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MARCELINA TERUKO FUJII MASCHIO
EDUCAO BSICA E EDUCAO PROFISSIONAL DO TRABALHADOR JOVEM E ADULTO: desafios da integrao
MARILIA 2011
MARCELINA TERUKO FUJII MASCHIO
EDUCAO BSICA E EDUCAO PROFISSIONAL DO TRABALHADOR JOVEM E ADULTO: desafios da integrao
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao da Faculdade de Filosofia e Cincias do Campus de Marlia para obteno do ttulo de Doutor em Educao. rea de Concentrao: Polticas Pblicas e Administrao da Educao Brasileira Orientador: Professor Paschoal Quaglio
MARILIA 2011
Ficha catalogrfica elaborada pelo
Servio Tcnico de Biblioteca e Documentao UNESP Campus de Marlia
Maschio, Marcelina Teruko Fujii.
M395e Educao bsica e educao profissional do
trabalhador
jovem e adulto : um desafios de integrao / Marcelina
Teruko Fujii Maschio - Marlia, 2011.
187 f. ; 30 cm.
Tese (doutorado - Educao) Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Filosofia e Cincias, 2011
Bibliografia: f. 163-175
Orientador: Paschoal Quaqlio
1. Educao e trabalho. 2. Educao profissional e tecnolgica. 3. Educao integrada. 4. Educao de jovens e
adultos. 5. Proeja. I. Autor. II. Ttulo.
CDD
370.193
BANCA EXAMINADORA
EDUCAO BSICA E EDUCAO PROFISSIONAL DO TRABALHADOR JOVEM E ADULTO: desafios da integrao
MARCELINA TERUKO FUJII MASCHIO
Prof. Dr. Paschoal Quaglio Professor Orientador
Universidade Estadual Paulista Campus de Marlia
Prof. Dra. Hlia Snia Raphael Banca Examinadora
Universidade Estadual Paulista Campus de Marlia
Prof. Dra. Maria Sylvia Simes Bueno Banca Examinadora
Universidade Estadual Paulista Campus de Marlia
Prof. Dr. Wilson Sandano Banca Examinadora
Universidade de Sorocaba
Prof. Dr. Joo Augusto Gentilini Banca Examinadora
Universidade Estadual Paulista Campus de Araraquara
Marlia, 18 de fevereiro de 2011
A Deus, por estar aqui. Aos meus pais, pelos valores repassados, por me ensinarem a sonhar e a buscar a realizao destes sonhos. Ao Joelson, companheiro de jornadas e desafios, incentivador e amigo. A Maria Jlia e Joo Matheus, pela espera, pelas perguntas dirias, dos interminveis... Mame, voc acabou? Mame, deixa que eu fao pra voc!
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Doutor Paschoal Quaglio, pela confiana depositada, pela oportunidade, pela importante ajuda e tempo dedicado;
s Professoras Hlia Snia Raphael e Graziela Zambo Abdian
Maia, pelas importantes contribuies na Banca Examinadora de Qualificao, por apontarem o caminho e mostrarem a direo, e aos Professores Maria Sylvia Simes Bueno, Wilson Sandano, Joo Augusto Gentilini e Hlia Snia Raphael, pelas importantssimas sugestes e contribuies com o trabalho na Banca Examinadora de Defesa;
Aos participantes da pesquisa, pela carinhosa acolhida,
comprometimento, seriedade com que responderam s indagaes e participaram das reunies e dos debates;
Aos Reitores e Pr-Reitores de Ensino dos Institutos Federais de
Educao, Cincia e Tecnologia e da Universidade Tecnolgica Federal do Paran; aos Diretores-Gerais e de Ensino dos Cefets, Coordenadores e Docentes pela colaborao e reflexes compartilhadas;
Caetana Juracy Resende Silva, Vnia Nbile Silva e equipe,
pelas informaes disponibilizadas. Aos trabalhadores jovens e adultos que esto a fazer seus cursos;
na busca de seus ideais pessoais, profissionais e da elevao do nvel de escolaridade, pelas importantes contribuies;
Ao Prof. Martins Dagostim, pelas importantes contribuies e
correes ortogrficas; Aos docentes e servidores da Unesp, Cmpus de Marlia, em
especial Cntia pela competncia, por toda ajuda e amizade.
Sem dominar aquilo que os dominantes dominam os dominados no chegam a se libertar da dominao.
Dermeval Saviani
MASCHIO, Marcelina Teruko Fujii. Educao Bsica e Educao Profissional do Trabalhador Jovem e Adulto: desafios da integrao. 2011. 184 f. Tese (Doutorado em Educao). Programa de Ps-Graduao em Educao. Faculdade de Filosofia e Cincias, Universidade Estadual Paulista. Marlia, 2011.
RESUMO
Elevar a escolaridade e oferecer formao profissional ao trabalhador jovem e adulto constituem-se na tarefa de buscar dois direitos fundamentais, a educao e o trabalho. Essa ideia foi materializada pelo Programa Nacional de Integrao da Educao Profissional com a Educao Bsica, na modalidade Educao de Jovens e Adultos, o Proeja, institudo em 2006. Este trabalho busca analisar o Proeja sob o ponto de vista daqueles que participam de sua implantao na rede federal de Educao Profissional, Cientfica e Tecnolgica (EPCT). Foram utilizadas pesquisas documentais, entrevistas, questionrio e grupo focal. Para entender a concepo, foram analisados documentos legais e o Documento Base do Proeja. A fim de verificar aspectos vinculados implantao do Proeja, optou-se pelo dilogo com ofertantes, ou seja, instituies, representadas pelos coordenadores, docentes e alunos, principalmente aqueles para quem o curso foi inicialmente pensado, o futuro aluno, trabalhador jovem e adulto. Pressupondo que a consolidao desse projeto educacional tem como fundamento a integrao entre trabalho, cincia, tcnica, tecnologia, humanismo e cultura geral, e que esses elementos so essenciais para o efetivo exerccio da cidadania, de acordo com o Documento Base do Proeja, possvel afirmar que, apesar de os resultados dos projetos educacionais s possam ser percebidos a longo prazo, o fundamento ainda no foi materializado. Identificaram-se, na viso dos participantes, concepes fortemente marcadas pela tica do capital, assim como a incorporao de conceitos ideolgicos vinculados ao mundo produtivo. Alunos e futuros alunos tambm vinculam a necessidade de estudar viso exclusiva da garantia de emprego. Trazem enraizado o pensamento da necessidade de formao de um contingente de reserva de mo-de-obra, como tambm a aceitao de que a responsabilidade e o esforo pessoal determinam as condies de trabalho e a garantia de sucesso profissional. Verifica-se a veiculao de ideias consentidas e aceitas que garantem a manuteno do pensamento de que a educao profissional, sob a tutela do mundo produtivo, deve permitir e aceitar as imposies demandadas pelo mercado de trabalho. Palavras-chave: Educao Profissional e Tecnolgica. Educao e Trabalho. Proeja. Educao Integrada. Educao de Jovens e Adultos.
MASCHIO, Marcelina Teruko Fujii. Basic Education and Vocational Education of Young and Adult Workers: integration challenges. 2011. 184 p. (Doctorate in Education). Graduate Program in Education. Department of Philosophy and Science, Universidade Estadual Paulista. Marilia, 2011.
ABSTRACT
Improving schooling and offering professional training to young and adult workers mean seeking two fundamental rights, education and work. This idea was materialized by the National Program for Integration of Professional Education with Basic Education, in the Modality of Education of Young People and Adults Proeja, established in 2006. This paper analyzes the Proeja from the point of view of those who participate in its implementation in the federal network Vocational, Scientific and Technological Education (EPCT). We used documentary research, interviews, questionnaires and focus groups. With the objective to understand the design, we analyzed legal documents and the Proeja Base Document. In order to check aspects related to the implementation of Proeja, we decided to talk to the providers, namely the institutions, represented by coordinators, teachers and students, especially those to whom the course was initially conceived, future students and young adult workers. Assuming that the consolidation of this educational project is based on the integration between work, science, technique, technology, humanism and general culture, and that these are essential elements for the effective exercise of citizenship (BRAZIL, 2007), it is possible to say that, in spite of the fact that the results of educational projects can only be perceived in the long term, the idea has not yet been materialized. The view of the participants revealed ideas strongly influenced by the capital perspective, as well as the incorporation of ideological concepts linked to the productive world. Students and future students also relate the need to study to the only view of job security. The students believe in the need to form a reserve contingent of 'manpower' and also that responsibility and personal effort determine the working conditions and ensure professional success. There is a propagation of ideas widely accepted and agreed upon, according to which professional education, under the tutelage of the productive world, should allow and accept the rules imposed by the work 'market'. Keywords: Vocational and Technological Education. Education and Work. Proeja.
Integrated Education. Education of Young People and Adults.
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 Organizao da Educao Profissional no Decreto n 2.208/1997 e no Decreto n 5.154/2004.......................................
50
QUADRO 2 Repasse de recursos financeiros do Programa Brasil Profissionalizado aos Estados......................................................
53
QUADRO 3 Oramento das Instituies da rede federal de Educao, Profissional de 2003 a 2011.........................................................
55
QUADRO 4 Nmero de alunos matriculados nos Cursos Tcnicos e no Proeja nas unidades de ensino pblicas no Brasil em maro de 2010..............................................................................................
72
QUADRO 5 Nmero de alunos matriculados nos cursos Proeja em relao aos alunos matriculados nos cursos tcnicos por Estado da Federao em maro de 2010.....................................................
74
QUADRO 6 Oferta de cursos de ps-graduao lato sensu - Especializao Proeja 2006 a 2009...................................................................
76
QUADRO 7 Investimentos executados e previstos para o Proeja 2007 a 2011..............................................................................................
87
QUADRO 8 Sntese das etapas da pesquisa, fonte e coleta de dados............ 90
QUADRO 9 Banco de Teses da Capes Proeja 2006 a 2009......................... 96
QUADRO 10 Dissertaes apresentadas em Mestrado Acadmico registradas no Banco de Teses da Capes 2009........................
97
QUADRO 11 Dissertaes apresentadas em Mestrado Acadmico registradas no Banco de Teses da Capes 2008........................
