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Miguel Stokes www.institutovaloresmobiliarios.pt ENSAIO SOBRE OS REQUISITOS SUBSTANTIVOS DA OPA CONCORRENTE

Ensaio sobre os requisitos substantivos da OPA Concorrente VF · Miguel Stokes ENSAIO SOBRE OS REQUISITOS SUBSTANTIVOS DA OPA CONCORRENTE

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  • Miguel Stokes

    www.institutovaloresmobiliarios.pt

    ENSAIO SOBRE OS REQUISITOS SUBSTANTIVOS

    DA OPA CONCORRENTE

  • Miguel Stokes

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    NDICE

    1. NOTA PRVIA......................................................................................................... 3

    2. INTRODUO ........................................................................................................ 3

    3. A OPA CONCORRENTE............................................................................................ 4

    4. OS FUNDAMENTOS DO REGIME SUBSTANTIVO DA OPA CONCORRENTE................. 7

    5. REQUISITOS SUBSTANTIVOS DA OPA CONCORRENTE ............................................. 9

    5.1 A Identidade do Oferente Concorrente ....................................................................... 10

    5.1.1 O artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios................................................ 10

    5.1.2 A OPA Concorrente luz do artigo 186. do Cdigo dos Valores Mobilirios ............. 22

    5.2 O Objeto da Oferta ....................................................................................................... 24

    5.2.1 Bitola uniforme para todos os oferentes concorrentes................................................ 24

    5.2.2 Os casos em que o oferente concorrente seja acionista da sociedade visada............. 27

    5.3 Condies da Oferta ..................................................................................................... 30

    5.3.1 As condies de sucesso do artigo 185., n. 6 do Cdigo dos Valores Mobilirios .... 30

    5.3.2 As condies previstas no artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios ....... 32

    5.4 A Contrapartida ............................................................................................................ 33

    5.4.1 A relevncia da contrapartida na OPA Concorrente .................................................... 33

    5.4.2 O regime da contrapartida........................................................................................... 34

    5.4.3 A natureza da contrapartida ........................................................................................ 37

    6. CONCLUSO ........................................................................................................ 38

    7. BIBLIOGRAFIA...................................................................................................... 41

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    1. NOTA PRVIA

    O presente ensaio foi preparado no mbito da XVII edio da Ps-Graduao de Valores

    Mobilirios, organizada pelo Instituto dos Valores Mobilirios, para efeitos de obteno do

    certificado de Ps-Graduao, conforme estabelecido no artigo 6., n. 1 do respetivo

    Regulamento.

    A primeira referncia bibliogrfica ser feita com indicao de autor, ttulo, local de

    publicao, ano e pgina, sendo que as referncias posteriores sero sempre remetidas com

    o nome do autor e a expresso ob. cit., acompanhada do nmero da pgina correspondente.

    2. INTRODUO

    O presente ensaio incide sobre a matria da OPA Concorrente, regulada nos artigos 185.,

    185.-A e 185.-B do Cdigo dos Valores Mobilirios, cujo regime legal foi objeto de anlise

    na sesso lecionada pelo Dr. Antnio Soares, subordinada ao tema OPA Concorrente no

    dia 19 de maro de 2013.

    Apesar de haver j, na doutrina portuguesa, autores que se pronunciaram, uns com maior

    profundidade, outros com menor, sobre o regime geral da OPA Concorrente em Portugal1,

    entendi, dado o interesse que esta temtica me suscitou, bem como o conjunto de

    interpretaes que o regime tem levantado, debruar-me sobre ela, em particular, sobre os

    requisitos de substncia da oferta concorrente, almejando assim, de algum modo, contribuir

    para o debate jurdico nesta matria.

    Como ponto de partida, e como passo introdutrio, cumpre em primeiro lugar recordar os

    conceitos de Oferta Pblica, de Oferta Pblica de Aquisio e, finalmente, o conceito de OPA

    Concorrente.

    O conceito de oferta pblica encontra-se definido no artigo 109. do Cdigo dos Valores

    Mobilirios, que considera pblica a oferta relativa a valores mobilirios dirigida, no todo ou 1 Em particular, MANUEL REQUICHA FERREIRA in OPA Concorrente, Caderno dos Valores Mobilirios, Volume X, Coimbra Editora, Lisboa, 1999; HUGO MOREDO SANTOS in Ofertas Concorrentes, Coimbra Editora, Lisboa, 2008 e PAULO CMARA, in, Manual da Direito dos Valores Mobilirios, II Edio, Almedina, Coimbra, 2011.

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    em parte, a destinatrios indeterminados, sendo que esta indeterminao de destinatrios

    no prejudicada pela circunstncia de a oferta se verificar atravs de mltiplas

    comunicaes padronizadas, ainda que endereadas a destinatrios individualmente

    identificados.

    Adicionalmente, considera-se tambm pblica (i) a oferta dirigida generalidade dos

    acionistas de sociedade aberta2, ainda que o respetivo capital social esteja representado por

    aes nominativas; (ii) a oferta que, no todo ou em parte, seja precedida ou acompanhada

    de prospeo ou de recolha de intenes de investimento junto de destinatrios

    indeterminados ou de promoo publicitria; e (iii) a oferta dirigida a, pelo menos, 150

    pessoas que sejam investidores no qualificados com residncia ou estabelecimento em

    Portugal.

    A oferta pblica de aquisio, por sua vez, a oferta dirigida aquisio dos valores

    mobilirios que dela so objeto, nos termos definidos no artigo 173. do Cdigo dos Valores

    Mobilirios.

    Finalmente, a definio de OPA Concorrente dada pelo artigo 185., n. 1 do Cdigo dos

    Valores Mobilirios, quando prescreve que a partir da publicao do anncio preliminar de

    oferta pblica de aquisio de valores mobilirios admitidos negociao em mercado

    regulamentado, qualquer outra oferta pblica de aquisio de valores mobilirios da mesma

    categoria s pode ser lanada atravs de oferta concorrente, conforme regulada pelos

    artigos 185., 185.-A e 185.-B do Cdigo dos Valores Mobilirios.

    3. A OPA CONCORRENTE

    Conforme se pode constatar pela definio constante do artigo 185., n. 1 do Cdigo dos

    Valores Mobilirios, a OPA Concorrente corresponde oferta lanada sobre (i) valores

    2 De acordo com o artigo 13. do Cdigo dos Valores Mobilirios, considera-se sociedade aberta (a) a sociedade que se tenha constitudo atravs de oferta pblica de subscrio dirigida especificamente a pessoas com residncia ou estabelecimento em Portugal; (b) a sociedade emitente de aes ou de outros valores mobilirios que confiram o direito subscrio ou aquisio de aes que tenham sido objeto de oferta pblica de subscrio dirigida especificamente a pessoas com residncia ou estabelecimento em Portugal; (c) a sociedade emitente de aes ou de outros valores mobilirios que confiram direito sua subscrio ou aquisio, que estejam ou tenham estado admitidas negociao em mercado regulamentado situado ou a funcionar em Portugal; (d) a sociedade emitente de aes que tenham sido alienadas em oferta pblica de venda ou de troca em quantidade superior a 10% do capital social dirigida especificamente a pessoas com residncia ou estabelecimento em Portugal e (e) a sociedade resultante de ciso de uma sociedade aberta ou que incorpore, por fuso, a totalidade ou parte do seu patrimnio.

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    mobilirios de uma sociedade aberta; (ii) admitidos negociao em mercado

    regulamentado3; (iii) quando tenha sido publicado anteriormente o anncio preliminar de

    oferta por parte de um outro oferente; (iv) que incida sobre valores mobilirios do mesmo

    emitente; e (v) com a especificidade de serem da mesma categoria dos valores mobilirios

    referido em (i).

    relativamente unnime a razo pela qual o momento a partir do qual uma oferta pblica

    de aquisio se submete ao regime da Oferta Concorrente o da publicao do anncio

    preliminar da oferta previsto no artigo 175. do Cdigo dos Valores Mobilirios.

    De acordo com o citado preceito, logo que o oferente tome a deciso de lanamento de

    oferta pblica de aquisio, deve enviar anncio preliminar CMVM, sociedade visada e s

    entidades gestoras dos mercados regulamentados em que os valores mobilirios que so

    objeto da oferta ou que integrem a contrapartida a propor estejam admitidos negociao,

    procedendo de imediato respetiva publicao.

    O publicao do anncio preliminar, por sua vez, obriga o oferente a (i) lanar a oferta em

    termos no menos favorveis para os destinatrios do que as constantes do anncio; (ii)

    requerer o registo da oferta no prazo de 20 dias, prorrogvel pela CMVM at 60 dias nas

    oferta pblicas de troca e (c) informar os representantes dos trabalhadores ou, na sua falta,

    os trabalhadores sobre o contedo dos documentos em falta, assim que estes sejam

    tornados pblicos.

    Ora, uma vez que a publicao do anncio preliminar de oferta pblica de aquisio implica,

    para o oferente, a obrigao de lanar efetivamente a oferta em termos no menos

    favorveis do que os constantes do anncio preliminar, facilmente se compreende que

    qualquer oferta subsequente a esta que incida sobre a mesma categoria de valores

    mobilirios da sociedade visada seja submetida ao regime da OPA Concorrente, tendo o

    3 No se compreende a opo do legislador em limitar a aplicao do regime da OPA Concorrente s ofertas sobre valores mobilirios admitidos negociao em mercado regulamentado quando o regime das OPAs se aplica a qualquer sociedade aberta. Sem nos querermos alongar sobre este tema, o qual foge ao objeto especfico do presente Ensaio, aproveitamos para remeter para a posio sufragada por HUGO MOREDO SANTOS, ob. cit. pp 75-76, em particular quando sustenta que (...) no parece existir qualquer razo para que os titulares de valores mobilirios admitidos negociao em mercado regulamentado sejam, no que a este aspeto respeita, mais e melhor tutelados do que os titulares da outros valores mobilirios.

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    legislador, e bem, definido como momento de desencadeamento do regime da OPA

    Concorrente o da publicao do anncio preliminar e no, por exemplo, o do anncio de

    lanamento, previsto no artigo 183. do Cdigo dos Valores Mobilirios, momento a partir

    do qual a oferta fica efetivamente cristalizada4.

    Com efeito, defender-se- que, caso outra tivesse sido a soluo do legislador, se cairia no

    risco de, aps a publicao do anncio preliminar de oferta a lanar pelo oferente A, o

    oferente B procedesse imediatamente publicao tambm do seu anncio preliminar,

    beneficiando seguidamente de condies mais favorveis para obteno do registo da oferta

    - inter alia, da no sujeio a autorizaes regulatrias - para, obtendo o registo da oferta

    mais rapidamente do que A, adiantar-se a este no anncio de lanamento da oferta, assim

    transferindo para A a sujeio ao regime da Oferta Concorrente (figurando assim B como

    oferente inicial).

