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ESPECULAÇÃO, SOL E MAR · 2020. 5. 17. · Especulação, sol e mar: os vazios urbanos de Ponta Negra / Saulo Matheus de Oliveira Lima Cavalcante. - Natal, RN, 2019. 156f.: il

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ESPECULAÇÃO, SOL E MAR: OS VAZIOS URBANOS DE PONTA NEGRA

SAULO MATHEUS DE OLIVEIRA LIMA CAVALCANTE

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE TECNOLOGIA

CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO Natal – RN

2019

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SAULO MATHEUS DE OLIVEIRA LIMA CAVALCANTE

ESPECULAÇÃO, SOL E MAR: OS VAZIOS URBANOS DE PONTA NEGRA

Trabalho Final de Graduação apresentado ao Curso de Arquitetura e

Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no semestre

2019.2, como requisito para a obtenção do grau de Arquiteto e Urbanista.

Prof.ª Dr.ª Amíria Bezerra Brasil Orientadora

Natal – RN

2019

BANCA EXAMINADORA

PROF.ª DR.ª AMÍRIA BEZERRA BRASIL Orientadora

PROF. DR. EMANUEL RAMOS CAVALCANTI Examinador interno

PROF. ME. PEDRO FREIRE DE OLIVEIRA ROSSI Examinador externo

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Dr. Marcelo Bezerra de Melo Tinôco - DARQ - ­CT

Cavalcante, Saulo Matheus de Oliveira Lima.

Especulação, sol e mar: os vazios urbanos de Ponta Negra / Saulo Matheus de Oliveira Lima Cavalcante. - Natal, RN, 2019.

156f.: il.

Monografia (Graduação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Tecnologia. Departamento de Arquitetura e Urba-

nismo.

Orientadora: Amíria Bezerra Brasil.

1. Planejamento urbano - Monografia. 2. Vazios urbanos - Mo-

nografia. 3. Ponta Negra - Monografia. 4. Função social da pro-

priedade - Monografia. 5. Função socioambiental da propriedade -

Monografia. I. Brasil, Amíria Bezerra. II. Universidade Federal

do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/BSE15 CDU 711.4

Elaborado por Ericka Luana Gomes da Costa Cortez - CRB-15/344

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho não é um produto: é uma obra. É o resultado de anos

de esforços coletivos feitos por aqueles que, ao longo do caminho, acredita-

ram na minha dedicação e no meu comprometimento com os estudos e com

a construção de uma sociedade cada vez mais democrática. Não podia dei-

xar, neste momento de encerramento de uma importante etapa da minha

formação acadêmica e pessoal, de agradecer aos que me apoiaram, me de-

ram forças para continuar e estiveram ao meu lado nos momentos mais difí-

ceis da luta política e de minha vida.

É impossível não começar falando de minha mãe, Sheyla, o meu

tudo. É imensurável a sua dedicação para dar a meu irmão e a mim não

apenas condições de estudar e seguirmos nossos caminhos, mas uma for-

mação de seres humanos preocupados com o mundo e com as pessoas.

Mesmo quando não parecia ter jeito, mesmo quando as causas já estavam

perdidas, foi ela que me deu o apoio necessário para não abaixar a cabeça

e seguir acreditando que, com honestidade e coerência naquilo que acredi-

tamos, devemos continuar pelo caminho correto em busca de construir dias

melhores. Queria agradecer, ainda que de uma forma incapaz de expressar

o que sinto, ao seu esforço e renúncia em todos esses anos. Obrigado por

acreditar em mim quando eu mesmo não acreditava.

Ao meu pai, Marcelo, e ao meu irmão, Samuel. Somos pessoas di-

ferentes em muitos aspectos, mas a convivência nos ensinou a lidar com as

diversidades um dos outros e do mundo lá fora. Os seus companheirismos

me mostraram que a distância física não é barreira para o afeto e que o amor

supera qualquer divergência. Há entre nós um hiato nunca abreviado preen-

chido por saudade.

À minha família. De uma forma geral, sem errar pelo exagero, posso

dizer que tenho sorte de viver em famílias afetuosas que sempre me apoia-

ram em minhas escolhas, sempre me aceitaram e que me deram suporte em

minha criação. À minha “mãe preta”, Tia Socorro, que cuidou de mim quando

meus pais não o podiam e que me recebe em sua casa com um filho com

muitos irmãos, cujos laços sanguíneos não deram conta de nos atar, mas

que se uniram uns aos outros com a cola de seu carinho. Todos até aqui

citados foram meus alicerces quando as perdas que sofremos quase me fi-

zeram ruir. Obrigado por tudo.

Nessa trajetória, a minha formação acadêmica teve um papel extre-

mamente importante. Estudei quase minha vida escolar inteira em escolas

públicas e não poderia deixar de agradecer por isso. O ensino público foi a

minha vivência e meu mote de luta política por anos, foi onde aprendi os

conteúdos do conhecimento científico e onde entendi o quanto a educação

é transformadora na realidade social das pessoas. Tive o privilégio de estu-

dar em escolas com altos índices de desempenho cujos números traduziam

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os investimentos de verba pública e dedicação de seu corpo docente na for-

mação dos estudantes. Professores que se reinventavam e se mantinham

comprometidos com o ensino, ainda que as suas condições de trabalho não

fossem ideais.

Foi ainda na Escola Municipal 4º Centenário que tive contato com

uma equipe comprometida com a formação cidadã de seus alunos e onde

conheci muitos dos amigos que, assim como eu, foram incentivados e pre-

parados a ingressar no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia

do Rio Grande do Norte (IFRN). Sem sombra de dúvidas, estudar no IFRN

foi uma das melhores experiências da minha vida. Foi onde tive contato com

um modelo de ensino emancipatório que permite que o estudante se desen-

volva nas esferas acadêmicas, artísticas e políticas. Uma educação baseada

no conhecimento científico como uma lente para enxergar o mundo.

Após obter o diploma de Técnico em Edificações, ingressei no curso

de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte

(UFRN). Na universidade, tive contato, em disciplinas e eventos com discus-

sões e oportunidades únicas que me apresentaram um novo horizonte de

possibilidades de carreira. Foi graças aos projetos de extensão nos quais fui

bolsista, sobretudo no Fórum Direito à Cidade, que pude experienciar os im-

pactos das atividades universitárias na vida da comunidade externa. As rela-

ções construídas com colegas, professores e funcionários também foram

fundamentais nesses processos, pois, sem eles, não teria construído a

noção que trago em mim da importância do ensino superior e da defesa da

democracia. Ao 4º Centenário, IFRN, UFRN e seus professores e servidores,

o meu obrigado.

Haja vista o tempo de minha vida no ensino público, não é possível

ignorar a importância das políticas educacionais para a formação não apenas

minha, mas de milhões de estudantes. Os projetos de expansão dos Institu-

tos Federais e a interiorização das Universidades públicas afetaram a mim e

a muitos pelo Brasil. Essas políticas foram fruto do compromisso obstinado

de um projeto político comprometido com a educação pública. Eu sou um

dos resultados dessas políticas. Os programas de bolsas e de assistência

estudantil permitiram que eu pudesse permanecer nas instituições e me de-

dicar exclusivamente ao curso técnico e à graduação. Desde o auxílio finan-

ceiro, custeio de cursos de idiomas, auxílio alimentação a atendimentos de

saúde, recebi apoio institucional à minha permanência nos estudos. Não há

expressão maior da minha gratidão senão a ininterrupta defesa política da

educação pública e do conhecimento científico. Ainda que palavras não o

expressem, obrigado, presidente Lula, por ter me permitido sonhar com um

país melhor e por ter me dado os meios de conquistar meus objetivos.

Paralelamente aos estudos, pude encontrar nessas instituições es-

paços de discussão política que me formaram como pessoa. Tão logo ingres-

sei no IFRN, pude começar a participar de debates e me inserir no movi-

mento estudantil. Nele permaneci por muito tempo sem me organizar em

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partidos políticos, mas participando de forma independente das lutas em de-

fesa da educação, da diversidade sexual e do direito à cidade, principal-

mente. Assim, por anos da graduação, fui membro da coordenação do Cen-

tro Acadêmico de Arquitetura e Urbanismo (CAAU), pelo qual fui represen-

tante dos estudantes do curso em vários espaços institucionais, como no

Colegiado do curso. Também fui eleito representante dos estudantes da

UFRN no Conselho Administrativo Superior, onde defendi os interesses da

classe estudantil. Entretanto, em tempos mais recentes, em função do acir-

ramento do cenário político, do avanço do conservadorismo no país e da

organização institucional de agentes sociais comprometidos com o desmonte

daquilo que defendo, me filiei ao Partido dos Trabalhadores, no qual tenho

atuado de forma orgânica. Assim, não poderia deixar de agradecer aos com-

panheiros e companheiras que estiveram comigo defendendo nossas causas

em espaços institucionais, manifestações de rua, ocupações e eleições. Vo-

cês me formaram como ser humano.

Ao longo dessa caminhada, não estive sozinho em nenhum mo-

mento: ao meu lado estiveram amigos que me ajudaram a realizar as ativi-

dades acadêmicas e que me deram suporte fora do espaço institucional. Por

serem muitos nomes, não os citarei todos, peço que desde já me desculpem.

Mas gostaria de representar o conjunto desses amigos nos nomes de algu-

mas pessoas que tenho certeza que são do agrado de todos. Não poderia

deixar de falar de Alana, minha amiga fiel que esteve comigo na mesma

turma desde o IFRN e passou parte da graduação como minha inseparável

dupla de trabalho e companheira nas gestões do CAAU. Sarah, que também

esteve à frente do CAAU, juntou-se à minha turma, tornou-se minha amiga e

juntamente com Alana e eu se dispôs a vender dindim nos carnavais de Natal

para arrecadarmos dinheiro para custear nossas despesas com a faculdade.

A Thamyres, que também esteve comigo desde o IFRN na mesma turma e

apoiou todas as minhas loucuras, sempre me incentivando a descobrir coisas

novas e ousar sempre em minhas propostas. Vocês são incríveis, mulheres

inspiradoras, muito obrigado.

Por fim, gostaria de agradecer ao grupo de professores, bolsistas,

estudantes e agregados carinhosamente apelidados de “As Urbanas”, em

especial à Amíria. Em função da nossa proximidade e identificação, Amíria,

suscitou, por meio de discussões que tivemos, o meu interesse pelo tema

dos Vazios Urbanos e pelas discussões sobre direito à cidade. Graças ao

despertar desse interesse, juntei-me ao projeto de extensão Fórum Direito à

Cidade, no qual temos realizado atividades para discutir sobre diversos te-

mas com comunidades e movimentos sociais referentes ao direito à cidade.

Também é através desse projeto que estamos acompanhando o processo

de revisão do Plano Diretor de Natal, como abordaremos no corpo do traba-

lho. Assim, muito obrigado pelos conhecimentos passados, pelas experiên-

cias proporcionadas e pela amizade desenvolvida.

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RESUMO

Os vazios urbanos são um fenômeno presente na maioria das cida-

des brasileiras. Apesar de ser estabelecida, no Capítulo da Política Urbana

da Constituição Federal, a submissão do direito de propriedade ao cumpri-

mento de uma função social e de haver instrumentos previstos pelo Estatuto

da Cidade para o combate a essas situações, observa-se que ainda assim

há nos territórios das cidades lotes não edificados, lotes e edifícios subutili-

zados ou não utilizados. Em Natal, eles podem ser verificados ao longo de

toda a sua extensão, não obstante, é nos trechos mais consolidados do te-

cido urbano e onde há maior valorização fundiária que esses vazios denun-

ciam um dos resultados da produção capitalista do espaço não suficiente-

mente regulados pelo Estado: a especulação imobiliária. Alinhado com as

legislações federais, o Plano Diretor de Natal possui em sua redação a defi-

nição da função socioambiental da propriedade e instrumentos para garantir

o cumprimento dessa de acordo com as características do território, como as

ZPAs para a questão ambiental e as AEIS para proteção da população em

situação de vulnerabilidade social, entretanto, nas demais localidades do mu-

nicípio, não estabelece de forma direcionada meios de dirimir a retenção es-

peculativa. Uma localidade emblemática dessa questão e universo de estudo

deste trabalho é o bairro de Ponta Negra. Situado em uma área de grande

valorização em função das atividades turísticas de sol e mar da praia homô-

nima, é um bairro com uma ocupação presente desde o século XIX e que se

se expandiu ao longo do séc. XX, tornando-se um dos espaços de maior

interesse do mercado imobiliário a sul do município. Mesmo assim os dados

do trabalho apontam que cerca de 8,17% da área total do bairro, o que sig-

nifica 24,71% das áreas totais dos lotes passíveis de ocupação no território,

está não edificada ou sem uso. Isso significa que 1.127.572,32 m² em Ponta

Negra se configuram como vazios urbanos não edificados e sem uso. Dessa

forma, o trabalho é uma investigação que tem como objeto de estudo a rela-

ção entre os vazios urbanos do bairro de Ponta Negra, os elementos consti-

tuintes da forma urbana e a função socioambiental da propriedade e da ci-

dade, sendo seu objetivo geral “Propor diretrizes de uso e ocupação do solo

para os vazios urbanos do bairro de Ponta Negra a partir da análise dos ele-

mentos constituintes da forma urbana com vistas ao cumprimento da função

socioambiental da propriedade”. Para tanto, foram elencados os seguintes

Objetivos Específicos: 1. Compreender conceitualmente os vazios urbanos

sob a ótica da função socioambiental da propriedade; 2. Investigar as carac-

terísticas dos elementos constituintes da forma urbana que classificam os

lotes não edificados e sem uso como vazios urbanos; e 3. Caracterizar tipo-

logicamente os vazios urbanos identificados.

Palavras-Chave: planejamento urbano; vazios urbanos; Ponta Ne-

gra; função social da propriedade; função socioambiental da propriedade.

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LISTA DE SIGLAS

AEIS – Área Especial de Interesse Social

ANEs – Áreas Non Aedificandi

AGCCAR – Áreas de Grande Concentração das Camadas de Alta Renda

APP – Área de Preservação Permanente

CAAU – Centro Acadêmico de Arquitetura e Urbanismo

CLBI – Centro de Lançamento da Barreira do Inferno

CONEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente

GEHAU/UFRN – Grupo de Estudos em Habitação, Arquitetura e Urbanismo

da UFRN

IDH – Índice de Desenvolvimento Humano

IFRN – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande

do Norte

NASA – National Aeronautics and Space Administration

OUC – Operação Urbana Consorciada

PDN – Plano Diretor de Natal

PHLIS – Plano de Habitação de Interesse Social

PS – Plano Setorial

RA – Região Administrativa

SEL – Sistema de Espaços Livres

SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo do municí-

pio de Natal

SEMUT – Secretaria Municipal de Tributação

TPC – Transferência de Potencial Construtivo

UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte

ZAB – Zona de Adensamento Básico

ZAd – Zona Adensável

ZET – Zona Especial de Interesse Turístico

ZPA – Zona de Proteção Ambiental

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LISTA DE EQUAÇÕES

Equação 1 Cálculo do coeficiente de aproveitamento ......................................................................................................................................................... 56

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Mapa da divisão administrativa e macrozoneamento do município de Natal ........................................................................................................ 44

Figura 2 Exemplos de vazios em Natal ............................................................................................................................................................................... 50

Figura 3 Mapa das áreas centrais e áreas de maior verticalização do município ............................................................................................................... 57

Figura 4 Mapa da localização de Ponta Negra .................................................................................................................................................................... 64

Figura 5 Descida da Rua Afonso Magalhães ...................................................................................................................................................................... 66

Figura 6 Soldados estadunidenses apreciando frutos do mar com moradores locais à praia, em Natal, Brasil .................................................................. 66

Figura 7 Mapa de ocupação do solo de Ponta Negra, em 1970 ......................................................................................................................................... 68

Figura 8 Mapa de conjuntos habitacionais e loteamentos no bairro de Ponta Negra .......................................................................................................... 69

Figura 9 Fotografia da Praia de Ponta Negra, na década de 1980 ..................................................................................................................................... 70

Figura 10 Fotomontagem representando o impacto visual que espigões trariam à paisagem de Ponta Negra, caso fossem construídos ........................ 72

Figura 11 Mapa de ocupação do solo na área de Ponta Negra, em 2007 .......................................................................................................................... 73

Figura 12 Escada de acesso à faixa de areia sobre o enrocamento da Praia de Ponta Negra ........................................................................................... 74

Figura 13 Embarcações na Praia de Ponta Negra .............................................................................................................................................................. 74

Figura 14 Paisagem de Ponta Negra nos anos 1980 .......................................................................................................................................................... 76

Figura 15 Paisagem de Ponta Negra em 2016 ................................................................................................................................................................... 76

Figura 16 Mapa racial de habitantes de Natal ..................................................................................................................................................................... 78

Figura 17 Mapa de distribuição da renda domiciliar média por bairro em Natal .................................................................................................................. 79

Figura 18 Mapa de edificações com mais de 4 pavimentos em Natal ................................................................................................................................. 79

Figura 19 Mapa das legislações incidentes no bairro de Ponta Negra ................................................................................................................................ 80

Figura 20 Mapa de localização e zoneamento da ZPA 05 .................................................................................................................................................. 82

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Figura 21 Mapa das ZPA 06 e Unidade de Conservação Morro do Careca ....................................................................................................................... 82

Figura 22 Mapa de Localização da AEIS Vila de Ponta Negra ........................................................................................................................................... 83

Figura 23 Mapa de localização da ZET 1 ............................................................................................................................................................................ 84

Figura 24 Mapa de delimitação da área de estudo ............................................................................................................................................................. 87

Figura 25 Tabela de atributos dos lotes inseridos na área de estudo ................................................................................................................................. 88

Figura 26 Mapa de lotes completamente inseridos na área de estudo ............................................................................................................................... 88

Figura 27 Gráfico da relação entre o número de lotes vazios e os demais na área de estudo ........................................................................................... 90

Figura 28 Gráfico da relação entre a área dos lotes vazios e a dos demais na área de estudo ......................................................................................... 91

Figura 29 Mapa do mosaico de imagens georreferenciadas da área de estudo, em 2019 ................................................................................................. 91

Figura 30 Mapa dos lotes não edificados e sem uso a serem analisados .......................................................................................................................... 92

Figura 31 Mapa dos vazios urbanos de Ponta Negra classificados por localização ........................................................................................................... 93

Figura 32 Mapa dos vazios urbanos de Ponta Negra classificados por área ...................................................................................................................... 94

Figura 33 Mapa dos tipos elaborados ................................................................................................................................................................................. 99

Figura 34 Percentual dos tipos de acordo com a quantidade de vazios ............................................................................................................................. 99

Figura 35 Percentual dos tipos de acordo com a área dos vazios ...................................................................................................................................... 99

Figura 36 Mapa do tipo 1 .................................................................................................................................................................................................. 100

Figura 37 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 1 ........................................................................................................................................ 101

Figura 38 Exemplo-tipo do tipo 1 ...................................................................................................................................................................................... 101

Figura 39 Mapa do tipo 2 .................................................................................................................................................................................................. 102

Figura 40 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 1 ........................................................................................................................................ 102

Figura 41 Exemplo-tipo do tipo 2 ...................................................................................................................................................................................... 102

Figura 42 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 3 ........................................................................................................................................ 103

Figura 43 Mapa do tipo 3 .................................................................................................................................................................................................. 103

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Figura 44 Exemplo-tipo do tipo 3 ....................................................................................................................................................................................... 104

Figura 45 Mapa do tipo 4................................................................................................................................................................................................... 104

Figura 46 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 4 ........................................................................................................................................ 105

Figura 47 Exemplo-tipo do tipo 4 ....................................................................................................................................................................................... 105

Figura 48 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 5 ........................................................................................................................................ 105

Figura 49 Mapa do tipo 5................................................................................................................................................................................................... 106

Figura 50 Exemplo-tipo do tipo 5 ....................................................................................................................................................................................... 106

Figura 51 Mapa do tipo 6................................................................................................................................................................................................... 107

Figura 52 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 6 ........................................................................................................................................ 107

Figura 53 Exemplo-tipo do tipo 6 ....................................................................................................................................................................................... 107

Figura 54 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 7 ........................................................................................................................................ 108

Figura 55 Mapa do tipo 7................................................................................................................................................................................................... 108

Figura 56 Exemplo-tipo do tipo 7 ....................................................................................................................................................................................... 109

Figura 57 Mapa do tipo 8................................................................................................................................................................................................... 109

Figura 58 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 8 ........................................................................................................................................ 110

Figura 59 Exemplo-tipo do tipo 8 ....................................................................................................................................................................................... 110

Figura 60 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 9 ........................................................................................................................................ 110

Figura 61 Mapa do tipo 9................................................................................................................................................................................................... 111

Figura 62 Exemplo-tipo do tipo 9 ....................................................................................................................................................................................... 111

Figura 63 Mapa do tipo 10 ................................................................................................................................................................................................. 112

Figura 64 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 10 ...................................................................................................................................... 112

Figura 65 Exemplo-tipo do tipo 10 ..................................................................................................................................................................................... 112

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Condições que classificam os lotes em Natal quanto às categorias de vazios urbanos ..................................................................................... 60

Quadro 2 Formação das famílias ........................................................................................................................................................................................ 95

Quadro 3 Famílias formadas ............................................................................................................................................................................................... 95

Quadro 4 Formação dos tipos ............................................................................................................................................................................................. 98

Quadro 5 Tipos formados ................................................................................................................................................................................................... 98

Quadro 6 Condições que classificam os lotes em Natal quanto às categorias de vazios urbanos a partir de conceitos propostos ................................. 117

Quadro 7 Tipo 1 ................................................................................................................................................................................................................ 122

Quadro 8 Tipo 2 ................................................................................................................................................................................................................ 122

Quadro 9 Tipo 3 ................................................................................................................................................................................................................ 123

Quadro 10 Tipo 4 .............................................................................................................................................................................................................. 123

Quadro 11 Tipo 5 .............................................................................................................................................................................................................. 123

Quadro 12 Tipo 6 .............................................................................................................................................................................................................. 124

Quadro 13 Tipo 7 .............................................................................................................................................................................................................. 124

Quadro 14 Tipo 8 .............................................................................................................................................................................................................. 125

Quadro 15 Tipo 9 .............................................................................................................................................................................................................. 125

Quadro 16 Tipo 10 ............................................................................................................................................................................................................ 126

Quadro 17 Síntese das diretrizes ...................................................................................................................................................................................... 127

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................................................................................... 17

PARTE 1: VAZIOS URBANOS E O DIREITO À CIDADE EM NATAL .............................................................................................................................. 25

1. A PRODUÇÃO CAPITALISTA DO ESPAÇO E O DIREITO À CIDADE NA CONTEMPORANEIDADE .................................................................... 27

1.1. A PRODUÇÃO CAPITALISTA DO ESPAÇO URBANO ....................................................................................................................................... 28

1.2. O DIREITO À CIDADE NA CONTEMPORANEIDADE ......................................................................................................................................... 33

1.3. A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE: DO NACIONAL AO MUNICIPAL ....................................................................................................... 35

1.4. NATAL E A FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE ......................................................................................................................... 39

1.4.1. A função socioambiental da propriedade ....................................................................................................................................................... 40

1.4.2. O território e o zoneamento de Natal ............................................................................................................................................................. 43

2. OS VAZIOS URBANOS ............................................................................................................................................................................................... 49

2.1. CONCEITOS ........................................................................................................................................................................................................ 50

2.2. VAZIOS URBANOS E AS LOCALIZAÇÕES ........................................................................................................................................................ 53

2.3. NATAL E OS VAZIOS URBANOS ....................................................................................................................................................................... 55

2.3.1. Lotes não edificados e sem uso .................................................................................................................................................................... 56

2.3.2. Lotes e edifícios subutilizados ....................................................................................................................................................................... 58

2.3.3. Os edifícios não utilizados ............................................................................................................................................................................. 59

PARTE 2: O CASO DE PONTA NEGRA ............................................................................................................................................................................ 61

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3. PONTA NEGRA .......................................................................................................................................................................................................... 63

3.1. NATAL E O BAIRRO DE PONTA NEGRA ........................................................................................................................................................... 64

3.2. CONFLITOS SOCIOESPACIAIS E A ÁREA DE GRANDE CONCENTRAÇÃO DAS CAMADAS DE ALTA RENDA .......................................... 75

3.3. A LEGISLAÇÃO URBANÍSTICA INCIDENTE ...................................................................................................................................................... 80

4. OS VAZIOS URBANOS DE PONTA NEGRA ............................................................................................................................................................. 85

4.1. IDENTIFICAÇÃO DOS VAZIOS .......................................................................................................................................................................... 86

4.2. ANÁLISE TIPOLÓGICA ....................................................................................................................................................................................... 92

4.2.1. Classificação prévia....................................................................................................................................................................................... 92

4.2.2. Elaboração dos tipos ..................................................................................................................................................................................... 96

4.2.3. Tipologia ........................................................................................................................................................................................................ 99

4.2.3.1. Tipo 1 ....................................................................................................................................................................................................... 100

4.2.3.2. Tipo 2 ....................................................................................................................................................................................................... 101

4.2.3.3. Tipo 3 ....................................................................................................................................................................................................... 103

4.2.3.4. Tipo 4 ....................................................................................................................................................................................................... 104

4.2.3.5. Tipo 5 ....................................................................................................................................................................................................... 105

4.2.3.6. Tipo 6 ....................................................................................................................................................................................................... 106

4.2.3.7. Tipo 7 ....................................................................................................................................................................................................... 108

4.2.3.8. Tipo 8 ....................................................................................................................................................................................................... 109

4.2.3.9. Tipo 9 ....................................................................................................................................................................................................... 110

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4.2.3.10. Tipo 10 .................................................................................................................................................................................................... 111

5. AS DIRETRIZES ........................................................................................................................................................................................................ 113

5.1. Tipo 1 ................................................................................................................................................................................................................. 122

5.2. Tipo 2 ................................................................................................................................................................................................................. 122

5.3. Tipo 3 ................................................................................................................................................................................................................. 123

5.4. Tipo 4 ................................................................................................................................................................................................................. 123

5.5. Tipo 5 ................................................................................................................................................................................................................. 123

5.6. Tipo 6 ................................................................................................................................................................................................................. 124

5.7. Tipo 7 ................................................................................................................................................................................................................. 124

5.8. Tipo 8 ................................................................................................................................................................................................................. 125

5.9. Tipo 9 ................................................................................................................................................................................................................. 125

5.10. Tipo 10 ........................................................................................................................................................................................................... 126

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................................................................................... 131

7. REFERÊNCIAS.......................................................................................................................................................................................................... 139

APÊNDICES ................................................................................................................................................................................................................. 143

APÊNDICE A: Mapa dos vazios urbanos de Ponta Negra classificados por localização .............................................................................................. 145

APÊNDICE B: Mapa dos vazios urbanos de Ponta Negra classificados por área ........................................................................................................ 147

APÊNDICE C: Mapa dos tipos elaborados ................................................................................................................................................................... 149

ANEXOS ....................................................................................................................................................................................................................... 151

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ANEXO 1: CAPÍTULO DA POLÍTICA URBANA DA CONSTITUIÇÃO (BRASIL, 1988) ............................................................................................... 153

ANEXO 2 – ARTIGO 2º DO ESTATUTO DA CIDADE ................................................................................................................................................. 155

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INTRODUÇÃO

O Brasil é um país que concentra a maior parte de sua população

em centros urbanos, principalmente, em função das condições de emprego

e vida que neles são ofertados. Entretanto, nem a população dessas cidades

se distribui de modo uniforme por seu território nem os recursos de infraes-

trutura urbana, os quais são financiados coletivamente, são dispostos de

forma homogênea ao longo de sua extensão. Com a intensificação da ocu-

pação desses centros a partir da segunda metade do século XX, sua popu-

lação cresceu e seus limites se expandiram em uma velocidade superior à

capacidade de adaptação das estruturas físicas de suporte. As cidades, de

modo geral, espraiam-se, concentrando recursos e uma população abastada

em áreas específicas, enquanto às camadas mais pobres da classe traba-

lhadora e, consequentemente, mais necessitadas de equipamentos e servi-

ços urbanos, são relegados os espaços mais distantes, menos dotados de

infraestrutura e, muitas vezes, os informais. Como afirma Flávio Villaça

(2011), as camadas mais pobres da sociedade não ocupam apenas as peri-

ferias, mas também áreas centrais marginalizadas, como as favelas que mar-

geiam os bairros mais bem localizados das capitais, como áreas de risco

próximas às áreas centrais ou como os próprios centros empobrecidos,

quando os núcleos originais da cidade já deixaram de ser ocupados pelas

dinâmicas econômicas e de trabalho das elites urbanas.

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Todavia, se por um lado há uma intensa ocupação das parcelas das

cidades marcadas pela ausência de infraestrutura e das periferias e uma

grande demanda habitacional não aplacada, por outro lado há parcelas do

tecido urbano consolidado que retêm lotes não edificados e sem uso, lotes e

edifícios subutilizados ou cujo uso não confere à terra urbana uma função

social, como abordaremos a seguir. Esses espaços são chamados de vazios

urbanos, os quais são marcas de um processo de formação da cidade orien-

tado pela segregação socioespacial1. A sua existência, ainda que não seja

exclusivamente causada por ela, é diretamente relacionada com a especula-

ção imobiliária, visto que o modo capitalista de produção do espaço urbano,

como expõe Amíria Brasil (2016, p. 33), atribui à terra o status de “mercadoria

de alto preço e propriedade privada”, o que confere a ela um valor de troca

que a faz valorizar-se de acordo com a sua localização em relação aos de-

mais elementos da malha urbana.