101
QUADRO 12 Dissertaes apresentadas em Mestrado Acadmico registradas no Banco de Teses da Capes 2007........................
101
QUADRO 13 Dissertaes apresentadas em Mestrado Profissional registradas no Banco de Teses da Capes 2009........................
102
QUADRO 14 Caractersticas utilizadas para determinar o perfil dos potenciais futuros alunos do Proeja...........................................
137
QUADRO 15 Locais e n de pessoas pesquisadas para determinar os potenciais futuros alunos do Proeja, no municpio de Cornlio Procpio, em 2009........................................................................
137
QUADRO 16 Data das reunies e nmero de participantes nos encontros....... 139
QUADRO 17 Caracterizao e nmero de participao nos encontros............. 140
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Ano de implantao do Proeja nas instituies participantes......... 112
TABELA 2 Turno de oferta do Proeja............................................................... 112
TABELA 3 Oferta do Curso de Especializao Proeja pelas instituies participantes....................................................................................
113
TABELA 4 Seleo adotada para ingresso de alunos ao Proeja..................... 113
TABELA 5 Relao candidato/vaga na seleo de alunos na implantao do Proeja..............................................................................................
115
TABELA 6 Evaso de alunos na implantao do Proeja.................................. 115
TABELA 7 Idade dos alunos e das alunas....................................................... 122
TABELA 8 Estado civil dos alunos e das alunas.............................................. 122
TABELA 9 Nmero de filhos dos alunos e das alunas..................................... 123
TABELA 10 Tipo de habitao dos alunos e alunas.......................................... 123
TABELA 11 Escolaridade do pai e da me........................................................ 124
TABELA 12 Atividade desenvolvida pelo pai na maior parte da vida................. 124
TABELA 13 Atividade desenvolvida pela me na maior parte da vida............... 125
TABELA 14 Situao atual em relao ao trabalho........................................... 125
TABELA 15 Rendimento mensal........................................................................ 126
TABELA 16 Atividade desenvolvida pelo aluno(a) durante a maior parte da vida..................................................................................................
126
TABELA 17 Alunos que trabalharam e estudaram ao mesmo tempo................ 127
TABELA 18 Motivos apontados como necessidade de trabalhar e estudar ao mesmo tempo.................................................................................
127
TABELA 19 Alunos que possuem Ensino Mdio concludo............................... 127
TABELA 20 Forma de obteno do Ensino Fundamental ou Ensino Mdio...... 128
TABELA 21 Motivo determinante do retorno aos estudos no Proeja................. 129
TABELA 22 Mudanas aps retorno escola no Proeja................................... 130
TABELA 23 Atividades ou cursos que realizou ou que est realizando............. 131
TABELA 24 Opinio quanto garantia de emprego aps a concluso do Proeja..............................................................................................
131
TABELA 25 Forma que os alunos tomaram cincia do Proeja.......................... 132
TABELA 26 Alunos que pretendem fazer Curso Superior.................................. 132
TABELA 27 Entendimento sobre Educao Profissional................................... 133
TABELA 28 Entendimento sobre a finalidade do Proeja.................................... 133
TABELA 29 Faixa etria dos potenciais futuros alunos do Proeja................... 145
TABELA 30 Situao atual em relao ao trabalho........................................... 145
TABELA 31 Rendimento salarial dos potenciais futuros alunos do Proeja...... 146
TABELA 32 Motivo principal que o levou a abandonar os estudos.................... 147
TABELA 33 Idade que comeou a trabalhar...................................................... 147
TABELA 34 Participao em cursos de Educao Profissional......................... 148
TABELA 35 Motivo que o(a) levaria a voltar a estudar....................................... 148
TABELA 36 Garantia de emprego aps a concluso do curso de Educao Profissional......................................................................................
148
TABELA 37 Opinio dos alunos quanto aos cursos de Educao Profissional......................................................................................
149
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
APL Arranjo Produtivo Local
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
Bird Banco Internacional de Reconstruo e Desenvolvimento
CBAI Comisso Brasileiro-Americana Industrial
Capes Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior
CEB Cmara de Educao Bsica
Cefet Centro Federal de Educao Tecnolgica
Ceeteps Centro Estadual de Educao Tecnolgica Paula Souza
Cepal Comisso Econmica para a Amrica Latina e o Caribe
CFE Conselho Federal de Educao
CNCT Cadastro Nacional de Cursos Tcnicos
CNE Conselho Nacional de Educao
Concefet Conselho dos Dirigentes do Centro Federal de Educao
Tecnolgica
Confintea Conferncia Internacional de Educao de Adultos
Conif Conselho dos Dirigentes das Instituies da Rede Federal de
Educao Profissional, Cientfica e Tecnolgica
CPF Cadastro de Pessoa Fsica
DCNs
DOU
Diretrizes Curriculares Nacionais
Dirio Oficial da Unio
DS Programa de Demanda Social
EAF Escola Agrotcnica Federal
EJA Educao de Jovens e Adultos
EPCT Educao Profissional, Cientfica e Tecnolgica
FAT/MTb Fundo de Amparo ao Trabalhador do Ministrio do Trabalho
FIC Formao Inicial e Continuada
FMEPT Frum Mundial de Educao Profissional e Tecnolgica
FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao
Fundeb Fundo de Manuteno e Desenvolvimento da Educao Bsica e de
Valorizao dos Profissionais da Educao
Fundef Fundo de Manuteno e Desenvolvimento do Ensino Fundamental
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
Ideb ndice de Desenvolvimento da Educao Bsica
IDH ndice de Desenvolvimento Humano
IDORT Instituto de Organizao Racional do Trabalho
IES Instituio de Ensino Superior
IF Instituto Federal
INEP Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira
LDBEN
MDA
MDS
Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional
Ministrio de Desenvolvimento Agrrio
Ministrio de Desenvolvimento Social e Combate Fome
MEC Ministrio da Educao
MMA Ministrio do Meio Ambiente
MTE Ministrio do Trabalho e Emprego
OIT Organizao Internacional do Trabalho
Pabaee Programa de Assistncia Brasileiro-Americana ao Ensino Elementar
PDE Plano de Desenvolvimento da Educao
PICDT Programa Institucional de Capacitao Docente e Tcnica
PL Projeto de Lei
Pnad Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios
PNE Plano Nacional de Educao
PQI Programa de Qualificao Institucional
Proeja Programa Nacional de Integrao da Educao Profissional com a
Educao Bsica na Modalidade Educao de Jovens e Adultos
Proep
ProJovem
Programa de Expanso da Educao Profissional
Programa Nacional de Incluso de Jovens
Pronap Programa Nacional de Apoio ao Ensino e Pesquisa em reas
Estratgicas
Pronasci Programa Nacional de Segurana Pblica com Cidadania
RTS
SAF
SBF
SDT
SEB
Rede de Tecnologia Social
Secretaria de Agricultura Familiar
Secretaria de Biodiversidade e Floresta
Secretaria de Desenvolvimento Territorial
Secretaria de Educao Bsica
Secad Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade
Seed-PR Secretaria de Estado de Educao do Paran
Sefor Secretaria de Formao e Desenvolvimento Profissional
Senac
Senaes
Servio Nacional de Aprendizagem Comercial
Secretaria Nacional de Economia Solidria
Senai
Senete
SNJ
SPPE
Servio Nacional de Aprendizagem Industrial
Secretaria Nacional de Educao Tecnolgica
Secretaria Nacional de Juventude
Secretaria de Polticas Pblicas de Emprego
Setec Secretaria de Educao Profissional e Tecnolgica
Sistec Sistema Nacional de Informaes da Educao Profissional e
Tecnolgica
TAE Tcnico em Assuntos Educacionais
TICs Tecnologias de Informao e Comunicao
Unesco
Uned
Organizao das Naes Unidas para Educao, Cincia e Cultura
Unidade de Ensino Descentralizada
Unisinos Universidade do Vale do Rio dos Sinos
USOM-B
UTFPR
United States Operation Mission-Brasil
Universidade Tecnolgica Federal do Paran
SUMRIO
INTRODUO ..................................................................................................... 14
ESTRUTURA DO TRABALHO............................................................................. 18
1 CONTEXTUALIZAO DA PESQUISA.............................................................. 20
1.1 CONCEPES E PRINCPIOS DO PROEJA..................................................... 24 1.1.1 O ponto: Educao Profissional, Empregabilidade, Competncias, Habilidades
e Educao Empreendedora................................................................................ 26
1.1.2 O contraponto: a Educao Politcnica e o trabalho como princpio educativo...............................................................................................................
29
2 EVIDNCIAS HISTRICAS DO PAPEL SOCIAL DAS INSTITUIES DA REDE FEDERAL DE EDUCAO PROFISSIONAL, CIENTFICA E TECNOLGICA...................................................................................................
34
2.1 CONFIGURAO DA REDE FEDERAL DE EDUCAO PROFISSIONAL, CIENTFICA E TECNOLGICA...........................................................................
54
3 O PROEJA COMO POLTICA PBLICA DE EDUCAO PROFISSIONAL E TECNOLGICA...................................................................................................
59
3.1 O TERMO EDUCAO PROFISSIONAL............................................................ 62 3.2 O PROGRAMA NACIONAL DE INTEGRAO DA EDUCAO
PROFISSIONAL COM A EDUCAO BSICA NA MODALIDADE EDUCAO DE JOVENS E ADULTOS (PROEJA).............................................
64
3.3 MATRCULAS DO PROEJA REGISTRADAS NO SISTEMA NACIONAL DE INFORMAES DA EDUCAO PROFISSIONAL E TECNOLGICA (SISTEC)...............................................................................................................
71
3.4 PROGRAMAS E AES DO GOVERNO FEDERAL VINCULADOS AO PROEJA................................................................................................................
74
4 PROCEDIMENTO METODOLGICO E ANLISE............................................. 89
4.1 O OLHAR DOS PESQUISADORES................................................................... 95 4.2 O OLHAR DAS INSTITUIES DA REDE FEDERAL DE EDUCAO
PROFISSIONAL, CIENTFICA E TECNOLGICA............................................... 110
4.3 O OLHAR DOS ALUNOS E ALUNAS MATRICULADOS NO CURSO PROEJA................................................................................................................
121
4.4 O OLHAR DOS POTENCIAIS FUTUROS ALUNOS E ALUNAS DO PROEJA................................................................................................................
