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ENTREVISTA E AVALIAÇÃO Estágio de Saúde Mental 2015-201 6

ENTREVISTA E AVALIAÇÃO · • Explorar respostas vagas ou obscuras • Permitir o discurso livre • Usar questões abertas e fechadas ... curiosidade para fazer perguntas do tipo

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ENTREVISTA E AVALIAÇÃO

Estágio de Saúde Mental2015-2016

TÉCNICAS DE ENTREVISTA

• Estabelecer relação tão cedo quanto possível• Determinar a queixa principal• Fazer um diagnóstico diferencial provisório• Excluir possibilidades diagnósticas• Explorar respostas vagas ou obscuras• Permitir o discurso livre• Usar questões abertas e fechadas• Não recear colocar questões embaraçosas• Não esquecer explorar ideação suicida• Dar ao doente a oportunidade de colocar questões• Transmitir confiança e esperança

Os doentes trazem para a consulta não apenas as suas queixas físicas mas também as circunstâncias em que vivem - o que são e o que gostariam de ser ... a pesquisa de informação psicossocial é útil não apenas para o estabelecimento da relação médico-doente, mas também para as tarefas diagnosticas e terapêuticas

... as duas qualidades mais úteis do médico podem bem ser a curiosidade e a paciência - curiosidade para fazer perguntas do tipo “Tell me about yourself” e paciência para aguardar a resposta

Stoeckle, 1995. In Platt (2001). Annals of Internal Medicine;134:1079-1085

... face ao sofrimento de uma pessoa, a primeira tarefa ética consiste no reconhecimento desse sofrimento. ...

Existe algo mais básico e mais crucial do que a competência cultural para a compreensão da vida do

doente, ou seja, o significado moral do sofrimento - o que é realmente importante para o doente, aquilo que o

doente, no fundo, pode ganhar ou perder.

Kleinman, A & Benson, P (2006). Anthropology in the Clinic: The Problem of Cultural Competency and How to Fix It. PLOS Medicine, 3 (10)

COMPONENTES DA ENTREVISTA

• Identificação do doente e informantes• Queixa principal• História da doença actual• História prévia

– Antecedentes psiquiátricos– Antecedentes pessoais e personalidade prévia

• História familiar• História social• História médica geral• Exame mental

EXAME MENTAL

• Aspecto e atitude• Actividade motora• Pensamento e discurso• Abstracção• Humor e afecto• Percepção

• Insight

• Orientação• Memória• Informação Geral• Cálculo, Leitura, Escrita• Aptidão viso-espacial• Atenção

SINAIS E SINTOMAS

Estágio de Saúde Mental2015-2016

Perturbações Psicóticas (I)

• Delírios (perseguição, ciúme, culpa ou pecado, grandeza, religiosos, somáticos, referência, controlo, leitura da mente, transmissão de pensamentos, inserção de pensamentos, roubo de pensamentos)

• Alucinações (auditivas, vozes comentadoras, vozes dialogando, somáticas ou tácteis, olfactivas, visuais)

• Comportamento bizarro ou desorganizado (vestuário e aparência, comportamento social e sexual, comportamento agressivo e agitado, comportamento ritualista ou estereotipado)

Perturbações Psicóticas (II)

• Discurso desorganizado - alterações formais positivas (descarrilamento, tangencialidade, incoerência ou esquizofasia, ilogicidade, circunstancialidade, pressão do discurso, discurso distrátil, clanging)

• Alogia - alterações formais negativas (pobreza do discurso, pobreza do conteúdo do discurso, bloqueio, aumento da latência de resposta, perseveração)

• Comportamento motor catatónico (estupor, rigidez, flexibilidade cérea, posturas bizarras e maneirismos)

• Afecto inapropriado

Perturbações Psicóticas (III)• Embotamento afectivo (expressão facial constante,

redução dos movimentos espontâneos, pobreza expressiva, contacto ocular pobre, incapacidade de resposta afectiva, ausência de inflexões vocais)

• Avolição - Apatia (asseio e higiene, impersistência escolar ou profissional, anergia física)

• Anedonia - Associalidade (actividades e interesses recreativos, interesse e actividade sexuais, capacidade de intimidade, relacionamento com colegas e amigos

• Atenção (inatenção social e no exame mental)

Isabel, 55 anos, internada por agitação psicomotora. Professora na vida adulta, tinha vivido em quartos alugados, com empregos temporários nos últimos 10 anos. Vivia socialmente isolada e apenas interagia com outras pessoas quando ia à Igreja.

