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Instituto Superior de Economia e Gestão Universidade Técnica de Lisboa Equações Diferenciais & Equações às Diferenças João Nicolau Preparado para a cadeira de Equações Diferenciais (2 0 ano) da Licenciatura de Matemática Aplicada à Economia e Gestão (versão 2) 2003

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Instituto Superior de Economia e GestãoUniversidade Técnica de Lisboa

Equações Diferenciais&

Equações às Diferenças

João Nicolau

Preparado para a cadeira de Equações Diferenciais (20 ano) da Licenciatura de

Matemática Aplicada à Economia e Gestão

(versão 2)2003

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Conteúdo

I Equações Diferenciais 6

1 Definições e Resolução de Equações Diferenciais 9

1.1 Definições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

1.2 Algumas Equações Diferenciais Univariadas de Primeira Ordem com Solução

Fechada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

1.2.1 Equação Linear (Primeira Ordem) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

1.2.2 Equação Com Variáveis Separáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

1.2.3 Equação Homogénea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

1.2.4 Equação Total Exacta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

1.2.5 Equação Redutível a Total Exacta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

1.3 Equações Diferenciais Redutíveis a Equações Diferenciais de Primeira Ordem . . 31

1.3.1 Equações do Tipo x00 = f (t, x0) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

1.3.2 Equações do Tipo x00 = f (x, x0) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

1.4 Aplicação (Modelos Populacionais) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

1.4.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

1.4.2 Estimação dos Parâmetros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36

1.4.3 Comentários Finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39

2 Existência, Unicidade e Prolongamento das Soluções 43

2.1 Existência e Unicidade das Soluções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

2.1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

2.1.2 Teorema de Existência e Unicidade das Soluções . . . . . . . . . . . . . . 44

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2.2 Prolongamento das Soluções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

2.3 Caso Multivariado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60

3 Aproximações Numéricas 65

3.1 Método de Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66

3.2 Outras Aproximações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72

4 Sistemas de Equações Lineares 76

4.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76

4.2 Sistema de Equações Diferenciais Homogéneas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79

4.2.1 Primeiras Noções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79

4.2.2 Matriz Fundamental de Soluções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83

4.2.3 Resolução do Sistema x0 = Ax . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88

4.3 Sistema de Equações Diferenciais Não Homogéneas . . . . . . . . . . . . . . . . . 103

5 Estabilidade 111

5.1 Definições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111

5.2 Estabilidade de Sistemas Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119

5.3 Estabilidade de Sistemas Não Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123

5.3.1 Linearização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123

5.3.2 Método Directo de Liapunov . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129

5.4 Métodos Gráficos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133

5.4.1 Equações Univariadas de Primeira ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134

5.4.2 Sistemas de Duas ED . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 138

II Equações às Diferenças 161

6 Equações Lineares 166

6.1 Equação Linear Primeira Ordem Não homogénea com Coeficientes Variáveis . . . 166

6.2 Equação Linear de ordem n Não homogénea Com Coeficientes Constantes . . . . 168

6.2.1 Equação Homogénea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 169

6.2.2 Equação Não Homogénea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 174

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6.3 Equações Linearizáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 178

7 Sistemas de Equações Lineares Não Homogéneas Com Coeficientes Con-

stante 185

7.1 Caso Homogéneo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 187

7.1.1 Caso Geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 188

7.1.2 Sistema de Duas Equações (n = 2) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 192

7.2 Caso Não Homogéneo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 200

8 Estabilidade 202

8.1 Pontos Fixos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 202

8.1.1 Definições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 202

8.1.2 Estabilidade de Sistemas Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 208

8.1.3 Estabilidade de Sistemas Não Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 212

8.1.4 Bacia do Escoadouro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 217

8.2 Pontos Periódicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 225

8.2.1 Definições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 225

8.2.2 Estabilidade dos Pontos Periódicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 231

8.3 Aplicação I (Problema de Afectação de Turmas) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 234

8.4 Aplicação II (Método Newton-Raphson) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 238

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Nota IntrodutóriaApresentamos neste documento um conjunto de apontamentos que servem de base à cadeira

Equações Diferenciais do 2o ano da licenciatura de MAEG (Matemática Aplicada à Economia e

Gestão/ISEG). Na exposição dos temas procurou-se um equilíbrio entre a abordagem quantita-

tiva, baseada na resolução de equações diferenciais (e às diferenças) e a abordagem qualitativa

das soluções, mais avançada, mas mais importante. O mundo é intrinsecamente não linear

e complexo. Daí que, quando se analisa um fenómeno real através de equações diferenciais

(ou equações às diferenças) não é geralmente possível obter expressões em "forma fechada"das

soluções, i.e., expressões analíticas envolvendo funções simples e transcendentais que represen-

tem a solução de uma equação diferencial (ou de uma equação às diferenças). Nestes casos a

abordagem quantitativa é completamente inútil. Outros casos existem onde a solução, embora

conhecida, é demasiadamente complicada para ser analisada. Mais uma vez, o estudo qual-

itativo das soluções é preferível. A abordagem quantitativa tem, no entanto, a vantagem de

ser mais pedagógica, sobretudo para quem inicia o estudo das equações diferenciais. Assim,

apresentam-se alguns métodos de resolução de equações diferenciais mais importantes ou mais

conhecidas, mas sempre que possível, simplifica-se ou abrevia-se a análise quantitativa. Por

exemplo, não se apresenta a teoria das equações diferenciais lineares de ordem n de coeficientes

constantes, dado que estas podem ser tratadas no âmbito dos sistemas lineares. Apenas a

resolução de sistemas lineares é tratado com algum desenvolvimento, não só porque a teoria é

suficientemente geral mas sobretudo porque vários resultados de sistemas lineares são usados

no estudo (qualitativo) dos sistemas não lineares.

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Parte I

Equações Diferenciais

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Suponha-se que se pretende estudar um fenómeno (económico, físico, biológico, etc.) ao

longo do tempo. Designamos o fenómeno pela letra x e, como x depende de t (tempo), usare-

mos também a notação x (t). Na maioria dos casos, é possível estabelecer uma relação entre

x0, t e x. Por exemplo, seja x (t) uma população de uma certa espécie (humana, de bactérias,

de predadores, etc.) no instante t e suponhamos, numa situação ideal, que x (t) varia continua-

mente. Seja r a diferença entre a taxa de natalidade e a taxa de mortalidade por unidade de

tempo. A variação da população num certo intervalo de tempo ∆ > 0 pode ser traduzida pela

igualdade (x (t+∆)− x (t)) /x (t) = r∆ ou seja (x (t+∆)− x (t)) /∆ = rx (t) . Com ∆ → 0

tem-se a equação diferencia (ED) x0 = rx. A partir desta relação é fácil (como veremos) obter

a fórmula matemática que estabelece o nível da população em cada instante t, x (t) = x (0) ert,

onde x (0) é o valor da população no momento ou instante zero. Quer dizer, se a dinâmica

infinitesimal de x é bem traduzida pela ED x0 = rx então a população evolui de acordo com a

fórmula x (t) = x (0) ert. Iremos designar esta fórmula por solução. Na maioria dos problemas

mais complicados (leia-se não lineares) não é possível obter a ”fórmula” x (t) . Felizmente, a

teoria das ED está suficientemente desenvolvida para que todas as questões relevantes possam

ser respondidas sem se recorrer à expressão analítica da solução da ED. Questões ”relevantes”

podem ser, por exemplo, qual o comportamento de longo prazo das soluções? Serão periódi-

cas? Tenderão para algum valor? Como reagem a pequenas perturbações? O estudo destas

questões constitui a abordagem qualitativa das equações diferenciais, em oposição à abordagem

quantitativa baseada na resolução das equações diferenciais.

Ao contrário do que sucede na área das ciências exactas, não é geralmente possível traduzir-

se um fenómeno económico ou financeiro ao longo do tempo através de uma relação exacta

(por exemplo, não há nenhuma ED que ajuste de forma perfeita o PIB, um índice da bolsa,

etc.). Embora se admita que as variáveis económicas e financeiras evoluem ao longo do tempo

de acordo com certo padrão, há desvios constantes face ao padrão. Esses desvios devem-se

ao acaso ou, eventualmente, a um conjunto de regras que o investigador não conhece. Um dos

problemas maiores na modelação dos fenómenos económicos consiste exactamente na procura do

padrão subjacente que governa o fenómeno. Retomando o exemplo atrás citado, considerámos

como apropriado a ED x0 = rx para descrever a dinâmica infinitesimal de uma população

genérica. Ora, para r > 0 tem-se limx (t) = +∞ pelo que a ED não poderá traduzir a rigor a

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dinâmica de uma população humana no longo prazo. Para esta ED haveria que levar em conta

outros factores, como por exemplo, recursos disponíveis, imigração, emigração, etc. Os factores

que individualmente fossem pouco significativos, poderiam ser englobados numa variável erro,

susceptível de ser descrita em termos probabilísticos.

Em econometria, seguem-se usualmente os seguintes passos na construção do modelo es-

tatístico (modelo de regressão): 1) (a) estabelecer as principais relações a partir da teoria

económica e (b) identificar as principais características do fenómeno em estudo; 2) especificar

o modelo; 3) estimar o modelo (a partir dos dados disponíveis) e 4) avaliar os resultados obti-

dos. Estes passos são também válidos na especificação da ED [sobretudo os passos 1) e 2)].

A rigor os fenómenos económicos e sociais não são susceptíveis de serem descritos de forma

determinística. Em modelos mais realistas em tempo contínuo, introduz-se explicitamente uma

componente aleatória que reflecte tudo aquilo que a relação determinística não explica. Estes

modelos são representados por equações diferenciais estocásticas (EDE). Na especificação destas

equações, são inteiramente válidos os passos [1) a 4)] acima referidos.

Embora as ED determinísticas não sejam apropriadas para modelarem fenómenos de na-

tureza económica (pois como se disse, não contemplam a componente aleatória) são, no entanto,

extremamente úteis no âmbito da teoria económica. Além disso, são um bom ponto de partida

para o estudo das EDE, da estabilidade e do caos em sistemas dinâmicos.

* Incompleto *

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Capítulo 1

Definições e Resolução de Equações

Diferenciais

1.1 Definições

Seja t ∈ I ⊂ R onde I é aberto. Uma equação da forma

F³t, x (t) , x0 (t) , x00 (t) , ..., x(n) (t)

´= 0 (1.1)

é designada por equação diferencial (ED) ordinária de ordem n. A equação (1.1) estabelece uma

relação entre a função incógnita x (t), a variável independente t e as derivadas de x. Dado que

(1.1) se apresenta numa forma implícita esta equação pode representar de facto uma colecção

de ED. Por exemplo, a ED (x0 (t))2−x (t)−1 = 0 conduz a duas equações, x0 (t) =px (t) + 1 e

x0 (t) = −px (t) + 1. Para evitar ambiguidades que a equação (1.1) pode levantar, vai admitir-

se que (1.1) é resolúvel em ordem a x(n) (t); nestas circunstâncias, a equação (1.1) escreve-se na

forma

x(n) (t) = f³t, x (t) , x0 (t) , x00 (t) , ..., x(n−1) (t)

´(1.2)

onde f é definida em I × Rn. A equação (1.2) pode-se escrever equivalentemente na forma

x(n) = f¡t, x, x0, x00, ..., x(n−1)

¢, estando implícita a dependência de x e das suas derivadas face

a t. Um caso particular importante é quando n = 1 (ED de ordem um), i.e., x0 (t) = f (t, x (t))

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ou x0 = f (t, x) .

Estudam-se também as chamadas ED parciais. Nestas equações, x depende de várias va-

riáveis independentes (para além de t), e estabelece-se uma relação entre x, as variáveis inde-

pendentes e as respectivas derivadas parciais de x (por exemplo, z−∂x (t, z) /∂t = z∂x (t, z) /∂z

é uma ED parcial). As ED parciais não são objecto do presente texto. Doravante a designação

”ED” quer dizer equação ou equações diferenciais ordinárias.

É importante distinguir ED lineares das ED não lineares. Diz-se que a ED (1.2) é linear

se f¡t, x, x0, x00, ..., x(n−1)

¢é linear em x, x0, x00, ..., x(n−1) e não linear no caso contrário. Na

situação n = 1 (ordem um), a ED linear é do tipo x0 = a (t)x + b (t) (a (t) e b (t) podem ser

funções não lineares). Exemplos de ED lineares de primeira ordem: x0 = tx+1, x0 = (sen t)x+t2,

etc. Exemplos de ED não lineares: x0 = x2 + t, x0 =√tx+ 1.

Uma ED (ou um sistema de ED) do tipo x0 = f (x) (f não depende de t) designa-se por ED

homogénea ou autónoma.

Suponha-se que certo fenómeno x evolui de acordo com a função (a) x (t) = e3t. Como

x0 (t) = 3e3t = 3x (t) podemos estabelecer (b) x0 = 3x. Nos problemas que iremos tratar a

equação (a) a prior não é conhecida. Normalmente conhece-se a dinâmica infinitesimal dada

por uma equação do tipo (b) e o objectivo consiste em obter uma função do tipo (a), designada

por solução.

Definição 1 (Solução) 1Uma função x (t) é designada uma solução da ED x(n) =

f¡t, x, x0, x00, ..., x(n−1)

¢num intervalo I se

(a) x(n) (t) existe em I;

(b) x (t) satisfaz x(n) (t) = f¡t, x (t) , x0 (t) , x00 (t) , ..., x(n−1) (t)

¢.

Exemplo 1 A função x (t) = ce− sen t, c ∈ R, t ∈ R é solução da ED x0 = −x cos t em R

(note-se f (t, x) = −x cos t). Com efeito,

x0 (t) = ce− sen t (− cos t) = −x (t) cos t = f (t, x (t)) ,

1De igual forma, uma função x (t) é designada uma solução da ED F t, x, x0, x00, ..., x(n) = 0 num intervalo

I se (a) x(n) (t) existe em I e (b) x (t) satisfaz F t, x (t) , x0 (t) , x00 (t) , ..., x(n) (t) = 0.

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i.e., a solução satisfaz a ED; por outro lado, x0 (t) = ce− sen t (− cos t) existe em R.

Exemplo 2 As funções x1 (t) = e−2t, x2 (t) = et para t ∈ R são soluções da ED de segunda

ordem x00 = −x0 + 2x em R (note-se que f (t, x, x0) = −x0 + 2x). Por exemplo, em relação a

x1 (t), tem-se x01 (t) = −2e−2t e x001 (t) = 4e−2t. Resulta 4e−2t = 2e−2t + 2e−2t [i.e., verifica-

se a alínea b) da definição anterior, x001 (t) = −x01 (t) + 2x1 (t) = f (t, x (t) , x0 (t))]. O mesmo

raciocínio se aplica a x2 (t).

As soluções destes últimos exemplos foram escritas de forma explícita. Poderíamos também

escrever a solução na forma implícita Φ (t, x, c) = 0. Por exemplo, Φ (t, x, c) = x (t)−ce− sen t = 0é a solução implícita da ED x0 = −x cos t (ver exemplo 1). É sempre preferível apresentar asolução na forma explícita, por razões óbvias. No entanto, por vezes não se consegue ou não é

fácil escrever a solução explicitamente. Por exemplo, log |t+ 1|− x (t) + log¯ex(t) + 1

¯+ c = 0

é solução implícita da ED x0 = (ex + 1) / (t+ 1) , t 6= −1 (ver exercícios) e não é possívelexplicitar x (t) .

No exemplo 1 vimos que x (t) = ce− sen t, c ∈ R é solução da ED x0 = −x cos t. Comoa constante c pode assumir qualquer valor em R, qualquer das seguintes expressões e− sen t,

−50e− sen t, πe− sen t, 101000e− sen t é uma solução da ED x0 = −x cos t. A definição seguinte

esclarece a natureza destas soluções.

Definição 2 (Solução Geral & Solução Particular) Uma solução de uma ED é designada

por solução geral se inclui todas as soluções da ED. Uma solução particular é uma solução

deduzida a partir da solução geral.

Exemplo 3 Retomando o exemplo 1, pode-se estabelecer que x (t) = ce− sen t, c ∈ R é a

solução geral da ED x0 = −x cos t e, expressões como, e− sen t, −50e− sen t, πe− sen t, 101000e− sen t

são soluções particulares, dado que são deduzidas a partir da solução geral. Na figura 1-1

apresentam-se três soluções particulares2 para t ∈ [0, 10] e, na figura 1-2, apresentam-se 64soluções particulares, também no mesmo intervalo (a constante c assume agora 64 valores).

Em geral não é fácil resolver-se uma ED, i.e., obter-se a sua solução. Considere-se, por

exemplo, a ED x0 (t) = f (t, x (t)) ou dx (t) = f (t, x (t)) dt (note-se x0 (t) := dx (t) /dt)3 e

2Quais são os valores que a constante c assume?3a := b significa a é igual a b por definição.

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Figura 1-1: Três Soluções Particulares da ED x0 = −x cos t

2 4 6 8 10t

2

4

6

8x

Figura 1-2: Sessenta e Quatro Soluções Particulares da ED x0 = −x cos t

2 4 6 8 10t-7.5

-5

-2.5

0

2.5

57.5

x

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suponha-se que f é contínua nos seus argumentos. Integrando ambos os termos vem x (t) =Rf (t, x (t)) dt+ const. A dificuldade inicial não está na resolução do integral mas no seguinte

facto: para se obter x (t) (lado esquerdo da equação) é necessário resolver-se o lado direito

da equação; mas o lado direito depende de x (t) que é precisamente o que procuramos obter.

Iremos estudar oportunamente técnicas para resolver certos tipos de ED.

O tipo mais simples de ED de primeira ordem corresponde à ED x0 = f (t) . Integrando

ambos os termos resulta que a solução geral é x (t) = Pt (f (t))+ c, onde Pt designa a primitiva

de f (t). Por exemplo, a solução geral de x0 = t é x (t) = t2/2 + c, c ∈ R. Qualquer queseja o valor atribuído a c, a função x (t) é sempre uma solução. Suponha-se que c = 1 então

x (t) = t2/2 + 1 é uma solução particular pois foi deduzida a partir da solução geral.

É evidente que para cada valor da constante c definida na solução geral se obtém uma curva

no plano (t, x) . A solução geral representa de facto uma família de curvas planas indexadas ao

parâmetro c. A esta família dá-se o nome de família de curvas integrais (dependente de um

parâmetro). Faremos no entanto a distinção entre a família de curvas integrais e solução geral

(ver observação 3).

Exemplo 4 Considere-se a ED não linear de primeira ordem x0 =³−t+√t2 + 4x

´/2 (*).

Não existe a prior um método para resolver esta ED. No entanto, considere-se o artifício mu-

dança de variável y (t) = y =√t2 + 4x. Esta equação expressa em x é x =

¡y2 − t2

¢/4.

Derivando esta equação em ordem a t, resulta x0 = (2yy0 − 2t) /4 = (yy0 − t) /2 (**). Logo

igualando as equações (*) e (**) vem

(−t+ y) /2 =¡yy0 − t

¢/2

ou seja y0 = 1 ou ainda y = t+ c1. Como x =¡y2 − t2

¢/4 resulta

x (t) =

³(t+ c1)

2 − t2´

4=1

2tc1 +

1

4c21 = tc+ c2

(para simplificar fizemos c = c1/2). Na figura 1-3 traçam-se algumas soluções particulares

fazendo variar a constante c.

13

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Figura 1-3: Soluções Particulares da ED x0 =³−t+√t2 + 4x

´/2

-10 -5 5 10

-20

20

40

60

Observação 1 (Envolventes de Curvas Integrais) A envolvente de uma família de curvas

integrais Φ (t, x, c) = 0 (caso exista) é uma curva g (t, x) = 0 tal que a) em cada ponto da curva

g (t, x) = 0 passa (sendo tangente) um elemento da família Φ (t, x, c) = 0 e b) g (t, x) = 0 é

tangente a todas a todas as curvas integrais. Assim, g (t, x) = 0 é uma curva envolvente se

existir uma função c (t, x) tal que a)

g (t, x) = Φ (t, x, c (t, x)) = 0

e b) os declives de g (t, x) = 0 e Φ (t, x, c) = 0 são iguais em todos os pontos (t, x) . Mostra-se

a seguir que a alínea b) traduz-se na condição Φ0c = 0. Suponha-se que Φ0x 6= 0 e Φ0t 6= 0. Entãog (t, x) = 0 define implicitamente x como função de t através (digamos) de uma expressão do

tipo x = φ (t) . O declive da tangente à curva g (t, x) = 0 é x0 = φ0 (t) e obtém-se a partir da

equação

Φ0t +Φ0xx0 +Φ0c

∂c

∂t+Φ0c

∂c

∂xx0 = 0⇒ x0 = − Φ

0t +Φ

0c∂c∂t

Φ0x +Φ0c ∂c∂x(1.3)

(pela fórmula de derivação da função implícita). Encarando Φ (t, x, c) = 0 como a família de

curvas integrais (e não como a envolvente) então c é uma constante. Neste caso o declive da

tangente à curva Φ (t, x, c) = 0 obtém-se a partir da equação

Φ0t +Φ0xx0 = 0⇒ x0 = −Φ

0t

Φ0x(1.4)

14

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Figura 1-4: Envolvente (traço grosso) e Curvas Particulares da ED x0 =³−t+√t2 + 4x

´/2

-10 -5 5 10

-20

20

40

60

Para que g (t, x) = 0 seja a curva envolvente é necessário que os declives (1.3) e (1.4) sejam

iguais, pelo que deve-se exigir Φ0c = 0. Para exemplificar retome-se o exemplo 4. Determine-se a

envolvente (caso exista) da família de curvas integrais Φ (t, x, c) = x− tc− c2 = 0. Considere-seΦ (t, x, c (t, x)) = 0 e determine-se uma função c (t, x) que satisfaça as condições expressas nas

alíneas a) e b). Vem

Φ0c = 0⇒ −t− 2c = 0⇔ c = − t

2.

Por outro lado,

Φ (t, x, c (t, x)) = 0⇔ x− tc (t, x)− c2 (t, x) = 0.

Com c = − t2 vem

Φ (t, x, c (t, x)) = Φ

µt, x,− t

2

¶= 0⇔ x− t

µ− t

2

¶−µ− t

2

¶2= 0⇒ x = −1

4t2.

Assim x (t) = −14 t2 é a expressão (explícita) da curva envolvente da família de curvas inte-grais. Na figura 1-4 representa-se a envolvente (a traço grosso) assim como algumas curvas

particulares.

Observação 2 (Soluções Singulares) Designamos soluções singulares de uma ED às soluções

da ED que não podem ser obtidas a partir da família de curvas integrais. Toda a curva envol-

vente que não pode ser obtida a partir da família de curvas integrais é naturalmente uma solução

15

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singular. Com efeito, a curva envolvente é uma solução da ED pois em cada ponto da envolvente

Φ (t, x, c (t, x)) = 0 as quantidades t, x e x0 são as mesmas para a envolvente e para a curva da

família. Mas a envolvente pode ser ou não uma curva da família. Se não for é óbvio que tam-

bém não pode ser deduzida a partir da família das curvas integrais e, neste caso, a envolvente

é uma solução singular da ED. Resulta claro também que a existência de soluções singulares

implica a violação da unicidade das soluções (este aspecto será discutido com mais detalhe no

ponto 2.1). Para exemplificar retome-se o exemplo 4. Vimos na observação 1 que −14t2 é aenvolvente da família de curvas integrais associadas à ED não linear x0 =

³−t+√t2 + 4x

´/2.

Por isso φ (t) = −14t2 é também solução (de facto φ0 =³−t+

pt2 + 4φ

´/2) e, como φ (t) não

pode ser deduzida a partir da solução x (t) = tc + c2 resulta que φ (t) = −14t2 é uma soluçãosingular.

Observação 3 Iremos mostrar que uma ED linear tem apenas uma única solução geral. Por

seu lado, uma ED não linear, como vimos na observação 2, pode ter uma solução "geral"e

soluções singulares. Para evitar ambiguidades, reservamos o termo solução geral apenas para

ED lineares. Assim, no caso de ED não lineares utilizaremos preferencialmente a designação

família de curvas integrais (dependente de um parâmetro) para designar soluções do tipo x (t) =

tc+ c2 (ver observação anterior).

Na generalidade dos problemas não estamos interessados na solução geral (ou na família

de curvas integrais) mas apenas numa solução particular que satisfaz uma condição inicial. A

determinação de uma solução particular corresponde a seleccionar uma particular função da

família de curvas integrais.

Exemplo 5 Suponha-se que no momento t = 0 dispomos de 1000 Euros para investir a uma

taxa fixa de 5% ao ano capitalizável continuamente. Para determinarmos o valor do capi-

tal no momento t, x (t) (podemos convencionar: t = 1 representa um ano), começamos por

formular o problema a partir de uma ED. Se o capital se valorizasse em tempo discreto, a

variação do capital num certo intervalo de tempo ∆ > 0 poderia ser traduzida pela igual-

dade (x (t+∆)− x (t)) /x (t) = r∆, onde r = 0.05, ou seja (x (t+∆)− x (t)) /∆ = rx (t) .

Como, por hipótese, o capital se valoriza continuamente tem-se, com ∆ → 0 a ED x0 = rx,

ou x0 = 0.05x. Pode-se provar que a solução geral da ED é x (t) = ce0.05t, c ∈ R. Como

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x (0) = 1000 (no momento t = 0 o capital é 1000 Euros) a constante c determina-se univoca-

mente. Com efeito, x (0) = ce0.05×0 = c = 1000. Por exemplo, o valor do capital ao fim de 10

anos e 6 meses é x (10.5) = 1000e0.05×10.5 = 1690. 5 (Euros).

Definição 3 (PVI) Uma ED x0 = f (t, x) equipada com uma condição do tipo x (t0) = x0

forma um problema de valor inicial (PVI).

No exemplo 5 o PVI corresponde a x0 = 0.05x, x (0) = 1000.

Definição 4 (Solução do PVI) Uma função real x (t) definida em I é designada por solução

do PVI

x0 = f (t, x) , x (t0) = x0, t ∈ I

se,

(i) x0 (t) existe para t ∈ I;

(ii) x0 (t) = f (t, x (t)) , t ∈ I e

(iii) x (t0) = x0, t0 ∈ I.

Exemplo 6 A solução do PVI x0 = −x cos t, x (π) = 3 é x (t) = 3e− sen t. Com efeito, suponha-se que já se conhece a solução geral x (t) = ce− sen t, c ∈ R, t ∈ R [ver exemplo 1]. Basta verificarque x (π) = 3⇔ ce− senπ = 3⇔ c = 3.

Observação 4 Temos vindo a assumir que a ED é escalar (ou univariada). Os sistemas de

ED de primeira ordem,

x01 = f1 (t, x1, x2, ..., xn)

x02 = f2 (t, x1, x2, ..., xn)

...

x0n = fn (t, x1, x2, ..., xn)

também se podem escrever na forma x0 = f (t, x) onde, obviamente, x = (x1, x2, ..., xn)T e

f = (f1, f2, ..., fn)T é uma função definida em I × Rn. As principais definições apresentadas

adaptam-se facilmente ao caso multivariado. Por exemplo, considere-se a definição 4. Uma

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função x (t) = (x1 (t) , x2 (t) , ..., xn (t))T definida em I é designada por solução do PVI se as

alíneas (i)-(iii) são válidas. Por exemplo, no caso (iii) x (t0) = x0, t0 ∈ I a condição interpreta-

se da seguinte forma:

x (t0) = x0 ⇔ (x1 (t0) , x2 (t0) , ..., xn (t0))T = (x10, x20, ..., xn0)

T .

Também os sistemas de ED de ordem superior a um podem ser escritos na forma x0 = f (t, x)

mediante uma substituição apropriada das variáveis. Voltaremos a esta questão.

Exemplo 7 Mostre-se que

x (t) =

x1 (t)

x2 (t)

= e2−2e1−t

2e1−t

é solução do PVI x1

x2

0 = x1x2

−x2

, x1 (1)

x2 (1)

= 12

em R (note-se que x0 = f (x) onde

f (x) =

f1 (x)

f2 (x)

= f1 (x1, x2)

f2 (x1, x2)

= x1x2

−x2

).É imediato verificar-se (i), (ii) e (iii). Com efeito,

x01 (t) = 2e1−te2−2e1−t= x1 (t)x2 (t)

x02 (t) = −2e1−t = −x2 (t)

e

x (1) =

x1 (1)

x2 (1)

= e2−2e1−1

2e1−1

= 12

.

18

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1.2 Algumas Equações Diferenciais Univariadas de Primeira

Ordem com Solução Fechada

1.2.1 Equação Linear (Primeira Ordem)

A ED x0 = f (t, x) designa-se por equação linear de primeira ordem não autónoma (ou não

homogénea) se f (t, x) = a (t)x+ b (t). Tem-se,

Teorema 1 Considere-se a ED x0 = a (t)x+ b (t) onde a (t) e b (t) são funções contínuas em

I. Então a solução geral em I é

x (t) = eξ(t)µZ

b (t) e−ξ(t)dt+ c

¶, t ∈ I (1.5)

onde ξ (t) =Ra (t) dt.

Dem. Em primeiro lugar note-se que as expressões ξ (t) eRb (t) e−ξ(t)dt estão bem definidas

em I dado que a (t) e b (t) são funções contínuas nesse intervalo. Seja x (t) uma solução de

x0 (t) = a (t)x (t) + b (t) .

Multipliquemos ambos os termos desta equação por e−ξ(t). Temos

x0 (t) e−ξ(t) = a (t)x (t) e−ξ(t) + b (t) e−ξ(t)

x0 (t) e−ξ(t) − a (t)x (t) e−ξ(t) = b (t) e−ξ(t)³x (t) e−ξ(t)

´0= b (t) e−ξ(t)

x (t) e−ξ(t) =

Zb (t) e−ξ(t)dt+ c

x (t) = eξ(t)µZ

b (t) e−ξ(t)dt+ c

¶.

Provámos que qualquer solução x (t) tem a forma (1.5). Reciprocamente, qualquer função da

forma (1.5) é solução de x0 = a (t)x+b (t) . Com efeito, por derivação e considerando o teorema

19

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fundamental do cálculo integral,

dx (t)

dt=

d¡eξ(t)

£Rb (t) e−ξ(t)dt+ c

¤¢dt

=d¡eξ(t)

¢dt

µZb (t) e−ξ(t)dt+ c

¶+ eξ(t)

d¡R

b (t) e−ξ(t)dt+ c¢

dt

= a (t) eξ(t)µZ

b (t) e−ξ(t)dt+ c

¶| {z }

x(t)

+ eξ(t)b (t) e−ξ(t)

= a (t)x (t) + b (t) .¥

Observação 5 É fácil verificar que a solução do PVI x0 = a (t)x+b (t) , x (t0) = x0 com t0 ∈ I

é

x (t) = eξ(t)µZ t

t0

b (s) e−ξ(s)ds+ c

¶, c = x0e

−ξ(t0). (1.6)

Exemplo 8 Resolva-se o PVI x0 = (sen t)x+sen t, x (0) = 1. Como a (t) = sen t e b (t) = sen t

são funções contínuas em R, a solução está definida em R. Considere-se em primeiro lugar,

ξ (t) =

Z(sen t) dt = − cos t,Z

b (t) e−ξ(t)dt =

Z(sen t) e−ξ(t)dt

=

Z(sen t) ecos tdt

= −ecos t.

A solução geral vem então,

x (t) = eξ(t)µZ

b (t) e−ξ(t)dt+ c

¶= e− cos t

¡−ecos t + c¢

= −1 + e− cos tc

Considerando agora x (0) = 1, tem-se

x (0) = 1⇔ −1 + e− cos 0c = 1⇔ c = 2e.

20

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Figura 1-5: Curva x (t) = −1 + 2e1−cos t, t ∈ [0, 10]

2 4 6 8 10t

2468101214x

Figura 1-6: Curva x (t) = −1 + 2e1−cos t, t ∈ [0, 200]

50 100 150 200t

2468101214x

Assim, a solução do PVI é x (t) = −1 + 2e1−cos t, t ∈ R [poderíamos também ter considerado

a equação (1.6)]. A representação gráfica de x (t) no intervalo t ∈ [0, 10] é dada na figura 1-5;a mesma representação mas no intervalo t ∈ [0, 200] é dada na figura 1-6. Observe-se que asolução é periódica.

Exemplo 9 Considere-se a ED x0 = −x/t+ 2, t > 0. A solução geral é x (t) = t+ c/t, t > 0.

O facto de x (t) não estar definido para t = 0 não causa surpresa pois a (t) = −1/t não écontínua no ponto t = 0. Com efeito, o teorema 1 só garante a existência de uma única solução

de x0 = −x/t + 2 no intervalo onde a (t) = −1/t e b (t) = 2 são contínuas. É no entanto

interessante observar que a ED com a condição inicial x (1) = 1 tem por solução particular

21

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x (t) = t e esta solução está definida para t ∈ R. Conclusão: se a (t) e b (t) forem contínuas em

I a solução de um PVI está necessariamente bem definida em I. Pode no entanto suceder que a

solução exista para outros pontos não contidos em I. Mas, se a solução não está definida para

certos valores de t é porque nesses mesmos pontos a (t) e/ou b (t) não são contínuas.

1.2.2 Equação Com Variáveis Separáveis

A ED x0 = f (t, x) designa-se por equação com variáveis separáveis se f (t, x) = f1 (t) f2 (x) . Ou

seja, nestas condições, f (t, x) pode decompor-se no produto de duas funções, uma dependendo

apenas de t e a outra dependendo apenas de x. Suponha-se que f1 (t) e f2 (x) são contínuas em

I1 e I2, respectivamente, e f2 (x) 6= 0 em I2. Tem-se x0 = f1 (t) f2 (x)⇔ dx/dt = f1 (t) f2 (x) e,

portanto, com f2 (x) 6= 0 em I2,

dx

f2 (x)= f1 (t) dt ou

dx (t)

f2 (x (t))= f1 (t) dt (1.7)

Integrando ambos os termos da última equação com respeito a t, obtém-se a solução da ED em

I1 Z t 1

f2 (x (s))dx (s) =

Z t

f1 (s) ds+ c

onde c é uma constante arbitrária. A equação anterior pode-se escrever na forma

Z x(t) 1

f2 (y)dy =

Z t

f1 (s) ds+ c, (1.8)

ou ainda Z1

f2 (x)dx =

Zf1 (t) dt+ c. (1.9)

Mostre-se que (1.8) é solução da ED. Definindo

F (t) = Φ (t, x (t) , c) =

Z x(t) 1

f2 (y)dy −

Z t

f1 (s) ds− c = 0

22

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vem, pela fórmula da derivação da função implícita, dF (t) /dt = ∂Φ (t, x, c) /∂t+∂Φ (t, x, c) /∂x dx/dt =

0 e pelo teorema fundamental do cálculo integral,

−f1 (t) + 1

f2 (x)x0 = 0

isto é, x0 = f1 (t) f2 (x) . Resulta imediato que o PVI x0 = f1 (t) f2 (x) , x (t0) = x0 tem por

solução4 Z x(t)

x0

1

f2 (y)dy =

Z t

t0

f1 (t) dt. (1.10)

Observação 6 Suponha-se que f2 (x) se anula no ponto a, i.e. f2 (a) = 0. Então x (t) ≡ a é

também solução da equação pois a0 = 0 e f (t, a) = 0. Se a solução obtida em (1.8) [ou (1.9)] não

contemplar como solução particular x (t) ≡ a então esta solução foi perdida no processo formal

de separação de variáveis (note-se que a equação (1.7) apenas está definida para f2 (x) 6= 0).

Exemplo 10 Considere-se x0 = t√x. A função f (t, x) pode decompor-se no produto f1 (t) f2 (x)

onde f1 (t) = t e f2 (x) =√x, x ≥ 0. Aplicando a fórmula (1.9) vem R

1√xdx =

Rtdt + c i.e.

2√x = 1

2t2 + c . A solução na forma explícita é x (t) = 1

16 t4 + 1

4 t2c + 1

4c2. Observa-se que

x (t) ≡ 0 é também solução pois f2 (0) =√0 = 0.

Exemplo 11 Considere-se o PVI x0 = x2, x (0) = 1. Aplicando a fórmula (1.9) vemR

1x2 dx =R

dt + c ou seja − 1x = t + c ou ainda x (t) = −1/ (t+ c) . Para determinar c faz-se x (0) =

−1/ (0 + c) = 1 o que implica c = −1. A solução do PVI é portanto x (t) = 1/ (1− t) para

−∞ < t < 1. Observe-se que a solução ”explode” em tempo finito, i.e. limt↑1 x (t) = +∞.

ED com soluções deste tipo, geralmente não servem para modelarem fenómenos naturais e

económicos. Uma discussão mais ampla sobre esta problemática é apresentada no ponto 2.1.

1.2.3 Equação Homogénea

A ED x0 = f (t, x) (com f contínua, como habitualmente) designa-se por equação homogénea

se f (t, x) é uma função homogénea de grau zero (em relação a t e x). Recorda-se que f (t, x)

é uma função homogénea de grau n em relação às variáveis t e x se se tiver para todo o

4Com efeito, seja F a primitiva de 1/f2. A solução (1.10) pode-se escrever na forma F (x (t)) = F (x0) +t

t0f1 (t) dt e é imediato que F (x (t0)) = F (x0) .

23

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λ, f (λt, λx) = λnf (t, x) . As funções homogéneas de grau zero possuem a particularidade

de f (t, x) ser igual a f (1, x/t) (t 6= 0). Basta considerar n = 0 e λ = 1/t na expressão

f (λt, λx) = λnf (t, x) . Assim, se f é homogénea de grau zero vem

f (t, x) = f³1,x

t

´. (1.11)

Sob a hipótese (1.11) a ED inicial pode-se escrever na forma x0 = f (1, x/t) . Considere-se a

mudança de variável y = x/t. A partir das relações x = yt e x0 = y0t+y obtemos uma nova ED

y0t+ y = f (1, y) que é uma ED com variáveis separáveis. Ponha-se y0t+ y = f (1, y) na forma

y0

f (1, y)− y=1

t.

Depois de se integrar ambos os termos da equação vem

Z1

f (1, y)− ydy =

Z1

tdt+ c

ou ainda Z1

f (1, y)− ydy = log |t|+ c. (1.12)

Esta equação fornece a solução da ED y0t + y = f (1, y) . Para obter a solução da ED original

basta substituir na solução obtida em (1.12) y por x/t.

Exemplo 12 Considere-se x0 = f (t, x) =¡x+ 2te−x/t

¢/t, t > 0. Verifique-se em primeiro

lugar que f (t, x) é homogénea de grau zero:

f (λt, λx) =λx+ 2 (λt) e−(λx)/(λt)

λt= λ0

x+ 2te−x/t

t= f (t, x) .

Logo com λ = 1/t e y = x/t fica

f³1,x

t

´=

x/t+ 2 (t/t) e−(x/t)/1

1= y + 2e−y = f (1, y) .

24

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Figura 1-7: x (t) = (log (2 log t+ 1)) t para t > e−12

1 2 3 4 5 6

-4

-2

2

4

6

8

Aplicando a fórmula (1.12) resulta

Z1

y + 2e−y − ydy = log t+ c⇔

Z1

2e−ydy = log |t|+ c

e a solução na forma implícita é1

2ey = log t+ c.

A solução da ED original na forma implícita é

1

2ex/t = log t+ c.

Resolvendo em ordem a x vem x (t) = (log (2 log t+ 2c)) t com t tal que 2 log t + 2c > 0.

Suponha-se agora que a condição inicial é x (1) = 0. Assim x (1) = (log (2 log 1 + 2c)) 1 =

(log (2c)) = 0 ⇒ 2c = 1, i.e. c = 1/2. Assim a solução do PVI é x (t) = (log (2 log t+ 1)) t

para t > e−12 . O intervalo

³e−

12 ,+∞

´designa-se por intervalo de existência da solução e, como

veremos oportunamente, o intervalo é maximal. Na figura 1-7 representa-se a solução do PVI.

1.2.4 Equação Total Exacta

Assuma-se que as funções M (t, x) e N (t, x) são contínuas num certo rectângulo R e têm

derivadas parciais com respeito a t e x contínuas no mesmo rectângulo R.

25

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Definição 5 A ED M (t, x) dt +N (t, x) dx = 0 designa-se por ED total exacta se existe uma

função F : R ⊆ R2 → R tal que

dF (t, x) =M (t, x) dt+N (t, x) dx.

A solução na forma implícita é naturalmente F (t, x) = c. Colocam-se duas questões:

primeiro, em que condições existe esta função F?; segundo, como determinar F , ou seja,

como determinar a solução? O teorema seguinte e a respectiva demonstração esclarecem estas

questões.

Teorema 2 Assuma-se que as funções M (t, x) e N (t, x) são contínuas num certo rectângulo

R e têm derivadas parciais com respeito a t e x contínuas no mesmo rectângulo R. Então a

condição∂M (t, x)

∂x=

∂N (t, x)

∂t. (1.13)

implica a existência de uma função F : R ⊆ R2 → R (designada primitiva da diferencial) tal

que

dF (t, x) =M (t, x) dt+N (t, x) dx, (t, x) ∈ R. (1.14)

Reciprocamente, se existe F nas condições de (1.14) então verifica-se (1.13).

Dem. Suponha-se que (1.14) é um diferencial total de F . Então dF (t, x) = F 0tdt + F 0xdx

e, como se sabe do cálculo diferencial, necessariamente F 00tx = F 00xt se F 00tx e F 00xt são funções

contínuas. Mas F 00tx ≡ ∂M(t,x)∂x e F 00xt ≡ ∂N(t,x)

∂t são funções contínuas, por hipótese. Logo (1.13)

é uma condição necessária para que M (t, x) dt+N (t, x) dx = 0 seja um diferencial total. Falta

mostrar o recíproco, i.e. que (1.13) é suficiente para que exista uma função F nas condições

do teorema. Em particular dever-se-á ter F 0t = M e F 0x = N. Suponha-se válida a condição

(1.13). Considere-se uma função F tal que F 0t (t, x) = M (t, x) . Tem-se, integrando em ordem

à variável t,

F (t, x) =

Z t

t1

M (u, x) du+ φ (x)

onde t1 é a abcissa dum ponto arbitrário no domínio de existência da solução e φ (x) é uma

função com derivada contínua em R (constante para a derivação em t). Observe-se que

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∂F (t, x)

∂x=

Z t

t1

∂M (u, x)

∂xdu+ φ0 (x) .

A derivada parcial F 0x é igual a N se e só se

∂F (t, x)

∂x= N (t, x)⇔

Z t

t1

∂M (u, x)

∂xdu+ φ0 (x) = N (t, x)

mas como ∂M∂x =

∂N∂t vem

R tt1

∂N(u,x)∂t du+ φ0 (x) = N (t, x) i.e. [N (u, x)]tt1 + φ0 (x) = N (t, x) ou

ainda N (t, x)−N (t1, x) + φ0 (x) = N (t, x) e, portanto, φ0 (x) = N (t1, x) . Resulta

φ (x) =

Z x

x1

N (t1, z) dz

(x1 é uma constante arbitrária). Consequentemente,

F (t, x) =

Z t

t1

M (u, x) du+ φ (x) =

Z t

t1

M (u, x) du+

Z x

x1

N (t1, z) dz (1.15)

Se tomarmos o diferencial desta última expressão juntamente com a equação (1.13) chega-se a

(1.14)5, isto é, provámos que sob a hipótese (1.13) existe uma função F , dada pela expressão

(1.15), tal que o diferencial é dF (t, x) =M (t, x) dt+N (t, x) dx.¥

O teorema anterior e a respectiva demonstração permite estabelecer o seguinte: 1) a ED

M (t, x) dt + N (t, x) dx = 0 é exacta sse a condição (1.13) se verifica; 2) a solução da ED é

definida implicitamente por F (t, x) = c, c ∈ R i.e.Z t

t1

M (u, x) du+

Z x

x1

N (t1, z) dz = c. (1.16)

Exemplo 13 Considere-se o PVI¡et + 2x

¢dx+etxdt = 0, x (0) = 1. A ED não é de variáveis

separáveis nem homogénea. No entanto, com N = et + 2x, M = etx tem-se

∂M

∂x=

∂N

∂t= et

5Note-se que a derivada de t

t1M (u, x) du +

x

x1N (t1, z) dz em ordem a t é M (t, x) e em ordem a x é

t

t1(∂M (u, x) /∂x) du+N (t1, x) =

t

t1(∂N (u, x) /∂t) du+N (t1, x) = N (t, x) . Logo o diferencial da expressão

(1.15) é efectivamente dF =M (t, x) dt+N (t, x) dx.

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e, portanto, a ED é total exacta (i.e. a igualdade ∂M/∂x = ∂N/∂t garante a existência de

uma função F nos termos da definição 5). Aplicando a fórmula (1.16), a solução (ou família

de curvas integrais) na forma implícita é

Z t

t1

euxdu+

Z x

x1

¡et1 + 2z

¢dz = c⇔ etx− et1x+ et1x+ x2 − x1e

t1 − x21 = c

ou etx (t)+x (t)2 = c (note-se que x1et1 e x21 são constantes arbitrárias; podemos fazer x1 = 0).

Atendendo a x (0) = 1⇔ e0+1 = c a solução do PVI na forma implícita é etx (t)+ x (t)2 = 2.

1.2.5 Equação Redutível a Total Exacta

Considere-se a ED M (t, x) dt+N (t, x) dx = 0 ondeM (t, x) e N (t, x) são contínuas num certo

rectângulo R e têm derivadas parciais com respeito a t e x contínuas no mesmo rectângulo

R. Vimos no ponto anterior que a condição (1.13) é necessária e suficiente para que a ED

M (t, x) dt+N (t, x) dx = 0 seja uma ED total exacta. Suponha-se agora que

∂M (t, x)

∂x6= ∂N (t, x)

∂t.

Definição 6 Uma ED M (t, x) dt + N (t, x) dx = 0 diz-se redutível a uma ED total exacta se

existir uma função não nula µ (t, x) tal que

µ (t, x)M (t, x) dt+ µ (t, x)N (t, x) dx = 0 (1.17)

é uma ED total exacta. A função µ (t, x) designa-se factor integrante.

A situação é, portanto, a seguinte: a ED M (t, x) dt +N (t, x) dx = 0 não é uma ED total

exacta e não se sabe resolver; por outro lado (1.17) é uma ED total exacta e sabe-se resolver.

De facto, com M (t, x) = µ (t, x)M (t, x) e N (t, x) = µ (t, x)N (t, x) a solução de (1.17) é, pela

fórmula (1.16), Z t

t1

M (u, x) du+

Z x

x1

N (t1, z) dz = c. (1.18)

Deixa-se como exercício mostrar que (1.18) é solução da ED (1.17). Impõem-se as seguintes

questões: a) a solução de (1.17), i.e. (1.18), é também solução da ED inicial M (t, x) dt +

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N (t, x) dx = 0? b) como determinar µ? A resposta a a) é positiva. Com efeito, seja x (t)

a solução da ED (1.17) (considere-se Φ (t, x, c) = 0, no caso de não ser possível obter uma

solução explícita). Logo x (t) satisfaz a ED µ (t, x)M (t, x) dt + µ (t, x)N (t, x) dx = 0 ou seja

µ (t, x) (M (t, x) dt+N (t, x) dx) = 0. Como µ é uma função não nula, resulta que x (t) satisfaz

também a ED M (t, x) dt + N (t, x) dx = 0 e, portanto, x (t) é solução da ED M (t, x) dt +

N (t, x) dx = 0.6

Relativamente à alínea b) iremos mostrar como determinar µ nos casos em que µ depende

apenas de t ou apenas de x (outros casos são possíveis - ver exercícios). Para que a ED (1.17)

seja uma ED total exacta é necessário e suficiente que

∂ (µ (t, x)M (t, x))

∂x=

∂ (µ (t, x)N (t, x))

∂t,

ou seja

µ∂M

∂x+

∂µ

∂xM = µ

∂N

∂t+

∂µ

∂tN. (1.19)

A equação (1.19) é uma ED parcial com função desconhecida µ. A solução de (1.19) é, em

geral, difícil de obter. No entanto, se µ = µ (t) (µ depende apenas de t) ou µ = µ (x) (depende

apenas de x) então (1.19) é uma ED ordinária com solução conhecida. Formule-se a hipótese

Ht: µ = µ (t). Nestas circunstâncias, a equação (1.19) pode escrever-se na forma

µ∂M

∂x= µ

∂N

∂t+

dtN

ou ainda na forma1

µdµ = h1 (t) dt, h1 (t) =

∂M∂x − ∂N

∂t

N(1.20)

A equação (1.20) é uma ED com variáveis separáveis (com função incógnita µ) com solução

µ = e h1(t)dt.

