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entretenimento e publicidade: presente ou futuro? São Bern@rdo.com.br Revista Acadêmica do Grupo Comunicacional de São Bernardo www.metodista.br/unesco/GCSB/index.htm Ano 1 - nº 1 - (janeiro/junho de 2004) Textos previamente publicados em anais, livros ou periódicos nacionais e/ou internacionais Entretenimento e Publicidade: presente ou futuro? Daniel Galindo* (Universidade Metodista de São Paulo - Brasil) Resumo Entendendo a propaganda como informação e persuasão Comunicação de massa, consumo de massa A produção customizada e a busca pela desmassificação da propaganda A sociedade da informação e do entretenimento Entretenimento ou propaganda? Referências bibliográficas Texto publicado na revista Idade Mídia n.3 da UniFIAM-FAAM em junho de 2003 Palavras-chave: Entretenimento. Propaganda. Sociedade do Espetáculo.

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reflexão sobre o futuro do entretenimento e publicidade

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entretenimento e publicidade: presente ou futuro?

São [email protected] Acadêmica do Grupo Comunicacional de São Bernardo

www.metodista.br/unesco/GCSB/index.htm Ano 1 - nº 1 - (janeiro/junho de 2004)

Textos previamente publicados em anais, livros ou periódicos nacionais e/ou internacionais

Entretenimento e Publicidade: presente ou futuro?

Daniel Galindo* (Universidade Metodista de São Paulo - Brasil)

Resumo Entendendo a propaganda como informação e persuasão

Comunicação de massa, consumo de massaA produção customizada e a busca pela

desmassificação da propagandaA sociedade da informação e do entretenimento

Entretenimento ou propaganda?Referências bibliográficas

Texto publicado na revista Idade Mídia n.3 da UniFIAM-FAAM em junho de 2003

Palavras-chave: Entretenimento. Propaganda. Sociedade do Espetáculo.

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Resumo

Este artigo discute o papel do entretenimento, recorrente nos meios de comunicação de massa, delimitando o seu enfoque na publicidade, entendendo o seu aspecto persuasivo frente à sociedade da informação, promotora por excelência do espetáculo e dos fenômenos promotores de lazeres. Nesta circunstância, temos o entretenimento como um elemento socializador e mercadológico, que envolve a audiência no consumo, tanto das informações como de bens e serviços, ao mesmo tempo que a distrai, proporcionando devaneio e gratificação emocional.

A atividade comunicacional voltada ao mercado nasceu e floresceu no descompasso da produção e do consumo, o produzir mais levou ao vender mais. No entanto, a crescente presença de concorrentes associada à inevitável padronização ou estandardização dos produtos e serviços culminaram com uma forma muito peculiar de se comunicar com o mercado. Este momento caracterizou-se pelo ato de persuadir, quer seja diferenciando-se o produto/serviço, quer seja no ato de comunicar, passando da proclamação para o discurso da mais valia, tudo isso a partir da evolução dos suportes midíaticos, mais precisamente da mídia massiva, culminando hoje com a mediação individualizada proposta pelo marketing do um a um.

Contextualizar hoje o papel da propaganda significa contextualizar a sociedade contemporânea, denominada por alguns teóricos como sociedade pós-moderna ou por outros como sociedade da informação. Entretanto, visualizamos como elemento comum e integrador desta contextualização o caráter hedonista de nossa atual sociedade, que tem como gênese o discurso do tempo livre e a conseqüente oferta do prazer, do divertimento, do entretenimento e do lúdico como busca pela eterna gratificação.

Entendendo a propaganda como informação e persuasão

Quando falamos em informação/persuasão, estamos nos referindo a características tão intrínsecas à atividade publicitária, como o oxigênio e o hidrogênio na composição da água. Devemos, contudo, retomar o final do século XIX, quando a publicidade conheceu sua verdadeira expansão.

A tecnologia e as técnicas de produção em massa já tinham atingido um nível de desenvolvimento em que um maior número de empresas produzia mercadorias de qualidade mais ou menos igual a preços mais ou menos iguais. Com isso, veio a superprodução e a subdemanda (...) tornando-se necessário estimular o mercado – de modo que a técnica publicitária mudou da proclamação para a persuasão. (Vestergaard & Schroder, 1996, p. 4)

Ainda nesta linha temos o trabalho de Gérard Lagneau, A sociologia da publicidade, em que o autor considera:

O reclamo já não encontrava lugar numa sociedade industrial que se dispunha finalmente a medir as ameaças que sobre ela pairavam, se o seu conteúdo não atingisse o nível de racionalidade a que chegara a sua produção. O catálogo de receitas empiricamente elaboradas pelos agentes de anúncios do século XIX já não atendia às necessidades. Para substituir o amontoado heteróclito de anúncios geniais ou imbecis pespegados nos muros e nos jornais, era mister organizar campanhas articuladas e coerentes, baseadas numa análise dos mercados (um estudo de seus hábitos, de seus recursos, dos veículos adequados para atingi-los), concebidas à maneira de variações de argumentos moduladas em torno de um tema central (o “eixo” da campanha, escolhido em função do “alvos” visados), e finalmente prolongadas através de ações “promocionais” (junto aos revendedores e no local de venda) e “relacionais” (junto aos “líderes” do gosto e da opinião, dos críticos e censores, dos jornalistas ou figuras de proa). (Lagneau, 1981, p. 23)

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Esta nova postura faz com que a atividade publicitária venha a sofrer uma radical e definitiva mudança, estando a partir deste momento atrelada a objetivos de vendas claros e definida, como também a se constituir em uma indústria, um grande e lucrativo negócio, com características bem diferenciadas, simplesmente baseada na criação, produção e distribuição de mensagens (persuasivas) destinadas ao mercado consumidor, patrocinadas por um anunciante (emissor).

