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Educação tutorial na formação em Letras:

história e análises teórico-críticas

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Renata Silveira da Silva

Sandro Martins Costa Mendes

Ana Valéria Goulart dos Santos

Pamela Belmutes Pinheiro

(Organização)

Educação tutorial na formação em Letras:

história e análises teórico-críticas

1a Edição

São Paulo

Todas as Musas

2018

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Editor: Flavio Felicio Botton

Capa e diagramação: Studio Vintage Br

Renata Silveira da Silva ©

Conselho Editorial

Edson Santos Silva

Luiz Felipe Voss Spinelly

Fernanda Verdasca Botton

É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem a prévia autorização

dos organizadores.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Kátia Aguilar CRB – 8/8898

E24

Educação tutorial na formação em Letras: história e análises teórico-críticas / Organização de: Ana Valéria Goulart dos Santos; Pamela Belmutes Pinheiro; Renata Silveira da Silva; et.al. São Paulo: Todas as Musas, 2018. 202 p. (PDF) Bibliografia ISBN 978-85-9583-037-0 1. Programa de Educação Tutorial (PET) – Letras 2. Curso de Letras da Unipampa 3. Projetos de ensino 4. Pesquisa e Extensão 5. Teoria e prática no ensino de línguas e literaturas 6. Educação tutorial na formação em Letras I. Santos, Ana Valéria Goulart dos; II. Pinheiro, Pamela Belmutes; III. Silva, Renata Silveira da; IV. Mendes, Sandro Martins Costa.

CDD 378.9 Catálogo Sistemático Programa de Educação Tutorial (PET) – Letras 378.2; Curso de Letras da Unipampa 378; Projetos e ensino 370; Pesquisa e extensão 370.9; Teoria e prática no ensino de línguas e literaturas 469.07; Educação tutorial na formação em Letras 378.9.

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1

Sumário

Apresentação,

Renata Silveira da Silva, Sandro Martins Costa Mendes, Ana

Valéria Goulart dos Santos e Pamela Belmutes Pinheiro

3

Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão),

Renata Silveira da Silva

13

Das Artes e das Letras: a literatura infantojuvenil latino-

americana em uma experiência de ensino petiana,

Geice Peres Nunes

31

Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário,

Ana Valéria Goulart dos Santos, Karoline Gasque de Souza, Maria

Solange Barbosa da Silva, Pamela Belmutes Pinheiro e Victor da

Silva Pacheco dos Santos

49

O projeto de ensino “A formação do leitor no Programa de

Educação Tutorial” e o ensino de literatura,

Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

65

Quando acordou, a literatura ainda estava lá: Letramento

Literário e a formação do leitor no Programa de Educação

Tutorial,

Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

85

Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras,

Sandro Martins Costa Mendes

105

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2

Os (in)sucessos na abordagem de temas transversais no Clube

do Livro,

Karoline Gasque de Souza e Maria Solange Barbosa da Silva

123

Petianos capacitando saberes,

Ana Valéria Goulart dos Santos e Pamela Belmutes Pinheiro

135

Tecelaria da Palavra: produzindo o gênero resumo informativo

na universidade,

Millaine de Souza Carvalho e Nathalia Madeira Araujo

145

Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de

ideias,

Sandro Martins Costa Mendes

169

Projeto Balbúrdia: escrita criativa no espaço de fronteira,

Renata Silveira da Silva e Sandro Martins Costa Mendes

187

Autores e autoras

199

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Apresentação

3

Apresentação

Renata Silveira da Silva

Sandro Martins Costa Mendes

Ana Valéria Goulart dos Santos

Pamela Belmutes Pinheiro

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Apresentação

4

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Apresentação

5

O Programa de Educação Tutorial (PET) Letras, em atividade

desde 29 de janeiro de 2013, surgiu com a finalidade de se valer de

atividades extracurriculares para promover inovações no percurso for-

mativo dos estudantes do Curso de Letras da Unipampa, Campus Ja-

guarão. Na proposta de criação do grupo PET, foram planejados pro-

jetos de ensino, pesquisa e extensão a partir de duas demandas da gra-

duação: flexibilização curricular e ligação entre teoria e prática no

ensino de línguas e literatura. Ao melhorar esses dois aspectos, o PET

Letras também estaria adequando o curso a dois objetivos institucio-

nais: aproximação entre a universidade e a comunidade; e formação

de profissionais competentes, não só conhecedores de princípios téc-

nicos e teóricos, mas também reconhecedores da importância de uma

atuação humanitária e ética.

Para o alcance dos objetivos aludidos e também adequação das ati-

vidades aos princípios do programa de educação pelo método tutorial,

foram criados, nos primeiros quatro anos de existência do grupo, di-

ferentes projetos, totalizando vinte e um, com duração variada:

PROJETOS

2013 2014 2015 2016

Tecelaria da Palavra na

Universidade

Monitoria

Discurso, mídia e escola

pesquisa

Discurso, mídia e escola

extensão

Balbúrdia no Português

Lampejos

Seminários Abertos

PET Cultural

Capacitações PET

KIT Estágio

Clube do Livro

SOS Reforço

Argumentação básica na

escola

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Apresentação

6

Balbúrdia na Escrita

Criativa

Texto: teorias e ensino

Tecelaria da Palavra na

Escola

Veteranos que publicam

Cultura latino-americana

Ecogestão

PETwork

Letramento Literário

Total 9 11 10 11

A seguir, uma amostra aproximada do quantitativo de atividades

por projeto:

PROJETOS 2013 2014 2015 2016

Tecelaria da

Palavra na

Universidade

2 minicur-

sos

6 oficinas 9 oficinas

Monitoria 2 graduan-

dos

3 gradu-

andos

4 gradu-

andos

2 graduan-

dos

Discurso, mídia e

escola pesquisa

4 artigos 1 artigo

Discurso, mídia e

escola extensão

3 oficinas 3 oficinas

Balbúrdia no

Português

4 informa-

tivos

3 infor-

mativos

Lampejos 2 edições

Seminários

Abertos

4 seminá-

rios

8 seminá-

rios

7 seminá-

rios

PET Cultural 2 edições 4 edições

Capacitações PET 4 edições 7 edições 4 edições 2 edições

KIT Estágio 5 leituras

Clube do Livro 1 edição 3 edições 3 edições

SOS Reforço 4 aulas

Argumentação

básica na escola

3 oficinas

Balbúrdia na

Escrita Criativa

3 edições

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Apresentação

7

Texto: teorias e

ensino

Capacita-

ções teó-

ricas

8 apresen-

tações

Tecelaria da Pala-

vra na Escola

9 oficinas 5 ativida-

des

Veteranos que

publicam

15 traba-

lhos aca-

dêmicos

1 livro

Cultura latino-

americana

Ecogestão 5 ações

PETwork 2 oficinas

Letramento

Literário

2 ações

Esse levantamento elucida o vasto material à disposição para ser

objeto de uma reflexão teorizadora e crítica. A intensa vivência petiana

poderia ser recuperada por diferentes vieses: aprofundamento das ba-

ses teóricas de projetos e implicações práticas; eficácia da aprendiza-

gem em âmbito acadêmico por meio de projetos no Programa de Edu-

cação Tutorial; identificação de princípios da educação tutorial pouco

e efetivamente desenvolvidos; perfil de tutor e de bolsista constituído;

o PET em uma universidade para todos: excelência ou qualificação

acadêmica?; os processos de seleção pouco concorridos; a tutoria en-

tre a mediação e a instrução.

Eis algumas das múltiplas possibilidades investigativas resultantes

do dedicado trabalho do PET Letras da Unipampa, Campus Jaguarão.

Desse rol, o presente livro, como toda publicação, opera um recorte e

congrega, no âmbito da autoria, uma parcela do quantitativo de atores

imprescindíveis à realização do planejamento de atividades de um

Programa de Educação Tutorial.

Inicialmente, a proponente do PET Letras e tutora nos primeiros

quatro anos, professora Renata Silveira da Silva, traz o capítulo intitu-

lado Gênese do PET Letras (Unipampa- Campus Jaguarão). O obje-

tivo é apresentar um histórico da criação do Programa de Educação

Tutorial (PET) Letras (2012) e socializar as justificativas para a exis-

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Apresentação

8

tência de um programa de formação complementar com vistas à exce-

lência acadêmica ligado à graduação em Letras, da Unipampa, Cam-

pus Jaguarão.

No capítulo dois, Das Artes e das Letras: a literatura infantojuve-

nil latino-americana em uma experiência de ensino petiana, a pro-

fessora Geice Peres Nunes defende o uso de publicações literárias in-

fantojuvenis nas aulas de língua espanhola. Para tanto, a atual tutora

do PET Letras elege a coleção Antiprincesas e Antihéroes (FINK; SAÁ,

2016) e destaca, nas publicações sobre a biobibliografia de artistas la-

tino-americanos, elementos estéticos, temáticas socioculturais e, con-

sequentemente, a relevância literária dessas obras quando acessadas

pelo público jovem. A professora também relata como a coleção, por

intermédio das obras Frida Kahlo e Julio Cortázar, foi norteadora

para a elaboração de atividades de ensino-pesquisa-extensão (2017-

2018) no âmbito do PET Letras.

Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário é o título do

texto produzido por Ana Valéria Goulart dos Santos, Karoline Gasque

de Souza, Maria Solange Barbosa da Silva, Pamela Belmutes Pinheiro

e Victor da Silva Pacheco dos Santos. Nesse capítulo, antigos e atuais

petianos refletem sobre a importância da iniciação científica no ensino

médio e a influência do projeto Tecelaria da Palavra na Escola na for-

mação acadêmica e docente de universitários. Também relatam como

surgiu o projeto, sendo originário de outro já existente, Tecelaria da

Palavra. Este trabalhava com as dificuldades de escrita de gêneros

acadêmicos dos discentes ingressantes na Unipampa; aquele se dedi-

cava aos concluintes da educação básica, de modo a instrumentalizá-

los para uma iniciação acadêmica mais capacitada quanto à produção

textual e usos de normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas

(ABNT).

No capítulo O projeto de ensino “A formação do leitor no Pro-

grama de Educação Tutorial” e o ensino de literatura, a docente Cátia

Goulart e os egressos do Curso de Letras, Maria Elia Martins e Santi-

ago Bretanha Freitas (ex-petiano), unem suas vozes para observar, sob

distintos lugares enunciativos – elaboradora, colaboradora e partici-

pante, as bases teórico-metodológicas e os resultados do projeto de

ensino. Este foi ofertado em 2016 pela professora Cátia aos petianos

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Apresentação

9

em virtude de uma demanda do PET Letras: receber capacitações

quanto à inter-relação teoria e prática para o ensino de literatura na

educação básica e, mais especificamente, elaborar atividades do pro-

jeto de extensão Letramento Literário.

O texto Quando acordou, a literatura ainda estava lá: Letramento

Literário e a formação do leitor no Programa de Educação Tutorial,

de autoria dos ex-petianos Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bre-

tanha Freitas, apresenta as etapas de realização do projeto Letra-

mento Literário. Os autores trazem reflexões teóricas e didáticas de-

correntes da aplicação do projeto A formação do leitor no Programa

de Educação Tutorial. Também expõem como essa capacitação dialo-

gou com a necessidade de instrumentalização de discentes e docentes

para o trabalho com textos ficcionais nas escolas. O capítulo ainda elu-

cida como se deu a elaboração e a execução de uma intervenção literá-

ria (2016) no Centro de Apoio Socioeducativo de Jaguarão (CASE).

No estudo intitulado Leitura e leitores no Clube do Livro PET Le-

tras, o professor Sandro Martins Costa Mendes, colaborador do PET

Letras, recupera as motivações para a criação do projeto que coorde-

nou: Clube do Livro. Com um olhar retrospectivo, elucida a importân-

cia da leitura para o leitor adentrar em um mundo ficcional distinto de

sua realidade para, pós-leitura, retornar ao mundo real com óticas di-

ferenciadas. O autor tematiza a leitura por prazer e busca compreen-

der o perfil do público-alvo do projeto, jovens universitários. Com base

em estatísticas sobre a leitura no Brasil, destaca motivos e obstáculos

à leitura. Outra questão evidenciada na reflexão são os diálogos sobre

as obras lidas nos encontros do Clube do Livro promovidos pelo PET

Letras.

No capítulo Os (in)sucessos na abordagem de temas transversais

no Clube do Livro, as petianas Karoline Gasque de Souza e Maria So-

lange Barbosa da Silva analisam os motivos pelos quais o Clube do Li-

vro obteve seus (in)sucessos ao incluir os temas transversais no pro-

jeto. As autoras explicitam a passagem de modalidade, extensão para

ensino, que se fez necessária a fim de contemplar os temas transver-

sais previstos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (MEC-SEF,

1998); são eles: ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual, plura-

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Apresentação

10

lidade cultural e trabalho e consumo. O texto ainda traz à baila a di-

versidade de obras debatidas nas edições realizadas, modificações nas

estratégias de divulgação, quantitativo de participantes e sugestões de

reformulação do projeto.

No capítulo Petianos capacitando saberes, as acadêmicas Ana Va-

léria Goulart dos Santos (ex-petiana) e Pamela Belmutes Pinheiro (pe-

tiana) avaliam o projeto Capacitações PET, que, levando em conside-

ração o público e as suas particularidades, subdividiu sua modalidade

em duas, passando a atuar tanto no ensino quanto na extensão. O texto

mostra a maleabilidade e o percurso do projeto desde o surgimento

das primeiras edições até a última de 2016. A argumentação revela os

pontos positivos e negativos vivenciados na tentativa de unir a popu-

lação da cidade com a universidade e relata a disseminação de temas

necessários à formação discente e raramente abordados no ensino for-

mal universitário.

O capítulo Tecelaria da Palavra: produzindo o gênero resumo in-

formativo na universidade, de Millaine de Souza Carvalho e Nathalia

Madeira Araujo, duas das quatro primeiras bolsistas do PET Letras,

apresenta análises de resumos elaborados pelos acadêmicos partici-

pantes do projeto Tecelaria da Palavra, edição de 2013. No primeiro

módulo dessa atividade, foram ensinados o resumo informativo e al-

gumas normas sobre referências da Associação Brasileira de Normas

Técnicas, totalizando 25 horas/aula. As ex-bolsistas estabelecem um

contraponto entre os resumos elaborados na fase de sondagem dos sa-

beres dos participantes e os elaborados após a aplicação do curso.

Nesse ínterim, destacam problemas linguísticos mantidos e superados

entre a produção inicial e final. As ministrantes também pontuam as

contribuições do projeto às suas quatro elaboradoras, que obtiveram

melhorias na expressão oral e escrita, exercitaram a docência, aperfei-

çoaram conhecimentos sobre o gênero resumo e refinaram seu olhar

quanto à revisão textual.

No capítulo Projeto Balbúrdia e a Criatividade: fomento e cone-

xão de ideias, o professor Sandro Martins Costa Mendes analisa con-

dicionantes da criatividade propostas por Steven Johnson (2011) e en-

contra essas condicionantes nos projetos Balbúrdia, Balbúrdia na Es-

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Apresentação

11

crita Criativa e na própria estrutura do PET. Essa pesquisa não pre-

tende demonstrar que apenas o Balbúrdia foi um solo fértil à criativi-

dade, mas que também é possível estabelecer em outras atividades

universitárias de ensino, pesquisa e extensão essas condicionantes. O

colaborador do PET Letras também se baseia em outros autores que

pensam o processo criativo, bem como reflete sobre a criatividade pre-

sente nos currículos.

No último texto, os professores Sandro Martins Costa Mendes e

Renata Silveira da Silva analisam uma edição do Balbúrdia na Escrita

Criativa, Balbúrdia Espaço, levando em consideração o espaço na

fronteira. O capítulo apresenta a experiência de escrita criativa dos

participantes do Balbúrdia Espaço, boa parte estudantes da universi-

dade, que vieram de outros lugares e experimentam a vivência e a cul-

tura da fronteira.

Os capítulos desta publicação funcionam como amostra da ima-

nência do ensino, da pesquisa e da extensão no Programa de Educação

Tutorial. Essas três faces do fazer acadêmico são relembradas em re-

flexões que, por sua vez, retroalimentam as ligações entre os elemen-

tos da tríade, elucidando ações futuras. Dessa forma, o livro explicita

memórias e, simultaneamente, convida o leitor ao “vir a ser” do pro-

grama.

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Apresentação

12

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

13

Gênese do PET Letras (Unipampa –

Campus Jaguarão)

Renata Silveira da Silva

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Renata Silveira da Silva

14

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

15

INTRODUÇÃO

O Programa de Educação Tutorial (PET), existente desde 1979, é

constituído por grupo de universitários, em média 12, tutoreados por

um docente. Existem 842 grupos no país, vinculados a 211 instituições

(2018). Os alunos realizam atividades de ensino, pesquisa e extensão,

de modo inter-relacionado, com o intuito de complementar e qualifi-

car a formação acadêmica. Os grupos dialogam com os cursos de gra-

duação a que estão vinculados, buscando realizar ações convergentes

com a proposta curricular e aprofundar o estudo de conteúdos previs-

tos nos componentes. Também são criadas estratégias para aprendi-

zagem de temáticas imprescindíveis ao profissional, mas pouco ou não

abordadas no percurso formativo.

O objetivo desta reflexão é registrar a história de criação do grupo

PET Letras, iniciado em 2013, e socializar as justificativas utilizadas

pela proponente do grupo, profa. Renata Silveira da Silva, para que o

Curso de Letras Português-Espanhol da Unipampa, Campus Jagua-

rão, tivesse o programa em seu rol de ofertas extracurriculares.

O presente texto é uma adaptação da proposta de criação do PET-

Letras (2012), lida e julgada por docentes da Unipampa, responsáveis

pela escolha de quais grupos poderiam concorrer ao Edital 11, de 19 de

julho de 2012, e avaliada pelo Ministério da Educação (MEC) para se-

leção de novos grupos PET. A proposta foi socializada com demais do-

centes do Curso de Letras, mas não foi debatida em reunião e perma-

neceu desconhecida. Por isso, a relevância desta produção, que traz

elementos históricos criadores de memórias do PET Letras.

A seguir, são retomadas informações sobre o processo de seleção

do PET Letras e apresentados os eixos norteadores do desenvolvi-

mento da proposta: – relações teórico-práticas no ensino de lín-

guas/literatura e flexibilização curricular. Após, está o modo como o

PET atua articulando o Projeto Institucional e o Projeto Pedagógico do

Curso de Letras. Em seguida, os referidos eixos são detalhados. Por

fim, é apresentado um quadro-síntese do rol de atividades de ensino-

1 Os dados referentes ao quantitativo de grupos PET no país e instituições são oriundos do portal do PET, no site do Ministério da Educação: http://portal.mec.gov.br/pet. Acesso em: 31 ago. 2018.

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Renata Silveira da Silva

16

pesquisa-extensão, expostas na proposta selecionada. Dessa forma, é

evidenciada a consonância dessas ações com a gênese do PET Letras.

SURGIMENTO E EIXOS FUNDADORES

O PET Letras, vinculado ao Curso de Letras da Unipampa, Campus

Jaguarão, foi aprovado pelo Edital 11, de 19 de julho de 2012, da Se-

cretaria de Educação Superior, com início efetivo das atividades em 29

de janeiro de 2013. O referido Edital previa a criação de 60 grupos,

divididos em três lotes. O Lote 1 tinha vaga para 15 grupos associados

a curso específico e quantitativo inicial de 4 bolsistas. O Lote 2, com o

mesmo número de vagas do Lote 1, era voltado a comunidades popu-

lares do campo ou da cidade, marcadas pela diversidade e os 12 bolsis-

tas deveriam estar em condição de vulnerabilidade social e econômica.

O Lote 3 ofertava 30 vagas para cursos de Engenharia com foco na

inovação tecnológica e 12 acadêmicos poderiam participar no primeiro

ano do Programa.

O Edital determinava que as atividades petianas estivessem vincu-

ladas ao Projeto Pedagógico da Instituição de Ensino Superior (IES) e

previssem ações para combate à evasão e à retenção. Os grupos pode-

riam ser do tipo interdisciplinar, de grande área do conhecimento, ins-

titucional ou curso específico. No resultado provisório, o PET Letras

ficou em 5º lugar, com a nota 93,41, precedido, no Lote 1, por um

grupo de abrangência institucional, um interdisciplinar e dois de curso

específico. Após os recursos, alterações nas notas de outros grupos im-

plicaram reclassificação do PET Letras, que ficou em 11º lugar, sendo

selecionado entre as 15 vagas concorridas por 348 IES, no Lote 1.

Nossa proposta, no seu lote, era a única do Rio Grande do Sul e a se-

gunda na área de Letras, mas a única de curso específico.

O Programa de Educação Tutorial (PET) Letras foi criado para in-

teragir dinamicamente com o Projeto Pedagógico do Curso de Letras

da Unipampa, Campus Jaguarão, por isso, atentou às seguintes de-

mandas do curso: – articulação entre saberes teóricos e prática de

ensino de línguas e literatura; – e flexibilização curricular, e respon-

deu com atividades de pesquisa, ensino e extensão ligadas a tais eixos.

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

17

CONVERGÊNCIA DO PET COM O PROJETO INSTITUCIONAL E O

CURSO DE LETRAS

A Universidade Federal do Pampa – Unipampa, com sede da reito-

ria em Bagé e gestão descentralizada, foi criada com base na lei 11.640,

de 11 de janeiro de 2008, publicada no Diário Oficial da União (DOU)

de 14/01/2008, seção 01, página 01. A nova instituição superior pú-

blica surgiu com o objetivo de “desenvolver pesquisa nas diversas

áreas do conhecimento e promover a extensão universitária, caracte-

rizando sua inserção regional, mediante ação multicampi, na mesor-

região Metade Sul do Rio Grande do Sul” (UNIPAMPA, 2009, p. 4).

A Universidade Federal do Pampa, conforme Projeto Institucional

(2009), foi criada em virtude de problemáticas socioeconômicas das

localidades onde estão seus dez campi, posto que a educação é deter-

minante para a melhoria das condições de vida. Outro argumento para

a criação da Unipampa baseou-se na seguinte premissa: a oferta de

educação superior contribui para a permanência de estudantes nas ci-

dades de origem, combatendo o declínio populacional, e movimenta a

economia local, dada a adequação da comunidade à presença de uma

instituição acadêmica.

O campus de Jaguarão, município localizado no extremo sul do

país e fronteiriço com Rio Branco, Uruguai, é um dos dez campi cons-

truídos para viabilizar a proposta da Universidade Federal do Pampa.

O Curso de Licenciatura em Letras Português – Espanhol e literaturas

correspondentes foi proposto mediante pesquisas reveladoras da ne-

cessidade de a cidade de Jaguarão, com aproximadamente 27.000 ha-

bitantes, ter mais docentes capacitados à atuação na educação básica.

O curso habilita brasileiros e uruguaios ao ensino de língua portu-

guesa, espanhola e respectivas literaturas, o que propicia aproximação

cultural, melhorias socioeconômicas e educacionais de Jaguarão (BR),

Rio Branco (UR) e cidades vizinhas, como Arroio Grande, Herval e Pe-

dro Osório (BR) (UNIPAMPA, 2010).

Passados 4 anos da publicação no DOU oficializadora da Uni-

pampa, segundo dados da Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD),

em 2012, foram ofertadas 3.110 vagas no processo seletivo

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Renata Silveira da Silva

18

SISU/ENEM (Sistema de Seleção Unificada/Exame Nacional do En-

sino Médio) com 9.117 matriculados em 29/02/2012. Na época, a Ins-

tituição de Ensino Superior (IES) contabilizava 62 cursos de gradua-

ção, sendo 8 novos. O campus de Jaguarão ofertava os cursos de Li-

cenciatura em Pedagogia, Licenciatura em História, Tecnologia em

Gestão de Turismo, Bacharelado em Produção e Política Cultural, e Li-

cenciatura em Letras – Língua Portuguesa e Língua Espanhola.

O Curso de Letras tem 9 semestres – tempo mínimo de integrali-

zação, e ofertava 50 vagas no período diurno e 50 no período noturno,

totalizando 100 vagas anuais. O curso passou a funcionar em 2006 e

até 2012 ocorreu a graduação de 3 turmas; tinha cerca de 16 docentes

do quadro efetivo, professores substitutos e temporários, os quais

atendiam a uma demanda de aproximadamente 230 alunos.

O curso foi avaliado pelo MEC em agosto de 2011. A comissão de

avaliadores, através de visita in loco, aferiu conceito 4, equivalente a

um bom perfil, a partir da análise da Dimensão 1- Organização didá-

tico-pedagógica: (nota 4); Dimensão 2- Corpo docente, corpo discente

e técnico administrativo: (nota 4); Dimensão 3- Instalações físicas:

(nota 4).

Com a oferta do Curso de Letras e demais cursos em Jaguarão, a

Unipampa atentou às carências locais e foi ao encontro da necessidade

de ampliação da oferta de ensino superior gratuito na região. Entre-

tanto, algumas melhorias precisavam ser efetivadas no Curso de Le-

tras para que fizesse jus ao desejo de oferta de ensino superior público

e de qualidade, tal como indicado no Projeto Institucional (2009, p.

3). O Projeto Pedagógico do Curso encontrava-se em fase de reestru-

turação. Antes do início da greve das universidades federais, iniciada

em 17 de maio de 2012, foram realizadas aproximadamente três reu-

niões entre os docentes, os quais tematizaram as sugestões de melho-

rias feitas pelos avaliadores2 do MEC e identificaram a flexibilização

2 A Comissão de Avaliadores sugeriu, na Dimensão 1, melhorias na composição do Núcleo Docente Estruturante (NDE) e no número de docentes por componente, pois havia média de 1 (um) docente para 3 (três) componentes curriculares. Nas Dimensões 2 e 3, foram sugeridos: gabinetes para docentes, visto que havia uma sala compartilhada sem divisórias;

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

19

curricular e o aprofundamento das relações teórico-práticas no en-

sino como demandas.

A proposta do PET Letras dedicou-se a esses dois tópicos para que

o curso estivesse melhor alinhado aos propósitos institucionais. Tais

problemas poderiam ser dirimidos via ação do PET Letras, que surgiu

como um intermediador entre o Projeto Pedagógico do Curso de Le-

tras (2010) e o Projeto Institucional (2009), ou seja, como um propo-

nente de atividades de ensino-pesquisa-extensão que ajudariam a mo-

dernizar a graduação em Letras e a ajustá-la às prerrogativas da Uni-

pampa.

As problemáticas descritas acima interferiam na qualidade do

curso e repercutiam indiretamente nos dados de evasão e retenção.

Vale dizer que os índices de evasão e de retenção também foram ori-

undos de dificuldades que escapavam às questões educacionais: a au-

sência de uma casa do estudante e de um restaurante universitário;

aluguéis progressivamente caros e falta de oportunidades profissio-

nais para os estudantes que não conseguiam bolsas na universidade.

A proposta do PET Letras baseou-se no perfil do aluno da Uni-

pampa, possível futuro petiano. Anualmente, era ampla a concorrên-

cia dos estudantes para aquisição de bolsas oriundas da Política de As-

sistência Estudantil da Unipampa, a qual visava criar condições para

o ingresso e a permanência dos acadêmicos. A Pró-Reitoria de Assun-

tos Comunitários e Estudantis (PRAEC) tinha três formas de benefício

estudantil. Os Programas de Bolsas de Desenvolvimento Acadêmico

(PBDA) compreendiam as modalidades de ensino, pesquisa, extensão

e gestão, sendo desprovidas de qualquer vínculo empregatício. Essas

atividades estavam distribuídas em carga horária de 12h, 16h e 20h. O

Programa Bolsas de Permanência – PBP concedia bolsas a estudantes

de graduação em situação de vulnerabilidade socioeconômica para

melhorar o desenvolvimento acadêmico e prevenir a evasão. Estava

distribuído nas modalidades: Bolsa Alimentação, Bolsa Moradia e

Bolsa Transporte. O Programa de Apoio à Instalação Estudantil era

aumento do número de periódicos especializados, indexados e correntes; e melhorias na infraestrutura dos laboratórios especializados.

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Renata Silveira da Silva

20

direcionado aos alunos em situação de vulnerabilidade socioeconô-

mica que vinham de cidades distantes dos campi da Instituição, de

modo a apoiar a chegada dos calouros à comunidade acadêmica.

Os programas de assistência estudantil existentes reafirmavam as

problemáticas de desenvolvimento socioeconômico dos municípios

onde foram inseridos os dez campi da Unipampa. Essas problemáticas

de ordem econômica eram intensificadas no Campus Jaguarão, no

qual não estavam concluídas as obras da casa do estudante e do res-

taurante universitário. Na cidade, os serviços de fotocópia eram caros,

pois a manutenção das máquinas fotocopiadoras era feita por mora-

dores de cidades vizinhas, fator que aumentava os valores. Além disso,

o transporte até o campus era feito através de uma empresa de ônibus

que atendia toda a cidade e não possuía horários de circulação mais

frequentes. Os aluguéis estavam progressivamente caros e havia difi-

culdade dos estudantes em conseguir vagas de emprego no comércio

local. A junção desses fatores de ordem institucional – relacionados à

lenta expansão da infraestrutura da Unipampa, e de ordem econômica

– relacionados às carências municipais, contribuíram para os índices

de retenção e geraram a desistência de alunos oriundos de outras ci-

dades e Estados brasileiros. Tais elementos eram agravados pelas pro-

blemáticas educacionais, pois a educação básica em Jaguarão caracte-

rizava-se por ter professores que lecionavam disciplinas distintas de

sua área de formação, consequentemente, as dificuldades de aprendi-

zagem oriundas dos bancos escolares explicavam, em parte, as dificul-

dades de aprendizagem do aluno ingressante nos cursos da Unipampa

de Jaguarão. Tais informações ajudaram na caracterização dos acadê-

micos e explicaram para qual população de alunos petiano foi elabo-

rado o PET Letras: estudantes oriundos de realidades econômicas e

educacionais carentes de melhorias. O PET Letras, por visar uma for-

mação de excelência, formaria multiplicadores capazes de disseminar

o perfil de egresso desejado:

O curso de Letras da Universidade Federal do Pampa – Campus Jagua-

rão – visa formar profissionais competentes, conscientes de sua atua-

ção na sociedade, capazes de lidar de forma crítica com as linguagens,

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

21

especialmente a verbal nos contextos oral e escrito, observando as ca-

racterísticas regionais em que a Universidade se insere, como também

as do país (UNIPAMPA, 2010, p. 8).

Egressos, conhecedores do funcionamento da linguagem, cientes

de sua importância como atores na mudança das condições educacio-

nais, atentos às demandas municipais, estariam capacitados a uma

atuação profissional provocadora de melhorias na localidade.

FLEXIBILIZAÇÃO CURRICULAR

A flexibilização curricular é compreendida como:

processo permanente de qualificação dos currículos, de forma a incor-

porar, nas diferentes possibilidades de formação (como disciplinas

obrigatórias, eletivas, atividades complementares), os desafios impos-

tos pelas mudanças sociais e pelos avanços científico e tecnológico e

pela globalização acelerada (UNIPAMPA, 2009, p. 11).

A integração universidade/universidade (diálogo entre cursos,

projetos institucionais e atores do espaço acadêmico) e universi-

dade/comunidade foi trazida, na proposta do PET Letras, como neces-

sária para promover a flexibilização curricular.

Sobre a relação entre as instâncias da própria universidade, tendo

em vista que o PET deve propiciar aprendizagens extracurriculares

para complementação da formação acadêmica, estavam previstos nas

atividades petianas, por exemplo, os seguintes projetos de extensão:

Balbúrdia, resultante da ação de alunos de Letras e História; Vivên-

cias e Reminiscências, que estabeleceria relações com o projeto Audi-

ovisual (do Curso de Letras) e dialogava com o Curso de História; e

Passeio Textual, resultante da colaboração de alunos de Letras e Tu-

rismo. Via diálogos sobre temas afins aos cursos, os participantes se-

riam desafiados à compreensão de temas caros a outros campos do sa-

ber.

Os referidos projetos de extensão e ainda os projetos de ensino e de

pesquisa, descritos na proposta de atividades do PET Letras, constitu-

íam atividades complementares de graduação e seriam facilitadores da

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Renata Silveira da Silva

22

almejada flexibilização curricular. Também incentivariam a inserção

do aluno nas atividades institucionais, contribuindo, dessa forma,

para a integração entre os atores da universidade. Conforme o Projeto

Pedagógico do Curso de Letras (2010), o acadêmico deve ter, ao final

do Curso, no mínimo, 200 horas de atividades complementares, que

compreendem, por exemplo: Atuação (ministrar, coordenar, desen-

volver) em projetos de pesquisa, extensão, iniciação ao ensino, publi-

cação e apresentação de trabalho acadêmico-científico e de natureza

cultural; Participação (assistir), por meio de representação discente

em colegiados, comissões, presença em eventos de natureza acadê-

mico-científico e cultural. As atividades complementares estão alinha-

das a um dos objetivos específicos do Projeto Pedagógico do Curso de

Letras (2010): “fazer com que o aluno assuma sua formação acadê-

mico-profissional como processo contínuo, autônomo e permanente”

(p. 8). Então, o PET Letras, através de suas ações de ensino-pesquisa-

extensão, se propôs a oportunizar diversificadas atividades comple-

mentares, ajudando os estudantes de Letras a completarem as 200 ho-

ras, que, não-raro, tornavam-se empecilho para a conclusão do curso

por alunos que simultaneamente trabalhavam e estudavam. No mais,

o PET Letras, por suas constantes atividades, almejava criar nos peti-

anos e participantes de projetos de ensino-pesquisa-extensão a per-

cepção da necessidade de formação contínua. Tal contribuição, reite-

ramos, estaria em consonância com o perfil de egresso do Projeto Pe-

dagógico do Curso de Letras.

No que concerne à relação universidade/comunidade, o Projeto

Institucional orientava que os atores locais e regionais fossem consul-

tados para o estabelecimento de diálogos que repercutissem na vincu-

lação de propostas acadêmicas às realidades do município de inserção

da Unipampa. O Curso de Letras vinha construindo ações de integra-

ção devido aos projetos de extensão que realizava.

Mesmo com essas iniciativas, precisávamos de mais ações a longo

prazo, tendo em vista que ainda eram recorrentes os relatos de que a

comunidade se sentia distanciada das ações da universidade. Tal pro-

blemática era perceptível quando, em eventos de projetos de extensão,

o público era repleto de pessoas da comunidade acadêmica e raros par-

ticipantes da comunidade em geral. Os estudantes universitários,

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

23

quando indagados sobre a ausência de seus amigos, familiares e côn-

juges em eventos destinados aos moradores da localidade, contavam

sobre receios, aversões em relação à Unipampa. Relatos de alunos ad-

vindos de comunidades populares urbanas revelavam certa resistência

à formação local e os jovens egressos do ensino médio ainda eram in-

centivados a procurarem qualificação educacional em outras localida-

des, com universidades mais antigas e estabelecidas.

Sendo assim, o PET Letras, através de seus projetos, se propôs a

criar situações de diálogo entre atores universitários e regionais, para

contribuir na resolução da problemática da integração universidade-

comunidade e para a formação do perfil docente desejado:

A Unipampa deve proporcionar uma sólida formação acadêmica gene-

ralista e humanística aos seus egressos. Essa perspectiva inclui a for-

mação de sujeitos conscientes das exigências éticas e da relevância

pública e social dos conhecimentos, habilidades e valores adquiridos

na vida universitária e inserção em respectivos contextos profissionais

de forma autônoma, solidária, crítica, reflexiva e comprometida com o

desenvolvimento local, regional e nacional sustentáveis, objetivando a

construção de uma sociedade justa e democrática (UNIPAMPA, 2009,

p. 11, grifos nossos).

Sobre a flexibilização curricular, consideramos que algumas ativi-

dades de extensão poderiam permitir a complementação dos compo-

nentes curriculares e instruir os participantes com a obtenção de co-

nhecimentos sobre outras áreas do saber (integração universi-

dade/universidade) e sobre a localidade de inserção da Unipampa (in-

tegração comunidade/universidade). Previmos a ocorrência do Pas-

seio Textual, em que seriam feitos passeios na cidade para descobrir

os textos que aí circulam. Outra proposta era o projeto Vivências e Re-

miniscências: momento de integração comunidade-universidade, em

que líderes comunitários, assistentes sociais do município, diretores,

professores e demais funcionários de escola, pescadores, políticos, por

exemplo, seriam convidados a relatar experiências, saberes, conheci-

mentos regionais. Esses encontros seriam organizados em mesas-te-

máticas, que contariam com o depoimento de pessoas da comunidade

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Renata Silveira da Silva

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e do espaço acadêmico. Os petianos, além de organizarem esses en-

contros, teriam o desafio de estabelecer inter-relações de modo que as

vivências fossem vinculadas aos questionamentos e reflexões da área

de Letras.

RELAÇÕES TEÓRICO-PRÁTICAS

A evasão e a retenção, além de ter causas de ordem econômica e

relacionadas ao processo de melhoria da infraestrutura da Unipampa,

também estavam relacionadas ao desenho curricular do Curso de Le-

tras. No que concerne aos componentes curriculares ofertados, mais

articulações teórico-práticas mostravam-se necessárias para que as di-

ficuldades inerentes à iniciação aos conhecimentos linguísticos, literá-

rios e educacionais não se transformassem em obstáculos à continui-

dade no curso. Nesse sentido, o PET Letras, ao ser proponente de no-

vos modelos pedagógicos e propiciador de diversificadas experiências

acadêmicas, poderia ajudar na construção de novos mecanismos de

aprendizagem.

Para fins de melhoria das relações teórico-práticas, apontamos

como alternativa a atuação dos petianos em monitorias, que lhes per-

mitiria atualização de conhecimentos. A monitoria também contribu-

iria para melhor aproveitamento de componentes curriculares e qua-

lificaria o curso, capacitando seus estudantes a um melhor desempe-

nho no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE).

Além disso, o apoio pedagógico na Unipampa era realizado pela Coor-

denadoria de Apoio Pedagógico (CAP), situada na reitoria, e pelos Nú-

cleos de Desenvolvimento Educacional (NUDE), existentes nos dez

campi. O PET Letras se propôs a buscar aporte no NUDE, campus Ja-

guarão, para obter informações basilares às atividades de monitoria.

O Núcleo de Desenvolvimento Educacional era o órgão responsável

pelo atendimento de docentes e discentes do campus, realizando ações

que visavam ao aprimoramento da qualidade do trabalho pedagógico,

melhorias no ensino e criação de condições de acesso e permanência

dos discentes na instituição. O NUDE poderia ajudar, por exemplo,

apoiando o tutor do PET Letras na elaboração de atividades de reforço

e/ou atualização de conhecimentos como estratégias pedagógicas para

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

25

contenção da retenção e evasão; apoiando os acadêmicos; e identifi-

cando fragilidades dos estudantes dos cursos de graduação em com-

ponentes curriculares específicos. Assim, via integração NUDE e PET

Letras, a monitoria se transformaria em ação resultante de trabalho

coletivo, tendo, portanto, mais chances de ser eficaz no controle da re-

tenção e da evasão.

Relacionadas à assimilação de conhecimentos acadêmicos estavam

as dificuldades de leitura e compreensão textual que os acadêmicos

apresentavam ao ingressarem na universidade. Tais dificuldades

acentuavam os problemas de aprendizagem e tinham como conse-

quência a desistência e a reprovação. Novamente, o PET Letras se

mostraria intermediador entre o Projeto Pedagógico do Curso de Le-

tras e o Projeto Institucional, pois a oferta de minicursos de escrita de

gêneros acadêmicos pelo PET e ação dos seus bolsistas como multipli-

cadores atenderia ao princípio institucional de “trabalho colabora-

tivo”.

A proposta de pesquisa coletiva também buscava a articulação teó-

rico-prática. Nesse âmbito, levamos em conta que a dimensão política

da linguagem clama por explicitação nas atividades de interpretação

de textos, lugar de dispersão de discursos, que, por sua vez, são encon-

tros de distintas formas de subjetividade. O PET Letras tinha em sua

pesquisa coletiva um projeto que sensibilizaria os envolvidos quanto à

indissociabilidade entre o linguístico e o político pelo fato de estar em-

basado na disciplina que se dedica a especificar essa relação: a Análise

de Discurso de linha francesa; pelo fato de requerer que o pesquisador

interpretasse seu objeto de estudo cruzando saberes sobre a sociedade

e sobre a estrutura da língua, isto é, tentando perceber na língua os

funcionamentos que se dão no plano discursivo-ideológico.

Com essa proposta de pesquisa coletiva, tentamos dar conta de

uma das problemáticas que ainda dificultava o alinhamento do Projeto

Pedagógico do Curso de Letras ao Projeto Institucional, a saber: o vín-

culo entre saberes teóricos e aplicações na prática docente de ensino

de línguas. A pesquisa coletiva exigia que o petiano tentasse compre-

ender as condições de produção dos textos em análise. Tal investiga-

ção deveria estar inter-relacionada ao ensino e à extensão, sendo as-

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Renata Silveira da Silva

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sim, as análises textuais apresentadas em formato de artigo capacita-

riam o petiano a observar seu corpus de análise do ponto de vista teó-

rico. O objeto de análise ainda deveria ser revisto visando à preparação

de atividades de compreensão textual. A análise teórica e construção

de atividades didáticas, além de aplicadas com alunos da educação bá-

sica, poderiam ser socializadas, de tal maneira que os bolsistas se

transformassem em multiplicadores.

A consulta aos preceitos teóricos advindos das teorias do texto e do

discurso poderia embasar ainda a elaboração de materiais didáticos a

serem apresentados no formato de jornal de ideias, tal como previmos

no projeto de ensino Balbúrdia no Português. No que tange ao vínculo

entre aportes teóricos literários e estratégias de ensino, seriam reali-

zadas parcerias com professores da área da Literatura.

SÍNTESE DA PROPOSTA DO PET LETRAS

Objetivo geral

- propor um conjunto de atividades de ensino – pesquisa – extensão que

têm em comum a temática “Interpretações itinerantes”, porque a interpre-

tação dos sujeitos envolvidos é aprofundada via – relações teórico-práticas

nos estudos da linguagem; – relações de sentido entre conhecimentos ad-

vindos da área de Letras com saberes de outras áreas do conhecimento e

populares, propiciando a flexibilização curricular.

Objetivos específicos Projetos

- criar para petianos, colabora-

dores e participantes oportuni-

dade de compreender como a

língua organiza as relações na

cidade;

Passeio Textual: petianos e vo-

luntários, com ajuda dos alunos do

Curso de Turismo, realizariam um

passeio pelo município de Jagua-

rão, descobrindo a cidade como lu-

gar de produção de textos e discur-

sos. Monumentos em praças, carta-

zes, faixas, avisos, placas de mu-

seus, anúncios, propagandas, en-

fim, diferentes gêneros textuais/

discursivos seriam abordados em

uma aula na rua, que descobriria a

potencialidade da linguagem orga-

nizando as relações sociais.

E

X

T

E

N

S

Ã

O

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

27

- integrar sujeitos que circulam

no espaço acadêmico e popular

através de mesas-redondas

compostas por membros desses

dois espaços, de modo que rea-

lizadores e participantes conhe-

çam distintas vivências sobre os

tópicos em discussão;

Vivências e Reminiscências:

Na mesa-redonda, seriam apresen-

tadas motivações ao debate, tais

como músicas, trechos de filmes,

poemas, programas televisivos, fo-

tos. O projeto previa gravações au-

diovisuais ou de áudio para cons-

trução de um acervo que poderia

ser corpus de estudo de alunos de

História e de Letras. O acervo ser-

viria para elaborar atividades com

a oralidade, analisar discursos, ob-

servar a composição do gênero “re-

lato”, por exemplo.

