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Tecnólogo e Mercado: uma relação a ser revisitada Emerson Freire, Fatec Jundiaí Professor na Faculdade de Tecnologia de Jundiaí, é doutor em Sociologia pela Unicamp e em Filosofia pela Université Paris 1 Panthéon Sorbonne França. É graduado em informática pela Fatec Americana (1998) e possui mestrado em Política Científica e Tecnológica pela Unicamp (2002). Foi ganhador do Prêmio Rumos Pesquisa do Instituto ItaúCultural em seleção nacional, prêmio este destinado ao fomento de pesquisadores em artemídia. Interessase pelas relações sociotécnicas produzidas no âmbito das produções artísticas que tematizam ou operam com as tecnologias contemporâneas. Desde 2003 é pesquisador do Grupo CTeMe (Conhecimento Tecnologia e Mercado) da Unicamp e coordena o Núcleo de Estudos de Tecnologia e Sociedade (NETS) na Fatec Jundiaí. RESUMO O caráter profissionalizante dos cursos superiores em tecnologia incentiva, de certa forma, uma relação mais estreita com o mercado. Percebe-se que nessa relação a influência do mercado torna-se cada vez mais determinante na formação dos tecnólogos, inclusive servindo como parâmetro para as grades curriculares. Todavia, o mercado não entende de tecnologia no seu mais íntimo, ou seja, no processo de invenção. Ele utiliza este para gerar mais valor, seu objetivo final e sua maestria, por meio do processo que ultimamente convencionou-se chamar inovação tecnológica. Eis o paradoxo: aquele que só compreende a tecnologia como utilitária acaba por definir as bases do ensino tecnológico. Este artigo pretende discutir esse paradoxo a partir de bibliografia específica e da experiência como docente em cursos tecnológicos. O pressuposto inicial é de que tal paradoxo acaba restringindo o potencial do ensino tecnológico com seu papel estratégico em termos sócio- políticos atualmente. Palavras-chave: tecnólogo, mercado, tecnologia, invenção, inovação. * Muitas vezes, por comodidade de um suposto lapso ou por imposição mesmo, sabe-se lá, esquece-se de algo muito simples: o Mercado não entende absolutamente nada de tecnologia. E não é de hoje. No que ele é imbatível, sua maestria singular, é a capacidade em gerar do valor mais valor, valor abstrato. Para lembrar Marx, não se trata do valor da mercadoria em função do tempo de trabalho para sua produção, mas como determinante da maneira de viver dos humanos sob o capitalismo.

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Como o tecnólogo se encaixa no mercado de trabalho.

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Tecnólogo e Mercado:

uma relação a ser revisitada

Emerson Freire, Fatec Jundiaí Professor  na  Faculdade  de  Tecnologia  de  Jundiaí,  é  doutor  em  Sociologia  pela  Unicamp  e  em  Filosofia  pela  Université  Paris  1  -­‐  Panthéon  Sorbonne  -­‐  França.  É  graduado  em  informática  pela  Fatec  Americana  (1998)  e   possui   mestrado   em   Política   Científica   e   Tecnológica   pela   Unicamp   (2002).   Foi   ganhador   do   Prêmio  Rumos   Pesquisa   do   Instituto   ItaúCultural   em   seleção   nacional,   prêmio   este   destinado   ao   fomento   de  pesquisadores   em   artemídia.   Interessa-­‐se   pelas   relações   sociotécnicas   produzidas   no   âmbito   das  produções   artísticas   que   tematizam   ou   operam   com   as   tecnologias   contemporâneas.   Desde   2003   é  pesquisador  do  Grupo  CTeMe  (Conhecimento  Tecnologia  e  Mercado)  da  Unicamp  e  coordena  o  Núcleo  de  Estudos  de  Tecnologia  e  Sociedade  (NETS)  na  Fatec  Jundiaí.      RESUMO O caráter profissionalizante dos cursos superiores em tecnologia incentiva, de certa forma, uma relação mais estreita com o mercado. Percebe-se que nessa relação a influência do mercado torna-se cada vez mais determinante na formação dos tecnólogos, inclusive servindo como parâmetro para as grades curriculares. Todavia, o mercado não entende de tecnologia no seu mais íntimo, ou seja, no processo de invenção. Ele utiliza este para gerar mais valor, seu objetivo final e sua maestria, por meio do processo que ultimamente convencionou-se chamar inovação tecnológica. Eis o paradoxo: aquele que só compreende a tecnologia como utilitária acaba por definir as bases do ensino tecnológico. Este artigo pretende discutir esse paradoxo a partir de bibliografia específica e da experiência como docente em cursos tecnológicos. O pressuposto inicial é de que tal paradoxo acaba restringindo o potencial do ensino tecnológico com seu papel estratégico em termos sócio-políticos atualmente. Palavras-chave: tecnólogo, mercado, tecnologia, invenção, inovação.