Ao falarmos deste primeiro momento da propaganda, não podemos deixar de abordar a primeira fase de seu processo persuasivo. A chave estava em valorizar um bem (produto ou serviço) frente aos demais, trazendo o “fazer-valer”, ou seja, agregando todo e qualquer processo socialmente utilizado para valorizá-lo. A partir deste momento nenhum objeto seria o mesmo, afinal ele precisava se destacar em meio à concorrência. “Embora sejam tão exageradas quanto rudimentares, essas práticas sociais da valorização não deixam de esclarecer a dificuldade peculiar à profissão de publicitário e que consiste em modificar a relação que estabelecemos com um objeto qualquer.” (Idem, ibid., p. 9).

Ainda nesta mesma linha, temos Vestergaard, citando Barthes, que credita à função publicitária a semantização dos objetos, ou seja: “Dessa forma, os objetos que usamos e consumimos deixam de ser meros objetos de uso para se transformar em veículos de informação sobre o tipo de pessoa que somos ou gostaríamos de ser” (Vestergaard & Schroder, 1996, p. 5). E ainda complementando esta proposta: “De um modo geral o anunciante quer dar ao seu produto uma imagem destinada a funcionar como vantagem extra para ele no mercado, onde é preciso diferenciá-lo um pouco dos produtos concorrentes, que são (quase) iguais quanto ao seu valor de uso material”.

Para Tânia Márcia C. Hoff, professora de redação publicitária da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da usp: “o produto vem sempre envolvido em uma rede de idéias de caráter afetivo”, pois, segundo ela, “seus atributos não são mencionados, as campanhas publicitárias usam as paixões e opiniões do consumidor, envolvendo-o com argumentos emocionais que ficam associados ao produto”. A autora conclui que predomina o que não tem comprovação, e não argumentos que comprovem racionalmente uma idéia, como o preço (Gazeta Mercantil, 14 dez. 1999, p.18).

Estamos ampliando nossa abordagem porque será nesta proposta de diferenciação ou da mais-valia de um produto que toda a atividade da indústria da propaganda estará baseada. Por conseqüência, o processo persuasivo estará possibilitando a construção desta aura eminentemente simbólica, ou, como define Pierre Martineau, “o halo de significações psicológicas, as associações de sentimentos, as mensagens estéticas escritas indelevelmente sobre e por cima das qualidades físicas” (apud Dunn, 1967, p. 71).

Não podemos deixar de mencionar que toda a propaganda moderna carrega em seu interior as propostas de um “velho” publicitário que edita, em 1923, um manual de como fazer propaganda com os recursos existentes naquele período, porém com técnicas que seriam retrabalhadas mais tarde e apresentadas como novidades. Seu livro tornou-se uma referência para os publicitários e, apesar do título questionável (A ciência da propaganda), descreve, por exemplo, que “tentamos dar a cada anunciante um estilo apropriado. Tornando-o distinto, talvez não em aparência, mas em maneira e tom. É-lhe dada uma individualidade que melhor convenha às pessoas a que se dirige” (Hopkins, 1966, p. 110).

Portanto, será em busca da individualidade que se deve atender aos anseios deste ou daquele consumidor, que os denominados mecanismos de persuasão da propaganda moderna serão desenvolvidos, tendo como base os princípios da psicologia humana e o estudo das reações do consumidor visado e, como leitura direta, os resultados de vendas que, de certa forma, representam um feedback do esforço comunicacional.

Comunicação de massa, consumo de massa

Acompanhando a evolução econômica, que requer o consumo em massa diante da produtividade em massa, os meios de comunicação de massa (mcm), cercados de todo o aparato tecnológico, revolucionaram a difusão das mensagens ao alcançarem grandes proporções de consumidores por um

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custo relativamente baixo. Com características bem definidas e funções próprias, os mcm vêm despertando polêmicas sobre suas causas e efeitos. Apesar de historicamente recentes, as pesquisas sobre os mcm já apresentam algumas conclusões, dividindo-se em duas vertentes bem distintas: de um lado estão os teóricos que pesquisam os efeitos que esses meios provocam nas pessoas e, de outro, pesquisadores que buscam respostas sobre o que é que as pessoas fazem com esses meios.

Dentro da segunda abordagem, a teoria funcionalista “ao mesmo tempo em que passa do estudo dos efeitos para os estudo das funções (...) passa-se para a situação comunicativa mais ‘normal’ e usual da produção e difusão cotidiana das mensagens de massa” (Wolf, 1995, p. 55). Buscando um referencial nas Ciências Sociais, essa linha de pesquisa baseia-se no pressuposto de que a influência das comunicações de massa só será possível se levar em consideração o contexto onde o receptor está inserido e seu inventário cultural, fruto do acúmulo de suas experiências. Mesmo a comunicação sendo homogênea na produção e distribuição, a recepção provocará reações diversas devido às diversidades culturais, econômicas, políticas, sociais e geográficas dos receptores.

