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Rev. Direito, Rio de Janeiro, v. 4, n. 7, jan./jun. 2000 123 Emenda Constitucional nº 25, de 2000: aplicação Parecer n o 04/00-FNB Ementa: Fixação dos subsídios dos dirigentes do Poder Executivo e dos Membros do Legislativo municipal: Emenda Constitucional n o 25, de 14 de fevereiro de 2000 e art. 45, n o V, da Lei Orgânica do Município. Inobstante “entrar em vigor” somente no ano de 2001, dita Emenda comporta, por sua natureza, interpretação elástica, a justificar sua aplicação imediata, no referente à fixação do subsídio dos Vereadores, sendo certo que não alterou o regime da Emenda n o 19, de 1998, relativamente aos subsídios do Prefeito e do Subprefeito. Os limites de despesa do Legislativo e de seu pessoal concernem à execução financeira, no curso da qual deverão observar-se, ainda quando diversos dos limites fixados orçamentariamente. Parecer pelo atendimento à referida Emenda, com a qual não é incompatível o aludido dispositivo orgânico. Senhor Procurador-Geral: Pelo ofício SGMD.07/2000, de 16 do corrente, o nobre Órgão interessado assinala aproximar-se o momento, legalmente previsto, de fixação dos subsídios das Autoridades máximas do Município e propõe audiência, com caráter de urgência, desta Procuradoria-Geral e das Repartições da área financeira, em vista da recente aprovação de Emenda Constitucional atinente aos gastos dos Poderes Legislativos municipais (fls. 2). Chegado aqui o processado, distribuiu-o Vossa Excelência ao signatário do presente. 2. A urgência determinada no r. despacho de fls. 3 foi atendida nos limites do possível, dada a complexidade e ineditismo da questão e os demais encargos desta Subprocuradoria-Geral. I. Histórico 3. É manifesto relacionar-se a preocupação originadora do administrativo com a recente Emenda Constitucional n o 25, promulgada a 14 do corrente e publicada no “Diário Oficial” da União do dia seguinte. Tal Emenda alterou, pela segunda vez em menos de dez anos (e com distância de pouco mais de ano e meio da alteração anterior), o inciso VI, que a Emenda n o 1, de 1992, aduzira ao art. 29 da Constituição da República, acrescentando, ainda, à mesma Lei Maior um art. 29-A, que contém,

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Rev. Direito, Rio de Janeiro, v. 4, n. 7, jan./jun. 2000 123

Emenda Constitucional nº 25, de 2000: aplicação

Parecer no 04/00-FNB

Ementa: Fixação dos subsídios dos dirigentes do Poder Executivo e dos Membros do Legislativo municipal: Emenda Constitucional n

o 25, de 14 de fevereiro de 2000 e art. 45,

no V, da Lei Orgânica do Município. Inobstante “entrar em

vigor” somente no ano de 2001, dita Emenda comporta, por sua natureza, interpretação elástica, a justificar sua aplicação imediata, no referente à fixação do subsídio dos Vereadores, sendo certo que não alterou o regime da Emenda n

o 19, de 1998,

relativamente aos subsídios do Prefeito e do Subprefeito. Os limites de despesa do Legislativo e de seu pessoal concernem à execução financeira, no curso da qual deverão observar-se, ainda quando diversos dos limites fixados orçamentariamente. Parecer pelo atendimento à referida Emenda, com a qual não é incompatível o aludido dispositivo orgânico.

Senhor Procurador-Geral:

Pelo ofício SGMD.07/2000, de 16 do corrente, o nobre Órgão interessado assinala aproximar-se o momento, legalmente previsto, de fixação dos subsídios das Autoridades máximas do Município e propõe audiência, com caráter de urgência, desta Procuradoria-Geral e das Repartições da área financeira, em vista da recente aprovação de Emenda Constitucional atinente aos gastos dos Poderes Legislativos municipais (fls. 2). Chegado aqui o processado, distribuiu-o Vossa Excelência ao signatário do presente.

2. A urgência determinada no r. despacho de fls. 3 foi atendida nos limites do possível, dada a complexidade e ineditismo da questão e os demais encargos desta Subprocuradoria-Geral.