    Esta situao poderia dar-se caso, por exemplo, B estivesse sujeito a um menor nmero, ou

    a um conjunto menos complexo de autorizaes regulatrias - maxime, caso no estivesse

    sujeito emisso de deciso de no oposio por parte da Autoridade da Concorrncia - que

    lhe permitissem um procedimento mais clere para o registo da oferta, assim prejudicando

    o oferente A, que se veria, a meio do jogo, deparado com um regime mais restrito para o

    lanamento da sua oferta, com o qual teria necessariamente de se conformar5.

    O limite temporal at ao qual ser aplicvel a uma oferta subsequente o regime da OPA

    Concorrente est, por sua vez, estabelecido no artigo 185.-A, n. 1 do Cdigo dos Valores

    Mobilirios, que estipula que a oferta concorrente deve ser lanada at ao 5. dia anterior

    quele em que termine o prazo da oferta inicial, prescrevendo, por sua vez, o n. 2 do

    mesmo artigo que proibida a publicao de anncio preliminar em momento que no

    permita o cumprimento do prazo referido no nmero anterior.

    4 Com efeito, com a publicao do anncio de lanamento que a oferta efetivamente lanada, passando o oferente a encontrar-se numa situao de sujeio (ao invs da situao de obrigao de lanamento da oferta em que se encontra desde a publicao do anncio preliminar e at publicao do anncio de lanamento, fruto da promessa pblica de que procederia ao lanamento de uma OPA em termos no menos favorveis do que os vertidos no anncio preliminar), apenas lhe sendo possvel revogar a oferta nos casos restritos previstos no artigo 128. do Cdigo dos Valores Mobilirios. No entanto, dado o grau de vinculao que o oferente desde logo assume com o anncio preliminar, este o momento escolhido para o desencadeamento do regime da Oferta Concorrente. 5 Sem prejuzo, naturalmente, da aplicabilidade ao caso do artigo 128., ex vi artigo 185.-B, n. 4 do Cdigo dos Valores Mobilirios.

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    Verifica-se assim que o anncio de lanamento da OPA Concorrente deve ser publicado no

    prazo acima referido, o que obrigar assim a que todos os passos anteriores a este -

    publicao de anncio preliminar, entrega de pedido de registo e registo da OPA

    Concorrente - tero de ser obtidos em momento tal que assegure o cumprimento deste

    prazo por parte do oferente concorrente.

    Feita esta exposio inicial acerca da opo do legislador quanto s circunstncias em que

    uma oferta pblica de aquisio ficar sujeita ao regime da OPA Concorrente, cumprir

    agora avanar para a anlise detalhada de cada um dos requisitos substantivos da Oferta

    Concorrente, bem como tecer concluses acerca da viabilidade dos mesmos para a

    maximizao do bem-estar dos sujeitos envolvidos, designadamente, os acionistas da

    sociedade visada, a prpria sociedade visada e o mercado em geral.

    Para este efeito, distinguimos os requisitos da OPA Concorrente de acordo com a seguinte

    dicotomia: por um lado, os requisitos processuais - relativos ao conjunto de passos que

    tero de ser percorridos desde o momento do anncio preliminar de OPA Concorrente at

    concluso do processo das ofertas, e que se encontra previsto nos artigos 185.A e 185.-B

    do Cdigo dos Valores Mobilirios -, que no sero tratados no presente ensaio; e os

    requisitos substantivos da oferta - que respeitam aos elementos materiais da OPA

    Concorrente, previstos no artigo 185., n.s 2 a 6 do Cdigo dos Valores Mobilirios, e a cuja

    anlise procederemos em 5 infra.

    4. OS FUNDAMENTOS DO REGIME SUBSTANTIVO DA OPA CONCORRENTE

    Antes de passarmos parte nuclear do ensaio, importa previamente refletir sobre os

    fundamentos que esto na base da definio de um regime jurdico especfico para a OPA

    Concorrente.

    Muitos autores portugueses j se debruaram sobre esta temtica, inspirados em parte pela

    anlise econmica do direito e por opinies de autores estrangeiros, por forma a

    determinarem quais os vetores principais que devem presidir arquitetura de um regime de

    OPA Concorrente, e quele que ter - ou deveria ter - sido o pensamento do legislador

    portugus na definio do regime aplicvel.

  • Miguel Stokes

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    A este respeito, o primeiro vetor a considerar concerne a valores constitucionais como a

    liberdade de iniciativa privada, a livre concorrncia e a igualdade, princpios basilares do

    capitalismo, nos quais se aliceram as razes do Estado de Direito.

    luz destes princpios, tende-se a defender uma regulamentao mnima da OPA

    Concorrente ao nvel da substncia, defendendo-se assim que a mesma tenha o contedo

    que o oferente concorrente lhe queira atribuir, por sua conta e risco6, sem qualquer tipo de

    imposio legal em matria de objeto da oferta, condies de eficcia ou sucesso ou

    contrapartida.

    Por outra banda, argumentos existem a favor da definio de um regime legal que promova

    o carter mais favorvel de qualquer OPA Concorrente em relao oferta inicial, no s

    com fundamento na promoo do valor para os acionistas da sociedade visada, mas tambm

    com o fundamento de que os menores custos que os oferentes concorrentes tm no

    lanamento da OPA Concorrente, por a oportunidade ter sido descoberta s custas oferente

    inicial - com os custos de monitorizao e auditoria que lhe tero estado associados -, e que

    justificam que qualquer oferente concorrente tenha o nus de, em compensao pelos

    menores custos com o lanamento da oferta, lanar uma OPA Concorrente que importe uma

    melhoria objetiva das condies da oferta inicial, desde logo ao nvel da contrapartida

    oferecida, assim restabelecendo o equilbrio entre as posies do oferente inicial e do

    oferente concorrente.

    Ambas as doutrinas tero razo de ser, a primeira, por se basear no princpio da livre

    concorrncia, tem sido recebida com maior apreo. Porm, inegvel que tal liberdade de

    estipulao dos termos da OPA Concorrente poder enfraquecer a posio do oferente

    inicial e consequentemente servir de desincentivo ao lanamento de OPAs, com o

    correspondente prejuzo para os acionistas da sociedade visada, para a prpria sociedade

    visada e para o mercado em geral7.

    6 Pois, caso a sua oferta for menos favorvel que a antecedente, as hipteses de sucesso sero objetivamente inferiores. 7 Com efeito, a no se potenciar o lanamento de OPAs, est automaticamente a restringir-se a existncia de OPAs Concorrentes que, estando dependentes das primeiras, beneficiaro com um regime favorvel ao lanamento de OPAs.

  • Miguel Stokes

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    Com efeito, se o oferente inicial souber, no momento em que vai lanar a oferta inicial, que

    se encontra sujeito ao lanamento de uma OPA Concorrente sem qualquer limite quanto ao

    objeto, condies e contrapartida, ter com certeza menos incentivos a avanar com a

    oferta, face maior probabilidade de esta vir a ser desafiada.

    Em oposio, a estipulao de regimes muito restritos para o caso de lanamento de OPAs

    Concorrentes, com a fixao de restries ao nvel do objeto da oferta, das condies da

    oferta e da contrapartida oferecida, podero, por seu turno, desincentivar os potenciais

    oferentes concorrentes, que podero, em funo da exigncia do regime que lhes imposto,

    optar por no lanar uma OPA Concorrente, a qual seria certamente lanada se tal regime

    restritivo no se aplicasse.

    5. REQUISITOS SUBSTANTIVOS DA OPA CONCORRENTE

    Conforme j enunciado em 3 supra, a definio de OPA Concorrente que nos dada pelo

    artigo 185., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios tem um carter formal/procedimental,

    determinando um momento a partir do qual o lanamento de uma oferta pblica de

    aquisio est sujeito a um conjunto adicional de regras que visam acomodar a situao de

    concorrncia que se criou.

    Podemos identificar quatro requisitos substanciais da OPA Concorrente, quanto a (i)

    identidade do oferente; (ii) objeto da oferta; (iii) condies da oferta e (iv) contrapartida.

    No que concerne (i) identidade do oferente, preceitua o artigo 185., n. 3 do Cdigo dos

    Valores Mobilirios que no podem lanar OPA Concorrente as pessoas que estejam com o

    oferente inicial ou com o oferente concorrente anterior em alguma das situaes previstas no

    artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios, salvo autorizao da CMVM a conceder

    caso a situao que determina a imputao dos direitos de voto cesse antes do registo da

    oferta.

    No que tange a (ii) objeto da oferta, determina o artigo 185., n. 4 do Cdigo dos Valores

    Mobilirios que as ofertas concorrentes no podem incidir sobre quantidade de valores

    mobilirios inferior quela que objeto da oferta inicial.

  • Miguel Stokes

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    No que respeita, por sua vez, a (iii) condies da oferta, o artigo 185., n. 6 do Cdigo dos

    Valores Mobilirios estipula que a oferta concorrente no pode fazer depender a sua

    eficcia de uma percentagem de aceitaes por titulares de valores mobilirios ou de direitos

    de voto em quantidade superior constante da oferta inicial ou de oferta concorrente

    anterior, salvo se essa percentagem se justificar em funo dos direitos de voto na sociedade

    visada j detidos pelo oferente e por pessoas que com este estejam em alguma das situaes

    previstas no artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios. Adicionalmente, o artigo

    185., n. 5 determina que a OPA Concorrente no pode conter condies que a tornem

    menos favorvel do que a oferta antecedente, seja ela a oferta inicial ou uma OPA

    Concorrente anterior.

    Finalmente, e talvez o mais importante dos requisitos, pelo menos pela visibilidade que tem

    e pela importncia que lhe dada pelos destinatrios da oferta, em particular dos

    investidores no qualificados8, temos a (iv) contrapartida, em relao qual o artigo 185.,

    n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios estipula que a mesma dever ser superior da

    oferta antecedente em pelo menos 2% do respetivo valor.

    5.1 A Identidade do Oferente Concorrente

    5.1.1 O artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios

    O regime da OPA Concorrente fixa uma importante limitao subjetiva quanto habilitao

    para o lanamento de OPA Concorrente, ao determinar que ficam impedidos de lanar OPA

    Concorrente as pessoas que estejam com o oferente inicial ou com o oferente concorrente

    em alguma das situaes previstas no artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios,

    salvo autorizao da CMVM a conceder caso a situao que determina a imputao de

    direitos de voto cesse antes do registo da oferta.

    8 Conceito de investidor no qualificado resulta da interpretao a contrario do artigo 30. do Cdigo dos Valores Mobilirios.