A análise da teoria funcionalista está centrada principalmente na hipótese dos “usos e gratificações”, que procura associar o consumo e os efeitos dos mcm à utilidade dos mesmos pelos receptores, na intenção de satisfazer uma necessidade. Segundo Katz, “mesmo a mensagem do mais potente dos mass media não pode influenciar um indivíduo que não faça uso dela no contexto sócio-psicológico em que vive” (Katz et al 1973, p. 38). Incluindo em sua colocação diversas necessidades dos indivíduos que os mcm satisfazem diante das funções psicológicas e sociais da comunicação de massa:

a. necessidades cognitivas (aquisição e reforço de conhecimentos e de compreensão); b. necessidades afetivas e estéticas (reforço da experiência estética, emotiva); c. necessidades de integração a nível da personalidade (segurança, estabilidade emotiva, incremento da credibilidade e da posição social); d. necessidades de integração a nível social (reforço dos contatos interpessoais, com a família, os amigos etc.); e. necessidades de evasão (abrandamento das tensões e dos conflitos).

Neste sentido, alguns teóricos buscaram relacionar as funções dos mcm, entre eles, Laswell (1948) apresentou três funções principais desempenhadas pelos mcm: “fornecer informações, fornecer interpretações que tornem significativas e coerentes as informações, exprimir os valores culturais e simbólicos próprios da identidade e da continuidade sociais” apud Wolf (1995, p. 64). Às funções relacionadas pelo autor foi acrescentada mais uma, considerada também de extrema importância: “a de entreter o espectador, fornecendo-lhe um meio de se evadir das ansiedades e dos problemas da vida social” (Wright, 1975, p. 91). De Fleur & Ball Rokeach (1993, p. 43) também reforçam essa função citando que os meios de comunicação de massa, dentre as suas atribuições, proporcionam “divertimento diário inócuo para as massas cansadas da força de trabalho”.

Atualmente, vivendo sob tensão e angústia, próprios da modernidade, os indivíduos procuram no entretenimento e no lazer um meio para aliviar as pressões do cotidiano. Em uma sociedade em que se registra “o aumento do lazer e da valorização da informação como conseqüência de conquistas sociais e tecnológicas” (Galindo; Dejavite, 2000), os meios de comunicação de massa representam um instrumento importante para a satisfação dessas necessidades, da mesma forma que aumentam sua participação no contexto social.

Segundo pesquisa da revista Meio & Mensagem (jan. 2002), referente aos investimentos globais em propaganda no ano de 2001, temos: Propaganda em mídia de massa (45%); Propaganda em mídias direcionadas (18%); Merchansiding no pdv (12%); Marketing direto (8%); Promoção de vendas (6%); Eventos (6%) e Marketing social (5%). Esta constatação do volume na distribuição do uso dos meios a serviço do mercado revela o poder da mídia massiva frente à realidade de um mercado, carente e ao mesmo tempo privado do consumo de mídias mais seletivas, cujo hábito de consumo passa quase sempre pela possibilidade da aquisição e pelo processo de decodificação.

(...) dado que cada meio de comunicação apresenta uma combinação específica de conteúdos característicos, atributos expressivos e técnicos, situações e contextos de consumo, tal combinação de fatores pode tornar os vários mass media mais ou menos adequados

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à satisfação de diferentes tipos de necessidades. (Wolf, 1985, p. 67)

Diante dessa realidade, o entretenimento ganha mais espaço na mídia, transformando-se na principal característica dos mcm, principalmente dos meios eletrônicos, como cinema, rádio e televisão. Em pesquisa realizada por Comstock et al., em 1978, ficou constatado que “o consumo de TV é tipicamente motivado pelo desejo de se estar entretido e o seu objetivo é entreter”.

A produção customizada e a busca pela desmassificação da propaganda

A dinâmica do mercado consumidor, ou das relações entre a produção e consumo, continua proporcionando mudanças. Entramos nesta nova década com uma nova proposta ou simplesmente com uma nova realidade, como podemos ver na matéria de capa do The New York de 3 out. 1989, reproduzida no trabalho de Rapp & Collins (1991) anunciando que: “Mudanças na estratégia de marketing surpreendem a indústria da propaganda”. Logicamente, esta matéria sinalizou o que seria o ponto de partida para um novo contexto ou direcionamento do marketing; nela o seu autor comentava:

Após cinco anos de estagnação, a indústria americana de propaganda vê-se em face de um futuro obscuro e incerto (...). As agências de propaganda estão fazendo uma adaptação apenas intermitente a uma mudança profunda: a divisão do mercado de massa em centenas de mercados menores, e o desenvolvimento de novas maneiras para se comunicar com eles (...). O crescimento da propaganda de massa atingiu uma interrupção virtual, as margens de lucro de agência foram cortadas ao meio, e as agências de propaganda estão passando por uma consolidação dolorosa que atinge as áreas mais profundas da indústria(...) (Rapp & Collins, 1991, p. 12)

Os efeitos desta matéria alastraram-se pela imprensa especializada, que percebeu de imediato a transformação que estava às portas, como podemos observar no trecho extraído de uma entrevista com Randall Rothenberg para um programa de televisão, citado em seguida por Rapp & Collins,

Existirá uma introdução contínua de novas formas de mídias, que persistirão diminuindo o poder e o alcance da mídia de massa, da televisão de rede e das revistas de circulação de massa. Outra coisa que vai acontecer é que as novas tecnologias de pesquisa permitirão que anunciantes e suas agências localizem com muito mais precisão quem são seu mercado ou mercados-alvo.

