Educação Em Sêneca Fabrício

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    Educao e Filosofia

    Educ. e Filos., Uberlndia, v. 21, n. 41, p. 61-87, jan./jun. 2007.

    A EDUCAO SENEQUIANA

    Jos Joaquim Pereira Melo*

    RESUMO

    O presente trabalho tem como preocupao fazer algumas reflexessobre o conceito de educao de Sneca. A educao, para essepensador, consistia na subordinao das tendncias instintivas razo, e a condio fundamental para essa sujeio era oconhecimento de si mesmo. Isto implica que, em sua concepo, oprocesso formativo tinha um carter de auto-educao, cujosprincpios fundamentais eram a moral, a virtude, a liberdade, asabedoria e a filosofia. Assim, o pensamento de Sneca deve serabordado segundo dois eixos condutores significativos. O primeiro que a sabedoria e a filosofia so realidades inseparveis e dizrespeito meta da formao, ou seja, educao consumada; osegundo, que tanto a filosofia como a sabedoria fazem parte dasubstncia da educao e refere-se, ainda, ao objetivo imediato,instrumento e caminho para formao, quer dizer, a educao serealizando.

    PALAVRAS-CHAVE: Sneca. Educao. Filosofia. Autoformao.

    ABSTRACT

    The present study is concerned with making some reflections aboutthe education concept in Seneca. The education, for this thinker,consisted in the subordination of the instinctive trends to the reason,

    * Doutor em Histria e Sociedade e professor do DFE/PPE/UEM UniversidadeEstadual de Maring.

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    and the essential condition for this subjection, was the knowledgeof oneself. It implicates that, in his conception, the formative processhad a character of self-education, which basic principles weremoral, virtue, liberty, knowledge and philosophy. Therefore,Senecas thinking must be treated according to two significantguiding lines: the first is that the knowledge and the philosophyare inseparable realities; the second is that philosophy as well aswisdom is part of the education essence. The first is about theformation target, or rather, the consummate education; thesecond refers to the immediate objective, instrument and road toformation, in other words, the realization of the education.

    KEYWORDS: Seneca. Education. Philosophy. Self formation.

    Lcio Aneu Sneca, poltico, escritor e filsofo na Roma doalvorecer da Era Crist, conquistou notoriedade e lugar de destaquena Histria pela sua preocupao com a promoo do homem doseu tempo, o qual, segundo ele, era marcado pelo sofrimentodecorrente de um ambiente de dissenses polticas, arbitrariedades,inseguranas e medos provocados por um Imprio em francadecadncia.

    Para Sneca, a reordenao dessa sociedade passava, emgrande medida, por um processo educativo que possibilitasse aohomem o desenvolvimento da racionalidade e de uma vida virtuosae feliz, conforme a natureza lhe havia projetado.

    Na realizao dessa ao educativa, o que levaria formaodo sbio, do agente social que responderia s necessidades do seutempo, no eram as habilidades intelectuais e a assimilao dacultura, mas a regenerao do homem. Por esse motivo, definiu aescola como o lugar onde se investigam as qualidades do homemde bem, donde se aprende a s-lo (Cartas 76, 4).

    Em face disto, so perfeitamente compreensveis suasconstantes crticas educao de corte intelectual comprometidacom a superficialidade, na qual se confundia cultura com sabedoriae instruo com educao.

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    Esse era para Sneca um dos grandes paradoxos da formaohumana, uma vez que o fato de o discpulo assimilar contedosmltiplos sem ser por eles educado configurava-se como umatragdia. Por isso, ele estabeleceu a distino entre o homemdouto e o homem bom.

    Mesmo destacando a retido, possibilitada pelo saber, Snecano deixou de lembrar os limites por ele estabelecidos, pois somenteadentravam seus domnios aqueles que conseguiam capt-lo e respei-t-lo em sua plenitude. Essa condio representava a chave da forma-o liberal. Era necessrio se libertar das coisas inteis para que oesprito, num processo de busca, se fartasse da verdadeira sabedoria.

    Segundo Sneca esclareceu a Luclio, o seu discpulo preferido,muitos dos contedos ensinados serviam apenas para aguar oengenho humano, e lamentou-se: Para que pretendes tu que eu tefornea uma cincia intil?. Provocou, assim, uma solicitao dodiscpulo: Ajuda-me, ento, a ser capaz de desprezar os prazeres ea glria, ensina-me apenas o indispensvel (Cartas 19, 17-18).Isso o levou a inform-lo o que se propunha a fazer nesse sentido edestacar as avaliaes que poderiam ser feitas quanto ao exercciodos conhecimentos de carter meramente intelectualista.

    Caro Luclio, com estes subtis raciocnios, no conseguimosmais do que dar a aparncia de exercitar o engenho combagatelas e empregar os nossos cios em discusses totalmenteestreis. Vou, no entanto, satisfazer o teu desejo e expor aopinio da nossa escola sobre o assunto (Cartas 113, 1).

    Assim, mostrou a Luclio a virtude do filsofo e da Filosofia eos benefcios que um e outro poderiam trazer aos seus convivas eadeptos:

    De facto, quem convive diariamente com um filsofo obtmsempre algum beneficio: ou o seu carter se aperfeioa, setorna mais apto a ou aperfeioar-se. O poder da filosofiabeneficia inevitavelmente no s os iniciados, mas at os quea conhecem ocasionalmente (Cartas 108, 4).

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    O filsofo, como homem, deveria tambm se preocupar consigomesmo, mas sua preocupao primeira deveria ser promover epraticar a virtude, convertendo-se em exemplo. Por sua vez, aFilosofia deveria resultar num verdadeiro prazer para o homem:ser uma fonte segura de realizao pessoal e, ao mesmo tempo,conduzi-lo a um objetivo maior, o bem pblico.

    Da, para Sneca, no ter sentido um ensino que no fossecomprometido com a promoo do discpulo e da sociedade. J nocaso da Filosofia, existia, segundo ele, a indissociabilidade entre ateoria e a prtica, que pouco ou em nada se relacionava com asutileza intelectual (Cartas 111, 2).