  • Miguel Stokes

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    O artigo 20., n. 1, conforme descrito infra, tem o propsito de imputar ao participante os

    direitos de voto cujo exerccio se considere ser por ele influenciado ou influencivel, j no uso

    de alguma faculdade jurdica, j num plano puramente ftico9.

    Cumpre, no entanto, suscitar se a opo do legislador nesta matria faz sentido, ou se a

    mera remisso para as causas de imputao do artigo 20., n. 1 dos Valores Mobilirios

    correspondam uma excessivo zelo do legislador no estabelecimento de restries relativas

    identidade do oferente concorrente.

    De acordo com o citado artigo, no cmputo das participaes qualificadas consideram-se,

    alm das inerentes s aes de que o participante tenha a titularidade ou o usufruto, os

    direitos de voto:

    a) Detidos por terceiros em nome prprio, mas por conta do participante;

    b) Detidos por sociedade que com o participante se encontre em relao de domnio ou

    de grupo;

    c) Detidos por titulares do direito de voto, com os quais o participante tenha celebrado

    acordo para o seu exerccio, salvo se, pelo mesmo acordo, estiver vinculado a seguir

    instrues de terceiro;

    d) Detidos, se o participante for uma sociedade, pelos membros dos seus rgos de

    administrao e de fiscalizao;

    e) Que o participante possa adquirir em virtude de acordo celebrado com os respetivos

    titulares;

    f) Inerentes a aes detidas em garantia pelo participante ou por este administradas ou

    depositadas junto dele, se os direitos de voto lhe tiverem sido atribudos;

    g) Detidos por titulares do direito de voto que tenham conferido ao participante

    poderes discricionrios para o seu exerccio;

    9 CARLOS OSRIO DE CASTRO, Imputao de Direitos de Voto no Cdigo dos Valores Mobilirios, in Cadernos do Mercado de Valores Mobilirios, n. 7, Lisboa, abril de 2000.

  • Miguel Stokes

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    h) Detidos por pessoas que tenham celebrado algum acordo com o participante que

    vise adquirir o domnio da sociedade ou frustrar a alterao de domnio ou que, de

    outro modo, constitua um instrumento de exerccio concertado de influncia sobre a

    sociedade participada;

    i) Imputveis a qualquer das pessoas referidas numa das alneas anteriores por

    aplicao, com as devidas adaptaes, de critrio constante de alguma das outras

    alneas.

    Antes de nos debruarmos sobre esta temtica, cumpre referir que a interpretao que a

    doutrina portuguesa tem feito deste artigo tem sido tendencialmente restritiva10, havendo

    uma efetiva tendncia para limitar a aplicao dos fatores de imputao do referido preceito

    quelas em que a imputao se d a ttulo subjetivo, e, dentro desta rea, s causas de

    imputao constantes dos pares de alneas c), h) e b), d).

    Esta questo acaba por ser tanto mais importante se verificarmos que a autorizao da

    CMVM para o lanamento de OPA Concorrente, nos casos em que o oferente concorrente

    esteja com o oferente inicial em algum dos casos previsto no artigo 20., n. 1 do Cdigo dos

    Valores Mobilirios, apenas pode ser conferida caso a situao que determina a imputao

    de direitos de voto cesse antes do registo da oferta 11.

    Esta soluo legal, da qual discordamos, est alis em contraposio com o seu antecedente

    artigo 561., n. 3 do saudoso Cdigo do Mercado dos Valores Mobilirios, o qual atribua

    CMVM a faculdade de fazer, in casu, um juzo de razoabilidade da inibio de lanamento de

    OPA Concorrente por serem imputados ao oferente concorrente os votos do oferente inicial

    na sociedade visada12.

    10 MANUEL REQUICHA FERREIRA, ob. cit, pp 231 e ss.; JOO SOARES DA SILVA, Algumas Observaes em Torno da Tripla Funcionalidade da Tcnica de Imputao de Votos no cdigo dos Valores Mobilirios, in Caderno dos Valores Mobilirios, n. 7, abril de 2007, pp. 55-57. 11 Parece-nos altamente discutvel o mrito de se retirar CMVM o poder de determinar se, no caso concreto, se justifica a aplicao da presente limitao. Com efeito, ao conferir CMVM esta possibilidade de escrutnio, o legislador teria conferido norma uma plasticidade que lhe permitiria adaptar-se mais facilmente a cada caso concreto, sendo o oferente subsequente admitido a lanar OPA Concorrente quando a CMVM conclusse no estar verificada qualquer circunstncia que o devesse impedir, com todos os benefcios da resultantes para acionistas da sociedade visada, prpria sociedade visada e mercado em geral. 12

    De acordo com o artigo 561., n. 3 do Cdigo do Mercado de Valores Mobilirios salvo autorizao devidamente fundamentada da

    CMVM, que s conceder em casos excepcionais em que o considere justificado, no podem lanar uma oferta concorrente as pessoas que actuem em concertao com o oferente, ou como mandatrios do oferente, da oferta inicial ou de uma oferta concorrente anterior..

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    (A) Razo de Ordem

    Permitimo-nos, relativamente limitao subjetiva constante do artigo 185., n. 3 do

    Cdigo dos Valores Mobilirios, chamar ao presente ensaio as palavras de MANUEL REQUICHA

    FERREIRA, quando refere que O telos do actual artigo 185., n. 3, funda-se no s na

    necessidade de evitar uma reviso encapotada da oferta, tal como postulavam AUGUSTO

    TEIXEIRA GARCIA e RAL VENTURA GARCIA luz do Cd.MVM, mas tambm no intuito de assegurar

    a transparncia e bom funcionamento do processo de OPA, uma vez que, para os acionistas,

    em particular para os pequenos investidores da sociedade visada, seria confuso, pouco claro

    e destitudo de sentido que a mesma pessoa, singular ou colectiva, estivesse, de forma

    directa ou indirecta, a avaliar a empresa por valores dspares.13

    O objetivo que subjaz norma assim o de evitar que o oferente inicial procure,

    ardilosamente, chamar a si o regime jurdico da OPA Concorrente, ao invs de se sujeitar s

    regras que regulam a OPA em termos estritos14.

    Para este efeito, o legislador, cautela, recorreu clusula que lhe dava maiores garantias

    quanto a este aspeto - o artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios, aqui, na sua

    terceira funcionalidade tcnica15 - sem ter cuidado de verificar se cada uma das alneas a

    previstas justificava a sua aplicao na presente matria.

    (B) A lgica de as causas de imputao do artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores

    Mobilirios constiturem restrio subjetiva ao lanamento de OPA Concorrente

    Como nota preliminar, podemos desde j afianar que, em nossa opinio, no se justifica

    que todas as clusulas de imputao de direitos de voto vertidas no artigo 20., n. 1 do

    Cdigo dos Valores Mobilirios sirvam de restrio ao lanamento de uma OPA Concorrente,

    ainda para mais nos termos absolutos em que tal inibio definida, sem que a CMVM

    possa fazer, in casu, um juzo quanto suscetibilidade de a OPA Concorrente constituir uma

    13 MANUEL REQUICHA FERREIRA, ob. cit. pp. 231. 14

    Analisaremos mais adiante que motivaes (se algumas) podero existir para que um oferente inicial procure recorrer ao regime da OPA

    Concorrente ao invs de atuar de acordo com as regras aplicveis oferta inicial (sobretudo, em matria de reviso da oferta). 15 A este respeito, ver JOO SOARES DA SILVA, ob. cit., pp. 55-57.

  • Miguel Stokes

    14/41

    manobra engenhosa do oferente inicial para recorrer, por intermdio de um terceiro, ao

    regime legal previsto no artigo 185., 185.-A e 185.-B do Cdigo dos Valores Mobilirios.

    Com efeito, os prejuzos que o legislador visou evitar com a consagrao desta restrio: (i) a

    tentativa de manipulao, pelo oferente inicial, das regras da reviso da oferta, atravs da

    utilizao de entidade com quem est conluiada, para o lanamento de OPA Concorrente e

    (ii) a eventual confuso criada nos destinatrios da oferta, que se veriam perante a

    circunstncia de terem uma oferta inicial e uma OPA Concorrente lanadas por duas

    entidades que esto concertadas; no se fazem sentir na esmagadora maioria dos casos

    previstos nas alneas do artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios.

    Este excessivo nmero de fatores de restrio subjetiva do lanamento de OPAs

    Concorrentes tanto mais nefasto se se atender a que os benefcios para os acionistas da

    sociedade, para a prpria sociedade visada e para o mercado em geral do lanamento de

    OPAs Concorrentes em muito ultrapassam os prejuzos resultantes da eventual manipulao

    de regime e da confuso criada nos destinatrios da OPA Concorrente relativamente

    identidade dos oferentes.

    Relativamente questo da manipulao do regime legal, no vemos qual possa ser o

    interesse objetivo do oferente inicial em lanar uma OPA Concorrente atravs do

    participante em nome do qual detm as aes, para fugir ao regime geral da OPA, em

    particular ao regime de reviso da oferta previsto no artigo 184..

    Com efeito, atendendo ao regime de reviso da oferta estabelecido nos artigos 184. e

    185., n. 1-B - este ltimo aplicvel apenas quando haja ofertas em concorrncia - conclui-

    se que o lanamento de uma OPA Concorrente implicar at um conjunto de nus adicionais

    em relao reviso da oferta inicial, como sejam o da elaborao e publicao de um

    prospeto adicional e da ultrapassagem de uma nova fase de registo da oferta, o que torna a

    OPA Concorrente num procedimento que no se coaduna com tentativas de manipulao do

    regime da oferta inicial (designadamente, da sua reviso), a qual beneficia de regras menos

    rgidas do que a OPA Concorrente, inutilizando assim, em termos lgicos, a proibio de

    lanamento da OPA Concorrente queles que estejam com o oferente inicial em qualquer

  • Miguel Stokes

    15/41

    das situaes de imputao de direitos de voto previstas no artigo 20., n. 1 do Cdigo dos

    Valores Mobilirios.

    Pelo exposto, no se descortina qual poder ser o incentivo de um oferente inicial em

    recorrer a uma entidade com ele concertada para os efeitos previstos no artigo 20., n. 1 do

    Cdigo dos Valores Mobilirios para, atravs desta, lanar uma OPA Concorrente, ao invs

    de simplesmente rever a sua oferta inicial.