6No entanto, algumas soluções podem perder-se. Por exemplo, se o factor integrante for µ = 1/x, x 6= 0 euma das soluções da ED M (t, x) dt+N (t, x) dx = 0 for x (t) ≡ 0, pode suceder que a solução da ED (1.17) nãorevele a solução x (t) ≡ 0.

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No caso Hx: µ = µ (x) pode-se mostrar que

µ = e h2(x)dx, h2 (x) =∂N∂t − ∂M

∂x

M.

Existem outras hipóteses simplificadoras. Por exemplo, µ = µ (xy) ou µ = (x+ y) .

Num exercício concreto, µ é desconhecido pelo que não se sabe de que forma µ depende

de t e/ou x (ou mesmo se µ existe nas condições da definição 6). Nestas circunstâncias, pode-

se seguir o seguinte procedimento quando se procura determinar µ: 1) formular a hipótese

Ht: µ = µ (t) ; 2) calcular h1; 3) se h1 depender apenas de t, aceita-se a hipótese Ht e o factor

integrante é µ = exp¡R

h1 (t) dt¢. A solução da ED é dada pela expressão (1.18). Se h1 depende

de x rejeita-se Ht e passa-se ao passo 4): formular a hipótese Hx: µ = µ (x) ; 5) calcular h2; 6)

se h2 depender apenas de x, aceita-se a hipótese Hx e o factor integrante é µ = exp (h2 (x) dx) .

A solução da ED é dada pela expressão (1.18). Se h2 depende de t deve-se procurar outro

método de resolução (ou, eventualmente, investigar outras hipóteses relativas a µ).

Exemplo 14 Considere-se a ED¡x+ tx2

¢dt− tdx = 0. Tem-se M = x+ tx2 e N = −t. Como

∂M/∂x = 1+2tx 6= ∂N/∂t = −1 a ED não é total exacta. Analise-se a hipótese Ht: µ = µ (t) .

Tem-se

h1 =∂M∂x − ∂N

∂t

N=1 + 2tx− (−1)

−t = −21 + tx

t.

Como h1 depende explicitamente de t e x (devia depender apenas da variável t) a hipótese Ht

não é válida. Investigue-se a hipótese Hx: µ = µ (x) . Tem-se

h2 =∂N∂t − ∂M

∂x

M=−1− 1− 2tx

x+ tx2=−2 (1 + tx)

x (1 + tx)= −2

x

e a hipótese Hx é válida, pelo que o factor integrante é

µ = e h2(x)dx = e − 2xdx = e−2 log x =

1

x2.

30

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Assim, multiplicando a ED inicial por 1/x2 obtém-se a ED total exacta¡x+ tx2

¢x2

dt− t

x2dx = 0 ou

µ1

x+ t

¶| {z }

M

dt− t

x2|{z}N

dx = 0,

cuja solução é

Z t

t1

M (u, x) du+

Z x

x1

N (t1, z) dz = c i.e.Z t

t1

µ1

x+ u

¶du+

Z x

x1

µ− t1z2

¶dz = c

ou ainda 2t+t2x−2t1−t21x2x − t1

x−x1xx1

= c. Com t1 = 0 vem 2t+t2x2x = c ou seja (na forma explícita)

x (t) = 2t2c−t2 .

1.3 Equações Diferenciais Redutíveis a Equações Diferenciais

de Primeira Ordem

Certas ED de ordem superior à primeira podem ser transformadas numa ED de primeira ordem

através de uma mudança de variáveis. As ED lineares de ordem superior a um são abordadas

no ponto 4.1.

1.3.1 Equações do Tipo x00 = f (t, x0)

Trata-se de uma ED de segunda ordem que não depende explicitamente de x. Considerando

a mudança de variável y (t) = x0 (t) tem-se y0 = f (t, y) que é uma ED de primeira ordem.

Resolvendo a ED y0 = f (t, y) obtém-se y (t) que, por integração dá x (t) .

Exemplo 15 Considere-se a ED tx00−x0 = t2et que verifica as condições x (1) = −1 e x0 (1) =0. Considerando a mudança de variável y = x0 vem ty0 − y = t2et, i.e.,

y0 =1

ty + tet, y (1) = 0

que é uma ED linear de primeira ordem.

31

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Aplicando a fórmula (1.6) vem

ξ (t) =

Za (t) dt =

Z1

tdt = log t

y (t) = eξ(t)

= t

µZ t

1sese− log sds+ 0

¶= t

µZ t

1esds

¶= t

¡et − e

¢.

Assim

x (t) =

Zy (t) dt, x (1) = −1

=

Zt¡et − e

¢dt

= tet − et − 12t2e+ c

e, portanto, x (1) = −1⇒ c = 12e− 1.

Observação 7 A ED x(n) = f¡t, x(n−1)

¢sem x resolve-se de forma similar, considerando a

mudança de variável y (t) = x(n−1) (t) .

1.3.2 Equações do Tipo x00 = f (x, x0)

Trata-se de uma ED de segunda ordem que não depende explicitamente de t. Considerando a

mudança de variável y (x) = x0 (t) tem-se

x00 (t) =d (y (x (t)))

dt=

dy

dx

dx

dt= y0 (x) y (x) .

Logo a ED x00 = f (x, x0) pode escrever-se na forma

y0 (x) y (x) = f (x, y)

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que é uma ED de primeira ordem (com variável independente x). Resolvendo esta ED obtém-se

y (x). Dada a relação y (x) = x0 (t) , obtém-se x (t) resolvendo

1

y (x)dx = dt

que é uma ED de variáveis separáveis.

Exemplo 16 Resolva-se a ED x00 = 2x0x. Com a mudança de variável y (x) = x0 (t) obtém-se

y0y = 2yx, i.e. y0 = 2x (ED com variável independente x) cuja solução é y = x2 + c1. Para

obter x (t) resolve-se agora a ED1

x2 + c1dx = dt

cuja solução, na forma implícita é

arctg³

x√c1

´√c1

= t+ c2.

1.4 Aplicação (Modelos Populacionais)

1.4.1 Introdução

Seja x (t) uma população de uma certa espécie (humana, de bactérias, de predadores, etc.) no in-

stante t e suponhamos, numa situação ideal, que x (t) varia continuamente7. Seja r (t, x) a difer-

ença entre a taxa de natalidade e a taxa de mortalidade (por unidade de tempo) no momento

t. A variação da população num certo intervalo de tempo ∆ > 0 pode ser traduzida pela igual-

dade (x (t+∆)− x (t)) /x (t) = r (t, x (t))∆ ou seja (x (t+∆)− x (t)) /∆ = r (t, x (t))x (t) .

Com ∆ → 0 tem-se a ED x0 = r (t, x)x. No caso r (t, x) = r (constante) a equação x0 = rx

é conhecia como a equação de Malthus. Sabendo-se o valor da população x0 num dado mo-

mento t0, é imediato concluir-se que a solução (do PVI) é x (t) = x0er(t−t0). Toda a espécie

que satisfaça a lei de Malthus cresce exponencialmente no tempo. O modelo, apesar de atrac-

tivo (pela sua simplicidade) é pouco realista. Se tomarmos para r o valor 0.02 para dados

7Na verdade x (t) varia discretamente com t pelo que x (t) não é uma função diferenciável (nem mesmo con-tínua) com respeito a t. No entanto, se o valor da população é alto a variação de uma unidade tem pouca expressãocomparada com o valor da população. Nestas circunstâncias pode-se admitir, com um erro negligenciável, quex (t) é uma função contínua e mesmo diferenciável.

33

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anuais (estimativa obtida a partir de dados da população dos EUA) qualquer previsão a longo

prazo é desprovida de significado8. Mesmo assim, o modelo de Malthus pode aproximar ra-

zoavelmente o crescimento de populações de dimensão reduzida (ver Braun, 1993). Todavia,

quando o valor da população excede certo limiar os indivíduos passam a competir entre si pelos

recursos disponíveis (espaço, recursos naturais e alimentação). Esta competição abranda ou

trava o crescimento da população. Para contemplar este efeito é necessário definir na ED um

termo (função) tal que, quando x é alto ou muito alto, x0 deve abrandar ou diminuir. Uma

possibilidade consiste em adicionar o termo −bx2 (b > 0) na equação de Malthus, ficando

x0 = r1x− bx2, r, b > 0.

Esta equação, designada por equação logística, foi proposta pelo matemático e biologista Ver-

hulst em 1837. Normalmente o parâmetro b é pequeno, comparado com o de r1. Assim, quando

o valor da população é baixo a quantidade −bx2 é negligenciável e a população evolui aproxi-madamente de acordo com a regra x0 = r1x. À medida que x aumenta, o termo −bx2 passa aexercer um efeito de contracção no crescimento da população. A resolução da equação logística,

embora fácil é trabalhosa. Trata-se de uma ED com variáveis separáveis,

1

r1x− bx2dx = dt

cuja família de curvas integrais é

Z1

r1x− bx2dx =

Zdt+ c.

Para primitivar a função 1r1x−bx2 em ordem a x é necessário decompor a função em fracções

simples. Deixa-se como exercício verificar que

1

r1x− bx2=−1r1

b

bx− r1+1

r1

1

x

8Por exemplo, se a população mundial crescer de acordo com o modelo x0er(t−t0), r = 0.02, no ano de 2515 aárea disponível para cada habitante no planeta, incluindo mares, rios e lagos será inferior a um metro quadrado(ver Braun, 1993, pp. 26-27).

34

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Figura 1-8: Cronograma da População dos EUA (em milhões de Hab.)

0

50

100

150

200

250

300

1800

1810

1820

1830

1840

1850

1860

1870

1880

1890

1900

1910

1920

1930

1940

1950

1960

1970

1980

1990

2000

e Z µ−1r1

b

bx− r1+1

r1

1

x

¶dx = ... = − 1

r1log

¯bx− r1

x

¯.

A família de curvas integrais na forma explícita é

x (t) =r1

b− e−r1tc1, (c1 é uma constante).

Dada a condição inicial x (0) = x0, a solução do PVI é

x (t) =x0r1

bx0 + e−tr1 (r1 − bx0).

Vai analisar-se a qualidade dos modelos x0 = rx e x0 = rx − bx2 com base nos dados

da população dos EUA. Na figura 1-8 apresenta-se a evolução da população dos EUA desde

1800. Existe claramente uma tendência crescente, porém a ritmos decrescentes, como se pode

observar na figura 1-9, onde se apresenta a variação relativa da população ao longo do tempo

(log (x (t+∆) /x (t)) ≈ (x (t+∆)− x (t)) /x (t)). Se o modelo de Malthus fosse correcto a

expressão r = log (x (t+∆) /x (t)) /∆ deveria ser (aproximadamente) constante ao longo dos

anos.

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Figura 1-9: Variação Relativa da População (log (x (t+∆) /x (t)))

0.09

0.14

0.19

0.24

0.29

0.34

1810

1820

1830

1840

1850

1860

1870

1880

1890

1900

1910

1920

1930

1940

1950

1960

1970

1980

1990

2000

1.4.2 Estimação dos Parâmetros

Uma das fases mais importantes em qualquer estudo empírico consiste na estimação dos parâmet-

ros dos modelos especificados. Esta tarefa apenas pode ser resolvida cabalmente no contexto

de um modelo probabilístico, que exigiria, no nosso caso, acrescentar-se às ED um termo es-

tocástico construído a partir dos chamados processos de Wiener (ou movimentos Brownianos).

Como não pode entrar-se nessa área, vai apresentar-se um procedimento mecânico de estimação

dos parâmetros9.

Convencione-se: t = 0⇔ ano 1800; t = 1⇔ ano 1810 e assim sucessivamente. Em qualquer

dos modelos a condição inicial pode ser fixada como x (0) = 5.3. O modelo de Mathus vem

então

xM (t) = 5.3ert.

A questão é estimar o parâmetro desconhecido r. Devemos escolher r de tal forma que a diferença

entre os valores efectivamente observados x (t) e o modelo xM (t) seja mínima. Trata-se então

9Poderá provar-se que os resultados que se obtêm por este método mecânico são idênticos aos que se al-cançariam se se usasse o método de estimação dos Mínimos Quadrados Condicionados, o qual fornece estimadoresconsistentes em sentido probabilístico.

36

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de um problema de minimização em ordem a r, i.e.,

minr>0

d

x (1)

x (2)

...

x (n)

,

xM (1)

xM (2)

...

xM (n)

onde d (a, b) representa uma distância entre os vectores a e b e n representa o número de obser-

vações disponíveis. Considerando o critério habitual (minimização das diferenças quadráticas10)

d (a, b) = (a− b)T (a− b) =P

t (at − bt)2 o problema de optimização é então

minr>0

20Xt=1

(x (t)− xM (t))2 = min

r>0

20Xt=1

¡x (t)− 5.3ert¢2 .

Qualquer programa de estatística (por ex., GAUSS, TSP, EXCEL11) resolve facilmente este

problema de optimização. A solução é r = 0.20712 (taxa de crescimento na unidade 10 anos -

note-se que t = 1 representa 10 anos; numa base anual a taxa de crescimento é de 0.020712)12.

Uma medida do erro associado ao modelo é

20Xt=1

³x (t)− 5.3ert

´2= 908.9.

Relativamente ao modelo logístico o problema de minimização é

minr1,b>0

20Xt=1

(x (t)− xL (t))2 = min

r1,b>0

20Xt=1

µx (t)− 5.3r1

b5.3 + e−tr1 (r1 − b5.3)

¶210O estimador dos mínimos quadrados do modelo de regressão clássico (para modelos discretos) baseia-se neste

princípio, como se verá na cadeira de econometria.11Opção Solver em Tools (escolher Add-Ins caso a opção não esteja disponível).12Uma estimativa alternativa pode-se obter tendo em conta que log xM (t) = log 5.3+ rt. O problema de opti-

mização é agora minr>020t=1 (log x (t)− log xM (t))2 = minr>0

20t=1 (log x (t)− log 5.3− rt)2 . É fácil deduzir,

aplicando a condição de primeira ordem do problema de optimização, que

r =20t=1 log xM − n log 5.3

20t=1 ti

= 0.23.

Esta estimativa não coincide com a anterior. A estimativa "correcta"dependeria do modelo probabilístico quese considerasse. Por exemplo, se o modelo fosse log xM (t) = log 5.3+ rt+ e (t) sendo e (t) uma variável aleatóriacom "boas propriedades"então a estimativa "correcta"seria r = 0.23. Se o modelo fosse xM (t) = 5.3ert + e (t) aestimativa "correcta"seria r = 0.20712.

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Figura 1-10: Ajustamento: Modelo de Malthus vs. Modelo Logístico

0

50

100

150

200

250

300

350

400

1800

1810

1820

1830

1840

1850

1860

1870

1880

1890

1900

1910

1920

1930

1940

1950

1960

1970

1980

1990

2000

Pop.Pop. Est (Malthus)Pop. Est (Logis.)

cuja solução é r1 = 0.2754 e b = 0.000823. Os erros de ajustamentos são agora

20Xt=1

x (t)− 5.3r1

b5.3 + e−tr1³r1 − b5.3

´2 = 31.23.

Observa-se com o modelo logístico uma redução muito forte dos erros de ajustamento. Também

a figura 1-10, na qual se compara o valor observado x (t) com os valores estimados pelos dois

modelos, corrobora essa ideia.

Os modelos podem também servir para prever o valor futuro de x (t) . Por exemplo, a

previsão do modelo de Malthus para o ano 2140 é xM (34) = 5.3er×34 = 6062 (milhões)13. Na

figura 1-11 mostram-se as previsões dos dois modelos até ao ano 2140. Enquanto o modelo

logístico estabelece uma estabilização da população dos EUA em torno do valor 334 (milhões),

o modelo de Malthus prevê valores arbitrariamente altos à medida que t→ +∞.

13Note-se que se convencionou que t = 0 corresponde ao ano 1800, t = 1 ao ano 1810 e assim sucessivamente.Procedendo assim t = 34 corresponde ao ano 2140.

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Figura 1-11: Previsão: Modelo de Malthus vs. Modelo Logístico

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

1800

1830

1860

1890

1920

1950

1980

2010

2040

2070

2100

2130

Pop.Pop. Est (Malthus)Pop. Est (Logis.)

1.4.3 Comentários Finais

Retomando o modelo logístico, é interessante verificar que

limt→+∞x (t) = lim

t→+∞x0r1

bx0 + e−tr1 (r1 − bx0)=

r1b, r1, b > 0

Assim a população tende para o valor r1/b quando t→ +∞. Observe-se também que no ponto

x = r1/b a função f (t, x) = f (x) = r1x − bx2 é nula pelo que, nesse ponto, a população não

cresce nem decresce (digamos, está em equilíbrio). No capítulo Estabilidade designaremos o

valor r1/b como um ponto de equilíbrio assimptoticamente estável. No contexto do exemplo

anterior, obteve-se r1 = 0.2754 e b = 0.000823. Assim, a previsão de (muito) longo prazo para

o valor da população é 0.2754/0.000823 = 334. 63 (milhões de indivíduos), valor que a figura

1-11 também confirma.

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Exercícios

1. Classifique as ED (ordem, linearidade e autonomia) apresentadas nos restantes exercícios

do Cap. 1.

2. Mostre que x (t) = cecos t, c ∈ R é solução da ED x0 = −x sen t = 0 em R.

3. Mostre que x (t) = c1et + c2te

t+2+ t, c1, c2 ∈ R é solução da ED x00 − 2x0+ x = t em R.

4. Mostre que log (t+ 1)− x (t) + log¡ex(t) + 1

¢+ c = 0, c ∈ R é solução (implícita) da ED

x0 = (ex + 1) / (t+ 1) em t > −1.

5. Mostre que x (t) = 2t/¡3− t2

¢é solução do PVI x0 = x/t+x2, x (1) = 1 em I =

£1,√3¢.

6. Mostre que x (t) = log¡t2/2− 2¢ é solução do PVI x0 = te−x, x

¡√6¢= 0 em I = ]2,+∞[ .

7. Obtenha a solução geral da ED x0 = −x/t+ 2, t > 0.

8. Obtenha a solução geral da ED x0 − (n/t)x = ettn, n ∈ R, t > 0.

9. Resolva x2¡1 + x02

¢= k2, obtenha as curvas envolventes à família de curvas integrais e

mostre que estas curvas são soluções singulares.

10. Resolva o PVI t2 x0x + 2t log x = 0, x (1) = e1.

11. Resolva x0 + 1+x3

tx2(1+t2)= 0.

12. Resolva o PVI x0 = xt

¡1 + log x

t

¢, x (1) = e.

13. Resolva x0 = tx/¡t2 − x2

¢.

14. Resolva 2tx3+ x2−3t2

x4x0 = 0.

15. Resolva o PVI x0 = −x+ g (t) , x (0) = 0 onde

g (t) =

2 0 ≤ t ≤ 10 t > 1.

16. Dada a ED x0 = a (t)x + b (t) com a e b contínuas e a e f tais que a (t) ≤ −k < 0 e

limt→+∞ b (t) = 0, mostre que qualquer solução tende para zero quando t→ +∞.

40

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17. Mostre que uma ED com variáveis separáveis pode sempre se escrever como uma ED total

exacta (suponha verificadas certas condições de regularidade).

18. Mostre que uma ED do tipo M (t, x) dt + N (t, x) dx = 0 onde M e N são funções ho-

mogéneas do mesmo grau é uma ED homogénea.

19. (Exame) Resolva o seguinte PVI

¡t3 + 3x2t+ 5

¢dx+

¡3t2x+ x3 + 2

¢dt = 0, x (1) = 1.

20. Mostre que a ED (de Bernoulli) x0+P (t)x = Q (t)xn, n 6= 1, n 6= 0, onde P (t) e Q (t) sãofunções contínuas pode-se transformar-se através de mudança de variável z (t) = x (t)1−n

na ED linear z0 + (1− n)P (t) z = (1− n)Q (t) . Como aplicação resolva x0 + tx = t3x3.

21. (Exame) Resolva o PVI

x0 =x

t

³1 + log

x

t

´, x (1) = e.

22. Considere a EDM (t, x) dt+N (t, x) dx = 0 comM eN funções reais de classe C1 definidasem D =

©(t, x) ∈ R2 : t > 0, x > 0

ª.

(a) Considere a hipótese de o factor integrante µ depender apenas do produto tx, i.e.

µ = µ (tx) com µ definido em D e de classe C1. Fazendo a substituição z = tx, mostre

que esta hipótese é válida se dado

h3 =∂N∂t − ∂M

∂x

tM − xN

a função h3 depender apenas de z = tx. Conclua, nesse caso, que o factor integrante

é µ (z) = e h3(z)dz.

(b) Como aplicação resolva x2t+ 1/t+¡1/x− t2x

¢x0 = 0.

23. (Exame) Considere a equação diferencial linear posta na forma

dx+ (a (t)x+ b (t)) dt = 0

41

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onde a e b são funções contínuas em R.

(a) Mostre que esta equação é redutível a uma equação diferencial total exacta (para o

efeito determine o factor integrante).

(b) Encarando a equação linear como uma equação redutível a uma equação diferen-

cial total exacta, obtenha a solução geral para o caso a (t) = b (t) = 2t e calcule

limt→+∞ x (t) .

24. Resolva o PVI x00 = (x0)2 /x, x0 (0) = 1, x (0) = −1.

25. Resolva a ED x00 = x0t

³1 + log x0

t

´.

26. (Exame) Considere o PVI

x0 = −ax+ g (t, x) , x (0) = x0, a: constante positiva.

(a) Mostre que

x (t) = e−atx0 + e−atZ t

0easg (s, x (s)) ds

é solução do PVI.

(b) Admita as seguintes hipóteses:

H1: |g (t, x)| ≤ b (t) |x| , b (t) ≥ 0

H2:R +∞t0

b (t) dt < +∞, t0 ∈ R.

Mostre que |x (t)| tende para zero quando t → +∞. Considere o seguinte lema: seja c

uma constante não negativa e z (t) e v (s) funções não negativas. Se

z (t) ≤ c+

Z t

0z (s) v (s) ds

então

z (t) ≤ cet0 v(s)ds.

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Capítulo 2

Existência, Unicidade e

Prolongamento das Soluções

2.1 Existência e Unicidade das Soluções

2.1.1 Introdução

Um PVI pode não ter solução, ter uma única solução ou ter mais do que uma solução (por

exemplo, uma infinidade delas).

Exemplo 17 a) Se f é a função Dirichlet,

f (t, x) =

1 se t é racional

0 se t é irracional

não é naturalmente possível encontrar uma função x (t) que satisfaça x0 = f (t, x) . b) Considere-

se a ED x02 + x2 = 0. A única solução real é x (t) ≡ 0. Assim o PVI x02 + x2 = 0, x (0) = 1

não tem solução. c) O PVI x0 =√x, x (0) = 0 tem mais do que uma solução: x (t) ≡ 0 e

x (t) = t2/4. d) O PVI x0 = ex, x (0) = 0 tem uma única solução x (t) = − log (1− t) em

t ∈ (−∞, 1) . e) O PVI x0 + x = 0, x (0) = 1 tem uma única solução, x (t) = e−t em R.

Modelos sem soluções não têm obviamente interesse. Problemas de valores iniciais com

várias soluções colocam o problema de se saber qual é a solução que efectivamente traduz o

43

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comportamento do fenómeno. Modelos deste tipo geralmente estão mal especificados (i.e., a

função f (t, x) não está bem definida).

Estes problemas não ocorrem com ED lineares, as quais possuem, como vimos no teorema

1, uma única solução. Além disso, a solução é conhecida (i.e. é sempre possível obter uma

solução fechada). Com as ED não lineares a situação é diferente. Se a solução é conhecida

é possível discutir-se a questão da existência da solução directamente a partir da respectiva

expressão analítica. Por exemplo, considere-se o PVI x0 = x2, x (0) = 1. A solução deste PVI é

x (t) = 1/ (1− t) e claramente se verifica que a solução existe para −∞ < t < 11. Mas, se for

impossível obter uma solução fechada para o PVI x0 = f (t, x) , x (t0) = x0 como poderemos

garantir que o PVI admite uma solução única? E será esta questão relevante? Afinal de contas,

mesmo que a solução exista e seja única é impossível obtê-la. É importante verificar que, na

prática, mesmo desconhecendo-se a solução, é possível, através de métodos numéricos (fazendo-

se uso da função f (t, x)), obter-se aproximações tão precisas quanto se deseje. Por outro lado,

as propriedades limites (assimptóticas) da solução podem também ser estudadas apenas a partir

da função f (t, x) e sem o conhecimento da solução fechada. No entanto, a aplicação de métodos

numéricos e o estudo das propriedades limites da solução só fazem sentido no caso em que a

solução existe e é única. Assim, é fundamental estudarmos a questão da existência e unicidade

das soluções.

2.1.2 Teorema de Existência e Unicidade das Soluções

O caso linear x0 = a (t)x+ b (t), onde a (t) e b (t) são funções contínuas em I, foi abordado no

teorema 1 e observação 5. Vimos que a solução do PVI x0 = a (t)x+ b (t) , x (t0) = x0 existe e

é única em I.

O caso não linear é tratado a seguir (até ao final do corrente ponto). A demonstração do

teorema de existência e unicidade para o PVI

x0 = f (t, x) , x (t0) = x0 (2.1)

1É incorrecto dizer-se que a solução existe para t 6= 1, embora a função 1/ (1− t) esteja definida para t 6= 1.De facto, a solução passa no ponto (t, x) = (0, 1) e ”explode” ou "extingue-se"quando t ↑ 1. Não se admite,portanto, que a solução possa continuar para valores de t tais que t > 1.

44

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consiste em mostrar que, sob as condições do teorema, que iremos especificar, existe uma

sequência de funções {xn (t) , n ≥ 1} construídas a partir do PVI tal que, a) xn (t) convergepara x (t), b) x (t) é a solução do PVI, c) x (t) é uma função contínua e d) x (t) é solução única.

Para demonstrarmos o teorema de existência e unicidade é necessário estabelecer alguns

resultados preliminares.

Considere-se o conjunto compacto

Ra,b = {(t, x) : |t− t0| ≤ a, |x− x0| ≤ b} . (2.2)

Lema 1 Se a função f (t, x) é contínua em Ra,b então o PVI (2.1) é equivalente à equação

integral

x (t) = x0 +

Z t

t0

f (s, x (s)) ds (2.3)

para t tal que |t− t0| ≤ a.

Dem. Devido à continuidade de f em Ra,b tem-se o seguinte. Se x (t) é uma solução

de (2.1) então integrando (2.1) no intervalo [t0, t] obtemos (2.3). Reciprocamente, derivando

(2.3) obtém-se x0 = f (t, x (t)). Além disso, considerando t = t0 na expressão (2.3) obtém-se

x (t0) = x0 + 0 = x0.¥

Nas condições do lema anterior uma equação integral é uma forma de escrever uma ED e

vice-versa, i.e. as duas representações são equivalentes.

Definição 7 (Condição de Lipschitz) Diz-se que a função f (t, x) satisfaz a condição de

Lipschitz com respeito a x no conjunto Ra,b se existe um K > 0 tal que para todo o (t, x) , (t, y) ∈Ra,b se tem

|f (t, x)− f (t, y)| ≤ K |x− y| . (2.4)

(K designa-se por constante de Lipschitz).

A condição de Lipschitz (com respeito a x) pode ser entendida como uma condição forte de

continuidade (com respeito a x). Com efeito, veja-se, por exemplo em Agudo (1989), a seguinte

relação: f satisfaz a condição Lipschitz em Ra,b ⇒ f é uniformemente é contínua2 em Ra,b ⇒

2Diz-se que g : D ⊂ R→ R é uniformemente contínua em S ⊆ D se, para cada δ > 0 existe ε > 0 tal que

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f é contínua em Ra,b. É imediato verificar que

Observação 8 a) Se ∂f/∂x é contínua Ra,b então f satisfaz a condição de Lipschitz com

respeito a x no mesmo conjunto. Com efeito, pelo teorema do valor médio,

f (t, x) = f (t, y) +∂f (t, ξ)

∂x(x− y) , ξ = θx+ (1− θ) y, 0 ≤ θ ≤ 1

e, portanto,

|f (t, x)− f (t, y)| =¯∂f (t, ξ)

∂x(x− y)

¯=

¯∂f (t, ξ)

∂x

¯|x− y| .

Ora, como ∂f/∂x é contínua no conjunto compacto Ra,b (logo limitada) segue-se que existe um

K < +∞ tal que |∂f (t, x) /∂x| ≤ K para (t, x) ∈ Ra,b. Logo

|f (t, x)− f (t, y)| ≤ K |x− y| .

Se o conjunto de referência é R2 então é necessário exigir que ∂f/∂x seja contínua e limitada

(só assim se garante a existência de um K < +∞ tal que |∂f (t, x) /∂x| ≤ K). b) O recíproco

de a) não é verdade. Isto é, existem certas funções que satisfazem a condição de Lipschitz em

certo conjunto mas não possuem derivadas contínuas com respeito a x nesse mesmo conjunto.

Por exemplo, f (t, x) = |x| satisfaz a condição de Lipschitz num intervalo que contenha o ponto

0, pois

|f (t, x)− f (t, y)| = ||x|− |y|| ≤ |x− y|

mas ∂f (x) /∂x não existe no ponto 0.

Exemplo 18 a) A função f (t, x) = f (x) =√x definida em S = [0, c] , c > 0 (embora

uniformemente contínua em S) não satisfaz a condição de Lipschitz em S. Com efeito, tomando

y = 0 na equação (2.4), vem: ∀K > 0 ∃x0 ∈ ]0, ε] , ε > 0 : 0 < x < x0 ⇒ √x > Kx. b) A

|g (x)− g (y)| < δ sempre que |x− y| < ε (x, y ∈ S). Analiticamente:

∀δ > 0,∃ ε > 0 : ∀x, y ∈ S, |x− y| < ε⇒ |g (x)− g (y)| < δ.

Por outro lado, g não é uniformemente contínua em S se

∃ δ > 0,∀ ε > 0 : ∃x, y ∈ S, |x− y| < ε⇒ |g (x)− g (y)| > δ.

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função f (t, x) = 1/x definida em S = ]0, 1] , não satisfaz a condição de Lipschitz em S. Basta

mostrar que f (t, x) = 1/x não é uniformemente contínua em S.3 Com efeito, seja x = ε/2

e y = ε (logo |x− y| < ε). Vem |1/x− 1/y| = |2/ε− 1/ε| = 1/ε. Para todos os valores de

x, y < 1, i.e. ε < 1, tem-se |x− y| < ε ⇒ |f (x)− f (y)| > 1.4 c) A função f (t, x) = t2e−x

satisfaz a condição de Lipschitz no rectângulo R = {(t, x) : |t| ≤ 1, |x| ≤ 1} . Basta considerar aobservação 8. Com efeito, ∂f/∂x = −t2e−x é contínua em R.

Definição 8 (Iterações de Picard) As aproximações sucessivas ou iterações de Picard para

o PVI x0 = f (t, x) , x (t0) = x0 definem-se como a sucessão de funções {xn (t) , n ≥ 0} onde

x0 (t) = x0

x1 (t) = x0 +

Z t

t0

f (s, x0 (s)) ds

...

xn (t) = x0 +

Z t

t0

f (s, xn−1 (s)) ds

para n = 0, 1, ....

Exemplo 19 Calcular as iterações de Picard para o PVI x0 = x, x (0) = 1. Tem-se, com

f (t, x) = x,

x0 (t) = 1

x1 (t) = 1 +

Z t

0f (s, x0 (s)) ds = 1 +

Z t

01ds = 1 + t

x2 (t) = 1 +

Z t

0f (s, x1 (s)) ds = 1 +

Z t

0(1 + s) ds = 1 + t+

t2

2

3Dada a relação, (a) f satisfaz a condição Lipschitz em Ra,b ⇒ (b) f é uniformemente é contínua em Ra,b,conclui-se que (b) é uma condição necessária para que (a) se realize.

4Uma forma mais simples de negar a condição de Lipschitz consiste em mostrar que, para certo valor de y,y0 ∈ S, a função em x, |f (x)− f (y0)| / |x− y0| não é limitada quando x varia num certo subconjunto de S. Noexemplo em análise é fácil verificar que, para y = 1, a expressão |1/x− 1| / |x− 1| = 1/ |x| não é limitada quandox varia no intervalo ]0, 1] . Este raciocínio pode também servir para mostrar que

√x definida em S = [0, c] , c > 0

não satisfaz a condição de Lipschitz em S. Com efeito, tomando y = 0 observa-se que |√x− 0| / |x− 0| = 1/ |x|não é limitada em S.

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e, em geral,

xn (t) = 1 +

Z t

0f (s, xn−1 (s)) ds = 1 +

Z t

0

µ1 + s+ ...+

sn−1

(n− 1)!¶ds

= 1 + t+t2

2!+ ...+

tn

n!.

Conclui-se xn (t)→ et i.e. xn (t) converge para a solução x (t) = et do PVI.

Considere-se M = max(t,x)∈Ra,b|f (t, x)|, h = min (a, b/M) , J = {t : |t− t0| ≤ h} e Rh,b =

{(t, x) : |t− t0| ≤ h, |x− x0| ≤ b} .

Lema 2 Assuma-se f contínua no rectângulo Rh,b. Então: a) as iterações de Picard {xn (t) , n ≥ 1}existem e são contínuas para t ∈ J; b) (t, xn (t)) ∈ Rh,b para t ∈ J.

Dem. a) Para x0 (t) = x0 é óbvio que x0 (t) existe e é contínua para t tal que |t− t0| ≤ h.

Naturalmente, f (t, x0 (t)) é contínua pois a composição de funções contínuas é ainda uma

função contínua. Pelo teorema fundamental do cálculo integral, resulta que x1 (t) é contínua.

Por indução facilmente se conclui que todos os elementos da sucessão {xn (t) , n ≥ 1} são funçõescontínuas. b) Temos de provar que |xn (t)− x0| ≤ b para t tal que |t− t0| ≤ h. Em primeiro

lugar verifique-se o seguinte. Como f é contínua no conjunto compacto Rh,b então existe um

M > 0 tal que

|f (t, x)| ≤M para (t, x) ∈ Rh,b.

Assim, dado que (t, x0 (t)) ∈ Rh,b podemos escrever,

|x1 (t)− x0| =

¯Z t

t0

f (s, x0 (s)) ds

¯≤Z t

t0

|f (s, x0 (s))| ds

≤Z t

t0

Mds =M |t− t0| ≤Mh ≤ b.

O resto da demonstração resulta por indução. Assuma-se para t ∈ J que

|xk (t)− x0| ≤ b, k = 1, 2, ..., n− 1.

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Figura 2-1: Iterações de Picard

x

tat −0 ht −0 ht +0 at +0

( )00 ttMxx −−=− ( )00 ttMxx −=−

bx +0

bx −0

( )00 , xt

A

B C

D

( )txn

P

Isto implica (t, xn−1 (t)) ∈ Rh,b e, portanto, |f (t, xn−1 (t))| ≤M. Logo

|xn (t)− x0| ≤M |t− t0| ≤Mh ≤ b

i.e., (t, xn (t)) ∈ Rh,b.¥

Observação 9 Se t permitíssemos que t variasse no conjunto {t : |t− t0| ≤ a} então teríamos|x1 (t)− x0| ≤ Ma, com Ma eventualmente superior a b. Não poderíamos assim garantir

|f (t, x1 (t))| ≤ M (pois f estaria a ser avaliada num ponto (t, x) não pertencente ao conjunto

Ra,b) e, portanto, a quantidade |x2 (t)− x0| ≤R tt0|f (s, x1 (s))| ds não poderia ser majorada

(nem obviamente todos os demais termos |xk (t)− x0|, k = 1, 2, ..., n− 1). Naturalmente, todasas propriedades que se asseguram para f no conjunto Ra,b não podem garantir-se se a função

f é avaliada fora do conjunto Ra,b.

Na figura 2-1 mostra-se que as iterações de Picard estão contidas nos triângulos APB e

CPD. Se permitirmos que t varie até t0 − a ou, no sentido inverso, até t0+ a então é claro que

as iterações de Picard {xn (t) , n ≥ 1} poderão sair dos limites x0 ± b.

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Lema 3 Suponha-se w (t) contínua e não negativa satisfazendo a desigualdade

w (t) ≤ k

Z t

t0

w (s) ds. (2.5)

Então w (t) ≡ 0.

Dem. Ver Braun (1993), p. 78.¥

Apresenta-se agora o resultado fundamental.

Teorema 3 (Existência e Unicidade das Soluções - Caso Escalar) Se f (t, x) é contínua

em Ra,b = {(t, x) : |t− t0| ≤ a, |x− x0| ≤ b} e, além disso, satisfaz a condição de Lipschitz em

Ra,b com respeito a x, então existe uma solução única para o PVI x0 = f (t, x) , x (t0) = x0 em

t ∈ J = {t : |t− t0| ≤ h} onde h = min (a, b/M) .

Dem. Assume-se que t ∈ [t0, t0 + h]. O caso t ∈ [t0 − h, t0] demonstra-se de forma similar.

A demonstração consiste em provar o seguinte: a) xn (t) → x (t) quando n → +∞; b) x (t)satisfaz o PVI; c) x (t) é uma função contínua e d) Se z (t) é também uma solução do PVI

necessariamente se tem x (t) = z (t) . Comecemos por verificar a). Por construção tem-se

xn (t) = x0 (t) + [x1 (t)− x0 (t)] + ...+ [xn (t)− xn−1 (t)]

= x0 (t) +nX

k=1

[xk (t)− xk−1 (t)] .

Ora xn (t) converge sseP+∞

n=1 [xn (t)− xn−1 (t)] converge. Para o efeito é suficiente mostrar que

+∞Xn=1

|xn (t)− xn−1 (t)| < +∞.

Vamos em primeiro lugar estabelecer uma desigualdade para o termo geral da série, |xn (t)− xn−1 (t)| ≤δ (n) e depois mostramos que

Pn≥1 δ (n) < +∞.

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Atendendo a (2.3) e a (2.4) vem para t ∈ [t0, t0 + h]

|xn (t)− xn−1 (t)| =

¯Z t

t0

[f (s, xn−1 (s))− f (s, xn−2 (s))] ds¯

≤Z t

t0

|f (s, xn−1 (s))− f (s, xn−2 (s))| ds

≤Z t

t0

K |xn−1 (s)− xn−2 (s)| ds. (2.6)

Observe-se que a função f satisfaz a condição de Lipchtiz, i.e., para todo o (t, xi (t)) , (t, xi−1 (t)) ∈Rh,b tem-se |f (t, xi (t))− f (t, xi−1 (t))| ≤ K |xi (t)− xi−1 (t)|. Esta garantia é dada (para alémdo enunciado do teorema em análise) pelo lema 2 que estabelece (t, xi (t)) ∈ Rh,b ⊆ Ra,b,

i = 1, ..., n pois t ∈ [t0, t0 + h]. Se permitíssemos que t variasse no conjunto [t0, t0 + a] poderia

suceder, por exemplo, que |x1 (t)− x0 (t)| ≤ Ma com Ma eventualmente superior a b. Logo

(t, x1 (t)) poderia sair do conjunto Ra,b e não haveria garantia que a função f satisfizesse a

condição de Lipchtiz. Usa-se agora a desigualdade (2.6) sucessivamente para n = 2, n = 3, etc.

Para n = 2 e considerando |x1 (t)− x0 (t)| =¯R tt0f (s, x0 (s)) ds

¯≤ R t

t0Mds = M (t− t0)

vem

|x2 (t)− x1 (t)| ≤Z t

t0

K |x1 (s)− x0 (s)| ds

≤Z t

t0

KM (s− t0) ds

=KM (t− t0)

2

2;

para n = 3,

|x3 (t)− x2 (t)| ≤Z t

t0

K |x2 (s)− x1 (s)| ds

≤Z t

t0

K2M (s− t0)2

2ds

=K2M (t− t0)

3

3!.

Por indução chega-se a

|xn (t)− xn−1 (t)| ≤ Kn−1M (t− t0)n

n!.

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Finalmente podemos concluir:

+∞Xn=1

|xn (t)− xn−1 (t)| = |x1 (t)− x0 (t)|+ |x2 (t)− x1 (t)|+ ...+ |xn (t)− xn−1 (t)|+ ...

≤ M (t− t0) +KM (t− t0)

2

2!+ ...+

Kn−1M (t− t0)n

n!+ ...

=M

K

+∞Xn=1

(K (t− t0))n

n!≤ M

K

+∞Xn=0

(K (t− t0))n

n!=

M

KeK(t−t0) < +∞

para t ∈ [t0, t0 + h]. Provámos que, para cada t ∈ [t0, t0 + h] , a sequência xn (t) converge

(pontualmente) para x (t). Prova-se a seguir que xn (t) → x (t) uniformemente em t ∈ J , i.e.,

supt∈J |xn (t)− x (t)|→ 0 quando n→ +∞.5 Tem-se

supt∈J

|xn (t)− x (t)| = supt∈J

¯Z t

t0

(f (s, xn−1 (s))− f (s, x (s))) ds

¯≤ sup

t∈J

Z t

t0

|f (s, xn−1 (s))− f (s, x (s))| ds

≤ K supt∈J

Z t

t0

|xn−1 (s)− x (s)| ds

Atendendo a

xn−1 (t) = x0 (t) +n−1Xk=1

[xk (t)− xk−1 (t)] , x (t) = x0 (t) ++∞Xk=1

[xk (t)− xk−1 (t)] .

vem

|xn−1 (s)− x (s)| =¯¯+∞Xk=n

[xk (s)− xk−1 (s)]

¯¯ ≤

+∞Xk=n

Kk−1M (s− t0)k

k!

e, portanto,

supt∈J

|xn (t)− x (t)| ≤ K supt∈J

Z t

t0

|xn−1 (s)− x (s)| ds ≤ K supt∈J

Z t

t0

+∞Xk=n

Kk−1M (s− t0)k

k!ds

≤ K supt∈J

+∞Xk=n

Kk−1Mhk

k!

Z t

t0

ds ≤Mh+∞Xk=n

(Kh)k

k!→ 0.

5Nesta alínea a) é suficiente considerar-se a convergência pontual. A convergência uniforme é invocada nasalíneas seguintes.

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Vejamos agora a alínea b). Para mostrar que o limite de xn (t), x (t) , satisfaz o PVI basta

mostrar, atendendo ao lema 1, que x (t) satisfaz a equação integral

x (t) = x0 +

Z t

t0

f (s, x (s)) ds.

Considerando a iteração de Picard,

xn+1 (t) = x0 +

Z t

t0

f (s, xn (s)) ds

e tomando o limite em ambos os termos da equação quando n→ +∞ obtém-se

x (t) = x0 + limn→+∞

Z t

t0

f (s, xn (s)) ds.

Para mostrar que a equação anterior é igual a x (t) = x0+R tt0f (s, x (s)) ds é necessário mostrar

em primeiro lugar que limn→+∞R tt0f (s, xn (s)) ds =

R tt0limn→+∞ f (s, xn (s)) ds. A permutação

do limite com o integral não é geralmente válida. Sabe-se, no entanto, que se f (t, xn (t))

converge uniformemente para f (t, x (t)) então a referida permutação é válida. Nas condições

do teorema pode-se provar que f (t, xn (t)) converge uniformemente para f (t, x (t)) 6 ,7, pelo

que o limite pode permutar com o integral. Falta mostrar queR tt0limn→+∞ f (s, xn (s)) ds =R t

t0f (s, x (s)) ds. Este resultado é imediato devido à continuidade de f e à alínea a). Prove-se

c). Como xn (t) é contínua e converge uniformemente em t ∈ J a função limite, x (t) é também

contínua (ver Sarrico, 1999, teorema 7.2.1). Finalmente, veja-se d). Mostramos agora que se

z (t) é também uma solução do PVI necessariamente se tem x (t) = z (t). Assim,

x (t) = x0 +

Z t

t0

f (s, x (s)) ds, z (t) = x0 +

Z t

t0

f (s, z (s)) ds.

6De facto, como f satisfaz a condição de Lipschitz e supt∈J |xn (t)− x (t)| → 0 tem-sesupt∈J |fn (t, xn (t))− f (t, x (t))| ≤ K supt∈J |xn (t)− x (t)|→ 0 quando n→ +∞.

7Alternativamente, invocando o teorema da convergência dominada de Lebesgue, imediatamente se concluique a permutação do limite com o integral é válida [Teorema da convergência dominada de Lebesgue: suponha-seque f, g são tais que |f | < ∞ e |g| < ∞. Se |fn| ≤ |g| para n = 1, 2, ... e lim fn = f então limn fn = f ].De facto, xn (t) é limitada (está contido em Rh,b), t varia num intervalo limitado e f é contínua em Ra,b. Logot

t0|f (s, xn (s))| ds < +∞.

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Considerando |x (t)− z (t)| e atendendo ao facto de f satisfazer a condição de Lipschitz,

|x (t)− z (t)| =

¯Z t

t0

[f (s, x (s))− f (s, z (s))] ds

¯≤

Z t

t0

|f (s, x (s))− f (s, z (s))| ds

≤Z t

t0

K |x (s)− z (s)| ds.

Aplicando agora o lema 3 com w (t) = |x (t)− z (t)| resulta x (t) = z (t) .¥

O teorema anterior exige que a função f seja contínua e satisfaça a condição de Lipschitz

em certo rectângulo. Se a condição de Lipschitz falha é possível ainda assim estabelecer um

teorema de existência nas seguintes condições.

Teorema 4 (Existência) Admita-se que f (t, x) é contínua no conjunto

S = {(t, x) : t0 ≤ t ≤ t0 + a, |x− x0| ≤ b} .

Então o PVI (2.1) admite pelo menos uma solução no intervalo [t0, t0 + a] .

Exemplo 20 Determine-se um intervalo de existência e unicidade para o PVI x0 = 1 + x +

x2 cos t, x (1) = 2 em R = {(t, x) : |t− 1| ≤ 3, |x− 2| ≤ 4} (note-se t0 = 1, x0 = 2, a = 3,

b = 4). A função f (t, x) é contínua e ∂f/∂x = 1 + 2x cos t é contínua em R (logo limitada e,

portanto, satisfaz a condição de Lipschitz - ver observação 8, p. 46). Por outro lado,

M = max(t,x)∈R

|f (t, x)| = 1 + 6 + 62 = 43.

Pelo teorema 3 existe uma solução única em t ∈ J = {t : |t− 1| ≤ h} onde h = min (3, 4/43) =4/43. Assim um intervalo de existência e unicidade é J = {t : |t− 1| ≤ 4/43} = [−39/43, 47/43] .

Exemplo 21 Para determinar o intervalo de existência da solução do PVI x0 = x2, x (0) = 2,

t ≥ 0, usando o teorema 3, considera-se:

R = {(t, x) : 0 ≤ t ≤ a, |x− 2| ≤ b} , M = max(t,x)∈R

|f (t, x)| = (b+ 2)2 .