Dessa maneira, a proximidade com equipamentos, oferta de infraes-

trutura urbana, interesses turísticos, flexibilidade legislativa e um mercado

produtor aquecido fazem com que algumas áreas da cidade tenham maior

valor que outras, pois, como afirma David Harvey (2013, p. 315-316), “a de-

cisão de onde colocar um elemento não pode ser divorciada do ‘onde’ dos

outros”. Desse modo, os vazios se distribuem pela cidade sob variados

1 Segregação socioespacial é tratada neste trabalho como sendo, de acordo com Villaça, “a alta concentração de camadas sociais em determinada parcela do espaço urbano” (1997, p. 6), sendo esta uma consequência do modo capitalista de produção do espaço.

fatores e formas, mas ocorrem, sobretudo, onde há um maior interesse do

mercado imobiliário em lucrar. Esse valor associado à localização, por sua

vez, é determinante, nas áreas do tecido urbano consolidado, para a sua

ociosidade com fins especulativos, uma vez que a oferta de infraestrutura

circundante torna a sua edificação ou transação imobiliária potenciais gera-

dores de lucro. Se por um lado, essa diferenciação promove a construção

social de edificações e vazios, por outro, dentro do modelo capitalista de pro-

dução, também produz segregação socioespacial, visto que a distribuição de

tais atributos não se dá de forma homogênea no território.

Por entender que a retenção especulativa é um dano à produção

coletiva da cidade, as legislações que tratam da política urbana impõem limi-

tes à propriedade privada e estabelecem instrumentos urbanísticos para o

combate à especulação. No capítulo da política urbana da Constituição Fe-

deral, em seu artigo 182, está enunciado que a política de desenvolvimento

urbano tem por objetivo a promoção da função social da cidade e o bem-

estar dos seus habitantes, de modo que a propriedade urbana cumpre sua

função social quando cumpre com as exigências do plano diretor (BRASIL,

1988). Desse modo, submete a produção construtiva privada ou pública aos

interesses coletivos acordados no processo participativo de elaboração dos

planos diretores.

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A Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001 (BRASIL, 2001),

conhecida como Estatuto da Cidade, foi promulgada 13 anos após a aprova-

ção da Constituição com a função de detalhar o seu capítulo da política ur-

bana. Nele, em seu segundo artigo, estão determinadas 17 diretrizes gerais

a serem atendidas pelos instrumentos que se propõem a realizar o planeja-

mento territorial, seja sua escala de abrangência nacional, regional, estadual,

metropolitano, microrregional ou municipal (BRASIL, 2001). Entre essas di-

retrizes, está explicitado que a ordenação e o controle do uso do solo devem

se dar de modo a evitar “a retenção especulativa de imóvel, que resulte na

sua subutilização ou não utilização” (BRASIL, 2001). O Estatuto ainda traz

um rol de instrumentos urbanísticos para que sejam utilizados a fim de se

cumprir tais diretrizes, entre os quais destacam-se, para esta discussão, o

Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsórios (PEUC), o Imposto so-

bre a Propriedade Predial Territorial e Urbana Progressivo no Tempo (IPTU

Progressivo) e a instituição de Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS)

(BRASIL, 2001). Além disso, o Estatuto também define o cumprimento da

função social da propriedade da seguinte forma:

a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à jus-tiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas. (BRASIL, 2001).

Sendo assim, os vazios urbanos são parcelas do território que suba-

proveitam os investimentos coletivos que os cercam, contribuindo

negativamente com a qualidade de vida dos habitantes e usuários à sua

volta, sendo um entrave ao pleno desenvolvimento de atividades econômi-

cas, bem como não atende às necessidades dos cidadãos de acesso à terra

ou a seus bens e serviços. Enquanto as cidades possuem um contingente

humano desabrigado ou em más condições habitacionais, os proprietários

de lotes retêm solo urbano vazio. Desse modo, descumprem a função social

da propriedade.

Na esfera municipal, temos a Lei Orgânica do Município (NATAL,

1990) e a Lei Complementar nº 82, de 21 de jun. de 2007, que institui o Plano

Diretor de Natal (PDN) (NATAL, 2007). Em seu capítulo da política urbana,

a Lei Orgânica ratifica o expresso na Constituição e estipula que o processo

de elaboração do plano diretor deve se dar de forma participativa e que “as

funções sociais da cidade dependem do acesso de todos os cidadãos aos

bens e aos serviços urbanos, assegurando-lhes condições de vida e de mo-

radia compatíveis com o estágio de desenvolvimento do Município” (NATAL,

1990). Já no PDN, esse conceito surge sob a alcunha de “função socioambi-

ental da propriedade”, destacando a necessidade de que a ocupação se dê

conforme as capacidades da infraestrutura disponível, garanta a qualidade

ambiental ao usuário do lote e seus vizinhos e esteja subordinada às demais

legislações (NATAL, 2007).

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O PDN vigente, em seu macrozoneamento, divide o território em três

zonas: as Zona Adensável2 (ZAd), Zonas de Adensamento Básico3 (ZABs) e

Zonas de Proteção Ambiental4 (ZPAs) (NATAL, 2007). Dessa forma, a ocu-

pação da cidade ocorre majoritariamente entre as ZAd e as ZABs, sendo

aquela a porção em que há maior oferta de infraestrutura urbana. O plano

também possui em seu corpo a previsão dos instrumentos de PEUC e de

IPTU Progressivo, instrumentos classificados pelo Instituto Pólis como sendo

de indução ao desenvolvimento urbano (2001), entretanto não se apresen-

tam de forma autoaplicável nem receberam regulamentação específica pos-

terior, portanto nunca foram implementados.

Apesar dessa prescrição legislativa existente, o Poder Público muni-

cipal não consegue, através dos mecanismos que utiliza, impedir a formação

dos vazios urbanos ou mesmo intervir na sua perpetuação. Um dos fatores

para que isso aconteça é o conflito de interesses que existe sobre a terra,

sobretudo em função do município não ter o poder de polícia suficiente para

limitar o mercado imobiliário no sentido do cumprimento da função socioam-

biental da propriedade. Enquanto avançam, nos processos participativos de

2 Zona Adensável: aquela onde as condições de infraestrutura, meio físico e necessidade de diversificação de uso possibilitem maior adensamento (NATAL, 2007). 3 Zonas de Adensamento Básico: porções do território que não possuam características que justifique seu maior adensamento e sobre as quais incide estritamente o coeficiente de apro-veitamento básico (NATAL, 2007). 4 Zonas de Proteção Ambiental: onde os aspectos ambientais, ecológicos, paisagísticos, históricos, arqueológicos, turísticos, culturais, arquitetônicos e científicos necessitam de res-trições de uso e ocupação do solo para sua manutenção e recuperação (NATAL, 2007).

elaboração de planos diretores, instrumentos como as ZPAs e Áreas Espe-

ciais5, os quais garantem proteção aos aspectos ambientais e a permanência

de comunidades vulneráveis em seus locais de origem, instrumentos de com-

bate à ociosidade em áreas privilegiadas são recebidos com resistência.

Uma das áreas da cidade que apresenta uma concentração de lotes

vazios e que nos chama atenção pelo papel que desempenha na economia

local, em função das atividades voltadas para o turismo em que nele se rea-

lizam, é o bairro de Ponta Negra. Localizado na ZAB, o bairro tem a origem

de sua ocupação imprecisa, mas seu crescimento aconteceu de forma verti-

ginosa ao longo do século XX, quando passou de um território ocupado por

uma vila de pescadores a um cartão postal do circuito turístico internacional.

A alteração em de sua dinâmica territorial transformou o lugar do ponto de

vista socioespacial, mantendo os descendentes dos pescadores originais em

uma parcela do bairro hoje caracterizada pela AEIS Vila de Ponta Negra, ao

mesmo tempo em que se veem instalados ao longo de sua extensão hotéis

com turistas do mundo todo e dois conjuntos habitacionais voltados para a

classe média. Com essa transformação veio a valorização fundiária e, junto,

5 Área Especial é entendida no PDN como sendo a porção do território municipal, delimitada por lei, que se sobrepõe às zonas em função de peculiaridades que exigem tratamento es-pecial (NATAL, 2007). Entre os tipos estão as Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS), as quais se assemelham às ZEIS estabelecidas pelo Estatuto da Cidade.

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a especulação imobiliária. Por causa, principalmente, do turismo de sol e

mar, Ponta Negra passou a ser uma das áreas mais procuradas para negó-

cios imobiliários, todavia, após sucessivas crises, a partir do fim da primeira

década do século XXI, o mercado na área esfriou e muitos dos lotes que

estavam com alta procura e mantêm alto valor agregados passaram a um

estado de ociosidade, à espera de compradores em momentos mais favorá-

veis. Nesse meio tempo, os terrenos se mantêm vazios, descumprindo a sua

função social, enquanto a população que habita o bairro tem diversas neces-

sidades não aplacadas.

Tendo em vista essa realidade de retenção desses imóveis em uma

área de grande valorização do território da cidade e levando em conta a ne-

cessidade de esta estabelecer meios, através do planejamento urbano, de

recuperação dos investimentos coletivos na região, entende-se como ques-

tão de pesquisa: “Quais diretrizes devem ser seguidas para que os lotes não

edificados e sem uso do bairro de Ponta Negra que se constituem como va-

zios urbanos passem a cumprir uma função social?”.

Ainda que os vazios urbanos sejam entendidos como imóveis não

edificados, subutilizados ou não utilizados, nem tudo que está vazio é neces-

sariamente um vazio urbano. Há um conjunto de atributos morfológicos e

características da dinâmica socioespacial do território a serem avaliados a

fim de identificar os vazios urbanos, visto que há parcelas do território em

que não é permitida a sua ocupação e/ou utilização. Essas restrições se

baseiam em legislação ambientais e urbanísticas que visam resguardar de-

terminados aspectos especiais do território, logo, tratam-se de áreas que,

ainda que não estejam edificadas ou utilizadas por atividades humanas, cum-

prem uma função social para a cidade.

A identificação dos vazios passa, portanto, por uma série de verifica-

ções sobre a possibilidade de uso e ocupação de determinada parcela do

território, a fim de compreender o seu papel na dinâmica local das relações

socioespaciais. Para tanto, é necessário averiguar a sobreposição de legis-

lações das esferas federal, estadual e municipal que imprimam sobre essa

extensão quaisquer restrições ou caracterizações especiais de uso e ocupa-

ção. Em seguida, é importante constatar se os lotes inseridos nessa área

cumprem com essas prescrições, destacando os que não cumprem como

vazios urbanos. Assim, podemos observar esses lotes, identificar as carac-

terísticas de seus atributos físicos e agrupá-los tipologicamente de modo a

estabelecer diretrizes para o cumprimento de sua função social.

No caso de Ponta Negra, identificamos a incidência de duas áreas

especiais, duas ZPAs e um conjunto de Áreas de Preservação Permanente

(APPs) cujas legislações caracterizam os trechos do bairro com suas parti-

cularidades e prescrições a fim de cumprir o que o PDN expressa como fun-

ção socioambiental da propriedade. Em algumas dessas áreas a ocupação

é proibida, em outras ela é permitida com prescrições mais ou menos restri-

tivas. Logo excetuados os lotes onde a ocupação é proibida, identificamos e

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destacamos os vazios urbanos do bairro. O que possibilita o seu agrupa-

mento a partir das prescrições urbanísticas incidentes e a sua dimensão ba-

lizada pelos instrumentos que o PDN dispõe.

Dessa forma, compreende-se o objeto de estudo como sendo a re-

lação entre os vazios urbanos do bairro de Ponta Negra, os elementos cons-

tituintes da forma urbana e a função socioambiental da propriedade e da ci-

dade.

Como universo de estudo definimos o bairro de Ponta Negra. O

bairro, cujo nome homenageia a praia homônima que foi indutora do seu sur-

gimento e tem, ao longo de sua área, parcelas de ocupação de variadas tem-

poralidades e características morfológicas: desde a comunidade tradicional

da Vila, passando pelos conjuntos habitacionais posteriores à década de

1970 e chegando à uma área turística com grande número de hotéis. Esses

espaços trazem consigo tipos característicos de edificações, como as casas,

hotéis e os condomínios verticais. Desse modo, uma vez que o bairro de

Ponta Negra se insere na ZAB e possui em seu território duas ZPAs, uma

Área Especial de Interesse Social6 (AEIS), uma Área Especial de Controle

de Gabarito (ZET) e um conjunto de APPs, observa-se que o uso e a ocupa-

ção do seu solo não podem se dar de maneira ostensiva, dadas as

6 Área Especial de Interesse Social: áreas “destinadas à produção, manutenção e recupe-ração de habitações e/ou regularização do solo urbano e à produção de alimentos com vistas a segurança alimentar e nutricional” (NATAL, 2007, p. 15)

fragilidades ambientais de algumas áreas, bem como sua paisagem, ativi-

dade turística e a comunidade tradicional que ocupa a AEIS da Vila de Ponta

Negra.

Sendo assim, ao analisar Ponta Negra é necessário atentar-se ao

processo especulativo que incide sobre essa área e que produz edificações

e vazios, mas sem perder de vista a sua inserção na ZAB, ou seja, que não

se trata de uma porção do território com suporte para grandes densidades

construtivas. Para tal, é preciso compreender o processo de evolução urbana

que ocorreu naquele espaço e como ele está hoje para que se possa refletir

sobre uma possibilidade concreta de mudança dessa condição de retenção

especulativa no futuro.

O Objetivo Geral deste trabalho é: “Propor diretrizes de uso e ocu-

pação do solo para os vazios urbanos do bairro de Ponta Negra a partir da

análise dos elementos constituintes da forma urbana com vistas ao cumpri-

mento da função socioambiental da propriedade”. Dessa forma, foram elen-

cados os seguintes Objetivos Específicos:

1. Compreender conceitualmente os vazios urbanos sob a ótica da função

socioambiental da propriedade;

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2. Investigar as características dos elementos constituintes da forma ur-

bana que classificam os lotes não edificados e sem uso como vazios

urbanos;

3. Caracterizar tipologicamente os vazios urbanos identificados.

Apesar do município de Natal prever, em seu Plano Diretor, instru-

mentos para coibir a retenção fundiária em seus limites, há obstáculos à efe-

tividade desse combate. A ausência de regulamentação específica para al-

guns dos instrumentos urbanísticos, as definições pouco esclarecedoras so-

bre a função socioambiental da propriedade e lotes subutilizados, bem como

a ausência ou pouca expressividade de estudos específicos sobre os vazios

urbanos no município são alguns dos fatores que dificultam a tomada de

ações que almejem que o cumprimento da função social da propriedade.

Por sua vez, a discussão sobre o direito à cidade e os seus conflitos

com a ação dos agentes especulativos do capital e da regulação estatal não

é nova, mas se apresenta urgente e imprescindível. Com a deflagração do

processo de revisão do plano diretor do município de Natal, em 2017, inicia-

tivas como o Fórum Direito à Cidade, na UFRN7, e mobilizações da socie-

dade civil organizada reaqueceram o debate do planejamento urbano com

vistas ao cumprimento da função social da propriedade. Uma contribuição à

7 Projeto de Extensão Fórum Direito à Cidade, coordenado pelas professoras Ruth Maria da Costa Ataíde e Amíria Bezerra Brasil do Departamento de Arquitetura da UFRN (DARQ). 8 Maria Dulce Picanço Bentes Sobrinha: professora adjunta do Departamento de Arquitetura da UFRN (DARQ), a época ministrando a disciplina de Projeto e Planejamento Urbano e Territorial 06 e membro do Fórum Direito à Cidade.

discussão foi a produção do Trabalho Final de Graduação de Bárbara Mari-

nho sobre a temática dos vazios urbanos. A partir das reflexões suscitadas

por esse trabalho e por esse contexto, novas investigações foram desenvol-

vidas na intenção de compreender esse fenômeno, suas causas e possibili-

dades de intervenção para que o solo pudesse cumprir sua função social.

Em 2018, sob orientação da Professora Dulce Bentes8, foi realizada uma

pesquisa intitulada “Vazios urbanos: estudos morfológicos no bairro de Ca-

pim Macio, em Natal, Rio Grande Do Norte, entre 2007 e 2018”, a qual se

dedicou a investigar os lotes sem uso e ocupação nesse bairro, lindeiro à

Ponta Negra (CAVALCANTE, 2018).

Em sequência a esse trabalho, foi realizado um artigo em parceria

com Bárbara Marinho e as professoras Ruth Ataíde9 e Amíria Brasil10 intitu-

lado “Vazios urbanos em Natal: um estudo para categorização das áreas oci-

osas e subutilizadas” (ATAÍDE, BRASIL, et al., 2019). Dessa forma, este tra-

balho se apresenta como uma continuação e um aprofundamento da discus-

são e de abordagem teórica: ampliando a sua proporção em complexidade

do universo de estudo, ao se tratar de uma área com maior sobreposição de

prescrições urbanísticas, e fazendo uma análise crítica ao conceito de função

social da propriedade em relação ao direito à cidade.

9 Ruth Maria da Costa Ataíde: professora associada do DARQ e membro do grupo de estu-dos EcoHabitat e do Fórum Direito à Cidade. 10 Amíria Bezerra Brasil: professora adjunta do DARQ e membro do Fórum Direito à Cidade.

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A fim de cumprir o primeiro objetivo específico, fazemos uma revisão

bibliográfica acerca da produção capitalista do espaço e do direito à cidade

na contemporaneidade, o que resultou no Capítulo 1: A Produção Capitalista

e o Direito à Cidade na Contemporaneidade. Para tanto foram abordados,

sobretudo os trabalhos de David Harvey (2005, 2013), Flávio Villaça (1997,

2011) e Emanuel Cavalcanti (2018) sobre a produção capitalista do espaço

e Csaba Deák (2001) sobre localizações. Para tratar do tema do direito à

cidade na contemporaneidade, elencamos as obras de Henri Lefebvre (2001)

e David Harvey (2014). Por fim, para tratar da função social da propriedade

analisamos os artigos do capítulo da política urbana da Constituição Federal

(BRASIL, 1988) e o Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001), no âmbito nacional,

e, no âmbito municipal, o Plano Diretor de Natal (NATAL, 2007).

Para atingirmos o segundo objetivo específico, desenvolvemos o Ca-

pítulo 2: Os Vazios Urbanos. A partir das análises sobretudo do capítulo da

política urbana da Constituição (BRASIL, 1988), do Estatuto da Cidade

(BRASIL, 2001) e do Plano Diretor de Natal (NATAL, 2007), explanamos o

conceito de vazios urbanos e sua relação com a localização da terra, abor-

dando as formas como são classificados pela legislação. No Capitulo 3:

Ponta Negra, abordamos os aspectos históricos, morfológicos, sociais e le-

gislativos do bairro que constitui o nosso universo de estudo. Assim, desta-

camos as suas particularidades e elementos que possibilitam a identificação

dos vazios. Temos, pois, como principais referências Maria Suely Paula da

Silva (2006), Karina Messias da Silva (2007), Ângelo Magalhães Silva (2013)

e os bancos de dados da SEMURB e da pesquisa “Caracterização do tecido

urbano de Natal: um estudo morfológico da evolução urbana da cidade”, co-

ordenada pela professora Amíria Bezerra Brasil. Em seguida, observando a

inserção de Ponta Negra na Área de Grande Concentração das Camadas de

Alta Renda (AGCCAR) de Natal, alisamos os aspectos socioeconômicos do

bairro sob a ótica de Villaça (2011). Por fim, abordamos as legislações urba-

nísticas e ambientais incidentes sobre o território, nas esferas municipais e

federais, tendo como principal referência o PDN (NATAL, 2007) e a Lei Nº

12.651, de 25 de maio de 2012, o Código Florestal (BRASIL, 2012).

Ainda visando cumprir o segundo objetivo específico, no Capítulo 4:

Os Vazios Urbanos de Ponta Negra, identificamos os vazios, utilizando para

tal as bases cartográficas do registro de lotes junto à SEMURB e informações

relativas ao uso e ocupação desses imóveis. Ainda no mesmo capítulo, mas

de modo a atingir o terceiro objetivo específico – caracterizar tipologicamente

os vazios urbanos identificados –, tendo como base Philippe Panerai (2006,

p. 127), desencadeamos uma análise tipológica executada em 4 etapas: a

definição da abrangência, a classificação prévia, a elaboração dos tipos e a

tipologia.

Por fim, no Capítulo 5: As Diretrizes, visando o cumprimento do ob-

jetivo geral, são estabelecidas diretrizes gerais, bem com diretrizes específi-

cas para cada tipo identificado, para que os vazios possam passar a cumprir

a função social da propriedade.

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PARTE 1: VAZIOS URBANOS E O DI-

REITO À CIDADE EM NATAL

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1. A PRODUÇÃO CAPITALISTA DO ES-

PAÇO E O DIREITO À CIDADE NA CON-

TEMPORANEIDADE

Neste capítulo abordamos como as localizações dos imóveis no te-

cido urbano são produto do modo capitalista de produção e como as conse-

quências disso interferem na efetivação do direito à cidade. Para tratar da

nossa realidade mais próxima, mostramos como a legislação, nos âmbitos

federal e municipal, submete o direito de propriedade aos interesses coleti-

vos na tentativa de garantir maior equidade socioespacial, bem como o modo

como se configura o território do município de Natal a partir da sua evolução

do crescimento e dessa legislação.

Para discutir a respeito da produção capitalista do espaço, foi feita

uma revisão bibliográfica a partir das obras de David Harvey (2005, 2013) e

Flávio Villaça (1997, 2011), que se utilizam de reflexões marxianas e marxis-

tas a respeito da sociedade capitalista para formularem uma série de pensa-

mentos sobre o espaço urbano nesse contexto. Outro autor que faz essas

reflexões, a partir do trabalho de Harvey é Emanuel Cavalcanti (2018), que

trata de sua aplicação à transformação dos vazios urbanos, motivo pelo qual

o utilizamos também como base nesse trabalho. Para a discussão a respeito

das localizações, utilizamos adicionalmente as contribuições de Csaba Deák

(2001).

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Em sequência, é tratado o tema do direito à cidade sob a ótica, so-

bretudo, de Henri Lefebvre (2001) e David Harvey (2014). Lefebvre é o autor,

inclusive, da própria expressão “direito à cidade”, enunciado em sua obra

homônima. Ainda que seu estudo seja mais voltado à série de processos que

culminaram na produção e experiência da cidade moderna, suas reflexões

são muito atuais e pertinentes ao nosso contexto, visto que o passar do

tempo tratou de aprofundar as características e contradições dessa produ-

ção. Harvey, por sua vez, assimilou contribuições de Lefebvre, outros auto-

res marxistas e a própria obra marxiana pra falar, de forma mais aprofun-

dada, da realidade contemporânea. Dessa forma, para este trabalho, com-

preendemos que ambos são complementares em suas investigações para a

discussão que pretendemos a respeito do direito à cidade nos tempos hodi-

ernos.

Em seguida, fazemos uma exposição de como as legislações incor-

poram em seus instrumentos de ordenamento territorial limitações à proprie-

dade privada, através do conceito de função social da propriedade. Analisa-

mos, pois, os artigos do capítulo da política urbana da Constituição Federal

(BRASIL, 1988) e o Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001), no âmbito nacional.

Por fim, fazemos uma apresentação do território de Natal, desta-

cando a organização administrativa da cidade e os planos diretores do mu-

nicípio, sobretudo o que está vigente desde 2007 (NATAL, 2007), hoje em

processo de revisão.

1.1. A PRODUÇÃO CAPITALISTA DO ES-

PAÇO URBANO

O mundo se organiza através do sistema capitalista. Essa generali-

zação e redução não pretende se deter nas minúcias de como se organizam

os distintos modelos de sociedade existentes, sobretudo os que extrapolam

o modo de vida ocidental, tampouco pretendemos tomar esse dado como um

fenômeno natural. Pelo contrário: as sociedades passaram, ao longo dos úl-

timos séculos, por processos complexos e cada vez mais globalizados que

mudaram as suas formas de organização social e de produção. Esses pro-

cessos fizeram surgir uma nova sociedade com uma nova relação dialética

entre as classes que a compõem: os detentores dos meios de produção e os

que vendem sua força de trabalho. Ao passo que essas mudanças ocorre-

ram, modificou-se a paisagem do espaço ocupado por essa sociedade: o

espaço urbano.

O modelo socioeconômico baseado nas relações capitalistas de pro-

dução e consumo impôs a estruturação de novos modos de vida em socie-

dade. Era preciso industrializar a produção e esse processo demandava um

contingente humano cada vez maior e mais concentrado em torno dos polos

produtores, assim como uma oferta de matéria-prima extraída em maiores

quantidades e de forma mais eficiente. Dessa forma, o trabalho no campo e

na cidade se modernizaram, sendo esta última o espaço de instalação das

indústrias e oportunidades de emprego. Parte dos agrupamentos rurais foi

dando lugar, portanto, aos assentamentos urbanos, através da concentração

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populacional nas cidades e seu consequente crescimento. A cidade tonou-

se, pois, o espaço da modernidade: o espaço onde as relações capitalistas

se acentuam e se materializam.

A sociedade capitalista já não é mais uma novidade em si. A sua

estruturação está em constante processo de evolução, adaptando-se aos no-

vos contextos sociais, numa perspectiva global. Entretanto, sua essência é

a mesma: a acumulação de capital através da exploração da mais-valia. Para

Harvey, “a acumulação é o motor cuja potência aumenta no modo de produ-

ção capitalista” (2005, p. 43). Da mesma forma, a cidade é o espaço social-

mente convencionado do encontro das classes, sendo ela um produto cole-

tivo das relações entre os agentes que nela habitam e constroem. Partindo,

pois, desses princípios, podemos afirmar que, uma vez que as cidades estão

inseridas em e são produzidas por uma sociedade capitalista, sobre o seu

espaço físico incidem materializações dessa organização social, sendo sua

construção uma dimensão dos processos capitalistas acumulativos.

A urbanização no contexto do capitalismo se dá por meio da cons-

trução de uma paisagem dotada de estruturas físicas e sociais que dão meios

para reprodução desse modelo capitalista, de forma que ocorrem, segundo

Harvey, à sua imagem e semelhança (2005, apud CAVALCANTI, 2018).

Essa urbanização, pois, é orientada pela acumulação, cujo processo, por sua

vez, é marcado por uma série de contradições e tensões. O próprio processo

acumulativo é contraditório: o ciclo inicia na produção e só se realiza com o

consumo, mas, para que se acumule mais, é necessário que se dê ao traba-

lhador os meios de consumir mais, o que implica no aumento do custo de

produção, por exemplo, de forma simplificada. Esse processo é caracteri-

zado, assim, pela produção das próprias barreiras para sua expansão, o que

faz com que mudanças sejam promovidas para maior acumulação. Dada

essa característica, para Harvey,

o sistema capitalista é, portanto, muito dinâmico e inevitavel-mente expansível; esse sistema cria uma força permanente-mente revolucionária, que, incessante e constantemente, re-forma o mundo em que vivemos (2005, p. 43).

Para desenvolver-se, o progresso da acumulação depende e pres-

supõe de alguns elementos: 1- a existência de um exército de reserva in-

dustrial, um excedente de mão-de-obra que pode servir para alimentar a

expansão da produção e controlar os salários através da manutenção do de-

semprego; 2- os meios de produção necessários à disposição de modo a

possibilitarem a expansão da produção mediante reinvestimento de capital;

e 3- um mercado consumidor com capacidade de absorver a crescente

produção (HARVEY, 2005). Tal acumulação, pois, para garantir a sua repro-

dução, necessita de reinvestimentos que a mantenham em face aos avanços

tecnológicos e ao desgaste ou escasseamento dos meios de produção. Nas

cidades, os elementos que mais facilmente traduzem esse processo são as

redes de infraestrutura urbana, sobretudo as de transporte e comunicação,

os quais estruturam e norteiam a evolução do tecido urbano. Entretanto, do

mesmo modo que as contradições do capitalismo produzem crises, o espaço

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físico, produto da cadeia desses processos, reflete essas contradições

(CAVALCANTI, 2018).

As redes de infraestrutura (ferrovias, fábricas, portos etc.) são ele-

mentos classificados como capital fixo, o qual é definido como sendo “um

processo de circulação do capital através do uso de objetos materiais, como

as máquinas” (HARVEY, 2013, p. 323), sendo esses objetos aqueles empre-

gados para a produção de mais-valor. Por conseguinte, há outras estruturas

no tecido urbano que não são instrumentos de extração de acumulação, mas

produtos que se apresentam frente às necessidades da sociedade, os bens

de consumo, os quais, segundo Cavalcanti, “estão representados por cons-

truções comuns no universo urbano, como as habitações, vias, parques, mas

também os eletrodomésticos, os automóveis dentre tantos outros” (2018, p.

57).

É importante salientar que a diferença entre bens de consumo e ca-

pital fixo é determinado pelo uso ao qual se prestam:

A distinção entre capital fixo e bens de consumo é baseada no uso das mercadorias e não em seu modo de ser material. Os itens podem ser transferidos de uma categoria para a outra mediante uma mudança no uso (HARVEY, 2013, p. 353).

Sendo assim, uma residência pode ser transformada em um estabe-

lecimento de prestação de serviços, mudando a sua categoria na cadeia pro-

dutiva e modificando a sua relação com os demais espaços em seu entorno.

