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Generalidades Educação – não existe um conceito acabado acerca de educação, entretanto, pode-se dizer que : educação é o processo que visa a capacitar o indivíduo a agir conscientemente diante de situações novas de vida, com aproveitamento da experiência anterior, tendo em vista a integração, a continuidade e o progresso social, segundo a realidade de cada um, para serem atendidas as necessidades individuais e colectivas”(NÉRICI, 1991). Tradição – conhecimento que provém da transmissão oral de hábitos durante um longo espaço de tempo e que passa de geração em geração. O termo foi originariamente aplicado pelos primeiros cristãos às crenças centrais, transmitidas através da instrução nas coisas religiosas. A tradição inspira, muitas vezes, o

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Generalidades

Educação – não existe um conceito acabado acerca de educação, entretanto, pode-se dizer

que :

“educação é o processo que visa a capacitar o indivíduo a agir conscientemente diante de

situações novas de vida, com aproveitamento da experiência anterior, tendo em vista a

integração, a continuidade e o progresso social, segundo a realidade de cada um, para

serem atendidas as necessidades individuais e colectivas”(NÉRICI, 1991).

Tradição – conhecimento que provém da transmissão oral de hábitos durante um longo

espaço de tempo e que passa de geração em geração.

O termo foi originariamente aplicado pelos primeiros cristãos às crenças centrais,

transmitidas através da instrução nas coisas religiosas. A tradição inspira, muitas vezes, o

respeito, simplesmente através da autoridade que nela se alicerça ( tradicional). Representa

normalmente o padrão ou modelo de referência, sendo por isso particularmente respeitada

pelos conservadores e, por outro lado, atacada por não conservadores como obstáculo à

mudança. De qualquer modo, apenas as crenças mais rígidas são incapazes de ver a tradição

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como um processo crescente e cumulativo, e só as revoluções mais radicais tentaram

romper completamente com todas as ligações ao passado (ENCICLOPÉDIA UNIVERSAL)

Portanto, tradição conjunto de ideias, sentimentos, costumes e aptidões transmitidos de geração em geração aos membros duma sociedade humana, quer através da linguagem verbal quer através dos próprios actos.

Educação Tradicional – as crianças aprendem para a vida por meio da vida. O indivíduo sofre uma tripla integração: pessoal, social e cultural. Aprende-se imitando os adultos nas actividades diárias, sem que alguém esteja especialmente destinado para a tarefa de ensinar.

A formação é integral e universal. Integral porque abrange todo o saber da comunidade e universal porque todos podem ter acesso ao saber e ao fazer da comunidade.

Até aos sete (7) anos as crianças do sexo feminino e do sexo masculino são tida como iguais. A partir desta idade começa a separação de actividades e de tarefas conforme o sexo.

Assim, as crianças de ambos sexos crescem acompanhando os adultos na execução de

diversas actividades produtivas o que lhes permitirá serem senhores de si mesmo no

amanhã que os espera.

A transmissão do saber é feita usando diversos elementos como: contos, lendas, fábulas,

advinhas, provérbios, canções, tabus, preconceitos, ritos e outros.

Todos estes elementos têm uma grande importância na educação e na criação da

consciência tradicional da vida. São exaltados os valores e repudiados os contravalores.

Os valores exaltados: a solidariedade, a amizade, a união, a prudência, o pudor, a decência,

a simplicidade, a humildade etc.

Os contravalores repudiados: o egoísmo, a falta de respeito, a vingança, a mentira, a inveja,

o boato, o ódio, a fornicação e outros males que desprestigiam a comunidade, a linhagem e

a família.

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Ensino tradicional moçambicana

Ritos de gravidez

A mulher ao sentir-se grávida troca impressões sobre o seu estado com pessoas femininas

mais velhas da sua família e de maior confiança, caso se confirme o seu estado de gravidez

é que se comunica ao seu marido.