Isso exigirá que as agências de propaganda tenham a capacidade de focalizar esses mercados específicos dentro de uma abordagem muito mais precisa, utilizando a mídia específica. Dado o fato de que essa é uma indústria construída com base na mídia e nos mercados de massa, isso pressupõe uma mudança dramática. (Rapp & Collins, 1991, p. 12) (Grifos nossos)

Nesta citação, podemos perceber claramente que, quando se fala em um novo marketing, fala-se em uma nova forma de comunicar ou um novo momento da mídia que se desenvolve tecnologicamente, proporcionando novas possibilidades de falar com este ou aquele consumidor sempre a respeito de um produto, serviço ou um determinado bem, deste ou daquele fabricante.

Contudo, estamos diante de uma nova forma de atuação do marketing que, neste momento, recebe a denominação de “Maximarketing”, ou seja, os autores propõem que o conceito do marketing seja entendido como uma abordagem estratégica e unificada, na qual as pessoas que são real ou potencialmente os melhores clientes são identificadas, contatadas, persuadidas, motivadas, convertidas e fidelizadas de uma forma que maximiza as vendas e os prospects. Com isso, o processo total dessa nova forma de praticar marketing amplia a imagem de marca, constrói a lealdade do cliente e maximiza as vendas, utilizando informações de uma banco de dados para moldar um relacionamento interativo e receptivo com prospects-alvo ou clientes individuais.

Estamos no início dos anos 90, exatamente quando a discussão sobre o poder da massificação dos produtos e da comunicação começa a ser questionada. Kelvin J. Clancy e Robert S. Shulman, em seu

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livro The marketing revolution, asseguram que não é possível manter uma prática inadequada de fazer marketing, diante desta nova realidade:

Hoje em dia a demanda pela maioria dos produtos de consumo está crescendo apenas na mesma e vagarosa velocidade de crescimento da população. (...) E os avanços tecnológicos resultaram em uma avalanche de produtos de qualidade similar, o que torna difícil para uma empresa distinguir-se das outras, enquanto a competição de preços batalha por parcelas do mercado que destruíram a margem de lucros. Nenhuma firma pode vencer tais lutas cortando custos e continuando a trabalhar da mesma forma que fazia no passado. (Clancy & Shulman, 1993, p. 13)

Neste importante trabalho, Clancy & Shulman, citando o professor Philip Kotler como um dos mais influentes pesquisadores com grande trânsito no empresariado norte-americano, descrevem as modificações que hoje ocorrem como uma mudança de paradigma, a qual, “como definida por Thomas Kuhn em The structure of scientific revolutions, acontece quando os praticantes de determinada disciplina não estão satisfeitos com as variáveis que definem a matéria ou com o alcance da referida disciplina” (idem, ibid., p. 1).

Esta busca por um novo paradigma, ou uma nova leitura dos princípios de marketing para uma nova realidade, pode ser constatada por meio de um simples e contundente questionamento junto a experientes e calejados profissionais de marketing, que já presenciaram grandes mudanças em suas vidas profissionais. A pergunta era: “Qual é o mais importante princípio de marketing em que você acreditava quando iniciou a carreira e no qual não acredita mais?”. Eles disseram que não mais crêem que:

- Um bom marketing vende ou pode vender qualquer produto;

- O melhor produto ganha a maior parte do mercado;

- A propaganda é a arma mais eficiente do arsenal do marketing;

- Um produto, para ter sucesso, tem que apelar para a massa;

- O produto com preço mais barato vende mais;

- Os resultados das pesquisas de mercado podem influenciar a direção geral das empresas e as companhias entendem a importância desses levantamentos (Clancy & Shulman, 1993, p. 5).

É exatamente nesse contexto que vamos encontrar o clima ou o ambiente da desmassificação, afinal estamos em plena Terceira Onda. Neste ponto, Alvin Toffler deixa de ser guru para ser um dos autores citados por todo um côro de publicitários, que conseguem perceber em seu trabalho algo perfeitamente viável e aplicável na dinâmica dos anos 90.

O publicitário Mário Kempenich, ao escrever sobre o marketing da Terceira Onda, menciona que o marketing já se divide em dois mundos, o da propaganda e o da comunicação dirigida, argumentando inclusive que não se trata de uma inovação ou exclusividade de uma ou de outra nação, mas sim do sistema industrial como um todo. Vejamos:

Já é hoje muito mais fácil segmentar o produto e a sua oferta. Com um simples apertar de botão, se obtém um novo design no computador, uma nova peça redesenhada, com novas cores, tudo reposicionado para atender a uma necessidade e a uma vontade muita específica do consumidor: é a demanda segmentada, que começa a tomar conta do social.