*

Muitas vezes, por comodidade de um suposto lapso ou por imposição mesmo, sabe-se lá,

esquece-se de algo muito simples: o Mercado não entende absolutamente nada de

tecnologia. E não é de hoje. No que ele é imbatível, sua maestria singular, é a capacidade

em gerar do valor mais valor, valor abstrato. Para lembrar Marx, não se trata do valor da

mercadoria em função do tempo de trabalho para sua produção, mas como determinante da

maneira de viver dos humanos sob o capitalismo.

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Dado este fato, a tecnologia, por sua vez, mesmo dentro da esfera do ensino

tecnológico, recebe uma tendência de tratamento característico e paradoxal que lhe é dado

por nossa cultura, pois ao mesmo tempo em que ela percorre todos os setores, ambientes e

áreas do conhecimento, justificando seu estudo e aprofundamento no que concerne ao ato

inventivo em si, é vista apenas como algo auxiliar, separado, extrínseco, de certa forma

independente desses mesmos setores, ambientes e áreas do conhecimento, como se

pudesse ser regulada unicamente pelo movimento do mercado. Em outras palavras, a

tecnologia aparece sempre como utilitária, como ferramenta desenvolvida a ser aplicada

alhures, geralmente em posição subjugada. É uma ambigüidade estranha, ao mesmo tempo

que ativa, que funciona como força motriz na fase de desenvolvimento tecnológico atual. A

tecnologia acaba sucumbindo ao papel de coadjuvante sempre que precisa passar pelo

crivo do mercado (logo ele que pouca intimidade tem com ela) para produção de valor, o

ator principal, mesmo que o discurso do marketing e da propaganda diga outra coisa.

Em uma experiência recente, em conjunto com a profa. Dra. Sueli S. S. Batista,

fizemos uma pesquisa bem simples com nossos alunos da Fatec Jundiaí, na qual essa

ambiguidade pouco satisfatória do ponto de vista do fazer tecnológico foi captada em uma

simples questão apresentada a eles: "O que é tecnologia?" (BATISTA & FREIRE, 2011).

Percebeu-se, claramente, como a tecnologia em si não é discutida enquanto suas

especificidades sócio-culturais, incluindo aí sua tecnicidade. É como se as respostas à

pergunta já viessem programadas, dadas de antemão, em um discurso desprovido de

qualquer pensamento mínimo dessas especificidades, já marcadas pelo referido crivo.

Um contra-argumento óbvio tanto quanto perigoso: ora, são alunos.

Talvez a questão de fundo seja mais ampla. É conhecido que muitos dos cursos

superiores em tecnologia consultam empresas do mercado de trabalho para orientar como

esses seriam mais bem compostos para melhor atendê-las, concedendo-lhes, em prol da

empregabilidade, uma legitimação e poder de decisão sobre o que se entende por

tecnologia e o fazer tecnológico. Em nossas Faculdades de Tecnologia, do Centro Paula

Souza, é sempre enfatizada essa vocação de formação para o mercado de trabalho e os

nossos altos índices de empregabilidade são comemorados, e com razão e mérito, diga-se

de passagem. Não é esse o foco aqui. Altos índices de empregabilidade não têm nada a ver

com a educação tecnológica ou, mais especificamente, com o fazer tecnológico em si. O

problema está em como se dá essa relação, tecnologia-tecnólogo-mercado.

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Ora, se um ensino tecnológico parte já em suas premissas de que seu intuito final é

somente a preparação para o mercado e que, portanto, justifica-se que este é quem deve

estabelecer as regras últimas ou as de maior relevância na formação do tecnólogo, há de

princípio um imbróglio considerável. Se, como foi relembrado aqui desde o início, o mercado

de trabalho ou mesmo o financeiro, não entende nada de tecnologia, mas da geração de

valor abstrato, ele fará, também, um uso utilitário da tecnologia, uma espécie de ativo

privilegiado para facilitar a produção de valor exponencialmente. Mais ainda, tornará a

própria tecnologia como valor restrito, mercadológico, via fetiche e a enunciação dos

benefícios intrínsecos ao seu uso, resquícios do mesmo discurso do progresso técnico

positivista.

