Escola Joaquim Ensinar Aprender Sociedade Conhecimento

Embed Size (px)

Citation preview

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

Ensinar aapr ender naSociedadedoConhecimentoJoaquimJosJacintoEscola UniversidadedeTrsosMonteseAltoDouro [email protected]

Resumo No dealbar do sculo XXI as sociedades confrontamse com transformaes aceleradas, desencadeadas, em grande medida, pelo desenvolvimento cientfico e tcnico, pela mundializao,globalizaoepelasociedadedainformaoecomunicao. Estas mutaes impem a necessidade e urgncia de pensar o modo como a escola se pode prepararpararespondereficientementeaosnovosdesafios,bemcomoasresponsabilidadesque lhesoacometidaspelos novoscontextos queoLivroVerdeparaaSociedadedaInformao

emPortugal(1997)recenseia.Afonte decriatividade e inovao queacompanhaacriaotecnocientficano passvel de ser pensada aqum ou alm do paradigma ecolgico que governa os media , como atestam as reflexes deMac Luhan(1998), Neil Postman(1993), Javier Echeverra (1994), entre outros. Os novos territrios da comunicao (Philippe Breton, Serge Proulx, (1997) assinalados na cartografiadacomunicaoconferem televiso, informtica, telemtica,Internet um

topos central no processo civilizacional como antes, a inveno da escrita ou a inveno daimprensa haviam desencadeado transformaes na comunicao, na cultura, na escola (Karl Popper(1995),ElizabethEisenstein,1994). Hodiernamente, das mltiplas e diferenciadas fontes de onde jorraainformao que inunda o quotidiano dos alunos, acentua a tendncia das ltimas dcadas que deslocou da escola a centralidade na transmisso da informao. Ao mesmo tempo, o incremento das mensagens icnicasqueproliferamnaiconosfera datelepoliscontemporneaconfrontasecomumamatriz escolar, claramente tipogrfica, acentuando o fosso entre o homo videns (Sartori, 2000) e o

homotypographicus.(MacLuhan,1998).Emfacedetantasetoradicaismutaesedesafiosurgepromovernovospapis,desenvolver novascompetncias,(Perrenoud,20002001)paraprofessores eparaosalunos,possibilitando que estes respondam eficazmente s novas exigncias, possibilitando assim a passagem da nascente sociedade da informao para futura sociedade do conhecimento. (Manuel Castels, 2002)

343

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

Importa sublinhar que a comunicao educativa no poder esquecer ou rasurar, por mais fascinantequepareaseromundomediatizadoevirtualdacomunicaodigital,acomunicao interpessoal, o dilogo pedaggico, cada vez mais reclamado numa sociedade ameaada de desintegraoporfenmenoscomooindividualismoouoconflito.(Escola,2003)

Introduo

Asociedadedainformaoedacomunicaovaiemergindocomomarcadistintivada nossacivilizaoconformandodeformadecisivaadimensopoltica,social,culturale educativa, outorgando informao o estatuto nuclear em todo o processo civilizacional.Emfacedasalteraesacomunicaoeducativavserevestidadenovas responsabilidades, quando se confronta com a necessidade de discutir as grandes questes que no presente animam o debate entre educadores e professores e visam prepararaadaptaodaescolasociedadedainformaoedacomunicao. O Livro Verde para a Sociedade da Informao em Portugal veio consagrar esta preocupaocapital,desafiandoosvriossectoresscioculturaisareflectiremsobreas transformaes,desafiandotodososintervenientesaencontrarem novaspossibilidades de se adaptarem s mais recentes exigncias que irrompem no seio da sociedade e se plasmamnosdiferentessectores.Parecenoscadavezmaisevidentequeemtornodas TICqueodiscursoqueanunciaapassagemgradualdasociedadedainformaoparaa sociedadedoconhecimentoencontraoseuespaodeeleio. No primeiro momento deste trabalho procuraremos pr em evidncia o carcter incontornvel de uma meditao sobre o desenvolvimento tcnico e cientfico para a correcta compreenso do fenmeno comunicacional que envolve o advento da sociedadedainformao. No segundo momento, convocamos a ateno para o topos ocupado pela informao neste sociedade emergente, sublinhando a evoluo histrica que o incremento das possibilidadesdeacesso,desdeoaparecimentodaimprensaataosrecentesprogressos datecnologiacomputacionaldisponibiliza. Noterceiromomentomereceranossaatenoapassagemdasociedadedainformao para a sociedade do conhecimento, relembrando as exigncias de formao colocadas aoseducadorespararesponderemcomproficinciaaosnovosdesafios.