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A função f (t, x) é contínua e ∂f/∂x = 2x é contínua em R (logo limitada). Pelo teorema

3 a solução existe no intervalo 0 ≤ t ≤ h = min³a, b/ (b+ 2)2

´. Tem obviamente interesse

obter o maior h possível. A questão é portanto maximizar h. Como max b/ (b+ 2)2 = 1/8,

podemos seleccionar a = 1/8 e, portanto, pelo teorema 3 existe uma solução única no intervalo

0 ≤ t ≤ 1/8. Como o PVI admite uma solução fechada tem interesse verificar se o maior

intervalo de existência estabelecido pelo teorema 3 corresponde de facto ao maior intervalo de

existência do PVI. Pode-se mostrar que x (t) = 2/ (1− 2t) é a solução do PVI e a solução estáclaramente definida em 0 ≤ t < 1/2.

O exemplo anterior mostra que o teorema 3 não fornece necessariamente o maior intervalo

de existência. De facto o teorema 3 é um teorema local de existência e unicidade.

2.2 Prolongamento das Soluções

Estabelecem-se agora condições que permitem prolongar o intervalo J definido pelo teorema

3 caso J não coincida com o maior intervalo de existência (intervalo maximal de existência)

mantendo-se as condições de existência e unicidade.

Definição 9 (Prolongamento, Extensão, Solução Maximal e Intervalo Maximal) Seja

x (t) , t ∈ I, uma solução de um certo PVI. Suponha-se que existe uma solução y (t) , t ∈ I1 do

mesmo PVI tal que y (t) = x (t) para t ∈ I e I ⊂ I1. Nestas circunstância diz-se que y (t) é

um prolongamento de x (t) e I1 é uma extensão de I. Se não existe y (t) nas condições enunci-

adas então x (t) designa-se por solução maximal e I o intervalo maximal de existência (ou não

prolongável).

Teorema 5 (Prolongamento) Seja f (t, x) contínua e limitada no domínio R ⊂ R2. Se

x (t) é uma solução do PVI x0 = f (t, x) , x (t0) = x0 num intervalo (ta, tb) , então os limites

x (ta + 0) := limt→ta+0 x (t) e x (tb − 0) := limt→ta−0 x (t) existem. Além disso se (tb, x (tb − 0)) ∈R então x (t) pode ser prolongada à direita de tb e de igual forma, se (ta, x (ta + 0)) ∈ R então

x (t) pode ser prolongada à esquerda de ta.

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Dem. Mostre-se que x (tb − 0) existe. Considere-se ta < u < v < tb. Nas condições do

teorema podemos usar o lema 1 para x (v) e x (u) . Depois de algumas simplificações obtém-se

|x (v)− x (u)| ≤Z v

u|f (s, x (s))| ds ≤M |v − u| (2.7)

ondeM é tal que |f | ≤M em R. Podemos usar agora o critério de convergência de Cauchy. De

facto, quando v → tb e u → tb vê-se, pela equação (2.7) que x (v) − x (u) → 0, o que implica,

de acordo com o critério de Cauchy, que x (tb − 0) existe. Um argumento similar aplica-se ao

limite à esquerda. Suponha-se agora que (tb, x (tb − 0)) ∈ R. Podemos definir a seguinte função

y (t) =

x (t) t ∈ (ta, tb)x (tb − 0) t = tb.

Claramente y (t) , t ∈ (ta, tb] é um prolongamento de x (t) , t ∈ (ta, tb). Um outro prolongamentode y (t) pode ser obtido usando (tb, x (tb − 0)) como condição inicial. Com efeito, como f é

contínua, existe uma solução z (t) para t ∈ [tb, tb + β] , β > 0 tal que z (tb) = x (tb − 0) (teoremade existência). Conclui-se agora que a solução y (t), t ∈ (ta, tb] pode ser prolongada pela solução

w (t) =

y (t) t ∈ (ta, tb]z (t) t ∈ [tb, tb + β] , β > 0.¥

Exemplo 22 Retome-se o exemplo 21, x0 = x2, x (0) = 2 onde, como vimos, o teorema 3

estabelece uma solução única no rectângulo

R = {(t, x) : 0 ≤ t ≤ 1/8, |x− 2| ≤ 2} .

Pelo teorema do prolongamento é possível prolongar a solução x (t) , t ∈ [0, 1/8] , dado quef (t, x) = x2 é contínua e limitada em R. Tome-se como condição inicial x (1/8) = k e forme-

se novo rectângulo

R1 = {(t, x) : 0 ≤ t ≤ 1/8 + a, |x− k| ≤ b}

(passamos a ter t0 = 1/8 e x0 = k). Sabe-se que existe uma solução única z (t) com 1/8 ≤ t ≤

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1/8 + h onde h = min (a, b/M) e

M = max(t,x)∈R1

|f (t, x)| = (b+ k)2 .

Como o valor máximo de b/ (b+ k)2 é obtido quando b = k, tem-se que max b/ (b+ k)2 =

1/ (4k) . O valor de h é então maximizado quando a = 1/ (4k) , e vem portanto h = 1/ (4k) .

Existe portanto um prolongamento de x (t) e a extensão é I1 = [0, 1/8 + 1/ (4k)] . Em geral,

o valor de k pode ser determinado numericamente. No nosso caso concreto, k é x (1/8) =

2/ (1− 2 (1/8)) = 2. 666 7 o que significa que I1 é de facto o intervalo [0, 0.21875]. Como o

intervalo maximal é [0, 0.5) (ver exemplo 21) outros prolongamentos são possíveis de obter.

Como nota final convém sublinhar que a procura de prolongamentos só faz sentido quando a

solução fechada não é conhecida. O exemplo presente serviu apenas para ilustrar a técnica de

obtenção de prolongamentos, mas a rigor como a solução é conhecida não é necessário invocar-

se o teorema de existência e o de continuação: sabemos de facto que a solução do PVI existe

em 0 ≤ t < 1/2, sendo este intervalo maximal.

Teorema 6 Admita-se que f (t, x) é uma função contínua e limitada em R2 e f (t, x) satisfaz

a condição de Lipschitz em relação a x no mesmo conjunto R2. Então o PVI x0 = f (t, x) ,

x (t0) = x0 tem solução única em R.

Dem. Considere-se

R = {(t, x) : |t− t0| ≤ a, |x− x0| ≤ b} , M = max(t,x)∈R

|f (t, x)| < +∞

Nas condições do teorema, existe uma solução única no intervalo |t− t0| ≤ h = min¡a, b

M

¢.

Quando a→ +∞ e b→ +∞ a constanteM mantém-se finita, pelo que h pode assumir qualquer

valor arbitrariamente alto.¥

O teorema de existência e unicidade e do prolongamento não permitem obter o intervalo

maximal de existência. Uma solução satisfatória é dada pelo teorema seguinte.

Teorema 7 Considerem-se os seguintes PVI: x0 = f (t, x) , x (t0) = x0, y0 = g (t, y) , y (t0) =

y0, z0 = h (t, z) , z (t0) = z0. Admita-se que (i) f (t, x) , g (t, x) e h (t, x) satisfazem as condições

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Figura 2-2: Argumento usado na demonstração do teorema 7.

tx

ty

1tt

2t

do teorema de existência e unicidade num conjunto R ⊂ R2, (ii) h (t, x) ≤ f (t, x) ≤ g (t, x) ,

∀ (t, x) ∈ R e (iii) z0 ≤ x0 ≤ y0. Então as soluções dos PVI definidas em certo intervalo I

verificam as desigualdade z (t) ≤ x (t) ≤ y (t) para todo o t ≥ t0 em I.

Dem. (Por redução ao absurdo) É suficiente mostrar uma desigualdade. Suponhamos que

não é verdade que x (t) ≤ y (t) em I (i.e., x (t) > y (t)). Como as soluções são contínuas e

x0 ≤ y0 então existe um t1 ≥ t0 e um t2 > t1 em I tal que x (t1) = y (t1) e x (t) > y (t) para

todo o t ∈ (t1, t2) ⊂ I (ver figura 2-2). Resulta x (t) > y (t)⇔ x (t)−x (t1) > y (t)− y (t1) para

todo o t ∈ (t1, t2) e, portanto,

f (t1, x (t1)) = x0 (t1) = limt→t1+

x (t)− x (t1)

t− t1> lim

t→t1+

y (t)− y (t1)

t− t1= y0 (t1) = g (t1, y (t1)) ,

i.e., f (t1, x (t1)) > g (t1, y (t1)) o que é uma contradição com a hipótese f (t, x) ≤ g (t, x) ,

∀ (t, x) ∈ R (verifique através da figura 2-2 que x0 ≤ y0 e x (t) > y (t) implica f (t1, x (t1)) >

g (t1, y (t1)) o que é uma contradição com a hipótese f (t, x) ≤ g (t, x)).¥

Nas condições do teorema anterior a solução x (t) existe no intervalo I onde z (t) e y (t)

estão definidos. Além disso conclui-se que z (t) ≤ x (t) ≤ y (t) para t ≥ t0. O teorema 7 pode

ser aplicado nas seguintes condições. Dada a função f (t, x) procura-se h (t, x) e g (t, x) nas

condições do teorema e tal que as ED y0 = g (t, y) e z0 = h (t, z) tenham soluções conhecidas.

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Exemplo 23 Considere-se o PVI

x0 =x cos (t+ x)

1 + 2x2, x (0) = 1

com solução analítica desconhecida. O teorema 6 pode ser aplicado, atendendo a que f (t, x) =

x cos (t+ x) /¡1 + 2x2

¢é contínua e limitada em R2 e

∂f (t, x)

∂x= −− cos (t+ x) + 2x2 cos (t+ x) + x sen (t+ x) + 2x3 sen (t+ x)

1 + 4x2 + 4x4

é contínua e limitada em R2 (o que implica que a constante de Lipschitz é finita). Logo o PVI

tem solução única em R. Também o teorema 7 pode ser invocado. Com efeito,

|f (t, x)| =¯x cos (t+ x)

1 + 2x2

¯≤ |x|1 + 2x2

≤ |x|1 + x2

< 1,

isto é −1 < x cos (t+ x) /¡1 + 2x2

¢< 1. Logo o PVI tem solução única em R (note-se: (ii)

h (t, x) = −1 < f (t, x) < g (t, x) = 1 e (iii) −1 ≤ x0 ≤ 1 implica 1− t ≤ x (t) ≤ 1 + t, t ≥ 0).

Exemplo 24 Considere o PVI x0 = x (1 + x) cos (t) , x (0) = 1 cuja solução é

x (t) =1

2e− sen(t) − 1

para t ∈ [0, arcsen (log 2)) = [0, 0.765846) . Se a solução x (t) fosse desconhecida seria interes-

sante aplicar-se o teorema 7. Uma possibilidade na escolha das funções h e g é

h (t, x) = −x (1 + x) ≤ x (1 + x) cos (t) ≤ g (t, x) = x (1 + x) .

A solução do PVI y0 = y (1 + y) , y (0) = 1 é y (t) = et/¡2− et

¢para t ∈ [0, log 2) e a solução

do PVI z0 = −z (1 + z) , z (0) = 1 é z (t) = 1/¡−1 + 2et¢ para t ≥ 0.Conclui-se, pelo teorema 7

que1

−1 + 2et ≤ x (t) ≤ et

2− et, t ∈ [0, log 2) = [0, 0.693 15) .

Na figura 2-3 mostram-se as soluções y (t) , x (t) e z (t) .

59

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Figura 2-3: Soluções x (t) = 12e− sen(t)−1 , y (t) = et/

¡2− et

¢e z (t) = 1/

¡−1 + 2et¢ satisfazendo1

−1+2et ≤ x (t) ≤ et

2−et .

0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6

5

10

15

20

25

30

2.3 Caso Multivariado

Considere-se agora um sistema de ED de primeira ordem x0 = f (t, x) , onde x = (x1, x2, ..., xn)T

e f = (f1, f2, ..., fn)T . Com ligeiras adaptações, os teoremas apresentados neste capítulo são

válidos também para o caso multivariado. Seja kxk a norma do vector x.

Teorema 8 (Existência e Unicidade das Soluções - Caso Multivariado) Se f (t, x) é con-

tínua em R = {(t, x) : t0 ≤ t ≤ t0 + a, kx− x0k ≤ b} e, além disso, satisfaz a condição de Lip-

schitz em R com respeito a x então existe uma solução única para o PVI (2.1) em t ∈ [t0, t0 + h]

onde h = min (a, b/M) e M = max(t,x)∈R kf (t, x)k .

Naturalmente a condição de Lipschitz no caso multivariado deve ser interpretada nos seguintes

termos. Diz-se que a função f (t, x) satisfaz a condição de Lipschitz com respeito a x no conjunto

S ⊂ Rn+1 se existe um K > 0 tal que para todo o (t, x) , (t, y) ∈ S se tem

kf (t, x)− f (t, y)k ≤ K kx− yk .

Suponha-se que f (t, x) tem derivadas parciais contínuas com respeito a t e x e ainda

°°°°∂f (t, x)∂xi

°°°° ≤ K para (t, x) ∈ S e i = 1, ..., n

60

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(a desigualdade anterior é imediatamente satisfeita se S é um conjunto limitado e fechado em

Rn+1). Aplicando o teorema do valor médio para cada variável obtém-se kf (t, x)− f (t, y)k ≤K kx− yk .

Exemplo 25 Considere-se o PVI

x01 = −x1, x1 (0) = 1,

x02 = tx1x2, x2 (0) = 1

e o conjunto

R = {(t, x) : 0 ≤ t ≤ 1, kx− x0k ≤ 4}

onde

x =

x1

x2

, x0 =

11

e k·k é a norma Euclidiana. Mostre-se que existe uma solução única no intervalo [0, 1]. Parao efeito verifique-se o seguinte. (i) A função

f (t, x) =

f1 (t, x)

f2 (t, x)

= −x1

tx1x2

é obviamente contínua em R; (ii) as normas (Euclidianas) de

∂f

∂x1=

−1tx2

e∂f

∂x2=

0

tx1

respectivamente,

°°° ∂f∂x1

°°° = p1 + t2x22 e

°°° ∂f∂x2

°°° = pt2x21 = |tx1| são contínuas no compacto R

e, portanto, satisfazem a condição de Lipschitz em R. Assim, pelo teorema 8, existe uma solução

única em t ∈ [0, h] onde h = min (1, 4/M) eM = max(t,x)∈R kf (t, x)k = max(t,x)∈Rpx21 + t2x21x

22 =

2.73.8 Logo h = min (1, 4/2.73) = 1.

8Note-se que se trata de um problema de optimização com restrições de desigualdades.

61

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Exercícios

1. Considere o PVI x0 = 4t+ 2t x, x (0) = 1.

(a) Utilize o método de Picard para obter a solução do PVI.

(b) Confirme o resultado obtido na alínea anterior resolvendo o PVI pelo método habitual

2. Considere a equação x (t) = 1 +R t0 (t− s)x (s) ds.

(a) Utilize o método de Picard para resolver a equação.

(b) Mostre que a equação dada representa um certo PVI.

(c) Mostre que a solução obtida na alínea (a) satisfaz o PVI (alínea (b)).

3. Considere o PVI x0 = t2x+ x2, x (0) = 1 em R = {(t, x) : |t| ≤ 2, |x− 1| ≤ 2} .

(a) Utilize o método de Picard para obter as três primeiras aproximações da solução

x (t).

(b) Mostre que f (t, x) = t2x + x2 satisfaz a condição de Lipschitz em R e determine a

constante de Lipschitz.

(c) Determine um intervalo de existência e unicidade da solução.

4. Seja g : R→R uma função contínua e não identicamente nula. Mostre que o PVI x0 =g (t)√x, x (0) = 0 não tem solução única. O que falha no teorema de existência e

unicidade?

5. Mostre que o PVI x0 =√x2 − 1, x (0) = 1 não tem solução única. O que falha no teorema

de existência e unicidade?

6. (Exame) Considere o PVI x0 = x2+xt−5, x (0) = 0 no rectânguloR = {(t, x) : 0 ≤ t ≤ 2, |x| ≤ 2}

(a) Mostre que f (t, x) = x2 + xt − 5 satisfaz a condição de Lipschitz com respeito a x

no conjunto R e determine a constante de Lipschitz.

(b) Determine um intervalo de existência e unicidade para a solução do PVI.

62

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(c) Utilizando o método de Picard obtenha as três primeiras aproximações da solução

(x0 (t) , x1 (t) e x2 (t)) e proponha uma estimativa para x (2/3) .

7. Considere o PVI x0 = x2+5cos t2, x (0) = 2 definido em R = {(t, x) : |t| ≤ a, |x− 2| ≤ b} .Aplicando o teorema de existência e unicidade das soluções determine o maior intervalo

que o teorema admite, onde existe uma solução única.

8. Considere o PVI x0 = t2 + x2, x (0) = 0 definido em R = {(t, x) : 0 ≤ t ≤ a, |x| ≤ b} .Aplicando o teorema de existência e unicidade das soluções determine o maior intervalo

que o teorema admite, onde existe uma solução única.

9. Considere o PVI x0 = θx2, x (0) = 1 onde θ é um parâmetro positivo. Que condição

devemos impor a θ para que exista uma solução única no intervalo [0, T ]? Resolva a

questão considerando separadamente: (a) a solução do PVI; (b) o teorema de existência

e unicidade das soluções.

10. Considere o PVI x0 = θex2 − 1 − cos t, x (0) = 0 onde θ é um parâmetro positivo. Que

condição devemos impor a θ para que exista uma solução única no intervalo [0, T ] .

11. Mostre que o PVI x0 = arctgx, x (0) = 0 tem uma solução única em R.

12. Mostre que o PVI x0 = ecos t, x (0) = 0 tem uma solução única em R.

13. (Exame) Considere o PVI

x0 =ex

1 + ex, x (0) = 0.

(a) Mostre que existe uma solução única em R.

(b) Sem resolver o PVI mostre que |x (t)| ≤ t para t ≥ 0.

14. Considere o PVI x0 = (arctg x)x+ t, x (0) = 0, t ≥ 0. Determine um intervalo I = [0, b)

e duas funções z (t) e y (t) tais que z (t) ≤ x (t) ≤ y (t) em I.

15. Considere o PVI x0 = x2+cos¡t+ x2

¢, x (0) = 0, t ≥ 0. Determine um intervalo I = [0, b)

e duas funções z (t) e y (t) tais que z (t) ≤ x (t) ≤ y (t) em I.

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16. (Exame) Considere os PVI x0 = f (t, x) , x (0) = x0 e x0 = f (t, x) , x (0) = y0 e as respec-

tivas soluções x (t, 0, x0) e x (t, 0, y0). Suponha que f satisfaz a condição de Lipschitz com

respeito a x. Determine uma função φ (t) tal que |x (t, 0, x0)− x (t, 0, y0)| ≤ |x0 − y0|φ (t) ,para todo o t ≥ 0. Utilize a desigualdade de Bellman e Gronwall: se z (t) é uma funçãoreal contínua tal que z (t) ≥ 0 e z (t) ≤ C +K

R t0 z (s) ds para todo o t ≥ 0, onde C > 0 e

k > 0 então z (t) ≤ CeKt.

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Capítulo 3

Aproximações Numéricas

Quando a ED é não linear a solução analítica geralmente não é conhecida. Tem interesse assim

investigar-se aproximações numéricas para x (t) . Considere-se o PVI

x0 = f (t, x) , x (t0) = x0

com solução única em t ∈ J . O objectivo consiste em aproximar x (t) no intervalo [t0, tn] ⊆ J

através de uma função y (t). Uma possível aproximação para x (t) pode ser fornecida pelo

método de Picard (definição 8). No entanto, este método é difícil de aplicar pois, em cada

iteração, é necessário realizar-se uma integração. Vamos apresentar esquemas alternativos de

aplicação mais simples.

Nestes esquemas começa-se por discretizar o intervalo [t0, tn] na forma t0 ≤ t1 ≤ ... ≤ tn−1 ≤tn. Sem perda de generalidade pode-se considerar uma amplitude de discretização ti− ti−1 = ∆constante para i = 1, 2, ..., n. Vem assim ∆ = (tn − t0) /n e ti = t0 + i∆, i = 0, 1, ..., n (ver a

figura 3-1). Como veremos, o objectivo consiste em aproximar a solução x (t) nos instantes de

discretização ti através de uma função y (ti).

Investiga-se agora possíveis funções aproximadoras y. Para o efeito, considere-se o seguinte.

Admita-se que x (t) tem derivadas de ordem s em [t0, tn]. Então pela fórmula de Taylor tem-se

x (t) = x (t0) + x0 (t0) (t− t0) + x00 (t0)(t− t0)

2

2!(3.1)

+...+ x(s−1) (t0)(t− t0)

s−1

(s− 1)! + x(s) (z)(t− t0)

s

s!

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Figura 3-1: Discretização (ou decomposição) do intervalo [t0, tn] de acordo com a regra ti =t0 + i∆, i = 0, 1, .., n, ∆ = (tn − t0) /n

0t

1t 2t43421

43421∆

43421∆

3t

nt1−nt

43421∆

...

com z = θt+ (1− θ) t0, 0 ≤ θ ≤ 1. Note-se que

x0 (t0) = f (t0, x (t0)) = f (t0, x0)

x00 (t0) =df (t0, x (t0))

dt=

∂f (t0, x0)

∂t+

∂f (t0, x0)

∂x

dx (t0)

dt

=∂f (t0, x0)

∂t+

∂f (t0, x0)

∂xf (t0, x0) , (3.2)

etc. É necessário nesta fase escolher a ordem da aproximação, i.e., é necessário truncar a fórmula

de Taylor.

3.1 Método de Euler

O caso mais simples consiste em considerar, a partir da equação (3.1), a expressão

x (t) = x (t0) + x0 (t0) (t− t0) + e1

onde e1 representa o resto da fórmula de Taylor. Como x0 (t0) = f (t0, x0) vem,

x (t) = x (t0) + f (t0, x0) (t− t0) + e1.

Como se sabe, o erro de aproximação que se comete ao se desprezar o resto da fórmula de Taylor é

tanto maior quanto maior for o valor |t− t0| . Podemos tornar este valor "pequeno"considerando

66

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a correspondente a expressão dinâmica

x (ti) = x (ti−1) + f (ti−1, x (ti−1)) (ti − ti−1) + e2, (3.3)

baseada na discretização do intervalo [t0, tn] . Anulando e2, obtém-se uma função aproximadora

(para simplificar, y (ti) passa a escrever-se yi):

y0 = x0 (3.4)

yi = yi−1 + f (ti−1, yi−1)∆, i = 1, 2, ..., n. (3.5)

As equações (3.4) e (3.5) são conhecidas como a aproximação ou esquema de Euler1.

Exemplo 26 Considere-se o PVI x0 = t2+log |1 + x| , x (0) = 1 com solução única no intervalo[0,+∞) (mostre). A solução x (t) não é conhecida. Aproxime-se o valor da solução x (t) em

certos instantes t no intervalo [0, 2] com base numa amplitude de discretização de ∆ = 1/2.

Logo n = (tn − t0) /∆ = 4 e ti = t0 + i∆ = i/2, i = 0, 1, 2, 3, 4. Tem-se, atendendo às equações

(3.4) e (3.5) (e notando yi := y (ti)),

y0 = x0 = 1

y1 = y0 + f (t0, y0)∆ = 1 +¡02 + log |1 + 1|¢ /2 = 1. 346 6 (aprox.)

y2 = y1 + f (t1, y1)∆ = 1. 346 6 +³(1/2)2 + log |1 + 1. 346 6|

´/2 = 1. 898 1 (aprox.)

y3 = y2 + f (t2, y2)∆ = 1. 898 1 +¡12 + log |1 + 1. 898 1|¢ /2 = 2. 930 1 (aprox.)

y4 = y3 + f (t3, y3)∆ = 2. 930 1 +³(3/2)2 + log |1 + 2. 930 1|

´/2 = 4. 739 4 (aprox.).

Em cada iteração ocorrem dois erros de aproximação: um dos erros deve-se ao anulamento

do termo e2 na equação (3.3); o outro deve-se aos arredondamentos que se efectuam nas várias

1Podemos também obter o esquema de Euler notando que a função f (t, x) é o declive da recta tangenteao gráfico da solução x (t) no instante t. Assim, a partir da definição de derivada de x (t) tem-se, para ∆suficientemente pequeno,

x (t+∆)− x (t)

∆≈ f (t, x)

ou sejax (t+∆) ≈ x (t) + f (t, x)∆.

67

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Figura 3-2: Esquema de Euler (∆ = 1/2) yi = yi−1 + f (ti−1, yi−1) 12 , (i = 1, 2, ..., 5)

0.5 1 1.5 2 2.5

-1

1

2

3

4

iterações (é desejável não se proceder a arredondamentos grosseiros para que não se acumule

no final um erro de aproximação significativo).

Uma questão que imediato se coloca é a seguinte. Qual é o impacto sobre a qualidade da

aproximação quando a amplitude de discretização diminui. O exemplo e o teorema seguinte

clarificam esta questão.

Exemplo 27 Considere-se a ED linear x0 = f (t, x), f (t, x) = −x+7e−t cos 8t com a condiçãoinicial x (0) = 1/2. Atendendo ao teorema 1 obtém-se a solução única x (t) = 1

8e−t (4 + 7 sen (8t))

para t ∈ R. Conhecendo-se a solução pode-se avaliar de forma precisa o erro que se comete usan-do o esquema Euler. Nas figuras 3-2 a 3-4 compara-se a solução exacta (traço grosso) com o

esquema de Euler no intervalo t ∈ [0, 2.5] para diferentes valores de ∆ (os pontos {yi} são liga-dos uns aos outros, i.e. faz uma interpolação linear entre eles - o esquema de Euler é agora uma

função contínua). É evidente que quanto mais pequeno é ∆ (i.e. mais fina é a decomposição

do intervalo) mais precisa é a aproximação.

Obviamente, numa aplicação concreta, só se aplica o esquema de Euler se a solução for

desconhecida. Nestas circunstâncias, como avaliar a magnitude dos erros de aproximação? O

teorema seguinte responde a esta questão. Concretamente, fornece uma majoração para o erro

Ei = |x (ti)− yi| , i = 1, ..., n no caso em que yi corresponde ao esquema de Euler.

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Figura 3-3: Esquema de Euler (∆ = 1/10) yi = yi−1 + f (ti−1, yi−1) 110 , (i = 1, 2, ..., 25)

0.5 1 1.5 2 2.5

-1

-0.5

0.5

1

1.5

2

Figura 3-4: Esquema de Euler (∆ = 1/50) yi = yi−1 + f (ti−1, yi−1) 150 , (i = 1, 2, ..., 125)

0.5 1 1.5 2 2.5

-1

-0.5

0.5

1

1.5

2

69

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Teorema 9 Considere-se o PVI x0 = f (t, x), x (t0) = x0 com solução única em t ∈ J =

[t0, t0 + h], onde h = min (a, b/M) , M = max(t,x)∈R |f (t, x)| e R = {(t, x) : t0 ≤ t ≤ t0 + a, |x− x0| ≤ b} .Suponha-se que

max(t,x)∈R

¯∂f (t, x)

∂x

¯≤ L, max

(t,x)∈R

¯∂f (t, x)

∂t+ f (t, x)

∂f (t, x)

∂x

¯≤ D.

Então, o erro absoluto associado ao esquema de Euler verifica

Ei ≤ D∆

2L

³(1 +∆L)i − 1

´≤ D∆

2L

³ehL − 1

´i = 1, ..., n.

Para provarmos este teorema precisamos do seguinte lema.

Lema 4 Suponha-se que {Ei, i = 1, 2, ..., n} satisfaz

Ei ≤ AEi−1 +B, E0 = 0

onde A e B são constantes positivas. Então

Ei ≤ B

(A− 1)¡Ai − 1¢ , se A 6= 1

Ei ≤ Bi, se A = 1.

Dem. Seja yi = Ayi−1+B, y0 = 0. Por indução conclui-se que Ei ≤ yi. Atendendo à teoria

das equações lineares às diferenças finitas, basta verificar que yi = B(A−1)

¡Ai − 1¢ se A 6= 1 e

yi = Bi se A = 1.¥

Dem. do Teorema 9 Atendendo às equações (3.1) e (3.2) pode-se obter

x (ti) = x (ti−1) + f (ti−1, x (ti−1))∆+µ∂f (z, x (z))

∂t+

∂f (z, x (z))

∂xf (z, x (z))

¶∆2

2!

com z = θti + (1− θ) ti−i, 0 ≤ θ ≤ 1. Considerando

f (ti−1, x (ti−1)) = f (ti−1, yi−1) +∂f (ti−1, x∗)

∂x(x (ti−1)− yi−1)

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(pela fórmula de Taylor) onde x∗ = λx (ti−1)+(1− λ) yi−1, 0 ≤ λ ≤ 1 e o facto de (ti−1, x (z∗)) ∈R e (z, x (z)) ∈ R vem, para i = 1, ..., n,

Ei = |x (ti)− yi| = |x (ti−1)− yi−1 + (f (ti−1, x (ti−1))− f (ti−1, yi−1))∆

+

µ∂f (z, x (z))

∂t+

∂f (z, x (z))

∂xf (z, x (z))

¶∆2

2!|

≤ |x (ti−1)− yi−1|+¯∂f (ti−1, x∗)

∂x

¯|x (ti−1)− yi−1|∆

+

¯∂f (z, x (z))

∂t+

∂f (z, x (z))

∂xf (z, x (z))

¯∆2

2!

≤ |x (ti−1)− yi−1|+ L |x (ti−1)− yi−1|∆+D∆2

2!

= Ei−1 + LEi−1∆+D∆2

2!

= (1 + L∆)Ei−1 +D∆2/2!

isto é,

Ei ≤ AEi−1 +B, E0 = 0

com A = (1 + L∆) e B = D∆2/2! (notar que a relação E0 = 0 decorre de x (t0) = y0). Pelo

lema 4 vem Ei ≤ D∆2L

³(1 + L∆)i − 1

´. Para obter uma estimativa independente de i observe-se

que (1 + L∆) ≤ e∆L. Assim,

Ei ≤ D∆

2L

³(1 + L∆)i − 1

´≤ D∆

2L

¡ei∆L − 1¢ ≤ D∆

2L

³ehL − 1

´(3.6)

tendo-se considerado i∆ ≤ h.¥

No teorema anterior poderíamos ter trabalhado com o intervalo [t0, tn] em lugar de [t0, t0 + h]

(com tn ≤ h). Neste caso, em lugar da equação (3.6), ter-se-ia Ei ≤ D∆2L

¡e(tn−t0)L − 1¢ .

De acordo com o teorema 9 podemos estabelecer que Ei = O (∆). Logo lim∆→0Ei = 0 (mas

lim∆→0Ei/ |∆| = const.). Observe-se: se∆ diminui para metade Ei diminui pelo menos metade.

Em geral, o esquema de Euler, com ∆ relativamente pequeno, permite obter boas aproximações

à solução. Todavia, para obter boas aproximações é necessário, em certos casos, considerar-se

um ∆ muito pequeno e isto levanta dois problemas. Primeiro, há um custo em termos de tempo

de computação - o número de iterações que é necessário efectuar com o esquema de Euler é

71

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igual a n = (tn − t0) /∆ (quanto menor ∆ maior é n). Este custo não pode ser valorizado tendo

em conta a velocidade de processamento dos computadores actuais. Segundo, sabe-se que as

operações aritméticas envolvendo valores fraccionários nunca são processadas de forma exacta

pelos computadores - existem pequenos erros de arredondamento. Estes erros podem tornar-se

significativos se o número de iterações processadas é alto, i.e. quando ∆ é baixo (ver exercícios).

3.2 Outras Aproximações

Para minorar os inconvenientes relacionados com o esquema de Euler, podem-se definir esque-

mas de aproximações mais precisos para ∆ fixo. Por exemplo, considerando as equações (3.1)

e (3.2), tem-se

x (ti) = x (ti−1) + f (ti−1, x (ti−1))∆

+

µ∂f (ti−1, x (ti−1))

∂t+

∂f (ti−1, x (ti−1))∂x

f (ti−1, x (ti−1))¶∆2

2!+O

¡∆3¢.

Desprezando os termos de ordem O¡∆3¢obtém-se o esquema de aproximação

y0 = x0

yi = yi−1 + f (ti−1, yi−1)∆+µ∂f (ti−1, yi−1)

∂t+

∂f (ti−1, yi−1)∂x

f (ti−1, yi−1)¶∆2

2!

para i = 1, 2, ..., n. Pode-se provar que o erro de aproximação |x (ti)− yi| é de ordem O¡∆2¢

(notar que no caso do esquema de Euler o erro é de ordem O (∆)).

Um esquema de aproximação bastante conhecido pela sua simplicidade e eficiência é o

esquema de Runge-Kutta

y0 = x0

yi = yi−1 + (Li−1,1 + 2Li−1,2 + 2Li−1,3 + Li−1,4)∆

6

para i = 1, 2, ..., n, onde Li−1,1 = f (ti−1, yi−1) , Li−1,2 = f¡ti−1 + ∆

2 , yi−1 +∆2 Li−1,1

¢, Li−1,3 =

f¡ti−1 + ∆

2 , yi−1 +∆2 Li−1,2

¢e Li−1,4 = f (ti−1 +∆, yi−1 +∆Li−1,3) . Pode-se provar que o erro

de aproximação |x (ti)− yi| é neste caso de ordem O¡∆4¢.

72

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No caso multivariado suponha-se que se tem

x01 = f1 (t, x1, x2, ..., xm)

x02 = f2 (t, x1, x2, ..., xm)

...

x0m = fm (t, x1, x2, ..., xm) .

Seja yj (ti) a aproximação à solução xj (ti) . No caso do esquema de Euler a aproximação cor-

responde a

yj (ti) = yj (ti−1) + fj (ti−1, y1 (ti−1) , ..., ym (ti−1))∆

para i = 1, 2, ..., n e j = 1, 2, ...,m.

73

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Exercícios

1. Considere o PVI x0 =¡t2 + x2

¢/2, x (0) = 0.

(a) Mostre que existe uma solução única definida em R = {(t, x) : 0 ≤ t ≤ 1, |x| < 1}.

(b) Considerando ∆ = 1/10 e o esquema de Euler obtenha uma aproximação para x (0) ,

x (1/10) , x (2/10) e x (3/10) .

(c) Resolva a alínea (b) considerando um esquema com um erro absoluto de ordem

O¡∆2¢.

(d) Resolva a alínea (b) considerando o esquema de Runge-Kutta .

(e) Determine ∆ de forma que o erro absoluto cometido na aproximação a x (ti) , ti ∈[0, 1] , utilizando-se o esquema de Euler, não seja superior a 0.0001.

2. Considere o PVI x0 = f (t, x) , x (0) = 0. Suponha que |f (t, x)| ≤ 1, |∂f (t, x) /∂x| ≤ 1 e|∂f (t, x) /∂t+ f (t, x) ∂f (t, x) /∂x| ≤ 2 no rectânguloR = {(t, x) : 0 ≤ t ≤ 1,−1 ≤ x ≤ 1} .Sabe-se que o esquema de Euler com ∆ = 1/10 produz y (5/10) = y5 = −.09157 7 ey (5/10) = y6 = .09 258 7. Mostre que existe pelo menos um t∗ ∈ [5/10, 6/10] tal quex (t∗) = 0.

3. Suponha que o computador avalia o esquema de Euler introduzindo em cada iteração um

erro de arredondamento de εi, i = 1, 2, ... verificando |εi| < ε, i.e.

yi = yi−1 + f (ti−1, yi−1)∆+ εi, i = 1, 2, ..., n.

Suponha |∂f (t, x) /∂x| ≤ L e |∂f (t, x) /∂t+ f (t, x) ∂f (t, x) /∂x| ≤ D para todo o t e x.

(a) Mostre que

Ei = |x (ti)− yi| ≤µD∆

2L+

ε

∆L

¶³ehL − 1

´.

(b) Determine o valor de ∆ que minimiza Ei.

4. Considere o PVI x0 = θx, x (0) = 1. Mostre que a aproximação de Euler converge para a

solução quando∆→ 0. Sugestão: Comece por mostrar y1 = (1 + θ∆) , y2 = (1 + θ∆) y1 =

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(1 + θ∆)2 , ..., yn = (1 + θ∆)n. Faça ∆ = tn/n e considere n → +∞. Conclua y (tn) =

x (tn) para qualquer tn.

5. Seja o PVI

x01 = −x1, x1 (0) = 1,

x02 = tx1x2, x2 (0) = 1.

Considerando ∆ = 1/2 e o esquema de Euler obtenha uma aproximação para a solução

do sistema nos instantes 0, 1/2 e 1.

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Capítulo 4

Sistemas de Equações Lineares

4.1 Introdução

Até agora estudámos essencialmente ED univariadas (embora tenhamos já introduzido sistemas

de ED diferenciais - ver a observação 4 e o ponto 2.3). Com os sistemas de ED assume-se que

as taxas de variação x0i (t) dependem não só da própria variável xi (t) como também de outras

variáveis xj (t) , j 6= i. Um exemplo clássico é do modelo predador-presa. Se designarmos

respectivamente, x1 (t) e x2 (t) as populações de predadores e presas é natural concluir-se que

nenhuma das variáveis x1 e x2 pode ser estudada de forma independente, já que elas interagem

dinamicamente ao longo do tempo. Como resultado, devemos considerar o sistema de ED

x01 = f1 (t, x1, x2) , x02 = f2 (t, x1, x2) . São numerosos os exemplos na área da economia e das

finanças (modelo de ajustamento procura-oferta, modelo neoclássico de crescimento, etc. - ver

Gandolfo, 1997, Cap. 19).

Neste capítulo vamos estudar o sistema de equações diferenciais (SED) lineares

x01 = a11x1 + ...+ a1nxn + g1 (t)

x02 = a21x1 + ...+ a2nxn + g2 (t)

...

x0n = an1x1 + ...+ annxn + gn (t)

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ou, compactamente

x0 = Ax+ g (t) (4.1)

onde

x :=

x1...

xn

, x0 :=

x01...

x0n

, A :=

a11 · · · a1n...

. . ....

an1 · · · ann

, g (t) :=

g1 (t)...

gn (t)

(a := b lê-se: a é igual a b por definição). O PVI virá, como habitualmente, na forma

x0 = Ax+ g (t) , x (t0) = x0.

O objectivo deste capítulo consiste em obter a solução geral do sistema e estabelecer alguns

resultados que servirão depois o estudo da estabilidade.

Definição 10 O sistema (4.1) designa-se por sistema de equações diferenciais não homogéneas.

Se g (t) ≡ 0 o sistema designa-se por sistema de equações diferenciais homogéneas.

Observação 10 Tem interesse verificar que a ED linear não homogénea de ordem n

y(n) = an−1y(n−1) + ...+ a1y0 + a0y + b (t)

onde y(k) := dky (t) /dtk e b (t) é uma função contínua em certo intervalo I, pode ser represen-

tada como um sistema de equações lineares de primeira ordem (definido em I) e, portanto, ser

resolvida como tal. Com efeito, considere-se

x1 = y, x2 = y0, ..., xn = y(n−1).

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resulta

x01 = x2

x02 = x3

...

x0n = an−1xn + an−2xn−1...+ a0x1 + b (t)

isto é, x0 = Ax+ g (t) onde

A =

0 1 0 · · · 0

0 0 1 · · · 0...

......

. . ....

0 0 0 · · · 1

a0 a1 a2 · · · an−1

, g (t) =

0

0...

0

b (t)

.

Exemplo 28 Represente-se a ED linear de ordem 3

y000 = −2y00 + y0 − 4y + e3t

através de uma sistema de ED de primeira ordem. Com as transformações x1 = y, x2 = y0, x3 =

y00 tem-se

x01 = x2, x02 = x3 e x03 = −2x3 + x2 − 4x1 + e3t

isto é, x01x02x03

=

0 1 0

0 0 1

−4 1 −2

x1

x2

x3

+0

0

e3t

Vamos começar por abordar o caso dos sistemas de equações diferenciais lineares homogé-

neos, x0 = Ax (A não depende de t e, portanto, A é uma matriz de constantes).

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4.2 Sistema de Equações Diferenciais Homogéneas

4.2.1 Primeiras Noções

Começa-se por recordar que uma função x (t) é designada uma solução da ED (ou do SED)

x0 = f (t, x) num intervalo I se x0 (t) existe em I e x (t) satisfaz x0 (t) = f (t, x (t)) (definição 1).

No caso x0 = f (x) = Ax, x1 com valores em Rn é uma solução em I do SED se x1 (t) existe em

I (neste capítulo admitiremos sempre esta condição) e se¡x1¢0 é tal que ¡x1¢0 = Ax1. Outra

definição que recordamos é a de solução geral. Vimos (definição 2) que uma solução de uma

ED (ou de um SDE) é designada por solução geral se inclui todas as soluções da ED (ou do

SED). Uma solução particular é uma solução deduzida a partir da solução geral.

Exemplo 29 Considere-se o SED

x01 = 2x1

x02 = 3x2

(observe-se que as variáveis evoluem de forma independente, pelo que, a rigor, não é necessário

tratar x1 e x2 de forma conjunta, i.e. através de um sistema). O SED pode escrever-se na

forma x1

x2

0| {z }

x0

=

2 0

0 3

| {z }

A

x1

x2

| {z }

.

x

Se tomarmos

x1 =

e2t

0

, x2 =

0

e3t

é fácil ver que

¡x1¢0=

2e2t0

, Ax1 =

2 0

0 3

e2t

0

= 2e2t

0

i.e.

¡x1¢0= Ax1 e, da mesma forma,

¡x2¢0= Ax2 ou seja x1 e x2 são soluções do SED

x0 = Ax. Também se pode verificar que c1x1 e c2x

2 onde c1, c2 ∈ R são soluções do SED.

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Naturalmente c1x1 e c2x2 (considerados separadamente) não representam a solução geral (por

exemplo −x2 não pode obter-se a partir de c1x1, qualquer que seja o valor da constante c1). Noentanto, tome-se uma combinação linear de x1 e x2, i.e., x = c1x

1 + c2x2. É imediato que x

é solução do SED1. A solução assim obtida é mais ”abrangente” do que c1x1 e c2x2 (tomados

individualmente). Em particular, x gera as soluções c1x1 e c2x2. Será x a solução geral? Iremos

ver que a resposta é positiva, mas não podemos ainda garanti-lo sem que se mostre primeiro

que x = c1x1 + c2x

2, c1, c2 ∈ R, gera todas as soluções do SED.

Teorema 10 Seja S o conjunto de todas as soluções do SED x0 = Ax. O conjunto S munido

das operações usuais de soma de vectores e multiplicação escalar é um espaço vectorial (sobre

o corpo R).

Dem. Basta mostrar que são válidos os axiomas definidores de espaço vectorial (ver

Gregório Luís e Silva Ribeiro, 1985, capítulo 1). Em particular, se x1, x2 ∈ S então umacombinação linear de elementos de S é ainda um elemento de S, i.e. x = c1x

1 + c2x2 ∈ S.¥

A demonstração dos resultados seguintes pode ver-se em Braun (1993), Cap. 3. Caso não

seja especificado nada em contrário, A é uma matriz quadrada de ordem n.

Teorema 11 A dimensão do espaço vectorial S, formado por todas as soluções do SED x0 =

Ax, é igual a n.

Teorema 12 Se x1, x2, ..., xn são soluções linearmente independentes do sistema x0 = Ax então©x1, x2, ..., xn

ªforma uma base do espaço das soluções S. A solução geral de x0 = Ax é

x = c1x1 + c2x

2 + ...+ cnxn.

Lema 5 (Teste de Independência Linear) Sejam x1 (t) , x2 (t) , ..., xk (t) soluções de x0 =

Ax. Então x1 (t) , x2 (t) , ..., xk (t) são linearmente independentes sse x1 (t0) , x2 (t0) , ..., x

k (t0)

são linearmente independentes.

1Com efeito, dado que c1x1 e c2x

2 são soluções, tem-se x0 = c1x1 0

+ c2x2 0

= Ac1x1 + Ac2x

2 =A c1x

1 + c2x2 = Ax.

80

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Exemplo 30 Verifique-se que

x1 (t) =

e2t

0

, x2 (t) =

0

e3t

são linearmente independentes. Pelo lema anterior x1 (t) e x2 (t) são linearmente independentes

sse x1 (t0) e x2 (t0) são linearmente independentes. Faça-se a escolha mais simples: t0 = 0.

É simples verificar que x1 (0) = (1, 0)T e x2 (0) = (0, 1)T são linearmente independentes, logo

x1 (t) e x2 (t) são também linearmente independentes.

Exemplo 31 Considere-se o exemplo 29.Vimos que

x1 =

e2t

0

, x2 =

0

e3t

são soluções do SED x0 = Ax. Além disso, x1 e x2 são linearmente independentes (ver o exemplo

anterior). Assim, os vectores©x1, x2

ªformam uma base de dimensão 2 do espaço das soluções.

Em consequência não é possível encontrar uma terceira solução linearmente independente das

duas soluções já obtidas. Pelo teorema 12 a solução geral do sistema é

x (t) = c1

e2t

0

+ c2

0

e3t

= c1e

2t

c2e3t

, c1, c2 ∈ R.

Observe-se que se chegaria exactamente a esta conclusão se se resolvesse as ED x01 = 2x1,

x02 = 3x2 de forma independente.

Exemplo 32 Considere-se o seguinte PVI

x01 = x2

x02 = −x1 − 2x2

81

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x (0) = (1, 1)T . Na notação matricial temos x0 = Ax onde

A =

0 1

−1 −2

.(Note-se que o PVI definido em sistema é equivalente ao PVI y00 + 2y0 + y = 0, y (0) = 1,

y0 (0) = 1). Verique-se que uma solução de x0 = Ax é

x1 =

e−t

−e−t

.Com efeito,

¡x1¢0=

−e−te−t

, Ax1 =

0 1

−1 −2

e−t

−e−t

= −e−t

e−t

e, portanto, verifica-se

¡x1¢0= Ax1. Também se pode verificar que c1x1 (t) , c1 ∈ R é solução

de x0 = Ax. No entanto x1 não forma uma base do espaço do espaço das soluções. Verifique-se

que

x2 =

te−t

(1− t) e−t

é também solução do sistema e x2 não pode ser obtido a partir de x1. Uma forma de apresentar

uma solução mais ”abrangente” é considerar a combinação linear das duas soluções,

x = c1x1 + c2x

2, c1, c2 ∈ R.

Como o SED x0 = Ax com n = 2 equações admite no máximo n = 2 soluções linearmente

independentes não é possível encontrar uma terceira solução linearmente independente das duas

soluções já obtidas. A solução geral do sistema é

x (t) = c1

e−t

−e−t

+ c2

te−t

(1− t) e−t

= c1e

−t + c2te−t

−c1e−t + c2 (1− t) e−t

, c1, c2 ∈ R.

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4.2.2 Matriz Fundamental de Soluções

Seja eAt definida da seguinte forma:

eAt := I +At+A2t2

2!+ ...+

Aktk

k!+ ... (4.2)

onde I é a matriz identidade de dimensão n. A expressão eAt existe já que a série que figura

do lado direito da expressão (4.2) converge para todo o t.

Exemplo 33 Suponha-se

A =

a 0

0 b

.Como

Ak = diaghak, bk

i=

ak 0

0 bk

resulta

eAt = I +At+A2t2

2!+ ...+

Aktk

k!+ ...

=

1 0

0 1

+ a 0

0 b

t+ a2 0

0 b2

t2

2!+ ...+

ak 0

0 bk

tk

k!+ ...

=

1 + at+ a2t2

2! + ... 0

0 1 + bt+ b2t2

2! + ...

=

eat 0

0 ebt

.Mais geralmente, se A é uma matriz diagonal de ordem n, isto é, A = diag [a1, ..., an] então

eAt = diag£ea1t, ..., eant

¤. Se a matriz A é não diagonal o cálculo de eAt é mais complicado.

Retomaremos esta questão adiante.