Essa mudança muitas vezes está associada a processos coletivos de

valorização da terra, seja pela atuação do Estado ou do conjunto de agentes

privados atuantes naquele espaço. Espaços onde há um processo de valori-

zação tendem a concentrar estruturas de reprodução do processo acumula-

tivo, ao passo que o contrário também é verificado: espaços onde há menor

circulação de capital tendem a concentrar mais estruturas de bens de con-

sumo, como os trechos residenciais. Isso não significa que não haja diferen-

ças de valorização dos espaços do mesmo tipo ao longo do território, mas

que são tendências do processo de produção de acumulação capitalista.

Dessa forma, ambos estão sujeitos às oscilações do contexto econômico em

que se inserem.

A permanência e o funcionamento dessas estruturas dependem di-

retamente do papel que desempenham na sociedade. Avanços tecnológicos

ou o próprio desgaste de suas máquinas pode comprometer o pleno cumpri-

mento do ciclo de acumulação desse aparato, de modo que o controle da

taxa de mudança tecnológica é uma forma de se utilizar da obsolescência

programada para manter o valor do capital fixo (CAVALCANTI, 2018). Exem-

plo desse processo é o das ferrovias no Brasil. Embora, em muitos locais do

país, tenham sido utilizadas para o escoamento da produção agrícola, ino-

vações tecnológicas que tornavam mais economicamente viáveis outros mé-

todos de transporte (bem como a própria oscilação da valorização dos pro-

dutos do campo) as substituíram. O ciclo produtivo desses espaços chegou

ao fim, mas não sem marcar a paisagem urbana com a sua presença e, pos-

teriormente, com a sua ausência.

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A imobilidade das infraestruturas urbanas revela, pois, uma contra-

dição: elas só podem ser movidas mediante a destruição do seu próprio va-

lor. Não é possível transportar uma rede ferroviária, como a do exemplo, para

outro local, seria necessária a sua demolição e o reinvestimento em outra

localidade. A recuperação do valor desse espaço ocupado só pode dar-se

em função de uma mudança em seu uso, a fim de que volte a circular o

capital. Isto posto, dois conceitos são importantes para compreender essa

dinâmica de valor do solo urbano: as localizações e a formação de um

mercado imobiliário.

É preciso uma consideração inicial de que, no capitalismo, a terra é

uma mercadoria. Não somente isso: para Amíria Brasil, é uma “mercadoria

de alto preço e propriedade privada” (2016, p. 33). Isso significa que a sua

aquisição se dá por meio de relações de compra e venda e sobre seu preço

incidem não apenas os valores de uso11, mas também valores de troca12.

Ademais das suas características formais e condições naturais tais como re-

levo, dimensões e características geotécnicas, sobre o preço do lote urbano

há um valor referente à sua posição relativa aos demais lotes, equipamentos

e serviços de infraestrutura no tecido urbano, isto é: a sua localização.

11 Valor de uso: conceito marxiano que diz respeito à utilidade de uma coisa, sendo esta condicionada às suas propriedades físicas e tendo sua realização plena no uso ou no con-sumo (MARX, 2011). Para Lefebvre, no que toca às cidades, significa “a cidade e a vida urbana, o tempo” (2001, p. 35), opondo-se ao valor de troca.

Para Deák (2001), as localizações são formas delimitadas no territó-

rio relacionadas por caminhos, estradas, fios, cabos, tubulações etc., isto é,

elementos físicos que dependem da sua construção para se materializarem

no espaço econômico construído pela produção capitalista. Por sua vez, “o

espaço econômico é produto do trabalho” (DEÁK, 2001). Ressaltamos que a

tendência de homogeneização do território e a superação da dicotomia

campo-cidade são produtos do modo capitalista de produção. Dessa forma,

há um esforço pela transformação do espaço produtivo em um espaço único

e contínuo, onde mercadorias, trabalho e capital fluem livremente. Como

complementa Deák:

O que há é um espaço contínuo, que é homogêneo porque as localizações nele contidas são intercambiáveis e por isso dife-rentes entre si, de forma que o espaço se diferencia ao se ho-mogeneizar. (2001, p. 88)

A localização, pois, é um ponto relativo nesse espaço socialmente

produzido cujo valor é determinante para as atividades que nela se desen-

volvem. Para Harvey, “a decisão de onde colocar um elemento não pode ser

divorciada do ‘onde’ dos outros” (HARVEY, 2013, p315-316). Para as ativi-

dades de produção ou reprodução de capital a localização é, portanto, um

valor de uso, “uma vez que é uma condição necessária para o desempenho

12 Valor de troca: a relação quantitativa entre os valores de uso de uma coisa e outra, sendo essa relação constantemente mutável de acordo com o tempo e o lugar (MARX, 2011). Se-gundo Lefebvre, opõe-se ao valor de uso da cidade ao significar “os espaços comprados e vendidos, o consumo dos produtos, dos bens, dos lugares e dos signos” (2001, p. 35).

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de qualquer atividade” (DEÁK, 2001). Desse modo, a aquisição da terra tem

em seu preço um valor referente a essa localização, isto é, um valor de troca,

visto que é comercializada como uma mercadoria, como colocamos anteri-

ormente. Assim:

O preço de mercado dos produtos, que regula as quantidades relativas das mercadorias a serem produzidas, regula assim, ao mesmo tempo, também a distribuição espacial da produção no espaço urbano e regulação da produção implica necessa-riamente em organização espacial, através do instrumento do pagamento pela localização. (DEÁK, 2001)

Para Villaça (1985), esse fenômeno que atribui o caráter dual entre

os valores de troca e de uso da terra é denominado terra-localização e a

valorização desta tem dois conjuntos de processos envolvidos: o capital in-

vestido sobre a terra e a localização pura. Através do exemplo que ele esta-

belece sobre o lote vago, Villaça observa que sobre ele não há a atuação de

ambos os conjuntos (os quais seriam traduzidos nas figuras de um agente

que queira fazer uso da terra e do proprietário da terra, respectivamente),

mas somente a sua localização sem investimento, entretanto, ainda assim,

se verifica que, ao longo do tempo, essa terra se valoriza (VILLAÇA, 1985).

Mesmo que se considere uma situação em que dois lotes vagos em pontos

distintos da cidade tenham à sua disposição a mesma infraestrutura urbana,

os lotes mais próximos aos centros urbanos possuem maior valor associado,

evidenciando o peso que o valor de uso da localização oriundo da própria

aglomeração humana tem na composição do preço da terra.

Ao mesmo tempo, o produto do trabalho coletivo externo ao lote tam-

bém o valoriza. Sendo assim, a terra urbana que tem em seu entorno ele-

mentos indutores da vitalidade urbana, tais como mercados, postos de em-

pregos, equipamentos de cultura, serviços de transporte público e etc. tem

um maior valor agregado a si. Seguindo esse mesmo raciocínio, podemos

inferir que a degradação física, mudança no fluxo de capital, avanços tecno-

lógicos ou outras externalidades podem alterar o valor da terra negativa-

mente. Essas oscilações revelam o caráter dinâmico do valor da localização,

as quais marcam as cidades com os vestígios físicos de sua lógica de orga-

nização territorial.

Porém, um aspecto abstrato desse espaço também é influente na

forma como se dão as possibilidades de ocupação: as prescrições urbanísti-

cas. São elas que determinam o potencial construtivo de cada lote bem como

a forma como este deve se dar, ou seja, ditam o modo como pode ser feito

o investimento de capital sobre a terra urbana. Portanto, as localizações que

têm maior potencial construtivo são também as que podem de maneira mais

ostensiva instalar estruturas de produção e, consequentemente, agregar

mais valor ao solo urbano. Não à toa grandes centros comerciais se instalam

em localidades onde se é possível ter grandes lojas em detrimento de espa-

lhar pequenas unidades de maneira uniforme ao longo do território. A ten-

dência de concentração é um reflexo do esforço da redução de custos na

produção, como anteriormente explicamos, o que visa maior controle de pre-

ços e acumulação de mais-valia.

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Destarte, a relação de preço da terra é possibilitada pela existência

de um mercado imobiliário que não é controlado pelo Estado, mas que é

influenciado por sua atuação, indiretamente. São os detentores das terras

que estabelecem os seus preços e o fazem à luz da lógica de acumulação

capitalista, na qual os valores de troca não se sujeitam exclusivamente aos

valores de uso. A oferta de terras é, pois, controlada à revelia da necessidade

de acesso a ela, de modo que em nome do lucro é, em algumas situações,

mais economicamente interessante a ociosidade temporária do que a venda

por preços mais baixos. Sob essa lógica são criados espaços nas cidades

onde a terra tem os maiores preços e, logo, só é acessada pelos mais ricos.

Geralmente, essa terra se localiza nas regiões onde há maior oferta dos equi-

pamentos urbanos e maior circulação do capital, espaço mantido pelo traba-

lho coletivo de uma classe trabalhadora que não tem os meios materiais de

ali viver. Desse modo, da mesma forma em que são criadas as construções

são criados os vazios e ambos são produtos do modo capitalista de produ-

ção.

É como consequência da reflexão do modo como o capitalismo atua

sobre o espaço que surgiram tensões de ruptura que buscam pensar um

modelo de cidade diferente baseado num modelo diferente de organização

socioeconômica. O desejo de romper com essa estrutura de sobreposição

do valor de troca sobre o valor de uso possibilitou o surgimento de um novo

modo de organizar a sociedade, onde a superação da dominação de uma

classe sobre a outra se mostrou necessária. Com essa visão de

democratização social, desenvolveu-se a visão de democratização do es-

paço ocupado por essa sociedade: o direito à cidade.

1.2. O DIREITO À CIDADE NA CONTEMPO-

RANEIDADE

À medida que o sistema capitalista avançou e foi se aprofundando,

transformações foram sendo observadas em cidades erguidas originalmente

sob outros processos de formação histórica, assim como surgiram novas

aglomerações urbanas. As marcas da passagem do tempo desse processo

se materializaram no tecido urbano dessas cidades de forma a modificar não

apenas a sua constituição física, mas as relações sociais de seus habitantes,

os seus cotidianos. Essas mudanças seguiram e seguem, de forma desigual

em cada parte do mundo, e se somaram a outros processos sociais – muitos

decorrentes da oposição ao modelo capitalista de produção – que se desen-

volveram simultaneamente, como as guerras, movimentos artísticos, avan-

ços científicos, desastres naturais e etc.

No início do século XX, viu-se despontar um movimento muito forte

em negação à prática arquitetônica vigente e em defesa da produção de ci-

dades sob a lógica da padronização e do funcionalismo: o modernismo. Para

as cidades, esse movimento significou uma alteração brusca em sua maneira

de planejá-las, colocando em prática ideias surgidas em meados do século

XIX. A preconização da salubridade, higienização e racionalização dos pro-

cessos deveria erigir cidades sãs e funcionais para abrigar um denso

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contingente populacional. Apesar desses ideais não terem sido reproduzidos

integralmente em todo o mundo, o pensamento modernista acabou por influ-

enciar toda a produção construtiva posterior a ele, seja de uma forma coni-

vente ou crítica.

Nesse contexto, ao longo do século, sob tais ideais, foram construí-

dos grandes conjuntos habitacionais, máquinas de morar, sobretudo no pe-

ríodo posterior às grandes guerras. Muitas cidades receberam sistemas de

transporte e passaram a pensar o seu território de forma funcionalmente zo-

neada. Entretanto, do mesmo modo que modificavam as cidades, críticas

surgiam, sobretudo entre os que viam nessa lógica a materialização de pro-

cessos de acumulação de capital e seu avanço sobre o cotidiano dos cida-

dãos. As cidades que antes existiram davam lugar à cidade capitalista, onde

os espaços regidos por seu valor de uso passam a ter um valor de troca.

Em 1968, o filósofo francês Henri Lefebvre lançou sua obra mais co-

nhecida: O direito à cidade. Nela, expressava as suas reflexões a respeito

do meio urbano, tecendo críticas ao seu modo de concepção e organização

por meio do materialismo-dialético. Essas críticas estruturam a sua proposi-

ção revolucionária em oposição à produção moderna das cidades.

Para Lefebvre, o direito à cidade é traduzido como sendo

[o direito] à vida urbana, à centralidade renovada, aos locais de encontro e de trocas, aos ritmos de vida e empregos do tempo que permitem o uso pleno e inteiro desses momentos e locais (2001, p. 139).

Dessa maneira, é proposta uma cidade regida pelo valor de uso onde

a troca é separada do valor de troca, ou seja, onde haja trocas comerciais

em espaços propiciados para tal, mas que suas localizações não sejam re-

gidas como produto. Isto é: o fim da terra como mercadoria. Para tanto, em

sua sétima tese sobre a cidade, o urbano e o urbanismo, Lefebvre ressalta o

teor revolucionário de suas ideias:

A proclamação e a realização da vida urbana como reino do uso (da troca e do encontro separados do valor de troca) exi-gem o domínio do econômico (do valor de troca, do mercado e da mercadoria) e por conseguinte se inscrevem nas pers-pectivas da revolução sob a hegemonia da classe operária. (2001, p. 139)

Entretanto, se, por um lado, a revolução urbana lefebvriana ainda

não aconteceu, por outro, ela inspirou uma geração de pensadores sobre a

cidade. Entre esses, David Harvey, o qual, sobre o direito à cidade, afirma

que

é, portanto, muito mais do que um direito de acesso individual ou grupal aos recursos que a cidade incorpora: é um direito de mudar e reinventar a cidade mais de acordo com nossos mais profundos desejos. Além disso, é um direito mais coletivo do que individual, uma vez que reinventar a cidade depende ine-vitavelmente do exercício de um poder coletivo sobre o pro-cesso de urbanização. (2014, p. 28)

Para ambos os autores, esse objetivo não tem um roteiro traçado,

mas há caminhos que devem ser seguidos para que se torne possível a su-

peração da terra como mercadoria. Tendo em vista o processo de acumula-

ção que norteia a sociedade capitalista, Harvey afirma que “uma vez que o

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processo de urbanização é um dos principais canais de uso”, isto é, de pos-

sibilitador de valor de uso, “o direito à cidade se configura pelo estabeleci-

mento do controle democrático sobre a utilização dos excedentes na urbani-

zação” (HARVEY, 2014, p. 61).

Para tanto, estamos considerando um estágio de tomada de poder

pela classe trabalhadora que desembocasse na superação da exploração de

classe. Todavia, antes de chegar a tanto, o direito à cidade se apresenta

como uma reivindicação pelo maior controle por parte dos trabalhadores dos

rumos da urbanização, configurando-se como uma estação intermediária

nesse processo revolucionário, mas sem tê-lo como um objetivo em si

(HARVEY, 2014). Isso se dá porque essa classe revolucionária não é com-

posta exclusivamente por operários fabris, mas por trabalhadores urbanos,

que, ao deflagrarem esse processo democrático, deflagram o exercício de

um modo de produção urbana que não se baseia na acumulação.

Entretanto, há avanços de outras frentes progressistas, de caráter

mais reformista, que evocam a democratização do controle do processo de

urbanização dentro dos moldes do estado democrático de direito. Nesse con-

texto, essa democratização se torna sinônimo de controle e participação po-

pular, ainda que não seja, de forma conceitual, sinônimo de direito à cidade.

Há, pois, a convergência de esforços para garantir que a população seja par-

tícipe nos processos decisórios de controle do uso e ocupação do solo ur-

bano.

No Brasil, vemos esse esforço acontecer a partir do estabelecimento

do capítulo da política urbana, na Constituição escrita após o fim da ditadura

militar no país. Nesse sentido, o Estado progressista não se utiliza de “direito

à cidade”, mas da “função social da propriedade” como recurso a garantir

esse controle sobre a produção de excedentes, como veremos a diante.

Sendo assim, direito a cidade e função social da propriedade são

coisas distintas. O primeiro é uma reivindicação revolucionária de superação

da lógica capitalista de produção do espaço. O segundo é a forma como o

Estado Moderno brasileiro garante maior defesa dos interesses coletivos

dentro da produção urbana, subjugando a propriedade privada a esses inte-

resses.

1.3. A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE:

DO NACIONAL AO MUNICIPAL

Com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

(BRASIL, 1988), houve um esforço de incorporação de princípios de prote-

ção dos interesses coletivos em detrimento dos interesses privados ao capí-

tulo que trata da política urbana no país (Anexo 1). Tal esforço se deu numa

perspectiva do uso do Estado como promotor de justiça social através de seu

papel de regulador da sociedade. De modo que tal capítulo mune o poder

público de meios de intervenção na propriedade privada de imóveis a fim de

que estes passem a desempenhar uma função social. A submissão ao cum-

primento de sua função social impõe à propriedade privada restrições em

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sua utilização. A partir dessa exigência, os proprietários dos imóveis irregu-

lares à tal condição são passíveis de penalizações que visam conferir a es-

ses lotes e/ou edificações uma inserção na dinâmica urbana. Para tanto, é

estabelecido que o Poder Público municipal tem a prerrogativa de estabele-

cer a sua política de desenvolvimento urbano, definindo o modo como se dá

o seu ordenamento territorial e as condições para o cumprimento da função

social da propriedade e da cidade. O instrumento básico para essa política é

o Plano Diretor (BRASIL, 1988).

O segundo capítulo do título VII da Constituição Federal (BRASIL,

1988) é o que trata da política urbana no Brasil. Nos artigos que o compõem,

o 182 e o 183, são definidos mecanismos legislativos que devem ser utiliza-

dos para garantir o cumprimento da função social da propriedade, os quais

foram posteriormente detalhados pelo Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001).

Uma vez que o artigo 183 é voltado para a regularização fundiária, que não

é nosso objeto de discussão, vamos nos concentrar no artigo 182.

O artigo 182, com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento

das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes,

estabelece que é obrigação do Poder Público municipal a execução da polí-

tica de desenvolvimento urbano (BRASIL, 1988). Ao fazê-lo, promove a des-

centralização do planejamento, conferindo autonomia para que o Poder Pú-

blico oriente o ordenamento de seus territórios a partir de sua realidade. Para

tanto, os municípios com mais de 20 mil habitantes devem aprovar os seus

planos diretores, cujas exigências fundamentais de ordenação territorial de-

vem ser seguidas a fim de que a propriedade urbana cumpra sua função

social (BRASIL, 1988). Dessa forma, a Constituição não estabelece explici-

tamente quais condições considera como sendo obrigatórias para o exercício

da função social pelos imóveis, relegando tal interpretação aos planos dire-

tores municipais. Se tal situação é, por um lado, uma forma de se fazer ade-

quar a realidade de cada cidade à compreensão desse cumprimento, por

outro, abre margem para variadas interpretações do que está adequado ou

não ao longo do país.

A Lei Federal no 10.257, de 10 de julho de 2001 (BRASIL, 2001),

denominada Estatuto da Cidade, amplia a definição de cumprimento da fun-

ção social da propriedade. Essa lei detalha o capítulo da política urbana, afir-

mando, dentre outras coisas, que

A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à jus-tiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2º desta Lei (BRASIL, 2001).

Ao introduzir os elementos da justiça social e do desenvolvimento

econômico, o enunciado do artigo 39 já é um pouco mais específico na defi-

nição de função social. Porém é, ao vincular essa compreensão às diretrizes

do artigo 2º, que se acrescenta uma compreensão mais consistente desse

conceito. Esse artigo estabelece que “a política urbana tem por objetivo

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ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propri-

edade urbana” (BRASIL, 2001). Para tanto, aponta 17 diretrizes gerais – as

quais podem ser observadas integralmente no Anexo 2 – a serem atendidas

pelos instrumentos que se propõem a realizar o planejamento territorial, seja

sua escala de abrangência nacional, regional, estadual, metropolitano, mi-

crorregional ou municipal (BRASIL, 2001). Como destaques, trazemos algu-

mas dessas diretrizes:

I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento am-biental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;

[...]

IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distri-buição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;

V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, trans-porte e serviços públicos adequados aos interesses e neces-sidades da população e às características locais;

VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:

a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;

b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;

c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infra-estrutura urbana;

d) a instalação de empreendimentos ou atividades que pos-sam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previ-são da infraestrutura correspondente;

e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização;

f) a deterioração das áreas urbanizadas;

g) a poluição e a degradação ambiental;

[...]

VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica do Município e do território sob sua área de influência;

IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;

[...]

XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a valorização de imóveis urbanos;

XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;

[...]

XV – simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocu-pação do solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unida-des habitacionais; (BRASIL, 2001)

Com as diretrizes, novos conceitos são introduzidos ao escopo da

definição de função social da cidade e da propriedade. O conceito de cidades

sustentáveis, por sua vez, é muito importante, pois explicita uma gama de

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direitos do cidadão que devem ser garantidos ao se pensar a cidade. Tais

direitos, em consequência, são, ao mesmo tempo que exigências, alertas

para uma contradição das nossas cidades, desenvolvidas sob o sistema ca-

pitalista: as localizações. Ao enunciar o direito à moradia, à infraestrutura, ao

transporte etc., se enuncia que um novo modelo de cidade é desejado: um

modelo de cidade pensado pelo poder público que promova mais acesso dos

seus habitantes a esses serviços e, em algum nível, maior equidade social.

Porém, como já abordamos anteriormente, não é nesse sentido que avan-

çam as produções sobre o território, mas em seu sentido oposto. O modo

capitalista de produzir preconiza a concentração da produção de mais-valia

e sua retenção nas mãos de uma classe, de modo que a terra urbana reflete

essa lógica e se distribui ao longo do território com preços variados, os quais

aumentam quando ela é servida por mais benesses urbanas e se aproxima

dos polos de concentração de trabalho e renda. Ou seja, a produção das

cidades é submetida a uma lógica de segregação socioespacial13 , ao

passo que essa política urbana se apresenta sob a lógica de equidade.

Essa forma equitativa de estabelecer a política urbana não é de ne-

nhum modo indesejada ou irreal, mas se apresenta como uma resposta con-

creta e bastante progressista à realidade das nossas cidades. É preciso pen-

sar e produzir as cidades de uma forma diferente, pois o nosso modelo atual

13 Segregação socioespacial urbana é tratada neste trabalho como sendo, de acordo com Flávio Villaça, “a alta concentração de camadas sociais em determinada parcela do espaço urbano” (1997, p. 6)

é insustentável. Para tanto, devem ser corrigidas as distorções promovidas

pelo capitalismo que impeçam a distribuição equitativa da produção coletiva

da sociedade, como os serviços públicos. Entretanto, ainda reside em sua

formulação a anuência com o tratamento da terra como mercadoria privada

sem que haja qualquer controle sobre o mercado imobiliário, cerne do pro-

blema fundiário. Desse modo, o caráter reformista do Estatuto da Cidade não

logra avanços sobre a raiz do problema, atuando, pois, na poda dos galhos,

direcionando-os para caminhos mais desejados. Entretanto, partindo do prin-

cípio que a legislação é um mecanismo do Estado e, portanto, instrumenta-

liza a sua manutenção, ainda que se pretenda orientá-lo para uma sociedade

menos injusta, não poderia, pois, tratar-se de uma ruptura revolucionária com

o capitalismo, ainda que esse seja o caminho para onde se deve rumar para

garantir a superação da terra como mercadoria. É, dessa maneira, uma limi-

tação de sua natureza. Essa topiaria reformista, por conseguinte, não sana

as contradições entre o planejamento e a cidade real, mas os reconfigura na

direção de estimular uma produção munida de novos valores mais adequa-

dos com os princípios da justiça social.

Destarte, quando são estabelecidas como diretrizes a “justa distri-

buição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização” e a

“recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a

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valorização de imóveis urbanos” (BRASIL, 2001), pretende-se ressaltar es-

ses valores, promovendo a redistribuição espacial dos investimentos urba-

nos ao apresentar-se em oposição à lógica de segregação vigente. Sendo

assim, há oposição a um dos reflexos de se ter a terra como mercadoria: a

especulação imobiliária. Visto que se pretende combater a retenção espe-

culativa que resulte na subutilização ou não utilização dos imóveis urbanos

(BRASIL, 2001), torna-se uma premissa do ordenamento urbano o combate

aos vazios urbanos, como veremos adiante. Para tal, os municípios como

Natal devem incorporar esses valores aos seus planos diretores.

Sendo assim, os municípios com mais de 20 mil habitantes, por sua

vez, devem desenvolver seus Planos Diretores (BRASIL, 1988) e, ao fazê-

lo, também devem lançar mão de instrumentos que lhes deem meios de in-

tervir no território e limitar o direito de propriedade dos detentores de terras

e edificações, a fim de possibilitar o direito à cidade. Tais instrumentos urba-

nísticos foram, em sua maioria, elaborados no Estatuto da Cidade. Para tal,

os planos têm a obrigação de assimilar esses conceitos através da definição

de função social da propriedade de acordo com sua realidade. Entretanto,

isso nem sempre ocorre de modo integral no que tange à formulação das

leis, assim como no que tange à sua aplicação. No plano diretor vigente no

município de Natal (NATAL, 2007), por exemplo, há a enunciação do que é

definido como função socioambiental da propriedade. Esse conceito será

14 O PDN está com seu processo de revisão deflagrado desde 2017 e o estamos acompa-nhando tanto com a intenção de contribuir com as discussões quanto para avaliar possíveis

abordado e analisado a seguir, assim como a organização territorial de Natal,

com vistas a entender de que modo se instrumentaliza o cumprimento da

função social da propriedade no município.

1.4. NATAL E A FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL

DA PROPRIEDADE

Natal é a capital do Estado do Rio Grande do Norte. Em seus 419

anos de história, teve os últimos 35 marcados pelo planejamento urbano ins-

trumentalizado através da elaboração de planos diretores. Após o fim da di-

tadura civil-militar e promulgação da Constituição de 1988, houve a primeira

revisão do Plano Diretor de Natal (PDN) em 1994, quando ocorreu a incor-

poração do conceito constitucional de função social da propriedade à sua

redação e o estabelecimento de áreas especiais mesmo antes da aprovação

do Estatuto da Cidade (NATAL, 1994). Desde então, houve uma segunda

revisão em 2007 e, atualmente, estamos em um terceiro processo revisor

enquanto este trabalho é escrito14.

Sendo assim, a fim de compreendermos como as prescrições urba-

nísticas do PDN incidem sobre a discussão do direito à cidade e da função

social da propriedade, faremos uma breve exposição de seu conteúdo. Inici-

aremos pela trajetória de discussão da função social a partir dos planos di-

retores elaborados até então. Em seguida, abordaremos as definições gerais

mudanças nas definições e conceitos que embasam este trabalho, entretanto, até a data de realização deste TFG, não houve conclusão da revisão.

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do macrozoneamento e sua relação com o território físico e a história da ci-

dade.

1.4.1. A função socioambiental da propriedade

Conforme preveem a Constituição Federal (BRASIL, 1988) e o Esta-

tuto da Cidade (BRASIL, 2001), o Plano Diretor de Natal de 2007 (NATAL,

2007) assimila conceitos relativos à limitação do direito de propriedade pri-

vada, o que enuncia como função socioambiental da propriedade. Entre-

tanto, tais conceitos são identificados no PDN desde a sua formulação em

1984 (NATAL, 1984), tendo sido acrescidas novas contribuições ao longo de

suas revisões, sendo a primeira revisão em 1994 (NATAL, 1994) e a segunda

sendo o plano atualmente em vigor. Todavia, apesar desses 35 anos de tra-

jetória de formulação de políticas urbanas, observamos poucos efeitos desse

princípio no que toca a algumas temáticas.

No PDN 84, Lei Municipal nº 3.175, de 29 de fevereiro de 1984

(NATAL, 1984), não havia menção à função social da propriedade, visto que

é anterior à promulgação da Constituição, porém é possível identificar algu-

mas das diretrizes expressas pelo Estatuto da Cidade em seu texto. Entre os

artigos 3º e 5º, que tratam dos objetivos e diretrizes gerais do plano, identi-

fica-se a adequação da ocupação do solo à racionalização da infraestrutura

urbana, ao combate à especulação imobiliária e ao adensamento a fim de

preencher os vazios e melhor aproveitar os investimentos públicos (NATAL,

1984). Esse plano é caracterizado pelo seu zoneamento funcional, o que é

visto hoje como uma forma superada de planejamento urbano que deve ser

evitada em detrimento ao estímulo à variedade de usos. Mas é um início de

uma trajetória que foi se moldando.

Em 1990, foi aprovada a Lei Orgânica do Município de Natal (NATAL,

1990), a qual possui um capítulo referente à política urbana, composto pelos

artigos 118, 119 e 120. O capítulo se inicia, no artigo 118, com a submissão

de seu conteúdo à Constituição Federal e define o conceito de função social

da cidade em seu parágrafo primeiro:

§ 1º As funções sociais da cidade dependem do acesso de todos os cidadãos aos bens e aos serviços urbano, assegu-rando-lhes condições de vida e de moradia compatíveis com o estágio de desenvolvimento do Município (NATAL, 1990).