344

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

Acomunicaonacivilizaotecnocientfica

No exequvel a pretenso de levar a cabo uma correcta avaliao da sociedade da informaoesquecendoqueestanosdevedoradodesenvolvimentotcnicocomo a que se escora. As actuais conquistas realizadas no espao de mediao comunicacional encontram a sua filiao no universo tcnico. Independentemente dos exagerostecnfobosetecnfilossporingenuidadepoderemosaceitaratesedequea evoluo tecnocientfica acontece sem arrastar consigo importantes e significativas modificaesnoespaocomunicacionaleculturaldosculoXXI.Seobservarmoscom ateno a histria da evoluo da tcnica constatamos que as invenes no se impuseramcomoacontecimentosneutros,axiologicamenteasspticos,relegandoparao uso ou a aplicao a clarificao das dimenses contraditrias que as envolvem (Cabrero,2001:63).Deuma formaglobal,cada novoinstrumentoteve,quasesempre, consequncias que extravasaram o sentido ou a intencionalidade subjacente criao, enquanto no espao do impondervel se abriam inauditas possibilidades de utilizao. Uma das questes mais preocupantes da tecnopolis reside no facto de no se ter percebidodequeformaacultura,asociedadeeaescolasoalteradospelasinovaes tecnolgicas.ParaPostman(1994:23) Nopossvelconterosefeitosdeumanovatecnologianumaesferalimitadada actividade humana. Se esta metfora [a competio tecnolgica desencadeia a guerra total] apresenta a questo com demasiada brutalidade, podemos ento ser um pouco mais gentis e suaves: a mudana tecnolgica no nem aditiva nem subtractiva,ecolgica.

EstherGispertPellicerdefendequeofascnioexercidopelastecnologiasestassociado aofactodequeaideiadeprogresso,sedimentadanodiscursodamodernidade,vincular deformaestreitaodesenvolvimentotcnicoeoprogressohumano.Tornasedifcilde sustentar esta posio se atendermos ao facto de que alguns fenmenos sociais e

345

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

relacionais como a apatia e desejo de no envolvimento (Lorenz, 1992:21), o individualismo, a violncia, a incomunicao (Camps,1996) terem encontrado um espaodeafirmaoeincrementocadavezmaissignificativo.Oprogressotecnolgico no silencia a ambivalncia, pois muito do desenvolvimento tecnolgico acontece envolto em promessas que no encontraram confirmao no tempo. Assim aconteceu com a revoluo da automao que anunciava a era do cio e confirmou a era do desemprego a produtividade industrial que proclamava o reino da abundncia e no consegue esconder a penria no Ocidente nem o exrcito de famintos do terceiro mundoainformticaprofetizouacapacidadedepensarpornsedeformamaisrpida, masqueataopresente,comrarssimasexcepes,disponibilizouexemplosdecomose podiaatrofiaramemria,ojuzoouacriatividade. Os novos territrios da comunicao que ganham hoje um papel nuclear nesta sociedade, na cultura, na educao. A televiso e a informtica, com especial relevo para a internet, tm vindo a introduzir modificaes significativas no universo educativo, desde o prescolar ao ensino universitrio, sem que os docentes, de uma formaglobal,setenhamapercebidodissoou,pelomenostenhamaquilatadooalcance das transformaes em curso. O grande desafio que exige a nossa meditao , indiscutivelmente,ouniversodainformao

Navegandonooceanodainfor mao

O cerne da sociedade da informao ligase s questes que envolvem o acesso, armazenamento e tratamento da informao. A evoluo tecnolgica, particularmente centrada no progresso dos meios informticos, trouxe possibilidades verdadeiramente inimaginveis at h algumas dcadas. De qualquer ponto do globo, coma worl wide

webcruzamosoespao,traandonovssimasrotas,rasgandonovoscaminhosmartimosembusca deste novo e admirvel mundo a que chamamos sociedade da informao e comunicao.Assim,recuperamosprodigiosamenteaubiquidadequeidentificoualguns dos meios que marcaram a histria da comunicao de que so exemplos a rdio ou mesmoateleviso.