Apresentam-se algumas propriedades de eAt:

Lema 6 Considere-se eAt definida pela equação (4.2) e sejam A e B matrizes quadradas de

ordem n e v um vector de tipo n× 1. Então:

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P1: deAt

dt = AeAt;

P2:¡eAt¢−1

= e−At;

P3: eAt+Bt = eAteBt apenas se AB = BA;

P4: eA(t+s) = eAteAs;

P5: eλItv = eλtv.

Dem. Vejam-se apenas as propriedades P1, P3 e P5. As demais demonstrações podem

ver-se em Braun (1993). Tem-se

deAt

dt=

d³I +At+ A2t2

2! + ...+ Aktk

k! + ...´

dt= A+

A2t

1+ ...+

Aktk−1

(k − 1)! + ...

= A

µI +At+

A2t2

2!+ ...+

Aktk

k!+ ...

¶= AeAt.

Relativamente a P3 vejam-se os exercícios (P4 é caso particular de P3). Quanto a P5, tem-se

eλItv =

µI + λIt+

λ2I2t2

2!+ ...

¶v = v + λtv +

λ2t2

2!v + ...

=

µ1 + λt+

λ2t2

2!+ ...

¶v = eλtv.¥

Definição 11 (Matrix Fundamental das Soluções) Seja©x1, x2, ..., xn

ªuma base (de di-

mensão n) do espaço das soluções do SED x0 = Ax. Considere-se

Φ (t) =hx1 x2 · · · xn

i.

A matriz Φ (t) designa-se por matriz fundamental das soluções (MFS) do SED x0 = Ax.

Resulta óbvio da definição que Φ (t) é formada por colunas linearmente independentes, pelo

que |Φ (t)| 6= 0 para qualquer t.

Exemplo 34 A solução geral do SED x0 = Ax onde

A =

1 −1 4

3 2 −12 1 −1

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é dada por

x (t) = c1

−et

4et

et

+ c2

e3t

2e3t

e3t

+ c3

−e−2t

e−2t

e−2t

.Uma base do espaço S é portanto

−et

4et

et

,

e3t

2e3t

e3t

,−e−2t

e−2t

e−2t

e, assim,

Φ (t) =

−et

4et

et

e3t

2e3t

e3t

−e−2t

e−2t

e−2t

é uma MFS do SDE x0 = Ax.

Lema 7 (a) Se Φ (t) é uma MFS do SED x0 = Ax então Φ0 (t) = AΦ (t) e |Φ (0)| 6= 0; (b)

Reciprocamente, se Φ0 (t) = AΦ (t) e |Φ (0)| 6= 0 então Φ (t) é uma MFS do SED x0 = Ax.

Em suma, Φ (t) é uma MFS do SED x0 = Ax sse Φ0 (t) = AΦ (t) e |Φ (0)| 6= 0.Dem. (a) Como

©x1, x2, ..., xn

ªsão soluções linearmente independentes do SED então re-

sulta: (1) |Φ (t)| 6= 0 e, portanto, |Φ (0)| 6= 0, pelo lema 5; (2)¡xj¢0= Axj , j = 1, ..., n.

Matricialmente isto significahx1 · · · xn

i0= A

hx1 · · · xn

iou Φ0 (t) = AΦ (t) . (b)

Reciprocamente, se |Φ (0)| 6= 0 e Φ0 (t) = AΦ (t) então xj , com j = 1, ..., n são soluções lin-

earmente independente do SED. Pelo teorema 12 formam uma base do espaço das soluções.

¥

Lema 8 A matriz eAt é uma MFS do SED x0 = Ax.

Dem. Tem-se¡eAt¢0= AeAt (lema 6 propriedade P1, p. 83). Por outro lado

¯eA×0

¯= |I| =

1 6= 0. Logo eAt é uma MFS do SED x0 = Ax.¥

Lema 9 Sejam Φ1 (t) e Φ2 (t) duas MFS. Então existe uma matriz C tal que Φ1 (t) = Φ2 (t)C.

85

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Dem. Considerem-se as matrizes Φ1 (t) =hy1 · · · yn

ie Φ2 (t) =

hx1 · · · xn

inas

condições do enunciado, i.e. onde©y1, y2, ..., yn

ªe©x1, x2, ..., xn

ªformam duas bases de S.

Como©x1, x2, ..., xn

ªé uma base do espaço das soluções do SED então qualquer solução, yj ,

pode-se expressar como combinação linear dos vectores da base. Isto é, existe um vector de

escalares C•,j =hC1j · · · Cnj

iTde tipo n× 1 tal que

yj =nX

k=1

xkCkj .

Vale também y1 =

Pnk=1 x

kCk1

...

yn =Pn

k=1 xkCkn

e, portanto,

hy1 · · · yn

i=

h Pnk=1 x

kCk1 · · · Pnk=1 x

kCkn

i=

hx1 · · · xn

iC

ou seja Φ1 (t) = Φ2 (t)C.¥

Deve-se verificar |C| 6= 0 (ver exercícios).

Lema 10 Seja Φ (t) uma MFS do SED x0 = Ax. Então

eAt = Φ (t)Φ−1 (0) .

Dem. Pelos lemas 8 e 9 podemos escrever

eAt = Φ (t)C.

Fazendo t = 0 resulta eA0 = Φ (0)C. Sabe-se também, pela definição (4.2) que eA0 = I.

Igualando estas equações vem eA0 = Φ (0)C = I ⇒ C = Φ−1 (0) já que |Φ (0)| 6= 0 (i.e. existeinversa de Φ (0)).¥

86

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Teorema 13 A solução única do PVI x0 = Ax, x (t0) = x0 é

x (t) = eA(t−t0)x0, t ∈ R

Dem. Pelo lema 6, propriedades P1 e P4, vem x0 (t) = AeA(t−t0)x0 = Ax (t) . Por outro

lado, x (t0) = Ix0 = x0. Logo x (t) = eA(t−t0)x0 é uma solução do PVI. Esta solução existe

para todo o t ∈ R, de acordo com a definição estabelecida em (4.2). Para mostrar que a

solução é única seja z (t) uma outra solução da forma z (t) = eA(t−t0)y (t) . Mostre-se que

y (t) é constante. Vem y (t) = e−A(t−t0)z (t) e y0 (t) = −Ae−A(t−t0)z (t) + e−A(t−t0)z0 (t) =

−Ae−A(t−t0)z (t) + e−A(t−t0)Az (t) = 0 para todo o t dado que e−A(t−t0) e A comutam (ver

exercícios). Fixando t = t0 vem y (t) = x0. Conclui-se x (t) ≡ z (t) .¥

Para resolver o SED temos portanto que obter eAt. No exemplo 33 já vimos como calcular

eAt no caso em que A é diagonal (este caso é pouco relevante já que os sistemas dinâmicos

xj (t) , j = 1, ..., n evoluem separada e independentemente ao longo do tempo, podendo por

isso ser tratados, cada um por si, como processos univariados). Existem ainda outros casos

onde o cálculo de eAt é relativamente simples (ver exercícios). O procedimento geral que iremos

seguir para determinarmos eAt baseia-se nos valores e vectores próprios de A (existem outras

alternativas). O procedimento assenta nos seguintes resultados.

Lema 11 Suponha-se que (A− λI)m v = 0 para certo m ∈ N. Então

eAtv = eλtµv + t (A− λI) v + ...+

tm−1

(m− 1)! (A− λI)m−1 v¶.

Dem. Tem-se eAtv = eAt−λIt+λItv = e(A−λI)t+λItv e

eAtv = e(A−λI)teλItv (i)

= e(A−λI)teλtv (ii)

=³e(A−λI)tv

´eλt (iii)

=

µv + t (A− λI) v +

t2

2!(A− λI)2 v + ...+

tm−1

(m− 1)! (A− λI)m−1 v + ...

¶eλt (iv)

=

µv + t (A− λI) v +

t2

2!(A− λI)2 v + ...+

tm−1

(m− 1)! (A− λI)m−1 v¶eλt. (v)

87

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A equação (i) resulta da propriedade P3 (lema 6), a equação (ii) da propriedade P5 (lema 6),

a equação (iv) deve-se à definição (4.2) e, finalmente (v) resulta do facto de

(A− λI)m+k v = (A− λI)k [(A− λI)m v] = (A− λI)k 0 = 0,

para k ∈ N.¥

Lema 12 φ = eλtv é uma solução do SED sse Av = λv.

Dem. Suponha-se que φ é solução. Então φ0 = λeλtv = eλtλv ⇒ λv = Av pois só nestas

condições se tem φ0 = eλtλv = eλtAv = A¡eλtv

¢= Aφ. Reciprocamente suponha-se válida a

relação Av = λv. Então, considerando

λφ = λeλtv = eλtλv = eλtAv ⇔ φ = λ−1eλtAv, (λ 6= 0)

resulta que φ é solução pois, φ0 = λ−1λeλtAv = eλtAv = A¡eλtv

¢= Aφ (o caso λ = 0 obrigaria

a considerar φ = v).¥

4.2.3 Resolução do Sistema x0 = Ax

A resolução do SED x0 = Ax, com solução dada pelo teorema 13, vai basear-se nos valores e

vectores próprios da matriz A. Vamos considerar três situações distintas: (a) valores próprios

reais e distintos; (b) valores próprios complexos (conjugados) e (c) valores próprios iguais.

Valores Próprios Reais e Distintos

Considere-se uma solução do SED x0 = Ax

eAtv1 = eλ1tµv1 + t (A− λ1I) v1 + ...+

tm−1

(m− 1)! (A− λ1I)m−1 v1

¶(4.3)

(pois¡eAtv1

¢0= A

¡eAtv1

¢) e seja λ1 um valor próprio de A com multiplicidade algébrica igual

a um e v1 um vector próprio associado. Claro que a expressão (4.3) se simplifica, pois se v1 é

vector próprio associado a λ1 i.e., tal que (A− λ1I) v = 0 então, pelo lema 11, todos os termos

(A− λ1I)m v1 para m ≥ 1 são nulos. Desta forma a equação (4.3) escreve-se eAtv1 = eλ1tv1

88

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(observe-se que o lema 12 também identifica a expressão eλ1tv1 onde v1 é vector próprio associ-

ado a λ1, como uma solução do SED). Repetindo o procedimento anterior para os demais valores

próprios (λ2, ..., λn que se assumem distintos) obtém-se n soluções linearmente independentes©x1, ..., xn

ªcom xi = eλitvi (sendo vi um vector próprio associado a λi). A independência linear

está garantida pelo facto de que vectores próprios de valores próprios distintos são linearmente

independentes. Assim a solução geral é

x (t) = c1eλ1tv1 + ...+ cne

λntvn, ci ∈ R.

Uma forma alternativa de se apresentar a solução consiste em obter explicitamente a função

eAt. Considere-se

eAthv1 ... vn

i=heλ1tv1 ... eλntvn

i= PΛ (t)

onde P =hv1 ... vn

ie Λ (t) = diag

£eλ1t, ..., eλnt

¤. Naturalmente PΛ (t) é solução do SED

e, como os vectores próprios (de valores próprios distintos) são linearmente independentes,

PΛ (t) é uma matriz fundamental. Escreva-se assim Φ (t) = PΛ (t) . Resulta (pelo lema 10),

eAt = Φ (t)Φ (0)−1 = PΛ (t)P−1.

Assim, a solução do PVI x0 = Ax, x (t0) = x0 no caso em que os valores próprios são reais e

distintos é

x (t) = PΛ (t− t0)P−1x0 (4.4)

(sendo a solução geral dada simplesmente por PΛ (t)P−1c onde c é um vector de constantes

arbitrárias).

Observação 11 Se os valores próprios λ1, ..., λn de uma matriz quadrada de ordem n são

reais e distintos então qualquer conjunto de vectores próprios {v1, ..., vn} forma uma base doespaço Rn. Prova-se também que P−1AP = diag [λ1, ..., λn] onde P =

hv1 ... vn

i(ver

Gregório Luís e Silva Ribeiro, 1985, Cap. 6). Por outras palavras, se uma transformação linear

T : Rn → Rn é representada por uma matriz A com respeito à base natural {e1, ..., en} então,

89

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na base {v1, ..., vn} , a transformação T é representada pela matriz diagonal diag [λ1, ..., λn] .

Observação 12 Considere-se o PVI y0 = diag [λ1, ..., λn] y, y (0) = y0. É fácil concluir que

a solução é y (t) = ediag[λ1,...,λn]ty0 = Λ (t) y0 onde Λ (t) = diag£eλ1t, ..., eλnt

¤(ver exemplo

33, p. 83). Considere-se agora o PVI x0 = Ax, x (0) = x0 e suponha-se que A tem valores

próprios reais e distintos, {λ1, ..., λn} . Com a mudança de variável y = P−1x (logo x = Py)

onde P =hv1 ... vn

ié a matriz dos vectores próprios tem-se x0 = Ax ⇔ Py0 = APy ⇔

y0 = P−1APy ⇔ y0 = diag [λ1, ..., λn] y com solução (com respeito a y) y (t) = Λ (t) y0. Logo a

solução com respeito a x é x (t) = Py (t) = PΛ (t) y0 = PΛ (t)P−1x0 (y (0) = P−1x (0)) que é

exactamente a expressão (4.4) com t0 = 0.

Exemplo 35 Considere-se o PVI x0 = Ax, x (0) = x0 onde

A =

1 2

3 2

, x0 =

14

Obtenha-se a solução do PVI. Os valores próprios são λ1 = −1 e λ2 = 4. Um vector próprio

associado ao valor próprio −1 é

v1 =

1

−1

.e um vector próprio associado ao valor próprio 4 é

v2 =

23

.A solução geral pode-se escrever na forma

x (t) =

x1 (t)

x2 (t)

= c1eλ1tv1 + c2e

λ2tv2 = c1e−t 1

−1

+ c2e4t

23

=

c1e−t + c22e

4t

−c1e−t + c23e4t

.

90

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Com a condição inicial

x (0) =

c1 + 2c2

−c1 + 3c2

= 14

resulta c1 = −1 e c2 = 1. A solução do PVI é portanto

x (t) =

x1 (t)

x2 (t)

= −e−t + 2e4t

e−t + 3e4t

.Naturalmente, também se pode chegar a este resultado aplicando a fórmula (4.4)

x (t) = PΛ (t)P−1x0

=

1 2

−1 3

e−t 0

0 e4t

1 2

−1 3

−1 14

=

−e−t + 2e4te−t + 3e4t

.Valores Próprios Complexos

Comecemos por analisar um dos valor próprios da matriz A do tipo λ = α + βi com vector

próprio v = u+ iw. Invocando o lema 12 tem-se que eλtv = eλt (u+ iw) é uma solução do SED

x0 = Ax. Relativamente ao conjugado de λ, o lema seguinte estabelece que

Lema 13 O valor próprio conjugado de λ = α + βi, λ = α − βi, tem como vector próprio o

conjugado de v, v.

Dem. Por hipótese Av = λv. Tomando os conjugados em ambos os termos da equação e,

dado que A é uma matriz real, vem Av = λv.¥

Mostramos agora que a partir da solução eλtv = eλt (u+ iw) se extraem duas soluções reais

linearmente independentes.

Como se sabe, se z = α+ βi ∈ C então ez = eαeβi = eα (cosβ + i senβ).

91

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Assim, podemos expressar a solução complexa da seguinte forma

x = eλtv = e(α+βi)t (u+ iw) = eαt (cosβt+ i senβt) (u+ iw)

= eαt [(u cosβt− w senβt) + i (u senβt+ w cosβt)]

= x1 + ix2

onde

x1 = eαt (u cosβt− w senβt) , x2 = eαt (u senβt+ w cosβt) . (4.5)

O lema seguinte estabelece que estas expressões são soluções reais linearmente independentes

de x0 = Ax.

Lema 14 Seja x = eλtv = e(α+βi)t (u+ iw) = x1+ix2 uma solução complexa do SED x0 = Ax.

Então x1 e x2 são soluções reais linearmente independentes.

Dem. Por hipótese x0 = Ax. Vem

x0 =¡x1¢0+ i

¡x2¢0= A

¡x1 + ix2

¢= Ax1 + iAx2.

Igualando os termos reais e imaginários resulta¡x1¢0= Ax1 e

¡x2¢0= Ax2. Mostre-se agora

que x1 e x2 são linearmente independentes. Segue-se agora em diagrama:

valores próprios λ e λ são distintos

⇒ v = (u+ iw) e v = (u− iw) são linearmente independentes em C

⇒ u,w são linearmente independentes

⇒ x1, x2 são linearmente independentes.

A segunda implicação decorre do seguinte. Por hipótese, o determinante¯v v

¯é diferente

de zero. Assim, pelas propriedades dos determinantes

92

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0 6=¯v v

¯=¯u+ iw u− iw

¯=

¯u u− iw

¯+¯iw u− iw

¯=

¯u u

¯+¯u −iw

¯+¯iw u

¯+¯iw −iw

¯=

¯u −iw

¯+¯iw u

¯= −

¯u iw

¯−¯u iw

¯= −2

¯u iw

¯= −2i

¯u w

¯6= 0⇒

¯u w

¯6= 0⇒ u e w são linearmente independentes

A última relação explica-se nos seguintes termos. Considere-se [ver expressão (4.5)] x1 =

eαt (u cosβt− w senβt) , x2 = eαt (u senβt+ w cosβt) . Os vectores x1 (t) e x2 (t) são indepen-

dentes sse a relação θ1x1 (t) + θ2x

2 (t) = 0 implica θ1 = θ2 = 0 para qualquer t. Pelo lema

5 basta verificar se θ1x1 (0) + θ2x

2 (0) = 0 implica θ1 = θ2 = 0. Ora θ1x1 (0) + θ2x

2 (0) =

θ1u+ θ2w = 0⇒ θ1 = θ2 = 0 dado que u e w são linearmente independentes.¥

Observação 13 As soluções reais que se obtêm a partir de eλtv são as soluções reais que se

obtêm a partir de eλtv. Com efeito, pelo lema 13, a solução complexa associada ao valor própio

λ vira,

x = eλtv = e(α−βi)t (u− iw) = eαt (cos (−βt) + i sen (−βt)) (u− iw)

= eαt [(u cos (−βt) + w sen (−βt)) + i (u sen (−βt)− w cos (−βt))]= z1 + iz2

onde z1 = eαt (u cos (−βt) + w sen (−βt)) e z2 = eαt (u sen (−βt)− w cos (−βt)) . Como sen (−θ) =− sen θ e cos (−θ) = cos θ é fácil ver que z1 = x1 e z2 = x2. Como resultado, quando se procuram

os vectores u e w basta considerar apenas λ ou λ.

93

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Exemplo 36 Obtenha-se a solução geral do SED x0 = Ax onde

A =

1 0 0

0 1 −10 1 1

.

Passo 1: Determinar os valores próprios de A. O polinómio característico de A é

P (λ) = |A− λI| = (1− λ)¡λ2 − 2λ+ 2¢ .

Resolvendo P (λ) = 0 sai, λ = 1 e λ = 1± i.

Passo 2: Determinar os vectores próprios associados a cada um dos valores próprios.

(i) Vector próprio associado a λ = 1. Trata-se de obter um vector não nulo v tal que

(A− I) v = 0. Depois de algumas contas, conclui-se que qualquer vector do tipo

v = c

1

0

0

, c ∈ R

é um vector próprio associado a λ1 = 1. Assim, uma solução do SED é

x1 = c1et

1

0

0

.

(ii) Vector próprio associado a λ = 1 + i. Trata-se de determinar um vector v não nulo tal

que

[A− (1 + i) I] v =

−i 0 0

0 −i −10 1 −i

v1

v2

v3

=0

0

0

.

94

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Resulta (depois de algumas contas) que o vector próprio é

v =

0

i

1

=0

0

1

| {z }

u

+ i

0

1

0

| {z }

w

.

Atendendo à equação (4.5) têm-se com α = 1 e β = 1

x2 = eαt (u cosβt− w senβt) = et

0

0

1

cos t−0

1

0

sen t = et

0

− sen tcos t

x3 = eαt (u senβt+ w cosβt) = et

0

0

1

sen t+0

1

0

cos t = et

0

cos t

sen t

.

x2 e x3 são soluções reais linearmente independentes.

Passo 3: A solução geral é

x = c1et

1

0

0

+ c2et

0

− sen tcos t

+ c3et

0

cos t

sen t

=

c1et

−c2et sen t+ c3et cos t

c2et cos t+ c3e

t sen t

.

Como observação final note-se que

Φ (t) =

et 0 0

0 −et sen t et cos t

0 et cos t et sen t

95

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é uma MFS e (pelo lema 10, p. 86)

eAt = Φ (t)Φ (0)−1 =

et 0 0

0 −et sen t et cos t

0 et cos t et sen t

1 0 0

0 0 1

0 1 0

−1

=

et 0 0

0 et cos t −et sen t0 et sen t et cos t

.

Suponha-se agora que existem 2n valores próprios complexos distintos (naturalmente a

matriz A é de tipo 2n × 2n). Para o valor próprio genérico λj = αj + βji vimos que duas

soluções linearmente independentes são

heαjt

¡uj senβjt+ wj cosβjt

¢eαjt

¡uj cosβjt−wj senβjt

¢ i=

hwj uj

i eαjt cosβjt −eαjt senβjteαjt senβjt eαjt cosβjt

.Repetindo o procedimento para os restantes valores próprios obtém-se a matriz fundamental

Φ (t) =hw1 u1 · · · wn un

i

eα1t cosβ1t −eα1t senβ1t · · · 0 0

eα1t senβ1t eα1t cosβ1t · · · 0 0...

.... . . 0 0

0 0 0 eαnt cosβnt −eαnt senβnt0 0 0 eαnt senβnt eα1t cosβnt

= PQ (t)

Resulta agora eAt = Φ (t)Φ (0)−1 = PQ (t)P−1 e assim a solução do PVI x0 = Ax, x (t0) = x0

(quando todos os valores próprios são complexos e distintos) é

x (t) = PQ (t− t0)P−1x0.

96

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Valores Próprio Iguais

Comecemos com um exemplo. Seja

A =

1 1 0

0 1 0

0 0 2

.

Os valores próprios são 1 (multiplicidade algébrica 2) e 2. Os vectores próprios associados a

λ = 1 resultam do sistema (A− I) v = 0,

0 1 0

0 0 0

0 0 1

v1

v2

v3

=0

0

0

v2 = 0

0 = 0

v3 = 0

com v1 ∈ R. O sistema tem um grau de indeterminação e, portanto, a dimensão do subespaço

próprio associado a λ = 1 é de apenas um: é possível apenas extrair um vector próprio linear-

mente independente. Por outras palavras, a multiplicidade geométrica do valor próprio (igual

ao grau de indeterminação do sistema homogéneo) é inferior à multiplicidade algébrica. Nestas

condições a matriz A possui apenas 2 vectores próprios linearmente independentes2.

A questão que nos interessa abordar é a seguinte: suponha-se que uma matriz A de tipo

n×n tem apenas k < n vectores próprios linearmente independentes. Então o SED x0 = Ax tem

k soluções linearmente independentes da forma eλtv. O problema consiste então em encontrar

as restantes n− k soluções linearmente independentes, para que se forme uma base do espaço

das soluções de dimensão n.

Considere-se assim um valor próprio λ com multiplicidade algébrica superior à respectiva

multiplicidade geométrica (para simplificar suponha-se, sem perda de generalidade, que esta

multiplicidade é igual a um). Associado a λ existe um vector v1 tal que (A− λI) v1 = 0.

Uma solução do SED é eAtv1 = eλtv1. Para encontrarmos as outras soluções independentes do

2Pode suceder que um certo valor próprio tenha multiplicidade algébrica superior a um (portanto temos o casode valores próprios iguais) e existam ainda assim n vectores próprios linearmente independentes. Isto sucede se asmultiplicidades algébricas associados aos vários valores próprios coincidirem com as respectivas multiplicidadesgeométricas.

97

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SED determinamos vectores próprios generalizados. Seja v2 um vector de tipo n × 1 tal que(A− λI)2 v2 = 0 e (A− λI) v2 6= 0. Sabe-se a prior que eAtv2 é solução do SED (qualquer ex-pressão do tipo eAtv é solução do SED). Invocando o lema 11, p. 87, pode-se escrever a expressão

eAtv2 na forma simplificada, eAtv2 = eλt (v2 + t (A− λI) v2) (atendendo a (A− λI)2 v2 = 0 e

(A− λI) v2 6= 0). Esta solução é independente da primeira solução3. Se o número de soluçõesindependentes é ainda inferior à multiplicidade algébrica, continua-se o procedimento, deter-

minando outro vector próprio generalizado. Neste caso, seja v3 tal que (A− λI)3 v3 = 0 e

(A− λI)2 v3 6= 0. Naturalmente eAtv3 é também solução do SED e, de acordo com o lema

11, eAtv3 escreve-se na forma eAtv3 = eλt³v3 + t (A− λI) v3 +

t2

2 (A− λI)2 v3

´. Esta solução é

independente das duas primeiras. O procedimento repete-se até se obter um número de soluções

linearmente independentes igual à multiplicidade algébrica.

A obtenção de eAt simplifica-se no caso em que λ é valor próprio de multiplicidade algébrica

n. Com efeito,

eAt = eλIte(A−λI)t

=

ÃI + λtI +

(λt)2

2I + ...

!µI + t (A− λI) +

t2

2!(A− λI)2 + ...

¶(4.6)

= eλtµI + t (A− λI) +

t2

2!(A− λI)2 + ...+

tk

k!(A− λI)k

¶(4.7)

= B (t) .

3Note-se que θ1v1+θ2v2 = 0 implica θ1 = θ2 = 0. Com efeito, pré multiplique-se ambos os termos da equaçãoθ1v1+ θ2v2 = 0 por (A− λI) . Vem θ1 (A− λI) v1+ θ2 (A− λI) v2 = 0. Como (A− λI) v1 = 0 e (A− λI) v2 6= 0resulta imediato que θ2 = 0. Assumindo θ2 = 0 na equação θ1v1 + θ2v2 = 0, i.e., θ1v1 = 0, conclui-se que θ1 = 0pois v1 6= 0. Em suma, v1 e v2 são linearmente independentes e, como consequência, as solução eAtv1 e eAtv2 sãolinearmente independentes (verifique).

98

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com k < n. Note-se que (A− λI)n+i = 0, i = 0, 1, 2, ... devido ao lema de Cayley-Hamilton4 ,5.

Nestas circunstâncias, a solução do PVI x0 = Ax, x (t0) = x0, no caso em que λ é valor

próprio de multiplicidade algébrica n, é

x (t) = eA(t−t0)x0 = B (t− t0)x0. (4.8)

Exemplo 37 Obtenha-se a solução geral do SED x0 = Ax onde

A =

1 1 0

0 1 0

0 0 2

.

Passo 1: Determinar os valores próprios de A. Resolvendo P (λ) = 0 sai, λ = 1 (multiplicidade

algébrica 2) e λ = 2.

Passo 2: Determinar os vectores próprios associados a cada um dos valores próprios.

(i) Vector(es) próprio(s) associado(s) a λ = 1. Trata-se de obter um vector não nulo v1 tal

que

(A− I) v1 =

0 1 0

0 0 0

0 0 1

z1

z2

z3

| {z }

v1

=

0

0

0

.

4Lema de Cayley-Hamilton: Seja A uma matriz quadrada e p (λ) = |A− λI| = 0 a respectiva equaçãocaracterística. Então p (A) = 0. Por exemplo, no caso

A =1 23 4

a equação característica é p (λ) = |A− λI| = λ2 − 5λ− 2 = 0. Pelo lema de Cayley-Hamilton vem

p (A) = A2 − 5A− 2I = 7 1015 22

− 5 1015 20

− 2 00 2

=0 00 0

.

Outro exemplo: suponha-se que o valor próprio 3 tem multiplicidade n, i.e., p (λ) = (λ− 3)n = 0 entãop (A) = (A− 3I)n = 0. Note-se que, se λ não tem multiplicidade algébrica n, então a equação (4.7) não é válida.Claro que a equação (4.6) permanece válida.

5Outra forma de se obter eAt = B (t) é a seguinte:

eAtP = B (t) v1 B (t) v2 · · · B (t) vn = B (t) v1 v2 · · · vn = B (t)P,

onde P é a matriz dos vectores próprios generalizados, com |P | 6= 0. Logo eAt = B (t)PP−1 = B (t) .

99

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Este sistema implica z2 = z3 = 0 e, portanto,

v1 =

1

0

0

é um vector próprio associado a λ1 = 1. Assim, uma solução do SED é

x1 (t) = et

1

0

0

.

Não é possível determinar outro vector próprio independente pois a multiplicidade geométrica

de λ = 1 é um (igual ao grau de indeterminação do sistema homogéneo). Procura-se agora um

vector v2 tal que

(A− I)2 v2 =

0 1 0

0 0 0

0 0 1

0 1 0

0 0 0

0 0 1

z1

z2

z3

| {z }

v2

=

0 0 0

0 0 0

0 0 1

z1

z2

z3

=0

0

0

.

Este sistema implica que z3 = 0. Escolha-se por exemplo o vector

v2 =

0

1

0

.

Naturalmente para este vector v2 tem-se (A− I)2 v2 = 0 e (A− I) v2 6= 0. Pelo lema 11 segue-seque

x2 (t) = eAt

0

1

0

= ete(A−I)t

0

1

0

= et [I + t (A− I)]

0

1

0

= ... = et

t

1

0

100

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é uma segunda solução linearmente independente.

(ii) Vector próprio associado a λ = 2. Depois de algumas contas conclui-se que

x3 (t) = e2t

0

0

1

é outra solução independente.

Passo 3: A solução geral é

x = c1et

1

0

0

+ c2et

t

1

0

+ c3e2t

0

0

1

=

c1et + c2e

tt

c2et

c3e2t

.

Como nota final, observe-se que

eAt =

et tet 0

0 et 0

0 0 e2t

.

Exemplo 38 Obtenha-se a solução do PVI x0 = Ax, x (0) = (0, 1, 1)T onde

A =

2 1 0

0 2 1

0 0 2

.

O valor próprio 2 tem multiplicidade 3. Podemos usar a fórmula (4.8). Veja-se em primeiro

lugar que

A− 2I =

0 1 0

0 0 1

0 0 0

, (A− 2I)2 =

0 0 1

0 0 0

0 0 0

, (A− 2I)3 =

0 0 0

0 0 0

0 0 0

.

101

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Considerando (4.8) vem

x (t) = e2tµI + t (A− 2I) + t2

2!(A− 2I)2

¶x0 =

e2t e2tt 1

2e2tt2

0 e2t e2tt

0 0 e2t

0

1

1

=

e2tt+ 12e2tt2

e2t + e2tt

e2t

Solução Geral no Caso n = 2

No caso de sistemas de duas equações (A é quadrada de ordem 2) a solução geral do SED

x0 = Ax pode apresentar-se nas seguintes formas:

Caso 1: Valores Próprios Reais e λ1 6= λ2

x (t) = c1eλ1tv1 + c2e

λ2tv2, c1, c2 ∈ R (4.9)

onde v1 e v2 são vectores próprios associados aos valores próprios λ1 e λ2.

Caso 2: Valores Próprios Complexos (conjugados)

x (t) = c1eαt (u cosβt−w senβt) + c2e

αt (u senβt+w cosβt) , c1, c2 ∈ R (4.10)

onde u+ iw é vector próprio associado ao valor próprio λ = α+ βi.

Caso 3: Valores Próprios Reais Iguais λ1, λ2 = λ

x (t) = c1eλtv1 + c2e

λt (I + t (A− λI)) v2, c1, c2 ∈ R (4.11)

onde v1 é vector próprio associado a λ e v2 é vector próprio generalizado associado a λ (se λ

tem multiplicidade geométrica igual a 2 a solução é x (t) = c1eλtv1 + c2e

λtv2). A solução neste

caso 3 pode apresentar-se na forma da equação (4.8):

x (t) = eλt (I + t (A− λI))

c1

c2

(4.12)

que tem a vantagem de dispensar o cálculo dos vectores próprios.

102

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4.3 Sistema de Equações Diferenciais Não Homogéneas

Consideramos agora o caso

x0 = Ax+ g (t)

(ver o ponto 4.1, p. 76).

Teorema 14 Considere-se o PVI x0 = Ax+ g (t) , x (t0) = x0 onde g (t) é função contínua em

I (eventualmente I = R). Então a solução do PVI em I é

x (t) = eA(t−t0)x0 +Z t

t0

eA(t−s)g (s) ds. (4.13)

Dem. (A demonstração é similar à demonstração do teorema 1, p. 19) Multipliquemos

ambos os termos do SED x0 = Ax+ g (t) por e−At. Vem e−Atx0 (t) = e−AtAx (t) + e−Atg (t) i.e.

e−Atx0 (t)−Ae−Atx (t) = e−Atg (t) (notando que e−AtA = Ae−At) ou

¡e−Atx (t)

¢0= e−Atg (t) .

Integrando ambos os termos desta equação entre t0 e t obtém-se

e−Atx (t)− e−At0x (t0) =Z t

t0

e−Asg (s) ds

ou, ainda, depois de se pré-multiplicar ambos os termos da equação anterior por eAt

x (t) = eA(t−t0)x0 +Z t

t0

eA(t−s)g (s) ds.

103

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Provámos que qualquer solução x (t) tem a forma (4.13). Reciprocamente, qualquer função da

forma (4.13) é solução de x0 = Ax+ g (t) . Com efeito,

x0 (t) =

µeA(t−t0)x0 +

Z t

t0

eA(t−s)g (s) ds¶0

=³eA(t−t0)x0

´0+

µeAt

Z t

t0

e−Asg (s) ds¶0

=³eA(t−t0)x0

´0+¡eAt¢0 Z t

t0

e−Asg (s) ds+ eAtµZ t

t0

e−Asg (s) ds¶0

= AeA(t−t0)x0 +AeAtZ t

t0

e−Asg (s) ds+ eAte−Atg (t)

= A

µeA(t−t0)x0 + eAt

Z t

t0

e−Asg (s) ds¶+ g (t)

= Ax (t) + g (t) .

Falta verificar que para t = t0 se tem x (t0) = eA(t0−t0)x0 +R t0t0eA(t−s)g (s) ds = x0.¥

Exemplo 39 Resolva-se o PVI

x01x02x03

=1 1 0

0 1 0

0 0 2

x1

x2

x3

+

et

0

0

, x (0) =

0

0

1

No exemplo 37 estabelecemos

eAt =

et tet 0

0 et 0

0 0 e2t

.

104

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Aplicando a fórmula (4.13) para t0 = 0

x (t) = eAtx0 +

Z t

0eA(t−s)g (s) ds

=

et tet 0

0 et 0

0 0 e2t

0

0

1

+Z t

0

et−s (t− s) e(t−s) 0

0 e(t−s) 0

0 0 e2(t−s)

es

0

0

ds

=

0

0

e2t

+R t0 e

tds

0

0

=

ett

0

e2t

.

É possível simplificar a calculatória propondo uma solução particular ψ (t) para o SED não

homogéneo. Concretamente, suponha-se que ψ (t) (solução particular) satisfaz x0 = Ax+ g (t)

e φ (t) é solução geral de x0 = Ax. Então a solução geral do SED não homogéneo vem

x (t) = φ (t) + ψ (t) .

Com efeito,

x0 (t) = φ0 (t) + ψ0 (t)

= Aφ (t) +Aψ (t) + g (t)

= A (φ (t) + ψ (t)) + g (t)

= Ax (t) + g (t) .

Exemplo 40 Considere-se o SED x0 = Ax+ g (t) onde

A =

1 0 0

2 1 −23 2 1

, g (t) =

ect

0

0

, c 6= 1.

Para ψ (t) propomos uma função similar a g (t) , ψ (t) = bect onde b é um vector de tipo 3× 1cujos elementos devemos determinar. Como exigimos que ψ (t) seja solução particular, i.e., ψ

105

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tal que ψ0 = Aψ+ g (t), o vector b obtém-se da resolução da equação matricial ψ0 = Aψ+ g (t) ,

i.e.

cbect = Abect +

1

0

0

ectou

(cI −A) b =

1

0

0

.Isto implica

b = (cI −A)−1

1

0

0

= −11− c

1

2(c−4)4+(1−c)21+3c

4+(1−c)2

.Como

eAt =

et 0 0

et sen 2t+ 32e

t cos 2t− 32e

t et cos 2t −et sen 2t32e

t sen 2t− et cos 2t+ et et sen 2t et cos 2t

(verifique!), a solução geral é

x (t) = φ (t) + ψ (t) = eAt

c1

c2

c3

+ ψ (t)

= eAt

c1

c2

c3

+ −11− c

1

2(c−4)4+(1−c)21+3c

4+(1−c)2

ect.

106

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Exercícios

1. Mostre que eAt+Bt = eAteBt se AB = BA. Para o efeito mostre sucessivamente que

(a) Y (t) = eAt+Bt satisfaz o PVI Y 0 (t) = (A+B)Y (t) , Y (0) = I,

(b) eAtB = BeAt se AB = BA e, nestas circunstâncias, Z (t) = eAteBt é solução do PVI

Z 0 (t) = (A+B)Z (t) , Z (0) = I.

Conclua Y (t) ≡ Z (t) .

2. Seja A uma matriz idempotente (A2 = A). Calcule eAt.

3. Seja Φ1 (t) uma matriz fundamental de soluções do SED x0 = Ax. Mostre que Φ2 (t) =

Φ1 (t)C é uma matriz fundamental de soluções sse |C| 6= 0.

4. Mostre que eT−1AT = T−1eAT.

5. Considere o SED x0 = Ax onde

A =

1 1

0 2

.(a) Verifique que

Φ (t) =

et e2t

0 e2t

é uma matriz fundamental de soluções.

(b) Calcule eAt.

6. Seja A uma matriz de tipo 2× 2 de traço nulo e determinante positivo.

(a) Mostre que A2 = − |A| I (I é a matriz identidade). Sugestão: tenha em conta que

tr (A) = 0⇒ a11 + a22 = 0.

(b) Mostre que

eAt =Ap|A| sen

³p|A|t

´+ cos

³p|A|t

´I.

Sugestão: (i) Considere a definição de eAt = I +A2t2/2! +A3t3/3! + ...; (ii) Calcule

A3, A4, etc. a partir da relação A2 = − |A| I e (iii) considere os desenvolvimentosem série sen (x) = x− x3/3! + x5/5!− ... e cos (x) = 1− x2/2! + x4/4!− ...

107

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(c) Usando a alínea anterior determine a solução do PVI x0 = Ax, x (0) = (1, 2)T onde

A =

2 4

−2 −2

.7. Considere a ED linear de segunda ordem y00 = a1y

0+a0y. Determine a1 e a0 sabendo que

uma solução da ED é y (t) = cos (2t) + 12 sen (2t) .

8. Obtenha a solução geral da ED y000 = 2y00 − 2y0.

9. Suponha que A = S + N onde S = diag [a1, ..., an], N (de tipo n × n) é uma matriz

nilpotente de ordem k (i.e., Nk−1 6= 0 e Nk = 0) e SN = NS. Mostre que

eAt = diag£ea1t, ..., eant

¤µI +Nt+

N2t2

2!+ ...+

Nk−1tk−1

(k − 1)!¶.

Como aplicação obtenha eAt onde

A =

1 0 0

0 2 1

0 0 2

.

Confirme o resultado através de um procedimento expedito.

10. (Exame) Seja Φ1 (t) uma matriz fundamental do sistema de equações diferenciais x0 = Ax

e Φ2 (t) uma matriz fundamental do sistema de equações diferenciais y0 = By. Sabendo

que AB = BA obtenha a solução do PVI z0 = (A+B) z, z (0) = z0 (como função de Φ1

e Φ2).

11. (Exame) Sejam A e B matrizes quadradas de ordem n > 1. Suponha que

• λ é valor próprio de A e v é um vector próprio de A associado a λ;

• θ é valor próprio de B e v é um vector próprio de B associado a θ.

Mostre que φ (t) = e(λ+θ)tv é uma solução do sistema de equações diferenciais x0 =

(A+B)x.

108

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12. Resolva os seguintes PVI x0 = Ax, x (0) = x0:

(a) A =

1 2

1 0

, x0 = 1

−1

Solução:

e−t

−e−t

(b) A =

−1 −1−1 −1

, x0 = −1

1

Solução:

−11

(c) A =

1 2

−2 1

, x0 = 10

Solução:

et cos 2t

−et sen 2t

(d) A =

1 −10 1

, x0 = 11

Solução:

et − tet

et

13. Resolva os seguintes SED x0 = Ax para

(a) A =

−1 1 0

1 −1 0

0 0 −4

, x0 =0

2

1

Solução:

−e−2t + 11 + e−2t

e−4t

(b) A =

−2 −3 0

3 −2 0

0 0 −4

, x0 =1

0

1

Solução:

e−2t cos 3t

e−2t sen 3t

e−4t

(c) A =

2 0 1

0 1 −10 0 1

, x0 =0

1

1

Solução:

e2t − et

et − tet

et

(d) A =

1 0 1

0 1 −10 0 1

, x0 =0

1

1

Solução:

tet

et − tet

et

(e) A =

1 −2 1

0 1 −10 0 1

, x0 =1

1

1

Solução:

et − tet + t2et

et − tet

et

109

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14. Especifique as condições que a função b (t) deve verificar para que todas as soluções da

ED y00 = −y0 + b (t) sejam limitadas em t ∈ [0,∞) .

15. Considere o PVI x0 = Ax+ b, x (0) = x0 onde b é um vector de constantes de tipo n× 1.

(a) Mostre que a solução do PVI é x (t) = eAtx0 +¡eAt − I

¢A−1b.

(b) Determine a solução para o caso

A =

1 0

10 −4

, b =

01

, x (0) =

10

16. Resolva o PVI x0 = Ax+ g (t) , x (0) = x0 onde

A =

1 0

0 2

, g (t) = e4t

e−2t

, x0 = 11

Solução:

23e

t + 13e4t

e2t − 14

¡e−4t − 1¢ e2t

110

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Capítulo 5

Estabilidade

Até agora centramos o nosso estudo em duas grandes áreas: análise da existência e unicidade das

soluções e resolução de equações e sistemas de ED. Uma área de enorme importância é a análise

da estabilidade das soluções de ED. Basicamente procura-se extrair informação qualitativa sobre

as soluções quando t → +∞. Poderão interessar aspectos como, o limt→+∞ x (t) (previsão a

longo prazo), o comportamento de x (t) quando a condição inicial é alterada, a periodicidade

da solução, o conjunto de pontos iniciais tais que x (t) converge, etc.

**Incompleto**

5.1 Definições

Seja x (t) a solução única do PVI x0 = f (t, x) , x (t0) = x0 (x é de tipo n× 1). A solução podetambém escrever-se na forma x (t) = x (t, t0, x0) , o que evidencia a dependência da solução

face aos argumentos t0 e x0. Em certos casos pode-se ainda escrever a solução na forma

x (t) = x (t, t0, x0, θ) onde θ é um parâmetro (ou um vector de parâmetros) não especificado

(i.e. não é concretizado com um valor). Por exemplo, o PVI x0 = θx, x (t0) = x0, θ ∈ R tem porsolução a expressão x0eθ(t−t0). Para evidenciar a dependência da solução face aos parâmetros t,

t0, x0 e θ podemos escrever x (t, t0, x0, θ) = x0eθ(t−t0). Também a função f pode escrever-se na

forma f (t, x, θ) . Sob certas condições pode-se garantir a continuidade da solução com respeito

aos parâmetros t0, x0 e θ. Nestas condições, pequenas alterações nos dados iniciais (t0 e x0) ou

no parâmetro θ não causam desvios significativos na solução. Este resultado é particularmente

111

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significativo em aplicações económicas quando existem erros de observação nos parâmetros t0,

x0 e θ 1. Se a solução é contínua com respeito a esses valores, então pequenos erros na estimação

de t0, x0 e θ não causam desvios significativos nos resultados do modelo. O teorema seguinte

estabelece as condições.

Teorema 15 (Continuidade da Solução com respeito a t0, x0 e θ) Assuma-se: (1) f (t, x, θ)

é contínua com respeito a t, x e θ num conjunto compacto D; (2) f satisfaz a condição de Lip-

schitz com respeito a x no conjunto D. Então a solução x (t, t0, x0, θ) do PVI x0 = f (t, x, θ) ,

x (t0) = x0 é contínua nos argumentos t, t0, x0 e θ no conjunto D. Assuma-se adicionalmente

que (3) ∂f/∂x existe e é contínua em D. Então a solução é contínua e diferenciável com respeito

a x0.

Dem. Ver Coddington e Levinson (1955, pp. 25-28).¥

A estabilidade (que se analisa adiante) difere da questão da continuidade da solução com

respeito a t0, x0 e θ. No estudo da estabilidade investiga-se o que sucede com uma solução para

valores grandes de t, nomeadamente quando t→ +∞, quando se impõe uma pequena variação

no valor inicial.

Considere-se o PVI x0 = f (t, x) , x (t0) = x0 com solução x (t) = x (t, t0, x0) . Utilizaremos

também a notação x (t) = x (t, t0, x0) para designar a solução do PVI x0 = f (t, x) , x (t0) = x0.

Definição 12 (Solução Estável, Assintoticamente Estável e Instável) A solução x (t) =

x (t, t0, x0) diz-se estável se para cada ε > 0 existe um δ = δ (t0, ε) tal que, para cada qualquer

solução x (t) = x (t, t0, x0) a desigualdade kx0 − x0k ≤ δ implica2 kx (t)− x (t)k < ε para todo

o t ≥ t0. A solução x (t) = x (t, t0, x0) diz-se assimptoticamente estável se é estável e se existe

um δ0 > 0 tal que a desigualdade kx0 − x0k ≤ δ0 implica kx (t)− x (t)k→ 0 quando t → +∞.

A solução x (t) = x (t, t0, x0) diz-se instável se não é estável.

1Um dos problemas maiores da inferência estatística em processos de difusão governados por equações difer-enciais estocásticas trata do problema da estimação de θ.

2Note-se que kxk é a norma do vector x. Exemplos de normas:

supi|xi| ,

i

|xi| ,i

x2i .

No caso univariado a norma corresponde ao módulo habitual.

112

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Figura 5-1: Solução φ (t, t0, x0) Estável

Na figura 5-1 ilustra-se o conceito de estabilidade. Fixe-se um ε positivo. Se a solução é

estável é sempre possível encontrar um δ > 0 tal que kx0 − x0k ≤ δ implica kx (t)− x (t)k < ε

(por mais pequeno que seja ε > 0). Por outras palavras, pequenos desvios na condição inicial

não afectam significativamente o comportamento futuro da solução.

Exemplo 41 Suponhamos que a população de uma certa espécie evolui de acordo com o modelo

x0 = f (t, x). Num dado momento, há uma perturbação no meio (por exemplo, introdução

de novos elementos na população) que faz alterar subitamente o valor da população para x0.

Situemos este momento em t0. Na ausência deste choque externo, o valor da população em

t0 seria de x0 e a sua trajectória futura seguiria a fórmula x (t, t0, x0), t ≥ t0. No entanto,

devido à perturbação, o comportamento da população passará a seguir a fórmula x (t, t0, x0)

(solução do PVI x0 = f (t, x) , x (t0) = x0). Se a solução é estável, o choque externo (supondo

pequeno) não irá alterar significativamente a trajectória da população, pois, supondo |x0 − x0|relativamente ”pequeno” implica |x (t, t0, x0)− x (t, t0, x0)| igualmente ”pequeno”. Se a soluçãoé assimptoticamente estável devemos mesmo esperar que |x (t, t0, x0)− x (t, t0, x0)|→ 0 quando

t → +∞ (o efeito do choque é diluído ao longo do tempo e desaparece assimptoticamente).

Pelo contrário, se a solução é instável, pequenas alterações das condições iniciais (ou pequenos

choques) afectam, para todo o sempre, o comportamento da solução e o comportamento da

população tenderia a desviar-se cada vez mais da solução x (t, t0, x0) . A figura 5-2 ilustra os

113

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três casos.