Afastar a tecnologia do próprio ato de criação, de uma relação positiva entre homem

e máquina, para um mero instrumento de mercado é, ao mesmo tempo, desviar o foco da

invenção no sentido nobre da palavra, é reduzi-la a algo passivo, é transformar essa

tecnologia numa espécie de escrava contemporânea. Não é à toa que de tempos para cá, a

palavra invenção caiu em desuso, enquanto a inovação tornou-se a grande coqueluche,

com os discursos fáceis que já se conhece. A questão não é tanto a mudança de

nomenclatura, mas o que isso significa em termos de produção de conhecimento e de

progresso humano. E, desde já, não se pode confundir, embora seja o que ocorra mais

corriqueiramente, progresso técnico com progresso humano, como já advertia o filósofo

Gilbert Simondon (1990). Quando se desviou o olhar da invenção para inovação, quando a

inovação abocanhou a invenção, distorceu-se até mesmo as palavras daquele que foi um

dos primeiros a formular mais objetivamente esse desvio, o economista alemão Joseph

Schumpeter (1911;1942;1947), pois este ainda mantinha a invenção como ato criativo

indispensável e central, cerne de uma positiva (e não positivista) relação homem-máquina

que, inclusive, poderia para ele aliar-se à lógica capitalista de produção de valor. O que se

viu, nos últimos anos, é que a inovação tecnológica foi restringindo-se à produção de

patentes, uma espécie de aposta de controle sobre os incrementos próprios para a

aceleração do processo de consumo tecnológico, sem a menor valorização de discussões

sobre riscos ou acidentes intrínsecos a qualquer produção deste tipo.

Assim que a invenção foi escondida sorrateiramente, camuflada em meio a inovação

tecnológica, a propriedade intelectual sentiu-se à vontade para dar as caras e as cartas de

forma mais incisiva. Sim, porque inovação tecnológica é mais possante, como se diz, donde

invenção é só uma parte. Há todo um aparato envolvido: instituições para todos os tipos e

gostos, das financeiras às educacionais, imbuídas de um só espírito, empreendedor claro,

na missão solene de promover a inovação.

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Em contraponto, Simondon escreve uma frase surpreendente em seu artigo sobre os

limites do progresso humano:

A técnica é ainda mais primitiva que a religião, ela reuni a produção e a satisfação de necessidades biológicas em si mesmas; ela pode, portanto, intervir como elo formando conjuntos entre homens de grupos diferentes, ou entre os homens e o mundo, em circunstâncias bem menos limitadas que aquelas proporcionadas pelo pleno uso da linguagem e pelo plena comunicação religiosa (SIMONDON, 1990: p.10-11 - tradução nossa).

Diferente de um possível uso pejorativo, ser primitivo assume para Simondon uma

conotação positiva, pois liga diretamente o desenvolvimento técnico ao desejo e à intuição,

que, consequentemente, leva à melhor maneira de se atingir o progresso humano. É da

invenção que está falando Simondon, do processo criativo, independente da apropriação

econômica, mesmo sem ignorá-la. Nesse sentido, pode existir progresso tecnológico e

econômico sem que haja necessariamente progresso humano. Este para Simondon existe

somente em um sistema completo da atividade e da existência, na relação entre aquilo que

o homem produz (suas concretizações objetivas) e o que o homem é. Curiosamente, os

chamados povos primitivos desenvolvem-se dessa maneira, entendem o que chamamos de

invenção dessa forma.

Por exemplo1, se pode dizer que um xavante inventa, não inova. Inventa o avião, não

inova uma turbina necessariamente. Talvez por isso não queira defender sua propriedade

de inventor, porque não é sua propriedade, isso lhe é bem claro há tempos, nunca precisou

de nenhuma propriedade capitalizada. É mais desejo de criação, de fabricação, de

intoxicação. Um hacker sabe dessas coisas também.

Na invenção o sangue ferve, a intuição funciona. E há calafrios também. Alegria e

dor, muitas vezes, na relação com o que se projeta, relação intestinal. E controlar essas

alternâncias de sensações e de temperatura não é fácil. É preciso uma maquinaria maior,

mais poderosa: um excelente médico, muito bem pago evidentemente, que use aparelhos

especiais de monitoramento, para que nada escape, se prolifere, pelo menos por um tempo.

Mas, se for um vírus novo surgindo deste estado febril, ah, que eu seja o primeiro a registrá-

lo, diz o doutor, muito bem pago sim senhor. E se possível e necessário, criamos um

ambiente propício para a reprodução de novos vírus e bactérias, injetamos dinheiro e

conhecimento, e desenvolvemos máquinas novas, e o governo ajuda, certeza. Mas, o que

deve ser escondido são os princípios desse estado febril, por favor.

É, no fundo, a invenção o que interessa, mas a maneira de captá-la é isolar o vírus, e

colocá-lo em um enorme laboratório-labirinto institucional qualquer, despolitizá-la, em um

                                                                                                               1 Trata-se de um fato relatado em uma sala de aula pelo prof. Dr. Laymert Garcia dos Santos. Quando perguntado a um xavante sobre o avião esse teria dito: Ah sim, nossos ancentrais já inventaram o avião, apenas não o construíram.