A revolução industrial sempre preconizou a produção em massa, e agora estamos falando de

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desmassificação. Ou seja, teremos muitas produções em pequena escala, o que obrigará e continuará impondo a necessidade de grandes empresas produzirem os mesmos produtos, só que com pequenas alterações para o atendimento de públicos específicos. (Kempenich, 1985, p. A 3)

As colocações de outro importante publicitário brasileiro, Sérgio Amado, responsável hoje pela administração da multinacional Ogilvy, demonstram que estamos em um outro momento, pois...

Nada funciona mais como no passado. Isso sem falar que os recursos estão ficando cada vez mais escassos. Vamos ter que aplicar o dinheiro do cliente em mídias que proporcionem o melhor resultado em termos de custo/benefício e para isso precisa de um foco muito bem dirigido. A mídia hoje é mensurada e comprovada, nenhum cliente vai investir 10 ou 15 milhões de dólares se não tiver absoluta certeza de que conseguirá resultados efetivos em suas vendas e no processo de construção de sua marca. (Amado, 1998, p. 7)

Na realidade, seu depoimento caracteriza-se pela proposta de “um foco muito bem definido”, talvez até pela abordagem feita mais adiante de que “nós fazemos propaganda para vender e propaganda que não vende é um suicídio”. Esclarece por que as agências de propaganda contam agora com o trabalho de comunicação dirigida e preocupam-se com uma mídia mais segmentada, fazendo com que a própria agência que Amado dirige criasse a OgilvyOne, uma agência de marketing direto – ou de relacionamento, segundo alguns.

Talvez possamos compreender o que significa a desmassificação, por meio do depoimento de J. Tyleer Wilson, diretor da rjr Nabisco, que alegou: “Já se foi o tempo do grande funil eletrônico, pelo qual poderíamos despejar nossos produtos dentro da corrente da consciência americana” (Rapp & Collins, 1991, p. 14).

Como vimos nesses depoimentos, uma grande mudança ocorreu e vem ocorrendo, conseqüência, por exemplo, das mudanças demográficas ocorridas nas diversas sociedades em que o modelo tradicional de família foi substituído por famílias com um ou dois membros, ou por casais não casados que vivem juntos, ou por um contingente de mulheres que trabalham e detêm um enorme potencial de consumo, ou mesmo por solitários que vivem de forma totalmente exclusiva, com menos tempo e energia disponíveis para cozinhar em casa (estima-se que, das três refeições regulares, uma refeição e meia é feita fora de casa e a metade restante já é comprada pronta). Enfim, graças à família de duas rendas, com menor tempo para compras e com maior renda disponível, o marketing direto continua em crescimento. Afinal, aquele tempo em que toda a família se reunia na sala para ouvir o seu programa favorito de rádio ou, mais recentemente, de TV, ficou no passado distante.

A sociedade da informação e do entretenimento

Na sociedade atual, uma nova e expressiva situação vem afetando a vida das pessoas: o aumento do lazer e da valorização da informação como conseqüência de conquistas sociais e tecnológicas. Dessa maneira, os meios de comunicação de massa (mcm) encontram-se em lugar estratégico na promoção desse fenômeno. Sabe-se que, dentre os principais papéis que estes meios desempenham, estão a capacidade de informar e entreter a audiência: receptor/consumidor.

Nesse sentido, a publicidade como atividade da comunicação de massa viabiliza e promove tanto a informação como a persuasão, colocando-se como um dos importantes vetores dentro dessa nova realidade, decorrente da sociedade do ócio ou do tempo livre, que, por sua vez, é caracterizada por diversas atividades de consumo. Tanto o consumo de bens culturais, quanto de lazeres são promovidos pelos mcm.

No entanto, esse papel de entreter é considerado por muitos um subproduto, ou até mesmo como um desvio da atenção do receptor frente a assuntos considerados de maior importância. Na verdade, a maioria dos autores analisa o entretenimento como um instrumento ideológico utilizado pelos mass media para manipular a audiência, esquecendo seu caráter socializador e mercadológico.

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Diante disso, este artigo aborda o papel de entreter, presente nos meios de comunicação de massa – delimitando o seu enfoque na publicidade –, encarando-a como importante fenômeno promotor de lazeres; e entendendo o entretenimento como um elemento socializador e mercadológico, que envolve a audiência em circunstâncias do dia-a-dia, como o consumo tanto da informação como de bens e serviços, ao mesmo tempo em que a distrai. Isso porque o tempo disposto pelos receptores não pode ser concebido como uma mera exposição frente aos meios, mas como uma utilização ativa e seletiva por parte dos mesmos no uso desses meios.

Os sistemas de comunicação de massa, frente à introdução das novas tecnologias de ponta que vêm surgindo de forma surpreendente, sofrem mudanças significativas. Como resultante desse processo, observa-se um papel diferenciado para o entretenimento tanto na vida pessoal como profissional.