134
4.5 RESULTADOS...................................................................................................... 153
5 CONSIDERAES FINAIS................................................................................. 158
6 REFERNCIAS.................................................................................................... 163
ANEXOS............................................................................................................... 183
14
INTRODUO J sonhamos juntos, semeando as canes no vento. Quero ver crescer essa voz, no que falta sonhar. J choramos muito, muitos se perderam no caminho. Mesmo assim no custa inventar, uma nova cano, Que venha nos trazer sol de primavera, Abre as janelas do meu peito... A lio sabemos de cor, s nos resta aprender!
BETO GUEDES, 1979
A tentativa de sonhar junto aos trabalhadores e trabalhadoras que
buscam uma vida mais digna, mesmo pressupondo que a lio sabemos de cor,
depara-se com o desafio de buscar alternativas para garantir aos jovens e adultos
dos muitos que se perderam no caminho o direito educao e ao trabalho.
Inventar uma nova cano assim que se apresenta o objeto de estudo a ser
analisado, o Programa Nacional de Integrao da Educao Profissional com a
Educao Bsica na Modalidade Educao de Jovens e Adultos, o Proeja.
Destaca-se tratar de um programa que concilia trs vertentes: a
Educao Profissional, a Educao Bsica e a Educao de Jovens e Adultos (EJA),
que almeja uma formao com profissionalizao no sentido de contribuir para a
integrao social das pessoas que no concluram a Educao Bsica em ter
acesso formao profissional de qualidade (BRASIL, 2007).
O Proeja relativamente novo no cenrio da educao brasileira,
implantado em 2006 e apresenta-se como uma das diretrizes emanadas pela
Secretaria de Educao Profissional e Tecnolgica do Ministrio da Educao
(Setec/MEC) que afirma que o Proeja, mais do que um projeto educacional, ser um
instrumento de resgate da cidadania de grande parcela dos brasileiros expulsos do
sistema escolar por problemas encontrados dentro e fora da escola (BRASIL, 2007).
A opo em pesquisar este tema deu-se principalmente pelo desafio
que o Proeja apresenta que a educao integrada, com o entendimento de que
esta a concepo de formao humana que preconiza a integrao de todas as
dimenses da vida, do trabalho, da cincia e da cultura (RAMOS, 2010, p. 67). A
integrao da Educao Bsica e a Educao Profissional, salvo as dificuldades
encontradas, j objetivo perseguido pelos cursos tcnicos integrados. Ressalta-se
que o maior desafio centra-se na integrao destas duas reas modalidade
Educao de Jovens e Adultos. Pela especificidade da modalidade EJA e a busca
15
pelo ensino integrado, a reduo de carga horria nas disciplinas de Educao
Bsica em relao aos cursos tcnicos regulares1, pode-se incorrer no risco de que
o Proeja seja reduzido mera profissionalizao, para insero no mercado de
trabalho.
O Proeja abarca uma mirade de aes que se articulam sua oferta, a
fim de auxiliar e minimizar os impactos em seu processo de implantao. Ressalta-
se que, grande parte das aes possuem financiamento e gesto da Setec/MEC.
Entre as aes, destacam-se a oferta de cursos para formao de docentes e
gestores, especificamente aos que j atuam ou atuaro no Proeja, configuradas
como especializao lato sensu ou cursos de extenso; apoio produo de
material terico, como publicao de livros; incentivo formao de pesquisadores
para este tema especfico, por meio de parcerias com universidades, para formao
de grupos de pesquisa; mecanismo de acompanhamento das instituies ofertantes
a fim de apoiar os gestores, coordenadores de curso e professores, com intuito de
minimizar as taxas de evaso; alm do auxlio para a permanncia do aluno no
Proeja, ou seja, a possibilidade de os alunos receberem auxlio financeiro para
custearem, por exemplo, transporte, alimentao ou material didtico. Tais fatos
tambm se configuraram como determinantes para a opo de estudo deste objeto
de pesquisa.
Para buscar informaes sobre as instituies ofertantes do Proeja,
ficou delimitada a investigar to somente as instituies vinculadas rede federal de
Educao Profissional, Cientfica e Tecnolgica (EPCT), aqui denominada, rede
federal2. Tal escolha se deu em razo de que no primeiro decreto, a implantao era
restrita a estas instituies, e em decorrncia, a presena do Proeja ainda
incipiente nas redes estaduais e municipais. Justifica-se tambm por sua
1 Cursos regulares: como j descreveram Frigotto (2009) e Moura (2009), no no sentido de
considerar que o que no regular irregular, mas para diferenciar cursos, como os de ensino regular e o supletivo, de regularidade, ou seja, regular aqui considerado como fluxo educacional contnuo.
2 De acordo com a Lei n 11.892, de 29 de dezembro de 2008 que instituiu a Rede Federal de
Educao Profissional, Cientfica e Tecnolgica, que cria os Institutos Federais de Educao, Cincia e Tecnologia, a rede federal constituda pelas seguintes instituies: I - Institutos Federais de Educao, Cincia e Tecnologia - Institutos Federais; II Universidade Tecnolgica Federal do Paran UTFPR; III Centros Federais de Educao Tecnolgica Celso Suckow da Fonseca Cefet-RJ e de Minas Gerais CEFET-MG; IV Escolas Tcnicas vinculadas s Universidades Federais.
16
capilaridade, tendo em vista que a rede federal se faz presente em todos os estados
da federao e Distrito Federal.
J nos primeiros contatos com algumas instituies ofertantes,
detectou-se que, naquele momento, destacavam-se algumas fragilidades, como a
procura insatisfatria ao curso por parte de alunos. Cita-se inclusive instituies que,
aps publicao e divulgao de seus editais de seleo para ingresso, as vagas
no foram preenchidas e, portanto, os editais foram reabertos para preenchimento
de vagas remanescentes. Outro fato preponderante foi o elevado ndice de evaso
apresentado no curso.
O Relatrio Global sobre Aprendizagem e Educao de Adultos
(UNESCO, 2010), compilou nos Relatrios dos Pases3 os diversos tipos de oferta
de Educao de Adultos e classificou-os em:
competncias bsicas/gerais (exemplo: alfabetizao);
profissionalizante/tcnica e para gerao de
renda/treinamento em servio;
habilidade de vida, ps-alfabetizao e assuntos de
sade;
gerao de conhecimentos e inovao (exemplos:
tecnologias de informao e comunicao - TICs, lngua
estrangeira);
educao em direitos humanos e educao cvica;
educao liberal/pessoal (exemplo: artstica, cultural);
educao continuada;
educao de segunda chance;
treinamento de professores;
educao secundria.
Neste trabalho, ao referir-se Educao de Jovens e Adultos, destaca-
se tratar da profissionalizante/tcnica e para gerao de renda/treinamento em
servio. Observe-se que este o nico vis da EJA que sugere vinculao da
formao especfica para o trabalho. Apesar de o Proeja tratar da imbricao do
3 Relatrios nacionais preparados para a CONFINTEA VI, no Relatrio Global sobre Aprendizagem e
Educao (UNESCO, 2010, p. 44-45).
17
trip, Educao Profissional, Educao Bsica e Educao de Jovens e Adultos
(EJA), este trabalho se restringir a abordar a tica da Educao Profissional.
O recorte temporal ficou restrito ao perodo de 2006, ano de
implantao do Proeja, a 2010, ano limite de acesso s informaes disponveis at
o momento da redao deste trabalho.
De acordo com o Decreto n 5.840 de 13 de julho de 2006, que
atualmente rege o Proeja, as possibilidades de oferta so os cursos e programas de
Educao Profissional de Formao Inicial e Continuada de trabalhadores
(Proeja/FIC) e a Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio. Estas podero ser
articuladas ao Ensino Fundamental ou ao Ensino Mdio, este ltimo de forma
integrada4 ou concomitante5. A delimitao de opo de anlise restringiu-se
vinculao do Proeja com o Ensino Mdio na forma integrada.
Este estudo tem como referencial a leitura de pesquisadores que se
dedicaram a investigar a relao entre a educao e o trabalho, principalmente
baseado no dilogo com Frigotto, Ciavatta, Ramos, Machado, Kuenzer, Bueno,
Gramsci, Saviani, Ferretti, Moura, Oliveira, entre outros.
Por ser polissmico, aqui se adota o termo tecnologia sob a tica de
Gama (1986), entendendo tecnologia como cincia do trabalho produtivo, e o
trabalho como categoria do saber e da produo. Tambm se compactua com a
viso de Gramsci (1991), da integrao do trabalho manual e intelectual com o
trabalho como princpio educativo.
Considera o Proeja como um curso de Educao Profissional integrado
Educao Bsica, ou seja, no se desvincula a formao profissional dos
conhecimentos cientficos historicamente acumulados pela humanidade, do
conhecimento especfico de cada eixo tecnolgico6. Em se tratando, neste caso, do
4 Integrada: oferecida somente a quem j tenha concludo o Ensino Fundamental, sendo o curso
planejado de modo a conduzir o aluno habilitao profissional tcnica de nvel mdio, na mesma instituio de ensino, contando com matrcula nica para cada aluno (Decreto n 5.154/2004). 5 Concomitante: oferecida somente a quem j tenha concludo o Ensino Fundamental ou esteja
cursando o Ensino Mdio, na qual a complementaridade entre a Educao Profissional tcnica de nvel mdio e o Ensino Mdio pressupe a existncia de matrculas distintas para cada curso, podendo ocorrer: a) na mesma instituio de ensino, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponveis; b) em instituies de ensino distintas, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponveis; ou c) em instituies de ensino distintas, mediante convnios de intercomplementaridade, visando o planejamento e o desenvolvimento de projetos pedaggicos unificados (Decreto n 5.154/2004). 6 Eixo Tecnolgico: a Educao Profissional, antes voltada para reas especficas, passa a ser
agrupada em torno de fundamentos cientficos comuns, configurando os eixos tecnolgicos (SENAC, 2010). O Catlogo Nacional de Cursos Tcnicos agrupa os cursos conforme suas caractersticas
18
Ensino Mdio Integrado, analisa o Proeja sob a perspectiva da Educao Politcnica
de Saviani e pela formao omnilateral dos trabalhadores.