No artigo seguinte, referenda o expresso pela Constituição e enuncia

que o Plano Diretor é o instrumento básico da política urbana a ser executada

pelo Município, assegurando que o seu conteúdo deve ser construído e revi-

sado de forma participativa e com atenção às áreas especiais:

§ 1º O Plano Diretor fixa critérios que asseguram a função so-cial da propriedade, cujo uso e ocupação devem respeitar a legislação urbanísticas, a proteção do patrimônio ambiental natural e construído, e o interesse da coletividade, obser-vando:

I - a participação das entidades representativas da comuni-dade no processo de elaboração, de alteração e de execução do Plano Diretor;

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II - a definição de áreas especiais de interesse social, urbanís-tico e ambiental, para as quais será exigido aproveitamento adequado;

III - a definição de diretrizes adequadas para o uso e para a ocupação do solo urbano (NATAL, 1990)

Nesse processo, observa-se um avanço no que Harvey descreveu

como uma reformulação do Estado para este “voltar a se colocar sob o con-

trole democrático do povo” (2014, p. 62). Ainda que de forma deficitária, esse

esforço garante à população voz em um espaço de disputa onde seus coti-

dianos estão sendo definidos, possibilitando a reivindicação para que áreas

com características específicas tenham o seu tratamento diferenciado, em

virtude de suas especificidades e visando cumprir às funções sociais da ci-

dade e da propriedade.

Nesse mesmo sentido, após uma Emenda15, em 2006, o conteúdo

desse capítulo passou a incorporar objetivos relativos à promoção da regu-

larização fundiária. Então, no artigo 118-A, em seu inciso V, passou a constar

que, onde esse instrumento fosse aplicado, deveria ser evitada “a retenção

especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utili-

zação” (NATAL, 1990). Bem como, no artigo 119-A, ficou estabelecida a “As-

sistência Técnica e Jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociais

menos favorecidos” (NATAL, 1990). Desse modo, verificamos uma amplia-

ção dos direitos da população que vive em áreas que careçam de

15 Emenda à Lei Orgânica nº 19/2006, de autoria da Mesa Diretora da Câmara Municipal.

regularização fundiária e caminhos apontados para o acesso delas a profis-

sionais que os orientem. Ainda que devamos salientar que essas práticas

não acontecem de forma satisfatória e que não há no município tal assistên-

cia, há na legislação o marco dessas reivindicações.

A Lei Complementar nº 07, de 05 de agosto de 1994 (NATAL, 1994),

o PDN 94, posterior à Constituição e à Lei Orgânica do Município, assimilou

o conceito de função social da propriedade. Em seu segundo capítulo, com-

posto pelo artigo 5º, define que o cumprimento da função social acontece

quando são atendidos dois critérios simultaneamente: o uso compatível com

a oferta de infraestrutura urbana e a utilização e aproveitamento compatíveis

com o meio ambiente (NATAL, 1994). Nesse contexto, não se fala mais em

promover o adensamento como sendo um objetivo do plano ou preencher os

vazios, mas se observa no artigo 4º que será a ampliação da oferta de infra-

estrutura que norteará o adensamento, sendo um critério da garantia do de-

senvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade a distribuição

dos custos e benefícios das obras de infraestrutura, havendo a recuperação

da valorização imobiliária decorrente disso, conforme o artigo 3º (NATAL,

1994). Desse modo, apesar do texto ter sido modificado, o seu conteúdo se

mantém em relação à sua versão anterior no que toca a esse aspecto.

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Já a Lei Complementar nº 82, de 21 de junho de 2007 (NATAL,

2007), o PDN, acrescenta uma maior definição ao conceito e estabelece a

nomenclatura de função socioambiental da propriedade:

Art. 5º - A propriedade urbana atenderá a sua função sócio-ambiental quando os direitos decorrentes da propriedade indi-vidual não suplantarem ou subordinarem os interesses coleti-vos e difusos, devendo satisfazer, simultaneamente, os se-guintes requisitos, além de outros estabelecidos em lei:

I - Uso para atividades urbanas, em razão compatível com a capacidade da infraestrutura instalada e suprimento de servi-ços públicos;

II - Aproveitamento e utilização compatíveis com a qualidade do meio-ambiente, segurança e saúde dos usuários e proprie-dades vizinhas;

III - Atendimento às normas fundamentais destinadas à orde-nação da cidade expressa neste Plano Diretor e leis correla-tas;

IV - Preservação, de conformidade com o estabelecido em lei especial, da flora, da fauna, das belezas naturais, do equilíbrio ecológico e do patrimônio histórico e artístico, bem como pro-teção do ar e das águas de modo à manutenção da qualidade ambiental.

Parágrafo único. São atividades de interesse urbano aquelas inerentes às funções sociais da cidade, ao bem-estar da cole-tividade e a preservação da qualidade do meio ambiente, tais como: habitação, produção de bens e serviços, preservação do patrimônio histórico, cultural, ambiental e paisagístico, cir-culação de pessoas e bens, preservação, conservação e utili-zação racional dos recursos necessários à vida e dos recursos naturais em geral. (NATAL, 2007)

Apesar da mudança de nomenclatura, o conteúdo é muito similar ao

estabelecido na sua versão anterior, de 1994, e mantém os mesmos critérios,

fazendo modificações em outros aspectos que não são do escopo dessa dis-

cussão. Desse modo, como abordamos anteriormente, há alguns conteúdos

que são definidos pelo Estatuto, mas que não aparecem de forma explícita

associados à definição de função socioambiental da propriedade ou mesmo

em outras partes do plano. Um dos aspectos não explicitados é o que define

o artigo 2º do Estatuto da Cidade, em que expressa que deve haver ordena-

ção e controle do uso do solo, de forma a evitar a retenção especulativa de

imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização (BRASIL,

2001).

Todavia, o PDN apresenta nas definições de suas Áreas Especiais

de Interesse Social (AEIS) uma situação que se apresenta como passível de

receber tal classificação e que caminha no encontro ao combate à ociosi-

dade. Em seu artigo 22, o PDN apresenta a categoria IV de AEIS, a qual é

compreendida por lotes não edificados, subutilizados ou não utilizados que

possuam área maior que 400 m², os quais podem ser destinados a progra-

mas de habitação de interesse social (NATAL, 2007). Outra categoria de

AEIS nesse sentido é a V, a qual estabelece tratamento diferenciado que

resguarde as características e a importância históricas próprias de prédios

desocupados ou subutilizados ou aqueles que possam causar riso ao en-

torno pela sua condição de degradação situados em áreas centrais da cidade

(NATAL, 2007). Entretanto esse enquadramento pouco contribui para a

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delimitação dessas áreas e tampouco se apresenta como um instrumento de

combate à ociosidade da terra, visto que não se verificam AEIS delimitadas

com tal classificação, ainda que haja parcelas do território que apresentem

tais características, como aponta Marinho (2018).

Sendo assim, ainda que a função social/socioambiental da proprie-

dade seja conceituada no arcabouço legislativo do município e que seja co-

locada como objetivo do PDN, ela aparece de forma abstrata e não tem todos

os critérios abarcados pelos instrumentos urbanísticos que o plano lança

mão. Apesar da submissão do uso do solo à capacidade da infraestrutura,

não há aplicação de instrumentos que combatam a retenção especulativa,

por exemplo. Entretanto, por outro lado, há questões que são mais contem-

pladas, como as próprias ZPAs, que, em prol do direito ambiental, protegem

as áreas onde há relevantes conjuntos de fauna e flora para o município.

Outra área em que há um relativo avanço é nas prescrições para as AEIS,

em que partes do tecido urbano recebem tratamento diferenciado em virtude

dos aspectos físicos, sociais, culturais e históricos do lugar. Essa gama de

instrumentos faz avançar a limitação do direito de propriedade sobre esses

temas.

Portanto, no que tange a investigar as lacunas da garantia desse

direito, veremos, no capítulo seguinte, a problemática dos vazios urbanos e

16 Apesar da previsão de Regiões Administrativas, elas não funcionam efetivamente como tal. Todavia em função de muitas sistematizações de informações oficiais levarem em conta essa divisão, bem como de serem elementos corriqueiros nas falas informais – ainda que

como estes, sendo um produto da produção capitalista do espaço, denun-

ciam o descumprimento da função social da propriedade. Na sequência ime-

diata, veremos como se apresenta e organiza o território do município.

1.4.2. O território e o zoneamento de Natal

Situada na costa nordestina, Natal é a capital do Rio Grande do

Norte e faz fronteira com outros 4 municípios potiguares: Extremoz, São Gon-

çalo do Amarante, Macaíba e Parnamirim, como se observa na Figura 1.

Além desses, outros 10 municípios compõem a Região Metropolitana de Na-

tal, sendo a capital sua cidade polo (RIO GRANDE DO NORTE, 2019). Em

seus limites, a cidade possui uma grande presença de dunas, lagoas e ve-

getação remanescente de Mata Atlântica, tendo uma das maiores reservas

nacionais desse bioma delimitada pelo Parque Estadual Dunas de Natal,

considerado o maior parque urbano sobre dunas do Brasil (SEARH/COTIC,

2015). Esses atributos naturais que se mesclam com o tecido urbano confe-

rem à cidade uma paisagem singular, a qual reflete a origem da cidade e

orienta as prescrições do seu planejamento urbano.

Em sua divisão administrativa, o município se distribui em 4 Regiões

Administrativas (RAs): Norte, Sul, Leste e Oeste16. As três últimas são sepa-

radas da primeira pelo Rio Potengi, cujo leito é vencido por duas pontes,

ambas situadas na RA Leste, que conectam as duas porções de terra da

sejam popularmente conhecidas como “zonas” (Zona Norte, Zona Sul...) –, usaremos essa divisão também em nossas discussões.

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cidade. Dentro das RAs há um conjunto de 36 bairros e o Parque das Dunas,

que consiste em uma unidade de conservação destacada das divisões ad-

ministrativas municipais. Além dessa divisão, o PDN estabelece, em seu ma-

crozoneamento, a divisão do território em três zonas: Zona Adensável (ZAd),

Zona de Adensamento Básico (ZAB) e Zonas de Proteção Ambiental (ZPAs)

(NATAL, 2007).

A sua origem remonta ao fim do século XVI, com a construção do

Forte dos Reis Magos e o ato de inauguração da cidade. Inicialmente cha-

mada de Povoado de Reis, Natal foi fundada em 1599, no dia do feriado

homônimo. Nasceu com status de cidade, ainda que tivesse um número

muito pequeno de habitantes e que se assemelhasse mais a uma vila e assim

permaneceu pelos três século seguintes (SEMURB, 2018).

O núcleo urbano original da cidade se localizou no bairro Cidade Alta

e tinha como vizinho um bairro de caráter institucional e comercial, a Ribeira

(SEMURB, 2018). Essa forma de colonização à portuguesa, entretanto, não

se tratava do único assentamento humano na extensão atual do município.

Havia algumas ocupações de povos tradicionais e aglomerados sob uma

produção de subsistência em pontos mais afastados, como a Vila de Ponta

Negra, no extremo Sul do território. Todavia, esses agrupamentos eram

muito ermos e separados fisicamente do centro da Cidade, o que só come-

çou a mudar a partir da virada do século XX (CAVALCANTE, 2018).

Figura 1 Mapa da divisão administrativa e macrozoneamento do município de Natal

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ 2015. 2019.

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45

Foi no início do século XX, sob o governo oligárquico dos Albuquer-

que Maranhão, que a cidade passou então a planejar seu crescimento de

forma sistemática, o que deu origem à criação de seu terceiro bairro17, Ci-

dade Nova – atualmente, constituído pelos bairros de Tirol e Petrópolis – por

meio do Plano Polidrelli18 (SEMURB, 2018). A partir de então, viu suas po-

pulações e extensão expandirem vertiginosamente, sobretudo durante o pe-

ríodo em que o Brasil esteve submetido à Ditadura Civil-Militar de 1964,

época em que foram construídos, financiados pelo Banco Nacional de Habi-

tação (BNH), grandes conjuntos habitacionais na cidade. Nesse período,

marcado pela supressão da democracia, intervenção do governo militar e

perseguição política, de líderes locais inclusive, foi apresentado aos natalen-

ses, em 1968, o Plano Urbanístico e de Desenvolvimento de Natal (PUDN)

(SEMURB, 2018). O PUDN é considerado, pelo seu conteúdo, o primeiro

Plano Diretor da cidade, ainda que não tenha sido estabelecido de forma

participativa e democrática, e é característico pela marca de seu tempo: apre-

sentava um zoneamento funcional e considerava o município de formal glo-

bal.

A essa altura, os loteamentos urbanos avançavam sobre as áreas

então periféricas da cidade, substituindo as propriedades de características

mais rurais, como sítios e chácaras, por quadras à espera dos conjuntos

17 Até então, existiam apenas os bairros Ribeira e Cidade Alta.

habitacionais. O latifundiário passava de fazendeiro a especulador imobiliá-

rio. Assim se viu a cidade atravessar o rio e se expandir os limites das peri-

ferias Norte, Oeste e Sul. Esse cenário fez com que, durante duas décadas,

houvesse uma multiplicação no número de habitações com a construção de

grandes conjuntos habitacionais por todo o território nessas áreas de expan-

são. Um dos bairros a recebê-los, foi o próprio bairro de Ponta Negra, como

abordaremos mais adiante.

Associadas a essa expansão, formaram-se sobras intersticiais com

alta valorização fundiária. Entre os novos conjuntos periféricos e a malha

tradicional, restavam áreas que passavam a serem servidas pelas redes de

infraestrutura que se deslocavam até a periferia para atender às necessida-

des dessa população. Eram áreas que, apesar de não edificadas, já tinham

um valor mais alto agregado do que as utilizadas para construção dos con-

juntos, que brotavam em vazios isolados. Muitas dessas áreas vazias em

bairros bem atendidos com infraestrutura básica e serviços coletivos que,

junto com os novos espaços periféricos urbanizados, agregaram valor imo-

biliário ao longo das três últimas décadas, como apontam Ataíde; Brasil et al.

(2019).

Um aspecto que contribuiu para o modo esparso dessa ocupação foi

a legislação urbanística, que até a década de 1980, quase inexistia. Até

18 Apesar do nome de plano, assemelhava-se mais a um projeto de expansão urbana, atra-vés do loteamento de uma área na então periferia da cidade.

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então, não havia sido promulgada a Lei de Parcelamento do Solo 6766/79, o

que possibilitou que muitos loteamentos fossem aprovados sem que fossem

respeitadas padronizações de dimensões ou destinação de áreas para a ins-

talação de equipamentos públicos. Foi a partir de 1984, que a primeira Lei

de Uso do Solo foi incorporada ao Plano Diretor de Natal (NATAL, 1984), o

qual contemplava toda a extensão do município. Entretanto, foi estabelecido

observando as estratégias do zoneamento funcional e estimulava de forma

desigual a ocupação do solo ao longo do território, tais como as Zonas de

Comércio e Serviço, que estimulavam uma ocupação mais intensificada

numa faixa de 300 metros a partir dos eixos viários principais (ATAÍDE,

BRASIL, et al., 2019). Essas prescrições estimularam, conforme apresen-

tado anteriormente, padrões de ocupação de diferentes níveis sociais ao

longo do território, visto que, por suas localizações permitirem maior aprovei-

tamento do terreno, seus preços eram elevados e acessíveis apenas a uma

elite cada vez mais seleta à medida que empreendimentos se instalavam e,

com isso, valorizavam ainda mais o seu entorno. Do mesmo modo, o interior

dos bairros teve seu crescimento estagnado, visto que a manutenção da terra

ociosa para fins de valorização fundiária oriunda dos investimentos privados

e públicos ao longo dessas avenidas era economicamente vantajoso para os

proprietários de terra.

A partir das décadas seguintes, 1980 e 1990, a configuração espa-

cial dessas áreas de expansão passou a sofrer mudanças com o preenchi-

mento gradual das sobras dos conjuntos e loteamentos ainda não edificados

(ATAÍDE, BRASIL, et al., 2019). A partir de meados de 1980, na RA Sul, onde

se instalaram habitações voltadas para trabalhadores com uma faixa de

renda intermediária, viu-se a intensificação da ocupação e do surgimento de

atividades comerciais e de serviço no eixo viário das suas grandes avenidas:

a Senador Salgado Filho, que se torna BR-101 e conecta Natal com o muni-

cípio de Parnamirim; a Engenheiro Roberto Freire, que conecta o centro da

cidade – através da Senador Salgado Filho – com o litoral sul do município,

incluindo o bairro de Ponta Negra; e a Ayrton Senna, que atende às regiões

mais internas que estão mais distantes das duas outras avenidas, bem como

à área de expansão de Parnamirim, na divisa entre os dois municípios, onde

se concentra uma população mais elitizada. Enquanto se observou na RA

Sul um aumento da ocupação por uma população mais abastada e com

maior variedade de usos, na RA Norte, de forma mais tardia, a partir dos

anos 1990, foi observada uma ocupação mais homogênea e residencial, vol-

tada para uma parcela de trabalhadores com menor renda. A maioria desses

preenchimentos se deu por meio de novos conjuntos habitacionais, mas tam-

bém foram observadas outras formas de ocupação tanto formais quanto in-

formais.

Em 1994, o plano diretor recebeu uma revisão, o que provocou mu-

danças substanciais em seu conteúdo. A ruptura com o zoneamento funcio-

nal, que setorizava a cidade pelo estímulo a determinados usos, trouxe con-

sigo a permissão à diversidade de usos em todo o território. Em seu lugar

também foi estabelecido o zoneamento que até hoje é seguido, dividido entre

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a ZAd, ZAB e ZPA, entretanto os parâmetros urbanísticos para orientar a

ocupação dessas zonas eram uma mistura de coeficiente de aproveita-

mento19 e densidades populacionais (NATAL, 1994). Do mesmo modo, fo-

ram estabelecidas as Áreas Especiais, as quais imprimem sobre as parcelas

do território com características específicas e prescrições urbanísticas dife-

renciadas das demais áreas da cidade. As áreas especiais destacadas à

época são as Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS), Áreas Especiais

de Operação Urbana e Áreas Especiais de Controle de Gabarito (AECG)

(NATAL, 2007). Com essas mudanças, algumas áreas passaram a ser atra-

entes para a ocupação residencial mais intensa, o que somado à dinâmica

imobiliária de valorização de determinados espaços na cidade, fez com que

a RA Sul atraísse mais habitantes.

Esse processo de expansão também pode ser apontado como um

dos fatores do esvaziamento das antigas áreas centrais da cidade, onde até

então se concentravam as habitações, sobretudo as da elite (ATAÍDE,

BRASIL, et al., 2019). Com o surgimento de novas áreas da cidade voltadas

para ocupação de elites e a indução do desenvolvimento econômico dessas

áreas através do estímulo à instalação de atividades geradoras de renda,

houve um deslocamento de parte da parcela mais rica para áreas mais afas-

tadas. A região que mais recebeu esse contingente foi a RA sul, sobretudo

19 Coeficiente de aproveitamento é o índice urbanístico equivalente à divisão entre a área construída computável da edificação e a área total do lote. No PDN, é estabelecido que pergolados, beirais, caramanchões, guaritas, garagens, depósitos de lixo, depósitos de gás, casas de máquinas e subestações não são áreas computáveis (NATAL, 2007).

em volta do eixo das avenidas Senador Salgado Filho e Engenheiro Roberto

Freire, que passaram a concentrar além de variados pontos de consumo, um

grande fluxo em direção aos conjuntos habitacionais e ao lazer e turismo

proporcionados pelas praias do litoral sul.

Desse modo, conforme houve a redefinição da importância desses espaços para o tecido urbano, houve uma modificação no uso predominante que se dava ao seu solo, de forma que, onde se instalavam indústrias ou havia uma ocupação de ca-racterísticas rurais, passou-se a ocupar-se o solo com equipa-mentos voltados à atividade comercial e à habitação. (ATAÍDE, BRASIL, et al., 2019, p. 8-9)

A partir da sua revisão de 2007, o PDN manteve o macrozoneamento

vigente, mas extinguiu o parâmetro das densidades, alinhando-se com os

parâmetros urbanísticos definidos pelo Estatuto da Cidade, aprovado em

2001. Nas ZABs, o adensamento é permitido, porém de forma mais restrita,

sendo sua ocupação limitada ao máximo cumprimento do coeficiente de

aproveitamento básico, que equivale a 1,2 para todo o município. Já na Zona

Adensável, onde as condições de infraestrutura e do meio físico o permite, o

padrão de adensamento é estimulado a ser maior que nas ZABs, sendo o

seu coeficiente de aproveitamento máximo variável de acordo com o bairro

em questão, oscilando entre os valores de 2,0 e 3,5. Em ambas as zonas é

estabelecida uma restrição de gabarito20: para as ZABs é de 65 metros; para

20 Gabarito é a diferença de altura entre o nível do meio fio e o ponto mais alto da edificação (NATAL, 2007).

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as Zonas Adensáveis, 90 metros. Já as ZPAs, são áreas onde as caracterís-

ticas do meio físico restringem o uso e ocupação, visando a proteção, manu-

tenção e recuperação dos aspectos ambientais, ecológicos, paisagísticos,

históricos, arqueológicos, turísticos, culturais, arquitetônicos e científicos

(NATAL, 2007). Como se vê na Figura 1, A Zona Adensável se concentra

numa porção mais central do município, enquanto as ZABs se distribuem

pelas demais localidades, alternando-se com as ZPAs, as quais somam 10

perímetros ao longo do território.

De 2007 para cá, os espaços das elites se consolidaram. Os eixos

de maior valorização fundiária passaram a concentrar os espaços de verti-

calização da cidade, sobretudo nos bairros do Sul. Os bairros centrais segui-

ram densos, mas vêm perdendo população, ao passo que os seus territórios

vêm passando por um aumento no número de Habite-se emitidos (SEMURB,

2018). A segregação urbana, portanto, tem aumentado. Com ela, entretanto,

onde se esperava ver um maior preenchimento dos bairros vemos a manu-

tenção de seus vazios. Imóveis não edificados, subutilizados e não utilizados

mantêm sua ociosidade com o passar dos anos, mesmo que a regulação do

uso e ocupação do solo seja regida pela função socioambiental da proprie-

dade. Esses imóveis, chamados de vazios urbanos serão abordados a se-

guir.

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2. OS VAZIOS URBANOS

Apesar de, numa primeira impressão, o termo “vazio urbano” remeter

diretamente a terrenos baldios, o seu conceito abarca uma gama de situa-

ções de imóveis, sejam lotes ou edifícios, que de algum modo não cumprem

a função social da propriedade. Dessa forma, para melhor detalhar esse con-

ceito, partimos das percepções que temos ao nos deparar com essas situa-

ções no nosso cotidiano e inserimos alguns conceitos à discussão à medida

que for pertinente. Sendo assim, pretendemos melhor definir o que são os

vazios urbanos sem a pretensão de esgotar a discussão aqui, visto que, pela

própria natureza do tema, há muito o que se explorar.

Dessa maneira, explanamos o conceito de vazios urbanos, a sua re-

lação com a localização e as formas de categorização que existem para me-

lhor compreendê-los. Para tanto, lançamos mão das definições presentes na

legislação para estabelecer alguns contornos ao que é o vazio em si. Por-

tanto, tratamos sobretudo do capítulo da política urbana da Constituição

(BRASIL, 1988), do Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001) e do Plano Diretor

de Natal (NATAL, 2007).

Em seguida, relacionamos esse conteúdo com o tema da especula-

ção imobiliária e com o que abordamos no capítulo anterior no que tange à

produção capitalista do espaço e da localização. Por fim, abordamos as

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classificações de vazios a partir das definições do PDN e seus instrumentos

urbanísticos.

2.1. CONCEITOS

Andando pelas cidades, observamos toda a sorte do que chamamos

corriqueiramente de vazio. Diz-se “vazios” aos terrenos abandonados, cer-

cados ou não, denunciados pela vegetação que cresce amorfa, invadindo

calçadas e terrenos vizinhos, ou mesmo pelos rastros de uma demolição in-

conclusa, muitas vezes executada pelo seu próprio tempo de abandono. Ve-

mos pelos bairros, dos mais antigos aos mais novos, construções que ven-

ceram o passar dos anos, mas já não são utilizadas ou cujo uso atual não

necessita de um espaço do porte da construção. Mesmo nas áreas comerci-

ais da cidade, marcadas pela intensa circulação de pessoas e mercadorias,

são observados terrenos que não abrigam nenhuma edificação, mas que

concentram carros estacionados sob nenhuma estrutura ou sob estruturas

improvisadas. Esses imóveis muitas vezes assim permanecem até que se

valorizem e sejam adquiridos por algum indivíduo ou grupo que construirá

mais um empreendimento no local. Dessa maneira, são espaços geralmente

associados à especulação imobiliária.

Em Natal, é possível ver exemplos como os acima mencionados es-

palhados por toda a extensão do município, como apresentam as três situa-

ções reais ilustradas na Figura 2. A primeira (A) delas se localiza no bairro

de Capim Macio, trata-se de um lote, como muitos da região, que já está há

um tempo vazio e que, apesar de cercado e eventualmente limpo, mantem-

se sem edificação e sem uso. Já a segunda situação (B), ilustra uma antiga

fábrica localizada na Avenida Senador Salgado Filho, uma das principais vias

da cidade, no bairro de Lagoa Nova, cuja edificação permanece há anos sem

uso, o que se evidencia pelo estado precário de conservação das fachadas.

Por último, na imagem C, há a retratação de um lote no meio da área comer-

cial popular de Natal, o Alecrim, que abriga exclusivamente um estaciona-

mento.

Figura 2 Exemplos de vazios em Natal

Fonte: CAVALCANTE, 2018.

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Essas três situações ilustram, por sua vez, três categorias diferentes

de vazio urbano, como será abordado na sequência. Mas, antes de detalhar

essa categorização, vamos tratar de como esses lotes não edificados e sem

uso, esses edifícios não utilizados e esses imóveis subutilizados são classi-

ficados como vazios urbanos. Para tal, é necessário retomar o conceito de

função social da propriedade.

É importante compreender que a propriedade da terra está subme-

tida a uma série de prescrições legais e por elas subordinada a estratégias

de ordenamento e planejamento urbano e territorial. Ao passo que há o solo

urbano, há, constitucionalmente, a exigência de que ele esteja submetido ao

cumprimento de uma função social. Isso se dá pelo teor coletivo da constitui-

ção do tecido urbano, o que implica numa divisão dos custos de mantê-la.

Isto é, os impostos que viabilizam a pavimentação das ruas, a iluminação

pública, o sistema de esgotamento sanitário, etc., são uma contribuição dos

cidadãos de uma forma geral, independentemente de em que ponto do mu-

nicípio esse cidadão more. Dessa forma cada cidadão contribui não somente

com a construção do espaço que ocupa, mas também com a construção da

cidade como um todo.

O princípio norteador do regime da propriedade urbana é a sua fun-

ção social, permitindo que, por meio do Plano Diretor, o Poder Público Muni-

cipal possa exigir o cumprimento do dever do proprietário, submetendo seu

direito em detrimento do benefício da coletividade, o que implica numa

destinação concreta do seu imóvel para atender a um interesse social.

(ROLNIK e SAULE JÚNIOR, 2001). A função social da propriedade, como

abordamos, é exercida quando o direito individual de propriedade não su-

planta ou subordina os interesses coletivos e difusos (NATAL, 2007).

Dessa maneira, a apropriação privada dessa construção coletiva

através da retenção especulativa é um problema para as cidades. Ao passo

que as cidades são o lugar socialmente convencionados da vida em comuni-

dade, os espaços da cidade têm impacto na vida de todos à sua volta. Sendo

assim, quando se deixa um imóvel vazio, ele não apenas deixa de contribuir

para a vitalidade da cidade, mas também onera a sociedade como um todo.

Isso porque esses imóveis, comumente em estado de abandono, passam a

abrigar lixo e vetores de doenças e passam a ser espaços que emitem uma

sensação de insegurança. É muito corriqueira nas ruas a imagem de grandes

terrenos baldios que à noite inspiram medo, sobretudo nas mulheres, que se

sentem mais vulneráveis diante da rua que, por não ter ocupação, tem pou-

cas pessoas circulando. Todavia, os lotes, à revelia de serem mantidos por

seus proprietários, não deixam de se beneficiar dos investimentos coletivos

em infraestrutura: as ruas seguem pavimentadas, com disposição de rede

elétrica, de água, esgoto etc. Os proprietários têm os seus lotes valorizados

pelo conjunto de cidadãos, enquanto contribuem negativamente para a vida

urbana. Isto é, os custos são coletivizados, mas os lucros são individualiza-

dos. Portanto, os vazios urbanos são uma denúncia de injustiça territorial, de

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uma apropriação indevida e, na maioria dos casos, impune do esforço comu-

nitário de construir as cidades.

Entretanto, nem tudo que é identificado preliminarmente como vazio

pode ser considerado de fato um vazio urbano. Uma vez que, dada a com-

plexidade das relações fundiárias, há muitos espaços que são, na verdade,

áreas verdes, áreas non aedificandi, lotes inseridos em áreas de proteção

ambiental, lotes em litígio, imóveis de valor histórico, partes de regiões con-

taminadas, áreas expostas a condições de risco à saúde ou de alta declivi-

dade topográfica, condições que impedem ou restringem a sua ocupação.

Sendo assim, compreende-se que a terra urbana passível de uso e/ou ocu-

pação que permanece vazia (não edificada, subutilizada ou não utilizada) não

está cumprindo a sua função social, uma vez que seu uso não está de acordo

com a capacidade da infraestrutura disponível.

