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1 ENTRAVES NA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS INDÍGENAS NO BRASIL André Luiz Carvalho Greff 1 [email protected] Antonio H. Aguilera Urquiza 2 [email protected] RESUMO: Pretende-se neste artigo analisar alguns direitos dos povos indígenas, previstos na Constituição Federal do Brasil, bem como em Tratados de Direito Internacional, como a Convenção 169 da OIT Organização Internacional do Trabalho e as razões pelas quais esses direitos, mesmo previstos em leis brasileiras, não vem sendo efetivados na prática. Seguindo o método dedutivo, pretende-se extrair uma compreensão a respeito das razões da não efetividade dos direitos indígenas no Brasil, apontando-se diretrizes para uma mudança de percepção dos legisladores brasileiros, quando pretenderem reformular certos dispositivos legais, com vistas a beneficiar essas populações. PALAVRAS-CHAVE: Direitos indígenas; Efetividade dos direitos indígenas; Estados plurinacionais. LA DIFICULTAD DE EFECTIVACION DE LOS DERECHOS INDÍGENAS EN BRASIL RESUMEN: Se pretende en este artículo analizar algunos derechos de los pueblos indígenas, en la Constitución Federal de Brasil, así como los tratados de derecho internacional, como el Convenio 169 de la OIT - Organización Internacional del Trabajo y las razones por las cuales estos derechos, incluso dentro de las leyes en Brasil, no se han efectuado en la práctica. Siguiendo el método deductivo se pretende dibujar un entendimiento acerca de las razones de la no efectividad de los derechos indígenas en Brasil, señalando directrices para un cambio de la percepción de los legisladores brasileños, cuando tengan la intención de reformular determinadas disposiciones legales, con el fin de beneficiar a estas poblaciones. PALABRAS-CLAVE: Derechos indígenas; Efectividad de los derechos indígenas; Estados plurinacionales. 1 Mestrando em direitos humanos da UFMS Fadir Campo Grande MS. 2 Doutor em Antropologia (Universidade de Salamanca). Professor da Pós-Graduação em Direitos Humanos da UFMS e professor colaborador das Pós-graduações em Antropologia (UFGD) e de Educação (UCDB).

ENTRAVES NA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS INDÍGENAS NO BRASIL · com a primeira nau, já encontrou no Brasil, seus antigos habitantes, os povos indígenas. Durante os séculos seguintes,

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ENTRAVES NA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS INDÍGENAS NO

BRASIL

André Luiz Carvalho Greff1

[email protected]

Antonio H. Aguilera Urquiza2

[email protected]

RESUMO:

Pretende-se neste artigo analisar alguns direitos dos povos indígenas, previstos na Constituição

Federal do Brasil, bem como em Tratados de Direito Internacional, como a Convenção 169 da

OIT – Organização Internacional do Trabalho e as razões pelas quais esses direitos, mesmo

previstos em leis brasileiras, não vem sendo efetivados na prática. Seguindo o método dedutivo,

pretende-se extrair uma compreensão a respeito das razões da não efetividade dos direitos

indígenas no Brasil, apontando-se diretrizes para uma mudança de percepção dos legisladores

brasileiros, quando pretenderem reformular certos dispositivos legais, com vistas a beneficiar

essas populações.

PALAVRAS-CHAVE: Direitos indígenas; Efetividade dos direitos indígenas; Estados

plurinacionais.

LA DIFICULTAD DE EFECTIVACION DE LOS DERECHOS

INDÍGENAS EN BRASIL

RESUMEN:

Se pretende en este artículo analizar algunos derechos de los pueblos indígenas, en la Constitución

Federal de Brasil, así como los tratados de derecho internacional, como el Convenio 169 de la

OIT - Organización Internacional del Trabajo y las razones por las cuales estos derechos, incluso

dentro de las leyes en Brasil, no se han efectuado en la práctica. Siguiendo el método deductivo

se pretende dibujar un entendimiento acerca de las razones de la no efectividad de los derechos

indígenas en Brasil, señalando directrices para un cambio de la percepción de los legisladores

brasileños, cuando tengan la intención de reformular determinadas disposiciones legales, con el

fin de beneficiar a estas poblaciones.

PALABRAS-CLAVE: Derechos indígenas; Efectividad de los derechos indígenas; Estados

plurinacionales.

1 Mestrando em direitos humanos da UFMS – Fadir – Campo Grande – MS. 2 Doutor em Antropologia (Universidade de Salamanca). Professor da Pós-Graduação em Direitos

Humanos da UFMS e professor colaborador das Pós-graduações em Antropologia (UFGD) e de Educação

(UCDB).

2

SUMÁRIO:

Introdução. 1. Breve histórico da proteção do direito indígena no Brasil. 2 Direito indigenista

versus direito indígena. 3. Dificuldades do novo constitucionalismo indígena. Conclusão.

Referências bibliográficas.