Este trabalho tem como objetivo geral, analisar a implantao do
Proeja na rede federal de Educao Profissional, no que se refere aos aspectos
internos instituio, sob o olhar dos envolvidos no processo, representados por
docentes, coordenadores de curso, alunos e principalmente, futuros alunos.
Tem como objetivos especficos:
verificar a produo cientfica sobre o Proeja nos programas de
ps-graduao stricto sensu;
descrever percalos e casos de sucesso na implantao do
Proeja sob o olhar das instituies ofertantes.
Diante disso pergunta-se: Em que medida, em seu processo de
implantao, o Proeja tem atendido as concepes e princpios dos objetivos
propostos, prescritos nos documentos oficiais no que se refere integrao da
Educao Profissional com a Educao Bsica na modalidade Educao de Jovens
e Adultos?
ESTRUTURA DO TRABALHO
O trabalho foi organizado em cinco captulos.
A Introduo tem por objetivo apresentar a delimitao do objeto de
estudo e o que motivou a realizao deste trabalho.
O primeiro captulo primou em aproximar o leitor do objeto de estudo,
demonstrar a gnese da pesquisa, os pressupostos, as concepes e os princpios
do Proeja.
cientficas e tecnolgicas em 12 eixos tecnolgicos que somam, ao todo, 185 possibilidades de oferta de cursos tcnicos. Cumprindo a funo de apresentar denominaes que devero ser adotadas nacionalmente para cada perfil de formao, o Catlogo Nacional de Cursos Tcnicos no impede, entretanto, o atendimento s peculiaridades regionais, possibilitando currculos com diferentes linhas formativas (SETEC/MEC, 2010).
19
O segundo captulo expe o papel social das instituies da rede
federal, por meio da apresentao da trajetria histrica percorrida tanto pela
Educao Profissional quanto pelas instituies, sob a tica da legislao
educacional brasileira, das Escolas de Aprendizes Artfices at os atuais Institutos
Federais de Educao, Cincia e Tecnologia.
O terceiro captulo apresenta o Proeja, seus objetivos, formas de oferta
e de financiamento e respectivas intenes e possibilidades imbricadas neste
programa. Elenca tambm as aes da Setec/MEC vinculadas oferta do Proeja.
O quarto captulo incide na discusso do caminho metodolgico
percorrido pela pesquisa, caracterizada como qualiquantitativa. Apresenta a
organizao e sistematizao do estudo, buscando o rigor metodolgico necessrio
em uma pesquisa. Apresenta os instrumentos de coleta de dados, os participantes e
o mtodo utilizado. Busca demonstrar:
a) a produo cientfica relacionada ao Proeja, apresentada em
Programas de Ps-Graduao stricto-sensu, cadastrados junto ao
Banco de Teses da Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal
de Nvel Superior (Capes) de 2006 a 2009;
b) parte da trajetria na implantao do Proeja na rede federal sob o
olhar das instituies ofertantes, representadas por docentes e
coordenadores, tendo em vista o papel fundamental que estes
possuem na implementao de uma proposta;
c) conhecer o perfil do aluno matriculado no Proeja, e sob sua tica,
verificar o cumprimento de suas expectativas de formao
profissional e pessoal quanto ao curso em questo;
d) apresentar ao trabalhador jovem e adulto com perfil para tornar-se
futuro aluno do Proeja, a forma de oferta, bem como entender quais
caractersticas este curso deveria assumir para que estes se
matriculem, tanto como forma de retorno escola, quanto para
adquirir formao profissional tcnica de nvel mdio e
principalmente, para a formao cidad.
Por fim, no quinto captulo, foram traadas as consideraes finais
sobre o projeto de investigao.
20
1 CONTEXTUALIZAO DA PESQUISA
A cabea pensa onde os ps pisam
Paulo Freire
A opo por pesquisar a Educao Profissional vem de uma trajetria
profissional de quase duas dcadas. Aprovada em concurso pblico de uma
instituio de Educao Profissional, houve a necessidade de entender sua
especificidade. Quando se refere formao de trabalhadores, os objetivos so
apresentados, muitas vezes como antagnicos principalmente quando se pergunta a
quais interesses ou finalidades essa modalidade atende. Com o decorrer dos anos,
pela (con)vivncia com casos de sucesso e por outros nem to bem-sucedidos a
Educao Profissional passou a ser vista como excelente alternativa aos que vivem
do trabalho (KUENZER, 2002).
Ao pensar no relacionamento entre a educao e o trabalho, depara-se
com dados da Sntese de Indicadores Sociais de 2009, do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatstica (IBGE, 2010), que aponta que somente 37,9% dos jovens de
18 a 24 anos conseguiram completar os primeiros 11 anos de estudo7, o que
corresponde concluso da Educao Bsica. O estudo indica, ainda, que, entre os
pases do Mercosul, o Brasil possui a maior taxa de abandono da escola por parte
dos jovens. Apenas 50% dos adolescentes de 15 a 17 anos esto cursando a srie
adequada idade. Em decorrncia, essa diferena educacional determina
preponderantemente as oportunidades aos jovens brasileiros e contribui fortemente
para acentuar as diferenas sociais.
No seminrio Perspectivas e Propostas na Formao para o Mundo do
Trabalho, Frigotto (2007) apresentou que a fora de trabalho brasileira adulta tem
em mdia apenas 3,5 anos de escolaridade, e completa com o questionamento de
Belluzzo (2004): os pases pobres so pobres porque tm pouca escolaridade, ou
tm pouca escolaridade porque so pobres? So excludos porque tm pouca
escolaridade, ou tm pouca escolaridade porque so excludos?
categrico afirmar que um grande contingente de jovens precisa
antecipar a entrada no mundo do trabalho. Pelas necessidades prioritrias de
7 Anos de estudo: classificao obtida em funo da srie e do nvel ou grau mais elevado alcanado
pela pessoa, considerando a ltima srie concluda com aprovao. Cada srie concluda com aprovao corresponde a um ano de estudo (IBGE, 2008).
21
sobrevivncia e para auxiliar no oramento familiar, falta-lhes tempo para ir escola
e, em consequncia, abandonam os estudos. Acrescentam-se fatores culturais que
no valorizam a escolaridade e contribuem para retardar ou afast-los do percurso
escolar regular. Assim, a modalidade Educao de Jovens e Adultos (EJA) passa a
ser uma alternativa queles que pretendem concluir parte de sua escolarizao.
nesse contexto que esses cidados procuram retornar escola, com
a certeza de que a falta de escolarizao no lhes permite um emprego ou
condies melhores de vida. Aqui, ressalta-se a concepo de Frigotto (2007)
quanto culpabilizao da vtima, ou seja, atribui-se unicamente a cada indivduo a
responsabilidade pela ausncia de formao, pela falta de oportunidade, tanto
pessoal quanto profissional, relacionada baixa escolarizao, ausncia de
capacitao profissional e, consequentemente, de emprego, sem considerar os
aspectos determinantes a este contexto, vinculados aos aspectos sociais,
econmicos, geogrficos, culturais, entre outros. Oliveira (2008) afirma que se retira
do Capital e do Estado a responsabilidade pela implementao de medidas capazes
de garantir mnimas condies de sobrevivncia da populao, bem como do direito
ao trabalho.
Ciente da dualidade existente na educao brasileira preciso
minimizar a viso que classifica a Educao Profissional como mero ensino
operacional, de cunho pragmtico, em decorrncia da diviso entre os que pensam
e planejam e aqueles que apenas executam, ou seja, aquela que oferta uma
formao precria para trabalhadores precarizados (KUENZER, 2002). Sobre essa
formao precria, Florestan Fernandes, no prefcio do livro de Buffa e Nosella
(1997, p. 11), aponta que se estabeleceu uma poltica sistemtica de circunscrever
o mundo da escola s elites das classes dominantes e de excluir a massa da
populao da escolaridade obrigatria.
Bueno (2000, p. 9) menciona a responsabilidade pelas transformaes
sociais que foram delegadas educao, ao mesmo tempo em que ela reduzida a
fator que contribuiu para associar crescimento econmico, qualidade de vida e
democratizao. A autora ressalta que o conhecimento humano fica rebaixado a
recurso estratgico de desenvolvimento, confundido com informao. Nessa
dimenso, o trabalho, que considerado base da cidadania poltica, tem sua
concepo reduzida, visto como mero fator de produo e no como categoria
ontolgica e econmica fundamental.
22
Uma tendncia amplamente conhecida no campo da educao a
denominada Teoria do Capital Humano, formulada no incio da dcada de 1960 por
Theodore Schultz. A teoria refere-se busca em aumentar a produtividade baseada
no recurso humano, em que o homem colocado como apenas mais um recurso,
junto aos financeiros, fsicos, materiais, entre outros. Oliveira (2004) argumenta que
a educao deveria ser um instrumento de construo de relaes mais solidrias e
no apenas como instrumento de formao para o mercado de trabalho.
Para Oliveira (2004), essa retomada do discurso dos anos de 1960,
de que a profissionalizao pela via da escolarizao garantiria aos indivduos as
condies para competirem no mercado de trabalho e melhorarem suas condies
econmicas, comprova a ineficcia dessas proposies. Este autor afirma que a
desigualdade social no consequncia da distribuio desigual do conhecimento,
mas decorre das prprias caractersticas do modelo econmico que tende a
concentrar riqueza.
Sob esse mesmo ponto de vista, Frigotto (apud BIANCHETTI, 2001, p.
28) argumenta que:
[...] assim como na sociedade, a educao enfatiza a lgica de mercado como estruturadora das relaes sociais e polticas, com tica marcadamente utilitarista, que induz a motivao dos comportamentos humanos na busca permanente da utilidade individual.
Para Santos (1999), o predomnio dos processos de excluso sobre os
de incluso, do capital sobre o trabalho, do mercado sobre a democracia, leva a uma
crise tica, civilizatria e paradigmtica. Coggiola (2001, p. 9) defende que em
harmonia com as teses sobre o capital humano, a educao foi definida como um
dos fatores que explicam as diferenas econmicas e sociais entre naes
desenvolvidas e subdesenvolvidas e entre classes sociais.
