ELAS, a reinvenção de Elis Músicas - · PDF file5 Que é para eu chorar Chorar de tristeza Tristeza de amar (Música Atrás da porta de Chico Buarque – canta sozinha) Sem carinho,

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    ELAS, a reinveno de Elis

    De Alexandre Rodrigues

    Msicas:

    Arrasto de Edu Lobo e Vinicius de Moraes

    Madalena de Ivan Lins e Ronaldo Monteiro de Souza

    Dois pra l, dois pra c de Joo Bosco e Aldir Blanc

    Fascinao de Armando Louzada, F. D. Marchetti e M. de Feraudy

    Romaria de Renato Teixeira

    Bbado e equilibrista de Joo Bosco e Aldir Blanc

    Bom dia tristeza de Vinicius de Moraes e Adoniran Barbosa

    Atrs da porta de Chico Buarque e Francis Hime

    Como nossos pais de Belchior

    Al! Al, Marciano! de Rita Lee

    guas de maro de Tom Jobim

    CENA 1

    ELIS Eu nasci para cantar, para cantar e gritar... Quero saber do brasileiro,

    no estou preocupada em cromar minha orelha e sair para a rua para chamar a

    ateno... Tempo bom, foi aquele dos sonhos embalados a Fred Astaire... Mas

    passou! Agora o silncio dos musicais da Broadway e o barulho das botas dos

    soldados nas ruas... O barulho das botas encobrindo o som das vozes dos

    fracos... O barulho das botas e o silncio do tiro no escuro, o tiro mudo... Que

    mata sem sangue, sem corpo... Sem cano! O marchar pesado, o marchar

    armado... Mas, afinal... "Me tomam por quem? Um imbecil? Sou algo que se

    molda do jeitinho que se quer? Isso o que todos queriam, na realidade. Mas

    no vo conseguir, porque quando descobrirem que estou verde j estarei

    amarela. Eu sou do contra... E sempre viverei como um kamikaze e isso me far

    ficar em p... As botas podem calar os fracos, mas no sou fraca, sou cantora,

    sou mulher... Essa mulher que entre a parede e a espada, se atira contra a

    espada... Sem medo! Aquela que canta enquanto sangra e ri ao ver o seu

    sangue-cano escorrer sobre as botas daqueles que marcham... Sou Elis

    Regina Carvalho Costa que poucas pessoas vo morrer conhecendo...

    (canta Arrasto de Edu Lobo e Vinicius de Moraes)

  • 2

    Eh! Tem jangada no mar

    Eh! eh! eh! Hoje tem arrasto

    Eh! Todo mundo pescar

    Chega de sombra e Joo J viu

    Olha o arrasto entrando no mar sem fim

    meu irmo me traz Iemanj pr mim

    Olha o arrasto entrando no mar sem fim

    meu irmo me traz Iemanj pr mim

    Minha Santa Brbara me abenoai

    Quero me casar com Janana

    Eh! Puxa bem devagar

    Eh! eh! eh! J vem vindo o arrasto

    Eh! a rainha do mar

    Vem, vem na rede Joo prmim

    Valha-me meu Nosso Senhor do Bonfim

    Nunca, jamais se viu tanto peixe assim

    Valha-me meu Nosso Senhor do Bonfim

    Nunca, jamais se viu tanto peixe assim

    CENA 2

    ELIS Quando canto, solto os meus demnios... No , Vincius? (ri) Meu

    poeta... Talentoso, como aqueles que sabem reconhecer talentos... Eu sou

    talentosa! Insegura, mas no palco no... Afinal, aqui um lugar sagrado, meu

    lugar sagrado... O palco a minha cama! Aqui me reinvento, me compartilho, me

    desfao, me refao... Cantar, para mim, sacerdcio... Palco e cama! No so

    a mesma coisa? (ri)So... Exatamente a mesma coisa!A cano e o teso...

    (risos) No palco gosto de destilar emoes, na cama posso ser promessa... Como

    as guas de maro... Promessa de vida no corao... Sou intensa! Sou o meu

    prprio caos... Sou como assum-preto, que precisa cantar muito mais depois que

    lhe tiram os olhos. E que retirem meus olhos, mas me deixem cantar... Afinal,

    nesse pas, s h duas pessoas que cantam: Gal e eu...

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    (Canta Madalena de Ivan Lins e Ronaldo Monteiro de Souza)

    Madalena

    O meu peito percebeu

    Que o mar uma gota

    Comparado ao pranto meu.

    Fique certa

    Quando o nosso amor desperta

    Logo o sol se desespera

    E se esconde l na serra.

    Madalena

    O que meu no se divide

    Nem to pouco se admite

    Quem do nosso amor duvide.

    At a lua se arrisca num palpite

    Que o nosso amor existe

    Forte ou fraco alegre ou triste.

    CENA 3

    MADALENA Madalena...! Eu sou Madalena... Sou Vera... Sou Regina... Musa!

    Um homem quando sofre... Mas quando sofre mesmo, esquecendo todas as

    regras masculinas de no sofrer, no chorar... impossvel de resistir! Um

    homem chorando to bonito... To doce... Fica como um pequeno menino,

    indefeso... difcil resistir as lgrimas honestas de um homem, lgrimas de um

    homem que ama e que sabe amar!

    ELIS A gente tem de fazer das tripas sentimento..., Madalena... Seja mulher

    ou homem...

    MADALENA Regado cerveja e a brisa martima... Ronaldo viu suas lgrimas,

    derramadas por mim, inundarem oceano...

