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Em Espirito e Em Verdade

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  • 2| S R I E C R I S T I A N I S M O P R T I C O

    EM ESPRITO E EM VERDADE Curso prtico de liturgia

  • 2| S R I E C R I S T I A N I S M O P R T I C O

    EM ESPRITO E EM VERDADE

    Curso prtico de liturgia

    2. Edio

    Luiz Carlos Ramos

    EDITEO So Bernardo do Campo, 2008

  • Srie Cristianismo Prtico 2008 Luiz Carlos Ramos

    EDITORA DA FACULDADE DE TEOLOGIA (EDITEO)

    Catalogao preparada pela bibliotecria Aparecida Comelli Tavares (CRB 8-3781) Biblioteca Jalmar Bowden

    264 RAMOS, Luiz Carlos R147e Em esprito e em verdade: curso prtico de

    liturgia / Luiz Carlos Ramos. 2. ed. So Ber-nardo do Campo: Editeo, 2008. 144 p. ISBN: 978-85-88410-85-5

    1. Liturgia 2. Culto pblico I. Curso prtico de liturgia II. Ttulo

    CDD 18. ed.

    Faculdade de Teologia da Igreja Metodista Umesp

    Reitor da Faculdade de Teologia Rui de Souza Josgrilberg Reitor da Umesp Mrcio de Moraes

    Editeo Conselho Editorial Blanches de Paula

    Helmut Renders Jos Carlos de Souza Luiz Carlos Ramos Magali do Nascimento Cunha Nelson Luiz Campos Leite Otoniel Luciano Ribeiro Rui de Souza Josgrilberg (presidente) Ronaldo Sathler-Rosa Stanley da Silva Moraes Trcio Machado Siqueira Marcos Jos Martins

    Coordenador editorial Ronaldo Sathler-Rosa Editor responsvel por este livro Trcio Machado Siqueira Coordenador de produo Luiz Carlos Ramos Reviso Gedilson Oliveira dos Santos, Glria Pratas e Adilson Miguel da Silva Assistente Editorial Glria Pratas Editorao e capa Marcos Antonio Brescovici Foto da capa Vitor Chaves (patena e clice utilizados nas celebraes eucarsticas da FaTeo)

    EDITORA DA FACULDADE DE TEOLOGIA DA IGREJA METODISTA Rua do Sacramento, 230 Rudge Ramos 09840-000 So Bernardo do Campo, SP

    Telefone: (11) 4366-5983 e-mail: [email protected]

  • Sumrio

    Prefcio ................................................................... 7 Prlogo .................................................................. 11 Introduo ............................................................ 13 Liturgia e Culto ............................................................ 13 Liturgia e Teologia........................................................ 13 Modelos bblicos e histricos de ordem para o culto ....... 16 As bases da liturgia crist: o Po e a Palavra ................. 24 I O que culto? (A liturgia do servio) ...............29 II Por que fazer culto? (A liturgia da graa) .......37 III Onde se faz culto? (A liturgia do espao sagrado)................................................................41 Lugares Sagrados ........................................................ 42 Tabernculo................................................................. 43 O Templo .................................................................... 45 Sinagogas ................................................................... 47 Casas (cenculo) ......................................................... 48 Praa pblica ............................................................... 50 Prises ........................................................................ 51 Catacumbas ................................................................ 52 Baslicas e catedrais ..................................................... 54 A linguagem espacial e a teologia dos edifcios, moblias e utenslios religiosos................................................... 56 A Igreja: em esprito e em verdade............................... 62 IV Quem participa do culto? (A liturgia do povo de Deus) ..................................................66

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    O lugar da criana no culto cristo................................ 70 Culto para crianas ou culto com as crianas? ............... 73 O que as crianas podem e no podem fazer no culto?.. 75 Preparao da liturgia de um culto inclusivo.................. 78 Portanto...................................................................... 80 V Quando fazer culto? (A liturgia do tempo)....... 82 A celebrao da Histria da Salvao............................ 83 O Calendrio Litrgico.................................................. 86 Ciclo do Natal .............................................................. 88 O Tempo Comum (aps Epifania e aps Pentecostes)..................................................... 93 Ciclo Pascal ................................................................. 96 Esquema do Ano Litrgico...........................................101 VI Como fazer culto? (A liturgia da liberdade e da criatividade)................................................ 105 Objetividade e subjetividade litrgicas .........................106 A emoo na comunicao litrgica .............................107 A razo na comunicao litrgica.................................108 Emoo, sensao e razo e a sade litrgica ..............110 Outras formas de comunicao-no-verbal na liturgia ..111 A natureza e o culto....................................................112 O corpo e o culto ........................................................120 A cultura e o culto.......................................................131 A Equipe ou Ministrio de Liturgia ................................135 Eplogo ................................................................ 139 Referncias ......................................................... 141 Textos sobre culto e liturgia.........................................141 Textos sobre a comunicao por vias no-verbais ........143

  • Prefcio

    A Srie Cristianismo Prtico (S-CRIPT) foi planejada para oferecer s lideranas das igrejas locais, pastores e pastoras, leigos e leigas, um ins-trumento de trabalho e aperfeioa-mento da pastoral crist. Como uma demonstrao de nossa disposio, temos a alegria de apresentar o traba-lho do Rev. Luiz Carlos Ramos, Em Esprito e em Verdade, um curso pr-tico de liturgia.

    A publicao deste livro torna-se urgente, exatamente, porque cresce, nas igrejas evanglicas, uma atitude de desdm para com a palavra litur-gia. H poucos dias, ouvi a seguinte frase, numa orao de um leigo: Re-

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    preenda, Senhor, o esprito de liturgi-a. Indagado pelo pastor sobre o seu conceito de liturgia, ele respondeu: aquele papelzinho que organiza o cul-to.

    O livro Em Esprito e em Verdade tem a inteno de esclarecer o signifi-cado de liturgia para a Igreja Crist. Mais do que enfatizar a liturgia como uma ordem para a celebrao cltica, o autor deixa claro que ela vai alm. Para ele, liturgia deve ser compreen-dida como uma vida de servio Causa Divina. Isso faz da liturgia um conjunto harmonioso de palavras, gestos e expresses que orientam e desafiam a comunidade celebrante a aperfeioar o seu testemunho cristo.

    Assim, pedagogicamente, a liturgia deixa de ser mera questo formal, para exercer um verdadeiro papel proftico, desafiando a cada celebran-te a transformar os passos litrgicos, contidos numa folha de papel, em prticas do seu dia-a-dia.

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    O autor desenvolve este tema

    com profundidade e leveza. Partindo das bases bblicas, mostra a liturgia como um instrumento necessrio ao testemunho cristo. Alm disso, ele deseja mostrar que a liturgia um dos elementos que sinalizam a di-menso ecumnica da Igreja Crist, em todas as pocas. Na diversidade das igrejas, a liturgia se faz presente na especificidade de cada tradio crist.

    Portanto, a Faculdade de Teologia da Igreja Metodista pretende, com esta publicao, incentivar as igrejas locais a redescobrirem a importncia da liturgia, para o culto, e a dialoga-rem com as tradies crists. A preo-cupao do Rev. Luiz Carlos com a prtica do culto nas igrejas.

    Como editor da Srie Cristianismo Prtico, espero que este curso prtico de liturgia ajude o povo cristo na busca de uma autntica celebrao de sua f. Que os cultos sejam mais

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    comunitrios e participativos, e que o povo crente seja mais consciente e comprometido com a Palavra de Deus.

    Trcio Machado Siqueira

  • Prlogo

    O material desta obra o resulta-do da experincia do autor como pas-tor e como liturgista. fruto dos cursos ministrados nas comunidades pelo Brasil afora e das aulas de Li-turgia da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista; e tambm da expe-rimentao de uma espiritualidade encarnada, vivenciada nas celebra-es da Igreja local, regional e nacio-nalmente, bem como em tantos en-contros ecumnicos, e, particular-mente, nos cultos da FaTeo.

    Luiz Carlos Ramos

  • Introduo

    Liturgia e Culto

    NTES DE APRESENTARMOS uma definio de liturgia, importante fazer uma pe-quena distino entre Li-

    turgia e Culto: segundo Nelson Kirst (ver referncias bibliogrficas no final da publicao) Culto o encontro ce-lebrativo entre Deus e o seu povo, e a Liturgia o que acontece nesse en-contro.

    Liturgia e Teologia

    Convencionalmente, a Teologia se estrutura em trs grandes reas, a saber: (1) Bblia, que se ocupa da in-

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    vestigao das fontes da f crist; (2) Teologia Sistemtica e Histria, que estuda a maneira como a f foi inter-pretada e reinterpretada em diferen-tes pocas e lugares; (3) e Pastoral, que se ocupa da prxis da f, isto , da reflexo e da prtica aplicada realidade das pessoas e das comuni-dades de f no contexto da misso da Igreja a toda a humanidade.

    Didaticamente, a Liturgia inscre-ve-se no escopo da Teologia Pastoral, que, por sua vez, se subdivide em di-ferentes reas, sendo as principais estabelecidas a partir da narrativa bblica do livro dos Atos dos Apstolos (especialmente, 2.42-47): doutrina (didaskalia) comunho (koinonia) partilha do po (diakonia) ora-o/louvor (liturgia). A Liturgia , por-tanto, um captulo da Teologia Pasto-ral, ao lado da Educao Crist, do Aconselhamento ou Poimnica, da Diaconia ou Ministrios. Entretanto, essas divises tm carter meramente didtico, pois, na prtica, todas as

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    reas da Teologia esto imbricadas, interligadas e se interdependem.

    Na academia, o uso cientfico do termo liturgia aplica-se disciplina teolgica que trata da ritualidade ce-rimonial e rubrical que regulam o e-xerccio externo do culto.

    Considera-se a liturgia como teolo-gia primeira (theologia prima) e a re-flexo dogmtica como Teologia se-gunda (theologia secunda). igual-mente considerada pice e fonte (cul-men et fons) da ao da igreja (actio ecclesiae). Neste sentido, como ensina Casiano Floristn, a liturgia lugar primrio no qual se realiza a autnti-ca f, ao mesmo tempo em que fonte e norma primeira da doutrina. A li-turgia uma das trs grandes aes da Igreja, sendo precedida pela evan-gelizao e seguida pela atividade ca-ritativa, testemunhal ou apostlica.

    Assim sendo, no se pode fazer Li-turgia sem se recorrer fonte da nos-sa f, a Bblia; nem interpretao e atualizao dessa f, a Teologia Sis-

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    temtica e a Histria; e, muito menos, sem recorrer-se aplicao dessa f vida com vistas transformao da realidade luz dos princpios do Rei-no de Deus, que a tarefa especfica da Teologia Pastoral.

    Por essa razo, trataremos dos temas da Liturgia, sempre relacio-nando-os Bblia, sistematizao histrica e prxis pastoral.

    Comecemos, portanto, pela busca de alguns modelos bblicos de ordem para o culto.

    Modelos bblicos e histricos de ordem para o culto

    Na Bblia Hebraica h muitas in-dicaes, umas mais, outras menos explcitas, de diferentes prticas li-trgicas. Um bom exemplo a narra-tiva de Neemias 8.1-12. Note-se a estrutura sugerida pela narrativa: Reunio leitura bblica adorao edificao (explicao da leitura)

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    refeio comunitria/servio aos ne-cessitados.