346

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

No actual momento de evoluo histrica a que Neil Postman deu o ttulo de tecnopolia,coroandoopercursoquetemasuagnesenasculturasferramentistas,e a que se seguiu a tecnocracia, torna evidente o quanto a questo em torno da qual gravitam todas as outras indiscutivelmente a busca incessante por mais informao, muitasvezessemdeixarclaraaintenosubjacenteaestelabor.(Postman,1994:60) Emmuitasocasiesacreditamosqueaproblemticadoexcessodeinformaosagora teria conquistado um lugar importante, no entanto, esta posio encerra um lapso capital. Muitos sculos antes, com a inveno da imprensa por Gutenberg, a Europa civilizada debateuse com a emergncia de uma novssima realidade para a qual no tinha uma resposta. Bastaria para tanto aludir ao facto de que quarenta anos aps o aparecimentodaimprensa,estahaviasurgidoemseispaseseemcentoedezcidades. Aapenascinquentaanosdedistnciadasua invenooitomilhesde livros,sobreos maisvariadosassuntos,circulavamnaEuropaModerna,inundandoasbibliotecasata repletas de manuscritos e incunbulos Importa no esquecer que as inovaes introduzidasnoformatodolivroreforavaaevidnciaenecessidadedemanterdentro decertoslimitesofluxodeinformao. O sculo XVII encontrar na escola moderna a resposta adequada ao excesso de informao, pelo que a sua rpida expanso e a inveno do currculo confirmam a necessidade de controlar a informao, evitando ansiedade e confuses. As escolas aparecem, desde ento, como estruturas de legitimao ou desacreditao do fluxo de informaoou,comoescreveNeilPostman(1994:62),asescolasforam()ummeio paragovernaraecologiadainformao. Aculturaocidentalduranteduzentosanosreorganizousecomoobjectivodeseadaptar imprensa e s novas condies por ela criadas, no tendo, at meados do sculo dezanove,aparecidonenhumatecnologiainovadoraquealterasseaforma ,ovolumeou a velocidade da informao. Os mecanismos de controle da informao evitaram, em grandemedida,osdistrbiosestimuladospeloexcessodeinformao. A tecnopolis contempornea revela a este nvel uma imensa fragilidade pois no patenteianenhumaformadecontrolosobreainformao,dirseiamesmoquesofrede umaespciedeSIDAcultural,(SndromedeDeficinciaAntiInformao),namedida emqueoseusistemadeimunidadenoestestruturalmentepreparadoparafazerfacea toabundanteinformao.

347

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

Apsoprimeiro momentodarevoluo informativa,propiciadopela imprensa,outros sevoseguir,abrindoocaminhosociedadedainformao.Osegundomomentodse comoaparecimentodotelgrafo,emmeadosdosculoXIX.Oprimeiroataqueatingiu eesvazioude legitimidadeapresumidarelaoentre informao,razoeutilidade.O segundo ataque fez ruir a concepo do espao, e da relevncia e utilidade da informao local para um determinado espao, rasurando as fronteiras dos vrios estados norteamericanos, conectandoos numa vasta rede de informao. Uma outra ideia avanada pelo telgrafo foi a da informao livre do contexto, transformandoa numa mercadoria passvel de ser comprada e vendida, isto , comercializada independentemente do uso ou significado. A partir daqui o importante era vencer o espao,enviandoetrocandomensagens,aindaqueirrelevantes. Comafotografia,atingimosoterceiroestgiodarevoluoinformativa.Estainvadiuo meio ambiente simblico, criando uma nova imagstica. Aquela no aparece somente comoumcomplementodalinguagem,tendeumesmoasubstituila,afirmandosecomo meio privilegiado de construir, compreender e testar a realidade. Os homens da imprensa diria haviam compreendido que a imagem para alm de valer mil palavras, era uma importante forma de obteno de riqueza. Quer a telegrafia ou mesmo a fotografiatrouxeramumanovaconcepodeinformaoquerecusavaanecessidadede interligao, de contexto, postulando o imediatismo como alternativa continuidade histrica,ofascnioemlugardacomplexidadeedacoerncia. Quando a cultura procurava adaptarse a esta realidade uma nova inveno, a radiodifuso deu entrada, iniciando o quarto estgio da informao, sendo o ltimo estgio marcado pelo desenvolvimento da tecnologia computorizada, contribuindo a este propsito para o caos informativo em que todos nos sentimos de algum modo submersos. As escolas do sculo XXI continuam a debaterse com a mesma dificuldade, procurando, como no perodo que se seguiu criao da imprensa, encontrar uma posiodeequilbrioqueconserveasuarelevnciacomoespaoprivilegiadodeensino e aprendizagem e da misso do professor comomediador dessa mesma aprendizagem na escola sem muros, na aula aberta , sobretudo nesta poca da superabundncia informativa,equeDianeRavitch descreve:

