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ELEMENTOS FORMADORES DAS LÍNGUAS R OMÂNICAS PROFA. DRA. LILIANE BARREIROS (PPGEL/UEFS)

ELEMENTOS FORMADORES DAS LÍNGUAS ROMÂNICAS · As mais recente: menir, dólmen, druida e bardo. Substrato 3) Fenício e púnico - é quase nula, a única palavra ... transformação

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ELEMENTOS FORMADORES DAS

LÍNGUAS ROMÂNICASP R O F A . D R A . L IL IA NE B A R R E IR O S

(P P G E L / U E F S )

Textos:BASSETTO, Bruno F. A formação das Línguas Românicas. In: ______. Elementos defilologia românica: história externa das línguas. Vol. 1. São Paulo: EDUSP, 2001, p.152-176.

BASSO, Renato Miguel. GONÇALVES, Rodrigo Tadeu. A România e a formação daslínguas românicas. In: ______. História concisa da língua portuguesa. Petrópolis, RJ:Vozes, 2014, p. 65-101.

GARCIA, Afrânio da Silva. O português do Brasil questões de substrato, superstrato

e adstrato. In: SOLETRAS, Ano II, nº 04. São Gonçalo: UERJ, jul./dez. 2002.

ILARI, Rodolfo. Fatores de dialetação do latim vulgar. In: ______. Lingüísticaromânica. São Paulo: Ática, 2001, p. 135-149.

Origem das Línguas RomânicasO latim e suas variedades :

Clássico e Vulgar

Mais simples em todos os níveis; analítico; expressivo epermeável a elementos estrangeiros.

Latinização ou Romanização

É a assimilação cultural e linguística da civilização latina porparte dos povos conquistados.

Fatores de latinização: Exército romano

Colônias militares (veteranos)

Colônias civis

Administração romana

Obras públicas

Comércio

“[...] o latim usado pela administração das províncias foi umponderável fator de latinização, já que era veículo decomunicação nos contatos com a população, latina e não-latina, ea língua oficial de todos os documentos” (BASSETTO, 2005, p. 107).

A latinização não foi uniforme em todas as partes do Império Romano.

A fragmentação do Império RomanoCAUSAS INTERNAS

Despovoamento do Império – guerras civis, invasões bárbaras ea peste

Empobrecimento e Impostos – população descontente ecorrupção generalizada

Decadência militar – privilégios exagerados, morte, soldadosbárbaros (“invasões pacíficas”).

A fragmentação do Império RomanoCAUSAS EXTERNAS: AS INVASÕES

“Invasões pacíficas” – presença, sobretudo de germanos, noexército e nas colônias

Final do séc. IV – início das grandes invasões (Vândalos, Godos,Francos, Lombardos, Alamanos, Eslavos, Árabes etc.)

Após a queda do IR, o vasto território romanizado é ocupado por vários povos diferentes, mas o latim continuou a ser a língua de

cultura e administração por muito tempo.

A fragmentação política e linguística do IR

Traços de romanização em graus variados, que dependiam,basicamente, da antiguidade da romanização, do período em quea província ficou submissa ao Império e da profundidade doscontatos linguísticos entre os povos.

As províncias acabaram desenvolvendo dialetos mais ou menospróximos do latim vulgar, em épocas diferentes, e em grausbastante variados de proximidade com o latim.

Formação das Línguas RomânicasOs fenômenos externos mais relevantes que favoreceram a

dialetação do latim vulgar e consequentemente a formação dasLínguas Românicas:

Substrato

Superstrato

Adstrato

SubstratoSUB + STRATUM = “camada de baixo”

Denominação atribuída por Graziadio Isaia Ascoli

São marcas linguísticas do povo vencido deixadas na língua demaior prestígio.

Influência de baixo para cima

SubstratoA língua de maior prestígio cultural e político tende a se

impor naturalmente sobre a outra, que perde seus falantes.

A ação do substrato depende de causas sociais, políticas, históricas eaté estilísticas (tendências populares à simplicidade ou ao descuido, oumesmo cultas em busca de aprimoramento ou de purismo).

SubstratoA grande diversidade de povos da Itália antiga explica a grandequantidade de substratos (oscos, umbros, sabinos, celtas etc.).