Abordando o mundo em que vivemos, John Naisbitt menciona que as telas estão invadindo as nossas vidas:

São as telas de cinema, telas de TV, telas do monitor de computador, telas do Gameboy, telas da agenda eletrônica pessoal, telas do beeper, telas do telefone celular, telas do forno microondas, telas do monitor cardíaco, enfim, as telas estão em todos os lugares, orientando-nos, informando-nos, divertindo-nos. Frente a esta constatação o autor conclui que mesmo sem nossa percepção consciente, elas estão nos modelando. As telas que nos entretêm (...) o entretenimento número um nos Estados Unidos da atualidade é a mídia. (Naisbitt, 1999, p. 28)

Essa nova sociedade que se desenha tem oferecido novos valores, demandando pelos agentes de mercado, novos bens e serviços. Nesse sentido, os produtos comunicacionais também se mostram diferenciados.

Embora ainda recente esse fenômeno era esperado já na década de 1970. Toffler (op. cit.), um dos primeiros teóricos a registrar o aparecimento desses novos paradigmas sociais pós-industriais, acredita que essa nova civilização (...) traz consigo novos estilos de família, modos de trabalhar, amar e viver diferentes; uma nova economia; novos conflitos políticos, e, além de tudo isso, igualmente uma consciência alterada (...). Alguns falam em Idade de Informação, de uma Era Eletrônica ou de uma Aldeia Global (Toffler, 1980, p. 23).

Para Negroponte (1995, p. 175), a superestrada da informação é mais do que um simples atalho para o acervo da Biblioteca do Congresso. Ela está criando um tecido social inteiramente novo e global.

Já Bill Gates atribui à sociedade da informação um sistema de valores em que a expansão da distribuição da informação propiciará maior espaço para o lazer e para o enriquecimento cultural. Conforme analisa, essa sociedade

Vai ajudar a aliviar a pressão nas áreas urbanas permitindo que os indivíduos trabalhem em casa ou em escritórios remotos. (...) Vai nos dar maior controle sobre nossas vidas e permitir que experiências e produtos sejam adequados aos nossos interesses. Os cidadãos da sociedade da informação terão novas oportunidades no que se refere à produtividade, aprendizado e lazer. (Gates, 1995 p. 38)

Na opinião de Luis Escobar de la Serna, em um mundo global, com rede de informação crescente, assiste-se a uma maior comunicação e conhecimento entre os diversos países e a uma aproximação cultural. O desenvolvimento de novas tecnologias atuará em diferentes países em várias formas de consumo cultural nas modalidades de utilização do ócio, em um novo tipo de ócio contraposto a um ócio passivo, no qual essas novas tecnologias dotam de dimensões sociais e culturais muito amplas (Serna, 1991, p. 126).

De origem latina, o entretenimento tem como definição mais familiar “aquilo que diverte com distração ou recreação e um espetáculo público ou mostra destinada a interessar ou divertir” (Gabler, 1999, p.

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25). Os mcm, ao exercerem o papel de promotores de lazer, envolvem a audiência e aumentam a sua utilidade diante dos receptores. Galindo & Dejavite (2000, p.4) entendem o entretenimento nos mcm “como um elemento socializador e mercadológico, que envolve a audiência em circunstâncias do dia-a-dia, como consumo tanto da informação como de bens de serviços, ao mesmo tempo em que a distrai”. De acordo com Dumazedier (1973, p. 34),

o lazer é um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se, ou ainda para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais.

Segundo esse autor, as definições de lazer são relacionadas com os aspectos de tempo e atitude. Para que uma atividade seja considerada de tal forma, é preciso que o sujeito tenha com ela uma relação de satisfação, no sentido da atitude, e que seja realizada no tempo livre – entendendo-se este como aquela hora sem coações ou normas de conduta social. Na opinião de Rita de Cássia Giraldi Santini, dentre os muitos hábitos de consumo,

O conteúdo do tempo livre conquistado se enche de atividades consumidoras, não só de consumo de bens, mas, também, de consumo de lazeres. Esses lazeres surgem através das imagens veiculadas como um estilo de vida, em cuja essência podemos encontrar os mitos de gozar a vida, da felicidade e da aventura (...). Esses mitos – veiculados através das mensagens e imagens do sistema de comunicação – são incorporados pelos indivíduos através dos processos psicológicos de identificação e projeção (...). Os conteúdos das propagandas, de certos filmes, das estórias em quadrinhos, ignoram até certo ponto os problemas do trabalho e dirigem às necessidades de lazer, do consumo de bens materiais por um lado, e pelo outro, ao amor, aventura e felicidade. (Santini, 1993, p.64).

Segundo Gabler, etimologicamente a palavra entretenimento tem sua origem:

Com toda certeza vem de inter(entre) e tenere(ter). Em inglês, a evolução da palavra entertainment levou-a a significar tanto uma forma de servidão quanto o fornecimento de apoio ou sustento, a maneira de tratar alguém, uma forma de ocupar o tempo, receber ou aceitar algo, dar hospitalidade a uma pessoa, bem como à definição mais familiar: “aquilo que diverte com distração ou recreação” e “um espetáculo público ou mostra destinada a interessar ou divertir”. (Gabler, 1999, p. 25)

Mas, para ele, todas as definições mantêm um vínculo com a origem latina da palavra, que possui a idéia de ter entre. Hoje, o entretenimento diz respeito a filmes, rock, romances sanguinários, histórias em quadrinhos, televisão, jogos eletrônicos, cultura de massa, sendo basicamente uma forma de experiência sensória prazerosa.

