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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
INSTITUTO DE BIOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA
Efeitos da Fragmentação de Hábitats por
Infraestrutura Linear
BIANCA FELIPPE TORGGLER
RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL
JULHO DE 2015
II
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
INSTITUTO DE BIOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA
Efeitos da Fragmentação de Hábitats por Infraestrutura Linear
BIANCA FELIPPE TORGGLER
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ecologia da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre em
Ciências Biológicas (Ecologia).
Orientador: Prof. Dr. Carlos Eduardo de Viveiros
Grelle
RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL
JULHO DE 2015
III
“All our discontents about what we want
appeared to me to spring from the want of
thankfulness for what we have.”
Daniel Defoe em Robinson Crusoe
IV
Agradecimentos
À minha família, pelo carinho e apoio, e ao meu companheiro Rogério, pelos “coachs” e cooperação
fundamental na organização do trabalho de campo.
Ao meu orientador Cadu. Eu não poderia definí-lo melhor do que a Beatriz: “great motivator”. Agradeço por
sua forma não-linear de discutir o projeto (desde 2010) e de orientar, o que muitas vezes me levou
desconstruir ideias para reconstruí-las de uma forma melhor. Agradeço também as sugestões de leitura e a
atenção nas reuniões, e-mails ou mesmo nos corredores do bloco A.
Ao Leonardo Florêncio, que foi o grande incentivador e apoiador deste projeto em todos os aspectos.
À Deborah de Mattos, que “comprou a ideia” do apoio material (armadilhas), e ao Rafael e a Luiza, que o
viabilizaram.
A todos os amigos, mas em especial a alguns que tiveram papel fundamental neste período: Miriane, Carlos
Abraham, Flávia, Renato, Priscila, Giovani, Patrícia, Ricardo, Marcos, Zé Mello, Mari3, Júlia Luz, Caryne,
Maíra, Marcelo, Paulo Rubens, Elisa, Rita. À Dani Bertolucci, por seu exemplo de fé e alegria, mesmo nas
situações difíceis da vida. À Beatriz Faria e Katherine, sempre perto, apesar das distâncias.
Aos amigos do Labvert (Laboratório de Vertebrados-UFRJ), sejam professores, funcionários, alunos
graduandos, pós-graduandos e pós-docs pelo ambiente efervescente e colaborativo para o aprendizado seja
no Laboratório (inclusive nos almoços), no Biotério, no Parnaso (Rancho Frio e Garrafão) ou na Regua.
À minha estagiária Diana, por sua imensa colaboração e versatilidade, seja para organizar uma infinidade de
dados numa planilha Excel, seja para lavar 100 armadilhas numa tarde. E ao Gael, seu filho, por “emprestar”
a mamãe para os trabalhos de campo. A todos que participaram do trabalho de campo: Diana, Jéssica,
Jayme, Samara, Bernardo, Caryne, Zé Mello, Marcelo, Gustavo (Yow). Vocês foram sensacionais.
Aos proprietários das fazendas, da Fazenda Nova Miracema - Sr. Sebastião Bruno e família - e da Fazenda
Gaviões, representada pelo administrador Sr. Raul. Agradecimento especial ao Seu Délio, D. Irani e família
residentes na Fazenda Nova Miracema, que nos apoiaram em campo. À Aline e D. Moema que nos
hospedaram no Sítio Lago Azul.
Ao Compartilhado RBG pelo empréstimo de veículos e aos motoristas Guida, Paulo, Márcio e Kádio.
Ao programa de Pós-Graduação em Ecologia da URFJ pela oportunidade de desenvolvimento acadêmico e
pessoal. À nossa secretária do programa Márcia, sempre atenciosa e solícita.
Aos membros do comitê de acompanhamento (profs. Arcoverde e Daniela) e da banca de qualificação
(Diogo Loretto e Henrique Rajão) pelos comentários e considerações.
Ao Laboratório de Mastozoologia do IBRAG/UERJ e ao Laboratório de Biodiversidade Molecular do IB/UFRJ
pela identificação de espécies de roedores.
A todos que não foram citados, mas colaboraram com um sorriso ou uma palavra de incentivo.
V
Resumo
O efeito de borda é uma combinação de alterações físicas e bióticas associadas com as margens dos
fragmentos de habitats, sendo um dos principais responsáveis pelo declínio populacional de espécies em
áreas fragmentadas. Empreendimentos lineares, tais como estradas, linhas de transmissão e dutos, são
parte integral da paisagem moderna e causa potencial de diversas alterações ecológicas decorrentes da
fragmentação dos hábitats e, em especial, do efeito de borda. Desta forma, o objetivo desta dissertação foi
investigar a influência do efeito de borda resultante de fragmentação de habitats por infraestrutura linear
(faixa de dutos), usando como modelo comunidades de pequenos mamíferos em fragmentos de Mata
Atlântica.
No primeiro capítulo foi realizada uma revisão sistemática dos tipos de resposta dos mamíferos terrestres ao
efeito de borda nos biomas brasileiros e em seguida analisadas as respostas das comunidades de pequenos
mamíferos ao efeito de borda. Doze dos quinze estudos existentes foram realizados em biomas florestais,
Mata Atlântica e Amazônia. Existe grande variação nos tipos de resposta entre grupos estudados (pequenos
mamíferos não-voadores, morcegos, primatas, médios e grandes mamíferos), e entre espécies de um
mesmo grupo. Variações no tipo de resposta também diferiram de acordo com a variável medida (riqueza de
espécies, abundância e densidade). Mecanismos que atuam em nível específico, provavelmente
correlacionados com atributos funcionais, fazem com que cada espécie responda de uma forma particular.
Dentre os mamíferos, o grupo mais estudado foi o dos pequenos mamíferos não-voadores (73%), e a
abordagem mais utilizada foi em nível de comunidade (73%). Nestes estudos houve registro de respostas
neutras e negativas para as seguintes variáveis: abundância total, composição de espécies e índice de
diversidade. Apenas a variável “riqueza de espécies” apresentou respostas positivas em dois estudos,
realizados em locais nos quais a vegetação nativa era equivalente ou predominante com relação ao total
áreas alteradas na paisagem.
VI
No segundo capítulo, para a coleta de dados em campo foi escolhida a faixa dos dutos Osduc, Osduc II,
Osduc IV (antigo Gasduc I) e Gasduc II nos municípios de Silva Jardim e Cachoeiras de Macacu, pois é uma
faixa que apresenta pontos de interferência com a vegetação florestal nativa, atualmente protegida pela
APA da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado. A largura da faixa é de 20 metros e sua superfície é
mantida com vegetação de porte herbáceo. Assim, foram selecionados dois fragmentos adjacentes a esta
faixa, nos quais foram dispostas armadilhas de captura viva em linhas paralelas às bordas. As linhas mais
próximas da faixa de dutos foram alocadas a 10 metros das bordas dentro dos fragmentos e as demais linhas
entre 100 a 200 m de cada linha mais próxima, em direção ao interior de cada fragmento. Foram realizadas
cinco campanhas entre setembro e dezembro de 2014, totalizando 4.500 armadilhas-noite. Em um dos
fragmentos foram capturados 49 indivíduos (sucesso de captura de 4,7%) e, em outro, somente 23 (sucesso
de captura de 1,52%). Os dados coletados nas diferentes distâncias a partir da borda foram analisados em
separado para cada fragmento por meio de testes de randomização. Baseado nos resultados destes testes,
no primeiro fragmento possivelmente existe uma resposta negativa da comunidade de pequenos mamíferos
ao efeito de borda, refletidas especialmente no padrão de riqueza. Já no segundo fragmento, o baixo
número de registros no período estudado não permitiu tal inferência.
Finalmente, a avaliação da ocorrência de pequenos mamíferos em diferentes distâncias de um
empreendimento linear pode contribuir para a abordagem estratégica na avaliação de impactos ambientais,
sendo uma ferramenta para avaliar impactos que ocorrem em escala local, como o efeito de borda.
VII
Abstract
The edge effect is a combination of physical and biotic changes associated with the margins of
habitat patches, one of the main reasons for population declines of species in fragmented areas.
Linear projects such as roads, transmission lines and pipelines, are an integral part of the modern
landscape and potential cause of many ecological changes resulting from fragmentation of habitats
and in particular, the edge effect. Thus, the aim of this work was to investigate the influence of the
resulting edge effect of linear infrastructure for habitat fragmentation (pipeline right-of-way), using
as model communities of small mammals in Atlantic Forest fragments.
The first chapter is a systematic review of types of terrestrial mammals responses to edge effects in
the Brazilian biomes and then an analysis of small mammals communities responses to edge effect.
Twelve of the fifteen existing studies were conducted in forested biomes, Atlantic Forest and
Amazon. There is wide variation in the types of response between groups (small non-flying
mammals, bats, primates, medium and large mammals), and between species of the same group.
Variations in the type of response also differed according to the variable measured (species
richness, abundance and density). Mechanisms that act on specific level, probably related to
functional attributes, make each species responds in a particular way. Among mammals, the most
studied group was non-flying small mammals (73%), and the most used approach was at
community level (73%). In these studies, there was record of neutral and negative responses to the
following variables: total abundance, species composition and diversity index. Only "species
richness" variable showed positive responses in two situations, studies in which the native
vegetation was equivalent or prevalent in relation to the total areas altered in the landscape.
VIII
In the second chapter, the right-of-way of Osduc, Osduc II, Osduc IV (former Gasduc I) and Gasduc II
pipelines in the municipalities of Silva Jardim and Cachoeiras de Macacu was chosen for collection
of field data. This right-of-way had been chosen because of interference in native forest vegetation,
currently part of a protected area (APA da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado). The right-of-
way typical width is 20 meters and its coverage is maintained with herbaceous vegetation. Thus, we
selected two forest fragments intercepted by the right-of-way, in which we placed Sherman traps in
parallel lines to the edges. The nearest lines of traps were located 10 meters from the right-of-way
edge inside the forest; other lines were located between 100 and 200 m of each closest line,
seeking the core of each fragment. In five campaigns held between September and December 2014
we captured 72 individuals (132 catches), in a sampling effort of 4500 trap-nights. In one fragment
49 individuals were captured (4.7% capture success) and, in another, only 23 (1.52% capture
success). The data collected in different distances from the edge were analyzed separately for each
fragment using randomization tests. In the first fragment, there is possibly a negative response of
the small mammal community to the edge effect, reflected especially in the richness pattern. In the
second fragment, the low number of records during the study period did not allow such inference.
Finally, the evaluation of the occurrence of small mammals at different distances from a linear
development can contribute to the strategic approach to the environmental impact assessment,
and a tool to assess impacts on a local scale, as the edge effect.