Nesse sentido, de um lado se posiciona o capitalismo, representado
pelo setor produtivo, que objetiva o lucro e, de outro, o trabalho humano, que almeja
qualidade de vida pela educao emancipatria. Desse processo agrava-se a crise
estrutural do emprego, em que no se pode subsumir a cidadania como mera
incluso no mercado de trabalho, mas assumir a formao do cidado que produz,
pelo trabalho, a si e o mundo (BRASIL, 2007). No se trata de ofertar formas
paliativas para o emprego e nem de educao assistencialista (FERRETI e SILVA,
2000).
23
Desse modo, Harvey (1994) aponta que o capitalismo orientado para
o crescimento busca a evoluo em valores reais e se apoia na explorao do
trabalho vivo na produo. O trabalhador deve ser capaz de cumprir as exigncias
fora de trabalho e ser responsvel tanto por sua insero quanto pela organizao
no processo produtivo e da que se criam as relaes de classe entre o trabalho e
o capital.
Laudares (2006, p. 102) enfatiza que ao capitalista interessa a
crescente produtividade no processo do trabalho, e a vitria da competitividade, sem
ruptura na ordem social da ideologia capitalista. Essa ideia reforada por Frigotto
(1989), que argumenta que a crtica ressurge acompanhada das recomendaes de
eficincia e produtividade presentes no referencial neoliberal, em que o sistema
capitalista busca, cada vez mais, retirar do trabalhador o controle do seu processo
de trabalho.
Zanella (2003) defende que, sob a tica do capital, a escola pblica
restringe-se a formar o trabalhador coletivo para atender s demandas do processo
produtivo tal como requer a organizao do trabalho. Neste caso, sob a tica da
classe trabalhadora, a escola pblica tem no trabalho concreto industrial o seu
princpio educativo. A formao requerida omnilateral, tecnolgica, de
emancipao humana e social. Para Souza Jnior (2008), omnilateralidade refere-se
a uma formao humana oposta formao unilateral provocada pelo trabalho
alienado, pela diviso social do trabalho.
Entre as definies de trabalho, destaca-se Ramos (2010) que defende
que, no sentido ontolgico, o trabalho processo de objetivao humana inerente ao
ser, como tambm mediao fundamental de suas relaes com a realidade material
e social. Para Mszros (2006) o trabalho atividade produtiva fundamental da
humanidade, modo humano de existncia.
Segundo Kosik (1986, p. 180), o trabalho um processo que permeia
todo o ser do homem e constitui sua especificidade. Neste contexto, Frigotto (2010)
assevera que o trabalho no se reduz atividade laborativa ou ao emprego, mas
produo de todas as dimenses da vida humana. Lukcs (1978) afirma que o
trabalho no pode ser confundido com as formas histricas que o trabalho assume,
do trabalho servil, escravo ou assalariado. Marx (2006) utilizou os termos trabalho
abstrato e concreto. O trabalho concreto, caracterizado por seu valor de uso,
24
produzido para a satisfao das necessidades humanas e o trabalho abstrato, por
seu valor de troca, de tempo de trabalho por salrio, representado pelo dinheiro.
Assim, o significado de trabalho adquire vrias conotaes. Ciavatta
(2008) aponta que as palavras trabalho, labor (ingls), travail (francs), arbeit
(alemo), ponos (grego) tem a mesma raiz de fadiga, pena, sofrimento, pobreza.
Assim tambm, Depresbteres (2000) cita que a palavra trabalho vem do latim,
tripalium, um instrumento usado antigamente para tortura. Para Ciavatta (1990), o
trabalho no necessariamente educativo, depende das condies de sua
realizao, dos fins a que se destina, de quem se apropria do produto do trabalho e
do conhecimento que gerado a partir dele. Trata-se da compreenso do trabalho
em seu sentido ontolgico e histrico.
1.1 CONCEPES E PRINCPIOS DO PROEJA
O Documento Base (BRASIL, 2007), fonte basilar do Proeja, tem por
objetivo fornecer subsdios para sua implantao. Esse documento aborda a
Educao de Jovens e Adultos no Brasil e apresenta a necessidade de integrao
da Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio e o Ensino Mdio na Modalidade
EJA, bem como os grupos destinatrios dessa poltica e o descompasso da EJA em
relao Educao Bsica. Apresenta as concepes e os princpios do Proeja, a
fundamentao no que se refere a um Projeto Poltico-Pedaggico integrado.
Finaliza expondo os aspectos operacionais relativos ao plano de implantao,
implementao e avaliao do Proeja.
As concepes e os princpios do Proeja esto apresentados neste
Documento Base. Para entender a concepo do Proeja, cabe caracterizar,
primeiramente, o significado da palavra concepo. O Dicionrio Aurlio da Lngua
Portuguesa (FERREIRA, 2010) aponta que o ato de conceber ou criar
mentalmente, de formar idias, principalmente abstraes; maneira de formular um
projeto original, um plano para posterior realizao; noo, conceito, compreenso.
Por princpio entende-se preceito, proposies diretoras de uma cincia, s quais
todo desenvolvimento posterior deve estar subordinado (FERREIRA, 2010). Ciavatta
25
(2008) argumenta que princpios so leis ou fundamentos gerais de uma
determinada racionalidade, dos quais derivam leis ou questes especficas.
No Documento Base (2007, p. 35) a concepo do Proeja est
fundamentada na integrao entre trabalho, cincia, tcnica, tecnologia, humanismo
e cultura geral. O objetivo dessa formao contribuir para o enriquecimento
cientfico, cultural, poltico e profissional, pela indissociabilidade dessas dimenses
no mundo real. Ramos (2010) apresenta que a concepo de educao integrada
tem como horizonte a formao politcnica e omnilateral dos trabalhadores. Busca a
integrao de todas as dimenses da formao humana.
Cabe ressaltar a importncia dada pelo governo Lula s polticas que
possibilitam e priorizam a oferta da educao integrada, tanto pela revogao do
Decreto n 2.208 de 1997 e a promulgao do Decreto n 5.154/2004 que permitiu o
retorno da oferta dos cursos integrados, assim como pela oferta do Proeja que se
baseia na integrao das trs reas j citadas, a a Educao Bsica, a Educao
Profissional e a Educao de Jovens e Adultos. Desta forma, o Documento Base
inclui, como primeiro princpio do Proeja, o papel e o compromisso das instituies
pblicas com a incluso da populao de jovens e adultos que no concluram a
Educao Bsica em idade regular, no simplesmente pelo acesso escola, mas
por sua permanncia e principalmente pelo sucesso. O segundo princpio consiste
na insero orgnica da modalidade EJA integrada Educao Profissional nos
sistemas educacionais pblicos, sob a perspectiva da educao como direito do
cidado.
O terceiro princpio busca ampliar o direito Educao Bsica, pela
universalizao do Ensino Mdio, entendendo que a formao humana no se faz
em curtos espaos de tempo. O trabalho como princpio educativo apresenta-se
como quarto princpio. O quinto apresenta a pesquisa como fundamento da
formao da pessoa atendida nessa poltica e, por fim, das condies geracionais,
de gnero, das relaes etnicorraciais como fundantes da formao humana e dos
modos como se produzem as identidades sociais, que caracterizam o sexto
princpio.
O Documento Base (BRASIL, 2007, p. 5) expe que:
[...] a consolidao desse projeto educacional tem como fundamento a integrao entre trabalho, cincia, tcnica, ecologia, humanismo e cultura geral com a finalidade de contribuir para o enriquecimento cientfico,
26
cultural, poltico e profissional como condies necessrias para o efetivo exerccio da cidadania.
A proposta do Proeja assume a Declarao de Hamburgo de 1997, no
que se refere condio humanizadora que se faz ao longo da vida. De uma
educao que no se restrinja a tempos prprios e a faixas etrias especficas.
1.1.1 O ponto: Educao Profissional, empregabilidade, competncias, habilidades e
educao empreendedora
A Educao Profissional traz consigo uma gama de nomenclaturas e
termos que acabam por formar um arcabouo de chaves que caracterizam essa
modalidade educacional. Esses termos foram reforados com a promulgao do
Decreto n 2.208/1997, que separou a Educao Bsica da Educao Profissional e
possibilitou uma formao rpida, na busca da eficincia e da eficcia, inclusive com
ensino por mdulos, com o intuito de certificar em menos tempo.
Surgem termos como profissionalizao, laboralidade,
empregabilidade8, educao empreendedora, assim como a adoo da pedagogia
das competncias. Ao vincular a Educao Profissional com o objetivo linear de
profissionalizar, Saviani (apud RAMOS, 2010, p. 44) argumenta que a
profissionalizao entendida como um adestramento a uma determinada
habilidade sem o conhecimento dos fundamentos dessa habilidade e, menos ainda,
da articulao dessa habilidade com o conjunto e a viso de totalidade do processo
produtivo.
A profissionalizao vista como resultado de uma formao
aligeirada, precria, de pequena parte de um processo, sem vnculo com os
conhecimentos de base cientfica, que visa atender rapidamente s demandas do
mercado de trabalho. Em consequncia, busca capacitar pouco, para que se
possa remunerar pouco, bem como obter um grande nmero de trabalhadores
8 De acordo com Sassaki (2010), um colegiado composto de 53 empresas e rgos canadenses, a
Conference Board of Canada divulgou o Employability 2000+ (Empregabilidade para os anos 2000 e alm), que traz como subttulo as habilidades que voc necessita para entrar, permanecer e progredir no mundo do trabalho, seja trabalhando sozinho ou como parte de uma equipe.
27
precrios, para formar reserva de mo-de-obra. Em decorrncia, os que no
aceitarem as regras sero dispensados. Da advm as condies que permitem um
trabalho mal remunerado, precrio e com nfimos benefcios sociais.
Nessa viso do sistema capitalista, discute-se a importncia de tornar-
se empregvel, isto , buscar formao continuada permanente, como se a
possibilidade de estudar ou de matricular-se em cursos fosse mera opo do
trabalhador, enquanto parte significativa da populao brasileira ainda procura
apenas sobreviver. Da mesma forma, empregabilidade para Oliveira (2008), tem sido
compreendida como a capacidade de o indivduo inserir-se no mercado de trabalho,
denotando a necessidade de agrupar um conjunto de ingredientes que o torne capaz
de competir com todos aqueles que disputam e lutam por um emprego. O autor
defende que este conceito empregabilidade surgiu como instrumento de
relativizao da crise do emprego, face incapacidade do setor produtivo de
incorporar ou manter o mesmo nmero de trabalhadores. Desse modo,
empregabilidade, para Oliveira (2008), a incapacidade do Estado de criar
mecanismos eficazes para diminuir o desemprego.