SUMARIO:

Introducción. 1. Breve historia de la protección de los derechos indígenas en Brasil. 2 Derecho

indígena frente al derecho indígena. 3. Las dificultades del nuevo constitucionalismo indio.

Conclusión. Referencias bibliográficas.

Introdução

Analisando-se a situação dos povos indígenas no Brasil é fácil perceber que

vivem condições de constante luta para se afirmarem enquanto povos distintos, serem

partícipes dos processos democráticos, integrarem cargos políticos, terem as terras que

necessitam para viverem com dignidade e respeito.

Normalmente os indivíduos indígenas são denominados simplesmente por

‘índios’. Grande parcela da população brasileira desconhece que essa denominação, por

si só, é equivocada. Isso porque no Brasil existem cerca “de mais ou menos 283 povos

indígenas distintos, habitando centenas de aldeias localizadas em praticamente todos os

estados da Federação. Vivem em 628 terras indígenas descontínuas, totalizando 12,54%

do território nacional” (VIEIRA, 2013, p. 13). Cada povo detendo sua diversidade étnica,

linguística, costumes e tradições, sendo tão diferentes entre si, como o são, por exemplo,

os brasileiros e os argentinos.

Desde a ocupação portuguesa, quando Cabral aportou em terras brasileiras

com a primeira nau, já encontrou no Brasil, seus antigos habitantes, os povos indígenas.

Durante os séculos seguintes, persistiu-se na ideia de que esses povos deveriam ser

conduzidos às práticas e costumes do colonizador, abdicando de seus hábitos, de suas

línguas, de suas tradições. Na verdade, os povos indígenas que se rebelavam contra isso

foram sendo gradativamente dizimados.

Só mesmo recentemente, as Constituições do Brasil passaram a contemplar

de uma forma mais ou menos ampla, os direitos indígenas, enxergando e tentando

proteger seus costumes e suas tradições. Contudo, o que se nota é que o texto legal é belo,

mas a sua eficácia no dia a dia dos povos indígenas, é pouca e limitada. Ainda se lê com

bastante frequência, notícias sobre conflitos indígenas, sobretudo na luta por terras, uma

vez que alguns povos jazem circunscritos a pequenos espaços, pois que foram sendo

gradativamente expulsos de onde originalmente viviam, pelo branco invasor.

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Também se nota uma dificuldade dos habitantes das cidades brasileiras,

enxergarem os povos indígenas como merecedores de respeito, como cidadãos

brasileiros, com seus saberes, com suas culturas, com seus costumes, denotando-se, não

raro, um preconceito mal disfarçado, seja nos comentários, seja no trato, quando lidam

com integrantes dos povos indígenas.

O objetivo deste artigo é analisar por que o constitucionalismo brasileiro,

apesar de contemplar o direito indígena, vem falhando na efetividade desses direitos. Por

que, apesar de o artigo 231 da Constituição Federal de 1988 contemplar diversos direitos

indígenas, não se nota, na vida cotidiana dos povos indígenas, que estejam sendo

atendidos em suas reivindicações, quase sempre vivendo na dependência do apoio da

FUNAI – Fundação Nacional do Índio e de organizações governamentais diversas.

Apresenta-se breve histórico do direito indígena no Brasil, depois acentua-se

a diferença entre direito indigenista para direito indígena, apontando-se as dificuldades

do novo constitucionalismo de proteção aos povos indígenas e por fim, apresentam-se

sugestões para tornar efetivo aquilo que a Lei Maior contempla, mas não vem efetivando,

de maneira convincente aos contemplados por tais normas.

1. Breve histórico da proteção do direito indígena no Brasil

Pesquisando-se a história de proteção aos povos indígenas no Brasil, o

estudioso descobre que em quinhentos anos, desde o descobrimento do Brasil pelos

portugueses, como bem acentua Lopes (2014), os governantes interpretavam os indígenas

“como categorias transitórias ou em extinção”. Ou esperavam que os povos indígenas

abdicassem de tudo que se relacionasse ao seu modus vivendi e aderissem aos costumes

ditos “civilizados”, ou simplesmente trabalharam no sentido da extinção dos povos

indígenas renitentes a tais investidas.

Desde o descobrimento do Brasil, os portugueses estabeleceram uma

distinção clara entre os indígenas: os agressivos e os não agressivos. E criaram formas

distintas de lidarem com tais grupos, como bem explica, Danielle Bastos Lopes:

No período colonial, por exemplo, ao analisarmos brevemente sua

legislação, é notória a diferenciação feita pela Coroa Portuguesa entre

duas categorias: os índios amigos e os inimigos ou bravos (BEOZZO,

1983). Os primeiros eram os índios que atendiam aos interesses da

Coroa e trabalhavam como escravos para as colônias, e os segundos

eram os resistentes à catequese e à ‘civilização’. Em relação aos índios

‘amigos’, havia uma política intitulada ‘descimento’. O descimento era

o processo de persuasão dos índios, sem a utilização de ‘violência’, a se

deslocarem de suas terras originais para as aldeias localizadas na

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cercania das colônias portuguesas, isto é, os aldeamentos propriamente

ditos. (LOPES, 2014, p. 86).