Existem espaços do município de Natal em que se verifica a neces-

sidade de alterar os lotes da sua condição de vazios urbanos, seja isso feito

através de instrumentos urbanísticos de regularização fundiária ou de indu-

ção do desenvolvimento urbano21, seja através de incentivos financeiros com

programas habitacionais. Mas há lugares em que os vazios não oferecem

risco eminente à dinâmica social do lugar, como nas áreas de expansão ur-

bana e periferias. Nestas, inclusas geralmente na ZAB, os vazios não

21 Instrumentos urbanísticos de regularização fundiária e de indução do desenvolvimento urbano são classificações elaboras por Rolnik e Saule Júnior (2001) para agrupar os meca-nismos estabelecidos pelo Estatuto da Cidade.

precisam necessariamente ser adensados, mas é necessário conhecê-los e

à sua dinâmica para que essa decisão seja tomada, uma vez que há de se

pesar que as redes de infraestrutura urbana devem atender a todos os bair-

ros da cidade, mas que em alguns lugares seu adensamento implicaria numa

sobrecarga dessas redes. Ainda é importante atentar, dada a carência de

equipamentos públicos e áreas de lazer ao longo do município, que a ocupa-

ção não é sempre uma saída mais interessante para os vazios urbanos: au-

mentar a oferta de praças, parques e espaços de reunião pública podem ser

ainda mais adequados às necessidades locais. O que deve balizar essa de-

cisão é a análise das necessidades da população no território em discussão,

sem perder de vista que os vazios são ao mesmo tempo problemas urbanos

e potenciais espaços no tecido para se fazer justiça territorial.

Destarte, vazio urbano pode ser compreendido como sendo o imóvel

– lote ou edificação – situado numa parcela do município passível de uso

e/ou ocupação que não exerce a sua função social/socioambiental da propri-

edade, podendo ele estar: não edificado, subutilizado ou não utilizado.

Os imóveis não edificados são os lotes que não receberam constru-

ção ou cuja construção pré-existente foi demolida. São a categoria de mais

fácil identificação, visto que pressupõem a verificação de área construída

igual a 0. Já os lotes e edificações subtilizados são aqueles cujo

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aproveitamento é inferior ao mínimo definido no plano diretor ou em legisla-

ção dele decorrente (BRASIL, 2001). Portanto, trata-se do valor do coefici-

ente de aproveitamento, ou seja, ocupação, e também uma relação de utili-

zação considerada compatível com as atividades desejadas para o espaço

urbano. Logo, a fim de que sejam identificáveis esses imóveis, é necessário

que os planos estabeleçam um coeficiente de aproveitamento mínimo

(BRASIL, 2001) e as condições de uso do solo que estejam em conformidade

com a função social da propriedade. Entretanto, é importante que ressalte-

mos que, segundo Rolnik e Saule Júnior (2001), essa definição não se res-

tringe ao coeficiente mínimo de aproveitamento do lote, ou seja, é preciso

compreender que a ideia de subutilização pode variar nos diferentes contex-

tos urbanos. Entre os vazios que podem ser considerados subutilizados es-

tão os estacionamentos, os terrenos grandes com edificações pequenas ou

ainda, as edificações com uso parcial. Por sua vez, os imóveis não utilizados

são edifícios completamente abandonados.

A fim de que sejam possíveis de aplicar e efetivar os instrumentos

urbanísticos, para Rolnik e Saule Junior, é preciso que os planos diretores

definam os conceitos de subutilização e não utilização, observando as espe-

cificidades de cada realidade urbana (2001). Dessa forma, seguiremos abor-

dando a relação entre os vazios urbanos e as localizações, para observarmos

como eles interagem com a produção do espaço urbano.

2.2. VAZIOS URBANOS E AS LOCALIZAÇÕES

No modo de produção capitalista da sociedade e, consequente-

mente, das cidades, apesar das zonas urbanas serem quase completamente

loteadas, o valor da terra não é o mesmo ao longo de sua extensão. Lotes

de mesma dimensão em localidades distintas do território possuem preços

distintos. O preço da terra urbana, pois, não se dá somente por suas carac-

terísticas formais – dimensão, declividade, presença de vegetação e etc. –,

mas também em função da sua inserção em relação a outros lotes e, sobre-

tudo, a equipamentos urbanos e disposição de infraestrutura. Ou seja, con-

forme tratamos no capítulo 1, a construção social coletiva da cidade produz,

ademais de suas obras físicas, um produto abstrato e inerente à materiali-

dade: as localizações.

A regulação do mercado de terras no Brasil é pouco incisiva e não

há interferências diretas na precificação dos lotes ou em sua oferta, o que

seria uma ferramenta para o Estado garantir a distribuição equitativa dos re-

cursos urbanos. Ainda que haja instrumentos urbanísticos estabelecidos pela

lei com esse objetivo, os municípios não logram êxito em desenvolver e muito

menos aplicar tais instrumentos em seu território. A taxação diferenciada do

IPTU de lotes vazios, os instrumentos de indução do crescimento ou mesmos

as ações diretas dos poderes municipais de regularização fundiária são ele-

mentos que figuram nos Planos Diretores e demais legislações, mas que não

se verificam na prática.

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Entretanto, a não aplicação desses instrumentos não pode ser en-

tendida simplesmente como incompetência, mas como um conjunto de ações

deliberadas de uma estrutura de poder que não admite a democratização da

terra como um processo importante para o país, mas como uma ameaça à

manutenção do status quo, uma ameaça ao estado patrimonialista22.

De maneira semelhante, as definições dos Planos Diretores sobre as

porções dos municípios que podem receber maior adensamento construtivo

também beneficiam determinadas camadas da sociedade. Em seu papel de

regulador do uso e da ocupação do solo, as prescrições urbanísticas defini-

das pelos poderes municipais influenciam, sobretudo, os rumos do mercado

formal e como este se colocará sobre o solo urbano. De forma dialética,

acaba por delimitar as áreas que não receberão as ações do mercado formal

por não serem economicamente interessantes. Sendo assim, essas prescri-

ções dotam de possibilidades variadas os lotes em pontos distintos das cida-

des. Há um tipo de lote, pois, que é mais suscetível a essas determinações,

bem como nestes se denunciam sua existência: os vazios urbanos.

Isso pode ser ilustrado por uma situação hipotética em que um de-

terminado lote na cidade que antes se inseria numa zona de ocupação mais

restritiva da cidade que previa a aplicação do coeficiente de aproveitamento

básico, após um processo de alteração legislativa, passe a poder usufruir de

22 Patrimonialismo pode ser entendido como uma característica do Estado que não possui definidos os limites do público e do privado, sendo ele governado para o atendimento de

um coeficiente máximo 3 vezes superior ao básico, por exemplo. Tal ação,

ocorrida supostamente “à revelia” do proprietário do imóvel faz com que o

preço do terreno suba exponencialmente, pois ele agora pode abrigar um

empreendimento com o triplo do porte que podia antes. De forma seme-

lhante, ainda que de modo mais modesto, quando passam a ser ofertados a

lotes periféricos serviços de infraestrutura que essa área não possuía.

Desse modo reter lotes em situação de abandono pode ser econo-

micamente mais valioso do que manter, edificar e dar uso aos lotes. Essa

retenção deliberada à espera de melhores condições de mercado para ne-

gociar os imóveis chama-se especulação imobiliária. Portanto, pode-se in-

ferir a partir do que foi anteriormente exposto que, uma vez que a terra urbana

é uma mercadoria, que esse mercado de terras não é regulado e que a apro-

priação individual dos lucros sobre os investimentos urbanos coletivos acon-

tece por meio da oferta de serviços estatais: que os vazios urbanos são um

produto de uma estrutura de Estado patrimonialista inserido num sistema so-

cioeconômico que transforma a terra em capital.

Desse modo, a concentração de vazios em determinadas parcelas

do tecido urbano ao mesmo tempo que pode denotar um mercado aquecido,

pode denunciar o esvaziamento de capital nessas áreas. Assim, há vazios

interesses dos grupos associados ao poder e não os da coletividade de cidadãos, indepen-dentemente de sua relação com esses grupos.

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em diversas localizações na cidade com diversas causas originárias, logo

eles prescindem de medidas diversas de acordo com sua natureza.

Essa retenção especulativa, pois, é um estado de reserva do solo

urbano a fim de auferir maiores lucros com as potencialidades construtivas

em detrimento da sua produção material. Dessa forma, a compreensão de

como esses vazios urbanos se constituem no território é uma maneira de

instrumentalizar o combate à especulação e, consequentemente, a esse pro-

cesso de segregação socioespacial. Há uma necessidade de produção, so-

bretudo habitacional para pessoas em vulnerabilidade social, muito grande

para que seja considerado ético tal modo de desenvolver as cidades. As ur-

gências são de democratização da terra e dos seus processos de controle:

direito à cidade. O caminho para tal passa pela conversão dos vazios em

espaços que cumpram a sua função social.

2.3. NATAL E OS VAZIOS URBANOS

Para Rolnik e Saule Júnior, a fim de fazer cumprir a função social da

propriedade, o plano diretor deve ter mecanismos para promover o adequado

aproveitamento dos vazios urbanos, de modo a coibir o uso especulativo da

terra como reserva de valor (2001, p. 41-42). Em concordância com esse

entendimento, o PDN em vigor estabelece alguns instrumentos nesse

23 Apesar do contexto em que a expressão “área” se insere apontar para a interpretação de que está se tratando de lotes, há espaço para interpretações ambíguas, as quais podem levar a compreensão de que quaisquer imóveis – lotes ou edifícios – com mais de 1.000,00

sentido, três dos quais serão pontuados aqui pelos contornos que trazem à

definição de vazios para o município: o Parcelamento, Edificação ou Utiliza-

ção Compulsórios (PEUC), o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) Pro-

gressivo e as AEIS de Vazios.

Para que sejam aplicados o PEUC e, sucessivamente, o IPTU Pro-

gressivo, são definidos como seus possíveis objetos os imóveis não edifica-

dos, subutilizados ou não utilizados localizados na Zona Adensável, excetu-

ando-se os que possuem área menor que 400,00m² e os que se constituem

como única propriedade do titular (NATAL, 2007). Eles também se aplicam

às áreas23 com mais de 1.000,00m², nas mesmas condições acima, podendo

estar localizado em qualquer Zona, em que se verifica a necessidade de re-

gulamentação ou criação de novas AEIS (NATAL, 2007).

Em seu artigo 22, o PDN estabelece também que são passíveis de

classificação como AEIS de Vazios, as

glebas ou lotes urbanos, isolados ou contíguos, não edifica-dos, subutilizados ou não utilizados, com área superior a 400m² (quatrocentos metros quadrados), necessários para a implantação de programas de habitação de interesse social.

Logo, precisamos entender os conceitos que definem o que são es-

ses imóveis não edificados, subutilizados ou não utilizados a fim de que pos-

samos entender como esses imóveis podem se classificar. O primeiro passo,

m² não edificados, subutilizados ou não utilizados que se constituam única propriedade do titular sejam passíveis de submissão aos instrumentos de PEUC e IPTU progressivo.

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portanto, é entender que a expressão “imóvel urbano” pode ser compreen-

dida como sendo o conjunto composto por terrenos e edifícios. Outro con-

ceito importante é que “edificação” é tratado nas prescrições urbanísticas

como “área construída”. Sendo assim, abordaremos o que entendemos na

legislação atual que pode definir esses vazios urbanos, tendo em vista os

seus aspectos de uso e ocupação.

2.3.1. Lotes não edificados e sem uso

Os lotes não edificados são aqueles cuja área construída é igual a 0.

Diferentemente dos lotes subutilizados, como veremos a seguir, que usam

como referência o coeficiente de aproveitamento mínimo, este não pode ser

parâmetro para analisar este caso. Isso se dá em função do coeficiente de

aproveitamento (CA) ser definido no PDN como sendo a razão entre a área

construída do lote subtraída de sua área não computável e a área total ter-

reno (NATAL, 2007), como observamos abaixo. As áreas não computáveis,

por sua vez, são correspondentes aos “pergolados, beirais, caramanchões,

guaritas, garagens, depósitos de lixo, depósitos de gás, casas de máquinas

e subestações” (NATAL, 2007).

Equação 1 Cálculo do coeficiente de aproveitamento

𝐶𝐴 =Á𝑟𝑒𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑑𝑒 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡𝑟𝑢çã𝑜 − Á𝑟𝑒𝑎 𝑛ã𝑜 𝑐𝑜𝑚𝑝𝑢𝑡á𝑣𝑒𝑙

Á𝑟𝑒𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑑𝑜 𝑡𝑒𝑟𝑟𝑒𝑛𝑜

Fonte: Produzido pelo autor com base em dados do PDN (NATAL, 2007). 2019.

Salvo o contrário, considerar o coeficiente de aproveitamento, da

forma como está definido hoje pelo PDN, significaria considerar como vazios

não edificados lotes que possuem construções. O coeficiente de aproveita-

mento para Natal é uma proporção entre as áreas em que se desempenham

atividades humanas e a área total da terra. Logo, o coeficiente de aproveita-

mento igual a 0, se usado como parâmetro de análise dos lotes, pode enco-

brir situações em que terrenos são destinados a garagens ou depósitos, o

que, conceitualmente, se aproxima mais daquilo definido como subutilização.

A não edificação associada ao não uso é a situação em que mais

fácil se verificam os vazios urbanos, pois são áreas do tecido edificado con-

solidado que permanecem vazias, em contraste com o seu entorno, sendo

frutos de eventuais demolições ou mesmo lotes que nunca receberam cons-

truções desde seu parcelamento. Ao nível do observador, essas áreas são

os descampados que, à noite, conferem à rua a aversão ao espaço público

escuro, despovoado e potencial abrigo de crimes, enquanto revelam o seu

perigo diuturno à cidade: a especulação imobiliária.

Essa é apontada como uma explicação mais frequente desse fenô-

meno, pois são os espaços que usufruem da estrutura ao seu redor para sua

valorização fundiária, mas não oferecem nada em troca ao seu entorno, se-

não a sensação de insegurança, como observa Iris de Almeida Rezende Eb-

ner:

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Talvez, em realidade, a existência dos vazios urbanos só se explique pela especulação. Parece ser este o motivo mais con-tundente para se manter grandes áreas passíveis de serem ocupadas, em compasso de espera. Para futuro parcelamento ou ocupação, aumentando assim a possibilidade de seu pro-prietário auferir uma renda maior. (EBNER, 1999, p. 70)

Esses vazios, por sua vez, apresentam várias dimensões e se espa-

lham por toda a cidade, ressaltando o seu caráter de produto do processo de

evolução da cidade. Isto é, apenas são evidenciados como vazios os lotes

que possuem um entorno construído, portanto, eles são marcas da atividade

humana sobre o solo, uma vez que o construído e o não construído são parte

do mesmo processo evolutivo do território, desde sua ocupação à sua cons-

tante renovação. Portanto, pode-se afirmar que “o vazio é gerado como são

criadas as construções urbanas” (EBNER, 1999, p. 68). Ou seja, estão sub-

metidos às lógicas de mercado e, portanto, são apresentados nos lugares

onde há maior possibilidade de benefício ao seu proprietário.

Em Natal, essa situação de lote pode ser vista em várias partes da

cidade, mas o foco de maior especulação ocorre nos bairros das áreas que

contam com externalidades e atrativos que sirvam de prerrogativa para man-

ter a oferta dessas terras com valores do metro quadrado elevados e à es-

pera da melhor oportunidade para serem vendidos (MARINHO, 2018, p. 34-

35). Essa porção do território, que também agrega as parcelas da sociedade

natalense mais abastadas, se distribui desde o centro da cidade em direção

ao sul, como se vê na Figura 3.

Figura 3 Mapa das áreas centrais e áreas de maior verticalização do município

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ 2015, ATAIDE, et al. 2018. 2019.

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Todavia, nem sempre o lote não edificado está sendo usado volun-

tariamente para a especulação imobiliária. Quando se faz referência a terras

públicas, ele pode se tratar de uma área verde, área non aedificandi ou parte

de uma das 10 ZPAs, situações em que o lote ainda que não edificado de-

sempenha sua função socioambiental, visto que contribui para o “bem-estar

da coletividade e a preservação da qualidade do meio ambiente" (NATAL,

2007). Entretanto, quando essas áreas não edificáveis, mas passíveis a uti-

lização (praças e áreas verdes), não estão qualificadas para tanto, caracteri-

zam-se, pois, como lotes subutilizados.

Também há situações, quando se trata da propriedade privada, em

que os proprietários não possuem recursos para edificá-los ou dar-lhes uso,

bem como parcelá-los, em função da sua realidade socioeconômica. Porém

esses casos são exceções à regra, o que se verifica pela localização das

maiores concentrações de vazios, nos bairros mais dotados de infraestrutura

e com uma população mais abastada, e pela retenção da terra vazia geral-

mente concentrada nas mãos de poucos donos e mesmo empreiteiras.

Mesmo assim, os lotes que não estão especulando não deixam de descum-

prir sua função social e, portanto, seguem classificados como vazios urba-

nos.

Pela sua fácil identificação, pelos limites de recursos e pelo limite de

tempo deste estudo, nesta pesquisa, apenas os lotes não edificados e sem

uso serão alvo de investigação, a fim de que se possa estudá-los de forma

mais aprofundada.

2.3.2. Lotes e edifícios subutilizados

O conceito de subutilização remonta a duas características dos lotes:

a sua ocupação e seu uso. É o princípio de que os danos oferecidos por

esses espaços estão associados ao seu potencial de benefício, dadas as

prescrições urbanísticas e infraestrutura de entorno sobre ele incidentes, e

ao cumprimento da função social da terra urbana. Sobre a primeira conside-

ração, o Estatuto da Cidade expressa que é subutilizada a edificação cujo

aproveitamento seja inferior ao mínimo definido no plano diretor ou em legis-

lação dele decorrente (BRASIL, 2001). O PDN, por sua vez, é mais abran-

gente e determina, em suas definições que glebas ou lotes subutilizados são

áreas públicas ou particulares, com edificação abandonada, ociosas ou utilizadas por alguma forma de ocupação transitória ou móvel ou ainda, cujo coeficiente de aproveitamento seja in-ferior a 0,1 (zero vírgula um) e que não atendam às funções sócio-ambientais da propriedade expressas nesta Lei. (NATAL, 2007, p. 8)

Assim, podemos entender que, para Natal, lotes subutilizados são

aqueles que abrigam edificações cujo somatório das áreas construídas sub-

traído das áreas não computáveis seja menor que 10% da área, ou cujas

construções estejam abandonadas ou ociosas. Ainda considera que também

assim se configuram os lotes que, embora não tenham construções, abrigam

usos transitórios móveis – estacionamentos ou áreas de foodtruck por

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exemplo –, descumprindo a função socioambiental da propriedade. Um as-

pecto importante dessa compreensão é que o regramento urbanístico muni-

cipal estabelece que as terras sob custódia do município também são passí-

veis de classificação como subutilizadas.

Uma observação complementar é de que a definição de subutiliza-

ção varia de acordo com o que prevê a legislação de cada município, visto

que esse detalhamento é dado pelos planos diretores de acordo com a rea-

lidade local. Por exemplo, em Fortaleza, seu plano diretor prevê que imóveis

subutilizados são aqueles cujo índice de aproveitamento é inferior ao coefici-

ente mínimo e, no artigo 209, que são subutilizados os imóveis:

edificados, com área igual ou superior a 400m² (quatrocentos metros quadrados), cujos índices de aproveitamento não atin-jam o mínimo definido para zona ou que apresentem mais de 60% (sessenta por cento) da área construída da edificação ou do conjunto de edificações sem uso há mais de 5 (cinco) anos (FORTALEZA, 2009)

Já em São Paulo, em seu Plano Diretor Estratégico, o artigo 93 con-

sidera subutilizados os lotes e glebas com área superior a 500m² (quinhentos

metros quadrados) que apresentem coeficiente de aproveitamento inferior ao

mínimo, este, por sua vez, varia entre 0,3 e 0,5 a depender de sua localização

em relação aos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana. (SÃO

PAULO, 2014)

O conceito de subutilização não é tão simples de ser apreendido pela

população leiga como no caso dos lotes não edificados e também divide

autores dada a delicadeza de sua definição. Isso se dá porque muitos desses

lotes desempenham atividades temporárias, o que faz com que as pessoas

não os associem à especulação, como no caso dos estacionamentos rotati-

vos e dos foodtrucks, estes ainda mais evidentes, uma vez que são respon-

sáveis por inserir uma dinâmica num espaço que muitas vezes era um vazio

não edificado, o que os dissocia do espaço hostil do terreno abandonado.

Sobre isso, esclarece Andrea de Lacerda Pessôa Borde (2006):

A subutilização nem sempre é identificada como vazio urbano pelos cidadãos uma vez que, em alguns casos, nele se desen-volvem usos e atividades que atendem a uma função não aten-dida pelo poder público. (BORDE, 2006, p. 15-16)

2.3.3. Os edifícios não utilizados

Apesar da abrangência dos instrumentos de indução do PDN alcan-

çar os imóveis não edificados, subutilizados e não utilizados, a última cate-

goria não é possível de ser estabelecida separada da segunda. Isso acontece

porque, ainda que enuncie “imóveis”, as definições que descrevem os con-

ceitos de não edificação e subutilização são referentes exclusivamente aos

terrenos e abarcam em sua extensão os edifícios não utilizados, classificando

os terrenos que os contêm como subutilizados.

Dessa forma, o quadro normativo urbanístico de Natal limita-se a

tratá-los a partir do lote. Portanto, divide os vazios em 2 categorias, as quais

intitulamos: vazios não edificados e sem uso e os vazios subutilizados, como

se vê no Quadro 1.

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Quadro 1 Condições que classificam os lotes em Natal quanto às categorias de vazios urbanos

CARACTERÍSTICAS DO IMÓVEL E DA ÁREA ONDE SE LOCALIZA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE

Ocupação Utilização Cumprimento

Vazio Urbano

Permissão Características da ocupação Permissão Incidência de uso Caracterização Categoria

Permitida: lote sobre

o qual não incide le-

gislação proibitiva à

construção.

Área construída igual a 0 sem ou-

tras formas de ocupação

Permitida Com uso Cumpre Não

Permitida Sem uso Não cumpre Sim Lote não edificado

e sem uso

Área construída igual a 0 com ocu-

pação móvel ou transitória

Permitida Com ou sem uso Não cumpre Sim Lote subutilizado

Área construída maior que 0 e coe-

ficiente de aproveitamento menor

que 0,1

Permitida Com ou sem uso Não cumpre Sim Lote subutilizado

Coeficiente de aproveitamento

maior que ou igual a 0,1

Permitida Com uso Cumpre Não

Sem uso Não cumpre Sim Lote subutilizado

Não permitida: lote

sobre o qual incide

legislação proibitiva

à construção, por ca-

racterísticas socio-

ambientais, de risco

ou outra.

Área construída igual a 0 sem ou-

tras formas de ocupação

Permitida Com uso Cumpre Não

Sem uso Não cumpre Sim Lote subutilizado

Não permitida Com uso Não cumpre Não

Sem uso Cumpre Não

Área construída superior a 0 ou com

ocupação móvel ou transitória

Permitida ou não Com ou sem uso Não cumpre Não

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

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PARTE 2: O CASO DE PONTA NEGRA

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63

3. PONTA NEGRA

Neste capítulo abordamos os aspectos históricos, morfológicos, so-

ciais e legislativos do nosso universo de estudo, o bairro Ponta Negra. Para

tanto, iniciamos pela contextualização da área em relação aos processos his-

tóricos e de evolução da ocupação da cidade, tendo como principais referên-

cias Maria Suely Paula da Silva (2006), Karina Messias da Silva (2007), Ân-

gelo Magalhães Silva (2013) e os bancos de dados da SEMURB e da pes-

quisa “Caracterização do tecido urbano de Natal: um estudo morfológico da

evolução urbana da cidade”, coordenada pela professora Amíria Bezerra Bra-

sil.

Em seguida, tratamos dos aspectos socioeconômicos que caracteri-

zam a ocupação do bairro, tendo como fontes os dados do IBGE e da SE-

MURB. No mesmo sentido, relacionamos esses dados com a conceituação

feita por Villaça (2011) das Áreas de Grande Concentração das Camadas de

Alta Renda (AGCCAR) e o município de Natal.

Por fim, abordamos as legislações urbanísticas e ambientais inciden-

tes sobre o território, nas esferas municipais e federais, tendo como principal

referência o PDN (NATAL, 2007) e o Código Florestal (BRASIL, 2012).

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3.1. NATAL E O BAIRRO DE PONTA NEGRA

Ponta Negra é um bairro da RA Sul do município de Natal cuja inser-

ção no macrozoneamento da cidade o dispõe como pertencente à Zona de

Adensamento Básico, de acordo com o PDN (NATAL, 2007). É limitado ao

Leste pelo Oceano Atlântico (pela Praia Ponta de Negra), ao norte pelo Par-

que das Dunas (ZPA 2), ao noroeste pelos bairros Capim Macio e Neópolis

e ao Oeste e ao Sul pelo bairro Nova Parnamirim e pelo Centro de Lança-

mento da Barreira do Inferno (CLBI), respectivamente, esses últimos perten-

centes ao território de Parnamirim, como se vê na Figura 4. Dentro de seus

limites, o bairro possui duas ZPAs inscritas: a 05, Associação de Dunas e

Lagoas do Bairro de Ponta Negra (a Lagoinha), e a 06, Morro do Careca e

Dunas associadas. Da mesma forma, também está inscrita em seu território

a AEIS Vila de Ponta Negra24, a qual delimita parte do território ocupado pela

comunidade tradicional homônima. De origem agricultora, a Vila mantém vi-

vas expressões culturais e artísticas de sua história, tais quais o Congo de

Calçolas, a Capoeira e a Renda de Bilro.

A ocupação no território onde hoje fica o bairro tem sua origem in-

certa, dada a sua historiografia escassa e fragmentada, como aponta Silva

(2006), mas há consenso de que ela remonta ao surgimento da comunidade

da Vila de Ponta Negra. Há divergências históricas da origem dessa

24 Segundo Maria Suely Paula da Silva (2006), a comunidade da Vila de Ponta Negra era conhecida como Vila de Pescadores, mas dada a imprecisão dos registros sobre a área recorreremos ao nome oficial da AEIS para nos referirmos à comunidade.

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019

Figura 4 Mapa da localização de Ponta Negra

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comunidade, como apresenta Ângelo Magalhães Silva (2013): enquanto al-

guns autores citam como marco originário o desembarque holandês em 1633

na praia de Ponta Negra após a derrota sofrida na Ponta do Morcego (trecho

da Praia do Meio, no litoral Leste de Natal), outros autores alegam que o

evento não estabeleceu um assentamento ou relação com qualquer comuni-

dade ali presente, tratando-se apenas de um movimento militar. Todavia, se-

gundo o autor, o processo de ocupação começa oficialmente em 1635 de

modo lento (SILVA, 2013). Para a antropóloga Lois Martin Garda,

os moradores do povoado descendiam das primeiras três ou quatro famílias que se estabeleceram no lugar, precedentes da cidade de São José de Mipibu, das localidades de Bonfim, Pirangi e do Município de Nísia Floresta (SILVA, 2006, p. 22).

A comunidade originária era constituída de pescadores que ocupa-

ram inicialmente a beira mar com suas casas cobertas de palha de coqueiro

e, depois de certo tempo, subiram as ocupações para o alto da colina, onde

se fundou o núcleo da Vila (SILVA, 2006). Esse povoado, além da pesca,

fabricava carvão, fazia renda e cultivava roçados de subsistência se esten-

diam das margens do Rio Jiqui até as terras que hoje compõem o CLBI

(SILVA, 2013). Até meados do século XX, os roçados eram cultivados no

período chuvoso e se pescava durante a seca, o que garantia o alimento da

família e o seu sustento através da venda dos excedentes para a aquisição

de produtos necessários à sua reprodução social (SILVA, 2006). Como não

25 Até meados do século XX, a ocupação contínua de Natal se estendia do seu litoral leste até próximo de onde hoje se situa a avenida Bernardo Vieira, no limite do bairro Tirol.

havia estradas conectando a Vila com o centro de Natal, os deslocamentos

que os moradores precisavam realizar para venderem seus peixes e carvão

no comércio da cidade eram feitos a pé ou a cavalo (SILVA, 2013). Como

atividades complementares de renda, havia a extração de frutas e confecção

de renda de bilro, atividades realizadas pelas mulheres da comunidade, que

precisavam caminhar sobre as dunas até chegar às ruas da capital25 (SILVA,

2006, p. 23).

As casas dos moradores, até o início do século XX, se localizavam à

beira mar e nas encostas das dunas (SILVA, 2006, p. 23), onde hoje se si-

tuam as ladeiras que dão acesso à praia e são tomadas por casarões e equi-

pamentos de suporte ao turismo, como se pode ver na Figura 5. Por volta de

1930, a ocupação de casas de taipa passou a se dar no cume da duna, cri-

ando a Rua de Cima, que é atualmente conhecida como Rua Vereador Ma-

noel Coringa de Lemos. Esse padrão de ocupação predominou nessa par-

cela do bairro até a década de 1960, época em que a água de beber era

retirada de um cacimbão na praia e as roupas eram lavadas no Rio Jiqui,

distante 3 quilômetros do núcleo da Vila (SILVA, 2006, p. 24).

Em 1809, o então governador da capitania do Rio Grande do Norte,

José Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque, ordenou a construção

de um fortim e uma capela onde hoje é o território do bairro, ambos teriam a

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intenção de vigiar a aproximação de tropas bonapartistas à costa potiguar

(SILVA, 2013). Entre o final do século XIX e início do século XX, foi construído

e reformado um templo, o qual abrigava as atividades religiosas da comuni-

dade, que já se consolidava em seu entorno. Mas somente em 1923, uma

via para carros e automóveis foi criada conectando a Vila à cidade, a Estrada

de Ponta Negra. A via foi encomendada pelo então presidente da Intendência

Municipal, Coronel Joaquim Ignácio Torres, e reformada em 1936 pelo pre-

feito de Dr. Gentil Ferreira de Souza (SILVA, 2013, p. 79).