    Cumpre referir, no entanto, que o presente entendimento assenta no facto de, em nossa

    opinio, o artigo 184. n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios no estabelecer limites ao

    nmero de vezes que a oferta inicial pode ser revista16. Caso o entendimento fosse o de que

    o artigo 184., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios apenas permite uma reviso, a

    utilizao pelo oferente inicial de um terceiro para, atravs dele, recorrer ao regime de OPA

    Concorrente permitiria ultrapassar a limitao ao nmero de revises da oferta

    estabelecida no artigo 184., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios, havendo assim uma

    razo lgica para se promover uma manipulao do regime da OPA Concorrente. Sem

    prejuzo do exposto, entendemos que esta interpretao no encontra, hoje em dia,

    qualquer apoio na letra da lei.

    Tendo em considerao o sobredito, e fazendo a anlise autnoma de cada uma das alneas

    do artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios como fatores de inibio subjetiva do

    lanamento de OPAs Concorrentes, extramos as seguintes concluses:

    a) Direitos de voto detidos por terceiros em nome prprio, mas por conta do

    participante

    A presente causa de imputao dirige-se, primacialmente, aos casos em que uma

    pessoa jurdica detenha aes em nome de outra, sempre com o propsito de

    conceder primazia titularidade ftico-econmica e de frustrar a manobra

    consistente na disperso das aes por vrios sujeitos17.

    16 Neste sentido, MANUEL REQUICHA FERREIRA ob. cit. pp. 397 e ss. 17 CARLOS OSRIO DE CASTRO, ob. cit. pp 188-190.

  • Miguel Stokes

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    Ser este o caso, por exemplo, de algum assumir a qualidade de scio de uma

    sociedade votando em assembleia-geral e recebendo os dividendos por conta e no

    interesse de outrem, verdadeiro beneficirio econmico da participao18.

    No vemos que a presente causa de imputao justifique, luz do artigo 185., n. 3

    do Cdigo dos Valores Mobilirios, que o beneficirio econmico das aes da

    sociedade visada seja impedido de lanar uma OPA Concorrente caso o oferente

    inicial seja o detentor das referidas aes, reproduzindo-se para este efeito o nosso

    entendimento expresso em 5.1.1 (B).

    b) Direitos de voto detidos por sociedade que com o participante se encontre em

    relao de domnio ou de grupo

    A presente causa de imputao ser aquela que, a nosso ver, mais facilmente ser

    aceite como causa de inibio de um participante de lanamento de uma OPA

    Concorrente.

    De acordo com o artigo 21., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios (...) considera-

    se relao de domnio a relao existente entre uma pessoa singular ou coletiva e

    uma sociedade quando, independentemente de o domiclio ou a sede se situar em

    Portugal ou no estrangeiro, aquela possa exercer sobre esta, direta ou indiretamente,

    uma influncia dominante. De acordo com o n. 2 do mesmo artigo Existe, em

    qualquer caso, relao de domnio quando uma pessoa singular ou colectiva (a)

    disponha da maioria dos direitos de voto; (b) possa exercer a maioria dos direitos de

    voto, nos termos de acordo parassocial; (c) possa nomear ou destituir a maioria dos

    titulares dos rgos de administrao ou de fiscalizao. Finalmente, o n. 3 do

    mesmo artigo determina que (...) consideram-se em relao de grupo as sociedades

    como tal qualificadas pelo Cdigo das Sociedades Comerciais, independentemente de

    as respetivas sedes se situarem em Portugal ou no estrangeiro.

    18

    JOO MATTAMOUROS REZENDE, A Imputao de Direitos de Voto no Mercado de Capitais, in Cadernos do Mercado de Valores Mobilirios, n. 7, Lisboa, abril de 2006.

  • Miguel Stokes

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    Caso o oferente concorrente seja uma sociedade que se encontra em relao de

    domnio ou grupo com o oferente inicial, existe, com efeito, uma relao de

    identidade entre ambas as entidades, a qual pode assim ser entendida como um

    mtodo de subverso das regras relativas reviso da oferta inicial, com a

    consequncia adicional de poder confundir os destinatrios da oferta, os quais se

    vero perante duas ofertas distintas apresentadas, em termos substanciais, pela

    mesma entidade jurdica19.

    Consideramos assim ser justificvel, luz da presente alnea, a inibio, por parte do

    participante, da faculdade de lanamento de OPA Concorrente, devendo neste caso,

    em contrrio, ser promovida a reviso da oferta por parte do oferente inicial, nos

    termos do artigo 184. do Cdigo dos Valores Mobilirios, sem prejuzo do que j

    referimos a respeito da (i)lgica de se preferir o regime da OPA Concorrente ao

    regime da oferta inicial.

    c) Direitos de voto detidos por titulares do direito de voto com os quais o

    participante tenha celebrado acordo para o seu exerccio, salvo se, pelo mesmo

    acordo, estiver vinculado a seguir instrues de terceiros

    Quanto a esta causa de imputao, que parte da doutrina tem considerado que no

    dever constituir fator de inibio do lanamento, pelo participante, de uma OPA

    Concorrente20, a nossa posio vai tambm no sentido da sua irrelevncia para

    efeitos do artigo 185., n. 3 do Cdigo dos Valores Mobilirios.

    Com efeito, no vemos de que modo que um acordo de voto celebrado entre

    oferente inicial e oferente concorrente relativamente ao exerccio de direitos de voto

    em assembleias gerais da sociedade visada dever constituir fator de inibio de

    lanamento, por este ltimo, de OPA Concorrente.

    Atente-se no seguinte exemplo: os direitos de voto de A na sociedade B esto

    imputados a C por fora de um acordo de voto para designao dos administradores.

    19 Em certos casos essa confuso poder existir inclusivamente ao nvel da firma. 20 MANUEL REQUICHA FERREIRA, ob. cit pp 232.

  • Miguel Stokes

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    far sentido que C seja impossibilitado, pela existncia desse acordo, de lanar uma

    OPA Concorrente sobre a sociedade B quando esteja pendente uma oferta de A?

    No se v qual o prejuzo que da poderia resultar para os acionistas da sociedade

    visada. Bem pelo contrrio, o estabelecimento desta restrio impossibilitaria os

    acionistas da sociedade visada de obterem uma contrapartida superior pelas suas

    aes, e de a prpria sociedade visada vir a ser controlada por um acionista que,

    atribuindo sociedade um valor superior, teria a expetativa de, obtido o controlo,

    alcanar uma produtividade, ou sinergias, superiores s que o oferente inicial poderia

    obter.

    Note-se que, a no se interpretar o artigo 185., n. 3, no sentido de excluir a alnea

    c) do artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios, um acordo de voto entre o

    oferente inicial e um acionista da sociedade visada que disponham, por absurdo que

    possa ser, de 0,01% dos direitos de voto cada, sero suficientes para inibir o referido

    acionista de lanar uma OPA Concorrente21.

    A concluso a que se chega nesta ponto assim a mesma a que se chegou quanto

    alnea (a) supra, a de que no se justifica que a presente causa de imputao

    desencadeie a inibio de lanamento, pelo participante, de OPA Concorrente,

    quando lhe sejam imputados os votos do oferente inicial.

    d) Direitos de voto detidos, se o participante for uma sociedade, pelos membros dos

    seus rgos de administrao e de fiscalizao

    Relativamente presente causa de imputao, consideramos, uma vez mais, que no

    se justifica que a mesma implique a impossibilidade de lanamento, por um

    administrador ou membro do conselho de fiscalizao do oferente inicial, de uma

    OPA Concorrente.

    Com efeito, uma vez mais devero ser feitos valer os argumentos expostos em 5.1.1

    (B), bem como a posio vertida supra relativamente causa de imputao (c).

    21 Este argumento meramente acessrio, pois que a nossa concluso a de que independentemente da percentagem de direitos de voto objeto de imputao, as mesmas no devero servir de entrave ao lanamento de uma OPA Concorrente.

  • Miguel Stokes

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    Admitimos contudo, neste ponto, que a identidade do oferente possa, neste caso,

    gerar confuso nos destinatrios da oferta, que se veriam perante (i) uma oferta

    inicial lanada pela sociedade e (ii) uma OPA Concorrente lanada pelo seu

    administrador ou membro do rgo de fiscalizao, o que seria objetivamente apto a

    gerar confuso22.

    Ainda assim, com base nos argumentos expostos em 5.1.1 (B), somos levados a

    concluir no sentido da aceitao da OPA Concorrente que seja lanada por quem

    esteja com o oferente inicial em relao de imputao ao abrigo da alnea d) do

    artigo 20., n. 1, sem prejuzo das cautelas levantadas supra quanto confuso que

    tal situao poder criar nos destinatrios da oferta.

    e) Direitos de voto que o participante possa adquirir em virtude de acordo celebrado

    com os respetivos titulares

    Relativamente presente alnea, no nos parece razovel que o facto de um

    participante ter celebrado com o oferente inicial, por exemplo, um contrato de opo

    de compra de aes da sociedade visada - ou um contrato-promessa de compra e

    venda23 -, possa servir de inibio do lanamento, por este ltimo, de uma OPA

    Concorrente, cujos benefcios foram j elucidados em 4 supra.

    A existncia, por exemplo, de uma opo de compra, no obstante gerar a imputao

    de direitos de voto, por se assumir que o titular de opo poder influenciar, de

    algum modo, o exerccio dos direitos de voto da contraparte, no parece justificar a

    inibio do optante de lanar uma OPA Concorrente.

    No nosso entendimento, no h qualquer razo de regime que justifique que se iniba

    um optante, promitente-comprador ou comprador com reserva de propriedade de

    lanar uma OPA Concorrente quando a sua contraparte tenha lanado a oferta inicial.

    22 Sobretudo pela falta de nexo que representar um membro de um rgo de administrao ou fiscalizao da sociedade estar a concorrer com esta no processo de oferta para aquisio da sociedade visada, sem prejuzo da violao dos deveres fundamentais de administradores e membro do rgo de fiscalizao que muito provavelmente resultaria dessa conduta. 23

    CARLOS OSRIO DE CASTRO, ob. cit, pp. 188-190.

  • Miguel Stokes

    20/41

    f) Direitos de voto inerentes a aes detidas em garantia pelo participante ou por

    este administradas ou depositadas junto dele, se os direitos de voto lhe tiverem

    sido atribudos

    No presente caso, no vemos por que razo a causa de imputao dever constituir

    fator de inibio, por parte do participante, do lanamento de OPA Concorrente.

    Atente-se no presente exemplo: A, sociedade produtora de energia eltrica, com

    uma participao numa sociedade de telecomunicaes com aes admitidas

    negociao em mercado regulamentado, contrai um financiamento junto do banco B,

    em garantia do qual constitui penhor sobre aes correspondentes a 1%24 do capital

    social da sociedade de telecomunicaes, sendo o direito de voto sobre essas aes

    atribudo ao banco B.