IX
Sumário
Resumo ................................................................................................................................................. III
Abstract ................................................................................................................................................VII
Sumário ................................................................................................................................................. IX
Lista de Figuras ...................................................................................................................................... XI
Lista de Tabelas .................................................................................................................................. XIV
Introdução Geral .................................................................................................................................... 1
1. Capítulo 1. Efeito de borda: avaliação dos efeitos para os mamíferos terrestres nos biomas do
Brasil ........................................................................................................................................... 4
1.1. Introdução .................................................................................................................................... 4
1.2. Material e Métodos ..................................................................................................................... 6
1.3. Resultados .................................................................................................................................... 9
1.3.1. Análise do efeito de borda para mamíferos nos biomas brasileiros ........................................ 9
1.3.2. Análise do efeito de borda para pequenos mamíferos nos biomas brasileiros ..................... 15
1.4. Discussão .................................................................................................................................... 16
1.4.1. Análise do efeito de borda para mamíferos nos biomas brasileiros ...................................... 16
1.4.2. Análise do efeito de borda para pequenos mamíferos nos biomas brasileiros ..................... 20
1.5. Literatura citada na Tabela 1.1 .................................................................................................. 23
2. Capítulo 2. Estudo do efeito de borda em fragmentos adjacentes à faixa de dutos para
comunidades de pequenos mamíferos da Mata Atlântica ...................................................... 25
X
2.1. Introdução .................................................................................................................................. 25
2.2. Material e Métodos ................................................................................................................... 28
2.2.1. Área de estudo ........................................................................................................................ 28
2.2.2. Coleta de dados ...................................................................................................................... 35
2.2.3. Análise dos dados ................................................................................................................... 42
2.3. Resultados .................................................................................................................................. 44
2.3.1. Análise da Riqueza Observada (Sobs) - Fazenda Gaviões ........................................................ 47
2.3.2. Análise da Abundância - Fazenda Gaviões ............................................................................. 50
2.3.3. Análise da Riqueza Observada (Sobs) - Fazenda Nova Miracema ............................................ 52
2.4. Discussão .................................................................................................................................... 56
Considerações finais ............................................................................................................................ 61
Referências Bibliográficas .................................................................................................................... 63
Anexo A – Lista de artigos que não foram incluídos na revisão .......................................................... 71
XI
Lista de Figuras
Figura 1.1. Número de artigos sobre efeitos de borda aos mamíferos nos biomas brasileiros
publicados por ano. .................................................................................................................. 10
Figura 1.2. Número de artigos para cada grupo e abordagens utilizadas (Multi-taxa, comunidades e
populações), considerando os quinze artigos selecionados. ................................................... 11
Figura 1.3. Tipos de respostas (negativa, neutra, positiva) dos pequenos mamíferos com relação às
diferentes variáveis consideradas em estudos cuja abordagem se deu no nível de
comunidades. ........................................................................................................................... 15
Figura 2.1. Faixa de dutos com marcos de concreto sinalizando a localização de cada duto
enterrado. ................................................................................................................................ 31
Figura 2.2. Mapa com a localização das duas fazendas dentro da APA da Bacia do Rio São
João/Mico-Leão-Dourado (área hachurada). Os dois fragmentos escolhidos estão
representados por linhas verdes contínuas. As áreas de amostragem nas fazendas Nova
Miracema e Gaviões estão indicadas com pontos verdes. As faixas de dutos da
Petrobras/Transpetro estão indicadas com linhas vermelhas contínuas. ............................... 33
Figura 2.3. Vista geral da Fazenda Gaviões, Município de Silva Jardim-RJ. ......................................... 34
Figura 2.4. Vista do interior do fragmento de vegetação na Fazenda Nova Miracema, Município de
Cachoeiras de Macacu-RJ. ........................................................................................................ 34
Figura 2.5. Desenho esquemático do módulo de amostragem no fragmento. .................................. 36
Figura 2.6. Disposição final do módulo de amostragem de pequenos mamíferos no fragmento da
Fazenda Gaviões, Silva Jardim-RJ. As estações de captura estão indicadas com pontos
amarelos. .................................................................................................................................. 37
XII
Figura 2.7. Disposição final do módulo de amostragem de pequenos mamíferos no fragmento da
Fazenda Nova Miracema, Cachoeiras de Macacu-RJ. As estações de captura estão indicadas
com pontos amarelos. .............................................................................................................. 38
Figura 2.8. Armadilha de captura viva do tipo Sherman grande armada no solo. .............................. 39
Figura 2.9. Armadilha de captura viva do tipo Sherman pequena armada no sub-bosque. ............... 39
Figura 2.10. Triagem de indivíduo (Akodon cursor) em campo. .......................................................... 41
Figura 2.11. Curva do coletor construída para Fazenda Gaviões. Em azul estão os valores observados
(Mao Tau), em laranja as estimativas Jackknife 1.................................................................... 46
Figura 2.12. Curva do coletor construída para Fazenda Nova Miracema. Em azul estão os valores
observados (Mao Tau), em laranja as estimativas Jackknife 1. ............................................... 46
Figura 2.13. Riqueza Observada (Sobs) (média e desvio padrão) para as estações de captura da
Fazenda Gaviões agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da
borda. L1 é o grupo mais próximo da borda e L4 o mais distante. ......................................... 48
Figura 2.14. Histograma da razão-F nas amostras aleatorizadas em comparação com os dados reais
obtidos em campo para a riqueza de espécies na Fazenda Gaviões. Em verde está
representada a distribuição das Razões-F geradas para os 1000 procedimentos de
aleatorização da Riqueza observada (representadas no eixo X). A linha em vermelho
representa a distribuição amostral exata da Razão-F obtida a partir dos dados de campo (F =
3,79; p = 0,019). ....................................................................................................................... 50
Figura 2.15. Abundância (média e desvio padrão) para as estações de captura da Fazenda Gaviões
agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda. L1 é o grupo
mais próximo da borda e L4 o mais distante. .......................................................................... 51
Figura 2.16. Histograma da razão-F nas amostras aleatorizadas em comparação com os dados reais
obtidos em campo para a abundância das espécies encontradas na Fazenda Gaviões. Em
verde está representada a distribuição das Razões-F geradas para as 1000 aleatorizações da
XIII
Abundância observada (representadas no eixo X). A linha em vermelho representa a
distribuição amostral exata da Razão-F (F = 2,54; p = 0,067). ................................................. 52
Figura 2.17. Riqueza Observada (Sobs) (média e desvio padrão) para as estações de captura da
Fazenda Nova Miracema agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir
da borda. L1 é o grupo mais próximo da borda e L4 o mais distante...................................... 54
Figura 2.18. Histograma da razão-F nas amostras aleatorizadas em comparação com os dados reais
obtidos em campo para a riqueza de espécies na Fazenda Nova Miracema. A linha em
vermelho representa a distribuição amostral exata da Razão-F obtida a partir dos dados de
campo (F = 2,31; p = 0,076). ..................................................................................................... 55
XIV
Lista de Tabelas
Tabela 1.1. Artigos que apresentaram evidências empíricas do efeito de borda para os mamíferos
em diferentes biomas do Brasil, destacando: bioma, estado, grupos, nível de abordagem,
variáveis medidas, tipo de resposta à borda e observações, quando pertinente (continua). 13
Tabela 2.1. Datas de realização do trabalho de campo. ...................................................................... 41
Tabela 2.2. Número de capturas e sucesso de capturas por áreas e total, os números entre
parêntesis se referem aos números de indivíduos novos, excluídas as recapturas. ............... 44
Tabela 2.3. Espécies capturadas nas duas fazendas durante as cinco campanhas. ............................ 45
Tabela 2.4. Número total de indivíduos capturados em cada linha de estações de captura da
Fazenda Gaviões, Silva Jardim-RJ. ............................................................................................ 48
Tabela 2.5. Tabela descritora do modelo linear (Anova) para a Riqueza Observada nas estações de
captura da Fazenda Gaviões agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a
partir da borda. ........................................................................................................................ 49
Tabela 2.6. Tabela descritora do modelo linear (Anova) para a abundância nas estações de captura
da Fazenda Gaviões agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da
borda. ....................................................................................................................................... 51
Tabela 2.7. Número total de indivíduos capturados em cada linha de estações de captura da
Fazenda Nova Miracema, Cachoeiras de Macacu-RJ. .............................................................. 53
Tabela 2.8. Tabela descritora do modelo linear (Anova) para a Riqueza Observada nas estações de
captura da Fazenda Nova Miracema agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3,
L4) a partir da borda. ................................................................................................................ 55
Tabela 2.9. Distância linear aproximada (km) das duas fazendas amostradas neste estudo a áreas
próximas nas quais houve levantamento de pequenos mamíferos. ....................................... 56
XV
Tabela A.1. Artigos que não apresentaram resultados empíricos diretos do efeito de borda para
mamíferos do Brasil. Na quarta coluna, denominada “Abordagem” explicitam-se os motivos
pelos quais os estudos não foram incluídos. ........................................................................... 71
1
Introdução Geral
O processo de fragmentação ocorre quando uma grande extensão de habitat é
transformada em um número de manchas menores de habitats diferentes do original (Wilcove et
al., 1986). Originalmente, o conceito de fragmentação de habitat foi uma inovação conceitual
adotada na Ecologia nos anos 1970, e buscava ser uma hipótese teórica para alguns efeitos de
mudanças induzidas pelas atividades humanas nas paisagens naturais (Haila, 2002). A partir de
então, este conceito foi rapidamente apropriado por uma abordagem fundamentada na Teoria de
Biogeografia de Ilhas, produzindo diversos estudos e recomendações quanto à conservação em
áreas fragmentadas (Haila, 2002). Nesta abordagem, o tamanho e o isolamento dos fragmentos de
habitats seriam os determinantes do processo de extinção ou de persistência das espécies (Wilson
& Willis, 1975).
O estudo da fragmentação baseado na Teoria de Biogeografia de Ilhas possuía três
premissas subjacentes: (1) que os fragmentos seriam comparáveis a ilhas oceânicas, (2) que os
habitats no entorno dos fragmentos seriam hostis à maioria dos organismos e (3) que as condições
naturais anteriores à fragmentação seriam uniformes. Ao longo do tempo, estas três premissas
foram sendo questionadas à luz de novos estudos e especialmente dos conceitos da Ecologia da
Paisagens (Haila, 2002). A partir de meados dos anos 1980, outros fatores que possuíam influência
nas respostas biológicas ao processo de fragmentação, tais como o entorno (matriz), o efeito de
borda, a forma e o histórico de surgimento dos fragmentos, passaram a ser abordados em
diversos estudos (Olifiers & Cerqueira, 2006).
2
Em uma revisão sobre as consequências da fragmentação, Saunders et al. (1991)
destacaram a importância das alterações físicas, tanto com relação ao microclima quanto das
características nas quais se deu a fragmentação (tempo decorrido, isolamento, conectividade,
alterações na matriz), bem como de fatores modificadores (tamanho, forma e posição dos
fragmentos), para o entendimento mais completo dos efeitos da fragmentação na persistência das
populações. Assim, os fragmentos passaram a ser vistos como elementos em uma paisagem
dinâmica e heterogênea (Haila, 2002).
Muitas destas evidências sobre as consequências da fragmentação foram construídas a
partir da maior e mais longa pesquisa sobre fragmentação em termos mundiais que ocorre na
Amazônia há mais de trinta anos, denominada Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos
Florestais (PDBFF), e que trouxe contribuições fundamentais para o entendimento do efeito de
borda, do isolamento, de efeitos da matriz e da dinâmica de paisagem (Laurance et al., 2011). É
relevante mencionar que declínios populacionais de espécies em áreas fragmentadas,
anteriormente atribuídos apenas ao efeito do tamanho dos fragmentos, conhecido como “efeito
de área” pela abordagem da Biogeografia de Ilhas, foram reavaliados e, a existência do efeito de
borda tem sido considerada como causa principal destas alterações decorrentes da fragmentação
dos habitats (Harrisson & Bruna, 1999; Laurance et al., 2011).
Neste contexto, infraestruturas lineares, tais como estradas, linhas de transmissão e faixas
de dutos, são um dos tipos de atividades humanas que podem causar a fragmentação de habitats,
sendo partes integrantes da paisagem moderna e, fora de áreas urbanas, são um dos elementos
antrópicos mais evidentes nas áreas naturais (Goosem, 1997). A fragmentação dos habitats, neste
caso, é causada principalmente pela alteração do uso do solo local ocupado pela instalação e não
3
pelo tipo de utilização (Geneletti, 2006). Desta forma, ao longo de infraestruturas lineares vários
habitats podem estar sob influência do efeito de borda, causa potencial de diversas alterações
bióticas ou abióticas, decorrentes da fragmentação (Goosem, 1997).
Considerando que o impacto do efeito de borda pode ser considerado essencial para a
conservação de espécies em áreas fragmentadas (Didham & Ewers, 2012), o objetivo desta
dissertação foi investigar a influência do efeito de borda resultante de fragmentação por
infraestrutura linear (faixa de dutos). Inicialmente foi feito um levantamento dos tipos de
respostas encontradas em estudos de comunidades de pequenos mamíferos não-voadores ao
efeito de borda, dentro de uma avaliação geral das respostas de mamíferos ao efeito de borda
encontradas nos biomas brasileiros. Em seguida foi feita uma avaliação das respostas de espécies
de pequenos mamíferos à presença de bordas adjacentes a uma faixa de dutos em dois
fragmentos de Mata Atlântica.
4
1. Capítulo 1. Efeito de borda: avaliação dos efeitos para os mamíferos
terrestres nos biomas do Brasil
1.1. Introdução
O conceito de “borda” é usualmente atribuído a Aldo Leopold, pelo menos com relação à
Ecologia Animal (Lidicker, 1999). No entanto, até os anos 1980 este conceito era pouquíssimo
utilizado em ecologia animal, e geralmente citado como um tipo de ruído, não como um objeto
específico da investigação científica. Como o surgimento da ecologia de paisagem, os fenômenos
relacionados às bordas adquiriram novos significados e reapareceram nas pesquisas científicas,
com destaque na biologia da conservação (Lidicker, 1999).
Atualmente, o efeito de borda vem sendo considerado como causa principal de alterações
decorrentes da fragmentação dos habitats (Harrisson & Bruna, 1999; Laurance et al., 2011) e
diversos estudos de fragmentação vêm usando largamente os vertebrados como objetos de
estudo, especialmente aves e mamíferos, grupos reconhecidos como sensíveis a esta interferência
humana (Laurance & Bierregaard Jr., 1997). Entretanto, os resultados de diversos estudos
confirmam que diferentes espécies respondem a formação de bordas de diferentes maneiras,
podendo apresentar aumentos, declínios ou ausência de alteração na abundância, a depender do
tipo de borda presente e de variações temporais ou espaciais na distribuição de determinados
recursos (Ries & Sisk, 2004).
Empreendimentos lineares (dutos, estradas, linhas de transmissão) são potenciais
causadores de efeito de borda e, no entanto, são escassos os estudos publicados sobre efeitos da
5
fragmentação causada por este tipo de instalação (Goosem, 1997). Em uma revisão sobre os
impactos da infraestrutura linear em florestas tropicais, Laurance et al. (2009) apontaram que os
impactos causados por este tipo de empreendimento têm em geral sido estudados de forma mais
aprofundada para estradas. No Brasil, os poucos estudos sobre os efeitos de infraestruturas
lineares são referentes ao impacto de estradas em aves de subosque da Amazônia (Develey &
Stouffer, 2001; Laurance & Gomez, 2005) e sobre atropelamentos de fauna em rodovias (ex. Bager
& Rosa, 2011). Recentemente, foi realizado um estudo sobre efeito borda para pequenos
mamíferos em área de Mata Atlântica atravessada por uma ferrovia (Cerboncini et al., 2015).
