capazes de demonstrá-Lo de forma defi nitiva: cosmológicas (que tratam da estrutura do Universo – Deus é a Causa Única da sua própria causalidade, por-tanto é real, e tem condições de preexis-tir à Criação e sobreexistir ao sem-fi m; aplicadas por Aristóteles e Tomás de Aquino); ontológicas, conhecidas como Argumento de Santo Anselmo (tratam do ser enquanto ser – Deus é perfeito em todos os Seus atributos e na própria essência, que explicam Sua existência, pois, se não fosse real, deixaria de ser perfeito); teleológicas (tratam do mundo como sistema de relações entre meios e fi ns – a beleza, a harmonia cósmica, a precisão matemática e estrutural da Criação, penetradas pelo pensamento humano, dão ao homem a conclusão única de que procede da existência de um Criador); morais (defendidas por Kant, que rejeita as anteriores, aceitas por Descartes, Spinoza e outros), tratam da presença de Deus, como Legislador Supremo, no homem, mediante sua res-ponsabilidade moral e sua própria liber-dade e inteligência. A Doutrina Espírita contempla esses grupos de conside-

rações, afi rmando Deus como Causa Necessária, a um só tempo transcen-dente e imanente à Criação.

A visão espírita de Deus lança novas luzes e redireciona o pensamento espiritualista, já desgastado com ver-tentes teológicas que passaram a ser inconsistentes perante os avanços, não por acaso, da ciência do século XIX, posto que estavam no Planejamento Superior, uma vez que soara no Infi nito a hora de consubstanciar a promessa de Jesus de que nos enviaria “um outro Consolador”.

A visão espírita de Deus é a culmi-nância de um processo pelo qual evo-luiu o psiquismo humano, transitando do temor dos povos primitivos, confun-dindo-O com a Sua Obra – postura que assumiu formulação racional, fi losófi ca, no panteísmo: Deus é a Natureza – à posição de humanização, de antropo-morfi zação da Divindade, que carreava os sentimentos e paixões próprios das limitações humanas, em típico fenô-meno de transferência. Adorado pelos homens, foi destronado pela ciência que O substituiu pela deusa Razão, personi-fi cada por uma bailarina na Revolução Francesa em 1789, com argumentos de que essa ideia de Deus não tem funda-mento, de que o sagrado, o irracional são uma tolice, de que a matéria expli-caria o Universo, de que, com fulcro no Empirismo, somente as informações sensoriais mereceriam credibilidade, ensejando o positivismo, que dominou a paisagem fi losófi co-científi ca do século XIX, em nítido processo de desdiviniza-ção, descristianização e secularização do mundo moderno.

Mas quanto mais esse mesmo processo se ateve e se atém à inves-tigação da matéria, mais aproxima a ciência de Deus. A ideia de Deus – da Razão Perfeita para Sócrates, pas-sando pela Ideia do Bem de Platão, Primeiro Motor de Aristóteles, Uno do

A Visão Espírita de DeusA Visão E

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Cultura Espírita – 13 abril 2011 /

Nadja do Couto Valle

panteísmo de Plotino, à perplexidade de Santo Agostinho – “Se me perguntam o que é Deus, não sei; mas se não me perguntam, eu sei”, à Grande Máquina de Descartes e à Grande Mônada de Leibniz, passando por Paulo – In ipso vivimus, movemur et summus5, pas-sando também pelo monismo de Fichte, Hegel e Schelling, por exemplo, até chegar à ideia de Deus no corpo da Doutrina Espírita, que patrocina a união da ciência e da fé, da religião e da razão, em pleno século que viu mag-nas conquistas em todos os campos do conhecimento, com destaque para o campo da física, com a fi ssão do átomo e os postulados de Einstein.

Com o advento do paradigma quântico, que possibilita nova descrição de objetos científi cos, o modelo meca-nicista-materialista perde seu espaço e até mesmo sua consistência, pois os modelos quânticos promovem uma pro-gressiva desmaterialização da física, o que vem dar atestado da ciência formal aos postulados da Doutrina Espírita, que trabalha com a imponderabilidade do espírito como realidade e de seu mundo, de forma abdutiva6, através de método racionalista, com rigor científi co, concebido por Rivail/Kardec, especi-fi camente para o trato das questões metafísicas, que classifi camos como “positivismo metafísico” ou “positivismo transcendental”7.