Narra a autora que os tais descimentos “[...] foram incentivados e constantes

desde o Regimento de Tomé de Sousa, de 1547, até o Diretório Pombalino de 1757.”

(LOPES, 2014, p.86). Mas era uma falsa liberdade a concedida aos indígenas aldeados,

que se submetiam à vontade da Coroa, uma vez que tinham de se submeter ao trabalho

compulsório e resignado aos colonos, começando aí um longo processo de

descaracterização dos povos indígenas.

Havia, segundo narra Lopes (2014), momentos em que extrema violência era

permitida contra os indígenas, por períodos que foram denominados de “Guerra Justa”,

que consistia simplesmente na captura dos indígenas hostis ou eliminação daqueles que

resistissem, sendo que em punição às rebeliões, a Coroa Portuguesa decretou ainda a

chamada Lei de Liberdade nos anos de 1609, 1680 e 1755, quando não se fazia distinção

entre indígenas hostis e não hostis e a violência atingia a todos.

A escravidão indígena, ao menos oficialmente, perdurou no Brasil até o final

do século XVIII, quando foi abolida pelo Marquês de Pombal. Mas há evidências que

comprovam que a escravidão indígena perdurou até o final do século XIX. Já a escravidão

dos africanos começou desde o século XVI.

Seguindo o texto de Lopes (2014), constata-se que a primeira Constituição do

Império do Brasil, que foi outorgada por Dom Pedro I, isso em 24 de março de 1824, não

teve participação popular e nem teve qualquer referência aos povos indígenas. Apenas o

Ato Adicional de 1834 veio dispor que era da competência legislativa das províncias, a

catequese e civilização dos indígenas.

Nessa época, em pleno século XIX, havia duas visões a respeito dos povos

indígenas, amplamente disseminadas na sociedade brasileira:

Tínhamos, de um lado, Francisco Adolfo Varnhagem (1806 – 1878), o

Visconde de Porto Seguro, que defendia a necessidade da sujeição dos

índios à força brasileira em benefício da consolidação das fronteiras do

Império. E, de outro, José Bonifácio de Andrada e Silva (1763 – 1838),

autor do documento Apontamentos para a Civilização dos Índios

Bravos do Brasil, que defendia a obrigação moral do Império em

prover-lhes condições para seu ingresso no projeto de unidade nacional.

(LOPES, 2014, pág. 88).

Também a Constituição Republicana de 1891 nenhuma menção fez aos povos

indígenas. Vigorava uma visão positivista, equivocada, segundo a qual os indígenas

seriam ‘sub-raça’, havendo quem defendesse que devido ao seu modo de vida diferente

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dos ditos civilizados, deveriam ser ‘assimilados’ e, caso não fosse possível, eliminados.

Essa era a filosofia da recém-criada República para os povos indígenas.

A primeira Constituição Brasileira a mencionar os indígenas, foi a de 1934,

que de forma lacônica, em seu artigo 5º., inciso XIX, estabeleceu: “Será respeitada a posse

de terras de silvícolas que nelas se achem permanentemente localizados, sendo-lhes, no

entanto, vedado aliená-las.”. O que foi mantido em texto semelhante, na Constituição de

1937, como o regime ditatorial de Getúlio Vargas, cujo artigo 15, estabeleceu: “Será

respeitada aos silvícolas a posse das terras em que se achem localizados em caráter

permanente, sendo-lhes, porém, vedada a alienação das mesmas”.

Como se vê, nenhum desses textos referiu-se a esses povos como povos

indígenas. Referiu-se aos mesmos como ‘silvícolas’. O que é significativo e demonstra

uma percepção geral e subliminarmente equivocada, de que todo habitante das matas fazia

parte de um mesmo grande grupo, amorfo e indistinguível.

Eis que a Constituição de 1946, foi a primeira a, de maneira mais clara,

estabelecer uma política aos povos indígenas. Seu artigo 5º, inciso XV, estabelecia:

“Compete à União: (...) legislar sobre (...) incorporação dos silvícolas à comunhão

nacional”.

Essa ideia de incorporação, de assimilação, foi inclusive a tônica usada na

Convenção n. 107, de 05 de junho de 1957, da OIT – Organização Internacional do

Trabalho, nos seguintes termos: “Concernente à proteção e integração das populações

indígenas e outras populações tribais e semitribais de países independentes”. Essa tônica

tem por base o conceito da aculturação, da Antropologia Cultural Americana e o conceito

da assimilação, da Antropologia Social Inglesa, conceitos que concebiam a cultura como

algo dado e estático, portanto, factível de se perder. A partir desta concepção, os índios

deveriam deixar sua cultura para serem integrados à sociedade nacional.