    No mesmo livro podemos encon-trar variaes dessa estrutura, veja-se, por exemplo, Neemias 9: Confis-so individual leitura bblica ado-rao e louvor confisso comunit-ria dedicao (renovao da alian-a).

    Um dos modelos mais significati-vos o encontrado em Isaas 6.1-8. A estrutura oferecida por esta passagem forneceu a base para a liturgia de v-rias igrejas reformadas e, particular-mente, a Igreja Metodista, aqui no Brasil: adorao confisso (indivi-dual e comunitria) edificao de-dicao.

    No Novo Testamento, vrias so as referncias. Detenhamo-nos em al-gumas das que mais inspiraram a prtica litrgica histrica.

    Lucas 24. O captulo 24 do Evan-gelho de Lucas repete sistematica-mente uma mesma estrutura: encon-tro Servio da Palavra Servio da

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    Mesa Envio. Veja Lucas 24.13-35; 36-43; 44-49.

    O mesmo texto de Atos 2.42-47, mencionado acima, tambm nos ofe-rece uma referncia sobre a prtica celebrativa dos primeiros cristos: instruo comunho partilha orao e louvor.

    Apocalipse 8. Uma outra proposta litrgica, bem diferente, encontramos no relato de um culto escatolgico, narrado no captulo 8 e seguintes do livro do Apocalipse: silncio contem-plativo splicas (incensrio) pro-clamao (trombetas) edificao (10.8-10) Envio (10.11; 11.1ss).

    Um dos registros mais antigos, a que temos acesso, sobre o culto nos primeiros sculos, encontra-se na Didach, que era uma espcie de ma-nual dos primeiros cristos, datado, provavelmente, do final do primeiro sculo. Veja-se, a ttulo de ilustrao, a seguinte orao eucarstica extrada da Didach:

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    No que se refere eucaristia, dai graas assim: Primeiramente, sobre o clice: Ns te damos graas, Pai nosso, pela santa vinha de Davi, teu servo; tu no-la fizeste conhecer por Jesus, teu filho. Glria a ti pelos sculos! Depois, sobre o po partido: Ns te damos graas, Pai nosso, pela vida e pelo conhecimento que nos concedeste por Jesus, teu filho. Glria a ti pelos sculos! Como esse po partido, antes disseminado sobre as montanhas, foi reunido para ser apenas um, rene do mesmo modo tua igreja das extremidades terra em teu Reino. Sim, a ti so a glria e o poder por Jesus Cristo, pelos sculos! Depois de terdes comido o po, agradecei assim: Ns te damos graas, Pai santo, por teu santo nome, que abrigaste em nosso corao, pelo conhecimento, pela f

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    e pela imortalidade que nos concedeste por Jesus, teu filho. Glria a ti pelos sculos! Tu, Senhor todo-poderoso, criaste o universo para louvor de teu nome e deste aos homens a comida e a bebida para [seu] regozijo, a fim de que eles te dem graas; mas a ns, tu nos deste um alimento e uma bebida espirituais e a vida eterna por teu filho. Antes de tudo ns te damos graas porque s poderoso; Glria a ti pelos sculos! Lembra-te, Senhor, de livrar tua igreja de todo mal e de complet-la em teu amor. Rene, dos quatro ventos a Igreja, que santificaste, no Reino que preparaste para ela. Porque a ti pertencem o poder e a glria pelos sculos! Venha a tua graa e passe este mundo! Hosana ao Deus de Davi! Quem santo venha; quem no faa penitncia. Marana tha! Amm.

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    Sntese: Adorao (oraes a Deus, o Pai) Eucaristia (proclamao do evangelho e memorial de Jesus, o Fi-lho) Diakonia (Esprito Santo motiva o servio/coleta em favor dos necessi-tados).

    Outro importante documento o relato de Justino Mrtir (Primeira Apologia), de meados do segundo s-culo da era crist. Assim Justino des-creve a celebrao do domingo:

    Depois disso, continuamos a recor-dao dessas coisas. Aqueles que tm posses prestam ajuda a todos os que tm necessidade, e ns nos da-mos assistncia mutua. Em todas as nossas oferendas bendizemos o Cria-dor do universo por seu filho Jesus Cristo e pelo Esprito Santo. No dia chamado do sol, todos, habitem nas cidades ou nos campos, se renem num mesmo lugar. So lidas as me-mrias dos apstolos e os escritos dos profetas enquanto o tempo o permite. Terminada a leitura, aquele que preside toma a palavra para ad-vertir e exortar imitao desses be-los ensinamentos. Em seguida, todos

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    ns nos levantamos e oramos em voz alta. Depois, como j dissemos, ter-minada a orao, so trazidos po, vinho e gua. Aquele que preside, medida que suas foras o permitem, faz subir ao cu oraes e aes de graa, e todo o povo responde com a aclamao amm. Segue-se a distribuio dos alimen-tos consagrados a cada um, e a parte dos ausentes lhes enviada pelo mi-nistrio dos diconos. Aqueles que tm bens em abundncia e querem fazer doaes doam livremente o que querem. O que recolhido entregue ao presidente, que d assistncia aos rfos, s vivas, aos doentes, aos indigentes, aos presos, aos hspedes estrangeiros, numa palavra, a todos os que esto passando necessidade. Ns nos reunimos no dia de Sol por-que o primeiro dia, aquele em que Deus, tirando a matria das trevas, criou o mundo, porque nesse mesmo dia o nosso salvador Jesus Cristo ressuscitou dos mortos. Na viglia do dia de Saturno ele foi crucificado e, no dia seguinte a este, isto , no dia do Sol, ele apareceu aos seus apsto-

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    los e aos seus discpulos e lhes ensi-nou essa doutrina que ns acabamos de submeter ao vosso exame.

    A liturgia comeava com leituras das Escrituras e relatos dos teste-munhos dos apstolos (seguidores de Jesus) exortaes para a imitao dos atos de Jesus, conforme teste-munhados oraes pelo mundo e pela igreja, particularmente pelos enfermos, ou que estavam morte, e pelos que haviam sido presos por professarem a Cristo, denunciados por no cristos beijo da Paz ofer-trio dos elementos eucarsticos orao eucarstica distribuio dos elementos eucarsticos aos presentes e envio aos ausentes coleta em fa-vor dos necessitados (alimentos, rou-pas ou dinheiro) despedida com orao para que todos permaneam fiis e a salvo at reunirem-se nova-mente no prximo domingo.

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    As bases da liturgia crist: o Po e a Palavra

    Sabe-se que os primeiros cristos mantinham seu costume, como ju-deus, de freqentar a sinagoga, aos sbados, para ouvir a leitura da Lei, dos Escritos e dos Profetas; e que, no domingo, se reuniam nas casas para o partir do po e celebrar a mem-ria de Jesus. Celebravam, assim, a Palavra, no sbado, e a Ceia, no do-mingo. Porm, medida que os cris-tos foram sendo expulsos das sina-gogas, passaram a concentrar no domingo a celebrao da Palavra e da Mesa.

    Num primeiro momento, como sa-lienta Nelson Kirst em Nossa Liturgia: das origens at hoje, o sacramento eucarstico era feito no contexto de uma refeio normal e tinha a se-guinte estrutura: O celebrante partia o po e fazia uma orao de ao de graas, depois todos comiam a refei-o comunal e, ao final, o celebrante

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    voltava a chamar a ateno de todos para a partilha do vinho que era pre-cedida de outra orao de ao de graas.

    A estrutura era, portanto: po refeio vinho. Mais tarde, por ra-zes vrias, passou-se a realizar a refeio em primeiro lugar, juntando a celebrao do po e do vinho no final da cerimnia: refeio po e vinho. Mais adiante, ainda, separou-se completamente a refeio do me-morial do po e do vinho.

    O culto cristo integra em uma nica celebrao a leitura e a expli-cao das Escrituras, prprias da liturgia da Sinagoga judaica, e o memorial eucarstico, do Cenculo.

    As primeiras pessoas a professar a f crist eram, principalmente, ju-dias, e assim continuaram at que foram expulsas da Sinagoga. At en-to, reuniam-se no sbado (Shabah), na Sinagoga para a liturgia da Pala-vra, e tornavam a reunir-se no do-

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    mingo (Dia do Senhor) para a Liturgia do Cenculo.

    Quando as Sinagogas fecharam suas portas aos cristos, estes pas-saram a concentrar a liturgia da Pa-lavra, e a do Cenculo, numa nica celebrao, desta vez no Dia do Se-nhor (Kyriake hemera).

    Dos relatos bblicos e histricos, mencionados at aqui, podemos es-tabelecer um padro que d o fun-damento da liturgia crist: a Cele-brao da Palavra e a Celebrao da Mesa.

    Quase todos os relatos tm em comum o fato de terem dois focos distintos e complementares: a leitura e explicao da Palavra, de um lado, e a prtica sacramental do memorial institudo por Jesus, a eucaristia, ou Santa Ceia, ou ainda a Ceia do Se-nhor, de outro. Po e Palavra so, portanto, os pilares da liturgia.

    Na organizao do espao celebra-tivo, esses pilares ficam evidentes pela disposio, no altar: da mesa da

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    comunho e do plpito, lugares res-pectivos da comunho e da procla-mao; do sacramento e do Evange-lho; da partilha e do anncio; da f e da prtica; dos atos de piedade e das obras de misericrdia; enfim, do Po e da Palavra.

  • I O que culto?

    (A liturgia do servio)

    TERMO LITURGIA TEM origem no grego clssico leitourgia (leitos [adjetivo de las] = povo + ergon = trabalho, esforo), que origi-

    nalmente designava toda obra, ao ou iniciativa assumida livremente por um indivduo em favor do povo ou do bairro ou da cidade ou do Estado. Aos poucos o termo passou a designar qualquer trabalho que importasse em servio, mais ou menos obrigatrio, prestado ao Estado, ou a um indivduo, ou mesmo divindade (servio religioso).

    Na Bblia Hebraica, ou Antigo Tes-tamento, um dos termos mais signifi-

    O

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    cativos, relativos ao culto, hawa, que pode ser traduzido por prostrar-se e adorar. A palavra empregada 170 vezes em todo o AT e traz a idia de submisso e auto-humilhao, cujo sentido sugere um curvar-se at a testa encostar o cho.

    Derivam de hawa outros termos que nos ajudam a entender melhor a fora e a idia da raiz desse termo: abad, traduzido por escravo, servo (equivalente ao grego doulos); abida, traduzido por servio, ritual, ado-rao; abodah, traduzido por traba-lho e abad, servir, cultivar o cam-po (vd. x 12.21-28; Dt 10.8; 2Cr 8.14).

    Em Esdras 6, por exemplo, esses termos so empregados na narrativa que descreve o servio realizado por ocasio da construo ou reconstru-o de Jerusalm.

    A traduo grega do Antigo Testa-mento, a Septuaginta (LXX), emprega o termo liturgia sempre, sem exceo, para designar o servio religioso

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    prestado pelos levitas a Yaweh (ocorre mais de 150 vezes).