A ideia de que no Universo quân-tico palpita a Consciência Cósmica como elemento primordial, que cons-trói a realidade, encontra ressonân-cia no universo do corpus doutrinário do Espiritismo: “Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”, e está presente em todas as criaturas, mediante a Sua lei inscrita na consciência do homem8. É a ima-nência de Deus na criatura, pela via de Sua transcendência, Sua inteligência presente em Sua Lei: “acima de tudo

Deus, o criador, o pai de todas as coi-sas.”9, pois, quânticamente, a matéria é produto da consciência. A identifi cação dos postulados quânticos com a essên-cia dos ensinamentos da Doutrina Espírita reafi rma o que disse Jesus: “Meu pai até agora não cessa de obrar e eu também obro incessantemente”10 – como consciência una com o Pai. Ou seja, o gerador, o Criador/Pai de tudo, até agora não cessa de obrar, de criar tudo, na Causação Descendente, de que nos falam a Física Quântica e o físico Amit Goswami11, e Jesus mantém-se unido a Ele, à Consciência Suprema, à Consciência Cósmica Interconectada, mediante a abrangên-cia dessa grande lei quântica, a da interconectividade. Por isso somos de Deus, como tudo é de Deus, porque nós, como tudo, d’Ele proviemos e d’Ele nos sustentamos. Hoje, neurocientistas descobrem no cérebro o God point, o ponto de Deus, inscrito na criatura12, o que nos leva a concluir que possa ser uma prova de que a consciên cia cria regiões cerebrais necessárias às ativi-dades a serem desenvolvidas, segundo seu estágio evolutivo.

A Doutrina Espírita não teme as novas conquistas e incorpora-as sem perder nada de sua substancialidade tanto teórica quanto prática, segundo o próprio Codifi cador asseverou, a res-peito de sua natureza “essencialmente progressiva”, “que não pode ser con-trária às leis de Deus”: “As descobertas que a Ciência realiza, longe de o rebai-xarem, glorifi cam a Deus; unicamente destroem o que os homens edifi caram sobre as falsas ideias que formaram de Deus. (...) Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas des-cobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modifi caria nesse ponto. Se uma ver-dade nova se revelar, ele a aceitará.”13

A visão espírita de Deus, trans-cendente e imanente, como Inteligência Suprema, Causa Primária de todas as coisas, reafi rma a Razão Perfeita de Sócrates, evoca a Ideia do Bem, de Platão, é confi rmada pela física quân-tica, e espelha a defi nição de Jesus e de João: Deus é Pai e é Amor.

Nadja do Couto Valle é professora universitária e expositora espírita.

Referências:1 XAVIER, Francisco Cândido. O primeiro capítulo. Pelo Espírito Irmão X. Reformador. p. 25, abril/1957.2 KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 102.ed. Rio de Janeiro: FEB, 1990. Introdução, item IV – Sócrates e Platão, precursores da ideia cristã e do Espiritismo.3 ____. O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 71. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1991. Q. 1.4 COUTO VALLE, Nadja do. Refl exões à luz do Espiritismo. 2. ed. Rio de Janeiro: Edições ICEB, 2010. Capítulo 1, “Um olhar sobre Kardec”, p. 16.5 Bíblia. N.T. Atos, 17:28.6 A abdução, ou inferência hipotética, é o método que possibilita conhecimento novo, ou seja, é a forma de inferência que acrescenta algo ao conhecimento, ao postular a existência de um objeto e ao atribuir-lhe propriedades, formando teorias. O processo de busca completa-se com a indução, encontrando fatos confi rmatórios das teorias.7 COUTO VALLE, Nadja do. Id. Ibid. p. 18.8 KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tra-dução de Guillon Ribeiro. 71. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1991. Q. 621: “Onde está escrita a lei de Deus? Na consciência.”9 Id. Ibid. Q. 27.10 Bíblia. N.T. João, cap. 5, vers. 17.11 GOSWAMI, Amit. O universo autoconsciente: como a consciência cria o mundo material // com Richard E. Reed e Maggie Goswami. Tradução de Ruy Jungmann. 2. ed. São Paulo: Aleph, 2008. (Série Novo Pensamento).12 KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Pode remeter-nos a um nexo com a q. 621: “A lei de Deus está escrita na consciência.”13 KARDEC, Allan. A gênese. Tradução Guillon Ribeiro. 25. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1982. Capítulo I, item 55.COUTO VALLE, Nadja do. Materialismo e espiritu-alismo na fi losofi a: culminâncias e sínteses. In: Emtorno de Rivail: O mundo em que viveu Kardec.Bragança Paulista: SP, Lachâtre, 2004. p. 192-231. LIMA, Moacir Costa de Araújo. Consciência cria-dora. Porto Alegre, RS: AGE, 2010.