Até aqui, seguindo-se apontamentos de Lopes (2014), ainda pontua a autora

que em seguida novo golpe militar ocorreu no Brasil, sendo imposta uma nova

Constituição, a de 1967, no dia 24 de janeiro. Paradoxalmente, essa foi a Constituição

que, até então, maior atenção dava aos indígenas, sendo que as terras ocupadas pelos ditos

‘silvícolas’ passaram a ser expressamente incluídas como bens da União (no artigo 4º.,

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inciso IV), e assegurou-se aos índios os direitos ao usufruto exclusivo dos recursos

naturais dessas terras (artigo 186).

Entretanto, a intenção do Governo brasileiro era contar com o apoio indígena

para delimitar áreas de fronteira. Como os povos indígenas conheciam e habitavam esses

locais, era interessante assegurar-lhes garantia de posse sobre tais áreas, sempre sob a

supervisão do Exército Brasileiro.

Em seguida veio a Emenda Constitucional de 1969, que inovou,

estabelecendo em seu artigo 198 a inalienabilidade das terras habitadas por silvícolas.

Sempre lembrando que essa expressão, ‘silvícolas’, também constou do antigo Código

Civil de 1916, que inclusive colocava os indígenas sob a condição de ‘incapazes’,

comparando-os aos jovens menores de 21 anos e aos pródigos, diferentemente do novo

Código Civil, de 2002, cujo artigo 3º, parágrafo único, deixa ao critério de lei especial a

abordagem e tratamento da capacidade para os atos da vida civil, dos povos indígenas.

Em 19 de dezembro de 1973 foi sancionado o Estatuto do Índio, Lei 6.001,

valendo citar, na íntegra, os seus artigos 1º. e 2º.:

Art. 1º Esta Lei regula a situação jurídica dos índios ou silvícolas e das

comunidades indígenas, com o propósito de preservar a sua cultura e

integrá-los, progressiva e harmoniosamente, à comunhão nacional.

Parágrafo único. Aos índios e às comunidades indígenas se estende a

proteção das leis do País, nos mesmos termos em que se aplicam aos

demais brasileiros, resguardados os usos, costumes e tradições

indígenas, bem como as condições peculiares reconhecidas nesta Lei.

Art. 2° Cumpre à União, aos Estados e aos Municípios, bem como aos

órgãos das respectivas administrações indiretas, nos limites de sua

competência, para a proteção das comunidades indígenas e a

preservação dos seus direitos:

I - estender aos índios os benefícios da legislação comum, sempre que

possível a sua aplicação;

II - prestar assistência aos índios e às comunidades indígenas ainda não

integrados à comunhão nacional;

III - respeitar, ao proporcionar aos índios meios para o seu

desenvolvimento, as peculiaridades inerentes à sua condição;

IV - assegurar aos índios a possibilidade de livre escolha dos seus meios

de vida e subsistência;

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V - garantir aos índios a permanência voluntária no seu habitat,

proporcionando-lhes ali recursos para seu desenvolvimento e

progresso;

VI - respeitar, no processo de integração do índio à comunhão nacional,

a coesão das comunidades indígenas, os seus valores culturais,

tradições, usos e costumes;

VII - executar, sempre que possível mediante a colaboração dos índios,

os programas e projetos tendentes a beneficiar as comunidades

indígenas;

Nota-se, ainda, uma postura integracionista dos povos indígenas. A ideia era

ver os povos indígenas convivendo junto com a população brasileira, dita ‘civilizada’,

praticando os mesmos atos comuns, aderindo aos mesmos costumes, renunciando por

certo ao seu modus vivendi, aos seus costumes, às suas crenças, aos seus hábitos.

Apesar de ainda estar em vigor, o Estatuto do Índio contempla uma política

ultrapassada, se comparado em seus propósitos com a atual Constituição de 1988, que

reservou um capítulo inteiro para o tratamento dos povos indígenas, no caso o capítulo

VIII, que recebeu, pela primeira vez, o nome “Dos Índios”, estabelecendo o caput do seu

artigo 231, o seguinte:

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes,

línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que

tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e

fazer respeitar todos os seus bens.

E nos parágrafos que seguem esse artigo, protegeu-se, finalmente, de forma

ampla a posse permanente, por parte dos indígenas, de suas terras tradicionalmente

ocupadas, assegurando-se o direito à extração de recursos, necessários para a

sobrevivência dos mesmos.

A Constituição Federal não dividiu os povos indígenas em: I – Isolados; II –

Em vias de integração; e III – Integrados. Afastou a visão da integração forçada dos povos

indígenas, reconhecendo o direito de continuarem sendo índios, com seus costumes, suas

tradições, sua organização social, línguas e crenças (cf. GUTIERREZ, 2013, pág. 296).