Exemplo 42 A solução constante x (t) = x (t, 0, 2) = 2 do PVI x0 = 0, x (0) = 2 é estável mas

não assimptoticamente estável. Com efeito, atendendo a |x (t)− x (t)| = |x0 − 2| ≤ δ < ε, basta

tomar, no contexto da definição, um δ tal que 0 < δ < ε.

Exemplo 43 A solução x (t) = x (t, 0, 1) = 1e−t do PVI x0 = −x, x (0) = 1 é assimptoti-

camente estável. Veja-se em primeiro lugar que é estável. Existe um δ tal que |x0 − x0| ≤ δ

⇒ |x (t)− x (t)| < ε para todo o t ≥ t0. Ora

|x (t)− x (t)| = ¯x0e−t − x0e−t¯ = |x0 − 1| e−t ≤ δe−t ≤ δ < ε.

Para cada ε > 0 fixado, basta escolher um δ < ε para que a definição de solução estável seja

satisfeita. Por outro lado, para qualquer δ0 verifica-se |x (t)− x (t)|→ 0.

Exemplo 44 A solução x (t, t0, x0) = x0e(t−t0) do PVI x0 = x, x (t0) = x0 é instável. Verifique-

se em primeiro lugar que

|x (t)− x (t)| =¯x0e

(t−t0) − x0e(t−t0)

¯= |x0 − x0| e(t−t0).

É imediato concluir-se que a solução é instável dado que a expressão |x (t)− x (t)| não é limitadapara todo o t ∈ R. Para se concluir que a solução é instável, também se pode verificar que

existe um ε, por exemplo ε = 1, tal que, para qualquer δ = δ (t0, ε) > 0 e |x0 − x0| < δ,

tem-se |x (t)− x (t)| = |x0 − x0| e(t−t0) > ε = 1 a partir de certo t em diante. Na figura 5-3

representam-se as trajectórias x (t, 0, 3) = 3et e x (t, 0, 10) = 10et. Observe-se que a amplitude

|x (t, 0, 10)− x (t, 0, 3)| aumenta com t.

Exemplo 45 A solução x (t, 0, x0) = 1+x0−cos t−t sen t da ED x0 = −t cos t é estável emboranão assimptoticamente estável. De facto, δ < ε ⇒ |x (t, 0, x0)− x (t, 0, x0)| = |x0 − x0| < ε.

No entanto |x (t, 0, x0)− x (t, 0, x0)| não tende para zero quando t → +∞. Na figura 5-4

apresentam-se duas trajectórias x (t, 0, 3) e x (t, 0, 10) . Observe-se que a amplitude é |x (t, 0, 3)− x (t, 0, 10)|é constante.

114

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Figura 5-2: Solução Estável, Assintoticamente Estável e Instável (ver exemplo 41)

0t

0x

0~x

( )00 ,, xttx

( )00~,, xttx

0t

0x

0~x

( )00 ,, xttx

( )00~,, xttx

0t

0x

0~x

( )00 ,, xttx

( )00~,, xttx

115

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Figura 5-3: Trajectórias x (t, 0, 3) = 3et e x (t, 0, 10) = 10et

0.5 1 1.5 2t

10

20

30

40

50

60x

Figura 5-4: Trajectórias x (t, 0, 3) = 1 + 3− cos t− t sen t e x (t, 0, 10) = 1 + 10− cos t− t sen t

10 20 30 40 50t

-40

-20

0

20

40

60x

116

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Tem particular interesse o estudo da estabilidade da chamada solução de equilíbrio.

Definição 13 (Solução de Equilíbrio) Uma solução (ou valor de equilíbrio) é uma solução

designada por x que satisfaz a equação f (t, x) = 0 para t ≥ 0.

É imediato verificar-se que x é solução (de facto x0 ≡ 0 e f (t, x) ≡ 0). Intuitivamente, sef (t, x) ≡ 0 então no ponto x a variação infinitesimal é nula pelo que o sistema no ponto x nãose altera (i.e. está em equilíbrio).

Exemplo 46 Determine-se o valor de equilíbrio da ED x0 = αx. Trata-se de encontrar x :

f (t, x) = αx = 0. Obviamente a solução de equilíbrio é x = 0 para qualquer α. Neste caso

sabemos que x (t) = ceθt e, em particular |x (t)|→ +∞ se θ > 0 e c 6= 0 e x (t)→ 0 se θ < 0.

Exemplo 47 Determine o valor de equilíbrio do SED x01 = (x1 − 1) (x2 − 1)x02 = (x1 + 1) (x2 + 1) .

x é um valor de equilíbrio sse f (t, x) = 0, i.e.

(x1 − 1) (x2 − 1) = 0(x1 + 1) (x2 + 1) = 0.

Trata-se, portanto, de resolver o sistema anterior em ordem a x1 e x2. Da primeira equação

sai x1 = 1 ou x2 = 1; da segunda sai x1 = −1 ou x2 = −1. A solução do sistema é

(x1 = 1 ∨ x2 = 1) ∧ (x1 = −1 ∨ x2 = −1) ,

obtendo-se, assim, dois valores de equilíbrio,

x1 =

1

−1

, x2 =

−11

.

Definição 14 (Solução de Equilíbrio Estável, Assintoticamente Estável e Instável)

A solução de equilíbrio x diz-se estável se para cada ε > 0 existe um δ = δ (t0, ε) tal que, para

117

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cada qualquer solução x (t) = x (t, t0, x0) a desigualdade kx0 − xk ≤ δ implica kx (t)− xk < ε

para todo o t ≥ t0. A solução de equilíbrio x diz-se assimptoticamente estável se é estável e se

existe um δ0 > 0 tal que a desigualdade kx0 − xk ≤ δ0 implica kx (t)− xk→ 0 quando t→ +∞.

A solução de equilíbrio x diz-se instável se não é estável.

Por outras palavras, uma solução de equilíbrio é estável se, qualquer solução inicializada no

momento t0 suficientemente perto de x, permanece perto de x para todo o t ≥ t0 e assimptotica-

mente estável se não só é estável como também tende para x quando t→ +∞. Observe-se quea definição 14 corresponde à definição 12 onde, nesta última, deve ler-se x em lugar de x (t).

Na verdade a solução de equilíbrio pode ser encarada como a solução do PVI x0 = f (t, x) ,

x (t0) = x.

Observação 14 Para se concluir que uma solução x (t, t0, x0) (incluindo a solução de equilíbrio

x) é instável é suficiente verificar-se que kx (t, t0, x0)− x (t, t0, x0)k não é limitado para todo ot ou que kx (t, t0, x0)− x (t, t0, x0)k→ k 6= 0 e k não depende de x0.

Exemplo 48 A solução de equilíbrio x = 0 da ED x0 = −x é assimptoticamente estável.Veja-se em primeiro lugar que é estável. Tem-se

|x (t)− x| = ¯x0e−t¯ = |x0| e−t ≤ δe−t ≤ δ < ε.

Para cada ε > 0 fixado basta escolher um δ < ε para que a definição de solução de equilíbrio

estável seja satisfeita. Por outro lado, para qualquer δ0 verifica-se |x (t)| → 0. Na figura 5-5

apresentam-se as quatro trajectórias, x (t, 0,−4) , x (t, 0,−3) , x (t, 0, 3) e x (t, 0, 4) (i.e. todasas trajectórias são iniciadas no momento t = 0 mas com valores x0 igual a −4,−3, 3, 4).

Exemplo 49 A solução de equilíbrio x = 0 da ED x0 = x é instável. Com efeito, basta verificar

que a expressão

|x (t)− x| = |x0| e(t−t0)

não é limitada para todo o t ∈ R.

118

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Figura 5-5: Quatro Soluções da ED x0 = −x

1 2 3 4 5t

-4

-2

0

2

4

x

Exemplo 50 A solução de equilíbrio x = 0 da ED x0 = −a (t)x onde

a (t) =

µ13 + 12 sen log (t+ 1) +

12t

t+ 1cos log (t+ 1)

é assimptoticamente estável. Com efeito a solução geral é

x (t, 0, x0) = x0e−(13+12 sen log(1+t))t

e |x (t, 0, x0)| ≤ |x0| e−t (ver exemplo 48).

Todos os exemplos fornecidos neste ponto baseiam-se em ED que admitem uma solução

fechada. Investigaremos adiante a estabilidade de SED com solução desconhecida.

5.2 Estabilidade de Sistemas Lineares

Aborda-se a estabilidade da solução do SED x0 = Ax. Tem particular interesse o estudo da

estabilidade da solução de equilíbrio do SED. A(s) solução (soluções) de equilíbrio verificam

Ax = 0 e, portanto, pertencem ao núcleo (ou espaço nulo) da matriz A,

N (A) = {z ∈ Rn : Az = 0} .

119

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Se A tem característica n (nenhum valor próprio é igual a zero) então N (A) = {0} , i.e., a únicasolução de equilíbrio é x = 0. Caso contrário, N (A) é o espaço próprio correspondente ao valor

próprio λ = 0 da matriz A. Em qualquer dos casos, centra-se a análise apenas na solução de

equilíbrio x = 0.

Teorema 16 Qualquer solução (incluindo a solução de equilíbrio x = 0) do SDE é: (a) as-

simptoticamente estável se todos os valores próprios tiverem parte real negativa; (b) estável se

todos os valores próprios tiverem parte real negativa ou nula e os valores próprios da parte

real nula tiverem multiplicidade algébrica igual à multipliciade geométrica; (c) instável se pelo

menos um dos valores próprios tiver parte real positiva ou se existir algum valor próprio com

parte real nula com multiplicidade algébrica superior à multiplicidade geométrica.

Dem. Sem perda de generalidade podemos analisar a estabilidade da solução de equilíbrio

x = 0 pois, para sistemas lineares a diferença de duas soluções é ainda uma solução3. (a) Toda

a solução x (t) = (x1 (t) , ..., xn (t))T do SED x0 = Ax é da forma x (t) = eAtx (0) = eAtx0. Seja

φij (t) o elemento ij da matriz eAt e x0 = (x10, ..., xn0)

T . Então

xi (t) = φi1 (t)x10 + ...+ φin (t)xn0.

Suponha-se que todos os valores próprios de A têm parte real negativa (por outras palavras,

maxi=1,...,n {Re (λi)} < 0). Seja −α1 = maxi=1,...,n {Re (λi)} o valor da parte real mais elevadano conjunto dos valores próprios (por exemplo, se λ1 = −1, λ2 = −2 + 4i, λ3 = −2− 4i entãomaxi=1,2,3 {Re (λi)} = −1). Então, existe um K > 0 e α > 0 a verificar −α1 < −α < 0 tal que

3Analisar a estabilidade da solução x (t, t0, x0) corresponde a analisar a estabilidade da solução nula. Comefeito kx (t, t0, x0)− x (t, t0, x0)k = kx (t, t0, x0 − x0)k = kx (t, t0, x0 − x0)− xk = kx (t, t0, x∗0)− xk e x∗0 desem-penha o mesmo papel que x0.

120

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¯φij (t)

¯ ≤ Ke−αt para todo o t ≥ 0. Consequentemente, verifica-se para i = 1, ..., n

|xi (t)| = |φi1 (t)x10 + ...+ φin (t)xn0|≤ Ke−αt |x10 + ...+ xn0|≤ Ke−αt (|x10|+ ...+ |xn0|)≤ Ke−αtnmax {|x10| , ..., |xn0|}= Ke−αtn kx0k .

Assim,

kx (t)k ≤ max {|x1 (t)| , ..., |xn (t)|}≤ nKe−αt kx0k .

Para garantir kx (t)k < ε é suficiente que ocorra kx0k < ε/ (nK) (t = 0). Nestas condições

escolha-se 0 < δ < ε/ (nK) pelo que kx0k ≤ δ ⇒ kx (t)k < ε. Resulta também, para qualquer

valor inicial, que kx (t)k → 0. Em suma, nas condições de (a) a solução de equilíbrio (ou

qualquer outra) é assimptoticamente estável. O resto da demonstração pode ver-se em Braun

(1993), Cap. 4.¥

Exemplo 51 Considere-se o SED x0 = Ax onde A é uma matriz quadrada de ordem 2 e os

seguintes cenários e respectiva solução geral: (C1) λ1 = −1, λ2 = −2. A solução geral é

x (t) = c1e−tv1 + c2e

−2tv2, c1, c2 ∈ R

onde v1 e v2 são vectores próprios associados aos valores próprios λ1 e λ2; (C2) λ1 = −3± 2i.A solução geral é

x (t) = c1e−3t (u cos 2t− w sen 2t) + c2e

−3t (u sen 2t+ w cos 2t) , c1, c2 ∈ R

onde u+iw é vector próprio associado ao valor próprio λ = α+βi; (C3) λ1, λ2 = −4. A soluçãogeral é

x (t) = c1e−4tv1 + c2e

−4t (I + t (A− λI)) v2, c1, c2 ∈ R

121

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onde v1 é vector próprio associado a λ e v2 é vector próprio generalizado associado a λ. Nos

cenários (C1), (C2) e (C3) a solução de equilíbrio x = 0 é assimptoticamente estável, pois, em

qualquer dos casos, todos os valores próprios têm parte real negativa. Observe-se, que |x (t)| < ε

e |x (t)|→ 0, em qualquer dos três casos. Considere-se agora (C4) λ1, λ2 = 0. A solução geral

é

x (t) = c1v1 + c2 (I + t (A− λI)) v2, c1, c2 ∈ R.

A estabilidade depende da multiplicidade geométrica do valor próprio nulo. Se a multiplicidade

geométrica de λ = 0 é igual um então é possível obter apenas um vector próprio linearmente

independente (v1). O vector v2 é vector próprio generalizado, verificando (A− λI) v2 6= 0.

Resulta que a solução de equilíbrio é instável. Se a multiplicidade geométrica é igual a dois

então é possível obter dois vectores próprios linearmente independentes. Nestas circunstâncias,

v2 é vector próprio e (A− λI) v2 = 0. A solução reduz-se agora a x (t) = c1v1+ c2v2. Tratando-

se de uma solução constante, a solução do PVI com a condição inicial x (0) = x0, só poderá

ser x (t, 0, x0) = x0. Conclui-se imediatamente que a solução é estável, pois, para garantir

kx (t, 0, x0)− xk = kx0k < ε basta tomar um 0 < δ < ε nos termos da definição 14.

Exemplo 52 Considere-se o SED x0 = Ax onde

A =

0 0 1

0 −1 0

0 0 0

.

É imediato verificar que os valores próprios são λ1 = 0, λ2 = 0 e λ3 = −1. A multiplicidade

algébrica do valor próprio nulo é dois e a multiplicidade geométrica é apenas 1, i.e., existe apenas

um vector próprio linearmente independente associado ao valor próprio nulo (verifique!). Pelo

teorema 16 a solução de equilíbrio (ou qualquer outra) é instável. Verifique-se, pela definição,

que a solução é efectivamente instável. Para o efeito determine-se a solução x (t) = x (t, 0, x0) =

122

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eAtx0. Deixa-se como exercício verificar que

eAt =

1 0 t

0 e−t 0

0 0 1

.

Assim,

x (t) =

1 0 t

0 e−t 0

0 0 1

x10

x20

x30

=

x10 + tx30

e−tx20

x30

.Tem-se agora, utilizando, por exemplo, a norma kxk =px21 + x22 + x23,

kx (t)− xk = kx (t)k =

°°°°°°°°°x10 + tx30

e−tx20

x30

°°°°°°°°° =r³

|x10 + tx30|2 + e−2t |x20|2 + |x30|2´→ +∞

quando t→ +∞. Pela definição 14 e observação 14 a solução de equilíbrio é instável.

5.3 Estabilidade de Sistemas Não Lineares

Aborda-se agora a estabilidade da solução de equilíbrio x, do SED x0 = f (x) onde, como

habitualmente,

f (x) =

f1 (x)...

fn (x)

.

5.3.1 Linearização

Uma forma de abordar a estabilidade consiste em linearizar f (x) em torno da solução de

equilíbrio. Suponha-se que f (x) possui derivadas de segunda ordem contínuas. Então, pela

fórmula de Taylor, vem

123

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fi (x) = fi (x) +∂fi (x)

∂xT(x− x) +

1

2(x− x)T

∂f2i (z)

∂x∂xT(x− x) , i = 1, ..., n (5.1)

onde z é uma combinação linear convexa entre x e x. A equação (5.1) pode-se escrever, mais

compactamente, na forma

f (x) = f (x) + f 0 (x) (x− x) +1

2

(x− x)T

∂f21 (z)

∂x∂xT(x− x)

...

(x− x)T ∂f2n(z)∂x∂xT

(x− x)

(5.2)

onde

f 0 (x) =

∂f1(x)∂x1

· · · ∂f1(x)∂xn

.... . .

...∂fn(x)∂x1

· · · ∂fn(x)∂xn

Note-se que f 0 (x) é o Jacobiano de f no ponto x (é uma matriz de constantes). Reescreva-se

a equação (5.2) na forma

f (x) = Ax+ g (x)

onde

A = f 0 (x) ,

g (x) = f (x)− f 0 (x) x+1

2

(x− x)T

∂f21 (z)

∂x∂xT(x− x)

...

(x− x)T ∂f2n(z)∂x∂xT

(x− x)

(5.3)

(note-se que z varia com x). Tem-se agora:

Teorema 17 Suponha-se que f (x) possui derivadas de segunda ordem contínuas. Então a

124

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solução de equilíbrio x do SED x0 = f (x) , ou equivalentemente, x0 = Ax+ g (x) com

A = f 0 (x) =

∂f1(x)∂x1

· · · ∂f1(x)∂xn

.... . .

...∂fn(x)∂x1

· · · ∂fn(x)∂xn

é (a) assimptoticamente estável se todos os valores próprios de A tiverem parte real negativa e (b)

instável se pelo menos um dos valores próprios de A tiver parte real positiva. c) A estabilidade da

solução de equilíbrio não pode ser determinada a partir da estabilidade da solução de equilíbrio

x0 = Ax se todos os valores próprios de A tiverem parte real menor ou igual a zero e pelo menos

um dos valores próprios tiver parte real nula.

Nota: As soluções de equilíbrio que estão nas condições das alíneas (a) e (b) designam-se

por pontos hiperbólicos.

Dem. Nota introdutória: é frequente assumir-se sem perda de generalidade que x = 0 é

a solução de equilíbrio. Mostre-se em primeiro lugar que assim pode suceder. Considere-se

z = x− x e portanto também x = z + x. Tem-se z0 = f (x) = f (z + x) ou ainda z0 = g (z). Se

x é a solução de equilíbrio do SED x0 = f (x), i.e., verifica-se f (x) = 0, então 0 é a solução do

equilíbrio do SED z0 = g (z) pois g (0) = f (0 + x) = 0. Claro que as propriedades dinâmicas

de z são equivalentes às de x (basta verificar que z = x− x). Assim, assuma-se sem perda de

generalidade que x = 0. (a) Como x0 = f (x) = Ax+ g (x) e g é contínua tem-se, pela equação

(4.13), com a condição x (0) = x0,

x (t) = eAtx0 +

Z t

0eA(t−s)g (x (s)) ds.

Precisamos de provar sob a condição (a) do teorema que não só kx (t)k é limitado para qualquert como também kx (t)k → 0. Sob a condição (a) sabe-se que existe um K > 0 e um k > 0 tal

que °°eAtx0°° ≤ Ke−kt kx0k

(ver demonstração do teorema 16). Resulta também

°°°eA(t−s)g (x (s))°°° ≤ Ke−k(t−s) kg (x (s))k .

125

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Nas condições do teorema existe um σ > 0 tal que4

kxk < σ ⇒ kg (x)k ≤ k

2Kkxk (5.4)

Podemos agora escrever, para kxk < σ

kx (t)k ≤ °°eAtx0°°+ Z t

0

°°°eA(t−s)g (x (s))°°° ds≤ Ke−kt kx0k+

Z t

0Ke−k(t−s) kg (x (s))k ds

≤ Ke−kt kx0k+Z t

0Ke−k(t−s)

k

2Kkx (s)k ds

= Ke−kt kx0k+ k

2

Z t

0e−k(t−s) kx (s)k ds

Multiplicando a equação anterior por ekt vem

ekt kx (t)k ≤ K kx0k+ k

2

Z t

0eks kx (s)k ds

e fazendo z (t) = ekt kx (t)k a desigualdade pode ainda escrever na forma

z (t) ≤ K kx0k+ k

2

Z t

0z (s) ds.

Pela desigualdade de Bellman e Gronwall5 vem

z (t) ≤ K kx0k e k2 t,

4Note-se que, com a norma kxk = maxi=1,...,n {|xi|}, kg (x)k é uma forma quadrática e kxk é uma formalinear. Para valores de xi próximos da solução de equilíbrio, isto é, próximos de zero, kg (x)k é uma quantidade”pequena” comparativamente a kxk . Assim, num vizinhança de zero, certamente se tem kg (x)k ≤ c kxk , ondec é uma constante positiva e que depende do conjunto onde os xi variam. Por conveniência, podemos escolherc = k/ (2K) . Basta admitir que os xi variam num certo conjunto respeitando a restrição kxk < σ para um certoσ > 0.

5Desigualdade de Bellman e Gronwall: se z (t) é uma função real contínua tal que z (t) ≥ 0 e

z (t) ≤ C + kt

0

z (s) ds

para todo o t ≥ 0, onde C > 0 e k > 0 entãoz (t) ≤ Cekt.

126

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e portanto z (t) = ekt kx (t)k ≤ K kx0k e k2 t,

kx (t)k ≤ K kx0k e−kte k2 t = K kx0k e−12kt (5.5)

desde que kx (s)k < σ, 0 ≤ s ≤ t. Mas se kx0k = kx (0)k < σ/K a desigualdade (5.5) garante

que kx (t)k < σ se verifica para todo o t. Consequentemente, a desigualdade (5.5) é verdadeira

para todo o t se o valor inicial respeitar a desigualdade kx0k < σ/K. Nestas condições, verifica-

se também kx (t)k → 0. (b) Remete-se a demonstração para Perko (2001). Relativamente à

alínea (c) veja-se o exemplo 55.¥

Exemplo 53 Naturalmente a teoria aplica-se também a ED univariadas. Considere-se a ED

x0 = f (x) = −x2+5x+6. Resolvendo f (x) = 0 resulta x = −1 e x = 6. Estude-se a estabilidadede x = −1. Nos termos do teorema 17 a ”matriz” A é A = f 0 (−1) = −2 (−1) + 5 = 7 > 0 e ovalor próprio (único) é positivo. Logo, a solução de equilíbrio x = −1 é instável. A solução deequilíbrio x = 6 é, no entanto, assimptoticamente estável pois A = f 0 (6) = −2 (6)+5 = −7 < 0e o valor próprio (único) é negativo. Qualquer solução inicializada numa vizinhança de x = 6,

tende para x = 6 quando t → +∞; no entanto, o valor inicial x0 não pode ser escolhidolivremente em R (i.e., não se garante x (t, 0, x0) → x = 6 para todo o x0 ∈ R - esta conclusãoé evidente tende em conta que −1 é uma solução de equilíbrio instável). Voltaremos a estaquestão adiante. O exemplo em análise mostra que o tipo de estabilidade que estudamos é

essencialmente uma propriedade local.

Exemplo 54 Considere-se o SED

x0 = f (x) =

1− x1x2

x1 − x32

.Determine-se a solução (ou as soluções) de equilíbrio. Procura-se portanto x tal que f (x) = 0.

Da equação 1 − x1x2 = 0 sai x1 = 1/x2. Substituindo este valor na segunda equação vem

1/x2 − x32 = 0 ⇔ x42 = 1. Esta equação tem 4 soluções6 x2 = 1 ∨ x2 = −1 ∨ x2 = i ∨ x2 = −i.Como as soluções de equilíbrio complexas não interessam assume-se apenas x2 = 1 ∨ x2 = −1.

6Note-se que x4 = 1 dá lugar a x2 = 1 ∨ x2 = −1 e que x2 = −1 implica x = ±√−1 = ±i.

127

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As soluções de equilíbrio são

x1 =

11

, x2 =

−1−1

.Analise-se primeiro a solução x1. Nos termos do teorema 17, vem

A = f 0 (x1) =

∂(1−x1x2)∂x1

∂(1−x1x2)∂x2

∂(x1−x32)∂x1

∂(x1−x32)∂x2

x1=1,x2=1

=

−x2 −x11 −3x22

x1=1,x2=1

=

−1 −11 −3

.Como os valores próprios −2,−2 têm ambos parte real negativa a solução de equilíbrio x1, pelo

teorema 17, é assimptoticamente estável. No outro caso a matriz A é

A = f 0 (x1) =

∂(1−x1x2)∂x1

∂(1−x1x2)∂x2

∂(x1−x32)∂x1

∂(x1−x32)∂x2

x1=−1,x2=−1

=

1 1

1 −3

.Como os valores próprios são −1±√5 , tendo um deles parte real positiva, a solução de equilíbriox2, pelo teorema 17, é instável.

Exemplo 55 Considere-se o SED

x0 = f (x) =

x2 − x1¡x21 + x22

¢−x1 − x2

¡x21 + x22

¢ .

A única solução de equilíbrio é x = 0. Depois de algumas contas conclui-se

A = f 0 (x) =

0 1

−1 0

.Os valores próprios são ±i e a solução de equilíbrio do SED x0 = Ax é estável (verifique).

Pode-se provar (por métodos engenhosos) que a solução (na forma implícita) do SED inicial é

x1 (t) + x2 (t) =c

1+2ct , com c = x21 (0) + x22 (0) . Como existe um K tal que |x1 (t) + x2 (t)| < K

e como x1 (t) + x2 (t) → 0 tem-se que x = 0 é uma solução de equilíbrio assimptoticamente

estável. Estamos nas condições do teorema 17 c): no caso em que um dos valores próprios tem

128

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parte real nula, a estabilidade da solução de equilíbrio do SED inicial não pode ser determinada

a partir da estabilidade da solução de equilíbrio x0 = Ax. Considere-se agora o SED

x0 = f (x) =

x2 + x1¡x21 + x22

¢−x1 − x2

¡x21 + x22

¢ .

Como no caso anterior, a única solução de equilíbrio é x = 0. Depois de algumas contas conclui-

se

A = f 0 (x) =

0 1

−1 0

.Os valores próprios são ±i e a solução de equilíbrio do SED x0 = Ax é estável. No entanto, pode-

se provar (por métodos engenhosos) que a solução (na forma implícita) é x1 (t)+x2 (t) =c

1−2ct ,

com c = x21 (0) + x22 (0) . Assim, a solução só está definida para t ∈ (0, 1/ (2c)) e claramente asolução é não limitada. A solução x é instável. Também neste caso a estabilidade da solução

de equilíbrio do SED inicial não pode ser determinada a partir da estabilidade da solução de

equilíbrio x0 = Ax já que pelo menos um dos valores próprios tem parte real nula [teorema

17 c)]. Em suma, quando pelo menos um dos valores próprios tem parte real nula a análise

da estabilidade da solução de equilíbrio do SED inicial não pode ser determinada a partir da

estabilidade da solução de equilíbrio x0 = Ax. Em particular, a solução de equilíbrio do SED

inicial pode ser assimptoticamente estável, instável (ou apenas estável).

5.3.2 Método Directo de Liapunov

O exemplo 55 mostra as limitações do teorema 17. Um método para decidir sobre a estabilidade

de soluções de equilíbrio, incluindo pontos não hiperbólicos, é devida a Liapunov.

Considere-se um SED de n equações não linear x0 = f (x) satisfazendo as condições de

existência e unicidade no conjunto R = I × E (t ∈ I) onde E é aberto e está contido em Rn e

seja x uma solução de equilíbrio contida em E. Considere-se uma função V : Rn → [0,+∞] talque V ∈ C1 (E) , V (x) > 0 se x 6= x e V (x) = 0. Uma função nestas condições designa-se por

função Liapunov. Note-se que

V 0 (x (t)) :=dV (x (t))

dt=

nXi=1

∂V

∂xix0i (t) . (5.6)

129

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Teorema 18 Se (a) V 0 (x (t)) ≤ 0 para todo o x ∈ E então a solução x é estável; se (b)

V 0 (x (t)) < 0 para todo o x ∈ E e x 6= x então a solução x é assimptoticamente estável; se (c)

V 0 (x (t)) > 0 para todo o x ∈ E e x 6= x então a solução x é instável.

Dem. Sem perda de generalidade assuma-se x = 0. (a) Escolha-se um ε > 0 tal que

{x : kxk ≤ ε} ⊂ E e defina-se V0 = minkxk=ε V (x) . Dado que V (0) = 0 e V (x) é contínua em

E segue-se que existe um δ, 0 < δ ≤ ε tal que kxk ≤ δ ⇒ V (x) < V0. Assim se kx0k < δ a

hipótese V 0 (x) ≤ 0 implica que

V (x (t, t0, x0)) ≤ V (x0) < V0 (5.7)

para t ≥ t0. Suponha-se agora que para kx0k < δ existe um t1 > 0 tal que kx (t1, t0, x0)k = ε.

Nestas condições, como V0 é o mínimo no conjunto kxk = ε segue-se que

V (x (t1, t0, x0)) ≥ V0

o que é uma contradição com (5.7). Conclui-se então que kx0k < δ implica kx (t, t0, x0)k < ε

para todo o t ≥ 0 e, portanto, x é estável. (b) Pela parte (a), quando kx0k < δ, x (t, t0, x0)

converge, digamos para x, no compacto {x : kxk ≤ ε} quando t → +∞. Uma vez que V (x)

é estritamente decrescente com t a aumentar e dado que V (x (t, t0, x0)) → V (x) devido à

continuidade de V, segue-se que

V (x (t, t0, x0)) > V (x) (5.8)

para todo o t > 0. Mas se x 6= x = 0 então para s > 0 tem-se V (x (s, t0, x)) < V (x) e, devido à

continuidade segue-se que, para todo o y suficientemente próximo de x, V (x (s, t0, y)) < V (x) .

Mas então para y = x (t∗, t0, x0) e t∗ suficientemente grande tem-se

V (x (s+ t∗, t0, x0)) < V (x)

o que é uma contradição com (5.8). Logo x = x = 0 e x é uma solução assimptoticamente

estável. Remete-se à alínea (c) para Perko (2001), p. 132.¥

130

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Figura 5-6: Função Liapunov V (x) (n = 1) onde V 0 (x) < 0

x( )001 ,, xttx( )002 ,, xttx 0x

( ) 2xxV =

A maior dificuldade deste método consiste em encontrar a função de Liapunov apropriada.

Uma primeira tentativa consiste em analisar V (x) = c1 (x1 − x1)2 + ...+ cn (xn − xn)

2 , ci > 0

onde xi são as coordenadas do vector x. Certas combinações lineares entre os parâmetros ci

permitem esclarecer a natureza das soluções de equilíbrio, tal como mostra o exemplo 57 (ver

adiante).

Exemplo 56 Considere-se x0 = −x. Sabe-se que a solução de equilíbrio x = 0 é assimptotica-

mente estável (ver exemplo 48). Na figura 5-6 representa-se a função Liapunov V (x) = x2 estri-

tamente decrescente com respeito a t (caso n = 1). Com efeito, dV (x (t)) /dt = 2xx0 = −2x2 <0, x 6= x. Pelo teorema 18, x = 0 é assimptoticamente estável. Observe-se que dV (x (t)) /dt < 0

implica V (x (t2, t0, x0)) < V (x (t1, t0, x0)) < V (x0) para t0 < t1 < t2. Dado um ponto inicial

x0 a solução x (t) desloca-se no sentido onde a função V (x (t)) decresce. Este movimento

processa-se em direcção a x = 0.

Na figura 5-7 representa-se uma função de Liapunov V (x (t)) no caso n = 2. Observe-se

que V (x (t)) decresce à medida que t→ +∞. As trajectórias x (t) representadas na figura por

Γ cruzam sucessivas curvas de nível y1, y2, ... de amplitude decrescente à medida que x (t) se

aproxima da solução de equilíbrio x = 0.

131

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Figura 5-7: Função Liapunov V (x1, x2) (n = 2) onde V 0 (x) < 0

Exemplo 57 Considere-se o SED

x01 = −2x2 + x2x3

x02 = x1 − x1x3

x03 = x1x2.

Resolvendo o sistema f (x) = 0 conclui-se que x = (0, 0, 0)T é uma das soluções de equilíbrio.

Aplicando o teorema 17 vem

f 0 (x) = A =

0 −2 0

1 0 0

0 0 0

e os valores próprios de A são {0,±2i} . Logo a estabilidade do SED inicial não pode ser

deduzido a partir do SED x0 = Ax. Para usar o método de Liapunov é necessário em primeiro

lugar encontrar uma função V (x) apropriada. Uma primeira tentativa passa por funções do

tipo

V (x) = c1x21 + c2x

22 + c3x

23, c1, c2, c3 > 0

132

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(note-se que V satisfaz: V : Rn → [0,+∞] , V ∈ C1 (E) , V (x) > 0 se x 6= x e V (x) = 0).

Calcule-se a derivada de V com respeito a t. Usando a fórmula (5.6) vem

V 0 (x (t)) =3X

i=1

∂V

∂xix0i (t)

= 2c1x1x01 + 2c2x2x

02 + 2c3x3x

03

= 2c1x1 (−2x2 + x2x3) + 2c2x2 (x1 − x1x3) + 2c3x3 (x1x2)

= 2 (c1 − c2 + c3)x1x2x3 + 2 (−2c1 + c2)x1x2.

Não é possível escolher c1, c2 e c3 de forma que V 0 (x) > 0 ou V 0 (x) < 0 para todo o E. No

entanto, impondo (c1 − c2 + c3) = 0, (−2c1 + c2) = 0 e c1, c2, c3 > 0, i.e., c2 = 2c1 > 0 e

c3 = c1 > 0 resulta V 0 (x) = 0. Nas condições do teorema 18 a solução de equilíbrio é estável.

Exemplo 58 Considere-se o SED

x01 = −2x2 + x2x3 − x31

x02 = x1 − x1x3 − x32

x03 = x1x2 − x33.

À semelhança do exemplo anterior, também neste caso a estabilidade deste SED não pode

ser deduzido a partir do SED x0 = Ax. Verifique-se que a solução de equilíbrio (0, 0, 0)T é

assimptoticamente estável a partir da função V (x) = x21 + 2x22 + x23.

5.4 Métodos Gráficos

Apresenta-se neste ponto um conjunto de procedimentos gráficos que permitem discutir o com-

portamento da solução quando esta é desconhecida.

133

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5.4.1 Equações Univariadas de Primeira ordem

Retratos de Fases (n = 1)

Considere-se a ED autónoma x0 = f (x) e suponha-se que a solução x (t) é desconhecida. Se

atendermos ao sinal de f (x) numa vizinhança de x0, podemos estabelecer se x (t, t0, x0) aumenta

ou diminui a partir desse ponto. Se x (t) aumenta (diminui) podemos inserir, junto a x0, uma

seta no sentido oeste-este (este-oeste). A magnitude de f (x) numa vizinhança de x0 pode

ser também relevante (dá informação sobre se o aumento ou diminuição de x (t) é forte ou

fraco). Esta informação incorpora-se no gráfico traçando uma seta com um comprimento, ou

espessura, proporcional à magnitude de f (x) . Esta representação gráfica, que se designa por

retrato de fases (caso univariado), fornece uma ideia geral sobre o comportamento da solução,

nomeadamente, permite discutir (ou conjecturar) sobre a estabilidade das soluções de equilíbrio.

Na figura 5-8 apresentam-se duas situações distintas. Na caso A a solução de equilíbrio

ocorre no ponto x = a, pois f (a) = 0. Esta solução é assimptoticamente estável. Intuitivamente

é claro: quando x é inicializado num valor abaixo de a resulta que f (x) > 0, i.e. x0 > 0 e,

assim, o valor de x aumenta; neste caso x move-se da esquerda para a direita até atingir o valor

x = a (as setas indicam o movimento de x). Se x é inicializado num valor acima de a resulta

que f (x) < 0, i.e. x0 < 0 e, assim, o valor de x diminui; neste caso x move-se da direita para a

esquerda até atingir o valor x = a (as setas indicam o movimento de x). Em ambas as situações

a solução tende para o valor de equilíbrio. No caso B a solução de equilíbrio é b, mas não é

estável. Com efeito, verifica-se que f (x) > 0 quando x > b e f (x) < 0 quando x < b. Nestas

circunstâncias, a solução afasta-se sempre de b. O teorema 17, p. 125, permite fundamentar

estas conclusões. Com efeito, no caso A (B) a função f (x) verifica f 0 (a) < 0 (f 0 (b) > 0).

Exemplo 59 Considere-se x0 = f (x) = −x2+5x+6. A partir da figura 5-9 pode-se concluir quea solução de equilíbrio −1 é instável enquanto que a solução de equilíbrio 6 é assimptoticamenteestável. Mais: se x0 < −1⇒ limt→+∞ x (t, 0, x0) = −∞ e se x0 > −1⇒ limt→+∞ x (t, 0, x0) =

6. Deixa-se ao cuidado do leitor a inserção das setas no eixo das abcissas.

134

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Figura 5-8: Retratos de Fase

a

( )xf

xb

( )xf

x

A B

Figura 5-9: Curva f (x) = −x2 + 5x+ 6

-2 2 4 6

-5

5

10

135

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Campos de Direcções

Considere-se agora o caso da ED não autónoma x0 = f (t, x). O campo de direcções é uma

aplicação que atribui, a cada ponto de uma região de duas ou três dimensões, um vector. No

caso de ED univaridadas, o campo de direcções obtém-se associando a cada ponto (t, x) do plano

um vector com a direcção (1, f (t, x)) e com um comprimento

r³1 + |f (t, x)|2

´. Observe-se:

quando t aumenta o par ordenado (t, x (t))movimenta-se ao longo da sua trajectória. A tangente

a esta trajectória, num dado ponto (t, x) ∈ R2 tem inclinação f (t, x); por outras palavras, a

tangente tem a direcção do vector (1, f (t, x)). Podemos então associar a cada ponto (t, x)

do plano um vector (graficamente representado por um segmento de recta ou mesmo uma

seta) com a direcção do vector (1, f (t, x)) e com um comprimento

r³1 + |f (t, x)|2

´. Em

certos casos, para se obter melhor informação gráfica, pode impor-se que os vectores tenham

comprimento unitário: para o efeito divide-se (1, f (t, x)) pela norma Euclidiana do vector7.

A informação fornecida pelo campo de direcções é relevante no estudo do comportamento da

solução. Nomeadamente, permite inferir (ou conjecturar) sobre a estabilidade das soluções.

Exemplo 60 Considere-se a ED x0 = −x cos t. A solução geral é x (t) = ce− sen t. Com a

condição inicial x (0) = x0 vem x (t) = x0e− sen t. Se a solução fosse desconhecida poder-se-ía

tentar saber algo mais sobre a solução traçando o campo de direcções. Represente-se então o

campo de direcções (figuras 5-10 e 5-11 - utilizando o programa Maple) e tente-se imaginar a

solução nos seguintes casos x0 = −1, x0 = 1 e x0 = 2.Na figura 5-12 traça-se o mesmo campo de direcções (agora com o programa Mathematica)

mas apresentando as soluções iniciadas em x0 = −1, x0 = 1 e x0 = 2.

Exemplo 61 Considere-se a ED x0 = e−5¡e−5x − e5x

¢t e tente discutir-se a estabilidade da

solução de equilíbrio, a partir do campo de direcções. A solução de equilíbrio x verifica f (x) = 0.

Ora e−5¡e−5x − e5x

¢t = 0 se x = 0. As figura 5-13 e 5-14 parecem indicar que a solução de

7 Isto é, considera-se o vector 1

1 + |f (t, x)|2,

f (t, x)

1 + |f (t, x)|2

.

136

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Figura 5-10: Campo de Direcções da ED x0 = −x cos t (vectores de comprimento unitário)

-4

-2

0

2

4

x

2 4 6 8 10 12 14t

Figura 5-11: Campo de Direcções da ED x0 = −x cos t (vectores de comprimentop1 + f2 (t, x))

-4

-2

0

2

4

x

-4 -2 2 4t

137

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Figura 5-12: Campos de Direcções e Comparação com a Solução

2 4 6 8 10 12 14t

-4

-2

0

2

4

6x

equilíbrio 0 é estável: para qualquer valor numa vizinhança de x = 0, a solução diminui de valor

se x > x (pois x0 < 0 para x > x) e aumenta de valor se x < x (pois x0 > 0 se x < x) existindo,

portanto, um ”efeito de reversão” para o valor de equilíbrio. Provavelmente a figura 5-14 é

mais informativa pois mostra que o efeito de reversão é mais forte à medida que t→ +∞.

5.4.2 Sistemas de Duas ED

Retrato de Fases (n = 2)

Introdução Considere-se o sistema com duas ED x01 = f1 (x1, x2)

x02 = f2 (x1, x2) .

Toda a solução x1 (t) , x2 (t) permite definir as seguintes curvas, com t a variar em certo

intervalo:

1. uma curva em R2 gerada pelos pontos (t, x1 (t)) ;

2. uma curva em R2 gerada pelos pontos (t, x2 (t)) ;

3. uma curva em R3 gerada pelos pontos (t, x1 (t) , x2 (t)) ;

4. uma curva em R2 gerada pelos pontos (x1 (t) , x2 (t)) .

138

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Figura 5-13: Campo de Direcções da ED x0 = e−5¡e−5x − e5x

¢t (vectores de comprimento

unitário)

-1

-0.5

0

0.5

1

x

1 2 3 4 5t

Figura 5-14: Campo de Direcções da ED x0 = e−5¡e−5x − e5x

¢t (vectores de comprimentop

1 + f2 (t, x))

-1

-0.5

0

0.5

1

x

1 2 3 4 5t

139

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Figura 5-15: Trajectória x1 (t) = cos t− sin t

5 10 15 20

-1

-0.5

0.5

1

Exemplo 62 Considere-se o sistema x01 = −x2x02 = x1.

Resolvendo o sistema com as condições x1 (0) = x2 (0) = 1 obtém-se x1 (t) = cos t− sen tx2 (t) = cos t+ sen t.

As trajectórias (ou curvas) x1 (t) e x2 (t) estão representadas nas figuras 5-15 e 5-16.

Uma trajectória em R3 gerada pelos pontos (t, x1 (t) , x2 (t)) = (t, cos t− sen t, cos t+ sen t)é representada na figura 5-17 a traço grosso. Observe-se que as trajectórias representadas nas

figuras 5-15 e 5-16 estão também representadas na figura 5-17.

Como estabelecemos no ponto 4 atrás, toda a solução x1 (t) , x2 (t) permite definir uma

curva em R2 gerada pelos pontos (x1 (t) , x2 (t)) quando t varia num certo intervalo. Designamos

estas curvas por órbitas (em R2) (pode-se ter uma infinidade de órbitas quando se analisa a

solução geral ou apenas uma órbita, quando se analisa um PVI).Tratam-se, portanto, de curvas

paramétricas em R2. O plano onde as órbitas se definem designa-se por plano de fases (espaço

de fases no caso Rn, n > 2). Assim, a órbita de uma solução é a projecção do gráfico da solução

no plano de fases. Ao conjunto de todas as órbitas (de uma solução geral) designamos por

140

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Figura 5-16: Trajectória x2 (t) = cos t+ sin t

5 10 15 20

-1

-0.5

0.5

1

Figura 5-17: Curvas Associadas ao SED x01 = −x2, x02 = x1

-2 -1 01

2x2

-2-1

01 2x1

05

101520

t

-2 -1 01

2x2

-2-1

01 2x1

141

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Figura 5-18: Órbita de (x1, x1) = (cos t− sin t, cos t+ sin t)

-1 -0.5 0 0.5 1 x1-1

-0.5

0

0.5

1

x2

retrato de fases. Retome-se o exemplo 62. Vimos que a solução do PVI é x1 (t) = cos t− sen t,x2 (t) = cos t + sen t. Assim, a órbita associada é definida por todos os pontos (x1, x2) =

(cos t− sen t, cos t+ sen t) quando t varia num certo intervalo (ver figura 5-18). A solução de

equilíbrio x = 0 não é assimptoticamente estável pois (x1, x2) não se dirige para o ponto 0 ∈ R2

quando t aumenta (seta indica a direcção do movimento sobre a órbita).

Retrato de Fases do SED Linear x0 = Ax Analisa-se agora com mais profundidade os

retratos de fases do SED x0 = Ax em R2, os quais se baseiam quase inteiramente na natureza

dos valores próprios λ1 e λ2 da matriz A. Vamos distinguir os seguintes casos:

Caso 1: λ2 < λ1 < 0

A solução é dada pela equação (4.9)

x (t) = c1eλ1tv1 + c2e

λ2tv2, c1, c2 ∈ R.

142

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Figura 5-19: Representação do vector v1

1x

2x

11v

21v

1v

Suponhamos por um momento que c2 = 0 pelo que x (t) = c1eλ1tv1 i.e.,

x (t) =

x1 (t)

x2 (t)

= c1eλ1t

v11

v21

| {z }

v1

.

Com c2 = 0 a solução é proporcional ao vector v1 (a constante de proporcionalidade é c1eλ1t).

Para simplificar um pouco mais suponha-se, para um certo t, que c1eλ1t = 1. A solução para

esse valor de t viria igual ao vector v1. Nestas circunstâncias, x1 = v11 e x2 = v21 e (x1, x2) =

(v11, v21) define um ponto no plano. Permitindo agora que a constante de proporcionalidade

varie livremente, tem-se que a solução x (t) = c1eλ1tv1, no plano de fases, situa-se ao longo de

todo o segmento definido pelo vector v1 - ver a figura 5-19. Como, por hipótese, λ1 < 0, a

solução desloca-se sobre o segmento em direcção ao ponto (0, 0) , à medida que t→ +∞.

No caso em que c2 6= 0, a solução desloca-se entre os vectores v1 e v2 de acordo com a

regra do paralelogramo. Como, por hipótese, λ1 < 0 e λ2 < 0, todas as órbitas dirigem-se para

(0, 0) quando t → +∞. O ponto de equilíbrio x = (0, 0)T (que se sabe ser assimptoticamente

estável) designa-se por nó estável. Podemos ainda refinar a análise, observando que, para t

suficientemente grande, eλ2tv2 é pequeno em comparação com eλ1tv1. Em resultado, o retrato

de fases sob a hipótese λ2 < λ1 < 0 é do tipo da figura 5-20-A.

Caso 2: 0 < λ1 < λ2

143

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O retrato de fases é neste caso o da figura 5-20-A excepto que a direcção das setas é revertido.

Claro que kx (t)k→ +∞. A solução de equilíbrio designa-se por nó instável.

Caso 3: λ1 = λ2 < 0

A solução é dada pela equação (4.11)

x (t) = c1eλtv1 + c2e

λt (I + t (A− λI)) v2, c1, c2 ∈ R.

É necessário distinguir: (a) A possui dois vectores próprios independentes e (b) A possui apenas

um vector próprio independente. No caso (a) v2 é vector próprio e (A− λI) v2 = 0 pelo que a

solução se reduz a

x (t) = c1eλtv1 + c2e

λtv2 = eλt (c1v1 + c2v2) .

O vector eλt (c1v1 + c2v2) é paralelo a c1v1+ c2v2 para todo o t e dado que {v1, v2} é uma basede R2 o retrato de fases é constituído por todos os segmentos de recta que cruzam a origem (ou

seja, o conjunto de todas as órbitas cobrem todas as direcções do plano, quando c1 e c2 variam

em R) - figura 5-20-B. No caso (b) a solução é

x (t) = c1eλtv1 + c2e

λt (I + t (A− λI)) v2 = eλt (c1v1 + c2v2) + c2eλtt (A− λI) v2.