Diante desse cenrio, busca-se a capacidade de manter-se
empregado, ou seja, proteger sua carreira profissional da instabilidade do capital, a
fim de preparar-se para atender s exigncias da produo. Cabe refletir ento, se a
diferena entre classes sociais depende exclusivamente da quantidade de
conhecimento e do esforo pessoal.
Neste mesmo raciocnio, ganham fora termos como competncias e
habilidades, ou seja, o ensino baseado em uma pedagogia das competncias, que
acaba por proporcionar apenas o suficiente para desempenhar uma funo
especfica, e no uma slida formao que permita a compreenso dos
fundamentos cientfico-tecnolgicos do processo produtivo, conforme prope a
LDBEN n 9.394/1996, nos Artigos 35 e 36.
Destaca-se a argumentao de Kuenzer (2002) sobre a necessidade
de superar a noo de competncia, que carrega em seu significado o princpio do
relativismo e do pragmatismo cientfico. Para a autora, a noo de competncia
reduz a atividade criativa e criadora do trabalho a um conjunto de tarefas pr-
estabelecidas. Furtado e Lima (2010) defendem a idia de que a Pedagogia das
Competncias aposta num esvaziamento do papel da escola como instituio
responsvel pela elevao do patamar cultural dos trabalhadores e enfatizam a
28
responsabilidade na formao e desenvolvimento do indivduo em adquirir as
competncias e habilidades necessrias sua adaptao numa sociedade regida
pelo capital.
Para Bueno (2000), as competncias profissionais repassam a ideia da
viso do trabalho como mera ocupao, norteado pelas exigncias e interesses de
mercado. A autora argumenta a adoo de termos como laboralidade, do trabalho
que no pode ser emprego propriamente dito, e do empreendedorismo, com esprito
de risco e iniciativa para gerenciar o seu percurso no mercado de trabalho.
Cabe, aqui, a reflexo feita por Kuenzer (2006, p. 11), de que o
processo de reduo ontolgica conta com mais uma importante estratgia
educativa voltada para a formao de subjetividades e ao mesmo tempo justificar o
insucesso a partir dos sujeitos, como as propostas de educao para o
empreendedorismo.
Salienta-se, aqui, o valor e o respeito ao empreendedorismo e
educao empreendedora como fator de percepo de oportunidades, que
impulsiona a inovao e permite o desenvolvimento, do empreendedorismo utilizado
como iniciativa para criar e inovar, assim como ao cooperativismo, como soma de
foras e sinergia entre pares. Porm, pertinente a crtica que se faz ao
empreendedorismo pelo empreendedorismo, ou seja, aquele que transfere a
responsabilidade ao cidado em criar oportunidades, para que possa, alm de
garantir o seu posto de trabalho, tambm empregar pessoas, a fim de suprir a falta
de trabalho formal, como aponta Bueno (2008).
Para Dornelas (2001, p. 37), o empreendedor aquele que detecta
uma oportunidade e cria um negcio para capitalizar sobre ela, assumindo riscos
calculados. Caracteriza a ao empreendedora em todas as suas etapas, ou seja,
criar algo novo mediante a identificao de uma oportunidade, dedicao e
persistncia na atividade que se prope a fazer para alcanar os objetivos
pretendidos e ousadia para assumir os riscos que devero ser calculados.
Mais uma vez, o cidado quem deve responder pelo sucesso ou
pelas mazelas da sociedade. Esse modelo adotado e imposto cada vez mais,
inclusive pelo capital internacional, pela submisso e dependncia, em decorrncia
de emprstimos que impem a subordinao do pas aos interesses de foras
econmicas externas que compactuam com a ideia de Estado Mnimo, bem como
da liberdade de mercado (BORON, apud OLIVEIRA, 2004).
29
Faleiros (1996) explicita que, alm de fazer o povo aceitar e, portanto,
legitimar as intervenes do Estado e de seus agentes, esses discursos levam a
populao a acreditar na bondade do sistema e do Estado e no fracasso individual.
Esse autor defende que nas sociedades capitalistas avanadas h o discurso da
igualdade, segundo o qual o Estado garante ao cidado a oportunidade de acesso
gratuito a certos servios e prestao de benefcios mnimos para todos, o Welfare
State, ou Estado de Bem-Estar, com o mnimo de garantias para manter a
subsistncia do indivduo.
Nos pases perifricos no existe o Welfare State, pois as polticas
sociais no so para todos devido s profundas desigualdades de classes. No h
acesso universal, ou seja, as polticas tm como alvo apenas certas categorias
especficas da populao, com aes exclusivamente direcionadas, ora para
trabalhadores, ora para crianas, ora para idosos, que so criadas a cada gesto
governamental, segundo critrios clientelsticos e burocrticos (FALEIROS, 1996).
Dessa forma, cabe desvincular a Educao Profissional do papel de
atender prioritariamente s necessidades demandadas pelo setor produtivo, ou seja,
torna-se essencial deslocar o eixo das finalidades, para atender ao homem e sua
formao como cidado, que faz do trabalho categoria fundante da sociedade, ou o
trabalho como sentido da vida (DEMO, 2006).
1.1.2 O contraponto: a Educao Politcnica e o trabalho como princpio educativo
Como contraponto ao pragmatismo que se apresenta vinculado
aplicabilidade imediata dos cursos de Educao Profissional como um todo, este
trabalho apoia-se na Educao Politcnica e no trabalho como princpio educativo.
Pressupondo como essencial ao papel da Educao Profissional o princpio de
incluso social, s ser possvel entender a tecnologia com uma slida formao de
base cientfica, ou seja, se efetivamente houver a integrao de conhecimentos da
cincia pela Educao Bsica e pela Educao Profissional, a fim de garantir a
autonomia do cidado.
Um dos princpios fundamentais do Proeja refere-se ao trabalho como
princpio educativo, isto , aquele que ultrapassa o carter utilitarista e imediatista da
30
formao profissional e proporciona uma formao consistente ancorada no princpio
cientfico para o entendimento do conhecimento tecnolgico. Objetiva gerar
conhecimento que perpasse a base cientfica, que possa garantir tambm uma
consistente base histrica e a cultural, de gesto e tecnolgica. Entender mercado
de trabalho como mundos do trabalho, um mundo plural, numa percepo ampliada
e sistmica de mundo a fim de valorizar o conhecimento presente no cotidiano e
proporcionar a interrelao entre o conhecimento tcito e o cientfico.
De acordo com Ramos (2010, p. 49), o trabalho princpio educativo,
pois impe exigncias especficas para o processo educativo, visando participao
direta dos membros da sociedade no trabalho socialmente produtivo. Assim, esta
autora defende que no se deveria propor que o Ensino Mdio formasse tcnicos
especializados, mas sim politcnicos, pois a relao entre o trabalho e a educao
clama pela necessria vinculao da educao prtica social.
Segundo Ramos (2010), o trabalho princpio educativo, porque
proporciona a compreenso do processo histrico de produo cientfica e
tecnolgica, como conhecimentos desenvolvidos e apropriados socialmente para a
transformao das condies materiais da vida e a ampliao das capacidades, das
potencialidades e dos sentidos humanos.
Ciavatta (2008) argumenta que no trabalho como princpio educativo se
afirma o carter formativo tanto do trabalho como da educao, como ao
humanizadora, por meio do desenvolvimento das potencialidades do homem. A
autora retoma as ideias de Marx (1979), situando a discusso terica no
materialismo histrico, em que se parte do trabalho como produtor dos meios de
vida, tanto nos aspectos materiais como culturais, ou seja, do conhecimento, da
criao material e simblica e das formas de sociabilidade.
Ciavatta (2008) ainda defende que a introduo do trabalho como
princpio educativo na unidade escolar ou na formao de profissionais, supe
recuperar a dimenso do conhecimento cientfico, tecnolgico da escola unitria e
politcnica, introduzir nos currculos a crtica histrico-social do trabalho no sistema
capitalista, os direitos do trabalho e o sentido das lutas histricas no trabalho e na
educao. Ciavatta (1990) argumenta que o trabalho no necessariamente
educativo, pois depende das condies de sua realizao, dos fins a que se destina,
de quem se apropria do produto do trabalho e do conhecimento que gera.
31
Segundo Frigotto (2008), o trabalho como princpio educativo no
uma tcnica didtica ou metodolgica no processo de aprendizagem, mas um
compromisso tico-poltico. O autor afirma que, como princpio educativo, o trabalho
, ao mesmo tempo, dever e direito. um dever porque justo que todos colaborem
na produo de bens materiais, culturais, simblicos, fundamentais produo da
vida humana. um direito porque o ser humano um ser na natureza, que
necessita estabelecer, por sua ao consciente, um metabolismo com o meio
natural, transformando em bens para sua produo e reproduo.
Para Cury (apud BUENO, 2008), as funes clssicas atribudas ao
Ensino Mdio no Brasil so a propedutica, a formativa e a profissionalizante. E
assim que se apresentam as funes do Proeja. O Documento Base do Proeja
prope um currculo integrado que abandona a perspectiva estreita de formao
para o mercado de trabalho, para assumir a formao integral dos sujeitos. Ento, o
fundamento poltico-pedaggico prope a integrao curricular no Proeja, ou seja, a
integrao da Educao Profissional Educao Geral. Impe-se buscar uma
educao integrada para superar o dualismo entre teoria e prtica e entre aqueles
que pensam e os que executam.
Santom (1998) esclarece que o termo currculo integrado tem sido
utilizado quando se busca uma compreenso global do conhecimento e a
interdisciplinaridade entre as disciplinas e formas de conhecimento. Para que se
obtenha a integrao efetiva dos contedos cientficos e tecnolgicos, Saviani
(2002) prope uma educao politcnica, cujo termo, segundo o autor, mais
pertinente do que educao tecnolgica, quando se busca uma formao integral.
Parte-se do entendimento da politecnia como ensino que integra a cincia, cultura,
humanismo e tecnologia para, em consequncia, trazer o homem para o centro do
processo educativo. Inclusive h autores que entendem politecnia como sinnimo de
educao tecnolgica.