O Brasil ainda promulgou a Convenção 169, da OIT – Organização

Internacional do Trabalho, por meio do Decreto nº 5.051, de 19 de abril de 2004,

legislação importantíssima para os povos indígenas, que contempla diversos direitos,

além do respeito aos costumes e práticas, tais como: direito à livre organização e definição

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de prioridades, direito ao respeito aos costumes ou leis consuetudinárias, direito à

intérprete em caso de processamento por crimes etc.

Como bem lembra Gutierrez (2013, p. 297):

Essa Convenção foi o primeiro instrumento internacional a tratar

dignamente dos direitos coletivos dos povos indígenas, estabelecendo

padrões mínimos a serem seguidos pelos Estados e afastando o

princípio da assimilação e da aculturação no que diz respeito a esses

povos.

Todos esses direitos foram, ainda, reafirmados na Declaração das Nações

Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, de 13 de setembro de 2007, que ainda não

foi ratificada por meio de lei, pelo Brasil, mas que estabelece, entre outros direitos,

inclusive a possibilidade de os povos indígenas terem autonomia e autogoverno (artigo

4), em questões relacionadas ao seu convívio interno e local.

Nota-se, comparando a legislação anterior à Constituição Federal de 1988,

bem como à Convenção 169, uma mudança radical no tratamento dos povos indígenas,

que de tutelados pelo Estado brasileiro, de objeto de políticas integracionistas fadadas ao

insucesso, passaram a ter uma perspectiva real de autonomia e autodeterminação, não se

podendo confundir ambos os direitos, pois como bem pontuam Amado e Amado (2011):

O princípio da autoderminação dos povos indígenas parece se confundir

com o da autonomia, mas são diretrizes diferentes. Enquanto que o

princípio da autonomia visa assegurar que a participação e o

desenvolvimento dos povos indígenas de acordo com suas

cosmovisões, o princípio da autoderterminação informa que os povos

indígenas podem eles mesmo gerir, traçar suas metas e conduzir seus

projetos sem nenhuma intervenção, política, assistência ou ação

indigenista por parte do Estado ou qualquer terceiro não-índio.

(AMADO e AMADO, 2011, pág. 3).

Houve, então, uma mudança de paradigma, uma guinada epistemológica, em

que passou-se de uma concepção de integração, para a concepção de que os indígenas

são cidadãos brasileiros e o Estado passa a “reconhecer” seus direitos à cultura, territórios

tradicionais e à língua, assim como a possibilidade do reconhecimento do direito

indígena, também conhecido como direito consuetudinário indígena.

2. Direito indigenista versus direito indígena

O direito indigenista representa toda essa legislação estatal, anterior à

Constituição Federal de 1988 e à Convenção 169, que insistia em uma política

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integracionista dos povos indígenas, sem ouvi-los. Trata-se de uma legislação elaborada

por não-índios para os povos indígenas, na expectativa declarada ou não declarada, de

que os indígenas abdicassem de seus costumes, de suas crenças e passassem a viver como

vivem os demais habitantes do Brasil.

Já quando se trata de direito indígena, pensa-se na preservação dos costumes

indígenas, pensa-se em ouvi-los se desejam mesmo se integrar aos costumes dos

chamados homens-brancos, ou se desejam manter os seus costumes, as suas tradições

originais, o seu direito consuetudinário. Trata-se de enfoque polêmico, na medida em que

há indisfarçável incômodo por parte das autoridades legais brasileiras em se admitir um

direito consuetudinário indígena, uma vez que por centenas de anos partiram de uma

compreensão equivocada, de que os povos indígenas eram bárbaros, aculturados,

incapazes de conceber um sistema legal costumeiro.

Tal incapacidade de se vislumbrar toda a diversidade de costumes, práticas e

comportamentos, por parte da dita sociedade ‘civilizada’ brasileira é um dos motivos da

dificuldade que se encontra hoje, de se implementar, de se efetivar os direitos

contemplados na Constituição Federal de 1988, aos povos indígenas.

Citado por Luiz Henrique Eloy Amado e Simone Eloy Amado, em seu artigo,

o Desembargador Francisco das Chagas Lima Filho escreveu importante texto em que

acentua algumas diferenças antropológicas entre os hábitos dos povos indígenas em

confronto com os hábitos do colonizador, que por sua relevância, vale à pena novamente

reproduzir:

Pode-se afirmar que o direito indígena antes do período da colonização

tinha como princípios básicos:

a) da prioridade dos interesses coletivos sobre os interesses individuais;

b) da responsabilidade coletiva;

c) da solidariedade; e,

d) da reciprocidade;

Com relação ao princípio da prioridade ou prevalência dos interesses

coletivos sobre os individuais pode-se dizer que ele se revela na

autoridade do chefe que tem como base os interesses da coletividade. O

líder somente permanece no poder enquanto os seus subordinados se

sentem beneficiados.