E

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- propiciar a flexibilização cur-

ricular através do projeto de ex-

tensão Balbúrdia, que discute

uma temática sob vieses teóri-

cos, populares, literários e artís-

ticos, permitindo o contato do

estudante de Letras com outras

áreas do saber e ampliação de

sua percepção crítica, necessá-

ria às análises textuais;

Balbúrdia: O evento Balbúrdia,

anterior à criação do PET Letras e

incorporado ao programa, teve o

formato de uma revista. Em cada

edição apresentava um tema (mú-

sica, infância, militância, corpo,

etc.), que era discutido através de

vídeos, trechos teóricos, poemas,

encenações, relatos, piadas, dita-

dos populares, dinâmicas de grupo,

experiências sensoriais, notícias,

por exemplo.

E

X

T

E

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S

Ã

O

- elaborar, a partir das temáti-

cas do projeto Balbúrdia, ativi-

dades aplicáveis nas aulas de

língua portuguesa, cuja divulga-

ção se dará através de jornal di-

dático Balbúrdia no Português,

que permite ao petiano exerci-

tar o planejamento docente com

base na interdisciplinaridade;

Informativo Balbúrdia no

Português: A partir das temáticas

discutidas no Balbúrdia, petianos e

voluntários produziriam informati-

vos. Cada jornal de ideias contem-

plaria dois assuntos do Balbúrdia e

traria ideias de como aplicar as ati-

vidades do evento nas aulas de lín-

gua materna.

E

N

S

I

N

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Renata Silveira da Silva

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- possibilitar aos petianos atua-

ção como monitores das disci-

plinas com as quais se identifi-

cam, visando ao reforço escolar

de colegas e à atualização de co-

nhecimento;

Monitoria: Em um período de, no

mínimo, 2 anos, cada petiano deve-

ria atuar como monitor em pelo

menos 1 componente curricular de

seu interesse.

E

N

S

I

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O

- oportunizar aprendizagem ex-

tracurricular e complementação

da formação acadêmica dos alu-

nos de Letras e demais cursos

da Unipampa, Campus Jagua-

rão, através de minicursos vol-

tados ao ensino de nova orto-

grafia, de normas da Associação

Brasileira de Normas técnicas

(ABNT) sobre o texto científico

e da escrita de gêneros acadêmi-

cos;

Minicurso nova ortografia;

Escrita de gêneros acadêmi-

cos: normas ABNT (citação e

referência), resumo e resenha

(módulo I);

Escrita de gêneros acadêmi-

cos: normas ABNT (apresen-

tação do texto acadêmico, es-

trutura), projeto de pesquisa e

artigo (módulo II)

E

N

S

I

N

O

-aprofundar saberes sobre teo-

rias do texto e do discurso que

funcionam como aporte na rela-

ção dos gêneros textuais/dis-

cursivos (bula, receita, carta,

etc.) com a situação de produ-

ção e enriquecem as atividades

de interpretação textual, atra-

vés de realização de pesquisa

que tem como linha mestra a

Análise de Discurso de linha

francesa.

Discurso, texto e escola: O pro-

jeto de pesquisa, anterior ao PET

Letras e integrado ao Programa,

fundamentava-se na Análise de

Discurso de linha francesa, linha de

estudos que pensa o texto como lu-

gar de dispersão de discursos que

se aliam ou se conflitam ideologica-

mente.

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S

A

CONCLUSÃO

O planejamento do grupo tutorial do Curso de Letras atendeu aos

princípios do MEC quanto às possibilidades de intervenção do PET:

modernização do curso de graduação; aprendizagens extracurricula-

res; formação global; contato com o mercado de trabalho; qualificação

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Gênese do PET Letras (Unipampa – Campus Jaguarão)

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do petiano como membro da sociedade; formação humanitária; au-

mento de experiências; interação com o Projeto Pedagógico do curso;

indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; contato dos bol-

sistas com a realidade social e formação de acadêmicos como multipli-

cadores. Além disso, o PET Letras, vale reforçar, surgiu conceituando-

se como um intermediador entre o Projeto Institucional e o Projeto

Pedagógico do Curso de Letras, de modo que fosse um porta-voz das

demandas do curso no diálogo com os as orientações de qualificação

do ensino superior da Unipampa.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Programa de Educação Tutorial

(PET). Manual de Orientações básicas. Brasília: 2006. Disponível

em:<http://proeg.ufam.edu.br/attachments/128_petma-

nual_2005.pdf>. Acesso em: 31 ago. 2008.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA (UNIPAMPA). Projeto Ins-

titucional. Bagé: 2009. Disponível em:< http://cursos.uni-

pampa.edu.br/cursos/gestaoambiental/files/2011/02/PI-UNI-

PAMPA.pdf>. Acesso em: 31 ago. 2018.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA (UNIPAMPA). Projeto Pe-

dagógico: Curso de Licenciatura em Letras Português, Espanhol e

respectivas literaturas. Jaguarão: 2010. Disponível em:

<http://cursos.unipampa.edu.br/cursos/letrasjaguarao/fi-

les/2016/06/PPC-Letras-vers%C3%A3o-original.pdf>.

Acesso em: 31 ago. 2018.

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Renata Silveira da Silva

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Das Artes e das Letras

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Das Artes e das Letras: a literatura

infantojuvenil latino-americana em

uma experiência de ensino petiana

Geice Peres Nunes

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Geice Peres Nunes

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Das Artes e das Letras

33

s reflexões aqui apresentadas assentam-se em três pilares: se

uma de suas bases se apoia na literatura; a segunda vale-se

dessa importante matéria como parceira para o desenvolvi-

mento de uma prática de ensino em língua espanhola; a terceira toma

forma na educação tutorial do PET Letras e na possibilidade de futuros

professores vivenciarem a experiência de ensino desde a sua formação

inicial.

Cabe destacar que a interface literatura-língua-formação consti-

tuiu o principal interesse a ser alcançado com o projeto de ensino Cru-

zamentos: a literatura e as artes no ensino de língua espanhola, que

deu origem ao subprojeto A literatura e as artes no ensino de língua

espanhola, desenvolvido junto ao PET Letras nos anos de 2017 e 2018,

experiência da qual derivam algumas das reflexões aqui apresentadas.

Assim, a composição deste texto toma forma em duas seções, cujo con-

teúdo expõe um estudo da literatura de língua espanhola (infantoju-

venil latino-americana, no caso apresentado); e, logo em seguida, uma

reflexão acerca da literatura coadunada à prática de ensino de língua

espanhola e essa ação associada a uma experiência de ensino no âm-

bito do PET Letras da Universidade Federal do Pampa, Campus Ja-

guarão.

ANTIPRINCESAS E ANTIHÉROES COMO PERSONAGENS NA

SALA DE AULA

Ainda pouco estudadas, Antiprincesas e Antihéroes1 chegam em

coleções literárias infantojuvenis baseadas em biobibliografias de ar-

tistas latino-americanos. Seus números destinados “para chicas y chi-

cos” compuseram-se, inicialmente, por Frida Kahlo, Julio Cortázar,

Violeta Parra, Eduardo Galeano, Clarice Lispector, com publicações

datadas em 2016. Porém, o crescimento gradual das referidas coleções

possibilitou a apresentação de outros artistas e personalidades histó-

ricas ou populares com relevante papel nesse espaço geográfico e cul-

tural.

1 Ao longo deste artigo, optamos por fazer uso das expressões “Antiprincesas” e “Antihéroes” em língua espanhola.

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Num movimento iniciado há décadas, essa literatura, ainda que

destinada ao público infantojuvenil, dá conta de aspectos sociais en-

quanto continua refletindo acerca do ser latino-americano, à medida

em que adota a postura ou opção de confrontar e relativizar binaris-

mos a fim de superar a posição de inferioridade ou de marginalidade

da cultura produzida em uma região tão plural. Contemporânea, essa

literatura dá voz, também, aos discursos do nosso tempo, na promoção

de um público leitor que se desarma e descontrói preconceitos.

Em sua estrutura, cada edição ganha corpo por um reduzido nú-

mero de fotografias e, quase em sua totalidade, por ilustrações de Pitú

Saá, inspiradas em fatos que evidenciam a história de vida, a carreira

profissional e as reverberações da produção de cada artista título – se-

jam elas literárias, musicais, pictóricas -, junto à sociedade e ao pú-

blico consumidor de suas artes. Ao lado das ilustrações, pequenos bo-

xes, redigidos por Nadia Fink, narram histórias através de textos cur-

tos, forma adotada, aparentemente, em função do público-alvo dos li-

vros, que reivindicam explicações breves acerca de conceitos, eventos

ou outros conteúdos presentes nas páginas. Nesse formato, cada livri-

nho se abre em todo o seu potencial artístico, informativo, questiona-

dor de valores e, sempre, reflexivo. É assim que cada conteúdo se con-

verte em hiperlink para informações que o leitor infantojuvenil ou

adulto pode acessar, e estas chegam na ordem de uma formação cul-

tural e social proporcionada por tais leituras.

As coleções Antiprincesas e Antihéroes trazem consigo conceitos

passíveis de impulsionar os jovens leitores a desenvolverem uma pos-

tura relativista e emancipada. Ao mesmo tempo em que podem pro-

porcionar modificações na interioridade dos sujeitos, ainda promo-

vem transformações sociais, quando dão ênfase a aspectos culturais

para questionar valores, posturas, juízos artísticos, experimentações,

da mesma forma que o estar no mundo dos sujeitos leitores. Nesse

sentido, um traço que se sobressai nessas leituras é o forte teor deco-

lonial nelas reunido, conceito compreendido a partir da noção difun-

dida por Catherine Walsh “como metodologías organizacionales, ana-

líticas y psíquicas que orientan rupturas, transgresiones, desplazami-

entos e inversiones de los conceptos y prácticas impuestas y hereda-

das” (WALSH, 2013, p. 64). As publicações evidenciam a condução

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Das Artes e das Letras

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para um processo que promove o rompimento com crenças, ideologias

e visões de mundo estreitas e limitadoras, como a determinação social

do papel da mulher, por exemplo, promovendo a decolonização de

uma “crença” imposta e difundida em diferentes contextos. É nesse

aspecto que Frida Kahlo (2016), Violeta Parra (2016), Juana de Azur-

duy (2016) e Clarice Lispector (2016), com suas biografias pessoais

e/ou artísticas convertidas em matéria literária, aproximam-se do que

viemos destacando como postura decolonial.

Pelo menos nos três primeiros livros da coleção Antiprincesas, as

trajetórias da artista plástica Frida Kahlo, da cantora, compositora e

artesã Violeta Parra e da heroína Juana de Azurduy propiciam um “re-

cuperar, reconstruir y hacer re-vivir la memoria colectiva sobre terri-

torio y derecho ancestral, haciendo esta recuperación, reconstrucción

y revivencia parte de procesos pedagógicos colectivos” (ALEXANDER

apud WALSH, 2013, p. 64). Nesses casos, o fator pedagógico se dirige

ao leitor infantojuvenil, no movimento de conhecer a história da Amé-

rica Latina como região cultural, contada não pelo discurso hegemô-

nico e legitimado, pois os livrinhos trazem a proposta de promover in-

fancias libres através da releitura da trajetória de vida de artistas in-

seridos em contextos geográficos particulares, em momentos históri-

cos específicos e defensores de causas pessoais, que se fundem, tam-

bém, com causas coletivas. Assim, é nesse sentido que publicações e

protagonistas expressam a “resistencia-existencia ante el largo hori-

zonte colonial” e ajudam a ler o presente por se relacionarem ao mo-

mento atual (2013, p. 64). Para corroborar essa potencialidade, ainda

dentro de tal perspectiva, destacamos Violeta Parra, enquanto perso-

nagem real e ficcional, como uma agente capaz de

reestablecer y fortalecer relaciones de aprendizaje intergeneraciona-

les y, a su vez, emprender reflexiones sobre los caminos pedagógico-

accionales por construir y recorrer. Escribir esta memoria colectiva,

es decir, poner en letra las memorias y enseñanzas que vienen de la

tradición oral […] Eso frente al momento actual de distanciamiento de

las generaciones nuevas, de las voces de enseñanza y aprendizaje de

las abuelas y los abuelos [...] (ALEXANDER apud WALSH, 2013, p.

64-65, grifos nosso).

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Nessa popularização da leitura das coleções Antiprincesas e Anti-

héroes, a linguagem atualizada dos livrinhos constitui um papel fun-

damental para a aproximação de novos leitores, mas compreendemos

que esta não é uma edição que chega ao seu público sem precursores.

Em grande parte, a postura da antiprincesa já está consagrada na tra-

dição literária, desde a heroína clássica Antígona, protagonista da tra-

gédia homônima; em personagens da dimensão de Rosaura, a donzela

guerreira de La vida es sueño, de Pedro Calderón de la Barca; de Dia-

dorim, composta por Guimarães Rosa em Grande Sertão: Veredas; de

Úrsula Iguarán, Meme, Angela Vicario, destacadas entre a gama de

personagens femininas de Gabriel García Márquez; de Lavinia, de La

mujer habitada, de Gioconda Belli, entre outras que aqui não nomea-

mos. Ainda vale destacar que o alcance e a popularização desse perfil

de personagem entre o público infantojuvenil contemporâneo parece

ter se propagado de forma massiva a partir de animações cinemato-

gráficas, com modelos femininos tais quais Fiona, Merida ou Mulan,

entre outras princesas “desprincesadas”, cuja postura combativa e

convicções sobre o papel social da mulher/princesa transcendiam cos-

tumes e valores propagados por uma sociedade patriarcal. Uma aná-

lise mais profunda dessa produção nos brindará com um número

abundante de modelos, mas o fato é que, aqui, a observação das per-

sonalidades artísticas, literárias ou políticas apresentadas pelo selo

Antiprincesas nos remete a um perfil real -não mais fabular -, com ra-

ízes latino-americanas:

Las antiprincesas no sólo son mujeres. No sólo son distintas a aquellas

de plástico y fantasía. No sólo derrumban mitos y lógicas misóginas.

Son reales, son de acá, son nuestras. No sólo por ser americanas, sino

por ser pueblo. (MORALES & PIANTONI, 2016, p. 4)

Detectados possíveis antecedentes, cabe enfatizar a originalidade

das publicações que aqui tratamos. Inicialmente, destacamos a sua co-

nexão com o tempo de seus leitores. Os livros são repletos de hashtags,

expressas pelo elemento gráfico #, além de outros símbolos que con-

duzem o leitor ao mundo digital. Assim, a leitura não chega com o pre-

texto ou a proposta utópica de afastar uma geração hiperconectada nas

redes de seus aparelhos eletrônicos. Pelo menos na primeira edição,

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Frida Kahlo (Figura 1), muitos ícones desse universo são utilizados e

ilustram o material impresso. Nos demais livros, o que vemos são os

meios digitais como mecanismos auxiliares para acessar de forma

mais aprofundada conteúdos apresentados nos livrinhos, seja a obra

pictórica de Frida – recriada em linhas mais infantis-, a literatura de

Cortázar, a música de Violeta, as crônicas, entrevistas, documentários

de Galeano, etc. Cabe ao jovem leitor a busca autônoma para obter a

satisfação nas respostas: “¿Y qué pasó después con Violeta? Esa es otra

historia… una que habrá que buscar en otro cuento o que vas a tener

que buscar en otros libros, en otras voces” (FINK; SAÁ, 2016b, p. 22).

Sobre esse fragmento, Morales e Piantoni o analisam sob outra pers-

pectiva e percebem-no como uma estratégia dos autores para não

adentrarem em temas julgados fortes, como a morte ou outros, para

os leitores infantojuvenis e, a esse respeito, defendem que, apesar da

proposta de os autores falarem claramente sobre questões sociocultu-

rais, “es contradictorio que por ejemplo no incluyan el suicidio como

la verdadera causa de la muerte de Violeta Parra y dejen la narración

abierta” (2016, p. 273). Vemos coerência nessa argumentação, mas ve-

mos, ao lado disso, um impulsionamento do leitor em direção à busca

independente por uma resposta que lhe permita preencher as lacunas

deixadas propositadamente pelos autores.

Figura 1 – Capa e detalhes de ícones

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Na nossa visão, outro aspecto que contribui para o interesse do pú-

blico infantojuvenil reside na forma de apresentação de conteúdos bi-

ográficos, conteúdos artísticos, explicações teóricas, etc. Em cada uma

das publicações, eles são mediados por um personagem que assume

diferentes aspectos: “perro preguntón”, em Frida Kahlo; “pajarito pre-

guntón”, em Violeta Parra; gato, em Julio Cortázar; Ulisses, o ca-

chorro perguntador, em Clarice Lispector; “chanchita preguntona”,

em Eduardo Galeano, entre outros. Uma vez apresentados, esses ani-

mais fabulares (dotados de vozes e curiosidades) evidenciarão a com-

plexidade na simplicidade de seu uso: são parte do livro, mas se situam

em um momento posterior à vida pessoal e profissional dos artistas

título, por essa razão, carregam muitas dúvidas sobre o narrado. Nesse

entrelugar, deslocados temporalmente dos eventos narrados, repre-

sentam a curiosidade dos leitores contemporâneos, fazendo perguntas

que estes fariam com a mesma ingenuidade e frescor. Assim, de algum

modo, cada livro ilustrado parece simular a experiência de narrar e

ouvir, vivenciada entre pais e filhos, entre avós e netos, entre profes-

sores e estudantes, repleta de interrupções motivadas por perguntas

que, na oralidade, podem dar forma a contos que se dilatam conforme

a curiosidade do ouvinte, porém, na escrita, são limitados pela infor-

mação que o texto oferece.

Evidenciados os aspectos da forma, é imperativo que nos voltemos

ao conteúdo desse conjunto de livros que analisamos. Acerca dessas

coleções, María Morales e Giulietta Piantoni resenharam:

Los textos que constituyen esta propuesta promueven el respeto por la

diversidad comprendiendo y valorando la especificidad, lo particular y

lo único de cada niño y niña con sus posibilidades y proyecciones. Esta

colección expone algunos casos entre miles y rescatan valores de hom-

bres y mujeres comunes que decidieron “ser” dentro de un mundo que

intenta homogeneizar, que lucharon por ideales y convicciones lejos

del legado patriarcal y religioso que América Latina heredó de sus con-

quistadores y que regula la vida de niños y niñas con el fin de hacerlos

“encajar”. (MORALES & PIANTONI, 2016, p. 2).

No fragmento, o discurso das pesquisadoras Morales e Piantoni faz

ecoar uma consistente crítica latino-americana. É como se a voz de

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Ángel Rama ressurgisse nas entrelinhas e viesse a destacar a diversi-

dade na aparente unidade, ponto de vista evidenciado em Transcultu-

ración Narrativa en América Latina, publicada em 1982, obra na qual

Rama reflete: “Por debajo de la unidad se despliega una interior diver-

sidad que es la definición más precisa del continente” (RAMA, 2004,

p. 57). Assim, embora teorize sobre regiões culturais e a ilusória ho-

mogeneidade, o discurso do crítico latino-americano elucida também

o social e mostra as especificidades e diferenças “dentro de um mundo

que tende a homogeneizar”. Nesse aspecto, as coleções aqui discutidas

carregam o perfil emancipador, pois conscientizam, mais do que rotu-

lam ou tentam definir posturas padronizadas, para além disso, afir-

mam o valor positivo da diversidade.

É notável como as publicações desempenham esse papel. De abran-

gência latino-americana, cada livro revela o caráter heterogêneo dessa

região cultural, que pode ser observado desde uma perspectiva étnica

ou regional, cuja idiossincrasia de cada artista retratado tem recursos

para expressar. Esses aspectos, reunidos ou isoladamente, dão mos-

tras da pluralidade cultural, conscientizam acerca das culturas ao

passo que educam aqueles jovens leitores que se colocam em contato

com tal produção. Assim, os aspectos destacados podem vincular-se,

sob uma perspectiva da teoria da cultura, a questões aprofundadas por

intelectuais como Ángel Rama, assim como viemos afirmando.

Nesse olhar positivo sobre o que é diverso, uma publicação mar-

cante aparece no segundo livro da coleção Antiprincesas, Violeta

Parra. É através de fragmentos da trajetória pessoal dessa artista mu-

lher que a essência de uma poesia popular e de uma cultura oral res-

surgem para o leitor contemporâneo no narrar do autodidatismo e da

afeição pela música folclórica, pela literatura oral e o artesanato do

país natal de Violeta Parra, a

artista chilena [que] salió por los caminos más profundos de su país a

buscar en los pueblitos perdidos las canciones que no llegaban a otras

partes. Y así las escuchó de boca de la gente más vieja y, como en una

máquina del tiempo, las llevó a su presente para que no se perdieran.

(FINK; SAÁ, 2016b, p. 3).

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Na zona campesina de Chillán, Violeta “conoció de cerca y aprendió

todo lo relacionado con el arte popular: moldeaba cerámica, creaba fi-

guras con alambre y empezó a ver algo del tejido de tapices que tanto

bordó después de grande” (FINK; SAÁ, 2016b, p. 4). Analisando o im-

pacto dessa descrição viva da arte popular de Violeta, percebemos sua

potencialidade para transformar a visão de mundo dos jovens leitores

que se voltam para o livrinho, mas que, sujeitos de seu tempo, veem

nas mídias televisivas e digitais o terreno da consagração. Para esses

leitores, ter acesso à arte de Violeta é ter a oportunidade de perceber o

olhar atento ao passado, à ancestralidade e àquilo que é culturalmente

constitutivo da identidade de cada um e que cabe a cada indivíduo co-

nhecer e salvaguardar.

Eduardo Galeano é outro autor que tem sua trajetória narrada em

intrínseca relação com a história da América Latina: “Y entonces,

cuando tenía 31 años llegó su libro más reconocido, Las venas abiertas

de América Latina, que habla del saqueo de la tierra desde la con-

quista (que alguna vez se llamó ‘descubrimiento’) de América hasta

nuestros días” (2016d, s. p.). Nas expansões e aprofundamentos dos

autores, a expressão “saqueo de la tierra” é usada na perspectiva do

autor título:

Galeano reveló al mundo la forma en que Europa se llevó de estas tie-

rras todas las riquezas, como el oro y la plata. Y hoy sigue siendo sa-

queada por las grandes potencias del mundo, se siguen llevando los re-

cursos naturales y talando los bosques. (FINK; SAÁ, 2016d, s. p.).

Além de seu ponto de vista associado à defesa do território latino-

americano, o livro de Eduardo Galeano apresenta amostras da cultura

latino-americana entranhadas em sua essência (Figura 2): o caráter

multiétnico da região cultural, a importância musical e literária uru-

guaias, destacando a festividade do Carnaval e as formas de represen-

tações difundidas no país, como os cantos de protesto apresentados

nos “tablados” montevideanos; a influência marcante do escritor uru-

guaio Juan Carlos Onetti; a figura do mexicano Juan Rulfo como mo-

delo literário; além do interesse por figuras femininas do cenário la-

tino-americano, notáveis e anônimas, tal qual Frida Kahlo, Violeta

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Parra, entre outras, retratadas pelo autor no livro Mujeres, de 1995

(FINK; SAÁ, 2016d, s. p.).

É a partir dessas características compartilhadas pela coleção que

vemos nesses textos compostos por informações narradas de forma

leve e em língua espanhola a possibilidade de cativar leitores jovens.

Os livros são nutridos da capacidade de instigar os jovens leitores a

investigar diferentes fontes para descobrir respostas mais profundas

que satisfaçam seus questionamentos.

Figura 2 – Ilustração de Pitú Saá

No caso do exemplar intitulado Julio Cortázar, ademais da contís-

tica repleta de seres imaginários que consagra o autor título – vale re-

cordar dos “famas”, das “esperanzas” e dos “cronopios” -, a vivência do

escritor e sua relação com países latino-americanos como Argentina e

Cuba se sobressai nas páginas do livro desse antihéroe. Dessa experi-

ência, um excerto de Viaje a un país de Cronopios insere o leitor na

literatura do autor em sua língua de origem, desperta a curiosidade e,

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de forma lúdica, familiariza leitores infantis ou juvenis (nesse caso da-

mos destaque aos brasileiros) na sua produção literária de valor uni-

versal.

Pelo exposto, as potencialidades já destacadas sobre essas coleções,

voltadas mais especificamente para as suas matérias literárias, apre-

sentam sintonia com o viés proposto pelo subprojeto executado no

PET Letras, no qual literatura, artes e língua espanhola estariam asso-

ciadas em favor de uma aula pautada na interface entre essas matérias,

com um foco em aspectos socioculturais, conformadores de quaisquer

das línguas.

O COMPONENTE LITERÁRIO NA AULA DE LÍNGUA

ESTRANGEIRA2 COMO BASE DE UMA EXPERIÊNCIA PETIANA

O Programa de Educação Tutorial3, nas normativas que amparam

sua execução, destaca o papel a ser desempenhado pelos grupos que

constituem seu conjunto nas variadas áreas de especificidade. A todos

os grupos cabe a proposição e execução de ações de ensino, pesquisa e

extensão como práticas indissociáveis à formação global de estudantes

em nível superior (MEC, 2006, p. 6). Tais aplicações requerem a rea-

lização de aprendizados reflexivos possibilitados pela execução de ati-

vidades extracurriculares formadoras; ampliando e aprofundando co-

nhecimentos acadêmicos de disciplinas que integram a grade curricu-

lar. Nessas ações, planejamento, reflexões e debates são requisitos es-

senciais às vivências dos petianos, visando aprimorar o seu desenvol-

vimento como acadêmico e como profissional em formação (MEC,

2006). Assim, o conhecimento das demandas que o PET exige pôr em

prática foram essenciais para pensar a tutoria, assim como para dar

concretude ao subprojeto A literatura e as artes no ensino de língua

2 Esta seção se vale de recortes de referências e reflexões já apresentadas no projeto de ensino Cruzamentos: a literatura e as artes no ensino de língua espanhola, registrado na plataforma SIPPEE, da Universidade Federal do Pampa, sob o número 06.016.16. 3 O Programa de Educação Tutorial é regulamentado pela Lei nº 11.180, de 23 de dezembro de 2005, e pelas Portarias MEC nº 3.385, de 29 de setembro de 2005, e nº 1.632. de 25 de setembro de 2006 (MEC, 2006).

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espanhola, derivado de uma adaptação das ações planejadas no pro-

jeto de ensino Cruzamentos: a literatura e as artes no ensino de lín-

gua espanhola.

Sobre o uso do componente literário no ensino de língua estran-

geira, destacamos que se trata de uma discussão que parece estar sem-

pre em voga e, não sendo unânime, guarda seus conflitos. Um questi-

onamento inicial indaga se essa presença na sala de aula “¿Sirve para

aprender lengua o para aprender literatura?”, conforme provoca a pes-

quisadora Begoña Sáez Martínez (2012). É claro que sua resposta é fa-

vorável ao uso da literatura nas aulas, por isso, nos chega em uma ar-

gumentação que leva em conta tanto a literatura enquanto objeto es-

tético a ser fruído, quanto o texto literário como um enunciado em que

estruturas linguísticas possam ser analisadas:

En primer lugar, si la literatura sólo se usa para aprender lengua, en-

tonces podemos preguntarnos: ¿Para qué elegir un texto literario?, o

mejor dicho, ¿Por qué? ¿Qué motivo nos conduce a ello? ¿Es un

adorno? ¿Es distendido? ¿Queda muy bien en nuestras clases después

de tanta gramática? ¿Es el azar el que nos ha llevado hasta él para prac-

ticar determinados contenidos lingüísticos? […] Muchas veces el texto

literario no funciona como literario, sino como soporte para otras ex-

ploraciones didácticas. (2012, p. 16).

María Dolores Albaladejo García, que também representa uma im-

portante referência sobre o tema aqui desenvolvido, em seus estudos

e diagnósticos, aponta para o número reduzido de pesquisas sobre a

presença da literatura nas aulas de língua estrangeira e destaca que,

em muitos casos, quando é utilizada, em especial nos livros didáticos,

está presente como um “apêndice” (2007, p. 4). Esse aspecto é facil-

mente detectado em publicações brasileiras desse gênero, cuja aber-

tura ou fecho de capítulo costuma trazer poemas ou fragmentos de gê-

neros em prosa, como leituras apartadas das discussões e impressas

com a suposta possibilidade de fruição. Assim, a reflexão da pesquisa-

dora contextualiza e provoca sobre a condição de uso do texto literário

que, a um só tempo, constitui-se como um objeto artístico expresso em

linguagem e passível de representar “um contexto cultural significa-

tivo” (2007, p. 4).

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Na sua abordagem, Albaladejo García elenca uma série de argu-

mentos que comprovam a relevância do uso do literário em sala de

aula e assim incentiva essa presença: a literatura “[…] ayuda a desar-

rollar la competencia comunicativa en su componente lingüístico y en

su dimensión sociocultural […]”, além de ser “un vehículo de gran ri-

queza lingüística y estética” (2007, p. 5). Defensora dessa perspectiva,

Albaladejo García lista as razões pelas quais a literatura deve ser reco-

nhecida no contexto do ensino de língua: por seu caráter universal de

temas; por sua condição de material autêntico, “lo que significa que

las obras literarias no están diseñadas con el propósito específico de

enseñar una lengua, y que por tanto el alumno tiene que enfrentarse a

muestras de lengua dirigidas a hablantes nativos” (2007, p. 6); ou

mesmo “el valor cultural de la literatura, cuyo uso puede ser muy be-

neficioso en la transmisión de los códigos sociales y de conducta de la

sociedad donde se habla la lengua meta” (2007, p. 7); essa condição

permitirá que um leitor estrangeiro entre “en contacto con estas for-

mas en un rico contexto que servirá de modelo para su propia escri-

tura, ampliando y enriqueciendo su habilidad escrita” (p. 8); por fim,

propõe a combinação de algumas estratégias:

Nos referimos al desarrollo de diferentes ejercicios en el aula que per-

mitan la interacción entre los estudiantes, que favorezcan las dramati-

zaciones, los debates, la escritura creativa individual o compartida, la

improvisación, la introducción de actividades lúdicas, canciones, etc.,

en resumen, al uso del mismo abanico de procedimientos aplicables a

una clase de lengua general, adaptado para utilizar un texto literario de

forma comunicativa, divertida y que fomente el aprendizaje de la len-

gua estudiada. (2007, p. 11).

Portanto, com base nesse conjunto de saberes, defendemos a rele-

vância de fazer uso do texto literário infantojuvenil em língua espa-

nhola, em especial as Antiprincesas e Antihéroes nas aulas de língua

estrangeira, extraindo dele o que há de mais considerável nesse con-

texto: a expressão de traços artísticos e literários, organizados e difun-

didos em uma língua no seu dinamismo autêntico, com marcações

pela expressão de uma identidade latino-americana, porém neutrali-

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zada por um “nosotros”, ou mesmo por um “tú”, como formas de tra-

tamento. Ademais, com um conteúdo que comunica e diverte, a leitura

promove o exercício da empatia, do reconhecimento e respeito pelo

outro e pela cultura do outro através do ato de leitura.

Encaminhando-nos para a reflexão sobre a referida atividade de

ensino vivenciada pelo grupo PET Letras, das projeções aos resulta-

dos, cabe-nos destacar que recuperar o histórico do subprojeto A lite-

ratura e as artes no ensino de língua espanhola em sua prática apli-

cada entre os anos de 2017 e 2018 já não constitui uma tarefa rápida.

Hoje, exige que nos voltemos para diferentes etapas da realização de

um atento trabalho que reuniu a pesquisa, a extensão e o ensino; que

levou o grupo a refletir sobre cada passo do planejamento e sobre cada

ação efetuada.

Duas práticas foram executadas pelo PET Letras: a primeira, em

2017; a segunda, em 2018. Essas aplicações tiveram base no mesmo

material, porém, foram apresentadas com formatos bastante diferen-

tes. Em 2017, dando conta de uma demanda dos bolsistas, foram rea-

lizadas capacitações que instruíram sobre a didática e os objetivos en-

volvidos na elaboração de um material didático a ser usado no ensino

de línguas estrangeiras, em especial, a língua espanhola. No referido

ano, cada um dos dois grupos compostos por seis bolsistas dedicou-se

a formular um material para ser aplicado em cinco encontros. Um

grupo se dedicou às aulas de língua baseada no livro Frida Kahlo e em

produções artísticas da pintora. De outro lado, o outro grupo se dedi-

cou ao livro Julio Cortázar, assim como à literatura do escritor argen-

tino. As oficinas foram aplicadas em duas turmas do Centro de Acolhi-

mento Sócio Educativo (CASE), entre os meses de setembro e outubro.

Ademais, no primeiro semestre de 2018, a experiência vivenciada

foi base para a apresentação de trabalho no evento regional anual, XXI

SULPET, redundando na divulgação do trabalho do grupo aos colegas

de diferentes áreas e proporcionando a troca de saberes. Além disso,

na aplicação do projeto em sua segunda edição, também executada no

primeiro semestre, o material do ano anterior foi redimensionado e

passou por uma adequação às questões que dois grupos de petianos

destacaram como necessárias: aulas mais detalhadas; maior uso de

textos e de exercícios; presença de uma gramática contextualizada,

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mas sem desprezar o uso do lúdico. Nesse exercício, as aulas foram

ministradas com o auxílio de um caderno didático, material no qual a

literatura e os conhecimentos gramaticais em língua espanhola estive-

ram reunidos de forma orgânica e foi possível constatar na prática o

crescimento qualitativo do conteúdo. As aulas aplicadas aos mesmos

grupos do ano anterior tiveram uma dinâmica diferente e o contato

com um conteúdo produzido pelos alunos despertou o interesse, mo-

tivou os alunos a participarem ativamente das aulas, ao mesmo tempo

em que instigava à prática retroalimentar de ensinar/aprender.

Os desafios se mantiveram ao longo das oficinas, mas as experiên-

cias anteriores como parâmetros para as ações presentes permitiram

que as dificuldades fossem contornadas e as aulas fossem ministradas

com êxito. Ao lado dessa vivência tão significativa para os petianos,

como tutora, percebi o crescimento do grupo expresso na segurança

gradual em estar diante de uma turma de alunos; na maturidade das

aulas planejadas; no contexto da sala de aula. Avaliar esse trabalho

reivindica pensar em uma série de fatores, mas, dentre todos eles, foi

possível inferir que a atmosfera da sala de aula, assim como o interesse

sobre o material parecem ter tido base nas personagens selecionadas,

nas atividades elaboradas e nas diagramações realizadas pelo grupo

PET Letras.

Ao finalizar este escrito, cabe reforçar que as experiências breve-

mente descritas estiveram sempre amparadas pelo tripé ensino-pes-

quisa-extensão, eixos que se firmaram a cada passo trilhado pelo

grupo. Na busca de materiais para aulas e para motivar petianos/pro-

fessores em formação a fugirem do lugar-comum e produzirem seus

materiais didáticos, chegamos aos livros infantojuvenis das coleções

Antiprincesas e Antihéroes, de autoria dos argentinos Nadia Fink e

Pitu Saá, material que foi acolhido pelos bolsistas, sujeitos que, a par-

tir dele, produziram conhecimento e motivação para ensinar e apren-

der língua espanhola. Na medida em que eram lidos pelos petianos, os

textos infantojuvenis eram fruídos enquanto leitura, mas também ins-

piravam pelas possibilidades latentes de cada conteúdo; evidenciavam

as possibilidades de leitura e ampliavam suas potencialidades para uso

na sala de aula de espanhol. Aproximava-se, então, o momento de fa-

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Das Artes e das Letras

47

zer de textos curtos, ilustrados, em tom aparentemente infantil (im-

pressão passível de ser relativizada), os meios para a exposição de te-

máticas de riquezas culturais incontestáveis.

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Geice Peres Nunes

48

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Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário

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Tecelaria da Palavra na Escola e o

gênero seminário

Ana Valéria Goulart dos Santos

Karoline Gasque de Souza

Maria Solange Barbosa da Silva

Pamela Belmutes Pinheiro

Victor da Silva Pacheco dos Santos

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Ana Santos, Karoline Souza, Maria Silva, Pamela Pinheiro e Victor Santos

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Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário

51

INTRODUÇÃO

Este capítulo é focado em reflexões dos petianos realizadores do

projeto de ensino Tecelaria da Palavra na Escola, pertencente ao

grupo PET Letras. A atividade teve início em 2015, sendo uma adap-

tação do projeto Tecelaria da Palavra, que foi executado durante os

anos de 2013 e 2014. Originalmente, utilizavam-se minicursos direci-

onados ao ensino das orientações da Associação Brasileira de Normas

Técnicas (ABNT) sobre o texto científico (citações, referências, etc.) e

da escrita de gêneros acadêmicos. Tais atividades propiciavam uma

complementação da formação acadêmica dos discentes da Unipampa,

Campus Jaguarão.

Já em 2015, o projeto foi subdividido em Tecelaria da Palavra na

Universidade e Tecelaria da Palavra na Escola. O primeiro manteve

as propostas mencionadas anteriormente, enquanto o segundo modi-

ficou-se em relação ao público e ao ambiente, visto que seria aplicado

com alunos do ensino médio, preferencialmente no próprio espaço es-

colar. Em seus dois anos de vigência, o último projeto oportunizou,

através de oficinas, a capacitação dos estudantes para que estes adqui-

rissem maior facilidade e melhor desempenho em atividades envol-

vendo os gêneros acadêmicos.

Nota-se a necessidade do projeto devido à dificuldade em tais pro-

duções apresentada pelos ingressantes na universidade em conse-

quência da ausência de noções básicas à produção de alguns gêneros,

como: elaboração de resumos, inserção de diferentes tipos de citações

em textos, criação de referências bibliográficas, montagem de seminá-

rios, consulta a fontes confiáveis na internet, produção de textos sem

plágio, etc. O Tecelaria da Palavra na Escola amplia o alcance das

oficinas, pois os alunos do ensino médio, futuramente, irão para dife-

rentes universidades, portanto, o projeto não estaria restrito à Uni-

pampa.

Para fins de aplicabilidade, o grupo PET foi dividido em dois sub-

grupos. Cada um contatava uma escola para verificar sua disponibili-

dade de receber o projeto. Após recebido o aceite, os grupos elegiam

as temáticas a serem desenvolvidas junto aos alunos. Em 2016, foram

selecionados o gênero seminário e o texto dissertativo-argumentativo;

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Ana Santos, Karoline Souza, Maria Silva, Pamela Pinheiro e Victor Santos

52

a escolha deste último foi uma demanda relatada pela própria escola,

enquanto que aquele se justificou pela experiência dos próprios petia-

nos.

O projeto se mostra extremamente relevante, uma vez que contri-

bui para a familiarização dos petianos com a futura atuação docente

no espaço escolar. Nele, elaboram planos de aula, articulam os autores

e as metodologias que julgam mais apropriados para seu público, além

da frutífera experiência de ministrarem oficinas. No entanto, ao longo

da elaboração das atividades, foi constatado o déficit teórico do pro-

jeto, que, consequentemente, resultou na dificuldade em sua prepara-

ção e aplicação. Diante disso, o PET Letras realizou capacitações para

reformular o projeto e sanar essa deficiência.

A estrutura do capítulo é a seguinte: Histórico do projeto; O olhar

petiano sobre o projeto promovendo iniciação científica no ensino mé-

dio; O olhar petiano sobre a influência do projeto na formação do-

cente; O olhar do petiano sobre a influência do projeto na formação

acadêmica; Considerações finais.

HISTÓRICO DO PROJETO

O grupo PET (Programa de Educação Tutorial) Letras da Universi-

dade Federal do Pampa, Campus Jaguarão, teve início no ano de 2013.

Nesse mesmo ano, as quatro bolsistas realizaram atividades no projeto

de ensino Tecelaria da Palavra, que tinha como objetivo principal a

realização de minicursos de gêneros acadêmicos e normas da ABNT

(Associação Brasileira de Normas Técnicas) para alunos da universi-

dade. A partir da notória dificuldade que os alunos ingressantes apre-

sentavam com as noções básicas exigidas na academia, o PET Letras

decidiu ramificar o projeto Tecelaria da Palavra para também atuar

no ensino médio, originando, então, o Tecelaria da Palavra na Uni-

versidade e o Tecelaria da Palavra na Escola.

No decorrer do ano de 2015, com o grupo completo de 12 bolsistas,

foi possível realizar diversas oficinas do Tecelaria da Palavra na Uni-

versidade. Já no Tecelaria da Palavra na Escola, como era o primeiro

ano desse subprojeto, decidiu-se atuar em apenas uma escola, onde

foram aplicadas nove oficinas sobre resumo para alunos do terceiro

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Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário

53

ano do ensino médio do Colégio Estadual Carlos Alberto Ribas, Jagua-

rão – RS. Logo, em 2016, foram realizadas oficinas do Tecelaria da

Palavra na Escola na Escola Estadual de Ensino Médio Hermes Pin-

tos Affonso e no Instituto Estadual de Educação Espírito Santo, tam-

bém para alunos do último ano do ensino médio.

Através do projeto Tecelaria da Palavra na Escola, os bolsistas

cumprem com o objetivo de serem multiplicadores de conhecimento,

uma vez que sempre se capacitam e, após discussões, elaboram as ofi-

cinas. Além disso, a atividade proporciona uma imersão no espaço es-

colar e a familiarização com a docência. Vale salientar que os bolsistas

novatos no PET devem ministrar as oficinas em duplas para que se

sintam respaldados ao entrar em sala de aula. Com mais experiência

e, consequentemente, maior segurança, estarão aptos a atuarem sozi-

nhos como professores.

O OLHAR PETIANO SOBRE O PROJETO PROMOVENDO

INICIAÇÃO CIENTÍFICA NO ENSINO MÉDIO

O ingresso no ensino superior é uma fase de grandes mudanças. Ao

entrar em contato com a universidade pela primeira vez, o aluno se

encontra rodeado por uma dinâmica social e acadêmica completa-

mente nova e enfrenta, portanto, um período de muitas adaptações.

Além do novo ambiente e de se deparar com novas regras do cotidiano

do discente, há, ainda, os trabalhos que deve produzir ao longo da gra-

duação e que são totalmente diferentes dos feitos até então. Na Uni-

versidade Federal do Pampa, Campus Jaguarão, esse cenário é muito

corriqueiro e comprovamos, através da dificuldade acima citada, como

principal motivador a questão da iniciação científica no ensino médio

que, não raras vezes, é negligenciada. Dessa forma, o projeto Tecelaria

da Palavra na Escola se insere no ambiente escolar com intuito de

familiarizar o estudante com o que está por vir em seu ingresso no en-

sino superior.

Antes que sigamos adiante, se faz necessária uma breve explanação

sobre o conceito de iniciação científica, no ensino médio ou na univer-

sidade, já que é abordada em ambos os ambientes. No ensino superior,

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Ana Santos, Karoline Souza, Maria Silva, Pamela Pinheiro e Victor Santos

54

por exemplo, a universidade dispõe de alguns grupos de pesquisa co-

ordenados por professores, porém, com toda a adaptação ao novo am-

biente, os alunos terminam por não saber exatamente do que tratam

esses grupos, bem como seu modo de inserção. Sendo assim, para sa-

nar essa lacuna, que, certamente, permaneceu do ensino médio, logo

nos primeiros semestres, o Curso de Letras tem em sua grade curricu-

lar o componente de Práticas de Linguagem, que possibilita, na me-

dida do possível, que o discente desenvolva as suas competências

quanto aos textos orais e escritos, dando um enfoque maior à parte

escrita, dado o necessário nível de domínio para a elaboração de gêne-

ros da esfera científica.