    De acordo com esse raciocnio, a educao deveria estarfundada sobre bases reais, que fossem comuns a todos os homens,indistintamente, e no sobre algo abstrato (VON RINTELEN, 1965).Por esse motivo, Sneca considerou que o xito do processoeducativo passava pelo que se ensinava e pelo que se assimilava.O que explica a importncia que ele deu elaborao de umcurrculo, opo por contedos de maior possibilidade formativa,os quais, por extenso, rompessem com as matrias que nolevavam a esse propsito.

    medida que pontuou as suas motivaes, no se limitou adenunciar a sutileza intelectual como obstculo formaohumana. A primeira delas dizia respeito s distraes e aosdivertimentos, os quais, mesmo que pudessem oferecer algumbenefcio, no rompiam com a sua condio de banais e inteis.

    Apesar de a sutileza intelectual se apresentar como um dosobstculos ao processo formativo, este seria facilmente dominado,desde que se estabelecessem objetivos precisos e que se tivesseclareza das dificuldades para a sua realizao.

    A segunda motivao apontada por Sneca, a qual eleconsiderava muito perigosa, tinha origem em uma das tendnciasinatas do homem: sua curiosidade insacivel, sua busca contnuapor aprender, tendo em vista desvendar problemas, uma vez que,em muitos casos, isto levava especializao.

    Esse perigo seria afastado com a adoo de algumasprecaues, como, por exemplo: realizar criteriosa seleo das

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    matrias e dos contedos a serem estudados e estabelecer relaesentre as atividades a serem realizadas e a formao pessoal. Snecaconvocou Luclio a praticar esse exerccio: Corrige os teus costumes[...] tirando de tudo proveito para a tua formao moral, para arepresso das paixes nocivas. Estuda, em suma, no para sabermais, mas para saber melhor (Cartas 89, 18-23).

    O entendimento da dificuldade de dominar essa tendncianatural do homem leva Sneca compreenso, e no apenas crtica dos possveis deslizes do seu discpulo.

    A terceira motivao de Sneca para combater a sutilezaintelectual dizia respeito ao grave fato de esta ser uma opopessoal ou decorrente de orientaes enganadas, situaes quecomprometiam o aperfeioamento humano. Mas nem sempre oresultado satisfatrio, ou porque os mestres nos ensinam aargumentar e no a viver, ou porque os discpulos procuram osmestres no com a inteno de cultivarem a alma, mas sim deaguarem o engenho (Cartas 108, 23).

    Essa linha de raciocnio no dispensava nem mesmo a Filosofia,com todo o seu contedo formador e transformador, de ser tratadade forma serena e moderada.

    Nesse acaso, a denncia senequiana no se referia multiplicidade e inadequao dos conceitos que se propunha aensinar, mas direo que a educao tomava quando mestres ediscpulos ensinavam e aprendiam matrias e contedos quetinham por fim a superficialidade. Deste modo, o cultivo da culturasomente seria concretizado se o objetivo e a inteno fossemformativos, ou seja, se houvesse consonncia entre a teoria e aprtica.

    Nessa reflexo, Sneca deu a conhecer os ingredientes dareceita de uma educao de aparncia e ineficaz: o primeiro,aprender por dinheiro; o segundo, desvincular instruo deformao. Nesse engano encontravam-se aqueles que tecnificavama cultura e a Filosofia e as transformavam em disciplinas especficasdesvinculadas da educao moral (GARCA GARRIDO, 1969).Contra isso, Sneca alertou: Ouve este exemplo do mal que podefazer a sutileza excessiva, e de como pode ser nociva verdade

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    (Cartas 88, 43). Em continuidade, conclamou o nosso pensador: da maior importncia a inteno com que se aborda umassunto (Cartas 108, 24). Para concluir, afirmou quo enganosoera o estudo com os olhos dos gramticos (Cartas, 108, 28).

    Da mesma forma, tendo em conta a necessidade de se falarmais cuidadosamente do que se vive, Sneca combateu os que assimensinavam e os que assim aprendiam, especialmente aqueles que,de uma forma mais grave, transformavam a Filosofia em Filologia(Cartas 108, 24), em v verbalidade, em virtuosismointelectual, pouco comprometido com a educao voltada para aperfeio.

    A crtica de Sneca incidia sobre duas situaes em que esseprocesso ocorria: o crescente interesse pela Dialtica, que viabilizavaas argumentaes distorcidas, e o aumento do cepticismo, no quala dvida apresentava-se como a nica atitude do sbio.

    Na perspectiva senequiana, os cpticos eram piores que osdialticos: Nem poderei dizer quais so os que mais me irritam,se aqueles que nos no permitem saber nada, se os que nem sequernos deixam saber que nada sabemos! (Cartas 88, 46).

    Nessa circunstncia, a nica atitude a ser tomada, segundoele, era desconsiderar os postulados que desqualificavam overdadeiro conhecimento.

    O que tambm poderia levar ao ensino verbalista seria a adoode um grande nmero de discpulos, uma vez que istocomprometeria a ateno a ser dispensada a cada um,inviabilizando um ensino diferenciado. Por isso, ele proclamou:Para mim, basta-me que sejam poucos, basta-me que haja s um,basta-me que no haja nenhum (Cartas 7,11). Na ltima opo,cabia ao sbio a formao da sua prpria pessoa, a autoformao,a qual tinha prioridade. Esse esforo pessoal em busca doaperfeioamento poderia se converter num elemento de atraodo interesse do discpulo, despertando-lhe a vontade de progredir.

    Nesse sentido, era preciso conjugar a luta asctica com aspossibilidades, as caractersticas e o temperamento da cadadiscpulo, uma vez que era fcil tornar imposio aquilo que deveriaser apenas um exemplo. Assim, no havia avano perfectivo sem

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    luta e sem esforo. Porm, esse direcionamento deveria ser umadeciso pessoal, e no uma imposio, que poderia levar ainteresses alheios vontade do discpulo, por extenso, a umaformao distorcida.

    Para Sneca, o conhecimento que no estivesse vinculado sabedoria, que no estivesse comprometido com a operatividadedo hbito sapiencial, no era um conhecimento verdadeiramenteracional (ALONSO, 1966).

    Assim, ele mostrou a necessidade de o discpulo se prepararpara enfrentar as distores provocadas pelos corruptores dacultura. Era preciso conhec-las, sem, no entanto, exercit-las.

    No nego que se deva dar uma olhadela ao estudo da dialtica,mas uma olhadela apenas, uma saudao, por assim dizer,feita c de longe e com este nico propsito: o de no tomarmoso que no passa de palavreado como se fosse expresso dealgum grande e profundo pensamento (Cartas 49,6).