Foi internada pela 1ª vez com 25 anos, dizendo que os vizinhos a andavam a assediar. Desenvolveu depois a ideia de que estava no centro de uma cabala governamental. O FBI, o sistema judicial, a Igreja Católica e os vizinhos estavam envolvidos. Acreditava que os vizinhos tinham sido recrutados para a assediar. Aos 49 anos, foi internada depois de o seu senhorio a ter acusado de bater violentamente no tecto do quarto, enquanto gritava contra mais um ataque iminente dos vizinhos.

Isabel mudava de quarto de 6 em 6 meses. Contudo, acabava por descobrir que os novos vizinhos, onde quer que estivesse, estavam todos envolvidos. Continuou a trabalhar, embora progressivamente relegada para posições secundárias. Um médico falou-lhe na reforma, mas dado que não se achava doente, recusou essa possibilidade.

Na altura do actual internamento, o senhorio queixou-se dos gritos. Ela disse que estava apenas a responder ao desconforto que os vizinhos lhe tinham causado, através de meios electrónicos. Acreditava que ondas electromagnéticas estavam a ser usadas para controlar as suas acções e pensamentos, descrevendo mesmo uma sensação de electricidade no seu corpo, sempre que o senhorio se aproximava.

Isabel não evidenciava humor deprimido. Estava aborrecida com o internamento, que julgou desnecessário. O discurso era circunstancial. Depois de 1 mês de tratamento antipsicótico, Isabel continuava delirante, embora menos preocupada com as ideias de assédio. Devido à ausência de crítica, Isabel ficou com medicação depot.

Uma mulher com 23 anos de idade foi trazida ao serviço de urgência pela polícia, que foi chamada a casa de um advogado conhecido. A doente referiu estar apaixonada pelo advogado. Argumentou ainda pensar que ele partilhava dos mesmos sentimentos, apesar de ser casado e de nunca lhe ter dito nada sobre o assunto. O advogado chamou a polícia depois de ver a rapariga sentada nos degraus de sua casa 12 horas consecutivas. Ela tinha recusado sair do local, mesmo depois de o advogado lhe ter ralhado e tentado afastá-la à força. Quando questionada sobre se o comportamento do advogado não seria, afinal, sinal inequívoco de que os seus sentimentos não eram recíprocos, a doente sorriu e respondeu que “ele só agiu dessa maneira porque a mulher estava em casa”.

Acrescentou ainda que enquanto o advogado lhe ralhava, pôde ler na forma como ele olhava para ela uma mensagem do tipo: “Não ligues ao que eu estou a dizer-te; não desistas”. Não apresenta alterações da forma do pensamento nem alterações do humor. Recusa-se a tomar medicação. Depois de duas consultas, deixou de aparecer. Continuou a assediar o advogado. Acabou detida, por violar a ordem pública. Os pais conseguiram convencer o juiz a suspender a sentença, desde que ela fosse viver com eles, numa outra cidade. Depois disto, não se sabe o que aconteceu.

Sintomas Maníacos

• Humor eufórico ou irritável• Hiperactividade• Aceleração do pensamento/fuga de ideias• Aumento da auto-estima• Redução na necessidade de dormir• Distractibilidade• Compromisso do juízo crítico

O Mário tem apresentado um comportamento estranho, segundo a mãe. Tem dormido muito pouco e parece excepcionalmente enérgico, quase sem necessidade de dormir. Este comportamento surgiu algumas semanas depois de um período em que andou cabisbaixo, parecendo desanimado e triste, sem razão aparente. Depois deste período, passou a dormir pouco e a levantar-se cheio de ideias, projectos, a falar muito depressa, saltando de assunto em assunto, ou distraindo-se facilmente, ao menor estímulo.

Mais recentemente, anunciou que iria ser empresário e fez diversos investimentos avultados, contra a vontade da família. Quando se sentia contrariado, chegava a reagir de modo agressivo. Era pior quando lhe diziam para ir ao hospital. Gritava que não estava doente, proferindo mesmo que nunca se tinha sentido tão bem. Na verdade, havia alturas em que parecia feliz, elogiando-se a si próprio pela inteligência e espírito de iniciativa. O pai foi descrito como uma pessoas que tinha “altos e baixos”, ao longo da vida, razão pela qual teve vários internamentos psiquiátricos. Segundo foi possível apurar, o pai tomava regularmente carbonato de lítio.