Pesquisa em Educação é outro componente importante quanto a

esse aspecto. Ofertado no 3º semestre, introduz o estudante no con-

tato com elementos basilares, e constitutivos, de elaboração da pes-

quisa acadêmica. No entanto, cabe a cada professor explicar e exigir,

ou não, que tais padrões sejam utilizados em seus trabalhos, já que,

nesses primeiros semestres, os discentes ainda estão se familiarizando

com os gêneros acadêmicos, por exemplo, ensaios, artigos. No espaço

acadêmico, não somente nessa disciplina, mas também em outras, e

nos já citados grupos de pesquisa, os alunos podem entrar em contato

com algumas das importantes etapas da iniciação científica, como se

ambientar, através da leitura, com a produção da área de interesse,

aprimorando, assim, seu domínio a respeito dos critérios para uma es-

crita científica com qualidade. Esse contato é o primeiro passo para a

realização de uma investigação eficiente.

Quanto à iniciação científica no ensino médio, desde 2011 existe

uma nova proposta para a educação no Rio Grande do Sul, o Seminá-

rio Integrado, que objetiva tornar seus alunos capazes de produzir

pesquisas correspondentes a esse nome, dado que, atualmente, os alu-

nos fazem simples consulta a sites na internet. Em ditas “pesquisas”,

o estudante copia e cola as primeiras informações que lhe aparecem,

sem a devida preocupação quanto à confiabilidade da fonte, ou ainda,

com a veracidade, além, é claro, do tão comum plágio, muitas vezes,

produzido de maneira não intencional. Santos Junior et al. (2013, p.

4), sobre a implementação de um projeto de iniciação científica no en-

sino médio, em uma escola estadual de São Paulo, comentam:

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Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário

55

No desenvolvimento do projeto, o grupo coordenador procurou discu-

tir, nas reuniões periódicas com os professores, o que é pesquisa, pro-

blematizando as práticas correntes promovidas na escola, e o sentido

da palavra “pesquisa”, a qual tem sido usada para nomear qualquer ati-

vidade pedagógica que demande consulta. Esse uso, no entanto, é uma

aplicação errônea e superficial do termo. Geralmente a pesquisa esco-

lar é um ato reprodutivo executado pelo aluno, que se apropria de con-

teúdos de terceiros e com a devida aprovação do professor, o que se

configura como uma “pseudopesquisa” (e, consequentemente, uma

“pseudoaprendizagem”). O sentido etimológico da palavra não corres-

ponde a essa prática cristalizada, já que “pesquisa” vem da palavra la-

tina perquiro, que quer dizer “procurar cuidadosamente, em todo lugar

e de modo aprofundado, perguntar sobre, descobrir” (NININ, 2008,

apud SANTOS JUNIOR et al., 2013, p. 4, grifos do autor).

Assim, o Seminário Integrado foi pensado e elaborado pela SE-

DUC – RS, Secretaria de Educação do Estado do Rio Grande do Sul,

como suporte para orientações de pesquisas mais adequadas. É um

modelo de ensino em que o estudante se torna protagonista de seu

aprendizado, seu método focaliza, dentre outros, o trabalho para o de-

senvolvimento de habilidades básicas de compreensão textual e o cri-

tério de discriminação de fontes de pesquisa. A familiarização com

materiais variados permite o aumento considerável de uma eficiente

leitura dos textos, ou seja, em que sejam perceptíveis o problema de

pesquisa, os argumentos utilizados, a pertinência dos autores e cita-

ções apresentadas etc.

Por último, há no Seminário a prática da habilidade de comunica-

ção oral, visto que, ao final, a pesquisa é apresentada à comunidade

escolar. Assim, com a realização do processo de pesquisa, desde seu

início até a sua conclusão, os alunos podem vir a manifestar algum in-

teresse pela área científica, o que os instigaria a seguir para o ensino

superior. O Tecelaria da Palavra na Escola se insere nesse meio para

propiciar, antecipadamente, aos alunos, saberes que lhes serão cobra-

dos na graduação. Além do mais, também oportuniza ao petiano uma

breve experiência de docência. Para que o projeto fosse aplicado, an-

tes, se fizeram necessárias algumas capacitações, nas quais o grupo se

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Ana Santos, Karoline Souza, Maria Silva, Pamela Pinheiro e Victor Santos

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reuniu para estudar a questão da iniciação científica no ensino médio

e os atuais métodos de ensino empregados.

Assim, foram lidos diversos materiais, dentre eles, artigos que re-

fletiram a respeito do novo ensino médio, da concepção de iniciação

científica, de pesquisa escolar, além do livro da Secretaria da Educação

sobre a reestruturação do ensino médio e revistas organizadas pelo

Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul. Alguns autores con-

sultados foram: Santos Junior (2013), Ferreira (2003), Ninin (2008),

Azevedo e Reis (2013). Ainda, houve uma capacitação com um profes-

sor da rede pública de ensino da cidade, e uma ex-aluna do novo en-

sino médio, na qual obtivemos acesso ao olhar e à experiência de am-

bos os lados do processo de aprendizagem.

Levando em consideração as apresentações dos trabalhos ao final

das oficinas (2016), pode-se entender que o projeto não promoveu de

forma efetiva a iniciação científica no ensino médio, mas, em contra-

partida, dialogou bem com a proposta do Seminário Integrado. Em

relação à iniciação científica, notamos que os assuntos escolhidos por

alguns alunos não foram investigados adequadamente, já que durante

as oficinas foram passadas informações como sites de pesquisa confi-

áveis e formatação dessas fontes, pontos que visivelmente não foram

seguidos pela maioria dos participantes no processo de produção do

seminário.

Pusemo-nos à disposição dos estudantes para atendimento ex-

traclasse, de modo que o auxílio se estendesse além das oficinas, tam-

bém para o momento de pesquisa e montagem da apresentação do se-

minário, porém poucos compareceram às orientações. Credita-se tam-

bém a isso o fato de a iniciação científica não ter acontecido plena-

mente, como visava o projeto em seu cerne, já que não conseguimos

aplicar todas as oficinas planejadas por questões de adaptação ao ca-

lendário escolar, que sofreu alterações devido à greve dos professores

estaduais. Cabe ressaltar a impossibilidade da realização plena da ini-

ciação científica feita somente pelo grupo PET, posto que a escola,

mesmo com o projeto de educação, igualmente não alcança essa ple-

nitude. Dessa forma, apenas colaboramos com os objetivos da escola

quanto à iniciação científica.

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Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário

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Embora tenha havido imprevistos e percalços, fato é que o projeto

conseguiu mostrar aos alunos que visam ingressar na universidade um

pouco de como se desenvolvem as pesquisas acadêmicas, quais passos

são adequados e quais devem ser evitados no momento da investiga-

ção científica. Portanto, ensinar seminário pode ser uma forma de pro-

mover a iniciação científica no ensino médio. Sendo assim, defende-

mos que as oficinas ministradas propiciaram momentos de contato

com etapas importantes para a investigação e a escrita de um estudo.

O OLHAR PETIANO SOBRE A INFLUÊNCIA DO PROJETO NA

FORMAÇÃO DOCENTE

Ao contatarmos a escola para saber da disponibilidade de receber

o projeto, a supervisora se mostrou receptiva, pois rapidamente no-

meou o professor com o qual poderíamos dialogar. A receptividade do

docente de língua portuguesa, em um primeiro momento, deu-se de

maneira atenciosa. Nesse primeiro contato, precisávamos de alguns

dados para pedir autorização à Coordenadoria Regional de Educação

e adentrar a sala de aula, uma vez que se tratava de escola estadual,

além de informações como quais turmas seriam cedidas, quais eram

os recursos disponíveis na escola e quantos dias poderiam ser reserva-

dos para as aplicações das oficinas. Foram disponibilizadas duas tur-

mas do 3º ano do ensino médio.

Com esses dados, nós, enquanto graduandos, ao rememorarmos o

ingresso à vida acadêmica, percebemos o quão limitado era nosso co-

nhecimento sobre o gênero seminário, por isso, decidimos focalizar tal

gênero em nossas oficinas. A próxima etapa foi de elaboração de pla-

nos de aula, com suas temáticas divididas, para seis oficinas destina-

das à construção e apresentação de um seminário. Os temas das ofici-

nas foram: Técnicas de sublinha e de estudo; Fontes confiáveis de pes-

quisa/Introdução a resumo; Resumo; Estruturação e montagem de

slides; Exposição oral; Seminário. Esta última e sexta oficina foi dedi-

cada para que os alunos, em grupos, apresentassem um seminário com

duração de 10 minutos relativo a uma temática de interesse.

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Ana Santos, Karoline Souza, Maria Silva, Pamela Pinheiro e Victor Santos

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Infelizmente, ocorreram somente três, das seis oficinas planejadas,

visto que o professor informou no decorrer do projeto a indisponibili-

dade de ceder horários para a aplicação das demais oficinas. Em con-

sequência disso, como alternativa, pedimos apenas mais uma oficina

para que, pelo menos, os alunos conseguissem apresentar seus semi-

nários, totalizando quatro encontros. Ainda, reservamos duas tardes,

mencionado anteriormente, para prestar atendimentos aos alunos,

entretanto, apenas no último dia, descobrimos através dos próprios

alunos que o professor não os havia avisado, conforme fora combi-

nado.

Diante do exposto, notamos certa displicência do professor com o

projeto Tecelaria da Palavra na Escola, ou seja, problemas de diálogo

entre o professor da educação básica e a universidade, neste caso em

questão. Nós, enquanto petianos e licenciandos, refletimos a respeito

do professor disponibilizar duas horas/aula por dia com cada turma

em um contexto de final de ano letivo. Por isso, lamentamos a indis-

ponibilidade de tempo para concluir a aplicação das três oficinas res-

tantes e reconhecemos o quão difícil é estar na escola, pois se está sus-

cetível a questões de caráter administrativo, que vão além da disposi-

ção em ceder espaço ao projeto.

Durante a aplicação das oficinas nos terceiros anos do ensino mé-

dio, percebemos a heterogeneidade dos alunos, uma vez que, em uma

turma, houve a diferença de 40 minutos de aplicação em comparação

a outra. Isso nos mostrou o quanto os estudantes são distintos no que

concerne ao tempo de explicação necessário para a compreensão de

alguns conteúdos, bem como para a execução de exercícios. Nós, no

papel de docentes, precisamos nos atentar para as especificidades de

cada turma, para promover uma adaptação e uma reestruturação dos

planos de aula, já que tal flexibilidade é indispensável para a realização

de um trabalho mais produtivo que contemple os vários perfis de

turma.

A metodologia adotada para aplicação das oficinas foi a divisão dos

petianos em duplas (para as novatas no programa) ou de maneira in-

dividual (para os veteranos), porém, independentemente de quem mi-

nistrava a oficina, o restante do grupo se fazia presente a fim de orga-

nizar a sala e auxiliar no que fosse necessário à execução do plano de

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Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário

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aula. Esta prática de apoiar os colegas e de realizar um trabalho gra-

dativo de inserção no ambiente escolar está presente no Manual de

Orientações Básicas (2006) do PET.

Cabe ressaltar que identificamos uma progressão quanto ao nosso

desempenho, desde os planejamentos de aulas às partes práticas. Ao

nos familiarizarmos com a escola, nos empenhamos no paulatino tra-

balho para a perda da timidez, o que, seguramente, facilitou o diálogo

com os alunos. Em virtude das poucas horas/aula que tínhamos para

tratar de alguns componentes do gênero seminário no planejamento

das oficinas, focamos em encontros mais expositivos do que dialoga-

dos. Em uma autocrítica, durante a aplicação do projeto, percebemos

que estávamos usando um plano que apresentava uma metodologia

bastante tradicional, algo frequentemente criticado por nós, graduan-

dos.

Na licenciatura, estamos a todo momento estudando teorias que

apresentam métodos que buscam o afastamento do convencional, mas

quando fomos para a escola, notamos a dificuldade na aplicabilidade

de tais estratégias metodológicas, além de percebermos nossa depen-

dência em relação ao uso de slides nas oficinas e o quão pouco criativos

eram os materiais utilizados. Assim, as críticas às escolas que, como já

mencionado, são habituais, seriam mais coerentes se culminassem em

medidas mais práticas para os seus problemas, do que nestes propria-

mente ditos.

O OLHAR DO PETIANO SOBRE A INFLUÊNCIA DO PROJETO NA

FORMAÇÃO ACADÊMICA

Na vida acadêmica, é comum os alunos se depararem com diversas

dificuldades ao ingressarem na universidade. Esse universo, muitas

vezes, pode se tornar assustador até mesmo para os que se julgavam

preparados, pois se defrontam com diversas regras que estarão pre-

sentes durante toda sua formação. Com isso, acabam se retraindo e

aquilo que poderia ter sido feito com mais êxito, não é, consequente-

mente, perde-se uma oportunidade de mostrar o potencial.

Nós, petianos, notamos a importância de abordar esse tema para

que outros acadêmicos possam saber que muitos discentes sentem o

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Ana Santos, Karoline Souza, Maria Silva, Pamela Pinheiro e Victor Santos

60

mesmo pavor ao ouvir o professor solicitar a preparação de um semi-

nário ou a elaboração de um artigo. Pesquisar, escrever e apresentar

não são tarefas fáceis, principalmente quando os professores da gra-

duação possuem a expectativa de um desempenho de excelência.

O PET empenha-se em dar o suporte que o aluno precisa na vida

acadêmica. Por ser um programa baseado na tríade pesquisa, ensino e

extensão, visa oportunizar o desenvolvimento em tais âmbitos. Assim,

o graduando começa a ter contato mais frequente com as orientações

da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), noções de como

se portar durante uma apresentação e, também, é introduzido ao

mundo da pesquisa acadêmica. O petiano, ao começar a adquirir tais

saberes, se sente instrumentalizado e preparado para elaborar traba-

lhos atendendo a um padrão mais elevado.

Tecelaria da Palavra na Escola é um projeto que nos mostra, de

fato, a rotina de um professor. A elaboração de planos de aula e, por

fim, sua aplicação fazem que evidenciemos de perto a árdua e praze-

rosa função de educador. Essas tarefas exigem do petiano disciplina e

organização. Em decorrência disso, nos tornamos mais responsáveis,

pois teremos contato direto com alunos que possuirão diversos ques-

tionamentos, o que demanda preparação e estudo progressivo. Além

disso, na graduação, o Manual de Orientações Básicas do PET elenca,

como um dos objetivos do programa, a “[...] atuação dos bolsistas

como agentes multiplicadores, disseminando novas idéias (sic) e prá-

ticas entre o conjunto com alunos do curso;” (2006, p. 8), papel que

buscamos cumprir com esmero, sempre nos dispondo a auxiliar os dis-

centes do curso em suas dúvidas e dificuldades.

É sabido que quando se propõe a ensinar determinado conteúdo, é

imprescindível ter domínio e familiaridade com vários aspectos que o

cercam. Com a aplicação do projeto, tivemos a comprovação de que é

essencial o professor exercitar a capacidade de criar analogias e exem-

plos a fim de ilustrar questões mais abstratas, nas quais, sem sua me-

diação, o aluno provavelmente apresentaria um maior nível de dificul-

dade. Notamos, portanto, que assim a matéria é apreendida de ma-

neira mais eficiente. Desse modo, percebemos quão necessário é que

o professor siga estudando, refletindo sobre sua prática e se aprimo-

rando.

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Tecelaria da Palavra na Escola e o gênero seminário

61

Ao nos voltarmos para nós, petianos, enquanto discentes, podemos

observar e constatar a influência do projeto em nosso desempenho

acadêmico, o que é corroborado pelos docentes da Unipampa, que

atestam serem os petianos detentores de alto rendimento. Uma área

em que somos tidos como referência para nossos colegas de graduação

diz respeito à formatação de trabalhos, pois ministramos oficinas com

temáticas direcionadas à elaboração de gêneros acadêmicos e norma-

tização. Tal experiência, inevitavelmente, aguça o nosso olhar crítico

perante as produções, tanto nossas quanto alheias, além de, por seu

turno, aumentar a expectativa de que elaboremos produções condi-

zentes com nossa posição de petianos.

Assim, por meio de nossa experiência com o projeto Tecelaria da

Palavra na Escola, entre outros, ao realizarmos tarefas acadêmicas,

conseguíamos cumpri-las, pois nos sentíamos mais instrumentaliza-

dos enfrentando, sem tantos reveses, a volumosa carga de atividades

exigida pela graduação. Realizamos de forma mais segura atividades

antes desconhecidas, ao que se refere ao trabalho com a oralidade (se-

minários e debates, por exemplo). Embora o nervosismo inicial per-

maneça, estamos cientes de que se trata de um sentimento perfeita-

mente aceitável, e esperado, em tais situações de exposição. Sem dú-

vida, é gratificante olhar e vislumbrar o caminho que foi trilhado, as-

sim como as conquistas que obtivemos.

Em suma, é notável a relevância do projeto Tecelaria da Palavra

na Escola como forma de contribuição direta para uma formação mais

completa do graduando. Certamente, com tal formação, seremos pro-

fissionais mais confiantes e possuidores de olhar analítico em relação

a nossa atuação. Ontem, alunos temerosos e receosos com o novo

mundo, hoje, alunos/petianos se qualificando dia após dia, para que

seja realizado um trabalho com êxito e produtivo.

CONCLUSÃO

Através do projeto Tecelaria da Palavra na Escola, os petianos fo-

ram colocados em posição de extrema responsabilidade: no papel de

docentes. Ao tomar para si a delicada tarefa de assumir escolhas, tanto

de caráter administrativo quanto pedagógico, os bolsistas vivenciaram

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Ana Santos, Karoline Souza, Maria Silva, Pamela Pinheiro e Victor Santos

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o cotidiano de sua futura carreira, enfrentando contratempos ineren-

tes à profissão. Ao encararem imprevistos como falta de tempo para

aplicação de oficinas, disponibilizaram seu tempo extrapet para aten-

der os alunos. Além disso, os bolsistas veteranos tiveram a experiência

de ministrar individualmente uma oficina e as novatas deram sua pri-

meira aula.

Esses são alguns dos acontecimentos que enriqueceram a vivência

de docência oportunizada pelo projeto, não podendo faltar, obvia-

mente, sua consequente reflexão crítica sobre o cumprimento ou não

dos objetivos e proposta do projeto. Nesse sentido, concluímos que a

experiência foi produtiva tanto para os estudantes do ensino médio,

público-alvo, quanto para os do ensino superior, nós, petianos minis-

trantes. Afirmamos isso porque os acadêmicos que aplicaram as ativi-

dades obtiveram uma formação que, de certo modo, não receberam

nas aulas da graduação e, igualmente, os alunos da escola conseguiram

ter acesso a uma prática pouco exercida em seu meio. O projeto, como

avaliado anteriormente, cumpriu parcialmente seu objetivo. Este

bem-sucedido momento presta-se também como propulsor de uma

autocrítica que gerará melhorias futuras.

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Ana Santos, Karoline Souza, Maria Silva, Pamela Pinheiro e Victor Santos

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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O projeto de ensino “A formação do

leitor no Programa de Educação

Tutorial” e o ensino de literatura

Cátia Dias Goulart

Maria Elia Martins

Santiago Bretanha

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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PRIMEIRAS PALAVRAS

O projeto de ensino A formação do leitor no Programa de Educa-

ção Tutorial – PET – Letras foi concebido para atender uma demanda

dos estudantes do grupo relativa à formação de leitores, em especial,

a práticas de ensino da área da literatura. Considerando essa solicita-

ção, eu, juntamente com uma egressa do Curso de Letras de nosso

campus, já com mestrado em Ensino de Línguas e atuante como pro-

fessora de língua portuguesa e literatura no ensino fundamental e mé-

dio de escolas de Jaguarão, refletimos, organizamos e desenvolvemos

um curso de 40 horas no ano de 2016.

Este capítulo, desenvolvido mais de um ano após a realização do

projeto e integrando também a voz de um dos estudantes participantes

do curso, atualmente mestrando na área de Linguística Aplicada, apre-

senta uma reflexão acerca do processo de planejamento, da importân-

cia da compreensão do lugar dos pressupostos teóricos no balizamento

das atividades de ensino, bem como uma reflexão acerca das práticas

de leitura desenvolvidas pelo grupo, ou seja, é uma avaliação prospec-

tiva, a três vozes.

Consideramos que a elaboração do capítulo nos permitiu, ao refa-

zer nosso percurso, reafirmar princípios relativos ao ensino de leitura,

perceber lacunas no trabalho desenvolvido e abrir questionamentos

acerca de práticas de ensino de literatura, tanto no Curso de Letras de

nosso campus/universidade, quanto no sistema escolar da cidade de

Jaguarão, processo que nos auxiliará na elaboração de novas propos-

tas.

Cabe ainda destacar que, em decorrência dos loci de enunciação de

cada um dos articulistas, o texto por vezes soa em uníssono, mas em

outras optamos por marcar nossas perspectivas individuais, colo-

cando assim em evidência a enriquecedora dinâmica de pensar e atuar

de modo coletivo.

A DEMANDA E OS FUNDAMENTOS DO PROJETO DE ENSINO

O grupo de estudantes do Programa de Educação Tutorial – Letras

(PET), oriundos de diferentes semestres do curso, relataram, em um

primeiro encontro, a dificuldade no estabelecimento de relações entre

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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os conteúdos estudados nos componentes curriculares da área de Li-

teratura e a prática docente na área de ensino de leitura de textos fic-

cionais no ensino fundamental, questão que os limitava para proposi-

ções de ações do PET na comunidade. Destacaram, ainda, que almeja-

vam, ao longo do curso, atividades práticas com textos ficcionais, uma

vez que o estudo de textos teóricos exigiria tempo e limitaria a experi-

ência com os textos de arte.

Mediante esse diagnóstico inicial com o grupo, e considerando que

os estudantes eram/são integrados ao Curso de Letras, buscamos cha-

mar atenção – minha colaboradora e eu – para o papel da teoria en-

quanto práxis social. Tal concepção do papel da teoria implica reco-

nhecer que ela potencializa a relação entre o sujeito e seu objeto de

leitura, tornando-se também, ela mesma, um aspecto produtivo tanto

do processo hermenêutico empreendido pelo leitor, da metodologia de

ensino por parte do professor, quanto como tem implicação em nossas

escolhas de textos ficcionais. Nesse sentido, toda teoria deve ser to-

mada como princípio de orientação ao professor, e não como modelo

aplicativo ou de controle da leitura/interpretação.

Há que se considerar ainda que quando lidamos com textos literá-

rios, eles mesmos sugerem caminhos interpretativos. Afinal, como

aponta Paul Ricoeur, em Teoria da interpretação (1976), a natureza

simbólica desse tipo de texto tem a capacidade de eclipsar a referência

ostensiva, o que leva a uma tensão entre duas orientações, já presentes

na linguagem comum, mas que se intensificam no texto poético: por

um lado, a linguagem parece se exilar do mundo; por outro, parece

acentuar sua potencialidade de inter-relacionar-se com a realidade.

Essa natureza bidimensional dos textos simbólicos exige do leitor um

movimento entre o sentido literal e um sentido segundo, uma vez que

a construção do segundo só será possível através de uma relação esta-

belecida com o sentido primeiro. Essa simultaneidade de funções que

um símbolo assume potencializa diferentes abordagens para cada uma

de suas dimensões e o professor, mobilizador e mediador da leitura,

precisa estar ciente das potencialidades do texto.

Ressaltamos assim que “o ato crítico se beneficia com a sistemati-

zação teórica, mas não se confunde com ela, nem um substitui o outro”

(CANDIDO, 1989, p. 156) e buscamos ativar as memórias dos petianos

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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para fundamentos teóricos já trabalhados com eles no âmbito do curso

de graduação ao longo de disciplinas1. Entendemos que, em um grupo

que busca aprender a ler para ensinar a ler, seria de suma importância

expor os princípios teóricos que norteariam nossas aulas “práticas” de

estudo de textos ficcionais.

Afinal, cientes de que a relação estabelecida entre a perspectiva crí-

tica adotada e o objeto de leitura cria imaginários e, nesse caso, tam-

bém fundamenta a prática pedagógica, ressaltamos ao grupo nossa po-

sição crítica enquanto educadoras a partir de uma perspectiva comu-

nicativa da literatura, cujos principais fundamentos residem na con-

cepção sociopragmática desenvolvida a partir de teóricos como Mi-

khail Bakhtin (1988), Paul Ricoeur (1976) e Umberto Eco (1986), to-

dos pensadores presentes nas aulas de Teorias da Literatura e Teorias

Linguísticas de nosso Curso de Letras. Nossa escolha deve-se a que o

caráter interacionista dos aportes metodológicos desses pensadores

favorece o entendimento das relações entre a criação poética e a leitura

e, por isso, mobilizam a interpretação do texto artístico enquanto pro-

cesso discursivo que se realiza dialeticamente entre a explicação e a

compreensão da arte, por parte do sujeito leitor. É assim, a partir dessa

perspectiva teórica, que nós, enquanto educadoras, buscamos promo-

ver o entendimento comunicativo da literatura, ou seja, como um es-

paço discursivo no qual textos de natureza simbólica e leitor(es), his-

toricamente localizados, interagem na (re)construção de novos modos

de ser no mundo.

Outro pressuposto teórico com significativas implicações no reco-

nhecimento da importância da presença de textos ficcionais nas aulas

de leitura, bem como na seleção diversificada de textos dessa natureza,

1 Referências bibliográficas junto às ementas das disciplinas no Projeto Pedagógico do curso (2008), tanto na área de teorias da literatura, teorias linguísticas e da área de estudos pedagógicos, quanto em outras disciplinas vinculadas à área de literaturas, as quais a maioria dos petianos já haviam cursado, evidenciam a aproximação de nossos estudantes com o pensamento de teóricos e críticos que estão na base desse curso de formação do leitor e são retomados neste capítulo.

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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fundamenta-se em pensadores também próximos ao processo de for-

mação de nossos estudantes: Antonio Candido e Marisa Lajolo.

De Candido coube sua reflexão esclarecedora acerca do caráter hu-

manizador da ficção, exposto em especial no artigo Direitos humanos

e literatura (1989), texto que norteia muitos projetos voltados à for-

mação do leitor em diferentes instituições no Brasil2. Porque, como

bem expõe Candido, ao tratar da importância da fabulação de modo

geral, e da literatura em especial,

[n]ão há povo e não há homem que possam viver sem ela, isto é, sem a

possibilidade de entrar em contato com alguma espécie de fabulação.

Assim como todos sonham todas as noites, ninguém é capaz de passar

as vinte e quatro horas do dia sem alguns momentos de entrega ao uni-

verso fabuloso. O sonho assegura durante o sono a presença indispen-

sável desse universo, independentemente da nossa vontade. E durante

a vigília a criação ficcional ou poética, que é a mola da literatura em

todos os seus níveis e modalidades, está presente em cada um de nós,

analfabeto ou erudito – como anedota, causo, história em quadrinho,

noticiário policial, canção popular, moda de viola, samba carnavalesco.

Ela se manifesta desde o devaneio amoroso ou econômico no ônibus

até a atenção fixada na novela de televisão ou na leitura corrida de um

romance (CANDIDO, 1989, p.112).

Partindo de apontamentos sobre os bens inelidíveis à sobrevivên-

cia física dos seres humanos como um direito social, Candido, no refe-

rido texto, aponta para a necessidade de vivência espiritual também

2 Dentre eles, ressalto o projeto de extensão Experiências de leitura, a formação do leitor, criado com o propósito de fomentar o gosto pela leitura de textos de natureza artística entre os jovens da região e de promover reflexões acerca de metodologias de ensino-aprendizagem de leitura entre os estudantes no Curso de Letras. Buscando promover a articulação da teoria e da prática no processo de formação ao longo do curso, bem como estimular a inserção e o compromisso social dos estudantes junto à comunidade local, o projeto foi balizado por três princípios: trabalhar com textos de natureza artística, assumir o papel de extensionista como mediador de leitura e atuar na criação de comunidades de leitura em espaços escolares e alternativos ao sistema escolar. Tal projeto, iniciado por mim em 2010, foi coordenado também por outros docentes do curso ao longo deste tempo.

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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como um direito de forte impacto na integralidade da condição hu-

mana. É nesse campo das relações afetivas, da imaginação e das pos-

sibilidades de crenças que ele desenvolve sua reflexão sobre o acesso à

arte de modo geral e à literatura, em especial, como um bem indispen-

sável de humanização, sobretudo porque “[a] literatura desenvolve em

nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais com-

preensivos e abertos à natureza, à sociedade e ao semelhante” (CAN-

DIDO, 1989, p.117).

É assim, por acreditar, com Candido, que a leitura de textos ficcio-

nais é potencializadora não só de conhecimento, mas, sobretudo, de

experimentações do lugar do sujeito – de sua individualidade e alteri-

dade na sociedade – que buscamos promover o acesso à literatura na

universidade, nas escolas e em espaços alternativos. Cabe observar

que Candido reconhece, valoriza e promove a natureza literária no

abrangente campo do simbólico e de sua realização enquanto intera-

ção estética e é nessa mesma direção que Marisa Lajolo, em Litera-

tura: leitores & leituras (2001), livro básico da disciplina de Introdu-

ção aos Estudos Literários de nosso curso, entende a literatura.

Como bem aponta Lajolo, “saber o que é literatura é uma pergunta

permanente, mas as respostas são sempre provisórias” (2001, p. 5), e

essas – felizmente – não convergem a uma grande resposta, uma vez

que cada tempo e, dentro de cada tempo, cada grupo social tem sua

resposta, sua definição. Portanto, para nós, professores da área da li-

teratura, pensar nosso objeto de estudo e de ensino é retomar e atua-

lizar tudo o que foi dito e escrito sobre o assunto. Afinal, saber de onde

vêm e como se formulam certas noções de literatura torna nossa opi-

nião mais rigorosa e nossos argumentos mais consistentes e flexíveis.

E, sobretudo, como alerta, diz Lajolo que esse caminho permite-nos

discernir os recursos retóricos e ideológicos em que se fundam os con-

ceitos oficiais de literatura e nos possibilita lidar de modo mais amplo,

diversificado e enriquecedor com o campo da ficção.

Seguindo a orientação dos críticos anteriormente citados, a refe-

rida disciplina, que dá início aos estudos literários em nosso Curso de

Licenciatura em Letras, promove a discussão de tópicos da teoria da

leitura e da teoria da literatura, mas, sobretudo, propicia experiências

de contato e reflexão com textos ficcionais de natureza diversificada.

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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Narrativas fílmicas, documentários acerca de artistas, canções, textos

em quadrinhos, poemas, textos da dramaturgia e narrativas ficcionais

compõem o repertório de leitura oferecido aos estudantes, como pode

ser acompanhado pelos planos de ensino de nosso curso, bem como

em relatórios de estágio desenvolvidos por nossos estudantes na área

de literatura e nos projetos de extensão realizados junto à comuni-

dade.

Por essa via, enquanto docentes, evidenciamos que a formação do

gosto pela leitura, entendida como o desenvolvimento do prazer que

se alia à capacidade crítica do leitor frente a diferentes práticas textu-

ais, para nós, é papel e desafio tanto da universidade quanto da escola.

Papel porque o desenvolvimento de habilidades para a leitura crítica

frente à multimodalidade discursiva a que estamos imersos cotidiana-

mente, em um país de tantas desigualdades sociais, se dá eminente-

mente nesses espaços educacionais. Desafio porque se as universida-

des apenas recentemente estão se abrindo para a diversidade cultural,

e com ela para o caráter multimodal e multissemiótico da criação fic-

cional, a escola ainda tem mais temores e fragilidades.

A despeito das iniciativas desenvolvidas no âmbito universitário, a

crítica requer uma autocrítica propositiva e, nesse sentido, a de-

manda/convite dos petianos – estudantes de diferentes semestres do

curso – foi um desafio que assumimos também como um modo de re-

fletirmos sobre lacunas em nosso Curso de Letras.

Sempre atentas a que nosso desafio seria promover a leitura de tex-

tos ficcionais entre os estudantes do grupo e, por sua vez, promover

reflexões sobre como trabalhar os mesmos textos com crianças e jo-

vens do ensino fundamental II, buscamos também refletir acerca dos

princípios teóricos implicados nas “práticas de leitura” de textos ficci-

onais nos encontros semanais.

Acreditamos que uma breve exposição dos fundamentos teóricos

que norteavam nossas escolhas e metodologia de trabalho, abarcados

sucintamente via Power Point em dois encontros e com as devidas bi-

bliografias de referência, poderiam tornar evidente que todo exercício

de preparação de um curso/de uma aula carrega consigo conhecimen-

tos teóricos e que são também eles que subsidiam a autonomia criativa

na preparação e desenvolvimento de aulas por parte do proponente.

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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A recorrente pergunta “por onde iniciar a preparação de um curso

de leitura, a seleção de textos para o trabalho ou por onde começar a

ler um texto ficcional?” tem implicadas posições teóricas, ideológicas

e metodológicas por parte de cada professor. Como bem nos ensina

Paulo Freire, em Pedagogia da Autonomia (1996): “ensinar exige re-

flexão crítica sobre a prática”. Nesse sentido, “o que se precisa é possi-

bilitar que, voltando-se sobre si mesma, através da reflexão sobre a

prática, a curiosidade ingênua, percebendo-se como tal, se vá tor-

nando crítica” (FREIRE, 1996, p.17).

Com sua reflexão sobre o ato de ensinar, o mestre nos aponta outro

caminho para que os estudantes percebam o papel e a potencialidade

das teorias em uma aula “prática” de leitura. Por isso, buscamos dar

sequência a nossos encontros a partir da oferta de atividades de leitura

de textos ficcionais, com um debate reflexivo como processo de inter-

pretação individual e coletiva, bem como com a solicitação aos petia-

nos de proposições de abordagens dos mesmos textos voltadas ao pú-

blico jovem do ensino fundamental. Essa metodologia, em seu con-

junto, levou os estudantes de licenciatura em Letras também a refle-

xões de ordem crítica e teórica sobre todo processo, como se poderá

ver, em especial, na produção do portfólio coletivo apresentado ao fi-

nal do curso, cujo conteúdo, dentre outras temáticas, constitui o cerne

do capítulo seguinte3.

TEXTOS FICCIONAIS PROPOSTOS E METODOLOGIA DE

TRABALHO

Considerando a importância do universo ficcional na formação hu-

mana, a necessidade de reflexão sobre as relações entre a prática edu-

cativa, a diversidade sociocultural, bem como a potencialidade do am-

plo campo da ficção, aspectos apontados por Candido, Freire e Lajolo,

aliás princípios que norteiam também propostas metodológicas mais

3 Portfólio à disposição no site: https://petletrasjaguarao.wordpress.com/2016/12/15/letramento-literario-a-formacao-do-leitor-no-pet-letras-2016.

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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recentes expostas pela metodologia dos Multiletramentos4, propuse-

mos um conjunto ficcional que possibilitasse ao grupo o prazer da lei-

tura associada à reflexão sobre abordagens dos textos e metodologias

para o ensino fundamental com os mesmos textos.

Com a seleção predominante de textos ficcionais multimodais e in-

tersemióticos que têm a palavra como eixo articulador, buscamos pri-

orizar experiências estéticas reflexivas junto aos petianos.

Com esse propósito, selecionamos Lampião & Lancelote (VILELA,

2006), Museu desmiolado (BRITO, 2011), um grupo de poemas visu-

ais (CAPPARELLI; GRUSZYNSKI, 2000; CIBERPOESIA, 2017) e can-

ções do Compact Disc CRIANCEIRAS- Poesia de Manuel de Barros

(CAMILO, 2012). A partir desse conjunto de textos, foi possível mobi-

lizar reflexões sobre as relações de significados entre a palavra poética

oral – declamada, cantada – e a escrita, bem como seus vínculos com

ilustrações e recursos sonoros de performance vocal e instrumental.

Isso porque nas três primeiras obras citadas os textos lidavam emi-

nentemente com uma intersemiose entre a palavra impressa na página

ou em movimento na tela do computador, mas que também jogavam

com imagens geradas pelos ilustradores. Já o último texto desse con-

junto lidava com a palavra e seus recursos imagéticos sonoros em mais

alto grau. Porque poesia escrita, e publicada originalmente pelo poeta

Manuel de Barros, ganha uma leitura criativa com o músico Márcio de

Camilo e seu grupo infantil, ou seja, promove uma ressonância perfor-

mática. É com a performance vocal e corporal dos cantores no ritmo

4 Essa perspectiva teórica, concebida a partir de um encontro de um grupo de intelectuais em Nova Londres (EUA), no final dos anos noventa, chama atenção para a multiplicidade de linguagens que se dá no processo de construção de significados na contemporaneidade e propõe uma pedagogia de multiletramentos (COPE; KALANTZIZ, 2000). O termo foi concebido porque abarca duas realidades crescentes: uma relativa à diversidade linguística e cultural e a outra à multiplicidade de canais e meios – semióticos – de comunicação, decorrentes do desenvolvimento das tecnologias. No Brasil, os estudos de letramento podem ser rastreados inicialmente com Mary Kato (1986) e, posteriormente, com Tfouni (1988), Kleiman (1995) e Soares (1998). Mais recentemente, pesquisadores brasileiros como Kleiman (2004) e Rojo (2009), assumindo como centro de preocupação os efeitos e significados que a leitura e a escrita adquirem para diferentes grupos sociais, destacam também o letramento como um conceito plural.

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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melódico que a poesia escrita é transformada em canção. O fonograma

– palavra cantada – chega até os leitores/ouvintes também em ima-

gens visuais – cores, cenário, gestos – a partir de making off selecio-

nado de algumas gravações realizadas em estúdio. Um espaço dife-

rente da folha em branco ou do palco às telas de computadores, ta-

blets, smartphones e similares. As relações entre as condições de

acesso e o suporte do texto enquanto recurso criativo que integra o

objeto literário tornam-se assim, também, um aspecto importante de

reflexão para os estudantes. Reflexão tanto no que se refere ao uni-

verso de significados que essas relações intersemióticas mobilizam,

quanto aos recursos de aproximação e motivação de jovens em espaço

escolar com objetos de arte.

Cabe destacar que, se a oralidade nesse conjunto de textos perpassa

a declamação, o canto, e a gênese da lenda transfigurada de Lancelot,

assim como a do cordel em torno de um personagem histórico como

Lampião, essa modalidade da palavra também carrega consigo varian-

tes linguísticas e culturais regionais. Contextos de produção, de vozes

anônimas ou autorais, mas também de leitores que mobilizam alteri-

dades em mundos possíveis suscitados pela criação ficcional.

Esses aspectos simbólicos e geoculturais implicados aos textos fic-

cionais foram destacados, especialmente, com o segundo conjunto de

textos selecionados. A partir da novela infantojuvenil Lata de Tesou-

ros (URBIM, 2005), os petianos foram mobilizados a refletir sobre as

possíveis relações entre o locus de enunciação da voz narrativa e a do

autor da obra. Afinal, a voz narrativa, em expressiva performance au-

toral, incorpora na diegese tanto dados biográficos do autor empírico

quanto uma seleção de fragmentos que remetem à produção ficcional

e à vida de uma escritora uruguaia. A narrativa do escritor brasi-

leiro/fronteiriço, Carlos, que rememora sua infância, é composta, es-

pecialmente, por fragmentos de El cántaro fresco (1920) e Chico Carlo

(1944), de Juana de Ibarbourou. Esse processo criativo potencializou,

aos estudantes, uma pesquisa de textos da escritora uruguaia, das bi-

ografias de Urbim e de Irbarbouru, bem como um debate acerca dos

significados dessa rede intertextual e discursiva no texto de Urbim. O

repertório de leitura do narrador, bem como seu deslocamento vivido

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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e experimentado no universo da criação ficcional são marcados tam-

bém por expressivos vínculos com o espaço cultural dos escritores

Ibarbourou e Urbim, evidenciando assim a cartografia de uma região

cultural, aspecto já sinalizado nos primeiros textos, mas aprofundado

nesse segundo conjunto. Desdobrando-se em novela, autobiografia e

narrativa autoficcional, Lata de Tesouros provocou também no grupo

uma reflexão sobre possibilidades de exercício criativo de autoconhe-

cimento de textos da memória como metodologia ou “porta de en-

trada” ao universo ficcional a estudantes.

Com esses textos, dentre outros trabalhados durante o curso, bus-

camos, no exercício do processo interpretativo, provocar os petianos a

reflexões sobre a importância de textos ficcionais na formação do lei-

tor, o cuidado da seleção e sua relação com seus estudantes e os pro-

pósitos do curso/ensino, bem como os vínculos dos textos ficcionais

com as abordagens relacionadas aos mesmos. Ao final desse percurso,

esperamos ter contribuído com a competência de leitura dos petianos

ao que tange à experiência com textos ficcionais a fim de que se sen-

tissem melhor preparados e seguros para a proposição de cursos de

leitura junto à comunidade local.

OUTRO OLHAR DE DENTRO, A PERSPECTIVA DOS

ESTUDANTES

Diante da tecedura que até aqui se constrói, quando já expostos os

princípios teóricos do projeto e sua construção metodológica, cabe a

mim, agora, falar sobre a recepção do curso entre os petianos. Buscarei

recuperar alguns traços de como percebemos, como fomos desafiados

e como fomos afetados no decorrer das atividades. Para isso, antes de

mais nada, julgo necessário marcar meu lugar de enunciação: me

chamo Santiago Bretanha (ou Silviano, como me chama a profa. Cátia;

por um lapso, eu sei... ainda assim me sinto lisonjeado!). Hoje sou

egresso do Curso de Letras Português, Espanhol e respectivas literatu-

ras da Unipampa e mestrando em Letras pela Universidade Federal de

Pelotas. Há pouco fui bolsista PET (2015-2017), por exatos dois anos,

e, antes disso, bolsista do Programa de Bolsas de Iniciação à Docên-

cia/PIBID, subprojeto Língua Materna (2012-2015). Peço licença para

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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escrever enquanto petiano, quando tratar de visões particulares e, em

alguns instantes, enquanto “petianos”, quando trouxer reflexões nos-

sas, minhas e de meus companheiros de trabalho, no sentido de que

pretendo que minha voz, aqui, seja representativa.

Ambos os Programas, PIBID e PET, em sua concepção, articulam-

se sobre o tripé indissociável ensino-pesquisa-extensão, e, logo, assu-

mem em suas ações algumas diretrizes, também indissociáveis: da In-

teração Dialógica, da Interdisciplinaridade e Interprofissionalidade,

do Impacto na Formação do Estudante e do Impacto e Transformação

Social (FORPROEX, 2012, p. 16-20). Quando essas diretrizes são

apropriadas pelo Curso de Letras, tem-se a sua tetrafurcação, quando

englobadas por quatro áreas distintas no âmbito do Projeto Pedagó-

gico do Curso (PPC, 2008): a da Língua Materna, o português; a da

Segunda Língua, o espanhol; a da Literatura, de ambos os idiomas; e

a dita área “Pedagógica”, que concatena componentes curriculares

como Políticas Públicas em Educação e Organização do Trabalho Pe-

dagógico. Ainda que a indissociabilidade entre ensino-pesquisa-ex-

tensão seja pilar básico das Letras, não é leviano dizer que a sua inte-

gração é um desafio, tanto para docentes, quanto para discentes, o que

se torna mais complexo quando se preze pela interdisciplinaridade.