    Por outro lado, essa opo implicava uma conscincia claradas dificuldades a serem encontradas e do perigo que issorepresentava para o postulante, especialmente a possibilidade deele ser cooptado.Entretanto, quando o discpulo dominava as suaspaixes e se encaminhava progressivamente a um peculiar saberde tipo soteriolgico, no muito extenso ou sutil, que Snecaqualificou de sabedoria, a regenerao em que consistia a educaono dispensava essa mesma dimenso intelectual (REDONDO eLASPALAS, 1997).

    Sneca no tinha dvidas: os deuses no haviam agraciado ohomem com a sabedoria; o acesso aos domnios desse bemrequisitava esforo e dedicao pessoal, at mesmo por parte dosprivilegiados pela natureza.

    A partir dessa formulao, novas questes se colocam: pode-se pensar que Sneca advogou a eliminao, no processo formativo,do que no estivesse vinculado racionalidade? A educao, paraele, quando respaldada pela razo, viabilizava obstculos aosimpulsos irracionais?

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    As respostas foram oferecidas por Sneca da forma seguinte:A educao exige o mximo de diligencia, para que sejaaproveitada ao mximo, fcil ajust-la aos espritos ternos, comdificuldade se aproximam dos vcios que crescem em ns(SNECA, De la clera, II, 18, 2, 2000).

    Fica evidente, assim, que, para ele, o processo educativotambm recebia a influncia das mltiplas manifestaes datmpera humana, uma vez que a entendia como um conjuntoharmonioso de carter notadamente corporal, portanto,inteiramente ligado natureza fsica do homem.

    Tanto a tmpera quanto a racionalidade estavam relacionadas natureza humana, e a educao no pode pretender a suaeliminao da sua esfera de ao. Modificar a natureza certamente difcil, como no fcil alterar os elementos j constitudos noshomens (SNECA, De la clera, II, 20, 2, 2000).

    Em face disso, no processo educativo, quando seacompanhava a natureza, no se poderia negar esse aspecto, umavez que ele era inerente natureza de cada homem em particular.Dever-se-ia, portanto, ordenar adequadamente os dois aspectosdo homem, submetendo o inferior ao superior, a sua alma racional.

    Evidencia-se, assim, que a preocupao senequiana era apontaro caminho para seguir a natureza. Disso decorre a abrangnciada sua reflexo, que diz respeito ao homem em sua totalidade,corpo e alma: O nosso objectivo , primacialmente, viver deacordo com a natureza. Ora antinatural torturar o prprio corpo(Cartas, 5, 4).

    Fica explcito em Sneca que o processo educativo no podeabdicar e/ou desconhecer a materialidade humana como objetode sua ao, mesmo que alocada em segundo plano: Cultiva,portanto, em primeiro lugar a sade da alma, e s em segundolugar a do corpo (Cartas 15, 2), em vista de sua tendncia naturalde submeter o homem.

    Revestido desse entendimento, o processo educativo deviapossibilitar ao homem os instrumentos necessrios para querompesse com a condio a que estava submetido e buscasse obem maior para o qual nasceu: a felicidade. Como resultado desta

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    vida feliz, brota uma tranqilidade plena, uma verdadeiraliberdade.

    Em suma, esse o entendimento senequiano, tanto em relao possibilidade de a educao encaminhar o homem para aperfeio quanto necessidade dela para que ele atinja essa ddivadivina. Segundo ele, esse o objetivo e a meta do homempreocupado em promover a sua racionalidade e, por meio dela ede seu exemplo, chegar humanidade.

    Outro trao da educao, conforme concebida por Sneca, sua permanncia: a sabedoria no se esgota, nunca tarde paraaprender.

    Esse princpio da educao permanente no pode sertraduzido como obrigao de permanecer para sempre na escolaou como a possibilidade de nunca se obterem os resultadoscontemplados nos objetivos traados para se atingir a perfeio e,assim, de se estacionar em uma infncia moral e espiritual. O opostoaconteceria se a dinmica fosse diferenciada e bem orientada.

    Este entendimento levou Sneca a exortar Luclio a se dedicaraos estudos enquanto ainda jovem, para que no se repetisse nelea sua histria: aprender quando velho. O aprendido na juventudepodia ser aperfeioado na velhice (Cartas 88,35).

    Nisso consiste o segundo motivo para que ele considerasse aeducao como algo permanente: alm de a sabedoria no seesgotar, ela no era obtida plenamente (REDONDO e LASPALAS,1997). Por isso, ele conclamou Luclio a seguir o caminho em suadireo, tendo em vista uma vida digna.

    No fundamental, para Sneca, nada poderia substituir aeducao dirigida pelo prprio discpulo, o que o levou a sentenciar:A virtude no se conquista por procurao (Cartas 94, 5). Paraalm, concluiu: Um esprito virtuoso no coisa que se peaemprestado ou se possa comprar. E mesmo que existisse venda,receio bem que no encontrasse comprador. O vcio, esse todos osdias tem quem o adquira (Cartas 94, 8).

    Desta forma, Sneca concebia a virtude como a disposio parase atingir o aperfeioamento total da parte racional da alma. Pormeio da razo ocorria o aperfeioamento das aes livres, de forma

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    que, por meio da virtude, o homem se inseria na harmonia danatureza (LEN SANZ, 1997).

    Nesse sentido, a virtude era o resultado da busca pessoal doconhecimento filosfico e este era um fator de transformao queno poderia ser aprendido sem o consentimento do discpulo.

    Sneca punha em destaque a capacidade do homem de seautodirigir e, sustentado pela moral e pela razo, reconhecer-secomo parte integrante de um todo harmonioso (ULLMANN, 1996).

    Da a necessidade do exerccio da vontade na busca do processoautoformativo. Aquilo que pode fazer de ti um homem de bemexiste dentro de ti. Para seres um homem de bem s precisas deuma coisa: a vontade (Cartas 80,4).

    Essa atitude assumia maior dimenso quando o objetivo era oprogresso moral, independentemente dos problemas e dasdificuldades a serem enfrentadas ao longo da sua realizao. [...]E ento? dirs. Tem sido essa a minha vontade (Cartas 34, 3).