Assim, os interesses da comunidade são mais importantes e se

sobrepõem aos interesses ou direitos individuais. Por isso, os delitos

considerados mais graves eram aqueles que ameaçavam ou atingiam

aos sentimentos e aos interesses gerais merecendo, portanto, esse tipo

de infração, maior atenção por parte dos líderes na forma da punição,

caracterizando o direito penal público, enquanto os demais crimes que

envolviam pessoas individualmente consideradas, sem causar

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transtornos aos interesses gerais eram solucionados no âmbito

interpessoal ou interfamiliar caracterizando o direito penal privado.

Como se vê, havia dois tipos de direito penal: a) o direito penal público,

ligado à violação dos interesses ou direitos da coletividade e b) o direito

penal privado, que dizia respeito ao interesse ou direito individual. Por

isso, muitos dos delitos hoje considerados graves pelo direito penal

moderno, como o infanticídio, o aborto, a morte, o abandono dos idosos

e a eutanásia não eram considerados crimes, na medida em que eram

praticados por interesse de sobrevivência de todo o grupo, portanto, no

interesse coletivo, ao contrário do estupro que era tido como um delito

grave porque ofendia a todo o grupo familiar e não a própria vítima,

enquadrado, portanto, entre aqueles delitos de que se preocupava o

direito penal público.(1). (LIMA FILHO, 2007).

Os povos indígenas cultivavam outros valores, antes do colonizador levar a

termo um brutal processo de ‘descimento’, como se denominou nos primórdios, durante

os primeiros contatos com os habitantes que já viviam no Brasil. E, após séculos desde a

colonização, ainda há povos indígenas que mantiveram mais ou menos a salvo esses

costumes, não esquecendo de alguns grupos ainda em situação de isolamento.

A sociedade brasileira desenvolveu outra matriz cultural, com outros valores

e outros costumes. No lugar de valorizar o interesse coletivo, os indivíduos valorizam o

interesse privado; em vez da responsabilidade coletiva, nossa justiça busca individualizar

a culpa; a solidariedade e a reciprocidade são anseios de pequenos grupos, que encontram

imensa dificuldade em divulgar tais princípios, sobretudo em época de globalização e

forte individualismo.

Dessa forma, não é difícil compreender por que se levou tanto tempo para se

enxergar que os povos indígenas possuem outra maneira de interpretar o mundo, outra

maneira de compreender o que é direito, outra maneira de existir, em essência.

Importante salientar que a mudança na legislação, o processo de

enriquecimento do direito indigenista até se vislumbrar o direito indígena, foi

acompanhado por uma intensa movimentação dos povos indígenas, no sentido de

reivindicar essas mudanças. As alterações levadas a efeito na Constituição Federal de

1988 foi antecedida pela criação da União das Nações Indígenas (UNI), a primeira

entidade associativa organizada exclusivamente por indígenas, para cuidar dos seus

interesses.

Como acentua Lima Filho (2007):

Os movimentos indígenas vêm colocando de maneira crescente o

reconhecimento, a vigência e os privilégios de um direito próprio que

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regule a vida social indígena. Essa luta, essa reclamação é um meio para

opor-se a uma ordem normativa que teima em não reconhecer a

diversidade e que penaliza as práticas que a constituem e se funda na

ideia de que o direito é uma estratégia do Estado para dissolver as

particularidades dos povos e assegurar, pelo uso da coerção as

condições do exercício da hegemonia, como acertadamente nos lembra

Roberto Aguiar no seu Livro Direito, Poder e Opressão.

Essas associações, juntamente com outras, mistas, mas que souberam

entender a diversidade indígena, como o CIMI – Conselho Indigenista Missionário,

organização vinculada a CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, fundada

em 1972, vieram engrossar fileiras em uma luta em prol do reconhecimento do direito

indígena, com todas as suas consequências, até mesmo a aceitação da existência de

territórios protegidos da intromissão do Estado brasileiro, um Estado que durante séculos

julgou mais correto forçar os povos indígenas a renunciar aos seus costumes, às suas

terras, à sua visão de mundo.

Contudo, é importante refletir sobre as razões pelas quais esse novo

constitucionalismo indígena ainda não tem sido efetivado, na prática, como passa-se a

analisar.

3. Dificuldades do novo constitucionalismo indígena

Contemplando-se a luta dos povos indígenas por terra, bem como a luta pelo

reconhecimento do seu direito consuetudinário, entre outros direitos que o Estado

brasileiro prevê em suas leis, mas não tem alcançado os povos indígenas, é preciso

investigar as razões pelas quais, apesar da previsão legal na Constituição Federal de 1988

(artigo 231), os povos indígenas ainda vivem com extrema dificuldade, a margem da

sociedade dita ‘civilizada’.