    Caso A lance uma OPA sobre a sociedade de telecomunicaes, B dever ficar

    impedido de lanar OPA Concorrente? De acordo com a interpretao declarativa do

    artigo 185., n. 3 do Cdigo dos Valores Mobilirios, B estaria, luz do artigo 185.,

    n. 3 do Cdigo dos Valores Mobilirios, efetivamente inibido de lanar OPA

    Concorrente.

    Ora estamos em crer que, nesta circunstncia, como nas circunstncias tratadas em

    (a), (c), (d) e (e), a aplicao tout court da restrio subjetiva constante do artigo

    185., n. 3 do Cdigo dos Valores Mobilirios tem como consequncia o prejuzo (i)

    para os acionistas da sociedade visada, que vm negada a possibilidade de venderem

    as suas participaes a um oferente diferente por uma contrapartida superior, (ii) da

    sociedade visada, que poderia ser gerida pelo oferente concorrente, com os

    potenciais benefcios da decorrentes conforme referido em (C) supra e (iii) para o

    prprio mercado em geral, sem que, em contrapartida, a aplicao da restrio

    permita algum tipo de benefcio para os sujeitos envolvidos.

    24 A escolha da percentagem de 1% meramente aleatria, pois, conforme referido na nota de rodap n. 1, o nosso entendimento o mesmo independente da percentagem de direitos de voto objeto de imputao.

  • Miguel Stokes

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    A concluso quanto a este ponto ser assim a de que a presente causa de imputao

    de direitos de voto no dever servir de restrio ao participante para o lanamento

    de OPA Concorrente.

    g) Direitos de voto detidos por titulares do direito de voto que tenham conferido ao

    participante poderes discricionrios para o seu exerccio

    Aplica-se, mutatis mutandis, o raciocnio explanado em (A) supra, dando-se por

    reproduzida a concluso a que chegmos nesse ponto.

    h) Direitos de voto detidos por pessoas que tenham celebrado algum acordo com o

    participante que vise adquirir o domnio da sociedade ou frustrar a alterao de

    domnio ou que, de outro modo, constitua um instrumento de exerccio

    concertado de influncia sobre a sociedade participada

    Quanto presente causa de imputao, remetemos para o que foi dito quanto

    alnea (c) supra, sendo assim nossa opinio que a existncia deste fator de imputao

    no justifica a inibio de um participante, que com o oferente tenha celebrado um

    acordo com uma das finalidades aqui referidas relativamente sociedade visada, vir

    a lanar uma OPA Concorrente.

    Com efeito, apesar de no presente caso estarem em causa, designadamente, acordos

    parassociais, bem como a concertao de comportamentos, nomeadamente na

    convocatria, aposio de pontos ordem de trabalhos e exerccio de sentido de

    direito de voto em deliberaes da assembleia geral, ou em outros atos sociais nos

    quais os acionistas concertados intervenham, consideramos que se poder aplicar o

    mesmo raciocnio exposto em (c) supra, por estar em causa a definio de

    comportamentos futuros com relevncia para a sociedade, pelo que a presente

    alnea dever igualmente ser excluda da limitao genrica que se encontra prescrita

    no artigo 185., n. 3 do Cdigo dos Valores Mobilirios.

  • Miguel Stokes

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    i) Direitos de voto imputveis a qualquer das pessoas referidas numa das alneas

    anteriores por aplicao, com as devidas adaptaes, do critrio constante de

    alguma das outras alneas

    Relativamente a esta ltima alnea, a concluso ser, na maioria dos casos, negativa,

    pois que apenas uma das causas de imputao supra referidas foi identificada como

    fator razovel de inibio da possibilidade de lanamento de OPA Concorrente - a

    causa de imputao constantes da alnea (b) do artigo 20., n. 1 do Cdigo dos

    Valores Mobilirios.

    5.1.2 A OPA Concorrente luz do artigo 186. do Cdigo dos Valores Mobilirios

    Ultrapassada a anlise do requisito subjetivo imposto pelo regime da OPA Concorrente, e

    com concluses que postulam por uma interpretao mais lata ou, idealmente, uma

    alterao da redao do preceito legal em causa, e que tm o condo de favorecer a

    proliferao de OPAs Concorrentes; cumpre agora analisar outra questo que se pode

    colocar nesta temtica, e que diz respeito aplicabilidade, ao oferente concorrente, da

    limitao imposta pelo artigo 186. do Cdigo dos Valores Mobilirios.

    De acordo com o referido preceito Salvo autorizao concedida pela CMVM para proteo

    dos interesses da sociedade visada ou dos destinatrios da oferta, nem o oferente nem

    qualquer das pessoas que com este estejam em alguma das situaes previstas no n. 1 do

    artigo 20. podem, nos 12 meses seguintes publicao do apuramento do resultado da

    oferta, lanar, diretamente, por intermdio de terceiro ou por conta de terceiro, qualquer

    oferta pblica de aquisio sobre os valores mobilirios pertencentes mesma categoria dos

    que foram objeto da oferta ou que confiram direito sua subscrio ou aquisio.

    Cumpre saber, contudo, se esta limitao se aplica em caso de OPA Concorrente, isto , se

    uma pessoa que caia na previso do artigo 186. poder, caso um outro oferente lance uma

    OPA sobre a mesma sociedade visada, lanar OPA Concorrente sobre essa mesma

    sociedade.

  • Miguel Stokes

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    A questo no parece ser de resposta fcil. Com efeito, a ratio que subjaz a esta limitao

    tem por objetivo evitar distores de mercado, nomeadamente que o oferente, atravs de

    um conjunto de OPAs sucessivas e sem qualquer suscetibilidade de sucesso, limite

    sucessivamente a atuao da sociedade visada, subjugando-a aos deveres e limitaes

    impostos pelos artigos 181. e 182. do Cdigo dos Valores Mobilirios, respetivamente, ao

    mesmo tempo que cria confuso nos acionistas da sociedade, presenteados sucessivamente

    com ofertas que podero ser completamente descabidas em termos de contrapartida

    oferecida.

    Ora, atenta a ratio da disposio, conclui-se que a aplicao da mesma no reveste lgica no

    caso de o inibido pretender lanar uma OPA Concorrente.

    Com efeito, na medida em que (i) o oferente inicial no est sujeito regra do artigo 186.

    do Cdigo dos Valores Mobilirios e que (ii) o regime da oferta concorrente obriga a OPA

    Concorrente a ser lanada em termos no menos favorveis do que a oferta inicial, e com

    uma contrapartida superior em pelos menos 2% oferta antecedente; no se justifica

    impedir que seja lanada OPA Concorrente por quem j tenha lanado nos ltimos 12 meses

    uma OPA sobre a mesma sociedade visada.

    Admitimos que este entendimento, visto de determinados prismas, possa parecer

    desprovido de sentido. Com efeito, a aceitar-se esta possibilidade, criar-se-ia a circunstncia

    de o inibido ficar dependente do lanamento de uma oferta por outro oferente para

    poder, atravs de OPA Concorrente, escapar s amarras do artigo 186. do Cdigo dos

    Valores Mobilirios. Ademais, poder-se-ia dar o caso de o valor oferecido pelo oferente na

    OPA Concorrente ser inferior ao que havia sido oferecido na oferta lanada nos doze meses

    anteriores - mas conforme com o artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios -, o

    que constituiria um desvirtuamento do sentido material da prpria norma.

    Parece-nos, no entanto, que, falta de regras que regulem especificamente esta

    circunstncia, a faculdade de um oferente inibido poder lanar uma OPA Concorrente

    estar dependente de autorizao da CMVM, a conceder casuisticamente caso conclua que

  • Miguel Stokes

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    a OPA Concorrente permitiria proteger os interesses da sociedade visada ou dos

    destinatrios da oferta25.

    Caber assim CMVM, caso o oferente inibido nos termos do artigo 186. do Cdigo dos

    Valores Mobilirios pretenda lanar uma OPA Concorrente, avaliar se esta ser benfica para

    os sujeitos supra referidos, concedendo a autorizao se a concluso for positiva26.

    Por ltimo, importa alertar que a presente concluso se encontrar, necessariamente,

    sujeita a um limite, que o de garantir que oferente inicial e oferente concorrente no

    tiveram como mero propsito fazer cair a limitao imposta pelo artigo 186. do Cdigo dos

    Valores Mobilirios.

    A existncia de um tal conluio ser tanto mais provvel quando o oferente inicial e oferente

    concorrente estejam ligados por algum dos critrios de imputao de direitos de voto

    constantes do artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios, em particular da alnea f),

    ou quando exista um mero acordo qual A se comprometa perante B a lanar uma OPA sobre

    C, numa altura em que B esteja impedido de lanar OPA sobre C por efeito do artigo 186.

    do Cdigo dos Valores Mobilirios, com o exclusivo intuito de beneficiar da interpretao

    por ns supra defendida.

    5.2 O Objeto da Oferta

    5.2.1 Bitola uniforme para todos os oferentes concorrentes

    Os requisitos quanto ao objeto da OPA Concorrente encontram-se estabelecidos no artigo

    185., n. 4 do Cdigo dos Valores Mobilirios, o qual determina que As ofertas

    concorrentes no podem incidir sobre quantidade de valores mobilirios inferior quela que

    objeto da oferta inicial.

    Independentemente das razes que lhe subjazam, entendemos que o preceito claro: a

    bitola a tomar em considerao pelo oferente concorrente ser sempre a oferta inicial, o

    25 Conforme artigo 186. do Cdigo dos Valores Mobilirios. 26 luz do que foi j explicado acerca do regime da OPA Concorrente, a tendncia que a resposta da CMVM seja afirmativa. Mais dvidas se colocam nos casos em que a contrapartida oferecida na OPA Concorrente seja inferior contrapartida oferecida pelo oferente concorrente na oferta que realizara nos doze meses anteriores.

  • Miguel Stokes

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    que significa que todos os oferentes concorrentes estaro, em termos de objeto da oferta,

    balizados pela mesma cifra - o objeto da oferta tal como delineado pelo oferente inicial27.

    Esta circunstncia vem permitir, no entanto, e como bem nota MANUEL REQUICHA FERREIRA, que

    se possam gerar situaes que desvirtuem o propalado princpio da melhoria progressiva das

    ofertas concorrentes28.

    De acordo com este princpio, s se justifica que uma OPA Concorrente seja admitida

    conquanto traduza uma melhoria objetiva em relao oferta anterior, aumentando assim o

    potencial retorno para os acionistas da sociedade visada que vendam as suas aes.