Itália central e meridional: substrato osco-umbro

Assimilações:

nd > nn

expandere > spanne (estender; explicar);

infundere > nfonne (infundir; inculcar)

mb > mm

palumba > palomma (pomba)

SubstratoNorte da Itália: substrato celta

Mantêm os grupos consonânticos (nd > nn; mb > mm) – (fronda > fronna;piombo > piommo), porém o /u/ e o /a/ latino passam a /ü/ e /e/como no francês.

SubstratoEra natural que os povos vencidos, ao falar latim, aplicassem aessa língua os hábitos linguísticos próprios de seus idiomas.

SubstratoMaiores registros no léxico e na fonética

Ex.: léxico português – topônimos Coimbra, Lima; nomes comuns cama,lousa.

PB – tupi (designações da fauna, flora e utensílios)

OBS.: A inclusão definitiva de um fato linguístico modificado nalíngua receptora pode levar séculos.

SuperstratoSUPER + STRATUM = “camada de cima”

Termo criado por Walther von Wartburg

É utilizado para designar os vestígios e as influências de um povo dominador noidioma do dominado, idioma esse que passa a ser usado por ambos, já que alíngua do dominador político deixa de ser falada.

Influência de cima para baixo

SuperstratoAs línguas germânicas no território da România, com as invasões

bárbaras, constituíram superstratos do latim.

Ex.: guerra, trégua, estribo, espora, feudo; adjetivos – branco, morno, rico;verbos – roubar, falar, agasalhar.

BilinguismoDominadores e dominados continuam a usar seu próprio

idioma por período de tempo muito variável (BASSETTO, 2005, p. 152).

Osco / latim – território romano

Celta / latim – Gália

Ibérico / latim – Ibéria

Árabe / dialeto siciliano – Sicília

Não é comum a manutenção do bilinguismo.

AdstratoÉ toda língua que vigora ao lado de outra, num território dado, e quenela interfere como manancial permanente de empréstimos.

Para caracterizar uma situação de adstrato, basta que dois povos de idiomasdiferentes sejam vizinhos e mantenham relacionamento de qualquer tipo.

AdstratoA noção de adstrato tem a ver com a coexistência de línguas emsituação de bilinguismo.

Para a formação das línguas românicas foi importante a presençaconstante do grego e até mesmo do latim literário, especialmentecom relação aos empréstimos lexicais.

AdstratoA causa pode ser invasão ou conquista.

Ex.: Adstrato Árabe na Península Ibérica (a partir de 711) –

quase 8 séculos de convivência ao lado do romanço.

Moçárabes (nativos românicos que assimilaram a cultura árabe e eram

bilíngues).

Aljamia “língua estrangeira” – textos escritos em romance com

caracteres árabes.

Adstrato1492 - Os árabes foram expulsos e a população românicacontinuou a falar o seu dialeto, apenas enriquecido pornumerosos empréstimos.

Resumo das definições A definição dos termos substrato, superstrato e adstrato varia bastante, assim comoo que cada autor abrange com cada termo (Mattoso Câmara Jr., Wilton Cardoso e Celso Cunha

e Martinet)

1) Substrato – língua nativa desaparecida de um povo dominado, que adotoua língua do dominador;

2) Superstrato – língua nativa de um povo dominador desaparecida, emvirtude de este povo ter adotado a língua do povo dominado;

3) Adstrato – qualquer língua que conviveu ou convive em pé de igualdade(bilinguismo) com outra língua.

Revendo os conceitos...1) Substrato – adota-se a língua do dominador;

2) Superstrato – adota-se a língua do povo dominado;

3) Adstrato – qualquer língua que convive ao lado de outra.

Questões de Substrato, Superstrato e Adstrato no Português EuropeuG A R C IA , A F R Â N IO D A S IL V A . O P O R T U G U Ê S D O B R A S IL Q U ES T Õ E S D ES U B S T R A T O , S U P ER S T R A T O E A D S T R A T O . IN : S O L E T R A S , A NO II , Nº 0 4 .S Ã O G O NÇ A L O : U ER J , JU L . / D EZ . 2 0 0 2 .

SubstratoLínguas ibéricas, anteriores à conquista romana.

1) Ibérico - mais ou menos trinta palavras. As mais importantes são: barro,baía, bezerro, balsa, cama, esquerdo, garra, manto e sapo.

2) Celta - sua influência é maior, compreende palavras incorporadas aolatim antes da conquista da Península Ibérica e depois. As maisimportantes são: bico, cabana, caminho, camisa, carro, cerveja, gato,gordo, lança, légua, peça e touca. As mais recente: menir, dólmen, druida ebardo.