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local produtor de inovação, sim, via conhecimento, tecnologia e mercado, um ambiente para

inovação, não para invenção. Esta está naquela, mas pode não render em alguns casos e,

portanto, só tem valor dentro da outra.

Valor para quem, para quem? Pergunta genealógica, marota, sem dúvida.

Resta saber em quê essa mesma operação como ponto de partida, como guia para

as grades curriculares do ensino tecnológico superior, contribui efetivamente para uma

educação tecnológica lato senso, pensada como estratégica, não somente mercadológica

mas principalmente geopolítica, dado o contexto favorável para o Brasil, diante das crises

sucessivas que assombram os EUA e os países europeus. Sempre é bom lembrar que

esses modelos de inovação surgiram nos então chamados países centrais e há inúmeras

publicações sobre as discrepâncias na aplicabilidade desses modelos na periferia.

Vê-se que não se trata de qualquer sorte de romantismo ou inocência. Acontece que

incentivar a invenção apontando para a criação de patentes como fim único e ideal em

detrimento da relação inventiva em si, espelhados em modelos de tipos coreanos datados, é

no mínimo uma visão pouco estratégica ou ainda de mente colonizada, para ser um pouco

mais direto, diante da atual situação mundial, pós-crise de 2008. Além disso, em nada

contribui para o próprio entendimento do que vem a ser tecnologia e, pior, diminui o papel

crucial que os tecnólogos poderiam exercer neste novo contexto geopolítico, pois já lhes dão

o contexto pré-formatado em que devem atuar.

**

Toda questão da invenção está sempre relacionada ao virtual, à capacidade intuitiva

de atualização desse virtual. A inovação, como entendida atualmente pelos órgãos gestores,

pressupõe a geração de valor a partir dessa invenção atualizada, ou seja, está no terreno do

atual e lidando com possibilidades e não mais com virtualidades. Ao tecnólogo, cuja

incumbência por definição seria lidar com a invenção todo o tempo, caberia desenvolver tal

capacidade de intuir as virtualidades imanentes à sua relação com o objeto técnico, mais do

que se preocupar com as possibilidades de produção de valor que a invenção possa gerar.

Não se está negando que haverá captação e apropriação da invenção tecnológica pelo

mercado, que está cumprindo seu papel, afinal de contas. Apenas é preciso enfatizar que

este não é o leitmotiv da invenção e sim o da inovação como se apresenta hoje. Ora, se se

transfere esse leitmotiv do mercado que está situado no campo do atual para o da invenção,

no mínimo, há um empobrecimento ou um rebaixamento do processo inventivo, pois a

intuição não terá onde atuar em toda sua potencialidade. Por isso, uma cultura que tem a

tecnologia como um de seus pilares, isto é, uma tecnocultura, requer cada vez mais uma

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formação abrangente do graduado em tecnologia, incorporando esta habilidade em lidar

com o virtual via intuição, o que envolve o desenvolvimento do lado afecto-perceptivo em

sua formação. É o que Bergson (1991), por exemplo, propunha quando dizia ser melhor

subordinar a inteligência à intuição, esta vindo primeiro, como método de criação.

De nada adianta desenhar uma problemática em um papel, reunir um grupo de

alunos e dizer: bem, agora criem! Dêem-nos uma solução criativa! Inventem algo

interessante para isso virar uma nova patente! Nem é preciso dizer da inocência ou má fé

contida aí. O que vem sempre é repetição do mesmo. O incrível, para não dizer triste, é a

crença de que alguma modificação de layout de estrutura, de algum floreado aqui ou acolá,

que geram patentes até é verdade, traduza-se em um processo de invenção substancial e

que mudará algo em determinada área. A diferença está no estado febril, em fazê-lo emergir

e saber lidar com ele. Aliás, o próprio mercado poderia dar-se conta disso para seu próprio

regalo.

Um exemplo típico, vivenciado em sala de aula, em cursos de tecnologia em

Informática. O mercado, por meio de empresas do ramo, sugere, pede, para não dizer

impõe ou outra palavra que se queira usar, que o tecnólogo saiba inúmeras linguagens de

programação e de banco de dados, o que deixa os alunos e nosso colegiado ansiosos para

respondê-lo à altura, a tempo. Java, C++, C#, .Net, Oracle, são algumas das exigências

atuais, sem contar experiência em ERPs de toda sorte. O que acontece: insere-se o maior

número possível dessas disciplinas nos cursos, retiram-se outras consideradas

dispensáveis, geralmente da área de humanas e de formação geral. Acrescentar disciplinas

relacionadas à arte, justamente para ajudar o desenvolvimento do processo intuitivo para a

invenção, nem pensar. Pois bem, sabe-se das limitações de um curso de três anos,

obviamente. No entanto, e por isso mesmo, incorporar tudo que o mercado exige como fim

utilitário imediato, é diminuir o caráter de formação superior a que se propõem os cursos de

tecnologia, bem como o próprio entendimento do caráter estratégico-político dessa

modalidade de ensino. Os cursos técnicos, incluindo os próprios do Centro Paula Souza, já

cumprem bem esse papel, de forma contundente e importante. É um outro estágio, uma

outra camada.