Considerando o fato de que as faixas de servidão utilizadas para a implantação de dutos e
outros tipos de empreendimentos lineares, que não envolvem o trafego de veículos, são muito
semelhantes à matriz no entorno dos fragmentos, o efeito de borda em outras situações de
fragmentação foi utilizado como uma aproximação das possíveis respostas. Assim, o objetivo
central desta revisão foi levantar as evidências empíricas do efeito de borda decorrentes da
fragmentação de habitats para os mamíferos nos diferentes biomas do Brasil. Um segundo
objetivo foi identificar quais foram os tipos de respostas encontradas nos estudos de comunidades
de pequenos mamíferos ao efeito de borda.
6
1.2. Material e Métodos
Para o levantamento dos artigos foi feita uma busca na base de dados eletrônica “Scopus”
(disponível em www.scopus.com, acessado em fevereiro de 2015). As seguintes palavras foram
utilizadas no mecanismo de busca: “edge effect* AND mammal* AND Brazil”. Os asteriscos
permitiram que termos no plural fossem incluídos, como “edge effects” e “mammals”. O termo
“AND” condicionou os resultados da busca a conter ambas as palavras utilizadas. Estas palavras
foram pesquisadas tanto nos títulos, quanto nos resumos e nas palavras chave dos artigos.
Adicionalmente, foram acrescidos os seguintes filtros de assunto: “Agricultural and Biological
Sciences” e “Environmental Sciences”, de modo que a busca se restringisse ao campo da Ecologia.
Este levantamento foi complementado com uma busca equivalente na base “ISI Web of Science”
(disponível em http://apps.webofknowledge.com, acessado em fevereiro de 2015), como os
mesmos parâmetros.
Os artigos encontrados foram avaliados de modo a verificar se o assunto principal
abordado era relacionado diretamente ao efeito de borda, e se havia resultados específicos para
mamíferos. Artigos que tratavam de efeitos mais amplos decorrentes da fragmentação de habitats
com apenas menções genéricas ao efeito de borda foram excluídos, assim como estudos que
fizeram levantamentos de mamíferos, mas cujo objetivo principal fosse verificar a existência de
algum efeito ecológico em plantas ou outro grupo, por exemplo. Adicionalmente, artigos de
revisão, sem dados empíricos também foram excluídos. Os artigos encontrados por meio da busca
na base de dados “Scopus” que não foram considerados nesta revisão estão listados no Anexo A,
explicitando sua abordagem e motivos pelo quais não foram incluídos.
7
Para efetuar o levantamento das evidências empíricas do efeito de borda para os
mamíferos nos diferentes biomas do Brasil, os resultados apresentados nos diversos artigos foram
analisados e as seguintes informações foram organizadas em uma planilha:
a. Bioma (Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa, Pantanal, Transição);
b. Estado (Unidade da Federação);
c. Grupos (classificação simples em grupos usados na prática de campo: pequenos
mamíferos, primatas, morcegos, médios e grandes mamíferos);
d. Nível de abordagem (populações, comunidades ou multi-taxa);
e. Variáveis medidas, ou seja, quais foram os parâmetros ecológicos efetivamente
utilizados para as avaliações (abundância específica, abundância total, composição
de espécies, densidade específica, diversidade, número de registros de cada
espécie, probabilidade de ocorrência, razão sexual, riqueza de espécies, tamanho
da área de vida, tamanho populacional).
Para identificar quais foram os tipos de respostas ao efeito de borda encontrados, os
resultados de cada variável medida foram classificados quanto ao tipo de resposta à borda, e
detalhamentos quanto às respostas listados como observações. Como diversos estudos utilizaram
mais de uma variável ou apresentaram mais de um tipo de resposta para a mesma variável, todas
as informações foram desdobradas e apresentadas na planilha separadamente, de forma a não
omitir diferentes respostas. Sendo assim foram acrescentados os seguintes itens à planilha acima
descrita:
8
f. Tipo de resposta à borda (negativa, positiva ou neutra), seguindo as classes de
resposta propostas por Ries et al. (2004),
g. Observações, quando pertinente.
Finalmente, foram selecionados os estudos que avaliaram o grupo de pequenos mamíferos
no nível de abordagem de comunidades, com objetivo de identificar quais foram os tipos de
respostas ao efeito de borda encontradas para as diferentes variáveis utilizadas. Assim como na
análise anterior, como diversos estudos utilizam mais de uma variável ou apresentaram mais de
um tipo de resposta para a mesma variável, todas as informações foram desdobradas e
consideradas separadamente, de forma a não omitir diferentes respostas presentes em um
mesmo artigo.
9
1.3. Resultados
1.3.1. Análise do efeito de borda para mamíferos nos biomas brasileiros
Foram encontrados um total de 29 artigos relacionados a efeitos de borda dentro das
condições de busca na base de dados eletrônica “Scopus”. Dois artigos encontrados na base “ISI
Web of Science” não relacionados na busca na “Scopus” foram acrescentados, totalizando 31
registros. Deste total, dezesseis artigos não foram selecionados como evidências empíricas diretas
do efeito de borda aos mamíferos, havendo artigos que tratam, por exemplo, de política e gestão
ambiental, de ecossistema marinho e um estudo de gradiente de transição natural não resultante
de fragmentação. Todos os artigos excluídos estão listados no Anexo A, explicitando sua
abordagem e os motivos pelo quais não foram incluídos.
Assim, esta seleção resultou em quinze artigos que apresentavam resultados empíricos do
efeito de borda aos mamíferos no Brasil. Uma análise preliminar, relacionando o número de
artigos por ano sobre o assunto consta na
.
10
Figura 1.1. Número de artigos sobre efeitos de borda aos mamíferos nos biomas brasileiros publicados por ano.
Quanto aos biomas estudados, os estudos concentraram-se em apenas três: Mata Atlântica
(oito), Amazônia (quatro) e Cerrado (dois), além de um estudo para a transição Amazônia-Cerrado.
Considerando as unidades da federação, nove das dez unidades nas quais foram realizados
estudos tiveram um ou dos estudos (AM, BA, DF, MG, MS, PR, RJ, SE, SP). Somente o estado de
Mato Grosso obteve quatro estudos avaliando o efeito de borda em mamíferos.
Quanto aos grupos estudados, onze estudos foram realizados com pequenos mamíferos, os
demais grupos apresentaram apenas um (primatas) ou dois estudos (médios e grandes
mamíferos/morcegos; Erro! Fonte de referência não encontrada.). Quanto aos níveis de
abordagem, houve predominância de estudos para comunidades (dez), com relação a populações
(quatro; Figura 1.3Erro! Fonte de referência não encontrada.). Os estudos de comunidades foram
destaque para pequenos mamíferos (oito). Também houve registro de um estudo multi-taxa, que
0
1
2
3
4
Nú
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e ar
tigo
s
Anos
11
além de primatas e pequenos mamíferos, envolveu outros grupos: pteridófitas, lepidópteros,
anfíbios, répteis e aves.
Figura 1.2. Número de artigos para cada grupo e abordagens utilizadas (Multi-taxa, comunidades e populações), considerando os quinze artigos selecionados.
Nos quatro estudos que abordaram o nível de populações, foram medidas as seguintes
variáveis: densidade específica (dois estudos), um estudo avaliou a probabilidade de ocorrência e
um estudo avaliou o tamanho populacional, a razão sexual e o tamanho da área de vida.
Já os onze estudos que tiveram abordagem no nível de comunidades (inclui o estudo multi-
taxa, em função das características do estudo) mediram as seguintes variáveis: abundância
específica - espécies em separado (quatro), abundância total - espécies somadas (seis),
composição de espécies (três), diversidade - Índice de Shannon (um), número de registros de cada
espécie (dois) e riqueza de espécies (nove). Apenas três estudos utilizam apenas um tipo de
variável (Pires et al., 2005, Norris et al., 2008, Da Silva et al., 2013), os demais oito usaram
0
2
4
6
8
10
12
PequenosMamíferos
Médios eGrandes mamíferos
Morcegos Primatas
Nú
mer
o d
e ar
tigo
s
Grupos
Multi-taxa Comunidades Populações
12
combinações de duas ou três variáveis nas análises, podendo apresentar respostas divergentes
quanto à resposta ao efeito de borda (positiva, neutra, negativa) (Tabela 1.1).
13
Tabela 1.1. Artigos que apresentaram evidências empíricas do efeito de borda para os mamíferos em diferentes biomas do Brasil, destacando: bioma, estado, grupos, nível de abordagem, variáveis medidas, tipo de resposta à borda e observações, quando pertinente (continua).
Artigo Bioma Estado GruposNível de
AbordagemVariáveis Medidas
Resposta à
bordaObservações
Riqueza de espécies negativa
Diversidade: Índice de Shannon (H') negativa
Riqueza de espécies positiva
Abundância total neutra
positiva
Aumento nas bordas da abundancia de espécies comuns na matriz
Akodon cursor e Oligoryzomys sp., raramente capturados no
interior da floresta e Marmosa murina (espécie florestal comum).
neutra Rhipidomys mastacalis , Thaptomys sp., Micoureus demerarae .
negativa
Diminuição da abundancia de espécies típicas do interior da
floresta Monodelphis americana , Marmosops incanus e Oryzomys
laticeps nas bordas.
positivaAumento das capturas de Akodon cursor e Oecomys concolor na
borda.
neutra
Não houve tendência de aumento/diminuição detectável para as
demais espécies (Caluromys philander , Metachirus nudicaudatus ,
Philander frenata , Micoureus demerarae , Nectomys squamipes ,
Oligoryzomys nigripes ).
Riqueza de espécies neutra
Abundância total neutra
positiva Espécies generalistas oportunistas: Necromys lasiurus , Calomys sp.
neutraEspécies generalistas: Marmosa murina , Gracilinanus agilis ,
Monodelphis adusta , Neacomys spinosus , Oligoryzomys microtis
negativa
Espécies intermediárias: Marmosops noctivagus , Micoureus
demerarae , Oryzomys megacephalus , Oecomys bicolor , Oecomys
robertii , Proechimys gr. longicaudatus , Oryzomys nitidus ,
Metachirus nudicaudatus , Philander opossum , Oecomys sp.,
Monodelphis domestica , Mesomys hispidus , Akodon toba ,
Rhipidomys mastacalis
negativaEspécies especialistas: Didelphis marsupialis , Monodelphis
brevicaudata , Caluromys philander , Glironia venusta
neutra Akodon montensis e Oligoryzomys nigripes
negativa Delomys sublineatus
neutra Rodentia: Dayprocta agouti e Agouti paca
neutra/
positiva
Fragmentos pequenos: Ungulados (Tayassu tajacu , Mazama
guazoubira , Tapirus terrestris )
negativaFragmentos grandes: Ungulados (Tayassu tajacu , Mazama
guazoubira , Tapirus terrestris )
*Akodon montensis , Oligoryzomys nigripes , Delomys sublineatus
Pequenos Mamíferos Comunidades
Amazônia MT
Stevens & Husband 1998 Mata Atlântica SE
Pequenos Mamíferos Comunidades
Abundância específica
(8 espécies)
Pardini 2004 Mata Atlântica BA Pequenos Mamíferos ComunidadesAbundância específica
(9 espécies)
Pires et al 2005 Mata Atlântica RJ Pequenos Mamíferos Comunidades
Densidade específica
Norris et al 2008 Amazônia MTMédios e
Grandes mamíferosComunidades
Püttker et al 2008 Mata Atlântica SP Pequenos Mamíferos* População
Número de registros
de cada espécie
Santos-Filho et al 2008
Número de registros de cada espécie
14
Tabela 1.1. Artigos que apresentaram evidências empíricas do efeito de borda para os mamíferos em diferentes biomas do Brasil, destacando: bioma, estado, grupos, nível de abordagem, variáveis medidas, tipo de resposta à borda e observações, quando pertinente (fim).
