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Entrevista para o Jornal Nó Cego com Paulo Bustamante. 1. Inicialmente como o Senhor se definiria profissionalmente, Artista, Marceneiro, Consultor, ...? Sou ARTESÃO. Minha criatividade, meus conhecimentos práticos e teóricos em tecelagem, marcenaria, serralheria, etc, estão todos vinculados á minha atividade como artesão. Sou consultor porque gosto de partilhar os conhecimentos e de contribuir para melhorar a vida dos outros. Sou designer (algumas pessoas se referem a mim desta forma) porque é uma condição básica do artesão que quer se desenvolver em sua atividade, pois este nunca deve se contentar em reproduzir o que foi criado por outros. 2. O Senhor poderia nos contar um pouco de sua história (Onde nasceu, quem foram seus pais, formação escolar e profissional? Nasci em Três Pontas – MG, filho do sr João (bancário) e Dona Zilah (professora), e sou de Itanhandu – MG. Fiz curso técnico de mecânica e não me formei na faculdade de psicologia, na época preferi abrir uma loja de produtos naturais. Montei uma fabriqueta de conservas, trabalhei três anos no Banco do Brasil, neste período montei uma marcenaria e optei por viver exclusivamente da atividade artesanal. 3. Como começou na Tecelagem? Com quem aprendeu? Quando trabalhava no BB minha esposa na época – Fátima Cruz – fez um curso de tecelagem com a Cristina Lanzioti em São Lourenço; foi quando fiz o primeiro tear de pente-liço para ela. Em seguida ela quis um tear de pedal e me vi com a necessidade de entender um pouco como era o trabalho no tear para poder fabricá-lo da melhor maneira possível – para variar não queria simplesmente copiar um outro tear. Assim começou meu contato com a tecelagem artesanal. Depois de pronto o primeiro tear, comecei a pesquisar sobre o assunto, adquiri muitos livros importados a respeito, amigos me

Entrevista para o Jornal Nó Cego com Paulo Bustamante

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Entrevista para o Jornal Nó Cego com Paulo Bustamante.

1. Inicialmente como o Senhor se definiria profissionalmente, Artista, Marceneiro, Consultor, ...?

Sou ARTESÃO. Minha criatividade, meus conhecimentos práticos e teóricos em tecelagem, marcenaria, serralheria, etc, estão todos vinculados á minha atividade como artesão. Sou consultor porque gosto de partilhar os conhecimentos e de contribuir para melhorar a vida dos outros. Sou designer (algumas pessoas se referem a mim desta forma) porque é uma condição básica do artesão que quer se desenvolver em sua atividade, pois este nunca deve se contentar em reproduzir o que foi criado por outros.

2. O Senhor poderia nos contar um pouco de sua história (Onde nasceu, quem foram seus pais, formação escolar e profissional?

Nasci em Três Pontas – MG, filho do sr João (bancário) e Dona Zilah (professora), e sou de Itanhandu – MG. Fiz curso técnico de mecânica e não me formei na faculdade de psicologia, na época preferi abrir uma loja de produtos naturais. Montei uma fabriqueta de conservas, trabalhei três anos no Banco do Brasil, neste período montei uma marcenaria e optei por viver exclusivamente da atividade artesanal.

3. Como começou na Tecelagem? Com quem aprendeu?

Quando trabalhava no BB minha esposa na época – Fátima Cruz – fez um curso de tecelagem com a Cristina Lanzioti em São Lourenço; foi quando fiz o primeiro tear de pente-liço para ela. Em seguida ela quis um tear de pedal e me vi com a necessidade de entender um pouco como era o trabalho no tear para poder fabricá-lo da melhor maneira possível – para variar não queria simplesmente copiar um outro tear. Assim começou meu contato com a tecelagem artesanal. Depois de pronto o primeiro tear, comecei a pesquisar sobre o assunto, adquiri muitos livros importados a respeito, amigos me trouxeram catálogos de todas as partes do mundo, e comecei a experimentar vários modelos, vários mecanismos. Aparecia alguém querendo comprar um tear eu vendia e depois fazia outro diferente. Quando vi já estava fazendo vários teares por mês e decidi transformar isso em negócio, fiz um catálogo e comecei a participar de feiras de negócios para divulgar a linha de equipamentos.

