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Espaços invisíveis: arte e arquitetura na cidade contemporânea

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Pesquisa de Iniciação Científica relizada junto à Associação Escola da Cidade – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo | orientadora: Fernanda Mendonça Pitta | autora: Julia Junqueira Ribeiro Pinto | Palavras Chaves: arte e arquitetura, intervenção urbana, cidade contemporânea.

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Bolsista de Iniciação Científica: Julia Junqueira Ribeiro PintoArquitetura e Urbanismo | Escola da CidadeOrientadora: Prof.ª Dr.ª Fernanda Mendonça PittaSão Paulo, agosto de 2013 - setembro de 2014

Associação de Arquitetura e UrbanismoEscola da Cidade

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À Associação Escola da Cidade - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e seu Núcleo de Pes-quisa.

À minha orientadora Fernanda Pitta, pela inestimável contribuição às ideias aqui apresenta-das.

Aos artistas/arquitetos Louise Ganz, Rubens Mano e Carlos Teixeira pela receptividade e dispo-nibilidade para as entrevistas, extremamente en-riquecedoras.Agradeço também por me cederem materiais gráficos e bibliografias.

Sou grata também ao Vinicius Langer Greter, com quem debati muitas vezes sobre ideias aqui de-fendidas, pelo grande incentivo, apoio e suporte.

agradecimentos

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introdução...................................................................10

arquitetos/artistas....................................................11 Louise Ganz................................................................12

Rubens Mano.............................................................23

Carlos Teixeira...........................................................38

referências teóricas..................................................62

considerações finais.................................................72

referências bibliográficas........................................94

fontes das imagens...................................................100

sumário

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introdução

Arte e arquitetura partilham cada vez mais questões comuns dentro do que se pode entender como “campo ampliado” (WISNIK, 2012) da cultura, dissolvendo antigas fronteiras disciplinares para a compreensão do mundo contemporâneo, no qual a cidade genérica, financeirizada e com vocação glo-bal é expoente. Nela predominam produções imate-riais de valor, como o capital financeiro, que regem a valorização econômica e o consumo permanente da imagem dessas cidades. Parte natural e necessária à manutenção deste sistema são os espaços residu-ais, fisicamente evidentes em renovações urbanas a partir de ações especulativas, ou imateriais, porém existentes, barreiras entre público e privado, ou en-tre diferentes classes sociais.

Apesar de muitos terem consciência de sua existência, esses resíduos passam muitas vezes por despercebidos, invisíveis. Tamanha dificulda-de de se lidar com eles, são ignorados, excluídos, subutilizados. Porém, nesses lugares onde o tecido da cidade afrouxa, ficam evidentes os valores, dinâ-micas e fraquezas contemporâneas. Daí a potência de intervenções artísticas e arquitetônicas que cha-mam a atenção para esses locais e refletem sobre eles, abordando questões como espacialidade, efe-meridade, participação e evento buscando tensionar o público e o privado e assim quebrar com cotidiano programado e exercer uma crítica propositiva.

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Desta forma, o presente trabalho analisa e compara práticas recentes no contexto brasileiro de três artistas/arquitetos – Lotes Vagos, de Loui-se Ganz; Vazadores e Calçada, de Rubens Mano; e Amnésias Topográficas I, Amnésias Topográficas II e Espaços Públicos Invisíveis, de Carlos Teixeira – para entender como eles lidam com a realidade desse mundo capitalizado e fragmentado e ao mes-mo tempo dinâmico e virtualizado. Enfim, entender como, por meio da crítica e prática artística e ar-quitetônica, eles contribuem para a reflexão sobre essas próprias profissões e para a compreensão do mundo contemporâneo.

arquitetos/artistas

Rubens Mano, Louise Ganz e Carlos Teixeira são formados em arquitetura e urbanismo, porém apresentam diferentes visões sobre suas práticas em relação a esta formação. Mano acredita nunca ter exercido a profissão, pois desde a graduação trabalha no meio artístico. No entanto, suas obras discutem a possibilidade de uma arquitetura efêmera que se re-lacione rapidamente com a paisagem (MANO, 2014, p. 1). Teixeira, por sua vez, não se vê como artista, acre-dita que tudo que faz gira em torno da arquitetura, de modo diferente de um estritamente pragmático (TEI-XEIRA, 2014, p. 1). Ganz, com formação em ambos os campos, crê que não há mais uma dicotomia entre eles, são movimentos misturados (GANZ, 2014, p. 16).

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Apesar de opiniões díspares e de trajetórias profissionais distintas, seus trabalhos selecionados aproximam-se na medida em que tomam a cidade como campo de experimentação e propõem a ela novas possibilidades de existência, participando da construção do próprio mundo (WISNIK, 2012, p. 146) e da reflexão sobre urbanidade (PALLAMIN, 2000, p. 18). As discussões que promovem permeiam, por-tanto, arte, arquitetura, urbanismo, política e cultu-ra, uma vez que “toda intervenção na cidade é ne-cessariamente plural” (PEIXOTO, 2002, p. 12).

A seguir, seguirão as análises de cada obra. Além de referências teóricas, artigos críticos sobre os trabalhos em questão e escritos dos próprios ar-tistas/arquitetos, foram realizadas entrevistas com os estes, das quais se extraiu muitas informações que serviram para balizar a comparação e análise.

O trabalho Lotes Vagos constituiu-se de uma série de 16 intervenções experimentais reali-zadas em 2005, 2006 e 2008, entre as cidades de Belo Horizonte, Sabará e Fortaleza. Foi uma ação coletiva idealizada por Louise Ganz, contando com

Louise GanzLotes Vagos2005, 2006 e 2006Belo Horizonte, Sabará e Fortaleza

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a posterior colaboração de Breno Silva, além de di-versos artistas, arquitetos e moradores locais. Ela propunha ocupar e transformar lotes privados em espaços públicos durante um período determinado de tempo, por meio do empréstimo pelos seus pro-prietários e do uso pela população (GANZ e SILVA, 2009, p. 9). Nesse processo tanto as especificidades físicas do lugar e seu caráter vago quanto o grupo de pessoas e atividades do entorno foram prioriza-dos.