Artigo Bioma Estado GruposNível de
AbordagemVariáveis Medidas
Resposta à
bordaObservações
negativa Canis familiaris (espécie sinantrópica proveniente da matriz)
não
conclusiva Myrmecophaga tridactyla , Chrysocyon brachyurus
neutra Procyon cancrivorus , Tapirus terrestris
Composição (especialistas florestais) neutra diferenças apenas para pteridófitas e lepidópteros
neutra riqueza de espécies especialistas florestais
positiva riqueza de espécies generalistas
positiva abundancia de espécies generalistas
neutra abundancia de espécies especialistas florestais
Tamanho populacional neutra
Razão sexual neutra
Tamanho da área de vida neutra
Composição de espécies neutra
Riqueza de espécies neutra
neutraDidelphis albiventris , Monodelphis domestica , Thylamys macrurus
(fêmeas), Calomys callidus , Thricomys pachyurus
positiva Thylamys macrurus (machos)
Composição de espécies negativa
Algumas espécies não foram capturadas a menos de 100 m da borda
(Philander opossum , Metachirus nudicaudatus , Euryorymomys
nitidus )
Riqueza de espécies negativa
Abundância total negativa
Riqueza de espécies neutra
Abundância total negativa
Silva et al 2013 Mata Atlântica PR Morcegos Comunidades Riqueza de espécies neutra
positivaAlouatta macconnelli , Chiropotes chiropotes , Saguinus midas e
Sapajus apella apella
negativa Ateles paniscus
neutra Pithecia chrysocephala
Riqueza de espécies positiva
Abundância total neutra
Abundância específica
(espécie mais capturada)neutra Euryoryzomys russatus
**Canis familiaris , Myrmecophaga tridactyla , Chrysocyon brachyurus , Procyon brachyurus , Tapirus terrestris
*** Outros taxa : Pteridófitas, Lepidópteros, Anfíbios, Répteis e Aves
**** Akodon montensis
Densidade específica
Cerboncini et al 2015 Mata Atlântica PR Pequenos Mamíferos Comunidades
Lenz et al 2014 Amazônia AM Primatas População
Mendes-Oliveira et al 2012
Transição
Amazônia-
Cerrado
MT Pequenos Mamíferos Comunidades
Abundância específica (6 espécies)
Santos-Filho et al 2012 Amazônia MT Pequenos Mamíferos Comunidades
Napoli & Caceres 2012 Cerrado MS Pequenos Mamíferos Comunidades
Jordão et al 2010 Mata Atlântica MG Pequenos Mamíferos**** População
Riqueza de espécies de cada táxon
(divididos em especialistas e generalistas)
Abundância total
(divididos em especialistas e generalistas)
Lacerda et al 2009 Cerrado DFMédios e
Grandes mamíferos**População Probabilidade de ocorrência
Pardini et al 2009 Mata Atlântica BAMorcegos,
Pequenos mamíferos***
Multi-taxa
(Comunidades)
15
1.3.2. Análise do efeito de borda para pequenos mamíferos nos biomas brasileiros
O grupo dos pequenos mamíferos não-voadores, foi o que apresentou maior número de
estudos - dez. Apenas um estudo considerou abordagem de populações (Püttker et al., 2008), os
nove estudos restantes utilizaram abordagem de comunidades (incluindo multi-taxa), com uma ou
mais variáveis analisadas (Erro! Fonte de referência não encontrada.).
Figura 1.3. Tipos de respostas (negativa, neutra, positiva) dos pequenos mamíferos com relação às diferentes variáveis consideradas em estudos cuja abordagem se deu no nível de comunidades.
A variável mais utilizada foi a riqueza de espécies com resultados positivos (dois), neutros
(três) e negativos (dois) (Figura 1.3). A abundância total também foi utilizada, apresentando
respostas negativas (dois) e neutras (três), assim como a composição de espécies, com uma
negativa e uma neutra. Já um índice de diversidade foi utilizado por apenas um estudo, com
resposta negativa.
0
1
2
3
4
Abundância total Composição deespécies
Diversidade Riqueza de espécies
Resposta à Borda
Negativa Neutra Positiva
16
1.4. Discussão
1.4.1. Análise do efeito de borda para mamíferos nos biomas brasileiros
A revisão mostrou que no Brasil os estudos que avaliam o efeito de borda em mamíferos
usam predominantemente pequenos mamíferos em biomas predominantemente florestais (Mata
Atlântica e Amazônia), que totalizam 12 dos 15 estudos. O bioma cerrado, predominantemente
não florestal, contou com dois estudos, além de um estudo na Transição Amazônia-Cerrado. Não
foram encontrados estudos para os Biomas Caatinga, Pantanal e Pampa. Respostas à formação de
bordas tendem a ser mais acentuadas nas bordas com maior contraste estrutural, geralmente
definido pelas diferenças na altura da vegetação (Ries & Sisk, 2010). Desta forma, no caso do
estudo do efeito de borda, os biomas florestais são os modelos mais utilizados, pois a
fragmentação de habitats florestais geralmente ocasiona bordas abruptas, tendo em vista os tipos
de uso do solo mais comuns na matriz (ex. agricultura, pastagens), para as quais são esperadas
respostas mais evidentes, a priori.
Desta forma, nos dois estudos sobre efeito de borda aos mamíferos no Cerrado (Lacerda et
al., 2009; Napoli & Cáceres, 2012), bioma reconhecido por sua heterogeneidade estrutural
intrínseca, as respostas obtidas foram neutras, não conclusivas ou mesmo positiva (machos do
marsupial Thylamys macrurus – Napoli & Cáceres, 2012). O contraste entre a borda e o interior
dos remanescentes possivelmente não foram suficientes para causar alguma diferença importante
nas comunidades de pequenos mamíferos estudadas (Napoli & Cáceres, 2012). Uma resposta
17
negativa interessante foi encontrada por Lacerda et al. (2009) com relação à intrusão de espécie
exótica sinantrópica, o cachorro doméstico Canis familiaris, nas bordas de uma unidade de
conservação em área urbana. Neste caso, mesmo que não tenha sido detectado efeito direto
sobre os mamíferos nativos, a intrusão de cachorros domésticos nas bordas pode causar
alterações nestas populações.
Além das variações relacionadas à estrutura da vegetação, também há grande variação das
respostas às bordas entre os grupos (pequenos mamíferos não-voadores, primatas, morcegos e
médios e grandes mamíferos), mas entre espécies de um mesmo grupo e entre as variáveis
medidas. As respostas ao efeito de borda observado variaram entre positiva, neutra ou negativa,
provavelmente de acordo com os atributos funcionais de cada espécie e a incidência de fatores
como o isolamento e o efeito da matriz (Ewers & Didham, 2006). Em uma revisão, Ries et al.
(2004) encontraram 53 estudos que mediram as respostas dos mamíferos à formação de bordas,
sendo que deste universo, com relação à abundância por espécie, foram encontradas 12 respostas
positivas, 6 negativas, 25 neutras e 9 mistas e um estudo com efeito negativo na riqueza de
espécies.
Um dos motivos dessas respostas variadas é que ao contrário da perda direta de habitat,
que apresenta efeitos negativos consistentes na biodiversidade, os efeitos decorrentes da
fragmentação dos habitats, como o efeito de borda, por exemplo, são mais difíceis de interpretar,
visto que podem ser comparativamente mais fracos e variarem de negativos a positivos (Fahrig,
2003). Além disto, apesar de existirem respostas claras na estrutura florestal decorrentes de
condições abióticas decorrentes do efeito de borda, a resposta das espécies, componente biótico,
são menos óbvias (Murcia, 1995).
18
Dentre os estudos realizados em habitats florestais (12), somente dois estudos
apresentaram respostas negativas para todas as variáveis medidas (Stevens & Husband, 1998,
Santos-Filho et al., 2012), sendo que ambos foram realizados em paisagens altamente
fragmentadas, com matrizes não florestais. Outros dois estudos apresentaram somente respostas
neutras (Jordão et al., 2010, Da Silva et al., 2013), mas a maioria dos estudos apresentaram
respostas mistas, sendo que um estudo apresentou respostas negativas e neutras (Püttker et al.,
2008), três estudos apresentaram respostas positivas e neutras (Pires et al., 2005, Pardini et al.,
2009, Cerboncini et al., 2015) e quatro estudos apresentaram respostas positivas, neutras e
negativas (Pardini et al., 2004, Norris et al., 2008, Santos-Filho et al., 2008, Lenz et al., 2014).
Com relação aos dois estudos que obtiveram somente respostas neutras, Jordão et al.
(2010) abordaram parâmetros populacionais de apenas uma espécie de roedor (Akodon
montensis), espécie considerada de distribuição comum, abundante e sem restrição de uso de
habitat (Bonvicino et al., 2002). Além disto os próprios autores definem o fragmento estudado
como pequeno (60 hectares), o que poderia fazer com que o efeito de borda estivesse atuando em
toda a extensão do fragmento. Também não foram citadas as distâncias dos locais de captura às
bordas. Já Da Silva et al. (2013), em trabalho com morcegos, apresentou somente resultados
comparativos de riqueza de espécies entre dois transectos (um alocado no interior e outra na
borda) em um fragmento. Como o único parâmetro avaliado foi a riqueza de espécies, não foi
possível saber se houve diferenças quanto a abundância das diferentes espécies capturadas, visto
que a riqueza só considera o número de espécies e não o número de indivíduos de cada espécie.
Desta forma, ambos os estudos não necessariamente são evidências de um efeito de borda neutro
19
para as situações estudadas. Ries & Sisk (2010) mencionam que a resposta neutra, muitas vezes
pode ser o resultado de fatores que confundem a análise ou do baixo poder estatístico.
Por outro lado, as demais respostas neutras e positivas encontradas (Pardini et al., 2009,
Cerboncini et al., 2015) ocorreram em locais nos quais a vegetação nativa era equivalente ou
predominante com relação ao total áreas alteradas na paisagem. Nota-se que em três casos
(Pardini et al., 2004, Santos-Filho et al., 2008, Pardini et al., 2009), respostas neutras obtidas
quanto aos parâmetros de riqueza de espécies ou de abundância total das comunidades eram
compostas por diferentes respostas (positivas, negativas, neutras) na abundância das espécies ou
de grupos funcionais. Caso estes trabalhos tivessem apenas considerado os parâmetros de riqueza
e abundância das comunidades, possivelmente o efeito detectado para as espécies ou grupos
funcionais poderia não ter ficado evidente.
Os trabalhos que avaliaram o efeito de borda para populações de espécies diferentes,
roedores e primatas respectivamente, apresentaram mais de um tipo de resposta de (Püttker et
al., 2008; Lenz et al., 2014). Tais respostas podem ser explicadas por mecanismos que atuam em
nível específico, provavelmente correlacionadas com atributos funcionais das espécies, tais como
nível trófico, habilidade de dispersão, tamanho corporal, largura de nicho ou raridade, fazendo
com que cada espécie responda de uma forma particular (Ewers & Didham, 2006). O trabalho de
Pires et al. (2005) também identificou estas diferenças entre espécies de roedores.
Norris et al. (2008), por sua vez, apresentam uma situação na qual o efeito para ungulados
varia de acordo com o tamanho do fragmento, encontrando efeitos negativos nos fragmentos
grandes e neutros ou positivos nos fragmentos pequenos. Para explicar essa diferença, esses
20
autores sugeriram duas hipóteses para o efeito neutro ou positivo observado nos pequenos
fragmentos: ou os animais fazem uso intermitente do espaço, o que acarretaria em uma maior
frequência de movimentos atravessando a borda para acessar a matriz ou outros fragmentos, ou
os animais são residentes, o que poderia gerar a necessidade de utilizar todo o espaço disponível.
Finalmente, estudos de fragmentação vêm usando largamente os vertebrados como
objetos de estudo, especialmente aves e mamíferos, entretanto, as respostas levantadas para os
mamíferos nesta revisão indicam que há grande variação não somente entre grupos, mas entre
espécies de um mesmo grupo e variáveis medidas. As respostas ao efeito de borda observado
variaram entre positiva, neutra ou negativa, provavelmente de acordo com os atributos funcionais
de cada espécie e a incidência de fatores como o isolamento e o efeito da matriz (Ewers &
Didham, 2006). As respostas neutras, por outro, lado podem ser resultado do baixo contraste
entre os hábitats e a matriz, de fatores que confundem a análise ou do baixo poder estatístico,
mais do que de uma possível insensibilidade à formação de bordas. Esta insensibilidade à
formação de bordas é uma hipótese com elevada dificuldade de comprovação, visto que para uma
espécie ser considerada insensível, ela teria que apresentar a mesma resposta de forma
consistente em diversos tipos de borda (Ries & Sisk, 2004).
1.4.2. Análise do efeito de borda para pequenos mamíferos nos biomas brasileiros
Foram identificados nove estudos que avaliaram as respostas dos pequenos mamíferos ao
efeito de borda em abordagens de comunidades. Apenas um estudo avaliou parâmetros
21
populacionais em pequenos mamíferos. Ries et al. (2004) consideram que os efeitos da formação
de borda podem não ter implicações fortes nos parâmetros populacionais, caso o efeito seja fraco
ou a variável resposta não seja um fator chave na regulação da população.
Nestes nove estudos com abordagens de comunidades, houve registro de respostas
neutras e negativas para as variáveis: abundância total, composição de espécies e índice de
diversidade. Apenas a variável riqueza de espécies apresentou respostas positivas em dois estudos
(Cerboncini et al., 2015, Pardini et al., 2004), mas também respostas neutras e negativas. As
variações na riqueza de espécies e composição das comunidades são resultado da composição das
respostas individuais de cada espécie, que são amplamente variáveis, em função de diferentes
estratégias bionômicas e requisitos de habitat (Ewers & Didham, 2006). Ambos os estudos que
obtiveram respostas positivas para riqueza (Cerboncini et al., 2015, Pardini et al., 2004) ocorreram
em habitats localizados em paisagens na qual predominava a vegetação nativa e não em habitats
amplamente fragmentados, nos quais o efeito de borda seria potencializado (Laurance, 2008).
Em geral, tem sido empregado pouco esforço para elucidar os mecanismos causais das
respostas neutras, que apresentam ser as mais comuns nos estudos de efeito de borda (Ries &
Sisk, 2010). Estes autores citam tanto fatores extrínsecos, como a orientação e o contraste da
borda, como fatores intrínsecos a cada espécie, baseados em alguns atributos, tais como área de
vida, tamanho corporal e mobilidade. Mas em vários casos estas respostas neutras podem ocorrer
devido à baixa replicação ou a um poder baixo de detecção de efeitos (Ries et al., 2004).