Neste período ela recebe muitas e variadas instruções das mais velhas dependendo dos

ritos de cada comunidade e ou família, as instruções estão ligadas a:

• comportamento social ( relações sexuais com vários homens torna o parto difícil)

• alimentação

• tratamento

• escolha de parteira

Ritos de nascimento

Existem variados rituais após a nascença da criança dependendo dos usos e costumes de

cada comunidade e ou famílias.

Há cerimónias específicas para cada momento e para cada sexo. Cerimónias específicas

para:

1. Corte da planceta conforme o sexo

2. Defesa da recém nascida contra maus espíritos

3. Evitar que a criança se assuste quando se encontrar com outra pessoa ou animal

4. Protecção das crianças contra mãos quentes e outros rituais.

Educação dos Adolescentes

Ritos de iniciação masculina

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O adolescente é ensinado tudo o que possa vir a encontrar na vida, necessita conhecer

para a luta. Ele aprende a sofrer com resignação, a comer pouco e a beber menos e até a

caça é ensinado.

Os ritos de iniciação masculina subscrevem-se em realização da circuncisão. A circuncisão

é um costume que como força da lei e aquele que não for circuncidado é excluído em

todas as actividades socio-culturais.

Como o desenvolvimento masculino não é notado por sinais externos como na puberdade

feminina, a escolha dos adolescentes para a cerimónia de circuncisão não é criteriosa mas

baseia-se frequentemente na vivacidade espiritual e no desenvolvimento físico que os

mais velhos lhes reconhecem.

Todo o adolescente que passar pela circuncisão pode participar em todas as actividades

socio- culturais como: tomar parte nas conversas dos adultos, ver cadáveres, assistir as

cerimónias fúnebres, aconselhar outras pessoas, casar e organizar uma família e outras.

Nesta escola tradicional temporária, o adolescente é ensinado a não roubar, a ajudar o pai

nas actividades, a não bater nos filhos dos vizinhos, ser sempre voluntários nas

actividades da família, como encarar a mulher sexualmente etc.

Esses ensinos são transmitidos na base de provérbios, adágios e sempre acompanhados

com cantares e danças durante as noites da sua permanência nesse mato.

Esses rituais de passagem diferem de uma linhagem a outra em técnicas e meios.

Através da escola tradicional temporária, o adolescente é inserido na comunidade com as

normas e regras que regulam a vida da sociedade nos aspectos sociais, políticos e

económicos e assim ele adquire a aptidão para a manutenção da ordem social da região e

da paz social e individual.

Exceptuando a escola tradicional temporária, a educação tradicional não tem dias e nem

lugar específico para a sua administração, como acontece nos nossos dias nas instituições

escolares em que há calendários das aulas.

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Ritos de Iniciação Feminina

Diferentemente dos ritos masculinos em que não há critérios fixos na escolha do

adolescente para as cerimónias, os ritos de iniciação feminino iniciam com a menstruação.

As raparigas menstruadas pela primeira vez, são conduzidas a uma palhota, no meio do

mato, longe da povoação, e ali sob direcção de mestras idóneas, aprendem tudo o que uma

mulher deve saber.

Conforme CIPIRE (1996:41) a preparação das adolescentes para o lar, para o casamento e

para o próprio acto sexual, faz parte dos currículos de educação feminina.

O autor diz ainda que, tal como rapazes, uma rapariga só é reconhecida como ser humano

completo, depois de ter passado pelos ritos de iniciação. Estes têm como objectivo a

formação de mulheres para enfrentar as múltiplas tarefas do lar, nos aspectos de esposa,

mãe e produtora de bens materiais para benefício do marido e dos filhos.

Durante as aulas nessa escola tradicional temporária, as mestras ensinam as raparigas de

entre muitos ritos os seguintes:

• Ritos de menstruação - nada tem de anormal, antes pelo contrário é um sinal de

que em breve pode procriar ( objectivo central das mulheres nas sociedades

africanas),não pode dormir na cama do marido mas sim na esteira, não pode tomar

banho, deitar sal nas comidas,

• Ritos de higiene e limpeza,

• Ritos de virginidade

“Uma miúda desflorada antes de se casar é como se fosse uma casa sem porta em que todo

o viajante verá os pormenores do interior”( CIPIRE, 1996:41).