A artista procurava realçar e subverter os territórios vazios que pontuam a cidade, comumen-te percebidos como áreas desocupadas ou margi-nais. Ela os compreende como uma rede potencial de invenção que se instala no local e na cidade, como espaços capazes de gerar oportunidades e possibilidades de modos de convivência, de ocupa-ção e configuração do espaço urbano por meio da apropriação livre, visando sempre à sobreposição de acontecimentos e espacialidades numa esfera distinta da especulação, homogeneização e ordem determinista da cidade (GANZ e SILVA, 2009, p. 7). Segundo a artista, essa é uma maneira de enrique-cer a experiência de vida, que, segundo ela, é po-bre e fragmentária na medida em que é setorizada em funções com momentos específicos como mo-rar, trabalhar, divertir-se e circular. (GANZ e SILVA, 2009, p. 29). Distanciando-se da espetacularização que frequentemente acompanha a construção de grandes obras arquitetônicas, os programas de in-tervenção partem de alguns pressupostos de cará-

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ter sócio-político, tais como a ideia de participação e a noção de cotidianidade, procurando incorporar e ao mesmo tempo incentivar as práticas sociais e a interação comunitária. Construídos pela própria po-pulação local numa micro escala de transformação do espaço habitado, as intervenções problematizam os modos de vida social atuais abordando questões de propriedade, ambiente e comunidade.

Segundo Ganz, uma das intenções do projeto era fazer “borbulhar ideias na cabeça das pessoas” para que elas realizassem movimentos sem depen-der de acompanhamentos (GANZ, 2014, p. 7). Como um estímulo a isso, a maioria das ações feitas em Belo Horizonte foram propostas que partiam não de um diagnóstico, mas de um encontro entre um de-sejo e a situação do lugar, propostas completamen-te livres sugeridas majoritariamente por ela e Silva, conta Ganz. Um exemplo dessa leitura nada burocrá-tica do lugar era a escolha completamente aleatória dos lotes, que se baseava em derivas em diferentes direções da cidade realizadas por vários meios de lo-comoção, nas quais terrenos eram registrados por meio de fotografias e posteriormente selecionados como situações de interesse. (GANZ, 2014, p. 9).

Assim, cada ocupação teve suas especifici-dades, desde a negociação até a efetiva ocupação dos espaços. A divulgação não foi diferente. Ganz conta que em 2005 uma amiga jornalista fez uma reportagem de três páginas sobre o trabalho para um jornal que era distribuído gratuitamente, o que gerou uma repercussão enorme, e, por fim, levou

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Louise e Breno a discutir o projeto com o prefeito em seu gabinete (GANZ, 2014, p. 7, 8). A notícia da intervenção foi se desdobrando e saiu na rádio po-pular Itatiaia e num jornal semanal do ônibus, cada mídia com seu próprio entendimento do trabalho: a primeira divulgando que “terrenos estavam sen-do emprestados, e que isso era muito bom porque acabava com os ratos e baratas, e que todo mun-do ia cuidar dos terrenos vizinhos”, e o último que “terrenos estavam sendo emprestados para produ-ção de hortas” (GANZ, 2014, p. 8). Já em Fortaleza, Ganz e Silva estiveram em uma rádio para divulgar o trabalho, que teve como suporte, em todo o pe-ríodo de sua duração, um blog sempre atualizado. Por fim, os artistas lançaram o livro Lotes Vagos: ocupações experimentais, que Ganz ressalva ser uma forma importante de desenvolver o trabalho e fomentar sua circulação. Esse veículo possibilitou o projeto alcançar outras cidades, inclusive da Europa e da Ásia, e também novos desdobramentos, como uma apresentação num congresso sobre Arquitetu-ra Sustentável na China (GANZ, 2014, p. 8).

A primeira intervenção da série Lotes Vagos, 100 m² de grama, foi realizada na zona sul de Belo Horizonte durante os meses de abril, maio e junho de 2005. O lote de 500 m² possuía uma estrutura de obra em ruínas. Há sete anos estava aberto e cheio de lixo, o que provocava descontentamento dos vi-zinhos. Vislumbrando a limpeza negociada com o prefeito de Belo Horizonte, o proprietário empres-tou o lote por esse período por meio de um contrato

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de comodato. Segundo Ganz, a intenção era que to-das as intervenções tivessem um contrato de como-dato para oficializar o empréstimo do terreno, como uma forma de subverter o meio legal e burocráti-co tão utilizado na atualidade, transferindo tempo-rariamente a propriedade de privada para pública (GANZ, 2014, p. 6).

A intervenção consistia no plantio de 100 m² de grama junto aos moradores, ação que despertou demonstrações de interesse e manifestações afeti-vas, envolvendo pessoas e o espaço, revelando de-sejos e catalisando outras atividades como lavagem de carros, plantio de sementes, churrascos, dia de descanso e sol em piscina de plástico (GANZ e SILVA, 2009, p. 67). No primeiro dia de trabalho na área, um caminhoneiro que passava ofereceu terra vermelha que estava levando para um bota-fora. Trabalhou-se a terra junto com a grama doada por uma empresa produtora de placas de grama de modo a formar on-dulações gramadas (GANZ e SILVA, 2009, p. 27).

A intervenção não foi concebida para ser vi-sitada, mas vivida e construída. Aquele que antes é espectador passa a ser sujeito integrante, ativa-dor, uma vez que a obra não é oferecida como lu-gar distanciado. Dessa maneira, ela vai além de um manifesto de resistência. Segundo a artista, é uma experimentação propositiva que de fato intervém no cotidiano, impulsionando a participação do cidadão na construção da cidade na escala da vizinhança, por meio de sua atividade dentro da obra (GANZ, 2008). Assim, espaço pode ser entendido aqui como

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“lugar praticado”, expressão de Michel Certeau que se refere a uma espacialidade temporizada, antro-pológica, histórica e corporal (PALLAMIN, 2000, p. 39), enquanto que arte e arquitetura podem ser per-cebidas como possibilidade de movimento, uma vez neste espaço relacional, instável e tenso (WISNIK, 2012, p. 42).

100 m² de grama proporcionou situações que ativaram todo o espaço, pois colocaram em evidên-cia a existência de possibilidades. Envolveram os vizinhos, o dono da padaria, os professores e os alu-nos da creche em frente, a dona da boutique, o pro-prietário da clínica ao lado, os garotos da vizinhan-ça, os lavadores de carro da rua, o tomador de conta de carros, os passantes e os amigos (GANZ e SILVA, 2009, p. 67). “Então a gente tinha que negociar”, con-ta Ganz (GANZ, 2014, p. 6). Para ela, negócio é uma palavra que descreve bem o trabalho, que é mui-to mais um jogo de interesses em contraposição à equívoca ideia de um “imaginário colaborativo” ou um grupo fluido de pessoas a fim de colaborar e participar (GANZ, 2014, p. 6).

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Rubens Mano também realiza trabalhos com forte caráter político provocativo, introduzidos no espaço público de maneira muitas vezes sutil. Ele vê na arte a possibilidade de trabalhar o espaço co-mum como lugar onde a conversão de usuários em sujeitos é uma possibilidade real, liberando-se da dimensão exclusivamente física do campo arquite-tônico.