Para os discentes, professores em formação, a preocupação mais

presente é aquela relativa à didática, seja do ensino de português, do

espanhol, ou da literatura. Visando responder a essa preocupação, que

é também uma demanda, o curso oferece quatro disciplinas, específi-

cas, voltadas ao ensino do português e do espanhol; são elas as Lin-

guísticas Aplicadas ao Ensino do Português I e II e as Linguísticas

Aplicadas ao Ensino do Espanhol I e II. Entretanto, em reunião de pla-

nejamento do PET5, levantamos algumas questões: “Por que não há

um componente curricular específico voltado ao ensino de litera-

5 Ao fechamento de cada ano letivo, os grupos PET reconstroem seus planejamentos anuais e projetam as atividades para o ano seguinte. É orientado aos tutores e petianos que, nesse processo, constituam “observatório” dos cursos aos quais se vinculam em vistas a identificar possíveis lacunas na formação dos petianos e demais membros da comunidade acadêmica e de contemplá-las em suas ações.

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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tura?”, “Por que é destinado pouco espaço ao estudo da literatura in-

fantojuvenil na grade curricular?”, “Como ensinar literatura quando

formos para o estágio de docência?”, “Como formar leitores?”

Diante desses inquietamentos, o PET construiu, em 2016, o projeto

de extensão Letramento Literário, um espaço de reflexão sobre a for-

mação de professores de literatura por meio de capacitações teórico-

metodológicas no espaço acadêmico que seriam transpostas, a partir

de intervenções práticas, ao ensino de leitura e de literatura na rede

básica de ensino e em espaços não-formais de educação. O curso, em

formato de workshops, A formação do leitor no Programa de Educa-

ção Tutorial (mise-en-scène deste capítulo), oferecido pelas professo-

ras Cátia e Maria Elia, configurou o primeiro ciclo do projeto, o de ca-

pacitação. Até esse momento ansiávamos por uma resposta à ingênua

dúvida “como ensinar literatura?”.

Nos dois primeiros encontros que tivemos com a professora Cátia,

fundamentalmente de reflexão teórica e de sensibilização, fomos leva-

dos a pensar em outras questões, tais como “por que ensinar litera-

tura?” e “para que ensinar literatura?”. Essas provocações nos levaram

a pensar sobre o papel humanizador dos objetos estéticos e seu papel

social, político e cognitivo. Após acaloradas discussões, chegamos à

conclusão de que não há uma panaceia que responda ao “como ensinar

literatura”, embora questões didático-metodológicas devam ser leva-

das em conta: como a faixa etária dos alunos aos quais voltamos aten-

ção, as questões éticas e estéticas imbricadas às obras e abordar as di-

ferentes textualidades em classe complexamente, levando em conta

aspectos como as multisemioses, a transgenericidade e a intertextua-

lidade.

Essas reflexões foram, pouco a pouco, maturadas. O grande dife-

rencial, nesse ponto, é o de que petianos, tutora e equipe gestora do

projeto foram envolvidos pela lógica do “aprender fazendo e refletindo

sobre”, mote procedimental do PET. As professoras Cátia e Maria Elia

atuavam como provocadoras, mediadoras, do processo de pensar mo-

dos de abordar os textos ficcionais em classe. A todo momento éramos

instigados a assumir as posições, nem sempre cômodas, de contadores

de história, de alunos, de professores, de críticos. As experiências pe-

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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dagógicas que vivenciamos culminaram com a construção de um port-

fólio, em que se quedaram registradas as atividades do curso, reflexões

teóricas a elas pertinentes e breves anotações avaliativas.

Em minha visão, o projeto de ensino A formação do leitor no Pro-

grama de Educação Tutorial cumpriu vários papéis, todos de suma

relevância. Dentre eles, destaco três, que julgo fundamentais. Em pri-

meiro lugar, destaco o diálogo e a integração entre professores de di-

ferentes áreas do Curso de Letras no âmbito do projeto, o que, por sua

vez, demarca uma intenção interdisciplinar. Em segunda instância, o

de servir como espaço de escuta de discentes, em observatório; consi-

derações que, ainda que modestas, foram levadas à Comissão de Curso

e ao Núcleo Docente Estruturante, e ressoaram nas discussões de

(re)estruturação do PPC do Curso de Letras (em fase de atualização

nos anos de 2015/2016/2017). Nesse sentido, a contribuição se deu em

pensar a efetivação da Resolução CNE/CP 2, de 19 de fevereiro de

2002, especificamente, no que diz respeito à obrigatoriedade de horas

de prática como componente curricular, a serem vivenciadas ao longo

do curso; especificamente, as horas práticas dos componentes curri-

culares da área da Literatura.

Por fim, dou especial ênfase ao grande impacto do curso na forma-

ção complementar dos petianos, uma vez que minimizou um “déficit”

apresentado pelos petianos, o da didática de literatura; impacto alçado

a maior alcance quando somado a outras iniciativas, como o projeto

de ensino Experiências de Leitura: a formação do leitor. A exemplo

disso, trago a breve avaliação da Ana Valéria Goulart dos Santos, então

acadêmica do 5º período, representativa da visão dos demais bolsistas

e que, creio, agrega pontos significativos para o encerramento desta

seção:

O projeto foi imprescindível para minha formação, visto que proporci-

onou, a mim e aos meus colegas, novas experiências, que, até então, ou

não haviam sido vivenciadas, ou passaram despercebidas em nossa for-

mação. Pensar como ensinar literatura em sala de aula é fundamental

para formar um professor, devemos ter condições mínimas de saber

fazer conexões entre teoria e prática e transpô-las para as nossas aulas.

São conhecimentos basilares que, particularmente, me faltavam e o

projeto me proporcionou, com a crucial atuação da profa. Cátia Goulart

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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e contribuições da profa. Maria Martins, as reflexões que me inquieta-

vam nas tardes de terça-feira, durante o curso, não ficavam entre aque-

las paredes, vinha para casa refletindo sobre tudo o que eu aprendi, e

problematizando questões da grade curricular do nosso curso, como,

por exemplo, a falta de uma disciplina tão elementar como seria a di-

dática do ensino de literatura-teoria e prática. Gostaria de expor meu

agradecimento pessoal e esperança de que o projeto não se finde, es-

tendendo-se para toda a comunidade acadêmica.

A MODO DE CONCLUSÃO

Buscando integrar neste capítulo as diferentes perspectivas envol-

vidas no andamento do curso, retomo também as palavras da então

tutora do PET, profa. Renata Silva, para quem a junção de pessoas que

falam de lugares de enunciação diferentes discutindo um mesmo tema

foi enriquecedor para todos os envolvidos.

Foi com esse propósito coletivo que as ações desenvolvidas culmi-

naram na entrega de um portfólio com a demonstração do percurso de

aprendizagem por parte dos estudantes, com suas avaliações individu-

ais acerca do curso, bem como com a avaliação da professora tutora do

PET, mencionada anteriormente, acerca de todo trabalho. Por isso,

para encerrar este texto, nada mais apropriado do que retomar a pala-

vra do coletivo denominado petianos, a partir da apresentação do

portfólio preparado por eles:

O presente portfólio apresenta reflexões da tutora e bolsistas do PET

Letras sobre o projeto de ensino e assim se estrutura: para cada texto,

trazemos um resumo breve, diferentes contextualizações que a obra

provoca, sugestões didáticas para a educação básica e avaliações das

atividades do projeto de ensino. Após seguirmos essas etapas em rela-

ção a cada texto ficcional, passamos ao “referencial teórico”, que se

constitui em síntese do arcabouço teórico mobilizado pela profa. Cátia,

com destaques e sugestões do PET Letras. A seguir, estão os registros

visuais do projeto, avaliação individual do curso pelos bolsistas do PET

Letras e, por fim, comentários da profa. Renata, representativos tam-

bém de pontos de vista do grupo. (p. 3).

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A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial

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É a partir especialmente da palavra dos petianos, nas diferentes vo-

zes integradas a este capítulo, que melhor podemos depreender que

além de promover o ensino de leitura de textos ficcionais a estudantes

universitários e contribuir para capacitá-los ao ensino de leitura em

ambiente escolar, o trabalho possibilitou momentos de revisão da pró-

pria proposta de formação do estudante no âmbito do Curso de Letras.

Aspecto apontado na própria demanda do curso por parte dos petia-

nos, mas aprofundado nas reflexões que buscamos desenvolver acerca

de perspectivas teóricas e práticas desenvolvidas em algumas discipli-

nas do curso, bem como na revisão coletiva do PPC – em sua primeira

versão, 2006, e a vigente, aprovada em 2008. Ações que viabilizaram

uma reflexão mais ampla e profunda sobre o alcance e a potenciali-

dade do Curso de Licenciatura em Letras, mas também acerca de suas

fragilidades.

Tendo como base os estudos do campo da literatura, destacamos

aqui alguns aspectos de fragilidade que julgamos mais relevantes: o

primeiro é atinente à carência de diálogos interdisciplinares. Afinal,

ao chamar atenção para a intensificação do caráter multimodal e mul-

tissemiótico da criação ficcional nas últimas décadas, precisamos

atentar para uma lacuna na maioria dos PPCs dos cursos de Letras no

Brasil. Questão que se agudiza em uma universidade multicampi,

como a nossa, cujas distâncias com cursos afins – filosofia, artes plás-

ticas, música e outros – inviabilizam que o estudante busque discipli-

nas eletivas que aportariam de modo significativo em sua formação de

leitor de textos artísticos que se compõem por múltiplas linguagens.

Outro aspecto, ainda que vinculado a esse, é evidenciado pela falta

de espaços de debate e proposição de alternativas para o ensino de lei-

tura de textos artísticos ao longo de nosso curso, como bem apontaram

os petianos. No que tange a essa lacuna, cabe alertarmos que o docente

universitário da área de Letras e o futuro professor, cujo papel frente

à literatura é de mediador entre os textos e o leitor, precisam desen-

volver em si mesmos a experiência de leitura. É a partir dessa experi-

ência pessoal que os futuros professores poderão sentir e saber que a

leitura de textos artísticos possibilita entrarmos em mundos (im)pos-

síveis que fomentam a experimentação plena da alteridade. É com eles

que, sem perder sua individualidade e as circunstâncias históricas do

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Cátia Dias Goulart, Maria Elia Martins e Santiago Bretanha

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texto, o leitor contrapõe suas experiências pessoais com as construídas

pelo texto lido. Essa experiência vital de leitura enriquece-se em espa-

ços coletivos – como as universidades e as escolas – na medida em que

tais ambientes possibilitam que os leitores interajam com outras lei-

turas e (re)construam seu lugar de sujeito na diversidade de leitores.

Se é fato que precisamos abrir espaço no PPC do Curso de Letras para

seminários de ensino de literatura que viabilizem essa experiência du-

pla de aprender a ler e ensinar a ler, a demanda do PET – Letras pos-

sibilitou um bom exercício e provoca os docentes do curso para uma

reflexão profunda com relação ao Curso de Letras, razão pela qual pa-

rabenizamos a iniciativa da tutora e de seus orientandos.

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Quando acordou, a literatura ainda estava lá

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Quando acordou, a literatura ainda

estava lá: Letramento Literário e a

formação do leitor no Programa de

Educação Tutorial

Millaine de Souza Carvalho

Santiago Bretanha Freitas

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

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Quando acordou, a literatura ainda estava lá

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INTRODUÇÃO

Letramento Literário foi uma das atividades extensionistas que in-

tegraram as ações do Programa de Educação Tutorial (PET) Letras da

Universidade Federal do Pampa, Unipampa, Campus Jaguarão. Vi-

gente desde o ano de 2016, o projeto tinha por objetivo fundamental

sensibilizar e instrumentalizar os bolsistas para o trabalho com a lite-

ratura na escola e se caracterizou metodologicamente pela iniciação à

docência aliada à educação tutorial. Seu propósito se justificou por

uma demanda posta em discussão pelos petianos: criar mais oportu-

nidades de formação do leitor e de formação do professor de literatura

no currículo do Curso de Letras da Unipampa.

Frente a isso, em colegiado, petianos e tutora se dedicaram a criar

um espaço de reflexão sobre a formação de professores de literatura

por meio de capacitações teórico-metodológicas no espaço acadêmico

que seriam transpostas, a partir de intervenções práticas, ao ensino de

leitura e de literatura na rede básica de ensino e em espaços não-for-

mais de educação. À construção desse espaço, estabeleceu-se um pres-

suposto fundamental: o de que toda práxis deve se estabelecer a partir

de certos princípios éticos e estéticos, seja essa práxis relativa ao en-

sino, à pesquisa ou à extensão. Ao abordar o grande tema “ensino de

leitura e de literatura”, estabelecemos como princípio de nossa pos-

tura pedagógica uma abordagem responsiva ativa (BAKHTIN, 2010),

no sentido de que toda compreensão é prenhe de resposta (BAKHTIN,

2011) e, por isso, a classe, como cena enunciativa, e o texto ficcional,

como composição estética, são espaço para a heterogeneidade, para a

divergência e para a criatividade.

Nesse sentido, adotou-se uma perspectiva pedagógica sócio-inte-

racionista (RICOEUR, 1976; BAKHTIN, 2011), na qual o extensionista

assume postura de medianeiro entre os alunos e as nuances do texto

ficcional. Levando em conta o referido aporte teórico, o projeto se es-

truturou basicamente em três momentos, sobre os quais daremos en-

foque mais adiante: o primeiro, constituído por capacitações teóricas

e realização de um curso de formação inicial; o segundo, de realização

de ações voltadas à promoção da leitura e do letramento literário, sob

orientação da tutora e de professoras colaboradoras, precedidas por

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

88

períodos de observação em espaços de ensino; e, por fim, o terceiro

momento, o de refletir sobre a prática visando a sua divulgação nos

meios científicos e a qualificação do projeto em suas futuras reedições.

Como principais objetivos do projeto, era esperado que as observa-

ções realizadas na rede básica de ensino viessem a permitir o (re)co-

nhecimento de abordagens de ensino de literatura na escola, assim

como, por meio das oficinas, fosse propiciado um ambiente lúdico, de

fruição e de cognição a partir do texto literário, fator relevante para a

formação do leitor. Almejava-se, também, que o projeto fosse vetor re-

levante para a formação da identidade docente dos petianos, assim

como se esperava realizar um trabalho de aproximação do estudante

da educação básica com obras ficcionais, buscando problematizar a vi-

são, ainda recorrente, de que a leitura de criações literárias é uma ta-

refa obrigatória e, por isso, enfadonha. Nesse sentido, buscou-

se/busca-se a literatura enquanto força humanizadora; força que “de-

senvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna

mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o seme-

lhante” (CANDIDO, 2011, p. 182).

O presente capítulo, escrito um ano após o encerramento do pri-

meiro ciclo do projeto, configura-se como registro de suas atividades;

ou, melhor, procura ser excerto de memória, e por isso lacunar, dos

quatros anos de atividade do PET Letras. Anos marcados pela integra-

ção entre prática docente, iniciação científica e ação extensionista sob

a égide da transversalidade e da horizontalidade. Dedicaremos espe-

cial atenção à realização do projeto de ensino A formação do leitor no

Programa de Educação Tutorial, cuja arquitetônica é tematizada no ca-

pítulo anterior, realizado entre julho e agosto de 2016, nas dependências

da Unipampa, Campus Jaguarão.

O projeto, que integrou a primeira etapa de realização do

Letramento Literário, surgiu do interesse do PET Letras em adquirir

embasamento teórico-prático para o ensino de literatura no espaço

escolar. Em resposta a essa demanda, a Profa. Dra. Catia Goulart,

dialogando com professoras egressas do Curso de Letras,

especialmente com a Profa. Ma. Maria Elia Martins, elaborou o projeto

de ensino objetivando exercitar a leitura crítica individual e coletiva,

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Quando acordou, a literatura ainda estava lá

89

bem como promover uma reflexão sobre as interpretações suscitadas

pelos textos ficcionais.

A iniciativa também representou uma oportunidade de integração

entre a coordenadora do projeto, vinculada à área da Literatura, e a

então tutora do PET Letras, Profa. Dra. Renata Silveira da Silva, filiada

à Linguística. Outra integração estabelecida foi das egressas com a

coordenadora do projeto e o PET. Além dessas relações interpessoais,

foi estabelecido o contato do quarteto de docentes com acadêmicos de

diferentes semestres do Curso de Letras (3º, 5º, 7º e 9º) por conta de

um tema – a formação do leitor e o ensino de literatura na educação

básica.

Como embasamento teórico, a equipe gestora do projeto A

formação do leitor assumiu a perspectiva comunicativa da literatura,

valendo-se de uma visão sócio-interacionista oriunda de relações

entre Mikhail Bakthin (1988), Paul Ricouer (1976) e Umberto Eco

(2006). Ainda, mobilizaram a pedagogia dos multiletramentos

(COPE; KALANTZIZ, 2000), estabelecendo um recorte: letramento

literário (ZAPPONE, 2007). O projeto propiciou a leitura de distintos

textos ficcionais e possíveis abordagens no espaço escolar, dos quais

damos especial destaque a Lampião & Lancelote (2012), de Fernando

Vilela, e a Lata de Tesouros (2005), de Carlos Urbim.

O presente capítulo se estrutura em dois momentos: o de expor al-

gumas das produções resultantes da realização do projeto de ensino

(seções 1 e 2); e o de refletir sobre seus impactos a partir da visão dos

integrantes do PET (seção 3, de conclusão). Assim, na primeira seção,

dedicamo-nos a trazer um resumo breve dos textos ficcionais

abordados no projeto de ensino, diferentes contextualizações que as

criações artísticas provocam e sugestões didáticas para o trabalho com

as referidas obras na educação básica. Em seguida, na segunda seção,

apresentamos breve relato de uma intervenção literária realizada no

Centro de Apoio Socioeducativo (CASE) de Jaguarão, primeira

atividade extensionista do projeto. Por fim, na terceira seção, que

encerra o capítulo, trazemos a avaliação do curso pelos bolsistas do

programa, em que recapitulamos os impactos dos primeiros

momentos de desenvolvimento do Letramento Literário e refletimos

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

90

sobre o decurso de sua efetivação, dando ênfase ao curso A formação

do leitor no PET.

SUGESTÕES DIDÁTICAS PARA A ABORDAGEM DO TEXTO

LITERÁRIO EM SALA DE AULA

Diante do anteriormente exposto, nesta primeira seção, nos ocupa-

mos em expor algumas das propostas de transposição didática cons-

truídas ao longo do curso A formação do leitor no PET. As reflexões

que aqui apresentamos constituem parte do portfólio1 elaborado como

produto final do projeto de ensino A formação do leitor no Programa

de Educação Tutorial. Nesse, além de propostas de atividades para o

trabalho com textos ficcionais em sala de aula, são apresentadas refle-

xões da então tutora, profa. Renata Silva, e dos então bolsistas Ana

Henck, Ana Valéria Goulart, Antonella Vidales, Bianca Espindola, Ka-

roline Gasque, Maria Solange da Silva, Millaine Carvalho, Santiago

Bretanha e Victor Pacheco sobre o projeto.

Nas atividades que compõem o portfólio, estão sintetizadas as

aprendizagens do grupo PET Letras adquiridas durante as

capacitações teórico-práticas ofertadas pelo projeto de ensino. Ainda,

assume duas funções: a) é a expressão textual de resultados do projeto

de ensino A formação do leitor no Programa de Educação Tutorial;

b) e é embasamento, material de consulta para o projeto de extensão

Letramento Literário, que consiste em oficinas de literatura no

ambiente escolar.

Apresentamos, abaixo, duas das propostas didáticas que integram

o portfólio, a primeira, dedicada à obra Lampião & Lancelote (2012),

de Fernando Vilela, e a segunda, que se debruça sobre a novela Lata de

Tesouros (2005), de Carlos Urbim.

1 Portfólio disponível no sítio: <https://petletrasjaguarao.wordpress.com/2016/12/15/letramento-literario-a-formacao-do-leitor-no-pet-letras-2016>.

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Quando acordou, a literatura ainda estava lá

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LAMPIÃO & LANCELOTE, FERNANDO VILELA

Na obra Lampião & Lancelote (2012), Fernando Vilela propõe um

encontro lendário entre um dos mais famosos cangaceiros do nordeste

brasileiro, Lampião, e um dos melhores cavaleiros da Távola Redonda

do Rei Arthur, Lancelote. É possível dizer que o escrito é composto de

três partes. Inicialmente, são apresentados os protagonistas, primeiro

Lancelote e, em seguida, Lampião. Na segunda parte, é descrito o

transcorrido do cavaleiro medieval a um tempo futuro, o que ocasiona

uma ruptura temporal, a qual permite a Lancelote chegar ao nordeste

brasileiro. No terceiro e último instante, ocorre um embate inusitado.

Um dos livros mais premiados do Brasil, Lampião & Lancelote

mescla duas culturas, fator este perceptível através das materialidades

verbais e visuais que compõem a obra. No que concerne aos aspectos

verbais, é notável o uso da linguagem de novelas de cavalaria e da sex-

tilha do cordel nordestino para a descrição dos personagens. A narra-

tiva, que encanta tanto pela beleza estética quanto pelo enredo cria-

tivo, mescla rima, improviso – típicos do cordel – e o estilo épico me-

dieval. Quanto à materialidade visual, é importante reparar no espaço

sertanejo ilustrado através de xilogravuras, bem como no medieval

ilustrado por meio de carimbos; o cobre dá cor às indumentárias, mo-

edas e balas de Lampião, enquanto a prata colore as vestes e armas de

Lancelote.

No lendário encontro, os dois protagonistas estão acompanhados

de personagens históricos e místicos, como a cangaceira Maria Bonita

e a bruxa Morgana. O feitiço lançado ao cavaleiro é o que propicia o

encontro de dois personagens distantes temporalmente e geografica-

mente. O desafio lançado por Lampião a Lancelote é iniciado pela luta

de palavras, de significações. Enquanto tal desafio é visto por Lampião

como uma justa, para Lancelote é um duelo.

O caráter metaficcional merece destaque nessa obra, visto que o

próprio texto se identifica como uma produção literária. Originado dos

romances de cavalaria, o gênero cordel é proveniente da poesia popu-

lar portuguesa, tendo sido ele, inicialmente, um gênero oral, antes de

passar a ser impresso em papeis ou folhetos e pendurado em cordas,

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

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barbantes ou “cordéis”. Multissemiótico, o escrito é composto por di-

ferentes elementos, como carimbos, xilogravuras, cores, tipografia; o

verbal da narrativa acompanha o imagético. No que tange à tipografia,

são notáveis as escolhas do artista plástico e designer Fernando Vilela,

autor da obra; na prosa de Lancelote, a primeira letra do verso é com

tipografia gótica, remetendo à origem medieval do cavaleiro.

Como proposta de atividade didática, orientada a diferentes públi-

cos, sugere-se que, a priori, os alunos sejam sensibilizados com a his-

tória de seu conterrâneo, Lampião. Tal atividade poderá ser iniciada

através de questionamentos, como: “Vocês já ouviam falar em Lam-

pião?”, “Quem foi Lampião?”, “Qual sua origem?”. Nesse momento, é

interessante discutir com os alunos as diferentes significações atribu-

ídas a Lampião, uma vez que, enquanto alguns o viam como herói, ou-

tros o consideravam um traidor. Em seguida, é possível retomar quem

foi Lancelote, suas origens inglesas, onde viveu, como era a época me-

dieval, dizendo que ele, assim como Lampião, foi considerado herói e

traidor.

Posteriormente, pode-se expor que o cangaceiro Lampião e o cava-

leiro Lancelote viveram em épocas e lugares diferentes. Para este mo-

mento de contextualização, sugere-se o uso de um mapa-múndi.

Ainda, é possível a utilização de fotos, vídeos, que realçariam a dife-

rença espacial e cultural entre ambos. Em seguida, comenta-se com os

estudantes que tudo que fora relatado é abordado na obra Lampião &

Lancelote, de Fernando Vilela.

Durante a leitura da obra, como os alunos já saberão sobre os per-

sonagens e suas épocas, a intenção passa ser que atentem à configura-

ção visual do livro, que percebam como as diferenças entre os dois per-

sonagens são explicitadas na obra através de imagens, cores, além da

linguagem verbal. No decorrer da leitura, é importante chamar a aten-

ção para a cor de cada personagem, o desenho característico, a rima.

Ao final da leitura, é possível propor aos alunos uma reflexão sobre o

conceito de herói e, também, indagar-lhes se consideram que ainda há

heróis.

Essa proposta de atividade pretende aproximar os universos apre-

sentados pelo autor. Após a leitura conjunta da obra, pode-se partir do

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Quando acordou, a literatura ainda estava lá

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romance de cavalaria para apresentar os elementos narrativos do gê-

nero. A prosa, a qual é típica das narrativas da Idade Média, servia

para narrar feitos heroicos e grandes aventuras de um herói. Essas his-

tórias mesclavam temas culturais, amor idealizado e aventuras prota-

gonizadas por um personagem que presa pela honra, pela lealdade e

demonstra coragem. Em meio a essa contextualização, é possível tra-

zer outras obras importantes, de modo a estabelecer relações intertex-

tuais, como Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda.

As narrativas medievais eram marcadas por uma tradição oral, ex-

tensas e divididas em capítulos. Voltando ao texto com os alunos, pro-

põe-se a identificação dessas características na obra, destacando pas-

sagens e discutindo com eles as relações existentes com a literatura de

cordel, partindo de seus conhecimentos prévios. Em seguida, é inte-

ressante apresentar a história da literatura de cordel, destacando ser

esse um gênero que deriva das narrativas em prosa dos romances de

cavalaria, e que, também, é caracterizado pela oralidade. É relevante a

utilização de cordéis para exemplificar o gênero e, logo, a comparação

com a escrita da obra. Ao final, é importante estabelecer relações entre

a linguagem empregada nos cordéis e nos romances de cavalaria,

questionando-os (os alunos) sobre que tipo de linguagem mais cha-

mou a atenção e mais se aproxima daquilo que vivenciam.

LATA DE TESOUROS, CARLOS URBIM

Publicado pela primeira vez em 1993 pela editora Projeto, com o

título Dona Juana, o livro Lata de Tesouros (2005), narrativa infan-

tojuvenil de Carlos Urbim, está em sua segunda edição. A obra mobi-

liza as vivências de Carlos, pequeno habitante da região fronteiriça de

Santana do Livramento (BR)/Rivera (UY), que acompanha seus pais,

changueiros, em um trabalho de verão no interior de Melo (UY). A ati-

vidade de jardinagem, desempenhada pelo pai, e de doméstica, de-

sempenhada pela mãe, dá-se na chácara do Capitão Lucas Ibarbourou,

marido de Juana de Ibarbourou.

A história é transpassada pelas descobertas de Carlos enquanto es-

critor, que vislumbra em Juana uma referência poética. Carlos, cha-

mado “Chico Carlo” por Juana, é uma menção à obra homônima de

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

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Juana de Ibarbourou; desse modo, entrecruzam-se personagens his-

tóricos e ficcionais em uma teia interdiscursiva, a qual remete à auto-

ficção, em que Urbim, também Carlos, explora a sua formação en-

quanto leitor e escritor sob referência direta de Juana de Ibarbourou,

ou, como igualmente é conhecida a autora, Juana de América. As me-

mórias de infância, materializadas aqui e ali em um pedaço de papel,

um brinquedo, um poema, Carlos guarda em sua lata de tesouros.

Como referido anteriormente, a obra mobiliza diferentes (con)tex-

tos, quedando-se explícita a riqueza da narrativa. Ressaltamos três di-

mensões que julgamos serem centrais na obra de Urbim: primeira, a

do resgate da cultura e da memória fronteiriça, atentando à infância,

ao brincar e à percepção; segunda, a rede interdiscursiva que traz à

baila, na narrativa, a referência e a representação de distintos textos

artísticos; e, terceira, a da formação do leitor e do gosto pela leitura,

que incidem, diretamente, na formação do pequeno escritor.

A primeira dimensão, que se refere ao resgate da cultura e da me-

mória fronteiriça, atentando à infância, ao brincar e à percepção, é

observável pelo espaço construído pela narrativa, e, reafirmado pelos

movimentos das gentes entre os territórios, acompanhando as esta-

ções do ano e as demandas por trabalho, seja no lado de lá do Brasil,

ou o de cá, do Uruguay. Nesse contexto, instituem-se culturas infantis

particulares ao espaço híbrido, materializadas na percepção desses su-

jeitos, sobre si mesmos, sobre o outro e o seu lugar no mundo.

Já a segunda dimensão, que diz respeito à rede interdiscursiva que

traz à baila, na narrativa, a referência e a representação de distintos

textos artísticos, instaura-se no campo da enunciação, na produção da

obra enquanto discurso; no decorrer da narrativa, são reportadas inú-

meras obras, sejam elas a filmografia europeia e norte-americana da

década de 20, as músicas populares do carnaval brasileiro ou as nar-

rativas de Júlio Verne. Estabelece-se, aí, uma polifonia de vozes sociais

e históricas que, em maior, ou menor grau, ressoam na significação do

texto.

Por fim, a terceira dimensão, alusiva à formação do leitor e do

gosto pela leitura, que incidem, diretamente, na formação do pe-

queno escritor, concretiza-se nas relações do personagem Carlos, que

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Quando acordou, a literatura ainda estava lá

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enxerga em Juana sua iniciadora na escrita poética. O processo cria-

tivo, para ele, dá-se concomitantemente à sua formação enquanto lei-

tor, não somente de poesias, mas de mundo; a figura de Juana é de-

terminante: é ela quem guia Chico Carlo entre as letras e leva-o a per-

ceber a poética da natureza, das relações, da mirada.

A partir dessas três dimensões, que destacamos como constituintes

da narrativa, pensamos em possíveis atividades a serem desenvolvidas

na escola, para distintos públicos. Pensamos que a obra de Urbim é

adequada a diferentes públicos leitores, desde os mais pequenos, dos

6º e 7º anos, até os adolescentes, dos 8º e 9º anos do ensino funda-

mental e das 1ª, 2ª e 3ª séries do ensino médio. As atividades referem-

se, respectivamente, ao resgate da cultura e da memória fronteiriças,

à formação do leitor/escritor e à interdiscursividade mobilizados pela

Lata de Tesouros, sendo a primeira destinada aos 6º e 7º anos, a se-

gunda aos 8º e 9º anos e a terceira à 3º série do ensino médio (deti-

vemo-nos a essa série para pensar as atividades por uma necessidade

de recorte).

Primeira Atividade (6º e 7º anos): como lidaríamos com um pú-

blico mais jovem, acreditamos que a ludicidade é uma ferramenta im-

portante para a compreensão do texto ficcional em classe, assim como

para a expansão dos seus sentidos. Desse modo, após a atividade de

leitura e interpretação da obra junto ao alunado, problematizaríamos

a lata de tesouros de Carlos enquanto uma metáfora da memória e do

tempo, bem como estimularíamos os jovens a pensar os possíveis sig-

nificados de cada elemento guardado por Carlos em sua lata. Assim,

discutido o papel da memória e levadas em conta questões históricas

e culturais, convidaríamos os alunos a produzir artesanalmente suas

próprias “latas de tesouro”, nas quais guardariam objetos que, para

eles, fossem representativos – os alunos seriam, ao final, convidados

a socializar com seus colegas a motivação em ter “atesourado” cada um

de seus objetos.

Segunda Atividade (8º e 9º anos): levando em conta o público-

alvo, sua faixa-etária e os conteúdos curriculares voltados aos 8º e 9º

anos, acreditamos que a obra de Urbim é um possível eixo transversal

para pensar a interdisciplinaridade. Como a formação do leitor é atra-

vessada pela complexificação do olhar (pela complexidade, e não pela

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

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hermetização), julgamos interessante levar o aluno a estabelecer rela-

ções entre diferentes elementos significantes. Como os capítulos de

Lata de Tesouros são precedidos por epígrafes e por ilustrações, pro-

blematizaríamos, junto aos alunos, os efeitos de sentido mobilizados

por estes. As ilustrações são referenciais ao tema de cada capítulo, as

epígrafes são constituídas por excertos de poemas de Juana de Ibar-

bourou; logo, os alunos precisariam formular a compreensão global do

texto e estabelecer relações de sentido entre as diferentes linguagens

artísticas (narrativa e poesia).

Terceira Atividade (3º série do ensino médio): sabidamente, al-

guns dos conteúdos de Literatura para a 3ª série do ensino médio são

voltados ao movimento regionalista, ou melhor, à estética regionalista.

Isso posto, acreditamos ser interessante, através da obra de Urbim,

pensar a interdiscursividade por ele mobilizada com fins de refletir so-

bre uma estética regionalista que, ao contrário do cânone estipulado

pelos livros didáticos, constitui-se a partir da ótica urbana. Desse

modo, exploraríamos o caráter transcultural do espaço e as diversas

linguagens referidas pela obra, como o cinema, a música e a literatura.

TUDO TEM COR: INTERVENÇÃO LITERÁRIA NO CASE

Como exposto anteriormente, a Profa. Cátia Goulart, juntamente

com a Profa. Maria Elia Martins, ministrou, para os bolsistas do PET

Letras, oficinas direcionadas ao trabalho com textos literários, que

culminaram com a construção do portfólio acima mencionado. Posta

a necessidade de embasar teórico-metodologicamente os futuros do-

centes para a leitura crítica de textos ficcionais, foram-lhes oferecidas,

no âmbito do projeto de ensino A formação do leitor no Programa de

Educação Tutorial, cinco capacitações, as quais auxiliaram os petia-

nos no planejamento e desenvolvimento do projeto de extensão Letra-

mento Literário. No ano de 2016, referente a este projeto, o grupo PET

Letras promoveu a atividade de sensibilização: Tudo tem cor – Flicts,

com os alunos do CASE, vinculado à Prefeitura Municipal de Jagua-

rão.

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Quando acordou, a literatura ainda estava lá

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A atividade foi realizada em dezembro de 2016. Nessa oportuni-

dade, os bolsistas puderam conhecer as dependências do CASE, es-

paço não-formal de aprendizagem, pouco assistido pelos projetos vin-

culados à Unipampa – Jaguarão; foi possível notar quais metodologias

de ensino são adotadas no Centro. Esse primeiro contato dos bolsistas

com os alunos chamamos Sensibilização; sensibilizaram-se os petia-

nos à realidade socioeducativa dos frequentadores do CASE e os alu-

nos do Centro à leitura da obra literária. Importa dizer que, a esse es-

paço socioeducativo, são encaminhados estudantes residentes no Lar

de Passagem da cidade para que tenham uma atividade em turno in-

verso, e alunos considerados indisciplinados. Também é relevante di-

zer que, no referido ano, a Profa. Me. Nathalia Araujo, ex-bolsista do

PET Letras, atuava no lugar, fator que facilitou o contato entre os pe-

tianos e os responsáveis pelo CASE.

Para realização dessa atividade, escolheu-se o livro infantil Flicts,

do escritor, cartunista e desenhista Ziraldo. Com esta obra, o autor foi

vencedor do XXI Troféu HQMIX – O Troféu dos Quadrinhos na cate-

goria Homenagem/Destaque Internacional. Ancorados em uma pers-

pectiva pedagógica sócio-interacionista (RICOEUR, 1976; BAKHTIN,

2011) e nos pressupostos de Chiapinni (2005), Cosson (2006), Lajolo

(2001) e Magnani (2001), que versam, entre outras questões, sobre a

formação do leitor, a formação do gosto e o letramento literário, o

grupo planejou a leitura do texto ficcional.

Na obra eleita, é narrada a história de “Flicts”, uma cor que, ao

olhar para o arco-íris, para as bandeiras, para a caixa de lápis, enfim,

para o mundo, não vê lugar para si, uma vez que, como dito na narra-

tiva, “não existe no mundo nada que seja Flicts”. Por ser, então, rara,

esta pensava não haver lugar para si neste mundo. Sendo comparada

com outras cores, dizia-se não ter ele a força do vermelho, nem a imen-

sidão do amarelo, e tampouco a paz do azul; era considerado “apenas

o frágil, feio e aflito Flicts”. No mesmo ano em que o primeiro astro-

nauta pisara na Lua, cá em baixo Ziraldo escolheu justamente ela, o

satélite natural da Terra, para ser o lugar de Flicts. Ao receber um

exemplar de Flicts, Neil Armstrong, o astronauta, escreveu: “A Lua é

Flicts”. Baseados nesse livro, os bolsistas do PET Letras planejaram o

início da aplicação do projeto Letramento Literário.

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

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Assumindo uma postura de mediador entre as crianças e as nuan-

ces da obra eleita, foi realizada a leitura do texto. Enquanto um bol-

sista assumiu a voz do narrador, outro era Flicts e as falas das cores

eram assumidas pelos alunos do CASE. Cartazes com as cores e as falas

de cada uma foram elaborados pelo grupo para a realização da ativi-

dade. No livro, aparece a bandeira de alguns países, como Inglaterra,

Japão, República do Congo, as quais foram impressas e coladas na

lousa da sala.

Realizada a leitura, os petianos dialogaram com os alunos a partir

das seguintes questões: “Vocês já conheciam esta obra?”, “Quem é o

autor do texto?”, “Quem é Ziraldo?”, “Vocês conhecem outras obras do

Ziraldo?”, “Quem é o personagem principal do texto lido a vocês?”,

“Como ele é caracterizado na obra?”, “Atentando às primeiras falas do

narrador, é possível notar que sua representação é feita em compara-

ção a outras cores?”

Com vistas a estabelecer uma intertextualidade entre Flicts e o Pa-

tinho Feito, os bolsistas perguntaram ao grupo se lembrava de outras

histórias na quais alguém era discriminado por ser considerado dife-

rente. O conto de fadas O Patinho Feio, do escritor dinamarquês Hans

Christian Andersen, foi logo recordado e buscou-se uma inter-relação

entre as histórias; pelos alunos, foram estabelecidas comparações en-

tre a situação de exclusão enfrentada por Flicts e o Patinho Feio. Nesse

momento, um aluno comentou: “As pessoas acham que a gente precisa

ser tudo igual”; outro disse: “A gente sabe que ninguém é igual a nin-

guém, mas, mesmo assim, todo mundo quer tentar ser igual”; outro

ainda comentou: “A gente vê isso através das roupas, por exemplo”. A

partir das colocações dos alunos, os bolsistas mediaram o diálogo.

Em seguida, perguntaram aos alunos a vivência que eles têm com

as cores, como as cores significam para eles. Sentidos habitualmente

relacionados às cores foram rapidamente pautados pelos estudantes:

“O branco significa paz”, “O preto significa luto”, “O vermelho significa

amor” etc. Nesse instante, perguntaram ao grupo: “Será que as cores

são assim significadas em todos os lugares?”. Foi dito aos alunos: A

cor representativa do luto, por exemplo, varia de país para país. En-

quanto nos países majoritariamente cristãos, como é o Brasil, o luto é

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Quando acordou, a literatura ainda estava lá

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representado pela cor preta, em países orientais, como China e Japão,

a cor é o branco.

Logo, perguntaram ao grupo se haviam reparado na diversidade

de profissões que se utiliza das cores, entre elas: arquitetos, paisagis-

tas, publicitários. No presente momento, os bolsistas focalizaram a

discussão principalmente no uso das cores por pessoas da área da Pu-

blicidade e Propaganda e conversaram sobre o uso destas em propa-

gandas televisivas; levando em consideração a psicologia das cores,

promoveram uma discussão sobre como afetam nossas emoções, por

isso, utilizadas no marketing.

Posteriormente, os petianos conversaram com os estudantes

acerca do fato de Flicts ser discriminado por ser de uma cor diferente

das demais presentes da obra. Sobre isso, um aluno comentou: “Isso

acontece na vida real. Pessoas sofrem preconceito por causa da cor da

pele”. Foi retomada a “cor da lua”. Os petianos disseram ao grupo: “Na

obra de Ziraldo, Flicts era uma cor excluída e, ao final da leitura, des-

cobrimos que a Lua é Flicts. Não sabemos se vocês têm conhecimento

disso, mas a Lua reflete, como cor, a intensidade dos raios solares que

recebe, por isso, como nos diz o narrador, ela pode ser azul, vermelha,

amarela. No mesmo ano de publicação do texto do Ziraldo, o primeiro

homem pisou na Lua e, segundo o narrador, só eles, os astronautas,

sabem que a lua é Flicts. Ou seja, a cor da Lua, assim como a dos seres

vivos, varia de acordo com a luz e cada cor apenas possui uma frequên-

cia diferente”.

A partir da aplicação dessa atividade, a qual buscou sensibilizar os

estudantes do CASE para a leitura de obras ficcionais, foi notável, aos

petianos, o fato de esses alunos não estarem habituados a que lhes

fosse lida uma obra literária. Para que se mantivessem atentos à nar-

rativa, a entonação mantida durante a leitura de Flicts foi fator basilar.

Também, foi primordial o grupo PET ter proposto a leitura do texto

com a ativa participação dos alunos enquanto cores-personagens da

narrativa, promovendo, assim, a responsividade. Postos enquanto

parte integrante da atividade, os estudantes sentiram-se confortáveis

em participar da discussão proposta após a leitura, refletindo acerca

das questões colocadas em debate e refratando-as quando afinadas às

suas próprias vivências.

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

100

CONSIDERAÇÕES FINAIS: COM A PALAVRA, OS PETIANOS

Depois de recuperados alguns dos resultados dos primeiros mo-

mentos de execução do projeto de extensão Letramento Literário, que

coincidem com a aplicação do projeto de ensino A formação do leitor

no PET, cabe, agora, nesta derradeira seção, apresentar algumas per-

cepções sobre o seu processo de execução a partir da visão dos inte-

grantes do PET. Esperamos, ao fim do texto, oferecer uma mirada vol-

tada aos impactos do curso na formação docente dos bolsistas, com-

plementar àquela do capítulo anterior. Para tanto, à tecedura destas

últimas considerações, tomamos as vozes dos petianos materializadas

nos relatos inscritos no portfólio. Dentre os aspectos que acreditamos

mais pertinentes de serem mencionados, relevamos a construção de

uma postura responsiva/ativa em relação à sua formação docente, o

processo de construção das identidades docentes dos petianos e a pre-

ocupação com o estabelecimento de relações entre teoria (da literatura

e da língua(gem)) e prática pedagógica (ensino de leitura e de litera-

tura).

Embora esses aspectos sejam estritamente imbricados, o ponto

fundamental sobre o qual os petianos se debruçaram foi o de construir

uma postura crítica em relação à sua formação docente e ao currículo

do Curso de Letras da Unipampa – Jaguarão. Foram recorrentes as

indagações acerca do pouco espaço curricular dedicado à didática da

leitura e da literatura, assim como à literatura infantojuvenil. Nesse

sentido, o projeto de ensino possibilitou aos petianos instrumentaliza-

ção em relação às referidas temáticas. Nas palavras da ex-petiana An-

tonella Vidales, o curso “foi o começo do meu ‘despertar’ para a

realidade de que um dia serei licenciada para trabalhar com literatura,

e o curso me deu ferramentas para buscar e aprofundar os

conhecimentos vagos que são dados na universidade”. O mesmo foi

reiterado pela ex-petiana Millaine Carvalho, quando salienta que

adquiriu “importantes saberes sobre o ensino de Literatura”, o que

percebia ser uma “lacuna em sua formação”.