    No Novo Testamento, o verbo lei-tourgeo, o adjetivo leitourgikos e os substantivos leitourgia e leitourgos ocorrem 15 vezes e, em geral, so tra-duzidos como servio, ministrio, socorro/auxlio e seus correspon-dentes. Em Atos 13.2 o termo tem, especificamente, o sentido de culto (ver tambm: Hb 1.7,14, 8.2,6, 10.11; Fp 2.17).

    Nos escritos extrabblicos, como na Didach e textos de Clemente, o termo aparece claramente relacionado com a celebrao eucarstica.

    Ao longo da histria da Igreja, o termo grego foi preservado na igreja oriental, mas substitudo por seus equivalentes latinos (officium, ministe-rium, mnus...) na igreja latina.

    Atualmente, a palavra liturgia se aplica a todo o conjunto dos atos ri-tuais e da Igreja pelos quais prosse-gue no mundo no exerccio do sacer-dcio de Jesus Cristo, destinado a

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    santificar os seres humanos e glorifi-car a Deus.

    No Novo Testamento, outros ter-mos so utilizados com o mesmo sen-tido de leitourgia (At 13.2; Hb 1.7,14, 8.2,6, 10.11; Fp 2.17), entre eles: Proskyneo (equivalente ao he-

    braico hawa), geralmente tra-duzido por adorar/adorao/ adorador, (Mt 2.2,8, 11; 4.9, 10; Jo 4.20-23; Ap 3.9). Signi-fica, literalmente, curvar-se, prostrar-se;

    Sebomai, traduzido por te-mor, piedade (Mt 15.9; At 13.43,50, 16.14, 17.4,17, 18. 7,13, 19.27). a caracterstica dos homens e mulheres cuja piedade se tornava notria pela prtica da orao, do jejum e das esmolas dadas aos pobres;

    E Latreia, traduzido como cul-to, servio sagrado (Rm 9.4, 12.1; Hb 9.1,6,9,14; Mt 4.10; At. 7.7; Ap 7.15, 22.3). A la-treia a tarefa do latris, o mais

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    humilde dos serviais do pero-do bblico. H vrios tipos de escravos que so mencionados na Bblia: o doulos, que cuida-va dos servios externos (trata-va dos animais, lavrava a ter-ra...); o diakonos, que cuidava dos servios domsticos (servia as mesas, limpava a casa...); e o latris, que era quem fazia o trabalho mais degradante (lim-pava a latrina). O latris no mencionado nas pginas do NT, mas o seu servio sim, nos textos indicados acima. Da mesma raiz, temos as expres-ses em portugus latrina e idolatria.

    Todos esses termos tm a conota-o de humildade e servio.

    Portanto, liturgia o servio comuni-trio celebrado pelo povo de Deus por meio da adorao Trindade e da soli-dariedade aos da famlia da f, bem co-mo a toda a comunidade humana.

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    Talvez por essa origem etimolgica dos termos, para muitos, participar do culto assumiu um carter de de-ver, de obrigao, de trabalho (at hoje, um termo muito comum na ln-gua inglesa para designar o culto service, servio).

    Por essa razo, preciso, aqui, evocar a grande ao da graa de Deus, que toma a iniciativa de vir at ns, no culto, como veio ao encontro da humanidade na pessoa de Jesus Cristo, e estabelece conosco uma no-va aliana, pela qual j no somos chamados servos, mas amigos:

    J no vos chamo servos, porque o ser-vo no sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, por-que tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a conhecer. (Jo 15.15)

    Assim sendo, o culto o encontro maravilhoso do Eterno com o efmero, do Infinito com o finito, do Santssimo com o pecador redimido.

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    A dimenso do servio prestado com muita humildade permanece, mas no por dever, mas por amor.

    Dizendo de outra forma, a liturgia um dilogo interativo e afetivo en-tre Deus e os seres humanos e des-tes entre si, no contexto celebrativo da f, na forma de um servio co-munal comunitrio e comunica-cional porque prestado por to-dos e para todos.

  • II Por que fazer culto?

    (A liturgia da graa)

    OR QUE ALGUM VAI AO CULTO? A resposta a esta pergunta pode ser reveladora da teologia do culto.

    H, historicamente, trs posturas clssicas a esse respeito: a primeira, tpica da Igreja Medieval, que diz que devemos ir ao culto para sermos a-graciados por Deus: nfase na mstica sacramental.

    Uma segunda, muito difundida entre os anabatistas, diz que devemos ir ao culto para sermos alimentados pela Palavra de Deus: nfase na ra-cionalidade dogmtica.

    P

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    Finalmente, a posio de reforma-dores, como Calvino e Lutero, que entenderam que a liturgia no deve ser considerada mero meio para se obter graa ou favor divinos, nem co-mo ocasio para que o povo de Deus seja alimentado por sua Palavra, uma vez essas seriam prticas antropocn-tricas porque tm como ltimo be-neficirio o ser humano.

    Em contrapartida, os reformadores entenderam que a liturgia deve ser teocntrica, de modo que Deus seja o sujeito, o centro, o foco do culto. As-sim, o fiel deve buscar em primeiro lugar o Reino de Deus e sua justia isso tambm no culto. Assim, a graa, a instruo bem como as demais coi-sas, sero acrescentados aos fiis como decorrncia natural. Aqui esto sendo levadas em considerao as duas grandes doutrinas da Reforma Protestante: a Teologia da Graa (es-pecialmente, Lutero) e a da Soberania de Deus (especialmente, Calvino).

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    Na prtica, constata-se que h um caminho de mo dupla: de um lado, Deus vem ao encontro da comunidade (e sempre ele quem toma a iniciati-va), e, por outro lado, a comunidade vai ao encontro de Deus, como res-posta em ao de graas grande ao da graa de Deus. O culto se constitui, assim, em ponto de encon-tro celebrativo entre Deus e a comu-nidade e desta consigo mesma (cf. Tg 4.8).

    No entanto, no se deve perder o referencial de que Deus o centro do culto, ele que est sentado no alto e sublime trono (cf. Is 61).

    A pergunta por que fazer cultos? ser melhor respondida e mais deta-lhadamente explicada ao longo dos prximos captulos, medida que a-bordarmos outros aspectos essenciais da liturgia.

  • III Onde se faz culto?

    (A liturgia do espao sagrado)

    UANTO AO ESPAO LITRGICO, desde muito cedo na experin-cia do povo de Deus, conforme registrada nas Escrituras, hou-

    ve a preocupao de delimitaes e estabelecimento de reas nas quais a manifestao do Sagrado experi-mentada de maneira especialmente enftica.

    A relao do povo de Deus com tais lugares acompanhou o amadure-cimento da sua f e espiritualidade, bem como as contingncias scio-poltico-geogrficas prprias de cada perodo de sua histria.

    Q

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    Lugares Sagrados

    Primeiramente, na fase em que o povo de Deus dava seus primeiros passos na construo de sua identi-dade religiosa (f e teologia), sua ex-perincia com as manifestaes de Yaweh (as teofanias) eram eventuais e espordicas. Assim, as primeiras referncias so os chamados Lugares Sagrados, tais como aconteceu com: No, aps o Dilvio (Gn 8.20); Abrao, nos Carvalhais de Manre (Gn 13.18); Moiss, no Monte Horebe (x 3.5); Josu, no Monte Ebal (Js 8.30); Davi, na Eira de Orn (1Cr 21.26); Esdras e Neemias, na reconstruo do Templo (Ed 3.2); mesmo Jesus, no Monte da Transfigurao (Mc 9.2ss); e Paulo, no lugar de orao s margens de um rio (At 16.13 ).

    Nas primeiras experincias, o lu-gar em si passa a ser considerado sagrado, porque ali algo especial da parte de Deus aconteceu.

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    Na medida em que a identidade re-ligiosa do povo de Deus vai se estabe-lecendo com mais clareza, comeou-se a construir ou utilizar-se de locais conforme as circunstncias do seu cotidiano.

    Tabernculo

    Quando nmades, habitantes de tendas, e peregrinos do deserto, cons-truram o Tabernculo (x 30-40, ver tambm cap. 25 [especialmente v. 8 a 27]).

    O Tabernculo deveria ficar no centro do acampamento israelita, com a entrada do Santo Lugar voltada pa-ra o Oriente e a do compartimento interno, o Santo dos Santos, voltado para o Ocidente.

    Tratava-se de uma estrutura sim-ples: uma cerca de lona com um p-tio, e um espao reservado menor (o Santo) para os sacrifcios dirios, ofe-recidos pelos sacerdotes, e um ainda mais reservado (o Santo dos Santos)

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    onde o Sumo-Sacerdote oferecia o sacrifcio anual.

    O Tabernculo abrigava a Arca da Aliana (cf. x 25.1-22), o Menorah ou castial de sete braos (cf. x 25.31-39), o Altar de Bronze para os holocaustos (cf. x 27.1-8) e o Altar de Ouro para o incenso (x 30.1-10).

    Quando o povo levantava acam-pamento e partia para outras para-gens, o Tabernculo era desmontado e carregado pelos levitas que torna-vam a mont-lo no novo lugar de des-tino.

    Diferentemente do que se passava nos Lugares Sagrados, com o Taber-nculo, Yaweh passa a habitar em uma tenda muito parecida com a casa do povo que o adorava, acompanhan-do-o em sua peregrinao, sempre que este se mudava.

    Durante a conquista de Cana, o Tabernculo permaneceu em Gilgal, depois em Silo, e depois em Quiriate-Jearim, at Davi. No tempo de Saul,

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    ficou em Nobe (1Sm 21.1). Salomo o trouxe para Jerusalm.

    Segundo o Evangelho de Joo, Je-sus tabernaculou com os seres hu-manos (cf. 1.14).

    O Templo

    Quando sedentrios, j estabeleci-dos na Terra Prometida, e passam a habitar em casas de madeira e alve-naria, devidamente decoradas e a-paineladas (cf. Ag 1.4), os adoradores de Yaweh decidem construir o Templo (cf. 1Rs 5.5; 6).

    O modelo para o Templo o que h de melhor em termos de edifica-es humanas da poca.

    O Templo passa a ser o lugar de referncia ao redor do qual gira a vida do povo de Deus. Em Jerusalm, on-de edificado, est o centro do poder poltico, econmico e religioso.

    E o Templo que d legitimidade a todo o resto. Para isso, peregrinaes anuais eram promovidas, de modo

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    que todos tinham o compromisso de comparecer ao Templo periodicamen-te para oferecer sacrifcio, pagar taxas e impostos e apresentar seus filhos e inici-los na f de Yaweh.

    O Templo de Jerusalm, edificado por Salomo, foi destrudo pelos Babi-lnios, cerca de 600 anos antes de Cristo. Em duas ocasies, foi reedifi-cado (por Neemias, em 520-516 a.C., e por Herodes, entre 19 a.C. e 64 d.C.). Depois de quatro anos de rebe-lio armada, pela qual os hebreus pretendiam inutilmente expulsar os funcionrios de Csar da terra prome-tida, no ano 70, o general romano Tito, obedecendo s ordens do seu pai, Vespasiano, foi enviado Palesti-na para restabelecer a ordem imperi-al. L chegando, assaltou Jerusalm e incendiou e arrasou o Templo, no sem antes promover-lhe o saque completo.

