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Universidade Estadual de Maringá 02 a 04 de Dezembro de 2015 1 EDUCAÇÃO NÃO FORMAR COMO PROPOSIÇÃO DE REINSERÇÃO SOCIAL DO APENADO GARUTTI, Selson (1º Autor) 1 . OLIVEIRA, Rita de Cássia da Silva (2º Autor) 2 . RESUMO: Esta pesquisa objetivou analisar as ações educativas não formais implementadas na Penitenciária Estadual de Maringá - Paraná, entre os anos de 1999 a 2010, enquanto política pública como possibilidade de reinserção social dos apenados. Pesquisa qualitativa-documental oriundo da Divisão Ocupacional e de Qualificação da Penitenciária Estadual de Maringá (DIOQ-PEM-PR). Tem como referencial teórico o Modelo de Ciclos de Políticas, constituído por Howlett; Ramesh; Perl (2013). Os resultados foram que as Políticas Públicas implementadas na Penitenciária Estadual de Maringá foram classificadas como política distributiva, beneficiando um grande número de destinatários, todavia em escala relativamente pequena. Visou distribuir benefícios individuais, instrumentalizada pelo clientelismo, houve multiplicidade de interesses e de possibilidades de acesso, o que reduziu as chances de conflito. Portanto, serviu como mecanismo remissório para diminuição da população carcerária e não como política pública emancipatória dos sujeitos apenados em condições de vulnerabilidade social. PALAVRAS CHAVES: Educação, Políticas Públicas, Reinserção Social. INTRODUÇÃO A educação tanto formal quanto não formal se estabelece na sociedade como meio legítimo de transmissão de conhecimento adquirido historicamente, disseminado posteriormente por meio de todas as instituições. O meio de transmissão desse conhecimento acumulado historicamente dá-se por dois meios, ou pela educação formal ou pela educação não formal. Não existe dicotomia ou divergência entre os dois espaços, sendo espaços concomitantes que convergem para formar e informar o sujeito, preparando-os para a vida como um todo. Embora a legislação de suporte para que a educação seja uma realidade na vida de todos, existem diversos fatores que destoam dessa realidade, entre os quais, podem-se elencar as adversidades da vida, os percalços econômicos, as frustrações psicológicas e todas as contradições cabíveis nesse espaço incontável. 1 Licenciado em Filosofia pela USC e História pela UEM, Especialista em Pesquisa Educacional pela UEM e Mestre em Ciências da Religião pela PUCSP. Professor de Filosofia pelo Estado do Paraná. [email protected] 2 Doutora em Filosofia e Ciências da Educação pela Universidade de Santiago de Compostela, Espanha. Professora do Programa de Doutorado em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa, E-mail: [email protected]

EDUCAÇÃO NÃO FORMAR COMO PROPOSIÇÃO DE … · referencial teórico o Modelo de Ciclos de Políticas, constituído por Howlett; Ramesh; Perl (2013). Os resultados foram que as

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EDUCAÇÃO NÃO FORMAR COMO PROPOSIÇÃO DE REINSERÇÃO SOCIAL DO APENADO

GARUTTI, Selson (1º Autor) 1.

OLIVEIRA, Rita de Cássia da Silva (2º Autor) 2.

RESUMO: Esta pesquisa objetivou analisar as ações educativas não formais implementadas na Penitenciária Estadual de Maringá - Paraná, entre os anos de 1999 a 2010, enquanto política pública como possibilidade de reinserção social dos apenados. Pesquisa qualitativa-documental oriundo da Divisão Ocupacional e de Qualificação da Penitenciária Estadual de Maringá (DIOQ-PEM-PR). Tem como referencial teórico o Modelo de Ciclos de Políticas, constituído por Howlett; Ramesh; Perl (2013). Os resultados foram que as Políticas Públicas implementadas na Penitenciária Estadual de Maringá foram classificadas como política distributiva, beneficiando um grande número de destinatários, todavia em escala relativamente pequena. Visou distribuir benefícios individuais, instrumentalizada pelo clientelismo, houve multiplicidade de interesses e de possibilidades de acesso, o que reduziu as chances de conflito. Portanto, serviu como mecanismo remissório para diminuição da população carcerária e não como política pública emancipatória dos sujeitos apenados em condições de vulnerabilidade social. PALAVRAS CHAVES: Educação, Políticas Públicas, Reinserção Social.