Sintomas Depressivos

• Humor disfórico (qualidade distinta do humor)• Alterações do apetite ou peso; Insónia/hipersónia• Agitação/lentificação psicomotora• Diminuição do interesse ou prazer• Redução da energia; sentimentos de inutilidade• Alterações do raciocínio/concentração• Ideias recorrentes de morte/suicídio• Humor não reactivo; variação diurna do humor

Manuela é médica, especialista em Medicina Interna; no início da Primavera, começou a sentir-se fatigada, com dores no corpo. Acordava às 4 da manhã muito angustiada e não conseguia dormir mais; a higiene matinal era-lhe penosa, sentia-se muito lentificada e sem qualquer motivação para ir trabalhar. Na visita à enfermaria ficava sem iniciativa, sem conseguir decidir as alterações terapêuticas.

Culpava-se pelo facto de os doentes não estarem a melhorar e o menor contratempo vinha reforçar a sua convicção de que pouco valia como profissional, em comparação com os seus colegas. Achava que nunca conseguira ser boa médica e as suas perspectivas, em relação ao futuro, eram pessimistas. Pensava mesmo que era melhor desistir da sua carreira profissional. À noite, sentia-se melhor, embora se sentisse fraca, pois já tinha perdido 10 quilos.

"Assim não podia continuar, pensava no suicídio, mas não tinha força psíquica para o fazer". Oito anos antes tivera uma situação semelhante após o parto do 1º filho. Depois disso, tirou a especialidade com boa nota, mas "andei enganada, não sirvo para Medicina". Um tio materno suicidou-se.

O doente ... deve manter a saúde física, comer e dormir bem, mas a depressão traz diminuição do apetite e insónia. Deve ser activo - fazer mesmo algum exercício - mas um dos principais sintomas da depressão consiste na falta de energia. Deve divertir-se, mas a depressão diminui as possibilidades de prazer. Deve pensar de modo realista, mas a depressão instala um pensamento negativo e favorece memórias negativas. Deve conviver, mas apetece-lhe ficar sozinho e pode até encontrar uma subtil rejeição ao tentar interagir com outros. Afinal, para recuperar da depressão, o doente deve ter esperança. Mas a depressão compromete a esperança...

John G. Allen, 2006. Coping with Depression: XX

Sintomas de Ansiedade

• Crises de pânico• Agorafobia• Fobia social• Fobia específica• Obsessões• Compulsões

Mariana, uma estudante com 20 A, queixa-se “dos nervos”. Diz que é ansiosa desde que se conhece, mas nega tristeza. O seu problema piorou desde que acabou o liceu e saiu de casa, para entrar na Universidade.

Mariana preocupa-se com tudo – com a sua aparência física, com o rendimento escolar, com as qualidades dos seus amigos, com o estado de saúde dos pais, e mesmo com a sua inexperiência sexual.

Apresenta alguns tremores e deglute com frequência, ao longo da entrevista. Apresenta suores na face e reconhece sentir-se tensa, incapaz de relaxar. Há pouco tempo, teve uma consulta de cefaleias. Masca uma pastilha elástica para aliviar a boca seca. Costuma ter muitas vezes as mãos suadas e uma sensação de bola na garganta.

Não há uma explicação para a sua ansiedade crónica, mas o stress agrava a situação. Pediu tranquilizantes na primeira consulta, mas aceitou os exercícios respiratórios e o treino de relaxamento. Depois de aprender estas técnicas, continuou ansiosa, mas deixou de sentir que precisava de tomar tranquilizantes.

Anabela, 32 anos, veio à consulta para avaliação do seu estado de ansiedade. Referiu o início das suas crises aos 13 anos, numa aula de História. “Estava sentada na sala de aulas quando o meu coração começou a bater com força e fiquei a tremer, sem ter razões para me sentir nervosa”. Ao longo dos 19 anos seguintes, as crises tornaram-se crónicas e frequentes, ocorrendo até cerca de dez vezes por dia. Para a Anabela, as crises tiveram um efeito negativo: “Cresci ao longo dos anos a pensar que não era uma pessoa normal”. As crises fizeram-na sentir-se diferente das outras pessoas e impediram-na de fazer uma vida social normal.

Para além do medo das crises, a Anabela começou a evitar locais com muita gente, em particular centros comerciais, supermercados, salas de cinema e restaurantes. Era uma pessoa religiosa e costumava ir à igreja, mas sentava-se sempre perto da saída. Os evitamentos tendiam a aumentar e a diminuir de intensidade, e embora nunca tivesse ficado confinada à casa, insistia para que o marido ou pessoa amiga a acompanhassem sempre que saía às compras.