• Ritos da tatuagem

A rapariga é ensinada a fazer arranjos femininos do seu sexo, o uso de missangas nas ancas,

tatuagem ( nas ancas, no abdómem, nas nádegas, na cara, nas pernas e coxas).

Sistema matrilinear

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O sistema matrilinear, consiste na transmissão da herança para as mãos do sobrinho, filho

da irmã (CIPIRE, 1996:51).

O mesmo autor diz que neste sistema, a rapariga é considerada de riqueza familiar em

duplo sentido :

- sendo ela geradora de novas criaturas

- É ela que deve ocupar posições cimeiras na sua família.

Por regra, quando o rapaz se casa muda do seu núcleo doméstico para a aldeia da noiva.

O sistema matrilinear o genro não deve apertar a mão a sogra e nem dançar com ela nas

festas, não pode entrar na casa dela e nem sentar nos seus bancos ou esteira.

Ela é representada pelo tio materno dela para a tomada de certas decisões acerca de

determinados assuntos como: casamento, divórcio, questões jurídicas, cerimónias fúnebres,

os ritos medicinais ou de circuncisão e outras questões relacionadas com a família.

Nesse sentido ela é a rainha da comunidade mas forasteira quanto a autoridade.

O marido é visto mais como aliado cooperando na reprodução que como membro da família

da mulher, ele é expulso quando origina conflitos.

Processo para o casamento

No sistema matrilinear as jovens casam-se entre os 13 – 14 anos de idade. O pedido de

aquisição da moça é feito pelos pais dos interessados, sem intervenção dos interessados.

O ajustamento de casamento entre os pais não obedece limite de idade. É antigo costume

os pais combinarem acerca de casamento dos seus filhos quando ela tem ainda tenra idade,

basta o rapaz ser conhecido, vizinho,ou parente. Feito o acordo o futuro noivo começa a

oferecer presentes aos pais da futura esposa e a ela também, até que ela atinja uma idade

aceitável ( para a comunidade) para o casamento.

Por regra, a moça se conserva virgem até o dia de encontro sexual com o seu marido o que

dá prestígio a família e a ela.

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Antigamente uso em desuso as meninas eram inspeccionadas para verificar se havia sido

violada ou não.

Nesse sistema, as formalidades de casamento são muito simples e fáceis, entretanto, com a

mesma facilidade com que se casam assim se divorciam.

Sistema Patrilinear

O sistema patrilinear é aquele em que a herança dos bens se transmite directamente para o

filho varão. Nesse sistema o indivíduo encontra-se sob autoridade e controle do pai e dos

paternos.

É com este grupo que mantém as mais importantes relações jurídicas definidas por direitos

e deveres.

A mãe não participa na tomada de decisões sobre a sorte dos filhos.

O pai tem pesadas responsabilidades em relação a seus filhos e filhas, mesmo quando

maiores e casados, responsabilidade que pode estender-se aos netos quando o respectivo

pai desaparece ou encontra-se ausente.

Os filhos devem ao patriarca respeito e obediência. Os seus deveres atingem o ponto de

quanto solteiros lhes caberem entregar os salários que auferem, para que o pai os distribua

conforme as necessidades da família.

As raparigas são dirigidas pelos pais ou na sua falta pelos irmãos mais velhos do pai ( tio

paterno).

Neste sistema, ao contrário do que se passa no matrilinear, o elemento mais importante é o

filho varão. Este tem a missão sagrada de velar pelo bem de toda a família, trabalhando e

sustentando-a e em caso da morte do pai tornar-se herdeiro. É devido a este ensino que

quando o rapaz se casa deve lobolar a moça e trazé-la em casa e ou próximo da casa dos

pais. Nesta operação, a rapariga irá produzir e progenitar filhos para clã do marido, não tem

direito a herança e nem os filhos.

Page 8: Educacao tradicional em moc

Casamento Patrilinear

No sistema patrilinear o casamento é considerado como uma troca de serviços entre duas

famílias pertencentes a clãs diferentes.