A Visão Espírita de DeusEspírita de Deus

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Cultura Espírita – 14 / abril 2011

ICEB – Aulas de Esperanto – Sábado, 10h30min às 12h

Traduko: Saulo WanderleyESPERANTO

La spiritisma vidmaniero pri Dio kunportas novajn lumojn kaj þanøas

la marþdirekton de la spiritualista penso, jam signife korodita en teologiaj fontoj kiuj fariøis senhavecaj antaý la progresoj, nehazardaj, de la scienco de la XIX jarcento, æar ili estis en la Supera Planado, konsiderante esti jam alveninta la horo por plenumi promeson de Jesuo: sendi al ni “alian konsolanton”.

La spiritisma vidmaniero pri Dio estas la kulmino de procedo laý kiu evoluadis la homa-anima-fenomenaro, ekde la timo de primitivaj popoloj, kiuj ØIN miksadis al Lia kreitaferoj – sinteno kiu gajnis racian, filozofian formon en la panteismo: Dio estas la naturo – øis la sinteno humaniga, antropoformiga de la Dieco, sinteno kiu kunportadis la sentojn kaj pasiojn propraj de la homaj limoj, ene al tipa fenomeno de transfero. Adorata de la homaro, estis sentronigita de la scienco kiu ØIN anstataýis per la Racio-Diino, personigata per baletistino en la Franca Revolucio, dum 1789, surbaze de argumentoj laý kiuj la ideo pri Dio ne havas fundamenton, laý kiuj la sankta-afero, la neracia-afero estas stulta¼oj, laý kiuj la materio klarigus la universon, laý kiuj, surbaze de la empiriismo, nur la sensaciaj informoj estas indaj je kredindeco, okazigante la pozitivismon, kiu regis sur la pejzaøo scienca-filozofa de la XIX jarcento, en klara procedo de maldiecigo, malkristanigo kaj laikanigo de la moderna mondo.

Sed, ju pli tiu sama procedo sin ligis kaj ligas al la esplorado de la materio, des pli alproksimigas la sciencon al DIO. La ideo pri DIO – ekde la Perfekta Racio, laý Sócrates, pasante tra la Ideo de Bono, de Platão, Unua Motoro, de Aristóteles, Unu-eco de la Panteismo, de Plotino, al la perplekseco de Sankta Agostino – “Se oni demandas al mi: kio estas DIO? Mi ne scias, sed se oni ne demandas, mi scias”, al la Granda Maþino, de Descartes, al la Granda Monado de Leibniz, tuþante Paulo, la apostolo, – In ipso vivimus, movemur et summus5, ankaý tuþante la monismon de Fichte, Hegel kaj Schelling, kiel ekzemploj, estis profunde esplorita, tiu ideo pri DIO, øis atingi la ideon pri DIO de la Spiritisma Doktrino, kiu vere apogas la unuigon de fido kaj scienco, de religio kaj racio, øuste dum la jarcento kiu vidis grandajn konkerojn en æiuj konkampoj, reliefigante la kampon de la fiziko, per la atoma fisio kaj la postulatoj de Einstein.