Ora v1 é proporcional a (A− λI) v2, i.e. existe um k 6= 0 tal que v1 = k (A− λI) v2 (multiplique-

se ambos os termos por (A− λI)). Assim, a solução pode ainda apresentar-se na forma

x (t) = eλt (c1v1 + c2v2) + c2kteλtv1.

Quando t é grande a quantidade eλt (c1v1 + c2v2) é pequena comparativamente a c2kteλtv1.

Assim as tangentes às órbitas de x (t) aproximam-se de ±v1 (consoante o sinal de c2). O

retrato de fases é dado pela figura 5-20-C.

Caso 4: λ1 = λ2 > 0

O retrato de fases apresenta-se nas figuras 5-20-B e 5-20-C excepto que a direcção das setas

é revertido.

Caso 5: λ1 < 0 < λ2

144

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A solução é x (t) = c1eλ1tv1 + c2e

λ2tv2. No caso c2 = 0 a solução tende para zero; i.e.,

a solução movimenta-se sobre o vector v1 em direcção a (0, 0) . Na situação c2 6= 0 a solução

é dominada pelo termo c2eλ2tv2, que tende para +∞. Com t grande, a quantidade c1eλ1tv1 é

(muito) pequena comparada com c2eλ2tv2. Assim, as órbitas movimentam-se em direcção ao

vector v2, tendendo para +∞. Consequentemente, o retrato de fases tem a forma representada

na figura 5-20-D. A solução de equilíbrio designa-se por ponto sela (o retrato de fases parece-se

com uma sela, numa vizinhança da solução de equilíbrio).

Caso 6: λ1, λ2 = α± βi

A solução é

x (t) = c1eαt (u cosβt−w senβt) + c2e

αt (u senβt+w cosβt) , c1, c2 ∈ R.

Definindo

u =

u1

u2

, w =

w1

w2

a solução pode escrever-se na forma

x1 (t)

x2 (t)

= eαt

(c1u1 + c2w1) cosβt+ (c2u1 − c1w1) senβt

(c1u2 + c2w2) cosβt+ (c2u2 − c1w2) senβt

.Para α = 0 resulta que |x1 (t)| ≤ K1 e |x2 (t)| ≤ K2 para qualquer t, pelo que a órbita,

definida parametricamente por (x1 (t) , x2 (t)) , t ≥ 0 está contida num certo rectângulo. Pode

mesmo mostrar-se que a órbita é uma elipse (ou circunferência) com centro na origem - ver

figura 5-20-E. A solução move-se ao longo da elipse ou no sentido do ponteiro do relógio ou

inversamente. Para determinarmos o sentido, verifica-se (por exemplo) o sinal de x02 quando

x2 = 0. Se x02 > 0 para x2 = 0 e x1 > 0 então as soluções movem-se no sentido contrário

aos ponteiros do relógio (sob a condição x2 = 0 e x1 > 0 a órbita encontra-se algures num

ponto da abcissa, com x1 > 0; se x02 < 0 a órbita desloca-se para ”baixo” e a órbita entra

no quadrante {(x1, x2) : x1 > 0, x2 < 0}; se x02 > 0 a órbita desloca-se para ”cima” e entra no

quadrante {(x1, x2) : x1 > 0, x2 > 0}). A solução de equilíbrio designa-se por centro. No casoα < 0 existe um efeito de ”contracção” das soluções (as coordenadas (x1, x2) tendem ambas

145

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para zero quando t→ +∞) e, desta forma, as órbitas são espirais que convergem para a origem(mais uma vez o sentido do movimento deve-se determinar). A solução de equilíbrio designa-se

por foco estável. No caso α > 0 as órbitas são também espirais, mas a solução afasta-se da

origem à medida que t aumenta. A solução de equilíbrio designa-se por foco instável.

Deixa-se como exercício a análise dos casos λ1 = 0, λ2 6= 0 e λ1 = λ2 = 0.

Para exemplificar, representa-se na figura 5-21 quatro retratos de fases associados com

seguintes cenários:

Situação Matriz A Val. Próprios Vect. Próprios

A

− 110 1

−1 − 110

λ1, λ2 = − 110 ± 1

10 i v1 =

i

1

, v2 = −i1

B

−1 1

0 −2

λ1 = −2, λ2 = −1 v1 =

−11

, v2 = 10

C

−1 0

0 −1

λ1 = −1, λ2 = −1 v1 =

01

, v2 = 10

D

−1 −30 1

λ1 = −1, λ2 = 1 v1 =

10

, v2 = −3

2

Nota sobre a figura 5-21: os pequenos círculos escuros representam valores iniciais, e as

setas o movimento das soluções ao longo das órbitas (mais adiante confere-se um significado

mais preciso às setas que não se encontram desenhadas sobre as órbitas).

Retrato de Fases do SED Não Linear x0 = f (x) Seja x uma solução de equilíbrio do SED

não linear x0 = f (x) . Pelo teorema 17, se A = f 0 (x) não possui valores próprios com parte real

nula, então a estabilidade da solução de equilíbrio x do SED não linear pode ser deduzida a

146

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Figura 5-20: Retrato de Fases do SED x0 = Ax

2x

1x

2x

1x

C D

2x

1x

2x

1x

A B

2x

1x

2x

1x

E F

1vr2v

r

2vr 1v

r

147

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Figura 5-21: Retratos de Fases do SED x0 = Ax (e Campo de Direcções - Ver ponto seguinte)

-5 0 5 10 x1

-5

0

5

10x2

-5 0 5 10 x1

-5

0

5

10x2

A B

-5 0 5 10 x1

-5

0

5

10x2

-5 0 5 10 x1

-5

0

5

10x2C D

148

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partir da estabilidade da solução nula do SED linear x0 = Ax. Nestas circunstâncias, é natural

o seguinte resultado devido a Hartman-Grobman (versão simplificada):

Teorema 19 Seja E um subconjunto de Rn contendo a solução de equilíbrio x do SED x0 =

f (x) e seja f ∈ C1 (E) . Suponha-se que A = f 0 (x) e que A não possui qualquer valor próprio

com parte real nula. Então, na vizinhança de x, o SED não linear tem a mesma estrutura

qualitativa do SED linear x0 = Ax.

Dem. Ver Perko (2001), pp. 121-124. ¥

Exemplo 63 Considere-se o SED

x01 = 2x1 − 2x21 − 5x1x2x02 = x2 − x22 − 2x1x2.

Resolvendo o sistema f (x) = 0 obtêm-se as seguintes soluções de equilíbrio:

x1 =

00

, x2 =

01

, x3 =

10

, x4 =

3/81/4

.Observe-se que

A (x1, x2) = f 0 (x1, x2) =

2− 4x1 − 5x2 −5x1−2x2 1− 2x2 − 2x1

.Resulta:

149

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x Matriz A Val. Próprios Vect. Próprios

00

2 0

0 1

λ1 = 2, λ2 = 1 v1 =

10

, v2 = 01

01

−3 0

−2 −1

λ1 = −3, λ2 = −1 v1 =

11

, v2 = 01

10

−2 −50 −1

λ1 = −2, λ2 = −1 v1 =

10

, v2 = 5

−1

3/81/4

−3/4 −15/8−1/2 −1/4

λ1 = −3/2, λ2 = 1/2 v1 =

156

, v2 = 3

−2

Na figura 5-22 apresenta-se o campo de direcções do SED (esclarece-se adiante o significado

do campo de direcções de um SED).

Em certos casos pode-se explicitar a órbita através de uma função x2 = g (x1) (geralmente é

necessário mais do que uma função para definir a órbita; por exemplo, a órbita (x1, x2) tal que

x21+x22 = 1 pode ser representada pelas curvas x2 = ±p1− x21). Suponha-se, para concretizar,

que um certo SED tem por solução x1 (t) = 3t + 2 e x2 (t) = 5t2 + 7. A órbita é definida por

todos os pontos (x1, x2) =¡3t+ 2, 5t2 + 7

¢quando t varia num certo intervalo. Resolvendo

x1 = 3t+2 em ordem a t obtém-se t = t (x1) = (x1 − 2) /3. Substituindo esta última expressãona solução x2 obtém-se x2 (t (x1)) = 5 ((x1 − 2) /3)2 + 7 = 5

9x21 − 20

9 x1 +839 . Temos, portanto,

x2 como função de x1. Neste caso a órbita é representada pela equação x2 = 59x21 − 20

9 x1 +839

(com x1 a variar num certo intervalo). Aparentemente é necessário conhecer-se a solução do

SED para se construir uma órbita. Mostra-se agora que de facto não é necessário. Supondo

f1 (x1, x2) 6= 0 vem

x02x01=

f2 (x1, x2)

f1 (x1, x2)⇔

dx2dtdx1dt

=f2 (x1, x2)

f1 (x1, x2)⇔ dx2

dx1=

f2 (x1, x2)

f1 (x1, x2). (5.9)

150

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Figura 5-22: Campo de Direcções do SED x01 = 2x1 − 2x21 − 5x1x2, x02 = x2 − x22 − 2x1x2.

-1 0 1 2x1

-1

0

1

2x2

-1 0 1 2x1

-1

0

1

2x2

-1 0 1 2x1

-1

0

1

2x2

-1 0 1 2x1

-1

0

1

2x2(0,0) (0,1)

(1,0) (3/8,14)

151

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Figura 5-23: Órbitas do SED x01 =x2

(1+x1)2 , x

02 = −x22

-4 -2 2 4

-15

-10

-5

5

10

15

A resolução da ED (5.9) com a condição x1 = a, x2 = b permite obter a órbita que passa no

ponto (a, b) (com (a, b) tal que f1 (a, b) 6= 0). De uma forma geral, a resolução da ED envolveuma constante arbitrária. Fazendo variar esta constante (com a restrição de que (x2, x1) não seja

uma solução de equilíbrio) obtém-se o retrato de fases do SED x01 = f1 (x1, x2) , x02 = f2 (x1, x2) .

Exemplo 64 Considere-se

x01 =x2

(1 + x1)2 , x02 = −x22

Pela fórmula 5.9 vemdx2dx1

= −x2 (1 + x1)2 .

A ED anterior é de variáveis separáveis. A sua solução, e portanto, a expressão das órbitas é

x2 = e−(1+x1)3/3c.

Graficamente obtém-se a figura 5-23.

Campo de Direcções

No caso em que não é possível obter as órbitas (não se conhecem as soluções x1 (t) e x2 (t) ou

não se consegue obter x2 (x) como solução de x02 = f2 (x2, x1) /f1 (x2, x1)) consegue-se ainda

assim visualizar o campo de direcções do SED com um significado que se apresenta a seguir.

152

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Quando t aumenta o par ordenado (x1 (t) , x2 (t)) movimenta-se no plano ao longo da órbita.

A velocidade na direcção do eixo x1 é f1 (x) ; a velocidade na direcção do eixo x2 é f2 (x) .

Assim, este movimento, num dado ponto x1 ∈ R2, tem a direcção do vector¡f1¡x1¢, f2

¡x1¢¢.

Podemos visualizar graficamente a forma como a órbita se movimenta no ponto x1 inserindo

junto a x1 um vector (graficamente um segmento de recta ou uma seta) com a direcção do vector¡f1¡x1¢, f2

¡x1¢¢. Resulta assim que o campo de direcções do sistema de ED obtém-se asso-

ciando a cada ponto x1 = (x1, x2) do plano um vector com a direcção¡f1¡x1¢, f2

¡x1¢¢e com

um comprimento

r³|f1 (x)|2 + |f2 (x)|2

´(fornece uma medida da velocidade do movimento da

solução sobre a órbita). Graficamente, este comprimento pode ser relacionado com o tamanho

ou espessura das setas. Em certos casos, para se obter melhor informação gráfica, pode impor-se

que os vectores tenham comprimento unitário e, para o efeito, divide-se¡f1¡x1¢, f2

¡x1¢¢pela

norma Euclidiana do vector8. Para não se perder a informação

r³|f1 (x)|2 + |f2 (x)|2

´pode-se

fazer variar a espessura da seta de acordo com o valor

r³|f1 (x)|2 + |f2 (x)|2

´. Na figura 5-24

representa o campo de direcções do SED apresentado no exemplo 62. São apresentadas também

duas órbitas definidas a partir de duas condições iniciais diferentes. Comparar com a figura

5-18. Na figura5-25 representa o campo de direcções do SED x01 = x2, x02 = −x1 − x2/10 e

uma órbita com dada a condição x1 (0) = 0, x2 (0) = 1.

Ver ainda a figura 5-21.

8 Isto é, considera-se o vector f1 (x)

|f1 (x)|2 + |f2 (x)|2,

f2 (x)

|f1 (x)|2 + |f2 (x)|2

.

153

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Figura 5-24: Campo de Direcções e Órbitas do SED x01 = −x2, x02 = x1.

-4 -2 0 2 4x1

-4

-2

0

2

4

x2

Figura 5-25: Campo de Direcções e Uma Órbita do SED x01 = x2, x02 = −x1 − x2/10

-4 -2 0 2 4x1

-4

-2

0

2

4

x2

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Exercícios

1. Estude a estabilidade das soluções das equações diferenciais seguintes, a partir directa-

mente da definição:

(a) x0 = 1, x (0) = 1;

(b) x0 = tx, x (0) = 5;

(c) x0 = −x+ t, x (0) = 1;

(d) x0 = − sen t, x (π/2) = 1;

2. Estude a estabilidade das solução de equilíbrio das equações diferenciais seguintes, a partir

directamente da definição:

(a) x0 = x/ (t+ 1)

(b) x0 = −x sen t

(c) x0 = − (x− 1) log (t+ 1)

3. Considere a ED x0 = x (1− x)

(a) Estude a estabilidade das soluções de equilíbrio, a partir directamente da definição.

(b) Estude a estabilidade das soluções de equilíbrio efectuando uma linearização.

(c) Utilize um procedimento gráfico para confirmar os resultados.

4. (Exame) Seja

x (t, 0, x0) =x0q

e2t¡1− x20

¢+ x20

a solução de um certo PVI (x0 = f (t, x), x (0) = x0).

(a) Mostre que x = 0 e x = 1 são soluções de equilíbrio. Obtenha uma terceira solução

de equilíbrio.

(b) Estude a estabilidade da solução x = 0 considerando x0 ∈ ]−1, 1[ . Verifique se asconclusões se mantêm no caso x0 ∈ [−1− θ, 1 + θ], θ > 0. Comente o resultado.

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5. Estude a estabilidade das soluções de equilíbrio da ED x0 = x3 − x e represente o retrato

de fases.

6. Estude a estabilidade da solução de equilibrio x = 0 dos sistemas apresentados nos exer-

cícios 12 e 13 do Cap. 4.

7. Considere o SED x0 = Ax+ b onde b é um vector de constantes e A tem inversa.

(a) Determine a solução de equilíbrio.

(b) Mostre que a estabilidade das soluções do SED dado é equivalente à estabilidade

das soluções do SED x0 = Ax (sugestão: considere a mudança de variável z (t) =

x (t)− x).

8. Considere o SED de segunda ordem

u00 + w0 + u− w = 0

u0 + w0 + u− w = 0.

(a) Efectuando uma mudança de variáveis escreva o sistema na forma x0 = Ax

(b) Estude a estabilidade da solução de equilíbrio x = 0 do SED inicial.

9. (Exame) Considere o SED

x01x02

= −2 0

1 −3

| {z }

A

x1

x2

com as condições x1 (0) = 1 e x2 (0) = 2. Sabe-se que

v1 =

11

é um vector próprio da matriz A associado ao valor próprio λ1 = −2.

(a) Determine a solução do PVI e estude a estabilidade da solução nula.

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(b) Represente graficamente no plano (de forma aproximada) as órbitas que no instante

t = 0 se encontram nos pontos (1, 1) , (0, 1) e (1, 2) e insira setas sobre as três órbitas

para indicar como é que as soluções evoluem à medida que t aumenta a partir de

zero.

10. Considere o SED

x01 = sen (x1 + x2)

x02 = ex1 − 1

(a) Determine as soluções de equilíbrio.

(b) Estude a estabilidade das soluções de equilíbrio.

(c) Esboce um retrato de fases do sistema.

11. Considere o SED

x01 = −x2 − x31 − x1x22

x02 = x1 − x32 − x2x21

(a) Determine a solução de equilíbrio.

(b) Efectuando uma linearização estude a estabilidade da solução de equilíbrio.

(c) Discuta a estabilidade utilizando a função de Liapunov V (x1, x2) = x21 + x22.

12. (Exame) Considere o sistema de equações diferenciais

x01 = x2

x02 = −x1 − ex1x2

(a) Mostre que a solução nula³0 0

´T, é uma solução de equilíbrio.

(b) Estude a estabilidade da solução nula efectuando uma linearização.

(c) Estude a estabilidade da solução nula a partir da função de Liapunov V (x1, x2) =

12x21 +

12x22.

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(d) Faça um retrato de fases numa vizinhança da solução nula (insira setas sobre as

órbitas para indicar como é que o sistema evolui ao longo do tempo).

13. (Exame) Considere o modelo

x01 = −x1x02 = ax2 + x1x2.

(a) Mostre que a solução nula é uma solução de equilíbrio e estude a estabilidade dessa

solução nos casos a > 0 e a < 0.

(b) Determine a solução geral do sistema e confirme que no caso a < 0 se tem limt→+∞ x1 (t) =

limt→+∞ x2 (t) = 0.

(c) Determine a expressão analítica das órbitas no caso a = 0.

(d) Mostre que no caso a = 0 a solução nula não é assimptoticamente estável (aproveite

resultados já obtidos).

14. Considere a ED de segunda ordem não linear x00 = −f (x)x0 − g (x) onde f (x) e g (x)

são funções reais de variável real de classe C1 em R que verificam as seguintes condições:

f (x) > 0, ∀x ∈ R, xg (x) > 0 e g (0) = 0.

(a) Apresente o SED de primeira ordem equivalente à equação dada.

(b) Determine as soluções de equilíbrio.

(c) Analise a estabilidade das soluções de equilíbrio utilizando a função de Liapunov

V (x1, x2) =x222 +

R x10 g (u) du.

15. Faça um esboço do retrato de fases dos SED definidos no exercício 12 do Cap. 4.

16. Obtenha a expressão analítica das órbitas para o SED x0 = Ax onde A é uma matriz

quadrada de ordem 2 e λ é valor próprio de A com multiplicidade algébrica e geométrica

igual a dois.

17. Esboce o retrato de fases do SED x0 = Ax no caso em que os valores próprios de A são

158

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(a) λ1 = 0, λ2 6= 0.

(b) λ1 = λ2 = 0.

18. Mostre que as órbitas do SED

x0 =

0 4

−9 0

xsão elipses.

19. Considere o SED

x01 = x2

x02 = x1 + 2x21.

(a) Obtenha as soluções de equilíbrio.

(b) Determine a expressão analítica das órbitas e represente o retrato de fases (recorra

ao computador para traçar o retrato de fases).

(c) Represente o retrato de fases numa vizinhança da solução de equilíbrio (0, 0) a partir

do SED linearizado. Compare este retrato de fases com o definido na alínea anterior.

20. Discuta o campo de direcções das quatro figuras quanto à estabilidade das soluções de

equilíbrio e identifique caso existam, nós, focos e pontos de sela.

-1 0 1 2 x1

-1

0

1

2x2

-1 0 1 2 x1

-1

0

1

2x2

159

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-1 0 1 2 x1

-1

0

1

2x2

-1 0 1 2 x1

-1

0

1

2x2

160

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Parte II

Equações às Diferenças

161

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Com as ED admite-se que o fenómeno x (t) é caracterizável em termos infinitesimais, i.e., é

possível atribuir um significado à equação x0 = f (t, x) . Está implícito que x (t) é uma variável

contínua e que t varia de forma contínua num certo conjunto. No entanto, em certos casos, o

fenómeno apenas se altera em momentos precisos do tempo. Por exemplo, se x (t) representa

um certo depósito e se a sua capitalização for anual, x (t) , com t mensurável na unidade ano,

apenas varia nos momentos t = 1, t = 2, etc. Neste caso não pode ser conferido um significado a

x0 (t) dado que t varia de forma discreta. Sucede, em muitos outros casos, x (t) ser uma função

contínua, mas não se sabe, ou é difícil, estabelecer a respectiva ED. Nestes casos prefere-se uma

abordagem em tempo discreto. Em econometria é frequente estabelecer-se uma especificação

discreta na modelação dos fenómenos (i.e., com t a variar discretamente) embora, em muitos

casos, os fenómenos em estudo variem continuamente ao longo do tempo9.

Para distinguirmos a ED da equação às diferenças finitas (doravante EDF) identifica-se o

fenómeno em tempo discreto pela letra y. Como se estuda geralmente y como uma função do

tempo, escreve-se yt (notação usada em econometria e em sucessões cronológicas), com t ∈ Z(considera-se, habitualmente, sem perda de generalidade, t = 0, 1, 2, ...).

Exemplo 65 (a) Na data t = 0 faz-se um depósito de C= 12000 à taxa anual de 5%. Qual o

valor do capital na data t = 3? Seja yt o valor do capital na data t. Tem-se

y0 = 12000

y1 = y0 + y0 × 0.05 = 12000 + 12000× 0.05 = 12600y2 = y1 + y1 × 0.05 = 12600 + 12600× 0.05 = 13230y3 = y2 + y2 × 0.05 = 13230 + 13230× 0.05 = 13892.

Deduz-se facilmente que o modelo é yt = yt−1 + yt−1 × 0.05 ou yt = (1.05) yt−1 com a condição

inicial y0 = 12000. Questão: existe alguma fórmula que forneça o valor do capital para qualquer

valor de t e que dispense, consequentemente, a substituição recursiva dos valores? Observa-se

9Não cabe aqui explicar as razões pelas quais os econometristas preferem a especificação discreta na modelaçãodos fenómenos económicos. De qualquer forma, é um facto que os modelos em tempo discreto oferecem suficienteflexibilidade para modelarem a generalidade dos fenómenos económicos. Além disso, é mais fácil a inferênciaestatística em modelos em tempo discreto do que em modelos em tempo contínuo.

162

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que

y1 = 1.05y0

y2 = 1.05y1 = 1.052y0

y3 = 1.05y2 = 1.053y0

...

sendo possível inferir que yt = (1.05)t y0. Logo y3 = 1.05

312000 = 13892.

(b) Igual à alínea anterior com diferença de que se deposita todos os anos, depois do mo-

mento inical, C= 5000. O modelo é agora yt = (1.05) yt−1 + 5000, y0 = 12000.

(c) É interessante observar que yt =Pt

i=0 ai pode-se escrever na forma

yt =t−1Xi=0

ai + at ⇔ yt = yt−1 + at, y0 = a0.

(d) Seja yt o número de elementos que existem abaixo da diagonal de uma matriz quadrada

de ordem t. Defina-se o modelo para yt (na forma yt = f (yt−1) . É fácil constatar que

y1 = 0

y2 = 1

y3 = y2 + 2 = 3

y4 = y3 + 3 = 6

...

pelo que yt = yt−1 + t− 1, y1 = 0. A "fórmula"é agora yt = t (t− 1) /2. Veremos adiante comodeterminar esta expressão no contexto dos modelos de EDF lineares (naturalmente a expressão

t (t− 1) /2 pode ser vista como a soma dos termos de uma progressão aritmética).(e) Considere-se o PVI x0 = f (t, x) , x (0) = x0. O esquema de Euler

y0 = x0

yi = yi−1 + f (ti−1, yi−1)∆, i = 1, 2, ..., n

163

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é uma EDF.

(f) Considere-se o seguinte modelo económico multiplicador-acelerador simplificado

Ct = byt−1

It = Iit +G

Iit = k (Ct −Ct−1)

yt = Ct + It

onde, C é o consumo que depende do rendimento nacional, y do período anterior, I é o inves-

timento que é igual ao investimento induzido, Ii, mais gastos do estado, G, e k é o coeficiente

de aceleração A última equação representa a condição de equilíbrio do modelo económico. Uma

simples substituição produz

yt = b (1 + k) yt−1 − bkyt−2 +G.

A equação deduzida expressa yt como função de yt−1 e yt−2.

Vejam-se agora algumas definições.

Seja t ∈ Z (ou t ∈ N). Uma equação da forma

F (t, yt, yt−1, ..., yt−n) = 0

é designada por equação às diferenças finitas (EDF) de ordem n. A equação estabelece uma

relação entre yt e t, yt−1, ..., yt−n. Para simplificar admite-se que a equação anterior se pode

escrever na forma

yt = f (t, yt−1, ..., yt−n) .

A distinção entre EDF lineares e não lineares e, entre EDF autónoma e não autónoma é idêntica

à que foi apresentada para ED (ver ponto 1.1). Por exemplo, yt = y2t−1+3 é uma EDF não linear

autónoma de primeira ordem; yt = e−tyt−1 + yt−4 + sen (2t) é uma EDF linear não autónoma

da quarta ordem.

Definição 15 Uma função φt é designada uma solução da EDF yt = f (t, yt−1, ..., yt−n) se φt

164

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satisfaz φt = f¡t, φt−1, ..., φt−n

¢.

Todas as definições apresentadas no ponto 1.1 para ED, tais como, solução geral e particular,

PVI e solução do PVI servem, com as necessárias adaptações, para EDF. Por exemplo, a

expressão yt = t (t− 1) /2 é solução do PVI yt = yt−1 + t − 1, y1 = 0 [ver exemplo 65, alínead)]. Com efeito,

t (t− 1)2| {z }yt

=(t− 1) (t− 2)

2| {z }yt−1

+ t− 1

Por outro lado, y1 = (1× 0) /2 = 0.

165

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Capítulo 6

Equações Lineares

A EDF linear de ordem n é

yt + a1tyt−1 + ...+ antyt−n = et

onde ait (i = 1, ..., n) e et são funções em t. Note-se a convenção: et é uma expressão em t onde

t varia discretamente; e (t) é uma expressão em t onde t varia continuamente. Assim, se et = t2,

para t ≥ 0, então et assume os valores {0, 1, 4, 9, ...} .Neste capítulo estudam-se as EDF de primeira ordem com coeficientes variáveis e a EDF

de ordem n de coeficientes constantes.

6.1 Equação Linear Primeira Ordem Não homogénea com Co-

eficientes Variáveis

A EDF de primeira ordem não homogénea com coeficientes variáveis é da forma

yt = φtyt−1 + et. (6.1)

166

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Esta EDF é resolúvel pelo método iterativo. Dada a condição inicial yt0 , vem

yt0+1 = φt0+1yt0 + et0+1

yt0+2 = φt0+2yt0+1 + et0+2 = φt0+2(φt0+1yt0 + et0+1) + et0+2

= φt0+2φt0+1yt0 + φt0+2et0+1 + et0+2

yt0+3 = φt0+3yt0+2 + et0+3

= φt0+3¡φt0+2φt0+1yt0 + φt0+2et0+1 + et0+2

¢+ et0+3

= φt0+3φt0+2φt0+1yt0 + φt0+3φt0+2et0+1 + φt0+3et0+2 + et0+3

...

yt = yt0

tYj=t0+1

φj +tX

k=t0+1

ek

tYj=k+1

φj . (6.2)

Os seguintes casos particulares são importantes:

• φj ≡ φ. Tem-se

yt = yt0φt−t0 +

tXk=t0+1

ekφt−k

= yt0φt−t0 + φt

tXk=t0+1

ek

φk. (6.3)

Na tabela seguinte calcula-se φtPt

k=1 ek/φk (t0 = 0) para certas funções e :

et φtPt

k=1ekφk

a+ bt(aφ−bt−a+bφ+btφ+aφt−aφφt−bφφt)

−(φ−1)2

abt φt

b−φ

µab³bφ

´t − ab

bt2(φ−2tφ−φφt+t2+φ2+2tφ2−2t2φ−φ2φt+t2φ2)b

(1−φ)3

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• ej ≡ e. Tem-se

yt = yt0

tYj=t0+1

φj + etX

k=t0+1

tYj=k+1

φj . (6.4)

• e = 0 . Tem-se

yt = yt0

tYj=t0+1

φj . (6.5)

• Se φj ≡ φ 6= 1 e ej ≡ e vem

yt = yt0φt−t0 + e

tXk=t0+1

φt−k

= yt0φt−t0 + e

¡φt−t0−1 + φt−t0 + φt−t0+1 + ...+ φ0

¢= yt0φ

t−t0 + eφ01− φ(t−(t0+1)+1)

1− φ

= yt0φt−t0 + e

1− φt−t0

1− φ(6.6)

• Se φj ≡ 1 e ej ≡ e vem

yt = yt0 + etX

k=t0+1

1 = yt0 + e (t− t0) . (6.7)

Exemplo 66 Retome-se o exemplo 65 alínea d): yt = yt−1+ t− 1, y1 = 0. Pela fórmula (6.3),yt = yt0φ

t−t0 + φtPt

k=t0+1ekφk, com t0 = 1, yt0 = 0, φ = 1 e et = t− 1 vem

yt =tX

k=2

ek =tX

k=2

(k − 1) = 1 + 2 + ...+ (t− 1) = t (t− 1) /2.

6.2 Equação Linear de ordem n Não homogénea Com Coefi-

cientes Constantes

Considere-se a EDF linear não homogénea de ordem n de coeficientes constantes,

anyt+n + an−1yt+n−1 + ...+ a0yt = et. (6.8)

168

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O método iterativo, utilizado no ponto precedente, não funciona eficientemente para estas

equações. Exige-se assim ummétodo alternativo de resolução. Começa-se por resolver a equação

(6.8) assumindo et ≡ 0.

6.2.1 Equação Homogénea

Teorema 20 A solução geral da equação homogénea anyt+n+an−1yt+n−1+ ...+ a0yt = 0 é da

forma

yt = c1u1 + ...+ cnun (6.9)

onde ci (i = 1, ..., n) são constantes arbitrárias, ui = ui,t são funções em t e {u1, ..., un} é umabase de dimensão n do espaço das soluções.

Exemplo 67 Considere-se a EDF de ordem 2, yt+1−5yt+6yt−1 = 0. Mostre-se que©2t, 3t

ªé

uma base do espaço de soluções. Qualquer base do espaço das soluções de uma EDF de ordem 2

deve ser formada por duas soluções linearmente independentes (note-se que a EDF é de ordem

dois). Ora como

2t+1 − 5.2t + 6.2t−1 = 0,

3t+1 − 5.3t + 6.3t−1 = 0.

conclui-se que 2t e 3t são soluções. Estas soluções são linearmente independentes sse

α12t + α23

t = 0, ∀t⇒ α1 = α2 = 0.

Ora(t = 0)

(t = 1)

α1 + α2 = 0

2α1 + 3α2 = 0⇔ α1 = 0

α2 = 0

e as soluções são lineramente independentes. A solução geral é

yt = c12t + c23

t, c1, c2 ∈ R

(qualquer solução particular pode.ser obtida a partir da equação precedente mediante uma es-

169

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colha apropriada de c1 e c2).

O exemplo anterior mostrou como se pode verificar se um conjunto de soluções são linear-

mente independentes. O teorema seguinte estabelece uma forma alternativa mais eficiente de

verificar a independência linear.

Teorema 21 Sejam u1,t, ..., un,t n soluções da EDF homogénea anyt+n + an−1yt+n−1 + ... +

a0yt = 0. Estas soluções são linearmente independentes sse o determinante (designado deter-

minante de Casorati) ¯¯¯

u1,t u2,t · · · un,t

u1,t+1 u2,t+1 · · · un,t+1...

.... . .

...

u1,t+n−1 u2,t+n−1 · · · un,t+n−1

¯¯¯ (6.10)

for diferente de zero para algum valor de t.

Dem. Designe-se o Casorati por Ca (t) . Forme-se o sistema linear homogéneo

S (t) =

α1u1,t + ...+ αnun,t = 0

α1u1,t+1 + ...+ αnun,t+1 = 0

· · ·α1u1,t+n−1 + ...+ αnun,t+n−1 = 0.

Como se sabe, obtém-se uma solução única nula do sistema S (t0) , i.e., α1 = ... = αn = 0

sse Ca (t0) 6= 0. Naturalmente α1 = ... = αn = 0 implica que as soluções {u1,t0 , ..., un,t0} sãolinearmente independentes. Mostra-se agora que Ca (t0) 6= 0 implica Ca (t) 6= 0 para todo o te, portanto, Ca (t0) 6= 0 implica que as soluções são linearmente independente não só para t0

como também para qualquer t.

Suponha-se que Ca (t0) 6= 0 e existe um t1 tal que Ca (t1) = 0. Então o sistema S (t1) admite

uma solução não nula, i.e., existe pelo menos um αi não nulo que satisfaz o sistema. Como

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uj,t1 = F kuj,t0 , k = t1 − t0, j = 1, ..., n (F é o operador de avanço - ver a definição 16) vem

α1u1,t1 + ...+ αnun,t1 = 0

⇔ F k¡α1u1,t1 + ...+ αnun,t1

¢= 0

⇔ α1u1,t1 + ...+ αnun,t1 = 0

⇒ α1 = ... = αn = 0

mas isto é uma contradição com o facto de α1u1,t1 + ...+ αnun,t1 = 0 implicar pelo menos um

αi 6= 0. Logo Ca (t0) 6= 0 implica Ca (t) 6= 0 para todo o t.¥

Exemplo 68 (cont.) Verifique-se pelo teorema anterior que©2t, 3t

ªsão soluções linearmente

independentes. ¯¯ 2t 3t

2t+1 3t+1

¯¯ = 2t3t+1 − 2t+13t = 2t3t.

Por exemplo, para t = 0, o determinante vem igual a 1 e, assim, pelo teorema anterior as

soluções são linearmente independentes.

Sabe-se já verificar se determinada conjunto de soluções forma uma base do espaço das

soluções de uma EDF linear homogénea (sublinhe-se, de coeficiente constantes). Importa agora

estudar um método que permita obter a solução geral da EDF. Para o efeito, comece-se por

introduzir o operador de avanço (forward) F .

Definição 16 O operador de avanço F sobre a variável yt define-se como Fyt = yt+1.

Claro que F 2yt = F (Fyt) = Fyt+1 = yt+2. Em geral, com k, n ∈ N

Fnyt+k = yt+k+n.

Resulta óbvia a convenção F 0yt = yt. O operador F aplicado a uma constante resulta na própria

constante, Fc = c. Com o operador de avanço podemos escrever anyt+n+an−1yt+n−1+...+a0yt =

171

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0 na forma

anFnyt + an−1Fn−1yt + ...+ a0F

0yt = 0, ou¡anF

n + an−1Fn−1 + ...+ a0F0¢| {z }

P (F )

yt = 0, ou ainda

P (F ) yt = 0.

A expressão P (F ) designa-se por polinómio característico. Assim, a EDF de segunda ordem

5yt+2 + 3yt+1 − 2yt = 0 pode-se escrever na forma¡5F 2 + 3F − 2¢ yt = 0. Existem vários

outros operadores. Talvez o mais conhecido seja o operador de diferença ∆, cuja operação é

∆yt = yt−yt−1. Bastante utilizado em Econometria é o operador de atraso L (lag), Lyt = yt−1

(na área das sucessões cronológicas prefere-se a letra B (backshift) para designar o mesmo

operador de atraso). Naturalmente estes operadores podem utilizar-se conjuntamente, por

exemplo, L∆yt = L (yt − yt−1) = yt−1 − yt−2.

Teorema 22 (EDF linear de ordem n = 1) Considere-se a EDF a1yt+1 + a0yt = 0, i.e.,

(a1F + a0) yt = 0 ou ainda P (F ) yt = 0. Seja r a raíz do polinómio P (F ) = 0, i.e., r = −a0/a1.Então

yt = c1rt, c1 ∈ R

é a solução geral da EDF.

Dem. Atendendo ao teorema 20 a demonstração é simples e deixa-se como exercício.¥

Observe-se que a EDF a1yt+1 + a0yt = 0 é equivalente a yt+1 = (−a0/a1) yt ou ainda ayt = φyt−1, onde φ = (−a0/a1) . É assim também aplicável a fórmula (6.3) com et ≡ 0, obtidano ponto anterior, yt = yt0φ

t−t0 . A diferença entre yt = c1rt, c1 ∈ R e yt = yt0φ

t−t0 está em que

nesta segunda expressão já se encontra definida a condição inicial yt0 .

Teorema 23 (EDF linear de ordem n = 2) Considere-se a EDF a2yt+2+a1yt+1+a0yt = 0,

i.e.¡a2F

2 + a1F + a0¢yt = 0 ou ainda P (F ) yt = 0. Sejam r1 e r2 as raízes de P (F ) . Tem-se:

1. se r1 e r2 são reais de distintas a solução geral é

yt = c1rt1 + c2r

t2, c1, c2 ∈ R;

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2. se r1 = r2 = r a solução geral é

yt = c1rt + c2tr

t, c1, c2 ∈ R;

3. se r1, r2 = a+ bi a solução geral é

yt = ρt (c1 cos (wt) + c2 sen (wt))

onde ρ =√a2 + b2 e w = arccos (a/ρ) = arcsen (b/ρ) = arctg (b/a) .

Dem. Deixa-se como exercício mostrar que as soluções, em cada caso, satisfazem o teorema

20.¥

Teorema 24 (EDF linear de ordem n) Considere-se a EDF

anyt+n + an−1yt+n−1 + ...+ a1yt+1 + a0yt = 0⇔ P (F ) yt = 0. (6.11)

Suponha que as n raízes de P (F ) = anFn + an−1Fn−1 + ...+ a1F + a0 são constituídas por k

raízes reais distintas, r1, r2, ..., rk, s raízes reais iguais a r (r tem multiplicidade s) e 2z raízes

complexas distintas do tipo a1 ± b1i, ..., az ± bzi. Então, a solução geral da EDF é

yt = yt1 + yt2 + yt3

onde

yt1 = A1rt1 + ...+Akr

tk

é a parte da solução associada às raízes r1, r2, ..., rk raízes,

yt2 = B1rt +B2tr

t + ...+Bsts−1rt

é a parte da solução associada às s raízes reais iguais a r (r tem multiplicidade s) e

yt3 = ρt1 (C1 cosw1t+ C2 senw1t) + ...

+ρtz¡C2(z−1) coswzt+ C2z senwzt

¢;

173

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onde ρi =qa2i + b2i e wi = arccos (ai/ρi) é a parte da solução associada às 2z raízes complexas

distintas do tipo a1 ± b1i, ..., az ± bzi.

Exemplo 69 Considere-se a EDF de ordem 5, P (F ) yt = 0 onde

P (F ) = (F − 4)2 (F − 2)µ³

F −√3´2+ 12

¶.

É fácil ver que as raízes do polinómio P (F ) são

n2, 4, 4,

√3± i

o.

Pelo teorema anterior a solução geral é

yt = c12t + c24

t + c3t4t + ρt (c4 cos (wt) + c5 sen (wt))

onde ρ =q¡√

3¢2+ 12 = 2 e w = arcsen (b/ρ) = arcsen (1/2) = π/6.

6.2.2 Equação Não Homogénea

Estuda-se a seguir a equação a EDF P (F ) yt = et.

Definição 17 O polinómio em F , Q (F ) , designa-se polinómio aniquilador (PA) da função

et se Q (F ) et = 0.

Exemplo 70 É fácil ver que Q (F ) = F − 1 é o PA de et ≡ c (constante). Com efeito,

Q (F ) et = (F − 1) c = Fc− c = c− c = 0.

Por seu turno, o PA da função et = 3 + 4t é Q (F ) = (F − 1)2 . Com efeito,

Q (F ) et = (F − 1)2 (3 + 4t) = ¡F 2 − 2F + 1¢ (3 + 4t)= F 23 + F 24t− 2F3− 2F4t+ 3 + 4t= 3 + 4 (t− 2)− 6− 8 (t− 1) + 3 + 4t= 0.

174

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A tabela seguinte auxilia na procura do PA para certas funções de et.

Polinómios Aniquiladores

et Q (F )

c (constante) F − 1cjt

j + cj−1tj−1 + ...+ c1t+ c0 (F − 1)j+1

cmkt¡F −mk

¢¡cjt

j + cj−1tj−1 + ...+ c1t+ c0¢mkt

¡F −mk

¢j+1ρt (c1 coswt+ c2 senwt) , c1, c2 ∈ R (F − a)2 + b2

c, cj 6= 0, cj−1 ∈ R, cj−2 ∈ R, ..., c0 ∈ R

Teorema 25 Se Q1 (F ) é PA de et e Q2 (F ) é PA de ht então Q (F ) = Q1 (F )Q2 (F ) é PA

de et + ht.

Dem. Vem

Q (F ) (et + ht) = Q1 (F )Q2 (F ) (et + ht) = Q1 (F )Q2 (F ) et +Q1 (F )Q2 (F )ht

= Q2 (F )Q1 (F ) et| {z }0

+Q1 (F )Q2 (F )ht| {z }0

= 0.¥

Expõe-se a seguir o método do polinómio aniquilador para a resolução de EDF lineares não

homogéneas de coeficientes constantes, P (F ) yt = et. Suponha-se então:

• P (F ) um polinómio de ordem n;

• Q (F ) um polinómio de ordem m e tal que Q (F ) et = 0 e,

• yht a solução da EDF homogénea P (F ) yht = 0.

Multiplique-se ambos os termos da EDF P (F ) yt = et pelo PA de et, Q (F ) . Vem

Q (F )P (F ) yt = Q (F ) et = 0.

175

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A expressão Q (F )P (F ) yt = 0 representa uma EDF linear de ordem n+m (soma das ordem dos

polinómios P e Q). Esta EDF resolve-se facilmente considerando o teorema 24 (naturalmente

as raízes do polinómio Q (F )P (F ) correspondem às raízes de P (F ) mais as de Q (F )). A

solução geral da EDF Q (F )P (F ) yt = 0 deve possuir n+m soluções linearmente independentes

(teorema 20). Vem assim,

yt = c1u1 + ...+ cnun| {z }sol. assoc. a P (F )

+ b1v1 + ...+ bmvm| {z }sol. assoc. a Q(F )

(6.12)

= yht + ypt .

onde ci e bj são constantes e ui e vj são funções em t. A solução yht deve obrigatoriamente estar

presente em yt, pois yht também satisfaz Q (F )P (F ) yt = 0 (basta verificar que P (F ) yht = 0⇒

Q (F )P (F ) yht = 0). Resta analisar a natureza de ypt = b1v1 + ...+ bmvm. Ora

P (F ) yt = et ⇔ P (F )³yht + ypt

´= et ⇔ P (F ) yht| {z }

0

+ P (F ) ypt = et ⇔ P (F ) ypt = et.

Donde, ypt é solução da EDF não homogénea pois P (F ) ypt = et; mas, como ypt não pode ser

solução geral, pois esta é da forma da equação (6.12), conclui-se que ypt é solução particular

da EDF não homogénea. Como consequência, a relação P (F ) ypt = et permite determinar os

coeficientes bi definidos na solução ypt = b1v1 + ...+ bmvm; de facto, existe apenas um conjunto

de valores bi tais que a relação P (F ) ypt = et é válida. Estes valores determinam-se através do

método dos coeficientes indeterminados, como se apresenta no próximo exemplo.

Em suma, para resolver a EDF P (F ) yt = et pode-se proceder da seguinte forma:

1. Determinar as raízes de P (F ) e, a partir de delas, determinar yht .

2. Determinar o polinómio aniquilador Q (F ) (ver tabela) e as suas raízes.

3. A partir das raízes de P (F ) e de Q (F ) determinar a solução de Q (F )P (F ) yt = 0,

identificando a parte da solução que diz respeito a yht e a parte que diz respeito a y0t (ter

em atenção as raízes comuns a P (F ) e a Q (F )).

4. Determinar as constantes associadas à solução y0t pelo método dos coeficientes indetermi-

176

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nados a partir da relação P (F ) y0t = et

5. Estabelecer a solução geral, y = yht +y0t , onde yht é a solução geral da equação homogénea

P (F ) yht = 0 e y0t é a solução particular da EDF, i.e., verifica P (F ) y

0t = et.

Exemplo 71 Considere-se a EDF yt+2−5yt+1+6yt = 5+2t. Para resolver esta EDF procede-seda seguinte forma:

1. Determinar as raízes de P (F ) e, a partir de delas, determinar yht . As raízes de P (F ) =

F 2−5F+6 são {2, 3} pelo que a solução da EDF homogénea P (F ) yht = 0 é, pelo teorema23,

yht = c12t + c23

t.

2. Determinar o polinómio aniquilador Q (F ) (ver tabela) e as suas raízes. Pela tabela

conclui-se que Q (F ) = (F − 1)2 é um PA de et = 5 + 2t. As raízes de Q (F ) são {1, 1} .

3. A partir das raízes de P (F ) e de Q (F ) determinar a solução de Q (F )P (F ) yt = 0, iden-

tificando a parte da solução que diz respeito a yht e a parte que diz respeito a y0t . Atendendo

a que as raízes de Q (F )P (F ) são {2, 3}∪ {1, 1} a solução da EDF Q (F )P (F ) yt = 0 é,

pelo teorema 24,

yt = c12t + c23

t + b11t + b2t1

t

= c12t + c23

t| {z }yht

+ b1 + b2t| {z }ypt

.

4. Determinar as constantes b1 e b2 associadas à solução y0t pelo método dos coeficientes

indeterminados a partir da relação P (F ) y0t = et. Tem-se

P (F ) ypt = 5 + 2t¡F 2 − 5F + 6¢ (b1 + b2t) = 5 + 2t

...

(2b1 − 3b2) + 2b2t = 5 + 2t.

177

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Relativamente à última equação, o lado esquerdo é igual ao lado direito sse 2b1 − 3b2 = 52b2 = 2

⇔ b1 = 4

b2 = 1.

Em suma, a solução geral da EDF não homogénea yt+2 − 5yt+1 + 6yt = 5 + 2t é

yt = yht + ypt

= c12t + c23

t + 4 + t.

6.3 Equações Linearizáveis

Considere-se uma EDF de primeira ordem não linear

yt = f (yt−1, yt−2, ..., yt−n) .

Embora os valores de yt possam ser obtidos recursivamente não é geralmente possível obter

fórmulas explícitas para a solução. No entanto, num certo número de casos especiais é possível

transformar a EDF não linear numa EDF linear através de uma mudança de variáveis. Por

exemplo, a EDF não linear

yt = yαt−1yβt−2

pode ser linearizada através da mudança de variável zt = log (yt). Com efeito,

zt = αzt−1 + βzt−2.

Uma vez obtida a solução zt, a solução yt obtém-se facilmente tendo em conta que yt = ezt . A

equação

ytyt−1 + a1yt + a2yt−1 = et (6.13)

(de Riccati com coeficientes constantes), pode ser transformada numa EDF linear através da

mudança de variável

yt =zt+1zt− a1. (6.14)

178

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Com efeito, representando a EDF (6.13) usando yt =zt+1zt− a1 vem

µzt+1zt− a1

¶µztzt−1

− a1

¶+ a1

µzt+1zt− a1

¶+ a2

µztzt−1

− a1

¶= et

isto é,

zt+1 + (a2 − a1) zt + (−et − a1a2) zt−1 = 0.

Exemplo 72 Considere-se ytyt−1 + 2yt + 4yt−1 = −9. Com a mudança de variável (6.14)

resulta

zt+1 + 2zt + zt−1 = 0.

Esta EDF tem solução geral (ver o teorema 23)

zt = c1 (−1)t + c2t (−1)t , c1, c2 ∈ R.

A solução geral da EDF de Riccati é

yt =c1 (−1)t+1 + c2 (t+ 1) (−1)t+1

c1 (−1)t + c2t (−1)t− 2.