    A este argumento acrescentaramos um outro, que parece ter estado na mente do legislador

    quando edificou o regime substantivo da OPA Concorrente: assegurar que qualquer OPA

    Concorrente corresponder a uma melhoria substancial da oferta inicial, por forma a, de

    certa forma, proteger a posio do oferente inicial, cuja oferta apenas poder ser

    desafiada por outra que apresente termos objetivamente mais favorveis, representando

    um verdadeiro compromisso do oferente concorrente na aquisio da sociedade visada, e

    no uma mera inteno emulativa, de destruio dos objetivos do oferente inicial.

    O preceito em anlise, da forma como est redigido, no concretiza, de per se, o princpio da

    melhoria progressiva das ofertas concorrentes, sendo no entanto um auxiliar precioso do

    mesmo, ao garantir, pelo menos, a manuteno do status quo no que concerne ao objeto da

    oferta inicial.

    Note-se, no entanto, que em virtude da redao do preceito, poder suceder, por exemplo,

    que um primeiro oferente concorrente aumente o objeto da oferta em 20% dos valores

    mobilirios, com o correspondente aumento da contrapartida em 2%29 e que, em momento

    posterior, um segundo oferente venha lanar OPA Concorrente sobre o mesmo objeto da

    oferta inicial, acompanhada da necessria subida da contrapartida de 2% em relao

    primeira OPA Concorrente. Neste caso, a segunda OPA Concorrente ser tendencialmente

    27 Note-se, alis, que se quisesse utilizar como bitola a oferta antecedente, como no caso do artigo 185., n. 5 e 6, o legislador t-lo-ia referido expressamente. Em sentido contrrio, HUGO MOREDO SANTOS, ob. cit pp 94-95. 28 MANUEL REQUICHA FERREIRA, ob. cit pp 226-227. 29 Conforme exigido pelo artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios, conforme analisaremos infra.

  • Miguel Stokes

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    menos favorvel do que a primeira OPA Concorrente, pois apesar de aumentar ligeiramente

    a contrapartida, diminuiria o objeto da oferta de tal modo que haveria um nmero

    considervel de acionistas da sociedade visada que no caso da primeira OPA Concorrente

    conseguiriam vender as suas aes, mas que no caso da segunda OPA Concorrente veriam

    gorada essa inteno.

    Sem prejuzo de, teoricamente, poder haver um prejuzo para os acionistas pelo facto de a

    segunda OPA Concorrente ser partida menos favorvel do que a primeira OPA

    Concorrente, a verdade que a existncia desta segunda OPA Concorrente teoricamente

    no prejudica, mas antes alarga, o leque de opes dos acionistas da sociedade visada - que

    podem aceitar uma ou outra oferta -, com os benefcios da inerentes, sem prejuzo,

    naturalmente, de este alargamento do leque de ofertas poder implicar que, em uma delas,

    ou em ambas, a condio de sucesso estabelecida no se verifique30.

    Apesar de o preceito em anlise no corresponder aplicao material do princpio da

    melhoria progressiva das ofertas concorrentes, a verdade que a forma como o preceito

    est redigido permite cumprir alguns dos desgnios do regime da OPA Concorrente, como

    sejam (i) a promoo da existncia de OPAs; (ii) a promoo da existncia de OPAs

    Concorrentes e (iii) a melhoria31 da posio dos acionistas da sociedade visada, da sociedade

    visada e do mercado em geral.

    Em relao a (i) supra, o modo como o preceito est construdo salvaguarda a posio do

    oferente inicial, impondo que uma OPA Concorrente apenas seja admitida se no for

    objetivamente menos favorvel, protegendo assim, dentro do possvel, a posio de quem

    deu origem OPA, com os custos com a descoberta da oportunidade e de auditoria prvia

    sociedade visada que lhe tero estado associados.

    No que concerne a (ii), a promoo da existncia de OPAs Concorrentes funda-se no facto de

    no ser exigido o aumento do objeto da oferta, mas somente a manuteno do objeto

    30 Em ltima anlise, o surgimento da OPA Concorrente poder impedir que se verifiquem as condies de sucesso da oferta inicial. Nessa circunstncia, caso a OPA Concorrente no atinja, tambm, a condio de sucesso, as duas ofertas tero o efeito de se anularem a si mesmas. 31

    Ou, pelo menos, a manuteno do status quo.

  • Miguel Stokes

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    constante da oferta inicial. Com esta construo, permite-se aos oferentes concorrentes,

    independentemente da ordem por que surjam, ter como bitola o objeto da oferta inicial,

    podendo assim escolher qual o modo de estruturao da sua oferta que mais facilmente

    captar o interesse dos acionistas da sociedade visada32.

    Finalmente, no que diz respeito a (iii), a melhoria da posio dos acionistas da sociedade

    visada, da prpria sociedade visada, e do mercado em geral uma decorrncia do referido

    em (i) e (ii). Com efeito, um dado inequvoco que a existncia de OPAs e de OPAs

    Concorrentes tem o condo de melhorar a posio relativa dos sujeitos supra identificados:

    (i) no caso dos acionistas da sociedade visada, por permitir optar entre manter a

    participao ou alien-la (muito provavelmente com um prmio face ao valor de cotao ou

    contabilstico, consoante as aes estejam ou no admitidas negociao em mercado); (ii)

    no caso da sociedade visada, por significar que h quem se proponha adquirir essa

    sociedade, por a considerar um substrato capaz de criar valor33, e (iii) no caso do mercado

    em geral, por a existncia de OPAs e OPAs Concorrentes permitir a melhoria da posio dos

    sujeitos supra identificados sem implicar um correspondente prejuzo para outro sujeito de

    mercado - o chamado movimento de Pareto34.

    5.2.2 Os casos em que o oferente concorrente seja acionista da sociedade visada

    Finalmente, cumpre analisar uma situao que poder representar uma exceo - ou, pelo

    menos, adaptao - do que foi referido em 5.2.1 acerca do objeto da oferta.

    Conforme se concluiu supra, qualquer OPA Concorrente poder ser lanada desde que no

    incida sobre uma quantidade inferior de valores mobilirios, ou seja, desde que o objeto

    seja, pelo menos, igual.

    32 Isto , se apostam em manter o objeto da oferta inicial e aumentar a contrapartida acima dos 2% exigidos pelo artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios ou se, ao invs, apostam, por exemplo, na extenso do objeto, acompanhada do aumento mnimo da contrapartida. 33 Da que, por regra, as sociedades cujas aes estejam admitidas negociao em mercado, quando sejam objeto de OPA, tendem a ver a sua cotao aumentar aps a publicao do anncio preliminar, frequentemente acima do valor da contrapartida fixado no referido anncio. 34 PINTO BARBOSA, ANTNIO, in Economia Pblica, McGraw Hill, Lisboa, 1997, pp. 2-3.

  • Miguel Stokes

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    Coloca-se, porm, a questo de saber qual o modo de aferir do cumprimento desta

    disposio legal nos casos em que um dado oferente concorrente detenha j uma

    participao social na sociedade visada.

    Com efeito, se o objeto de uma oferta inicial for 90% do capital social da sociedade, e um

    oferente concorrente detiver 10%, o objeto da sua oferta dever corresponder (i) a 90% do

    capital social (ou seja, 100% do capital social que no detm)? a 90% do capital social que

    ele no detm, ou seja, a 81% do capital social? Ou dever somente ter como objeto uma

    percentagem tal do capital social que, a final, lhe possa granjear a mesma participao com

    que o oferente inicial ficaria adquirisse 90% do capital social - i.e. 80% (a que se somam os

    seus 10%)?

    Cremos que, para este efeito, dever considerar-se que o objeto da oferta inicial, para

    efeitos da determinao do objeto mnimo da oferta concorrente, corresponde a uma

    percentagem do capital social, j deduzido da participao detida pelo oferente. Ou seja, se

    a oferta inicial incidiu sobre 90% dos valores mobilirios, e o oferente concorrente detm

    uma participao de 10% no capital social, considera-se a priori que o oferente concorrente

    rejeitar a oferta inicial, a qual ter assim um objeto real de 100% do capital social

    adquirvel. Ser esta a percentagem que dever constituir objeto da OPA Concorrente, 100%

    do capital social que este no detm, que nesta hiptese corresponde a 90% do capital

    social.

    Pela aplicao do mesmo mtodo, resultar que se o oferente concorrente detiver 20% do

    capital social da sociedade visada, o objeto real da oferta inicial ser somente 80% do capital

    social, que corresponde a 100% do capital social adquirvel, pois assume-se que o oferente

    concorrente rejeitaria a oferta inicial. Neste sentido, tambm a OPA Concorrente dever ter

    por objeto 100% do capital social que ainda no detm, ou seja, 80% do capital social.

    Caso, por exemplo, o oferente inicial detivesse 5% do capital social e o objeto da oferta

    inicial fosse 90%, o modelo de clculo acima proposto levaria a que o objeto da oferta inicial

    fosse pelo menos 94,73% do capital social adquirvel. O oferente concorrente deveria assim,

  • Miguel Stokes

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    para que a sua OPA Concorrente fosse admitida, abranger 94,73% do capital social que no

    detm, ou seja, 90% da totalidade do capital social.

    Em suma, a aplicao do presente mtodo permite alcanar duas concluses alternativas: (i)

    ou o oferente concorrente detm uma participao que igual ou inferior diferena entre

    100% e o objeto da oferta inicial (aplicvel, no caso de o objeto da oferta inicial ser de 90%,

    se a participao do oferente concorrente for de at 10%, inclusive), caso em que o objeto

    da OPA Concorrente dever ser, pelo menos, igual ao da oferta inicial; ou (ii) o oferente

    concorrente detm um participao na sociedade visada superior diferena entre 100% e o

    objeto da oferta inicial (aplicvel, no caso de o objeto da oferta inicial ser 90%, se a

    participao do oferente concorrente for superior a 10% da sociedade visada), caso em que

    o objeto da oferta ser a totalidade do capital social que o oferente concorrente no detm.

    Este parece ser o mtodo que reproduz de modo mais fidedigno os requisitos do artigo

    185., n. 4 do Cdigo dos Valores Mobilirios, sendo aquele que melhor salvaguarda a

    posio dos acionistas da sociedade.

    Em concluso, o artigo 185., n. 4 dever ser interpretado no sentido de, semelhana do

    referido no artigo 185., n. 6, mutatis mutandis35, permitir que o objeto da OPA

    Concorrente seja, em absoluto, inferior ao da oferta inicial, quando o oferente concorrente

    detenha uma participao na sociedade visada que seja superior diferena entre 100% do

    capital social e a percentagem de capital social objeto da oferta inicial. Este raciocnio acaba

    por se reconduzir a uma concluso simples: a de que ao oferente concorrente no ser

    vedado lanar OPA Concorrente se, em virtude de ter uma participao na sociedade visada,

    o objeto desta for necessariamente inferior ao objeto da oferta inicial.