Je la alveno de la kvantuma para digmo, kiu ebl igas novan priskribon por la sciencaj

celoj, la modelo mekanikisma-materiisma perdas sian spacon kaj eæ fariøas senesenca, æar la kvantumaj modeloj okazigas progresan senmateriigon en la fiziko, kaj tio estas favora atesto el la formala scienco por la Spiritisma Doktrino, kiu abdukcie6 klarigas kaj øustigas la realecon kvazaý nematerian de la spirito kaj de sia mondo, per racia metodo, sub scienca rigoro, rigoro konceptita de Rivail/Kardec, specife por pritrakti la metafizikajn demandojn, klasifitaj de ni kiel “pozitivismo metafizika” aý “pozitivismo transcenda”.

La ideo laý kiu la Kosma Konscienco, kiel origina, primitiva elemento, vibras en la Kvantuma Universo, tia elemento konstruanta la realon, gajnas fortigon en la universo de la spiritisma doktrina konceptaro: “Dio estas la superpleja inteligento, unua kaýzo de æiaj aferoj” kaj æeestas en æia kreita¼o, per Sia leøo, enskribita en la homa konscienco8. Estas la imanenta æeesto de Dio en la kreita¼o, pere de Sia transcendeco, Sia inteligento æeestanta en Sia leøo: “sur la tuto Dio, la kreinto, patro de æiaj aferoj”9, æar kvantume, materio estas produkto de la konscienco. La identigo de la kvantumaj postulatoj al la esenco de la Spiritisma Doktrino reasertas tion, kion Jesuo diris: “mia patro, øis nun, ne haltis Sian konstruadon, kaj mi ankaý ne haltas mian konstruadon”10 – kiel konscienco unuigita al la Patro. Tiel estas, la generatoro, la Kreanto/Patro de æio, øis nun ne haltis sian kreadon, sian kreadon de æiaj aferoj, en descenda procedo de kreado, laý kiu parolas la kvantuma fiziko kaj la fizikisto Amit Goswami11; kaj Jesuo restas unuigata al Li, al la Superpleja Konscienco, al la Kosma Interkonektata Konscienco, per la amplekseco de tiu granda kosma leøo, la leøo de interkonektemeco. Pro tio ni apartenas al Dio, kiel æio apartenas al Dio, æar ni, kiel æio, devenas el Li, kaj nutriøas el Li. Nuntempe, neýrosciencistoj malkovras en la cerebro la God Point, punkto de Dio, enskribita en la kreita¼o12, kaj tio permesas al ni konkludi favore al la ebleco ke konscienco kreas cerebrajn regionojn kiuj estas necesaj al la aktivecoj disvolvigendaj, laý sia propra evoluadnivelo.

La Spiritisma Doktrino ne timas novajn homajn konkerojn; ilin inkluzivas en øia konceptaro, nenion perdanta de tiaj konkeroj, rilate al siaj esencoj teoriaj kaj praktikaj, laý la aserto de Rival/Kardec, Kodiginto de tiu Doktrino, pri øia naturo “esence progresema”, naturo “kiu ne povas esti kontraýa al la Diaj leøoj”: “La malkovroj

realigitaj de la scienco, esence kontraýe al Dion malaltigi, Øin glorigas; tiaj malkovroj, nure, detruas tion, kion la homaro edifis sur falsaj ideoj pri Dio. (...) Marþante flanke-æe-flanke kun la progreso, Spiritismo neniam estos superata, æar, se novaj malkovroj elmontrus al øi ian ajn eraron øian, pri ia ajn koncepto, øi sin modifus pri tia koncepto. Kaj se nova vero malvualiøos, Spiritismo akceptos tian novan veron.”13

La spiritisma vidmaniero pri Dio, transcenda kaj imanenta, Øin konsiderante kiel Superpleja Inteligento, Unua Kaýzo de æiaj aferoj, reasertas la Perfektan Racion de Sócrates, elvokas la Ideon pri la Bono, de Platão, estas konfirmata de la kvantuma fiziko, kaj spegulas la difinon el Jesuo kaj el João: Dio estas Patro kaj estas Amo.

Nadja do Couto Valle estas universitata profesorino kaj spiritisma prelegistino.

