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Eis a vós, o seu desabafo.
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Sumário
Eis a vós o seu desabafo
Eis que o casulo se abre
Estrada das escolhas
Modificar ou não a vida?
Linhas tênues
Entrei pela porta do vale e voltei
Os reis da rua
A menina que contava espiritos
A chuva que trazia surpresas
Portas
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Momentos de alegria
Mulher de preto
Olhos de vidro
Passos
Templos e coisas desnecessárias
Sem pedidos, sem culpas
Vítima: victimia e victus
Fora de foco
The Islander: a ilha
Infância desafinada
Um abismo chamado futuro
O dia da caneta
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Criança esquecida
A porta do destino
O olho que tudo vê
Sentido da perfeição
Primeiro dia de aula
Amor mesclado
Pintura a óleo
Sorrisos
Teoria dos números
Trilhos da vida
Só não desita - Poliana Santos
Sobre a autora
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Dedico essa obra a todos aqueles que estiveram comigo durante toda essa escrita e principalmente a
Deus, por me permitir escrever novamente. Feioso, obrigada!
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De início...
Definitivamente não sou para todos e muito menos gosto de
todos. Gosto muito do meu mundo particular e das pessoas que
deixo entrar nele. É quase como uma casa esse meu mundo...
Algumas pessoas podem entrar e sentar-se confortavelmente no
sofá, mas outras não passam nem do portão. Já umas duas têm a
intimidade franca e sincera de abrirem a porta da geladeira e
deitarem na minha cama. Meu mundo é cheio de mistérios e
surpresas, palavras soltas e sem nexo, com algumas poucas cores
misturadas. Raras são as vezes que tem um céu azul e muitas são as
vezes que ele se encontra nublado e cheio de tempestades. Assim eu
gosto afinal, não gosto mesmo da claridade do dia e muito menos
ainda, do azul claro de um dia com sol. Aqui dentro cabem sonhos
de todos os tamanhos. Tem os meus e mais alguns, que cultivo
também, junto com essas pessoas intima a ele. Ele não é pequeno e
sim grandioso, mas não cabe muita gente. Todas as pessoas que
estão nele não estão por acaso: são todas necessárias. São as
pessoas contadas nos dedos de apenas uma mão que passaram,
gostaram e em vez de partir, ficaram. São as pessoas que mesmo
conhecendo a complexidade dele, decidiram que era bom
permanecer onde estão. Uma pessoa em especial já ultrapassou o
laço íntimo de abrir a porta da geladeira, pegar uma garrafa de água
e se jogar em cima da cama. Essa pessoa já assumiu o posto de
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Comandante, mas não aquele que manda, que prega regras e exige
obediência. Ele é aquele que cuida, protege, alegra e me mantem
segura, sensação que nem mesmo rodeada por um exército eu
sentiria. Apesar de ser um mundo grande e “vazio” de pessoas ele
não possui ecos. Eu escuto as vozes que quero escutar, embora
algumas vezes outros tipos de “vozes” tentam aparecer e recebo o
abraço de quem quero receber. Nesse momento e tenho certeza que
em todos os outros próximos, longos e os que ainda estão sendo
escritos, só tem um abraço que quero e sempre recebo. Só existe
verdadeiro conforto nos braços do meu querido e amado
Comandante. Os outros? Bom, eles não fazem nada disso que eu
preciso, então continuarão bem onde estão: na sala de estar e do
portão para fora do meu grande e seletivo mundo.
Há tempos essa minha mente decidiu te amar sem reservas... Minha
vida, meu amor! Não há nada igual, nada poderia me afastar de ti.
Não, não há alguém que me faça tão bem como você faz... E não,
nunca haverá alguém que me transforme no melhor que posso ser,
porque só quem podia preencher o meu antigo vazio é você. Você, e
ninguém mais.”
E vocês, para quem vocês definitivamente são?
Bienvenue dans le monde que j'ai jamais!
*Sejam bem vindos ao mundo do Eu eternamente!