Próximo ao final dos anos 60, Guy Debord lança na França o livro A sociedade do espetáculo, que mesmo chegando ao Brasil três décadas depois (1997) apresenta de forma sucinta e clara o estágio em que nos encontramos, quanto a uma sociedade que faz de sua própria existência um espetáculo contínuo. Debord correlaciona a sociedade de consumo e o suporte midiático das comunicações de massa que possibilitam a esta mesma sociedade sua transformação na “sociedade do espetáculo”, ou melhor, segundo o autor, o espetáculo tornara-se a forma de ser da sociedade de consumo, pois o espetáculo

Consiste na multiplicação de ícones e imagens, principalmente através dos meios de comunicação de massa, mas também dos rituais políticos, religiosos e hábitos de consumo, de tudo aquilo que falta a vida real do homem comum: celebridades, atores, políticos, personalidades, gurus, mensagens publicitárias – tudo transmite uma sensação de permanente aventura, felicidade, grandiosidade e ousadia. (Debord, 1997, p. 69)

O autor insiste na colocação do espetáculo como uma forma integradora de uma sociedade esfacelada, dividida e presa ao fetichismo da mercadoria (felicidade identifica-se ao consumo),

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mediada pelos meios massivos que fazem do indivíduo um ser infeliz, anônimo e solitário. Portanto, alguém propenso à evasão, pronto para navegar pela fantasia ou pelo imaginário, carregando nas mãos bens e produtos concretos ou tangíveis.

Entretenimento ou propaganda?

Na publicidade, o recurso do entretenimento tem sido visto como uma forma de diferenciar-se frente a uma concorrência brutal dentro da própria mídia, ou seja, primeiramente precisa-se ultrapassar a barreira dos demais produtos oferecidos nos diversos meios, para logo de imediato chegar ao consciente do receptor.

Segundo Jacques Durand (1973, p. 32), a publicidade se “[...] apresenta assim como um monoteísmo universalista: existe um só deus, adorem-no todos!”.

Isso explica o porquê da busca desenfreada pela diferenciação junto ao próprio suporte midiático e frente aos demais concorrentes que atuam na mesma categoria de produto/serviço.

Ainda nessa linha, Georges Péninou coloca a publicidade como a mensagem e paisagem ao mesmo tempo. “Uma das raras mensagens – que é além de tudo uma paisagem (olha-se a publicidade, mais contemplada do que lida); lugar de recreação informativa, de informação recreativa; expressão de um certo olhar sobre o objeto, não do próprio objeto, a imagem publicitária acomoda sua estrutura à sua função”. (Péninou, 1973, p. 62).

Em um artigo denominado Os criativos têm razão! Mais uma vez, Jaime Troiano consegue resumir todo um questionamento sobre a importância do esquema clássico de persuasão na propaganda, através da “teoria da cebola”, ou seja: primeiro é preciso obter compreensão, depois envolvimento, depois, sim, a persuasão. Dessa forma não seria possível persuadir, se antes não obtiver a compreensão sobre o produto, bem ou serviço divulgado. Portanto, em um primeiro estágio, o consumidor precisa tornar-se consciente de um estímulo (awareness) e procurar entender o que é dito ou apresentado a respeito da marca e do produto.

A partir deste ponto entra em cena uma outra necessidade, tal qual a primeira, que é a reação do consumidor em relação à comunicação, ou seja, o quanto a comunicação foi capaz de gerar reações positivas (liking). Isto significa que buscar o “Likability” é mais importante até mesmo que a própria compreensão, em outras palavras: “Se eu gosto da comunicação, eu me disponho a entendê-la e posso estar preparado para ser persuadido por ela”. (Troiano, 1994, p. 47)

Portanto, o gostar da comunicação é o mesmo que se expor. Olhar para a publicidade é olhar para uma paisagem, é puro entretenimento e diversão. É participar deste roteiro lúdico, que apresenta a publicidade. De maneira semelhante, tem-se as colocações do publicitário Nizan Guanaes.

Procuro mostrar aos meus anunciantes que as pessoas não vivem para ver comerciais. Elas compram as revistas para ler e ligam a tevê para ver programas. O anúncio está interferindo na vida delas. Se você não tiver essa concepção muito clara, não vai se levar a sério. Você tem que chamar a atenção dessas pessoas, tem que buscar audiência. O comercial é a programação do intervalo e ele só se torna relevante se emocionar as pessoas, se é memorável. A publicidade só se torna relevante quando ela se compreende relevante. (Isto É, 24 nov. 1999, p. 10)

Nesse sentido, encontra-se no trabalho de Ivan Santo Barbosa – Propaganda e significação: do conceito à inscrição psicocultural – uma abordagem bem sintética e objetiva sobre o caráter persuasivo do discurso publicitário, tudo embalado pelo entretenimento através do humor dos bordões das “sacadas” criativas e, acima de tudo, do imaginário e dos devaneios de um receptor ávido por novidades.

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entretenimento e publicidade: presente ou futuro?