Para Saviani (2003, p. 140), politecnia diz respeito ao domnio dos
fundamentos cientficos das diferentes tcnicas que caracterizam o processo de
trabalho moderno. Assim, para este autor, o papel fundamental da escola de nvel
mdio ser o de recuperar a relao entre o conhecimento e a prtica do trabalho.
necessrio buscar uma educao para alm da escola, um ensino que no se
apresente apenas como fim em si mesmo, que no priorize e nem se subordine aos
interesses do setor produtivo ou do mercado de trabalho e de seus empresrios.
32
Baseado neste pressuposto, baseado em Saviani, prope-se como contraponto a
busca de uma escola que seja unitria, um trabalho como princpio educativo e uma
formao politcnica e omnilateral.
Segundo Gomes (2010), a proposta pedaggico-formativa de Karl Marx
para os trabalhadores recebeu, pela traduo portuguesa, o nome de politecnia;
outra sugesto de traduo Educao Tecnolgica. Gomes (2010) explicita que,
na organizao curricular de projetos pedaggicos inspirados na politecnia, deve-se
ter como eixos o trabalho, a cincia, a cultura, a poltica e a tecnologia.
Frigotto (2010) indica que ao pensar a politecnia ou Educao
Tecnolgica em Marx, deve-se lembrar que a tecnologia a cincia que est na
tcnica. Para esse autor, o Ensino Mdio integrado tautolgico9 porque pensa o
ser humano em sua omnilateralidade. O ensino no teria um fim em si mesmo nem
se pautaria pelos interesses do mercado, mas constituir-se-ia numa possibilidade a
mais para estudantes na construo de seus projetos de vida, socialmente
determinados, culminada com uma formao ampla e integral.
Para Geisler (apud ARANTES, 2006, p. 382), a concepo politcnica
da educao entendida como:
Parte de um projeto emancipador que deve possibilitar a experincia de valores e atitudes que se distanciam da ideologia liberal. Longe de se pautar pelas demandas e objetivos do mercado, a proposta da formao politcnica busca incorporar a dimenso reflexiva do trabalho produtivo.
Ramos (2008), pesquisadora considerada referncia em currculo
integrado, aponta que, no caso especfico da Educao Profissional, com
conhecimentos de formao geral e especficos para o exerccio profissional,
nenhum conhecimento s geral, posto que estrutura objetivos de produo, nem
somente especfico, pois nenhum conceito apropriado produtivamente pode ser
formulado ou compreendido desarticuladamente das cincias e das linguagens. Para
essa autora, o currculo integrado organiza o conhecimento e desenvolve o processo
de ensino e aprendizagem de forma que os conceitos sejam apreendidos como
9 A tautologia , na retrica, um termo ou texto que expressa a mesma idia de formas diferentes.
Como um vcio de linguagem pode ser considerada sinnimo de pleonasmo ou redundncia. A origem do termo vem de do grego taut, que significa "o mesmo", mais logos, que significa "assunto". Portanto, tautologia dizer sempre a mesma coisa em termos diferentes (WIKIPEDIA, 2010).
33
sistema de relaes de uma totalidade concreta que se pretende explicar e
compreender.
Para Ramos (2010), a integrao expressa uma concepo de
formao humana que preconiza a integrao de todas as dimenses da vida o
trabalho, a cincia, a cultura no processo formativo, com o propsito fundamental
de proporcionar a compreenso das relaes sociais de produo e do processo
histrico e contraditrio de desenvolvimento das foras produtivas. A proposta de
currculo integrado, para Ramos (2008), est na perspectiva de formao politcnica
e omnilateral dos trabalhadores, como aquelas que atendem as necessidades de
formao humana.
De acordo com Ramos (2010), formao politcnica e omnilateral dos
trabalhadores tm como propsito fundamental proporcionar a compreenso das
relaes sociais de produo e do processo histrico e contraditrio de
desenvolvimento das foras produtivas. Ramos (2010), ao retomar Gramsci, expe
que a construo da Escola Unitria significa o incio de novas relaes entre
trabalho intelectual e trabalho industrial, no apenas na escola, mas em toda vida
social. O princpio unitrio reflete em todos os organismos de cultura, transformando-
os e emprestando-lhes um novo contedo (GRAMSCI, 1991, p. 125).
Esse novo contedo deve permitir a formao do homem, pelos
princpios e concepes propostos ao Proeja, a fim de aceitar o desafio de integrar
uma slida base cientfica que possa consolidar o verdadeiro sentido do trabalho
como princpio educativo, um curso que, possa oferecer a perspectiva de uma
formao unitria, politcnica e omnilateral, na formao de trabalhadores jovens de
adultos.
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2 EVIDNCIAS HISTRICAS DO PAPEL SOCIAL DAS INSTITUIES DA REDE
FEDERAL DE EDUCAO PROFISSIONAL, CIENTFICA E TECNOLGICA
O Brasil de hoje saiu das academias. O Brasil de amanh sair das oficinas.
Nilo Peanha Presidente do Brasil (1909 e 1910).
O Proeja foi implantado na rede federal tendo como um dos objetivos
resgatar o papel social que uma instituio pblica, principalmente educacional,
deve assumir. Este captulo busca apresentar a trajetria da Educao Profissional
baseada na histria contada por Cunha (2000), Manfredi (2002), Depresbteres
(2000), Brando (1999), entre outros autores que auxiliam a abarcar o entendimento
de um perodo histrico que permita conhecer o passado para, ento, buscar
entender a cultura, valores e experincias destas instituies.
Ressalta-se, aqui, a histria de instituies distintas, com fatos
descontnuos, assim como objetivos diferenciados. Cabe, ento, entender para
julgar se as atuais instituies da rede federal de Educao Profissional possuem as
mesmas caractersticas do que se pretendia no incio do sculo passado, ou seja,
pergunta-se se o embrio gestado nas Escolas de Aprendizes Artfices se
desenvolveu at chegar s atuais instituies desta rede federal.
Para resgatar essa reconstruo histrica da Educao Profissional,
h que se destacar, como aponta Cunha (2000), a existncia de espaos vazios e
lacunas, pois os historiadores da educao se preocuparam principalmente com o
ensino das elites e do trabalho intelectual (CUNHA, apud MANFREDI, 2002), em
detrimento de uma Educao Profissional considerada de cunho mais laboral e
operacional, sendo, portanto, entendido como de segunda classe.
Nessa contextualizao, o fio norteador dessa histria apresenta a
presena sempre marcante da dualidade existente entre a escola propedutica, de
base cientfica, e a escola profissional. A separao entre o trabalho manual e o
intelectual, entre as questes do corpo e da mente, que tem razes desde a Grcia
Antiga, em que o trabalho braal era reservado aos escravos. Para Depresbteris
(2000), a histria da Educao Profissional movida pela constante luta na busca
de sua valorizao e reconhecimento.
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Cunha (2000) apresenta que, no retrospecto do ensino industrial-
manufatureiro no Brasil, desde a colonizao, os primeiros a desempenharem os
ofcios manuais foram os ndios e, posteriormente, negros vindos da frica. O autor
pontua que os cidados livres evitavam executar esses ofcios para diferenciar sua
condio social, ou seja, a rejeio pelo trabalho manual se dava muito mais pela
realizao de atividades que eram destinadas aos escravos e, portanto, recusado
mais pelo preconceito do que pela realizao do trabalho manual propriamente dito.
Manfredi (2000, p. 71) reafirma esta posio quando cita que o emprego da mo-
de-obra escrava na execuo de atividades artesanais e de manufatura acabou
criando e mantendo a representao de que todo e qualquer trabalho que exigisse
esforo fsico e manual, consistiria em trabalho desqualificado.
Brando (1999) explica que, nessa poca, os governantes
concebiam o ensino de ofcios como soluo privilegiada para a manuteno da
ordem. Segundo Cunha (2000), foi da que nasceu a possibilidade de ensinar o
trabalho manual compulsoriamente somente queles que no tinham escolha, ou
seja, aos rfos abandonados, aos desvalidos da sorte e da fortuna que eram
encaminhados tanto pelos juzes quanto pelas Santas Casas de Misericrdia. Aos
arsenais militares e da marinha tambm eram impostos a aprendizagem de ofcios e
o trabalho como artfices.
Manfredi (2002) aponta que o processo de Educao Profissional que
integra saberes e fazeres teve os jesutas como os primeiros educadores de artes e
ofcios. Cunha (2000) relata que os jesutas mantinham 25 residncias, 36 misses e
17 colgios e seminrios. Adotavam pedagogia, modelos institucionais e currculos
prprios, condensados na Ratio Studiorun at 1759, quando a Companhia de Jesus
foi expulsa do pas. As residncias dos jesutas foram os primeiros ncleos de
formao profissional, ou seja, as escolas-oficinas para a formao de artesos e
de demais ofcios durante o perodo colonial.
Manfredi (2002) ressalta que, nos dois primeiros sculos de
colonizao, pela expanso da agroindstria aucareira, prevaleciam as prticas
educativas informais de qualificao no e para o trabalho. A autora relata que nos
dois primeiros sculos de colonizao portuguesa predominavam, alm do trabalho
escravo da populao nativa de ndios e dos negros vindos da frica, alguns poucos
trabalhadores livres, empregados em tarefas que requeriam maior qualificao
tcnica. Ressalta-se a existncia de um alvar promulgado em 1785, que proibia a
36
implantao de fbricas e manufaturas no Brasil, que s foi revogado em 1808, com
a vinda da Famlia Real Portuguesa ao Brasil, e que, portanto, teve vigncia durante
23 anos.
D. Joo VI criou o Colgio das Fbricas em 1809, destinado
formao de artistas e aprendizes brasileiros, alm de portugueses atrados pelas
novas possibilidades, surgidas com a recente permisso de instalao de indstrias
no Brasil. Este foi considerado o primeiro esforo governamental relacionado
Educao Profissional no Brasil (DEPRESBTERES, 2000).