Segundo o artista, seus trabalhos são como inserções “silenciosas” que não procuram provocar a descontinuidade do espaço, mas sugerir outros fluxos existentes no ambiente urbano por meio de um processo de ressignificação. (MANO, 2003, p. 75). Para esta operação, Mano usa o termo interva-lo transitivo, pensado para designar uma ação que é capaz de suspender momentaneamente códigos perceptivos já disciplinados na medida em que se instala nas fissuras das estruturas ordenadoras do espaço (MANO, 2003, p. 2). Para a crítica de arte Thaís Rivitti, as experiências da cidade proporcio-nadas pelos trabalhos apontam, assim, para o frag-mento, a interrupção, da apreensão parcial e locali-zada. (RIVITTI, 2010, p. 158).

Vazadores (São Paulo, 2002) foi elabora-do para a 25ª Bienal Internacional de Arte de São

Rubens ManoVazadores2002São Paulo

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Paulo, no qual Mano representava São Paulo, uma das sete cidades exibidas. Como conta o artista, a intervenção foi pensada a partir da experiência que o espaço lhe provocou, beneficiando-se da crítica e reflexão sobre modernismo adquiridas em sua for-mação em arquitetura, do qual é importante exem-plar o edifício sede do evento, o Pavilhão Ceccillo Matarazzo (1951-1953), projetado para o Parque do Ibirapuera por Oscar Niemeyer (MANO, 2014, p. 4). Assim, “o espaço do museu não era uma possibili-dade, mas sim um ponto de partida” (RIVITTI, 2010, p. 156.) Dessa maneira, camadas foram destrincha-das e sobrepostas durante a concepção de Vazado-res, que, por fim, refletiu uma incongruência entre o tema proposto pela Bienal naquele ano – a metró-pole, sob curadoria de Alfons Hug – e a implantação da mostra num espaço que, apesar do esforço do arquiteto em destacar a relação interior-exterior, era fechado para a cidade e para discussões plurais sobre o assunto, sobretudo pelo gerenciamento da Bienal, que não questionava seu próprio exercício e apresentava uma série de conflitos, desde certa incompatibilidade entre uma exposição de arte con-temporânea num edifício moderno até a cobrança de ingressos (MANO, 2014, p. 4, 5).

Na intervenção, o artista propunha dois atra-vessamentos: um simbólico, que acabou não reali-zado, e outro físico. Este se constituía de uma es-trutura em forma de paralelepípedo discreta e sem indicação, que mimetizava e interceptava a facha-da principal do edifício, oposta a entrada do evento

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naquele ano. A construção era como um pequeno corredor com duas portas basculantes sem fecha-duras, o que permitia, portanto, a livre e gratuita passagem de qualquer um. Nessa operação, o ar-tista tencionava o debate sobre cidade, inclusão e as diversas instâncias que determinam a ocupação e o uso do espaço urbano, assim como problematizava estruturas espaciais e mentais da sociedade (WIS-NIK, 2012, p. 155), buscando um “real enfrentamen-to entre a cidade e suas representações” (MANO, 2003, p. 63).

Para a compreensão dessa obra, pode-se recorrer à reflexão do crítico Lorenzo Mammì a res-peito da arte contemporânea. Comentando algumas práticas recentes, o crítico identifica um traço ca-racterístico, que implica em que o significado dos trabalhos “parece” se deslocar “do interior da obra para a superfície dela, ou melhor, para o limiar que a separa do mundo” (MAMMÌ, 2012, p. 55). Operação similar se dava nesse trabalho que não tinha etique-ta, nem nada que indicasse o que era aquela inter-venção, confundindo-se com a própria arquitetura.

Assim, a intervenção trazia uma ideia de construção ao mesmo tempo em que sugeria uma contraposição à materialidade do já construído, ao propor possibilidades de permeabilidade (MANO, 2003, p. 80). Como aponta Mano, o trabalho não era finalizado em sua fisicalidade, logo, as experiências que poderiam ser proporcionadas ali pela constru-ção eram essenciais à sua natureza (MANO, 2014, p. 7). Experiências estas que Mano conta ter bus-

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cado garantir como possibilidade, mas que fugiram propositalmente de seu controle, de modo a não sugerir ou conduzir nada: se ninguém cruzasse o corredor ou completasse esse movimento era uma possibilidade, parte do trabalho, mas se ninguém o percebesse, o trabalho funcionaria parcialmente (MANO, 2014, p. 6). Elas não dependiam de um co-nhecimento específico para serem vivenciadas, nem precisavam ser as mesmas imaginadas pelo artista, de maneira que se poderia pretender ou promover outra coisa, desde que se percebesse aquele objeto. Segundo Mano, era justamente isso que lhe interes-sava, essa abertura proporcionada, essa gama di-versa de alternativas.

Entretanto, a obra rapidamente despertou reações. Logo após a abertura do evento, a direção da Bienal começou a “regrar” a passagem, que a princípio não tinha nenhum impedimento e permitia a entrada das pessoas sem o pagamento de ingres-so. Alegando questões de segurança, a Bienal pro-pôs um vigia para o trabalho, que não regularia, mas acompanharia o fluxo nessa passagem. Mano acei-tou essa quase imposição com a condição de que essa figura ficaria dentro do edifício, a certa distân-cia da obra. Diante dessa situação, o artista desen-volveu um monitoramento do controle que a Bienal faria sobre seu trabalho, instalando, assim, um mo-nitor e um gravador de fita VHS supervisionados por outro segurança. Essa pessoa contratada por Mano ficava no segundo andar do prédio, sentado diante de uma mesa e ao lado de uma cadeira vazia. Ela

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não podia dizer nada a respeito do que estava fazen-do ali, porém anotava tudo o que acontecia, inclusive quantas pessoas cruzavam a passagem – em média 50 por dia –, o que poderia servir como documento pra a Bienal se tranquilizar, visto que esse número representava muito pouco em termos de valor.

Por fim, durante uma viagem o artista ficou sabendo que a passagem estava muito restrita: ha-via pessoas obstruindo, definindo horários. Essa postura ia de encontro à sua intenção, e enxergando nela uma “morte anunciada”, solicitou o fechamento e o desmonte da obra antes do fim da mostra (MANO, 2013). A reação da direção da Bienal à transgressão espacial e institucional de Mano parecia demostrar sua pouca habilidade em lidar com a desarticulação de sua lógica institucional. A obra, portanto, expan-diu-se e revelou distorções sobre as expectativas e responsabilidades geralmente associadas à insti-tuição cultural (BATISTA e MANO, 2002, p. 73).