Grosso modo, os anúncios publicitários remetem a temas aparentemente muito comuns às pessoas: o desejo de amor, de afeto, de amizade e de reconhecimento. Propõe o prazer, volta à infância e à família feliz: traz humor, leva fantasia, ao erotismo, ao lúdico e à alegria. Para isto se vale de estereótipos e clichês, onde as personagens, mesmo as mais “humildes”, possuem o biótipo e a estética dos dominantes. Para parecerem tão “felizes” e “realizados”, a fórmula utilizada foi aparentemente simples. (Barbosa, 1995, p. 48)

Essa mecânica aparentemente simples, ou inocente, permeia todo o trabalho dos redatores, diretores de arte, produtores gráficos ou da mídia eletrônica, que elaboram o discurso publicitário. Para Barbosa, são bastante lúdicos, agradáveis, estimulantes, envolventes, imaginativos, de modo a torná-los persuasivos (idem, ibid.).

Aliás, o autor reforça que seus aspectos persuasivos ocorrem quer pela forma plena de recursos muito bem elaborados tecnicamente, quer pelo conteúdo, instigando as pulsações básicas no nível psíquico, ou sugerindo soluções para os problemas sociais, capazes de convencer a audiência-alvo de que as respostas às carências serão dadas satisfatoriamente como consumo de um produto específico. Ou, ainda, para se atingir o lucro, a mercadoria deve seduzir, “lançar olhares amorosos aos compradores potenciais” (idem, ibid., p. 35-44).

Sedução e persuasão ganham uma grande dimensão nesse contexto, afinal o ato da persuasão passa pelo ritual da sedução. Isso significa, em um primeiro momento, que, quanto mais atraente o produto, mais as pessoas desejarão adquiri-lo e menor será o intervalo entre a data em que sai da fábrica e aquela em que é vendido. Todavia, a estética do produto só é percebida por meio da estética dada a ele – por meio da comunicação, que tem na propaganda esta possibilidade de transformar todo e qualquer produto esteticamente o mais agradável possível, como, também, o próprio anúncio se converte numa realização estética.

Contudo, não podemos ignorar um instigante texto de Francisco Gracioso, denominado A nova era da comunicação total, onde o autor nos mostra de forma clara a intersecção da mídia com a propaganda, logicamente através de seu caráter entretenedor:

Na verdade as forças que interagem com o consumidor são hoje mais difusas, variadas e sutis. Os opinion leaders são agora bombardeados e manipulados de mil maneiras diferentes, por notícias, entrevistas e artigos na mídia, vitrines e corredores de shopping centers, filmes, novelas de TV, videogames, brinquedos inocentes e espetáculos esportivos. A TV oferece de graça as corridas de Fórmula 1 e as partidas da decisão do campeonato de futebol, mas junto com elas recebemos também as mensagens do Marlboro e da Nike. ( Gracioso, 2001, p. 45).

Ao verificar a questão do envolvimento do receptor/consumidor em relação às novas mídias – ou as chamadas mídias digitais – o fenômeno do entretenimento vai bem mais além do brincar com o mouse, pois, mesmo que a estrutura do discurso não apresente significativa diferença quanto à publicidade convencional, o receptor/consumidor precisa de um tempo maior de exposição.

Segundo Rosa Neto, a multimídia interativa é uma integração de mídias que têm como mérito envolver mais o usuário, por garantir sua participação ativa na aplicação, dando-lhe a liberdade de consultar as mesmas informações de acordo com o seu jeito de pensar.

(...) Isto porque a multimídia possibilitará identificar e alcançar individualmente todos os compradores potenciais. É o relacionamento “one to one” com o consumidor. Surge a técnica do “infocomercial”, comerciais interativos de até 30 minutos de duração. A propaganda em multimídia elimina o efeito da passividade, pois ela não é um meio de expor as pessoas a uma mensagem, mas um meio de guiá-las através de apresentações de vendas feitas sob medida para elas. (Rosa Neto, 1995, p. 59)

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Assim, verifica-se que esta mídia não difere de qualquer outra no sentido de promover a venda de um produto, um bem, ou mesmo uma imagem, estando sempre a serviço de uma proposta de marketing. Podendo também conter, necessariamente, elementos persuasivos, talvez com uma flexibilidade maior de envolvimento do receptor, mas, sem dúvida alguma, com uma estrutura que resgata – até mesmo – ingredientes da propaganda clássica, ou seja, precisa ser intuitiva, atraente e comunicar através de ícones.

Quando aceitamos ser o mundo da publicidade o reflexo do mundo real, devemos entendê-lo não na forma de como o vivenciamos, pois o mundo da propaganda funciona, segundo Vestergaard, ao nível do devaneio, o que implica uma constante insatisfação com o mundo real, sempre expressado por meio de representações imaginárias do futuro, tal como ele poderia ser: “uma utopia”. Tudo muito próximo da proposta do entretenimento ou do consumidor ávido por belas mensagens/paisagens que alimentem o devaneio nosso de cada dia.

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* Doutor em Comunicação Científica e Tecnológica pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), professor no programa de mestrado da mesma Universidade e do programa de mba em

marketing da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM); coordenador da agência experimental em propaganda do Centro Universitário Municipal de São Caetano do Sul (IMES). E-mail:

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