    Respaldada pela razo, a vontade ganha fora decisria,porque distingue o moral do imoral, indica o caminho do bem edesvia do mal, numa dinmica facilitadora da felicidade. EmSneca, o fato de o homem trazer consigo, ao nascer, as condiespara o bem no o dispensa da sua vontade para desenvolv-lo(OLIVEIRA, 1998) e efetiv-lo, especialmente quando se tem emconta que se trata de uma determinao da natureza. S h umasoluo, portanto: ser firme e avanar, sem descanso, mas grandeparte do progresso consiste na vontade de progredir (Cartas 71,36).

    Ao aceitar o destino, a vontade contribui para a harmoniauniversal; o homem, como parte integrante do universo, favorecido por essa harmonia, uma vez que participa da ordenaocsmica.

    O esforo do homem para chegar a esse entendimento permiteque ele se aproxime da divindade e do seu prprio querer, o que,para Sneca, significa a unio entre a vontade humana e a vontadedivina (OLIVEIRA, 1998). Esta relao no permite separao, poisa harmonia universal est a ela vinculada.

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    O sujeito da Educao

    Em face das muitas dificuldades que particularizam a escaladarumo perfeio, pode-se pensar que, para Sneca, o seu acessoestava reservado a homens privilegiados. Existiria uma tendnciade alguns homens a obter esse ideal ou, na dinmica oposta, algunsnaturalmente incapazes para atingir esse bem.

    certo que, em suas anlises, Sneca reconheceu a existnciade almas nobres, com caractersticas especiais e com excelentedisposio. No entanto, ele prprio considerava isso insuficiente parase encontrar a prpria perfeio, uma vez que poucos a realizavam.

    Isto sugere a existncia de uma predisposio para enfrentarobstculos, particularmente os referentes ao prprio homem, comoa pouco ajuda mtua entre eles e o fato de uns no serem exemplopara os outros. Para Sneca, a ajuda mtua uma exignciaimposta pela natureza, o seu mais imediato mandamento, e, paraalm dela, reflete-se no mbito racional humano (VON RINTELEN,1965). A no-realizao desse projeto afetava diretamente aconcretizao da perfeio: so uns para outros maus exemplos:todo aquele que segue o que est frente, mesmo quando este tomouequivocadamente o caminho, no ter desculpas, uma vez queextraviou a direo de todos (SNECA, De la Clera, II, 10, 3, 2000).

    Por esse motivo, o desejo inicial de quem almeja chegar conquista de si mesmo no pode ser irreflexivo, pelo contrrio,deve ser capitaneado pela reflexo, para no ser atrapalhado eatropelado. Esses eram os motivos pelos quais muitos daqueles queinvestem na busca da perfeio, sem esperana e intimidadosdiante do fracasso, abandonam os seus projetos.

    Destarte, no suficiente a vontade inicial; isto no deixa deser bom, mas faz-se necessria uma vigilncia constante dasdificuldades que se colocam no processo, e Sneca alertava seudiscpulo para elas: O lao mais forte a prender-te prtica davirtude este: comprometeste-te a ser um homem de bem,confirmaste-o por um juramento. Se te disserem que se trata deuma militncia ligeira e fcil esto troando de ti (Cartas 37,1).

    Deve-se estar ciente da necessidade da luta contra o desnimo

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    que, cedo ou tarde, se far presente. A arma contra esse inimigoimplacvel dotar-se de um inquebrantvel esprito deperseverana, aliado a uma efetiva autoconfiana e motivado pelacerteza de que a sua natureza tem o dom da perfeio.

    Para a realizao do supremo bem, cabe ao homem o encontroconsigo mesmo. Essa condio conquistada mediante um processode interiorizao, de um permanente enfrentar-se com as prpriaslimitaes, com o que nelas se apresenta como antinatural: umaascese purificadora. O bem supremo configura-se no juzo e nasatitudes de uma alma perfeita, ou seja, quando j se consumou asua caminhada (USCATESCU, 1965).

    Estas consideraes apontam para duas questessignificativas. A primeira diz respeito ao carter de urgncia doseu programa educativo, justificado pelo estado de enfermidadeque ele observava na humanidade. A segunda refere-se aosdestinados a serem beneficiados por esse programa, os quaisdeveriam se converter em multiplicadores e em exemplo de homensque respondiam s necessidades da sua sociedade e do seu tempo.

    Com base nessa premissa, Sneca procurou mostrar aos seusdiscpulos a importncia do critrio de seleo, ou seja, de buscar,antes de tudo, aqueles que se apresentassem mais propensos aoideal de conquistas, pois no se podia esquecer que o processoformativo demandava tempo e dedicao. Por isso, no se podiaconsiderar como discpulo um simples conhecido ou um amigo,mas sim, sem o atropelamento da pressa, aquele que tivesse ascondies necessrias para s-lo. Caso o mestre procedesse de outromodo, demonstraria falta de respeito para com a natureza daqueleque se pretendia formar.

    O mesmo erro tambm cometeria o mestre que exercesse umaatitude autoritria com o discpulo, justificando-a pela necessidadeda rapidez na realizao dos objetivos traados. Neste casodesconhecia-se que o acesso perfeio pressupe esforo pessoale que o mestre no era nada mais que um guia nesse processo. Issono significava que se devia dar ao discpulo liberdade plena,porque, mais cedo ou mais tarde, ele seria afetado pelas inmerasdificuldades interpostas na caminhada.

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    No obstante, sob dadas circunstncias transitrias, Snecaaceitava que se empregasse certa fora coercitiva: A certos doentesbasta que se lhes indique os remdios; outros tm de ser obrigadosa tom-los! (Cartas 27, 9). Desse modo, a formao apresentavagraus diferenciados de ao: a ao de guia e a de ajuda enrgica,que podia chegar coao. Nessas duas situaes, o mestre estavadiante de homens que no bastavam a si mesmos, porm, entreesses podiam ser identificados aqueles com mais capacidade doque outros. Assim se explica que o programa educativo de Snecaesteja voltado especialmente aos primeiros, que, convenientementedescobertos e selecionados, dariam as condies para a realizaode um trabalho educativo mais efetivo e eficiente: Se bemobservarmos, os mais pequenos pormenores podem serelucidativos, em qualquer situao. Por exemplo, o mnimo gestopode servir de indcio da moralidade das pessoas (Cartas 52,12).Efetuada a seleo, fazia-se necessrio, por parte do mestre,adaptar-se s caractersticas pessoais de quem tinha em vistaorientar, pois Sneca acreditava que certos espritos so abertos ereceptivos, outros precisam, como si dizer-se, de ser modelados mo, de gastarem nas fundaes o melhor do seu esforo (Cartas52, 6). O mestre no podia ter dvidas: mesmo que a sua missofosse mais difcil, o segundo grupo merecia especial ateno ereconhecimento pelo esforo, dedicao e persistncia em alcanaros seus objetivos formadores.