INTRODUÇÃO

A educação tanto formal quanto não formal se estabelece na sociedade

como meio legítimo de transmissão de conhecimento adquirido historicamente,

disseminado posteriormente por meio de todas as instituições. O meio de transmissão

desse conhecimento acumulado historicamente dá-se por dois meios, ou pela educação

formal ou pela educação não formal. Não existe dicotomia ou divergência entre os dois

espaços, sendo espaços concomitantes que convergem para formar e informar o sujeito,

preparando-os para a vida como um todo.

Embora a legislação de suporte para que a educação seja uma realidade na

vida de todos, existem diversos fatores que destoam dessa realidade, entre os quais,

podem-se elencar as adversidades da vida, os percalços econômicos, as frustrações

psicológicas e todas as contradições cabíveis nesse espaço incontável.

1 Licenciado em Filosofia pela USC e História pela UEM, Especialista em Pesquisa Educacional pela

UEM e Mestre em Ciências da Religião pela PUCSP. Professor de Filosofia pelo Estado do Paraná. [email protected]

2 Doutora em Filosofia e Ciências da Educação pela Universidade de Santiago de Compostela, Espanha. Professora do Programa de Doutorado em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa, E-mail: [email protected]

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Considerando a população geral, em suas dificuldades, pode-se perceber que

nem tudo acontece como deveria ser. Infelizmente existe uma grande disparidade entre

o ideal e o real e, como a vida é real e não ideal, nem sempre as pessoas se enveredam

pelos mesmos caminhos. Com isso, cada sujeito vai construindo a sua história,

aprendendo e ensinando ao mesmo tempo.

Algumas pessoas se enveredam por caminhos tortuosos dando mais valor a

um tipo de educação em detrimento a outro, descompasso que acaba gerando

ignorância, fome, miséria, desemprego, violência e etc. Tendo como consequência

direta o enfrentamento com a justiça e, por conseguinte, a penalização, passando a

serem recolhidos para cumprirem pena em alguma penitenciária.

Assim, em um dado momento, a penalização deixou de ser aplicada como

forma de castigo violento por meritocracia criminal e passou a ser espiada pela privação

de liberdade. Com o passar do tempo, essa lógica foi se cristalizando ao ponto de

constituir conceitos que passaram a se sedimentarem, entre os quais, pode-se citar a

completude institucional, lógica pela qual se acreditava que o então sistema penal teria

plena condição de constituir ressocialização. Essa lógica institucional foi se tornando

cada vez mais autossuficiente e fechando-se em seus conceitos, atraindo para dentro do

seu sistema todas as necessidades que o apenado precisasse. Durante muito tempo esse

paradigma da institucionalização deu conta de resolver proposição da ressocialização,

visto que, era um conceito hermético e inquestionável.

Com o avanço das ciências, devido aos avanços nas pesquisas sobre o

sistema penal, passou-se a perceber que o sistema prisional como tal, não dava mais

contas de atender às novas demandas sociais existentes. Não só porque o sistema

prisional estava um caos, mas também, porque não atendia mais as exigências

contemporâneas da globalização.

Advindo dessa necessidade, constitui-se a proposição de estabelecer a

obrigação do Estado, a propiciar condições necessárias e adequadas para a reinserção

social dos apenados, constituindo o direito à educativa como meio mais adequado de

reinserção social dos apenados. A qualificação profissional como educação não formal e

a escola como educação formal na prisão.

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MATERIAL

A elaboração dos objetivos desta proposta parte da análise do material

existente na Unidade Penal de Maringá, onde foram levantadas as fontes de pesquisa,

permitindo o acesso a diversas informações históricas. As fontes de pesquisa são

oriundas da Divisão Ocupacional de Qualificação da Penitenciária Estadual de Maringá

(DIOQ-PEM-PR), tratando dos cursos de educação não formal ofertados aos penados

entre os anos de 1999 e 2010. Este espaço constitui-se em importante fonte documental

por explicitar o cotidiano de uma determinada penitenciária. Além das fontes

documentais, levou-se em consideração a bibliografia já produzida sobre o tema,

buscando subsídios para uma maior compreensão analítica do processo.