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A experiência com a visibilidade e a invisibi-lidade do espaço urbano já havia sido discutida por Rubens Mano no trabalho Calçada (São Paulo, 1999). Esta obra nasceu de um convite ao artista pela Ofi-cina Cultural Oswald de Andrade, no bairro Bom Retiro. Analisando aquele espaço, Mano observou a pouca conexão entre o “espaço público aberto”, da rua, e o “espaço público fechado”, do centro cultu-ral (MANO, 2014, p. 2). A rua mostrava-se muito fre-quentada, cheio de transeuntes entre o comércio e o metrô, enquanto o espaço do centro cultural era re-lativamente pouco utilizado, passando a maior par-te do tempo despercebido. Segundo o artista, havia nessa disparidade uma “transversalidade” que não se completava (MANO, 2013). O trabalho, portanto, busca a conexão entre esses espaços, operando com uma lógica característica da arte contempo-rânea, que, conforme as palavras do crítico Alber-to Tassinari: “[...] não transcende espacialmente o mundo e o espaço em comum, mas antes nasce deles e retorna à vida cotidiana acrescentando-lhe novos sentidos.” (TASSINARI, 2001, p. 88).

Assim, o artista estendia a tubulação elétrica do jardim do Centro Cultural até a calçada, disponi-bilizando energia elétrica 24h gratuitamente. A in-tervenção transformou do uso cotidiano do espaço

Rubens ManoCalçada1999São Paulo

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ao redor na medida em que ambulantes que traba-lhavam na calçada durante o dia passaram a tra-balhar à noite também, que os taxistas trouxeram para seu ponto de táxi uma televisão, e que o senhor que serviu de inspiração do trabalho pôde enfim de-monstrar a qualidade do som dos discos que ele ali vendia (MANO, 2014, p. 7). Surgiu, a partir da ação do artista, uma série de outras ações de agentes que costumeiramente se relacionavam de modo auto-mático e inerente àquele espaço (como ambulantes, transeuntes, moradores do bairro, frequentadores da região), proporcionando um “redescobrimento do sentido da cidade por parte de seus habitantes” (MANO, 2003, p. 6). A intervenção tornou-se, assim, uma espécie de vetor de encontros no lugar e com o lugar, estimulando a experimentação em vários ní-veis.

Segundo Mano, não há como aferir exata-mente o que aconteceu durante suas instalações, e sabê-lo não lhe importa. Ele acompanhou alguns momentos de ambos os trabalhos Vazadores e Cal-çada depois de instalados, e conta que teve certeza de que muita coisa foi possível por causa deles, o que lhe é suficiente (MANO, 2014, p. 5). “O traba-lho ganha porque ele repercute, se desdobra em si mesmo a partir dessas ocorrências” (MANO, 2014, p. 5).

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O artista-arquiteto mineiro Carlos Teixeira também partiu da transformação do uso do espa-ço para realizar suas obras Amnésias Topográficas I (Belo Horizonte, 2001) e Amnésias Topográficas II (Belo Horizonte, 2004), ambas em co-autoria com Louise Ganz. Nelas, em parceria com o grupo de te-atro de rua Armatrux, ele concebeu um novo signi-ficado ao espaço labiríntico de pilares gerado pela implantação de edifícios residenciais em um terre-no em declive no bairro Buritis, em Belo Horizonte.

A intervenção convertia essa área de difícil acesso, ignorada pelos condôminos e com aspecto de depósito de entulho em um espaço ativado e re-velado como cenário dos espetáculos Invento para Leonardo (2001) e Nômades (2004), ambos escritos por Paulo Azevedo, com dramaturgia concebida es-pecificamente para esses lugares.

Em Amnésias Topográficas I, o Armatrux convidou o escritório de Teixeira para pensar sobre onde poderia ser a próxima peça do grupo (Inven-to para Leonardo), então em fase de concepção. Foi apontado e aceito, assim, o espaço debaixo dos pré-dios. Depois disso, o grupo de teatro cuidou de toda a produção, inclusive do contato com a vizinhança e do contrato com os condôminos. O escritório traba-

Carlos TeixeiraAmnésias Topográficas I e Amnésias Topográficas II2001, 2004Belo Horizonte

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lhou o projeto com uma maquete que sugeria uma possibilidade de ocupação do espaço, facilitando su-gestões da companhia de teatro.

No espetáculo Invento para Leonardo, as pessoas não puderam entrar e vivenciar o espaço interno das palafitas, pois ele era limitado – apenas um edifício – e o grupo de teatro preferiu usar a ar-quibancada interna apenas como parte do cenário, uma vez que sua capacidade de público (50 pessoas) era bem menor do que a arquibancada externa (200 pessoas) que ficava num lote vago em frente às pa-lafitas (TEIXEIRA, 2014, p. 4). Assim, a peça, que era para ter dois atos (arquibancada externa e, depois, arquibancada interna), teve apenas um, e público não se deslocou pra dentro das palafitas.

Os vizinhos debaixo do edifício, principal-mente aqueles que faziam divisa com o lote vago que dava acesso às palafitas, estavam muitos sa-tisfeitos com a intervenção, pois foram beneficiados visualmente pelo espetáculo (TEIXEIRA, 2014, p. 7). Eles testemunharam a retirada de várias caçam-bas de entulho antes de se começar a produção do cenário. Dessa maneira, foram simpáticos à ideia e assistiram aos espetáculos de suas varandas, que, voltadas para o lote vago, eram como que balcões da plateia.

Observando esse mesmo terreno, notou-se que os prédios enfileirados têm divisões e muros no nível da rua, com separação de propriedades, lotes e condomínio, mas que, por baixo, não há divisão

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alguma, apenas um único vazio contínuo. Amnésias Topográficas II explorava esse vazio de prédios con-tíguos, que a princípio envolvia cinco edifícios, de maneira a construir um “percurso mais ou menos linear por dentro desse espaço meio cavernoso” (TEIXEIRA, 2014, p. 3). Porém, o terceiro prédio não quis ceder o espaço e o projeto ficou limitado so-mente a dois edifícios. Adaptado, ele se transformou de linha para espiral, um percurso espiralado com um paisagismo de fibras de coco, caixas de feira e capins, e com algumas salas, mini palcos pedidos pelo grupo Armatrux, aonde aconteciam algumas cenas (TEIXEIRA, 2014, p. 3). A partir, disso a peça Nômades foi concebida, quase como esse próprio percurso de exploração do espaço, no qual o público subia quatro andares.

Neste percurso, Amnésias Topográficas II assemelhava-se a estratégias da arte na contempo-raneidade explicitada por Mammì, em que o traba-lho “se dissolve na multiplicação das modalidades

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de percepção” (MAMMÌ, 2012, p. 87). Ainda segundo esse autor, o valor da obra “já não está mais nela, mas nas operações visuais que cumprimos a par-tir dela.”. (MAMMÌ, 2012, p. 87). Assim também pode ser percebida a intervenção, que permitia ao público visitar todos os recantos dos pilares, unindo palco e plateia, atores e público, e experimentar arquite-tura, paisagismo e recuperação ambiental em uma cenografia dada no espaço antes desconexo.