Os impactos do curso, no que se refere a possibilitar reflexão sobre

temáticas que os petianos sentiam marginais no currículo da licencia-

tura, são lembrados por todos os bolsistas em seus relatos. Ainda, as

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miradas, inconformadas, em direção à formação docente, e compro-

metidas com seu aperfeiçoamento, colocam em evidência a responsi-

vidade, para além do primado teórico, no cerne de um posicionamento

político dos discentes frente ao sistema de ensino. Posicionar-se poli-

ticamente é, nesse contexto, marco para a construção de identidades

docentes, já na formação inicial. Tal afirmação encontra ancoragem

em considerações como as da ex-petiana Ana Valéria dos Santos, em

que sustenta: “pensar como ensinar literatura em sala de aula é

fundamental para formar um professor, devemos ter condições

mínimas de saber fazer conexões entre teoria e prática e transpô-las

para as nossas aulas”, o que é ratificado pelo forte posicionamento da

petiana Maria Solange Barbosa, quando diz “o projeto Formação de

leitores no PET Letras representou uma oportunidade ímpar de

acréscimo à formação deficitária da graduação na área da literatura.

Disciplina que, muitas vezes, não recebe o espaço e a atenção devida

na educação básica, sendo estigmatizada como menos relevante na

formação do sujeito”.

As falas críticas sustentam a imagem de que é basilar a fundamen-

tação teórica para a formação do professor de língua e de literatura,

entretanto, no processo de constituir-se professor é indispensável a

habilidade de transpor teoria à prática, e vice-versa, em que a teoria é

lente que potencializa a leitura do docente e lhe permite mediar as re-

lações entre o leitor em formação e as nuances do texto ficcional, do

monumento artístico. Nesse sentido, o maior impacto do curso/pro-

jeto de ensino A formação do leitor no PET, conforme reiterado pelos

petianos, é o de ter instigado a transposição didática, como salienta

Carvalho ao dizer que “durante a execução do projeto [foi-lhe] dada a

oportunidade de refletir sobre o trabalho com diferentes gêneros a

partir de uma perspectiva dialógica, pensando a transposição didática

das teorias estudadas ao longo da graduação”.

O mesmo ecoa na voz da petiana Karoline Gasque ao afirmar que,

no âmbito do curso, no decorrer “das discussões e atividades, apren-

demos a perceber as configurações da obra do início ao fim, interpre-

tar a imagem, a configuração do texto ficcional enriquece a leitura”.

Conforme Barbosa, “é neste contexto que o projeto se insere e ganha

relevância, na medida em que busca alternativas didáticas que

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Millaine de Souza Carvalho e Santiago Bretanha Freitas

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possibilitem ao aluno graduado em Letras (re)pensar o componente

curricular e, portanto, as didáticas”. Dessa forma, ainda que em pro-

cesso de consolidação, o Letramento Literário, aliado à parceria com

o A formação do leitor no PET, mostra-se dispositivo de maior impor-

tância à formação crítica dos bolsistas do PET Letras, no sentido que

qualificou, de distintas maneiras, suas posturas frente às práticas aca-

dêmicas e docentes, principalmente nas esferas do ensino e da exten-

são.

REFERÊNCIAS

BAKTHIN, Mikhail. Questões de literatura e de estética. São Paulo:

Hucitec, 1988.

______. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução a partir do

italiano por Valdemir Miotello e Carlos Alberto Faraco. São Carlos:

Pedro & João, 2010.

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Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras

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Leituras e leitores no Clube do Livro

PET Letras

Sandro Martins Costa Mendes

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Sandro Martins Costa Mendes

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Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras

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INTRODUÇÃO

Era uma vez. Essa frase remete a um tempo distante do nosso, a

outra época e abre um portal para esse tempo e para um espaço que

trará personagens, situações encadeadas e um final esperado, aguar-

dado e, quase sempre, feliz.

O “era uma vez” é conhecido por praticamente todo mundo, desde

a infância. Alguns apontam que a origem está na expressão francesa il

estoit une fois, registrada em livro pela primeira vez por Charles Per-

rault, em 1694. Esse lugar e tempo peculiar nem sempre obedece às

leis do nosso próprio mundo, sejam leis de Direito, leis da Física ou da

Natureza. Com isso, cada criança acostumada ao “era uma vez” passa

a acreditar, aceitar, entender que aquele que lhe diz a frase, aquele que

vai contar a história, tem conhecimento sobre algo acontecido em um

mundo que não é esse real onde ela habita. Assim, a criança aprende e

entende a literatura. Da mesma maneira, ela entende que tudo é pos-

sível ser criado, e que, também, esse mundo e época distantes são ha-

bitados por personagens muito diferentes daqueles ditos reais, pois

trazem animais que falam e constroem casas, figuras que não podemos

encontrar em nosso mundo, como elfos, duendes, fadas, bruxas; mas

ainda assim, com todas essas diferenças, é também um mundo muito

parecido com o da criança.

O era uma vez é, então, entrada ofertada a outro mundo. E é ao

adentrar nesse tempo e lugar que a criança vivencia os acontecimentos

desse mundo, conhece os personagens, busca explicações e espera pelo

final. A partir da voz de um parente, professor ou contador de história,

ou por ela própria, a criança costuma fantasiar ou fantasiar-se dentro

dessa história. Quando faz isso, está tomada pelo prazer de experimen-

tar uma narrativa. O gosto, o prazer pela leitura, muitas vezes começa

no era uma vez. Imaginando-se dentro do universo ficcional ou não, o

leitor é o protagonista da sua busca por prazer, é o herói de seu deleite.

O livro é a estrada, os desafios, o caminho do herói.

Infelizmente, há diversos fatores que vão ser obstáculos e serão an-

tagonistas nessa jornada de leitura. Por um motivo ou outro, pode ser

que aquele herói leitor passe a se acomodar, a deixar de acreditar em

si, e possa inclusive abandonar a sua jornada de leitura.

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Sandro Martins Costa Mendes

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O presente artigo vai tratar de um projeto do grupo PET (Programa

de Educação Tutorial) Letras que quis ser um auxiliar do protagonista,

quis impulsionar o protagonista de novo em sua jornada. O projeto

Clube do Livro surgiu como possibilidade de estímulo e tentativa de

proporcionar a leitura de forma prazerosa e despreocupada a seus par-

ticipantes, os quais eram, inicialmente, alunos do Curso de Letras da

Unipampa. É comum, em cursos de Letras, ouvir relatos de alunos se

dando conta de que pararam de ler literatura de ficção depois que en-

traram para a universidade. Dizem que grande parte de sua leitura é

de textos teóricos, e quando fazem leitura de textos ficcionais, são da-

queles exigidos em alguma cadeira de graduação. Dessa maneira, a lei-

tura se vê sempre enformada por um objetivo acadêmico.

Quando surgiu a possibilidade de realizar um clube do livro, pen-

samos nessa questão prazerosa e despreocupada citada acima e, para

tanto, buscamos obras que não estivessem de alguma maneira já exi-

gidas ou mesmo relacionadas com o Curso de Letras em si. Em deter-

minado momento, decidimos fazer do Clube do Livro um projeto de

extensão e assim a participação de alunos de outros cursos e membros

da comunidade passou a ser também um objetivo. A ideia era não se-

lecionar obras que estivessem também relacionadas com o estudo de

alguns dos cursos do campus da universidade. É importante ressaltar

que, durante a aplicação do projeto no PET Letras, os objetivos foram

modificados, mas isso é explicado no próximo capítulo.

O primeiro livro colocado em discussão respeitou essas premissas.

Sugerido dentro da criação do projeto, a obra selecionada foi Perdão,

Leonardo Peacock, de Matthew Quick. O tema era direcionado ao pú-

blico universitário e de ensino médio, pois o personagem principal da

obra era um rapaz que pensava em matar os colegas e suicidar-se e

todos os dilemas e conflitos internos a partir dessa decisão.

No presente capítulo, visamos ressaltar a importância da leitura de

ficção na formação do indivíduo, não de maneira ampla, mas a partir

de reflexão em relação a estudantes de Letras e de cursos universitá-

rios. Para tanto, será preciso pontuar a relevância da leitura e conhe-

cimentos prévios no que concerne à literatura para a fruição, desti-

nada ao prazer. Vamos refletir sobre os movimentos que a leitura pro-

voca no leitor. Depois, vamos tratar sobre o perfil do leitor brasileiro,

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Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras

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principalmente naquele grupo que nos interessa, jovens estudantes.

Faremos isso a partir de dados da pesquisa Retratos da Leitura no

Brasil (2016).

A LEITURA

O objetivo principal do projeto Clube do Livro era incentivar a lei-

tura de obras contemporâneas de ficção, não presentes no conteúdo

dos componentes curriculares dos cursos da Unipampa, Campus Ja-

guarão, como dito, e, por isso, as sugestões de leituras não estariam

presas a obras do cânone acadêmico. Buscava-se, com essa finalidade,

oportunizar a leitura pelo prazer de ler, liberta de preocupação acadê-

mica e de avaliação.

Independente disso, sabíamos que para os petianos todo esse pro-

cesso teria um viés diferenciado: para eles, a leitura da obra era obri-

gatória, mas também chegaria o momento de eles fazerem a sugestão

de obras e, assim, tentar encontrar aquela que já haviam lido e tido

prazer em algum momento de sua jornada de leitor, ou que escolhe-

ram ler, baseados em seus próprios gostos de leitura. Para isso, os pe-

tianos deveriam encontrar em seus próprios prazeres de leitura aque-

las obras que pudessem estimular a leitura por parte dos outros parti-

cipantes do clube. A conversa sobre a obra era o segundo momento do

projeto, ficando aqui, então, para mais adiante.

Mas, voltamos ao objetivo primeiro do Clube do Livro: o prazer da

leitura. Vincent Jouve (2002), na obra A Leitura, pergunta o que acon-

tece quando se lê um livro, “Quais são as sensações, as impressões que

a leitura suscita em nós?” (p. 107), e para responder essa pergunta,

Jouve cita Jauss, naquilo que chama de “fruição estética”. Jauss ex-

plica que “na atitude de fruição estética, o sujeito é libertado pelo ima-

ginário de tudo aquilo que torna a realidade de sua vida cotidiana

constrangedora” (JAUSS, 1978, p. 103 apud JOUVE, 2002, p. 107,

grifo do autor). O sujeito leitor faz dois movimentos na leitura, um pri-

meiro que o isola de seu mundo real, ou mesmo “aniquila” o mundo

do qual o leitor se afasta, e um segundo movimento de criação de um

mundo novo (a partir do mundo da obra) para aquele mundo aniqui-

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Sandro Martins Costa Mendes

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lado (o próprio real do leitor). Dessa maneira, Jouve explica que a lei-

tura é ao mesmo tempo libertação (de um mundo cotidiano próprio do

leitor) e preenchimento (quando o leitor preenche com os elementos

da obra que lê e de seu próprio imaginário o lugar anterior daquele

mundo empírico).

Assim, livra-se o leitor das imposições, dificuldades e as bastantes

realidades de seu mundo, ao mesmo tempo em que renova sua percep-

ção de mundo ao adentrar no universo ficcional criado por outrem.

Nas palavras de Jouve:

Ler, pois, é uma viagem, uma entrada insólita em outra dimensão que,

na maioria das vezes, enriquece a experiência: o leitor que, num pri-

meiro tempo, deixa a realidade para o universo fictício, num segundo

tempo volta ao real, nutrido da ficção (JOUVE, 2002, p. 109).

É, portanto, uma viagem que afasta, mas, por outro lado, mune o

leitor de mais elementos para saber enfrentar seu próprio mundo, o

real, quando do retorno daquela estada no mundo fictício.

Também aparece com destaque no pensamento de Jouve a outra

implicação do leitor em relação ao texto, que pode fazer surgir um sen-

timento de contemplação ou de participação. Segundo Jouve (2002),

quando o leitor é contemporâneo da obra, “a leitura lhe permite reno-

var sua percepção das coisas. Esse fenômeno explica-se pela deforma-

ção que o texto provoca sobre os dados do mundo” (p. 110). Por outro

lado, quando o leitor se vê separado da obra por considerável distância

no tempo, “cuida primeiramente de reconstituir a situação histórica

do texto” (JOUVE, 2002, p. 110). Portanto, “há participação quando o

leitor transcende a posição limitada que ele tem na vida cotidiana, e

‘contemplação’ quando chega uma visão de mundo que não é a de seu

universo cultural” (p. 111).

Roland Barthes, em O rumor da língua (2012), apresenta reflexões

acerca da leitura, ainda que afirme estar em um “desamparo doutri-

nal” por não ter uma doutrina sobre a leitura como tem sobre o escre-

ver (revelado em sua obra A preparação do Romance). Porém, pode-

mos nos valer de suas reflexões para, neste capítulo, tratar sobre a lei-

tura e o prazer em ler.

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Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras

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Barthes chega a duvidar da necessidade de que seja preciso uma

doutrina para a leitura, pois se pergunta se

a leitura não é, constitutivamente, um campo plural de práticas disper-

sas, de efeitos irredutíveis, e se, consequentemente, leitura da leitura,

a Metaleitura, não é nada mais do que um estilhaçar-se de ideias, de

temores, de desejos, de gozos, de opressões, de que convenha falar à

medida que surjam... (BARTHES, 2012, p. 31).

Sem a pretensão de reduzir o desamparo doutrinal, Barthes (2012)

se permite situá-lo e compreender o que para ele é a noção de leitura.

Para tanto, começa por usar a noção de pertinência, que em linguística

seria o “ponto de vista sob o qual se escolhe olhar, interrogar, analisar

um conjunto tão heteróclito, díspar, quanto a linguagem” (p. 31).

Barthes explica que grandes teóricos conseguiram encontrar caminho

para estudar alguns temas na área da linguagem quando se permiti-

ram escolher um ponto de vista para análise. Assim se deu, por exem-

plo, com os trabalhos de Saussure em relação à linguagem, a partir de

sua escolha pelo sentido; de Troubetskoi e Jakobson relacionados com

o som, também a partir do sentido; e de Propp sobre a narrativa,

quando buscou em contos populares apenas as situações e papéis es-

táveis. Por isso, Barthes diz acreditar que se poderia pensar em análise

na leitura se fosse possível decidir por uma pertinência. Porém, o au-

tor francês afirma que “infelizmente, a leitura ainda não encontrou o

seu Propp ou seu Saussure; essa pertinência desejada, imagem de um

alívio do cientista, nós não a descobrimos – pelo menos ainda não”

(BARTHES, 2012, p. 32).

A dificuldade de encontrar essa pertinência se dá por ser o verbo

ler um verbo “muito mais transitivo do que o verbo falar” (BARTHES,

2012, p. 32). Ou seja, podemos ler muitas coisas, textos, imagens, ges-

tos, cidades, entre outras. A variedade dos objetos que podemos ler faz

com que não se possa uni-los em uma categoria. Segundo Barthes, “o

objeto que eu leio é fundado apenas pela minha intenção de ler; ele é

simplesmente: para ler, legendum, pertencendo a uma fenomenolo-

gia, não a uma semiologia” (BARTHES, 2012, p. 32, grifos do autor).

Acrescente-se a essa dificuldade de categorizar a dificuldade que

Barthes diz existir de que haja uma pertinência de níveis. Para

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Sandro Martins Costa Mendes

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Barthes, não é possível definir níveis de leitura, pois não se consegue

fechar a lista de níveis. O autor entende que há uma origem da leitura

gráfica, quando se aprende as letras, porém, existem as leituras sem

aprendizagem, por exemplo, a leitura de imagens. Ele diz que essa

pode ser uma aprendizagem cultural, mas não seria técnica. E mesmo

quando existe a técnica, não se saberia quando parar de aprofundar:

“na captação de um sentido? Que sentido? Denotado? Conotado?”

(BARTHES, 2012, p. 32).

Em relação à dificuldade de se conseguir encontrar uma pertinên-

cia, Barthes tenta agregar outro obstáculo, que ele denomina por De-

sejo. Isso se dá, pois, para o autor, toda leitura é penetrada de Desejo

(ou Repulsa) (BARTHES, 2012, p. 33), o que retomaremos mais adi-

ante.

Faz parte da problemática acerca da leitura a resistência que as pes-

soas têm com a leitura, principalmente se pensarmos as tantas possi-

bilidades e atrativos que estão competindo com a leitura de livros de

literatura (na próxima seção, destacaremos na pesquisa sobre Retra-

tos da Leitura no Brasil, com quem o livro compete hoje em dia).

Barthes se perguntava sobre isso, já nos anos 1960 e 1970: “por que os

franceses de hoje não desejam ler?” (2012, p. 34) e se surpreendia com

o número de 50% de leitores. Barthes, então, leva em consideração

dois recalques que podem prejudicar o querer-ler, o que trataremos a

seguir.

Inicialmente, Barthes trata daquelas obras que se “devem” ler, ou

que já se deveria ter lido. Não está destacando aqui as obras necessá-

rias para determinada área, por exemplo, a área de Letras. Então, não

se dirige a obras de autores profundamente estudados ou clássicos.

Barthes se refere a obras livres. Nesse sentido, o autor afirma que esse

tipo de dever está bastante identificado a uma visão elitista, já não

mais em voga desde a derrocada dos valores humanistas. Mas agora,

deveres particulares

ligados ao ‘papel’ que o sujeito reconhece para si na sociedade de hoje;

a lei de leitura não mais provém de uma eternidade de cultura, mas de

uma instância estranha, ou pelo menos enigmática ainda, situada na

fronteira entre a História e a Moda. O que estou querendo dizer é que

existem leis de grupo, microleis, de que é preciso ter o direito de se

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libertar. Ainda mais: a liberdade de leitura, qualquer que seja o preço

a pagar, é também a liberdade de não ler (BARTHES, 2012, p. 34-5).

Então o dever de leitura depende da posição social ou de grupo que

cada leitor ocupa. Essa era também uma preocupação do Clube do Li-

vro no PET, inicialmente. Queríamos que as obras escolhidas estives-

sem livres desses deveres, inclusive, livres de conceitos e preconceitos

anteriores.

O outro recalque parece que poderia estar, agora, se desfazendo na

contemporaneidade, mas nem tanto. Está identificado com a Biblio-

teca. Barthes diz que ela é sempre inadequada ao Desejo, sempre

grande demais e pequena demais. Tem a ver com a escolha ou o res-

peito ao Desejo, que precisa respeitar o limite da biblioteca, que, em

outros momentos, parece ilimitada (principalmente no momento de

escolha de leitura dentro do acervo de cada biblioteca). Com o uso da

internet e a possibilidade de livros digitais que ela oferece, há grande

acesso a obras, seja de maneira oficial, através dos livros digitais que

são “entregues” ao leitor assim que há a compra no site, a qualquer

hora e dia; seja de maneira informal, através das cópias escaneadas

das obras. Ainda assim, a internet não dá conta da totalidade de livros,

pelo menos não de forma gratuita – o que se pode esperar ao adentrar

em uma biblioteca – e nem de maneira imediata, com acesso à obra

naquele momento de pesquisa, coisa que acontece quando pesquisa-

mos na biblioteca e o livro está à disposição. Segundo a pesquisa Re-

tratos da Leitura no Brasil, as bibliotecas ainda são lugar de leitura

de 19% dos leitores.

Os inúmeros portais de cópia e disponibilização de livros de forma

online, a grande diversidade de livrarias que realizam o comércio de

livros de maneira virtual, o acervo digitalizado de inúmeras bibliotecas

representam o acréscimo em muitas vezes da experiência da biblioteca

física, mas ainda assim apresentam a limitação desta. Obviamente que

estamos nos referindo a uma limitação absurdamente menor.

O comércio de livros online ainda nos faz esperar pela entrega da

obra, quando essa obra é física. Apesar do grande número de obras

colocadas à disposição de maneira informal, ou ilegal, ainda assim,

muitas estão ainda só em suas formas físicas. O desejo de ler, hoje em

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dia, é muito mais rapidamente saciado do que em outros tempos e em

outros ambientes que não o virtual. Ainda assim, há o limite, há o obs-

táculo.

Desejo é um dos pontos principais que Barthes relaciona com o

prazer da leitura. Barthes se pergunta o que há de Desejo na leitura

(2012, p. 36) e responde dizendo que há um “erotismo da leitura (na

leitura, o desejo está presente junto com o seu objeto, o que é a defini-

ção do erotismo)” (BARTHES, 2012, p. 36). Para Barthes, a “leitura

desejante aparece marcada por dois traços fundadores”, o primeiro é

quando o leitor se afasta de tudo, fecha-se a um lugar para ler, está

próximo de dois outros sujeitos humanos: “o sujeito apaixonado e o

sujeito místico” (2012, p. 37), relacionando assim a capacidade de au-

sentar-se presente na oração e a retirada da realidade que marca o su-

jeito apaixonado. Assim,

o sujeito-leitor é um sujeito inteiramente deportado sob o registro do

Imaginário; toda a sua economia de prazer consiste em cuidar da sua

relação dual com o livro (isto é, com a Imagem), fechando-se a sós com

ele, colado a ele, bem perto dele, como a criança fica colada à Mãe e o

Apaixonado ficado no rosto amado (BARTHES, 2012, p. 37-8, grifos do

autor).

A leitura desejante tem um segundo traço: “na leitura, todas as

emoções do corpo estão presentes, misturadas, enroladas: a fascina-

ção, a vagância, a dor, a volúpia; a leitura produz um corpo transtor-

nado, mas não despedaçado” (BARTHES, 2012, p. 37, grifos do autor).

Além desses, haveria outros prazeres diferentes de leitura? “Há

uma tipologia possível desses prazeres?”, pergunta-se Barthes (p. 37).

Para o autor, há pelo menos três tipos de prazer de ler.

O primeiro estaria relacionado com o fetiche, tirado das palavras,

“de certas palavras, de certos arranjos de palavras” (p. 37). Seria um

tipo de leitura metafórica ou poética, segundo Barthes. Para tanto, re-

flete o autor, não seria necessária uma cultura linguística, pois, apesar

de não se ter certeza, parece que mesmo a criança, no momento do

balbucio, “conhece o erotismo da palavra, prática oral e sonora ofere-

cida à pulsão” (p. 37).

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Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras

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No segundo tipo, o leitor é puxado por algo que Barthes aponta

como um prazer metonímico de toda narração, uma força “mais ou

menos disfarçada, da ordem do suspense: o livro vai se abolindo pouco

a pouco, e é nesse desgaste impaciente, arrebatado, que reside o gozo”

(BARTHES, 2012, p. 37-8).

Por fim, o terceiro tipo: a Escritura. Nessa, Barthes fala de um De-

sejo que para ele é praticamente consequência da leitura, ou deveria

ser:

a leitura é condutora do Desejo de escrever (...) Não é que necessaria-

mente desejamos escrever como o autor cuja leitura nos agrada; o que

desejamos é apenas o desejo que o escritor teve de escrever, ou ainda:

desejamos o desejo que o autor teve do leitor enquanto escrevia

(BARTHES, 2012, p. 39, grifos do autor).

Porém, esse terceiro tipo não é o essencial para este capítulo, mas

foi uma das afirmações basilares para a criação do Balbúrdia na Es-

crita Criativa, apresentado em outro capítulo.

OS LEITORES

Um rico mecanismo de conhecimento sobre o leitor brasileiro se

encontra na pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, encabeçada pelo

Instituto Pró-Livro. A pesquisa está em sua 4ª edição e teve como base

o ano de 2015.

Verificamos, na pesquisa, os dados identificados, de certa maneira,

com o público atingido pelo Clube do Livro PET Letras: universitários,

em sua maioria, jovens entre 17 e 24 anos, leitores do Sul do Brasil.

Porém, em alguns momentos, vamos nos referir a outras faixas etárias,

escolaridades, regiões e mesmo ano de aplicação. Nosso objetivo na

presente seção é entender como se comportam aquelas faixas de pú-

blico em que estão inseridos o nosso público do Clube do Livro. Além

disso, é importante frisar que a pesquisa define a metodologia para se

determinar quem é leitor e quem não é leitor. Muitas informações são

apuradas, como idade, escolaridade, sexo, renda familiar.

Para ser considerado leitor, o entrevistado precisaria ter lido um

livro inteiro ou em parte nos últimos 3 meses. O não leitor é aquele

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que não leu nem um livro inteiro, nem partes de um livro nos últimos

3 meses, mesmo que tenha lido nos últimos 12 meses.

Em 2007, a estimativa era de que os leitores fossem 55% da popu-

lação e os não leitores 45%. Em 2011, ficou bem dividido, 50 a 50%.

Em 2015, o cenário de 2007 retornou, com pequeno acréscimo, fi-

cando a porcentagem de leitores em 56%.

Um dado importante para nós diz respeito à porcentagem de leito-

res na Região Sul do país, que é a mais baixa das 5 regiões brasileiras.

Em 2015, a Região Sul alcançou 50% de leitores. Apesar de ainda ser

a mais baixa, melhorou bastante em relação a 2011, pois naquele mo-

mento havia apenas 43% de leitores. A Região Nordeste manteve, em

2011 e 2015, o número de 51% de leitores e 49% de não leitores. O

Norte passou de 47% a 53% de leitores. A Região Centro-Oeste passou

de 53%, em 2011, a 57% de leitores em 2015 e a Sudeste de 50% a 61%

de leitores.

A pesquisa demonstra que o refrão cansativamente utilizado que

diz que os jovens não leem mais é uma falácia. Para começar, o per-

centual de leitores entre os jovens de 11 a 13 anos e de 14 a 17 anos é

bem maior que a média nacional. Enquanto cerca de 75% dos jovens

entrevistados são leitores, lembramos que a média brasileira entre to-

das as faixas etárias é de 56%. Outro fator importante é o que mede o

gosto pela leitura. O gosto é medido nas respostas a “ler por gosto” ou

“distração”. E também nesse quesito os jovens leitores alcançam 58%,

quando têm 11 a 13 anos e um pouco menos, 48%, quando a pesquisa

é feita com a faixa etária de 14 a 17. Nos dois casos, a leitura prazerosa

é maior do que a leitura utilitária, ou seja, aquela que se destina à aqui-

sição de conhecimento, ou que se refere a motivos religiosos, para atu-

alização cultural ou mesmo para cumprir exigência escolar ou do tra-

balho (CECCANTINI, 2016, p. 86).

A leitura desses jovens também está escapando daquelas exigidas

na escola. Entre os livros citados como últimos livros lidos, aparecem

obras de John Green (A culpa é das estrelas), O diário de um banana,

de Jeff Kinney, e, entre os primeiros lugares, aparecem muitas obras

identificadas com a indústria cultural, pois são obras das quais foram

feitas adaptações ao cinema (com grande bilheteria), relacionadas

com games, música ou moda.

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Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras

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O público destacado nos parágrafos acima é aquele que antecede a

entrada na universidade e, como vimos, tem uma grande quantidade

percentual de leitores e boa parte deles lendo por prazer. Dissemos

que um dos motivos que nos fez propor o projeto Clube do Livro foi

identificar que muitos universitários acabam por dedicar seu tempo

de leitura na graduação à leitura técnica ou exigida pelos cursos. Va-

mos ver, em seguida, como esse grupo está lendo.

Em 2015, os leitores (ou seja, aqueles que leram uma obra ou partes

nos últimos 3 meses), na idade de 18 a 24, alcançavam 67% contra 33%

de não leitores. Na faixa de 25 a 29, o número de leitores chegou a 59%

e o de não leitores a 41%. Nas duas faixas etárias houve o crescimento

do percentual. Em 2011, o número de leitores entre 18 e 24 anos era

de 53% e os leitores de 25 a 29 chegavam a apenas 47%, ou seja, nessa

última faixa etária existia mais não leitores do que leitores.

Não podemos, entretanto, limitar a idade dos universitários nessas

duas faixas (de 18 a 24 e 25 a 29), já que temos alunos de idades vari-

adas, inclusive pela característica do Campus Jaguarão (e de outros)

da Unipampa: uma universidade nova em uma cidade pequena, pro-

piciando a muitas pessoas que antes não tiveram a oportunidade de

realizar uma faculdade, por não poderem se ausentar ou mudar da ci-

dade, a possibilidade de realizar o terceiro grau em outro momento de

vida.

Por isso, além da faixa etária, nos interessa igualmente ter infor-

mações em relação à categoria de estudante, visto que a pesquisa faz a

separação entre estudante e não estudante.

Os estudantes perfazem uma faixa de 27% em 2015, em 2011, eram

32% do total de entrevistados. Nos dois levantamentos, o número de

estudantes universitários do total chegava a 4%. Entre os entrevista-

dos que estão estudando, 84% são leitores. Os estudantes do ensino

superior têm o maior número percentual de leitores: 93%. No que diz

respeito ao gosto pela leitura entre os estudantes, 39% gosta muito de

ler, 50% gosta pouco e 11% não gosta de ler.

A pesquisa também aponta a motivação para se ler um livro. No

grupo dos que têm como escolaridade a universitária, 28% tem como

motivação a atualização cultural ou para conhecimento geral. Por

gosto, 20% e 15% leem para atualização profissional ou exigência do

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Sandro Martins Costa Mendes

118

trabalho. Outros motivos são: crescimento pessoal, 14%; distração,

9%; exigência escolar da faculdade 7%; e não sabem ou não responde-

ram, 3%.

Os números acima estão relacionados com a escolaridade e não

apenas com os que estão estudando. Portanto, há estudantes e não es-

tudantes entre o grupo com escolaridade universitária. Nos números

da pesquisa, repetimos, 27% dos entrevistados estava estudando. E os

universitários são apenas 4% dos estudantes.

O que se pode inferir dessas motivações é que grande parte da lei-

tura daqueles que têm a escolaridade universitária se dá motivada por

atualização cultural, laboral e por gosto. Por exigência da faculdade ou

escola, apenas 7%.

O gosto pela leitura foi influenciado pela mãe ou responsáveis do

sexo feminino, nos pesquisados com escolaridade universitária, em

13%. Logo em seguida, nesse ranking, aparecem os professores, 8%.

Mas os que não identificam ninguém, ou ninguém em especial, alcan-

çam 56%.

A falta de tempo é a razão principal para que estudantes não te-

nham lido mais (32%), mas 23% não gostariam de ter lido mais e 13%

dizem preferir outras atividades.

Outro fator importante para não se ler são aquelas atividades que

concorrem com a leitura. Entre os estudantes em geral, os maiores

concorrentes da leitura são a televisão (75%), usar a internet (67%),

escrever (66%) e escutar música (63%). Em 2015, o WhatsApp alcan-

çava 55%. A leitura de livros chegava a 33% de estudantes, e a leitura

de jornais, revistas, 18%. Porém, quando se toma a escolaridade uni-

versitária, o uso da internet chega a 84%, e a leitura de revistas e jor-

nais a 51% e de livros a 48%. Tanto nos estudantes em geral, como nos

universitários, televisão, música, WhatsApp, escrever, usar redes soci-

ais, encontrar-se com amigos são atividades que alcançam números

maiores do que ler, que são os últimos em preferência dentre as ativi-

dades realizadas em momentos de lazer.

Por fim, vamos destacar, na pesquisa, os gêneros lidos pelos estu-

dantes universitários. Entre os estudantes em geral, a Bíblia (31%), os

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Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras

119

contos (28%) e os didáticos (31%) são os gêneros mais comuns. Pen-

sando no objeto de leitura do Clube do Livro, podemos destacar outros

gêneros literários: o Romance (22%), os infantis (21%), Poesia (17%).

A LEITURA DOS LEITORES

Muitas nuances se apresentam ao leitor com a leitura: o desejo de

ler, o prazer, os obstáculos, as limitações, os recalques, além do envol-

vimento do leitor com o universo ficcional e seu “aprendizado” ou

“aprimoramento” de leitura do mundo real. E tudo isso é tema das dis-

cussões que se apresentam no momento da reunião de diversos leito-

res de uma obra, por isso, abaixo, falaremos, de maneira bastante su-

cinta e empírica, sobre o segundo momento do Clube do Livro, o mo-

mento após a leitura, o momento do encontro dos leitores daquela

obra e a conversa sobre ela.

Importante destacar que os momentos de conversa sobre a obra

não se restringiam a um roteiro preestabelecido para os debates de to-

das as leituras, ou seja, o grupo PET não previu um plano de pergun-

tas, sugestões de comentários ou de reflexão que fosse utilizado em

todos os encontros presenciais do Clube do Livro. Pelo contrário, cada

encontro tinha sua própria dinâmica, seu próprio planejamento.

Isso se deu por alguns fatores. O primeiro diz respeito à organiza-

ção das equipes de trabalho do PET. Havia um rodízio na organização

das atividades, dessa maneira, cada edição do projeto era organizada

e conduzida por um grupo específico de petianos, eram sempre 4 alu-

nos, dentre os 12 do PET. Esse grupo indicava os livros prováveis para

serem lidos e, também, a metodologia de escolha dessas obras: em al-

gumas vezes a escolha se deu dentro do grupo, em outras, houve en-

quete na internet para a definição da obra. Ficava a cargo do grupo,

também, as formas de divulgar o evento. Por exemplo, na primeira

edição houve a performance teatral de um aluno de Produção e Polí-

tica Cultural no auditório da universidade, que levou em consideração

o argumento da obra. Após a performance, houve a inscrição daqueles

que quisessem fazer a leitura do romance e participar das discussões.

Por isso tudo é que, em cada edição, assim como aconteceu com as

metodologias de escolha e divulgação, a metodologia de conversa e as

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Sandro Martins Costa Mendes

120

discussões sobre cada obra eram conduzidas de diferentes maneiras,

respeitando o planejamento de cada grupo. Mas, geralmente, se co-

mentava sobre o processo de leitura de cada leitor, o que esperavam

da obra, qual foi a dinâmica de leitura de cada participante naquela

edição do evento, tempo destinado à obra, locais em que despendeu a

leitura, se a leitura lhes foi prazerosa ou não.

Após essa introdução dedicada à experiência de leitura, partíamos

para a discussão do tema da obra. Algumas vezes se debateu o tema de

forma bastante livre, tanto que em alguns momentos as reflexões che-

gavam a se afastar da obra lida, colocando experiências pessoais ou

discussões culturais sobre o tema. Nestes últimos casos, a obra funci-

onava como um estopim ou provocação sobre aquele assunto especí-

fico. Um exemplo de ocorrência desse tipo se deu quando a obra Seja-

mos todos feministas, de Chimamanda Ngozi Adichie, foi trabalhada

durante a ocupação do campus.

Algo que também é preciso levar em conta e destacar, sobre os mo-

mentos de reunião e conversa sobre a leitura da obra, tem a ver com o

lugar do encontro: foram realizados em salas da universidade, geral-

mente salas de aula; houve conversa em saguão de anfiteatro e no pró-

prio hall de entrada do Campus Jaguarão. Também como atividade de

eventos maiores, como na Semana Acadêmica de Letras (realizada na

Biblioteca Pública Municipal de Jaguarão) e durante a ocupação do

Campus Jaguarão por movimento dos estudantes, como já dito. Evi-

dentemente, as diferenças de espaço moldavam de alguma maneira a

realização da edição, assim como a diversidade de pessoas presentes

em cada edição, pois cada obra atraía leitores específicos.

CONCLUSÃO

O projeto Clube do Livro quis se aproveitar do momento de maior

volume de leitura realizado por um indivíduo, que se dá quando é es-

tudante universitário, pois, conforme mostramos nos resultados da

pesquisa Retratos de Leitura do Brasil, 93% dos estudantes universi-

tários são leitores. Porém, sabemos que a leitura nesse momento de

vida está mais identificada com a leitura de livros técnicos, científicos

e profissionais, e mesmo em cursos em que as pessoas escolhem por

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Leituras e leitores no Clube do Livro PET Letras

121

gostarem de leitura (Letras, Jornalismo, por exemplo), a grande carga

de leitura técnica, teórica se torna um impeditivo para a leitura por

prazer. Ainda assim, acreditamos ser possível que isso aconteça e a

criação do Clube do Livro visava estimular uma prática de leitura vol-

tada ao gosto, ao prazer, ao entretenimento.

Como vimos, a leitura de obras ficcionais propicia ao leitor mergu-

lhar em um universo às vezes novo e distante do seu, outras vezes mais

semelhante. De qualquer maneira, conhecer, vivenciar esse outro

mundo permite ao leitor aprimorar a leitura de seu próprio mundo,

como vimos nas reflexões teóricas presentes neste capítulo.

REFERÊNCIAS

ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Sejamos todos feministas. Tradução

de Christina Baum. São Paulo/SP: Companhia das Letras, 2015.

BARTHES, R. O rumor da língua. São Paulo: Editora WMF Martins

Fontes, 2012.

CECCANTINI, João Luis. Mentira que parece verdade: os jovens não

leem e não gostam de ler. In: INSTITUTO PRÓ-LIVRO. Retratos

da Leitura no Brasil. 4ª ed. Disponível em:<http://proli-

vro.org.br/home/images/2016/RetratosDaLeitura2016_LI-

VRO_EM_PDF_FINAL_COM_CAPA.pdf>. Acesso em: 15 ago.

2018.

INSTITUTO PRÓ-LIVRO. Retratos da Leitura no Brasil. 4ª edição.

Disponível em:< http://prolivro.org.br/home/images/2016/Re-

tratosDaLeitura2016_LIVRO_EM_PDF_FI-

NAL_COM_CAPA.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2018.

JOUVE, V. A leitura. São Paulo: Editora UNESP, 2002.

QUICK, M. Perdão, Leonard Peacock. Rio de Janeiro: Intrínseca,

2013.

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Sandro Martins Costa Mendes

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Os (in)sucessos na abordagem de temas transversais no Clube do Livro

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Os (in)sucessos na abordagem de

temas transversais no Clube do Livro

Karoline Gasque de Souza

Maria Solange Barbosa da Silva

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Karoline Gasque de Souza e Maria Solange Barbosa da Silva

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Os (in)sucessos na abordagem de temas transversais no Clube do Livro

125

INTRODUÇÃO

O projeto de ensino Clube do Livro, vinculado ao Programa de

Educação Tutorial (PET) Letras da Universidade Federal do Pampa,

Campus Jaguarão, teve seu princípio no ano de 2014, proposto pela

então tutora, Profa. Dra. Renata Silveira da Silva, e coordenado pelo

Prof. Dr. Sandro Martins Costa Mendes, que integra o corpo docente

do Curso de Produção e Política Cultural da referida instituição. O pro-

jeto possuía a finalidade de instigar o gosto pela leitura de obras con-

temporâneas, privilegiando o texto narrativo.

A proposta inicial era que o PET Letras propusesse a leitura de uma

obra literária para posterior discussão em dia e horário marcados pelo

grupo, além de encarregar-se da divulgação do evento perante a co-

munidade acadêmica e externa. Nessa proposta, em 2014, foi realizada

uma única edição do projeto, contando com a presença do professor

colaborador, tutora e petianos, contabilizando oito pessoas, para dis-

cutirem o livro Perdão, Leonard Peacock, do autor Matthew Quick,

cuja disponibilização, de maneira parcial, se dava depois de feita a ins-

crição pelo e-mail do Programa.

No ano de 2015, o projeto contou com maior adesão de público nas

três edições realizadas. A primeira foi acerca do livro infantojuvenil

Alucinado som de tuba, de Frei Betto, com a presença de vinte parti-

cipantes, entre bolsistas e comunidade acadêmica. Na segunda, a obra

foi eleita por meio de enquete aberta à comunidade geral na página da

rede social Facebook do PET Letras; a obra Memórias de fogo (v. 1):

os nascimentos, autoria de Eduardo Galeano, contou apenas com a

participação dos petianos e professor coordenador. Para a terceira edi-

ção, o grupo selecionou a obra Branca de Neve e as Sete Versões, de

José Roberto Torero. Nessa oportunidade, o público foi constituído

por quatorze pessoas entre tutora, petianos e público externo.

Em 2016, ano em que também foram realizadas três edições, o pro-

jeto passou por reformulações, modificando-se de extensão a ensino

para inserir os temas transversais nas discussões das obras. Na pri-

meira edição, a leitura e a discussão foram a respeito do livro Sejamos

todos feministas, da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie,

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Karoline Gasque de Souza e Maria Solange Barbosa da Silva

126

adaptação de um discurso da própria autora proferido no TEDxEus-

ton1. Na época dessa edição, o prédio da Unipampa estava sendo ocu-

pado pelos alunos em prol de reivindicações de natureza acadêmica e

infraestrutural. Logo, o grupo PET Letras optou por realizar o evento

no hall de entrada da universidade, o que contribuiu para o maior su-

cesso de público, contando com cerca de quarenta participantes, entre

professores, técnicos administrativos, alunos e comunidade externa.

Para a segunda edição de 2016, a fim de inovar o projeto, foi esco-

lhida a história em quadrinhos Pílulas Azuis, de Frederik Peeters, gê-

nero ausente na bibliografia do Curso de Letras da Unipampa, Campus

Jaguarão. Essa edição também foi realizada no saguão da instituição,

o qual foi decorado para proporcionar uma imersão no cenário da his-

tória. Entretanto, apesar dos esforços empregados na divulgação do

Clube através da distribuição de balões com passagens da história e da

já mencionada decoração do saguão, imitando a imagem apresentada

na capa da HQ, a adesão do público foi insatisfatória, somando apenas

treze pessoas, contando apenas com tutora e petianos.

A terceira edição foi dedicada a homenagear o centenário da morte

do escritor gaúcho João Simões Lopes Neto, prestigiando, assim, a li-

teratura regional. Nesta, em especial, a leitura do conto Negrinho do

Pastoreio foi proferida pelo discente Breno Santareno do Curso de

Produção e Política Cultural, acompanhado com acordes de violão de

Marluce Amaral de Oliveira, aluna do Curso de Letras. Além disso, a

decoração, por si só, representava um atrativo à parte, já que retratava

o cenário presente no conto. Nessa oportunidade, contou-se com de-

zoito participantes entre tutora, petianos e discentes, ainda dentre os

presentes estava a Profa. Dra. Geice Peres Nunes do Curso de Letras

da instituição que, por ter apreciado a atividade, convidou o PET Le-

tras para reaplicá-la na V Semana Acadêmica de Letras.

Diante do exposto, com os três anos de experiência na aplicação do

projeto, várias questões suscitaram reflexões acerca do Clube do Livro,

como a formação do leitor e do gosto, o perfil do leitor contemporâneo

e a inserção dos temas transversais. No entanto, diante das limitações

1 Evento promovido pelo Tecnologia, Entretenimento e Design (TED) acerca da África.

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Os (in)sucessos na abordagem de temas transversais no Clube do Livro

127

que o próprio gênero capítulo possui, optou-se por discorrer sobre

questões referentes aos temas transversais, bem como sua pertinência

em inseri-los no Clube do Livro. Quanto à estrutura do capítulo, inicia-

se com um breve comentário a respeito da terminologia da expressão

“Clube do Livro”, logo após, serão abordados os temas transversais e

suas implicações para, em seguida, tratar do projeto Clube do Livro e,

consequentemente, a inserção dos temas, finalmente, encerra-se ao

registrar impressões e conclusões na subseção de considerações finais.

CLUBE DO LIVRO

A expressão “Clube do Livro” apresenta dois léxicos, o primeiro

“clube”, que presume uma associação de pessoas possuidoras de inte-

resses em comum que, por vezes, para seu ingresso, é condicionada a

indicação de integrantes antigos. No que concerne ao restante da ex-

pressão “do livro”, é evidente que o interesse comum é o da leitura.

Portanto, tem-se um grupo de pessoas que se reúne, esporadicamente,

a fim de comentar suas impressões acerca de uma determinada obra

literária.