Figura 5 Descida da Rua Afonso Magalhães

D

Fonte: Acervo do autor. 2018.

Na comunidade da Vila, como aponta Silva (2006, p. 25-26), a religi-

osidade sempre esteve presente em seus costumes, tradições e festas. Ha-

via, ademais do Natal, da Festa de Reis e da Semana Santa, quatro grandes

festas na comunidade: a de São Sebastião, a de São João Batista (padroeiro

do povoado), a de São José e a do Coração de Jesus. Todas contavam com

a participação de toda a comunidade, assim como as brincadeiras folclóricas

tais quais Boi de Reis, Congo de Calçolas, Pastoril e Bambelô.

Figura 6 Soldados estadunidenses apreciando frutos do mar com moradores locais à praia, em Natal, Brasil

Fonte: Ivan Dmitri. 1943.

Com a nova conexão, o litoral Sul do município passou a ser ocupado

também pelas casas de veraneio das elites natalenses, o que se intensificou

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com a presença dos estadunidenses na cidade, durante a Segunda Guerra

Mundial (SILVA, 2013, p. 79), como ilustramos na Figura 6. Nesse período,

várias famílias abastadas se apossaram de lotes à beira mar para a constru-

ção de suas segundas casas, o que significou a sobreposição de uma nova

lógica de ocupação do espaço sobre o modo como a comunidade se organi-

zava. Entretanto, como aponta Silva,

os antigos moradores não se incomodavam com essas apro-priações na beira da praia, pois suas casas não atrapalhavam a pesca e geralmente, essas famílias, por serem de grande influência na cidade, eram vistas como fonte de empregos e/ou favores (2006, p. 27).

Com a gradual valorização da área, conflitos fundiários despontaram.

Ainda que a presença dessa elite não fosse vista como uma ameaça pela

população às suas atividades no mar, novas investidas contra a sua perma-

nência na terra ocorreram.

Mesmo que desde o século XIX, tivessem acontecido tentativas de

desapropriação das terras ocupadas pela comunidade26, foi em 1955 que

Fernando Pedroza, irmão do então governador do estado, decidiu de forma

bem sucedida expropriar parte das terras, as quais alegavam ser de proprie-

dade de sua família (SILVA, 2013, p. 77). Com a vitória da família Pedroza,

os moradores da Vila perderam suas áreas de cultivo comunal e tiveram de

26 Em 1847, o presidente da província do Rio Grande do Norte, João Carlos Wanderley, expediu um pedido de desapropriação para a área. Porém, em 1856, José Joaquim da Cu-nha, o então presidente da província, tornou sem efeito a lei anterior. Entretanto, em

recorrer à pesca como meio de sobrevivência. Depois de vários anos de luta

jurídica e armada, Silva (2006) relata que 2/3 das terras de Ponta Negra fo-

ram doadas em 1964 para o Ministério da Aeronáutica, onde houve, com fi-

nanciamento da National Aeronautics and Space Administration (NASA), a

construção do CLBI. Com a expropriação das terras, o ciclo produtivo agrí-

cola teve de ser encerrado, porém como aponta Garda, isso não significou

uma mudança geográfica da comunidade:

[...] Este ciclo produtivo foi interrompido em 1964, quando os moradores foram expropriados da terra. Mas, devido a [sic] proximidade da Vila à capital, não foi preciso uma mudança geográfica para recomeçar uma vida baseada agora na venda de sua força de trabalho. [...] Parece provável que as relações de parentesco continuem exercendo importantes papéis na or-ganização social e econômica de qualquer grupo que se man-tenha coeso dentro de um espaço geográfico, apesar de mu-danças nas suas bases econômicas e nas suas relações para com o capital (SILVA, 2006).

A Vila de Ponta Negra cresceu junto com as famílias que a consti-

tuem. Dessa forma, apesar da impossibilidade de continuar com a atividade

agrícola, os seus moradores se mantiveram fixos à terra em função do apoio

familiar que encontravam ali, bem como a participação de vários membros

da família nas atividades econômicas que elas exerciam (SILVA, 2006). As-

sim, com o fim desse ciclo, parte da população passou a utilizar-se de ativi-

dades de apoio aos veranistas e frequentadores da praia como forma de

setembro do mesmo ano, o novo presidente, Antônio Bernardo de Passos, reconheceu no-vamente a desapropriação. Todavia, não há registros de que ela tenha ocorrido (SILVA, 2013).

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renda. Assim, o comércio de alimentos, bebidas e artesanato à beira da praia

de Ponta Negra se intensificou, ao mesmo tempo em que moradores da Vila

trabalhavam na construção das casas das elites e ainda havia a pesca arte-

sanal, mas sem o mesmo destaque.

A década de 1970 foi marcada pela construção dos primeiros con-

juntos habitacionais na área: Ponta Negra e Alagamar, como se vê na Figura

7. Com eles, Natal avançava em direção ao seu litoral sul. Essas obras trou-

xeram consigo uma grande oferta de empregos na área da construção civil,

o que se somou à demanda das casas de veraneio. Com o aumento da oferta

de moradia formal, voltada principalmente para a classe média, também

aconteceu o crescimento da ocupação informal na Vila, sobretudo em função

das oportunidades de trabalho nas obras e na praia.

É também no final desse período que começam as obras da Avenida

Senador Dinarte Mariz, popularmente conhecida como Via Costeira, a qual

conecta a orla sul do município, com a orla central, atravessando o Parque

das Dunas. Propiciada pela Política de Megaprojetos Turísticos, a Via Cos-

teira foi entregue em 1985 e fez com que Ponta Negra se firmasse como

espaço de lazer das classes média e alta, que até então as frequentava mais

intensamente no veraneio, segundo Karina Messias da Silva (2007, p. 46).

Figura 7 Mapa de ocupação do solo de Ponta Negra, em 1970

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GEHAU 2018. 2019

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Na década de 1980, os conjuntos existentes foram sendo ocupados

e foram construídos os novos Natal Sul e Serrambi I, II e III, como podemos

ver na Figura 8. Essa nova ocupação, com seus moradores de classe média,

mudou a paisagem do bairro. Onde havia granjas e espaços com caracterís-

ticas rurais, passaram a existir habitações modernistas traçadas por arquite-

tos, em contraste com as habitações nativas, muito mais modestas. Parale-

lamente, conforme crescia o número de habitantes, modificava-se a compo-

sição das ocupações informais da Vila. Como aponta Silva (2006), nessa

época, 25% dos moradores da Vila eram oriundos de outras localidades e as

fontes de renda se baseavam então nos serviços propiciados pela presença

de banhistas e turistas na praia. Nesse período, a área já tinha um crescente

apelo turístico e se valorizava pela sua paisagem natural exuberante que en-

quadrava o mar e as dunas adjacentes do Morro do Careca27.

Com esse atrativo turístico e ocupação de baixa intensidade, como

vemos na Figura 9, a Vila passou a receber moradores naturais de outros

estados do país. Vindas do Sul e do Sudeste brasileiros, essas pessoas bus-

cavam, nas características de tranquilidade e proximidade com a natureza

propiciadas pela Vila, um lugar para desempenharem suas atividades descri-

tas por Silva como “alternativas” (2006, p. 34), tais como massoterapia e fa-

bricação de produtos caseiros.

27 Inicialmente, o Morro do Careca era conhecido pela comunidade da Vila como Morro do Estrondo, em função dos sons que vinham da sua mata à noite, mas essa nomenclatura caiu em desuso (SILVA, 2013).

Figura 8 Mapa de conjuntos habitacionais e loteamentos no bairro de Ponta Negra

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019.

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Figura 9 Fotografia da Praia de Ponta Negra, na década de 1980

Fonte: Natal como eu te amo! 2015. Disponível em: https://www.facebook.com/NatalComoTeAmo/pho-tos/a.233396100076667/862341653848772/?type=3&theater Acessado em: 08 de outubro de 2019

Ao longo dos anos 1990, a ocupação na área se intensificou e a po-

pulação aumentou. No período, o setor turístico atraía grande atenção para

a área e o seu espaço passou a abrigar serviços voltados a essa demanda.

Hotéis, restaurantes, bares e outros equipamentos de suporte ao turismo se

instalaram no bairro, mudando o perfil predominantemente habitacional do

que até então era ocupado pela Vila e pelos conjuntos. Nessa década, atra-

vés da Lei Municipal nº 4.328, de 5 de abril de 1993 (NATAL, 1993), na ges-

tão do prefeito Aldo Tinoco, o bairro de Ponta Negra foi instituído com os seus

atuais limites.

Nesse mesmo ano, houve a inauguração do trecho inicial da Rota do

Sol, a qual conecta Natal, através do bairro de Ponta Negra, com as praias

do litoral sul metropolitano, sobretudo Pium, Cotovelo e Pirangi do Norte

(SILVA, 2007, p. 99). Com a obra, houve um deslocamento de investimentos

imobiliários para o local, o que propiciou a valorização da terra no seu entorno

e uma ocupação com características diferentes. Nesse contexto também se

iniciou a verticalização do bairro, a qual se concentrou na extensão da ave-

nida Engenheiro Roberto Freire por meio dos hotéis que ali se instalaram.

Também já começavam a despontar alguns condomínios verticais pelo

bairro, porém em áreas mais internas, nos limites próximos a Capim Macio e

ao conjunto Alagamar.

Após a conclusão da Via Costeira e da Rota do Sol, Ponta Negra se

consolidou como espaço de lazer para os natalenses, atraindo perfis sociais

além daqueles que ali se instalavam em segundas residências. As obras de

urbanização da orla realizadas nos anos 2000 foram muito importantes para

isso, pois foram responsáveis por uma série de investimentos para a qualifi-

cação da área para a atividade turística, como aponta Silva (2007, p. 46).

Segundo Maciel e Lima, as barracas, que antes se distribuíam à beira-mar,

foram substituídas por quiosques padronizados de fibra de vidro alojados no

calçadão de 4km construído (2014, p. 135). Em decorrência dessas obras de

infraestrutura, o bairro passou por uma transformação socioespacial que pro-

moveu o aumento da atividade turística, o que acelerou o processo especu-

lativo em Ponta Negra:

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Fora as demais mudanças presenciadas no principal espaço turístico da Cidade, devido às obras de urbanização, feitas pelo Poder Público, a partir dessas obras infra-estruturais a praia de Ponta Negra tornou-se alvo preferencial do capital imobiliário, desencadeando-se sobre tal espaço uma forte es-peculação imobiliária (SILVA, 2007, p. 46).

A partir da notoriedade que o espaço passou a ter, foram instalando-

se pelos arredores da praia atividades associadas com o turismo, tais como

restaurantes, hotéis, bares, agências de viagem, locadoras, etc. Com esses

novos usos, o caráter pacato de bairro residencial foi dividindo espaço com

um entretenimento diurno e noturno pela praia e pelos bares. Esses novos

equipamentos, porém, começaram a localizar-se nos trechos mais próximos

da praia, nas descidas entre a av. eng. Roberto Freire e o mar e nos quartei-

rões dos conjuntos lindeiros à avenida.

A modalidade de turismo de belezas naturais que se pratica em Natal

é baseada no Turismo de Massa, o que se caracteriza, segundo Ruschmann,

“pelo grande volume de pessoas que viajam em grupos ou individualmente

para os mesmos lugares, geralmente nas mesmas épocas do ano” (SILVA,

2007, p. 47). Essa atividade, ainda que sazonal, é responsável por uma ver-

dadeira urbanização turística, a qual transforma espaços de lazer que antes

eram desfrutados pela população residente em espaços de consumo turís-

tico. Essa transformação promove a alta valorização desses espaços, o que

faz aumentar o valor dos produtos ali vendidos, o preço da terra, o valor dos

impostos e o custo de vida, que acabam por substituir a população mais po-

bre por classes mais abastadas, quer seja no uso do espaço para consumo,

quer seja para moradia. O espaço de valor turístico vai se especializando em

atender a um tipo de população e pouco a pouco vai impossibilitando a per-

manência das comunidades nativas, geralmente socialmente vulneráveis, do

seu lugar de origem.

As ações que associam a iniciativa privada com o Poder Público no

sentido de fomentar a especialização dos espaços em espaços turísticos são

promotoras de segregação socioespacial. Ao usar dinheiro público para dotar

de infraestrutura um trecho do tecido urbano, o Estado promove a valorização

dos lotes e edifícios beneficiados, o que aumenta a concentração de capital

nas mãos de seus detentores. Espaços como a orla de Ponta Negra, que

receberam sucessivos investimentos públicos voltados para o turismo, não

apenas fizeram concentrar capital, mas criaram uma área muito valorizada

no tecido urbano voltada para uma atividade sazonal que é volúvel à dinâ-

mica econômica do país e do mundo como um todo. Enquanto a atividade

turística estava em crescente, os terrenos eram vendidos a preços elevados,

entretanto as crises financeiras internacionais frearam esse mercado, o que

acarretou numa retração do mercado imobiliário na região e na retenção dos

lotes e edifícios em busca de melhores condições de lucro nas vendas e in-

vestimentos.

Ao longo dos anos 2000, as atividades turísticas e imobiliárias as-

cenderam até que a crise econômica de 2008 afastou uma parcela de turistas

da área, predominantemente estrangeiros. Apesar da diminuição da

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atividade turística, as atividades imobiliárias marcaram a história do bairro

em 2006 com a tentativa de construção de edifícios verticais próximos ao

Morro do Careca. A população, entretanto, sensibilizada com a ameaça à

paisagem símbolo da cidade, organizou-se no movimento S.O.S Ponta Ne-

gra28. Como ilustramos na Figura 10, o movimento propôs uma série de ações

para provocar a população a respeito das ameaças, uma delas foi um con-

curso de fotomontagens que retratassem como ficaria a paisagem da orla

com as edificações propostas. Ao fim do processo conseguiu-se que o poder

público embargasse as obras e protegesse a população de seu entorno da

elevação do preço da terra, o que as expulsaria conforme aumentassem os

tributos fundiários relativos à sua ocupação.

Ao longo dessa década, a população seguiu aumentando e verifica-

mos uma ocupação mais intensa em relação à década anterior, como se ob-

serva na Figura 11. Ainda assim, há uma parcela do bairro mais esvaziada

ao longo do eixo da Avenida Deputado Antônio Florêncio de Queiroz (Rota

do Sol).

28 Movimento popular criado em 2006 com o objetivo de debater sobre o equilíbrio entre desenvolvimento e qualidade de vida no bairro e na Praia de Ponta Negra, sendo uma de

Figura 10 Fotomontagem representando o impacto visual que espigões trariam à paisagem de Ponta Negra, caso fossem construídos

Fonte: 1 Yunno Silva. 2010. Disponível em: https://sospontanegra.files.wordpress.com/2010/01/alexandrogur-gel.jpg

suas principais bandeiras à época a luta contra os espigões que ameaçam poluir a paisagem da orla e a vista para o Morro do Careca.

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Figura 11 Mapa de ocupação do solo na área de Ponta Negra, em 2007

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019

Já na década de 2010, a produção construtiva do bairro se manteve

estável, muito em função da estagnação do mercado imobiliário. Após a crise

de 2008, o Brasil voltou a entrar em crise em 2013 e isso afetou o surgimento

de novos empreendimentos, ainda que tenham surgidos novos condomínios

ao longo da Rota do Sol, nos limites de Ponta Negra com Parnamirim.

Em 2013, também houve um acontecimento marcante na história re-

cente da orla: o seu enrocamento. Após anos do calçadão da praia sofrer

avarias decorrentes das grandes ondas e do avanço do mar, chegando a cair

em vários trechos em 2012, a contenção da sua estrutura foi reforçada por

meio de um muro de rochas. Apesar da estabilização do passeio, que passou

por obras de reparação e qualificação depois disso, a faixa de areia da praia

vem diminuindo a cada ano que passa. A obra de enrocamento trouxe con-

sigo vários problemas à praia: além da epidemia de ratos, não foram execu-

tados acessos adequados à beira-mar e por muito tempo, para se chegar à

faixa de areia, tinha-se de descer por escadas improvisadas por sacos de

areia sobre rochas, que depois foram substituídos por escadas de madeira

de baixa resistência, como vemos na Figura 12.

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Figura 12 Escada de acesso à faixa de areia sobre o enrocamento da Praia de Ponta Negra

Fonte: Paulo Correia. 2015. Disponível em: https://www.natal.rn.gov.br/noticia/ntc-20993.html. Acessado em 23 de setembro de 2019.

O avanço do mar e a escolha pela reparação das avarias por meio

do enrocamento acabaram por afetar negativamente a dinâmica turística na

praia, o que fez com que o espaço fosse perdendo turistas. Além do turismo,

a pesca tradicional realizada pelos moradores da Vila de Ponta Negra tam-

bém foi muito prejudicada pelas obras, que não foram executadas de modo

a contemplar a atividade. Com o avanço da maré, as embarcações eram jo-

gadas contra as rochas e sofriam danos, o que fez com que os barcos, que

antes ocupavam uma extensão maior da faixa de areia, passassem a ficar

restritos a um trecho mais reduzido e que diminui com o avanço do mar sobre

o continente, como vemos na Figura 13. Dessa forma, a região como um todo

vem perdendo com a diminuição da atividade turística, mas é a população da

Vila, que sobrevive de modo mais intenso dos trabalhos formais e informais

propiciados pelo turismo e pela pesca, que mais tem sido prejudicada.

Figura 13 Embarcações na Praia de Ponta Negra

Fonte: Assessoria do Ministério Público. Disponível em: http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noti-cia/2013/12/enrocamento-da-praia-de-ponta-negra-em-natal-ameaca-atividade-pesqueira.html .Acessado em 23

de setembro de 2019

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3.2. CONFLITOS SOCIOESPACIAIS E A ÁREA

DE GRANDE CONCENTRAÇÃO DAS CAMA-

DAS DE ALTA RENDA

Apesar de sua origem remontar a um assentamento de pescadores

afastado do núcleo urbano da cidade de Natal, ao longo do processo de evo-

lução de sua ocupação, o bairro se tornou uma das áreas de maior importân-

cia para a economia local através da exploração turística de sua paisagem.

Conforme a terra foi se valorizando, como produto desse processo de trans-

formação, as tensões e conflitos despontaram. Inicialmente, houve a expro-

priação direta dos terrenos agricultáveis da Vila de Ponta Negra e, atual-

mente, a comunidade sofre com o aumento do valor dos tributos e do custo

de viver na localidade. À medida que a localização se valorizou, o preço da

terra subiu e restringiu a sua ocupação a uma parcela específica da socie-

dade, que pode pagar esse preço e que quer usufruir das particularidades do

lugar.

Entretanto, isso não aconteceu de forma homogênea. Há trechos do

bairro em que a terra se valorizou menos, assim como há trechos em que a

resistência da população em abrir mão de ocupar a terra em que seus ante-

passados viveram amenizou os efeitos do avanço do setor imobiliário sobre

a comunidade. A Vila de Ponta Negra conseguiu resistir à expulsão especu-

lativa e travou disputas para garantir o registro de suas especificidades como

Área Especial de Interesse Social (AEIS). Ainda que a AEIS tenha uma

extensão menor que a comunidade original, esse instrumento conseguiu ga-

rantir em partes a permanência dessas pessoas.

Entretanto, a Vila desponta dentro do bairro como um espaço excep-

cional. Alijados da infraestrutura urbana que beneficia as demais localidades

de Ponta Negra, seus moradores sofrem com a ausência de equipamentos

públicos que aplaquem suas necessidades. Enquanto a renda média do

bairro é de 3,03 salários mínimos per capita (SEMURB, 2018), predomina em

seu perímetro, tendo como parâmetro a sua caracterização como AEIS, a

renda de 3 salários mínimos por núcleo familiar.

Além dos aspectos de renda, também há especificidades em relação

aos aspectos ambientais no bairro, o que gera conflitos entre a ocupação

antropizada e essas áreas. Desde invasões às ZPAs por parte de condomí-

nios fechados à poluição de suas bordas, a interação entre as áreas ocupa-

das pela população e essas zonas é problemática. Em função das ZPAs não

serem conectadas entre si e outros fatores, muitos animais que precisam re-

alizar suas rotas migratórias ou que saem em busca de alimento acabam por

entrar nas edificações perimetrais, o que coloca a sua integridade e, conse-

quentemente, a biodiversidade de seus ecossistemas em risco.

Ademais dessas particularidades, Ponta Negra está numa parcela da

cidade que atribui especificidades à sua dinâmica: o eixo de expansão do

mercado imobiliário. Mesmo em relação a outras áreas da cidade com as

mesmas prescrições urbanísticas, há áreas do tecido urbano que concentram

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as moradias e postos de trabalho da parcela mais rica da sociedade. Nessas

áreas, o preço da terra é elevado em função não apenas da oferta de infra-

estrutura, mas de relações entre as camadas sociais que compõem essa elite

e seus interesses particulares.

Essas áreas compõem uma região do tecido urbano denominada por

Villaça (2011) como Área de Grande Concentração das Camadas de Alta

Renda (AGCCAR). Tratam-se de trechos da cidade onde há maior presença

de segregação urbana, ou seja, onde as elites locais ocupam de forma mais

homogênea o território não apenas com suas residências, mas com a oferta

de empregos terciários, que atendem à população residente na dupla função

de postos de trabalho e lugar de consumo (VILLAÇA, 2011). Não se trata de

um bairro específico, mas de uma verdadeira parcela da cidade em que es-

sas configurações se verificam. Do mesmo modo que se concentram as pes-

soas mais ricas em um lugar, o espaço em que elas se inserem é modificado

num processo que se retroalimenta de produzir um espaço que reflete essa

realidade social e atrair essas pessoas para um espaço que atenda aos seus

interesses. Desse modo, podemos ver nessa área da cidade, como ilustram

a Figura 14 e a Figura 15, um processo muito marcante na paisagem nata-

lense: a verticalização.

Figura 14 Paisagem de Ponta Negra nos anos 1980

Fonte: Blog Cidades em Postais. 2012. Disponível em: http://cidadesempostais.blogspot.com/2012/09/050-natal-rn-dec-de-1980.html?q=Natal Acessado em: 27 de set. de 2019

Figura 15 Paisagem de Ponta Negra em 2016

Fonte: DJI Phantom 3. 2016. Disponível em: shorturl.at/gCDKZ. Acessado em: 27 de set. de 2019

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A verticalização é um produto tanto da demanda dos agentes produ-

tores do espaço29 (construtores, proprietários de terras e promotores imobili-

ários) quanto do quadro normativo urbanístico. O primeiro aspecto diz res-

peito à lógica de produção do espaço, que reflete o que foi abordado no

nosso primeiro capítulo: a acumulação de mais-valia como objetivo. A produ-

ção construtiva no Brasil tem um duplo caráter, ao passo que é regida pelo

lucro, tem a tarefa de produzir as bases materiais para o atendimento aos

direitos da população. A moradia é um direito ao mesmo tempo que é um

produto. Para coordenar esses dois objetivos conflitantes é que existe a me-

diação do estado através da legislação urbanística. Desse modo, o segundo

aspecto que possibilita a verticalização – e toda a forma de ocupação regular

do espaço urbano – é a permissividade dos parâmetros urbanísticos para tal.

Portanto, há uma responsabilidade do Poder Público municipal tanto nos efei-

tos como nas causas desse processo, que vem promovendo na cidade a re-

tenção especulativa de lotes para que se valorizem, criando e mantendo va-

zios urbanos em seu território.

Villaça (2011), ao caracterizar a AGCCAR do município de São

Paulo, lançou mão de uma série de dados sobrepostos para definir a mancha

que especializa esse conceito. Como variáveis, ele selecionou alguns dados

que caracterizam essa parcela da população, tais como a sua renda

29 Agentes produtores do espaço são os proprietários dos meios de produção, os proprietá-rios fundiários, os promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais excluídos, como classifica Roberto Lobato Corrêa (1989)

domiciliar média, distritos com sua população sendo composta por no má-

ximo 10% de negros, Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), número de

óbitos por homicídio a cada 100 mil habitantes e outros (VILLAÇA, 2011). O

rol de dados utilizados pelo autor, entretanto, não são todos passíveis de

extração a partir da realidade local de Ponta Negra com os dados secundá-

rios que temos à disposição ou o tempo destinado a este trabalho para ma-

nipulação dos dados primários que tragam essas informações. Entretanto,

há alguns dados disponíveis que podem também caracterizar a distribuição

dessas elites no território do município a partir de informações sociais de sua

constituição de raça e renda e a partir do padrão de ocupação do solo que

realizam. Dessa forma, analisaremos a distribuição da população predomi-

nantemente branca e da população com rendimentos familiares acima do que

se caracteriza como classe média, ambas em relação aos setores censitá-

rios, assim como destacaremos as porções do município com maior número

de edifícios verticais.

A distribuição racial dos habitantes da cidade, como vemos na Figura

16, quando sobreposta à divisão administrativa, faz destacar que há uma

grande concentração de pretos, pardos e brancos coabitando o território das

RAs Norte e Oeste, ou seja, há uma diversidade étnica e racial nessa parcela.

Não obstante, nas regiões Leste e Sul, há uma grande concentração de

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habitantes brancos, verificando-se diversidade apenas nos pontos mais dis-

tantes dos principais eixos viários, nas periferias.

Figura 16 Mapa racial de habitantes de Natal

Fonte: Patadata. 2015. Disponível em: http://patadata.org/maparacial/ Acessado em: 25 de set. de 2019. Adap-tado pelo autor. 2019.

A distribuição das rendas familiares médias mensais no município de

Natal, de forma análoga, também segue essa divisão entre regiões adminis-

trativas. A renda média é de 1,78 salários mínimos por família e são as regi-

ões Norte e Oeste que concentram o maior número de bairros com médias

de rendimento abaixo da média do município, como podemos ver na Figura

17.

A concentração de edificações acima de 4 pavimentos, como obser-

vamos na Figura 18, por sua vez, se distribui nas mesmas RAs Leste e Sul,

sobretudo nos limites dos bairros caracterizados pela concentração das mai-

ores médias salariais. Uma observação importante é que essas áreas verti-

calizadas não se inserem apenas na ZAd, mas também se apresentam pela

ZAB, em função das prescrições urbanísticas dessa zona permitirem atual-

mente construções com até 65,00 metros de gabarito, mas utilizando até o

coeficiente de aproveitamento básico, que é de 1,2, de acordo com o atual

PDN (NATAL, 2007), mas que já foi de 1,8 no plano anterior (NATAL, 1994).

Dessa forma, podemos concluir que o bairro de Ponta Negra de fato

se insere numa porção da cidade caracterizada pelo agrupamento das elites

de Natal. Sua população, branca e rica, imprime sobre o solo urbano suas

características habitacionais marcadas pela verticalização associada a uma

baixa densidade populacional. A AGCCAR de Natal se estende por duas re-

giões administrativas, a sul e a leste, e se apresenta como um espaço quase

isolado das demais região, não do ponto de vista geográfico, mas do ponto

de vista socioespacial.

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Figura 17 Mapa de distribuição da renda domiciliar média por bairro em Natal

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007 e 2019, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019

Figura 18 Mapa de edificações com mais de 4 pavimentos em Natal

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019.

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3.3. A LEGISLAÇÃO URBANÍSTICA INCI-

DENTE

O bairro de Ponta Negra possui uma parte de seu território inserida,

de acordo com a legislação municipal, na Zona de Adensamento Básico e

outras partes destacadas como Zonas de Proteção Ambiental, a 5, Lagoinha,

e a 6, Morro do Careca e dunas fixas contínuas. Além dessas definições do

macrozoneamento, como mostra a Figura 19, incidem sobre o bairro algumas

áreas especiais: a AEIS da Vila de Ponta Negra e a Zona Especial de Inte-

resse Turístico 1, esta com um trecho destacado como de área non aedifi-

candi. Sobre esse território também incidem dois instrumentos urbanísticos:

o plano setorial (que, enquanto não houver sua regulamentação, proíbe so-

bre as áreas dos conjuntos Ponta Negra e Alagamar construções acima de 4

pavimentos e operações de remembramento) e a Operação Urbana Consor-

ciada (OUC) de Ponta Negra, que abrangem todo o bairro. Em nível estadual,

há uma proposta de criação de Unidade de Conservação que abarca o perí-

metro em que se insere a ZPA 6 e que será detalhada posteriormente. Já no

nível federal, há o estabelecimento de Áreas de Preservação Permanente

(APPs), as quais se sobrepõem parcialmente às ZPAs 5 e 6.

Figura 19 Mapa das legislações incidentes no bairro de Ponta Negra

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019

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A maior parcela do bairro se insere na ZAB, como observamos ante-

riormente na Figura 4. Essa zona é caracterizada pela concessão de sua

ocupação limitada em função da infraestrutura urbana instalada de esgota-

mento sanitário, mobilidade, equipamentos públicos etc. não estar atendendo

a toda a extensão do território ou fazê-lo de modo a não comportar maiores

adensamentos populacionais, por isso, seus parâmetros urbanísticos são

mais restritos do que aqueles previstos à ZAd. Dessa maneira, em Ponta

Negra, o coeficiente de aproveitamento máximo possível de ser utilizado é

igual a 1,2 e há uma restrição de gabarito, de 65,00 metros. As demais pres-

crições são comuns às duas zonas citadas: a taxa de ocupação máxima e a

taxa de impermeabilização máxima são ambas iguais a 80%.