Apresenta-se a seguir um método mais sistemático para a determinação da mudança de

variável que permite linearizar uma EDF. Restringe-se a análise à EDF de primeira ordem

yt = f (yt−1) . (6.15)

Suponha-se que é conhecida a expressão g (y) que satisfaz a expressão

δg (f (y)) = g (y)df (y)

dy(6.16)

onde δ é uma constante conhecida. Defina-se a transformação

z (f (y)) =

Z f(y) 1

g (u)du (6.17)

para y pertencente a um intervalo aberto no qual g (y) é diferente de zero. Mostre-se que a

solução da equação precedente define a mudança de variável que lineariza a EDF (6.15). Isto

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é, mostre-se que z (f (y)) = δz (y)+C, (C é uma constante). Com efeito, atendendo à equação

(6.16) e ao teorema fundamental do cálculo vem

dz (f (y))

dy=

1

g (f (y))

df (y)

dy

=1

g (f (y))

δg (f (y))

g (y)

g (y)

e integrando obtém-se

z (f (y)) = δz (y) + C

i.e.,

z (yt) = δz (yt−1) +C.

Note-se que a solução de zt = δzt−1 + C é

zt =

Aδt + C1−δ δ 6= 1

Ct+C δ = 1.

Exemplo 73 Considere-se a EDF yt = ayt−1 (1− yt−1) , f (y) = ay (1− y) . A equação (6.16)

vale

δg (ay (1− y)) = g (y) a (1− 2y)

A função g não é conhecida a priori mas a expressão anterior sugere que se tente g (y) = d+cy

onde d e c são parâmetros a determinar. Assim,

δg (ay (1− y)) = g (y) a (1− 2y)δ (d+ acy (1− y)) = a (d+ cy) (1− 2y)

dδ + acyδ − acy2δ = ad+ acy − 2ady − 2acy2

(2ac− acδ) y2 + (acδ − ac+ 2ad) y + (dδ − ad) = 0.

Pelo método dos coeficientes indeterminados obtém-se δ = a = 2 e c = −2d (um grau de

liberdade). Escolha-se, por exemplo, c = −1. Logo uma escolha válida para g é g (y) = 1/2− y.

180

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Resolva-se agora a equação (6.17) para g (y) = 1/2− y,

dz

dy=

1

1/2− y.

Tem-se z = − log(12−y) ou y = 12−e−z. Substitua-se agora esta expressão em yt = ayt−1 (1− yt−1) ,

i.e.1

2− e−zt = 2

µ1

2− e−zt

¶µ1− 1

2+ e−zt−1

¶ou

e−zt = 2e−zt−1

ou

zt = 2zt−1 − log 2.

Donde

zt = A2t + log 2

e finalmente

yt =1

2− e−zt =

1

2

³1−B2

onde B é uma constante arbitrária.

Especificando previamente uma dada função g é possível descobrir famílias de funções f para

as quais existe uma transformação linearizante. Concretamente, dada uma função g, resolve-se

a equação (6.16) em ordem à função incógnita f, função de y. A transformação linearizante

obtém-se depois a partir de (6.17).

Exemplo 74 Escolha-se g (y) =py (1− y). A equação (6.16) fica

δpf (1− f) =

py (1− f)

df

dy.

Esta é uma ED com variáveis separáveis (em y e f) cuja solução é

f (y) = sen2 (δ arcsen (√y) +C) .

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Escolha-se, por exemplo, δ = 2 e C = 0. Resulta, depois de algumas simplificações,

f (y) = 4y (1− y) .

Assim, a EDF yt = 4yt−1 (1− yt−1) é linearizável. A transformação linearizante obtém-se a

partir de (6.17) e vem z = 2arcsen¡√

y¢ou y = sen2 (z/2) . Esta mudança de variável produz

sen2³zt2

´= 4 sen2

³zt−12

´cos2

³zt−12

´= sen2 (zt−1)

ou

zt = 2zt−1

cuja solução é

zt = A.2t

e, portanto,

yt = sen2¡B.2t

¢, (B é uma constante arbitrária).

182

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Exercícios

1. Determine a solução (considere como valor inicial y0) e calcule limt→+∞ yt nos seguintes

casos:

(a) yt =t1+tyt−1 + e

(b) yt = φyt−1 + t

(c) yt = φyt−1 + λt−1 (considere os casos φ 6= λ e φ = λ)

2. Obtenha a solução da EDF

yt =

αyt−1 + a, t ≤ t∗

βyt−1 + b t > t∗

com a condição inicial y0 = c.

3. Suponha que

|c1,t| ≤ r |c1,t−1| , c1,0 = 1

|c2,t| ≤ r |c2,t−1|+ |c1,t−1| , c2,0 = 0.

Mostre que

|c1,t| ≤ rt

|c2,t| ≤ trt−1.

4. Use a mudança de variável zt = 1/yt para resolver o PVI

tyt+1yt + yt+1 − yt = 0, y0 = 1

5. Use a mudança de variável yt = sen zt para resolver yt+1 = 2ytp1− y2t .

6. Use uma transformação logarítmica para resolver

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(a) yt/yt−1 = 2 −t√yt−1, y1 = 1.

(b) yt+2 = yt+1y2t .

7. Considere a sequência de Fibonacci 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, ... (cada elemento é a soma dos

dois últimos elementos). Defina um PVI para a sequência de Fibonacci e resolva-a.

8. Seja Dn o valor do determinante da seguinte matriz quadrada de ordem n

a b 0 0 · · · 0 0 0

c a b 0 · · · 0 0 0

0 c a b · · · 0 0 0

0 0 c a · · · 0 0 0............. . .

.........

0 0 0 0 · · · a b 0

0 0 0 0 · · · c a b

0 0 0 0 · · · 0 c a

.

Fazendo um desenvolvimento Laplaceano ao longo da primeira linha obtenha uma EDF

de ordem 2 para Dn. Estabeleça um PVI e resolva-o.

9. Resolva as seguintes EDF

(a) yt +12yt−1 − 1

2yt−2 = 1.

(b) yt+2 − 4yt+1 + 4yt = 2t.

(c) yt+2 − yt+1 +12yt = t2.

(d) ∆2yt = t+ et.

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Capítulo 7

Sistemas de Equações Lineares Não

Homogéneas Com Coeficientes

Constante

Neste capítulo vamos considerar o seguinte sistema de equações lineares (SEDF) de primeira

ordem

y1,t = a11y1,t−1 + ...+ a1nyn,t−1 + g1,t

y2,t = a21y1,t−1 + ...+ a2nyn,t−1 + g2,t

...

yn,t = an1y1,t−1 + ...+ annyn,t−1 + gn,t

(nota: quando não haja possibilidade de confusão yi,t escreve-se na forma yit e yi,t−1 na forma

yit−1) ou, compactamente

yt = Ayt−1 + gt. (7.1)

A EDF de ordem n

zt = α1zt−1 + ...+ αnzt−n + et

185

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é caso particular de (7.1). Com efeito, considerem-se as mudanças de variável

y1,t = zt

y2,t = zt−1

...

yn,t = zt−n+1.

Tem-se

y1,t = α1y1,t−1 + ...+ αnyn,t−1 + et

y2,t = y1,t−1...

yn,t = yn−1,t.

De forma compacta, o SEDF escreve-se yt = Ayt−1 + gt onde

A =

α1 α2 · · · αn−1 αn

1 0 · · · 0 0...

.... . .

......

0 0 · · · 1 0

, gt =

et

0...

0

.

Teorema 26 Considere-se o PVI yt = Ayt−1+gt, yt0 = ζ e assuma-se que gt está bem definido

para t = t0, t0 + 1, ... Então existe uma solução única definida para t = t0, t0 + 1, ... que é dada

por

yt = At−t0ζ +tX

s=t0+1

At−sgs. (7.2)

186

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Dem. Sem perda de generalidade assuma-se t0 = 0. Prove-se em primeiro lugar que qualquer

solução tem a forma (7.2). Tem-se, resolvendo o sistema iterativamente,

y0 = ζ

y1 = Aζ + g1

y2 = Ay1 + g2 = A (Aζ + g1) + g2

= A2ζ +Ag1 + g2

...

yt = Atζ +tX

s=1

At−sgs.

Reciprocamente, verifica-se facilmente que qualquer expressão da forma (7.2) é solução da

equação (7.1). Com efeito, (7.2) satisfaz o SEDF yt = Ayt−1 + gt :

Ayt−1 + gt = A

ÃAt−1ζ +

t−1Xs=1

At−1−sgs

!+ gt = Atζ +

t−1Xs=1

At−sgs + gt

= Atζ +tX

s=1

At−sgs = yt.¥

7.1 Caso Homogéneo

No caso gt ≡ 0 vem yt = Ayt−1. Pelo teorema 26 a solução do PVI yt = Ayt−1, y0 =

(y1,0, y2,0, ..., yn,0)T é yt = Aty0.

Exemplo 75 Suponha-se

y1t = αy1t−1

y2t = βy2t−1

e

y0 =

12

.

187

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Na forma compacta, o SEDF escreve-se yt = Ayt−1 onde

A =

α 0

0 β

.Note-se

At =

α 0

0 β

... α 0

0 β

| {z }

t vezes

=

αt 0

0 βt

.A solução do SEDF com a condição inicial y0 é

yt = Aty0 =

αt 0

0 βt

12

= αt

2βt

.No caso em que A não é uma matriz diagonal a expressão de At é mais difícil de obter (não

é exequível multiplicar-se t vezes a matriz A, sobretudo para valores altos de t. Obviamente o

estudo de limt→+∞At exige que se escreva At através de funções elementares).

7.1.1 Caso Geral

Recorda-se o

Lema 15 (Cayley-Hamilton) Seja A uma matriz quadrada e p (λ) = |A− λI| = 0 a respec-tiva equação característica. Então p (A) = 0.

Exemplo 76 Verique-se o lema anterior para

A =

2 2

0 4

.A equação característica é

p (λ) = |A− λI| = (2− λ) (4− λ) = 0

188

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Agora,

p (A) = (2I −A) (4I −A) =

0 −20 −2

2 −20 0

= 0 0

0 0

tal como o lema anterior estabelece. Note-se: (1) neste exemplo poderíamos ter escrito p (A) =

(A− 2I) (A− 4I) = 0; (2) se C e D são matrizes e CD = 0 não se segue que C = 0 ou D = 0.

Observe-se, com efeito (A− 2I) 6= 0 e (A− 4I) 6= 0 mas (A− 2I) (A− 4I) = 0.

Teorema 27 Seja A uma matriz quadrada de ordem n. Então

At =n−1Xi=0

ci+1,tMi,

onde

M0 = I

Mi = (A− λiI)Mi−1

e ci,t, i = 1, ..., n, satisfazem o sistema de equações às diferenças

c1,t...

cn,t

=

λ1 0 0 · · · 0

1 λ2 0 · · · 0

0 1 λ3 · · · 0...

......

. . ....

0 · · · 0 1 λn

c1,t−1...

cn,t−1

(7.3)

com a condição inicial c1,0

c2,0...

cn,0

=1

0...

0

. (7.4)

Dem. (Introdução) Como o polinómio característico de uma matriz quadrada de ordem

n estabelece, pelo lema 15, uma relação entre I,A,A2, ..., An segue-se que An pode ser escrita

como uma combinação linear das matrizes I,A,A2, ..., An−1, i.e., An = cn−1An−1 + ... + c0I,

189

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onde ci são constantes1). Resulta também que An+k com k ∈ N pode ser escrita como umacombinação linear das matrizes I,A,A2, ..., An−1. De facto, considere-se k = 1. Tem-se

An+1 = AnA =¡cn−1An−1 + cn−2An−2 + ...+ c0I

¢A

= cn−1An + cn−2An−1 + ...+ c0A

= cn−1¡cn−1An−1 + cn−2An−2 + ...+ c0I

¢+ cn−2An−1...+ c0A

= (cn−1cn−1 + cn−2)An−1 + (cn−1cn−2 + cn−3)An−2 + ...+ cn−1c0I

e, portanto, An+1 pode ser escrita como uma combinação linear das matrizes I,A,A2, ..., An−1.

Por indução, conclui-se An+k com k ∈ N pode ser escrita como uma combinação linear das

matrizes I,A,A2, ..., An−1 (cujos coeficientes dependem do expoente n + k). Naturalmente, a

mesma conclusão se aplica a At (interpretando t = n+ k). Os ci acima definidos dependem o

índice t, em At. Desta forma, o lema 15 permite escrever

At =n−1Xi=0

ci+1,tMi = c1,tM0 + c2,tM1 + ...+ cn,tMn−1

onde

M0 = I

Mi = (A− λiI)Mi−1.

Note-se que

Mn = (A− λ1I) (A− λ2I) ... (A− λnI) = p (A) = 0,

pelo lema 15. As funções ci,t determinam-se como se segue. Tendo em conta, At+1 = AAt,

AMi = AMi − λi+1Mi + λi+1Mi = (A− λi+1I)Mi + λi+1Mi =Mi+1 + λi+1Mi (7.5)

1Por exemplo, vimos no exemplo 76 que (2I −A) (4I −A) = A2 − 6A+ 8I = 0. Logo A2 = 6A− 8I, i.e., A2

pode-se escrever como uma combinação linear entre I e A.

190

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e Mn = 0 vem

At+1 =n−1Xi=0

ci+1,t+1Mi (7.6)

At+1 = AAt

= An−1Xi=0

ci+1,tMi

=n−1Xi=0

ci+1,t (Mi+1 + λi+1Mi) (7.7)

=n−1Xi=0

ci+1,tMi+1 +n−1Xi=0

ci+1,tλi+1Mi

= c1,tM1 + ...+ cn−1,tMn−1 + cnMn + c1,tλ1M0 + ...+ cn,tλnMn−1

= c1,tλ1M0 +n−1Xi=1

(ci,t + ci+1,tλi+1)Mi. (7.8)

A partir das equações (7.6) e (7.8) vem

c1,t+1M0 + c2,t+1M1 + ...+ cn,t+1Mn−1

= c1,tλ1M0 + (c1,t + c2,tλ2)M1 + ...+ (cn−1,t + cn,tλn)Mn−1.

Igualando os coeficientes homólogos resulta

c1,t+1...

cn,t+1

=

λ1 0 0 · · · 0

1 λ2 0 · · · 0

0 1 λ3 · · · 0...

......

. . ....

0 · · · 0 1 λn

c1,t...

cn,t

.

Este sistema é equivalente ao sistema (7.3). A condição inicial obtém-se a partir da igualdade

A0 = I = c1,0I + ...+ cn,0Mn−1.¥

Pelo teorema 27 a solução do sistema yt = Ayt−1, com a condição inicial é dada pela

expressão

yt = Aty0 =n−1Xi=0

ci+1,tMiy0. (7.9)

191

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A fórmula (7.9) é válida qualquer que seja a natureza dos valores próprios da matriz A.

7.1.2 Sistema de Duas Equações (n = 2)

Vamos considerar o caso particular importante do sistema

y1t

y2t

= A

y1t−1

y2t−1

.Sejam λ1, λ2 os valores próprios de A. Vamos estudar os seguintes casos:

Valores Próprios Reais e Distintos

Suponha-se λ1, λ2 ∈ R e λ1 6= λ2. Resolvendo (7.3) com a condição (7.4) obtém-se

c1t = λt1, c2t =λt1 − λt2λ1 − λ2

.

Tem-se

yt =1X

i=0

ci+1,tMiy0 = (c1,tM0 + c2,tM1) y0

= (c1,tI + c2,t (A− λ1I)) y0 (7.10)

=

µλt1I +

λt1 − λt2λ1 − λ2

(A− λ1I)

¶y0. (7.11)

Exemplo 77 Resolva-se o PVI

y1t

y2t

= A

y1t−1

y2t−1

, y0 =

11

onde

A =

0 1

−2 −3

.

192

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Figura 7-1: Trajectórias y1t, y2t (traço grosso)

2 4 6 8 10t

-1000-750-500-250

250500750y1 y2

Os valores próprios são λ1 = −2, λ2 = −1. Utilizando a fórmula (7.11) e considerando

A− λ1I =

2 1

−2 −1

vem

yt =

(−2)t 1 0

0 1

+ (−2)t − (−1)t(−2)− (−1)

2 1

−2 −1

11

=

−2 (−2)t + 3 (−1)t4 (−2)t − 3 (−1)t

.Na figura 7-1 apresentam-se as trajectórias y1t, y2t. Note-se que ambas as trajectórias se afastam

cada vez mais do valor inicial à media que t aumenta.

Observação 15 Pode-se provar que a solução do sistema yt = Ayt−1, no caso em que os valores

próprios λi, i = 1, 2, ..., n são reais e distintos, pode apresentar-se como uma combinação linear

de soluções independentes do tipo λtiui onde ui é o vector próprio associado ao valor próprio

λi. Deixa-se como exercício mostrar: (a) se Aui = λiui então λtiui é uma solução do sistema

yt = Ayt−1; (b) escrevendo P =hu1 · · · un

ie Λ = diag [λ1, ..., λn] então At = PΛtP−1 e,

portanto, yt = PΛtP−1y0.

193

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Valores Próprios Complexos

Suponha-se que os valores próprios são α± βi. Usa-se novamente a fórmula (7.11)

yt =

µλt1I +

λt1 − λt2λ1 − λ2

(A− λ1I)

¶y0

com λ1 = α+ βi e λ2 = α− βi. O valor próprio λ1 na forma trigonométrica é

λ1 = ρ (cos θ + i sen θ)

onde

ρ =

qα2 + β2 e θ = arcsenβ/ρ = arccosα/ρ. (7.12)

Na forma exponencial tem-se λ1 = ρeiθ. Consequentemente,

λt1 = (α+ βi)t =³ρeiθ

´t= ρteitθ = ρt (cos tθ + i sen tθ) .

Por outro lado,

λt1i = ρt (cos tθ + i sen tθ) i = ρt (− sen tθ + i cos tθ) .

Relativamente ao conjugado λ2, vem

λ2 = (α− βi) = ρ (cos θ − i sen θ) ,

λt2 = (α− βi)t = ρt (cos tθ − i sen tθ) ,

λt2i = (α− βi)t i = ρt (sen tθ + i cos tθ) .

Desta forma, escrevendo,

yt =

µλt1I +

λt1 − λt2λ1 − λ2

(A− λ1I)

¶y0 =

µµλt1λ2 − λ1λ

t2

−λ1 + λ2

¶I +

λt1 − λt2λ1 − λ2

A

¶y0

194

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tem-se

λt1λ2 − λ1λt2

−λ1 + λ2=

1

2

α

βi (α+ iβ)t +

1

2(α+ iβ)t − 1

2

α

βi (α− iβ)t +

1

2(α− iβ)t

=1

2

α

β

¡ρt (− sen tθ + i cos tθ)

¢+1

2

¡ρt (cos tθ + i sen tθ)

¢−12

α

β

¡ρt (sen tθ + i cos tθ)

¢+1

2ρt (cos tθ − i sen tθ)

= ρtβ cos tθ − α sen tθ

β

λt1 − λt2λ1 − λ2

= − 12β

i (α+ iβ)t +1

2βi (α− iβ)t

= − 12β

¡ρt (− sen tθ + i cos tθ)

¢+1

¡ρt (sen tθ + i cos tθ)

¢= ρt

sen tθ

β

Assim,

yt =

µµλt1λ2 − λ1λ

t2

−λ1 + λ2

¶I +

λt1 − λt2λ1 − λ2

A

¶y0

= ρtµβ cos tθ − α sen tθ

βI +

sen tθ

βA

¶y0. (7.13)

Observação 16 Seguindo o raciocínio apresentado na observação 15 vem que se A possui 2n

raízes complexas distintas do tipo λ1, λ1, λ2, λ2, ..., λn, λn a solução virá na forma

yt =nX

j=1

³cjλ

tjzj + c2jλ

tj zj

´

onde cj (j = 1, ..., 2n) são constantes arbitrárias, zj é o vector próprio complexo associado ao

vector próprio λj e zj é o vector conjugado de zj . Para concretizar suponha-se que A é de tipo

2× 2 (caso de duas raízes complexas). Tem-se

yt = c1λtz + c2λ

tz

195

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ou, com λ = α+ βi e z = z1 + z2i (z1 e z2 são vectores reais de tipo 2× 1),

yt = c1 (α+ βi)t¡z1 + z2i

¢+ c2 (α− βi)t

¡z1 − z2i

¢.

Usando coordenadas polares (ver as relações apresentadas a partir da página ) pode-se escrever

(com A1 e A2 constantes arbitrárias)

yt = c1 (α+ βi)t¡z1 + z2i

¢+ c2 (α− βi)t

¡z1 − z2i

¢= c1 (α+ iβ)t z1 + c1 (α+ iβ)t iz2 + c2 (α− iβ)t z1 − c2 (α− iβ)t iz2

= c1ρt (cos tθ + i sen tθ) z1 + c1ρ

t (− sen tθ + i cos tθ) z2

+c2ρt (cos tθ − i sen tθ) z1 − c2ρ

t (sen tθ + i cos tθ) z2

= ρt¡c1 (cos tθ + i sen tθ) z1 + c1 (− sen tθ + i cos tθ) z2

¢+ρt

¡c2 (cos tθ − i sen tθ) z1 − c2 (sen tθ + i cos tθ) z2

¢= ρt

¡¡c1z

1 + c1iz2 + c2z

1 − c2iz2¢cos tθ +

¡c1iz

1 − c1z2 − c2iz

1 − c2z2¢sen tθ

¢= ρt((c1 + c2)| {z }

A1

z1 + (c1 − c2) i| {z }A2

z2) cos tθ + ((c1 − c2) i| {z }A2

z1 + (−c1 − c2)| {z }−A1

z2) sen tθ

= ρt¡¡A1z

1 +A2z2¢cos tθ +

¡A2z

1 −A1z2¢sen tθ

¢(7.14)

Exemplo 78 Resolva-se o PVI

y1t

y2t

= A

y1t−1

y2t−1

, A =

1 1

−2 3

, y0 =

10

.A partir de |A− λI| = 0 sai λ1 = 2 + i e λ2 = 2− i. Consequentemente, ρ =

√22 + 12 =

√5,

196

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θ = arcsen 1√5. Se utilizarmos a fórmula (7.13) vem

yt = ρtµβ cos tθ − α sen tθ

βI +

sen tθ

βA

¶y0

= ρt

cos³t arcsen 1√5

´− 2 sen

³t arcsen 1√

5

´0

0 cos³t arcsen 1√

5

´− 2 sen

³t arcsen 1√

5

´

+

sen³t arcsen 1√

5

´sen

³t arcsen 1√

5

´−2 sen

³t arcsen 1√

5

´3 sen

³t arcsen 1√

5

´ 1

0

=

¡√5¢t ³cos³t arcsen 1√5

´− sen

³t arcsen 1√

5

´´−2 ¡√5¢t sen³t arcsen 1√

5

´ .

Note-se arcsen 1√5= . 463 65.

Utilize-se agora a fórmula (7.14). O vector próprio associado a λ = 2+ i resulta da solução

do sistema

(A− (2 + i) I)

v1

v2

= 00

Tem-se

z =

1− i

2

= 12

| {z }

z1

+

−10

| {z }

z2

i.

Assim,

yt =

y1t

y2t

=

³√5´tA1

12

+A2

−10

cosµt arcsen 1√5

+

A2

12

−A1

−10

senµt arcsen 1√5

¶ .

197

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Figura 7-2: Soluções do PVI. Traço Grosso y1t, Traço Fino y2t

12 14 16 18 20 22 24t

-1´ 107

-5´ 106

5´ 106

8y1t y2t<

Para a condição inicial

y0 =

10

resulta

y0 = A1

12

+A2

−10

= A1 −A2

2A1

= 10

pelo que A1 = 0, A2 = −1. Assim

yt =³√5´t 1

0

cosµt arcsen 1√5

¶+

−1−2

senµt arcsen 1√5

¶=

¡√5¢t ³cos³t arcsen 1√5

´− sen

³t arcsen 1√

5

´´−2 ¡√5¢t sen³t arcsen 1√

5

´ .

Na figura 7-2 apresentam-se as trajectórias y1t, y2t. É importante notar que não é forçoso

saber-se a solução para traçar as trajectórias. De facto as trajectórias podem ser obtidas muito

facilmente usando-se um qualquer algoritmo de recorrência. Por exemplo, um programa do tipo

Excel gera facilmente trajectórias de sistemas dinâmicos discretos.

198

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Raízes Iguais

Suponha-se que os valores próprios são λ, λ (λ tem multiplicidade 2). Considere-se a fórmula

(7.9)

yt =1X

i=0

ci+1,tMiy0 = (c1,tM0 + c2,tM1) y0

= (c1,tI + c2,t (A− λ1I)) y0.

Não é possível utilizar a fórmula (7.11) dado que o sistema (7.3) é diferente. Com efeito, pela

fórmula (7.3) tem-se

c1,t

c2,t

= λ 0

1 λ

c1,t−1

c2,t−1

cuja solução com a condição inicial c1,0 = 1, c2,0 = 0, é c1,t = λt, c2,t = tλt−1. Assim a solução

do sistema yt = Ayt−1 com a condição inicial y0 é

yt =¡λtI + tλt−1 (A− λI)

¢y0. (7.15)

Observação 17 No caso geral de n equações, yt = Ayt−1, com a condição inicial y0, se λ valor

próprio de multiplicidade n então é fácil concluir, depois de se resolver (7.3), com λ = λ1 =

... = λn, que a solução é

yt =n−1Xi=0

ci+1,tMiy0

=³c1,tI + c2,t (A− λI) + ...+ cn,t (A− λI)n−1

´y0

=

µλtI + tλt−1 (A− λI) +

1

2t (t− 1)λt−2 (A− λI)2

+...+1

(n− 1)! (t (t− 1) ... (t− n+ 2))λt−n+1 (A− λI)n−1¶y0.

199

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7.2 Caso Não Homogéneo

No caso gt 6= 0, basta atender ao teorema 26. Assim, a solução do PVI yt = Ayt−1+ gt, dada a

condição yt0 = ζ vem

yt = At−t0ζ +tX

s=t0+1

At−sgs. (7.16)

Exemplo 79 Resolva-se o PVI yt = Ayt−1 + g, y0 = ζ onde

A =

1 0

2 1

, g =

11

, ζ =

01

.Uma vez que os valores próprios de A são {1, 1} vem

At =¡λtI + tλt−1 (A− λI)

¢=

1 0

2t 1

e

yt = Atζ +tX

s=1

At−sg

=

1 0

2t 1

01

+ tXs=1

1 0

2 (t− s) 1

11

=

t

t2 + 1

.

200

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Exercícios

1. Resolva os seguintes SEDF lineares yt = Ayt−1 onde

(a) A =

−1 2

0 3

, y0 = 12

(b) A =

−1 2

−1 1

, y0 = 10

(c) A =

−1 2

0 −1

, y0 = 11

2. Resolva o SEDF yt = Ayt−1 onde

A =

−1 2 0 0 0 0

0 3 0 0 0 0

0 0 −1 2 0 0

0 0 −1 1 0 0

0 0 0 0 −1 2

0 0 0 0 0 −1

, y0 =

1

2

1

0

1

1

(aproveite o facto de A ser diagonal por blocos e considere os resultados já obtidos no

exercício 1).

3. Resolva as seguintes EDF:

(a) zt + 1/2zt−1 − 1/2zt−2 = 0;

(b) zt+3 − 6zt+2 + 11zt+1 − 6zt = 0

201

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Capítulo 8

Estabilidade

Considere-se o sistema autónomo yt = f (yt−1) onde y é um vector de tipo n × 1 e f é umafunção real f : Rn → Rn. O domínio de f poderá ser S ⊂ Rn mas neste caso devemos exigir que

S ⊆ f (S) (suponha-se que esta condição não se verifica - então poderia suceder que ξ ∈ S e

y1 = f (ξ) /∈ S e não seria possível agora continuar com y2 = f (y1) = f (f (ξ)) pois f (ξ) /∈ S).

8.1 Pontos Fixos

8.1.1 Definições

Definição 18 (Ponto Fixo de f) Um vector y é designado por ponto fixo de f se f (t, y) = y,

para todo o t.

No ponto fixo o sistema dinâmico discreto não varia (está em equilíbrio). Com efeito,

se yt−1 = y e y é um ponto fixo, a variação da solução, ∆yt, é nula, i.e., ∆yt = yt − yt−1 =

f (yt−1)−yt−1 = y− y = 0. Observe-se a analogia com as soluções de equilíbrio (no contexto dasequações diferenciais). Por exemplo, considere-se y0 = 2 e a EDF yt = (1/2) yt−1 + 1. Iterando

a equação é fácil verificar que y1 = 2, y2 = 2, ... Logo y = 2 é o ponto fixo de f (x) = (1/2)x+1.

Para calcular o ponto fixo de f basta resolver a equação (1/2) y + 1 = y em ordem a y.

Exemplo 80 Considere-se yt = 2yt−1 (1− yt−1) . Tem-se f (x) = 2x (1− x) . Os pontos fixos

(de f) calculam-se a partir da relação f (y) = y, i.e., 2y (1− y) = y. Os pontos fixos são

portanto y = 0 e y = 1/2.

202

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Exemplo 81 Considere-se o sistema não linear

y1t

y2t

= y2t−1

y2t−1y1t−1

.Tem-se, portanto

f

x1

x2

=

x2

x2x1

com domínio

x1

x2

∈ R2 : x1 6= 0 .

Determinem-se os pontos fixos de f. Para o efeito, resolve-se f (x) = x, i.e.,

x2

x2x1

= x1

x2

.É fácil verificar que o único ponto fixo é

11

.Teorema 28 Seja S um intervalo fechado e f : S → R uma função contínua. Se S ⊆ f (S)

então f tem um ponto fixo em S.

Dem. Seja S = [a, b]. Sob as condições do teorema existe um c e um d em S tal que

f (c) = a e f (d) = b. Se c = a ou d = b então segue-se o resultado do teorema. Caso contrário

verifica-se a < c < b e a < d < b. Defina-se g (x) = f (x)− x. Tem-se g (c) = f (c)− c < 0 pois

f (c) = a < c e g (d) = f (d) − d > 0 pois f (d) = b > d. Dado que g (c) < 0 e g (d) > 0 e g

é uma função contínua, segue-se, pelo teorema de Bolzano, que existe um e tal que g (e) = 0.

Como consequência f (e) = e. A figura 8-1 ilustra o teorema anterior.¥

Quando n = 1 e a EDF é autónoma é muito útil no estudo da estabilidade o gráfico teia

de aranha. Para ilustrar a interpretação do gráfico representa-se na figura 8-2 o gráfico teia de

aranha associado ao PVI, yt = 0.5yt−1, y0 = 4 (ponto a). No momento 1 tem-se y1 = 0.5×4 = 2

203

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Figura 8-1: Ilustração do Teorema 28

a b

( )

Sf

a

b

( )xf

045

fixo ponto

c

(ponto b ou c). Este valor, y1 = 2, pode ser interpretado como o valor inicial com respeito a

y2; assim, poderíamos colocar y1 = 2 no eixo das abcissas. Em alternativa, o valor y1 ”parte”

da linha de 450 (ponto c) e o procedimento é repetido iterativamente. Assim, no momento 2

tem-se y2 = 0.5×2 = 1 (ponto e) e assim sucessivamente. O gráfico mostra que lim→+∞ yt = 0.

Os retratos de fases em R1 podem também ser traçados juntamente com os gráficos teia

de aranha. A sua interpretação é, no essencial, idêntica aos retratos de fases definidos para

equações diferenciais. O retrato de fases consiste, portanto, num diagrama onde se representam

possíveis valores iniciais e setas que indicam o movimento da solução à medida que t percorre o

conjunto N. Na figura 8-3 representa-se o gráfico teia de aranha da EDF yt = yt−1 e na figura

8-4 o correspondente retrato de fases.

Seja yt = yt (y0) a solução da EDF (ou do sistema de EDF) yt = f (t, yt−1) , dada a condição

inicial y0 (para simplificar admite-se, sem perda de generalidade, que t0 = 0). A expressão yt (y0)

define a solução como uma função explícita da condição inicial y0. No caso da EDF autónomas

é usual considerar-se a notação yt = f t (y0) em lugar de yt = yt (y0) onde

f t (x) := f(...f(f| {z }t vezes

(x))).

204

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Figura 8-2: Gráfico Teia de Aranha do PVI yt = 0.5yt−1, y0 = 4

-4 -2 2 4

-4

-2

2

4

a

bc

de

Linha 45º

f(x)

yt

yt-1

Figura 8-3: Gráfico Teia de Aranha da Aplicação f (x) = x2 (estão traçadas duas órbitas comvalores inicias -1.1 e 0.9)

-1 -0.5 0.5 1 1.5

-1

-0.5

0.5

1

1.5

2

205

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Figura 8-4: Retrato de Fases de f (x) = x2

-1 1

A expressão f t (y0) neste contexto não significa f "levantado" a t.1

Definição 19 (Ponto Fixo Estável, Assintoticamente Estável e Instável) O ponto fixo

y diz-se estável se para cada ε > 0 existe um δ = δ (t0, ε) tal que, para cada qualquer solução

yt (y0) a desigualdade ky0 − yk ≤ δ implica kyt (y0)− yk < ε para todo o t ≥ t0. O ponto fixo

y diz-se assimptoticamente estável se é estável e se existe um δ0 > 0 tal que a desigualdade

ky0 − yk ≤ δ0 implica kyt (y0)− yk→ 0 quando t→ +∞. O ponto fixo y diz-se instável se não

é estável.2

Grosso modo, um ponto fixo y é estável se yt = yt (y0) permanecer "perto" de y para todo

o t sempre que y0 se encontrar "perto" de y. O ponto fixo y é assimptoticamente estável se for

1Por exemplo, se f (x) = 11+x

, então

f2 (x) = f (f (x)) = f1

1 + x=

1

1 + 11+x

,

f3 (x) = f (f (f (x))) = f f1

1 + x= f

1

1 + 11+x

=1

1 + 1

1+ 11+x

.

Dada a EDF yt =1

1+yt−1 , o valor y3 dado y0 = 1 é

f3 (1) =1

1 + 1

1+ 11+1

=3

5.

Naturalmente, podemos obter este valor considerando o procedimento iterativo,

y1 =1

1 + 1=1

2, y2 =

1

1 + 12

=2

3, y3 =

1

1 + 23

=3

5.

A expressão f t (y0) representa o valor de yt dada a condição y0.2Se a EDF é autónoma leia-se f t (y0) em lugar de yt (y0) .

206

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estável e toda a solução inicializada perto de y converge para y.

Exemplo 82 Considere-se yt = φyt−1 + e, com e 6= 0. Tem-se f (x) = φx + e. Resolvendo

f (y) = y, i.e., φy + e = y conclui-se que o (único) ponto fixo é y = e/ (1− φ). No caso φ = 1

não existe ponto fixo (a equação x + e = x é impossível, com e 6= 0). A estabilidade do pontofixo y pode, no caso presente, ser discutida directamente a partir f t (na generalidade dos casos

não lineares não é possível obter f t). De acordo com a equação (6.6), p. 168, tem-se, com a

condição inicial y0, yt = f t (y0) = y0φt + e1−φ

t

1−φ . Assim

f t (y0)− y = y0φt + e

1− φt

1− φ− e

1− φ= φt

µy0 − e

1− φ

¶¯f t (y0)− y

¯= |φ|t

¯y0 − e

1− φ

¯= |φ|t |y0 − y| .

Impondo¯f t (y0)− y

¯< ε vem |φ|t |y0 − y| < ε. Se |φ| < 1 então y é estável. Basta considerar

um δ tal que |y0 − y| ≤ δ < ε. Nestas condições tem-se¯f t (y0)− y

¯< ε para todo o t > 0.

Se |φ| > 1 o termo¯f t (y0)− y

¯tende para +∞ o que significa que não existe um δ > 0 nos

termos da definição de ponto fixo estável; logo y é instável. Analise-se a estabilidade assintótica.

Tem-se para φ 6= 1

limt→+∞ f t (y0) = lim

t→+∞

µy0φ

t + e1− φt

1− φ

¶=

e1−φ = y se |φ| < 1±∞ se |φ| > 1

Assim, se |φ| < 1 o ponto fixo y é assimptoticamente estável; se |φ| > 1, y é instável.

Exemplo 83 Retome-se o exemplo 80 (yt = 2yt−1 (1− yt−1)). Vimos que os pontos fixos são

y = 0 e y = 12 . Discute-se agora a estabilidade a partir do gráfico teia de aranha - ver a

figura 8-5. Estão representados três valores iniciais. É fácil concluir que qualquer ponto que se

encontre numa vizinhança do ponto fixo 1/2 (por exemplo ponto A ou B) não só não se afasta

de 1/2 como também converge para y = 1/2. Este ponto fixo é portanto assimptoticamente

estável. O ponto fixo zero é instável. Basta observar o que sucede quando y é inicializado no

ponto C.

207

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Figura 8-5: Gráfico Teia de Aranha da equação yt = 2yt−1 (1− yt−1) (representados três valoresiniciais).

-0.5 -0.25 0.25 0.5 0.75 1

-0.4

-0.2

0.2

0.4

0.6

A BC

8.1.2 Estabilidade de Sistemas Lineares

Considere-se um sistema de n equações lineares yt = Ayt−1 com a condição inicial y0 e seja

r = max {|λi| : λi é um valor próprio de A (i = 1, ..., n)} . (8.1)

Teorema 29 (a) Se r < δ < 1 então existe uma constante C > 0 tal que

kytk ≤ Cδt ky0k

para t ≥ 0, para qualquer y0 ∈ R. Além disso verifica-se limt→+∞ kytk = 0.(b) Se r > 1 então

algumas soluções do sistema tendem para +∞. (c) Se r ≤ 1 e se a multiplicidade algébricade todos os valores próprios que verificam |λ| = 1 for igual a um então existe uma constante

C > 0 tal que kytk ≤ C ky0k para t ≥ 0.

208

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Dem. (a) Pelo teorema 27 a solução do SEDF é

yt = Aty0 =

Ãn−1Xi=0

ci+1,tMi

!y0.

Desta forma,

kytk ≤n−1Xi=0

|ci+1,t| kMiy0k

≤n−1Xi=0

|ci+1,t|D ky0k (8.2)

com kMik ≤ D < +∞ (D é escalar)3. Mostra-se agora que existe uma constante B tal que

|ci,t| ≤ Bδt com r < δ < 1, para i = 1, 2, ..., n. Tem-se, atendendo à equação (7.3) e a |λi| < r,

i = 1, ..., n,

|c1,t| ≤ rt;

|c2,t| ≤ trt−1

(ver exercícios). De igual forma, deixa-se como exercício mostrar que

|c3,t| ≤ t (t− 1)2

rt−2.

Em geral, pode-se mostrar, |ci,t| ≤ pi−1 (t) rt−i+1 onde pi−1 (t) é um polinómio de grau i−1 emt. Nestas condições existe uma constante B > 0 tal que |ci,t| ≤ Bδt com r < δ < 1. Retomando

a equação (8.2), vem

kytk ≤n−1Xi=0

|ci+1,t|D ky0k

≤n−1Xi=0

BδtD ky0k

≤ Cδt ky0k ,

3Note-se que M1, ...,Mn−1 são matrizes de escalares e, portanto, a sua norma é majorável por qualquerconstante D apropriada.

209

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com C = nBD. É imediato agora verificar que limt→+∞ kytk = 0 (pois 0 < δ < 1).

(b) No caso r > 1, existe pelo menos um valor próprio λ tal que |λ| > 1. Seja v o corre-

spondente vector próprio. Então φt = λtv é uma solução do SEDF (verifique) e°°λtv°° t→ +∞

quando t→ +∞.

(c) Suponha-se, sem perda de generalidade, que todos os valores próprios são tais que |λ1| =|λ2| = ... = |λn| = 1. Por hipótese, não há dois valores próprios iguais (pois a multiplicidade

algébrica de cada valor próprio é igual a um). É válida, assim, a expressão dada observação 17,

yt = PΛtP−1y0. Vem

kytk =°°PΛtP−1y0°°

≤ C°°Λt°° ky0k

= Cmax©|λ1|t , ..., |λn|tª ky0k

= C ky0k .¥

Notar que se λ é número complexo então |λ| = |α+ βi| =pα2 + β2.

Resulta do teorema anterior que o ponto fixo y = 0 é, assintonticamente estável se r < 1,

instável se r > 1, e estável se r ≤ 1 e se a multiplicidade algébrica de todos os valores própriosque verificam |λ| = 1 for igual a um.

Exemplo 84 Estude-se a estabilidade do sistema

y1t

y2t

= 1 −50.25 −1

y1t−1

y2t−1

.Os valores próprios são ±1

2 i. Logo r = 12 . Como r < 1 conclui-se que o ponto fixo y = 0 é

assimptoticamente estável. Nas figuras seguintes analisa-se graficamente a dinâmica do sistema

admitindo y0 = (10, 1)T . Na figura 8-6 apresentam-se as trajectórias y1t e y2t. Na figura 8-7

representa-se no plano os pontos (y1t, y2t) com t = 0, 1, ..., 10. Ambas as figuras 8-6 e 8-7 são

ilucidativas quanto à estabilidade do sistema. Em ambos os casos se observa y1t → 0, y2t → 0

quanto t→ 0.

210

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Figura 8-6: Trajectórias y1t e y2t (traço grosso)

2 4 6 8 10t

-2

-1

1

2

3y1 y2

Figura 8-7: Órbita (y1t, y2t) (t = 0, 1, ..., 10) com valor inicial (10, 1)

-2 2 4 6 8 10y1

-1

1

2

3

4

5y2

211

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Exemplo 85 Considere-se o sistema de EDF

yt =

cos θ sen θ

− sen θ cos θ

yt−1.Os valores próprios são λ = cos θ±i sin θ e |cos θ − i sin θ| = |cos θ + i sin θ| =

pcos2 θ + sin2 θ =

1. Como a multiplicidade algébrica de todos os valores próprios que verificam |λ| = 1 é igual aum conclui-se que o ponto fixo y = 0 é estável.

8.1.3 Estabilidade de Sistemas Não Lineares

Linearização

O teorema seguinte fornece um método para analisar a estabilidade assimptótica no caso escalar

(EDF autónomas).

Teorema 30 Suponha-se que f : R→R tem derivada de primeira ordem contínua num intervaloaberto contendo o ponto fixo y. Então (a) se |f 0 (y)| < 1, y é assimptoticamente estável; (b) se|f 0 (y)| > 1, y é instável.

Dem. (a) Dado que, por definição,

limx→y

|f (x)− f (y)||x− y| = lim

x→y

|f (x)− y||x− y| =

¯f 0 (y)

¯então existe uma vizinhança Vε (y) de raio ε > 0, tal que, para |f 0 (y)| < α < 1,

|f (x)− y| < α |x− y| , x ∈ Vε (y) .

Resulta que x ∈ Vε (y)⇒ f (x) ∈ Vε (y) (pela desigualdade anterior, constata-se que f (x) está

mais "perto"de y do que x está de y, por um factor de ordem α < 1). É imediato verificar que

f (x) ∈ Vε (y)⇒ f2 (x) ∈ Vε (y) . Repetindo o argumento conclui-se f t (x) ∈ Vε (y) . Logo,

¯f2 (x)− y

¯= |f (f (x))− y| < α |f (x)− y| < α2 |x− y| .

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Por indução, conclui-se¯f t (x)− y

¯< αt |x− y|. Como αt → 0 segue-se que y é assimptoti-

camente estável. (b) Utilizando argumentos idênticos conclui-se que f t (x) se afasta cada vez

mais de y à medida que t → +∞.¥

Exemplo 86 Retome-se os exemplos 80 e 83. Com f (x) = 2x (1− x) tem-se f 0 (x) = 2− 4xe, portanto, pelo teorema 30, o ponto fixo 0 é instável pois |f 0 (0)| = 2 > 1 e o ponto 1/2 é

assimptoticamente estável pois |f 0 (1/2)| = 0 < 1.

Analise-se agora a estabilidade de sistemas de EDF. Tal como procedemos para o caso de

sistemas de equações diferenciais, uma forma de abordar a estabilidade de sistemas de EDF

consiste em linearizar f (x) em torno do ponto fixo y (o caso escalar apresentado atrás baseia-se

também no método da linearização). Suponha-se que f (x) possui derivadas de segunda ordem

contínuas. Então, pela fórmula de Taylor vem

fi (x) = fi (y) +∂fi (y)

∂xT(x− y) +

1

2(x− y)T

∂f2i (z)

∂x∂xT(x− y) , i = 1, ..., n

ou, mais compactamente,

f (x) = f (y) + f 0 (y) (x− y) + g (x) (8.3)

Note-se que f 0 (y) é o Jacobiano de f no ponto y (é uma matriz de constantes). Reescreva-se a

equação (8.3) na forma

f (x) = Ax+ g (x)

onde

A = f 0 (y) =

∂f1(y)∂x1

· · · ∂f1(y)∂xn

.... . .

...∂fn(y)∂x1

· · · ∂fn(y)∂xn

, (8.4)

g (x) = f (y)− f 0 (y) y +1

2

(x− y)T

∂f21 (z)

∂x∂xT(x− y)

...

(x− y)T ∂f2n(z)∂x∂xT

(x− y)

(note-se que z varia com x). Tem-se agora:

213

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Teorema 31 Suponha-se que f : Rn→Rn tem derivadas de segunda ordem contínuas num con-

junto aberto contendo o ponto fixo y. Dado r = max {|λi| : λi é um valor próprio de A (i = 1, ..., n)}e A é dada pela equação (8.4) tem-se, (a) se r < 1 então y é assimptoticamente estável; (b)

se r > 1 então y é instável.

Dem. Kelley e Peterson, (1991), p. 180.

Obviamente este teorema generaliza o teorema 30.

Exemplo 87 Considere-se o seguinte modelo presa-predador,

y1t = (1 + ρ) y1t−1 − 0.001 y1t−1y2t−11 + 0.0001y1t−1

y2t = (1− δ) y2t−1 + 0.00003y1t−1y2t−1

1 + 0.0001y1t−1

onde y1t e y2t representa, respectivamente, o número de presas e o número de predadores no

momento t, ρ é a diferença entre a taxa de nascimento e a taxa de mortalidade das presas e δ

é a taxa de mortalidade dos predadores. Suponha-se que ρ = 0.1 e δ = 0.01. Tem-se

f (x1, x2) :=

f1 (x1, x2)

f2 (x1, x2)

= 1.1x1 − 0.001 x1x2

1+0.0001x1

0.99x2 + 0.00003x1x2

1+0.0001x1

.Os pontos fixos resultam da resolução do sistema f (x1, x2) = (x1, x2) . Obtém-se dois pontos

fixos,

y1 =

00

, y2 =

344.828103.448

.Estude-se a estabilidade do ponto fixo y2, recorrendo-se ao teorema 31. Para o efeito determina-

se

A = f 0 (y2) =

∂f1(y2)∂x1

∂f1(y2)∂xn

∂fn(y2)∂x1

∂fn(y2)∂xn

.Depois de alguns cálculos obtém-se

A =

1.003 −0.33330.0029 1

.

214

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Figura 8-8: Trajectórias y1t e y2t (t = 0, 1, ..., 800)

200 400 600 800t

320

340

360

380

400y1

200 400 600 800t

100

102

104

106

108

y2

Os valores próprios são λ1, λ2 = 1.00167± 0.0310466i. Donde

|λ1| = |1.00167 + 0.0310466i| =p1.001672 + 0.03104662 = 1. 002,

|λ1| = |1.00167− 0.0310466i| =p1.001672 + 0.03104662 = 1. 002,

pelo que r = 1.002 > 1 e, portanto, o ponto fixo y2 é instável. As figuras 8-8 e 8-9 ilustram o

comportamento dinâmico do sistema.

Método Directo de Liapunov

Considere-se um sistema de EDF yt = f (yt−1) com a condição inicial y0 e seja y um ponto fixo

de f . Considere-se uma função real V de n variáveis nas seguintes condições: V é contínua

numa vizinhança Vε (y) , V (x) > 0 se x 6= y em Vε (y) e V (y) = 0. Uma função nestas condições

designa-se por função Liapunov. Defina-se

∆V (x) := V (f (x))− V (x)

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Figura 8-9: Órbita (y1t, y2t) com valor incial y10 = 344, y20 = 104 (a órbita expande-se àmedida que t aumenta)

320 340 360 380 400y1

100

102

104

106

108

y2

em Vε (y) (não confundir a função V com a vizinhança de z de raio ε, Vε (z)).