Desta forma, apesar do pequeno número de estudos, foram identificadas respostas
neutras ou negativas para a maioria dos estudos das respostas ao efeito de borda de comunidades
22
de pequenos mamíferos. Respostas positivas foram identificadas somente para a variável riqueza,
em estudos em paisagens nas quais havia predomínio de vegetação nativa.
23
1.5. Literatura citada na Tabela 1.1
CERBONCINI, R. A. S.; ROPER, J. J.; PASSOS, F. C. Edge effects without habitat fragmentation? Small
mammals and a railway in the Atlantic Forest of southern Brazil. Oryx, p. 1–8, 11 fev. 2015.
DA SILVA, J. R. R.; FILHO, H. O.; LACHER, T. E. Species richness and edge effects on bat
communities from Perobas Biological Reserve, Paraná, southern Brazil. Studies on
Neotropical Fauna and Environment, v. 48, n. 2, p. 135–141, 2013.
JORDÃO, J. C.; RAMOS, F. N.; DA SILVA, V. X. Demographic parameters of Akodon montensis
(Mammalia: Rodentia) in an Atlantic Forest remnant of southeastern Brazil. Mammalia, v.
74, n. 4, p. 395–400, 1 jan. 2010.
LACERDA, A. C. R.; TOMAS, W. M.; MARINHO-FILHO, J. Domestic dogs as an edge effect in the
Brasília National Park, Brazil: Interactions with native mammals. Animal Conservation, v.
12, n. 2, p. 477–487, out. 2009.
LENZ, B. B.; JACK, K. M.; SPIRONELLO, W. R. Edge effects in the primate community of the
biological dynamics of forest fragments project, Amazonas, Brazil. American journal of
physical anthropology, v. 155, n. 3, p. 436–46, nov. 2014.
MENDES-OLIVEIRA, A. C.; SANTOS, P. G. P. dos; CARVALHO-JÚNIOR, O. de; MONTAG, L. F. de A.;
LIMA, R. C. S. de; MARIA, S. L. S. de; ROSSI, R. V. Edge effects and the impact of wildfires on
populations of small non-volant mammals in the forest-savanna transition zone in Southern
Amazonia. Biota Neotropica, v. 12, n. 3, p. 57–63, set. 2012.
NAPOLI, R. P.; CACERES, N. C. Absence of edge effect on small mammals in woodland-savannah
remnants in Brazil. Community Ecology, v. 13, n. 1, p. 11–20, 1 jun. 2012.
NORRIS, D.; PERES, C. A.; MICHALSKI, F.; HINCHSLIFFE, K. Terrestrial mammal responses to edges in
Amazonian forest patches: a study based on track stations. Mammalia, v. 72, n. 1, p. 15–
23, 25 jan. 2008.
24
PARDINI, R. Effects of forest fragmentation on small mammals in an Atlantic Forest landscape.
Biodiversity and Conservation, v. 13, n. 13, p. 2567–2586, dez. 2004.
PARDINI, R.; FARIA, D.; ACCACIO, G. M.; LAPS, R. R.; MARIANO-NETO, E.; PACIENCIA, M. L. B.; DIXO,
M.; BAUMGARTEN, J. The challenge of maintaining Atlantic forest biodiversity: A multi-taxa
conservation assessment of specialist and generalist species in an agro-forestry mosaic in
southern Bahia. Biological Conservation, v. 142, n. 6, p. 1178–1190, jun. 2009.
PIRES, A. S.; FERNANDEZ, F. A.; DE FREITAS, D.; FELICIANO, B. R. Influence of Edge and Fire-induced
Changes on Spatial Distribution of Small Mammals in Brazilian Atlantic Forest Fragments.
Studies on Neotropical Fauna and Environment, v. 40, n. 1, p. 7–14, abr. 2005.
PÜTTKER, T.; MEYER‐LUCHT, Y.; SOMMER, S. Fragmentation effects on population density of three
rodent species in secondary Atlantic Rainforest, Brazil. Studies on Neotropical Fauna and
Environment, v. 43, n. 789736854, p. 11–18, abr. 2008.
SANTOS-FILHO, M.; DA SILVA, D.; SANAIOTTI, T. Edge effects and landscape matrix use by a small
mammal community in fragments of semideciduous submontane forest in Mato Grosso,
Brazil. Brazilian Journal of Biology, v. 68, n. 4, p. 703–710, nov. 2008.
SANTOS-FILHO, M.; PERES, C. A.; DA SILVA, D. J.; SANAIOTTI, T. M. Habitat patch and matrix effects
on small-mammal persistence in Amazonian forest fragments. Biodiversity and
Conservation, v. 21, n. 4, p. 1127–1147, 28 jan. 2012.
STEVENS, S. M.; HUSBAND, T. P. The influence of edge on small mammals: evidence from Brazilian
Atlantic forest fragments. Biological Conservation, v. 85, n. 1-2, p. 1–8, jul. 1998.
25
2. Capítulo 2. Estudo do efeito de borda em fragmentos adjacentes à faixa
de dutos para comunidades de pequenos mamíferos da Mata Atlântica
2.1. Introdução
Estudos teóricos tratam a fragmentação como um problema relacionado à distribuição e
configuração espacial dos fragmentos de hábitat e à dispersão de espécies entre eles, entretanto,
evidências empíricas sugerem que os fragmentos experimentam alterações na composição de
espécies predominantemente devido a processos de degradação relacionados à existência de
bordas (Harrison & Bruna, 1999). Dois mecanismos de causa direta de alterações na abundância
das espécies relacionadas à existência de bordas são: a alteração em fluxos de matéria, de energia
ou de organismos através das bordas e o acesso a recursos espacialmente separados por algumas
espécies (Ries et al., 2004). Estes dois efeitos diretos podem levar a efeitos indiretos, sejam na
distribuição de recursos disponíveis para uma determinada espécie ou nas interações ecológicas
entre espécies (Ries et al., 2004). Tanto os efeitos diretos quanto indiretos podem causar
alterações em populações e na estrutura de comunidades próximas às bordas (Fagan et al., 1999).
Desta forma, o efeito de borda tem sido definido como uma combinação de alterações
físicas e bióticas associadas às margens de remanescentes ou fragmentos de habitats circundados
por ambientes modificados por atividades humanas (Murcia, 1995; Laurance, 1997). O padrão de
efeito de borda usualmente utilizado na maioria dos estudos assume que uma determinada
variável de interesse é uma função da distância da borda de um fragmento, que varia em direção
26
ao seu interior, formando um gradiente ambiental (Murcia, 1995). Entretanto, Prevedello et al.
(2012) ressalvam que a literatura sobre efeito de borda tradicionalmente assume que as respostas
das espécies às bordas são atribuídas apenas às características ambientais, de disponibilidade de
recursos ou de interação entre espécies, desconsiderando a existência do efeito geométrico da
borda, outro potencial mecanismo causal para alterações na abundância de espécies com relação
às bordas. Mesmo na ausência de gradientes ambientais, ainda assim a abundância de uma
espécie pode ser menor próximo às bordas se comparada a locais mais centrais de um fragmento,
devido ao fato que uma área central pode receber indivíduos de todas as direções, enquanto uma
área junto à borda tende a não receber indivíduos da área externa ao fragmento (Prevedello et al.,
2012).
Diversos estudos vêm demonstrando que diferentes espécies respondem à formação de
bordas de maneiras distintas, podendo apresentar aumentos, declínios ou ausência de alteração
em suas abundâncias, dependendo do tipo de borda presente e de variações temporais ou
espaciais na distribuição de determinados recursos (Ries & Sisk, 2004). Tal variação é esperada,
visto que respostas de uma espécie a mudanças ambientais tendem a ser diferentes das demais
espécies por vários motivos, sejam diferenças no tamanho corporal, no tamanho da área de vida,
na longevidade ou nos recursos necessários para alimentação e reprodução, fazendo com que as
espécies interajam de forma diferente com a paisagem, diferindo nas escalas espaciais e
temporais das respostas (Caro, 2010).
Dentre os mamíferos terrestres alguns atributos da história de vida, tais como baixa taxa
reprodutiva, bem como maior massa corporal e maior área de vida estão relacionados à
diminuição das abundâncias em habitats fragmentados (Kosydar et al., 2014). Entretanto, espécies
27
com alta capacidade de dispersão, tais como os mamíferos de maior massa corporal, podem
apresentar respostas populacionais à fragmentação que integram domínios espaciais muito mais
amplos que um único fragmento, podendo gerar respostas aparentemente idiossincráticas nesta
escala (Debinski & Holt, 2000).
Desta forma, para avaliação da existência de efeito de borda em dois fragmentos florestais
de Mata Atlântica atravessados por uma faixa de dutos, estudou-se um modelo de avaliação de
riqueza e abundância de pequenos mamíferos não-voadores (roedores e marsupiais) em
diferentes distâncias de uma faixa existente. Segundo Bonvicino et al. (2002) os pequenos
mamíferos apresentam características que podem favorecer seu uso em avaliações de impacto
ambiental e monitoramentos, tais como maiores populações, menor capacidade de dispersão e
menores áreas de vida do que outros mamíferos. Este grupo já foi utilizado em estudos sobre
efeitos de empreendimentos lineares na Austrália, apresentando diferenças relacionadas ao efeito
de borda (Goosem, 2000).
Assim, o objetivo deste capítulo foi verificar se a comunidade de pequenos mamíferos
apresentava diferenças na riqueza de espécies e na abundância em relação às bordas adjacentes à
faixa de dutos em dois fragmentos de Mata Atlântica.
28
2.2. Material e Métodos
2.2.1. Área de estudo
A área de estudo se localiza na bacia hidrográfica do Rio São João, nos municípios de
Cachoeiras de Macacu e Silva Jardim, Estado do Rio de Janeiro, pertencendo à APA da Bacia do Rio
São João/Mico-Leão-Dourado. Criada em 27 de junho de 2002 por decreto federal a Área de
Proteção Ambiental da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado, abrange 150.700 hectares nos
municípios de Araruama, Cabo Frio, Cachoeiras de Macacu, Casemiro de Abreu, Rio Bonito, Rio das
Ostras e Silva Jardim. Esta unidade de conservação se localiza na Região Centro-Leste do Estado do
Rio de Janeiro, e seus objetivos são a proteção e conservação dos mananciais, a regulação do uso
de recursos hídricos e do parcelamento do solo, de forma a garantir o uso racional dos recursos
naturais e proteger os remanescentes de floresta atlântica e o patrimônio ambiental e cultural da
região (Decreto s/n°, 27 de junho de 2002).
A APA da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado é uma Unidades de Conservação de
Uso Sustentável que se integra às duas Unidades de Proteção Integral da região - a Reserva
Biológica de Poço das Antas e a Reserva Biológica União - abrangendo partes relevantes das zonas
de amortecimento de ambas as unidades, bem como várias Reservas Particulares do Patrimônio
Natural (RPPNs). As principais linhas de pesquisa desenvolvidas na unidade compreendem
aspectos da ecologia do Mico-Leão-Dourado (Leontopithecus rosalia), espécie ameaçada de
29
extinção, a fragmentação da Mata Atlântica, espécies indicadoras e a ictiofauna. Atualmente seu
órgão gestor é o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio, 2008).
O clima da região é do tipo Aw segundo a classificação climática de Köppen (Alvares et al.,
2013) e seu relevo é caracterizado por escarpas serranas acidentadas que delimitam a Baixada do
Rio São João, esta formada por planície aluvial entremeada de colinas isoladas (CPRM, 2000). Os
fragmentos de vegetação nativa que restaram se localizam nos locais com relevo acidentado,
predominantemente nas escarpas, mas também nas colinas. As áreas de planícies, porém, tiveram
quase toda sua vegetação nativa removida para usos diversos do solo, com atual predomínio da
agricultura e pecuária (ICMBio, 2008). As formações florestais de Mata Atlântica são típicas de
Floresta Ombrófila Densa, com as fitofisionomias Montana, Submontana e de Terras Baixas (IBGE,
2012).
Nesta região há duas faixas de dutos da Petrobras/Transpetro que interligam a Refinaria
Duque de Caxias (Reduc) em Duque de Caxias ao Terminal de Cabiúnas (Tecab) em Macaé. A
primeira faixa comporta dois oleodutos denominados Osduc e Osduc II e dois gasodutos
denominados Gasduc I e Gasduc II; a segunda faixa, implantada mais recentemente, comporta o
gasoduto Gasduc III (Petrobras, 2015a; Petrobras, 2015b). Estas faixas compartilham alguns
trechos entre os municípios de Duque de Caxias e Itaboraí e em pequenas extensões em Silva
Jardim e Macaé, mas a maior parte de seus trajetos são independentes. Ambas as faixas
atravessam fragmentos de vegetação de Mata Atlântica no trecho compreendido pela APA da
Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado.