Amnésias Topográficas II teve um orçamen-to melhor do que Amnésias Topográficas I, pois não era somente um cenário do grupo de teatro, mas sim dois projetos paralelos submetidos ao Ministé-rio da Cultura que convergiram pro mesmo espa-ço: um da instalação arquitetônica, elaborado pelo escritório de Teixeira, e outro da dramaturgia, pelo grupo de teatro Armatrux (TEIXEIRA, 2014, p. 4). Assim, ambos tiveram produção independente, com um pouco mais de autonomia. O escritório de Tei-xeira concebeu e produziu o projeto arquitetônico,

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além de captar os recursos necessários para sua construção, conseguindo um valor bem maior do que o disponível em Amnésias Topográficas I. Dessa vez, o diálogo com as pessoas foi fei-to pelo escritório por meio de um panfleto contendo respostas para dúvidas frequentes, para informar e esclarecer os vizinhos diretamente afetados pela intervenção (TEIXEIRA, 2014, p. 5). O objetivo des-se recurso era também tentar convencê-los de que o evento poderia ser algo positivo, de que ele es-taria, durante uma temporada de um mês e meio mais ou menos, com recursos relativamente baixos, transformando uma paisagem que era de restos de construção civil em algum início de paisagismo (TEI-XEIRA, 2014, p. 5). Como aponta Teixeira, havia um receio de que as pessoas reagissem mal ao even-to, e, se houvesse alguma reclamação, o espetácu-lo teria que ser interrompido imediatamente, pois, uma vez sem a autorização da prefeitura, não havia nenhum recurso contra eventuais reclamações. Se-gundo Teixeira, os novos proprietários participantes estranharam a ideia de ceder o espaço sob suas ga-ragens para um espetáculo teatral, e foi difícil con-vencê-los (TEIXEIRA, 2014, p. 5). Eles temiam que o evento pudesse gerar algum tipo de invasão, visto que o espaço passaria de privado para “semi-públi-co” durante aquele período, visto que quem pagasse um valor simbólico poderia entrar. Por fim, foi feito um acordo com os condôminos por meio de um con-trato de comodato e de um aluguel do espaço com o valor de um salário mínimo por mês pra cada um

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Estudo final para Amnésias Topográficas II.

Estudo para Amnésias Topográficas II.

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dos edifícios, pois eles alegaram que teriam algu-mas despesas, como ceder água para regar os ca-pins (TEIXEIRA, 2014, p. 6).

Conforme acordado no contrato, terminado o evento as plataformas foram retiradas, pois para os locadores aquilo poderia incentivar à invasão do espaço. Na visão de Teixeira, os condôminos não es-tavam tão interessados em colaborar, de modo que foram dificultando o acesso ao jardim e à água (TEI-XEIRA, 2014, p. 6). O grupo de teatro e o escritório regaram os capins durante a temporada de apre-sentação, mas, depois disso, não houve manuten-ção do paisagismo e o jardim secou. Dessa maneira, Teixeira preferiu retirá-lo também para evitar qual-quer problema com possíveis incêndios gerados pe-las caixas de pinus (que pegam fogo rapidamente) misturadas às palhas (TEIXEIRA, 2014, p. 6).

Espaços Públicos Invisíveis (Nova York, 2008) não foi realizado, mas pretendia ser também um processo colaborativo de exploração espacial entre o arquiteto e a Companhia Suspensa de dança. Ele foi elaborado a quatro mãos para um concurso de

Carlos TeixeiraEspaços Públicos Invisíveis (não realizado)2008Nova York

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bolsa chamada Van Alen, oferecido pelo Instituto de Arquitetura Nova York, que, segundo o edital daque-le ano, daria prioridade pra projetos multidiscipli-nares, associado a outras artes (TEIXEIRA, 2014, p. 3). O projeto propunha a permanência do grupo du-rante dois meses em Nova York para que os deter-minados espaços públicos invisíveis na cidade fos-sem pesquisados: lugares que poderiam ter algum potencial de ocupação pública, mas que não eram utilizados dessa maneira (TEIXEIRA, 2014, p. 3, 4), tendo assim usos pré-definidos que poderiam ser “questionados por meio de um evento [...] conflitante com as expectativas de uso desses espaços” (TEI-XEIRA, 2010, p. 258). Dessa maneira, a intervenção seria resultado das percepções do arquiteto, que detecta os espaços, e da vivência dos bailarinos, que inventam uma maneira de ocupar e reinventar o uso dos mesmos. Vários lugares foram elencados como potenciais, como as áreas ociosas e subterrâneas entre as linhas do metrô, as torres da catedral St. Patrick, o espaço interno da Estátua da Liberdade e as passarelas entre os vitrais da Grand Central Station, principal estação de trem e metrô da cidade (TEIXEIRA, 2010, p. 258). Por ser a mais viável ins-titucionalmente, apenas esta última foi preliminar-mente desenvolvida e representada graficamente para o concurso.

Teixeira já havia estado na estação e repara-do em alguns corredores envidraçados suspensos, que ele denomina “corredores vitrine”, utilizados apenas por trabalhadores da estação e que o levou,

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muitos anos depois, a propor um espetáculo da Cia Suspensa neste lugar. (TEIXEIRA, 2014, p. 4). A in-tenção era dar outro sentido ao lugar, sendo os vi-trais da estação ocupados por corredores empilha-dos, palcos verticais para a apresentação que seria suspensa e voltada para os usuários da estação, ob-jetivando agregar uma nova função para esse local cotidiano. Entretanto, o projeto acabou não sendo selecionado para execução.

Assemelhando-se à colocação de Mammì, “se é o espaço quem detém o valor, o objetivo do artista será, antes de tudo, sua ocupação.” (MAMMÌ, 2012, p. 102). Nesse sentido, apesar de não reali-zada, a proposta desperta a reflexão e investigação sobre a ocupação dos espaços públicos mais em-blemáticos da cidade.

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referências teóricas

Destacaram-se acima algumas caracterís-ticas dos trabalhos em questão. A análise adiante dessas intervenções vale-se dos seguintes livros referenciais teóricos: Estética relacional, de Nicolas Bourriaud, publicado no Brasil em 2009, O espaço moderno, de Alberto Tassinari, publicado em 2001, e O que resta, de Lorenzo Mammì, publicado em 2012. Em comum, os três estudos procuram identificar e interpretar as principais características da produ-ção artística contemporânea, bem como compará--las às da arte moderna.