De acordo com John Milton (2002, p. 17), “os clubes de livros têm

enorme importância no mercado livreiro da Europa e da América do

Norte. Estima-se que sejam responsáveis por até 30% do total das ven-

das de livros”. Os pesquisadores Ribeiro e Carvalho (2017), apoiados

em Milton (2002), discorrem sobre a crescente e decrescente procura

por clubes, mediante associação no século XX. Conforme a citação a

seguir,

[...] o Clube do Livro foi o primeiro do Brasil e começou a funcionar

em 1943, presidido por Mário Graciotti. Publicava livros mensais a um

terço do preço de livraria. Em 1973, foi comprado pela editora Revista

dos Tribunais, em seguida pela Ática. Até que surgiu a concorrente Cír-

culo do Livro, da editora Abril e Bertelsmann, que contou com mais de

500 mil sócios em dez anos (MILTON, 2002, apud RIBEIRO; CARVA-

LHO, 2017, p. 3).

É notável que a terminologia “Clube do Livro” presume uma asso-

ciação e um empreendimento oneroso, porém cabe dizer que o projeto

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Karoline Gasque de Souza e Maria Solange Barbosa da Silva

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Clube do Livro distancia-se dessa noção, pois está centrado, precisa-

mente, na discussão de obras literárias. A ideia de promover um Clube

do Livro em um espaço acadêmico visava oportunizar um ambiente de

leitura e discussão de obras nem sempre contempladas nas bibliogra-

fias dos componentes curriculares do Curso de Letras (Unipampa/Ja-

guarão). Dessa maneira, o projeto possui um fator característico que é

o fato de ser realizado em um campus, no qual, em sua maioria, são

ofertados cursos de licenciatura. Assim, o olhar docente fez-se pre-

sente na leitura das obras, uma vez que estas suscitavam teorias lite-

rárias como aporte de leituras interpretativas; ainda, nos encontros,

refletia-se sobre as possibilidades de utilização do texto em sala de

aula, assim como sua relevância em integrar planejamentos destina-

dos à rede básica de ensino.

Em todas as edições do Clube do Livro de 2016, os petianos insti-

garam os demais participantes a pensar como trabalhar a obra no am-

biente escolar, quais assuntos enfatizar, para qual ano, entre outras

questões. No mais, grande parte dos participantes relatou ter tido con-

tato com a literatura por meio de uma abordagem superficial na edu-

cação básica, ou seja, lia-se a respeito das obras e suas características;

é dizer, o propósito central era abarcar aspectos gramaticais, dei-

xando, em segundo plano, a obra em si e, consequentemente, muitas

vezes não se dava a devida valorização ao texto ficcional.

TEMAS TRANSVERSAIS

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) dos temas transver-

sais para o terceiro e o quarto ciclos do ensino fundamental foram dis-

ponibilizados pelo Ministério da Educação e Secretaria de Educação

Fundamental em 1998. Eles apresentam seis temas transversais, que

são: ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual, pluralidade cultu-

ral e trabalho e consumo, para serem abordados nas diferentes disci-

plinas desses ciclos do ensino fundamental. De acordo com os PCNs:

O compromisso com a construção da cidadania pede necessariamente

uma prática educacional voltada para a compreensão da realidade so-

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Os (in)sucessos na abordagem de temas transversais no Clube do Livro

129

cial e dos direitos e responsabilidades em relação à vida pessoal e cole-

tiva e a afirmação do princípio da participação política. (MEC-SEF,

1998, p. 17)

A psicóloga Ana Amélia Inoue foi a coordenadora da equipe que

definiu os temas transversais propostos pelos PCNs. Em uma entre-

vista exibida pelo canal STV da Rede SESC SENAC2, a educadora de-

finiu que os temas transversais são, em suma, questões sociais, signi-

ficativas e urgentes, as quais precisam ser trabalhadas na escola, pois

estão presentes no nosso dia a dia.

Logo, a discussão dos temas transversais se faz indispensável de-

vido ao caráter relevante que possui em nossa sociedade. Ademais, a

transversalidade deve permear o tratamento das temáticas menciona-

das acima, sugeridas pelo documento, visando uma integração dos

componentes curriculares. De acordo com a experiência dos petianos

como alunos, a transversalidade não é abordada na escola, apesar de

uma década de publicação dos PCNs, tempo considerável para apro-

priação de seus conceitos e sugestões.

A instituição escolar se mostra reticente em adotar a transversali-

dade, pois se habituou a fragmentar os conteúdos, dando-lhes limites

muito rígidos. O esforço que é empregado em manter as disciplinas

como independentes deveria ser direcionado a romper sua suposta in-

dependência. Nota-se que a própria formação docente, por vezes, ad-

quire essa visão de independência, dificultando, assim, sua adequação

à transversalidade. Assim sendo, nos cursos de licenciatura se faz tão

necessário o tratamento dos temas transversais a fim de sensibilizar o

futuro docente quanto à relevância de abordá-los na escola.

O PROJETO CLUBE DO LIVRO E OS TEMAS TRANSVERSAIS

O Programa de Educação Tutorial é regido por um Comitê Local de

Acompanhamento e Avaliação (CLAA), composto por tutores e petia-

2 Rede SESC (Serviço Social do Comércio) SENAC (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), atual SescTV. Entrevista disponível no link: https://www.youtube.com/watch?v=n9fTgjMY7KY. Acesso em: 15 set. 2018.

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Karoline Gasque de Souza e Maria Solange Barbosa da Silva

130

nos da instituição. De acordo com a resolução nº 129, de 17 de dezem-

bro de 2015, das Normas de Organização e Funcionamento do CLAA-

PET da Universidade Federal do Pampa, uma das atribuições do Co-

mitê, previstas no §1º do art. 11 da Portaria nº 343, de 24 de abril de

2013 do MEC, é “recomendar, com base na avaliação dos relatórios

anuais dos grupos, ações que promovam e garantam a qualidade e ino-

vação acadêmica do PET, bem como a indissociabilidade entre ensino,

pesquisa e extensão”.

No ano de 2015, ao ser encaminhado o planejamento anual das ati-

vidades ao CLAA, surgiu a demanda de inserção dos temas transver-

sais nos projetos. Assim, considerando que as quatro edições do Clube

do Livro culminaram em discussões acerca de questões sociais, em

2016, o grupo PET Letras julgou adequado inserir os temas nesse pro-

jeto. Portanto, o referido ano foi marcado por mudanças na aplicação

do Clube do Livro, tanto no que se refere à escolha da obra, quanto às

estratégias de publicidade/divulgação e aplicação/execução. Para

aplicação de cada edição, o primeiro passo foi selecionar uma obra que

trazia em si, ao menos, um dos temas transversais e, após isso, elabo-

ração de estratégias de publicidade, que contavam com confecção de

cartazes, criação de evento na rede social Facebook, entre outros

meios de divulgação utilizados antes de sua execução.

Como já mencionado, na primeira edição foi selecionado o livro Se-

jamos todos feministas, da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi

Adichie, cuja temática de questões de gênero integra-se ao tema trans-

versal de orientação sexual, já que dois de seus objetivos são:

- identificar e repensar tabus e preconceitos referentes à sexualidade,

evitando comportamentos discriminatórios e intolerantes e analisando

criticamente os estereótipos;

- reconhecer como construções culturais as características socialmente

atribuídas ao masculino e ao feminino, posicionando-se contra discri-

minações a eles associadas; (MEC-SEF, 1998, p. 311).

Na segunda edição, a eleita foi a HQ Pílulas Azuis, de Frederik Pe-

eters; a história de caráter autobiográfico narra o encontro de um casal

sorodiscordante e o convívio com o vírus HIV. Em suma, o tema trans-

versal tratado foi a orientação sexual, que almeja os objetivos a seguir:

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Os (in)sucessos na abordagem de temas transversais no Clube do Livro

131

- conhecer seu corpo, valorizar e cuidar de sua saúde como condição

necessária para usufruir prazer sexual;

[...]

- agir de modo solidário em relação aos portadores do HIV e de modo

propositivo em ações públicas voltadas para prevenção e tratamento

das doenças sexualmente transmissíveis/Aids;

- conhecer e adotar práticas de sexo protegido, desde o início do rela-

cionamento sexual, evitando contrair ou transmitir doenças sexual-

mente transmissíveis, inclusive o vírus da Aids;

[...]

- consciência crítica e tomar decisões responsáveis a respeito de sua

sexualidade. (MEC-SEF, 1998, p. 311-12).

A discussão representou um momento importante, já que era um

espaço propício para o levantamento de um ponto ainda pouco deba-

tido no ambiente escolar: a sexualidade. Nesse viés, a edição foi o

exemplo de como o assunto pode ser abordado, isto é, por meio da vi-

vência de personagens, alertando sobre medidas a serem tomadas

para se usufruir de uma vida sexual saudável, de maneira responsável

e consciente. Além disso, o grupo PET tentou debater os aspectos ca-

racterísticos da HQ, isto é, a função comunicativa (abarcando as con-

dições de produção do gênero, desde aspectos textuais, discursivos a

imagéticos). O desafio era relacionar os aspectos imagéticos e linguís-

ticos para explorar os sentidos evocados, uma vez que juntos adquirem

novo campo de significado e efeito.

Já a terceira edição foi especial, porque foi em homenagem ao

grande escritor gaúcho João Simões Lopes Neto. Essa edição teve duas

aplicações; a primeira ocorreu na Unipampa e a segunda durante a V

Semana Acadêmica de Letras, evento realizado na Biblioteca Pública

Municipal Oscar Furtado de Azambuja, de Jaguarão. Nesta última, re-

cebeu-se a colaboração do Instituto João Simões Lopes Neto sediado

em Pelotas, por meio da doação de livros sobre o autor.

CONCLUSÃO

Ao final das edições do Clube do Livro, o grupo PET Letras realizou

uma análise qualitativa do projeto e constatou que não foi possível

atingir o nível de aprofundamento na discussão acerca dos temas

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Karoline Gasque de Souza e Maria Solange Barbosa da Silva

132

transversais, conforme era esperado. Na época, após reflexão crítica, o

grupo buscou identificar as diversas causas que, de uma maneira ou

outra, contribuíram tanto para os sucessos quanto para os insucessos

do Clube.

A edição acerca do livro Sejamos todos feministas e a em alusão

aos cem anos da morte do pelotense João Simões Lopes Neto, no as-

pecto quantitativo, foram as que tiveram maior sucesso de público, en-

quanto no qualitativo geraram boas discussões. O sucesso da primeira

foi causado por ter sido realizada na época de ocupação estudantil e

pela presença de pessoas participantes de grupos de pesquisa sobre

Feminismo, contando, portanto, com um número expressivo de parti-

cipantes que muitas vezes está em aula no momento de realização do

Clube. Enquanto a segunda foi produto da leitura dramática do conto

e da ambientação do lugar que, certamente, possibilitou aos presentes

uma imersão na cultura gaúcha e suas peculiaridades.

Quanto aos insucessos, é significativo o equívoco que o grupo PET

cometeu ao inserir os temas transversais no projeto Clube do Livro.

Duas foram as principais razões que originaram tal conclusão e estão

intimamente correlacionadas, são elas: primeiramente, a orientação

do CLAA para que o grupo PET contemplasse em seu planejamento de

atividades os temas transversais foi, minimamente, imprecisa, pois,

como se pode perceber na proposta dos PCNs, a transversalidade pre-

sume que questões sociais sejam trabalhadas em todas as disciplinas

na educação básica, isto é, algo inviável para o programa, pois, quando

inserido na escola, dialoga, sobretudo, com as disciplinas relativas às

linguagens; segundo, foi a decisão apressada do grupo de integrar os

temas transversais ao Clube do Livro, dado seu objetivo de formação

do gosto pela leitura contemporânea, embora houvesse um prazo res-

trito para se adequar às exigências do Comitê.

A questão da transversalidade mostrou-se ser um fator de insu-

cesso, uma vez que visa à confluência, como já mencionado, de diver-

sas disciplinas. Sendo o Clube do Livro um projeto de leitura, tal con-

fluência só poderia vir durante as discussões, entretanto, não havia

como garantir que os participantes trouxessem contribuições de ne-

cessariamente todas as áreas do conhecimento. Já que, muitas vezes,

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Os (in)sucessos na abordagem de temas transversais no Clube do Livro

133

o que a obra literária promove é a ressonância, por assim dizer, de vi-

vências, de experiências do leitor, além é claro, de seu repertório de

leituras prévias. Logo, com um curto prazo para reformular o planeja-

mento anual, o grupo não teve o tempo necessário para uma familia-

rização com o conceito de transversalidade que, por si, traz acopladas

questões metodológicas, sendo, portanto, essa união incongruente, o

que culminou na desconfiguração do projeto. Vale lembrar que origi-

nariamente o Clube do Livro previa a discussão de impressões e ideias

despretensiosas, portanto, não acadêmicas, nem de cunho metodoló-

gico.

REFERÊNCIAS

ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Sejamos todos feministas. Tradução

de Christina Baum. São Paulo/SP: Companhia das Letras, 2015.

BETTO, Frei. Alucinado som de tuba. 4.ed. São Paulo/SP: Ática, 1994.

BRASIL. SECRETARIA DA EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâme-

tros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos: apresentação

dos temas transversais, ética. Brasília/DF: MEC/SEF, 1998.

COMITÊ LOCAL DE ACOMPANHAMENTO E AVALIAÇÃO DO PRO-

GRAMA DE EDUCAÇÃO TUTORIAL (CLAA-PET) DA UNIVERSI-

DADE FEDERAL DO PAMPA. Resolução nº 129, de 17 de dezem-

bro de 2015. Disponível em:

<http://porteiras.r.unipampa.edu.br/portais/consuni/fi-

les/2010/06/Res.-129_2015-Comit%C3%AA-Local-de-Acompa-

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09 out. 2017.

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Eric Nepomuceno. v. 1. Porto Alegre/RS: L&PM, 1996.

LOPES NETO, João Simões. Negrinho do Pastoreio. In.______. Con-

tos gauchescos e lendas do sul. 3.ed. Porto Alegre/RS: Globo, 1965,

p. 32 – 37.

MILTON, John. O Clube do Livro e a tradução. Bauru/SP: Edusc,

2002.

QUICK, Matthew. Perdão, Leonard Peacock. Tradução de Alexandre

Raposo. Rio de Janeiro/RJ: Intrínseca, 2013.

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Karoline Gasque de Souza e Maria Solange Barbosa da Silva

134

RIBEIRO, Ana Elisa; CARVALHO, Rafael F. Clube de assinantes de

livros no séc. XXI: o caso do Leiturinha, 40º, 2017, Curitiba. Anais

do 40º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. São

Paulo: Intercom, 2017. Disponível em: <http://portalinter-

com.org.br/anais/nacional2017/lista_area_DT6-PE.htm> Acesso

em: 9 out. 2017.

TORERO, José Roberto; PIMENTA, Marcus Aurelius. Branca de Neve

e as Sete Versões. Rio de Janeiro/RJ: Objetiva, 2011.

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Petianos capacitando saberes

135

Petianos capacitando saberes

Ana Valéria Goulart dos Santos

Pamela Belmutes Pinheiro

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Ana Valéria Goulart dos Santos e Pamela Belmutes Pinheiro

136

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Petianos capacitando saberes

137

objetivo do presente capítulo é historiar e avaliar o projeto

Capacitações PET. Nesse âmbito, atentamos a variados as-

pectos: quantitativo de edições; temáticas escolhidas; o perfil

dos oficineiros; planejamento; tipos de saberes disseminados; vínculo

do projeto com os princípios tutoriais; contribuições à formação aca-

dêmica. Nessa retomada, simultaneamente avaliamos o projeto, des-

tacando consequências positivas, equívocos e sugestões de melhorias.

O projeto de extensão Capacitações PET, realizado na Universi-

dade Federal do Pampa (Unipampa), Campus Jaguarão, iniciou em

março de 2013. Nesse primeiro ano de aplicação, foram realizadas 4

edições: Contação de Histórias, com a Profa. Vera Regina Rodrigues

Ferreira; O que é notícia?, sob responsabilidade da Profa. Dra. Marília

Régio; Revisão Textual, com a Profa. Dra. Vanessa Fonseca Barbosa;

e Improviso, com o ator e diretor Eduardo Alimena.

Já no ano de 2014, ocorreram 7 edições: Oficina de Currículo Lat-

tes na II Semana Acadêmica de Turismo, aplicada pelos bolsistas Fa-

biano Rodrigo Zdradek e Jairo Jime; curso O que é texto?, ministrado

pela ex-tutora do PET Letras, Renata Silva; palestra Tradição Gaúcha,

realizada pelo Prof. João Manuel; e a oficina sobre Photoshop, opor-

tunizada aos petianos pelo bolsista Luis Fernando Silva. A Semana

PET Tecnologia condensava em uma semana oficinas sobre o uso de

ferramentas computacionais. Na época, a ideia de ofertar três oficinas

em caráter concentrado objetivava conquistar mais adesão do público,

que vinha se mostrando escasso nas atividades ofertadas espaçada-

mente. Na referida semana, aconteceram três capacitações: A utiliza-

ção do Word em trabalhos acadêmicos, com o bolsista Luis Fernando

Silva; Funções básicas do Windows Movie Maker, sob a responsabili-

dade da discente Elenice Pacheco Terra; e Como utilizar a nova ver-

são do Moodle (2.6), Videoconferência e Webconferência, ofertada

pela Profa. Dra. Cláudia Camerini Corrêa Pérez.

No ano de 2015, foram realizados 4 eventos: Perspectiva marxista

na educação, promovido pelo Prof. Me. Lauro Borges; Curso de mí-

dias gráficas, ofertado pelo Prof. Me. Gustavo Alcantara Brod; Ensino

e produção textual, título da palestra da Profa. Me. Maria Fuão, na IV

Semana Acadêmica de Letras; e Oficina sobre confecção de planos de

O

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Ana Valéria Goulart dos Santos e Pamela Belmutes Pinheiro

138

aula, ministrada pela Profa. Lisiane Armas. Em 2016, foram realiza-

das somente 2 oficinas: O ensino do português como língua adicional,

aplicada pelo Prof. Dr. Vitor Jochims Schneider; e Literatura em sala

de aula, ofertada pela Profa. Dra. Ana Lúcia Montano Boessio.

Com esse levantamento de atividades realizadas, conseguimos no-

tar a oscilação entre o caráter de ensino e de extensão que o projeto

adquiriu, de acordo com a necessidade e o público. Assim, ressaltamos

que nos momentos em que as atividades eram internas, ou seja, fecha-

das ao público externo e feitas somente para os integrantes do grupo

PET, o projeto assumia a qualidade de ensino. Nesse formato, os mem-

bros se qualificavam para a realização de outros projetos em anda-

mento. Já as capacitações externas eram edições em que a dinâmica

possibilitava a participação da comunidade acadêmica e jaguarense,

por isso, o cunho extensionista nessas ocasiões.

Para o planejamento das oficinas, previamente elencávamos várias

temáticas possíveis e, a partir disso, selecionávamos algumas das op-

ções de acordo com as necessidades momentâneas detectadas pelos

petianos como lacunas na graduação. Alguns temas foram escolhidos

pensando nas atividades desenvolvidas por ministrantes conhecidos

pelos integrantes do grupo PET, outras temáticas ainda precisavam da

identificação de oficineiros, visto que o assunto da oficina estava esco-

lhido, mas não tínhamos de imediato o contato de alguém que possu-

ísse domínio sobre o tema em questão, assim sendo, se iniciava a etapa

de buscar oficineiros qualificados para essa tarefa.

É importante salientar que em princípio a expectativa era poder

oportunizar oficineiros de diferentes grupos sociais e, dessa forma,

atender os diferentes pontos de vista: do aluno da Unipampa, do pro-

fessor da instituição e do morador da comunidade. Contudo, logo per-

cebemos que não seria possível cumprir com o ideal de equivalência

de oficinas por tipo de oficineiros. Avaliando o ocorrido, admitimos

que algumas visões foram mais tematizadas que outras, uma vez que

eram muito mais acessíveis conhecimentos e oficineiros da própria

universidade. Ao explanarmos aqui acerca das oficinas e o modo como

foram selecionadas no projeto Capacitações PET, podemos evidenciar

que essas edições contribuíram para que tivéssemos saberes de ordem

teórica, técnica e artística.

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Petianos capacitando saberes

139

Em relação aos diferentes temas presentes nas oficinas do projeto,

pode-se afirmar, a partir de sondagens, como pesquisas e conversas

informais com os outros grupos PET e também com alunos que parti-

ciparam de algumas edições ofertadas, que os temas apresentados fo-

ram inovadores em nossa universidade. Dessa forma, observamos os

mais variados tipos de saberes com que nós, petianos, tivemos con-

tato, fazendo com que tivéssemos uma formação mais ampla. Com

isso, podemos afirmar que o projeto Capacitações PET alcançou mi-

nimamente os objetivos que tinha desde o início: promover oficinas

sobre temáticas diversas, que englobassem os conhecimentos aqui já

explicitados. E também que oportunizassem o contato contínuo do

grupo PET com pessoas da comunidade acadêmica e externa, e a soci-

alização, no espaço acadêmico, de conhecimentos raramente tratados

nesse meio.

Os saberes socializados nas Capacitações PET também auxiliam os

bolsistas do programa em outros projetos realizados. Em outras pala-

vras, os petianos se instrumentalizam para que outras atividades do

grupo sejam realizadas com mais excelência. Com esse fato, entramos

em outro ponto com que o projeto colabora, isto é, as lacunas da gra-

duação.

Temos a consciência de que existem muitas falhas em uma forma-

ção acadêmica, e o projeto Capacitações PET vem com o intuito de

suprir parcialmente essas lacunas, não somente dos petianos, mas

também dos acadêmicos em geral. Sabemos que é necessário auxílio

para aqueles que possuem conhecimentos rasos sobre algumas tarefas

exigidas em uma graduação, por isso, o projeto procura promover mo-

mentos de práticas envolvendo as normas técnicas existentes no âm-

bito acadêmico e também aprimorar ou apresentar algumas temáticas

de cunho mais artístico, por exemplo: contação de histórias, técnicas

de improviso teatral e tradições gaúchas.

Conclui-se que o projeto aqui abordado é bastante abrangente, pois

abarca os três conhecimentos, citados anteriormente, que são de or-

dem teórica, técnica e artística. Isso significa também que os petianos

são introduzidos em meios diversificados, consequentemente, nossos

conhecimentos tornam-se mais amplos e articulados. Esses conheci-

mentos obtidos nas capacitações podem tranquilamente extrapolar o

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Ana Valéria Goulart dos Santos e Pamela Belmutes Pinheiro

140

espaço formal de aprendizagem da universidade e adentrar nas salas

de aula da educação básica, quando os petianos já estiverem licencia-

dos.

Ao realizarmos o projeto, esperávamos que fosse inovador. O in-

tuito era oportunizar aos discentes contato com diversos assuntos que

circulam pela sociedade, fazendo com que a formação de todos fosse

mais ampla e diversificada. Sabemos que, muitas vezes, os conteúdos

de uma graduação podem se tornar repetitivos e maçantes para os dis-

centes. Esse contato com diferentes saberes mostraria aos alunos que

uma formação pode ser um momento encantador e de grandes desco-

bertas em diversas áreas.

Visando um melhor entendimento dos horizontes das nossas pró-

prias práticas, ou seja, até onde realmente foram oportunizados mo-

mentos de reflexões e práticas inovadoras, sondamos, com perguntas

direcionadas, os demais grupos PET da Unipampa Campus Jaguarão,

vinculados aos Cursos de Pedagogia e Política e Produção Cultural;

quer dizer, perguntamos como eles fazem suas capacitações, explica-

mos como se dão as nossas, e se eles realizam ações parecidas. Assim,

constatamos que as capacitações, tanto internas quanto para a comu-

nidade, são ações recorrentes em todos os grupos. Isso significa que

há uma semelhança entre essas ações, já que os demais grupos PET

fazem capacitações com fins parecidos. Mas de forma alguma é possí-

vel dizer que não seja algo novo aos discentes que participam das ca-

pacitações, se tivermos em vista seus nichos. Para que possamos acla-

rar os tipos de capacitações que utilizamos, vamos conceituar as duas

formas que aplicamos.

As capacitações internas são atividades realizadas para os próprios

petianos, contando, muitas vezes, com a colaboração de pessoas da co-

munidade externa, com o intuito de capacitar os bolsistas antes de re-

alizar a aplicação de qualquer outro projeto do PET; nesse caso, o pro-

jeto se caracteriza como de ensino e almeja a excelência da atuação

petiana. Outro tipo de capacitação realizada é aquela promovida para

pessoas da universidade e também para pessoas da comunidade ja-

guarense, assim, podemos caracterizá-la como sendo integrante de um

projeto extensionista, pois extrapola o ambiente acadêmico e conse-

gue chegar aos moradores da cidade que não estudam na Unipampa.

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Petianos capacitando saberes

141

Como se pode perceber, há uma flexibilidade de natureza do projeto

dependendo do seu público.

As capacitações externas também são realizadas pelos outros gru-

pos PET, com a intenção de divulgar conhecimentos. Notamos uma

grande diferença que ocorre entre as capacitações dos grupos: as te-

máticas; embora os grandes eixos sejam os mesmos, ou seja, formação

técnica, teórica e artística.

O Capacitações PET procura atuar na coletividade, ou seja, busca

integrar o PET e a comunidade acadêmica, utilizando, para isso, os sa-

beres dispersos pela sociedade, de modo que todas as partes logrem

obter novas experiências. Essa ação, como projeto, se faz necessária à

medida que os próprios alunos da Unipampa percebem que a forma-

ção obtida por meio de uma aula formal não é suficiente para a futura

vida profissional. Obviamente, um curso com duração de quatro anos

e meio não teria condições de abordar todos os pontos que cada um

dos seus discentes crê ser necessário para a sua própria formação, en-

tão, para transpor esse obstáculo, o aluno deve “correr por fora”, quer

dizer, procurar por qualificações que estejam além da sala de aula.

Para isso, os acadêmicos se valem de leituras independentes, cursos,

participações em projetos, eventos, pesquisas na área de maior inte-

resse, entre inúmeras outras oportunidades, contudo, como já é de se

esperar, nem todo o graduando age dessa forma.

A partir de então, com vistas, principalmente, às reivindicações

desse público e à impossibilidade de contemplação das diversas áreas

de conhecimento, os petianos empenharam-se em elaborar um projeto

que, na medida do possível, pudesse de alguma forma auxiliar a cons-

truir e/ou qualificar novos conhecimentos. Por outro lado, o projeto

visa, também, uma melhor qualificação dos próprios bolsistas para as

diferentes exigências que os outros projetos do grupo PET Letras apre-

sentam.

Quanto ao público, embora a divulgação seja feita com antecedên-

cia de no mínimo uma semana nas redes sociais do grupo PET Letras

da Unipampa de Jaguarão e afixados cartazes nos murais do campus,

é perceptível que a aderência dos graduandos é muito baixa, fato que

diverge com o dado anterior sobre a demanda vinda pela parte dos

próprios discentes. As informações sobre interesse dos acadêmicos

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Ana Valéria Goulart dos Santos e Pamela Belmutes Pinheiro

142

vêm de conversas em corredores da universidade, o que é falado em

sala de aula e mais formalmente por meio de questionários, feitos al-

gumas vezes para averiguar a vontade deles quanto às futuras capaci-

tações a serem ofertadas.

As temáticas tendem a ser as mais diversificadas possíveis para

agradar a todos os públicos e, obviamente, abranger o máximo de pes-

soas. Além disso, a oferta variada de capacitações visa garantir a pre-

sença de pessoas de dentro da universidade e de fora. Ainda, vale res-

saltar que a participação de pessoas da comunidade externa, alunos e

professores da própria universidade, enquanto oficineiros, é de ex-

trema importância para a execução plena do projeto, pois cada parti-

cipante carrega consigo uma bagagem única de conhecimentos que

pode vir a ser ofertada de forma democrática a todos os interessados

no formato de oficinas.

Cabe aqui uma reflexão sobre o porquê de os alunos solicitarem ter

capacitações e quando são ofertadas não comparecerem. Podemos en-

tender que a mensagem de divulgação chega deturpada ao aluno, pois

os acadêmicos supõem que terão de fazer alguma tarefa difícil. A mai-

oria tem consciência que necessita ou quer alguns desses saberes, po-

rém não se interessa, ou se tem o interesse, não tem tempo, por traba-

lhar, ou estar em alguma outra aula e não poder se ausentar dela.

A baixa participação do público propiciou esse tipo de reflexão, o

que repercutiu no replanejamento do projeto, pois as modificações

que aconteceram visaram aperfeiçoá-lo, para que dessa forma mais

pessoas se integrassem às capacitações. Contudo, notamos que em al-

gumas oficinas o número de participantes foi bastante elevado, isso

nos permite pensar que a pessoa que está ofertando a capacitação é

quem chama o público, porém, não temos, ainda, como afirmar isso,

pois, para tanto, deveria ser feita uma sondagem de informações para

averiguar se é o ministrante ou o assunto que garante a presença do

público.

É importante também pensar que o papel do petiano como multi-

plicador pode ser desenvolvido com excelência no projeto, pois procu-

ramos saber do que os graduandos necessitam e nos capacitamos para

atender às demandas e também temos a oportunidade de promover

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Petianos capacitando saberes

143

oficinas, caso seja pertinente. Esse é um dos princípios do PET, a atu-

ação dos bolsistas como agentes multiplicadores, quer dizer, que seja-

mos capazes de disseminar “novas ideias e práticas entre o conjunto

dos alunos do curso” (MANUAL..., 2006, p.8). Por isso, há grande

atenção com o público, para que a propagação de conhecimentos seja

realmente efetivada, e isso só pode ocorrer quando há uma relação boa

entre os grupos participantes das comunidades já mencionadas.

Outro princípio é o planejamento e a execução de atividades que

se diferenciem das ofertadas na grade curricular dos cursos. Nesse as-

pecto, o Capacitações PET tem agido de forma exemplar, trazendo

para dentro da universidade o que não se tem dentro da sala de aula,

e, por vezes, nem em livros acadêmicos, por exemplo, a capacitação de

improviso teatral com o ator e diretor Eduardo Alimena.

Normalmente, as atividades acontecem na universidade, por moti-

vos de comodidade, já que muitos alunos moram por perto e já fre-

quentam habitualmente esse ambiente, também para que pessoas de

fora da Unipampa participem, pois é um lugar conhecido pela maioria

dos cidadãos jaguarenses. Além do mais, a Unipampa oferece a garan-

tia de materiais básicos para o bom andamento das oficinas, com salas

bem equipadas com projetores e caixas de som.

Ainda assim, podem acontecer capacitações em outros espaços da

cidade, pois é um projeto de extensão que visa integrar a comunidade

à universidade. Além de trazer os cidadãos para a Unipampa, também

é muito interessante levar os acadêmicos para ocupar os espaços ur-

banos disponíveis, mesmo que, desse modo, a logística para a execu-

ção seja mais dificultosa, pois, muitas vezes, teremos de improvisar,

porque, provavelmente, não teremos acesso a toda a aparelhagem tec-

nológica e acomodações disponibilizadas no campus da universidade

Apesar disso, pensamos no futuro do projeto como um cenário

propenso para haver miscigenação, não somente de temas, como tam-

bém de espaços, como sempre foi pretendido. Uma dessas possibilida-

des é repensar a gestão de modo que seja possível a ocupação de locais

da cidade por todos os participantes das capacitações. Essas ações co-

letivas promovem formação mais ampla para o acadêmico e fornecem

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Ana Valéria Goulart dos Santos e Pamela Belmutes Pinheiro

144

novos conhecimentos para as comunidades, contribuindo para am-

pliar os horizontes, fato que resulta em maior responsabilidade social

e um leque de saberes novos.

A experiência que o projeto Capacitações PET proporcionou aos

petianos certamente fez grande diferença em suas formações acadê-

micas e também na qualificação dos participantes das oficinas. Sabe-

res normalmente não cotados para o ensino em sala de aula foram pri-

vilegiados pelas oficinas, isso tudo devido, claro, aos oficineiros, que

se propuseram a propagar conhecimentos vários e também devido à

perspicácia do PET em selecionar temáticas relevantes e diferencia-

das.

Os bolsistas ainda tiveram um maior crescimento de seus conheci-

mentos devido às capacitações internas, que serviram para aperfeiçoar

o planejamento, desenvolvimento e aplicação dos projetos. Estes, a

partir dessas novas bases de competências, eram feitos com toda dili-

gência possível, visando à excelência. Levando em consideração todos

os aspectos citados, para o futuro, teremos o intento de levar o projeto

para outros cenários, ou seja, as capacitações não ocorrerão somente

na universidade.

Atendendo a um dos princípios do Manual do PET, o grupo bus-

cará, a partir das modificações, proporcionar com maior excelência a

formação humanitária não somente para a comunidade acadêmica,

mas para as outras esferas. Presumimos que, dessa maneira, os petia-

nos ampliarão ainda mais os conceitos bases do projeto, como garantir

capacitações sobre os vários saberes e também expandir lugares de

disseminação dos conhecimentos, cooperando, assim, com um com-

prometimento social e interdisciplinar da comunidade jaguarense

junto à comunidade universitária da cidade.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Manual de Orientações Básicas do

PET. Brasília, DF, 2006.

BRASIL. SECRETARIA DA EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâme-

tros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos: apresentação

dos temas transversais, ética. Brasília/DF: MEC/SEF, 1998.

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

145

Tecelaria da Palavra: produzindo o

gênero resumo informativo na

universidade

Millaine de Souza Carvalho

Nathalia Madeira Araujo

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Millaine de Souza Carvalho e Nathalia Madeira Araujo

146

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

147

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa, com base no método Sequência Didática, de-

finido, de acordo com Schneuwly, Dolz e Noverraz, como “[...] um con-

junto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em

torno de um gênero textual oral ou escrito” (2004, p. 83), objetiva

atentar aos resumos informativos escritos pelos alunos do projeto de

ensino Tecelaria da Palavra, com base nos artigos É dando que se re-

cebe, de Leonardo Boff, e Truculência na Internet, de Marcelo Leite.

Ainda, visa contrapor as produções iniciais às finais, de modo a refletir

sobre o método Sequência Didática para o ensino de produção textual.

Este trabalho está vinculado ao projeto de ensino Tecelaria da Pa-

lavra, desenvolvido pelo Programa de Educação Tutorial (PET) Letras

da Universidade Federal do Pampa (doravante Unipampa), Campus

Jaguarão. O projeto buscou oportunizar o aprendizado de gêneros aca-

dêmicos orais e escritos, bem como de normas da Associação Brasi-

leira de Normas Técnicas (doravante ABNT), tais como formatação de

trabalho acadêmico, elaboração de referências e citações.

O primeiro módulo desse projeto compreendeu o gênero resumo

informativo e as normas da ABNT sobre referências, tendo carga ho-

rária de 25 horas/aula (h/a). A primeira edição do Tecelaria da Pala-

vra foi ofertada de julho a agosto de 2013, da qual participaram alunos

do primeiro semestre dos Cursos de Letras, Pedagogia e História da

Unipampa-Jaguarão. Para a sua primeira edição, justifica-se a escolha

de acadêmicos do primeiro semestre tendo em vista que, em grande

proporção, esse público ingressa no ensino superior desconhecendo

aspectos do resumo informativo.

O corpus de análise é constituído por produções de 05 dos 12 alu-

nos participantes do projeto. Como critérios para a escolha de quais

resumos utilizaríamos para a análise, estipulamos ser necessário con-

siderar a frequência dos estudantes no minicurso, a realização das ati-

vidades solicitadas, bem como serem os textos produzidos por alunos

que apresentaram maior dificuldade para a elaboração dos primeiros

resumos.

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Millaine de Souza Carvalho e Nathalia Madeira Araujo

148

Primeiramente, na seção denominada Contextualização, elucida-

remos como se constituiu o Tecelaria da Palavra, quais seus objeti-

vos, sua fundamentação teórica, metodologia utilizada e como ocorreu

a primeira edição do projeto. Logo, em Conhecendo a “Sequência Di-

dática”, explicaremos o conceito gênero discursivo (BAKHTIN, 1992)

e, em seguida, explanaremos acerca do método Sequência Didática,

conforme Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004). No terceiro capítulo,

Resumo informativo: refletindo sobre o método “Sequência Didá-

tica”, atentaremos às produções dos alunos, de modo a ponderar a efi-

cácia da aplicação dessa metodologia para o ensino de produção tex-

tual na universidade. Por fim, traremos nossas considerações finais

acerca do estudo realizado.

CONTEXTUALIZANDO

Tecelaria da Palavra é um dos projetos que integrou as atividades

do PET Letras da Unipampa-Jaguarão. O primeiro minicurso foi ofer-

tado de 08 de julho a 28 de agosto de 2013, ocorrendo duas vezes por

semana, das 17h às 18h30, do qual participaram alunos do primeiro

semestre dos Cursos de Letras, Pedagogia e História da universidade

já mencionada. O curso foi ministrado pelas 04 bolsistas então vincu-

ladas ao PET Letras. Utilizamos, como material de trabalho para o mó-

dulo I, o livro Resumo, de Ana Rachel Machado, Eliane Lousada e Lília

Santos Abreu-Tardelli (2004), o qual se baseia no procedimento se-

quência didática, proposto por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004).

Justifica-se a escolha de acadêmicos do primeiro semestre tendo

em vista que, em grande escala, esse público ingressa no ensino supe-

rior com dificuldades no que se refere à produção do resumo informa-

tivo, basilar à produção de outros gêneros acadêmicos. Para a avalia-

ção do minicurso, foi observado o desempenho das bolsistas do PET

Letras na preparação, divulgação, realização do minicurso, assim

como foram elaboradas fichas avaliativas a serem respondidas pelos

estudantes com o objetivo de ter-se uma avaliação do curso pela ótica

desses acadêmicos.

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

149

CONHECENDO A SEQUÊNCIA DIDÁTICA

No presente item, iremos expor o referencial teórico utilizado para

elaboração deste trabalho. Partindo do princípio de que no projeto Te-

celaria da Palavra abordou-se o gênero resumo informativo como

textual/discursivo, explicaremos o conceito de gênero para Bakhtin

(1992). Ainda, explanaremos acerca do método Sequência Didática,

proposto por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004).

De acordo com Bakhtin (1992), a língua se realiza através de enun-

ciados orais ou escritos. Conforme o autor, todo enunciado é dialógico,

afinal, ao enunciarmos, visamos um determinado interlocutor, ou

seja, nossas palavras se realizam na interação eu/outro. Ainda, para

esse filósofo, um enunciado constitui-se a partir de outros enunciados

preexistentes e ocorrem em diferentes esferas da atividade humana.

A partir de uma dada esfera, então, utilizamos a língua, através de gê-

neros, para enunciarmos. Cada esfera produz gêneros específicos. A

partir da teoria dialógica, Fiorin afirma que

[o]s gêneros são, pois, tipos de enunciados relativamente estáveis, ca-

racterizados por um conteúdo temático, uma construção composicio-

nal e um estilo. Falamos sempre por meio de gêneros no interior de

uma dada esfera da atividade. O gênero estabelece, pois, uma interco-

nexão da linguagem com a vida social. A linguagem penetra na vida por

meio dos enunciados concretos e, ao mesmo tempo, pelos enunciados

a vida se introduz na linguagem (2006, p. 61).

As três características ligadas intrinsecamente à conceitualização

de gênero para Bakhtin são: o conteúdo temático, o estilo e a constru-

ção composicional, as quais são marcadas pela especificidade de cada

esfera de comunicação. O conteúdo temático é o domínio de sentido

que perpassa o gênero, ao passo que a construção composicional se

refere aos elementos estruturais que compõem um dado enunciado,

enquanto o estilo é uma seleção de meios linguísticos. Bakhtin (1992)

organizou os gêneros em dois tipos, os gêneros primários e os gêneros

secundários. Tal fato deu-se em função da heterogeneidade dos gêne-

ros do discurso. Os gêneros primários, de caráter “simples”, são aque-

les produzidos em situações cotidianas, as quais nos permitem uso

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Millaine de Souza Carvalho e Nathalia Madeira Araujo

150

mais imediato da linguagem, como o gênero bilhete. Os gêneros se-

cundários, de caráter mais “complexo”, são aqueles elaborados em es-

feras de comunicação formais. Nesses gêneros, em geral escritos, uti-

liza-se linguagem formal. Ainda, cabe salientar que, para Bakthin,

[...] muitos gêneros secundários, no seu processo de formação, absor-

vem e reelaboram diversos gêneros primários. Muitos gêneros nascem

de hibridismos de outros gêneros, primários ou não [...]. Além disso,

os gêneros secundários costumam “representar” diferentes formas da

interação cotidiana, pela incorporação de gêneros primários. (RODRI-

GUES, 2007, p. 169)

A partir da noção de gênero, explicaremos o método Sequência Di-

dática. Afinal, este se dá a partir de um gênero oral ou escrito especí-

fico. Conforme Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), “[u]ma ‘seqüência

didática’ é um conjunto de atividades escolares organizadas, de ma-

neira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito” (p.

97). Esse procedimento compreende as seguintes etapas: 1ª – Apre-

sentação da situação, 2ª – Produção inicial, 3ª – Módulos e 4ª – Pro-

dução final. O quadro abaixo exemplifica tais procedimentos:

Figura 1 – Esquema da sequência didática (DOLZ; NOVERRAZ;

SCHNEUWLY, 2004, p. 98)

A primeira etapa, denominada Apresentação da Situação, objetiva

preparar os alunos para realizar a produção inicial, a qual será a pri-

meira tentativa de produção do gênero solicitado. Nessa etapa, apre-

senta-se a tarefa solicitada. Assim, é necessário explicar aos alunos

qual gênero deverão produzir, a quem se destina, qual seu formato,

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

151

ademais de ser necessário organizar e expor aos estudantes quais de-

veram ser os conteúdos do gênero a ser elaborado.

Na segunda etapa, solicita-se que os estudantes produzam a pri-

meira versão do gênero em questão. A partir da produção inicial, ela-

boram-se os módulos, que se constituem em conjuntos de atividades

que visam à melhoria da primeira produção textual, os quais devem

atentar, minuciosamente, às dificuldades apresentadas pelos alunos;

a cada módulo, é possível solicitar uma nova reescrita. É importante

destacar que a quantidade de módulos varia de acordo com as dificul-

dades visíveis nas produções. Após os módulos, o gênero é reelaborado

na quarta etapa, denominada Produção final.

As sequências didáticas são um procedimento que se centra “nas

dimensões textuais da expressão oral e escrita”, oportunizam “mate-

rial rico em textos de referência, escritos e orais, nos quais os alunos

possam inspirar-se para suas produções”; e são modulares (p. 81-2). A

Sequência Didática centra-se nas seguintes escolhas: 1ª – Escolhas

pedagógicas: essas permitem o controle do processo de ensino-apren-

dizagem, propiciam que os alunos vejam-se enquanto autores, aumen-

tam a aprendizagem através de um método diversificado; 2ª – Esco-

lhas psicológicas: o procedimento coloca o aluno perante a complexi-

dade envolta na produção textual, diferentes instrumentos de lingua-

gem são usados; 3ª – Escolhas linguísticas: são produzidos textos e

discursos; percepção das diferentes funções da linguagem; aprendiza-

gem de gêneros (SCHNEUWLY; DOLZ; NOVERRAZ, 2004).

RESUMO INFORMATIVO: REFLETINDO SOBRE O MÉTODO

“SEQUÊNCIA DIDÁTICA”

Nesta seção, analisaremos a produção inicial dos participantes do

1º (primeiro) módulo (2013) do projeto de ensino Tecelaria da Pala-

vra em contraponto à produção final. O primeiro resumo, produzido

a partir do texto É dando que se recebe, de Leonardo Boff, foi elabo-

rado pelos acadêmicos a partir de seus conhecimentos prévios sobre

resumo informativo. A partir dessas produções, elaboramos os módu-

los do minicurso.