I. Histórico

3. É manifesto relacionar-se a preocupação originadora do administrativo com a recente Emenda Constitucional n

o 25, promulgada a 14 do corrente e publicada

no “Diário Oficial” da União do dia seguinte. Tal Emenda alterou, pela segunda vez em menos de dez anos (e com distância de pouco mais de ano e meio da alteração anterior), o inciso VI, que a Emenda n

o 1, de 1992, aduzira ao art. 29 da Constituição

da República, acrescentando, ainda, à mesma Lei Maior um art. 29-A, que contém,

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até, a inusitada descrição de tipos penais a título de crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipais — em adendo perplexificante ao Decreto-lei n

o 201, de 27 de

fevereiro de 1967.

4. Semelhante regime não tem antecedentes na tradição constitucional brasileira senão a partir da Carta autoritária de 24 de janeiro de 1967, cujo art. 16, § 2

o, impunha

gratuidade ao exercício da vereança em todos os Municípios, excetuadas, dentro de limites e critérios a fixarem-se em lei complementar, as capitais e aqueles de população superior a cem mil habitantes. Esse número foi elevado, pelo Ato Institucional n

o 7,

de 26 de fevereiro de 1969, para trezentos mil e reduzido, pela Carta outorgada sob o nome de Emenda Constitucional n

o 1, de 17 de outubro de 1969, para duzentos mil.

Nova Emenda, de no 4, em 23 de abril de 1975, expungiu o quantitativo, atribuindo às

Câmaras Municipais a fixação do estipêndio da Edilidade, mas “nos limites e segundo critérios estabelecidos em lei complementar”.

5. A Constituição de 1988, originalmente omissa a respeito, sofreu, como já dito, três alterações a partir da significativa data do vigésimo oitavo aniversário do movimento militar de 1964, quando se impactaram no aludido art. 29 constitucional os incisos VI e VII, com o seguinte teor:

“VI - a remuneração dos Vereadores corresponderá a, no máximo, 75% (setenta e cinco por cento) daquela estabelecida, em espécie, para os Deputados Estaduais, ressalvado o que dispõe o art. 37, XI;VII - o total da despesa com a remuneração dos Vereadores não poderá ultrapassar o montante de 5% (cinco por cento) da receita do município;”.

A Emenda no 19, em junho de 1998, emprestou nova redação ao primeiro desses

incisos, dando-lhe o texto a seguir:“VI - subsídio dos Vereadores fixado por lei de iniciativa da Câmara Municipal, na razão de, no máximo, 75% (setenta e cinco por cento) daquele estabelecido, em espécie, para os Deputados Estaduais, observado o que dispõem os arts. 39, § 4º, 57, § 7º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º I;”.

Por fim, a Emenda causadora do questionamento em tela conferiu ao mesmo inciso a expressão abaixo,

“VI - o subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, observado o que dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos:a) em Municípios de até dez mil habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a vinte por cento do subsídio dos Deputados Estaduais;b) em Municípios de dez mil e um a cinqüenta mil habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a quarenta por cento do subsídio dos Deputados Estaduais;c) em Municípios de cinqüenta mil e um a cem mil habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a quarenta por cento do subsídio dos Deputados

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Estaduais;d) em Municípios de cem mil e um a trezentos mil habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a quarenta por cento do subsídio dos Deputados Estaduais;e) em Municípios de trezentos mil e um a quinhentos mil habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a sessenta por cento do subsídio dos De-putados Estaduais;f) em Municípios de mais de quinhentos mil habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a setenta e cinco por cento do subsídio dos Deputados Estaduais.”

mantendo inalterado o inciso VII e acrescentando à Carta o mencionado art. 29-A, verbis,

“Art. 29-A - O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os sub-sídios dos Vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das transfe-rências previstas no § 5º do art. 153 e nos arts. 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior:I - oito por cento para Municípios com população de até cem mil habitantes;II - sete por cento para Municípios com população entre cem mil e um e trezentos mil habitantes;III - seis por cento para Municípios com população entre trezentos mil e um e quinhentos mil habitantes;IV - cinco por cento para Municípios com população acima de quinhentos mil habitantes.§ 1º - A Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus Vereadores.§ 2º - Constitui crime de responsabilidade do Prefeito Municipal:I - efetuar repasse que supere os limites definidos neste artigo;II - não enviar o repasse até o dia vinte de cada mês; ouIII - enviá-lo a menor em relação à proporção fixada na Lei Orçamentária.§ 3º - Constitui crime de responsabilidade do Presidente da Câmara Municipal o desrespeito ao § 1º deste artigo.”,

devendo, porém, viger tais disposições somente a partir de 01 de janeiro do ano vindouro (art. 3

o da Emenda).