Referencoj:1 XAVIER, Francisco Cândido. Unua æapitro. El la Spirito “Irmão X”. Spiritisma Revuo Reformatoro, paøo 25, aprilo/1957. 2 KARDEC, Allan. La Evangelio laý Spiritismo. Traduko de Guillon Ribeiro. 102a .eld. Rio de Janeiro: BSF, 1990. Enkonduko, itemo IV – Sócrates Kaj Platão, antaýuloj de la kristana ideo kaj spiritismo.3 ____. La Libro de la Spiritoj. Traduko de Guillon Ribeiro. 71a. eld. Rio de Janeiro: BSF, 1991. Demando 1. 4 COUTO VALLE, Nadja do. Pripensado sub la Spiritisma Lumo. 2a. eld. Rio de Janeiro: Eldonoj ICEB, 2010. Æapitro 1, “Rigardo sur Kardec”, paøo 16.5 Bíblia. N.T. Aktaro 17:28.6 La abdukcio, aý poema inferenco, estas metodo kiu ebligas novan konon, tiel estas, inferenca maniero kiu inkluzivas ion al la kono, kiam postulas la ekzistado de objekto kaj kiam atribuas proprecojn al øi, produktante teoriojn. La seræa procedo kompletiøas per indukcio, trovante faktojn kiuj konfirmas la teoriojn.7 COUTO VALLE, Nadja do. Id. Ibid. 8 KARDEC, Allan. La Libro de la Spiritoj. Traduko de Guillon Ribeiro. 71a. eld. Rio de Janeiro: BSF, 1991. Demando 621: “Kie estas skribita la Dia leøo? En la konscienco.” 9 Id. Ibid. Demando 27.10 Bíblia. N.T. João, æap. 5, vers. 17. 11 GOSWAMI, Amit. La memkonscia universo: kiel la konscienco kreas la materian mondon // Kun Richard E. Reed kaj Maggie Goswami. Traduko de Ruy Jungmann. 2a. eld. São Paulo: Aleph, 2008. (Serio “Nova Penso”) 12 KARDEC, Allan. La Libro de la Spiritoj. Povas prezenti al nin rilaton kun la demando 621: “La Dia leøo estas enskribita en la konscienco.”13 KARDEC, Allan. La Genezo. Traduko de Guillon Ribeiro. 25a. eld. Rio de Janeiro: BSF, 1982. Æapitro I, itemo 55. COUTO VALLE, Nadja do. Materiismo kaj Spiritualismo en la Filozofio: kulminoj kaj sintezoj. En: Pri Rivail: La mondo em kiu Kardec vivis. Bragança Paulista: SP, Lachâtre, 2004. paøo 192-231.LIMA, Moacir Costa de Araújo. Kreanta Konscienco. Porto Alegre, RS: AGE, 2010.BSF estas Brazila Spiritisma Federacio.

S P I R I T I S M A V I D M A N I E R O P R I D I O

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Cultura Espírita – 15 abril 2011 /

ICEB – Curso sobre Doutrina Espírita – Sábado, 10h30min às 12h

Yasmin Madeira

Encontro com Jesus

Não é muito comum as pes-soas deterem-se em refl e-

xões sobre o Calvário do Cristo. Ali nos deparamos com cenas tão terrí-veis e chocantes que preferimos nos deter na beleza de sua vida e ensina-mentos. Nos momentos, porém, em que as dores e sofrimentos, nossos e dos nossos irmãos em humanidade, nos batem à porta da existência, o drama do Calvário nos atrai com um magnetismo diferente, como se o Cristo ali pusesse um código divino que, se compreendido, é capaz de rasgar as trevas e nos situar em uma dimensão celestial onde o sofrimento desaparece.

Segundo estudiosos, a dor física tolhe a capacidade de raciocínio, limita a inspiração e o desenvolvi-mento de ideias complexas, permi-tindo que os instintos venham à tona. Já a dor emocional ativa a sensibi-lidade e permite que a criatividade se expresse para drenar a emoção perturbadora. Isso não ocorre, no entanto, com a ansiedade e a dor em níveis altos. Quando ocorrem, a memória fi ca obnubilada e se fecha a capacidade de pensar, de logicar. Com o Mestre, porém, tudo é dife-rente. Se o comportamento do Cristo nos conduz sempre a um estado de amorosa perplexidade (Lucas 2:47), as Suas últimas horas na Terra sinte-tizam, na prática, todo o Seu infi nito amor.