PROPOSTA DE ANÁLISE

Este estudo analisou o processo de montagem da agenda e formação das

políticas públicas educacionais implementadas na Penitenciária Estadual de Maringá-PR

(PEM-PR), tomada pela direção da Penitenciária Estadual de Maringá-Paraná, como

uma conquista, proposição calcada referindo-se ao histórico descaso com que são

tratadas as questões pertinentes ao sistema penitenciário brasileiro. Essa escolha se

constitui como tentativa de compreensão tanto da participação dos atores sociais, quanto

pelos conceitos empregados pela instituição durante o processo de formulação das

políticas públicas realizadas.

Partindo do pressuposto de que as políticas não são formulações a esmo,

mas sim, formulações consequentes dos processos oriundos da conjuntura existente,

resultantes das complexas interações de interesses envolvidos, bem como, das

possibilidades existentes (ao acaso) fundidos aos consensos estabelecidos ao longo dos

processos decisórios. Para tanto, estudar esse processo requer fazê-lo através de uma

metodologia que apreenda significativamente todo o processo da política. Com isso,

torna-se fundamental explicitar a complexidade do processo de formulação das

políticas.

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Qualquer campo científico requer um rigoroso procedimento teórico-

metodológico, o qual viabilize tanto no avanço da produção de conhecimento, quanto

orientar as próximas tomadas de decisões das próximas políticas a serem praticadas pelo

Estado. A atual dificuldade de formulação de políticas que sejam realmente efetivas na

sua implementação, fizeram com que fosse adotado o modelo de ciclo de políticas como

sendo uma das formas mais viáveis para a compreensão do processo como um todo.

A formulação política constitui-se por um processo complexo, através das

decisões tomadas pela confluência de diversos interesses, atores e instituições.

Compilados em determinada conjuntura, delineando a montagem de uma agenda

específica para determinado problema. Por isso, a analise das políticas pela teoria dos

ciclos, modelo produzido por Howlett; Ramesh; Perl (2003) parece ser bem adequado,

pois colocam em pé de igualdade tanto os atores e suas concepções, quanto às

instituições, constituindo um ciclo de intenções e interações com seus respectivos

desdobramentos.

Figura 01 - Ciclo de Política Pública de Howlett e Ramesh.

Fonte: REIS, 2010, p.49.

O modelo de analise de ciclo das políticas descreve o desenvolvimento da

política como um processo, constituído em etapas, podendo ser, tanto alterado quando

interrompido em qualquer parte do processo. Entre as vantagens deste modelo analítico

está a possibilidade de analise por meio de qualquer parte do processo, possibilitando a

investigação do processo de forma sistemática por meio de qualquer fase do processo,

haja vista ser o ciclo contínuo e ininterrupto, facilitando tanto a analise da parte quanto

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do todo da política. Com isso, o conceito empregado na análise das políticas é definido

pelo conceito cíclico, o qual não precisa ter necessariamente uma referência de início ou

meio ou fim, esses pontos cronológicos retilíneos, embora também importantes, mas

tornam-se elementos secundários no processo de análise. Assim, foi desenvolvido um

quadro cronológico como apoio referencial de sistematização dos principais eventos

pertinentes. Incluindo-se nessa analise, tanto as concepções políticas quanto os atores e

as instituições, identificando três ciclos de políticas públicas para a segurança pública.

Esses três ciclos de políticas são constituídos tanto pela atuação integrada dos três entes

federativos de governo (federal, estadual e municipal), com distribuição das devidas

atribuições e competências, com direção única em cada nível de governo, quanto pela

alternância de gestores.

Segundo o conceito de ciclo formulado por Howlet et al (2013), o contexto

político é constituído por um conjunto de subsistemas, de onde confluem atores,

concepções e instituições, alocados no mesmo espaço onde se dão os problemas, sendo

também o mesmo espaço de onde deverão sair as possíveis soluções. Dai a necessidade

de mapear os subsistemas para compreensão da montagem da agenda e,

consequentemente, a formulação das políticas,

A - MONTAGEM OU DEFINIÇÃO DA AGENDA (Agenda-Setting)

A partir de 1988, pós Constituição Federal, abrem-se espaços dialógicos entre

governo e movimentos sociais sobre a urgente necessidade na formulação e

implementação de políticas públicas no sistema penitenciário. Sendo a adoção de

práticas participativas da sociedade civil que vão conduzir à emergência do que Avritzer

e Pereira (2005, p. 18) classificam de formas híbridas, conjugando “[em] parte

representantes do Estado, [em] parte representantes da sociedade civil, [e que] reúnem,

ao mesmo tempo, elementos da democracia representativa e da democracia direta”,

sendo esse processo de participação, atualmente classificado por “cidadania ativa”, para

definir o processo de participação da sociedade civil (BENEVIDES, 1991).