6. Trata-se de saber de possíveis repercussões do novo regime constitucional na fixação dos subsídios das Autoridades superiores dos Poderes Executivo e Legis-lativo, a promover-se no semestre em curso, ex-vi do art. 45, n

o V, da Lei Orgânica

do Município.

II. Fundamentação

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7. O tema, como é óbvio, ainda espera o exame dos doutos e a definição juris-prudencial, que lhe fixará os precisos contornos. Nada obsta, porém, a que se busque solução para alguns problemas imediatos, que as novas regras suscitam.

8. De notar-se, à primeira abordagem, que essas últimas alterações consti-tucionais não interferem com a remuneração do Prefeito e do Vice-Prefeito, que persistem reguladas na forma estabelecida pela Emenda n

o 19 para o inciso V do art.

29 constitucional, verbis,“V - subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais fixados por lei de iniciativa da Câmara Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;”.

Subordina-se o estipêndio do Chefe do Executivo, do seu substituto e eventual suces-sor e de seus auxiliares superiores, tão-só, aos requisitos de valor máximo limitado ao do subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, de unicidade (vedado o acréscimo de quaisquer verbas especiais) e de indistinção tributária.

9. Já a remuneração dos membros do Legislativo municipal, além dessas limi-tações, atrela-se a outras, relacionadas com as finanças comunais. Especificamente quanto a este Município — cuja população, notoriamente excede, e de muito, os quinhentos mil habitantes —, o estipêndio terá de:

a) fixar-se, em lei, observado, em vista do que dispõe o art. 27, § 2o, da Constituição

Federal, a saber,“Art. 27 - .......................................................................................§ 2º - O subsídio dos Deputados Estaduais será fixado por lei de iniciativa da As-sembléia Legislativa, na razão de, no máximo, setenta e cinco por cento daquele estabelecido, em espécie, para os Deputados Federais, observado o que dispõem os arts. 39, § 4º, 54, § 7º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I.”,

um limite de valor individual não superior a 56,25% (cinqüenta e seis inteiros e vinte e cinco centésimos por cento) do subsídio estabelecido para os Deputados Federais, este nunca superior ao dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da alínea “f” do inciso VI do art. 29 emendado;

b) manter-se num valor tal que, multiplicado pelo número de Vereadores e somado à despesa de pessoal da Casa Legislativa, não exceda 3,5% (três e meio por cento) — isto é, 70% (setenta por cento) sobre 5% (cinco por cento) — do somatório da receita tributária do Município com as transferências oriundas de impostos federais e estaduais constitucionalmente determinadas, que se tenham efetivamente realizado no exercício anterior, consoante o art. 29-A e seu § 1

o, acrescentados à Carta da União

pela Emenda em debate.

Restou sem relevo, para o caso desta Municipalidade, a restrição contida no inciso VII do art. 29 constitucional, também susotranscrito, eis que, ao atender-se ao limite de despesa global do Legislativo e de dispêndio com pessoal, fica-se, inevitavelmente, abaixo do “montante de 5% (cinco por cento) da receita do município” — salvo a se

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entender que, nesse dispositivo, o legislador estivesse, em desacordo com o sistema, cogitando da receita orçada e não da realizada. Porquanto, integrando um somatório não superior a 3,5% (três e meio por cento) da receita comunal realizada, jamais poderá chegar o dispêndio com a remuneração dos Vereadores a cifra excedente de 5% (cinco por cento) da mesma receita, mesmo que esta exceda consideravelmente a receita orçada; e, caso a receita realizada fique abaixo da orçada, menos ainda será possível exceder-se a vigésima parte desta última.