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Millaine de Souza Carvalho e Nathalia Madeira Araujo

152

Na segunda aula, aclaramos quais os tipos de resumo existentes

(resumo indicativo, resumo informativo e resumo crítico – resenha),

bem como dissemos aos estudantes que, neste módulo, trabalharía-

mos, especificadamente, com resumo informativo. Assim, após as pri-

meiras explicações e efetuação do Módulo 1, solicitamos a elaboração

de um resumo informativo com base no artigo Truculência na inter-

net, de Marcelo Leite.

Assim, nos módulos, conforme a metodologia de trabalho da Se-

quência Didática, desenvolvemos cada problemática existente na pri-

meira versão do resumo entregue pelos estudantes, a saber: processo

de sumarização das ideias presentes no texto; compreensão global do

texto; localização e explicitação das relações existentes entre as infor-

mações principais; menção ao autor; atribuição de atos ao autor; reca-

pitulação dos procedimentos a serem considerados durante a produ-

ção do resumo. Também se dedicou três aulas para, exclusivamente,

trabalhar-se com dificuldades de caráter textual, linguístico, como es-

trutura do parágrafo, da oração, da frase, problemas de acentuação; e,

por fim, abordou-se o processo de elaboração de referências de acordo

com a ABNT.

ANALISANDO AS PRODUÇÕES INICIAIS

Primeiramente, para organização dos dados a serem analisados,

explicitaremos, em tabelas, as problemáticas encontradas nas produ-

ções iniciais dos alunos.

PROBLEMAS APRESENTADOS NAS PRODUÇÕES INICIAIS: É

DANDO QUE SE RECEBE, DE LEONARDO BOFF

Aluno A

Carência de explicita-

ção das relações exis-

tentes entre as ideias

apresentadas

“Os bens materiais quando utilizados para aju-

dar quem necessita também gera frutos. Ajudar

quem necessita enriquece o espírito e traz con-

sigo felicidade interior.”

Falta de menção ao

autor do texto

“Boff acredita que para nos tornamos indivíduos

melhores precisamos compartilhar o amor e a

nossa dedicação com outras pessoas, assim expe-

rimentaríamos o enriquecimento espiritual.”

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

153

Dificuldades para

atribuição de atos ao

autor do texto resu-

mido

“Logo, o filósofo incentiva o ato de doar pois só

assim podemos receber, provando a citação de

São Francisco: “é dando que se recebe.”

Problemas de para-

grafação

Apresenta o texto em parágrafo único.

Problemas de pontua-

ção, acentuação e

concordância

“[...] assim experimentaríamos o enriquecimento

espiritual.”

“Os bens materiais quando utilizados para aju-

dar quem necessita também gera frutos.”

Inserção de informa-

ções não explicitadas

anteriormente

“Leonardo Boff fazendo uso de um tópico da ora-

ção de São Francisco pela paz, onde Santo excla-

mou: ‘é dando que se recebe’, fez relação entre a

doação de bens materiais e bens espirituais.”

Ocorrência de Plágio Não houve ocorrência.

Ausência de introdu-

ção

“Leonardo Boff fazendo uso de um tópico da ora-

ção de São Francisco pela paz, onde Santo excla-

mou: ‘é dando que se recebe’, fez relação entre a

doação de bens materiais e bens espirituais.”

Elaboração de

referência

Não elaborou referência.

Aluno B

Explicitação das

relações existen-

tes entre as

ideias apresenta-

das

“Portanto, urge incorporar, de forma vigorosa, a eco-

nomia dos bens espirituais à economia dos bens ma-

teriais. Só assim restabelecendo a reciprocidade do

dar e do receber. Tendo assim mais sentido partilhar

do que acumular, reforçar o bem viver de todos. Ou

levamos da terra? Apenas os bens do capital espiritual

e nada do material.”

Falta de menção

ao autor do texto

“Portanto, urge incorporar, de forma vigorosa, a eco-

nomia dos bens espirituais à economia dos bens ma-

teriais”.

“Portanto, é ‘dando que se recebe’ nas palavras Leo-

nardo Bofe.”

Dificuldades

para atribuição

“Como ele fala nosso drama é que não aprendemos

nada de natureza.”

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154

de atos ao autor

do texto

resumido

Problemas de

paragrafação

“O importante mesmo é dar, dar e mais uma vez dar.

Assim se recebe. Comprovando a verdade franciscana

segundo o que é ‘dando que recebe’ ininterrupta-

mente amor, reconhecimento e perdão.”

Problemas de

pontuação, acen-

tuação e concor-

dância

“Se alguém da sem prudência e esbanja perdularia-

mente acaba na falência.”

“[o]u seja, nas palavras do autor quanto mais você se

doa mais você recebera de volta, amor, carinho e cres-

cerá ainda mais como pessoa.”

“Como ele fala nosso drama é que não aprendemos

nada de natureza.”

Inserção de in-

formações não

explicitadas an-

teriormente

“Compreendemos este paradoxo se atentarmos para a

estrutura de base do ser humano.”

Ocorrência de

Plágio

“Estamos em tempos de montagem de governo. Há

disputas por cargos e funções por parte de partidos e

de políticos. Neste contexto, se ouve citar um tópico

da inspiradora oração de São Francisco ‘é dando que

se recebe’. Mas desprezamos estes desvios e vejamos

seu sentido verdadeiro.”

“Há duas economias: a dos bens materiais e dos bens

espirituais. Elas seguem lógicas diferentes, economi-

camente.”

“Como ele fala nosso drama é que não aprendemos

nada de natureza.”

Ausência de

introdução

“Estamos em tempos de montagem de governo. Há

disputas por cargos e funções por parte de partidos e

de políticos. Neste contexto, se ouve citar um tópico

da inspiradora oração de São Francisco ‘é dando que

se recebe’. Mas desprezamos estes desvios e vejamos

seu sentido verdadeiro.”

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

155

Elaboração de

referência

Não elaborou referência.

Aluno C

Explicitação das

relações existentes

entre as ideias

apresentadas

“Mas devemos dar sem a intenção de retorno, que aí

ele se multiplica e se torna mais humanizado.”

Falta de menção

ao autor do texto

“Já a economia espiritual crê que as coisas funcio-

nam como diz a oração de São Francisco do Assis –

é dando que se recebe- pois quanto mais damos

amor, carinho atenção, estaremos recebendo mais

do que se deu.”

Dificuldades para

atribuição de atos

ao autor do texto

resumido

Em seu resumo, o aluno C se reportou somente duas

vezes ao autor do texto resumido, utilizando de

modo coerente verbos que expressassem a ação do

escritor dentro do texto.

Problemas de

paragrafação

Apresenta parágrafos de 2 (duas) e 3 (três) linhas,

como em:

“Mas devemos dar sem a intenção de retorno, que ai

ele se multiplica e se torna mais humanizado.”

“Boff diz: “O importante mesmo é dar, dar e mais

uma vez dar.”

Problemas de pon-

tuação, acentuação

e concordância

“A economia material acredita que temos que guar-

dar tudo o que possuímos para cada vez ter mais,

pois se dermos algo ficaremos com menos.”

“Já a economia espiritual crê que as coisas funcio-

nam como diz a oração de São Francisco do Assis

[...]”

Inserção de infor-

mações não expli-

citadas anterior-

mente

“Mas devemos dar sem a intenção de retorno, que ai

ele se multiplica e se torna mais humanizado.”

Ocorrência de

plágio

Não houve plágio.

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156

Ausência de

introdução

“Leonardo Boff afirma que existem duas economias,

porém com lógicas diferentes.”

Elaboração de

referência

Não elaborou referência.

Aluno D

Explicitação das re-

lações existentes en-

tre as ideias apresen-

tadas

“No texto de Leonardo Boff, ‘É dando que se re-

cebe?’ o autor usa a citação de São Francisco, para

abranger dois tipos de economias: a dos bens ma-

teriais e a dos bens espirituais.”

Falta de menção ao

autor do texto

“Ele menciona o fato de tudo tirarmos da terra

[...]”

Dificuldades para

atribuição de atos ao

autor do texto resu-

mido

“Ele menciona o fato de tudo tirarmos da terra

[...]”

Problemas de para-

grafação

Apresenta parágrafos com 3 (três) e 4 (quatro) li-

nhas.

“Ele menciona o fato de tudo tirarmos da terra,

de recebermos e nada darmos, da falta de recipro-

cidade que levou a terra ao seu desiquilíbrio

atual.”

“O teólogo mostra a importância de incorporar a

economia dos bens espirituais a economia dos

bens materiais.”

“Leonar Boff termina seu texto declarando, que o

importante mesmo é dar, pois assim se recebe e se

comprova a verdade franciscana, é dando que se

recebe.”

Problemas de pon-

tuação, acentuação e

concordância

“Leonardo Boff termina seu texto declarando

[...]”

Inserção de infor-

mações não explici-

tadas anteriormente

“Autor de vários livros, inclusive na área da espi-

ritualidade, ele diz que o dar desinteressado pro-

duz um efeito espiritual espantoso que é sentir-se

mais enriquecido.”

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

157

Ocorrência de

plágio

“[...] quanto mais você dá bens, roupas, casas,

terras e dinheiros, menos você tem.”

“[...] quanto mais dá, mais recebe, quanto mais

entrega mais tem.”

“[...] o dar desinteressado produz um efeito espi-

ritual espantoso que é sentir-se mais humanizado

e enriquecido.”

“[...] o importante mesmo é dar, pois assim se re-

cebe e se comprova a verdade franciscana, é

dando que se recebe.”

Ausência de

introdução

Apresenta introdução.

Elaboração de

referência

Não elaborou referências.

Aluno E

Explicitação das rela-

ções existentes entre as

ideias apresentadas

Não apresentou.

Falta de menção ao

autor do texto

“Muitas vezes se recebe mais do que se dá, te-

mos exemplos de tantas pessoas que dão

tempo, dedicação e bens para ajudar necessita-

dos [...]”

“O dar torna-se muito mais valioso que o rece-

ber, dando é que nos enriquecemos espiritual-

mente.”

Dificuldades para atri-

buição de atos ao autor

do texto resumido

Não apresentou.

Problemas de

paragrafação

Apresenta parágrafos com 2 (duas), 3 (três) ou

4 (quatro) linhas:

“No primeiro caso, quanto mais bens materiais

você dá, menos você terá.”

“No segundo caso, quanto mais dá, mais re-

cebe, quanto mais você se doa como pessoa,

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158

mais reconhecimento você ganhar como ser hu-

mano.”

“O autor cita como exemplo: O amor, quanto

mais amor se dá, mais ele se multiplica.”

Problemas de pontua-

ção, acentuação e

concordância

“Segundo Leonardo Boff, nos tempos de hoje

existem muitas disputas de governo e partidos

políticos por poder.”

“Eles vêm sempre com as mesmas propostas

de melhorar com o interesse do voto.”

“O dar torna-se muito mais valioso que o rece-

ber [...]”

Inserção de informa-

ções não explicitadas

anteriormente

“Eles vêm sempre com as mesmas propostas

de melhorar com o interesse do voto.”

Ocorrência de plágio “[h]averia menos opulência nas mãos de pou-

cos e muitos sairiam da carência e poderiam

beber [...]”

Ausência de

introdução

“Segundo Leonardo Boff, nos tempos de hoje

existem muitas disputas de governo e partidos

políticos por poder.”

Elaboração de

referência

Não elaborou referência.

ANALISANDO AS PRODUÇÕES FINAIS

PROBLEMAS APRESENTADOS NAS PRODUÇÕES FINAIS:

TRUCULÊNCIA NA INTERNET, DE MARCELO LEITE

Aluno A

Explicitação das re-

lações existentes en-

tre as ideias apre-

sentadas

“O autor menciona no texto que não acha justo

que apenas uma parcela seja processada, uma vez

que milhões de pessoas fazem esta prática [...]”

“Ele alerta para as consequências com a despopu-

larização dos artistas ou a criação de novos pro-

gramas, já que a internet é uma forma de conectar

pessoas ao mundo inteiro.”

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

159

Menção ao autor do

texto

“Marcelo Leite publicou [...]”

“O autor menciona [...]”

“Ele alerta [...]”

“O colunista sugeri [...]”

Atribuição de atos

ao autor do texto re-

sumido

“Ele alerta para as consequências com a despopu-

larização dos artistas ou a criação de novos pro-

gramas [...]”

“O autor menciona no texto que não acha justo

que apenas uma parcela seja processada no texto

que não acha justo que apenas uma parcela seja

processada [...]”

Paragrafação O texto foi escrito em parágrafo único.

Pontuação, acentua-

ção e concordância

Ainda apresenta problemas linguísticos:

“O autor menciona no texto que não acha justo

que apenas uma parcela seja processada [...]”

Inserção de infor-

mações não explici-

tadas anteriormente

Ainda apresentou problemas relativos à inserção

de informações não mencionadas anteriormente:

“Ele alerta para as consequências com a despopu-

larização dos artistas ou a criação de novos pro-

gramas [...]”

Ocorrência de

plágio

Não houve ocorrência.

Presença de

introdução

Apresenta introdução:

“Marcelo Leite publicou o texto ‘Truculência na

Internet’, falando sobre o ato que a indústria fono-

gráfica norte-americana tomou contra algumas

pessoas que baixam músicas, protegidas por di-

reito autorais, na internet.”

Elaboração de

referência

Não elaborou referências.

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160

Aluno B

Explicitação das re-

lações existentes en-

tre as ideias apresen-

tadas

Ainda apresenta dificuldades para explicitação

das relações existentes entre as ideias apresenta-

das:

“Leite comenta a ação que pode ser meio peri-

goso pode não ter a finalidade desejada.”

Menção ao autor do

texto

“O editor Marcelo leite, traz [...]”

“Leite comenta [...]”

“O autor fala [...]”

Atribuição de atos ao

autor do texto resu-

mido

Apresenta dificuldade para selecionar verbos

para atribuição de atos ao autor do texto resu-

mido:

“O editor Marcelo leite, traz [...]”

“O autor fala [...]”

Paragrafação Não há boa estruturação dos parágrafos. Apre-

senta parágrafos com somente 2 (duas) linhas e

parágrafo em que ocorre uma sucessão de ora-

ções.

Pontuação, acentua-

ção e concordância

Ainda apresenta problemas linguísticos:

“O autor Marcelo Leite, traz no artigo Truculên-

cia na Internet a ação tomada pela indústria fo-

nográfica americana [...]”

Inserção de informa-

ções não explicitadas

anteriormente

Ainda apresenta dificuldades no que refere à in-

serção de informações não explicitadas anterior-

mente:

“O autor fala da nova ciência da rede e comenta

que poderia ser criada uma nova forma de lucrar

com essa tecnologia.”

Ocorrência de plágio Não houve ocorrência.

Presença de

introdução

“O autor Marcelo Leite, traz no artigo Truculên-

cia na Internet a ação tomada pela indústria fo-

nográfica americana de processar um número pe-

queno de internautas [...]”

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

161

Elaboração de

referência

Não elaborou referências.

Aluno C

Explicitação das

relações existentes

entre as ideias

apresentadas

Há uma melhora significativa no uso dos conectores

para explicitar a relação entre as ideias apresentadas

pelo aluno:

“Seria uma ação quase impossível, pois como iriam

achar toda essas pessoas espalhadas pelo mundo”.

“Ele também afirma que os marketing deveriam

criar uma maneira de ganhar dinheiro com as novas

redes.”

Menção ao autor

do texto

Ocorrem poucas menções ao autor do texto resu-

mido:

“O colunista afirma [...]”

Atribuição de

atos ao autor do

texto resumido

Apresenta dificuldade para selecionar verbos para

atribuição de atos ao autor do texto resumido:

“O presidente da associação da indústria fonográ-

fica dos Estados Unidos descorda do autor, ele acre-

dita que só através da justiça poderá ver-se o fim

dessas atividades ilegais e as quais resultam em

grandes prejuízos.”

Paragrafação Apresenta singelas melhoras na elaboração de pará-

grafos.

Pontuação, acen-

tuação e concor-

dância

Ainda apresenta problemas linguísticos:

“O presidente da associação da indústria fonográ-

fica dos Estados Unidos descorda do autor [...]”

“Ele também afirma que os marketing deveriam

criar uma maneira de ganhar dinheiro com as novas

redes.”

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162

Inserção de infor-

mações não expli-

citadas anterior-

mente

Ainda apresenta dificuldades no que refere à inser-

ção de informações não explicitadas anteriormente:

“Ele também afirma que os marketing deveriam

criar uma maneira de ganhar dinheiro com as novas

redes.”

Ocorrência de

plágio

Não há ocorrência.

Presença de

introdução

Apresenta introdução:

“O texto truculência na internet de Marcelo leite,

traz a tona o assunto de que a indústria fonografia

norte-americana deu início a processos contra pes-

soas que baixam músicas da internet, protegidas por

direitos autorais.”

Elaboração de

referência

Não elaborou referências.

Aluno D

Explicitação das

relações existen-

tes entre as

ideias apresenta-

das

Apresenta explicitação das relações existentes entre

as ideias apresentadas.

“Inicialmente ele argumenta seu apoio ao direito au-

toral. Mas, mesmo reconhecendo esse direito [...]”

“Segundo o autor, as chances de ser processado pela

indústria é remota e faz com que as mesmas [...]”

Menção ao au-

tor do texto

“Marcelo Leite inicia [...]”

“Inicialmente ele argumenta [...]”

“[...] Leite faz considerações [...]”

“Segundo o autor [...]”

“Leite conclui [...]”

Atribuição de

atos ao autor do

texto resumido

O aluno apresenta melhoras no que se refere à inter-

pretação das ações desempenhadas pelo autor dentro

do texto:

“Inicialmente ele argumenta [...]”

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

163

“[...] Leite faz considerações [...]”

“Leite conclui [...]”

Paragrafação Apresentou apenas um parágrafo fora dos parâme-

tros esperados:

“Segundo autor, as chances de ser processado pela

indústria é remota, e faz com que as mesmas sejam

cada vez mais detestadas pelos jovens.”

Pontuação,

acentuação e

concordância

Não apresentou problemas de acentuação e concor-

dância. Houve apenas uma incidência de não uso de

vírgula.

“Leite conclui que apesar de serem sido inteligentes

em processar os grandes distribuidores controlar a

pratica de cópias [...]”

Inserção de in-

formações não

explicitadas an-

teriormente

Não houve inserção de informações não explicitadas

anteriormente.

Ocorrência de

plágio

Não houve ocorrência.

Presença de

introdução

Apresenta introdução:

“No artigo ‘Truculência na Internet’, publicado pela

Folha de São Paulo, em 2003, Marcelo Leite inicia fa-

lando do processo judicial que a indústria fonográfica

norte-americana iniciou contra pessoas que baixaram

músicas protegidas por direitos autorais [...]”

Elaboração de

referência

Não elaborou referências.

Aluno E

Explicitação

das relações

existentes en-

tre as ideias

apresentadas

“Segundo o colunista, os empresários foram inteligentes

e começaram a atacar aquelas pessoas que fazem cópias

para distribuí-las.”

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164

Menção ao au-

tor do texto

“De acordo com o texto [...]”

“O autor diz [...]”

“Segundo o colunista [...]”

Atribuição de

atos ao autor

do texto resu-

mido

“O autor diz [...]”

“Conclui o jornalista [...]”

Paragrafação O aluno ainda apresentou dificuldades quanto à organi-

zação dos parágrafos. Todavia, ocorreram melhorias.

1 ° Parágrafo:

“De acordo com o texto truculência na internet publi-

cado no jornal a folha de São Paulo no dia 21 de setem-

bro de 2003, escrito por Marcelo Leite a indústria

norte-americana deu início a muitos processos judiciais

contra pessoas que infringem os direitos autorais de ar-

tistas, escritores, etc... e baixam da internet suas obras.”

3° Parágrafo:

“Segundo o colunista, os empresários foram inteligentes

e começaram a atacar aquelas pessoas que fazem cópias

para distribuí-las.”

Pontuação,

acentuação e

concordância

O aluno E ainda apresenta problemas linguísticos:

“De acordo com o texto truculência na internet publi-

cado no jornal a folha de São Paulo no dia 21 de setem-

bro de 2003, escrito por Marcelo Leite a indústria

norte-americana deu início a muitos processos judiciais

contra pessoas que infringem os direitos autorais de ar-

tistas, escritores, etc... e baixam da internet suas obras.”

Inserção de in-

formações não

explicitadas

anteriormente

Não apresentou inserção de informações não explicita-

das anteriormente.

Ocorrência de

Plágio

Não houve ocorrência.

Presença de

introdução

O aluno E apresentou melhoras na elaboração de sua

introdução:

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

165

“De acordo com o texto truculência na internet publi-

cado no jornal a folha de São Paulo no dia 21 de setem-

bro de 2003, escrito por Marcelo Leite a indústria

norte-americana deu início a muitos processos judiciais

contra pessoas que infringem os direitos autorais de ar-

tistas, escritores, etc... e baixam da internet suas obras.”

Elaboração de

referência

Não elaborou referências.

Observando os dados apresentados nas tabelas presentes acima, a

partir das análises realizadas, podemos constatar que houve melhorias

nas produções textuais dos alunos. No que se refere à explicitação das

relações existentes entre as ideias apresentadas, é possível concluir

que somente o aluno B, na produção final, apresentou, ainda, signifi-

cativas dificuldades para localizar, interpretar e explicitar, através de

conectores, qual a relação estabelecida pelo autor entre determinadas

informações.

Entendemos que mencionar o autor do texto a ser resumido, aten-

tar a não inserção de informações não explicitadas anteriormente, ela-

borar introdução ao iniciar-se o resumo e não copiar partes do texto a

ser resumido são questões de cunho mais objetivo e notamos que to-

dos os participantes do projeto obtiveram significativas melhorias

nesses pontos. Todavia, apesar da elaboração de referência ser, tam-

bém, algo de aspecto objetivo, notamos que os alunos não realizaram

a referência do texto resumido.

Assim, ao final do projeto, decidimos ministrar uma aula sobre for-

matação do trabalho acadêmico e outra sobre elaboração de referên-

cias de acordo com a ABNT. No que concerne às atividades de cunho

mais subjetivo, como atribuição de atos ao autor do texto resumido,

entendimento e estudo de questões gramaticais, como pontuação,

acentuação, concordância e estruturação de parágrafos, percebemos

ser 25 horas/aula pouco tempo para trabalhar com todas essas proble-

máticas.

Mesmo tendo sido ministradas aulas exclusivamente sobre essas

temáticas, é possível perceber que o aluno A, apesar disso, elaborou

seu resumo estruturado em somente um parágrafo. O aluno B ainda

apresentou parágrafos com somente 02 linhas e parágrafo em que

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Millaine de Souza Carvalho e Nathalia Madeira Araujo

166

ocorre uma sucessão de orações principais. No resumo do aluno C,

ocorreram singelas melhoras na elaboração de parágrafos, afinal, na

produção inicial, os havia elaborado com duas linhas e/ou sem divisão

entre orações, ao passo que, na produção final, produziu parágrafos

com encadeamento entre as orações. O aluno D apresentou apenas um

parágrafo fora dos parâmetros esperados, enquanto o aluno E ainda

teve dificuldades quanto à organização dos parágrafos, todavia, ocor-

reram melhoras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da realização do 1º (primeiro) módulo do projeto de ensino

Tecelaria da Palavra, em que se abordou elaboração de resumo infor-

mativo e normas da ABNT sobre referências, é possível considerar que

a aplicação do minicurso proporcionou, às bolsistas, melhorias na ex-

pressão oral e escrita, experiências no ensino de produção textual,

aprendizados sobre princípios norteadores de revisão textual. Ainda,

permitiu que os alunos ingressantes se percebessem enquanto escrito-

res, atentassem a questões estruturais, gramaticais, e utilizasse, em

suas produções finais, técnicas de sumarização e métodos parafrásti-

cos.

Desse modo, é possível constatar que o projeto permitiu a ambos

adquirirem aprendizagens de normas da ABNT, autoanalisarem suas

produções escritas, refletindo acerca da produção de textos basilares à

escrita de gêneros acadêmicos, além de propiciar que as bolsistas ad-

quirissem/produzissem conhecimentos de possíveis estratégias de en-

sino desse gênero. Ainda, apesar de sabermos que o minicurso com-

preendeu pouco mais de 20 (vinte) horas de efetivo trabalho com o

gênero resumo informativo, percebemos que ocorreram melhoras nas

produções textuais dos alunos.

Cabe pensar acerca da necessidade da existência de projetos cujo

objetivo seja suprir necessidades advindas dos alunos, sobretudo in-

gressantes, no que concerne à produção de gêneros acadêmicos orais

e/ou escritos. Partindo do princípio de que estudantes da educação

básica pública chegam ao nível superior desconhecendo diversos gê-

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Produzindo o gênero resumo informativo na universidade

167

neros acadêmicos – os quais são exigidos nos componentes curricula-

res – e normas da ABNT necessárias à adequação do texto, cabe sali-

entar quão é relevante a existência de atividades complementares de

graduação, de modo a permitir essas aprendizagens.

Portanto, cabe salientar a importância de o PET Letras proporcio-

nar complementação na formação acadêmica dos bolsistas e dos par-

ticipantes dos projetos, de modo a reafirmar o caráter de multiplicador

de conhecimento associado ao programa. Ademais, reafirmamos a po-

sição de assessoria linguística assumida pelo grupo, proporcionando

aos acadêmicos da Unipampa-Jaguarão a possibilidade de suprirem

suas dificuldades no que se refere a conhecimentos de produção tex-

tual e normas da ABNT, temáticas, muitas vezes, abordadas superfici-

almente nos cursos de graduação.

REFERÊNCIAS

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ção verbal. Traduzido por M. E. G. Gomes Pereira. São Paulo: Mar-

tins Fontes, 1992. p. 277-326.

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SCHNEUWLY, B; DOLZ, J. et al. Gêneros orais e escritos na es-

cola. Traduzido por Roxane Rojo e Glaís S. Cordeiro. Campinas:

Mercado de Letras, 2004. p. 81-108.

FIORIN, J. F. Introdução ao pensamento de Bakhtin. São Paulo:

Ática, 2006.

FURASTÉ, P. A. Referências. In: ______. Normas técnicas para o

trabalho científico: explicitação das Normas da ABNT. 16. ed.

Porto Alegre: Dáctilo Plus, 2013. p. 75-117.

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São Paulo: Parábola Editorial, 2004.

RODRIGUES, R. H. Os gêneros do discurso na perspectiva dialógica

da linguagem: abordagem de Bakhtin. In: MEURER, J. L.; BONI-

ONI, A.; MOTTA- Roth, D. (orgs). Gêneros: teorias, métodos, de-

bates. São Paulo: Parábola Editorial, 2005. p. 152-183.

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Millaine de Souza Carvalho e Nathalia Madeira Araujo

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

169

Projeto Balbúrdia e a criatividade:

fomento e conexão de ideias

Sandro Martins Costa Mendes

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Sandro Martins Costa Mendes

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

171

Neste capítulo apresentamos a criatividade como ferramenta es-

sencial dentro da universidade. Utilizando como exemplo os projetos

Balbúrdia e Balbúrdia na Escrita Criativa, vamos destacar alguns

elementos importantes para a produção de novas ideias, invenções,

criações artísticas, inovações técnicas entre outras. Partindo de condi-

cionantes para a origem de boas ideias, destacadas por Steve Johnson

(2011), vamos identificar uma série de rudimentos que serão capazes

de propiciar o surgimento de inovações e criações.

O projeto Balbúrdia teve origem em 2012. Foram 15 edições no

ano, sempre realizadas às sextas-feiras (geralmente duas por mês).

Cada edição discutiu um tema diferente: Reflexões filosóficas de Vivi-

ane Mosé; Medo; Nuances do Tempo; Humor; Militância; Politica-

mente (in)correto; Fé; Heróis; Amor; Consumo; Infância; Palavra e

criação; Animal Humano; Corpo; Música. Em 2013, houve a edição

especial do Balbúrdia dentro da programação do 1º FALA (Feira Al-

ternativa de Literatura e Artes), promovido pela Sociedade Indepen-

dente de Cultura, de Jaguarão, e outras entidades municipais, inclu-

sive a Unipampa, Campus Jaguarão. Em 2018, aconteceu outra edição

especial do Balbúrdia na Universidade Federal de Pelotas em disci-

plina do Mestrado em Artes Visuais.

O Balbúrdia apresenta uma metodologia que se repete em cada

edição: sobre cada temática proposta, trazemos conceitos teóricos de

diferentes áreas, manifestações artísticas, ditos populares, apresenta-

dos através de textos, de vídeos, de fotos, de músicas, de comentários

e de dinâmicas com participação do público. O Balbúrdia não pre-

tende esgotar o tema apresentado, apenas trazer pontos de vista em

relação a ele, geralmente através de fragmentos, quebras no ritmo,

mudanças rápidas de textos e de formas de apresentação, rupturas de

ideias e, por vezes, conceitos e visões opostas sobre o assunto em

pauta, sem haver identificação com uma visão por parte dos apresen-

tadores. A condução do evento sempre foi coletiva, com os coordena-

dores se intercalando nas leituras e comentários, juntamente com alu-

nos voluntários e bolsistas do projeto também participando da execu-

ção. O espaço do evento costuma mudar, tanto de lugar como de es-

trutura, tendo, inclusive, apresentadores em diversos lugares da sala.

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Sandro Martins Costa Mendes

172

O Balbúrdia na Escrita Criativa apareceu em 2015, dentro das ati-

vidades do PET Letras. Na ocasião, alguns alunos que colaboraram

com o projeto original em 2012 faziam também parte do PET. Para

esse projeto, nos utilizamos do material de três edições do Balbúrdia,

a saber, espaço, tempo e medo. Começávamos com uma edição mais

curta do Balbúrdia (30 a 45 minutos), para, em seguida, propor alguns

exercícios de escrita criativa que levassem em consideração o tema

apresentado.

Nas considerações sobre a criatividade que fazemos abaixo, vamos

usar exemplos do Balbúrdia e do Balbúrdia na Escrita Criativa, ten-

tando demonstrar que através desses projetos propiciamos condições

bastantes para a criatividade nos participantes. A preocupação com a

criatividade se dá no interesse de incentivar futuros profissionais in-

ventivos, prontos a trabalhar com seu espaço, companheiros, e suas

próprias intuições na aplicação dos conhecimentos adquiridos na uni-

versidade e postos à prova em suas atividades profissionais. Não que-

remos individualizar o projeto, pois o interesse maior é discutir sobre

as condições para uma boa ideia e como é possível criá-las (as condi-

ções) não só em projetos, mas, também, em sala de aula.

Para tanto, começamos com um rol de condicionantes da criativi-

dade, propostos por Johnson (2011), e a cada um desses condicionan-

tes, fazemos a ligação com outros autores que discutem a criatividade

e processo criativo e apresentamos, como já dito, acontecimentos e ati-

vidades realizados em algumas das edições do Balbúrdia, mas tam-

bém entendendo o projeto como um todo.

Na obra “De onde vêm as boas ideias”, de Steven Johnson (2011),

autor formado em Letras, estudioso de tecnologia e mídia, há valioso

estudo sobre a criatividade e os elementos que a propiciam, enrique-

cem, desenvolvem e aprimoram. São sete elementos que a seu tempo

influem na criatividade e, em alguns casos, podem ser estimulados em

atividades específicas. Com isso, apresentamos o resumo das ideias de

Johnson e como os projetos Balbúrdia e Balbúrdia na Escrita Cria-

tiva funcionaram como origem e fonte de criatividade na Unipampa,

Campus Jaguarão.

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

173

Os sete condicionantes da criatividade são: “o possível adjacente”,

“redes líquidas”, “a intuição lenta”, “serendipidade”, “erro”, “exapta-

ção” e “plataformas”. Esses condicionantes ou elementos não preci-

sam ser vivenciados a todo momento ou em todas as criações, pelo

contrário, apenas um dos elementos já é possível estimular e propiciar

a criatividade.

O primeiro, o possível adjacente, leva em consideração aquilo

que se tem contextualmente no momento da criação. Examina o tipo

de ambiente que geraria boas ideias, inovações técnicas, possibilida-

des de resolução a problemas. Assim, é comum que essas soluções apa-

reçam em mais de um lugar ao mesmo tempo. Johnson enumera uma

série de invenções e inovações que tiveram vida quase ao mesmo

tempo em lugares diferentes, inclusive, algumas vezes, no mesmo ano.

Claro que aqui, Johnson, como em boa parte do livro, está focando na

criatividade que propicia a inovação, novas descobertas de tecnologia,

além de novas maneiras de interpretar a natureza. Porém, não é difícil

identificar o possível adjacente na criação humana. Então, tanto na

organização da vida (Johnson usa como exemplo a combinação das

células de carbono), quanto em inovações médicas, ou da área de com-

putação, o possível adjacente aparece como um continuum. Johnson

utiliza como analogia uma casa, que vai se construindo magicamente

na medida em que vão sendo abertas as portas encontradas em cada

novo cômodo.

Johnson afirma que

A HISTÓRIA DA VIDA E DA CULTURA HUMANA pode ser contada,

portanto, como a história da sondagem gradual, mas incessante, do

possível adjacente, cada inovação abrindo novos caminhos a explorar

(JOHNSON, 2012, p. 32, grifos do autor).

Porém, o autor ressalta que alguns ambientes são mais propícios

ao possível adjacente, por exemplo, cidades grandes teriam melhores

condições do que cidades pequenas. Da mesma maneira, a web se tor-

nou um meio bastante rico de “portas” a serem abertas.

É por tudo isso que Johnson afirma que o possível adjacente tem a

ver “tanto com limites quanto com aberturas” (p. 34). Esses limites

têm a ver com a tecnologia, as possibilidades de realização em algum

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Sandro Martins Costa Mendes

174

ambiente. Por exemplo, dificilmente um negócio bastante específico

(destinado a um público bastante específico) possa sobreviver em uma

cidade pequena. Hoje em dia se fala comumente em nicho, mas o ni-

cho numa cidade pequena não seria o suficiente para a sobrevivência

do mercado. Além do exemplo comercial, Johnson usa também as li-

mitações tecnológicas. Muitas das ideias tecnológicas só puderam ser

colocadas em prática um bom tempo depois de surgirem, exatamente

por não ser possível sua realização. Nesse sentido, Johnson vai afirmar

que os

avanços tecnológicos (e científicos) raramente escapam do possível ad-

jacente; a história do progresso cultural é, quase sem exceção, a histó-

ria de uma porta que leva a outra, permitindo a exploração de uma sala

do palácio de cada vez (JOHNSON, 2011, p. 34).

Quando se fala em possível adjacente, não estamos pensando ape-

nas na aplicação para inovações tecnológicas, grandes invenções ou

descobertas científicas. No que nos interessa aqui neste trabalho, o

possível adjacente precisa estar de acordo com a criação de projetos

na academia, mas também em relação com a escrita criativa. O projeto

Balbúrdia, por si só, já tinha uma relação forte com a criatividade. A

criatividade era importante no momento da criação de cada edição do

projeto, mas também era um dos objetivos de estímulo aos participan-

tes. O projeto tinha caráter de ensino, inicialmente, pois seria direcio-

nado a alunos de licenciatura, principalmente de Letras, para que no-

tassem que saberes de outras áreas do conhecimento eram tão neces-

sários para entender a linguagem e a educação como aqueles desen-

volvidos nos componentes curriculares do curso, fossem específicos de

Letras ou de Pedagogia. Portanto, é preciso que se entenda a impor-

tância do possível adjacente na criação de projetos, atividades de en-

sino, extensão, mas também em escrita criativa. Johnson ressalta:

TODOS NÓS VIVEMOS dentro de nossas próprias versões do possível

adjacente. Em nossa vida profissional, em nossas atividades criativas,

nas organizações que nos empregam, nas comunidades que habitamos

– em todos esses diferentes ambientes, estamos cercados por novas

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

175

configurações potenciais, novos meios de escapar da rotina (JOHN-

SON, 2011, p. 38, grifos do autor).

O projeto Balbúrdia pretendia gerar o ambiente favorável para a

criação, para a criatividade, para o interesse pelo novo, por novas

ideias, novos campos do conhecimento. Quando Johnson finalmente

pensa em responder à pergunta inicial de que tipo de ambiente geraria

boas ideias, diz que

ambientes inovadores são melhores para ajudar seus habitantes a ex-

plorar o possível adjacente, porque apresentam uma amostra ampla e

diversa de peças sobressalentes – mecânicas ou conceituais – e estimu-

lam novos modos de recombiná-las (2011, p. 39).

Uma das preocupações do Balbúrdia era criar, para cada tema, um

ambiente que estivesse de acordo com aquela proposta de assunto.

Isso nos parecia ser um ponto importante para que os participantes

pudessem ser imbuídos da atmosfera que fez com que os diversos pen-

sadores, artistas e demais autores utilizados nas edições do projeto

houvessem criado seus textos em relação ao tema. Queríamos que os

participantes do Balbúrdia saíssem de suas zonas de conforto, conhe-

cessem pensadores e artistas que, na maioria dos casos, não seriam

estudados em cursos de Letras e licenciaturas. Segundo Johnson, “o

segredo para ter boas ideias não é ficar sentado em glorioso isola-

mento, tentando ter grandes pensamentos. O truque é juntar mais pe-

ças sobre a mesa” (p. 40).

Saturnino de la Torre, que defende um currículo permeado pela

criatividade, afirma:

Quando falo de ensino criativo estou pensando em estratégias basea-

das na aprendizagem relevante, no desenvolvimento de habilidades

cognitivas, em uma atitude transformadora; na organização de ativida-

des inovadoras, flexíveis, motivantes; em uma mediação que leve em

consideração a experiência, a colaboração, a implicação do discente.

Trata-se de enriquecer o método com aquelas características atribuídas

à criatividade (TORRE, 2005, p. 160, grifos do autor).

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Sandro Martins Costa Mendes

176

Para tanto, Torre (2005) aponta que o ensino será flexível e adap-

tativo na medida em que considera as condições de contexto “e orga-

niza a ação atendendo às limitações e às capacidades dos indivíduos”

(p. 160). Torre deixa claro que o método flexível se adapta às pessoas,

mas também ao contexto, assim como já afirmou Johnson (2011)

acima.

Como segundo ponto relativo à criatividade, Johnson aponta as re-

des líquidas. O autor esclarece que, apesar de sempre usarmos me-

táforas para ideias possuidoras de uma noção de faísca, lampejo, cen-

telha ou lâmpada acendendo, na verdade, uma boa ideia é uma rede,

uma constelação específica de neurônios. Assim, uma “nova ideia é

uma rede de células explorando o possível adjacente de conexões que

elas podem estabelecer na nossa mente” (JOHNSON, 2011, p. 41). Fica

claro então que uma ideia não é algo único, mais “parece um enxame”

(p. 41). Importa nessa conexão do nosso cérebro duas precondições:

que a rede tenha um tamanho considerável e que seja plástica, ou seja,

capaz de adotar novas configurações.

Assim que

para tornar nossa mente mais inovadora, temos de inseri-la em ambi-

entes que compartilhem daquele mesmo tipo característico de rede;

isto é, em redes de ideias ou pessoas que imitem as redes neurais de

uma mente que explora os limites do possível adjacente (JOHNSON,

2011, p. 43).

E é por isso que à medida que foi vivendo em comunidade, o ser

humano passou a ter mais oportunidades de criar. Johnson apresenta,

através de uma linha do tempo com as mais importantes criações hu-

manas onde fica evidente o maior número de invenções situadas exa-

tamente quando começaram as primeiras cidades, e a intensificação

das invenções relacionada ao crescimento das cidades. O autor afirma

que “antes da escrita, dos livros, da Wikipédia, a rede líquida das cida-

des preservava a sabedoria acumulada da cultura humana” (JOHN-

SON, 2011, p. 50).

Portanto, a comunicação entre os criadores, a melhoria das ideias,

o compartilhamento dos problemas faz com que a criação encontre aí

um terreno fértil. A universidade, como comunidade de inteligências

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

177

e intenções direcionadas – a uma área do conhecimento, a uma pro-

fissão em formação, ao compartilhamento de ideias e sabedorias, – é,

sem dúvida nenhuma, espaço para a criatividade. Ainda assim, diver-

sas demandas equivocadas, burocracias, enquadramento de pensa-

mento, tarefas de repetição, preenchimento de tempo e esforços mal

empregados e até má vontade acabam por inibir a criatividade. Para

nós que temos contato com a área de Letras não é incomum encontrar

estudantes que entraram no curso por gostar de escrever e de criar

passarem seus anos de graduação com o tempo e esforços preenchidos

por atividades que, além de não incentivarem a criatividade, parecem

afastá-la. Muitas vezes ouvimos a afirmação de alunos em relação a

lerem mais literatura ou a escreverem com maior regularidade antes

de entrarem nos cursos de Letras do que durante o curso.

A rede líquida foi perceptível durante as edições do Balbúrdia. Se

o projeto começou com dois professores e alguns alunos que se propu-

seram a ajudar na logística de realização, passou a ter cada vez mais

participação de alunos, que buscavam material e depois passaram a

criar atividades de ambientação, de dinâmica de grupo e até poesia,

drama, audiovisual. E foi por isso que pensamos ser o formato do Bal-

búrdia perfeito a ser expandido ou adaptado à oficina de escrita cria-

tiva.

O terceiro elemento apontado por Johnson é a intuição lenta. O

autor defende que a criação passa por um tempo de maturação. Não

apenas dentro de uma pessoa, mas por vezes é preciso tempo para que

se encontre com outra intuição e nesse momento é que a ideia surgiria.

Muitas invenções parecem ter sido criadas ao acaso, num momento de

lampejo (como se disse no início deste trabalho), porém, essa fagulha,

essa epifania só foi possível por uma vontade enraizada, uma intuição

que estava hibernando, descansando ou esperando sua hora dentro do

criador, pois

a maioria das grandes ideias se configura primeiro de uma forma par-

cial, incompleta. [...] As redes líquidas criam um ambiente em que es-

sas ideias parciais podem se conectar; formam uma espécie de agência

de encontros para intuições promissoras (JOHNSON, 2011, p. 65).

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Sandro Martins Costa Mendes

178

Na escrita criativa, a intuição lenta também ocorre. Algumas ima-

gens, personagens, ambientes, pequenas tramas vão vivendo dentro

do criador até o momento em que encontram um texto. Bakhtin (2011)

explica que quando o autor cria um personagem, ele nunca é pura-

mente estético, sempre estará identificado em algum grau com pes-

soas que o autor conheceu ou sabe de sua existência. Porém, as ofici-

nas de escrita criativa propiciam o ambiente e a rede líquida que per-

mitem ao criador aproveitar-se de uma intuição lenta.

Fayga Ostrower (2010) encara a inspiração como não sendo algo

surgido nesse lampejo, ou vindo do além. Para a autora,

ocorrem momentos em nossa vida, momentos conscientes, pré-cons-

cientes, de grande intensidade emocional. Eles podem induzir em nós

novas forças, estimular todo nosso ser, trazer novas ideias, reorientar-

nos na vida. Podem oferecer propostas de trabalho, hipóteses de orde-

nação. Mas igual a outras, também essas ideias, propostas, hipóteses

teriam que passar por um processo de elaboração subsequente a fim de

evidenciarem sua validez. Talvez tenham sido ideias inspiradas, e tal-

vez não (OSTROWER, 2010, p. 73).