    Para Sneca, os melhores discpulos buscavam a sabedoria comabsoluta pureza de inteno. No se podia duvidar daqueles quesob presso poderiam ser levados para o caminho do bem e quenecessitavam no apenas de um guia, mas de algum que osamparasse com palavras e aes, e at mesmo que os forasse aprosseguir nessa direo (Cartas 52,4).

    Esse procedimento formativo defendido por Snecadistanciava-se de uma educao de massa e ao mesmo tempoimplicava um tratamento individualizado (GARCA GARRIDO,1969). Mesmo com essa postura, Sneca no negou que a perfeioera um bem acessvel a todos os homens.

    Isto explica o seu entendimento de que as possibilidades para

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    atingi-la eram uma ddiva dos deuses a todos os homens,indistintamente de condies sociais, polticas e econmicas, o queno dispensava o esforo pessoal de cada um para realizar oprocesso educativo. Assim, nas palavras de Sneca, o homemdeveria romper com os vcios e as paixes e retornar limpo ao seulugar de origem na natureza (Cartas 94, 55-56 e 68).

    Com base nessas reflexes, Sneca se contraps ao Mestre doJardim: Epicuro diz que todos estamos, ao abandonar a vida, nomesmo ponto em que estvamos ao nascer. De forma diferente,Sneca afirmou: Se somos piores ao morrer do que ao nascer, odefeito nosso, no da natureza. Esta teria o direito a queixar-sede ns: Que isto: Eu gerei-vos sem ambies, sem medos, semsupersties, sem maldade, sem qualquer outro vcio do mesmojaez. Sa, portanto, tal como entrastes! (Cartas 22, 15).

    Motivo por que, para Sneca, quando o homem, em suas aes,entrava em dissonncia com a natureza, levada pelos vcios epaixes, e chegava ao estgio da irrecuperabilidade, aresponsabilidade era inteiramente sua e daqueles que o cercavamno seu meio social.

    No entanto, Sneca hipotecava em favor do homem apossibilidade de reverter o caso, desde que voltasse a um exerccioresponsvel, contnuo e persistente em busca da perfeio.

    Por serem iguais, todos os homens eram convidados a buscara sabedoria. Este bem no era exclusivamente de homem algum,assim como ningum chegava aos limites da perfeio.

    No havendo sbios definitivamente distintos uns dos outros,cada homem estava qualificado a atingir determinado grau desabedoria, o que exigia uma dose de humildade para aceitar apossibilidade de no alcan-la em seu estado pleno e para lutar ese aproximar cada vez mais do seu objetivo; no pior dos casos,lutar para no se afastar do que estava traado (GARCABORRN, 1966).

    As reflexes senequianas, que levaram sua antropologiapedaggica, defendiam que o homem tinha sido dotado pelanatureza das condies necessrias para se libertar da escravidoa que estava submetido. O resultado disso era a sua capacidade

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    para se educar, para buscar a perfeio, independentemente dacondio social, uma vez que suas origens eram vinculadas sdivindades.

    Nesta perspectiva, o sentido de perfeio, para Sneca, eraum atributo essencial da alma, conforme est explcito em umadas suas clebres sentenas: Uma alma assim tanto pode encontrar-se num cavaleiro romano, como num liberto, como num escravo(Cartas 31, 11).

    Essa preocupao com a alma como fator que promovia asemelhana e a aproximao entre os homens, num carteruniversalista, deu a Sneca as bases para defender sua posio deque a educao era um bem que deveria ser extensivo a todos:nem mesmo escravos e executores de trabalhos servis poderiamser excludos dela.

    A partir dessa orientao, a alma requisitava que a educaotranspusesse as barreiras sociais que separavam os homens,convertendo-os em um corpo nico e universalizado.

    Esse posicionamento de Sneca pode ser entendido como poucocomum naquele momento histrico, particularmente porque setratava de uma sociedade que negava o trabalho mecnico edesconsiderava os setores sociais inferiorizados, responsveis pelaproduo da vida.

    Mesmo no comportando uma dimenso revolucionria, essadiscusso no deixou de ser uma contribuio da Antiguidade aohomem contemporneo.

    Tambm fundamentado no estoicismo, Sneca afirmou que anatureza humana, o ser do homem, trilhava etapas ou graus, emseu processo formativo, em busca da sabedoria.

    As etapas do conhecimento

    Nesta discusso, Sneca situava no primeiro grau os homensque, mesmo no tendo atingido sabedoria, encontravam-seprximos desse bem maior: aqueles que j tinham se libertado daspaixes e dos vcios e angariado conhecimentos significativos paraesta conquista, o que, no entanto, no os capacitava para dar

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    seqncia sua caminhada com confiana plena, ou seja, eles noestavam prontos para o exerccio do bem supremo. Emcontrapartida, embora no tivessem ainda uma noo clara dasua prpria pessoa, em sntese, no soubessem que sabiam, oretorno ao antigo estado de escravido j no era uma ameaa,no era possvel um retrocesso.

    Segundo o pensador, muitos outros filsofos esticos incluamnesta classe os homens que j haviam se libertado das doenas daalma, mas ainda estavam presos a paixes e, por isso, ainda noestavam seguros. Concluindo, os homens mais dedicados aosconhecimentos j tinham se libertado das doenas da alma, mas,por ainda estarem prximos da perfeio, estavam tambm sujeitos ao das paixes (Cartas 75, 9-12).

    Este estgio pressupe o encontro com a Filosofia, que levavaao amor sabedoria.

    No grau intermedirio, Sneca situava aqueles que, emborativessem conseguido se libertar das principais enfermidades daalma e das paixes, ainda no tinham alcanado o estado definitivoe pleno de tranqilidade e estavam sujeitos a recadas.

    Neles se observava um significativo aprimoramento doexerccio intelectual e contemplativo, regado, segundo Sneca, por[...] uma favorvel disposio natural e de uma intensa e assduaaplicao ao estudo (Cartas 75,13).