Há tempos solicitamos no quinto semestre desse mesmo curso de tecnologia em

informática que ministramos em nossa faculdade para que os alunos desenvolvam um

projeto livre para web, integrando o aprendizado da linguagem de programação que estão

vendo mais o de banco de dados de outros semestres. A idéia é aliar a prática e verificar a

habilidade criadora, de novas propostas. Com raríssimas exceções, que mantém o processo

vivo, o resultado é sempre muito próximo um dos outros, repetição sem variações

substanciais. Mesmo com o incentivo explícito de avaliação voltado mais para a

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originalidade do que para a técnica, o que acontece é uma constante de temas e resoluções

pré-formatadas. Alguns projetos até geram patentes, ou registros de software. Engordam-se

os indicadores para políticas e comemorações de todo tipo; mais uma linha no Lattes, e

como quase sempre sem uma preocupação efetiva com o conteúdo. E o fato de aumentar o

número das disciplinas técnicas no intuito de compensar a falta de originalidade pela

apurada técnica nem sempre é constatado. Ao invés de ensinar a aprofundar a tecnicidade

fixando-se em menos linguagens, estimulando o autodidatismo tão fundamental em cursos

como este e deixando lugar para o estímulo intuitivo na relação com a técnica, desenvolve-

se a ansiedade e o temor nos estudantes em relação ao não conhecimento de uma ou outra

técnica de programação. Portanto, perde-se pelos dois lados. Essa constatação empírica na

sala de aula pode ser rebatida pela boa reputação técnica dos nossos formandos no

mercado de trabalho. Todavia, é bom ficar claro, não se trata de educação técnica, mas

tecnológica, apesar de se confundir costumeiramente as duas, ou se considerar uma melhor

que a outra. Cada uma tem sua especificidade, cada uma uma camada, como foi dito.

***

É preciso ir um pouco além, com o auxílio do filósofo Gilbert Simondon. Ele define

dois modos fundamentais de relação do homem em função dos dados técnicos até então: o

estatuto de maioridade e o de minoridade (SIMONDON, 1969). São maneiras opostas de

compreender como o homem liga-se ao objeto técnico. No estatuto da minoridade o objeto

técnico tem mais valor de uso, necessário à vida cotidiana, e a relação é mais característica

da infância, quando o saber técnico é implícito, sem reflexão, costumeiro, próprio do

aprendiz. Já o da maioridade, é uma tomada de consciência, a fase adulta, do conhecimento

do engenheiro, é racional, operação refletida e elaborada com a participação das ciências.

O problema é a falta de coerência entre esses dois modos de relação ao objeto

técnico:

Ora, o artesão e o engenheiro não vivem somente para eles mesmos; testemunhas e agentes da relação entre sociedade humana em seu conjunto e o mundo dos objetos técnicos em seu conjunto, eles têm um valor exemplar: é por eles que o objeto técnico se incorpora à cultura. Até hoje, estes dois modos de incorporação não trouxeram resultados concordantes, de modo que existem duas linguagens e dois tipos de pensamentos que saem das técnicas e que não são coerentes um com o outro (SIMONDON, 1969, p.85 - tradução nossa)

O que Simondon tem em mente é que tanto um quanto outro estatuto não devem

tratar a tecnologia como subjugada ao homem, que o pensamento humano deveria instituir

um relacionamento igual, sem privilégios, entre o homem e as técnicas. Em outras palavras,

há uma disjunção pouco ou nada positiva entre cultura e técnica que precisa ser superada

pelo processo inventivo. Seria preciso encontrar algo que incorpore tanto um quanto outro,

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tanto o mundo do artesão quanto do engenheiro, de modo que o homem não seja nem

inferior nem superior aos objetos técnicos, algo ainda a se realizar, dirá Simondon.

Vê-se que a questão da tecnocultura, da técnica como parte da cultura, não é algo

banal, e envolve a intuição da minoridade e pensamento abstrato da maioridade. Nesse

ponto o tecnólogo, no sentido moderno que o damos, aparece como agente importante, não

como uma espécie de redentor de qualquer coisa, não é disso que se trata, mas como

aquele que pode fazer essa transição considerando aspectos sócio-políticos importantes.