    Atualmente, no lugar do Templo, em Jerusalm, est construda uma Mesquita Islmica (a Mesquita da

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    Cpula Dourada). Ainda hoje h fac-es judaicas que sonham com a re-construo o Templo de Salomo.

    Sinagogas

    Quando, na dispora, o povo de Deus se viu disperso por todo o can-to, e longe do Templo. Como fazer para preservar as tradies religio-sas? Como transmiti-las s novas ge-raes? Como celebrar a f? Onde ler as Escrituras? Onde reunir-se para as oraes?

    Tais necessidades motivaram a constituio das sinagogas (do gr. syn+ago = reunir-se, ir para jun-to). Estas eram edificaes inspira-das no Templo, em propores redu-zidas, nas quais o povo passou a se reunir para exercitar a espiritualidade e alimentar a f. A Sinagoga fazia as vezes do Templo, a exceo dos sacri-fcios.

    Jesus, como judeu que era, fre-qentava assiduamente as sinagogas

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    (ver Lc 4.16-37). Tambm os apsto-los e os primeiros cristos reuniam-se nas sinagogas para a leitura e expli-cao das Escrituras e para a orao (ver At 17.1-2 e 10).

    Casas (cenculo)

    Alm das sinagogas, os primeiros cristos se reuniam nas casas das pessoas do povo que abriam suas portas para acolher a comunidade crist.

    Esse costume foi certamente ins-pirado e incentivado pelo prprio Je-sus, que tinha essa prtica de fre-qentar as casas de seus amigos e ali constituir um lugar de orao, comu-nho, e instruo (cf. Lc 4.38; 6.29; 10.38ss).

    A instituio do sacramento da Ceia Eucarstica se deu na casa de uma pessoa annima que, hospitalei-ramente, cedeu o Cenculo (um apo-sento destinado s refeies familia-res), para que Jesus, seus seguidores

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    e seguidoras, bem como, naturalmen-te, os integrantes da famlia hospedei-ra, partilhassem aquela refeio co-munal.

    Num primeiro momento, na hist-ria da Igreja Crist, a prtica normal era, nos sbados, a comunidade reu-nir-se na Sinagoga, para a Liturgia da Palavra e, nos domingos, no Cencu-lo, para a Liturgia da Mesa.

    Aos poucos, medida que a iden-tidade entre a religiosidade judaica oficial e o cristianismo nascente foi se distinguindo e distanciando, houve uma ruptura entre a Sinagoga e o Cenculo.

    Muitos seguidores de Jesus foram, literalmente, expulsos, excomunga-dos, da Sinagoga (ver Jo 9.34-35). Excluda, a comunidade crist passou a concentrar nas Casas/Cenculo tanto a Liturgia da Palavra quanto a da Mesa.

    Enquanto gozavam de certa liber-dade, a comunidade crist se reunia nas Casas sem maiores problemas.

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    Muitas casas abrigavam Igrejas (ver, por exemplo, Rm 16.5; Fm 1-3). Estas passaram a ser conhecidas como Ca-sas-igrejas (em gr. oikos-ekklesia; em latim, domus ecclesie): a comunidade de f que se rene em salas de casas particulares.

    Estima-se que, no final do terceiro sculo, havia mais de 40 Casas-igrejas somente em Roma.

    Para os cristos, no mais o tem-plo o lugar da habitao da divin-dade, mas a prpria comunidade dos fiis entendida como o lugar espiri-tual onde Deus, em Cristo, se faz pre-sente, onde quer que esta esteja reu-nida.

    Praa pblica

    Grande parte do ministrio de Je-sus a partir do seu batismo por Joo Batista e depois do seu primeiro milagre, em Can da Galilia (cf. Jo 1 e 2) se deu em espaos pblicos: nas praias, beira dos lagos (cf. Mt 5

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    e paralelos); nas plancies e nas coli-nas (cf. Lc 6.17ss e Mt 5); pelas es-tradas, nos caminhos e margem dos caminhos (cf. Mc 10.17,46; Lc 24.13ss); em jardins e hortos (cf. Lc 22.39 e par.); nas ruas das cidades (cf. Lc 19); no ptio e nos espaos comuns do Templo (cf. Lc 19.41-17); etc.

    Tambm os apstolos, impulsio-nados pelo Esprito Santo, ganharam as ruas para falar das maravilhas de Deus (cf. At 2); ocuparam os espaos pblicos de debate, tais como as pra-as e o Arepago (cf. At 17.16ss, es-pecialmente os vs. 17b e 19); evange-lizaram nas estradas (cf. At 8.26ss); em tombadilhos de navios (cf. At 27); nas margens de rios (cf. At 16.13-15); etc.

    Prises

    No tardou para que fossem lan-ados em prises aqueles e aquelas que anunciavam o Evangelho de Je-

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    sus Cristo com tanta ousadia (ver At 5.18; 12.7). Particularmente em Atos 16.25, encontramos Paulo e Silas cantando louvores a Deus na priso. Em Romanos 16.17, entre outras passagens bblicas, Paulo menciona nominalmente os seus companheiros de priso. Mesmo preso, Paulo con-tinuou a sua misso apostlica como pregador do Evangelho, gerando mui-tos filhos na f, mesmo na priso, como podemos constatar por sua E-pstola a Filemon (esp. o v. 10).

    Tambm Joo, prisioneiro na Ilha de Ptmos, exerceu seu ministrio pastoral, redigindo suas cartas s Igrejas da sia Menor e registrando suas vises e textos litrgicos de lou-vor e glorificao ao Senhor Deus E-terno (cf. Ap 1.4 e 2.1ss).

    Catacumbas

    Quando a perseguio s pessoas que professavam sua f em Cristo ga-nhou propores mais violentas, atin-

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    gindo nveis de crueldade inimagin-veis, as comunidades crists precisa-ram de lugares mais seguros e discre-tos onde pudessem reunir-se secre-tamente e em relativa segurana.

    Assim as Catacumbas passam a ser a nova sede dos cultos. Os cemitrios eram lugares temidos, porque, segundo as supersties pags, eram lugares habitados por espritos imundos (ver Mc 5), lugar de demnios e assombraes.

    Mas, por causa da experincia, primeiro, da ressurreio de Lzaro e, depois, da ressurreio de Jesus, pa-ra os cristos, nem a morte nem os cemitrios eram temidos.

    Desde o martrio de Estevo (cf. At 7.54-60), e de Tiago, irmo de Joo (cf. At 12.1-2), a comunidade crist adotou o costume de honrar a mem-ria dos seus mrtires. Da nasceu o costume de reunir-se nos lugares on-de descansam os restos mortais da-queles e daquelas que deram sua vida por sua f em Cristo. Ali, junto s l-pides dos mrtires, a salvo dos su-

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    persticiosos perseguidores, a Igreja se reuniu inmeras vezes para a Liturgia da Palavra e a Liturgia da Mesa (ver Ap 7.9-17 [esp. v. 14]).

    Baslicas e catedrais

    Em meados do sculo IV, devido a controvertidos episdios polticos e msticos do Imperador Constantino, o cristianismo passou, no s a ser to-lerado, mas a ser, enfaticamente, in-centivado com o respaldo do Estado. Esse perodo recebeu a designao de Paz Constantiniana.

    Os pequenos grupos marginais de cristos vo, rapidamente, se tornan-do grandes assemblias. Isso exigiu uma reestruturao do espao cele-brativo. As casas j no davam conta de abrigar s grandes massas que afluam para as cerimnias religiosas.

    O prprio Constantino designou, ento, seus arquitetos para a edifica-o de novos espaos destinados aos cultos cristos. Ora, a experincia

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    desses profissionais quanto cons-truo de amplos edifcios, estava consolidada pelas chamadas Basli-cas. Estas eram, a princpio, espaos forenses onde se reunia o Tribunal do Jri da poca, para julgar processos judiciais.

    Tais edifcios tm o santurio, ge-ralmente com abside (nicho ou recin-to semicircular ou poligonal, de teto abobodado, geralmente situado nos fundos ou na extremidade da cons-truo ou de parte dela) para a cte-dra (antes destinada para uso do ma-gistrado, agora reservado para quem preside a liturgia), um ambo ou pl-pito (antiga tribuna), o altar (mesa da comunho), e um nrtex (vestbulo que ficava entrada da baslica pale-ocrist, destinado aos catecmenos, para que pudessem assistir aos ritu-ais, sem deles participar diretamente, por ainda no serem batizados [conti-nuou em uso nas igrejas da Idade Mdia e, mesmo aps perder seu sen-tido, nos perodos posteriores, per-

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    maneceu demarcado pelo espao en-tre a portada e o pra-vento]).

    Nos sculos subseqentes, as ba-slicas apresentaram formas variadas (quadrada, redonda, em forma de cruz latina, de cruz grega ou sim-plesmente de aula [ptio ou grande vestbulo], retangular).

    Os estilos variaram, com as cultu-ras dos respectivos sculos: estilo romnico, gtico, clssico renascen-tista, barroco, neo-clssico, e con-temporneo.

    O termo Catedral relativo a c-tedra, e designa a igreja principal de uma diocese, onde se encontra o tro-no episcopal; s, matriz.

    A linguagem espacial e a teologia dos edifcios, moblias e utenslios religiosos

    No culto, antes mesmo que os ce-lebrantes pronunciem qualquer pala-vra, o Evangelho j comea a ser pre-gado e conceitos teolgicos e ideolgi-

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    cos j esto sendo transmitidos pela linguagem espacial da arquitetura do edifcio, pela disposio e tipos da moblia, pela esttica e funo dos utenslios.

    Pode-se identificar, para fins did-ticos, trs concepes espaciais tpi-cas: O conceito medieval, que valoriza o altar, pois sua teologia refora o aspecto mstico e espiritual da parti-cipao no mistrio eucarstico. O conceito cartesiano, prprio do pero-do da ps-Reforma do sc. XVI, que coloca em evidncia o plpito, que refora o aspecto intelectual, concei-tual e didtico da f. E o conceito mi-ditico, comum nos dias atuais, que valoriza o palco, isto , o aspecto es-petacular do evento celebrativo, cujo centro passa a ser a performance dos celebrantes como comunicadores-atores e dos instrumentistas e canto-res.

    Deve-se, portanto, ter um esprito crtico em relao ao trato que se d ao espao celebrativo, pois aquilo que

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    este comunica pode, eloqentemente, estar em flagrante contradio com aquilo que os/as pregadores/as a-nunciam dos plpitos.

    As edificaes religiosas devem ser adequadas celebrao das aes litrgicas e devem facilitar a partici-pao ativa dos fiis.