348

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

Neste mundo de abundncia pedaggica, crianas e adultos podero sintonizar umprogramadetelevisoem casaeaprenderoquequiseremconforme lhes for mais conveniente. Se a pequena Eva no consegue dormir pode aproveitar para aprenderlgebra.Noseupostodeaprendizagemdomstico,poderligarparaum canalcomumasriedeproblemasinteressantesqueseroapresentadosdeforma interactiva,semelhanados jogosde vdeo().O jovemPeterpoderdecidir que quer aprofundar os seus conhecimentos sobre a Histria recente do Japo,o que far ligandose s maiores autoridades e professores do assunto, que no s utilizaro grficos e ilustraes estimulantes, como tambm narraro vdeos histricosqueestimularoasuacuriosidadeeimaginao.(Ravitch,1993:456 cit.inPostman,2003:56)

O grande problema destes jovens no ser tanto a acessibilidade da informao mas antesaquantidade,poisfoi,provavelmenteporterestadodurantetodoodiaexpostaa um excesso de informaes que a jovem Eva se encontra atingida pela insnia, claramente impotente perante to avassalador volume de informao. Milhares de cartazes,jornais,peridicos,livros,clubesdevdeos,milhesdeaparelhosdeteleviso, rdios, fotografias atingem o quotidiano de qualquer jovem como a Eva ou o Peter. DesdeosculoXIX,de formaparticulardesdeotelgrafo e fotografiaatao chipde siliconenoltimosculo,ampliousedesmesuradamenteorudodainformaoquese escoa de forma assustadora, metamorfoseada em ondas luminosas, sonoras, fitas de teleimpressoras,fiostelefnicos,cabosdetelevisoousatliteeprensastipogrficas. As sempre renovadas formas de armazenamento avolumam o caudal de informao armazenadocomonobrepropsitodepoderviraserutilizado.Emtermoseducativosa questocentralsersaberoquesepropefazeraescolaperanteestedescomunalacervo de informao. Se for sua inteno disponibilizar, imagem dos outros media, mais informaes estar condenada a tornarse obsoleta e irrelevante. (Postman, 2003:61) Parecenos, no entanto, que caber escola inventar novos caminhos, novas responsabilidades, novas competncias que respondam s demandas da nascente sociedade. Neste momento, o que nos parece evidente que como aprendiz de feiticeiro,estamos inundadosde informaoetudooqueofeiticeironosdeixou foi a vassoura.(Postman,1994:67)Oexcessodeinformaotransformaseemlixopoisno

349

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

disponibiliza respostas para as questes capitais do ser humano. A informao circula indiscriminadamentecarentededirecoedepropsito. Importanoesquecerqueassociadoaomitodoacessoinformao,aescoladebatese com um outro que tende a assimilar a informao e saber, como se tratasse de sinnimos.Paraum cidadoavisadoestesconceitos,apesardasuainterpenetrao,no se deixam confundir. Esther Gispert Pellicer estabelece as fronteiras muito precisas entreambosquandodeclaraque as informaes constituem a base do conhecimento, mas a aquisio deste implica,antesdemais,odesencadeardeumasriedeoperaesintelectuais,que colocam em relao os novos dados com as informaes armazenadas previamentepeloindivduo.Oconhecimentoadquirese,pois,quandoasdiversas informaes se interrelacionam mutuamente, criando uma rede de significaes queseinteriorizam.Naactualidade,umadasperturbaesprovocadaspelosmedia o facto de que o homem moderno cr ter acesso significao dos acontecimentos, simplesmente porque recebeu informao sobre aqueles. (GispertPellicer,1997:88)

Ograndedesafioconsisteemsaberdequeformapodeaescolafavorecerapassagemdo reinocaticodainformaoparaouniversodoconhecimento? Aprimeiragrandeconclusopassapelaafirmaodequeamissoprincipaldaescola no , definitivamente, a mera transmisso da informao, sobretudo quando esta circuladescontroladaeseencontradisponvel. Asegundasublinhaa ideiadequeoacesso informaono,porsi s,garantiade transformao em conhecimento e, muito menos, em sabedoria. A construo do conhecimentoimplicaacapacidadedeacolhernovasinformaes,articullas,deforma aqueosvnculosestabelecidoscomojsabidotransformemessasnovasinformaes emsaberrelevante. A terceira concluso, penos de sobreaviso no que concerne necessidade de desenvolver nos alunos autonomia, responsabilidade e esprito crtico, dotandoos de competncias que permitam aceder criteriosamente informao. Segundo Genvieve Jacquinot(1981)possvelelaborarumconjuntodecritriosquepermitamconsiderar