    ELIS ... O mar uma gota...

  • 4

    ELIS e MADALENA Comparado ao pranto meu...

    ELIS Um homem quando chora, sabe como chorar... Sua lgrima no s

    gua rolando, mas dor, dor deslizando... Por isso voc msica, Madalena!

    Quando te vi-ouvi pela primeira vez, senti a melancolia do amor de um homem...

    Engraado, por que tentaram retirar de ns, mulheres, o direito de ver um homem

    chorar? Tentaram nos privar do mais bonito... J para ns, Madalena, nos

    deixaram todo o resto... Ser mulher, me, cidad, artista... E temos que ser tudo

    isso o tempo todo... E por isso somos to intensas... E nos encheram com tantas

    lgrimas, tantas, e tantos sentimentos, tantos, que eles escorrem por nossa face

    como cascata... Como cachoeira... E aprendemos, pelo menos eu aprendi, a ter

    ...o prazer de me danar e me recompor sozinha. No preciso de muletas. O

    sexo frgil no a mulher, o homem... E o resto resto.

    MADALENA A tristeza, Elis... Para todos ns ... como um bichinho que para

    roer est sozinho... E como ri a bandida tristeza... Parece rato em queijo

    parmeso...(Adoniran Barbosa)

    (canta em dueto com Madalena a msica Bom dia Tristeza de Vinicius de Moraes

    e Adoniran Barbosa)

    Bom dia, tristeza

    Que tarde, tristeza

    Voc veio hoje me ver

    J estava ficando

    At meio triste

    De estar tanto tempo

    Longe de voc

    Se chegue, tristeza

    Se sente comigo

    Aqui, nesta mesa de bar

    Beba do meu copo

    Me d o seu ombro

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    Que para eu chorar

    Chorar de tristeza

    Tristeza de amar

    (Msica Atrs da porta de Chico Buarque canta sozinha)

    Sem carinho, sem coberta

    No tapete atrs da porta

    Reclamei baixinho

    Dei pr maldizer o nosso lar

    Pra sujar teu nome, te humilhar

    E me vingar a qualquer preo

    Te adorando pelo avesso

    Pra mostrar que ainda sou tua

    At provar que ainda sou tua. (chora)

    CENA 4

    BBADO Para muitos, sou o bbado, o louco... Anormal! Mas sou,

    simplesmente, o artista! O palhao que veste sua mscara, seu nariz e se

    equilibra no giro dirio do mundo... Sou o homem, a mulher, o cidado em busca

    da libertao... Me roubaram a vida! Mas, no podem me roubar o sonho... Me

    embriago da iluso... Dano, enquanto minhas pernas tranam no desalinho do

    caminho humano... Sou inexato, sou o rastro da loucura...

    ELIS J eu ... sou do contra. Tambm sou o artista! O bbado! O louco, pois

    no permito que os outros me dirijam... No!Decifra-me ou devoro-te? No vo

    me devorar, nem eu me decifrar, nunca. Eu sou a esfinge, e da?A lucidez me

    leva s raias da loucura.

    BBADO Para sempre incompreendidos...

    ELIS Incompreendida... A vida... muita loucura! E eu sou mais louca que a

    loucura que t solta! Fao parte do grupo dos bbados...

    BBADO Os bbados imundos que sujam caladas...

  • 6

    ELIS Mas que iluminam estrelas! Bbados de esperana... Bbados de amor...

    E o amor, tenso-intenso, nos salva...

    BBADO Bbados de tristeza e f... Bbados inebriados de coragem e arte...

    ELIS Sou a bbada do palco, da morte e da vida... E triste saber que

    ningum pode viver de iluso. Que nunca vai ser. Nunca vai dar. O sonhador tem

    que acordar... Mas ns, os bbados, podemos ir em frente... Danando sobre

    nossas pernas que tranam no palco, que valsam na arte de acreditar... Sabendo

    ... que o show de todo artista tem que continuar....

    (Canta a msica O Bbado e o Equilibrista de Joo Bosco e Aldir Blanc)

    Caa a tarde feito um viaduto

    E um bbado trajando luto

    Me lembrou Carlitos...

    A lua

    Tal qual a dona do bordel

    Pedia a cada estrela fria

    Um brilho de aluguel

    E nuvens!

    L no mata-borro do cu

    Chupavam manchas torturadas

    Que sufoco!

    Louco!

    O bbado com chapu-coco

    Fazia irreverncias mil

    Pr noite do Brasil.

    Meu Brasil!...

    Que sonha com a volta

    Do irmo do Henfil.

    Com tanta gente que partiu

    Num rabo de foguete

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    Chora!

    A nossa Ptria

    Me gentil

    Choram Marias

    E Clarisses

    No solo do Brasil...

    Mas sei, que uma dor

    Assim pungente

    No h de ser inutilmente

    A esperana...

    Dana na corda bamba

    De sombrinha

    E em cada passo

    Dessa linha

    Pode se machucar...

    Azar!

    A esperana equilibrista

    Sabe que o show

    De todo artista

    Tem que continuar...

    CENA 5

    ROMARIA (segurando uma moringa dgua) gua... Coisa mais simples... Da

    chuva, do rio, do orvalho da manh... L no poo tem gua limpa, seu fulano...

    pra beber! Do lado de c, ningum vai morrer de cede, no... E se no chove s

    rezar! Rezar e esperar... Deus no vai deixar um filho na mo... Bebe, seu

    fulano... Bebe da mina... E veja se toma um banho de rio... Ou de cachoeira, para

    espantar