    Cada elemento arquitetnico, ou da moblia ou utenslio empregado no culto, tem implicaes teolgico-litrgicas que expressam seu (1) as-pecto celebrativo, pois o culto f e festa motivada pela Graa (cf. Lc 15.7,10,23 e 32); (2) aspecto educati-vo, pois h uma teologia inerente s formas dos espaos retangulares, quadrados, circulares e em leque uns mais inclusivos outros menos; (3) aspecto encarnacional, pois o espao explicita o nvel de inculturao ou encarnao do Evangelho pregado em determinada cultura, como expresso material da Palavra, luz da encar-nao de Deus em Cristo (Jo 1.14); (4) aspecto espiritual, pois aponta para a

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    transcendncia por meio da transpa-rncia perceptvel na concepo desse espao: simplicidade nobre, familiari-dade, beleza, propriedade, qualidade, autenticidade ou integridade dos ele-mentos que compem o ambiente ce-lebrativo; (5) aspecto esttico-potico do espao que, intencionalmente, in-tegra a comunidade de fiis (corpo-alma-e-esprito), por meio de cuida-dosa ambientao e decorao que possibilitem a incluso dos sentidos, sentimentos, emoes e razes.

    Isso implica em um cuidado teol-gico-litrgico-esttico do lugar ou es-pao onde esse povo se rene. Por isso, so considerados imprescind-veis, nos templos cristos, como es-trutura mnima fundamental, o san-turio, a nave e o trio.

    O Santurio o espao central (no fisicamente, mas no sentido de mais importante) do edifcio. Tudo de-ve estar orientado para o espao re-servado para o Memorial Pascal, lugar da renovao da aliana: o altar, que

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    representa a mesa do sacrifcio (AT), a mesa eucarstica (NT) e as lpides dos fiis que deram sua vida por amor a Cristo, os mrtires; para a pia ou fon-te batismal, que, juntamente com a mesa do altar, representam os dois sacramentos (Ceia e Batismo); para o ambo ou plpito, que o lugar de onde o Evangelho pregado e a Pala-vra de Deus proclamada; e para a sdia ou ctedra, que o lugar onde se senta o presidente da celebrao.

    A Nave (do latim navis, que signi-fica navio, pela lembrana do forma-to das vigas que suportam o teto de alguns templos se parecerem com o costado de um navio) o espao da assemblia, que so os membros do corpo mstico de Cristo. o lugar da ateno, do alerta, da vigilncia. o lugar dos batizados e, por esta razo, o batistrio (ou pia batismal) pode es-tar colocado entrada da nave, indi-cando que participam da celebrao crist aquelas pessoas que receberam o Sacramento do Batismo e se vesti-

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    ram das vestes brancas para apre-sentar-se diante do Trono do Cordei-ro.

    E o trio (do latim atriu[m]) o espao de transio. o espao para a festa do encontro, onde as pessoas se renem antes e depois da celebra-o. Ao chegar para o culto, a pessoa se prepara para entrar no santurio, fica em silncio e passa pela porta que Cristo (no se pode chegar no lugar santo a no ser por intermdio de Cristo Jo 10.7,9).

    Os vrios objetos que so empre-gados no culto devem ser cuidadosa-mente escolhidos e sabiamente em-pregados, quer sejam objetos simbli-cos, tais como o po e o vinho e os recipientes que os contm, a Bblia, a cruz; quer sejam objetos festivos, co-mo so os candelabros, as flores e os vasos, os estandartes, os ornamentos e os vitrais; e mesmo os objetos fun-cionais, entre eles, o suporte para a Bblia, as toalhas, os sistemas acsti-

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    cos, climatizadores, de iluminao, etc.

    A Igreja: em esprito e em verdade

    Teologicamente, ou espiritualmen-te falando, luz dos ensinamentos e da prtica de Jesus (cf. Jo 4.20-23), deve-se compreender que o espao sagrado, por excelncia, no depende da forma arquitetnica, nem da topo-grafia, mas da atitude dos fiis que devem adorar o Pai em esprito e em verdade.

    Essa compreenso de adorado-res que adoram em esprito e em ver-dade , juntamente com o dito de Jesus de que onde estiverem dois ou trs reunidos em meu nome, ali estou no meio deles (Mt 18.20), fundamen-tou a eclesiologia crist: a igreja no um edifcio, mas o povo reunido em nome de Jesus, o Cristo.

    Os modelos para os edifcios cris-tos, portanto, no devem ser os sun-tuosos templos do paganismo mo-

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    derno, tais como os bancos, shopping centers, edifcios pblicos e casas de espetculo. Antes, sua forma deve ser determinada pela teologia do culto, isto , a liturgia. Suas linhas devem ser sbrias, austeras e singelas o que no implica em comprometer a esttica. Linhas que privilegiem o sen-timento de comunho da assemblia com Deus e de solidariedade para com o prximo; onde Deus possa ser adorado em esprito e em verdade (Jo 4.24), com decncia e com ordem (1Co 14.40), com o esprito e com o entendimento (1Co 14.15), onde pos-samos apresentar os nossos prprios corpos em sacrifcio vivo, santo e agra-dvel a Deus em um culto racional, alegre, sensvel e sincero (cf. Rm 12.1).

    O Ministrio da Ambientao, ou da decorao, ou da ornamentao, , em primeira instncia, um ministrio kerygmtico, de anncio do Evange-lho e da proclamao da Palavra.

    Aquelas pessoas que abraam esse ministrio devem estar dispostas a

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    ambientar e decorar com arte (esttica e qualidade), o que pressupe dom e talento; devem tambm ambientar e decorar com inteligncia (praticidade e significado), o que requer esforo e estudo; e devem ainda ambientar e decorar com o corao (afetividade e espiritualidade), para o que preciso sensibilidade e f.

  • IV Quem participa do culto?

    (A liturgia do povo de Deus)

    e acordo com a tradio b-blica, Deus a personagem central do culto, pois ele quem est assentado no alto

    e sublime trono (cf. Is 6.1); glorifi-cado por seres celestiais (cf. Is 6.2); servido por ministros ou sacerdo-tes/liturgos/ celebrantes (cf. 103. 21), cultuado pela comunidade de fiis, a congregao ou assemblia (cf. Sl 5.8; 22.22-23, 25-26); at mesmo por todos os que morreram por causa do seu testemunho, os mrtires ou tes-temunhas, se acham constantemente diante do trono, glorificando o Alts-

    D

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    simo (cf. Ap 7.9-15); mesmo os pa-gos ou gentios, de todas as naes, esto convidados para o culto (cf. Sl 117); e, mais ainda, de acordo com os salmistas, todo ser que respira deve louvar a Deus (cf. Sl 150.6); e mesmo os seres inanimados, tais como os corpos celestes, de alguma forma, proclamam a glria de Deus, e anun-ciam as obras das suas mos (cf. Sl 19.1).

    Deus quem toma a iniciativa e vem ao nosso encontro, no culto, dando incio ao dilogo litrgico e ce-lebrativo da f. Pouco sabemos sobre a participao dos seres celestiais no culto, bem como a respeito das tes-temunhas que se acham constante-mente diante do trono louvando a Deus. Por outro lado, podemos nos aplicar a compreender a nossa parti-cipao no culto, como comunidade de fiis.

    A congregao de fiis formada por pessoas de todas as camadas so-ciais, de todas as culturas e de todas

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    as idades. Isso significa que, do culto, tomam parte e tm lugar: pessoas das classes empobrecidas e das classes abastadas; pessoas cultas ou iletra-das; e pessoas de todas as idades a Igreja talvez seja o nico espao insti-tucional com tamanha abrangncia inclusiva.

    Teoricamente, todos deveriam ter sua participao no culto garantida, representada ou contemplada: na es-trutura da liturgia que se celebra, no repertrio dos cnticos que se ento-am, no tipo de linguagem que se ado-ta, etc.

    Ou a Igreja de todos ou no I-greja! Igreja s para jovens no Igre-ja, point; igreja s para idosos no Igreja, clube de saudosistas.

    Quando se diz que tm lugar no culto pessoas de todas as idades, es-tamos dizendo que a liturgia deve ser concebida e preparada para incluir e contemplar bebs, crianas, adoles-centes, jovens, adultos e idosos.

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    Embora isso parea relativamente bvio, ao observarmos o que acontece na prtica de muitas igrejas, essa in-cluso no acontece.

    Conquanto se possa constatar um evidente conflito de geraes, entre jovens e idosos, na disputa pela he-gemonia litrgica, as maiores vtimas dessas disputas so as crianas.

    De uma maneira ou de outra, jo-vens, adultos e idosos tm os seus meios para contestar e protestar. As crianas, entretanto, no tm voz nem vez.

    No obstante, dar destaque para a participao da criana no culto no apenas uma questo de fazer uma concesso e dar-lhes, provisoriamen-te, vez e voz. A criana trazida para o centro do culto, como se pretende demonstrar a seguir, a prpria ra-zo de ser da liturgia.

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    O lugar da criana no culto cristo

    A participao da criana, no cul-to, merece destaque por uma razo histrica e bblica. Como sabemos, o centro da liturgia crist a Pscoa que tambm o centro da liturgia judaica. Ora, nas instrues dadas por ocasio da instituio da Pscoa judaica, a criana desempenha um papel central, e ela que d incio s solenidades.

    Vejamos alguns dos relatos bblicos da instituio da celebrao da Pscoa:

    xodo 12.24-27: 24 Guardai, pois, is-to por estatuto para vs outros e para vossos filhos [grifo nosso], para sempre. 25 E, uma vez dentro na terra que o SENHOR vos dar, como tem dito, obser-vai este rito. 26 Quando vossos filhos [grifo nosso] vos perguntarem: Que rito este? 27 Respondereis: o sacrifcio da Pscoa ao SENHOR, que passou por cima das casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu os egpcios e livrou as nossas casas. Ento, o povo se incli-nou e adorou.

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    xodo 13.14: Quando teu filho [grifo nosso] amanh te perguntar: Que is-so? Responder-lhe-s: O SENHOR com mo forte nos tirou da casa da servi-do. Deuteronmio 6.20-21: Quando teu fi-lho [grifo nosso], no futuro, te pergun-tar, dizendo: Que significam os teste-munhos, e estatutos, e juzos que o SE-NHOR, nosso Deus, vos ordenou? 21 En-to, dirs a teu filho [grifo nosso]: ra-mos servos de Fara, no Egito; porm o SENHOR de l nos tirou com poderosa mo.

    luz dessas referncias, podemos nos perguntar pelo lugar que as cri-anas devem ter nos nossos cultos.

    As grandes experincias de f do povo de Deus eram celebradas ciclica-mente, justamente, pensando na trans-misso dessa espiritualidade para as novas geraes (ver Lc 2.41-42).

    As crianas eram, assim, o ele-mento disparador de tais liturgias. Tais cerimoniais eram concebidas especialmente para responder aos insistentes por qus? das crianas:

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    quando vossos filhos vos pergunta-rem: que rito este? Responder-lhes-s... (x 12.26 e par.).

    As crianas eram, portanto, o ponto de partida e, em grande parte, a razo de ser da liturgia. como se o culto fosse um veculo em cujo motor preci-sasse ser dada a partida por um siste-ma eficiente de ignio, para ento em-preender efetivamente sua viagem.

    Ao que parece, no faria muito sentido fazer essas festas sem a pre-sena das crianas. Sim, verdade que os adultos sempre se beneficiam muito de tais festas, mas para o adul-to os ritos so sempre repetio, e tem funo de reforo conceitual e prtico, mas para as crianas des-coberta e novidade deslumbrante de um novo universo espiritual.