    35 No caso do artigo 185., n. 6 trata-se de um caso em que o oferente inicial que j detm uma participao no capital social da sociedade visada, assim se permitindo que o oferente concorrente estabelea uma percentagem mais elevada de aceitaes como condio de sucesso.

  • Miguel Stokes

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    5.3 Condies da Oferta

    5.3.1 As condies de sucesso do artigo 185., n. 6 do Cdigo dos Valores Mobilirios

    No que concerne ao terceiro dos requisitos substanciais da OPA Concorrente, relativo s

    condies da oferta, estipula o artigo 185., n. 6 do Cdigo dos Valores Mobilirios que A

    oferta concorrente no pode fazer depender a sua eficcia de uma percentagem de

    aceitaes por titulares de valores mobilirios ou de direitos de voto em quantidade superior

    ao constante da oferta inicial ou de oferta concorrente anterior, salvo se, para efeitos do

    nmero anterior, essa percentagem se justificar em funo dos direitos de voto na sociedade

    visada j detidos pelo oferente e por pessoas que com este estejam em alguma das situaes

    previstas no n. 1 do artigo 20..

    No presente artigo, o legislador seguiu uma lgica ligeiramente diferente da descrita em 5.2

    supra quanto ao objeto mnimo da OPA Concorrente.

    Com efeito, no obstante determinar que a OPA Concorrente no dever conter condies

    de sucesso menos favorveis do que as da oferta anterior, no obrigando assim a uma

    melhoria substancial da oferta no que a este requisito diz respeito, vem estabelecer como

    bitola a ter com conta pelo oferente concorrente, no as condies tais como definidas na

    oferta inicial, mas sim na oferta antecedente.

    O legislador parece neste caso ter estado mais de acordo com as matrizes do princpio da

    melhoria progressiva das ofertas concorrentes, em comparao com o regime do objeto da

    OPA Concorrente, ao obrigar cada oferente concorrente a apresentar condies pelo menos

    to favorveis como as da oferta antecedente, a qual possivelmente incluir condies mais

    favorveis do que as definidas na oferta inicial.

    O artigo 185., n. 6 do Cdigo dos Valores Mobilirios faz referncia, em concreto, s

    chamadas condies de sucesso, da OPA, que consubstanciam percentagens mnimas da

    aceitao da OPA a partir da qual esta produzir concretizar os seus efeitos.

  • Miguel Stokes

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    Neste sentido, se o oferente inicial estabelecer como condio de sucesso a obteno de

    50,1% do capital social, nenhum oferente concorrente poder estabelecer uma condio de

    sucesso mais elevada - i.e. tornando menos provvel o sucesso da OPA Concorrente.

    Perguntar-se-36, no entanto, se o presente preceito deve ser interpretado literalmente, ou

    se, pelo contrrio, deve ser interpretado no sentido de salvaguardar o princpio da melhoria

    progressiva das ofertas concorrentes. Referimo-nos, em particular, circunstncia de, em

    alguns casos, uma oferta concorrente poder incluir como condio de sucesso uma

    percentagem superior de aceitaes, e mesmo assim ser objetivamente mais favorvel do

    que a oferta inicial, como seja o caso extremo em que a oferta inicial tenha por objeto 30%

    do capital e uma condio de sucesso de 30% e uma oferta concorrente que tenha por

    objeto 100% do capital e uma condio de sucesso de 31%.

    Neste exemplo, em que a OPA Concorrente ser em princpio considerada mais favorvel,

    por abranger mais do triplo dos acionistas da sociedade visada, o requisito de manuteno

    das condies de sucesso da oferta antecedente previsto no artigo 185., n. 3 do Cdigo

    dos Valores Mobilirios no se encontraria cumprido, com a consequente rejeio do registo

    da OPA Concorrente. Cremos, contudo, que a soluo legal deveria permitir uma maior

    flexibilidade na aferio do cumprimento destes requisitos, nomeadamente atribuindo

    CMVM a faculdade de determinar se, em cada caso concreto, se justifica a sua admisso

    luz da globalidade dos elementos da OPA Concorrente.

    Finalmente, fazemos notar que o presente preceito prev, como exceo obrigatoriedade

    de o oferente concorrente apresentar condies de sucesso que no sejam menos

    favorveis que as previstas em oferta antecedente, aquelas em que uma percentagem mais

    elevada se justificar em funo dos direitos de voto na sociedade visada j detidos pelo

    oferente ou por pessoas que com este estejam em alguma das situaes de imputao de

    direitos de voto previstas no artigo 185., n. 6 do Cdigo dos Valores Mobilirios.

    Com efeito, se o oferente inicial j detinha, por exemplo, 10% do capital social da sociedade

    visada, e lana uma oferta em que a condio de sucesso de 40,01% de aceitaes, deve

    36 Ver, neste sentido, HUGO MOREDO SANTOS, ob. cit, pp. 101.

  • Miguel Stokes

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    ser admitido ao oferente concorrente sujeitar a eficcia da OPA Concorrente a 50,01% de

    aceitaes, percentagem que se parece justificar face ao provvel objetivo de ambos os

    oferentes: a obteno do controlo da sociedade visada.

    5.3.2 As condies previstas no artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios

    A acrescer s condies de sucesso, tratadas no artigo 185., n. 6 do Cdigo dos Valores

    Mobilirios, prev ainda o artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios que a oferta

    concorrente no contenha condies que a tornem menos favorvel.

    Este nmero vem assim fixar um leque adicional de limitaes em matria de condies da

    OPA Concorrente, determinando que, a acrescer s condies de sucesso, a oferta

    concorrente no poder conter outras condies menos favorveis do que as estipuladas na

    oferta inicial.

    As referidas condies devero, em qualquer caso, ser em primeiro lugar compatveis com

    os pressupostos nsitos no artigo 124., n. 3 do Cdigo dos Valores Mobilirios, o qual

    estipula que a oferta s pode ser sujeita a condies que correspondam a um interesse

    legtimo do oferente e que no afetem o funcionamento normal do mercado.

    Relativamente a estas condies, destacamos a aprovao de alteraes estatutrias,

    designadamente, a supresso de tetos de voto - a chamada desblindagem de estatutos - ou a

    obteno prvia de uma deciso de no oposio por parte de uma entidade administrativa,

    designadamente da Autoridade Concorrncia37 ou da Comisso Europeia.

    Fazemos notar, no entanto, que a aposio, no anncio preliminar de OPA Concorrente, das

    condies supra referidas, apenas estar - ou s far sentido estar - sujeita restrio

    imposta pelo artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios na medida em que a sua

    verificao se d aps o registo e lanamento da OPA Concorrente.

    Com efeito, caso as referidas condies sejam condies lanamento38, de cuja eficcia

    depende o registo e lanamento da OPA Concorrente, e no a eficcia da prpria OPA

    37 Ver, neste sentido, HUGO MOREDO SANTOS, ob. cit. pgina 104, ob. cit. 38

    PAULO CMARA, ob. cit pg. 609.

  • Miguel Stokes

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    Concorrente - que apenas se considera efetivamente lanada com a publicao do anncio

    de lanamento, aps o registo da oferta - no devero ser sujeitas restrio supra referida,

    por se situarem em momento cronolgico que ainda no justifica a aplicao do meio de

    tutela previsto do artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios, por no haver ainda

    concretamente uma OPA Concorrente, mas to somente uma promessa pblica do seu

    lanamento.

    As condies relevantes para efeitos do artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores Mobilirios

    devero, assim, ser somente as condies de aquisio39, ou seja, aquelas cuja verificao

    deva ocorrer em momento posterior ao anncio de lanamento da OPA Concorrente,

    apenas a se justificando, luz do princpio da melhoria progressiva das ofertas

    concorrentes, a proibio de aposio de condies menos favorveis40.

    5.4 A Contrapartida

    5.4.1 A relevncia da contrapartida na OPA Concorrente

    Chegamos, por fim, ao requisito rei em matria de OPA Concorrente, a contrapartida.

    Este requisito constitui o principal fator de diferenciao dos termos da OPA Concorrente

    em relao oferta inicial, por traduzir especificamente o benefcio que os acionistas da

    sociedade visada podero retirar da OPA Concorrente.

    Com efeito, as condies analisadas em 5.1, 5.2 e 5.3 supra mais do que no so do que

    meros acessrios do verdadeiro fator de atratividade para os acionistas da sociedade visada

    - a contrapartida que podero obter pela venda das sus aes na OPA.

    O tratamento que dado pelo legislador parece ter em conta esta diferena, ao determinar,

    relativamente ao critrio (i) da identidade do oferente concorrente; (ii) do objeto da oferta e

    (iii) das condies da oferta; que estas no devero ser menos favorveis do que as definidas

    na oferta antecedente (exceto no caso do objeto da oferta, em que a bitola a oferta

    39

    Idem. 40

    Com efeito, no faz sentido contemplar no artigo 185., n. 5 do Cdigo dos Valores mobilirios condies de cuja verificao depende o

    registo da oferta, pois caso estas no se verifiquem no haver lugar ao lanamento da oferta pblica de aquisio concorrente, no se chegando sequer a aplicar o regime do artigo 185., n. 5 (sem prejuzo, naturalmente, do que referimos em 3 supra).

  • Miguel Stokes

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    inicial), i.e., o legislador procura assegurar o status quo relativamente a estes elementos,

    sem prejuzo da possibilidade de melhoria da oferta relativamente a qualquer um deles.

    J a contrapartida funciona como verdadeiro centro nevrlgico da OPA Concorrente,

    admitindo assim o legislador que a contrapartida o principal fator a ter em considerao

    pelos acionistas da sociedade visada, que ficam a saber que, na medida em que os requisitos

    se encontrem preenchidos, podero vir a obter, no mnimo, uma majorao da

    contrapartida em 2% face da oferta inicial41.

    5.4.2 O regime da contrapartida

    A regra da contrapartida na OPA Concorrente encontra-se prevista no artigo 185., n. 5 do

    Cdigo dos Valores Mobilirios, o qual prev que A contrapartida da oferta concorrente

    deve ser superior antecedente em pelo menos 2% do seu valor e no pode conter condies

    que a tornem menos favorvel.

    Esta exigncia de majorao face oferta inicial ter algumas razes de ser.

    Em primeiro lugar, a necessria majorao da contrapartida corresponde ao expoente

    mximo do princpio da melhoria progressiva das ofertas subsequentes, sinalizando assim a

    melhoria objetiva da OPA Concorrente em relao oferta inicial.