Uma das famílias cedia a outra a capacidade procriadora de um dos seus membros

femininos, e, para ser compensada pela perca recebia cabeças de gado ( Lobolo). O lobolo é

pois uma compensação nupcial e não preço de compra.

Neste contexto a mulher é considerada um bem material, mas não só, pois tem direito e

obrigações.

De acordo com CIPIRE(1996:58) em toda a sociedade tradicional, o adultério é totalmente

condenado raríssima excepções em relação c Chopes e Makhuwas do litoral que encaram

passivamente este fenómeno.

O Papel da educação em Moçambique no passado e os desafios no futuro.

O papel positivo da educação se encerrava em muitos valores como:

• O interesse e a autoridade da colectividade sobre o indivíduo – infelizmente este é

um valor que tende a ser perdido, e quando se perde tráz consigo graves

consequências sócio-económicas e políticas como por exemplo: má gestão dos fundo

públicos, desvios, roubo, corrupção e outros males.

• Solidariedade – O cumprimento de deveres recíprocos entre os membros permite a

ajuda mútua para todos os efeitos ( sociais, económicos, culturais e científico-

tecnológicos).

• Hierarquias socio-etárias – cada um no seu devido talhão,

O dedo indicador nunca serviu para apontar alguém, dar lugar aos mais velhos, a pessoa

mais velha era chamada

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pelo nome do filho e ou do apelido clãnico, era obrigatório saudar, a saudação era

acompanhada de um bater das palmas, o pôr-se de joelhos perante o mais velho era sinal

de respeito, não era costume o aperto das mãos, o beijo para cumprimentar era inexistente.

• Trabalho colectivo – o papel da educação nesta parte visava evitar o individualismo.

• Pragmatismo no sistema de ensino – valorizava-se muito o trabalho prático

( agricultura, pastorícia, pesca, caça etc).

Reflexões:

Negar todo o ensino do passado?

Levar todo o ensino do passado?

seleccionar?

Quem tem a tarefa de seleccionar?

O que levar e o que deixar ?

O que era útil e o que não era útil?

O desenvolvimento tecnológico contraria a educação tradicional?

Conclusão

A educação é um processo social, representado por toda e qualquer influência sobre o

indivíduo e capaz de modificar-lhe o comportamento desde o berço até a morte.

A educação tem triplo sentido: social, individual e transcendental. Ela é dinámica, flexível,

universal, integradora e socializadora.

Bibliografia

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ARANHA,Maria Lúcia de Arruda. História da Educação. 2.ed.SP. : Modrna,1996

CIPIRE,Felizardo. Educação tradicional em Moçambique. 2.ed. Maputo.:EMEDIL, 1996.

GWEMBE, Eusébio A. Pedro. A educação no contexto tradicional e na actualidade ( apostila da FEC.). Nampula, 2005

NÉRICE, Imídio. Introdução à Didáctica Geral. S.P:F. Cultura,, 1961.

Reflexão Crítica, sobre porquê as diferenças entre homem e mulher mesmo as óbvias

favorecem em grande medida o sexo masculino

Introdução

O desenvolvimento humano reconhece que as escolhas dos indivíduos são em princípio

múltiplas e infinitas e evoluem ao longo do tempo. Estas escolhas elementares incluem o

anseio de viver vidas longas material e espiritualmente ricas, ter um padrão de vida

adequado, ter acesso ao saber para fazer escolhas informadas e em igualdade de

circunstâncias sobre as suas vidas e participar livremente e sem discriminação ou

impedimentos nos processos de decisão sobre os destinos da sociedade e do mundo em

que se inserem.

As escolhas de querer viver vidas longas, o acesso ao saber para fazer escolhas informadas,

o processo de decisão para os destinos da sociedade e do mundo e outros aspectos, estão

reservados para todos os membros da sociedade em igual proporção e doses, quer homem,

quer mulher. Todos nós estamos na mesma causa e queremos atingir os mesmos objectivos,

logo, não deve existir o sexo mais favorito para isso.