Em Estética relacional, Bourriaud discute a tendência política das obras contemporâneas em in-vestir e problematizar a esfera das relações huma-nas. Afirma a importância do contexto social dessas obras para a compreensão de suas noções interati-vas, convivais e relacionais. Analisa-as como poten-ciais transformadoras do contexto da realidade, não por meio da utopia, mas sim por meio da construção provisória e nômade de espaços concretos e situa-ções de convívio de forma crítica e subversiva, convi-dando o observador a participar de sua significação. Dessa maneira, a obra de arte amplia-se, faz parte de uma realidade maior, é cena inteira. Uma vez muda-da a função e modo de apreciação da arte, Bourriaud acredita numa urbanização da experiência artística.

Alberto Tassinari também traz para seu en-saio a potencialidade da arte em inventar modos de

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renovar a vida social. Ele define um espaço moderno como um espaço em obra, que pode ser visto como ainda se fazendo. Do seu ponto de vista, a arte con-temporânea se dá a partir de um espaço específico isto é, solicita o espaço do mundo em comum para nele se instaurar como arte. Assim, vincula-se a ele de forma complementar e contraditória: por um lado, arrasta esse espaço para si para a individualização da obra, e, por outro, procura mantê-lo inalterado e não articulado. A obra traz então novas configura-ções de um assunto e espaço previamente conhecido.

Para Lorenzo Mammì, não há como desvin-cular obra e espaço contemporâneos, pois aquela tem uma articulação única e característica com o espaço ao redor. Para ele, a escolha do espaço ex-positivo não é posterior à feitura da obra, mas é parte de sua ideação, concepção e sentido. Nessa vertente, a obra sai da galeria e toma a cidade. Atra-vés da ocupação do espaço ela desperta e determi-na um sentido que o próprio espaço já carrega em potencial.

Além desses três livros, a tese de doutorado Dentro do nevoeiro: Diálogos cruzados entre arte e arquitetura contemporânea, de Guilherme Wisnik, publicado em 2012, também foi de suma importân-cia para o embasamento desta pesquisa. Nela, Wis-nik traça como arte e arquitetura lidam com a con-temporaneidade por meio de estratégias e poéticas parecidas, discutindo questões espaciais, sociais e políticas e influenciando-se simultaneamente.

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A partir dessa leitura é possível construir al-gumas hipóteses de compreensão das práticas ar-tísticas selecionadas para análise por esse trabalho. Inicialmente, pode-se concluir que o modo como o espaço cotidiano e “banal” é tratado por eles herda características do modernismo, pop art e principal-mente do found-object, estratégia mais conhecida pela série de ready-mades de Marcel Duchamp.

O found-object é inquietante pois trata-se de um mero objeto com simples condição de coisa deslocado de seu ambiente para um espaço expo-sitivo. Dessa maneira, as operações pelas quais o artista mostra sua obra sobrepõem-se ao objeto em si (MAMMÌ, 2012, p. 90). Numa mesma vertente, os trabalhos aqui em questão atribuem valor estético a espaços cotidianos ao invés de um objeto. Quase numa inversão do procedimento duchampiano de deslocamento para dentro do espaço expositivo, os trabalhos analisados levam uma ideia de arte para os espaços comuns, ativando seus potenciais esté-ticos. A valorização e intervenção desse lugar na ci-dade são também estranhas e inesperadas. Os tra-balhos se distanciam, no entanto, do found-object por serem mais discretos e democráticos, uma vez que estão inseridos em meio à turbulenta dinâmica da cidade, podendo atingir qualquer transeunte, não somente visitantes preparados para certa experiên-cia. Nesse sentido, aproximam-se de experiências e discussões trabalhadas pelo artista brasileiro Hélio Oiticica, que “declara que o ‘museu é o mundo’, isto é, ‘a experiência cotidiana’, e propõe que os traba-

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lhos de arte realmente vitais sejam colocados em terrenos baldios da cidade, como ‘uma obra perdi-da, solta displicentemente, para ser ‘achada’ pelos passantes, ficantes e descuidistas’” (WISNIK, 2012, p. 102).

Alberto Tassinari coloca que se o conceito de obra moderno indicava que “é sempre para um sujeito que a obra se mostra” (TASSINARI, 2001, p. 148), os trabalhos artísticos a partir do found-object, ou que com ele estabelecem um diálogo, enquanto “espaços em obra”, apresentam, como parte de sua realização, uma discussão da relação entre sujeito (espectador) e obra. Não é mais a estrutura da sub-jetividade (a relação entre um determinado sujeito e um determinado objeto) que entra em questão, mas sim uma “teia intersubjetiva”, uma vez que o espec-tador torna-se parte produtora de sentido da obra (TASSINARI, 2001, p. 148). Há um rompimento com a “arte objetual da representação e da contemplação, transformando o espectador em participante, e in-cluindo o corpo de uma forma cada vez mais ativa na experiência da obra” (WISNIK, 2012, p. 79). Conce-bendo-se como “espaços em obra”, os trabalhos em questão podem ser compreendidos também como a criação dessa teia intersubjetiva que transforma o trabalho de arte numa relação entre agentes, obje-tos e espaços.

Num paralelo a essa mudança de relações, a concepção ambiental explorada por Oiticica tam-bém se baseia em uma trama intersubjetiva, “onde o papel antes preponderante da questão formal de-

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cresce em importância”, “superando a divisão ra-cionalista da cidade em funções, baseada na rela-ção binária entre ego e natureza” (WISNIK, 2012, p. 86-89). Assim, se espaço é projetável, o ambiente é condicionável (WISNIK, 2012, p. 89). Dessa mesma maneira podem ser entendidas as obras selecio-nadas que, alterando minimamente o espaço físico, sugerem dinâmicas e ambientes, porém proposital-mente não os controlam. A subjetividade do público é usada “como antídoto irredutível à instrumentali-zação das relações sociais” (WISNIK, 2012, p. 84).

Dessa forma, o significado dos trabalhos não está “mais ligado à sua autonomia, e sim à sua di-mensão contextual” (MANO, 2003, p. 8). Extrapo-lando a conformação tradicional de exposição das galerias e apropriando-se do espaço urbano, os trabalhos estão sujeitos às intempéries, à dinâmi-ca do local e às informações sensoriais dos arre-dores, proporcionando experiências continuamente diferentes. Segundo Bourriaud, “o quadro amplia-se; além do objeto isolado, ele agora pode abarcar a cena inteira.” (BOURRIAUD, 2009, p. 28). Percebido isso, Mammì coloca que “a autonomia da arte per-deu força, a obra tornou-se campo de embate entre diferentes planos de discursos – teorético, ético, es-tético.” (MAMMÌ, 2012, p. 27).