10. Esta é a disciplina constitucional que entra em vigor em 1o de janeiro de

2001, nos termos do art. 3o da mesma Emenda. E é a vacatio assim aberta que gera o

mais áspero problema jurídico oriundo da alteração constitucional em exame.

11. Com efeito, estando, no corrente ano, por encerrar-se a 5a Legislatura e, pois,

no momento de deliberar a Casa sobre os subsídios a serem fixados para a Edilidade adveniente, há que saber-se se, vigendo somente a partir de 1

o de janeiro de 2001 o

novo regime, deve observar-se nessa fixação. Posta em outros termos, a indagação é a seguinte: o novo sistema se aplica somente na próxima Legislatura ou já para a próxima Legislatura?

12. A leitura simplesmente formal do texto favoreceria a primeira alternativa: estando, ainda, em vigor o inciso VI do art. 29 da Carta Federal, com a redação que lhe deu a Emenda n

o 19, o limite atualmente exigível seria, tão-só, o genérico de 75%

(setenta e cinco por cento) do subsídio dos Deputados Estaduais fluminenses, em parcela única e sujeita aos impostos gerais, consoante a redação que a mesma Emenda impôs ao art. 37, n

o XI, daquela Constituição. Vale dizer, somente a Legislatura a

iniciar-se em 2005 estaria sujeita ao regime recém-criado.

13. Não assim, porém, numa interpretação construtiva. Bem ou mal, correta ou erroneamente, por casuísmo ou elevada inspiração, certo é que o legislador alterou a Constituição com os olhos postos em situações atualmente existentes. Como extraiu o Exm

o. Sr. Presidente do Egrégio Tribunal de Contas do Município da justificação da

Proposta originadora da Emenda em questão, motivou-a “a preocupação do constituinte derivado em evitar que as Câmaras de Vereadores retirem recursos essenciais à ma-nutenção dos serviços básicos da cidade, para aumentar os seus próprios orçamentos” 1. A mudança constitucional careceria de sentido, se postergada a sua aplicação para

cinco anos à frente, deixando-se subsistirem os problemas que lhe deram azo.

14. Aduza-se que, à luz da hermenêutica constitucional hodierna, não se interpretam os textos da Lei Máxima, invariavelmente, sob os critérios ordinários de entendimento das normas de conduta em geral. A Emenda em exame, versando mecanismos de controle das finanças municipais, é de cunho manifestamente orga-nizacional — haja vista o início do art. 29 da Constituição, que altera e cujo objeto é alinhar os preceitos a observarem-se na lei orgânica municipal —, capitulando-se, 1 Cf. Diário da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, v. 24, n. 37, p. 2, 23/02/00.

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segundo o magistério de LUÍS ROBERTO BARROSO, entre as não destinadas“...a disciplinar condutas de indivíduos ou grupos; [porque] têm um caráter instru-mental e precedem, logicamente, a incidência das demais. É que, além de estru-turarem organicamente o Estado, as regras dessa natureza disciplinam a própria criação e aplicação das normas de conduta. As normas de organização não contêm a previsão abstrata de um fato, cuja ocorrência efetiva deflagra efeitos jurídicos. Vale dizer: não se apresentam como juízos hipotéticos. Elas possuem um efeito constitutivo imediato das situações que enunciam. Não sendo, em princípio, ge-radoras de direitos subjetivos, essas normas não são interpretadas e aplicadas em igualdade de condições com as normas de conduta.”

2.

Por isso mesmo, o propósito da mutação constitucional, no momento de sua ocorrên-cia, não se pode marginalizar ao interpretar-se a norma alterada. É o que, resumindo ensinamento de CHIERCHIA, anota o mesmo BARROSO:

“...[O] que se interpreta na norma não é apenas o seu conteúdo aparente, mas todo o substrato de valores históricos, políticos e ideológicos que estão na origem da Constituição. Não se trata da vontade individual ou somada dos constituintes, mas, sim, da vontade social de que aqueles foram portadores, entendida como síntese de valores, sentimentos e aspirações comuns, traduzidos, no plano normativo, nos princípios constitucionais.”