30
Na faixa de dutos mais antiga, o oleoduto Osduc (duto com diâmetro de 32”) teve sua
operação iniciada em 1982, assim como o gasoduto Gasduc I (16”). Em 1996 foi implantado um
segundo gasoduto nesta faixa, o Gasduc II (20”) e em 2002 foi implantado o quarto e último duto,
o Osduc II (20”) (ANTT, 2007). O Gasduc II transporta gás natural, enquanto o Osduc transporta
petróleo e o Osduc II transporta LGN (Líquido de Gás Natural). Em 2008, o Gasduc I foi convertido
para transporte de LGN (Líquido de Gás Natural) e teve sua denominação alterada para Osduc IV
(ANP, 2008). Na faixa mais recente, está implantado apenas o gasoduto Gasduc III (38”), cuja
operação foi iniciada em 2010.
A largura típica das faixas nesta região é de 20 metros e sua superfície é mantida com
vegetação de porte herbáceo, tipicamente gramíneas (Figura 2.1). A vegetação com raízes
profundas, como a arbórea e eventualmente arbustiva, pode provocar danos aos dutos
enterrados, por isto as faixas de dutos em geral apresentam cobertura vegetal herbácea e existe
um controle para evitar que o processo da regeneração natural volte a ocorrer.
31
Figura 2.1. Faixa de dutos com marcos de concreto sinalizando a localização de cada duto enterrado.
Para este estudo foi escolhida a faixa dos dutos Osduc, Osduc II, Osduc IV (antigo Gasduc I)
e Gasduc II nos municípios de Silva Jardim e Cachoeiras de Macacu, pois é uma faixa que apresenta
pontos de interferência com a vegetação florestal nativa, atualmente protegida pela APA da Bacia
do Rio São João/Mico-Leão-Dourado. Esta faixa foi instalada antes dos requisitos atuais da
legislação ambiental, cuja base conceitual foi estabelecida pela Política Nacional de Meio
Ambiente (Lei 6.938/1981), mas que somente em 1986 foi regulamentada em relação ao
licenciamento ambiental pela Resolução CONAMA nº 01/1986. Assim como em diversos
empreendimentos em operação no país, anteriores ao licenciamento ambiental, sua situação
prévia não é conhecida e eventuais impactos à biodiversidade não foram avaliados. Por outro
lado, na implantação da faixa mais recente, do gasoduto Gasduc III, os impactos de fragmentação
na vegetação nativa foram minimizados em função de práticas de análise ambiental durante a fase
de projeto e durante o processo de licenciamento ambiental.
32
Alguns estudos sugerem que as bordas geradas há mais tempo estariam sob efeito de
borda mais brando que as bordas mais recentes, devido a uma “vedação” ou adensamento da
vegetação na região da borda (Murcia, 1995). Entretanto, segundo Pütz et al. (2011) não há
evidências empíricas que uma atenuação por meio de “vedação” da borda ocorra, pelo menos na
Mata Atlântica, de forma que o efeito de borda seria responsável por alterações persistentes a
longo prazo na vegetação e perturbações no processo sucessional (Tabarelli et al., 2008). No
presente estudo, optou-se por seguir a posição de Pütz et al. (2011). Assim, mesmo a faixa
escolhida tendo sido implantada há mais de 30 anos, não se espera que tenha havido uma
atenuação significativa de efeito de borda, considerando-se que, conforme explicado
previamente, a superfície da faixa de dutos é mantida roçada ao longo dos anos de operação.
A escolha dos fragmentos para a coleta de dados foi baseada no tamanho do fragmento,
que deveria ser suficientemente grande para minimizar efeitos de bordas múltiplas (Fletcher,
2005), na possibilidade de acesso com relação ao relevo e concordância dos responsáveis pelas
propriedades com a realização do trabalho. Dessa forma, foram selecionados para a amostragem
áreas em dois fragmentos cujos tamanhos totais são de aproximadamente 1600 hectares (parte
pertencente à Fazenda Gaviões) e 3073 hectares (parte pertencente à Fazenda Nova Miracema),
ambas localizadas na APA da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-Dourado (Figura 2.2). As
coordenadas de referência das fazendas são: UTM 754252E/7501780S (Fuso 23K) da Fazenda
Gaviões e UTM 746506E/7498376S (Fuso 23K) da Fazenda Nova Miracema.
33
Figura 2.2. Mapa com a localização das duas fazendas dentro da APA da Bacia do Rio São João/Mico-Leão-
Dourado (área hachurada). Os dois fragmentos escolhidos estão representados por linhas verdes contínuas.
As áreas de amostragem nas fazendas Nova Miracema e Gaviões estão indicadas com pontos verdes. As
faixas de dutos da Petrobras/Transpetro estão indicadas com linhas vermelhas contínuas.
34
Figura 2.3. Vista geral da Fazenda Gaviões, Município de Silva Jardim-RJ.
Figura 2.4. Vista do interior do fragmento de vegetação na Fazenda Nova Miracema, Município de Cachoeiras de Macacu-RJ.
A vegetação presente em ambos os fragmentos escolhidos pode ser classificada como
Floresta Ombrófila Densa de Terras Baixas, uma das fitofisionomias mais ameaçadas na Mata
Atlântica devido a fragmentação (ICMBio, 2008). Na região predominam os estágios sucessionais
médio e avançado, sendo a vegetação caracterizada como secundária. O acesso às duas fazendas
35
se dá a partir da rodovia BR-101 (km 246, próximo à localidade de Cesário Alvim) e posteriormente
pela estrada municipal de Silva Jardim SJA-009 (estrada para a localidade de Imbaú) e RJ-126
(estrada que liga Correntezas-Silva Jardim a Japuíba-Cachoeiras de Macacu).
2.2.2. Coleta de dados
Inicialmente foi planejada a disposição de cinco linhas paralelas a faixa de dutos dentro
cada fragmento, sendo que as linhas mais próximas da faixa de dutos seriam alocadas a 10 m das
bordas dos fragmentos, de modo a garantir que todas as armadilhas estivessem em ambiente
florestal, e as demais linhas ficariam entre 100 a 200 metros de cada linha mais próxima, de modo
a penetrar 600 metros para o interior do fragmento, evitando a direção de outras bordas (Figura
2.5). Entretanto, devido a questões de relevo foram feitas algumas adaptações de modo a tornar
viável a instalação das armadilhas.
36
Figura 2.5. Desenho esquemático do módulo de amostragem no fragmento.
No fragmento localizado na Fazenda Gaviões, as fitas de marcação da quinta linha foram
removidas antes da primeira campanha, provavelmente por caçadores da região. Em conversa
com o administrador da Fazenda, foi informado que uma das propriedades vizinhas se encontrava
em estado de abandono, devido ao falecimento do proprietário, o que facilitava o acesso de
pessoas desconhecidas. Além disto, como chegaram a ser ouvidos tiros de arma de fogo na
primeira campanha, esta quinta linha foi desmontada devido ao risco à segurança da equipe e
possibilidade de perda das armadilhas. Desta forma, as disposições finais dos módulos finais
podem ser vistas na Figura 2.6 e na Figura 2.7 abaixo.
No fragmento de Nova Miracema os dados das duas linhas mais distantes da borda foram
tratados como um grupo único, devido às distâncias da borda serem equivalentes em função das
restrições da topografia.
37
Figura 2.6. Disposição final do módulo de amostragem de pequenos mamíferos no fragmento da Fazenda Gaviões, Silva Jardim-RJ. As estações de captura estão indicadas com pontos amarelos.
38
Figura 2.7. Disposição final do módulo de amostragem de pequenos mamíferos no fragmento da Fazenda Nova Miracema, Cachoeiras de Macacu-RJ. As estações de captura estão indicadas com pontos amarelos.
Em cada linha foram estabelecidas 10 estações de captura distantes 10 metros entre si. Em
cada estação de captura eram abertas duas armadilhas de captura viva do Tipo Sherman de
tamanhos diferentes: as menores com dimensões de 300x80x90 mm e as maiores medindo
430x125x145 mm. As armadilhas grandes foram sempre dispostas no chão (Figura 2.8) e as
pequenas foram preferencialmente presas em troncos no estrato do sob-bosque florestal (Figura
2.9). Todas as armadilhas foram iscadas com pasta feita com banana amassada, aveia, pedaços de
bacon e paçoca.
39
Figura 2.8. Armadilha de captura viva do tipo Sherman grande armada no solo.
Figura 2.9. Armadilha de captura viva do tipo Sherman pequena armada no sub-bosque.
40
As armadilhas eram verificadas diariamente e reiscadas quando necessário. Os indivíduos
capturados foram pesados, marcados com brincos numerados (National Band and Tag Co.,
Newport, Kentucky), medidos, tiveram seu sexo identificado, sendo liberados no ponto de captura
(Figura 2.10). Também foram registradas a condição reprodutiva (por exemplo, tetas com leite,
presença de filhotes para marsupiais), a dentição como indicador da classe de desenvolvimento
para marsupiais e se havia ou não a presença de parasitas. Caso o animal já fosse marcado, seu
número era registrado e o indivíduo solto no local de captura. Quando a identificação exata da
espécie não foi possível em campo, foi feita a coleta de indivíduos para posterior identificação em
laboratório. Indivíduos coletados foram incorporados à coleção do Museu Nacional/UFRJ.
Para a identificação em campo foram utilizadas as chaves de Bonvicino et al. (2008) para
roedores e de Gardner (2008) para marsupiais. A nomenclatura das espécies e o arranjo
taxonômico seguem estes autores, e também Patton et al. (2015) para roedores. A identificação
das espécies dos gêneros Akodon e Oligoryzomys foram feitas pelo Laboratório de Mastozoologia
do Departamento de Zoologia do IBRAG/UERJ. Já a identificação das espécies do gênero Trinomys
foi feita pelo Laboratório de Biodiversidade Molecular do IB/UFRJ.
O trabalho foi realizado com autorização para atividades com finalidade científica
(Número: 44647-1, emissão: 04/07/2014) concedida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade – ICMBio, por meio do Sistema de Autorização e Informação em Biodiversidade
– SISBIO.
41
Figura 2.10. Triagem de indivíduo (Akodon cursor) em campo.
Foram realizadas cinco campanhas, nas quais foram amostrados os dois fragmentos
simultaneamente, com cinco noites consecutivas de captura. As datas da realização das
campanhas seguem na tabela abaixo:
Tabela 2.1. Datas de realização do trabalho de campo.
Campanhas Datas de realização
1ª campanha 15 a 20 setembro 2014
2ª campanha 06 a 11 outubro 2014
3ª campanha 20 a 25 outubro 2014
4ª campanha 17 a 22 novembro 2014
5ª campanha 08 a 13 dezembro 2014
42
2.2.3. Análise dos dados
A riqueza de espécies para cada fragmento foi estimada com a construção de curva de
acumulação de espécies por indivíduo pelo método da rarefação e comparada ao estimador não
paramétrico Jackknife 1, calculados no programa EstimateS 9.1.0, com 10.000 aleatorizações.
Para análise de dados de riqueza e abundância, os dados coletados em cada fragmento
foram analisados em separado. Com apenas dois fragmentos não seria possível tratar cada um
como réplica dentro de uma abordagem paramétrica clássica. Uma forma de se lidar com essa
questão é ranquear os dados e aplicar testes não-paramétricos. Porém essa abordagem implica na
perda de parte da informação contida nos dados. Assim, preferiu-se utilizar testes de
randomização (randomization tests), como o de Monte Carlo (Manly, 2006) para analisar os dados
com maior sensibilidade, visto que não descartam informações, além de gerar análises estatísticas
válidas de informações obtidas em delineamentos de caso único (Todman & Dugard, 2009).
Neste caso, o teste de randomização seria análogo a uma análise Anova de um fator
(OneWay Anova), com os grupos definidos como as distâncias da borda em categorias e as
respostas como os valores de Riqueza Observada (Sobs), e Abundância total, se possível. A unidade
amostral foi a estação de captura, e para evitar a pseudo-replicação somente a primeira captura
de cada indivíduo foi computada para fins de análise. Desta forma, a hipótese nula é de que o
padrão encontrado nos dados não é diferente daquele que esperaríamos se as observações
tivessem sido atribuídas de forma aleatória aos diferentes grupos (Gotelli & Ellison, 2011),
43
denotando uma resposta neutra ao efeito de borda. A hipótese alternativa seria de que existem
diferenças na riqueza e abundância entre as linhas em diferentes distâncias da faixa de dutos.
Para realizar os testes de randomização (Monte Carlo), foram seguidas as seguintes etapas:
(i) foi calculado o valor F referente ao conjunto de dados amostrados em campo, (ii) foi gerada a
distribuição nula de referência, por meio do rearranjo dos valores da variável resposta (Riqueza ou
Abundância) de forma aleatória para as categorias de distância, computada a estatística F para os
dados aleatorizados, sendo este procedimento repetido 1000 vezes, (iii) o valor F referente ao
conjunto de dados amostrados em campo foi comparado à distribuição de referência gerada pelo
método de aleatorização (Gotelli & Ellison, 2011, Fortin et al., 2013), considerando um valor de
significância de 5%. Todas as análises estatísticas foram realizadas no programa RStudio Versão
0.98.1103 (RStudio, Inc.).