    Assim sendo, se algum, depois de Deus, tiver que ser privilegiado no culto cristo, esse algum so as cri-anas.

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    Culto para crianas ou culto com as crianas?

    Qual seria, ento, a melhor alter-nativa em relao questo criana-e-culto? As alternativas mais freqen-temente empregadas pelas igrejas protestantes so: (1) Modelo do culto infantil que consiste em tirar a crian-a do culto e fazer um outro (infantili-zado) parte para elas; (2) o modelo hbrido que tolera as crianas no cul-to parcialmente, mas somente at o momento da prdica, quando, ento, elas so retiradas do templo para um lugar onde tero atividades diferen-ciadas (a palavra mais bonita do que o resultado, pois amide o que se verifica que tais atividades se resu-mem a entretenimento sem projeto didtico-pedaggico, supervisionadas por pessoas que no tm formao para a educao infantil); (3) e o mo-delo deixa como est pra ver como fi-ca, que simplesmente ignora a pre-sena da criana no culto, cuja litur-

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    gia prossegue indiferente presena das crianas.

    O terceiro modelo, do deixa como est, embora talvez seja o mais recor-rente, deveria estar fora de cogitao.

    Quanto aos outros dois modelos, por mais bem intencionados que se-jam tanto o projeto do culto infantil quanto o projeto hbrido, ambos tam-bm acabam se tornando antipedag-gicos, pois excluem a criana do cul-to, total ou parcialmente.

    Ora, se a criana retirada do templo quando pequena, no h como esperarmos que, quando for adoles-cente (ou pr-adolescente), ela queira permanecer no culto. Pois tudo o que lhe foi ensinado, ainda que no inten-cionalmente, todas as vezes que foi retirada do culto, que ela no bem-vinda ali.

    As experincias inclusivas so ra-ras. Isso em parte compreensvel, mas no justificvel. Compreensvel, porque exige esforo, preocupao e d trabalho. injustificvel, porque

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    no h nada mais importante no Rei-no de Deus do que as crianas: afinal, foi isso que aprendemos (ou devera-mos ter aprendido) de Jesus em Ma-teus 18.1-2 e em Lucas 9.47.

    Como, afinal, a criana pode ser includa plenamente no culto? Disso trataremos a seguir.

    O que as crianas podem e no podem fazer no culto?

    Eis uma boa questo para a Igreja se perguntar: afinal o que as crianas podem e o que no podem no culto? Talvez o leitor ou leitora desta refle-xo se surpreenda com a resposta enftica que aqui se dar, afirmando que no h nada, liturgicamente fa-lando, que as crianas no possam fazer no culto cristo nada que um adulto no faa.

    O que acontece, amide, nos nos-sos cultos? Em geral, oramos, canta-mos, lemos as Escrituras Sagradas, testemunhamos, proclamamos o E-

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    vangelho, comungamos, ofertamos, nos comprometemos assumindo com-promissos, etc.

    Ora, quais desses atos litrgicos esto fora das possibilidades das cri-anas?

    As crianas podem aprender a orar antes mesmo de aprender a andar ento, por que nunca convidamos uma criana para fazer uma orao nos cultos de domingo?

    E quanto a cantar, por que tam-bm no cantamos com elas, uma vez que elas sempre cantam conosco? pois todos, mesmo os bebs, adoram (inclusive no sentido literal do termo) cantar (afinal, deles nasce o perfeito louvor, dizem as Escrituras Sagradas em Mt 21.16). Se elas cantam nosso repertrio, porque ns no cantamos as suas canes?

    Ler a Bblia: desde que alfabetiza-da, o que acontece cada vez mais ce-do, uma criana com sete, ou seis, talvez cinco anos, pode fazer leituras, da Bblia ou de outros textos litrgi-

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    cos, tal como qualquer adulto no seria fantstico se todo culto tivesse a participao de crianas na direo de certas leituras?

    Quanto aos testemunhos e pro-clamao, tambm a as crianas po-dem ser sujeitos.

    Elas podem, inclusive, participar da prdica, encenando passagens b-blicas, interpretando ilustraes (pra-ticamente todo sermo recorre s i-lustraes para aclarar pontos obscu-ros ou conceitos abstratos). O mero fato de o pregador, ou pregadora, ter em mente que seu pblico tambm formado por crianas, j pode servir como estmulo para a busca de uma linguagem mais expressiva, o uso de vocabulrio mais substantivo, objetivo e concreto; para o emprego de ima-gens visuais e outros recursos sens-veis (ao tato, ao paladar, ao olfato, por exemplo). Fazendo isso, todos se beneficiariam, pois quando usamos linguagem abstrata, somente os adul-tos (e nem mesmo todos eles) conse-

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    guem acompanhar, mas a linguagem objetiva e os substantivos concretos, todos, crianas e adultos, podem e gostam de acompanhar.

    E, no momento da dedicao, in-tercesso e envio, as crianas tambm podem assumir compromissos como sujeitos na comunidade de f e na construo do Reino de Deus.

    Quanto aos bebs, quando presen-tes ao culto, podem no entender conceitualmente o que est se pas-sando, mas afetivamente eles esto aprendendo, desde cedo, que eles so bem-vindos, que so amados e que ali seu lugar: no meio da comu-nidade de f.

    Preparao da liturgia de um culto inclusivo

    Preparar a liturgia de um culto in-clusivo, para todos, no qual todos so considerados, representados, e cuja participao est garantida, no

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    assim algo to difcil ou diferente do convencional.

    Basta que, na hora em que estiver-mos escolhendo o repertrio dos hinos, das leituras, dos gestos e atos litrgi-cos, lembrar de incluir as crianas, assim como fazemos naturalmente com os jovens e os adultos. Por exemplo, prever msicas prprias para as crian-as (ora, se elas podem cantar nossos hinos, porque no podemos cantar os delas?). E, na hora de distribuir as ta-refas, na conduo do culto, lembrar-mo-nos de atribuir funes s crian-as, que pode ser desde a direo de oraes e leituras, at a cooperao em atos como o recolhimento das ofertas, a distribuio da Ceia, e encenaes e performances vrias a depender u-nicamente da criatividade, da boa von-tade e do bom senso dos responsveis pelo preparo e direo da liturgia dos cultos ordinrios das nossas igrejas.

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    Portanto...

    Para finalizar estas consideraes sobre o culto cristo inclusivo, pode-mos sintetizar algumas das principais concluses a que chegamos, a partir do exposto acima:

    1. Deus sempre o principal sujeito do culto Cristo que, mediante o convite da sua graa, nos rene como seu povo num encontro ce-lebrativo dialgico e interativo.

    2. O povo a congregao de fiis que, em resposta ao convite da graa divina, presta-lhe seu servio no culto comunitrio.

    3. A congregao de fiis forma-da por todas as pessoas da comunidade: bebs, crianas, adolescentes, jovens, adultos e idosos.

    4. As pessoas responsveis pela preparao e pela direo da li-turgia devem levar em conta a totalidade do povo de Deus, o que implica em envolver, con-

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    templar, incluir a todos nos v-rios atos litrgicos.

    5. Dentre todos os fiis, so as crianas as que merecem maior cuidado e ateno, pois, luz da tradio bblica, so elas que deflagram o culto com suas perguntas fundamentais, s quais a comunidade celebrante oferece sua resposta de f, no exerccio de uma espiritualida-de que , assim, transmitida de gerao em gerao.

    6. No h nada que um adulto fa-a no culto que no possa ser feito pelas crianas. Portanto, elas no devem ser meras es-pectadoras do culto, mas sujei-tos ativos da dinmica litrgi-ca.

    Colocar isso em prtica... Eis a um belo desafio!

  • V Quando fazer culto?

    (A liturgia do tempo)

    LITURGIA SE D NO TEMPO e no espao. O tempo da litur-gia a Histria da Salvao contada ciclicamente duran-

    te o Ano Cristo, que tem a Pscoa como centro irradiador da mensagem salvfi-ca.

    Ao contar a histria de Jesus (a expectativa de sua vinda, sua vida e ensinamentos, sua paixo, morte e ressurreio) e sua presena espiritu-al na Igreja, a comunidade de f re-lembra, atualiza e celebra a sua pr-pria salvao.

    A

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    A liturgia , a um s tempo, mem-ria, atualizao e esperana salvfica.

    A celebrao da Histria da Salvao

    Para celebrar a sua salvao em Cristo, a Igreja, observa o Calendrio Cristo ou Calendrio Litrgico, que se estrutura em dois ciclos festivos e dois tempos ordinrios: o Ciclo do Na-tal, formado pelo Advento, Natal e E-pifania, que seguido por um primei-ro Tempo Comum (aps Epifania); e o Ciclo da Pscoa, que compreende a Quaresma (que dura 40 dias), a Se-mana Santa, o Tempo Pascal (que se estende por 50 dias e termina com o dia de Pentecostes), seguido de um segundo Tempo Comum (tambm chamado aps Pentecostes ou Tem-po do Reino).

    Essa histria constantemente atualizada em ocasies que se reves-tem de especial sentido, luz do E-vangelho: o Domingo (dia da Ressur-reio), a Quarta (acordo de Judas

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    para a traio), Quinta (lava-ps e instituio da Ceia) e Sexta-feiras (julgamento, crucificao, morte e sepultamento de Jesus), e o Sbado (Jesus no sepulcro); bem como as Ho-ras de Orao Matinas-Laudes (nascer do sol/ressurreio), Trcias (julgamento), Mdia (crucificao), Noas (morte), Vsperas (sepultamen-to), Completas e as Viglias Noturnas (Getsmani).

    No prprio culto, a igreja revive a Histria da Salvao: num primeiro momento adora o Pai (primeira pes-soa da Trindade), recordando o Cria-dor que Santo e perfeito; diante da santidade do Pai, a congregao reco-nhece suas imperfeies e pecados, por isso recorre ao Filho, segunda pessoa da Trindade, que o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo; agraciada com o perdo, a congrega-o pode agora ser instruda na sua f, porque o Filho tambm o Verbo que se fez carne e habitou entre ns cheio de graa e de verdade; essa

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    instruo, entretanto, para que se efetive na vida da comunidade, deve ser inspirada e iluminada pela ao do Esprito Santo, a terceira pessoa da Trindade, que tambm quem mo-tiva e envia a Igreja em sua misso, que a de reconciliar a humanidade com Deus, o Pai, retomando, assim, o ciclo teolgico-litrgico.

    A Histria da Salvao , assim, celebrada no tempo csmico, no ano litrgico, nas horas do dia e naquela hora nica que o culto.

    Tambm a Histria da Humanida-de celebrada na liturgia da comuni-dade de f: datas cvicas, nacionais e internacionais, so motivo de refern-cia e intercesso no culto.

    E, finalmente, a Histria das Pes-soas (nascimento, puberdade, casa-mento, procriao, envelhecimento e morte) tambm so motivos que ins-piram a prtica celebrativa, porque relacionam a nossa prpria histria de vida, e nos incluem, na grande his-

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    tria da salvao, mediante a graa de Deus.