O que se nota, é que apesar de a Constituição Brasileira contemplar o direito

indígena de forma mais ampla do que em textos anteriores, apesar de o Brasil ter

ratificado a Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho,

infelizmente tal sensibilidade legislativa não foi acompanhada por uma efetivação desses

direitos. Sendo que Ramírez (2010, p. 280) aponta algumas características do novo

constitucionalismo indígena, suas qualidades e seus defeitos, valendo citar:

A – Uma insuficiência do reconhecimento constitucional dos direitos

indígenas, como hábil a garantir a efetividade dos mesmos. A partir dos anos 1980 e

durante a década de 1990, ocorreram na América Latina importantes alterações

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constitucionais, em países como Colômbia (1991), Peru (1993), Bolívia (1994), Equador

(1998), Argentina (1994) e Brasil (1988), garantindo importantes direitos aos povos

indígenas, mas infelizmente tais direitos seguem ainda sem serem, em sua maior parte,

implementados na prática, acentuando Silvina Ramírez (2010, p. 275):

Sin embargo, a pesar de este avance normativo complementado con el

Convenio 169 de la OIT ya ratificado por numerosos países y la más

recentemente aprobada Declaración de las Naciones Unidas sobre

pueblos indígenas, la construcción del ya tan discutido Estado

intercultural y multinacional sigue siendo una tarea inconclusa y un

desafio.

O que significa dizer que o texto constitucional avança em termos jurídicos e

normativos, mas a vida dos povos indígenas continua sendo difícil e com seus direitos

básicos desrespeitados. No Brasil, vê-se uma luta constante em algumas regiões, por mais

terras, uma falta de respeito pelos costumes indígenas e ainda a ausência de

representatividade indígena junto aos poderes constituídos. Por mais que as Constituições

contemplem direitos indígenas, isso não foi capaz de implementar uma mudança

verdadeira na distribuição dos poderes dentro dos países, com representantes indígenas

(RAMÍREZ, 2010, pág. 276).

B – As Constituições da Bolívia e do Equador como modelos alternativos

daquelas que traduzem estados multinacionais. Diferentemente dos demais países da

América Latina, nota-se que nesses dois países houve um genuíno esforço de não apenas

contemplar direitos indígenas em seus textos constitucionais, de não apenas atribuir uma

hierarquia superior aos tratados internacionais de direitos humanos, mas também de se

criar mecanismos para garantir uma efetiva partilha do poder, das decisões, dentro dos

Estados citados, com os povos indígenas.

En el caso de Ecuador, en el capítulo del título segundo del nuevo texto

constitucional se contemplan los derechos de las comunidades, pueblos

y nacionalidades. Se reconocen multitud de derechos coletivos, tales

como los de identidade, no discriminación, propiedad imprescritible de

sus tierras comunitárias, uso, usufructo y administración de los recursos

naturales, consulta previa, libre e informada. Asimismo, se expressa el

reconocimiento de sus propias formas de convivência y organización

social y ejercicio de autoridade. Contempla la aplicación del derecho

consuetudinário que no vulnere los derechos constitucionales y la

posibilidad de construir y mantener las organizaciones que los

representan, entre otros derechos.

Del mismo modo, la nueva Constituición Política del Estado boliviano

dedica un capítulo – entre todas las referencias mencionadas a lo largo

del texto – a los derechos de las naciones y pueblos indígenas

originários campesinos.

(...)

13

En la Constitución boliviana, el Poder Legislativo contempla una

representación amplia que incluye a los pueblos indígenas como

componentes obligatorios del Parlamento. (RAMÍREZ, 2010, págs. 278

– 279).

Ou seja, as Constituições da Bolívia e do Equador, asseguraram não apenas a

previsão legal, mas impuseram o implemento desses direitos na prática, chamando os

povos indígenas para assumirem papel preponderante na condução do governo e por isso,

passam a ser consideradas Constituições de Estados Multinacionais.

C – Falta uma qualidade programática e operativa dos direitos, falta a

capacidade de execução de sentenças que venham proteger direitos indígenas, há uma

linguagem jurídica muito retórica e pouco prática no sentido da efetivação dos direitos.

Como explica Silvina Ramírez (2010, p. 284):

Las constituciones más recientes, en el afán de ampliar las categorias

de derechos protegeidos, han incorporado no solo los tratados

internacionales a sus textos – en su mayoría con jerarquia constitucional

– sino una multitud de temas que generan una suerte de “retórica

constitucional” que provoca el desafio de traducirla a prácticas

concretas.

A lo que se le suma un linguaje normativo que siempre ha sido

refractario a una mejor comprensión de los derechos que se regulan. En

otras palavras, este linguaje técnico y específico no transmite

claramente en un vocabulário simple caules son las garantias

contempladas en la constitución, generando no solo abismos entre el

texto y los ciudadanos sino convirtiendo a la própria constitución en

ideales regulativos más que en herramientas transformadoras.

Resumindo, os textos constitucionais são elaborados em linguagem retórica e

complexa, não transmitindo exatamente o alcance desejado, a abrangência de proteção

aos direitos dos povos indígenas. Há uma dificuldade em se transformar a retórica legal,

em ferramentas que tornem eficazes e efetivos os direitos previstos constitucionalmente.

