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Editor responsável
Projeto grá�co e diagramaçãoZeca Martins
Lilian Nocete MesciaCapaZeca MartinsRevisãoCamila da Silva Bezerra
Esta obra é uma publicação da Editora Livronovo Ltda.CNPJ 10.519.6466.0001-33www.editoralivronovo.com.br@ 2015, São Paulo, SPImpresso no Brasil. Printed in Brazil
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro poderá ser copiada ou reproduzida por qualquer meio impresso, eletrônico ou que
venha a ser criado, sem o prévio e expresso consentimento dos editores.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP
M547c Menoitanigami, Dara Ni Contando pétalas na sombra da �oresta / Dara Ni Menoitanigami. – Águas de São Pedro: Livronovo, 2015.
192 p.; 21 cmISBN 978-85-8068-0
1ª edição
1. Literatura brasileira. 2. Contos brasileiros. I. Título.
CDD – B869
Ao adquirir um livro você está remunerando o trabalho de escritores,
responsáveis por transformar boas ideias em realidade e trazê-las até você.
Índice
Desdobrando versos ................................................................ 7
Capítulo 1: Desencanto ........................................................... 9
Capítulo 2: Plantas curativas ................................................. 37
Capítulo 3: Raiar do dia ........................................................ 59
Capítulo 4: Os sons na floresta .............................................. 75
Capítulo 5: O vento .............................................................. 91
Capítulo 6: A chuva ............................................................ 105
Capítulo 7 : Mandalas ......................................................... 125
Capítulo 8: Poente .............................................................. 149
Capítulo 9: Encantos ........................................................... 169
Conversões .......................................................................... 187
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Desdobrando versos
O tempo passou e o que parecia verdade mostrou ser apenas uma doce ilusão, que findou perante uma revelação.
Encanto tornou-se DESENCANTO e procurei refúgio no meio da floresta para buscar em PLANTAS CURATIVAS o re-médio para as dores de um coração ferido.
No RAIAR DO DIA não era possível conectar com o doura-do da esperança, pois no meio de tanto verde que cobria abaixo e acima da vista, o sol apontava bem mais além do horizonte entre os espaços livres de folhas de todas as cores, brilhos e tamanhos.
A vida se manifestava desde cedo nos SONS DA FLORESTA, com os pássaros que anunciavam cada acontecimento ou calavam em momentos sombrios.
O VENTO trazia veloz o som do anúncio d’A CHUVA pela água que jorrava ao cair com força nas folhas, galhos, flores, fru-tos e sementes, chegando para banhar, corpo e alma, com a pure-za e a delicadeza das gotículas que conseguiam perpassar as copas das árvores.
As águas, ao abrandar no solo, faziam a floresta renascer em novos desenhos de teias de aranhas, dos frutos e folhas caídos e de sementes abertas por animais. As águas que avolumavam os rios, rodopiando na força de correntezas, lembravam MANDALAS, que serviam de modelos para criar florestas cultivadas pelo ser
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humano, trazendo de volta a esperança de reconstituir a riqueza
da natureza.
Na floresta, o dia ia embora mais cedo, escurecendo antes do
POENTE, quando medos vinham à tona com os animais que
despertavam.
ENCANTOS de seres mágicos surgiam, revelando segredos
que ainda não haviam sido contados.
O canto do Desconhecido havia cessado, por um instante,
mas voltou quando retornei da floresta e descobri que a sombra
dele pairava sobre mim.
Outras palavras alinhavavam ideias para tentar me desalinha-
var do que não fazia mais sentido, nem para mim nem para ele.
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Capítulo 1 – Desencanto
Por um tempo fiquei sem saber o que fazer com o livro Uni-
-verso dos contos, mas como estava próximo ao aniversário dele,
pensei que ao enviar-lhe uma mensagem de felicidades poderia
descobrir se ainda tinha interesse em ler as palavras que chegavam
e queriam seguir em sua direção.
Na mensagem desejei muitas alegrias e saúde e perguntei se
queria um presente como quem não quer nada. Ele respondeu
que sim, então disse que deveria escolher uma das opções: o que
ele chamava de diário, o qual denominei Uni-verso dos contos, ou
uns cereais que eu preparava com ingredientes e poções mágicas
para aumentar a vitalidade e que ele já havia experimentado e
gostado muito.