A Anabela nunca tinha procurado tratamento e achava que ninguém podia ajudá-la. Muitas vezes, foi aos Serviços de Urgência, mas nunca lhe fizeram o diagnóstico apropriado. Uma vez que pensava que os seus sintomas eram um sinal de fraqueza, também nunca tinha contado nada ao seu marido.

Foi medicada com paroxetina e, no espaço de um mês, ficou livre das suas crises; no espaço de três meses, deixou de evitar locais com muita gente. Aos seis meses, encontrava-se livre de todos os sintomas de ansiedade e achava então que era outra pessoa, sentindo-se muito melhor.

Júlia, 25 anos de idade, casada, licenciada, veio à consulta por depressão nos últimos 6 meses. A sua história clínica revelou que desde a escola tinha um desconforto acentuado e incapacitante em situações sociais.

Apesar de ser uma técnica competente, estava desempregada porque não suportava o desconforto de ir a uma entrevista e antecipava que sentiria um grande desconforto se tivesse que trabalhar com outras pessoas e relacionar-se com superiores hierárquicos. Fazia trabalhos técnicos em casa, à tarefa, mas tinha que ser o marido a ir entregá-los às firmas que os tinham encomendado dado o seu evitamento em interagir com outras pessoas, e o receio de que pudessem não avaliar bem o seu trabalho. Repetidas avaliações positivas e sinais de completa satisfação, por parte das firmas para quem realizara os trabalhos, não a tranquilizaram nem diminuíram o seu desconforto e evitamento dessas situações.

Outras actividades que implicassem interacções com estranhos eram sempre realizadas na companhia do marido, recusando-se a realizá-las sozinha dado o desconforto sentido. O seu isolamento social foi aumentando progressivamente, convivendo apenas com familiares e raros amigos de longa data. Qualquer sugestão do marido para procurar ajuda para as suas dificuldades era rejeitada por vergonha e desconforto em relatar as suas dificuldades ao psiquiatra que consultasse.

O desenvolvimento de um episódio depressivo levou-a finalmente a decidir-se a ir a uma consulta, mas não sem exigir que o marido fosse primeiro conhecer o psiquiatra que escolhera, e avaliasse se ele era simpático e ainda alguém que não a julgasse negativamente pelas suas dificuldades.

A Natalia, com 25 anos de idade, disse ao seu obstetra que tinha “medo de matar o meu bebé”. O filho tinha 7 meses de idade e a Natalia sentia um constante mal estar, com um pensamento recorrente, intrusivo, segundo o qual haveria de matar o bebé com uma faca de cozinha. Este pensamento tinha surgido pela primeira vez algumas semanas depois do parto. Apesar dos seus esforços para se livrar deste pensamento, a verdade é que este teimava em ocupar a sua consciência sempre que não estivesse envolvida nalgum tipo de actividade. Sempre tentou resistir ao pensamento e chegou mesmo a remover todos os objectos cortantes de sua casa. Além disto, deixava o bebé junto da sogra, durante o dia, para que não lhe pudesse fazer mal.

Esta situação causava-lhe um profundo embaraço, talvez mesmo vergonha, pelo que nunca a tinha revelado a ninguém, antes de a confessar ao obstetra.

Na semana anterior tinha começado a dormir mal, sentindo-se triste e referindo pensamentos suicidas. Quando foi entrevistada, admitiu que já tinha tido comportamentos deste tipo no passado. Por volta dos 10 anos de idade, referiu preocupações com a simetria, com uma arrumação particular dos objectos em casa dos pais. Também referiu, numa idade mais avançada, o hábito de contar os objectos em cima das mesas ou de contar as pessoas presentes numa sala. Também se lembrava, no passado, da necessidade de verificar se a janela do seu quarto estava fechada, sete vezes consecutivas, todas as noites, antes de se deitar. Nunca tinha contado isto a ninguém, por “vergonha”.

Tipos Comuns de Obsessões e Compulsões

• Múltiplas 72% • Contaminação 50% • Dúvida 42% • Somáticas 33% • Simetria 32% • Agressivas 31% • Sexuais 24%

• Verificação 61% • Múltiplas 58% • Lavagem/limpeza 50% • Contagem 36% • Perguntas 34% • Simetria/precisão 28% • Acumulação 18%

Starcevic, 2010. Anxiety Disorders in Adults.