350

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

uma pessoa como dotada de sentido crtico em relao aos meios de informao e comunicao: Hdesercapazdelimitarelamesmaoconsumodosmeiosparaprotegersedos riscoseperigos.Hdesaberfundamentarosseusgostoseprefernciascombase emjuzosclarosapartirdeanlisescategorizadas.Hdepodercontrolaropoder manipulador dos meios como leituras da realidade. Hde ser capaz de agir de maneira activa ao longo da sua vida, de modo que os meios de comunicao estejam postos sempre ao servio de meios democrticos. Hde participar activamentenoprocessosocial,emfunoeapartirdasuaposionasociedade, aqualestporsuavezdeterminadapelocontextoeconmicoeculturalemquese desenvolveoindivduo.(Jacquinot,1981citinGispertPellicer,1997:89)

Afastadadesterumoassistiremosaodefinhardaescolaenopoderemosesquecerqueo declnio da escola sintoma, indcio de um empobrecimento ou de um acentuado definhamentodos homens. Tal acontece sempre que por detrs do professor j no se perfilaohomem,masantesficouemseulugaralgumquesedeixouapagaremnome deumaentidadeabstractaquetemcomo funo recebereacumulardados,emvezda nobre preocupao em ser ele prprio, tornarse pessoa, conscincia livre em estreita relaocomoutros.

Acaminhodasociedadedoconhecimento

A sociedade do conhecimento assenta em quatro grandes objectivos educacionais:

aprenderaconhecer ,aprenderafazer,aprenderaviveremcomum,aprenderaser .Noqueconcerneaoprimeirograndeobjectivoeducacionalprocurasemuniroeducandode instrumentosdecompreenso,estabelecendoumequilbrioentreaculturageralvastae a competncia para tratar em profundidade pequenos fragmentos do real. A tnica posta no aprender a aprender , no desperdiando as possibilidades de aprendizagem queseoferecemaolongodavida. No segundo, percebese que muito mais do que habilitar ou qualificar profissionalmente,isto,prepararparaagirnumdeterminadocontexto,importaadquirir

351

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

competncias, mobilizar saberes (Perrenoud, 2001) que predisponham a pessoa a enfrentar criativamente as mais diversas situaes, respondendo positivamente aos desafioseenvolvendoosoutrosnum trabalhodeequipa.

Aprender a viver em comum, revelase hoje como um dos grandes objectivos, mastambmdesafioseducacionaisecivilizacionais,sobretudopornosserdadoobservarum conjuntodefenmenossociaisqueatestam,deformaevidente,adesagregaosocial.A xenofobia,oracismo,aintolernciareligiosa,osfundamentalismosdendolediversaou a prpria violncia que prolifera na telepolis contempornea pe a descoberto a fragilidade dos vnculos sociais, a ameaa real de se impor uma viso marcada pela satanizaodooutrooupeladiabolizaodadiferena.Nasociedadedoconhecimento exigese a participao e cooperao com os outros, o reconhecimento do valor do pluralismo, da cooperao mtua, da paz. Por ltimo aprender a ser , objectivo que totaliza e consubstancia os anteriores, permitindo a cada um desenvolver a sua personalidade,afirmaraautonomia,capacidadedediscernimentoeresponsabilidade. Nestes objectivos permanece em lugar de destaque a abertura e permeabilidade em relaosmudanascadavezmaisrpidase,porissomesmo,cadavezmaisexigentes. Setomssemosofamosorelgiodasinvenes,dequenosfalaCharlesWeingartnere Neil Postman, como modelo para a compreenso do ritmo das invenes sentimonos esmagados pela velocidade gradualmente mais alucinantes que assinala os acontecimentos tecnocientficos ocorridos nas ltimas fraces de segundo do sculo passado,econtinuadosnaauroradestenovomilnio. Tomemoscomounidadetotaldivisvelparaaesferadotempoduranteoqualo homemdesfrutoudastcnicasdaescrita.Onossorelgiorepresentarassimuns trsmilniosecadaminutounscinquentaanos.Baseandonosnestaescala,nose produziram mudanas significativas nos meios de difuso at h uns nove minutos.Nesse momentocomeouautilizaoda imprensa naculturaocidental. H trs minutos chegaram o telgrafo, a fotografia e a locomotiva. H dois minutos o telefone, a prensa rotativa, pelculas animadas, o automvel, o aeroplano e a rdio. H to somente um minuto, o cinema sonoro. A televiso apareceu nos dez ltimos segundos, os computadores, nos ltimos cinco, e os satlitesdecomunicaonoltimo.Oraiolaserquiomispoderosomeiode

352

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

comunicao surgiu h to somente uma fraco de segundo. (Weingartner, Postman,1981:26)