Substrato3) Fenício e púnico - é quase nula, a única palavra é barca, enquanto aspalavras de origem púnica são: mapa, mata e saco.

4) Grego – inúmeras palavras, porém raras são as que se pode atribuir, semmargem de dúvida, ao período de dominação grega na Península Ibérica,anterior à conquista romana. São elas: bolsa, cara, corda, calma, caixa, ermo,governar, golfo e órfão.

SuperstratoPalavras de origem germânica, introduzidas pelos visigodos,suevos e vândalos.

A maioria, são ligadas à vida militar e aos costumes próprios dos germanos,tais como a guerra e o saque.

As mais importantes são: acha, arauto, arreio, agasalho, albergue, anca, aspa,barão, banco, banho, branco, brasa, brandir, dardo, esgrimir, espiar, elmo,espeto, estaca, estribo, espora, estampar, escarnecer, feudo, fato, feltro,fralda, fresco, ganso, garbo, guarda, grupo, galardão, guia, lata, lasca, liso,marco, morno, rico, roupa, roubar, saga, sopa, tirar, trepar, trégua.

e os pontos cardeais: norte, sul, leste, oeste.

Adstrato1) Árabe - grande influência no léxico. As palavras de origem árabe são

compostas pelo artigo invariável al, quer inalterado ou reduzido a a,quando antes de x, z, c e d: arroz, azeite, açougue e aduana.

Os nomes árabes mais frequentes, relacionam-se a:

a) Plantas: algodão, alecrim, alface, alfafa, alfazema, açafrão,açucena, alcachofra, benjoim e bolota.

b) Instrumentos variados: alaúde, tambor, alicate, alfanje, algema,aljava, almofariz e gaita.

Adstrato Árabec) Ofícios e oficinas: alcaide, alfaiate, alferes, almoxarife, califa,emir; aduana, alcova, aldeia, armazém, arrabalde e arsenal.

d) Alimentos e bebidas: aletria, acepipe, álcool, almôndega exarope.

e) Medidas: alqueire, arroba e quintal.

Adstrato Árabef) Palavras de significação vária: álcali, alarde, alarido, alcunha,algazarra, álgebra, azulejo, alvará, almofada, alcatéia, azeviche,azar, cáfila, javali, cifra e zero;

g) Os adjetivos: garrido, forro, mesquinho e baldio;

h) Poucos verbos , como por exemplo, alcatifar;

e a interjeição oxalá (proveniente do árabe “in sha Allah”).

Adstrato2) Provençal ou occitânico - apesar da longa convivência entre oportuguês e a “langue d'Oc”, a presença de palavras de origem provençalconcentra-se, basicamente, em vocábulos relacionados com a vida nascortes, tais como: alba, balada, bedel, coxim, cadafalso, estandarte,homenagem, jogral, justa, paliçada, refrão, sirventês, trova, truão, tropel,vassalo e vianda.

Além dessas, temos algumas palavras de uso mais geral, como: a1egre,anel, artilharia, salitre, rouxinol e viagem.

Questões de Substrato e Adstrato no Português do Brasil

Havia duas diferentes línguas de intercurso (simplificadas) para entendimento mútuo

1) A língua geral, uma versão simplificada do tupi, que era usada pelosbrancos e mamelucos (filhos de índia com branco) em seus contatos comos aborígenes. Também usada pelos índios da tribo tupi como meio decomunicação com as demais tribos de famílias linguísticas diferentes, quefalavam as famosas línguas travadas.

2) O semicrioulo português, usado pelos portugueses na comunicação comos negros escravos e, também, com os índios e mestiços.

3) À exceção dos padres jesuítas e dos mercadores de escravos e tripulantesde navios negreiros, praticamente nenhum português entrou em contatodireto com qualquer outra língua que não fosse a língua geral ou osemicrioulo português.

Como podem ser conceituadas:

Substrato ou Adstrato ?

... Adstrato, por quê ?

AdstratoOs índios brasileiros, salvo raríssimas exceções, jamaisabandonaram sua língua para adotar a do conquistador; pelocontrário, no começo da colonização, a língua geral era maisfalada do que a portuguesa, devido à grande superioridadenumérica dos mamelucos e índios sobre a população branca.

A língua geral só deixou de ter importância pelo fato de osportugueses terem chacinado seus falantes, “um documentojesuítico nos diz que as 40 mil almas... estavam reduzidas a 400.”(Serafim da Silva Neto).