44
2.3. Resultados
O esforço total foi de 4500 armadilhas-noite, das quais 2000 armadilhas-noite na Fazenda
Gaviões, 2500 armadilhas-noite na Fazenda Nova Miracema. Nas cinco campanhas foram
realizadas 132 capturas de 72 indivíduos diferentes. Na Fazenda Gaviões foi registrado o maior
número de capturas (94) e também de indivíduos (49). A Fazenda Nova Miracema teve um
número de capturas (38) e indivíduos (23) bem menor que a Fazenda Gaviões (Tabela 2.2).
Tabela 2.2. Número de capturas e sucesso de capturas por áreas e total, os números entre parêntesis se referem aos números de indivíduos novos, excluídas as recapturas.
Áreas
Fazenda Gaviões
Fazenda Nova
Miracema TOTAL
Número de capturas 94 (49) 38 (23) 132 (72)
Esforço (armadilhas-noite) 2000 2500 4500
Sucesso 4,7% 1,52% 2,93%
1 – Número de noites de amostragem vezes o número de armadilhas por noite. 2 – Número de capturas dividido pelo esforço.
A Fazenda Gaviões teve nove espécies capturadas, enquanto a Fazenda Nova Miracema
teve sete espécies capturadas (
Tabela 2.3).
45
Tabela 2.3. Espécies capturadas nas duas fazendas durante as cinco campanhas.
Ordem Família Espécie Fazenda
Gaviões
Fazenda Nova
Miracema
Didelphimorphia Didelphidae Didelphis aurita 4 X
Philander frenatus 3 3
Metachirus nudicaudatus 6 X*
Marmosa paraguayana 6 4
Marmosops incanus 1 2
Monodelphis sp. X 1
Rodentia Cricetidae Akodon cursor 7 7
Oxymycterus dasytrichus 4 X
Nectomys squamipes 2 X
Oligoryzomys nigripes 16 3
Echimyidae Trinomys dimidiatus X 3
* Registrado indivíduo encontrado morto durante a abertura das trilhas, não houve captura em armadilha. Não considerado nas
análises.
As curvas do coletor construídas para as duas fazendas (Figura 2.11 e Figura 2.12)
apresentam o número de espécies com base no número de indivíduos capturados e no estimador
não paramétrico Jackknife 1 para comparação.
46
Figura 2.11. Curva do coletor construída para Fazenda Gaviões. Em azul estão os valores observados (Mao Tau), em laranja as estimativas Jackknife 1.
Figura 2.12. Curva do coletor construída para Fazenda Nova Miracema. Em azul estão os valores observados (Mao Tau), em laranja as estimativas Jackknife 1.
0
2
4
6
8
10
12
14
0 10 20 30 40 50
Nú
me
ro d
e E
spé
cie
s
Número de Indivíduos
Sobs (Mao Tau) Jackknife 1
0
2
4
6
8
10
12
0 5 10 15 20 25
Nú
me
ro d
e E
spé
cie
s
Número de Indivíduos
Sobs (Mao Tau) Jackknife 1
47
Nos casos das curvas de acumulação de espécies para as duas fazendas (baseadas no
número de indivíduos) fica evidente a baixa quantidade de capturas na Fazenda Nova Miracema
em relação à Fazenda Gaviões, mesmo assim em ambos os locais a riqueza observada aproximou-
se dos valores estimados de forma não paramétrica (Jackknife 1).
2.3.1. Análise da Riqueza Observada (Sobs) - Fazenda Gaviões
Na Fazenda Gaviões foram capturados 49 indivíduos pertencentes a nove espécies (Tabela
2.4). A riqueza média observada diferiu entre as estações de captura agrupadas nos quatro grupos
de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda (Figura 2.13), entretanto nota-se que há uma
variação grande dos desvios padrões, resultando consequentemente em heterogeneidade da
variância entre os grupos.
48
Tabela 2.4. Número total de indivíduos capturados em cada linha de estações de captura da Fazenda Gaviões, Silva Jardim-RJ.
Figura 2.13. Riqueza Observada (Sobs) (média e desvio padrão) para as estações de captura da Fazenda Gaviões agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda. L1 é o grupo mais próximo da borda e L4 o mais distante.
Espécie L1 L2 L3 L4 Totais
Oligoryzomys nigripes 1 8 4 3 16
Akodon cursor 1 0 3 3 7
Marmosa paraguayana 0 3 2 1 6
Metachirus nudicaudatus 1 1 2 2 6
Didelphis aurita 1 2 0 1 4
Oxymycterus dasytrichus 0 0 4 0 4
Philander frenatus 0 0 1 2 3
Nectomys squamipes 0 0 0 2 2
Marmosops incanus 0 0 0 1 1
Total por linha 4 14 16 15 49
49
A Razão-F para a Riqueza observada em campo para as estações de captura nos quatro
grupos de distâncias da borda foi calculada utilizando-se um modelo linear (Tabela 2.5). Os valores
apresentados não foram utilizados num teste de hipótese, mas somente como forma de obter-se
a estatística F.
Tabela 2.5. Tabela descritora do modelo linear (Anova) para a Riqueza Observada nas estações de captura da Fazenda Gaviões agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda.
Fonte de Variação Graus de
liberdade (gl)
Soma dos
quadrados (SQ)
Quadrado
médio (QM)
Razão-F Valor de P
Entre grupos de
distâncias
3 6,475 2,1583 3,790 0,0184
Dentro dos grupos
(Resíduos)
36 20,5 0,5694
Total 39 26,975
A probabilidade de se encontrar uma distribuição de dados como a encontrada em campo
é de 0,019, caso a riqueza seguisse um padrão uniforme ao longo das distâncias da borda (Figura
2.14).
50
Figura 2.14. Histograma da razão-F nas amostras aleatorizadas em comparação com os dados reais obtidos em campo para a riqueza de espécies na Fazenda Gaviões. Em verde está representada a distribuição das Razões-F geradas para os 1000 procedimentos de aleatorização da Riqueza observada (representadas no eixo X). A linha em vermelho representa a distribuição amostral exata da Razão-F obtida a partir dos dados de campo (F = 3,79; p = 0,019).
2.3.2. Análise da Abundância - Fazenda Gaviões
A média de abundância de indivíduos foi maior na distância maior da borda do que na
distância menor (Figura 2.15), entretanto, assim como nos dados de riqueza, nota-se que há uma
variação grande dos desvios padrões, resultando consequentemente em heterogeneidade da
variância entre os grupos.
51
Figura 2.15. Abundância (média e desvio padrão) para as estações de captura da Fazenda Gaviões agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda. L1 é o grupo mais próximo da borda e L4 o mais distante.
A Razão-F para a Abundância observada em campo para as estações de captura nos quatro
grupos de distâncias da borda foi calculada utilizando-se um modelo linear (Tabela 2.6). Os valores
apresentados não foram utilizados num teste de hipótese, mas somente como forma de obter-se
a estatística F.
Tabela 2.7. Tabela descritora do modelo linear (Anova) para a abundância nas estações de captura da Fazenda Gaviões agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda.
Fonte de Variação Graus de
liberdade (gl)
Soma dos
quadrados (SQ)
Quadrado
médio (QM)
Razão-
F
Valor de P
Entre grupos de
distâncias
3 9,28 3,092 2,547 0,0712
Dentro dos
grupos (Resíduos)
36 43,70 1,214
Total 39 52,98
52
A probabilidade de se encontrar uma distribuição de dados como a encontrada em campo
é de 0,067, caso a abundância seguisse um padrão uniforme ao longo das distâncias da borda
(Figura 2.16).
Figura 2.16. Histograma da razão-F nas amostras aleatorizadas em comparação com os dados reais obtidos em campo para a abundância das espécies encontradas na Fazenda Gaviões. Em verde está representada a distribuição das Razões-F geradas para as 1000 aleatorizações da Abundância observada (representadas no eixo X). A linha em vermelho representa a distribuição amostral exata da Razão-F (F = 2,54; p = 0,067).
2.3.3. Análise da Riqueza Observada (Sobs) - Fazenda Nova Miracema
Na Fazenda Nova Miracema foram capturados 23 indivíduos pertencentes a sete espécies
(Tabela 2.8). A riqueza observada média observada diferiu entre as estações de captura agrupadas
nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda (Figura 2.17), entretanto nota-se
que há uma variação grande dos desvios padrões, resultando consequentemente em
heterogeneidade da variância entre os grupos.
53
Tabela 2.8. Número total de indivíduos capturados em cada linha de estações de captura da Fazenda Nova Miracema, Cachoeiras de Macacu-RJ.
Espécie L1 L2 L3 L4* Totais
Akodon cursor 3 0 1 3 7
Marmosa paraguayana 0 1 3 0 4
Oligoryzomys nigripes 0 0 1 2 3
Philander frenatus 0 0 2 1 3
Trinomys dimidiatus 0 0 2 1 3
Marmosops incanus 0 1 0 1 2
Monodelphis sp. 0 1 0 0 1
Total por linha 3 3 9 8 23
* Linha 4 agrega resultados de 20 estações de captura.
A riqueza observada média foi muito baixa em todas as estações de captura agrupadas nos
quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda (Figura 2.17). Como os registros de
indivíduos foram muito baixos neste fragmento, não foi possível analisar dados de abundância.
54
Figura 2.17. Riqueza Observada (Sobs) (média e desvio padrão) para as estações de captura da Fazenda Nova Miracema agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda. L1 é o grupo mais próximo da borda e L4 o mais distante.
A Razão-F para a Riqueza observada em campo para as estações de captura nos quatro
grupos de distâncias da borda foi calculada com um modelo linear (Tabela 2.9). Os valores
apresentados não foram utilizados num teste de hipótese, mas somente como forma de obter-se
a estatística F.
55
Tabela 2.9. Tabela descritora do modelo linear (Anova) para a Riqueza Observada nas estações de captura da Fazenda Nova Miracema agrupadas nos quatro grupos de distâncias (L1, L2, L3, L4) a partir da borda.
Fonte de Variação Graus de
liberdade (gl)
Soma dos
quadrados (SQ)
Quadrado
médio (QM)
Razão-F Valor de P
Entre grupos de
distâncias
3 2,92 0,9733 2,308 0,0889
Dentro dos grupos
(Resíduos)
46 19,40 0,4217
Total 49 22,32
A probabilidade de se encontrar uma distribuição de dados como a encontrada em campo
é de 0,075, caso a abundância seguisse um padrão uniforme ao longo das distâncias da borda
(Figura 2.18).
Figura 2.18. Histograma da razão-F nas amostras aleatorizadas em comparação com os dados reais obtidos em campo para a riqueza de espécies na Fazenda Nova Miracema. A linha em vermelho representa a distribuição amostral exata da Razão-F obtida a partir dos dados de campo (F = 2,31; p = 0,076).
Figura B.6.
56
2.4. Discussão
O sucesso de captura, 4,7% e 1,52%, nas fazendas Gaviões e Nova Miracema,
respectivamente, é comparável ao sucesso registrado em levantamentos em áreas próximas de
Mata Atlântica. Delciellos (2011) registrou entre 2,0 e 7,8% de sucesso de captura para áreas
contínuas e entre 1,3 e 10,8% para fragmentos na Bacia do Rio Macacu, em região localizada a
menos de 30 km das áreas estudadas.
As riquezas observadas, na Fazenda Gaviões (nove) e na Fazenda Miracema (sete) são
semelhantes às riquezas registradas por Pessôa (2009) e Pires et al. (2002) para localidades com
mesmo tipo de fitofisionomia (Tabela 2.10), que variaram de 4 a 11 espécies, sendo que três
localidades tiveram registro de 8 ou 9 espécies (Tabela 2.11). O levantamento realizado por
Delciellos (2011) registrou uma riqueza significativamente maior, de 20 espécies. Entretanto, este
estudo consolidou dados de três áreas contínuas e 27 fragmentos, cujas riquezas locais variaram
entre 2 e 10.
Tabela 2.10. Distância linear aproximada (km) das duas fazendas amostradas neste estudo a áreas próximas nas quais houve levantamento de pequenos mamíferos.
Fazenda Gaviões Fazenda Nova Miracema
Estação Ecológica Estadual do Paraíso
(EEEP)1 45 39
Reserva Ecológica de Guapiaçu (REGUA)1 28 24
Parque Estadual dos Três Picos (PETP)1 18 20
Fazendas Reunidas Morro São João (MSJ)1 54 63
Rebio Poço das Antas2 30 38
1 Pessôa, 2009.
2 Pires et al., 2002. Obs. O trabalho de Delciellos (2011) foi realizado na REGUA e seu entorno.
57
Mesmo assim, é possível que algumas espécies registradas para a região com baixas taxas
de capturas, como por exemplo Gracilinanus microtarsus e Caluromys philander (Pires et al., 2002,
Delciellos, 2011), não tenham sido registradas em função do esforço amostral e da metodologia de
captura, que não incluiu armadilhas de dossel ou de queda (pitfalls). Porém, vale ressaltar que
embora o número de indivíduos registrados na Fazenda Nova Miracema seja baixo (23), foram
capturadas sete espécies, dentre as quais duas que habitualmente apresentam baixas taxas de
captura (Monodelphis americana e Trinomys dimidiatus). Esse resultado é interessante uma vez
que o esforço amostral tende a ser o principal fator que influencia a riqueza de espécies na Mata
Atlântica (Moura et al., 2008). Com relação à composição da comunidade, todas as espécies
registradas já possuíam registros em áreas próximas (Pessôa, 2009, Pires et al., 2002, Delciellos,
2011).