No trecho acima, Ostrower se demonstra cética em relação à inspi-

ração. Para ela, o conceito de inspiração estaria equivocado e passaria,

por outro lado, por uma “sensibilidade alerta, afetiva, motivada para

determinadas tarefas e dirigida para um fazer específico” (OSTRO-

WER, 2010, p. 73). Ostrower baseia-se em seu entendimento da cria-

tividade e processo criativo como uma atividade consciente, cultural e

de organização de mundo por parte do sujeito criador. Assim, Ostro-

wer se aproxima da ideia de uma inspiração lenta. Talvez não tão cons-

ciente quanto pode parecer na definição de Johnson, mas também de-

terminada por algo já presente no criador, seja em ideia incipiente, em

sensação ou desconfiança em relação a um problema ou a uma tenta-

tiva de solução. A autora ainda complementa essa ideia ao tratar de

tensão psíquica:

O que queremos mostrar é que a criação deriva de uma atitude básica

da pessoa. Não se trata de momentos singulares, “momentos de inspi-

ração”, nem fora nem dentro do trabalho. Mesmo quando o interesse

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

179

imediato centra no problema da expressão de uma experiência subje-

tiva emotiva, ainda se trata da atitude básica da pessoa. A maior im-

portância, por isso, deve ser dada à qualidade do engajamento interior

do indivíduo e à sua capacidade renovadora, isto é, sua capacidade de

se concentrar e de ao retomar o trabalho poder retomar o estado inicial

da criação. [...] O indivíduo não precisa “buscar inspirações”. Ele se

apoia em sua capacidade de intuir nas profundezas de concentração

em que elabora o seu trabalho (OSTROWER, 2010, p. 74, grifos da au-

tora).

Por outro lado, Johnson aponta como seu quarto item a serendi-

pidade, aportuguesamento da palavra da língua inglesa serendipity,

que exprime o poder da conexão acidental. Porém, como explica John-

son, serendipidade

não é apenas uma questão de abraçar encontros fortuitos por puro de-

leite. Ela é feita de felizes coincidências, sem dúvida, porém o que as

torna felizes é o ato de a descoberta ser significativa para quem a fez. A

serendipidade completa uma intuição ou abre uma porta para o possí-

vel adjacente que não havíamos percebido (JOHSON, 2011, p. 91).

O grande desafio, segundo Johnson, é saber como criar ambientes

que propiciem a serendipidade, seja em nossa mente, seja no “âmbito

de instituições mais amplas; e através de informação da própria soci-

edade” (JOHNSON, 2011, p. 92). Individualmente, pode-se perceber

que o banho é um momento que nos tira o foco da vida moderna, e lá

costumam aparecer boas ideias. Outra maneira é usar de passeios, que

servem também para um coletivo de pessoas. Em aulas de diferentes

disciplinas, fiz passeio a pé com os alunos com o objetivo de olharem,

ouvirem ou mesmo cheirarem o mesmo caminho que estavam acostu-

mados a passar, em volta da universidade. A prática de escrita após

essas caminhadas demonstrou o quanto é poderoso esse “passeio cri-

ativo”. Da mesma maneira, em muitas atividades do Balbúrdia e do

Balbúrdia na Escrita Criativa, usamos de movimento em sala de aula,

de atividades de movimentação que não respeitavam o uso comum da-

quele espaço. Inclusive, numa das edições do Balbúrdia, no Balbúrdia

Tempo, as pessoas chegaram e não havia lugar para sentar. Ficaram

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Sandro Martins Costa Mendes

180

de pé e se movimentaram periodicamente durante aquela uma hora de

evento.

Uma das características mais fortes do Balbúrdia era a mudança

brusca de ponto de vista sobre o tema. Isso acontecia por estarmos

sempre mesclando autores e textos, por exemplo, íamos de uma visão

filosófica sobre o humor para um esquete teatral de participante e con-

vidado lendo notícias absurdas sobre a cidade e, em seguida, passáva-

mos à apresentação de vídeo musical e assim que o vídeo terminasse

poderia entrar citação do romance “O nome da rosa”, de Umberto Eco

e as discussões sobre o humor na literatura e a possível obra perdida

de Aristóteles.

Dessa maneira, através da conexão de pontos de vistas distintos, e,

por vezes díspares, a intenção sempre foi mostrar que a interpretação

e o entendimento sobre um tema nunca é algo uníssono, ao contrário,

a pluralidade de vozes é quase sempre padrão. O choque de ideias em

um mesmo ambiente, a diversidade de textos e suportes (vídeo, mú-

sica, textos lidos, opiniões, dinâmicas práticas) eram espaço da cente-

lha, da faísca, de novas interpretações. Uma sala cheia de novas portas.

Ao mesmo tempo, a pluralidade de vozes e a maneira com que tra-

balhávamos cada tema também em diferentes suportes faziam com

que os textos não tivessem a forma de algo a ser entendido, assimilado,

ou que fossem informação dada como resultado de formação, algo a

ser aprendido. Pelo contrário, dotavam o participante do Balbúrdia

como parte ativa da conceituação daquele tema. É o que Torre (2005)

chama de metodologias indiretas, pois baseiam-se na construção do

conhecimento com a participação ativa das pessoas.

O erro é o quinto ponto debatido por Johnson. O autor encara o

erro como momento de se tomar um novo caminho em detrimento da-

quele pretendido inicialmente. Isso se dá quando entendemos que

aquilo visto como uma experiência errada só é assim pois queríamos

uma resolução diferente. Tentamos algo e não conseguimos. Mas tal-

vez o produto que aparece ali nos faça esquecer a solução pretendida

e nos dê solução para outro problema, ou mesmo um novo caminho

para o mesmo problema. Johnson sentencia que a “transformação do

erro em insight revelou-se uma das funções essenciais das reuniões de

laboratório” (2011, p. 115).

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

181

Além do erro surgido de forma fortuita, Johnson ressalta o erro

forçado. Nesse caso, ele fala de ruído, discordância e criatividade em

ambientes de grupo. Uma ação bastante identificada com a criativi-

dade é a livre associação. Quando se pensa em livre associação, quere-

mos que uma palavra ou imagem remeta a outra. Segundo algumas

pesquisas de psicólogos, a associação livre não é tão livre assim. Ao

mostrarmos um cartão verde a um grupo de pessoas e pedir que façam

uma associação livre, que digam o que primeiro lhes vêm à mente,

80% vão falar em grama ou em outra cor. Talvez 20% dirão algo como

dinheiro, bandeira (se pensar na cor predominante da bandeira brasi-

leira), folhagem.

Em alguns Balbúrdias experimentávamos provocar a associação li-

vre, pedindo aos participantes que nos dissessem, por exemplo, uma

palavra amarela, ou uma palavra triste. A grande maioria dava respos-

tas mais evidentes como “sol”, para a palavra amarela, e “choro” para

a palavra triste, ou seja, uma palavra que indicava um astro comu-

mente associado à cor amarela e uma palavra que identificava uma

ação de quem está triste. Mas poderia aparecer “rancor” e “índigo”,

respectivamente. A resposta mais óbvia acontecia quando fazíamos a

pergunta sem ter dado um estímulo antes. Ainda assim, quando al-

guém respondia fora da associação mais esperada, novas associações

inesperadas eram realizadas. O exemplo que dei acima foi uma ativi-

dade na primeira edição do Balbúrdia.

Nesse sentido, quando antes apresentávamos um poema de Ma-

noel de Barros, por exemplo, como fizemos no Balbúrdia Animal hu-

mano, com significados e construções inesperadas para palavras e en-

contro de ideias numa frase, a associação livre encontrava menos bar-

reiras estabelecidas, sendo, portanto, mais “livre”. Isso acontece pelo

ruído. Alguns experimentos sobre criatividade realizados por pesqui-

sadores utilizam-se do ruído e do erro para estabelecer nuances na cri-

atividade e sua interação com ambiente com certa alteração. O mesmo

experimento de pedir associação livre a partir de slides monocromáti-

cos apresentou resultados diferentes quando alguns atores, colocados

entre os pesquisados, passaram a descrever os slides assistidos de ma-

neira inexata, como se fossem de cor diferente, afirma Johnson. Nes-

ses grupos, os cientistas encontraram variação maior de associações

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Sandro Martins Costa Mendes

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livres menos previsíveis como “grama” e outra cor ou mesmo a palavra

“cor”. Aquelas palavras que apareciam relacionadas com apenas 20%

dos pesquisados passaram a aparecer com maior frequência. Ou seja,

quando expostos a descrições errôneas ou inexatas, os sujeitos de pes-

quisa se tornaram mais criativos. A introdução dos atores e de suas

impressões inexatas ou errôneas era o ruído. Assim, os “grupos conta-

minados com informação errônea acabaram fazendo conexões mais

originais que aqueles que só haviam recebido informação correta”

(JOHNSON, 2011, p. 118).

É por isso que um projeto onde se apresentam conceitos diversos e

opostos, em alguns casos, como o Balbúrdia, nos fez crer que tinha um

apelo à criatividade, e foi exatamente esse fator que gerou o interesse

do grupo de participantes. Estes faziam questão de estar presentes nas

duas sextas-feiras por mês em que realizávamos o projeto. O Balbúr-

dia era projeto cheio de ruídos, de erros. Apresentávamos ideias de

pensadores identificados com a direita política, por exemplo, para fa-

lar de movimentos sociais de esquerda, como fizemos no Balbúrdia

Militância. Quando tivemos como tema a relação homens e animais,

no Balbúrdia Animal Humano, convidamos representantes de grupos

de defesa animal, mas também apresentamos a canção “Rock da ca-

chorra”, de Eduardo Dusek, que diz “troque seu cachorro por uma cri-

ança pobre”. Como afirma Johnson, “boas ideias têm maior probabili-

dade de emergir em ambientes que contêm certa quantidade de ruído

e erro” (2011, p. 118).

Johnson (2011) utiliza um termo proposto por biólogos evolucio-

nários para trazer seu penúltimo ponto, a exaptação, referindo-se a

quando um “organismo desenvolve um traço otimizado para um uso

específico, mas depois ele é apropriado para uma função completa-

mente diferente” (JOHNSON, 2011, p. 127). Um exemplo disso, con-

forme Johnson, seria as penas das aves, que inicialmente serviriam

para ajudar na regulação de temperatura e, depois, quando alguns ani-

mais começaram a voar, serviram para controlar o fluxo de ar sobre a

superfície das asas.

Franco Moretti, historiador de literatura, é relembrado por John-

son ao aplicar a importância da exaptação na criação do romance, pois

é comum ver determinado recurso narrativo concebido para atender

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

183

determinada necessidade local e específica de uma obra em desenvol-

vimento e, a partir desse uso, novas necessidades narrativas fazem

com que seja usado de maneira mais ampla. Um exemplo é o fluxo de

consciência, usado pela primeira vez por Édouard Dujardin, como

lembra Jonhson. Nessa primeira aparição, o fluxo de consciência fica

restrito a curtos períodos de introspecção na obra de Dujardin. Déca-

das depois, James Joyce utiliza-se dessa técnica para criar uma obra

inteira: “Ulisses”.

Saturnino de La Torre, quando propõe um currículo permeado pela

criatividade, ressalta a importância de estimular a combinação de ma-

teriais e ideias. Segundo ele, “um ensino criativo leva a variadas com-

binações e ao uso múltiplo dos meios de que se dispõe” (2005, p. 161).

Em nosso caso, o próprio Balbúrdia é exemplo de exaptação. Cri-

ado para provocar a busca por repertório para a atividade docente, fo-

cado inicialmente em alunos de Letras, na licenciatura, em propiciar o

encontro com diferentes áreas do conhecimento unidas ao pensa-

mento popular e à arte, toda a concepção do Balbúrdia se direcionava

a demonstrar aos alunos de Letras que a linguagem vinha sendo tra-

tada por diferentes áreas, em diferentes tempos e que as discussões

acerca de seu uso e existência poderiam estar inseridas nos mais dife-

rentes gêneros textuais e suportes. Apesar de querer influenciar na cri-

atividade dos alunos, inclusive para posteriormente aplicarem em

seus planos de ensino e de aula quando docentes ou em estágio, o Bal-

búrdia alcançou mais do que isso. Primeiro, se mostrou interessante a

um público também diverso, tanto que rapidamente de uma atividade

de ensino passou a atividade de extensão. Suas edições saíram das sa-

las da universidade e passaram pela Casa de Cultura, Centro de Eco-

nomia Popular e Solidária, Biblioteca Pública Municipal, e, em 2018,

o Balbúrdia teve edição especial na Universidade Federal de Pelotas

(UFPel), dentro de componente curricular do Mestrado em Artes Vi-

suais. E, em 2015, o Balbúrdia teve 3 edições especiais com o título de

Balbúrdia na Escrita Criativa. Nessas três edições, pegamos parte dos

materiais utilizados em três edições do Balbúrdia (medo, tempo e es-

paço) e aplicamos como estímulo de escrita criativa. Acrescido de al-

guns exercícios, o Balbúrdia na Escrita Criativa se destinava, naquele

momento, à criação artística e literária.

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Sandro Martins Costa Mendes

184

A criação do Balbúrdia na Escrita Criativa vinha se desenhando

desde que notamos, durante algumas edições do Balbúrdia, que os

alunos começaram a criar textos, esquetes teatrais e poemas relacio-

nados com cada tema. E também pela experiência de um dos nossos

bolsistas, o Sílvio Nunes, estudante de Letras, que começou a escrever

um poema para cada Balbúrdia.

Por último, Johnson fala de plataformas. Utiliza-se da biologia,

mais uma vez, para descrever esse conceito. O que embasa esse con-

ceito é aquele grupo de espécie que não só é importante em seu sis-

tema, denominadas de espécie-chave (aquelas sem as quais se deses-

truturaria um determinado ambiente, por exemplo, um predador que

estando em falta deixaria livre para multiplicação algum outro orga-

nismo que destruiria esse ambiente). Estudiosos entenderam que exis-

tia uma classe de espécies-chave que não só era importante a determi-

nado sistema, como, na verdade, era (essa determinada espécie-chave)

que os construíam. Assim, surgiu a denominação de “construtores de

ecossistemas”. Um exemplo é o castor, que, com a derrubada de árvo-

res e a construção de represas, transforma florestas temperadas em

brejos, atraindo um número extraordinário de outros seres. Johnson

afirma que os “construtores de plataformas e de ecossistemas não ape-

nas abrem uma porta para o possível adjacente. Eles constroem um

novo pavimento inteiro” (2011, p. 151).

No estudo aqui em questão, penso que o grupo PET seria a plata-

forma. Um (a) tutor (a) e eventuais colaboradores docentes, acompa-

nhados de um grupo dedicado de estudantes, todos pensando projetos

de pesquisa, ensino e extensão, acabam por construir esse ecossis-

tema, que vai resultar em uma gama de projetos, ações, atividades que

englobam diversas áreas e podem ser aproveitados por estudantes,

pessoas da comunidade, docentes e servidores em geral. No ecossis-

tema a pesquisa realizada vai se transformar em atividade de ensino

ou extensão, ou uma ação de extensão pode sugerir um projeto de pes-

quisa ou atividade de ensino e, assim por diante.

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Projeto Balbúrdia e a criatividade: fomento e conexão de ideias

185

CONCLUSÃO

O projeto Balbúrdia surgiu da ideia de dois professores que busca-

vam propiciar o encontro de pensamentos sobre um determinado

tema vindos de áreas bastante diferentes, fossem teóricas, artísticas,

sabedoria popular, entre outras. Por contar, já nos primeiros encon-

tros, com a participação de um bom número de voluntários entre os

alunos do curso de Letras da Universidade Federal do Pampa, Campus

Jaguarão, o projeto foi sendo abastecido com as inquietações desse

grupo de alunos, que aproveitavam da oportunidade para colocar em

prática a criatividade.

Como nosso texto tentou provar, a configuração do projeto foi fo-

mento da criatividade, fosse através do espaço e ambiente criados, da

participação do coletivo de pessoas dispostas abertas a descobrir e a

dialogar, ou fosse no processo de continuidade do projeto.

Quando se planejou a criação de um projeto de Escrita Criativa, já

identificado com as atividades do PET Letras, a vinculação com o Bal-

búrdia foi praticamente imediata. Apesar de apenas três edições, mui-

tos textos criativos foram construídos individualmente e coletiva-

mente, visto que em cada Balbúrdia na Escrita Criativa era previsto

um momento de criação coletiva (em grupo, ou com todos os partici-

pantes) e pelo menos dois (mas geralmente mais) momentos de escrita

individual de textos líricos, minicontos ou argumentos e ideias.

Ainda assim, percebemos que não é preciso a criação de um projeto

nos mesmos moldes do Balbúrdia, pois o que é preciso levar em con-

sideração é aproveitar-se de alguns ambientes que a própria universi-

dade já proporciona: a união de vontades, de intuições, da possibili-

dade de experimentar e errar, entre elas. Acreditamos ter demons-

trado ser possível propiciar ambientes para a criação, para a inovação.

Bastando, quase sempre, uma determinação de estar aberto a outras

vozes, outros pontos de vista.

REFERÊNCIAS

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 6ª ed. São Paulo: Edi-

tora WMF Martins Fontes, 2011.

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Sandro Martins Costa Mendes

186

BARTHES, Roland. [PERRONE-MOISÉS, L. trad.] A preparação do

romance, [vol. I e II]. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

JOHNSON, Steven. De onde vêm as boas ideias. Tradução Maria

Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. 25ª ed. Pe-

trópolis: Vozes, 2010.

TORRE, Saturnino de la. Dialogando com a criatividade. Tradução

Cristina Mendes Rodríguez. São Paulo: Madras, 2005.

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Projeto Balbúrdia: escrita criativa no espaço de fronteira

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Projeto Balbúrdia: escrita criativa no

espaço de fronteira

Renata Silveira da Silva

Sandro Martins Costa Mendes

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Renata Silveira da Silva e Sandro Martins Costa Mendes

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Projeto Balbúrdia: escrita criativa no espaço de fronteira

189

Este trabalho apresenta os resultados do projeto de extensão Bal-

búrdia na Escrita Criativa, realizado na Universidade Federal do

Pampa (Unipampa), Campus Jaguarão. O projeto traz estímulos para

a realização de textos de escrita criativa. Em cada encontro há um

tema em foco. No presente trabalho, vamos tratar da edição que teve

como tema o espaço, em que direcionamos para o tema do espaço de

fronteira, tendo em vista que a cidade de Jaguarão está no extremo sul

do Rio Grande do Sul e faz fronteira com a cidade de Rio Branco, no

Uruguai. Portanto, nos interessa investigar sobre o processo de criação

na fronteira e como os encontros e mobilidades culturais interferem

na criação.

Aos poucos, os alunos que faziam parte da execução e planeja-

mento do Balbúrdia começaram a criar textos literários, esquetes tea-

trais e vídeos, tanto para a divulgação do evento, como para serem

apresentados durante cada edição. Isso nos levou a pensar o projeto

como incentivo à criação. Por isso, no final de 2012, fizemos um texto

com esse tema, apresentado no I Encontro de Escrita Criativa1, reali-

zado na PUCRS.

O Balbúrdia teve desdobramentos em projeto de ensino: em 2013,

surgiu o Balbúrdia no Português, jornal didático sobre os temas apre-

sentados no Balbúrdia com propostas de aplicação na escola; e, em

2015, criou-se o Balbúrdia na Escrita Criativa. Esses dois projetos fa-

ziam parte das atividades do Programa de Educação Tutorial (PET)

Letras da Unipampa, Campus Jaguarão, tutoreado, à época, pela pro-

fessora Renata Silva, com a colaboração do professor Sandro Mendes

em alguns projetos.

A proposta do Balbúrdia na Escrita Criativa era utilizar os moldes

do Balbúrdia original, de 2012, como provocação para oficinas de es-

crita criativa. Escolhíamos um tema trabalhado no Balbúrdia, realizá-

vamos em tempo menor (30 a 45 minutos) e depois aplicávamos dois

ou três exercícios de escrita individual e um de escrita coletiva (em

grupos). Por isso, cada encontro tinha um tema.

1 XXVIII Seminário Brasileiro de Crítica Literária, XXVII Seminário de Crí-tica do RS e I Encontro Nacional de Escrita Criativa, 2012, PUCRS.

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Renata Silveira da Silva e Sandro Martins Costa Mendes

190

O tema do espaço apareceu para que se pudesse tratar da escrita de

fronteira. No Balbúrdia, essa temática foi um evento especial, único

realizado em 2013, durante um evento do município de Jaguarão, o

FALA (Feira Alternativa de Literatura e Artes), criado e organizado

por um grupo que continha representantes da Prefeitura, universidade

e grupos da sociedade civil relacionados com as artes. Naquela edição

do Balbúrdia, discutimos sobre espaço através de textos de David

Harvey, Pierre Levy, Gaston Bachelard. Mostramos fotografias que

traziam distorção de espaço, vídeos virais da internet e videoclipes,

além de músicas e poemas.

Na edição de 2015, relatada neste trabalho, apresentamos material

sobre “espaço” e, depois, sobre o “espaço de fronteira”. Começamos

com a música “Frontera”, do cantor e compositor uruguaio Jorge

Drexler. Também apresentamos o conceito de fronteira, retirado de

um artigo de colega professor da Unipampa, Carlos Rizzon (2012).

Exibimos um trecho do programa CQC (Custe o Que Custar/Emissora

Bandeirantes), que discutiu sobre a situação dos haitianos no Brasil,

principalmente sobre a discriminação realizada em um vídeo feito em

um posto de gasolina em Canoas (RS). Também comentamos o con-

ceito de mobilidade linguística (PORTO, 2010) e apresentamos poema

de Fabian Severo (2010), em portunhol. E, por fim, abordamos a To-

pofilia, conceito de Yi-Fu Tuan (1980), que traz a percepção aliada ao

sentir o espaço, o lugar, a cidade.

Antes de iniciarmos o momento dos exercícios de criação, fizemos

algumas perguntas sobre a fronteira aos participantes. Alguns, que vi-

eram de fora do Rio Grande do Sul, comentaram sobre suas percep-

ções. As perguntas feitas questionavam sobre o encontro de culturas,

a visão deles acerca da fronteira e também elementos culturais que es-

ses estudantes vindos de fora mantinham. Uma participante, vinda do

interior do Estado de São Paulo, e que estava há mais de três anos em

Jaguarão, disse que não iria nunca usar o “tu” ou o “bah”. Outra, vinda

de Salvador há pouco mais de dois anos e meio, disse que já usava o

“tu”. Um aluno mineiro, já em seu sexto semestre na fronteira, relatou

uma atividade do curso em que trabalhou com uma “guria” (como ele

disse) e se sentiu mal por usar o “você” ao conversar com ela, mas que,

ainda assim, não usou o “tu”.

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Projeto Balbúrdia: escrita criativa no espaço de fronteira

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Ainda respondendo sobre a vinda e a vida na fronteira, a Partici-

pante (P) 6, uma estudante vinda de São Paulo, disse que ao chegar na

fronteira falou algo como ter percebido a existência de dois grupos

(uns e outros), referindo-se aos habitantes de Jaguarão (Brasil) e de

Rio Branco (Uruguai) e ela não conseguia se sentir fazendo parte nem

do “uns”, nem do “outros”. Outra aluna vinda de São Paulo, a Partici-

pante 2, disse que já sentiu um choque cultural ao chegar em Jagua-

rão, e acrescentou que andando mais cinco minutos encontrou outro

país e uma cultura ainda mais diferente. A aluna de Salvador, P1, disse

ficar impressionada que alguns falam em espanhol e os brasileiros en-

tendem (e vice-versa). Outra participante, P7, contou que vive em Rio

Branco, e não vê muita diferença, só que lá ela fala espanhol. Pergun-

taram a ela como se sente quando vem para Jaguarão, a participante

afirmou que só sentia que iria sair de casa, nada mais.

Iniciando a oficina de criação, utilizamos Roland Barthes e as obras

A preparação do romance (2005) e Incidentes (2005). Barthes diz ter

certo problema com o passado, que não tem boa memória e, por isso,

se um dia fosse escrever um romance, teria de ser texto no presente,

como notas. Então Barthes se pergunta se isso seria possível. Também

nas aulas que ministrou sobre a preparação do romance, Barthes tra-

tou do haicai, definindo o tradicional terceto japonês e explicando que

sempre havia uma menção ao tempo, à estação do ano. Partindo, de

certa maneira, dos haicais, Barthes chega a seus “incidentes”. Os inci-

dentes são caracterizados pela brevidade, uso do presente, e pouca

marca de subjetividade, pois pouquíssimas vezes aparece ou está en-

volvido um eu, e menos ainda está expressa alguma opinião. É claro

que o eu muitas vezes está presente, porém, é quase que elipsado, es-

condido. O próprio Barthes, na obra Roland Barthes por Roland

Barthes (2003), define como “minitextos, recados, haicais, anotações,

jogos de sentido, tudo o que cai, como uma folha” (p. 167).

Foi pedido, então, aos participantes do Balbúrdia na Escrita Cria-

tiva, que escrevessem um incidente. A intenção é que usassem a me-

mória para escrever o texto, pois o espaço de sala de aula, utilizado

para o projeto, não permitia muitas possibilidades de observação que

justificassem a nota. Praticamos os “incidentes” de uma forma dife-

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Renata Silveira da Silva e Sandro Martins Costa Mendes

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rente da que Barthes imaginou, já que o autor reclamava de sua pró-

pria memória. Ainda assim, pedimos que fossem usados o presente e

todas as outras características dos minitextos de Barthes. Valemo-nos,

então, da tradicional acepção da memória: “um mecanismo psíquico

que torna presente alguma verdade referente ao passado” (SOUZA,

2010).

No primeiro texto, não pedimos uma relação com a fronteira.

Ainda assim, alguns textos já apresentaram o contexto de fronteira,

como as produções dos Participantes 8 e 14, respectivamente:

No entrelugar do gênero e do sexo, os corpos que subvertem tomam a

margem por meio de pancadas. “Tinha uma travesti no meio do cami-

nho. No meio do caminho tinha uma travesti”.

É primavera e no centro de uma cidade periférica uma árvore chove

flores rosadas. Será esse um incidente maravilhoso?

Depois da experiência do primeiro texto no gênero, pedimos, en-

tão, que fossem pensados o contexto e o espaço da fronteira. Mais uma

vez, pedimos que usassem a memória para a escrita. Nesses textos,

como havíamos previsto, foi possível observar características das mo-

bilidades culturais. Quando falamos nisso, estamos nos referindo ob-

jetivamente ao Dicionário das mobilidades culturais: percursos ame-

ricanos, organizado por Zilá Bernd (2010). Durante o Balbúrdia, fize-

mos menção à mobilidade linguística, apenas, mas outros verbetes po-

dem ser identificados nos textos.

O primeiro que destacamos aqui é exatamente o da mobilidade lin-

guística:

Ao cruzar a casa de meus avós, me deparo com o desconhecido. Mas

que é tão íntimo e tão enraizado que logo já me acostumo. Y lo que

antes era distinto ahora es mío. (P7)

No conceito de mobilidade linguística, Valéria Brisolara identifica-

o com o exílio. O poeta anteriormente citado no Balbúrdia, Fabián Se-

vero, natural da fronteira entre Brasil/Uruguai, começou a escrever

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Projeto Balbúrdia: escrita criativa no espaço de fronteira

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sobre a fronteira e a utilizar o portunhol, quando foi estudar em Mon-

tevidéu. Severo não saiu do país, porém o autor aponta2 o portunhol

como sua língua materna. Assim, no âmago do autor, foi uma espécie

de exílio o que ele viveu em Montevidéu. A participante 7, que hoje

vive em Rio Branco, relata, no citado incidente, o momento em que foi

lá viver.

Dois textos retratam a circulação urbana, verbete escrito por Maria

Bernadette Porto. A maior característica desse conceito consiste no

transitar e traz valorização do fugaz, do transitório, do encontro for-

tuito. As circulações urbanas problematizam, então, o caminhar, o lo-

comover-se, de carro, de táxi, de ônibus, a pé. O incidente trabalha

também com as percepções, a provocação de sentidos que a cidade faz,

dialogando com o conceito de topofilia de Yi Fu Tuan, ainda que não o

cite. O texto abaixo é da participante 2.

Olha o momento, resolve então atravessar. Fica o tempo todo pensa-

tiva, com as pessoas ao redor. Novos dialetos, novas paisagens, outras

impressões. Uma ponte que leva para outro lugar, novos ares.

Outro texto (participante 10) pode ser encarado como “circulação

urbana” ou mesmo identificado com o conceito de “deslocamento”,

apresentado por Elena Palmero. A participante 10 criou o seguinte in-

cidente:

O mundo é diferente da ponte pra cá. Será?

Enquanto atravesso a rua, do outro lado escuto o vendedor de meias

em espanhol. Eu o entendo. Na troca de mate, percebo ser igual.

Esse texto é bastante rico em referências teóricas. Apresenta a cir-

culação urbana “enquanto atravesso a rua”, que podemos também

identificar com o conceito de flaneur (presente também no texto de

Porto). Além disso, o minitexto se relaciona com a paisagem sonora,

2 Declaração dada por e-mail como resposta à entrevista realizada por Marjorie Mendonça de Campos Fernandes, aluna do Curso de Produção e Política Cultural, que estava realizando Trabalho de Conclusão de Curso com o tema do processo criativo na fronteira, orientado por Sandro Martins Costa Mendes.

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Renata Silveira da Silva e Sandro Martins Costa Mendes

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noção desenvolvida por Murray Schaffer e abordada no Balbúrdia Es-

paço, em 2013. Assim, os sons peculiares de uma zona de fronteira,

voltada em grande parte ao comércio, foram destacados nesse inci-

dente. Também ressalta a particularidade da comunicação na fron-

teira, que além do portunhol, pode apresentar diálogos em que alguém

utiliza o espanhol e o outro o português, e ainda assim se entendem.

E, por fim, ao falar de “na troca de mate, percebo ser igual”, se enqua-

dra em outro verbete, que apesar de muito importante na fronteira em

estudo, não foi abordado no Balbúrdia: a transnação (LOPES, 2010).

O verbete transnação é desenvolvido no dicionário por Cícero Ga-

leno Lopes, para o qual a transnação se revela “pela construção de

identidade social coletiva que ultrapassa as fronteiras político-geográ-

ficas dos estados-nações em cujos territórios essa cultura se mantém”

(2010, p. 355). A transnacionalidade é interligada à cultura do gaú-

cho/gaucho no Rio Grande do Sul, Uruguai e parte da Argentina. Mú-

sicas, vestimentas, hábitos alimentares, valores, crenças, entre outros

elementos, são compartilhados. Além disso, estão inseridos, em uma

mesma paisagem geográfica, o pampa. Segundo Lopes, a diferença da

língua espanhola e portuguesa não é suficiente para separar.

No texto criado no Balbúrdia, a frase final “Na troca do mate, per-

cebo ser igual” faz referência ao chimarrão, ou mate, bebida típica do

gaúcho. Outro participante (Participante 5) fez menção à cultura gaú-

cha: “Fronteira que une culturas separadas dentro do mesmo pago”. Nesse texto, a palavra que evoca a cultura gaúcha é “pago3”. Ao

mesmo tempo, a participante pensou a fronteira como lugar de união

de culturas. Essa ideia condiz com a citação apresentada do texto do

professor Carlos Rizzon:

Caracterizando um território aberto à interferência e aos influxos de

variadas contribuições culturais, a fronteira constitui-se em um entre-

lugar, onde a porosidade e o trânsito que lhe são próprios operam cons-

tantes movimentos de expansão e retração. Assim, conforma um terri-

tório híbrido, onde um mesmo aspecto – a linguagem, por exemplo –

pode proporcionar relações de aproximação e distanciamento com o

3 Regionalismo: Rio Grande do Sul, lugar de nascimento; cidade, município, região natal; rincão, querência.

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Projeto Balbúrdia: escrita criativa no espaço de fronteira

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Outro. Dessa forma, é possível compreender a noção de fronteira como

um espaço múltiplo, mestiço e heterogêneo, marcado pelas presenças

das diferenças que afirmam lugares de contato e interrelação (RIZ-

ZON, 2012, p.114).

A fronteira não é então apenas uma linha, simbólica como na fron-

teira Chuí/Chuy, onde há uma rua apenas que limita o Brasil do Uru-

guai, ou mesmo uma linha geográfica como a que cria o rio Jagua-

rão/Yaguarón e obriga a existência da ponte entre Jaguarão e Rio

Branco. O espaço da fronteira compreende, por exemplo, no caso de

Jaguarão/Rio Branco, espaço que engloba as duas cidades. Tradu-

zindo graficamente, não seria uma linha, mas um espaço de intersec-

ção, onde cada cidade pertence ao seu “círculo”, mas, unidas, formam

outra situação. Essa intersecção não é fechada ou total. Talvez, para

cada elemento cultural, há aspectos que estão em intersecção e outros

que permanecem identificados com o grande círculo.

Essa ideia pode ser representada literariamente no incidente cri-

ado pelo Participante 9:

Na fronteira do branco com o preto

O cinza

Ou melhor: o marrom – eu!

A ideia de mobilidade cultural também foi desenvolvida no traba-

lho coletivo, no qual se exercitou a criação de um argumento. Os par-

ticipantes se dividiram em dois grupos e cada grupo criou, coletiva-

mente, um personagem que estivesse em alguma fronteira e tratasse

de mobilidades. Além de criar o perfil do personagem, pedimos que

descrevessem o espaço imaginado. Assim, um grupo pensou em per-

sonagem que trabalha com contrabando de alimentos, vive embaixo

da Ponte Internacional Mauá, que une Jaguarão e Rio Branco. Outro

grupo pensou em uma mulher passando por mudanças em seu casa-

mento, mudando de cidade. Um personagem, então, bem localizado

na fronteira geográfica, outra vivendo mobilidades e fronteiras psico-

lógicas. Depois que os grupos pensaram em um conflito para esses

personagens e espaço, pedimos que trocassem de personagem, ou seja,

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Renata Silveira da Silva e Sandro Martins Costa Mendes

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o personagem de cada grupo passou para o outro, e os grupos tiveram

de adaptá-los ao novo local.

Foi realizado, neste trabalho, um exercício de observação teórica

das criações literárias da oficina. E os participantes fizeram um exer-

cício de escrita criativa à luz das pinceladas teóricas, literárias, audio-

visuais propostas. Essa inter-relação entre estímulos, principalmente

teóricos, e criação literária, foi o mote da presente reflexão e da oficina

de escrita criativa, centrada na temática fronteiriça.

Ao deixarmos de atentar aos textos resultantes da oficina e focali-

zarmos nos estímulos à criação, percebemos que a escrita criativa, as-

sim como a fronteira, foi proveniente de deslocamentos, mobilidades

entre linguagens e saberes de diferentes ordens e culturas. O trabalho

buscou descrever explicitamente uma experiência bem-sucedida de

estímulo à criação e, implicitamente, tematizou as fontes de produção

literária, revisitando a ideia de que teoria e efervescência criativa não

se coadunam.

Concluindo, ressaltamos que, através das discussões empíricas e

teóricas, dos estímulos utilizados e sobre os quais se debateu, e, final-

mente, dos textos criados, foi possível perceber que o espaço de fron-

teira faz do habitante da fronteira um ser em que a mobilidade cultural

é presença marcante e, por isso, não causa estranhamento. Para quem

vem de outro lugar e chega à fronteira, este espaço, antes imaginado,

oferece fluidez, permeabilidade e o estranhamento da incerteza da não

fixação, da mobilidade. A participante 6, vinda do interior do Estado

de São Paulo, escreveu o incidente abaixo que marca essa nossa afir-

mação:

Agora que cruzamos o marco zero desse imaginário, será que o devir

que existe ali irá unir-se para transformar o imaginário do mapa para

algo menos simbólico?

Assim, a fronteira, bem marcada no mapa estudado na escola, se

confronta com a fronteira real, onde, apesar do rio que separa as duas

cidades e apesar da necessidade da ponte para a melhor mobilidade,

não há uma linha marcada, visível, que consiga separar as culturas, os

falares, ou mesmo a identidade de quem a ocupa. A intersecção, ou a

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Projeto Balbúrdia: escrita criativa no espaço de fronteira

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permeabilidade, como propomos, faz com que os pontos de contato se

multipliquem e façam das duas culturas em questão (brasileira e uru-

guaia), uma terceira, permeada das outras duas.

Finalizamos com um incidente, criado pela Participante 1, vinda de

Salvador.

Como que se faz para ir ao outro lado? pergunta a menina. Mas não há

outro lado, responde ele. Ela percebe que não se deve delimitar o lado.

REFERÊNCIAS

BARTHES, Roland. A preparação do romance, [vol. I e II]. São Paulo:

Martins Fontes, 2005.

_____________. Incidentes. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

______________. Roland Barthes por Roland Barthes. São Paulo:

Estação Liberdade, 2003.

LOPES, Cícero Galeno. Transnação. In: BERND, Zilá (org.) Dicionário

das mobilidades culturais: percursos americanos. Porto Alegre: Li-

teralis, 2010.

PALMERO, Elena. Deslocamento In: BERND, Zilá (org.) Dicionário

das mobilidades culturais: percursos americanos. Porto Alegre: Li-

teralis, 2010.

PORTO, Maria Bernadete. Circulações urbanas. In: BERND, Zilá

(org.) Dicionário das mobilidades culturais: percursos america-

nos. Porto Alegre: Literalis, 2010.

RIZZON, Carlos Garcia. Outras geografias em literatura de fronteira.

In: Para Onde!?, Volume 6, Número 2, p. 114124, jul./dez. 2012

Instituto de Geociências, Programa de Pós-graduação em Geogra-

fia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS,

Brasil.

SCHAFER, Murray. O ouvido pensante. São Paulo: UNESP, 1991.

SEVERO, Fabián. Noite nu norte. Poemas em Portuñol. Montevideo:

Ediciones del Rincón, 2010.

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SOUZA, Raquel Rolando. Memória e imaginário. In: BERND, Zilá

(org.) Dicionário das mobilidades culturais: percursos america-

nos. Porto Alegre: Literalis, 2010.

TUAN, Yi-Fu. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores

do meio ambiente. São Paulo: DIFEL, 1980.

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Autores e Autoras

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Autores e autoras

ANA VALÉRIA GOULART DOS SANTOS

É graduanda do Curso de Letras – Português/Espanhol e respectivas

Literaturas, na Universidade Federal do Pampa, Campus Jaguarão.

Foi bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET) Letras. E-mail:

[email protected].

CÁTIA D. GOULART

Professora adjunta do Curso de Letras Português – Espanhol e respec-

tivas Literaturas, da Universidade Federal do Pampa, Campus Jagua-

rão. Graduada em Letras Português pela Universidade Federal do Rio

Grande (1994), Mestre em Letras, com ênfase em História da Litera-

tura, pela Universidade Federal do Rio Grande (2004). Doutora em

Letras, com ênfase em Teoria da Literatura, pela Pontifícia Universi-

dade Católica do Rio Grande do Sul (2016). Atuou como colaboradora

do PET Letras, para o qual ofertou o projeto de ensino “A formação do

leitor no Programa de Educação Tutorial”. E-mail: catiadgou-

[email protected].

GEICE PERES NUNES

Possui graduação em Letras – Espanhol pela Universidade Federal de

Santa Maria, mestrado e doutorado em Letras – Estudos Literários

pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Atua como profes-

sora adjunta do Curso de Letras da Universidade Federal do Pampa

(Unipampa – Jaguarão), e como tutora do Programa de Educação Tu-

torial, PET – Letras, desde 2017. E-mail: [email protected].

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Autores e autoras

200

KAROLINE GASQUE DE SOUZA

É graduanda em Letras – Português/Espanhol e respectivas Literatu-

ras pela Universidade Federal do Pampa (Unipampa), Campus Jagua-

rão. É bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET) Letras desde

2014. E-mail: [email protected].

MARIA ELIA MARTINS

É mestra pelo Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Lín-

guas, Unipampa – Campus Bagé (2016). É especialista em Metodolo-

gia do Ensino de Língua e Literatura pela Unipampa – Jaguarão

(2014). Graduada no Curso de Licenciatura em Letras na Unipampa –

Jaguarão (2012). É professora da rede estadual de educação – RS.

Atuou como colaboradora do projeto “A formação do leitor no Pro-

grama de Educação Tutorial”. E-mail: mariaeliamartins@hot-

mail.com.

MARIA SOLANGE BARBOSA DA SILVA

É graduanda em Letras – Português/Espanhol e respectivas Literatu-

ras pela Universidade Federal do Pampa (Unipampa), Campus Jagua-

rão. É bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET) Letras desde

2015. E-mail: [email protected].

MILLAINE DE SOUZA CARVALHO

Possui graduação em Letras – Português/Espanhol e respectivas Lite-

raturas pela Universidade Federal do Pampa, Campus Jaguarão. Foi

bolsista do Programa de Educação Tutorial Letras (2013 a 2017). É

mestranda no Programa de Pós-Graduação em Letras/ Estudos da

Linguagem da Universidade Federal de Pelotas. E-mail: millainedes-

[email protected].

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Autores e Autoras

201

NATHALIA MADEIRA ARAUJO

Possui graduação em Letras – Português/Espanhol e respectivas Lite-

raturas pela Universidade Federal do Pampa (Unipampa), Campus Ja-

guarão, mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Letras

(PPGL)/Linguística Aplicada da Universidade Católica de Pelotas

(UCPEL). Foi bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET) Letras

(2013, 2014, 2015). E-mail para contato: natyaraujo_jag@hot-

mail.com.

PAMELA BELMUTES PINHEIRO

É graduanda do Curso de Letras – Português/Espanhol e respectivas

Literaturas, na Universidade Federal do Pampa, Campus Jaguarão. É

bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET) Letras desde maio

de 2016. E-mail: [email protected].

RENATA SILVEIRA DA SILVA

Possui graduação em Letras – Português/Espanhol pela Universidade

Federal do Rio Grande (FURG), mestrado e doutorado em Letras- Lin-

guística Aplicada pela Universidade Católica de Pelotas (UCPel). Atua

como professora do Curso de Letras da Universidade Federal do

Pampa (Unipampa), Campus Jaguarão. Foi tutora do PET Letras de

2013 a 2016. E-mail: [email protected].

SANDRO MARTINS COSTA MENDES

Possui graduação em Letras – Português/Espanhol pela Universidade

Federal do Rio Grande (FURG), mestrado em Letras/Teoria da Lite-

ratura e doutorado em Letras/Escrita Criativa pela Pontifícia Univer-

sidade Católica do Rio Grande do Sul. Atuou como colaborador do PET

Letras, no qual participou de várias seleções de bolsistas e desenvolveu

projetos. E-mail: [email protected].

SANTIAGO BRETANHA

Possui graduação em Letras – Português/Espanhol e respectivas Lite-

raturas pela Universidade Federal do Pampa (Unipampa), Campus Ja-

guarão. É mestrando em Letras/Estudos da Linguagem pelo Programa

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Autores e autoras

202

de Pós-graduação (PPGL) em Letras da Universidade Federal de Pelo-

tas (UFPEL). Foi bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET)

Letras (2015, 2016). E-mail: [email protected].

VICTOR DA SILVA PACHECO DOS SANTOS

É graduando em Letras – Português/Espanhol e respectivas Literatu-

ras, na Universidade Federal do Pampa, Campus Jaguarão. Foi bol-

sista do PET Letras de 2014 a 2017. E-mail: vitinhopachecos@hot-

mail.com.

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Autores e Autoras

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Autores e autoras

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