Ele, que nada tinha a expiar, no alto da cruz e no ápice da dor exclama: “Pai, perdoa-os por que eles não sabem o que fazem” (Lucas 23:34). Em meio a todo o cenário

caótico, de sombra e de dor, Jesus evidencia a presença de alguém, que em tudo vive, que é Pai, Criador. Ali Ele é humilhado, provocado, sevi-ciado, porém Sua mente se fi xa na realidade da vida espiritual, onde encontramos as explicações das dores e sofrimentos da Terra e uma

fonte inesgotável de equilíbrio e paz. As dores físicas e emocionais não Lhe feriram a lógica e a consciência sempre desperta.

Desfi gurado pelas torturas, Ele já havia perdoado seus algozes porque compreendia as limitações daquelas consciências presas no entorpeci-mento das paixões. A compreensão dos limites do outro é uma chave inequívoca para o perdão, que brota

espontâneo quando ela é acionada. Repleto de Vida Interior, não obstante as dores acerbas, sai de si mesmo, situando Sua consciência sempre no amor ao semelhante e encontra forças para acolher o criminoso arre-pendido, crucifi cado ao Seu lado, que Lhe roga auxílio. Continuando em seu serviço de amor, mesmo crucifi cado ao madeiro, no auge do sofrimento, preocupa-se com Maria, Sua mãe, e a recomenda a João, o discípulo amado (João 19:27), em um conjunto poético de palavras que transbordam emoção.

Alma irmã, querida (o) amiga (o), todos passamos por nosso Calvário particular. São ecos do passado e atendem às nossas necessidades educativas. O mundo exterior pode, nesses momentos, parecer sombrio por uma infi nidade de razões, mas se você souber administrar as suas emoções mais tensas e organizar seus pensamentos, você não per-derá suas conexões com a esfera espiritual, de onde brotam a paz e a felicidade verdadeiras. Identifi que suas metas na presente existência, adequando-as à sua maturidade de agora, e não se perca em lamen-tações ou recordações do mal que lhe fi zeram. Organize seu dia para o atendimento do bem, recuse-se a comentar o mal e focalize os pensa-mentos em Deus. Não tema. Todo o mal passa. Três dias após o Calvário, lá esta Ele, belo, nimbado de luz!

Bibliografi a:CURY, Augusto. O Mestre do amor. Rio de Janeiro: Sextante, 2010.

r e v i s t a

Cultura Espírita – 16 / abril 2011

ICEB – Revista Cultura Espírita – Fale conosco: [email protected]

Teresa Cristina Cabral

Muitas pessoas chegam ao meu consultório e dizem:

tenho síndrome do pânico, trans-torno obsessivo compulsivo, défi cit de atenção, bipolaridade etc. Ou então trazem o “diagnóstico” que fi zeram dos fi lhos, maridos, familia-res, conhecidos. Essa situação me faz lembrar da sabedoria popular: “de médico e louco todo mundo tem um pouco”!

Investigando melhor, percebo que esses diagnósticos são efetua-dos através de pesquisa realizada em site famoso da internet, pela reportagem da TV ou da revista de referência nacional e quem sabe até internacional.

Em um mundo tão desenvol-vido, como ainda não inventaram uma “droga” para exterminar a dor do existir? Precisamos, urgentemente, encontrar um “diagnóstico” e um “tratamento medicamentoso”, de pre-ferência com sabor agradável e que tenha efeito imediato!

É da natureza humana buscar justifi cativa para tudo o que acon-tece, com o intuito de amenizar a culpa e diminuir a angústia. Apenas encontrar justifi cativas não nos faz assumir a responsabilidade por esco-lhas, muitas vezes equivocadas, que fazemos ao longo de nossas vidas. Também não propicia transforma-

ção e mudança de atitude frente às adversidades do cotidiano.

É pertinente à condição humana a capacidade de pensar, de refl etir, de entrar em contato, de aprender e se desenvolver com a própria subjeti-vidade. Precisamos olhar e encontrar o sentido, a fi nalidade do sofrimento e do existir humanos. Precisamos nos questionar: qual o signifi cado da nossa existência? Qual a fi nalidade da nossa vida?