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B - FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS (Policy Formulation)

As políticas de assistência ao apenado no Brasil é um campo marcado

historicamente, por ações governamentais sempre fragmentadas, descontínuas com

desperdício de recursos e baixa eficácia das ações implantadas, caracterizadas muito

mais pelo reforço da marginalidade e invisibilidade do que por ações educativas

efetivas. Em muitos casos, as tecnológicas adotadas não são compatíveis com as

condições socioeconômicas e culturais do público-alvo. E, ainda, os processos de

tomada de decisão, quanta às políticas, têm sido formuladas segundo uma lógica tecno-

burocrática, sem a participação da sociedade civil organizada, refletindo assim,

diretamente sobre a situação de vulnerabilidade social da população.

Nesse sentido, a vulnerabilidade social compreende um conjunto de fatores

concatenados entre si, desde a economia até a cultura, formulando uma conjuntura

política, conformando os sujeitos a uma incapacidade de terem acesso aos bens

produzidos. Havendo ai uma estreita relação com a atual configuração neoliberal do

“Estado Mínimo” que transforma as políticas sociais em ações pontuais, emergenciais e

compensatórias. Nessa perspectiva, Oliveira (1995) relaciona vulnerabilidade social de

forma perversa à dependência econômica, social, cultural, intelectual, afetando

diretamente aos mais pobres.

C - TOMADA DE DECISÃO (Decision Making)

A tomada de decisão das políticas públicas se efetivou muito por causa das

pressões dos organismos internacionais e dos movimentos sociais, junto ao Brasil, para

incluírem em suas agendas políticas a discussão de temas relativos aos problemas no

sistema prisional. Instituições como a Organização das Nações unidas (ONU), a

Comissão Econômica para América latina e Caribe (CEPAL), Organização das Nações

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Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), esses organismos foram

imprescindíveis para a efetivação de políticas.

A partir destas pressões foi possível estabelecer uma referência sobre o

tratamento penal, o qual consistiu na formulação da Lei de Execução Penal (LEP) nº

7.210 de 1984, a qual versa sobre os direitos e deveres atribuídos aos apenados, sendo a

qual também, consiste na base de formulação de políticas públicas voltadas para as

demandas no sistema penitenciário. Bem como, a Lei nº 12.245, de 24 de maio de 2010,

a qual acrescentou um 4º parágrafo ao artigo nº 83 da LEP, dispondo que nos

estabelecimentos penais, conforme a sua natureza, serão instaladas salas de aulas

destinadas a cursos de ensino básico e profissionalizante. Ainda, a Lei de Remição pelo

trabalho e estudo, nº 12.433, de 29 de junho de 2011, pela qual altera os artigos 126,

127, 128 e 129 da LEP.

Como para Caldas (2008, p.13), “a fase de tomada de decisão pode ser

definida como o momento onde se escolhe alternativas de ação / intervenção, em

respostas aos problemas definidos na Agenda”. Sendo que essas duas últimas leis foram

posteriores à fundação da PEM e, como a tomada de decisão é o momento de definir a

mais apropriada dentre as alternativas apresentadas, bem como, a forma em que se dará

o processo, levando-se em consideração os atores participantes.

D - IMPLEMENTACAO (Policy Implementation)

A implementação é a fase caracterizada pela transformação das intenções em

ações, o “[...] momento onde o planejamento e a escolha são transformados em atos”

(CALDAS, 2008, p. 15). Com isso, a implementação tem por característica o

monitoramento e o controle das ações para visualizar obstáculos e falhas que possam

acontecer, a fim de detectar problemas mal formulados, objetivos distorcidos e/ou

otimismo exacerbado. Para Jannuzzi (2001, p. 45), essa fase “[...] corresponde aos

esforços de implementação de ação governamental na alocação de recursos e

desenvolvimentos dos processos previstos nas alternativas e programas escolhidos

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anteriormente”. Já para Secchi (2011) essa é a fase de transformar intenções políticas

em ações concretas, na qual entram em ação atores estatais e não estatais.

E - AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS E PROGRAMAS (Policy Evaluation).

Todas as fases são fundamentais e de igual valor, mas, se tivesse que escolher

entre as cinco fases a mais importante, com certeza, seria a avaliação (CALDAS, 2008).