Frenteaumcenriodetoexcepcional mobilidadeexigesecapacidadeparapensaro significado da mudana nesta sociedade da informao e da comunicao, tentando perceber se a escola est condenada ao declnio e consequente morte, j to abundantemente anunciada por Illich, se sobrevive s bruscas mutaes, recriandose num figurino completamente diferente, se adopta parte do seu passado e se adapta s novasexignciascivilizacionais.ComoescrevemWeingartnerePostman(1981:228) Asobrevivncianummundoemmudanarpidadependequaseinteiramentedo sersecapazdeidentificarquaisentreosvelhosconceitossorelevantesparadar respostasquestesqueamudanatrazconsigo.Destemodocolocaseumanova tarefaeducativa:conseguirqueumgruponoaprenda(ouesquea)osconceitos irrelevantescomocondio indispensvela novasaprendizagens.Quer istodizer queum esquecimentoselectivoindispensvelsobrevivncia.

As vrias crises da educao recordam exactamente a capacidade que os educadores tiverampara lidarcom a mudana.Foiassim no primeirogrande momentoderuptura comacriaodoalfabetonosculoVa.C..EmAtenasapassagemdeumaculturaoral para uma cultura escrita no foi feita sem sobressaltos, sem confrontos. A figura emblemticadeScrates,grandepatriarcadodilogonoOcidente,atestaarecusapor uma cultura escrita, pois como nos dito pelo discpulo Plato, a palavra escrita para almdenoseconseguirdefender,respondesempremesmapergunta.Aopopelo dilogo em Plato no s procura conservar o movimento que acompanha a conversao, como visa proteger a palavra de qualquer abuso dogmtico (Gadamer, 1984:446). Com a inveno da imprensa a educao mergulhou na segunda crise, tentando encontrarumespaodearticulaoentreaculturaoraleaculturaescrita.Apassagem daoralidadeparaaeradatipografiafezsepaulatinamentee,durantequatrocentosanos, assistimosaesteesforodeconvivnciapacfica queredundounumapazpedaggica entre as duas formas de aprendizagem, pelo que valioso em cada uma pde ser

353

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

maximizado (Postman, 1994:23). Ainda que os professores enaltecessem a imprensa, continuavam a conceder oralidade um lugar prestigiante na sala de aula, reconhecendolhevirtualidadesparaaaprendizagemdosalunos. A terceira grande crise teve lugar com a revoluo electrnica que mereceu de McLuhanadesignaodeGalxiaMarconi,comespecialimportnciaparaainveno dateleviso,queseimpsemconflitoabertocomaimprensa,isto,comtodaacultura sadadaGalxiaGutenberg.Oconfrontoentreambasrealauma batalhaondeambas tecnologiasvisamafirmaroseupoder,prestgio,controlesobreamentedosestudantes, mas sobretudo impor a sua viso de mundo diminuindo ou mesmo aniquilando a tecnologiaconcorrente. Por um lado, h o mundo da palavra impressa, com a nfase na lgica, na sequncia histrica, exposio, objectividade, liberdade de esprito e disciplina. Por outro, h o mundo da televiso, com a sua nfase na imagstica, narrativa, actualidade, simultaneidade, intimidade, gratificao imediata e rpida resposta emocional. As crianas vo para a escola profundamente condicionadas pelos preconceitos da televiso, e ali encontram o mundo da palavra escrita. (Postman,1994:22) Ascrianascrescem numuniversopovoadodeimagens,habitam confortavelmentena

iconosfera .Antesdeentraremparaaescolaestiveramexpostasamilharesdehorasdetelevisoequandoachegamexigemqueaquelaconvertaamaiorpartedainformao em algo visual, sob pena de desencadear o tdio, a apatia, o desinteresse. A nossa sociedadeassinalaoavanotriunfaldaimagemapardoestreitamentoconsiderveldo espao outrora concedido palavra. O recurso imagem como forma privilegiada e generalizada de expresso, potenciou consideravelmente a nossa funo visual, no impedindo, apesar de tudo, que permanecssemos, em algumas ocasies, como meros espectadores, absolutamente paralisados, no espectculo da superabundncia das imagens.Atelevisoconquistouumespao importantenacartografiadacomunicao contempornea, foise transformando durante dcadas, paulatinamente, no meio mais relevante nas transformaes culturais e educacionais que hoje vivemos. Antes de entraremparaaescolaascrianas j viram milharesdehorasdeteleviso,noperodo escolar,apesardoelevadonmerodehorasquepassamnaescola,continuamadedicar