Pretendo neste trabalho, reflectir de maneira crítica porque as diferenças entre homem e

mulher mesmo as óbvias favorecem em grande medida o sexo masculino.

Para melhor comprensão do tema será objecto da abordagem um resumo estatístico da

PNUD- 2001 que reflecte a discriminação da mulher, a socialização vigente nas familias e o

papel da educação formal na reversão do favoritismo do sexo masculino e as estrtégias para

conseguir esse fim.

Situação da mulher em diferentes quadrantes da sociedade

Page 11: Educacao tradicional em moc

A situação da mulher constitui um dos exemplos mais eloquentes das desigualdades que os

paises escamoteiam . É usual constatarmos que, uma vez desagregados por sexo, os

indivíduos sociais nos revelem uma clara tendência para o favoretismo do sexo masculino

em contra partida a marginalização ou discriminação por vezes até institucionalizada da

mulher.

Esta realidade é aplicável a qualquer país, independentemente do nível de

desenvolvimento . De acordo com UNDP ( 1995:2 ) citado por PNUD ( 2001: 12 ) "…as

questões das diferenças de desenvolvimento entre os sexos , levaram á constatação de que

em nenhuma sociedade a mulher tem o mesmo estatuto que o homem. A mulher sofre a

privação duplo: da desigualdade do género, e um nível relativamente baixo de progressão

na vida".

Conforme o documento em questão, no limiar do século XX1 as disparidades entre o

desenvolvimento das mulheres e dos homens continuam a ser uma realidade embaraçosa

para a humanidade, não obstante os progressos assinaláveis em todas as esferas de vida e

as inúmeras iniciativas globais para a eliminaçao de todas as formas de discriminação da

mulher nas últimas décadas.

O RDH de Moçambique ( 2001:12 ) revelou que " 854 milhões de adultos que, em 1999, não

sabiam ler nem escrever no mundo, 583 milhões ou seja 78% são mulheres. Por outro lado,

dos 325 milhões de crianças que se encontravam fora do sistema educacional no mesmo

ano 183 milhões, ou seja 56% eram raparigas".

Reflectindo sobre a definição do desenvolvimento humano, como processo de alargamento

de escolhas de todas as pessoas e não só de uma parte da sociedade, então o facto das

mulheres não usufruirem do mesmo nível de desenvolvimento que as suas contrapartes do

sexo masculino é o sinal mais elucidativo do favoretismo do sexo masculino e

marginalização do sexo feminino.

É importante e relevante ter a consciência de que a fraca realização individual das mulheres

resulta não de debilidade imputáveis a aspectos fisiológicos, mas ao processo de

socialização vigente nas sociedades. Por exemplo, em algumas sociedades a habilidade da

rapariga de contribuir no trabalho doméstico, muitas vezes em prejuizo da sua própria

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formação escolar, é interpretado como símbolo da boa educação. Na vida adulta, a mulher

tem de velar pelo bem estar da família, uma responsabilidade que nem sempre encontra

uma valorização comensurável com a sua importância na escala de valores da sociedade.

Quer dizer, o favoretismo do sexo masculino e a discriminação da mulher não-se conjuga na

diferença do sexo mas do género. Pois, quanto aos aspectos fisiológicos é sabido que há

coisas que as mulheres podem fazer que os homens não podem; exemplo: a mulher tem

potencial de gerar filho por possuir útero, o homem não pode por não-o possuir, a mulher

amamenta e o homem não pode, e outros mais aspectos fisiológicos. Portanto, está claro

que o sexo identifica as diferenças biológicas entre mulheres e os homens, e isto não

constitui nenhum problema. O problema do favoretismo do sexo masculino reside no

gémero. O que virá a ser género nesse caso ?

Género - " refere-se aos diferentes papéis que as mulheres e os homens desempenham, os

quais são determinados de acordo com os usos, costumes e desenvolvimento da sua

sociedade"( WALTER,et al. 1997 : 11 ).

LICHTENBERG,et al. ( 2000:25 ) abordam o género de forma ampla, de como

realmente as familias encaram a mulher e o homem, principalmente nas

comunidades rurais, o que correspondem perfeitamente a sociedade moçambicana.