Cunha (2000) registra que, em 1809, o ento Colgio das Fbricas,
criado para abrigar rfos que vieram na mesma frota que transportou a Famlia
Real ao Brasil, tornou-se referncia para o ensino de ofcios. Nesse colgio foi
acrescido o ensino das primeiras letras e, posteriormente, o ensino primrio. O autor
destaca, tambm, as Casas de Educandos Artfices, criadas entre 1840 e 1856, e o
Asilo dos Meninos Desvalidos, criado em 1875, para atender meninos de seis a doze
anos que vivessem na mendicncia. O artfice permanecia nessas instituies por
mais trs anos aps a concluso da aprendizagem, trabalhando nas oficinas, com o
intuito de pagar seus estudos e formar um peclio que lhe seria entregue somente
ao final do perodo (CUNHA, 2000).
Em 1858, a sociedade civil organizou um quadro de scios
benemritos, responsvel pela criao e manuteno dos Liceus de Artes e Ofcios.
Com o fim do Imprio e com a chegada dos padres salesianos, um novo elemento
ideolgico foi incorporado, o ensino profissional como antdoto para o pecado
(CUNHA, 2000).
Aps trs sculos e meio de escravido, em 13 de maio de 1888, foi
assinada a Lei urea pela Princesa Isabel, que aboliu a escravatura no Brasil. A
partir da deu-se uma crescente necessidade de artesos, sapateiros, pedreiros,
entre tantos outros profissionais, para atender s demandas nos centros urbanos
(CUNHA, apud MANFREDI, 2002). Este fato foi agravado tanto pela falta recente
dos escravos como pela intensificao da atividade extrativa de minrios no Estado
de Minas Gerais.
A monarquia entrou em crise aps 67 anos de vigncia. O Marechal
Deodoro da Fonseca proclamou a Repblica e assumiu a chefia do governo
provisrio. Floriano Peixoto, o vice-presidente, assumiu a presidncia aps a
renncia de Marechal Deodoro e outorgou a Constituio de 1891, tendo em vista a
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necessidade de aplicar medidas para implantar a nova forma de governo, pois fora
aprovado o regime presidencialista com voto aberto.
Cunha (2000) destaca que, com o advento da Repblica, sob forte
influncia positivista, o Asilo de Meninos Desvalidos foi transformado em 1892, pelo
Decreto n 722, em Instituto Nacional de Educao Profissional. Em 1906, Afonso
Pena, discursou que a criao e multiplicao de institutos tcnicos e profissionais
poderiam contribuir para o progresso das indstrias (BRANDO, 1999) pela
necessidade de incentivar o desenvolvimento industrial do Brasil. Em geral, apesar
de o discurso ser assistencialista, a finalidade dessas instituies passou a ser a
formao de operrios e contramestres. A qualificao restringia-se ao
essencialmente manual, pois a indstria era incipiente, baseada no artesanato e na
manufatura.
Nessa poca, essas escolas no tinham o objetivo de preparar mo-
de-obra, pois no Brasil as indstrias ainda eram escassas e vivia-se o momento
agrrio exportador, de acordo com Cunha (2000). Aqui fica visvel a preponderncia
do aspecto social, na busca de ensinar um ofcio para que os desprovidos da sorte
e da fortuna pudessem ser compensados pela falta de oportunidades.
Em 1906, o Presidente Afonso Pena criou o Ministrio dos Negcios da
Agricultura, Indstria e Comrcio, que ficou responsvel pelo ensino profissional, isto
, estudos e servios relacionados com o setor produtivo e com o comrcio,
enquanto a educao estava vinculada ao Ministrio da Justia. Registra-se a
formalizao da separao da formao profissional da educao em geral. Brando
(1999) refora essa afirmao, ao citar que vigorava a desvinculao da educao
com a formao profissional, entre educao e trabalho, separao reforada por
serem de responsabilidade de ministrios distintos.
O Presidente do Estado do Rio de Janeiro, Nilo Peanha, criou trs
escolas manufatureiras nas cidades de Campos, Petrpolis e Niteri e duas
agrcolas, localizadas em Paraba do Sul e Resende. Em 1909, agora como
Presidente da Repblica, Nilo Peanha criou 19 Escolas de Aprendizes Artfices,
pelo Decreto n 7.566 de 23 de setembro, destinadas ao ensino primrio gratuito,
nas capitais das unidades da federao, exceto no Distrito Federal e no Rio Grande
do Sul, que j dispunham de instituies com propsitos semelhantes, de acordo
com Cunha (2000).
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Segundo esse autor, no Rio de Janeiro a escola no foi instalada na
capital, mas no municpio de Campos, cidade natal de Nilo Peanha, pois o ento
Presidente do Estado do Rio de Janeiro, Alfredo Backer, no se disps a oferecer
facilidades para a instalao da escola na capital. Na escolha para a instalao
dessas escolas, os interesses foram mais polticos que econmicos, isso foi
demonstrado tanto pelo nmero de habitantes nos municpios quanto pela presena
de atividades manufatureiras que estavam desigualmente distribudas pelo pas
(CUNHA, 2000).
Esse autor relata que as capitais eram sede do poder poltico, porm,
no das atividades manufatureiras, a exemplo dos municpios de Juiz de Fora, no
Estado de Minas Gerais e de Blumenau, em Santa Catarina, por serem mais
expressivos, nesse quesito, do que suas capitais. Em 1907, de acordo com Prado
Junior (1976), 33% das empresas brasileiras estava instalada no Estado do Rio de
Janeiro. O Estado de So Paulo possua 16% das empresas nacionais e o Rio
Grande do Sul, 15%.
O Decreto n 7.566/1909, que criou as Escolas de Aprendizes Artfices,
afirmava que:
[...] no necessrio s habilitar os filhos dos desfavorecidos da fortuna com o indispensvel trabalho tcnico e intelectual, como tambm faz-los adquirir hbitos de trabalho profcuo, que os afastar da ociosidade ignorante, da escola do vcio e do crime.
Esse decreto tambm determinava que, para ingressar nos cursos, o
aluno deveria ter entre 10 a 13 anos, no sofrer molstia infecto-contagiosa e nem
ter defeito que lhe impossibilitasse o aprendizado dos ofcios. Nesse perodo, o
ensino profissional ganhou novos objetivos, pois como o pas passava por fase
intensa de industrializao e as correntes anarcossindicalistas lideravam as greves
de operrios. Assim, o ensino profissional passou a ser visto tambm como antdoto
contra a inoculao de ideias exticas (CUNHA, 2000).
Segundo o Documento da Setec/MEC10 (2010, p. 10), os objetivos
destas escolas eram o controle social e a qualificao de mo-de-obra:
No h dvidas de que aos objetivos das Escolas de Aprendizes Artfices associavam-se a qualificao de mo de obra e o controle social de um
10
Um novo modelo em Educao Profissional e Tecnolgica: concepes e diretrizes. Braslia, 2010.
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segmento em especial: filhos das classes proletrias, jovens e adultos em situao de risco social, pessoas potencialmente mais sensveis aquisio de vcios e hbitos nocivos sociedade e construo da nao.
Peterossi (1994) utiliza o termo ensino tcnico e apresenta seu
panorama, afirmando que a sua institucionalizao no Brasil teve por objetivo formar
artfices, ou seja, trabalhadores que dominassem um ofcio manual e que, portanto,
tivessem condies de estabelecer-se por conta prpria, ou agrupar-se em
pequenas oficinas de prestao de servios. Esse tipo de atividade foi o objeto das
escolas profissionais do incio do sculo. A prpria escola era uma oficina e seus
docentes mestres e oficiais do mercado (PETEROSSI, 1994, p. 16-17).
De acordo com Cunha (2000), as Escolas de Aprendizes Artfices
funcionaram durante 33 anos e formaram 141 mil alunos. Em 1920 atingiram o
nmero mximo de alunos matriculados e posteriormente, entraram em decadncia.
Os ofcios ensinados eram marcenaria, alfaiataria e sapataria, considerados mais
artesanais do que propriamente manufatureiros, o que, segundo esse autor, mostra
a distncia entre os propsitos industrialistas de seus criadores e a realidade
executada nas escolas. Estas foram extintas em 1942 pela Lei Orgnica do Ensino
Industrial.
Para retratar a fase de declnio das Escolas de Aprendizes Artfices,
Brando (1999) menciona a crtica realizada pelo encarregado da remodelao do
ensino profissional, Luderitz, a respeito destas escolas. Ele argumentava que a
indicao dos ofcios ensinados no seguia nenhum critrio industrial e nem
qualquer adaptabilidade s indstrias locais.
Registra-se, nessa poca, pela necessidade de formao de docentes,
em 1919, foi criada a Escola Normal de Artes e Ofcios Wenceslau Braz com o
objetivo de formar professores. Em 1924, foi criada a Escola Profissional de
Mecnica no Liceu de Artes e Ofcios, em virtude da necessidade demandada pelo
setor produtivo, como transportar caf ao Porto de Santos e para atendimento das
estradas de ferro, que ganhavam importncia, principalmente no estado de So
Paulo. Essas escolas foram transformadas em Liceus Industriais nos anos de 1930.
Segundo Cunha (2000), as empresas Estrada de Ferro Sorocabana, a So Paulo
Railway, que ligava Jundia ao Porto de Santos, a Companhia Paulista de Estradas
de Ferro e a Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, encaminhavam seus
aprendizes para cursos de quatro anos nos liceus industriais.
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Em 1929, quando ocorreu a crise econmica mundial, e aps a
Revoluo de 1930, comeou a intensificar-se a produo industrial e o aumento da
necessidade de mo-de-obra no Brasil. O Ministrio da Educao e Sade Pblica
foi criado em 1931 e, aps, foram sancionados vrios decretos conhecidos como
Reforma Francisco Campos. Em 1931, na fase chamada de industrialismo por
Gramsci, foi fundado o Instituto de Organizao Racional do Trabalho (IDORT) por
Roberto Mange, docente da Escola Politcnica de So Paulo. O IDORT apresenta o
taylorismo11 como soluo para a reduo de custos e respostas ao efeito da crise
econmica de 1929 (CUNHA, 2000).
Em 1942, o ento Ministro da Educao e Sade Pblica, Gustavo
Capanema, instituiu um conjunto de decretos-lei, denominado de Leis Orgnicas do
Ensino, que ficou conhecida como Reforma Gustavo Capanema. Entre os vrios
decretos-lei, est o Decreto n 4.048/1942, que no