4. O Senhor poderia nos esclarecer sobre a linha de produtos para Tecelagem Artesanal que sua empresa fabrica?

Quando desenvolvi esta linha, o fiz para atender a necessidades próprias. Fátima e eu tínhamos uma tecelagem que fazia de tudo um pouco (tapetes, bolsas, roupas, botas...) e chegamos a ter mais de 50 pessoas fiando lã. Exigente e meticulosa, Fátima estava sempre destacando os pontos fracos de cada equipamento e eu tentando melhorá-los. Assim se formou a minha linha de equipamentos, na busca de uma qualidade superior, dentro do conceito de durabilidade / robustez e praticidade de manuseio. Era uma linha de equipamentos exclusivamente profissionais, com teares de até 560cm de largura, agora acabo de desenvolver um modelo de tear pente-liço mais barato, com pente de poliestireno

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ao invés de latão e com uma estrutura mais leve, para atender aos hobbistas. Outro trabalho que faço nesta linha é o desenvolvimento de equipamentos especiais para atender a demandas de clientes, como rocas para fiar fio de bananeira e taboa, teares para tecer fitas plásticas, etc.

5. Soubemos que o Senhor tem prestado consultorias pelo Sebrae. Como se deu esse envolvimento e por onde o Senhor tem viajado?

Quando trabalhava no BB fiz um trabalho para o FUNDEC (Fundo de Desenvolvimento Comunitário) onde aprendi muito sobre mobilização e organização comunitária, tendo ajudado na organização de associações comunitárias e na elaboração de planos de desenvolvimento. A partir de 1990 comecei o trabalho com consultorias em parceria com a EMATER do Paraná e de Minas e depois comecei a atuar com prefeituras e ong’s. Estas primeiras consultorias eram exclusivamente sobre tecelagem, estruturação de oficinas, treinamento técnico e desenvolvimento de linha de produtos. Após desenvolver minha linha de produtos dA Bambuzeria, fui contratado pelo Sebrae Minas para atuar como designer de artesanato. Depois me contrataram, com o mesmo objetivo, o Sebrae do Acre e um consórcio da Vale do Rio Doce e CEMIG. Em 2005 fechei um pedido de 30.000 saboneteiras de bambu para O Boticário, e depois outros pedidos aconteceram, o que inviabilizou a continuidade das atividades como consultor.

6. O Senhor. poderia nos contar sobre seu trabalho com o Bambu?

Em 1998 assisti a uma palestra na Feira Nacional de Artesanato em BH do mestre bambuzeiro Lucio Ventania, e fiquei encantado com o bambu. Um mês depois ele já estava em minha oficina dando um curso para um grupo de pessoas de Itanhandu. Aprendi os princípios básicos do trabalho com o bambu e comecei imediatamente a produzir algumas peças – era uma linha de velas. Comecei então uma pesquisa dos métodos de tratamento do bambu até chegar no que utilizo atualmente e me dá uma boa garantia de qualidade. A intimidade com o bambu cresceu e desenvolvi uma linha de luminárias e acessórios para banheiro onde vivenciei a busca de um design bem brasileiro para o bambu. Atualmente estou reestruturando e ampliando a linha de produtos em função da boa aceitação do mercado e pela demanda de exportação.

7. Gostaria de acrescentar mais alguma coisa que não tenha sido perguntado?

Gostaria de dar um toque para as pessoas que estão fazendo a opção de ser artesão agora: nunca, em toda a história do Brasil industrializado, o artesanato foi tão reconhecido, valorizado e produzido. Mas nunca também o consumidor foi mais consciente e exigente quanto á qualidade física e estética dos produtos. Esta realidade é muito boa, mas nos remete ao fato de que para conquistar mercado e nos manter nele não basta fazer a mesma coisa que outros artesãos estão fazendo, é necessário buscar sua própria identidade, seu próprio produto, que como você, é carregado da cultura e outras influências regionais que o tornam único. Esta unicidade somada a uma boa qualidade é o que o mercado busca.

Agradecemos sua boa vontade em participar desta entrevista e nos colocamos desde já à sua disposição para qualquer eventualidade. Prof. René Scholz