Eles focam o género como uma criação social que através de várias formas de

aprendizagem dentro da família e na comunidade, muitas vezes sob forma não

registadas adquirem comportamento, hábitos e atitudes. Durante o seu

crescimento, a criança na família aprende por exemplo que é o homem que deve

construir a casa, e nunca a mulher (caso do centro e sul de Moçambique), que é a

mulher que deve buscar a água, cozinhar e lavar roupa, e nunca o homem ( tradição

de todo Moçambique) que a menina e o menino também têm de se vestir

diferentemente. É portanto assim em Moçambique e na maioria dos paises no

mundo. É durante a própria infância que se aprende como se comportar como

mulher, e como se comportar como homem.

O que dizem as pessoas1

1 LICHTENBERG, Else et al. Género-juntos melhoramos a nossa vida,ADPP -Moç.2000:25

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Os nossos antepassados ensinaram-nos que o homem é o chefe da família, por isso deve

tomar cuidado dos seus filhos e da sua esposa - a mulher é sua auxiliar

A moda do homem leva-o a cobrir cada vez mais o seu corpo. A moda da mulher leva-a a

descobrir cada vez mais o seu corpo. É porque somos mesmo diferentes. A mulher tem

espirito feminino, o homem tem espirito masculino.

Consequência dessa assimilação

De acordo com WALKER, ( 1997 :12 ) a criança ao entrar na escola já vem marcada pelas

disparidades de género na sua comunidade.Deste modo, é frequente as meninas serem

retraídas, inibidas na participação na sala de aula em relação ao rapaz.

As relações de género são contextualmente específicas, variando de acordo com o universo

social-cultural ( exemplo: grupos sociais, etnia, raça ) e frequentemente alteram-se em

resposta a circunstâncias económicas diferentes.

A questão de género não é nova, mas abrange gerações longícuas que constituiu a base da

educação não formal.

ANDRADE, et al. ( 1998:137 ) sobre a educação e relação de género focalizam que a

educação deve ser entendida como um sistema que actuando ao nível formal e informal

organiza, sustenta e orienta a reprodução da ordem social. Esta concepção de educação

abrange fundamentalmente dois espaços socials; a família e a escola.

Quanto a família e educação - remata ANDRADE ; a família como primeiro agente de

socialização é o meio de pertença onde ao longo do seu ciclo de vida as pessoas exercem e

cumprem função e papéis reguladores de codutas e construtores de identidade. Os

membros da família comunicando e participando entre sí exprimem a adesão a uma ordem

de valores e modos de pertença "conformes" simbolicamente ao grupo onde agem

socialmente. Se a família como primeiro agente de socialização e que exerce função e

papéis reguladora de condutas "é lícito, então perguntar o que explica que a maioria delas

continue na "cauda"da vida"? ( OSÓRIO, et al. 2001 :33). As mulheres continuam a ser a

maioria da população de pobres, de analfabetos, não estão adequadamente representadas

nas estruturas políticas, morrem desproporcionalmente de doenças de fácil prevenção, são

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sujeitas á violência e descriminação de género, e têm de viver em sociedade que, muitas

vezes não tomam em consideração os seu interesses específicos e fazem tábua raza do seu

potencial como agente de transformação.

Grande parte das privações a que as mulheres estão sujeitas têm como base as relações do

género que por sua vez emanam das relações de poder enraizados na cultura e tradição.

Isto não quer dizer que todas as práticas tradicionais sejam inerentemente nocivas. Elas são

parte integrante da identidade cultural dos povos. Entretanto, o que é inegável é que parte

delas ( práticas tradicionais) são declaramente obstâculos á igualdade entre homens e

mulheres. Exemplo de Moçambique:

a) Em caso de viuvez as normas culturais que regem a sucessão de herança

particularmente no centro e sul de Moçambique estabelecem que a mulher nunca

ocupa, uma posição superior ao terceiro lugar na hierarquia familiar depois dos filhos e

irmãos.

b) O lobolo significa adquirida e pertence inteiramente marido e a sua família, a condição

de decisão é terminada.

c) A poligamia agrava a vulnerabilidade da mulher.