A ZPA 5 - Ecossistema de dunas fixas e lagoas do bairro de Ponta

Negra é conhecida pela alcunha de Lagoinha e localiza-se próximo aos limi-

tes de Ponta Negra com os bairros de Capim Macio e Neópolis e o município

de Parnamirim, como observamos na Figura 20. Trata-se de uma ZPA já re-

gulamentada pela Lei Municipal n° 5.565, de 21 de junho de 2004 (SEMURB,

2008). Em sua regulamentação, são instituídas 4 subzonas: Subzona de Pre-

servação (SZ1), Subzona de Conservação (SZ2), Subzona que compreende

o tabuleiro costeiro intercalado por cordões de dunas isolados (SZ3) e a

Subzona que compreende o tabuleiro costeiro (SZ4). Na SZ1, são proibidas

ocupações, movimentações de terra, com exceção para obras de

30 O Monumento Natural do Morro do Careca é uma Unidade de Conservação

constituída em julho de 2011 pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONEMA),

infraestrutura, e uso, com exceção para pesquisa científica e programas de

educação ambiental. Na SZ2 são permitidos usos para chácaras, sítios, casa

de repouso e similares. Na SZ3, são permitidos todos os usos, mas com exi-

gências de medidas de compensação para novos parcelamentos e constru-

ções. Na SZ4, todas as prescrições são similares às da Zona de Adensa-

mento Básico.

A ZPA 6 – Morro do Careca e dunas fixas contínuas compreende

uma parcela desse conjunto dunar inserido no território de Natal, como ve-

mos na Figura 21.Trata-se de uma zona do macrozoneamento municipal

ainda não regulamentada e que se sobrepõe à unidade de conservação Mo-

numento Natural do Morro do Careca30. Em função de sua não regulamenta-

ção e sua composição por dunas, não são permitidas ocupações em sua ex-

tensão. Esse conjunto tem uma grande importância ambiental e paisagística

para o município. Trata-se de uma área com vegetação nativa de fixação de

dunas que é a paisagem símbolo da cidade. A sua preservação física e cê-

nica é apontada por um laudo pericial elaborado por representantes da UFRN

acerca das propostas de regulamentação da ZPA (FERNANDES,

CESTARO, et al., 2011). Parte desse conjunto também é protegido pela uni-

dade de conservação inserida no município de Parnamirim.

aguardando desde então a sua aprovação pela chefia do poder executivo estadual

(FERNANDES, CESTARO, et al., 2011).

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Figura 20 Mapa de localização e zoneamento da ZPA 05

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019.

Figura 21 Mapa das ZPA 06 e Unidade de Conservação Morro do Careca

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019.

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A AEIS da Vila de Ponta Negra está localizada entre a ZPA 6 e o

conjunto Alagamar, como podemos ver na Figura 22. Foi caracterizada como

AEIS pelo PDN desde a sua revisão em 1994, tendo seus limites estabeleci-

dos na revisão de 2007, porém a área segue aguardando a sua regulamen-

tação específica. Enquanto isso não acontece, em seu perímetro são proibi-

das ações de remembramento, desmembramento ou construções com altura

superior a 7,50 metros (NATAL, 2007).

A Zona Especial de Interesse Turístico (ZET) 1, como observamos

na Figura 23, foi criada pelo PDN 84, mas regulamentada apenas 3 anos

depois, através da Lei nº 3.607, de 18 de Novembro de 1987 (NATAL, 1987).

A lei estabelece que os lotes devem ter: área mínima de 360m²; densidade

líquida de 122 hab./ha; coeficientes de aproveitamento31 que variam entre

1,0 e 1,2 e taxas de ocupação que variam entre 50% e 60%, a depender do

seu uso; recuos frontais, laterais e de fundos com 5,00, 1,50 e 3,00 metros,

respectivamente (NATAL, 1987). Todavia, dentro do perímetro da ZET 1, há

9 quadras delimitadas como sendo Áreas Non Aedificandi (ANEs). Essas

ANEs foram estabelecidas pelo Decreto nº 2.236, de 19 de julho de 1979

(NATAL, 1979), o qual estabelece que esses terrenos não são passíveis de

construção, ficando o Procurador Geral do Município autorizado a desapro-

priá-los (NATAL, 1979).

31 Nos termos do documento, a prescrição é tratada como um índice urbanístico de “utiliza-ção” (NATAL, 1987), entretanto, adequamos a sua nomenclatura ao texto a fim de facilitar a sua compreensão e tendo em vista que não há perda conceituação na alteração.

Figura 22 Mapa de Localização da AEIS Vila de Ponta Negra

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019.

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Figura 23 Mapa de localização da ZET 1

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019.

Todo o bairro de Ponta Negra está inserido na mancha definida pelo

PDN 2007 como passível de receber uma Operação Urbana Consorciada

(OUC) (NATAL, 2007). Esse instrumento permite que sejam executados pro-

jetos urbanos coordenados pelo Poder Público em parceria com a iniciativa

privada, alterando parâmetros urbanísticos de coeficientes, regras de uso,

ocupação e parcelamento do solo. Para tanto, deve ser estabelecida uma lei

específica e as decisões sobre o projeto devem ser discutidas e aprovadas

em audiências públicas. Entretanto, esse instrumento não foi implementado

para essa área.

Assim como as OUCs, Planos Setoriais são instrumentos urbanísti-

cos previstos no PDN, mas que não foram executados. Os Planos têm como

objetivo detalhar o ordenamento do uso e ocupação do solo em uma ou mais

unidades territoriais contíguas, a depender de sua complexidade, com vistas

a otimizar o cumprimento da função socioambiental da propriedade e com-

patibilizar o seu adensamento à infraestrutura urbana (NATAL, 2007). De

acordo com os artigos 118 e 119 do PDN, deveria ter sido regulamentado um

plano setorial para Ponta Negra no prazo de 12 meses a contar da publicação

do plano diretor, o que não aconteceu. Todavia, enquanto não for regula-

mento, os conjuntos Ponta Negra e Alagamar têm seus gabaritos limitados a

quatro pavimentos. Se tivessem sido implementados, ambos os instrumentos

poderiam ser usados para promover mudanças que supram as carências do

bairro e mitiguem as consequências da retenção especulativa em seu territó-

rio em função da valorização sofrida pela vocação turística do lugar.

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85

4. OS VAZIOS URBANOS DE PONTA

NEGRA

Neste capítulo abordamos o processo de identificação dos vazios ur-

banos da categoria de lotes não edificados e sem uso inscritos no bairro de

Ponta Negra, bem como a sua análise tipológica. Para tanto, foram coleta-

dos, inicialmente, dados secundários relativos às bases cartográficas do re-

gistro de lotes junto à SEMURB e informações relativas ao uso e ocupação

desses imóveis. Também buscamos bases cartográficas junto ao IDEMA de

forma a criarmos mapas-base preliminares do bairro.

Com os lotes mapeados, demos sequência às análises através do

cruzamento dos dados de georreferenciamento com os de ocupação do solo,

destacando os imóveis cujos registros oficiais de 2017 apontavam como pos-

suindo área construída igual a 0. Paralelamente, foram identificadas áreas

cuja ocupação não é permitida, tais como ZPAs não regulamentadas, subzo-

nas de conservação de ZPAs, Áreas Non Aedificandi e APPs. Sobrepostas

essas duas áreas, obtivemos o recorte espacial final a ser analisado. A partir

de então, os dados referentes à ociosidade dos lotes foram confrontados com

imagens de satélite datadas de 2018 para atestar seu estado de vazio e ca-

racterizá-los como lotes não edificados e sem uso.

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Em seguida, tendo como base Philippe Panerai, desencadeamos

uma análise tipológica executada em 4 etapas: a definição da abrangência,

a classificação prévia, a elaboração dos tipos e a tipologia (2006, p. 127).

Dessa forma, obtivemos os agrupamentos a serem trabalhados na etapa se-

guinte, a de proposição.

4.1. IDENTIFICAÇÃO DOS VAZIOS

À luz das indicações de Panerai (2006), para que possamos realizar

uma análise tipológica, é necessário recorrer a um processo em 4 etapas e

este item dedica-se à primeira fase do processo, em que destacaremos os

objetos a serem analisados nas etapas posteriores. Dessa forma, nosso tra-

balho analítico teve início com a definição geográfica do perímetro investiga-

tivo e com a sistematização de informações de ocupação do solo que carac-

terizam o lote como não edificado.

A definição da abrangência do estudo, para Panerai, “está vinculada

às questões que se pretende responder” (2006, p. 128), havendo dois aspec-

tos que intervêm nesse processo: a escolha dos níveis de leitura e a deter-

minação da área de estudo. A nossa questão de pesquisa, como apontamos

na introdução do trabalho, é “Quais diretrizes devem ser seguidas para que

os lotes não edificados e sem uso do bairro de Ponta Negra que se consti-

tuem como vazios urbanos passem a cumprir uma função social?”. Desse

32 Em sua obra, o termo utilizado por Philippe Panerai é “zona de estudo” (2006, p. 131), entretanto a fim de não confundir com as zonas estabelecidas pelo macrozoneamento do

modo, o nível de análise é definido como sendo o nível de leitura do tecido

urbano em que os objetos em estudo se encontram. Logo, o nível estabele-

cido é o dos lotes não edificados e sem uso, objetos que serão comparados

e classificados ao longo da análise tipológica.

A definição da área32 de estudo “depende da problemática colocada

e dos meios disponíveis (tempo, recursos humanos)” (PANERAI, 2006, p.

131). Logo, em função do apontamento de trabalhar com os vazios urbanos

não edificados e sem utilização, destacamos que, dentro do universo do

bairro de Ponta Negra, trabalharíamos excetuando as áreas onde a ocupa-

ção não é permitida, conforme detalhamos no capítulo 2 deste trabalho.

Dessa maneira, foram excluídas da análise as áreas referentes à ZPA 06 –

que não está regulamentada –, à Unidade de Conservação do Morro do Ca-

reca – que apesar de não estar criada é uma área militar, onde não é permi-

tida a ocupação –, às áreas da subzona 1 da ZPA 05, nas ANEs e na APPs

identificadas no bairro. Portanto, ao final dessa redefinição da abrangência

da análise, obtivemos uma delimitação da área de estudo, como podemos

ver na Figura 24.

plano diretor de Natal, utilizamos o termo “área” por entendermos que não há prejuízo à compreensão do conceito.

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Figura 24 Mapa de delimitação da área de estudo

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019.

Dessa forma, paralelamente à delimitação das áreas passíveis de

ocupação, nos debruçamos sobre o material solicitado à SEMURB que diz

respeito às informações dos lotes do bairro de Ponta Negra. Dado o processo

de revisão do Plano Diretor de Natal, a secretaria atualizou parte de seus

dados cadastrais com informações relativas ao uso e ocupação do solo dos

imóveis da cidade junto ao banco de dados da Secretaria Municipal de Tri-

butação (SEMUT) de 2017. Os dados obtidos referentes a 2007 e 2017 foram

entregues em arquivos do formato *.shapefile e foram manipulados através

do software de sistema de georreferenciamento ArcGIS. Dentro do conjunto

de atributos dos lotes de Ponta Negra, havia o registro da área construída

cadastrada para cada lote, como ilustramos na Figura 25. Todavia, algumas

explicações precisam ser dadas quanto à essas informações. A primeira é

quanto à imprecisão dos dados, pois o método de coleta dessas informações

é variável e há mudanças informais no parcelamento dos lotes que não são

levadas em consideração quando são atribuídas as áreas construídas a cada

parcela do solo urbano, sendo o cadastro oficial o balizador. A segunda con-

sideração é que os lotes inscritos com área construída igual a 0 também

abarcam os lotes em que não há informações cadastradas, logo podem ser

sinalizados como não edificados lotes que possuam construções irregulares

ou ainda não cadastradas no momento da obtenção dos dados.

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Figura 25 Tabela de atributos dos lotes inseridos na área de estudo

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2017. 2019.

A seleção de quais lotes seriam considerados na análise foi feita

através da sobreposição do shapefile da área de estudo com o shapefile com

todos os lotes de Natal fornecido pela SEMURB. Feita a sobreposição, iden-

tificamos que havia lotes apenas parcialmente contidos dentro da área de

estudo. Entendemos que, a fim de estabelecer uma análise mais isonômica,

deveríamos descartar esses lotes, mantendo apenas os lotes que estão in-

tegralmente contidos na área de estudo. Logo, ao fazermos essa seleção

espacial, que pode ser observada na Figura 26, destacamos os lotes dese-

jados em um novo shapefile e iniciamos uma etapa de avaliação dos atributos

associados à cada lote.

Figura 26 Mapa de lotes completamente inseridos na área de estudo

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015. 2019.

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Ao iniciarmos essa avaliação, identificamos que havia uma série de

procedimentos a serem feitos de modo a preparar o arquivo para receber as

informações relativas à ociosidade do lote. Um aspecto importante é que

cada lote deveria estar associado a um único feature, isto é, não poderia

haver sobreposições de polígonos idênticos33. Assim, entendemos que, para

o objetivo da nossa investigação, não haveria prejuízo em remover as dupli-

catas sob nenhum aspecto, visto que as informações que poderiam ser úteis

sobre cada lote eram referentes às suas respectivas áreas construídas totais.

Para realizar a identificação dos vazios de forma coerente com os

conceitos que embasaram a sua definição e os instrumentos urbanísticos so-

bre eles incidentes, definimos como passíveis de caracterização os lotes não

edificados e sem uso que assim estivessem em 201934. Da mesma forma,

criamos uma coluna para extração de área automática dos features trabalha-

dos35. Sendo assim, observamos que as áreas dos vazios levadas em conta

33 Ao manipular os dados, observamos que cada polígono continha informações referentes a uma unidade habitacional (UH), além de haver duplicatas esporádicas. Portanto, se fez necessário reduzir esse volume de informação repetida, de modo que cada lote estivesse representado por apenas um polígono, sem sobreposições. Identificamos, assim, que havia um campo relativo à matrícula dos lotes, o que facilitava a acusação de duplicatas, assim como cada matrícula continha a informação da área construtiva relativa à UH e da área construída total do terreno. Com uma operação de deletar os valores idênticos, a partir do campo “ID_lote”, reduzimos o número de features totais de 16.479 para 6.274. 34 Para fazer essa caracterização, inserimos uma coluna de preenchimento manual referente ao estado de não edificação de cada lote para o ano de 2019, a qual para ser preenchida deveria receber o texto de “s” ou de “s av”, o que neste último caso identificava os vazios referentes às áreas verdes não qualificadas.

para este estudo podem diferir das áreas registradas pela SEMURB para es-

ses lotes.

Ao final dessa avaliação, observamos que, para identificar de forma

adequada os lotes não edificados e sem uso, precisaríamos das seguintes

informações: 1) base georreferenciada dos lotes de estudo, de acordo com o

cadastro imobiliário junto ao órgão municipal de planejamento urbano; 2)

identificação individual do polígono correspondente a cada lote para sua di-

ferenciação; 3) situação de vazio no ano de referência, no nosso caso, em

2019. A partir do tratamento dos dois primeiros pontos, passamos à terceira

etapa.

Para que pudéssemos verificar a situação de vazio dos lotes em

2019, recorremos às imagens de satélite disponibilizadas pelo Google Earth.

Uma vez que a área de estudo é muito extensa e tendo em vista que há

muitos lotes cercados e mesmo murados, ainda que vazios, essa alternativa

se mostrou a mais viável para essa análise. Para tanto, extraímos um

35 Ao manipularmos as informações dos atributos percebemos que as áreas totais de cada lote não eram informações geradas automaticamente a partir das geometrias dos polígonos, mas inseridas manualmente de acordo com o cadastro imobiliário. Uma vez que a área dos lotes será uma informação importante a ser considerada para a análise desses vazios, en-tendemos que ela deveria ser obtida de forma automática, entretanto, optamos por fazê-lo em uma coluna separada, mantendo uma coluna gerada automaticamente e uma com infor-mações inseridas manualmente a fim de compararmos o somatório dessas áreas para en-tendermos a grandeza de sua diferença. Assim, com base nos dados inseridos pela SE-MURB, o somatório da área dos lotes passíveis de uso e ocupação era de 6.557.009,40 m², mas os dados que verificamos resultavam em 4.567.891,84 m².

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conjunto de oito imagens de 2019 com resolução de 4k da área de estudo,

as georreferenciamos no software ArcGIS e montamos um mosaico relativo

à nossa delimitação espacial, como observamos na Figura 29. Feito isso,

sobrepusemos a ele os lotes de estudo e um a um iniciamos a verificação da

situação de vazio.

Ao identificarmos que o lote estava sem edificação, selecionamos os

polígonos referentes aos lotes e marcamos na coluna criada para vazios, em

sua tabela de atributos, a situação de ociosidade. Assim fizemos até que to-

dos os lotes fossem verificados.

Com essa verificação, demarcamos todos os lotes que não apresen-

tavam construções além de eventuais cercamentos, independentemente de

serem públicos ou privados, observando e excluindo da análise os lotes que

apresentavam sinais de uso, tais como estacionamentos rotativos. Nesse

processo, observamos que havia lotes vazios com veículos estacionados,

mas que não estavam caracterizados como estacionamentos rotativos

quando vistos a partir das imagens do Google Street View, logo eles foram

inclusos na análise. Também identificamos dentre os lotes não edificados al-

gumas áreas públicas classificadas como áreas verdes e praças pela SE-

MURB, mas que não estavam dotadas de infraestrutura de suporte a esses

usos e, portanto, também foram inclusas na análise. Lagoas de captação e

36 A área do bairro de Ponta Negra corresponde a 13.820.322,36 m², de acordo com os dados fornecidos pela SEMURB.

praças estruturadas, ainda que apresentassem pouco uso ou tivessem sinais

de abandono, não foram inclusas, pois não tínhamos elementos para atestar

se o uso estava acontecendo de forma plena, mas que, aparentemente a sua

não utilização se dava por razões alheias ao espaço físico, como a escassez

de chuvas ou a localização das praças. Desse modo, como observamos na

Figura 30, esses são os 794 lotes que serão trabalhados dentre os 6274 to-

tais da área de estudo, como mostra a Figura 27. Eles somam uma área de,

aproximadamente, 1.128.847,53 m², como é possível ver na Figura 28, o que

corresponde a 8,17% da área total do bairro36, 18,47% da área total dos lotes

de Ponta Negra37 e a 24,71% dos 4.567.891,84 m² das áreas totais dos lotes

passíveis de ocupação em Ponta Negra.

Figura 27 Gráfico da relação entre o número de lotes vazios e os demais na área de estudo

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

37 O somatório das áreas dos lotes do bairro de Ponta Negra corresponde a 6.110.327,58 m², de acordo com os dados fornecidos pela SEMURB.

794; 12,66%

5480; 87,34%

LOTES NA ÁREA DE ESTUDO

Lotes não edificados e sem uso

Demais lotes

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Figura 28 Gráfico da relação entre a área dos lotes vazios e a dos demais na área de estudo

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Como se vê na Figura 30, na área ocupada pelo conjunto Ponta Ne-

gra, há poucos vazios, o que é compatível com o processo de instalação do

conjunto, que foi entregue com todas as suas UHs prontas. Assim, verifica-

mos uma concentração de grandes glebas nas proximidades da ZPA 05 com

uma característica de contiguidade desses vazios, o que mostra que se trata

de uma área sobre a qual não houve grandes avanços do mercado imobiliá-

rio. Por fim, identificamos que sobre a ZET 1 e sobre a AEIS Vila de Ponta

Negra há um grande número de lotes vazios com áreas menores, mas dis-

persos pelo território.

Figura 29 Mapa do mosaico de imagens georreferenciadas da área de estudo, em 2019

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

1.128.847,53m²; 24,71%

3.439.044,31m²; 75,29%

ÁREA DOS LOTES NA ÁREA DE ESTUDO

Lotes não edificados e sem uso

Demais lotes

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Figura 30 Mapa dos lotes não edificados e sem uso a serem analisados

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

4.2. ANÁLISE TIPOLÓGICA

A partir da identificação dos lotes não edificados e sem uso inseridos

em áreas passíveis de ocupação e uso no bairro de Ponta Negra, demos

início à sua categorização e elaboração de tipos. Para tanto, seguindo as

indicações de Panerai (2006), precisamos estabelecer uma classificação pré-

via a partir dos dados que caracterizam cada lote para que então desenvol-

vêssemos os tipos e a tipologia, isto é, o conjunto dos tipos e suas relações.

Esse processo deve levar em conta as condicionantes legislativas,

que revelam relações próprias entre a função social da propriedade e as ca-

racterísticas da ocupação do solo e da dinâmica socioespacial desses luga-

res. Ademais disso, as dimensões devem ser consideradas a fim de que se

possa diferenciar as áreas passíveis de aplicação de determinados instru-

mentos urbanísticos e áreas que não são por eles alcançados. Dessa ma-

neira, a partir o cruzamento das variáveis, chegamos às famílias, as quais,

após serem analisadas foram sendo agrupadas a partir de suas semelhanças

e tendo em vista a natureza das diretrizes que seriam propostas, gerando os

tipos definitivos a serem considerados.

4.2.1. Classificação prévia

A fim de iniciarmos essa etapa, precisamos definir quais seriam as

variáveis relevantes para a caracterização dos vazios com vistas ao estabe-

lecimento de diretrizes para o cumprimento de sua função socioambiental.

Logo, avaliamos quais seriam os mecanismos a serem utilizados para tanto

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e entendemos que, para um estudo com essa abrangência, seriam utilizados

os instrumentos urbanísticos previstos pelo Estatuto da Cidade, uma vez que

o processo de revisão do Plano Diretor de Natal está em curso e essa poderia

ser uma contribuição para o planejamento urbano da cidade.

Desse modo, a partir de reflexões sobre os instrumentos de forma

geral, a legislação urbanística incidente no território do bairro de Ponta Negra

e a relação existente entre os vazios urbanos e as localizações, entendemos

que seria importante considerar a inserção dos lotes nas áreas especiais e

no macrozoneamento e a função das áreas verdes. Assim, sendo essa a pri-

meira variável considerada, destacamos os lotes em 5 diferentes localidades:

1- nas subzonas de conservação e uso restrito da ZPA 05, onde a ocupação

é permitida; 2- os lotes na Zona de Adensamento Básico (ZAB) que não es-

tão inseridos em áreas especiais ou têm restrições de prescrições em função

de outros instrumentos urbanísticos; 3- na Área Especial de Controle de Ga-

barito (AECG), que abarca a Zona Especial de Interesse Turístico 1 (ZET 1);

4- a Área Especial de Interesse Social (AEIS) Vila de Ponta Negra; 5- a área

dos conjuntos Ponta Negra e Alagamar, sobre os quais incide uma restri-

ção de gabarito; e 6- as áreas verdes não qualificadas, independentemente

de sua localização quanto ao zoneamento. Assim, criamos uma coluna na

tabela de atributos do shapefile dos lotes de estudo com tais informações de

zoneamento e obtivemos a Figura 31 e o Apêndice A.

Figura 31 Mapa dos vazios urbanos de Ponta Negra classificados por localização

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

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Ao fazer essa classificação por inserção nessas áreas especiais e

zonas, foi identificado um lote que estava parcialmente inserido na ZPA 5 e

na ZAB. Uma vez que as prescrições urbanísticas mais restritas são as da

ZPA, o classificamos como inserido nesse conjunto em função da melhor ca-

racterização das legislações incidentes sobre ele.

Em seguida, entendemos que havia a necessidade de acrescentar

outra variável à análise em função dos instrumentos e demais legislações

urbanísticas existentes: a dimensão dos lotes. De acordo com o PDN, o ta-

manho mínimo dos lotes, expresso como o termo lote padrão, deve corres-

ponder a uma área de 200,00 m² e a uma testada mínima de 8,00 m (NATAL,

2007). No mesmo sentido, como apresentamos anteriormente, o instrumento

da AEIS de vazios é aplicável a lotes com área superior a 400,00 m² onde se

pretenda instalar programas de habitação de interesse social (NATAL, 2007).

Da mesma forma, os instrumentos do PEUC e do IPTU progressivo no tempo

incidem sobre os lotes com área maior que 400,00 m² quando inseridos na

ZAd, assim como são aplicáveis a lotes acima de 1.000,00 m² localizados em

qualquer ponto da cidade. Logo, utilizaremos como intervalos: 1 - vazios com

área inferior a 200,00 m²; 2- vazios cuja área seja igual ou superior a

200,00 m² e inferior a 400,00 m²; 3- vazios cuja área seja igual ou superior

a 400,00m² até 1.000,00m²; 4- vazios com área superior a 1.000,00 m².

Sendo assim, obtivemos como resultado a Figura 32 e o Apêndice B.

Figura 32 Mapa dos vazios urbanos de Ponta Negra classificados por área

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

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Uma vez que identificamos os atributos que queríamos trabalhar e

como eles se aplicam aos vazios urbanos, iniciamos o processo de cruza-

mento das variáveis localização e dimensão. Dessa maneira, combinando os

pares de valores de cada variável, agrupamos as famílias, conforme hou-

vesse lotes que satisfizessem ambas as situações. Assim, excluídas as fa-

mílias referentes aos lotes com menos de 200,00 m² na ZPA 5, na área dos

conjuntos habitacionais e referentes a áreas verdes, bem como as áreas

acima de 1000,00 m² inseridas nos conjuntos habitacionais, cujas caracterís-

ticas não eram satisfeitas por nenhum lote, obtivemos um conjunto de 20

famílias, como ilustra o Quadro 2. Assim, com essas considerações, inicia-

mos a elaboração dos tipos, agrupando as famílias com características se-

melhantes, tendo em vista o objetivo de estabelecer diretrizes para esses

vazios.

Quadro 2 Formação das famílias

Abaixo de

200,00m²

De 200,00m²

a 400,00m²

De 400,00m²

a 1000,00m²

Acima de

1.000,00m² Total

ZPA 5 0 20 79 58 157

ZAB 1 118 165 92 376

AECG 5 25 67 19 116

AEIS 10 68 22 19 119

Conjuntos 0 6 12 0 18

Ár. verdes 0 2 2 4 8

Total 16 239 347 192 794

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Quadro 3 Famílias formadas

Famílias Área Localização Nº de vazios

Família 1 Abaixo de 200,00m² ZAB 1

Família 2 Abaixo de 200,00m² AECG 5

Família 3 Abaixo de 200,00m² AEIS 10

Família 4 De 200,00m² a 400,00m² ZPA 20

Família 5 De 200,00m² a 400,00m² ZAB 118

Família 6 De 200,00m² a 400,00m² AECG 25

Família 7 De 200,00m² a 400,00m² AEIS 68

Família 8 De 200,00m² a 400,00m² Conjuntos 6

Família 9 De 200,00m² a 400,00m² Áreas verdes 2

Família 10 De 400,00m² a 1000,00m² ZPA 79

Família 11 De 400,00m² a 1000,00m² ZAB 165

Família 12 De 400,00m² a 1000,00m² AECG 67

Família 13 De 400,00m² a 1000,00m² AEIS 22

Família 14 De 400,00m² a 1000,00m² Conjuntos 12

Família 15 De 400,00m² a 1000,00m² Áreas verdes 2

Família 16 Acima de 1.000,00m² ZPA 58

Família 17 Acima de 1.000,00m² ZAB 92

Família 18 Acima de 1.000,00m² AECG 19

Família 19 Acima de 1.000,00m² AEIS 19

Família 20 Acima de 1.000,00m² Áreas verdes 4

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

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96

4.2.2. Elaboração dos tipos

A elaboração dos tipos é uma abstração racional realizada em duas

etapas: incialmente, para cada família estudada, explicitamos as proprieda-

des dos objetos que a compõem; e, em seguida, reunimos as propriedades

em comum dos objetos de uma família para definir o tipo (PANERAI, 2006,

p. 135). Logo, partindo das variáveis que apontamos, refletimos sobre como

as prescrições incidentes para os lotes a partir de seu tamanho variavam ao

longo das diferentes áreas especiais e do zoneamento ambiental. Assim,

agrupamos as famílias com o objetivo de formar os tipos.

Primeiramente, identificamos que as áreas verdes não qualificadas

deveriam estar destacadas desse rol de vazios urbanos, visto que, sobre

elas, já existe uma previsão de uso balizada pela necessidade da população.

Assim, entendemos que, vislumbrando uma futura diretriz de qualificação

desses espaços, eles deveriam se constituir como o tipo 1, ainda que haja

variações em suas dimensões e localizações. De modo semelhante, os lotes

inseridos na ZPA 5 possuem características ambientais que os diferenciam

dos vazios das demais localidades. Assim, optamos por formar um tipo ex-

clusivo para esses lotes, o tipo 2. A partir de então, seguimos com as refle-

xões, observando, inicialmente, as legislações que estabeleceram os inter-

valos entre as áreas dos lotes e, em seguida, as legislações acerca da inser-

ção dos vazios no zoneamento urbanístico.