    No terceiro grau, ele identificava os homens que tinham selibertado de um nmero considervel de vcios, mas no datotalidade deles. Libertaram-se da prtica da avareza, mas no daao da ira; o prazer j no os provocava, o que no aconteciacom o esprito de ambio; estavam imunes dos desejos, mas nodo temor: a morte j no os amedrontava, mas temiam a dor fsica(Cartas 75,14).

    A referncia para esta categoria era a maturidadecontemplativa, prpria daqueles que tinham avanado nos estudos.

    No desenvolvimento deste pensamento, Sneca foi cauteloso,na medida em que no identificou outros graus de conhecimento,deixando espao aberto para lutas, buscas e conquistas em nvelpessoal. Em particular, aconselhava que o homem sbrio, ao

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    alcanar um dos seus objetivos, no agisse como quem j tivesseatingido o objetivo definitivo. Por esse motivo, no se sentiriaconstrangido em se incluir, ou pelo menos almejar, o terceiro grau.

    A possibilidade de novas conquistas, como apontava Sneca,indica quo insensata e pretensiosa era a postura daqueles que,por excesso de confiana, revestiam-se de intranqilidade por nocontemplarem com clareza o caminho da perfeio e, desta forma,mostravam que, neles, a sabedoria ainda no se fazia presente emnvel suficiente. A postura do sbio, ao contrrio, era de quem,pautado na tranqilidade, na persistncia, na pacincia e nacerteza do bem a conquistar, sabia quais os caminhos a seguir,numa atitude que rompia com a auto-suficincia, condenada porSneca (VON RINTELEN, 1965). No se quer dizer com isto queSneca induzia a uma atitude passiva e conformista: para ele, faziaparte do homem dedicado a ser sbio, querer buscar sempre maiso conhecimento e a perfeio.

    Estas consideraes eram dirigidas especialmente aos nefitosda sabedoria, diante da excessiva ambio de todos os iniciantes edo fato de que a morosidade na obteno da sabedoria poderiaoportunizar um desnimo irreversvel.

    Segundo Sneca, as baixas neste processo poderiam ser emgrande parte evitadas com o acompanhamento de um guiaconhecedor do difcil caminho a ser seguido, conforme orientou oseu irmo Novato da necessidade de se escolher um perito,conhecedor profundo do caminho a ser seguido, ante asdificuldades que particularizavam esses itinerrios:

    O recurso de um modelo

    Para Sneca, o modelo levaria ao conhecimento das pegadasindicativas da direo a ser tomada, ajudaria a identificar omomento de avanar e o momento de parar (PRADO, 1946, p.47), de modo a se atingir o objetivo proposto, a realizao do bemmaior, a perfeio. Ou seja, o recurso de um modelo possibilitavasegurana para percorrer esse caminho consciente eacertadamente: Devemos deixar-nos guiar enquanto ainda

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    estamos aprendendo a guiar-nos por ns mesmos. Um tal auxliodeve ser dado ao nosso esprito enquanto aprende a guiar-se porum modelo [...] (Cartas 94, 50-51).

    De acordo com Sneca, a Histria generosa nesse sentido, eoferece humanidade a memria de homens cujas existncias soverdadeiros exemplos e que esto sempre disposio para atenderaos que a eles recorrem (Sobre a brevidade da vida XIV, 1-2-5).

    Com isto, Sneca revela a perenidade dos valores espirituais emostra que todos os homens de boa vontade tm condies deviajar para fora do seu tempo, aprender com as grandespersonalidades de qualquer poca, entrar em contato com asociedade universal dos espritos e pensar e discutir com eles ascoisas eternas. Este espetculo oferecido pela Histria no chamavaa ateno apenas daqueles preocupados com as aes externas.Para o homem envolvido com a contemplao, a Histria no selimitava ao vai-e-vem das aparncias; sob os acontecimentossucessivos e acidentais se descobria o permanente e o substancial,o que havia de eterno no homem, no seu pensamento e no ser decada um (MOREAU, 1966).

    Esta volta ao passado para dialogar com aqueles que, emSneca, foram os melhores espritos, tinha a propriedade decontribuir para a plenitude da vida. Esse era o verdadeiro caminhoda sabedoria, da dimenso da humanitas no ensino de Sneca.

    Apesar deste contedo fecundo encontrado nos grandeshomens, Sneca recomendava que, quando o discpulo se sentisseseguro em relao aos seus propsitos e s suas conquistas, deveriase afastar do seu guia, por j estar em condio de dar continuidade sua caminhada evolutiva rumo perfeio.

    Os fatores do aperfeioamento humano

    Em Sneca, a perfeio, por ser uma possibilidade facultadaao homem, somente acontecia por meio de um processo educativoque tinha em vista a realizao da natureza racional do homem.A perfeio era identificada como ideal, como meta a ser atingida:mesmo que a natureza humana fosse apresentada de forma

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    normativa, tambm era concebida como fora que plasmava ohomem no seu ser, tanto na esfera racional como natemperamental. Esta condio prpria da natureza deveria serconquistada no dia-a-dia, com base em suas prprias e graduaisconquistas racionais.

    Nesta caminhada, era necessrio preservar o discpulo deambientes inadequados e nocivos, bem como realizar uma pacienteeliminao de hbitos no compatveis com a perfeio. Para isto,bastava que o homem assentisse, com sinceridade de propsitos,na manifestao de suas potencialidades naturais, ou seja, narealizao do processo formativo.

    Nessa direo, o principal objetivo do mestre e do discpulodeveria ser a criao de condies que favorecessem o dinamismoperfectivo inato no homem. com esse sentido que Snecaaconselha Luclio: [...] com todo o empenho que nunca deixesesmorecer ou esfriar o mpeto que te vai na alma. Conserva-o, d-lhe forma, de modo a que esse mpeto de hoje se torne configuraopermanente da tua alma (Cartas 16, 6).

    Alm desse conselho, ele mostra a importncia da ao dohomem para favorecer o despertar dos dons com que a natureza oagraciou.

    Esta, para ele, no era uma atividade difcil de ser realizada,no era um obstculo a ser transposto, principalmente quando seera jovem. A nica exigncia era criar as condies para o seudesabrochar.

    Nem por isto, em Sneca, a condio de sbio era exclusividadedo ancio. Um jovem, mesmo em fase de formao, mas com vigorna busca da perfeio, tinha tanto ou at mais mrito do que umhomem velho alquebrado pela luta contra seus vcios recorrentes.Neste caso, por suas conquistas pessoais, pode-se admitir que essejovem tenha acesso perfeio, sabedoria (GARCA GARRIDO,1969).