Refletindo sobre essas dinâmicas entre obra e espaço, Brian O’Doherty afirma que “space now is not just where things happen; things make space happen”1 (O’DOHERTY, 1986, p. 39) . Diferente de um

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espaço geometrizado e limitado, este é “topológico, contínuo e aberto à manipulação do participante” (WISNIK, 2012, p. 86). Assemelha-se, portanto, a concepção de Michel de Certeau sobre espaço como animação do lugar, ou seja, um espaço temporizado, antropológico, histórico, corporal, particularizado e independente de um padrão dominante de procedi-mentos. (PALLAMIN, 2000, p. 39). Nesse sentido, a concepção espacial de O’Doherty também se apro-xima de textos teóricos de Bernard Tschumi sobre evento e movimento, nos quais acontecimentos no espaço são colocados como mais importantes do que o próprio espaço arquitetônico (TEIXEIRA, 2014, p. 14). Assim, trabalho e espaço só existem quando há interação.

Nesse sentido, se seguirmos também as con-siderações de Claire Bishop acerca da questão da participação, podemos compreender os trabalhos selecionados nesta pesquisa em consonância, por exemplo, com os happenings, as performances, prá-ticas características da arte dos anos 1970, como as atividades do grupo Fluxus. A declaração de Joseph Beuys de que “todo homem é um artista”, casa-se com a forma de perceber o processo artístico des-ses trabalhos (BISHOP, 2004, p. 4). Entretanto, po-dem também ser associados à geração de artistas como Richard Serra e Robert Smithson, que, saindo da galeria, abordaram espaços onde o tecido urba-

1 “o espaço agora não é só o lugar onde coisas aconte-cem; coisas fazem o espaço acontecer” (O’DOHERTY, 1986, p. 39, tradução nossa).

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no afrouxa, mortos e invisíveis por falta de sentido (MAMMÌ, 2012, p. 102). Categorizadas comumente como land art, suas obras exploram uma escala di-ferente do objeto de arte e mais próxima da cons-trução civil (WISNIK, 2012, p. 146). Nesta operação, trabalham o conceito de site-specificity, que atribuí valor a esses espaços e suas especificidades e obje-tivam, portanto, sua ocupação, uma vez que só fazem sentido num lugar específico. Gordon Matta-Clark, por sua vez, é outro artista cuja obra pode ser lem-brada para a compreensão dos trabalhos em ques-tão, na medida em que trouxe, em suas práticas, o princípio do site-specificity para o interior da cena urbana, desvelando “a irracionalidade dos proces-sos urbanos guiados pela especulação imobiliária, escondida atrás da aparente disciplina ordenadora das suas edificações” (WISNIK, 2012, p. 158, 159).

As décadas de 1960/70 representam, portan-to, grandes mudanças de movimento no campo da arte, desde a própria concepção de arte, sua escala e operações até suas relações com o espaço e o in-divíduo. Assim também o foi para a arquitetura e o urbanismo, que, neste momento, revisava a política de “terra arrasada” ligada às ideias de “redesen-volvimento” para tender à moderação: “em vez de, sob a égide de um plano totalizante, “erradicar-se o caminho das mulas” (no dizer do arquiteto Le Cor-busier), passaram a ser valorizadas as intervenções de pequeno porte, respeito às tradições, costumes e uma arquitetura regionalizada” (PALLAMIN, 2000, p. 64).

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No Brasil, país de tradição patrimonialista com passado colonial e escravocrata não inteira-mente rompido, instituições civis débeis, tratadas via de regra segundo interesses pessoais, e com questões conjunturais, relativas à repressão da ins-tância pública pela ditadura, “é notável uma grande resistência dos artistas brasileiros em aderir a uma dimensão mais edificante de espaço público naque-le momento” (WISNIK, 2012, p. 102, 103). A esfera pública brasileira parece permanentemente proble-mática. Neta época, Vilanova Artigas e Paulo Men-des da Rocha estavam fazendo casas brutalistas, urbanizando a vida doméstica e forçando a criação de um comportamento mais responsavelmente civil enquanto que inversamente Hélio Oiticica preten-dia “domesticizar” a vida pública como resistência à instrumentalização das relações (WISNIK, 2012, p. 83, 84). Apesar de opostos, ambos estavam “pro-blematizando a fronteira entre as esferas pública e privada de modo a transgredi-las, inventando assim formas novas e exigentes do viver coletivo” (WIS-NIK, 2012, p. 83, 84).

Neste sentido, os trabalhos de Mano, Ganz e Teixeira referenciam muitos pensamentos dessas décadas. Usam da estratégia do site-specificity no cotidiano da cidade, buscando tensionar as esferas do público e do privado, seja usufruindo de terrenos baldios, franqueando a entrada para uma exposição de arte paga, fornecendo energia elétrica gratuita, acessando espaços exclusivamente residenciais ou simplesmente especulando ocupações de lugares

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públicos que não estão sujeitos a uma apropria-ção de mesmo caráter. Por meio da participação do indivíduo no processo de significação do trabalho, quebram com a percepção automatizada. Abordam espaços denominados por Ignasi de Solà-Morales de terrain vague, lugares aparentemente esqueci-dos, obsoletos, estranhos e sem limites, “exteriores mentais no interior físico da cidade que aparecem como contraimagem da mesma, tanto no sentido de sua crítica como no sentido de sua possível alterna-tiva” (SOLÀ-MORALES, 2012, p. 3). Espaços que não podem se definir nem como identitários, relacionais ou históricos, que não criam “nem identidade sin-gular nem relação, mas sim solidão e similitude” (AUGÉ, 2012, p.95), anonimato e indiferença, apro-ximando-se, nesse sentido, da definição de Marc Augé sobre não lugar, ainda que este se refira mais especificamente a espaços de circulação com inten-sos fluxos, como aeroportos e estações de metrô.

Assim, os trabalhos deslocam o significado de espaços desconexos conferindo-lhes uma qua-lidade nova. Como coloca Laymert Garcia dos San-tos: “o lugar é o mesmo de sempre e, no entanto, outro” (SANTOS, 2002). A quebra da rotina urbana que proporcionam desregula valores em planos di-versos propondo sentidos conflitantes (PALLAMIN, 2000, p. 79), e, assim, “ressignifica o espaço e o su-jeito, bem como a cidade e a cidadania.” (SANTOS, 2002). Dessa maneira, os trabalhos aqui em ques-tão podem ser compreendidos a partir da perspec-tiva fornecida por Nicolas Bourriaud na medida em

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que “não perseguem a meta de formar realidades imaginárias ou utópicas, mas procuram construir modos de existência ou modelos de ação dentro da realidade existente.” (BOURRIAUD, 2009, p. 18).