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Eis a vós, o seu desabafo
Sombria. É a melhor definição para a áurea invisível que a
rodeia. Não que ela seja sombria. Não, não: a atmosfera ao seu
redor é sombria. Dia a dia ela faz as mesmas coisas, hora motivada e
por muitas vezes desmotivada, simplesmente segue o ritmo que a
vida já lhe deu. Como qualquer ser humano capaz de agir por si
próprio tem sua reclamações, suas alegrias – embora nem todas
realmente verdadeiras – mas ajudam há passar o tempo. Trabalha
em uma empresa grande, com grandes acomodações e inúmeros
funcionários. Não se lembra do rosto de quase nenhum, mas sabe
que todos a conhecem, pois trabalha no setor referencia da
empresa, cuja mesma sem ele, não sobreviveria. Passa metade do
dia em frente a um computador digitando e pesquisando coisas para
o superior que sem esses mínimos detalhes não finaliza seu trabalho.
Move-se o menos possível não por preguiça ou
falta de animo, mas por não querer largar a atividade com medo que
terminem.
Estuda logo após sair do serviço em um colégio popular da
cidade onde aparentemente as pessoas se fecham em um circulo
vítreo onde é proibida a entrada de “estranhos”. Tem uma boa
convivência com seus colegas onde partilha poucos acontecimentos
do dia, mais como ouvinte do que falante, às vezes deixando sair
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alguma coisa que poderia lhes ser útil, mesmo não acreditando
nisso. Logo após algumas cansativas palestras que a maioria chama
de aula, segue para casa procurando descanso. Seu corpo pede por
isso, mas sua mente não discerne se é realmente necessário. Toma
um longo e prazeroso banho e deita-se na cama aguardando
adormecer. Olha ao relógio e vê que ainda pode gastar alguns de
seus minutos antes da madrugada com alguma leitura. Escolhe um
livro em sua estante, algum que já tinha iniciado a leitura e por falta
de tempo, parado nem mesmo se lembrando do enredo da historia.
E era assim o seu dia a dia sem modificações, surpresas, alterações,
saudades...
Era. Então, surge o grande dilema desse desabafo que em
poucas linhas, caro leitor, pretendo descrever, também para não
tomar tanto seu tempo. Devo ter aprendido essa mania de pouca
valorização com ela. Sim, a culpa é dela. Então, prossigamos. Em um
dia comum andando pelo centro da cidade já em um horário
avançado da noite – as vezes sentia vontade de sair andando,
fingindo claro que não tinha destino - , entrando e saindo das ruas
vazias e silenciosas do centro, olhando os antigos edifícios
ornamentados, algumas vitrines com suas belas e caras roupas
pensando se algum dia iria gostar daquilo. Sorri para si mesma e
percebe que não. Continua sua caminhada quando ouve algumas
vozes um pouco longe de onde ela estava, mas com o silencio se
tornam mais nítidas, como se estivessem bem próximas. Caminha
em direção ao grupo não com algum interesse em particular,
somente por caminhar.
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Quando estava se aproximando decide virar uma rua antes,
não queria aqueles pares de olhos masculinos pairando sobre ela.
Prestes a virar alguém daquele pequeno grupo desperta-lhe a
atenção. Seu rosto e a voz eram conhecidos, ainda que não se
lembrasse com clareza. Olhou com um pouco mais de intensidade e
um sorriso iluminou a face do agora reconhecido. Um colega da
época da outra faculdade. Era formada em gestão administrativa e
fazia pós também em gestão administrativa. Não tinha tanta
imaginação para escolher outro curso. Então seus olhos se
encontram com os seus e uma pequena ruga de interrogação se
forma em sua testa. Virou-se de imediato para o lado e percebeu
que a face ficou rubra. Vergonha de que meu Deus... Era só o que
me faltava – pensa. Sentiu sede.