Portanto, pode-se dizer no caso vertente que a discriminação inicia na família e se extende

por toda a sociedade.

Apesar de tudo isso, Moçambique e os seu instrumentos jurídicos legais têm se esforçado

pela igualdade entre mulher e homem, não obstante o baixo nível de escolarização das

mulheres e a existência de algumas práticas culturais que ainda promovem a

subalternização e ainda dificultam a integração plena da mulher na modernidade. Exemplo;

a proporção da educação formal da mulher em Moçambique até ano 2000 era de 71,2% de

analfabetos, enquanto que os homens era de 40,2%, a participação da mulher em cargos de

decisão na Administração pública é de 9,2%, ainda não há em Moçambique nenhuma

mulher governadora de Província, etc.

Como se pode ver, a educação ou promoção do género sempre favoreceu ao sexo

masculino partindo da célula base da sociedade ( família ). Esta não é uma situação isolada

mas é evidente em todo o mundo, apesar que alguns Governos caso de Moçambique e

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outros estarem a evidar muitos esforços com intenção de reverter a clássica situação que a

sociedade criou.

Gostaria de dar a minha contribuição pessoal acerca do assunto usando dois grandes

vertentes:

A primeira vertente é Educação - é que os Governos devem concentrar os esforços na

educação da célula base ( família ) promovendo proporcionalmente a mulher junto ao seu

parceiro ( homem ) na formação técnica profissional de base. Isto é, as familias devem ver

no concreto o potencial feminino partindo dos cursos de profissionalização de pequena

dimensão; como cursos básicos agro-pecuário, saúde, administração, assistência social e

outros, executados lá no campo pelas raparigas. As famílias devem ver as vantagens da

mulher ter uma formação partindo do ensino geral básico. Para dizer, segundo o meu ponto

de vista que, o ensino geral deve-se associar a profissionalização da rapariga na proporção

justa com os rapazes para que a sociedade observe na prática as capacidades das mulheres.

Principalmente lá no campo, primeiro, porque é lá onde habita a maioria da população

moçambicana, segundo, porque a educação do género promove mais ao homem que a

mulher, terceiro, porque é lá onde se observa o maior número de mulheres analfabetas,

quarto, porque é lá onde se observa menos mulheres profissionais e outros aspectos.

Portanto, seguindo o meu raciocínio, a intensificação da educação para a igualdade deve ser

no campo onde vive a maioria e onde a tradição ainde é muito forte principalmente aquela

que discrimina a mulher. É preciso atacar de forma ordeira, sistemática e de forma contínua

as zonas rurais com uma formação direccionada e de qualidade. As cidades onde a mulher

estudou não é muito difícil observar o grande potencial da mulher, mas isso constitui

pequenos exemplos em relação a toda a sociedade moçambicana. É verdade que mesmo

nas cidades ainda se observa o favoretismo do sexo masculino mas já não é naquela

proporção das zonas rurais. Porque as cidades de quando em vez se observa mulheres a

ocuparem diversos cargos, e até cargos de decisão.

Portanto, é função do Governo, porque, possue instrumentos para isso com a participação

de toda a sociedade civil principalmente, lutar por reverter essa situação. Para isso passa

necessariamente pela educação formal partindo das familias onde a educação do género

começa. Porque se as familias não forem atacadas pela educação no concernente a

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valorização da mulher o favoretismo do sexo masculino continuará por muitos e longos anos

vindouros. A direcção do meu raciocínio aponta que as localidades, Distritos o sistema de

educação formal deve ser mais agressivo . As familias devem ser sistemática e

metódicamente persuadidas a enviarem as suas filhas a escola na idade estabelecida pelo

governo. A persuação acompanhada pela supervisão, inspecção e control das familias

partindo da estrutura de base ( régulado e outras estruturas de base) com o objectivo de

verificar a situação das familias que não enviam os seus filhos á escola e principalmente ás

raparigas e não só, mas acompanhar a progressão das meninas no ensino formal. É

necessário criar uma "implicação positiva"com as familias que deixam os seus filhos fora do

sistema educativo em particular as meninas e mesmo na situação de desistência. Criar nas

familias a consciência de que a responsabilidade de formação dos filhos depende em grande

medida da família e responde por isso perante a sociedade e o Governo. Se a sociedade civil

cultivar esta conciência muitas situações de discriminação que temos assistido poderão

reduzir seriamente.