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considerações finais

Todas as obras aqui selecionadas agem na cidade real e atual, enfrentando seus problemas e pensando oportunidades. Dentre a poluição visual e informativa naturais da urbanidade, estas obras, concebidas para lugares específicos, buscam seus sentidos na paisagem. Publicamente acessíveis, são muito mais democráticas do que obras expostas em galerias, que naturalmente filtram seus aprecia-dores. Desde que perceba a obra, qualquer pessoa está sujeita às experiências, vivências e relações proporcionadas por esta, o que favorece múltiplas interpretações, reflexões e apropriações.

O caráter efêmero comum aos trabalhos analisadas permite, com recursos relativamente escassos, rapidamente ativar espaços e discussões públicas (como a revisão do plano diretor de Belo Horizonte, que houve alguns anos depois de Amné-sias Topográficas II, na qual se discutiu como impe-dir que novos pilares como aqueles fossem cons-truídos (TEIXEIRA, 2014, p. 7, 8)). Com a qualidade de trabalhar o imaginário, esses trabalhos partem de uma leitura urbana para romper o cotidiano pro-gramado e subverter a lógica dos espaços em que se dão, entendendo-os como dimensões abertas à reconstrução de seus sentidos (PALLAMIN, 2000) e permitindo, assim, experiências e vivências an-tes bloqueadas e impensáveis. Como coloca Sansão Fontes, em contrapartida às intervenções caras,

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permanentes e de grande escala, os projetos tem-porários se dão no âmbito do pequeno, das rela-ções sociais, provocando participação, interação e subversão de situações reais específicas (SANSÃO FONTES, 2011, p. 30). Já as intervenções perma-nentes podem até provocar o mesmo num primeiro momento, porém, com o tempo, são incorporadas às próprias dinâmicas usuais, perdendo sua força como deslocamento (RUBENS, 2014, p. 8).

Quando questionados sobre suas formações e atuações, os artistas/arquitetos revelaram dife-rentes visões, assemelhando-se, porém, no desfo-que dos limites entre esses dois campos. A gradua-ção em arquitetura e urbanismo permite realmente uma abertura de possibilidades para além de si pró-pria, que são investigadas conforme o interesse in-dividual. Entretanto, suas questões e ensinamentos parecem estar sempre presentes em qualquer que seja a possibilidade escolhida. De qualquer manei-ra, as evidentes reflexões espaciais desenvolvidas pelos trabalhos aqui analisados e as relações entre indivíduo e espaço colocadas nos fazem questionar os limites entre arte e arquitetura.

A aproximação entre esses campos parece estratégica, uma vez que “a arte é capaz de não se submeter inteiramente aos imperativos econômi-cos, atuando também sobre eles” (WISNIK, 2012, p. 120). De alguma maneira, os trabalhos “primeiro problematizam o estatuto da arquitetura, na medi-da em que questionam sua autonomia e postulam todo o espaço circundante, a paisagem urbana,

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como parte construtiva das intervenções” (PEIXO-TO, 2002, p. 12). Sendo assim, a crítica direta ou me-tafórica feita pelos trabalhos “incide exatamente no ataque aos conceitos de eficiência e funcionalidade, minando a aparência ordenada (e ordenadora) com que a sociedade se apresenta a nós em sua superfí-cie” (WISNIK, 2012, p. 124).

Enfim, independente do que pode ser discuti-do do que é arte ou do que é arquitetura, a potência dos trabalhos está na premissa da execução, apro-priação e confronto de ações em espaços urbanos e cotidianos, de forma prática e efetiva. Como escreve Nicolas Bourriaud, “parece mais urgente inventar relações possíveis com os vizinhos de hoje do que entoar loas ao amanhã” (BOURRIAUD, 2009, p.62). Neste sentido, as discussões trazidas por estas obras se mostram atuais e relevantes para ques-tionar os desequilíbrios urbanos e o quadro de pri-vatização dos espaços da cidade, bem como pensar uma construção e desenvolvimento destas, contri-buindo, assim, para a reflexão e a prática da arte, arquitetura e urbanismo contemporânea.

Tendo como base intervenções urbanas como essas aqui apresentadas, além de práticas experimen-tais dentro do campo acadêmico, formei em 2012, junto a uma amiga, o MUDA_coletivo. Com enorme apoio de Pedro Barros, Tomaz Lotufo e Cecília Lotufo, tínhamos a intenção de colocar em prática algumas teorias que aprendemos na faculdade e construir alguma coisa no espaço real. Desde então busco ampliar meus olhares sobre arquitetura, espaço, cidade e vida urbana.

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Em pouco mais de um ano, realizamos al-gumas intervenções com materiais de baixo custo ou reutilizados, em que houve algum tipo de con-versa com o entorno, um processo do entendimento do local. Nessas ações, foram muito importantes o contato, a comunicação e a interação como modos de praticar o corpo no espaço. Desses trabalhos, destaco o MUDA_cidade – Palletmob (2012), Parque Minhocão – Balançar eu adoro (2013) e Sinta-se em casa (2013). Portanto, a motivação desta pesquisa científica coincide com um momento de autocrítica e reflexão sobre as intervenções até então realizadas pelo MUDA_coletivo. Isto é, eu desejava entender mais profundamente o que realizava espontanea-mente, compreender os limites e a real força des-sas práticas coletivas que começavam a evidenciar suas dificuldades, qualidades e contradições.

Após o estudo das intervenções selecionadas pela pesquisa (nenhuma vivenciada por mim) e a conversas com os artistas/arquitetos, hoje percebo que as dinâmicas, movimentos e usos parecem defi-nir um espaço, ou melhor, uma espacialidade, tanto quanto, se não mais, do que uma obra de grande porte. Nesse sentido, intervenções artísticas/arqui-tetônicas urbanas são extremamente potentes. Sei que com algumas propostas e pouca energia e ma-téria consumidas, muita coisa é possível: dinâmicas urbanas, espaço, lugar, características, memórias e referências estão abertos à reinvenção constate.

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fontes das imagens

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Fonte: GANZ e SILVA, 2009, p. 12 e 13, 67, 25, 26.

página 18:

Fonte: http://www.naocaber.org/pratica-urbana/lotes-va-gos-grama Acesso em out. 2013.

páginas 25, 26, 32, 33, 35, 36 e 37:

Fonte: acervo pessoal de Rubens Mano.

páginas 29:

Fonte: acervo do Bau da Escola da Cidade.

páginas 39, 40, 41, 42, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 51, 52, 53, 54, 51, 56, 58 e 59:

Fonte: acervo do escritório Vazio S/A.

páginas 75, 76, 77, 78, 79, 88, 89, 70 e 71:

Fonte: acervo pessoal de Julia Pinto

páginas 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86 e 87:

Fonte: acervo do MUDA_coletivo

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