Teorema 32 Seja y um ponto fixo de f e assuma-se que f é contínua numa certa vizinhança

de y. Se (a) ∆V (x) ≤ 0 para todo o x ∈ Vε (y) então a solução y é estável; se (b) ∆V (x) < 0

para todo o x ∈ Vε (y) e x 6= y então a solução y é assimptoticamente estável; se (c) ∆V (x) > 0

para todo o ε > 0 e x ∈ Vε (y) e x 6= y então a solução y é instável.

Dem. Uma demonstração formal segue as linhas gerais da demonstração do teorema análogo

para sistemas de equações diferenciais (teorema 18).

Apresenta-se em alternativa uma explicação heurística do resultado. Imagine-se a função

V (x) como uma distância entre x e y com x ∈ Vε (y) . Considere-se 0 < δ < ε. Por hipótese

y0 ∈ Vδ (y) e, como, V (f (y0)) ≤ V (y0) o ponto y1 = f (y0) não se afasta de y (y1 não está

mais distante de y do que y0 está de y). Logo y1 ∈ Vδ (y) . Seguindo o mesmo raciocínio tem-se

que V (f (y1)) ≤ V (y1) implica y2 ∈ Vδ (y) . Iterando, conclui-se que yt ∈ Vδ (y) ⊂ Vε (y) .

Logo a solução y é estável. Suponha-se agora a desigualdade estrita V (f (x)) < V (x) . Por

hipótese y0 ∈ Vε (y) e V (f (y0)) < V (y0) implica kf (y0)− yk < α ky0 − yk, 0 < α < 1. Por seu

lado, a desigualdade V (f (y1)) < V (y1) implica ky2 − yk = kf (y1)− yk < α kf (y0)− yk <

α2 ky0 − yk . Iterando, conclui-se kyt − yk < αt kf (y0)− yk→ 0 quando t→ +∞. ¥

Exemplo 88 Considere-se yt = yt−1 − y3t−1. O único ponto fixo é y = 0. O teorema 30 é

inconclusivo, pois com f (x) = x − x3, tem-se |f 0 (0)| = 1. Considere-se a função V (x) = x2.

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Vem

∆V (x) =¡x− x3

¢2 − x2 = x6 − 2x4 = x4¡x2 − 2¢ < 0

no conjunto©x : |x| < √2ª = V√2 (y) . Logo o ponto fixo y = 0 é assimptoticamente estável.

Exemplo 89 Retome-se o exemplo 85,

yt =

cos θ sen θ

− sen θ cos θ

yt−1com ponto fixo,

y =

00

.Defina-se

V

x1

x2

= x21 + x22.

Facilmente se verifica V (y) = 0 e V (x) > 0 para x 6= y. Tem-se

∆V (x) = V

x1 cos θ + x2 sen θ

−x1 sen θ + x2 cos θ

− V

x1

x2

= (x1 cos θ + x2 sen θ)

2 + (−x1 sen θ + x2 cos θ)2 − x21 − x22

= 0.

Consequentemente o ponto fixo é estável.

8.1.4 Bacia do Escoadouro

Na literatura é usual designar-se um ponto fixo assimptoticamente estável como um escoad-

ouro (sink) e um ponto fixo instável como fonte (source). A designação escoadouro sugere que

o sistema dinâmico inicializado numa vizinhança do escoadouro converge para o escoadouro.

Utiliza-se também a designação bacia do escoadouro (basin of the skin) para definir o conjunto

de pontos W tal que se y0 ∈ W então yt = f t (y0) → y (onde y é um escoadouro). Analitica-

217

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mente escreve-se: W (y) =©y0 ∈ Rn : f t (y0)→ y

ª4. No exemplo 83, onde f (x) = 2x (1− x) ,

vimos que o ponto 1/2 é um escoadouro: qualquer ponto na vizinhança de 1/2 converge para

1/2. Uma inspecção da figura 8-5 sugere que a bacia do escoadouro é o conjunto (0, 1) , i.e.,

W (1/2) = (0, 1) .

O teorema seguinte tem aplicação no caso de EDF autónomas (não lineares).

Teorema 33 Seja E = {x : |f (x)− y| ≤ δ |x− y| , 0 < δ < 1} . Se existe um ε1 > 0 tal que

Vε1 (y) ⊂ E então

yt = f t (y0)→ y

para todo o y0 ∈ Vε1 (y) .

Dem. Se y0 ∈ Vε1 (y) então f (y0) ∈ Vε1 (y) e, por indução, conclui-se ft (y0) ∈ Vε1 (y) .

Vem

|f (y0)− y| ≤ δ |y0 − y|¯f2 (y0)− y

¯= |f (f (y0))− y|≤ δ |f (y0)− y|≤ δ2 |f (y0)− y| .

Por indução, ¯f t (y0)− y

¯ ≤ δt |y0 − y|

e como 0 < δ < 1 conclui-se que¯f t (y0)− y

¯→ 0 quando t→ +∞.¥

A figura 8-10 ilustra o teorema 33. O conjunto E corresponde ao intervalo (a, d) - trata-se

do conjunto de pontos x tais que |f (x)− y| < |x− y| ; nas regiões II e V a função satisfaz estadesigualdade. Existem pontos y0 de E que não implicam yt = f t (y0) → y. O ponto c é um

desses casos. Verifique-se que f (c) /∈ E. No entanto, todos os pontos pertencentes a Vε1 (y)

convergem para y.

O teorema 33 não fornece toda a bacia do escoadouro. Na figura 8-11 a função f (x) , com

ponto fixo y = 1, está definida na região V para x < 1 e na região III para x > 1. Apenas

4No caso não autónomo deve ler-se W (y) = {y0 ∈ Rn : yt (y0)→ y} .

218

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Figura 8-10: Ilustração do Teorema 33

3211

ε

3211

ε

y

a b c d

x

xy −2

IIV

( )daE ,=

( ) ( )bayV ,1

os pontos x pertencentes ao intervalo (A, 1) verificam |f (x)− y| < |x− y| . Concretamente,E = {x : |f (x)− y| < δ |x− y| , 0 < δ < 1} = (A, 1) mas não existe um ε > 0 tal que Vε (y) =

Vε (1) ⊂ E e, portanto, o teorema 33 não é aplicável. Também o teorema 30 não é aplicável,

pois |f 0 (1)| = 1 (admitindo que f 0 (x) existe numa vizinhança de 1). Verifica-se, no entanto,

por simples inspecção gráfica, que o sistema dinâmico definido por f (x) converge para y = 1

se o valor inicial pertencer a (A, 1) . Além disso, qualquer ponto do intervalo (1, B) tem como

aplicação um ponto de (A, 1) . Ou seja, embora não se verifique |f (x)− y| < |x− y| quandox ∈ (1, B) , os ponto de (1, B) movem-se para (A, 1) onde aqui se tem |f (x)− y| < |x− y| parax ∈ (A, 1) . Assim, a bacia do escoadouro é (A, 1) ∪ (1, B) ∪ {1} = (A,B) .

A discussão precedente sugere uma forma de se determinar a bacia do escoadouro. Suponha-

se que E1 é um conjunto de pontos y0 tais que f t (y0) → y e y0 ∈ E1 (este conjunto pode

determinar-se através do teorema 33). Num segundo passo determina-se o conjunto E2 =

{x : f (x) ∈ E1} e, por recorrência, Ei+1 = {x : f (x) ∈ Ei} . Se em dado momento Ek+1 = Ek

então a bacia do escoadouro é dado pela união dos conjuntos E0is.

Exemplo 90 Considere-se f (x) =¡3x− x3

¢/2 (figura 8-12). Os pontos fixos são −1, 0, 1.

Analise-se o ponto 1. É fácil verificar que E1 = (0, b) =¡0, 1/2

¡−1 +√17¢¢ ⊂ W (1) (o

219

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Figura 8-11: Bacia do Escoadouro

-0.5 0.5 1 1.5 2 2.5

-0.5

0.5

1

1.5

2

2.5

II

I

IIIIV

V

VI

f(x)

A B

teorema 33 é aplicável: numa vizinhança do ponto 1, a função f (x) encontra-se nas regiões II

e V; no entanto, o teorema fornece um primeiro conjunto contido em E1). Tem-se agora

E2 = {x : f (x) ∈ E1} = {x : 0 < f (x) < b} = (e, c) ∪ (b, d) ⊂W (1)

onde e = −2, 11569, c = −√3, d = √3. Este procedimento pode ser continuado com E3 =

{x : f (x) ∈ E2}, E4, etc.

Exemplo 91 Considere-se f (x) = tanx, −π/2 < x < π/2. O ponto fixo é y = 0 (pois

f (0) = 0). Na figura 8-13 verifica-se que a função f (x) não se encontra nem na região II nem

na região V (neste caso concreto, qualquer que seja o valor inicial, o sistema dinâmico afasta-se

cada vez mais de y = 0). Assim, y = 0 não é escoadouro.

Exemplo 92 Considere-se f (x) = 3x (1− x) . Verifica-se que os pontos fixo são 0 e 2/3. Na

figura 8-14 analisa-se o ponto fixo 2/3 (tendo-se representado para o efeito as curvas x e −x+2y = −x+4/3). O teorema 30 não esclarece a natureza do ponto fixo y = 2/3 pois |f 0 (2/3)| = 1.Também o teorema 33 não é aplicável pois embora E = {x : |f (x)− 2/3| < |x− 2/3|} = (0, 2/3)não existe um ε > 0 tal que Vε (2/3) ⊂ E. Também não se pode concluir imediatamente que o

220

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Figura 8-12: Bacia do Escoadouro da Aplicação f (x) =¡3x− x3

¢/2

1a e c bd

II

IIIIV

V

IVI

Figura 8-13: f (x) = tg x

-1 -0.5 0.5 1

-1.5

-1

-0.5

0.5

1

1.5I

II

IIIIV

V

VI

221

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Figura 8-14: f (x) = 3x (1− x)

0.2 0.4 0.6 0.8 1

-0.5

0.5

1

1.5

I

II

IIIIV

V

VI

intervalo (0, 2/3) pertence à bacia do escoadouro (verifique-se isso através de inspecção gráfica).

Este exemplo mostra as limitações dos teoremas 30 e 33. Pode-se provar que o ponto 2/3 não é

de facto um escoadouro5 (i.e. um ponto fixo assimptoticamente estável) pelo que não há lugar à

determinação da bacia do escoadouro. Na figura representa-se a trajectória yt com t = 1, ..., 50

Um resultado que ultrapassa, em certas circunstâncias, as limitações apontadas aos teoremas

30 e 33 e, além disso, é directamente aplicável a sistemas de equações às diferenças consiste no

seguinte.

Teorema 34 Admitam-se as condições do teorema 32 e suponha-se ∆V (x) < 0 para todo o

x ∈ Vε (y) e x 6= y. Se y0 ∈ Vε (y) então f t (y0)→ y quando t→ +∞.

Logo Vε (y) ⊆W (y) .

5Prova-se que não existe um ε > 0 tal que f (2/3− ε)− 2/3 > 2/3− f2 (2/3− ε) .

222

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Figura 8-15: Trajectória de yt = 3yt−1 (1− yt−1), y0 = 0.5 (t = 1, ..., 50)

10 20 30 40 50 t

0.55

0.6

0.65

0.7

0.75y

Exemplo 93 Considere-se

y1t = y2t−1 − y2t−1¡y21t−1 + y22t−1

¢y2t = y1t−1 − y1t−1

¡y21t−1 + y22t−1

¢.

Estude-se a estabilidade do ponto fixo y = (0, 0)T e determine-se a respectiva bacia do escoad-

ouro. Para o efeito tome-se a função V (x1, x2) = x21 + x22. Vem

∆V (x) =¡x2 − x2

¡x21 + x22

¢¢2+¡x1 − x1

¡x21 + x22

¢¢2 − ¡x21 + x22¢

= ...

=¡x21 + x22

¢2 ¡−2 + ¡x21 + x22¢¢

< 0

no conjunton(x1, x2) :

px21 + x22 <

√2o= V√2 (y) ⊆W (y) .

Exemplo 94 Retome-se o exemplo 88, yt = yt−1 − y3t−1. Resulta óbvio que V√2 (y) ⊆W (y) .

Exemplo 95 Retome-se o exemplo 90, yt =¡3yt−1 − y2t−1

¢/2. Analise-se a bacia do escoad-

223

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Figura 8-16: Gráfico da função ∆V (x) = 14 (x− 4) (x− 1)2 x

1 2 3 4

-3

-2

-1

1

2

ouro do ponto y = 1 e, para o efeito, considere-se V (x) = (x− 1)2 . Tem-se

∆V (x) =¡¡3x− x2

¢/2− 1¢2 − (x− 1)2

=9

4x2 − x− 3

2x3 +

1

4x4

=1

4(x− 4) (x− 1)2 x.

A função∆V (x) está representada na figura 8-16, a qual permite concluir que V1 (1) = {x : |x− 1| < 1} ⊆W (1) . No exemplo 90 foi-se um pouco mais longe. De facto, observou-se que V1 (1) ⊂W (1).

A terminar esta secção mostra-se que se um ponto pertence a uma certa bacia de escoadouro

então esse ponto não pode pertencer a outra bacia de escoadouro. Assim,

Teorema 35 Se y1 e y2 são escoadouros e y1 6= y2 então W (y1) ∩W (y2) = ∅.

Dem. Mostra-se que W (y1) ∩W (y2) 6= ∅ ⇒ y1 = y2. Seja y0 ∈ W (y1) ∩W (y2) . Então

para cada ε > 0 existe um n1 ∈ N tal que t ≥ n1 implica°°f t (y0)− y1

°° < ε/2 e existe um

n2 ∈ N tal que t ≥ n2 implica°°f t (y0)− y2

°° < ε/2. Logo as duas desigualdades verificam-se

simultaneamente para o maior dos n0s, i.e. definindo n3 = max {n1, n2} tem-se que t ≥ n3

implica°°f t (y0)− y1

°° < ε/2 e°°f t (y0)− y2

°° < ε/2. Utilizando a desigualdade triangular para

224

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t ≥ n3 vem

ky1 − y2k =°°y1 − f t (y0)−

¡y2 − f t (y0)

¢°°≤ °°y1 − f t (y0)

°°+ °°y2 − f t (y0)°°

2+

ε

2= ε.

Como a distância entre y1 e y2 é menor do que ε para cada ε > 0, deverá ter-se y1 = y2.¥

8.2 Pontos Periódicos

8.2.1 Definições

Definição 20 Um vector p ∈ Rn é um ponto periódico de período k se

fk (p) = p (8.5)

e k é o menor inteiro positivo tal que (8.5) se verifica (i.e., fs (p) 6= p para s = 1, 2, ..., k − 1).A órbita de valor inicial p diz-se uma órbita periódica de período k.

Note-se que se p é um ponto periódico de período 2 então p é um ponto fixo de f2. O

recíproco não é verdade. Por exemplo, um ponto fixo de f2 pode ser também um ponto fixo de

f e, neste caso, de acordo com a definição, este ponto tem período 1.

Considere-se uma órbita de valor inicial p, i.e.,©p, f (p) , f2 (p) , ...

ª. Se p é um ponto perió-

dico de período 3, p deve repetir-se de três em três iterações. Por exemplo,©p, f (p) , f2 (p) , p, ...

ª.

Mas f (p) e f2 (p) também se repetem de três em três iterações,©.., p, f (p) , f2 (p) , p, f (p) , f2 (p) , p...

ª.

Neste exemplo, é suficiente identificar a órbita de período 3 através dos três elementos©p, f (p) , f2 (p)

ª(se p é ponto fixo de f e, portanto, ponto periódico de período 1, então a órbita periódica de

período 1 é constituída apenas pelo elemento {p}). Naturalmente, b = f (p) e c = f2 (p) são

também pontos periódicos de período 3. O teorema seguinte estabelece este resultado.

Teorema 36 Seja p um ponto periódico de f de período k. Então f (p) , f2 (p) , ..., fk−1 (p) são

também pontos periódicos de período k.

225

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Dem. Considere-se um ponto genérico do conjunto©f (p) , f2 (p) , ..., fk−1 (p)

ª, pi = f i (p) ,

com i = 1, 2, ..., k−1. Mostra-se em primeiro lugar que pi não é um ponto fixo de fs com s < k,

caso contrário pi não poderia ser candidato a ponto periódico de período k (definição 20).

Suponha-se no entanto que pi é ponto fixo de fs. Viria

fs (pi) = pi ⇔ fs¡f i (p)

¢= f i (p)⇔ fs+i (p) = f i (p)

o que significa que p repete de s em s iterações, ou seja que p é ponto fixo de fs. Esta conclusão

contradiz a hipótese de p ser ponto periódico de período k > s (i.e., a primeira vez que p se

repete é após k interacções). Basta agora ver que pi = f i (p) é ponto fixo de fk. Vem

fk (pi) = fk¡f i (p)

¢= f i

³fk (p)

´= f i (p) = pi.¥

Exemplo 96 Considere-se a equação yt = ayt−1 (1− yt−1) . Tem-se portanto f (x) = ax (1− x) .

Investigue-se se existem pontos periódicos de período 2. Determine-se f2 (x)

f2 (x) = f (f (x)) = a (f (x)) (1− f (x)) = a (ax (1− x)) (1− ax (1− x)) .

Poderíamos também obter f2 (x) considerando

yt = ayt−1 (1− yt−1)

= a (ayt−2 (1− yt−2)) (1− (ayt−2 (1− yt−2)))

o que permitiria deduzir f2 (x) = a (ax (1− x)) (1− ax (1− x)) . Para determinar eventuais

pontos peródicos resolve-se a equação f2 (x) = x em ordem a x. Factorizando f2 (x)−x obtém-

se

−x (1− a+ a x)¡1 + a− ax− a2 x+ a2 x2

¢= 0

pelo que se conclui que os pontos fixos de f2 são

x1 = 0, x2 =−1 + a

a, x3 =

12 +

12a+

12

p(−3− 2a+ a2)

a, x4 =

12 +

12a− 1

2

p(−3− 2a+ a2)

a.

(8.6)

226

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Figura 8-17: Trajectória de yt = 3.3yt−1 (1− yt−1) , y0 = 0.1

10 20 30 40 50t

0.2

0.4

0.6

0.8y

Estes valores serão pontos periódicos de período 2 se não forem pontos fixos de f . Ora resolvendo

f (x) = x

sai y = 0 e y = −1+aa . Retome-se os pontos fixos apresentados em (8.6). Conclui-se que os

pontos 0 e (−1 + a) /a não são pontos peródicos de período 2 pois eles são pontos fixos de f (e,

portanto são pontos peródicos de período 1). Relativamente a x3 conclui-se que

12 +

12a+

12

p(−3− 2a+ a2)

a=−1 + a

a

se a = 1, e12 +

12a+

12

p(−3− 2a+ a2)

a= 0

se a = −1. Logo x3 é ponto periódico de período 2 se a 6= 1 e a 6= −1. Seguindo o mesmoraciocínio conclui-se que x4 é ponto periódico de período 2 se a 6= 3 e a 6= −1. Para concretizarsuponha-se que a = 3.3. Tem-se y = 0, y = −1+a

a = . 696 97, x3 = . 823 6 e x4 = . 479 43. Na

figura 8-17 é evidente que {0. 823 6, 0.47943} forma uma órbita de período 2.Outra forma (embora pouco eficiente) de confirmarmos as conclusões emergentes da figura

8-17 consiste em se calcular iterativamente a trajectória y. A tabela seguinte fornece os valores

de yt ao longo do tempo, com y0 = 0.1. É óbvio, a partir de certo valor de t (digamos, a partir

de t = 20) yt repete os valores .8236 e .4794 de duas em duas iterações.

227

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Figura 8-18: Sucessão yt = 3.3yt−1 (1− yt−1) , y0 = 0.1, t = 1, ..., 41

t: 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13yt: 0.1000 0.2970 0.6890 0.7071 0.6835 0.7139 0.6740 0.7251 0.6577 0.7429 0.6303 0.7690 0.5863 0.8004

t: 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27yt: 0.5271 0.8226 0.4816 0.8239 0.4788 0.8235 0.4796 0.8236 0.4794 0.8236 0.4794 0.8236 0.4794 0.8236

t: 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41yt: 0.4794 0.8236 0.4794 0.8236 0.4794 0.8236 0.4794 0.8236 0.4794 0.8236 0.4794 0.8236 0.4794 0.8236

Figura 8-19: Gráfico Teia de Aranha da equação yt = 3.3yt−1 (1− yt−1)

-0.5 -0.25 0.25 0.5 0.75 1

-0.4

-0.2

0.2

0.4

0.6

0.8

É também interessante confirmarmos que . 823 6 e .47943 são pontos periódico de período 2

a partir do gráfico teia de aranha, figura 8-19.

Exemplo 97 Retome-se o exemplo 81. Tem-se

f2 (x) = f

f

x1

x2

= f

x2

x2x1

=

x2x1x2x1x2

= x2

x1

1x1

228

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e

f3 (x) = f

f

f

x1

x2

= f

x2x1

1x1

=

1x11x1x2x1

= 1

x1

1x2

.Deixa-se como exercíco verificar que não existem ponto periódicos de período 2 e existem

três pontos periódicos de período 3.

Um modelo que pode gerar pontos periódico é o modelo linear por troços (ou, simplesmente,

modelo limiar). Assume-se um comportamento diferenciado do sistema dinâmico consoante o

estado do sistema no momento t−1, concretamente, consoante yt−1 se encontre abaixo ou acimade certo limiar L. No caso mais simples o modelo corresponde a

yt =

c1 + φ1yt−1, yt−1 < L

c2 + φ2yt−1, yt−1 ≥ L.

Para concretizar considere-se o exemplo

yt =

1 + 0.5yt−1, yt−1 < 0

−1− 0.5yt−1, yt−1 ≥ 0.

A função f (x) representa-se na forma

f (x) =

1 + 0.5x x < 0

−1− 0.5x x ≥ 0.

A função f (x) pode não ser contínua (no limiar L), como o exemplo precedente mostra. O

modelo seguinte, com c1 = L (φ2 − φ1) + c2, define uma função contínua no ponto L.

yt =

L (φ2 − φ1) + c2 + φ1yt−1, yt−1 < L

c2 + φ2yt−1, yt−1 ≥ L.

229

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Figura 8-20: Gráfico Teia de Aranha. Os valores 0.4 e -1.2 são pontos periódicos de período 2

-4 -2 2 4

-4

-2

2

4

15.01 −−−= tt yy15.01 −+= tt yy

A função f (x) é portanto

f (x) =

L (φ2 − φ1) + c2 + φ1x, x < L

c2 + φ2x, x ≥ L.

Logo f (L) = c2+φ2L e limx↑L f (x) = L (φ2 − φ1)+c2+φ1L = c2+Lφ2. Podemos ainda exigir

a existência de um ponto fixo no ponto L fazendo

L (φ2 − φ1) + c2 + φ1x = x, Solução: x =−Lφ2 + Lφ1 − c2

φ1 − 1

c2 + φ2x = x, Solução: x = − c2φ2 − 1

e, agora resolvendo, −Lφ2+Lφ1−c2φ1−1 = − c2φ2−1 , sai c2 = L (1− φ2) . Assim, tem-se

f (x) =

L (φ2 − φ1) + L (1− φ2) + φ1x, x < L

L (1− φ2) + φ2x, x ≥ L.

230

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ou

f (x) =

L (1− φ1) + φ1x, x < L

L (1− φ2) + φ2x, x ≥ L.

Veja-se que

f (L) = L (1− φ2) + φ2L = L

e

limx↑L

f (x) = L (1− φ1) + φ1L = L.

8.2.2 Estabilidade dos Pontos Periódicos

Tal como no caso dos pontos fixos de f, pontos periódicos podem ser estáveis ou instáveis.

Intuitivamente, um ponto periódico de período k é estável se qualquer trajectória iniciada numa

vizinhança desse ponto não se afasta desse ponto de k em k iterações, para todo o t (da mesma

forma se interpreta ponto periódico assimptoticamente estável e instável). O facto essencial é

que um ponto periódico de f de período k é um ponto fixo de fk. Desta forma, a definição

de estabilidade para pontos periódicos pode basear-se na definição 19, sendo que agora deverá

ler-se fk em lugar de f (f t deverá ler-se fkt). Em geral são aplicáveis os teoremas precedentes,

desde que se procedam às necessárias adaptações. Por exemplo, o teorema 30 estabelece que

y é assimptoticamente estável se |f 0 (y)| < 1 e instável no caso contrário. Se as condições do

teorema 30 se aplicarem, e fazendo g (x) = fk (x) , podemos estabelecer que o ponto periódico

p de período k é assimptoticamente estável se |g0 (p)| < 1 e instável no caso contrário.Vimos no teorema 36 que, se p é ponto periódico de período k então a aplicação f admite

adicionalmente k−1 pontos periódicos. Se p exibe uma certa característica qualitativa que con-clusões podemos tirar para os demais pontos periódicos? O teorema e a demonstração seguintes

mostra que todos os pontos periódicos partilham das mesmas propriedades qualitativas. Desta

forma pode-se falar de órbitas periódicas estáveis e instáveis (em alternativa a pontos periódicos

estáveis e instáveis).

Teorema 37 Seja f uma aplicação de classe C1 em R e seja {p1, p2, ..., pk} uma órbita periódica

231

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de período k. Então {p1, ..., pk} é assimptoticamente estável (escoadouro) se

¯f 0 (pk) ...f 0 (p1)

¯< 1

e instável (fonte) se ¯f 0 (pk) ...f 0 (p1)

¯> 1.

Dem. Seja g (x) = fk (x). O ponto pi (i = 1, ..., k) é um ponto periódico de período k

assimptoticamente estável (ou escoadouro se pi é um ponto fixo assimptoticamente estável (ou

escoadouro) de g. De forma análoga, o ponto pi é um ponto periódico de período k instável (ou

fonte) se pi é um ponto fixo instável (ou fonte) de g. De acordo com o teorema 30, se |g0 (pi)| < 1então pi é um escoadouro de g e se |g0 (pi)| > 1 então p1 é uma fonte de g. O teorema fica

demonstrado se mostrarmos ser válida a equação |g0 (pi)| = |f 0 (pk) ...f 0 (p1)| para i = 1, ..., k.Vem agora, pela derivação de funções composta,

g0 (x) =³fk (x)

´0= (f(...f(f(x))))0 = f 0

³fk−1 (x)

´f 0³fk−2 (x)

´...f 0 (f (x)) f 0 (x) . (8.7)

Com x = p1 tem-se

g0 (p1) = f 0³fk−1 (p1)

´f 0³fk−2 (p1)

´...f 0 (f (p1)) f 0 (p1) . (8.8)

Naturalmente, p2 = f (p1) , p3 = f2 (p1) , ..., pk = fk−1 (p1) , pelo que, a equação (8.8) pode

escrever-se na forma

g0 (p1) = f 0 (pk−1) f 0 (pk−1) ...f 0 (p2) f 0 (p1) . (8.9)

(Assim, |g0 (p1)| < 1 é equivalente a |f 0 (pk−1) f 0 (pk−1) ...f 0 (p2) f 0 (p1)| < 1). Estude-se agora

p2. Vem, pela fórmula (8.7) no ponto x = p2,

g0 (p2) = f 0³fk−1 (p2)

´f 0³fk−2 (p2)

´...f 0 (f (p2)) f 0 (p2) .

Naturalmente, p3 = f (p2) , p4 = f2 (p2) ..., pk = fk−2 (p2) . Por outro lado, fk−1 (p2) = fk−1 (f (p1)) =

fk (p1) = p1. Assim, g0 (p2) é igual ao lado direito da equação (8.9). Considere-se agora um

232

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ponto pi genérico. Vem, pela fórmula (8.7) no ponto x = pi,

g0 (pi) = f 0³fk−1 (pi)

´f 0³fk−2 (pi)

´...f 0 (f (pi)) f 0 (pi) .

Naturalmente, pi+1 = f (pi) , pi+2 = f2 (pi) ..., pk = fk−i (pi) . Por outro lado, fk−i+1 (pi) =

f¡fk−i (pi)

¢= f (pk) = p1, f

k−i+2 (pi) = ... = p2, fk−i+(i−1) (pi) = pi−1. Assim, g0 (pi) é igual

ao lado direito da equação (8.9).¥

Conclui-se da demonstração anterior que se pi é um ponto periódico assimptoticamente

estável (instável) da órbita {p1, ...pk} então pj é também um ponto periódico assimptoticamenteestável (instável).

Exemplo 98 Considere-se a EDF yt = 3.5x (1− x) . Utilizando-se um programa de Matemática

obtiveram-se os seguintes resultados:

k Pontos Fixos de fk (os pontos periódicos estão em negrito)

1 {0,0.714286}2 {0, 0.714286,0.428571,0.857143}3 {0, 0.714286}4 {0, 0.714286, 0.428571, 0.857143,0.38282,0.500884,0.826941,0.874997}

Analisa-se agora a estabilidade dos pontos periódicos na tabela seguinte.

k Análise da Estabilidade dos Pontos Periódicos (teorema 37)

1 |f 0 (0)| = 3.5, |f 0 (0, 0.714286)| = 1.52

¯f 0 (0.428571) f 0 (0.857143)0

¯= 1.25

3 −4 |f 0 (0.38282) f 0 (0.500884) f 0 (0.826941) f 0 (0.874997)| = 0.03

Os resultados apresentados na tabela anterior podem também ser obtidos da seguinte forma

¯¡f2 (0.428571)

¢0 ¯=¯¡f2 (0.857143)

¢0 ¯= 1.25¯¡

f4 (0.38282)¢0 ¯=¯¡f4 (0.500884)

¢0 ¯=¯¡f4 (0.826941)

¢0 ¯=¯¡f4 (0.874997)

¢0 ¯= 0.03.

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Figura 8-21: Gráfico Teia de Aranha da equação yt = 3.5yt−1 (1− yt−1)

0.2 0.4 0.6 0.8 1 x

0.2

0.4

0.6

0.8

1 f

Naturalmente esta segunda alternativa é bastante mais trabalhosa. Conclui-se que todos os

pontos periódicos de período k = 4 são assimptoticamente estáveis; todos os outros pontos em

análise são instáveis. O gráfico 8-21 permite identificar um comportamento periódico de período

k = 4.Tem interesse ainda observar o gráfico teia de aranha do modelo f4 (x) - ver figura 8-

22. Observe-se (talvez com alguma dificuldade) que a função f4 corta o eixo de 45o oito vezes

(considerando também o ponto zero). Este facto corrobora a primeira tabela deste exemplo

(última linha).

8.3 Aplicação I (Problema de Afectação de Turmas)

Com a entrada do plano de estudos 2002/2003 os alunos da licenciatura de Gestão estão sujeitos

às seguintes regras: 1) as disciplinas de Matemática I e II funcionam nos dois semestres; 2) um

aluno só pode frequentar Matemática II se concluir Matemática I com nota positiva; 3) um

aluno que não conclua Matemática I no primeiro semestre poderá frequentar Matemática I

no segundo semestre; caso não conclua Matemática I no segundo semestre, deverá frequentar

Matemática I no primeiro semestre do ano seguinte; 4) um aluno que não conclua Matemática

II no segundo semestre poderá frequentar Matemática II no primeiro semestre do ano seguinte.

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Figura 8-22: Gráfico Teia de Aranha do Modelo f4 (x)

0.2 0.4 0.6 0.8 1x

0.2

0.4

0.6

0.8

1f

O problema que se coloca nesta aplicação consiste em determinar (aproximadamente) o número

de alunos que irão frequentar Matemática I e II nos próximos anos. Para o efeito, admita-se

o seguinte: todos os anos entram E alunos no primeiro ano do curso de gestão; a taxa de

aprovação a Matemática I é α e a taxa de aprovação a Matemática II é β. Seja, yij,t o número

de alunos que frequentam Matemática i (i = I, II) no semestre j (j = 1, 2) no ano lectivo t. As

quatro variáveis são agrupadas no vector yt

yt = (y11,t, y12,t, y21,t, y22,t)T .

Convencione-se que t = 1 corresponde ao ano lectivo de arranque do novo plano de estudos

(englobando os dois semestres lectivos) e seja M1 e M2 o número de alunos do antigo plano de

estudos inscritos, respectivamente, em Matemática I e Matemática II no ano lectivo 2002/2003.

235

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A condição inicial y1 é então

y11,1 = E +M1

y12,1 = (1− α) (E +M1)

y21,1 = M2

y22,1 = α (E +M1) + (1− β)M2.

É fácil verificar as seguintes relações dinâmicas entre as variáveis

y11,t = E + (1− α) y12,t−1

y12,t = (1− α) y11,t

y21,t = (1− β) y22,t−1

y22,t = αy11,t + (1− β) y21,t.

Por exemplo, a equação y11,t = E + (1− α) y12,t−1 estabelece que o número de alunos em

Matemática I no primeiro semestre é igual ao número de alunos que entram no instituto mais

os alunos que reprovaram em Matemática I no segundo semestre do ano lectivo anterior. A

equação y22,t = αy11,t + (1− β) y21,t estabelece que o número de alunos em Matemática II no

segundo semestre é igual ao número de alunos aprovados em Matemática I (primeiro semestre)

mais o número de alunos que reprovaram em Matemática II no primeiro semestre. O sistema

anterior pode (e deve) escrever-se na forma habitual yt = Ayt−1 + g. Assim,

y11,t = E + (1− α) y12,t−1

y12,t = (1− α) (E + (1− α) y12,t−1)| {z }y11,t

y21,t = (1− β) y22,t−1

y22,t = α(E + (1− α) y12,t−1)| {z }y11,t

+ (1− β) (1− β) y22,t−1| {z }y21,t

236

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ou seja

y11,t

y12,t

y21,t

y22,t

| {z }

yt

=

0 1− α 0 0

0 (1− α)2 0 0

0 0 0 1− β

0 α (1− α) 0 (1− β)2

| {z }

A

y11,t−1

y12,t−1

y21,t−1

y22,t−1

| {z }

yt−1

+

E

(1− α)E

0

αE

| {z }

g

.

A solução do SED yt = Ayt−1 + g dada a condição inicial acima estabelecida pode obter-se

a partir da fórmula (7.16). A solução é todavia demasiadamente extensa para ser apresentada.

Representa-se a seguir apenas as soluções respeitantes às duas primeiras linhas do vector yt,

y11,t =

³−1 + (−1 + α)2t

´(−1 + α)2E + (−2 + α) (−1 + α)2t αM1

(−2 + α) (−1 + α)2 α

y12,t = −³−1 + (−1 + α)2t

´(−1 + α)2E + (−2 + α) (−1 + α)2t αM1

(−2 + α) (−1 + α) α.

Note-se, para α > 0,

limt→+∞ y11,t =

E

α (2− α), lim

t→+∞ y12,t =E (1− α)

α (2− α)

Em particular, se α = 1 (100% de aprovações) então limt→+∞ y11,t = E e limt→+∞ y12,t = 0.

Determine-se agora os pontos fixos, i.e., os pontos y : Ay + g = y. Tem-se

y = (A− I)−1 (−g) =

−1 −α+ 1 0 0

0 (−α+ 1)2 − 1 0 0

0 0 −1 −β + 10 α (−α+ 1) 0 (−β + 1)2 − 1

−1 −E

− (1− α)E

0

−αE

=

E

α(2−α)E(1−α)α(2−α)(1−β)E

(2−α)(2−β)βE

(2−β)(2−α)β

. (8.10)

237

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Os valores próprios da matriz A são©0 (raiz dupla), α2 − 2α+ 1, β2 − 2β + 1ª; assim,

r = max©|0| , ¯α2 − 2α+ 1¯ , ¯β2 − 2β + 1¯ª .

É fácil verificar que r < 1 se α > 0 e β > 0 e, nestas circunstâncias, o ponto de equilíbrio y

(equação (8.10)) é assimptoticamente estável (teorema 29). No caso α = 0 ou β = 0 não existe

ponto fixo e verifica-se kytk → +∞ quando t → +∞ para qualquer valor inicial. Supondo

α, β e E fixos (ano após ano) e α, β > 0 então o número de alunos nas duas disciplinas de

matemática, primeiro e segundo semestre, tenderá para o vector de constantes (8.10). Vejam-se

alguns cenários: suponha-se α = .8, β = .8 e E = 180. Neste caso, yt converge para o vector

h187. 5 37. 5 31. 25 156. 25

iT(para calcular estes valores utilizou-se a expressão (8.10) e o facto de que yt é assimptoticamente

estável quando α > 0 e β > 0). O número de turmas a constituir (supondo que cada turma

comporta 30 estudantes) é a seguinte: 6 turmas de Matemática I no primeiro semestre, entre

uma a duas turmas de Matemática I no segundo semestre, uma turma de Matemática II no

primeiro semestre e 5 turmas de Matemática II no segundo semestre. Se as taxas de aprovação

forem de apenas 0.5 em ambas as cadeiras yt converge para o vector

h240 120 80 160

iT.

Várias generalizações são possíveis: 1) a taxa de aprovação em Matemática I no primeiro

semestre pode diferir da taxa de aprovação de Matemática I do segundo semestre; 2) a taxa

de aprovação em Matemática II no primeiro semestre pode diferir da taxa de aprovação de

Matemática II do segundo semestre e 3) o número de novos alunos que entram todos os anos

no instituto, E, pode variar ao longo do tempo.

8.4 Aplicação II (Método Newton-Raphson)

Vários problemas lidam com a questão da determinação das raízes da equação g (x) = 0, i.e.,

{x : g (x) = 0} (por exemplo, num problema de optimização, para se determinarem os pontos de

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críticos de uma função f de classe C1, é necessário resolver-se o sistema f 0xi (x) = 0 em ordem àsvariáveis xi; a determinação dos pontos de estacionaridade no âmbito do estudo da estabilidade

também exige a resolução da equação f (x) = 0; etc.). Obviamente a resolução da equação

h1 (x) = h2 (x) + c em ordem a x pode ser encarada como um problema do tipo {x : g (x) = 0}onde g (x) := h1 (x) − h2 (x) − c. Para a equação quadrática, g (x) = ax2 + bx + c = 0 é bem

conhecida a fórmula

x =−b±√b2 − 4ac

2a.

Também para polinómios de ordem 3 e 4 existem fórmulas resolventes (neste último caso, bas-

tante complicada). Está provado que para polinómios gerais de ordem 5 não existe fórmula

resolvente. De igual forma, não existem fórmulas que permitam encontrar as raízes da gen-

eralidade de equações envolvendo funções transcendentais, como por exemplo, cosx = x ou

ex + x = 1. Nestas circunstâncias devem-se usar métodos numéricos. O mais conhecido é o

método de Newton ou Newton-Raphson.

O método de Newton baseia-se na observação de que a linha tangente é uma boa aproximação

local ao gráfico de uma função. Seja (x0, g(x0)) um ponto do gráfico da função g ∈ C1. Como se

sabe a linha tangente (equação da recta tangente à curva g no ponto x0) é dada pela expressão

y − g(x0) = g0(x0)(x− x0)

Esta recta intercepta o eixo das abcissas quando y = 0; o correspondente valor para x é

x = x0 − g(x0)

g0(x0).

Assim, a ideia subjacente ao método consiste em propor um valor x0 como uma aproximação

para o valor que anula a função g. O valor que se obtém da equação precedente constitui uma

nova aproximação (presumivelmente melhor) para esse valor; designe-se esse valor por x1 (i.e.,

x1 = x0 − g(x0)

g0(x0)).

239

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Este procedimento pode ser continuando da seguinte forma:

x2 = x1 − g(x1)

g0(x1)

Em geral, dada a aproximação xn−1 para o zero da função g, a linha tangente no ponto

(xn−1, g (xn−1)) cruza o eixo das abcissas no ponto (xn, 0) onde

xn = xn−1 − g(xn−1)g0(xn−1)

.

Assim, o método de Newton propõe como zero da função g (x) o limite limxn. Utilizando a

notação habitual, o método de Newton consiste em obter o limite lim yn onde

yn = f (yn−1) , f (x) = x− g (x)

g0(x).

Observe que se g (x) = 0 admite pelo menos uma solução então f (x) admite pelo menos um

ponto fixo (verifique).

Exemplo 99 Considere-se g (x) = x − x3 = 0. As raízes de g são: −1, 0 e 1. Vejamos se ométodo de Newton consegue detectar estas raízes. Tem-se

f (x) = x− x− x3

1− 3x2 =2x3

3x2 − 1 .

A EDF é portanto yn =2y3n−13y2n−1−1

. Se iniciarmos a órbita com o valor 0.44, obtém-se a seguinte

sequência {0.44,−0.406, 0.266,−0.047, 0.00022,−2.15×10−11, 0, 0, 0}. Na figura 8-23 mostra-sea aplicação do método de Newton. Observem-se as sucessivas linhas tangentes. Na figura 8-24

mostra-se o correspondente gráfico teia de aranha. Em ambos os gráficos8-23 e 8-24 é possível

confirmar a órbita {0.44,−0.406, 0.266,−0.047, 0.00022,−2.15×10−11, 0, 0, 0}.Assim, quando ovalor inicial é 0.44 o método de Newton propõe como zero da função g o valor 0. No entanto,

como a tabela seguinte mostra, se o valor inicial for 0.75 o método propõe o valor 1, e se o valor

for 0.45 o método propõe −1. Deixa-se ao cuidado do leitor verificar que o método de Newtonnão se aplica quando o valor inicial é y0 = 1/

√3 ou y0 = −1/

√3 (veja-se a figura 8-23).

240

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Figura 8-23: Método de Newton (função g (x) = x− x3)

10.50-0.5-1

0.4

0.2

0

-0.2

-0.4

x

y

x

y

Figura 8-24: Gráfico Teia de Aranha da EDF yn =2y3n−13y2n−1−1

, y0 = 0.44

-0.4 -0.2 0.2 0.4

-0.4

-0.2

0.2

0.4

241

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Órbitas da EDF yn =2y3n−13y2n−1−1

com

valores de inicialização Distintos

n yn yn yn

0 0.4400000 0.7500000 0.4500000

1 -0.4064122 1.2272727 -0.4643312

2 0.2661215 1.0507126 0.5668991

3 -0.0478628 1.0034499 -10.1563782

4 0.0002208 1.0000177 -6.7928698

5 0.0000000 1.0000000 -4.5615319

6 0.0000000 1.0000000 -3.0905310

7 0.0000000 1.0000000 -2.1348584

8 0.0000000 1.0000000 -1.5355449

9 0.0000000 1.0000000 -1.1922426

10 0.0000000 1.0000000 -1.0383176

11 0.0000000 1.0000000 -1.0020218

12 0.0000000 1.0000000 -1.0000061

13 0.0000000 1.0000000 -1.0000000

Um resultado importante é o seguinte.

Teorema 38 Se g é uma função diferenciável então todo o ponto fixo de f (x) = x−g (x) /g0 (x)é assimptoticamente estável e raíz de g. Se um ponto é raíz de g e f está definida nesse ponto,

então o ponto é um ponto fixo de f assimptoticamente estável.

Naturalmente, o teorema não garante a convergência da sequência yn = f (yn−1) dado um

qualquer valor inicial y0, mesmo que f esteja definida no ponto y0 (y0 pode não pertencer a

nenhuma bacia de escoadouro).

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Exercícios

1. Usando a definição, estude a estabilidade dos pontos fixos das seguintes EDF:

(a) yt = yαt−1k, k > 0 (considere a transformação zt = log yt)

(b) yt = e−tyt−1, t ≥ 0(c) P (F ) yt = 0 onde P (F ) é um polinómio de grau dois em F (faça o estudo em função

das raízes do polinómio P (F )).

2. Represente o gráfico teia de aranha, identifique os pontos fixos e estude a estabilidade dos

pontos fixos a partir do gráfico teia de aranha e do teorema 30 (quando tal for possível)

nos seguintes casos:

(a) f (x) = x1/3

(b) f (x) = 2 arctg x (note que −π/2 < arctg x < π/2;pontos fixos −2. 331, 0 e 2. 331 1)(c) f (x) = 1/x (discuta a estabilidade também a partir da definição)

(d) f (x) = cosx (ponto fixo: 0.739 09)

(e) f (x) = x+ e−5 (e−x − ex). Considere a figura seguinte

-7.5 -5 -2.5 2.5 5 7.5

-7.5

-5

-2.5

2.5

5

7.5

-a a

3. (Exame) Considere a equação às diferenças finitas yt = y3t−1. A função f (x) = x3 é repre-

sentada na figura seguinte.

243

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1.510.50-0.5-1-1.5

1.5

1

0.5

0

-0.5

-1

-1.5

x

f ( x )

x

f ( x )

(a) Obtenha a solução da equação às diferenças dada a condição inicial y0 = ξ.

(b) Determine os três pontos fixos e classifique-os quanto à estabilidade.

(c) Recorrendo a métodos gráficos determine a bacia do(s) escoadouro(s).

4. Suponha que f : R→R tem derivada de primeira ordem contínua num intervalo aberto

contendo o ponto fixo y. Mostre que se f 0 (y) < 0 então existe um intervalo aberto I

contendo y tal que se x ∈ I, f (x) e x encontram-se em lados opostos face a y.

5. Determine a bacia dos escoadouros dos modelos definidos no exercício 2.

6. (Exame) Considere f (x) = x+ senx.

(a) Determine os pontos fixos de f e classifique-os quanto à estabilidade.

(b) Determine a bacia dos escoadouros utilizando o teorema 33 e o gráfico seguinte onde

se representam as curvas x+ senx, x e 2 (kπ)− x com k = −1, 0, 1, 2, 3, 4.

244

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- 2 p - p p 2 p 3 p 4 px

-10

-5

5

10

15

20

25

30f

7. Considere a EDF yt = yt−1/¡1 + y2t−1

¢.

(a) Determine o único ponto fixo.

(b) Mostre que o ponto fixo é assimptoticamente estável (verifique que o teorema 30 não

é aplicável).

(c) Mostre que W (0) = R usando

i. o teorema 33,

ii. o teorema 34.

8. Considere a EDF yt = f (yt−1), onde f (x) = −x log¡1 + x2

¢.

(a) Determine o único ponto fixo.

(b) Mostre que o ponto fixo é assimptoticamente estável.

(c) Determine a bacia do escoadouro usando o gráfico da função f (x)

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-3 -2 -1 1 2 3

-2-1.5-1

-0.5

0.51

1.52

(d) Determine a bacia do escoadouro usando o teorema 34.

9. Mostre que y = (0, 0)T é um ponto assimptoticamente estável dos sistema

y1t =αy2t−11 + y21t−1

y2t =βy1t−11 + y22t−1

se α2, β2 < 1 usando,

(a) o teorema 31

(b) o teorema 32

(c) No caso α2, β2 < 1 determine a bacia do escoadouro.

10. Considere a função f (x) = 2x2 − 5x.

(a) Determine os pontos fixos e estude a sua estabilidade.

(b) Sabe-se que as soluções da equação f (f (x)) = x são©0, 3, 1 +

√2, 1−√2ª . Deter-

mine os pontos periódicos de período 2 e escreva a respectiva órbita de período 2.

Estude a sua estabilidade.

11. Considere um sistema de duas equações às diferenças

yt = Ayt−1

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com valor inicial y0. Suponha que A é uma matriz triangular possuindo dois valores

próprios iguais a λ 6= 0. Como se sabe a solução do PVI neste caso é

yt =¡λtI + tλt−1 (A− λI)

¢y0. (*)

(a) Admitindo que existem dois vectores próprios independentes associados a λ, simpli-

fique a expressão (*).

(b) Determine todos os pontos fixos.

(c) Estude a estabilidade do ponto fixo y = 0 no caso em que |λ| ≤ 1 (considere t ≥ 0).Utilize a definição de estabilidade.

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