354

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

maistempoaovisionamentodeteleviso,convertidaemladradotempo,criadainfiel (John Condry, 1995:33). No estranha que o fascnio exercido pelo medium leve as crianaseosalunosaadoptaremvalores,aceitaresteritipos,assumircomportamentos quedeformaexplcitaouimplcitasevoinsinuandonapantalha.Assemprerenovadas preocupaes com a qualidade dos programas televisivos, alimentados pelo sensacionalismo,sexoeviolncia,ostrsgrandesingredientesque,naopiniodeKarl Popper(1995)consolidamoespaodateleviso,continuamaprovocaracesosdebates na comunidade educativa, evidenciando a urgncia de uma educao para os media (Tisseron, 2004 Ballesta e Guardiola, 2001 Urra, Clemente, Vidal, 2000 Sanmartn, Grisola e Grisola, 1998). A passagem da era tipogrfica para a era da televiso, do

homo typographicus para o homo videns teve consequncias no modo comoaprendemos,poisopensamentonosepodedesvinculardosmeiosque lheservemde suporte e atravs dos quais se expressa. A primeira grande evidncia passa pela centralidadedaiconosfera naaprendizagem, multiplicandoseosestmulos visuaisnos processoseducativos,desdeoprescolaraoensinouniversitrio.Asegundaevidncia relembra o papel do entretenimento na prpria aprendizagem. A televiso deu um contributo fundamental para a filosofia da educao dando sustentabilidade tese de que ensino e entretenimento so inseparveis, inaugurando uma concepo verdadeiramente original, pois no est presente em nenhum discurso sobre educao desde Confcio a John Dewey. Deste magno princpio decorrem trs grandes mandamentosquealteramporcompletoafilosofiadaeducaonaeradateleviso:no tersrequisitosprvios,noprovocarsperplexidadeevitarsaexplicaocomosese tratassedasdezpragasdoEgipto.(Postman,1991:1535) As novas tecnologias da informao e comunicao, de modo especial a tecnologia computorizada, introduziram novidade, mas no deixaram de reforar a ideia de uma aprendizagem grandemente suportada por imagens, onde o entretenimento continua como valor estruturante da praxis educativa, bem como a necessidade desenfreada de acedersempreamaisinformao,continuandoarevoluodainformaoiniciadacom ainvenodaimprensa. Decorrem daqui novas exigncias de formao para a sociedade do conhecimento.Se atendermos aos padres de qualidade de formao inicial de professores, presentes na

355

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

Deliberaon1488/2000,noDRde1122000,consagraseumespaofundamentals tecnologiasdainformaoecomunicao: O curso proporciona acesso s novas tecnologias da informao e da comunicaoeaoutrosrecursosparasatisfazer necessidades especficas,noque serefere: i)smetodologiasdeensinousadas ii)oacessoinformaoecomunicaoentreosformandos,docentes,escolase outrosintervenientesnoprocessodeformao iii) aprendizagem do uso criterioso das tecnologias da informao e da comunicao,nassuasdiversasvertentes iv) ao uso destes recursos como parte integrante da preparao e experincia profissionaldosformandos v)Ocorpodocentedocurso: vi) Sabe usar apropriadamente as novas tecnologias da informao e da comunicao,emparticularnoensinodasuareaenasuaactividadedocente.

Tambm no DecretoLei n241/2001 de 30 de Agosto onde se estabelece o perfil do educador e do professor do 1 ciclo do ensino bsico se reconhece um lugar s muito significativo s TIC. Escrevese em relao ao educador de infncia que mobiliza e gereosrecursoseducativos,nomeadamente ligadosstecnologiasda informaoeda comunicaoe,noqueconcerneaoperfildoprofessordefendequeestedeverutilizar as TIC adequandoas a situaes e contextos diferenciados, promovendo o recurso a linguagens diversas e suportes variados em situaes de aprendizagem, bem como a aquisiodecompetnciasbsicasnausodasTIC. NoLivroVerdeparaaSociedadedaInformaoemPortugal(1997),nocaptulo4,A EscolaInformada:AprendernaSociedadedaInformao,namedida4.4(promovera formao de professores para a sociedade da informao) para alm de lembrar a necessidade de criar programas de formao inicial e contnua de professores que os capacitassemnasTIC,recordamasituaodedesarticulaoentreaevoluoacelerada dasociedadedainformaoeaactualizaomuitolentadosprofessores. O DecretoLei n 6/2001, no art 3 h) nos princpios orientadores chama a ateno para a importncia das TIC na valorizao das metodologias e estratgias de ensino