Mas, é bom salientar que isso ocorre somente nessa chave, em que o homem e objetos

técnicos não entram em competição, mas em um sistema de acoplamento.

É interessante que Simondon, para ajudar-nos nessa afirmação da relevância do

tecnólogo (ele não usará este nome, mas sim técnico num sentido mais amplo) como aquele

que permitirá a incorporação de maioridade e minoridade, trará uma genealogia bastante

pertinente, a do conhecimento técnico enciclopédico.

Para Simondon o espírito enciclopédico teve três grandes manifestações, tendo no

horizonte anterior a Grécia e os fisiocratas como ponto de partida. A primeira aparece no

Renascimento, contemporânea da revolução ética e religiosa da Reforma. Neste período há

já uma certa amabilidade em relação à técnica, seja com paradigmas ou como meio de

expressão; basta relembrar Da Vinci.

A segunda etapa reporta-se ao século das Luzes. Antes a técnica não era livre como

fora a ciência, lembra Simondon. Foi o pensamento científico que ajudou neste momento a

liberar a técnica. Como esta atinge os mais diversos âmbitos sociais, como o comércio, a

indústria, a agricultura, este enciclopedismo técnico irá requerer um período de reformas

sociais e administrativas, com a criação de instituições como as Grandes Écoles francesas e

suas correlatas mundo afora. Simondon dirá que o enciclopedismo é politécnico por

definição (SIMONDON, 1969: p.97). É o momento em que o aspecto industrial se

desenvolve mais intensamente, dado este caráter politécnico aplicado. Mas se a técnica

agora está liberada, ela exigirá um outro meio de expressão mais adequado a si, o visual,

que permitirá transmitir seus esquemas de movimentos e estruturas materiais de forma mais

eficiente que o registro oral.

A civilização da palavra deixa seu lugar àquela da imagem. (...) É por meio do esquema que o enciclopedismo técnico adquire todo seu sentido e seu poder de difusão, transformando-se verdadeiramente universal. (...) a cultura, através da linguagem oral ou escrita, não possui universalidade direta. É talvez por esta razão que o Renascimento não pode constituir uma universalidade tecnológica, apesar de sua tendência a preferir, nas artes em particular, a expressão plástica e gráfica a qualquer outro simbolismo (SIMONDON, 1969, p.98).

É com a Teoria da Informação e da Cibernética que Simondon entrevê em sua

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época2 o anúncio de uma terceira manifestação do pensamento enciclopédico, "que ainda

não conseguiu constituir seus modos de expressão universais" (Ibidem). Eis um dos

aspectos geniais da filosofia de Simondon: antever em seu embrião, aliás como fizera Marx

em relação ao capital, as tendências e os problemas futuros constitutivos dessas teorias que

estavam dando seus primeiros passos. Não havia internet ainda, nunca é demais lembrar. O

modo de expressão estava aberto, mas Simondon, mesmo considerando a televisão e o

cinema, já salientava que o simbolismo oral e escrito retornava com força em sua conexão

com as imagens, dada as características de difusão da informação. Ora, sabe-se bem o que

foi e está sendo a influência da cibernética no mundo, principalmente após os anos 80 e 90.

Para Simondon, estas teorias requereriam o estabelecimento de um simbolismo

comum ao homem e à máquina, uma possibilidade de sinergia real entre ambos, mas desde

que não trate apenas de tradução de pensamento o processo de comunicação entre eles,

pois toda tradução significa perda de informação. Ele afirma à época:

Hoje, a existência das técnicas da informação dão à tecnologia uma universalidade infinitamente maior. A teoria da informação coloca a tecnologia no centro de um grande número de ciências muito diversas, como a fisiologia, a lógica, a estética, ... (...) A teoria da informação é uma tecnologia intercientífica (...) Não se pode considerar a teoria da informação como uma técnica entre as técnicas; ele é, na realidade, um pensamento que é mediador entre diversas técnicas por um lado, entre diversas ciências por outro, e entre as ciências e as técnicas (SIMONDON, 1969, p. 110).

E em outro ponto:

A etapa do enciclopedismo técnico é somente provisório; ela chama aquela do enciclopedismo tecnológico que o atinge dando ao indivíduo uma possibilidade de retorno ao social que muda de estatuto... (SIMONDON, 1969, p.104)

Há, portanto, uma correspondência entre as três manifestações do espírito

enciclopédico, que Simondon resume assim: primeiro ética, depois técnica e agora

tecnológica.