A avaliação é um processo sistemático de análise das ações praticadas efetivamente,

pela qual e dentro da conjuntura deve ser verificada, qual deva ser o rumo empreendido,

ou continuação, ou reorientação ou extinção das políticas.

Faz-se necessário analisar a constituição do empreendimento como um todo e,

principalmente, seus resultados a fim de verificar se atingiu ou não os objetivos iniciais?

Resolveu ou não os problemas iniciais? Esse exame garantirá qualquer correção,

cancelamento ou continuidade do programa. Outro aspecto importante é analisar se a

conjuntura se reorganizou sob outra perspectiva, necessitando também a reformulação

das políticas implementadas, reiniciando o ciclo (JANNUZZI, 2011).

A DEFINIÇÃO DO CORTE TEMPORAL COMO PROCESSO DE ANÁLISE

A escolha desse período pesquisado (1999 a 2010) se justifica por ser o

período em que os arquivos da DIOQ da PEM-PR estão mais bem servidos. Por isso, da

adoção cronológica da alternância de governo como critério para estabelecer o início e o

fim cronológico da pesquisa. Portanto, Ciclo 01 do Presidente FHC: vai de 1999 a 2002.

O Ciclo 02 do Presidente Lula, vai de 2003 a 2006. E o Ciclo 03 também do Presidente

Lula, vai de 2007 a 2010.

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Figura 02: Ciclos de Políticas sobre segurança Pública

Fonte: Elaborado pelo autor.

A partir dos três ciclos identificados, o corte temporal desta pesquisa fica

delimitado a partir do ciclo 02. Os eventos ocorridos no ciclo 01 ficam considerados

como antecedentes históricos para a formulação da concepção política analisada. O

terceiro Ciclo fica como referência atual de política, pós-implantação do Sistema Único

de Segurança Pública (SUSP), pelo qual propicia um novo contorno na Segurança

Pública do País.

A PENITENCIÁRIA ESTADUAL DE MARINGA: O LÓCUS DESTA

PESQUISA

A Penitenciária Estadual de Maringá (PEM) Unidade Penal do Paraná está

localizada em Maringá. Inaugurada em 10 de abril de 1996, localizada na área agrícola

de Maringá-PR, no limite entre os Municípios de Maringá e Paiçandu. Construída numa

área de 5.800 metros quadrados, em um terreno de 24 mil metros quadrados, possuindo

60 celas com capacidade para seis presos cada, num total de 360 vagas. Dotada de

completa infraestrutura com guaritas, galerias, solários, refeitórios, salas de aula, salas

de atendimento, cozinha, panificadora, lavanderia, consultório médico, odontológico e

área íntima.

Sua construção teve um custo de R$ 3 milhões e possui o mesmo projeto da

Penitenciária Estadual de Londrina, sendo similar na estrutura de segurança e na

capacidade de lotação. A sua instalação proporcionou à cidade 202 novos empregos

diretos e atende a região Noroeste do Estado, servindo a 30 cidades.

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Caracteriza-se como estabelecimento de segurança máxima, destinada aos

presos do sexo masculino que cumprem pena de regime fechado. Embora possua uma

capacidade de lotação para 360 presos, mantém uma média populacional de 345, sendo

que, destes, 55% da população carcerária emprega sua mão-de-obra em 24 canteiros de

trabalho nas áreas de manutenção, artesanato, agricultura, fábrica de bolas de futebol,

marcenaria, dentre outros. Ainda destes apenados, 55% estudam no Centro de Estudos

Supletivos, Professora Tomires Moreira de Carvalho, localizado no interior da própria

instituição penal. Aos detentos são oferecidos os cursos de Alfabetização, Ensino

Fundamental e Médio, seguindo, os dois últimos, o sistema supletivo de ensino da

Secretaria de Educação do Estado.

Aos apenados empregados, a cada três dias de trabalho são comutados um

dia na pena; aos que estudam a cada dezoito horas é compensado um dia na pena. A

escola funciona no período das 8h às 17h e, a biblioteca das 8h às 11h e das 14h às

16horas.

O espaço físico destinado à escola é cabível. Não há paredes separando as

turmas, o espaço da cela de aula é aberto isto é, cada professor possui um pequeno local

com cadeiras e carteiras compatíveis com o número de alunos matriculados, variando

muito o número de alunos por turma. O curso com maior índice de frequentadores é o

de alfabetização. Trabalham, concomitantemente, todos os professores e, dentro desse

espaço, somando-se todas as turmas, há uma média de quarenta a sessenta alunos

detentos, com um agente penitenciário diretamente controlando o local.