356

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

diversificadas, com o intuito de facilitar o desenvolvimento de competncias numa perspectiva ao longo da vida. No artigo 62 consagra a preocupao com as TIC na reorganizao curricular dos trs ciclos do ensino bsico, a par da educao para a cidadania (art. 61), considerandoa, formao transdisciplinar de carcter instrumental, que tem por meta a certificao de aquisio de competncias bsicas nestedomnio. Nos3ciclosdoensino bsicodefendeseque nasreascurriculares nodisciplinares, concretamente nas reas de projecto, estudo acompanhado e formao cvica, devem encontrar um espao de desenvolvimento em articulao entre si bem como com as reasdisciplinares,contemplandoumacomponentedetrabalhodosalunosondeasTIC sejamusadas.

Concluso

Independentemente do reconhecimento das novas exigncias que as TIC colocam aos educadores neste trnsito para a sociedade do conhecimento, o lugar do professor continua inquestionvel e, em nada ameaado, pois se se multiplicam as fontes e as possibilidadesdepesquisadeinformao,areconversodoalunoemexploradoractivo no ciberespao, exige mais do que nunca sua presena, ensinando aos alunos a difcil tarefadeavaliaregerirainformaoquechega. O professor ensinalhe que essa viagem rumo ao conhecimento, tecida na riqueza do dilogo pedaggico, s foi possvel porque ambos, num momento mgico, para alm das mediaes tecnolgicas, fizeram da educao um espao de encontro de sujeitos construtores de saber, mestres na transformao da informao em saber, saboroso. (Escola,2003)

357

LIVRODEACTAS 4SOPCOM

Bibliografia

Br eton,Philippe,Proulx,Serge,(1997)AExplosodaComunicao.Lisboa,Bizncio. Cabr er o,Jlio(2001)TecnologiaEducativa.Diseoyutilizacindemediosenlaenseanza. Barcelona:Paids. Camps,Vitoria,(1996)ParadoxosdoIndividualismo,SantaMariadaFeira:Relgiodgua. Castells,Manuel,(2002)AEradaInformao:Economia,SociedadeeCultura.ASociedade emRede.VolumeI,Lisboa:Gulbenkian. Castells, Manuel, (2004) A Galxia Internet. Reflexes sobre Internet, Negcios e Sociedade.Lisboa:FundaoCalusteGulbenkian. Eisentein, Elizabeth, (1994), La Revolucion de la Imprenta en la Edad Moderna Europea . Madrid:Akal. Escola,Joaquim,(2003)ComunicaoeEducaoemGabrielMarcel,TesedeDoutoramento apresentadanaUniversidadedeTrsosMonteseAlto Douro MacLuhan,M.,(1998)LaGalxiaGutenberg.Barcelona:CirculodeLeitores. Per r enoud,Philippe,(2000),10NovasCompetnciasparaEnsinar ,PortoAlegre:Artmed. Per r enoud,Philippe,(2001),PorquConstruirCompetnciasaPartirdaEscola?, Porto:Asa. Popper , Karl, Condry, John, (1995), Televiso: Um Perigo para a Democracia. Lisboa: Gradiva. Weingar tner , Charles, Postman, Neil, (1981) La Enszeanza como Actividad Crtica . Barcelona:LibrosdeConfrontacin. Postman, Neil (1991) Divertirse hasta morir. El Discurso pblico en la era del show business.Barcdelona:EdicionesdelaTempestad. Postman,Neil,(1993),Tecnopolia.QuandoaCulturaserendeTecnologia .Lisboa:Difuso Editora. Postman,Neil(2002)OFimdaEducao.RedefinindoovalordaEducao.Lisboa:Relgio dgua. Sar tor i,Giovanni,(2000)HomoVidens:TelevisoePspensamento.Lisboa:Terramar. Pellicer, Esther Gispert, (1997), La Mod a tecnolgica en la educacin: peligros de un espejismoin PxelBit.RevistadeMediosyEducacin,(n9Junho),8192 Sanmar tn, J., Gr isola, James, Gr isola, Santiago, 1998) Violencia, Televisin y Cine, Barcelona:EditorialAriel. Tisseron,Serge,(2004)AsCrianzaseaviolncianosEcrs.AInfluenciadateleviso,cinemae jogosdecomputadornascrianas,Porto:mbar. Urr a, Javier, Clemente, Miguel, Vidal, Miguel ngel, (2000), Televisin: Impacto en la infncia ,Madrid:SigloVeintiunodeEspaaEditores. Ballesta, Javier, Guar diola, Plcido, (2001) Escuela, Familia y Medios de Comunicacin, Madrid:EditorialCCS.

358