3

Até porque, na palavra do mais celebrado defensor da interpretação modernizada dos comandos constitucionais, HÄBERLE,

“[a] interpretação constitucional jurídica traduz (apenas) a pluralidade da esfera pública e da realidade (die pluralische Öffentlichkeit und Wirkichkeit), as neces-sidades e as possibilidades da comunidade, que constam do texto, que antecedem os textos constitucionais ou subjazem a eles.”

4

O escopo de saneamento financeiro das Municipalidades e de destinação adequada dos recursos destas não se pode ignorar, pois, na análise da Emenda n

o 25.

15. Mas o art. 29-A, por esta introduzido, no seu caput, initio, suscita outra indagação, aparentemente árdua: limita-se percentualmente a despesa do Poder Legislativo municipal, no caso desta Cidade, a 5% (cinco por cento) do somatório efetivamente realizado no exercício anterior da receita tributária e das transferências financeiras havidas. A regra, conquanto alusiva a execução financeira, tem repercussão orçamentária inevitável, dado que, desde logo, na orçamentação para 2001, deverá

2 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 2. ed. São Paulo :

Saraiva, 1998. p. 103; grifos daqui.3 Ibid. p. 126.

4 HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional : a sociedade aberta dos intérpretes da

Constituição : contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Porto Alegre : S.A. Fabris, 1997. p. 43.

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cuidar a Câmara de não se atribuir despesas superiores àquele percentual sobre a re-ceita prevista. Mas o exercício anterior, quando da elaboração da lei ânua de meios, ainda não se findou: como observar-se tal limite?

16. A dificuldade, como se disse, é aparente, considerando-se, vale repetir, cuidar a norma da execução financeira e não da elaboração orçamentária. É na efetivação dos desembolsos, ao longo do exercício de 2001 e dos que se lhe seguirem (se a Emenda sobreviver até lá), que se deverá atentar para o quanto foi arrecadado, em tributos e transferências, no exercício anterior, independentemente do previsto no orçamento. As suplementações a formalizarem-se, no curso do ano, ainda quando oriundas de disponibilidades já obtidas, restarão inexeqüíveis, se resultarem em excesso daquele percentual.

17. As questões emergentes, de imediato, da Emenda discutida parecem estar, assim, esclarecidas; outras, que porventura surjam, devem estudar-se, como é de rigor em opinamentos jurídicos, caso a caso.

III. Conclusão

18. Assim, pois, por força da Emenda no 25, de fevereiro recente, retomou estatura

constitucional o princípio consagrado art. 45, no V, da Lei Orgânica do Município e

permanece exigível a prescrição de definir-se em cada legislatura, para a seguinte, o subsídio dos Vereadores, que, no caso desta Municipalidade, far-se-á “no primeiro período legislativo ordinário” do corrente ano e não poderá passar além de 75% (se-tenta e cinco por cento) do subsídio dos Deputados Estaduais fluminenses, devendo a despesa do Legislativo, a partir do exercício de 2001, cifrar-se ao máximo de 5% (cinco por cento) da receita comunal oriunda de tributos e transferências constitucionais, efetivamente realizada no corrente ano e assim por diante, aí compreendido o limite de 3,5% (três por cento) da mesma receita para despesas de pessoal, abrangente do desembolso com aquele subsídio.

Tal o parecer, submetido à elevada consideração de Vossa Excelência.

Rio de Janeiro, 01 de março de 2000.

Francisco das Neves BaptistaSubprocurador-Geral da Câmara Municipal do Rio de Janeiro

1. Visto. Aprovo o parecer supra, versando sobre o atendimento à Emenda Constitucional n

o 25, de 14/01/2000, e a compatibilidade do art. 45, V, da Lei Orgânica

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do Município com a referida Emenda.

2. Restitua-se ao Exmo. Sr. Presidente, opinando pelo prosseguimento dos estudos

sugeridos pela Secretaria-Geral da Mesa Diretora (fls. 2), com o encaminhamento do presente processo à Diretoria de Finanças, para que a Mesa Diretora possa “dispor de informações técnicas na área financeira”.

Em 02 de março de 2000.

Roberto BenjóProcurador-Geral da Câmara Municipal do Rio de Janeiro