O único espaço dotado de paredes e portas, localizados dentro dessa mesma

cela, é uma pequena sala, com determinado número de carteiras e cadeiras, destinadas à

oferta de alguma aula que requeira uma ação diferente, como por exemplo, assistir

algum filme. Nessa sala também fica a biblioteca, com espaço reduzido: há três

prateleiras e um conjunto de cadeira e mesa pertencentes ao atendente da biblioteca.

Não é possível a leitura dentro desse ambiente, por ser restrito e também porque uma

possível reunião de detentos em um local limitado dificultaria o trabalho dos agentes

penitenciários.

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Há na biblioteca obras que congregam desde textos literários, políticos,

filosóficos, de autoajuda, de religião, até obras de cunho didático - apostilas, livros

didáticos, entre outros temas. As obras foram constituídas ou por meio de doações ou

por aquisição da própria escola.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Gráfico 01: Cursos (1999 a 2010)

4%

6%13%

11%

14%19%

13%

4%3% 4%

5% 4%

CURSO 1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados na DIOQ-PEM-PR. Gráfico 02: Carga Horária (2002 a 2010)

5%16%

28%17%

12%

1%6%

4%11%

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados na DIOQ-PEM-PR.

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Vale ressaltar que especificamente no caso específico do gráfico de frequência, não

constavam nas planilhas os três primeiros anos.

Gráfico 03: Frequência (1999 a 2010)

3% 8%

10%

11%

14%20%

12%

4%4%

4%6% 4% 1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados na DIOQ-PEM-PR

ANALISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

No Brasil, as esferas governamentais, tanto federal quanto estadual,

enfatizam que o processo de ressocialização do preso deve ser efetivado por meio tanto

do trabalho quanto da educação. Em cima desse argumento foi construído todo um

discurso que considera o trabalho como fator fundamental de sustentação tanto da

recuperação, quanto das políticas públicas de qualificação profissional implantadas no

sistema penitenciário como sendo mecanismo de redução penal e tentativa de inserção

do egresso na sociedade.

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Gráfico 04: Quadro Comparativo dos cursos constituídos na PEM

Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados na DIOQ-PEM-PR.

Essa constatação se faz presente devido ao fato de que os cursos dados no

sistema penal nem de longe tem condições estruturais para qualificação do apenado para

o emprego formal como um todo. O sistema prioriza trabalhos e cursos

profissionalizantes que mais se parecem com terapia ocupacional para ocupar o tempo

dos alunos de que necessariamente prepará-los para o mercado de trabalho.

Os cursos geralmente tem uma equivalência de quinze a vinte horas e são

quase sempre frequentados por um total de quinze alunos por curso. São cursos de

trabalhos artesanais, bordado a mão, além de cursos dedicados ao plantio e cultivo de

hortaliças e jardinagem. Esses cursos, elevados ao status de “qualificação”,

desenvolvidos dentro do sistema prisional se constituem em uma reprodução de

conhecimentos meramente técnicos, o que não garante a inserção nem do apenado e

nem do egresso ao mercado de trabalho formal, tão pouco a geração de renda e menos

ainda, a possibilidade de ressocialização.

O discurso dominante do Estado sempre enfatizou a qualificação

profissional como sendo uma complexa construção social de qualificação estrutural não

se restringindo apenas por cursos de terapia ocupacional. No entanto, a realidade

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constatada é bem diferente, uma situação reveladora que apresenta mais que um

adestramento, do que desenvolvimento de habilidades empregatícias.

Uma das críticas válidas para esse quadro reside no fato de que essa

produção de terapia ocupacional não tem em seus procedimentos operacionais quase

nada que possa vir a desenvolver as competências e as habilidades complexas que

configuram nas reais condições de efetivação do trabalho intelectual, fruto de um

exercício político de crítica tão necessário para dar conta dos desafios configurados pela

sociedade contemporânea.

As qualificações profissionais advindas desses cursos se pautam em critérios

de reflexo condicionado para aquisição de condicionamento disciplinar mais do que no

desenvolvimento de habilidades profissionais. O trabalho, com sua grande

potencialidade de ressocialização, passou a ser instrumento de novas formas de exclusão

social ensejada pela precarização do trabalho e pelo desemprego. A falta de emprego ou

as parcas condições do trabalho existente acabam por configurar as modernas formas de

exclusão social atuais.