Entrou na primeira lanchonete que encontrou no caminho e
pediu um suco de tamarindo bem gelado. Não gostava de tamarindo
mais precisava de algo azedo nesse momento, algo que não fosse
uma limonada. Também não gostava de limonada. Quem era ele
mesmo? Não se recordava do nome dele, somente da beleza. Era o
garoto mais bonito da turma. Foram colegas por apenas um ano,
mas lembrava bem dos olhos negros, combinando com os negros e
longos cabelos, na pele branca de porcelana. Lembrava que todas as
meninas da sala eram apaixonadas por ele, e não somente elas,
como alguns meninos também. Mas ele era irredutível. Não se
importava com as declarações de amor que recebia e as confissões
apaixonadas sempre ao final da aula. Partiu inúmeros corações, sem
se importar com eles. Não se sentia culpado, afinal de contas, não
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gostava de ninguém em particular. Recordava vagamente que ele
tinha iniciado um breve namoro com uma colega de sala, e isso
afugentou as investidas das outras garotas.
Ela somente observava como muitas outras, afinal tinha a
plena consciência de que ele nunca olharia para ela, como nunca
olhou. Uma vez foram colegas de equipe para apresentação de um
trabalho, mal se falaram quem dirá se olharam. Ela era a “caxias” da
sala como todos lhe chamavam e ele o popular. Completamente
opostos. Estava perdida em suas vagas lembranças dessa época sem
saudades quando uma mão pousa sobre o ombro. Olhou assustada
para o lado por ter saído do seu devaneio quando percebe quem
estava ao seu lado. Era ele! Seu antigo colega de sala...
– Marta?
Impossível... Ele lembra meu nome? – pensa.
– Oi? – resolve fingir que não o reconhece.
– Se lembra de mim? Fomos colegas. Augusto...
Sim... Augusto! Era o nome mais sussurrado da sala.
– Ah sim! Olá como vai? – seu coração bate tão forte que falta
sair-lhe pela boca, mas não pode transparecer isso de forma alguma,
muito menos, ter o rubro em sua face novamente.
– Tudo bem. Posso me sentar?
– Claro...
E então começaram a conversar. Relembraram do tempo da escola e
de como as coisas eram mais fáceis naquele tempo, sem se
preocupar com muita coisa, somente em tirar acima de sete nas
provas. Ela não tinha tanta saudade antes, mas conforme foram
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relembrando das coisas uma nostalgia veio-lhe enchendo o coração e
teve ate mesmo vontade de retornar aquele tempo. Conversaram
sem perceber o avançar da hora quando já era tarde em demasia ela
se sobressalta dizendo que tinha de ir embora, afinal levantava muito
cedo para ir trabalhar. Nunca tinha ficado tanto tempo fora de casa e
muito menos conversado tanto com ele. Ele.
– Te levo em casa, afinal já é tarde para ir sozinha por ai.
Vamos, te dou uma carona.
– Ah não precisa eu posso pegar uma condução...
– Eu insisto.
Entraram no carro e foram passando pelas casas, lojas, edifícios já
silenciosos com o entrar da madrugada e pela primeira vez em muito
tempo se sentiu bem. A muito não sabia o que era felicidade. E
aquela pessoa trouxe um pouco disso essa noite. Chegaram a sua
casa e ela o convidou para entrar. Ele prontamente aceitou. Não
sabia por que estava fazendo isso, só que tinha que fazer. Mal
entraram, começaram a se beijar de forma desesperada, como se
estivessem aguardando anos para isso. E assim deram inicio a uma
longa noite de paixão incontrolável. Qual foi a ultima vez que um
homem a visitara? Quatro, cinco anos atrás? Nem se lembrava mais.
Parecia um sonho a ser consumado...
Abriu os olhos com a tamanha claridade que emanava da janela
esquecida de ser fechada na noite anterior e olhou para o lado. Ele
já não estava mais la. Como pensara uma experiência de única noite.
Algo normal para ele, pois com o passar dos anos a beleza tinha
intensificado e coisas assim eram normais. Para ela, que continuava
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da mesma forma, cabelos ondulados, castanhos claros, olhos
castanho- escuros e seu inseparável óculos. Nenhum bilhete,
nenhuma despedida, nada. Sentia-se machucada? Possivelmente.