AdstratoOs negros também não abandonaram seu português crioulo paraaprenderem a língua portuguesa padrão. O principal motivo distofoi que o Brasil, profundamente escravocrata e racista, nãofornecia qualquer tipo de educação aos negros; a estes, bastavaque soubessem o português crioulo, para que pudessem entenderas ordens e cumpri-las.

A língua geral teve influência, quase que exclusivamente, sobre oléxico e o semicrioulo português exerceu, basicamente, sobre amorfologia e a fonologia.

Influência da língua geral sobre o PB1) Animais - araponga, arara, capivara, curió, cutia, gambá, jibóia, jacaré,jararaca, juriti, lambari, paca, piranha, quati, sabiá, saúva, tamanduá, tatu eurubu.

2) Plantas - abacaxi, capim, carnaúba, cipó, imbuia, ipê, jabuticaba, jacarandá,jequitibá, mandioca, peroba, pitanga, sapé, taquara e tiririca.

3) Utensílios - arapuca e jacá.

4) Alimentos - moqueca e pipoca.

5) Fenômenos naturais - piracema e pororoca.

6) Crendices - saci, caipora e curupira.

7) Doenças - catapora

Influência do semicrioulo português sobre o PB

1) Fonológico - apresentando os seguintes casos:

a) redução de ditongo a vogal: dotô por doutor; isquêro por isqueiro;

b) transformação do lh em iode: muié por mulher; oiá por olhar;

c) assimilação dos grupos consonantais em nasal: tomano portomando; quano por quando; tamém por também;

d) queda do r final: amô por amor; muié por mulher; fazê por fazer;

e) queda do l final: generá por general; papé por papel.

Influência do semicrioulo português sobre o PB

2) Morfofonológico - apresentando os seguintes casos:

a) queda da primeira sílaba do verbo estar, como em eu tô:

b) aglutinação fonética, como em zóio por olhos; zunha porunhas; e zoreia por orelhas.

Influência do semicrioulo português sobre o PB

3) Morfológico - manifesto por:

a) simplificação da flexão verbal, reduzida a somente duas pessoas,como em:

“eu compro” / “tu/você compra” / “ele/ela compra”

“nós compra” / “vocês compra” / “eles/elas compra”

b) queda da flexão de número do determinado, como ocorre em: “asmuié” por “as mulheres”; “esses home” por “esses homens”.

Influência do semicrioulo português sobre o PB3) Lexical

a) Religião: macumba, mandinga, candomblé, babalaô e orixá;

b) Comida: tutu, angu, abará, cachaça e vatapá;

c) Instrumentos: agogô, samba, maracatu e ganzá;

d) Doenças: caxumba, calombo, calundu e banzo;

e) Objetos de uso: cachimbo, carimbo, miçanga e tanga;

f) Animais e plantas: camundongo, marimbondo, inhame, chuchu, jiló,maxixe e quiabo;

g) Locais: mocambo, quilombo e senzala;

h) Pessoas e relações pessoais: moleque, mucama, milonga, molambo,muxoxo, quizília e dengo.

Conclusão1) A influência do substrato no português é de poucaimportância, resumindo-se ao léxico.

2) A influência do superstrato, apesar de maior, é resumidatambém ao léxico e muito especializada, sendo que muitas desuas formas tornaram-se obsoletas ou excessivamente restritas.

Conclusão3) A influência do adstrato é a mais importante de todas. Com exceção doprovençal, todas as línguas que conviveram com o português, quer emPortugal: o árabe, quer no Brasil: a língua geral e o semicrioulo português,penetraram bastante no nosso léxico, sendo que o semicrioulo portuguêsserviu, ainda, para intensificar o processo de evolução já existente, de umamaneira muito mais intensa, é claro, nas populações de baixo nível deescolaridade e instrução.

Recapitulando...Os fenômenos externos mais relevantes que favoreceram adialetação do latim vulgar e consequentemente a formação dasLínguas Românicas...

Recapitulando...Fragmentação do latim

Romanização superficial

Superioridade cultural dos vencidos

Superposição maciça de populações

Fragmentação do Império - causas internas: despovoamento do Império;empobrecimento e impostos; e decadência militar; causas externas: asinvasões. “Invasões pacíficas”; e Final do séc. IV – início das grandesinvasões (Vândalos, Godos, Francos, Lombardos, Alamanos, Eslavos,Árabes etc.).