    Em segundo lugar, obriga o oferente concorrente a ponderar fortemente a viabilidade do

    lanamento da oferta naqueles termos, excluindo assim - ou pelo menos mitigando - o risco

    de lanamento de OPAs Concorrentes com o exclusivo objetivo de (i) prejudicar o oferente

    inicial ou (ii) de aumentar o perodo das ofertas, com a correspondente extenso do perodo

    em que a sociedade visada se encontra sujeita aos deveres e limitaes impostos pelos

    artigos 181. e 182. do Cdigo dos Valores Mobilirios, respetivamente, com os prejuzos

    da decorrentes para a sociedade visada.

    41 O valor da contrapartida, que logo no anncio preliminar dever corresponder a uma crscimo de 2% relativamente oferta inicial, poder entretanto ser aumentado at ao anncio de lanamento, no podendo contudo, tornar-se inferior (nos termos do artigo 176., n. 2 a) do Cdigo dos Valores Mobilirios). Adicionalmente, este valor poder vir a ser aumentado na pendncia da oferta nos termos previstos no artigo 185.-B, n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios.

  • Miguel Stokes

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    Em terceiro lugar, este regime permite tutelar de alguma forma a posio do oferente inicial,

    que teve maiores custos na identificao da oportunidade de aquisio da sociedade visada,

    com os custos de auditoria que lhe tero estado associados, assegurando assim o legislador

    que a sua oferta s ter concorrncia se esta comportar uma contrapartida

    substancialmente superior. A tutela do oferente inicial, que frequentemente tem sido

    criticada por implicar limitaes ao princpio da liberdade de iniciativa privada e de livre

    concorrncia no mercado do controlo societrio42, tem no entanto o condo de favorecer o

    lanamento de ofertas iniciais, as quais constituem pressuposto lgico da existncia de OPAs

    Concorrentes, cuja proliferao no poder ser potenciada se no for acompanhada de

    medidas de regime que assegurem que os incentivos ao lanamento de ofertas iniciais no

    sejam comprimidos43.

    O facto de o legislador exigir um aumento da contrapartida da OPA Concorrente em pelo

    menos 2% tem sido objeto de numerosas crticas na doutrina que se tem pronunciado sobre

    o tema, a qual tem genericamente considerado que esta cifra poder tornar demasiado

    oneroso o lanamento da OPA Concorrente, criando-se o risco de que em alguns casos a

    OPA Concorrente acabar por no ser lanada por o aumento da contrapartida no

    compensar ao oferente concorrente, o qual at poderia estar disposto a lanar uma OPA

    Concorrente que envolvesse a mesma contrapartida da oferta inicial ou um aumento da

    mesma em percentagem inferior aos 2% definidos na lei ou, alternativamente, disposto a

    abranger um objeto mais alargado, mas com a contrapartida limitada da oferta inicial44.

    Admite-se, nesta sede, que o aumento do objeto da oferta poder por vezes ser mais vivel

    do que o aumento da contrapartida. Com efeito, a partir da avaliao que o oferente faz da

    sociedade visada, estabelece-se um limite ao montante de contrapartida que este estar

    disposto a oferecer por cada ao, pois que a certo ponto a contrapartida oferecida no ser

    compensada pela avaliao que o oferente concorrente faz da ao da sociedade visada. J

    42

    Neste sentido, MANUEL REQUICHA FERREIRA, ob. cit pg. 248. 43 Neste sentido, PAUL DAVIES e KLAUS HOPT, in Control Transactions, The anatomy of corporate law - a comparative and functional approach, Oxford University Press, Nova Iorque, 2004, pp. 137 e ss. 44

    MANUEL REQUICHA FERREIRA, ob.cit, pp. 137 e ss e HUGO MOREDO SANTOS, ob.cit pp. 105 e ss.

  • Miguel Stokes

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    no que respeita ao aumento do objeto da oferta, o mesmo apenas implica uma maior

    despesa inicial do oferente, que ser compensada pela maior participao granjeada na

    sociedade visada, e na correspondente maior parcela de lucros que lhe cabero.

    Sem prejuzo do acima exposto, tendemos a no concordar com as crticas feitas ao regime

    tal como se encontra delineado.

    Com efeito, o legislador ter partido do pressuposto de que at cifra de 2%, a melhoria que

    poderia advir para os acionistas da sociedade visada pela possibilidade de venderem mais

    caro no compensaria o prejuzo que tal causaria para a sociedade visada, em funo do

    aumento do prazo das ofertas, nos termos do artigo 185.-A do Cdigo dos Valores

    Mobilirios, com a consequente extenso dos deveres e limitaes impostos sociedade

    visada nos termos dos artigos 181. e 182 do Cdigo dos Valores Mobilirios,

    respetivamente.

    Adicionalmente, ter tambm o legislador considerado que a exigncia deste intervalo

    mnimo de 2% corresponderia a uma compensao atribuda ao oferente inicial por ter tido

    o esforo (financeiro) de lanamento da oferta inicial - com os correspondentes custos de

    identificao da oportunidade e de auditoria sociedade -, estimando em cerca de 2% do

    valor da oferta os custos acrescidos em que incorreu com o lanamento da oferta inicial, e

    que devero assim ser tambm suportados pelos oferentes concorrentes, sob a forma de

    majorao obrigatria da contrapartida da OPA Concorrente face cifra inscrita na oferta

    inicial.

    A definio de uma majorao mnima comporta sempre o risco de a mesma no refletir

    corretamente o valor econmico da tutela conferida ao oferente inicial. No entanto,

    entendemos que a cifra de 2% representa uma percentagem razovel e adequada face aos

    diferentes interesses que so dignos de tutela, os quais sero idneos a maximizar os

    benefcios gerados por estas operaes de aquisio do controlo societrio.

  • Miguel Stokes

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    5.4.3 A natureza da contrapartida

    Uma ltima questo que caber colocar-se a respeito do requisito da contrapartida na OPA

    Concorrente se o artigo 177. do Cdigo dos Valores Mobilirios, cujo n. 1 estipula que A

    contrapartida pode consistir em dinheiro, em valores mobilirios, emitidos ou a emitir, ou ser

    mista se aplica em toda a sua extenso ao regime da OPA Concorrente por efeito do 185.,

    n. 2, podendo a OPA Concorrente apresentar uma contrapartida em valores mobilirios

    quando a oferta inicial seja em dinheiro.

    Esta questo tanto mais relevante quando frequente a contrapartida oferecida ser total

    ou parcialmente assente em valores mobilirios, dispensando assim o oferente a

    transformar esses valores mobilirios em liquidez para efeitos do lanamento da oferta.

    Como argumentos a favor desta possibilidade temos (i) o facto de a oferta de valores

    mobilirios ser uma contrapartida lcita; (ii) ser possvel determinar o valor dos valores

    mobilirios, nomeadamente com base nos critrios definidos no artigo 188. do Cdigo dos

    Valores Mobilirios45 e de (iii) respeitado o aumento de 2% face oferta antecedente, estar

    preenchido o requisito quantitativo definido por lei para a contrapartida, com a

    consequente salvaguarda dos princpios que lhe subjazem e que se encontram melhor

    descritos em 5.4.2 supra.

    O argumento contra seria, aqui, o de a contrapartida em espcie poder ser considerada

    menos favorvel do que em dinheiro, dada a menor liquidez que est associada aos valores

    mobilirios. De qualquer modo, o artigo 177., n. 3 do Cdigo dos Valores Mobilirios, ao

    fixar que Se a contrapartida consistir em valores mobilirios, estes devem ser de adequada

    liquidez e ser de fcil avaliao, parece aceitar que a contrapartida em valores mobilirios,

    na medida em que preencha estes requisitos, no dever ser considerada menos favorvel

    do que a contrapartida em dinheiro, no procedendo assim o argumento contra a

    possibilidade de a contrapartida da OPA Concorrente ser em valores mobilirios.

    45 Com efeito, apesar de integrante do regime das ofertas pblicas obrigatrias, cremos que as ferramentas de clculo do valor equitativo da contrapartida definidas nos n. 1 e 2 do artigo 188. do Cdigo dos Valores Mobilirios devero ser aplicveis caso se aceite, como parece fazer sentido, que a contrapartida da OPA Concorrente seja em valores mobilirios.

  • Miguel Stokes

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    Finalmente, face ao supra exposto, conclumos por maioria de razo que nada obstar a que,

    sendo a oferta inicial em valores mobilirios, a OPA Concorrente seja em dinheiro.

    6. CONCLUSO

    Feita a anlise, ainda que sumria, dos quatro requisitos substantivos da OPA Concorrente,

    conclumos que, apesar das crticas que os mesmos tm suscitado, o modo como os mesmos

    esto construdos se justifica face ao conjunto de sujeitos cuja posio se visa tutelar.

    Sem prejuzo do exposto, foram identificadas algumas situaes que, na nossa opinio,

    careceriam de uma interpretao mais restritiva ou extensiva - conforme os casos - do que a

    que resulta da mera anlise das normas relevantes de um ponto de vista declarativo e,

    noutros casos, se justificaria uma reviso da prpria redao das normas, por forma a

    melhor tutelar os interesses da multiplicidade de sujeitos envolvidos nos procedimentos de

    ofertas em concorrncia.

    No pretendendo ser exaustivos, podemos sintetizar alguns dos pontos que nos mereceram

    reparos no regime da OPA Concorrente:

    (i) Relativamente ao requisito da identidade do oferente, conclumos que a limitao

    subjetiva de lanamento de OPA Concorrente a todos aqueles que se encontrem com o

    oferente inicial ligados, relativamente sociedade visada, por alguma das causas de

    imputao do artigo 20., n. 1 do Cdigo dos Valores Mobilirios, se revela excessiva e

    inapropriada e, consequentemente, lesiva de um regime de OPAs Concorrentes que se

    pretende o mais favorvel possvel ao lanamento das mesmas. Na nossa opinio,

    apenas a alnea b) do referido artigo constitui uma causa de imputao que justifica a

    restrio de lanamento de OPA Concorrente;

    (ii) Ainda quanto ao ponto supra referido, consideramos que se deveria ponderar, na

    redao do preceito, a atribuio CMVM da capacidade de fazer, in casu, um juzo de

    razoabilidade quanto inibio de lanamento de uma OPA Concorrente, por estar

    verificada uma das causas de imputao supra referidas;

  • Miguel Stokes

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    (iii) No que concerne ao requisito do objeto da oferta, conclumos que nos casos em que o

    oferente concorrente seja j acionista da sociedade visada, se dever ter em conta esta

    especial circunstncia na interpretao dos requisitos em matria de objeto da oferta.

    Para este efeito, entendemos que: (a) no caso em que o oferente concorrente detenha

    uma participao na sociedade visada igual ou inferior diferena entre 100% do capital

    social e o objeto da oferta inicial, o objeto da OPA Concorrente dever ser, pelo menos,

    igual ao da oferta inicial; e (b) no caso em que o oferente concorrente detenha uma

    participao na