O trabalho pode ser configurado tanto como fator de inclusão, quanto fator

de exclusão. Isso acaba sendo um marco regulatório no processo de ressocialização.

Assim, os apenados são incluídos em Políticas de Qualificação Profissional que

focalizam o trabalho como elemento de ressocialização e, por conseguinte, a produção,

sendo que os interesses acabam por se confundirem, ora como discurso para a

ressocialização, ora como discurso do pleno emprego, sendo efetivada a real

preocupação apenas com a produção.

A que constituir uma crítica às políticas públicas desenvolvidas no sistema

penal por muitas vezes não potencializarem a possibilidade das vias da empregabilidade

apenas compilarem meios parcos para transferência de conhecimentos que direcionam o

sujeito para a execução de trabalhos que exijam apenas habilidades técnicas.

Dos cursos ministrados nos estabelecimentos penais poucos contribuem

para que os apenados se profissionalizem, inviabilizando assim, as chances de inserção

do apenado ao mercado de trabalho, impossibilitando a geração de renda, empurrando

os egressos para o subemprego ou para a informalidade, quando não, para o

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desemprego. O que acaba corroborando diretamente o aumento da reincidência

criminal.

O quadro conjuntural que o apenado enfrenta consiste em um tecido social

dado tanto pelas modernas técnicas de produção quanto pela precarização do trabalho,

acrescido a isso o fato de serem ex-sentenciados, estigma que significa pertencer ao

universo do crime. Nesse sentido, o discurso das políticas públicas constitui-se muito

mais em uma falácia do que ressocialização efetiva, constituindo um discurso de

culpabilização individualizada mais do que uma situação social.

A partir disso, a empregabilidade assume uma configuração individualizante

pelo qual transfere toda a responsabilidade social para o sujeito, indivíduo fracassado

pela sua própria incapacidade e inoperância, justificada inclusive pelas teorias

lambrozianas, certificadas pelos conceitos constituídos pelo Médico Sanitarista

Raymundo Nina Rodrigues ([1938] 2009), como sendo o pertencimento ao mundo do

crime a justificativa para promulgar a nova forma de culpabilização do indivíduo pela

situação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Penitenciária Estadual de Maringá esteve no caminho de efetivação do

processo de qualificação dos apenados, propiciando cursos durante anos, os mais

vaiados possíveis. Sendo esse o pomo da questão. Os cursos foram muito expressivos,

mas indicativo de um caminho a ser seguido. Tanto os trabalhos realizados, quanto os

cursos ministrados, propiciaram uma razoável condição, servido tanto para qualificação

quanto para remissão.

Nessa perspectiva a participação da sociedade civil foi condição sine qua

nom para a efetivação destas ações significativas, propiciando oportunidades, as quais, a

maioria dos apenados nunca teve, haja vista ser a penitenciaria cheia de pessoas

marcadas pela violência, pobreza e marginalização.

A participação dos apenados sempre foi grande. Nem que fosse apenas para

obter certificação, preocupados em deixar transparecer que já haviam se regenerado

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porque participavam da igreja, da escola e dos canteiros de trabalho, além de fazer todos

os cursos possíveis.

Através da Divisão Ocupacional de Qualificação (DIOQ), a PEM sempre

propiciou os mais diversos cursos, os quais sempre emitindo certificação, pois era a

efetivação da certificação que proporcionava condições para efetivação da remissão da

pena.

Houve inúmeros percalços, mas, em uma seara tão causticante quanto o

sistema prisional, a experiência praticada na Penitenciária Estadual de Maringá,

expressa mais ainda que para haver resultados a contento para a ressocialização, tal

sucesso só se efetivará na medida em que as políticas públicas se efetivarem como meio

de ação efetiva do Estado, atendendo as demandas reais dos apenados, efetivando o

conceito de rede como relação basilar das políticas públicas praticadas nesse contesto.

Ainda os percalços serviram de exemplo para não cometerem os mesmos erros

posteriormente.

Apesar de que muitos cursos serviram mais como terapia ocupacional do

que qualificação profissional propriamente dito, serviram também como discurso

político para justificar a ausência do Estado no sistema penitenciário. Também produzir

um processo remissório.

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Universidade Estadual de Maringá 02 a 04 de Dezembro de 2015

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