Necessitamos, urgentemente, de um espaço de acolhimento, onde seja possível olhar para, e falar da – dor/sofrimento –, que permeia a existência de todos nós. Em hipó-tese alguma na condição de vítimas e mártires, mas como buscadores do autoconhecimento e do aperfeiçoa-mento ético e moral.

Muitas vezes viver é doloroso, sim, mas, ao mesmo tempo, é a maior dádiva do Criador ofertada a cada um de nós! É a oportunidade preciosa do crescimento e desenvolvimento de nossa consciência ética e moral.

Portanto, sinto que, hoje, falar em saúde mental é falar da capaci-dade de aprender a lidar com o sofri-mento humano, próprio e do seme-lhante. Aceitar nossa fragilidade, limitação e impotência, não negar nossos sentimentos, mesmo os mais obscuros. Tem-se falado muito

de doença e pouco de prevenção e obtenção da saúde mental, emocio-nal e espiritual.

Olhar para o nosso mundo interno pode ser desafi ador, mas posso garantir que é muito enri-quecedor. E, com certeza, vamos encontrar muitas preciosidades que estavam escondidas e outras que serão descobertas. Vamos nos sur-preender com defeitos que só con-seguíamos ver no nosso semelhante! Poderemos nos perceber mais fortes e criativos.

Não estou negando que exis-tam patologias. Elas existem, sim, e precisam ser diagnosticadas e tra-tadas, ADEQUADAMENTE, por pro-fi ssionais qualifi cados e competen-tes. Também não estou negando a importância da tecnologia, em todas as áreas, em especial a internet, que trouxe acesso a tanta informação. Apenas me pergunto se consegui-mos digerir e transformar em conhe-cimento e sabedoria essa quantidade de informações fragmentadas. Mas essa é outra refl exão, para outra oportunidade.

Teresa Cristina Pereira Cabral é psi-cóloga clínica de orientação Junguiana, coligada às técnicas corporais de P. Sandor e expositora espírita.

SAÚDE MENTAL:SAÚDE MENTAL:ALGUMAS REFLEXÕESALGUMAS REFLEXÕES

r e v i s t a

Cultura Espírita – 17 abril 2011 /

ICEB – Tels.: 0XX(21) 2224-1060 / 2224-0736 – [email protected] / [email protected]

Certas Palavras

Marcos Leite

O pequeno Zeca entra em casa, após a aula, batendo

forte os seus pés no assoalho da casa. Seu pai, que estava indo ao quintal para fazer alguns serviços na horta, ao ver aquilo, chama o menino para uma conversa. Zeca, de oito anos de idade, o acompanha des-confi ado. Antes que seu pai dissesse alguma coisa, fala irritado:

— Pai, estou com muita raiva. O Juca não deveria ter feito o que fez comigo. Desejo tudo de ruim para ele.

Seu pai, um homem simples, mas cheio de sabedoria, escuta calmamente o fi lho que continua a reclamar:

— O Juca me humilhou na frente dos meus amigos. Não aceito. Gostaria que ele fi casse doente sem poder ir à escola.

O pai escuta tudo calado, enquanto caminha até um abrigo onde guardava um saco cheio de carvão. Levou o saco até o fundo do quintal e o menino o acompanhou, calado.

Zeca vê o saco ser aberto e antes mesmo que ele pudesse fazer

uma pergunta, o pai lhe propõe algo:— Filho, faz de conta que

aquela camisa branquinha que está secando no varal é o seu amiguinho Juca e cada pedaço de carvão é um mau pensamento seu, endereçado a ele. Quero que você jogue todo o carvão do saco na camisa, até o último pedaço. Depois eu volto para ver como fi cou.

O menino achou que seria uma brincadeira divertida e pôs mãos à obra. O varal com a camisa estava longe do menino e poucos pedaços acertavam o alvo. Uma hora se pas-sou e o menino terminou a tarefa. O pai, que espiava tudo de longe, se aproxima do menino e lhe pergunta:

— Filho, como está se sentindo agora?

— Estou cansado, mas estou alegre, porque acertei muitos pedaços de carvão na camisa — responde o menino. O pai olha para o fi lho, que fi ca sem entender a razão daquela brincadeira e, carinhoso, lhe fala:

— Venha comigo até o meu quarto, quero lhe mostrar uma coisa.