É para esta terceira etapa que Simondon propõe a necessidade de uma síntese em

nível educacional entre o modo maior e menor de acesso às técnicas. Não faz sentido

manter o antagonismo entre o aprendizado da criança e do adulto, muito embora ele

perdure ainda em nossos dias. Ou seja, essa síntese parece ainda não ter acontecido de

fato. A criança é o ser das virtualidades, do intuitivo, dirá Simondon, a quem a aquisição de

conhecimentos dos esquemas tecnológicos não exige capacidades de abstração, que ela

não possui ainda. A proposta de Simondon é a da unificação desses modos por meio da

tecnologia:

A conseqüência desta unificação reflexiva das técnicas e o do fim da oposição entre o saber teórico e do saber prático é considerável para a concepção reflexiva do homem; uma vez esse nível alcançado, de fato, não há mais hiato

                                                                                                               2 A primeira publicação de Du mode d'existence des objets techniques, parte complementar de sua tese de doutorado, dá-se somente em 1958. O livro de Norbert Wiener sobre a cibernética fora publicado em 1948.

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ou antagonismo entre o tempo da educação e da idade adulta (SIMONDON, 1969, p.111).

Eis por onde pode passar o caráter estratégico do ensino tecnológico, com o

tecnólogo como vetor importante, desde que deixe de ser um passivo especialista por meio

da relação utilitária da técnica, muitas vezes a proposta do mercado via uma inovação que

desprivilegia a invenção e por consequência o intuitivo. Ele pode desempenhar um papel de

mediador por sua compreensão do ser técnico. Para Simondon este, o ser técnico, só pode

ser definido em termos de informação e de transformação de diferentes tipos de energias ou

de informação, isto é, "por um lado como veículo de uma ação que vai do homem ao

universo, e por outro, como veículo de informação que vai do universo ao homem. A

tecnologia cultural torna-se um misto de energética e teoria da informação" (SIMONDON,

1989, p. 284 - tradução nossa).

Claro, assim como a ciência, a tecnologia não é neutra, e também não é

determinante única nas mudanças sociais, e sim um dos vetores por onde passam as

necessidades individuais e coletivas da sociedade dentro da lógica contemporânea. Não se

trata, assim, de estudá-la, incluindo aí os nossos tecnólogos, isoladamente a partir de uma

das duas vertentes frágeis habitualmente utilizadas, aquela que a considera uma panacéia

para todos os problemas humanos ou, ao contrário, que a repele sistematicamente. Evitar

esses extremos ajuda a criar um pensamento mais substancial, de forma a entender a

tecnologia como algo a ser experimentado, compreendendo seu funcionamento e

implicações, de modo a construir um posicionamento mais agudo em relação ao uso e

construção dessa tecnologia. Mas é sempre preciso lembrar de quebrar o cadeado da idéia

do objeto técnico como utensílio, a inconveniência de uma relação senhor-escravo com a

tecnologia, nas duas direções:

Portanto, para que um objeto técnico seja recebido como técnica e não somente como ferramenta, para que seja julgado como resultado de uma invenção, portadora de informação, e não como utensílio, é preciso que o sujeito que o recebe possua nele formas técnicas. Pelo intermédio de objeto técnico se cria então uma relação inter-humana (...) (SIMONDON, 1969: p.248 - tradução nossa)

Faz-se aí nesta passagem uma associação entre invenção e informação que é

fundamental e que permitirá Simondon criticar a cibernética, justamente por esta reduzir a

idéia de informação à apenas uma troca de sinais entre emissor e receptor, com traduções e

quantificações e retroalimentações das relações entre humanos e máquinas, problema que

ele já advertia e acabou se concretizando, próprio para um tecnocratismo. Hoje pensa-se

informação fundamentalmente pela idéia da informática, o que não é a mesma coisa.

É nesse sentido que o técnico como prefere Simondon, ou o tecnólogo como

proposto aqui, é peça-chave, transformar-se em um pivô nas relações homem-máquina,

pois atuaria como aquele que concretiza um pensamento em um objeto tecnológico, inventa,

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informa, cria a partir da intuição. Esse papel não lhe é conferido atualmente apenas, mas

historicamente como se viu, porém a especificidade das tecnologias contemporâneas

confere-lhe um caráter diferente, mais agudo, digamos assim, em virtude da complexidade e

multidisciplinaridade que o mundo da tecnociência exige. Toda uma cadeia de relações

entre humanos e máquinas torna-se necessária para as mais diversas atividades.