Lagrimas começaram a rolar por sua face e angustiada percebe que
estava apaixonada. Quão tola era, se apaixonar por apenas uma
noite, ou talvez já fosse desde aquela época. Olha para o relógio e
vê que estava atrasada, mas não se move do lugar.
Vagarosamente inicia seu rito matinal e se desloca para a
empresa. Tem seu dia normal e rotineiro de trabalho, almoço,
faculdade, afinal já era assim antes. Saindo da faculdade vai
diretamente para casa, estava sem animo para caminhar. Toma um
banho demorado, mas não come nada. Estava sem fome. Deita para
dormir e então o celular começa a tocar. Mensagem. Só poderia ser
da operadora, afinal ninguém lhe mandava mensagens. Um numero
desconhecido. Posso entrar? Estou bem embaixo da sua janela
agora... Mas o que... Então em quase desespero corre ate a janela e
a abre. Impossível! Por quê? Lágrimas rolam por sua face
novamente, mas dessa vez de alegria. Sorri e responde a mensagem
com um sim tímido, mas cheio de muitas emoções. Espera ao lado
da porta contando os segundos que demoraram uma eternidade
para passar. A campainha soa e ela mais que depressa abre a porta.
Augusto estava parado a sua porta, com um lindo sorriso nos lábios.
– Me desculpe sair sem avisar ou deixar um recado. Você
dormia tão tranquilamente, não quis lhe acordar, além disso, me
chamaram com urgência no hospital. Cirurgia de urgência. Mas não
vem ao caso. Senti saudades então voltei.
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Sim. Ele era um neurocirurgião. Sem pensar duas vezes ela o abraça
forte temendo que fosse embora e o convida para entrar. Ele fecha a
porta atrás de si e a beija com intensidade.
– Amanhã prometo que me despeço antes de ir – disse com
um sorriso encantador no rosto.
–Ok.
Então, se entregaram novamente a mais uma noite de paixão
avassaladora. Estavam ambos apaixonados.
Então, eis o seu desabafo. De como sua vida mudou em uma
noite sua vida mudou completamente. De como o destino muda os
caminhos. De como um simples olhar acompanhado de um sorriso
sincero pode ser realmente encantador. Não fuja dos pequenos
detalhes como se fossem irrelevantes. Os melhores acontecimentos
são antecedidos por pequenas descobertas. Nunca duvide que o
futuro sempre traz consigo belas surpresas. O tempo pode passar,
muito pode ser esquecido, mas o destino sempre nos encontra e nos
surpreende. Então, seja bem vindo destino!
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Eis que se abre o casulo
O vento frio de um entardecer sopra levando as cascas para
longe. Asas miúdas e delicadas batem pela primeira vez
experimentando o sabor de uma vida nova. Tons avermelhados
salpicados de violeta dão avidez ao planar da pequena borboleta que
acabara de sofrer sua transformação, mudando de um aspecto
estranho e nada querido de uma lagarta, para uma linda e suave
borboleta. Todas as mudanças de pele, a construção do seu
mundinho particular onde se desenvolveu aguardando o tempo certo
para sair e inúmeros estágios até estar completa. Quão lindo pode
ser a visão da vida a sua frente? Depende de como você quer
enxergá-la e vive-la. E essa linda borboleta espera o melhor dela. Ela
só não contava com um equivoco: nascer para vida logo ao
anoitecer, onde o mais belo do dia já esta a dormir... Mas não há
problema. Irá adormecer juntamente com todos e esperar o tão
aguardado nascer do sol.
Dias e mais dias foram se passando, mas algo estava estranho
nesse ambiente para o qual saíra. O mundo quente e aconchegante
que estava se transformara. Tudo estava escurecido, frio e sem vida
como se o tempo naquele lugar nunca mudasse ou pior, estivesse
parado. A Borboleta alça voo e sai a procurar por alguma luz, algo
que brilhasse mesmo que por um mísero segundo, mas nada
encontrava. E todos os dias ia dormir, cada vez mais triste e