Fiquei surpresa, primeiro porque me respondeu de forma
muito educada agradecendo as felicitações e, depois, porque es-
colheu o diário, dizendo que seria o presente perfeito. Pensava
que não queria mais as estórias ou palavras que lhe enviava, pois
por muito tempo ficou sem respondê-las.
Agora nada disso importava, pois sentia que as palavras con-
tidas no diário, depois de lidas, nos afastariam ainda mais. Na
verdade, não eram apenas as palavras das estórias, mas também
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as palavras escritas a caneta nas bordas das folhas como recadi-
nhos, no qual inventei um novo código relacionado às atitudes
que tinha. O código era o DH que queria dizer Dia de Honrar o
fato de ser Homem, onde o H poderia ser tanto Honrar quanto
Homem, que vinha em contraponto ao HD.
O código HD surgiu numa das primeiras vezes que nos cor-
respondíamos quando ele me enviou uma mensagem dizendo
que ficaria um tempo sem me escrever para que o HD do meu
computador cerebral pudesse assimilar suas palavras. Tempos de-
pois, como ele de vez em quando sumia do mundo virtual por
onde nos comunicávamos, lhe disse que o HD significava Hora
de Desaparecer, explicando que ele desaparecia para não se deixar
envolver por uma mulher de verdade, do tipo que ele não estava
acostumado a lidar.
Nesta nova estória, o que era revelado nas palavras não eram
mais fantasias cheias de melodias como nas estórias dos Versos de
um colar de contos e Contos de um colar ao inverso. Era a realidade
de como eu o via no aqui e agora, ao unir opostos que se comple-
mentam. Via-o como alguém que não queria se colocar no lugar
de ser um homem de verdade. Embora o tivesse amado profun-
damente em algum momento da minha existência, aquele que
estava perante meus olhos, no presente, me desencantava com a
maneira como se portava perante a vida e o ser mais delicado da
criação, a mulher.
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As expectativas criadas no passado e não vislumbradas no fu-
turo causavam no presente uma grande decepção amorosa, geran-
do um conflito avassalador entre emoção e razão.
O que havia acreditado por milênios, talvez por promessas fei-
tas em outros tempos, era corroído por uma personalidade que se
deixara corromper pela dor ou pelo cansaço de uma batalha que
parecia não ter fim.
Assim como ele, eu estava cansada e desacreditada de muitas
coisas da vida ou, melhor, de acontecimentos que envolvem pes-
soas. Após um ano de intenso trabalho e dedicação gerenciando
Unidades de Conservação, percebia quanto o descaso de políti-
cos corruptos e interesseiros prejudicavam, não só a integrida-
de destes espaços criados legalmente para preservação do meio
ambiente, como passavam por cima de todo um arcabouço legal
legitimado pela sociedade.
Trabalhava manhã, tarde e noite, finais de semana e feriados
para receber um pouco mais que a pessoa que estava pagando
para cuidar da minha casa e de meus filhos. A diferença é que eu
havia ficado por mais de 25 anos estudando e minha secretaria
não tinha passado nem quatro anos de sua vida nos bancos es-
colares.
Estava vivendo no que se chamava a Era do Conhecimento,
onde as estatísticas afirmavam que a cada ano a mais de esco-
laridade de um trabalhador, sua remuneração poderia aumentar
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em 15%. Mas não era o meu caso, pois já tinha pós-graduação
e recebia quase o mesmo valor que uma pessoa semianalfabeta.
Todo esse tempo, trabalhei não só para formar um currículo
com experiência na área ambiental, mas principalmente por um
ideal de que era possível mobilizar pessoas para um bem comum
em defesa de valores e da natureza.
Tinha um contrato governamental onde talvez não houvesse
nem um pouco de interesse político que pessoas capacitadas ficas-
sem por muito tempo ocupando os cargos de gestor nas unidades,
nem criando condições de que leis fossem cumpridas ao invés dos
interesses particulares de políticos carreiristas, que procuravam
cargos que lhes trouxesse mais votos a cada eleição.
Talvez, medindo na ponta do lápis, a responsabilidade de cui-
dar de seres que entravam na adolescência fosse maior do que a
responsabilidade de gerenciar um espaço público criado para pre-
servação do meio ambiente. Ponderava que a formação de jovens
para o futuro poderia fazer uma grande diferença para uma socie-
dade saudável e para que os espaços naturais fossem, realmente,
preservados. Embora fosse muito difícil mensurar numa balança
o que pesava mais, pois no futuro talvez não houvesse mais o que
ser preservado, pelo rumo que as coisas iam tomando.