As regras culturais e a educação formal devem-se completar, constituindo assim bases

fortes para a promoção de todo o cidadão moçambicano tanto homem como mulher na

participação da produção social.

Em jeito de síntese, dizer que a educação formal deve ser agressiva para toda a sociedade

civil pois, ela ( escola ) constitui o instrumento importante nas mãos do Governo para a

promoção de igualdade entre homem e mulher. O objecto principal da agressividade deve

ser a família com a base do vector o campo em direcção á cidade.

Associado a educação deve-se promover a profissionalização a nível básico da mulher em

proporção ao homem.

A segunda vertente é Política - é preciso preparar a mulher e exercer as funções nas

regiões da sua influência como na agricultura, pecuária, saúde, educação, postos

Administrativos, localidades, Distritos, e outros. A sociedade civil deve ver a sua filha a

trabalhar e ocupar cargos visíveis se possível cargos de decisão. Ver e não admirar porque a

sua filha está a conduzir carro, porque ela é chefe do posto administrativo, porque ela é

directora da escola, Administradora do Distrito, etc. Os esforços que estão sendo feitos a

nível de alguns paises e em moçambique devem ser ainda maiores. A mulher deve

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igualmente se preparar ou melhor, prporcionar condições para que ela se prepare e exerça

funções sem nenhum pré-conceito de sexo mais fraco, pelo contrário ocupar posições de

decisão de acordo com a sua capacidade e preparação, assim estar-se-ia pararelamente a

brandar o pré-conceito de que só o homem é que pode fazer grandes obras e não a mulher.

O quadro apresenta o ideal de igualdade entre sexos

Área da Vida Aspectos a Observar

Autonomia do corpo

proteção jurídica contra violência com

base no sexo,

controlo da sexualidade,

controlo da reprodução

Autonomia dentro da família e do

agregado familiar

liberdade para se casar e divorciar,

direito á custódia dos filhos em caso de

divórcio e / ou viúvez,

poder de tomar decisões e acesso a

bens dentro do agregado familiar.

Poder político

tomada de decisão a nível acima do

agregado familiar ( municípios,

sindicatos, Governo, parlamento…),

percentagens de mulheres com altos

cargos executivos.

Recursos sociais

Acesso a educação,

Acesso á água

Recursos materiais

Acesso a terras,

Acesso a casa

Acesso a crédito

Tempo acesso relativo ao lazer e ao descanso.

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Fonte: OSÓRIO,Conceição et al.: Relatório nacional do desenvolvimento humano-PNUD,

2001: 49.

Conclusão

O favoretismo do sexo masculino é uma questão que dura a partir dos tempos dos nossos

antepassados e que tem-se alastrado até os nossos dias. Com o desenvolvimento sócio-

económico e tecnológico dos paises não faz sentido continuar a conservar essa cultura

nociva. Porque as diferenças realmente existentes entre homem e mulher são meramente

bio-físicas, de resto o homem é igual a mulher em direitos e deveres. Quer dizer, ela possue

igualmente um imenso potencial para construção activa da sociedade, sem

constrangimento bio-física. Ela não precisa ser dada a oportunidade como fosse um objecto

do destino mas deve ser um sujeito activo das oportunidades existentes para o

desenvolvimento de toda a sociedade sendo o seu maior e inato parceiro o homem.

Portanto, nada de favoretismo do sexo masculino. Este comportamento pertence aos

nossos ancestrais. Agora é tempo de deixar atrás as coisas que ficam e erguer a cabeça para

a frente de igualdade, progressão e globalização consciente.

Bibliografia

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Moçambique. Maputo, 1998.

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