    O Calendrio Litrgico

    Todo o Calendrio Litrgico se de-senvolve a partir da Pscoa. Esta comemorada no primeiro domingo depois da primeira lua cheia do outo-no, no hemisfrio Sul (e na primavera, no Norte). Tradicionalmente era a o-casio em que os catecmenos eram batizados e recebidos como membros da comunidade crist geralmente depois de ter passado trs anos se preparando para isso.

    Desde muito cedo, na Histria da Igreja, adotou-se o costume de obser-var um tempo de jejum e orao, pri-meiramente no dia anterior ao Do-mingo da Pscoa, depois, durante to-da a Semana Santa. Por fim, esse pe-rodo se ampliou para quarenta dias, inspirado por vrias a narrativas b-blicas significativos: a tentao de Jesus durante quarenta dias e qua-

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    renta noites no deserto, bem como nas demais associaes com o nme-ro quatro: quarenta dias do dilvio, quatrocentos anos de escravido no Egito, quarenta anos de peregrinao pelo deserto, anncio de que em qua-renta dias Nnive seria subvertida, e sua sbita converso, etc.

    A Festa do Natal mais tardia, e se estabelece depois do sculo IV (e o Advento, depois do VI). Trata-se da cristianizao da festa pag que cele-brava o comeo do fim do inverno, isto , o solstcio de inverno, no he-misfrio Norte. Para os cristos, Je-sus o Sol da Justia que nasceu em Belm; ele o Sol que maior que o astro adorado pelos pagos, este sol no existiria, no fosse aquEle.

    Da mesma forma que sucedeu com a Pscoa, a comemorao do nascimento de Jesus, no Natal, como que exigia um tempo de preparao. Novamente o nmero quatro evoca-do. Desta vez, reserva-se quatro se-manas (domingos), para que as co-

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    munidades crists se preparem para o grande evento da encarnao do Verbo. Nesse perodo, a igreja recorda as promessas feitas aos pais na f a respeito da vinda do Messias, o Sal-vador.

    Ciclo do Natal

    O Ciclo do Natal corresponde a quatro tempos litrgicos do calend-rio cristo, a saber, Advento, Natal, Epifania e Batismo do Senhor. Este ciclo tem incio quatro domingos an-tes do Natal e se estende at o Batis-mo do Senhor.

    O Advento o tempo que marca o incio do calendrio litrgico cristo. Sua origem documentada a partir do sculo IV d.C. Semelhante pre-parao da Pscoa, expiao de Cris-to, o Advento surge como preparao para o nascimento de Jesus, o Natal. Advento, do latim adventus, significa vinda, espera.

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    Trata-se de uma celebrao onde o foco a expectativa da vinda do Mes-sias, o Cristo prometido. Nesse pero-do celebra-se a espera do Messias, e pode ser dividido em duas partes: os dois primeiros domingos enfatizam o Advento Escatolgico, o terceiro e o quarto domingos a Preparao do Na-tal de Cristo.

    Destarte, o Advento tem a dimen-so da expectativa da segunda vinda de Cristo, bem como, a expectativa da chegada do Messias que concretiza o Reino, o j e o ainda no que implica viver a espera do cumprimen-to das promessas e renovar a espe-rana no Reino que vir.

    A espiritualidade do Advento marcada pela esperana e o aguardo do Messias prometido; a f na concre-tizao da promessa; o amor que se demonstra com a chegada do Messias e a paz por ele anunciada e plenifica-da.

    O segundo tempo litrgico desse ciclo o Natal. Esta celebrao teve

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    sua origem nos meados do sculo IV d.C., entretanto sua aceitao como festa crist s ocorreu no sculo VI. O Natal surgiu com a finalidade de afas-tar os fiis da festa pag do natale solis invictus (deus sol invencvel), e passou a significar a chegada do Mes-sias, o sol da justia (cf. Ml 4.2) j anunciado e aguardado no Advento.

    Natal, na acepo da palavra, sig-nifica nascimento, entretanto, para as/os crists/os a partir do sculo IV d.C., este significado ainda mais profundo, pois com o nascimento de Cristo celebra-se o Verbo que se fez carne e habitou entre ns. O Deus infinitamente rico se faz servo e habi-ta entre os despossudos da terra. este Verbo que atrai para si toda a criao a fim de reintegr-la ao proje-to salvfico de Deus.

    A espiritualidade desse perodo enfatiza a humanidade de Cristo e a salvao que nele absoluta.

    O terceiro tempo desse ciclo a Epifania, que surgiu no Oriente como

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    festa da manifestao do Cristo en-carnado. Somente, a partir do sculo IV d.C., passou para o Ocidente a fim de rememorar a visita dos reis magos ao Messias que havia chegado.

    Epifania, do grego ephifaneia, sig-nifica manifestao, apario. An-tes de tornar-se um termo apropriado pelo cristianismo, significava a che-gada de um rei ou imperador. A partir de Cristo, tem a conotao de mani-festao do divino ao mundo, que no Primeiro Testamento era expressa pelo termo teofania.

    Esse tempo celebra a manifestao de Cristo aos seres humanos, no momento em que os reis do Oriente seguiram a estrela em busca daquele que viria a ser o Salvador por exce-lncia.

    A Epifania para o Natal o que o Pentecostes para a Pscoa, isto , desenvolvimento e permanncia do ato de Cristo em favor da humanida-de.

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    A espiritualidade deste perodo caracterizada pela manifestao e a-pario de Cristo ao mundo. o Cris-to prometido que se torna uma reali-dade na vida de mulheres e homens que procuram a paz, a justia e o a-mor.

    O Batismo do Senhor celebrado no primeiro domingo aps a Epifania, e representa o incio da misso de Jesus no mundo. Este tempo parte da manifestao de Jesus aos seres humanos, por isso trata-se de uma continuidade da Epifania. Diferenci-ando-se pelo fato de que na Epifania a humanidade (representada pelos magos) que vai a Cristo, ao passo que com o Batismo do Senhor Deus (por meio de Jesus Cristo) que vem at o ser humano, a fim de cumprir sua misso.

    Por isso, a espiritualidade desse dia marcada pela misso iniciada por Jesus em prol dos menos favore-cidos e injustiados.

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    Com o Batismo do Senhor termina o Ciclo do Natal, dando incio ao Tem-po Comum, ou Tempo aps Epifania.

    O Tempo Comum (aps Epifania e aps Pentecostes)

    Alm dos dois ciclos festivos, o A-no do Senhor, tambm contempla 33 ou 34 semanas, situadas entre o Na-tal e a Pscoa. Esse perodo recebeu a designao Tempo Comum por con-trapor-se poca festiva do Ano Cris-to.

    O fato de haver um Tempo Comum ressalta o significado de que Deus no Senhor somente das coisas ex-traordinrias, mas tambm o do cotidiano. Enfatiza a presena cons-tante e amorosa do Pai na caminhada do povo rumo plenitude do Reino. A cada celebrao, antecipamos a eter-na liturgia do cu, para o qual nos preparamos, dia-a-dia, tanto no tem-po festivo como no tempo comum.

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    Ao longo da histria, vrias inicia-tivas foram tomadas no sentido de oferecer alternativas liturgia do tempo no festivo. Para exemplificar com algumas mais recentes e prxi-mas, citamos a formalizao, na d-cada de 30 nos EUA, de uma propos-ta que sugeria a criao de um novo perodo, o Kingdomtide (Ciclo ou Tempo do Reino). Essa proposta tem de positivo o fato de enfatizar menos o aspecto eclesistico-institucional e mais o teolgico-missionrio do per-odo. Entretanto, a postura mais am-plamente adotada pelos protestantes do mundo todo, foi a de designar as duas partes do Tempo Comum como sendo Tempo aps Epifania e Tem-po aps Pentecostes, respectivamen-te. Na Igreja Metodista no Brasil, o rev. Messias Valverde props uma organizao do Ano Cristo dividido em Estaes Litrgicas, das quais destacamos a Estao da Criao, com uma preocupao ecolgica e escatolgica.

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    A primeira parte do Tempo Co-mum tem incio na segunda-feira a-ps a comemorao do Batismo do Senhor e vai at a vspera da Quarta-Feira de Cinzas, quando comea a Quaresma (Ciclo da Pscoa).

    Sua espiritualidade enfatiza o a-nncio do Reino de Deus e visa es-perana e pregao da Palavra.

    A segunda parte do Tempo Co-mum comea na segunda-feira aps Pentecostes e dura at a vspera do Primeiro Domingo do Advento, quan-do tem incio o Ciclo do Natal.

    Sua espiritualidade comemora o prprio ministrio de Cristo em sua plenitude, principalmente aos domin-gos e enfatiza a vivncia do Reino de Deus e a compreenso de que os/as cristos/s, so o sinal desse Reino. Se na primeira parte do Tempo Co-mum a nfase no anncio, na se-gunda a concretizao do Reino de Deus.

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    Ciclo Pascal

    O Ciclo Pascal que compreende a Quaresma, a Semana Santa, o Tempo Pascal, e encerra-se com o Pentecostes formou-se a partir de um processo de reflexo e sistemati-zao do cristianismo que vai do pri-meiro ao quarto sculo da era Crist. A partir deste ciclo se constituiu todo o calendrio litrgico.

    Nas comunidades primitivas, era comum a reunio no primeiro dia de cada semana na qual celebrava-se a memria de Jesus. A origem do culto cristo est em torno dessa Pscoa Semanal, que ocorria no chamado Dia do Senhor.

    Em boa parte por influncia do ju-dasmo cristo, desenvolveu-se uma celebrao anual da Pscoa como um grande dia do Senhor, cuja festa se prolongava por cinqenta dias, sendo o ltimo, o dia de chegada do Espri-to, o Pentecostes Cristo, isso j no sculo II.

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    No sculo IV, desenvolveu-se a tradio de reviver e refletir de um modo mais sistematizado, os momen-tos da paixo, isso deu origem s ce-lebraes da Semana Santa. Desde o sculo III as vsperas da Pscoa j eram dias de reflexo. Os catecme-nos que por dois anos vinham sendo preparados, agora eram acompanha-dos por toda a comunidade. Inspiran-do-se nos quarenta dias de preparo de Jesus para seu ministrio, nasceu o perodo da quaresma. Assim, em torno da celebrao da morte e res-surreio de Jesus, desenvolveu-se todo o Ciclo Pascal do Calendrio Li-trgico Cristo, marcado pela peni-tncia e confisso, mas tambm pela alegria e exultao do crucificado e ressuscitado.

    A Quaresma o perodo no qual se enfatiza a importncia da contri-o, do preparo e da converso. Ini-cia-se no quadragsimo dia antes da Pscoa (no se contam os domingos). O incio na Quarta-feira de Cinzas

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    retoma tradio bblica do arrepen-dimento com cinzas e vestes de saco (Jn 3.5-6). um momento oportuno para refletir sobre a confisso e o va-lor do perdo de Deus.

    Sua espiritualidade enfatiza mo-mentos de preparo na histria bblica geral e da vida de Jesus: Quarenta dias de Jesus no de-

    serto (Mt 4.2; Lc 4.1ss); Quarenta dias de Moiss no

    Sinai (x 34.28); Quarenta anos do povo no de-

    serto (x 16.35); Elias em direo ao Horeb (1Rs

    19.8). A Semana Santa tem incio no

    Domingo de Ramos, celebrao de Cristo como o Messias, salvador dos pobres, o rei dos humildes. Reflete-se, nessa semana, passo a passo, os l-timos momentos da vida de Jesus.