O fi lho acompanha o pai até

o quarto e é colocado na frente de um grande espelho onde pode ver seu corpo todo. Que susto! Só se conseguia enxergar seus dentes e os olhinhos. O pai, então, lhe diz ternamente:

— Filho, você viu que a camisa quase não se sujou; mas, olhe só para você. O mal que desejamos aos outros é como o que lhe aconteceu. Por mais que possamos atrapalhar a vida de alguém com nossos pensa-mentos, a borra, os resíduos e a fuli-gem fi cam sempre em nós mesmos.

Lembre-se: cuidado com seus pensamentos; eles se transformam em palavras. Cuidado com suas palavras; elas se transformam em ações. Cuidado com suas ações; elas se transformam em hábitos. Cuidado com seus hábitos; eles moldam o seu caráter. Cuidado com seu caráter; ele controla o seu des-tino. Um grande abraço e até a pró-xima!

Marcos Leite é jornalista, publicitário e coordenador do programa “Espaço Jovem”, veiculado pela Rádio Rio de Janeiro (1400 KHz AM / www.radioriodejaneiro.am.br)

A IMPORTÂNCIA DO PERDÃO

METEMPSICOSE – do grego metempsykhosis; meta = mudança e empsykhos = alma. Signifi ca a alma que muda para outro corpo.Fonte:COSTA MARTINS, Luís da. Verbum palavra. 1 ed. Rio de Janeiro: Ed. Gayathri, 2011. p. 115.

Yvon Luz

r e v i s t a

Cultura Espírita – 18 / abril 2011

A C O N T E C E UA C O N T E C E UREABERTURA DO ANO LETIVO DO ICEB

Com grande brilhantismo, no dia 12 de março, o Instituto de Cultura Espírita do Brasil, reabriu seu ano de ati-vidades regulares. Retornamos ao nosso antigo endereço, na Rua dos Inválidos 182, no Centro do Rio de Janeiro. Nunca será demais registrar a imensa gratidão do ICEB aos irmãos do Conselho Estadual Espírita do Rio de Janeiro que, generosamente, cedem suas instalações não só para as aulas regulares do Instituto mas também as salas para atividades de administração.

Foi um evento memorável. Magnífi ca a palestra de Ivone Ghiggino sobre O Livro dos Médiuns, nossa homena-gem aos 150 anos dessa obra fundamental da Codifi cação. Luís da Costa Martins lançou seu último livro VERBUM PALAVRA, na tarde de autógrafos que mobilizou muitos dos seus admiradores. Belíssimas as contribuições de BETO, nosso querido e tradicional tecladista e de Anatasha Meckena, cantora, compositora, arranjadora de brilho invulgar.

A palestra de Ivone pode ser encontrada no Portal do ICEB.

DIFERENTES GERAÇÕES

Interessante matéria foi publicada em www.twitter.com/revcobertura sobre confl ito de gerações. Dizem os pes-quisadores que a geração nascida entre 1946 e 1964 tinha como característica a permanência, por décadas, na mesma empresa; focada nos valores pessoais e no futuro, agiam por consenso. A geração X, dos nascidos entre 1965 e 1977, buscou qualidade de vida, tornando o mundo mais humano. Foi a geração que presenciou a chegada da internet e a busca do equilíbrio entre a vida pessoal e profi ssional. Já a geração Y, dos nascidos entre 1978 e 1998, tem acesso à alta tecnologia, é extremamente conectada e utiliza plenamente a comunicação de massa, trabalhando em rede e fazendo muitas coisas ao mesmo tempo. A geração Z, dos nascidos entre 1993 e 2010 é pri-vilegiada, recebeu muita coisa pronta, com a interatividade digital desde a infância. São empreendedores, quebram paradigmas, têm senso crítico muito aguçado. Não é de surpreender se, um dia, uma criança de cinco anos bater à porta de uma empresa, pedindo emprego... O mundo caminha cada vez mais rápido. É o caso de perguntar: qual o papel do Espiritismo neste cenário desafi ador do tempo novo, quando os espíritos dizem que já começou a Era da Regeneração?