Mesmo com a consciência de que a cultura ocidental habituou-se a tratar essa relação

em forma de contraponto, mais interessante parece ser um tratamento harmônico, quem

sabe até em uníssono, pois como afirmava Simondon: “o homem, intérprete das máquinas,

é também aquele que, a partir de seus esquemas, fundou as formas rígidas que permitem

as máquinas funcionar. A máquina é um gesto humano depositado, fixado, que se tornou

estereotipia e poder de repetição”. (SIMONDON, 1989, p. 138)

Em outra parte, Simondon ressalta que o próprio funcionamento do objeto técnico

“oculta uma margem de indeterminação. É esta margem que permite à máquina ser sensível

a uma informação exterior. (...) O homem intervém como ser que regra a margem de

indeterminação a fim de que ela seja adaptada à melhor troca possível de informação”.

(SIMONDON, 1989, p.11-12)

Seguindo esse raciocínio, o desafio lançado ao tecnólogo estaria em desvendar essa

margem de indeterminação oculta no objeto técnico, ou seja, tirar o véu que encobre a

informação humana depositada no objeto técnico de forma positiva.

Mas, sempre tem um mas, aí está o complicador... Uma diferenciação é crucial que

se faça para retornarmos às questões mais pontuais sobre a relação Tecnólogo e Mercado

e finalizarmos. Em uma bela passagem, Simondon faz essa ressalva:

Não se pode confundir técnica e trabalho; (...) o verdadeiro técnico é aquele que é um mediador entre a comunidade e o objeto oculto ou inacessível. Nós chamamos hoje técnicos os homens que são na realidade trabalhadores especialistas, mas que não colocam a comunidade em relação com um domínio oculto; uma técnica completamente elucidada e divulgada não é mais um técnica, mas um tipo de trabalho; os "especialistas" não são verdadeiros técnicos, mas trabalhadores; a verdadeira atividade técnica está hoje no domínio da pesquisa científica que, por ela ser pesquisa, é orientada em direção aos objetos ou às propriedades dos objetos ainda desconhecidas. (SIMONDON, 1989: p.163 - tradução nossa)

Ora, percebe-se uma mudança de foco ou de entrada em relação à tecnologia e ao

ensino tecnológico. A empregabilidade e o mercado de trabalho não estão sendo

descartados. Apenas, quando se aprofunda a questão e se quer que a invenção apareça

como potencial real, não é de especialistas que se está falando mas de técnicos, ou

tecnólogos, e requer pesquisa. Portanto, é de dentro que seria mais plausível sair a maior

contribuição para essa formação tecnológica profissional, a partir de uma longa reflexão

sobre o processo inventivo, de como estimular a capacidade intuitiva em lidar com as

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virtualidades, captar as tendências da relação homem-máquina que se concretizarão em

objetos técnicos que contribuirão efetivamente para as estratégicas político-sociais.

Não há discrepâncias entre esses mundos, o da intuição e do político-social, ao

contrário:

Pode haver aí relação complementar entre as intuições de integração aos conjuntos técnicos e as intuições político-sociais, porque as instituições técnicas exprimem o resultado da história e do condicionamento da vida, do hic et nunc, enquanto as intuições político-sociais são um projeto em direção ao futuro, a expressão ativa de potenciais. (...) a intuição técnica, ao nível dos conjuntos, exprime o devir como base e resultado obtido; a intuição político-social é a inserção de tendências, expressão de virtualidades e de forças do devir, dentro da mesma realidade. (...) o pensamento técnico dos conjuntos e o pensamento político-sociais estão ligados por suas condições de origem e seus pontos de inserção no mundo (SIMONDON, 1969: p.30 - tradução nossa)

Uma assertiva tão complexa quanto essencial para revisitar a relação tecnólogo e

mercado.

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REFERÊNCIAS BATISTA, Sueli S. S., FREIRE, Emerson (2011). O conceito de tecnologia na formação do tecnólogo. Anais do I Congresso Latino-americano de Filosofia da Educação. PUC- Campinas(agosto de 2011. Disponível em: http://www.alfe-ilosofiadelaeducacion.org. Acesso em: 20 out. 2011

BERGSON, Henri (1991). Oeuvres. 5 ed. PAris: PUF.

SCHUMPETER, Joseph (1911 [1934]), The Theory of Economic Development, Harvard University Press, Cambridge, Mass.

_____ (1942). Capitalism, Socialism, Democracy, Harper and Row, New York.

_____ (1947). “The Creative Response in Economic History”, Journal of Economic

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SIMONDON, Gilbert (1964). L'individu et sa Genèse Physico-Biologique: l'individuation à la lumière des notions de forme et d'information. Paris: Press Universitaires de France.

_____ (1969). Du mode d'Existence des Objets Techniques. Paris: Aubier - Montaigne.

——— (1989). L'individuation psychique et collective: à la lumière des notion de Forme, Information, Potentiel et Métastabilité. Paris: Aubier.

——— (1990). "Les limites du progrès humain". In: Cahiers Philosophiques, Centre National de Documentation Pédagogique, no. 42, mars, pp 7-14.