    No geral, no pensamento senequiano, o homem havia recebidoda natureza o talento para o essencial, ou seja, para a formaomoral, o que, por seu turno, implicava o esforo pessoal para cadaum se educar. Essa exigncia era tambm extensiva aos mais

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    agraciados pela natureza, uma vez que o processo formativo nose realizaria ao acaso ou pela ao externa ao homem: Muitasvezes um bom material permanece inutilizado por falta de quem otrabalhe (Cartas 47, 16). Ningum bom por obra do acaso; avirtude aprende-se (Cartas, 123, 16); por outro lado, Uma vezaprendidos, os bens da sabedoria permanecem para sempre nanossa posse (Cartas 50, 8).

    O modo pelo qual Sneca entende a educao tem comoobjetivo destacar que nesse processo o fundamental era modelar ocarter e a personalidade. Isto pressupunha exigncias edificuldades: poucos o realizavam em sua plenitude. Da anecessidade de se investir no esforo pessoal para se educar eaceitar, com humildade, a ajuda exterior: Lutemos, portanto, semtemer pedir o auxlio alheio (Cartas 52, 2-3-6-7).

    Um exemplo da ajuda prestada pelo mestre, assim comodaquela possibilitada pelo ambiente, reside naquilo que Snecadenominou de preceitos, os quais favoreciam, em grande medida,o surgimento de princpios ou convices no discpulo. Essespreceitos refletiam a grande influncia exercida pelo meio paraimplantar princpios sem que o discpulo se esforasse por entendere praticar a sabedoria.

    Fins e objetivos da Educao

    Numa perspectiva teleolgica, a felicidade apresenta-se nopensamento senequiano como o fim da vida humana e, porextenso, como o fim da educao. No entanto, necessrioconsiderar que a felicidade resultado direto da virtude: apenasos bons, os que investem na virtude em alto grau de perfeio, sofelizes. A condio para se alcanar a felicidade viver de acordocom a natureza: somente vivem em retido de vida os que adentramos domnios da sabedoria e, por intermdio dela e na suaproporo, atingem a perfeio, a virtude e a felicidade. Felicidade,virtude, perfeio, retido de vida e sabedoria so os cincoelementos fundamentais e indissociveis da educao em seu fimltimo: a formao do homem ideal, o sbio.

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    A esse fim ltimo do processo formativo senequiano, noentanto, inerente tambm a dificuldade de sua realizao, namedida em que se trata de um ideal que, segundo Sneca, alcanado, de tempos em tempos, por alguns homens dotados detraos de excepcionalidade: Olha que um homem de bem no coisa que surja assim to depressa! E sabes o que eu entendo aquipor homem de bem? Apenas o de segunda categoria, porque ode primeira como a fnix, que s aparece uma em quinhentosanos (Cartas 42, 1-2).

    Mesmo com as dificuldades que se colocam no processoformativo, Sneca acredita que o ideal de sbio pode ser alcanado.Entretanto, para inviabilizar possveis presunes, Sneca prefereapresentar o sbio no como aquele que atingiu o objetivodefinitivo, numa perspectiva idealista, conforme proposto peloestoicismo (GARCA BORRN, 1966), mas como um homeminteiramente ligado, plenamente envolvido, perfeitamenteengajado no caminho que um dia escolheu para trilhar. O sbio,ainda que assoberbado de saber, continua no seu caminho, sempreem busca de progresso, o que o torna perfeito. Isto explica que opice da perfeio seja algo que ele tem sempre em mente, olhandosempre de baixo para cima, nunca de cima para baixo. Tambmlhe causa admirao a sabedoria em outros, particularmentenaqueles que foram laureados com a ltima ddiva da sabedoria,uma morte segundo os cnones esticos (GARCA GARRIDO,1969). Sneca prope tambm a superao da auto-suficincia dosbio estico.

    Mesmo que se atingisse o estgio mximo do conhecimento, oprocesso formativo no estaria consumado, uma vez que, com essaconquista, abrir-se-iam novas possibilidades para o que seriaconsiderado como perfeio, o que, por seu turno, implicariatambm a possibilidade de novos obstculos.

    No processo de aperfeioamento, que, em ltima instncia,leva aquisio da virtude e, com ela, conquista da felicidade,assumem papel decisivo a liberdade e a filosofia, elementos queformam a medula da ordem moral. A essncia de uma condutamoral tem por base a liberdade e o conhecimento: sem o

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    conhecimento no se conquista a liberdade e sem liberdade no sealcana a moralidade. Portanto, no se tratava da liberdadegarantida pelo direito pblico, mas da liberdade como ddiva dodireito natural, ou seja, da liberdade, da independncia, daautonomia advinda do interior, libertadora do medo da morte, dapobreza, dos vcios e de tudo o que se origina dos desejos do corpo.No se trata, tambm, de uma liberdade de carter psicolgico,subjetiva ou relacionada s posses e necessidade de atender ssuas exigncias. A liberdade com que Sneca brinda a humanidadesomente a Filosofia pode oferecer (SANGALLI, 1998). Manifesta-se, assim, a exigncia de uma luta asctica contra as paixes, cujocarter violento de que, com freqncia, se revestem dificulta aaquisio da sabedoria: Ns, esticos, no podemos serdesmoralizados! De que modo ento perguntas tu conseguireilibertar-me? Tu no podes escapar ao inevitvel, mas podes venc-lo! Abre-se caminho fora (Cartas, 37,3).

    Para Sneca, a liberdade poderia abrir fendas em um mundoem que as necessidades eram duramente colocadas na ordem dodia. Ao no se submeter ao da fortuna e saber aceitar as leisimpostas pela natureza, das quais a mais radical e cruel, para onosso pensador, era a degradao a que estava submetida acondio humana: homo servus, homo aeger, homo victus (homemescravo, homem doente, homem vencido), o homem teria condiesde ser plenamente livre.

    A libertao moral constitua, para Sneca, o maior prmioda formao da unitas generis humani (unidade do gnero humano).Este processo deveria ser traado para despertar no individuo oseu impulso para a sociedade.

    O restabelecimento, em parte, da sade da alma, a conquistada liberdade interior o senhorio e a posse de si mesmo so pr-condies para qualquer tipo de formao filosfica. Na empreitadade libertao em que consiste a educao, delineia-se, em seusprimeiros momentos, uma expressiva e singular dificuldade a sersuperada pelo discpulo.