    Este o momento da viglia de preparo para a ressurreio.

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    Sua espiritualidade chama-nos a ateno para os momentos finais de Jesus at o pice de sua paixo: A Santa Ceia (Mt 26.17-30); O Lava-ps (Jo 13.1-17); Jesus no Getsmani (Mt 26.36-

    46; Mc 14.26-31); O julgamento, sepultamento e

    a crucificao (Mt 27; Mc 15; Lc 23; Jo 19).

    A Pscoa propriamente, a festa da ressurreio e da libertao. Um novo xodo ocorre, e a humanidade passa do cativeiro da morte para a vida.

    Sua solenidade pode iniciar-se j na Quinta-Feira Santa (instituio da ceia), que d incio ao chamado Tr-duo Pascal. Contudo a celebrao da ressurreio comea com uma viglia na noite de sbado encontrando sua plenitude no romper da aurora do Domingo da Pscoa, quando Cristo lembrado como o sol da justia que traz a luz da nova vida, na ressurrei-o.

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    A espiritualidade norteadora da Pscoa aponta para a ressurreio nos mais variados relatos das comu-nidades do sculo I d.C.: A ressurreio (Mt 28.1-20; Mc

    16.1-8; Lc 24.1-12; Jo 20.1-18; At 1.14);

    Cnticos Pascais (Sl 113 ao 118 e x 12).

    Entre os hebreus, era comum a celebrao da chamada festa das semanas ou Pentecostes, isso por-que ela se dava sete semanas, ou cin-qenta dias, aps a Pscoa. Nela, o povo dava graas ao Senhor pela co-lheita. Mais tarde, adquiriu mais uma dimenso celebrativa, a da proclama-o da lei (instruo) no Sinai, cin-qenta dias aps a libertao do Egi-to.

    Na era crist, o Pentecostes tor-nou-se o ltimo dia do ciclo pascal, quando celebra-se a chegada do Esp-rito Santo como aquele que atualiza a presena do ressuscitado entre ns, dando fora para que as comunidades

  • S C R I P T 2 : E M E S P R I T O E E M V E R D A D E | 101

    sejam testemunhas de Jesus na his-tria.

    A espiritualidade que nos orienta nesse perodo fala da presena conso-ladora do Esprito que semeia nos coraes a esperana do Reino de Deus e nos impulsiona para a misso: Festa das semanas (x 34.22;

    Lv 23.15); Jesus promete o Consolador

    (Jo 16.7); Jesus ressuscitado sopra seu

    Esprito (Jo 20.22); A chegada do Esprito Santo no

    dia de Pentecostes (At 2).

    Esquema do Ano Litrgico

    Ciclo do Natal Advento (quatro domingos que

    antecedem o Natal) Natal (vspera, dia de Natal e

    semana que se segue) Epifania (6 de janeiro ou o do-

    mingo mais prximo) Tempo Comum aps Epifania

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    Domingos seguintes at o que antecede a Quarta-Feira de Cinzas

    Ciclo da Pscoa Quaresma (tem incio com a

    Quarta-Feira de Cinzas) Semana Santa: o Domingo de

    Ramos ou Domingo da Paixo (d incio Semana Santa) que se completa com o Trduo Pas-cal (as solenidades da Institui-o da Ceia, a Crucificao e a Ressurreio de Cristo)

    Domingo da Pscoa, que encerra a Semana Santa ( a festa mais importante do Ano Litrgico)

    Domingos de Pscoa (at o do-mingo de Pentecostes)

    Pentecostes (encerra o perodo da Pscoa)

    Tempo Comum aps Pentecostes Domingo da Santssima Trindade Domingos seguintes at o... ... Domingo do Cristo Rei (lti-

    mo domingo do Ano Litrgico: no domingo seguinte recomea-

  • S C R I P T 2 : E M E S P R I T O E E M V E R D A D E | 103

    se o ciclo do Natal com o Pri-meiro Domingo de Avento).

  • VI Como fazer culto? (A liturgia da liberdade

    e da criatividade)

    PARTIR DO NOSSO ESTUDO, constatamos que um culto cristo tem uma trplice es-trutura, caracterizada pela

    ao efetiva das trs pessoas da Trin-dade, o Pai, o Filho, e o Esprito Santo. Assim, pode-se dizer que o culto cristo possui partes essenciais que se ausen-tes o descaracterizariam.

    Assim, a estrutura bsica da litur-gia crist trinitria e pressupe um primeiro momento teolgico, no qual Deus adorado, um segundo momento

    A

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    Cristolgico, no qual a memria de Cristo celebrada e proclamada; e um terceiro momento, Pneumatolgico, no qual, pela ao do Esprito, a comuni-dade se compromete com o servio a Deus e ao prximo.

    Essa liturgia construda a partir da ao criativa da comunidade de f e compe-se de atos, ritos.

    Objetividade e subjetividade litrgicas

    Nesse sentido, a liturgia se constitui de ritos, atos, ofcios e sacramentos comunitrios que se expressam pelas vias racionais prprias das palavras (escritas, lidas, proclamadas, cantadas) e pelas vias sensoriais prprias dos gestos (levantar os olhos, fechar os o-lhos, ouvir a palavra, aspirar o incenso, curvar a cabea, beijar, comer o po, beber o vinho, impor as mos, estender as mos, aplaudir, bater no peito, a-braar, ficar em p, sentar-se, ajoelhar-se, processionais e recessionais...).

  • S C R I P T 2 : E M E S P R I T O E E M V E R D A D E | 107

    A emoo na comunicao litrgica

    Alm das dimenses racionais e sensoriais da comunicao verbal e no-verbal, a liturgia tambm comuni-ca pelas vias subjetivas das emoes. A maneira como os ritos, atos, ofcios e sacramentos afetam nossos sentimen-tos dependem de um sem nmero de questes que subjazem nossa consci-ncia. As emoes podem ser evocadas a partir de fora, mas somente podem ser experimentadas a partir de dentro. O riso ou choro, a ira ou a ternura, a indignao ou a compaixo, so esta-dos que, literalmente, jorram do sub-consciente. So manifestaes que, antes de despertar, jazem adormecidas ou, para usar a linguagem psicanalti-ca, esto reprimidas e contidas no obs-curo mundo da alma humana.

    Quando somos tocados desde fora por uma palavra ou um gesto, por um som ou uma imagem, pode acontecer de vacilarem as foras repressoras que mantinham trancadas as comportas do

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    subconsciente. Abrem-se essas com-portas e emergem, ento, as emoes, juntamente com memrias significati-vas (de experincias da infncia, de lembranas dos pais, dos filhos...), que compem o repertrio existencial e que, por uma razo ou outra, foi associado ao instante celebrativo. No raro, essas liberaes emocionais resultam em x-tases que se revelam to intensos que chegam a embotar a razo, dando va-zo a aes no conscientes e no ra-cionais.

    A razo na comunicao litrgica

    Ora, o princpio da primazia da e-moo sobre a razo o grande trunfo dos meios de comunicao de massa. Os estudiosos da comunicao rapi-damente concluram que as pessoas no so persuadidas por argumentos racionais, mas seduzidas por experin-cias emocionais. A mdia descobriu a eficincia do entretenimento e do espe-tculo como mediadoras da conver-

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    so que transforma o auditrio em massa.

    Entretenimento, como sugere a eti-mologia da palavra, se refere a um pro-cesso que procura ter o indivduo en-tre alguma coisa. O entretenimento funciona como um parntesis, no qual o indivduo se isola, ainda que por al-guns instantes, do mundo real. aqui, no processo de separao do real, que entra o espetculo, cuja etimologia re-monta ao latim speculum, espelho. O espetculo , portanto, uma imagem do real. As imagens, por mais parecidas que sejam, no podem ser confundidas com a realidade, pois toda imagem re-fletida no espelho se apresenta como o inverso do real ou como sua reprodu-o invertida. A vida real, quando espe-tacularizada, se nos d como no-vida. Quando, como espectadores, nos diver-timos com o espetculo, abrimos um parnteses em nossa vida e suspende-mos por um tempo a nossa existncia, para nos dedicarmos contemplao da simulao do real.

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    Como ao teraputica, essa prtica pode at ser de grande benefcio para a nossa sade emocional, entretanto, quando isso se d como mecanismo de fuga sistemtica da realidade, o que se verifica um desperdcio considervel da vida real. Como o medo e a amn-sia, a fuga tambm se constitui em im-portante dispositivo de sobrevivncia. No obstante, o medo, a amnsia e a fuga no devem substituir a prpria vida, por mais dura que esta seja, sob pena de terminar por aniquilar a pr-pria existncia. O entretenimento pode causar dependncia, mas no respon-sabilidade; alivia as tenses, mas no resulta em compromissos.

    Emoo, sensao e razo e a sade litrgica

    A liturgia essencialmente comuni-cao por abranger todo o espectro comunicacional humano. E a comuni-cao litrgica ser tanto mais intensa quanto maior for a abrangncia da sua

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    ao, subjetiva/objetiva, verbal/no-verbal, consciente/inconsciente... Um grande desafio para a liturgia , por-tanto, dosar adequadamente emoo, sensao e razo. Conclumos que a sade litrgica de uma comunidade de f depende da sensibilizao equilibra-da e inteligente das dimenses sensori-al, emocional e racional da comunica-o humana no contexto celebrativo. Mas isso no se poder obter pelo es-petculo nem pelo entretenimento, mas somente no servio comunitrio cele-brado pelo povo para Deus e para toda a comunidade humana.

    Outras formas de comunicao-no-verbal na liturgia

    Temos lugares comuns com todas as pessoas, de todas as idades, de qualquer nacionalidade e de qualquer substrato social.

    O primeiro desses lugares a na-tura (natureza), em cujo ventre todos

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    fomos gerados, em cujos seios sacia-mos a fome.

    O segundo o corpo a corporei-dade um tema que nos diz respeito a todos, religiosos ou no, homens e mu-lheres, adultos e crianas.

    Finalmente, a cultura, o universo, a oikoumene, na qual habitamos. Con-quanto diversa e extremamente com-plexa seja nas imensas distncias geogrficas dos cinco continentes, quer seja no microcosmo da nossa casa a cultura nos forja, ora nos formando, ora nos deformando.

    A natureza e o culto

    Os antigos filsofos diziam que a tudo o que existe no mundo derivado de quatro substncias elementares: a terra, a gua, o fogo e, o ar.

    Na Bblia, encontramos inmeras referncias a esses elementos relacio-nados espiritualidade do povo de Deus.

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    No princpio, criou Deus os cus e a terra. Deus fez o ser humano a partir do p da terra e o designou para culti-var e cuidar da terra (tu s p e ao p tornars) ouviu o grito do sangue de Abel clamando da terra; no suportan-do a maldade do corao humano, en-viou o dilvio para destruir e purificar a terra; chamou Abrao e lhe disse: sai da tua terra e vai pra terra que te mostrarei; desafiou Moiss a libertar o povo e Israel da opresso no Egito e conduzi-lo terra p