Quanto às classificações quanto à sensibilidade das espécies encontradas nas duas
fazendas, Bonvicino et al. (2002) caracterizam Akodon cursor, Oligoryzomys nigripes, Philander
frenata e Didelphis aurita como amplamente distribuídas, podendo ocorrem tanto em áreas com
vegetação conservada quanto com vegetação alterada. Vieira (1999) cita Akodon e Oligoryzomys
como gêneros típicos tanto de áreas abertas abandonadas quanto de florestas em diversos
estágios sucessionais. Já a cuíca Marmosa paraguayana é citada por Dalloz (2013) como uma
espécie que consegue se manter com alta abundância em paisagens fragmentadas. Por outro lado,
Delciellos (2011) capturou Trinomys dimidiatus somente em áreas de mata contínua. Não foram
capturadas espécies sinantrópicas ou típicas de ambientes abertos, como Necromys lasiurus,
registrado para a Rebio Poço das Antas (Pires et al., 2002).
58
Tabela 2.11. Composição e riqueza de espécies registradas para áreas próximas nas quais houve levantamento de pequenos mamíferos.
EEEP
1 REGUA
2 PETP
3 MSJ
4
Rebio Poço das Antas
5
Faz. Gaviões
Faz.Nova Miracema
Ordem Didelphimorphia
Caluromys philander X
Didelphis aurita X X X X X X
Gracilinanus microtarsus X
Marmosops incanus X X X X X X
Metachirus nudicaudatus X X X X X*
Marmosa paraguayana X X X X X
Monodelphis americana X X X X X X
Philander frenatus X X X X
Ordem Rodentia
Akodon cursor X X X X
Akodon serrensis X
Euryoryzomys russatus X X X
Nectomys squamipes X X X X X
Oecomys concolor X
Oligoryzomys nigripes X X X X X
Oxymycterus dasytrichus X
Rhipidomys sp. X X X
Trinomys dimidiatus X X X X
Trinomys gr. bonafidei X
Riqueza Didephimorphia 4 5 4 4 7 5 5
Riqueza Rodentia 4 4 4 0 4 4 3
Riqueza total 8 9 8 4 11 9 8
1-4 Pessôa, 2009.
1 EEEP: Estação Ecológica Estadual do Paraíso.
2 REGUA: Reserva Ecológica de Guapiaçu.
3 PETP: Parque Estadual dos Três Picos.
4 MSJ: Fazendas Reunidas Morro São João.
5 Pires et al., 2002.
Em relação a detecção de diferenças da riqueza e da abundância dos pequenos mamíferos
que vivem próximos à faixa de dutos com relação aos que vivem em áreas mais centrais de dois
fragmentos florestais, foram encontradas duas situações diferentes para as fazendas estudadas.
59
Na Fazenda Gaviões, é pouco provável que a riqueza possa ser considerada equivalente ao
longo das diferentes distâncias da borda, o que sugere um efeito de borda presente. Quanto aos
valores da abundância, foi observada uma tendência crescente em direção as áreas mais centrais
do fragmento, embora o resultado obtido não tenha sido significativo. Já na Fazenda Nova
Miracema, a baixa quantidade de capturas, reduz o poder de inferência. O modelo de
aleatorizações não apresentou um bom ajuste, apesar dos números de indivíduos e espécies
serem aparentemente mais elevados no interior do fragmento do que na borda e na linha mais
próxima à faixa terem sido capturados somente indivíduos de Akodon cursor. Neste fragmento foi
registrada a presença de cães domésticos com uma armadilha fotográfica instalada de forma não
sistemática. Lacerda et al. (2009) caracterizam a própria presença de cães como um fator do efeito
de borda, o que pode ter contribuído para o baixo número de capturas.
Desta forma, em um dos locais amostrados possivelmente existe uma resposta negativa da
comunidade de pequenos mamíferos ao efeito de borda, enquanto no outro local, o baixo número
de registros não permitiu tal inferência. A resposta negativa apresentada pela comunidade de
pequenos mamíferos na Fazenda Gaviões parece apresentar um padrão transicional negativo em
relação à borda (Ries & Sisk, 2004). Isso sugere que, a faixa de dutos pode atuar de forma
equivalente a um habitat de baixa qualidade em relação ao habitat florestal, traduzindo-se em um
gradiente de queda da riqueza a partir do interior da floresta.
Tais resultados diferiram dos resultados do único estudo encontrado sobre o efeito de
borda para pequenos mamíferos ao longo de um empreendimento linear (ferrovia) no Brasil
(Cerboncini et al., 2015). Neste estudo, o número de capturas e abundância não apresentaram
variações significativas nas linhas paralelos à ferrovia em distâncias de 0 a 150 metros, apesar de
60
algumas espécies terem sido registradas apenas na distância mais próxima à borda. Entretanto, a
ferrovia estudada foi implantada há mais de 100 anos, sua faixa possui apenas 10 metros de
largura e ela se localiza em uma área praticamente contínua de Mata Atlântica na região sul do
Brasil (Parque Estadual Pico do Marumbi, estado do Paraná), o que pode ter contribuído para
minimizar o efeito de borda. Da mesma forma, os resultados também diferiram dos resultados
encontrados para roedores e marsupiais na Mata Atlântica na Bahia (Pardini, 2004), no qual as
bordas de fragmentos grandes (maiores que 1000 hectares), comparáveis aos fragmentos
estudados, apresentavam maior riqueza do que o interior, fato atribuído à maior heterogeneidade
de hábitats nas bordas. No entanto, a paisagem local na qual foi feito este estudo na Bahia é um
mosaico predominantemente florestal, diferente da paisagem da Bacia do Rio São João, na qual
predominam áreas abertas, principalmente pastagens e agricultura.
Por outro lado, os resultados obtidos são congruentes aos resultados obtidos por Stevens
& Husband (1998) em fragmentos de Mata Atlântica com matriz predominantemente aberta no
Nordeste, assim como os existentes na Bacia do Rio São João. Segundo estes autores, a distância
da borda influencia diretamente a riqueza de espécies e diversidade até cerca de 120 a 160 m para
o interior do fragmento, sendo que algumas espécies não foram capturadas nas armadilhas
dispostas entre 0 a 20 metros das bordas.
Finalmente, Pires et al. (2005), em um estudo realizado na Rebio Poço das Antas, não
encontraram espécies exclusivas nas bordas ou interiores dos fragmentos estudados, devido,
possivelmente, ao tamanho reduzido dos fragmentos amostrados (7,1 e 8,8 hectares), sendo
Akodon cursor a única espécie que mostrou um incremento em sua abundância em áreas mais
próximas às bordas.
61
Considerações finais
Num cenário de dificuldades para se integrar o conhecimento ecológico na prática da
avaliação de impactos ambientais de empreendimentos (Treweek, 1996) e, consequentemente do
licenciamento ambiental, o presente estudo buscou consolidar uma avaliação geral das respostas
dos mamíferos ao efeito de borda nos biomas brasileiros para fundamentar um estudo da
influência do efeito de borda resultante da fragmentação de habitats por faixa de dutos, usando
como modelo os pequenos mamíferos em dois fragmentos de Mata Atlântica.
A revisão bibliográfica permitiu constatar que o maior número de estudos sobre efeito de
borda no Brasil foram realizados em biomas predominantemente florestais e que o grupo mais
comumente utilizado foi o dos pequenos mamíferos não-voadores. As respostas mais comuns à
borda para este grupo foram as neutras ou negativas. Respostas positivas foram identificadas
somente quando considerada a variável riqueza, em estudos em paisagens nas quais predominava
a vegetação nativa. Assim, uma vez que as respostas em ambientes muito fragmentados e com
predomínio de usos do solo para atividades antrópicas podem diferir de ambientes no qual a
vegetação nativa predomine na paisagem, sugere-se que as respostas da comunidade à efeitos de
borda devem ser, impreterivelmente, interpretadas dentro do contexto da paisagem estudada.
Com relação à amostragem feita em campo nos fragmentos das Fazendas Gaviões e Nova
Miracema foram encontradas duas situações distintas. Na Fazenda Gaviões foi observada uma
resposta negativa da comunidade de pequenos mamíferos ao efeito de borda, refletidas
especialmente no padrão de riqueza. Já na Fazenda Nova Miracema, o baixo número de registros
obtidos no período estudado não permitiu tal inferência.
62
Concluindo, um delineamento que avalie as comunidades de pequenos mamíferos em
diferentes distâncias de um empreendimento linear, pode contribuir para a abordagem
estratégica na avaliação de impactos ambientais, com protocolos de monitoramento orientados
para avaliar impactos que ocorrem em escala local, como o efeito de borda.
63
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UNDERWOOD, A. J. Beyond BACI: the detection of environmental impacts on populations in the
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145–178, 1992.
70
VIEIRA, E. M. Estudo comparativos de comunidades de pequenos mamíferos em duas áreas de
Mata Atlântica situadas a diferentes altitudes do sudeste do Brasil. Tese de doutorado,
Unicamp, 1999.
WILCOVE, D. S.; MCLELLAN, C. H.; DOBSON, A. P. In: SOULÉ, M. E. (Ed.). Conservation Biology (The
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Ecology and Evolution of Communities. Harvard University Press, Cambridge,
Massachusetts, 1975. p. 522–534.
71
Anexo A – Lista de artigos que não foram incluídos na revisão
Tabela A.1. Artigos que não apresentaram resultados empíricos diretos do efeito de borda para mamíferos do Brasil. Na quarta coluna, denominada “Abordagem” explicitam-se os motivos pelos quais os estudos não foram incluídos.
Artigo Título Grupos Abordagem (Motivo pelo qual não foi incluído)
Canale et al , 2012 Pervasive defaunation of forest remnants in a tropical biodiversity hotspot Médios e Grandes mamíferos Padrões de extinção em manchas de habitat
Christianini e Galetti, 2007Spatial variation in post-dispersal seed removal in an Atlantic forest: Effects of
habitat, location and guilds of seed predatorsInvertebrados, Roedores e Aves Remoção de sementes por animais
Cullen et al , 2000 Effects of hunting in habitat fragments of the Atlantic forests, Brazil Mamíferos e Aves Avaliação do impacto da caça
Esteves et al , 2000 The Argentine sea: The Southeast South American shelf marine ecosystem Ecossistema marinho
Faleiro et al , 2013Defining spatial conservation priorities in the face of land-use and climate
changeCenários de uso do solo e vulnerabilidade à mudanças climáticas
Fleury e Galetti, 2004Effects of microhabitat on palm seed predation in two forest fragments in
southeast BrazilPredação de sementes de palmeiras
Freitas et al , 2012
A model of road effect using line integrals and a test of the performance of
two new road indices using the distribution of small mammals in an Atlantic
Forest landscape
Pequenos mamíferos Modelagem do efeito de estradas
Galetti et al , 2010Mudanças no Código Florestal e seu impacto na ecologia e diversidade dos
mamíferos no BrasilMamíferos Política e gestão ambiental
Gascon e Lovejoy, 1998 Ecological impacts of forest fragmentation in central Amazonia Revisão
Godoi et al , 2010Efeito do gradiente floresta-cerrado-campo sobre a comunidade de pequenos
mamíferos do alto do Maciço do Urucum, oeste do Brasil.Pequenos mamíferos Estudo de gradiente natural: floresta-cerrado-campo
Iob e Vieira, 2008Seed predation of Araucaria angustifolia (Araucariaceae) in the Brazilian
Araucaria Forest: Influence of deposition site and comparative role of small Pequenos e Médios mamíferos Remoção de sementes por animais
Jordani et al , 2015 Natural enemies depend on remnant habitat size in agricultural landscapes Mamíferos, Aves, Formigas e VespasPredação de insetos em lavouras em paisagens com diferentes
tamanhos de manchas remanescentes nativos
Mendel e Vieira, 2003Movement distances and density estimation of small mammals using the spool-
and-line techniquePequenos mamíferos
Avaliação do efeito de borda resultante do uso de grids para
captura de pequenos mamíferos e não resultante da
fragmentação florestal
Norris et al , 2010Habitat patch size modulates terrestrial mammal activity patterns in
Amazonian forest fragmentsMédios mamíferos
Efeito do tamanho das manchas remanescentes de habitat no
padrão horário de atividade das espécies
Paschoal et al , 2012Is the domestic dog becoming an abundant species in the Atlantic forest?
A study case in southeastern BrazilCanis familiaris e Leopardus pardalis
Comparação das densidades de cachorros domésticos e
jaguatiricas
Passamani e Fernandez, 2011Abundance and richness of small mammals in fragmented Atlantic Forest of
southeastern BrazilPequenos mamíferos
Comparação da abundância de pequenos mamíferos em
diferentes tamanhos de fragmentos de Mata Atlântica
72
Literatura citada na tabela A.1
CANALE, G. R.; PERES, C. A.; GUIDORIZZI, C. E.; GATTO, C. A. F.; KIERULFF, M. C. M. Pervasive
defaunation of forest remnants in a tropical biodiversity hotspot. PloS one, v. 7, n. 8, p.
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