    Em face disso, a ao do discpulo deve ser direta e firme contraos vcios que cerceiam a liberdade. Esse impulso do processo

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    libertador repousa na conscincia do pecado, numa espcie deignorncia tica, pois quem no tem conscincia do pecado noest em condies ou no est capacitado para a correo pessoal.A conscincia possibilita o reconhecimento da culpa, assim como condio da regenerao humana. Esse o motivo de Sneca tersentenciado: o princpio da sade a conscincia da culpa.

    Esse posicionamento de Sneca vale lembrar pode ser oequivalente tico da douta ignorncia socrtica, bem como oprocesso que levava conquista do saber, do vir sapiens (homemsbio) e da conscincia dos prprios limites convertia-se em impulsopara a regenerao da virtude, do vir bonus (homem de bem), e aconscincia do prprio pecado. Para seres um homem de bem sprecisas de uma coisa: a vontade (Cartas 80,4). Esta questoest dependente da vontade, e por isso uma grande parte debondade consiste em querermos ser bons (Cartas 72, 3).

    Constatada essa situao, faz-se necessrio desencadear umaao recuperadora: [...] se h nos olhos alguma impureza queimpea a viso, preciso elimin-la, admito que algum nestasituao no carea de preceitos para ver, mas sim de um remdioque lhe limpe os olhos e remova o obstculo a uma viso perfeita(Cartas 94,18).

    Rigorosamente, pelo entendimento senequiano, ningumchegava ao domnio da virtude simplesmente porque se sentisseatrado por ela; pelo contrrio, fazia-se necessrio ser impelido,projetado para sua esfera. Esse o motivo da sua exortao: Avirtude autntica, porm, s possvel a uma alma instruda,cultivada, uma alma que atingiu o mais alto nvel atravs de umaexercitao (Cartas 90, 46).

    Essas orientaes balizam algumas questes significativas. Aprimeira a alma instruda: ele destacava a necessidade primriada instruo, do ensino e da aprendizagem intelectual; a segunda,a alma cultivada: ele evocava um arcabouo de conhecimentoorientado; a terceira, a exercitao, que ele referia ao esforodespendido pelo homem para alcanar a virtude, o que precisavade um guia.

    Pelo que se pode observar, Sneca, mesmo destacando a

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    existncia de homens de primeira classe, no tem grande apreopor eles. Eis como ele conclui a sua reflexo: Ns no pertencemosaos espritos da primeira escala, e devemos dar-nos por felizes seformos aceitos entre os de segunda (Cartas 52,3).

    Neste caso, Sneca inclua-se, juntamente com Luclio e tantosoutros pares, entre os esforados e conscientes das suas prpriaslimitaes os que constituam a segunda classe. Ele punha sclaras que, no seu projeto pedaggico, a sua filosofia tinha sidopensada para essa categoria de homens que, segundo seu juzo,eram seletos, com notria capacidade.

    Nessa discusso, Sneca no se esqueceu da existncia de umaterceira classe de homens (GARCA GARRIDO, 1969), que tambmmerecia ateno, uma vez que essa posio era acessvel a todos oshomens.

    Na concretizao dessa operao, conforme j foi mencionado,papel fundamental era atribudo liberdade, a qual tinha no corpohumano o seu principal campo de batalha. Para o pensador, oprocesso libertador consistia, pelo menos em parte, em sedesvencilhar das asperezas do corpo, no qual a alma estavaenclausurada como num triste e sombrio domiclio, tornando-se afilosofia um meio libertador.

    Em razo de a alma se encontrar tiranizada e presa no corpo,ela perde a liberdade, cabendo educao, no seu aspecto corporal,tambm responsvel pelo processo formativo, contribuir para asua libertao, respaldada numa orientao bsica, asctica esensvel. Por esse motivo, Sneca ponderava: O estmago no secontenta com sentenas: reclama, e exige ser satisfeito. No ,todavia, um credor muito exigente: ir-se- embora com pouco desdeque lhe ds apenas o que deves, e no tudo quanto podes (Cartas21,11).

    Vale considerar que mesmo este fundo sbrio com que Snecamarcou a existncia humana no afetou o seu otimismopedaggico, cujo fim era no apenas recuperar as antigas virtudesromanas, mas, principalmente, devolver ao homem a conscinciada sua condio de homem, para que pudesse se posicionar demaneira efetiva diante de seu destino, de sua vida e de sua prpria

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    morte (USCATESCU, 1965). Essa conscincia e essa atitude eramcada vez mais raras na sociedade romana de seu tempo,bombardeada e afetada por uma inverso de valores que negava amoral e a tica pregadas e consagradas pela romanidade.

    Na reviso desse quadro, o fundamental era investir naformao do homem e lev-lo a responder s necessidades que secolocavam, o que passava em primeira instncia por umaorganizao, um planejamento do ensino, ou seja, por viabilizaras condies para se conformar este homem ideal.

    Esta preocupao com a formao humana, assumida porSneca, ao longo da sua vida, como misso pedaggica da qualnunca se distanciou, ganhou expresso at mesmo na sua morte momento, segundo acreditava, da libertao humana, motivo det-la convertida num ato pedaggico pleno de inteno educativa.

    As suas reflexes e as sua prticas pedaggicastransformaram-no em uma das vozes romanas mais importantese significativas em matria de educao. Isso fica explcito na suaressonncia ainda na Antiguidade, quando exerceu notvelinfluncia nos chamados Padres da Igreja, a exemplo de Clementede Alexandria, Tertuliano, Santo Ambrsio e Santo Agostinho; aodespertar, na Medievalidade, o interesse de pensadores comoLactncio, Martins de Braga, Toms de Kempis e Santo Toms deAquino, entre tantos outros; ou, ao chegar Modernidade e Contemporaneidade, despertando a simpatia de Montaigne,Descartes, Leibniz, Kant e Nietzsche.

    Essa permanncia na Histria significativa para justificarum estudo sobre o pensamento de Sneca que, num processodinmico e criador, invadiu outras pocas distantes da sua eevidenciou a validade de seu modelo pedaggico, fundado na ticae na moral, princpios esses que apresentam traos de semelhanasem todos os tempos, lugares e culturas. O que provvel, istotambm foi possvel graas soluo prtica que apontou para osproblemas existenciais, em vista do seu entendimento da naturezahumana e da determinao dos valores humanos.

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