As dunas, os mangues, as praias de cidades litorâneas eram
vendidas por comunidades tradicionais, que viviam em harmonia
com a natureza, por pressão de grandes multinacionais e especu-
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ladores imobiliários sem escrúpulos. Leis eram modificadas da
noite para o dia para atender as demandas da cobiça e a máquina
estatal era utilizada para fazer benfeitorias para os investidores
ficarem cada vez mais ricos a custa de dinheiro público.
Não tinha muita escolha, embora quisesse, profundamente,
defender das garras cruéis de monstros sanguinários as belezas
paisagísticas e os refúgios naturais, aos quais gerenciava. Após um
ano sem dar a devida atenção aos meus filhos, não podia mais
deixá-los nas mãos de uma pessoa ríspida que, além de não ter
uma formação adequada, não tinha um coração amoroso para
orientá-los. Eu precisava retomar a missão de ser mãe e pai ao
mesmo tempo.
Pedi demissão do trabalho com a última gota d’água de espe-
rança dizimada pelos politiqueiros que ocupavam os cargos mais
altos do órgão ao qual estava ligada profissionalmente.
Após cinco meses gerenciando um parque de, aproximada-
mente, 190 hectares com uma equipe de 21 pessoas, surgia a
oportunidade de selecionar pessoas com mais capacidade técnica
para alavancar as possibilidades de utilizar a unidade para outras
finalidades muito além do que apenas um espaço de defesa dos
recursos naturais. A ideia era ser um local onde a comunidade
pudesse se apoderar tanto do espaço físico, para a melhoria da
qualidade de vida, como ter acesso a conhecimentos que pudes-
sem propiciar mudanças no rumo da estória local.
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A interação e a busca por objetivos em comum poderiam
trazer resistência à especulação imobiliária e a exploração de-
senfreada dos recursos naturais.
A desinformação e falta de consciência levavam as comu-
nidades a atearem fogo para queimar o lixo que descartavam.
Isso quando não amontoavam a céu aberto. Construíam ca-
sas em áreas de risco e de forma inadequada, que compro-
metiam as condições mínimas de saúde e segurança. Políticos
interesseiros, incentivando e efetivando as incongruências e
ilegalidades, levavam asfalto e postes de energia com o recurso
público para angariarem votos em locais inapropriados para a
ocupação. Mas o serviço nunca era completo para dar todas
as condições necessárias às comunidades carentes, pois outras
eleições viriam e precisava haver outro pretexto para ganharem
mais votos.
O lema deles era “dar o peixe para que não aprendessem a
pescar e continuassem dependentes para sempre deles, como
senhores bem feitores”.
Duas comunidades que se instalaram às margens do parque,
volta e meia, ateavam fogo para queima de lixo, provocando
incêndios dentro da unidade e pondo em risco suas próprias
casas, além de causar emissão de gases no ar, provocando do-
enças respiratórias e aumentando a sensação térmica de calor
no ambiente ao qual estavam inseridas.
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O quadro de funcionários que estava trabalhando na unidade
começou a ser capacitado por mim e por outros profissionais de
diversas áreas do conhecimento convidados, para que primeiro
pudessem compreender o espaço onde trabalhavam, tendo acesso
ao conhecimento dos processos da natureza e como estes estão,
intrinsecamente, alinhavados à qualidade de vida de cada um de
nós. Além disso, fazíamos reuniões periódicas para que compre-
endessem que as peças-chave para fazer com que os objetivos da
unidade fossem cumpridos estavam nas mãos de cada um deles.
Foi lhes devolvido o direito de serem protagonistas e não mais
expectadores, podiam escrever a estória da qual estavam fazendo
parte, ao invés de serem fantoches nas mãos de dominadores im-
placáveis.
Nas reuniões com os vigilantes trazia informações técnicas e
questionamentos que eles mesmos levantavam em relação à pos-
tura de colegas ou procedimentos da empresa que os contratava
para prestar serviço ao Estado. Cada qual tinha uma percepção
diferente de um fato, às vezes um apresentava um desvio de cará-
ter em determinado assunto e outro apresentava uma visão mais
adequada para que o trabalho fosse mais efetivo. Em outros as-
suntos os papéis se invertiam. Nenhum era perfeito, cada qual
precisava da experiência e do bom senso do outro, mas devido à
ingerência do gestor anterior, que optou por extorquir informa-
ções por meio de fofocas, acabou jogando uns contra os outros
sem consciência do fato.