No Brasil há, portanto, um hiato entre aquilo que preconiza a Lei Maior e a vida cotidiana

dos povos indígenas brasileiros, que não conseguem fazer ecoar o seu pleito às instâncias

institucionais e legais brasileiras.

D - Há uma preponderância da vontade popular enquanto uma maioria

uniforme, enquanto o ideal seria que houvesse pactos entre os povos. As constituições

dos países da América Latina, inspiraram-se na primeira Constituição dos Estados

Unidos, que nasceu com a proposta de proteger a vontade popular. Houve, então, um

pacto entre diversos setores, para que se aprovasse o texto constitucional com inspiração

no modelo norte americano, sendo os povos indígenas que habitavam originariamente as

terras dos Estados, consumidos nesse amálgama de ideal abrangente, quando era

14

imperioso contemplar também os povos indígenas, estabelecendo pactos que protegessem

seus direitos, sua diversidade, seus costumes.

O mesmo foi feito na América Latina, ou seja, excetuando-se a Bolívia e o

Equador, há nos textos constitucionais, sobretudo o brasileiro, um ideal de dissolver

individualidades no mesmo amálgama da dita vontade popular, na simples denominação

“povo”, quando deveriam ter excetuado os povos indígenas, promovendo com os

mesmos, pactos, acordos, que garantissem efetivamente a proteção dos seus direitos. Em

outras palavras, a Constituição Federal de 1988 avançou muito em relação à forma como

o estado brasileiro tratava anteriormente os povos indígenas. No entanto, poderia ter

avançado mais, na direção do que fizeram, já no século XXI, a Bolívia e o Equador, os

quais reconheceram o direito consuetudinário indígena, suas formas de poder e

organização política.

Conclusão

A luta pela previsão constitucional dos direitos dos povos indígenas,

contemplando não apenas a proteção do Estado brasileiro, mas também o reconhecimento

de sua diversidade, de seus costumes, de sua heterogeneidade, bem como a proteção de

suas terras, é apenas o começo. É preciso lutar também para a efetividade desses direitos.

Da forma como está, o texto constitucional brasileiro ainda não é o ideal, uma

vez que não estabeleceu a participação efetiva dos diversos representantes dos povos

indígenas nas estruturas de poder, organizadas no Brasil.

O neo-constitucionalismo indígena avançou muito, mas esbarrou em um

velho costume brasileiro de não se cumprir o que determina a lei, ou ainda, pior, fingir

que se cumpre, que se respeita o que determina a lei. Não se estabeleceu nenhum roteiro

programático para o implemento dos direitos dos povos indígenas, contemplados no

artigo 231 da Constituição Federal de 1988, e tampouco se buscou criar políticas para o

cumprimento da Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho,

ratificada pelo Brasil, por meio do Decreto números 5.051, de 19 de abril de 2004.

De outra sorte, há um hiato entre o que determina o texto constitucional o que

se aplica na prática, em se tratando de decisões judiciais. Os juízes aplicam, ainda, o

Estatuto do Índio, em sua visão integracionista. Ou ignoram completamente os costumes

e o direito consuetudinário indígena, mesmo quando apontados em laudos antropológicos.

15

Isso ocorre, no tocante à Convenção 169, uma vez que:

[...] por serem documentos de princípios, as Declarações representam

apenas obrigação moral, ou no máximo política, aos Estados

conveniados (BOBBIO, 2004). Consequentemente, os povos indígenas

se veem permanentemente forçados a se mobilizar para ter incorporados

seus direitos na legislação interna de cada país. (URQUIDI; TEIXEIRA

e LANA, 2008, pág. 205).

Há, também, que se colocar os tratados de direitos humanos, pactuados e

ratificados pelo Brasil, em uma hierarquia legal superior, pois no Brasil parecem possuir,

nas impressões particulares dos julgadores, posição inferior às leis ordinárias.

Defende-se neste artigo a revogação do Estatuto do Índio e a aprovação de

um novo texto legal substitutivo, que contemple os direitos previstos na Constituição de

1988 e na Convenção 169. Um novo Estatuto dos Povos Indígenas, em vez de Estatuto

do Índio, lei que estabelecerá inclusive um conteúdo programático de medidas e políticas

que serão implementadas, prevendo-se a participação efetiva de representantes indígenas

dos diversos povos indígenas brasileiros, nas esferas do Poder Legislativo, Executivo e

Judiciário.

Anseia-se que esse texto legal, de uma vez por todas, estabeleça mecanismos

para a resolução de conflitos por terras, entre povos indígenas e fazendeiros ou posseiros.

Vinculando recursos orçamentários para a indenização aos proprietários que

eventualmente tiverem suas terras desapropriadas, por serem originariamente integrantes

dos territórios indígenas.

Só assim poderá se almejar a existência de um efetivo direito indígena, em

substituição ao mero direito indigenista, pelo qual lutam os povos indígenas brasileiros.

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16

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