Desse modo, tendo em vista os lotes cuja área é inferior à do lote

padrão, aqueles com menos de 200,00 m², identificamos a sua ocorrência na

AECG, na AEIS Vila de Ponta Negra e nas áreas da ZAB sobre a quais não

incidem áreas especiais. Lotes inferiores ao padrão, desde que sejam produ-

tos de um parcelamento realizado há mais de 10 anos, como é o caso de

Ponta Negra, podem possuir uma ocupação com valores acima da taxa de

80%, valor que é aplicado a todos os lotes do município (NATAL, 2007). En-

tretanto para as AEIS podem ser previstas prescrições diferenciadas para o

lote padrão, sendo sua área possível de ser inferior a 200,00 m² de forma

regularizada (NATAL, 2007). Da mesma forma, as AEIS são áreas da cidade

que desempenham uma função socioambiental especial e, portanto, seus lo-

tes devem atender às demandas dessa população, diferenciando-as das de-

mais localidades. A AECG, que já possui regulamentação para a ZET 1, que

é anterior à atual versão do PDN e, portanto, anterior à prescrição desse valor

de lote padrão, onde se localizam os vazios, prescreve como lote padrão

aquele com área igual ou superior a 360,00 m², entretanto, essa regulamen-

tação é muito antiga – foi pensada baseando-se no PDN 84 – e deve passar

por um processo de revisão. Além disso, essa área especial tem a finalidade

de estabelecer parâmetros urbanísticos que restrinjam a ocupação e sua ex-

tensão a fim de resguardar o potencial cênico-paisagístico da orla, logo, di-

ferentemente da AEIS, o cumprimento da sua função social não está associ-

ado a um uso específico, o que a AECG torna possível de ser comparada à

área da ZAB sobre a qual não incidem áreas especiais. Assim, utilizando os

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conceitos de Panerai (2006, p. 135), os vazios com área igual superior a

200,00 m² estarão inseridos em outro tipo, constituindo uma variação. Logo,

os lotes com menos de 200,00 m² da ZAB e da AECG foram agrupados no

tipo 3, enquanto os das AEIS ficaram no tipo 4.

Os lotes com áreas iguais ou acima de 400,00 m² até 1.000,00 m²

são passíveis de caracterização como AEIS de Vazios, onde se pretenda

instalar programas de habitação de interesse social, porém não são passíveis

de aplicação dos instrumentos do PEUC e do IPTU progressivo. Dessa

forma, identificamos que as áreas que poderiam assim ser classificadas, em

função das características da ocupação de gabarito mais baixo e homoge-

neidade do padrão socioeconômico, são aquelas inseridas no território dos

conjuntos habitacionais, formando, assim o tipo 5.

Os lotes acima de 1.000,00 m², excetuando as áreas verdes e os

vazios das ZPAs, localizam-se na AEIS, na AECG e nas demais localidades

da ZAB. Sobre esses recaem os instrumentos de PEUC e de IPTU Progres-

sivo no tempo, o que balizou a diferenciação de tratamento de acordo com

as necessidades de cada parcela do território. Logo, entre essas 3 localida-

des, a AEIS se diferencia por sua finalidade e necessidades específicas: a

Vila de Ponta Negra tem carências de equipamentos públicos e áreas de la-

zer, assim como sofre com o acúmulo de lixo nesses lotes abandonados; o

que nos levou a considerar os seus vazios como o tipo 6. Da mesma forma,

os lotes inseridos nas parcelas da ZAB em que não há delimitação de áreas

especiais cuja área seja acima de 1.000,00 m² também inspiram tratamento

especial, uma vez que são muitos em quantidade, apresentam-se em algu-

mas regiões de modo contíguo e se inserem numa zona com oferta restrita

de infraestrutura urbana, logo constituíram-se como o tipo 7.

Uma vez analisadas as particularidades dos vazios de acordo com a

utilização dos instrumentos e das prescrições urbanísticas, analisamos as

particularidades de cada território. Iniciando pelas AEIS, entendemos que se

trata de uma área cuja maior necessidade é aplacar a carência habitacional,

logo seus vazios se diferenciavam em relação às demais localidades. Desse

modo, observando os dois intervalos de vazios restantes, entendemos que

eles poderiam ser tratados da mesma forma, constituindo o tipo 8.

A AECG, por sua vez, possui uma finalidade específica que é o fo-

mento à atividade turística na orla através da proteção da sua paisagem, as-

sim, as suas características a diferenciam dos lotes nas demais áreas da

ZAB. Ao analisarmos os intervalos de área dos vazios nela inseridos, verifi-

camos que não havia pertinência da aplicação de outros instrumentos urba-

nísticos na área, assim, os lotes com área igual ou superior a 200,00 m² foram

tratados da mesma forma, admitindo, assim, os lotes que têm menos de

360,00 m² - lote padrão para essa área especial –, os quais serão tratados

como uma variação, constituindo o tipo 9. Por fim, os vazios ainda não clas-

sificados inseridos na área da ZAB onde não há delimitação de áreas espe-

ciais foram agrupados com os vazios restantes inseridos na área dos

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98

conjuntos, constituindo o tipo 10. Assim o fizemos por entender que há se-

melhanças entre os seis vazios dos conjuntos e os 283 vazios da ZAB, sendo

a única diferença a restrição de gabarito daqueles.

Dessa maneira, a partir das considerações feitas a respeito de como

incidiam as legislações sobre as parcelas do bairro de Ponta Negra e levando

em conta os aspectos que fazem com que esses lotes possivelmente cum-

pram com a sua função social, foi elaborado oQuadro 4, que mostra como as

famílias se agruparam em tipos. Após esse agrupamento, destacamos os ti-

pos, suas características de área e localização e elaboramos o

Quadro 5, que mostra como ficaram estabelecidos os tipos formados.

Quadro 4 Formação dos tipos

Abaixo de

200,00m²

De 200,00m²

a 400,00m²

De 400,00m²

a 1.000,00m²

Acima de

1.000,00m² Total

ZPA 5 0 20 79 58 157

ZAB 1 118 165 92 376

AECG 5 25 67 19 116

AEIS 10 68 22 19 119

Conjuntos 0 6 12 0 18

Ár. verdes 0 2 2 4 8

Total 16 239 347 192 794

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Quadro 5 Tipos formados

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 1 Qualquer área Áreas verdes 8

Tipo 2 Qualquer área ZPA 157

Tipo 3 Abaixo de 200,00m² ZAB e AECG 6

Tipo 4 Abaixo de 200,00m² AEIS 10

Tipo 5 De 400,00m² a 1.000,00m² Conjuntos 12

Tipo 6 Acima de 1.000,00m² AEIS 19

Tipo 7 Acima de 1.000,00m² ZAB 92

Tipo 8 De 200,00m² a 1.000,00m² AEIS 90

Tipo 9 Acima de 200,00m² AECG 111

Tipo 10 De 200,00m² a 1.000,00m² ZAB

289 De 200,00m² a 400,00m² Conjuntos

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

A partir da formação dos tipos, elaboramos a Figura 33, também pre-

sente na forma de Apêndice C. Neles podemos observar como se distribuem

os tipos espacialmente sobre o território de Ponta Negra, destacando as suas

concentrações. Assim, entendemos a importância de avaliar cada um dos

tipos de acordo com as suas características particulares, da mesma forma

como sua comparação com os demais tipos para que possamos, de forma

mais assertiva apontar suas diretrizes, a fim de possibilitar o cumprimento de

sua função social.

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99

Figura 33 Mapa dos tipos elaborados

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

4.2.3. Tipologia

Uma vez identificados os tipos, começamos a avaliar a forma como

eles se inserem no território de Ponta Negra. Para tanto, iniciamos a investi-

gação do quanto em área e em quantidade cada tipo representa em relação

ao conjunto dos lotes passíveis de edificação no bairro e em relação aos

vazios urbanos. Assim, como observamos na Figura 34, o tipo com o maior

número de vazios é o tipo 10, representando 36,04% dos lotes não edificados

e sem uso em Ponta Negra, mas, como expomos na Figura 35, o tipo com

maior área ocupada é o tipo 2, que representa 36,19% da área vazia total.

Figura 34 Gráfico do percentual dos tipos de acordo com a quantidade de vazios

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

1,01%

19,77%

0,76%

1,26%

1,51%

2,39%

11,59%

11,34%13,98%

36,40%

Tipos em relação à quantidade de vazios

Tipo 1

Tipo 2

Tipo 3

Tipo 4

Tipo 5

Tipo 6

Tipo 7

Tipo 8

Tipo 9

Tipo 10

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100

Figura 35 Gráfico do percentual dos tipos de acordo com a área dos vazios

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Em seguida, iniciamos a caracterização dos tipos. Para tanto, desta-

camos as suas propriedades, observando quais são os aspectos que mais

ocorrem, destacando, assim, o exemplo-tipo, como indica Panerai (2006, p.

135).

4.2.3.1. Tipo 1

Tratam-se das áreas verdes não qualificadas. Os vazios somam 8 no

total, o que representa 1,01% dos 794 lotes não edificados e sem uso de

Ponta Negra. A sua área total é aproximadamente de 50.215,87 m², o que

corresponde a 4,45% dos 1.128.847,53 m² referentes à soma das áreas de

todos os vazios analisados.

Figura 36 Mapa do tipo 1

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

4,45%

36,19%

0,08%

0,13%0,58%6,06%

31,01%

2,89%

7,23%

11,37%

3,68%

Tipos em relação à área

Tipo 1 Tipo 2 Tipo 3 Tipo 4 Tipo 5Tipo 6 Tipo 7 Tipo 8 Tipo 9 Tipo 10

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101

Figura 37 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 1

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Figura 38 Exemplo-tipo do tipo 1

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

A sua distribuição, como mostra a Figura 36, acontece predominan-

temente na área da ZAB onde não há sobreposição de áreas especiais, mas

também verificamos seus exemplos na AEIS Vila de Ponta Negra e na área

dos conjuntos habitacionais Ponta Negra e Alagamar. As áreas dos vazios

desse tipo se apresentam conforme a figura 37, sendo a sua média de

6276,98 m² de forma que o lote que mais se aproxima desse valor e melhor

representa o tipo 1 é aquele situado entre as ruas da Lagosta, das Algas e

Carapeba, cuja área corresponde a 5370,56 m², como observamos na figura

38.

4.2.3.2. Tipo 2

Esses são os lotes não edificados e sem uso inseridos na ZPA 5. Os

vazios somam 157 no total, o que representa 19,77% dos 794 vazios anali-

sados. A sua área total é aproximadamente de 408.561,26 m², o que corres-

ponde a 36,19% dos 1.128.847,53 m² referentes à soma das áreas de todos

os lotes estudados.

A sua distribuição, como mostra a Figura 39, acontece exclusiva-

mente na ZPA 5, mas em diferentes subzonas. Esses vazios são preponde-

rantemente terrenos nunca edificados, inseridos em uma parcela do bairro

onde há quase nenhuma ocupação e muitos desses lotes se apresentam de

forma contígua no território, apresentado grandes trechos de completa ocio-

sidade. As áreas dos vazios desse tipo se apresentam conforme a Figura 40,

sendo a sua média de 2.602,30 m² de forma que o lote que mais se aproxima

desse valor e melhor representa o tipo 2 é aquele situado conforme se ob-

serva na Figura 41, cuja área corresponde a 2.602,16 m².

0,00

5.000,00

10.000,00

15.000,00

20.000,00

25.000,00

1 2 3 4 5 6 7 8

Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 1

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102

Figura 39 Mapa do tipo 2

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

Figura 40 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 1

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Figura 41 Exemplo-tipo do tipo 2

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

100,00

1.000,00

10.000,00

100.000,00

1 21 41 61 81 101 121 141

Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 2

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103

4.2.3.3. Tipo 3

Refere-se aos vazios cujas áreas são inferiores a 200,00 m² inseri-

dos na AECG e nas demais localidades da ZAB onde não há sobreposição

de áreas especiais. Os vazios somam 6 no total, o que representa 0,76% dos

794 lotes não edificados e sem uso de Ponta Negra. A sua área total é apro-

ximadamente de 921,72 m², o que corresponde a 0,08% dos 1.128.847,53

m² referentes à soma das áreas de todos os vazios analisados. É o tipo com

menor ocorrência e com menor área entre todos os estudados.

A sua disposição sobre o território, como mostra a Figura 43, acon-

tece predominantemente na AECG, havendo um único lote na ZAB. As áreas

dos vazios desse tipo se apresentam conforme a Figura 42, sendo a sua

média de 153,62 m² de forma que o lote que mais se aproxima desse valor e

melhor representa o tipo 3 é aquele situado conforme se observa na Figura

44, cuja área corresponde a 148,69 m².

Figura 42 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 3

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Figura 43 Mapa do tipo 3

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

0,00

50,00

100,00

150,00

200,00

1 2 3 4 5 6Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 3

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104

Figura 44 Exemplo-tipo do tipo 3

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

4.2.3.4. Tipo 4

Tratam-se dos lotes inseridos na AEIS Vila de Ponta Negra cujas

áreas são menores que 200,00 m². Os vazios somam 10 no total, o que re-

presenta 1,26% dos 794 lotes não edificados e sem uso de Ponta Negra. A

sua área total é aproximadamente de 1.478,22 m², o que corresponde a

0,13% dos 1.128.847,53 m² referentes à soma das áreas de todos os vazios

analisados. A disposição dos vazios sobre o território da AEIS acontece como

ilustra a Figura 45, ou seja de modo disperso sobre a extensão da comuni-

dade, não apresentando concentrações em áreas específicas ou contigui-

dade entre os lotes de mesmo tipo.

Figura 45 Mapa do tipo 4

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

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105

As áreas dos vazios do tipo 4 se apresentam conforme mostra a Fi-

gura 46, sendo a sua média de 147,82 m² de forma que o lote que mais se

aproxima desse valor e melhor representa o tipo 4 é aquele situado conforme

se observa na Figura 47, cuja área corresponde a 150,59 m².

Figura 46 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 4

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Figura 47 Exemplo-tipo do tipo 4

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

4.2.3.5. Tipo 5

Esses são os lotes não edificados e sem uso inseridos na área dos

conjuntos Ponta Negra e Alagamar cujas áreas são iguais ou superiores a

400,00 m² e iguais ou inferiores a 1.000,00 m². Os vazios somam 12 no total,

o que representa 1,51% dos 794 vazios analisados. A sua área total é apro-

ximadamente de 6.599,73 m², o que corresponde a 0,58% dos 1.128.847,53

m² referentes à soma das áreas de todos os lotes estudados. As áreas dos

vazios desse tipo se apresentam conforme ilustra a Figura 48, sendo a sua

média de 549,98 m² de forma que o lote que mais se aproxima desse valor e

melhor representa o tipo 5 é aquele situado conforme se observa na Figura

50, cuja área corresponde a 536,13 m².

Figura 48 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 5

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

0,00

50,00

100,00

150,00

200,00

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 4

400,00

600,00

800,00

1.000,00

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 5

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Figura 49 Mapa do tipo 5

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

A sua distribuição, como mostra a Figura 49, acontece exclusiva-

mente na área dos conjuntos, mas distribuindo-se de forma não homogênea

sobre o território e apresentando-se, em determinadas situações, em conti-

guidade com outros lotes de mesmo tipo.

Figura 50 Exemplo-tipo do tipo 5

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

4.2.3.6. Tipo 6

Refere-se aos vazios cujas áreas são maiores que 1.000,00 m² inse-

ridos na AEIS. Somam 19 no total, o que representa 2,39% dos 794 lotes não

edificados e sem uso de Ponta Negra. A sua área total é aproximadamente

de 68.375,13 m², o que corresponde a 6,06% dos 1.128.847,53 m² referentes

à soma das áreas de todos os vazios analisados. É um tipo que, apesar de

pouco numeroso, possui grandes lotes, como observamos na Figura 51.

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107

Figura 51 Mapa do tipo 6

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

As áreas dos vazios do tipo 6 se apresentam conforme mostra a Fi-

gura 52, sendo a sua média de 3.598,69 m² de forma que o lote que mais se

aproxima desse valor e melhor representa o tipo 6 é aquele situado conforme

se observa na Figura 53, cuja área corresponde a 3.484,31 m².

Figura 52 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 6

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Figura 53 Exemplo-tipo do tipo 6

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

1.000,00

4.000,00

7.000,00

10.000,00

1 4 7 10 13 16 19Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 6

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108

4.2.3.7. Tipo 7

Esses são os lotes não edificados e sem uso inseridos na área da

ZAB onde não há sobreposição de áreas especiais cujas áreas são superio-

res a 1.000,00 m². Os vazios desse tipo somam 92 no total, o que representa

11,59% dos 794 vazios analisados. A sua área total é aproximadamente de

350.073,32 m², o que corresponde a 31,01% dos 1.128.847,53 m² referentes

à soma das áreas de todos os lotes estudados. Trata-se do segundo tipo de

maior área ociosa no bairro, sendo o primeiro colocado, se considerarmos

apenas os lotes inseridos na macrozona de Adensamento Básico, cujas ca-

racterísticas são favoráveis a uma ocupação de solo, ainda que de forma

moderada em relação à ZAd. As áreas dos vazios do tipo 7 se apresentam

como se vê na Figura 54, sendo a sua média de 3.805,15 m², de modo que

o lote que melhor representa o tipo 7 é aquele situado conforme se observa

na Figura 56, cuja área corresponde a 3.919,89 m².

Figura 54 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 7

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Figura 55 Mapa do tipo 7

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

1.000,00

4.000,00

7.000,00

10.000,00

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 7

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109

A sua distribuição, como mostra a Figura 55, acontece preponderan-

temente na porção do território nos arredores da ZPA 5, distribuindo-se de

forma concentrada sobre o território e apresentando-se, comumente, em con-

tiguidade com outros lotes de mesmo tipo, o que proporciona grandes áreas

de vazios nas regiões onde esse tipo se concentra. Entretanto, na parcela

mais próxima à AEIS, há lotes mais dispersos do mesmo tipo.

Figura 56 Exemplo-tipo do tipo 7

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

4.2.3.8. Tipo 8

São os vazios cujas áreas são iguais ou superiores a 200,00 m² e

iguais ou inferiores a 1.000,00 m² e que estejam inseridos na AEIS. A sua

disposição, como apresenta a Figura 57, ocorre de forma distribuída por toda

a extensão da Vila de Ponta Negra, apresentando-se de forma concentrada

em alguns trechos, o que gera vazios ainda maiores que os lotes individuais.

Figura 57 Mapa do tipo 8

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

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110

Ao todo são 90 vazios, o que representa 11,34% dos 794 lotes não

edificados e sem uso de Ponta Negra. A sua área total é aproximadamente

de 32.572,80 m², o que corresponde a 2,89% dos 1.128.847,53 m² referentes

à soma das áreas de todos os vazios analisados. As áreas dos vazios do tipo

8 se apresentam como se vê na Figura 58, sendo a sua média de 361,92 m²,

de modo que o lote que melhor o representa é aquele situado conforme se

observa na Figura 59, cuja área corresponde a 362,16 m².

Figura 58 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 8

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Figura 59 Exemplo-tipo do tipo 8

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

4.2.3.9. Tipo 9

São os lotes não edificados e sem uso inseridos na AECG cujas

áreas são maiores ou iguais a 200,00 m². Os vazios somam 111 no total, o

que representa 13,98% dos 794 vazios observados. A sua área total é apro-

ximadamente de 81.657,92 m², o que corresponde a 7,23% dos 1.128.847,53

m² referentes à soma das áreas de todos os vazios analisados.

A disposição dos vazios sobre o território, como mostra a Figura 61,

acontece predominantemente na AECG, havendo um único lote na ZAB. As

áreas dos vazios desse tipo se apresentam conforme a Figura 60, sendo a

sua média de 735,66 m² de forma que o lote que mais se aproxima desse

valor e melhor representa o tipo 9 é aquele situado conforme se observa na

Figura 62, cuja área corresponde a 745,81 m².

Figura 60 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 9

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

200,00

400,00

600,00

800,00

1.000,00

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 8

200,00

700,00

1.200,00

1.700,00

2.200,00

2.700,00

3.200,00

3.700,00

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120

Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 9

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111

Figura 61 Mapa do tipo 9

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

Figura 62 Exemplo-tipo do tipo 9

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

4.2.3.10. Tipo 10

Esses são os vazios inseridos na área da ZAB onde não há sobre-

posição de áreas especiais cujas áreas são iguais ou superiores a 200,00 m²

e iguais ou inferiores a 1.000,00 m² e os vazios inseridos na área dos con-

juntos habitacionais cujas áreas são iguais ou superiores a 200,00 m² e infe-

riores a 400,00 m². Eles somam 289 no total, o que representa 36,40% dos

794 vazios analisados. A sua área total é aproximadamente de 128.391,55

m², o que corresponde a 11,37% dos 1.128.847,53 m² referentes à soma das

áreas de todos os lotes estudados. Trata-se do maior tipo em relação à quan-

tidade de vazios, porém o terceiro em área. As áreas dos vazios do tipo 10

se apresentam territorialmente como se vê na Figura 63.

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112

Figura 63 Mapa do tipo 10

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

As áreas dos vazios do tipo 10 se apresentam conforme mostra a

Figura 64, sendo a sua média de 444,26 m² de forma que o lote que mais se

aproxima desse valor e melhor representa o tipo é aquele situado conforme

se observa na Figura 65, cuja área corresponde a 443,75 m².

Figura 64 Gráfico de dispersão das áreas dos vazios do tipo 10

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

Figura 65 Exemplo-tipo do tipo 10

Fonte: Produzido pelo autor com base em Google Earth, 2019. 2019.

200,00

400,00

600,00

800,00

1.000,00

0 30 60 90 120 150 180 210 240 270 300

Áre

a do

s va

zios

(m

²)

Ordem dos vazios por área

Área dos vazios do tipo 10

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113

5. AS DIRETRIZES

Uma vez que discutimos conceitualmente o que são os vazios urba-

nos e como eles são produtos do modo capitalista de produção do espaço,

entendemos a realidade e o processo de evolução do bairro de Ponta Negra,

identificamos e classificamos os seus lotes não edificados e sem uso, apon-

tamos diretrizes a serem adotadas para que esses lotes passem a cumprir

uma função social. Para tanto, definimos diretrizes gerais e específicas, con-

siderando as particularidades que os fizeram classificar-se em 10 tipos. Logo,

consideramos as prescrições urbanísticas incidentes sobre esses tipos de

acordo com a sua localização e com os seus atributos físicos, tendo em vista

as necessidades do bairro.

Por compreendermos que há variadas legislações exprimindo as par-

ticularidades de cada trecho de bairro em prescrições específicas e tendo em

vista que algumas dessas leis estão necessitando de regulamentação espe-

cífica, estando algumas delas passíveis de modificação com o processo de

revisão do plano diretor de Natal, nos concentramos nos instrumentos urba-

nísticos cabíveis. A AEIS Vila de Ponta Negra e o Plano Setorial de Ponta

Negra são dois instrumentos que não estão regulamentados. A AECG do

bairro, abarca a ZET 1, a qual está, assim como os anteriores, passível a

algumas modificações durante a revisão do plano. Até mesmo os conceitos

e limites da ZAB e das ZPAs estão em discussão. Dessa forma, este se

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114

mostra um momento propício para a formulação de sugestões que contri-

buam com a revisão e regulamentação dessas leis de modo a fazer com os

vazios urbanos sejam considerados por elas, da mesma forma como sejam

combatidos, visando a função socioambiental da cidade e da propriedade.

Assim, há diretrizes gerais que podem ser apontadas a partir das

reflexões que este trabalho proporcionou com relação à maneira como os

vazios urbanos são tratados na legislação, desde a sua conceituação, pas-

sando pela identificação e chegando na instrumentalização das ferramentas

para o seu combate. Dessa forma, elencamos as seguintes diretrizes gerais:

• Combate aos vazios urbanos como uma diretriz do PDN;

• Inserção do conceito de vazio urbano no PDN;

• Caracterização das ZAB e ZAd, com o estabelecimento de objetivos e

diretrizes para o combate aos vazios urbanos em cada uma delas;

• Punição aos vazios urbanos que não são mantidos limpos e cercados;

• Inserção da delimitação das AEIS de vazios no Plano de Habitação de

Interesse Social (PHLIS) e nos Planos Setoriais (PS);

• Regulamentação da AEIS Vila de Ponta Negra;

• Regulamentação da ZPA 6;

• Regulamentação de PEUC e IPTU Progressivo no Tempo;

• Regulamentação do Consórcio Imobiliário;

• Revisão da regulamentação da ZET 1, na AECG;

• Desenvolvimento do Plano setorial de Ponta Negra;

Desse modo, destacamos a necessidade de inserção do conceito

de vazio urbano no plano diretor, sendo uma diretriz dele o combate aos

vazios, estabelecendo os critérios para a sua identificação. O capítulo da

política urbana da Constituição expressa que o plano diretor é o instrumento

básico da política de desenvolvimento urbano e que a propriedade urbana

deve a ele estar submetida para que seja cumprida a função social da pro-

priedade (BRASIL, 1988). O Estatuto da Cidade, ao detalhar esse capítulo

constitucional, estabelece, em seu artigo 2º, 17 diretrizes gerais para que os

instrumentos sigam a fim de fazer cumprir essa função. Uma delas, a sexta

diretriz, orienta que a ordenação e o controle do solo devem se dar de forma

a evitar, entre outras coisas, a utilização inadequada dos imóveis urbanos, a

deterioração de áreas urbanizadas e a retenção especulativa de imóvel ur-

bano que resulte na sua subutilização ou não utilização (BRASIL, 2001). No

mesmo sentido, a Lei Orgânica do Município de Natal, em seu artigo 119, já

previa que deveriam ser adotadas diretrizes para o uso e para a ocupação

do solo urbano (NATAL, 1990). Entretanto, no PDN (NATAL, 2007), ainda

que o artigo 3º expresse como critério para obedecimento do artigo 119 da

Lei Orgânica a racionalização e adequação do uso da infraestrutura urbana

instalada para evitar a sua sobrecarga e ociosidade, não há menção ao com-

bate à retenção especulativa ou mesmo uma instrumentalização aplicável de

mecanismos de combate efetivos à ociosidade da terra urbana.

Todavia, ao detalhar os instrumentos do PEUC e do IPTU progres-

sivo no tempo, no artigo 71, o PDN expressa que são passíveis da aplicação

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115

deles, em determinadas condições, os imóveis não edificados, subutilizados

ou não utilizados (NATAL, 2007). Desse modo, o plano subjuga os vazios

urbanos à aplicação desses instrumentos. Porém, não apresenta em seu ca-

pítulo de definições ou em outra parte do texto, os detalhamentos desses

conceitos, restringindo-se à confusa conceituação de “lotes ou glebas sub-

utilizadas”, a qual abarca tanto lotes como edifícios. Logo, há necessidade

de incorporar esses conceitos ao plano e de estabelecer como diretriz o com-

bate aos vazios urbanos. Para isso, é importante levar em conta a distinção

entre edifícios e lotes, para caracterizar os imóveis que são vazios urbanos,

bem como o fato de que os lotes não edificados se constituem como tal ao,

simultaneamente, não apresentar formas de utilização.

Assim, sugere-se que, no artigo 4º, que trata das diretrizes do PDN,

seja inserido um inciso que expresse o combate aos vazios urbanos, em con-

sonância com os incisos II e III do artigo 3º que trazem como objetivos do

plano, ente outros

II - a distribuição equânime dos custos e benefícios das obras e serviços de infra-estrutura urbana e a recuperação, para a coletividade, da valorização imobiliária decorrente dos investi-mentos públicos;

III - a racionalização e adequação do uso da infra-estrutura ur-bana instalada, evitando-se sua sobrecarga e ociosidade; (NATAL, 2007)

38 Os números dos incisos propostos são apenas ilustrativos. Os valores escolhidos respei-tam a atual sequência dada aos incisos, de acordo com cada artigo. Em sublinhado estão as propostas de alteração

Desse modo, o inciso a ser incluso deve ser38:

Art. 4º Para atingir tais objetivos, ficam estabelecidas as seguintes

diretrizes:

(...)

XV – a prevenção da formação e consolidação de vazios urbanos ao

longo do território, estabelecendo instrumentos para o seu combate e defi-

nindo áreas prioritárias para a transformação desses vazios em imóveis com

usos adequados ao cumprimento da função socioambiental da propriedade.

Para tanto, no capítulo das definições devem constar as definições

de “vazio urbano”, “lote não edificado”, “lote subutilizado”, “edifício subutili-

zado” e “edifício não utilizado”. Dessa maneira, estaria assim definido:

Art. 6º - Para os fins desta Lei são adotadas as seguintes definições:

(...)

XXIX – lote subutilizado – aquele lote inserido em parcela do território

passível de ocupação que não apresente área construída e seja utilizado por

formas de ocupação exclusivamente transitórias ou estacionamentos, exce-

tuando edifícios garage, ou lote que apresente coeficiente de aproveitamento

inferior ao mínimo (0,1); ou aquele lote inserido em parcela do território não

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116

passível de ocupação, mas com utilização permitida, em que não se com-

prove uso por mais de 3 anos. (...)

XLVII – vazio urbano – o imóvel – lote ou edificação – situado numa

parcela do território do município passível de uso e/ou ocupação que não

exerce a sua função social/socioambiental da propriedade, podendo ele ser:

lote não edificado e sem uso, lote subutilizado, edifício subutilizado ou edifício

não utilizado.

XLVIII – Lote não edificado e sem uso – aquele lote inserido em par-

cela do território passível de ocupação e utilização que apresente área cons-

truída igual a zero e não seja utilizado.

XLIX – edifício subutilizado – aquela edificação inserida em parcela

do território passível de ocupação e utilização que apresente área coeficiente

de aproveitamento maior ou igual ao mínimo (0,1) e sem uso comprovado há

mais de 3 anos em mais de 50% da área construída.

L – edifício não utilizado – aquela edificação inserida em parcela do

território passível de ocupação e utilização que apresente coeficiente de

aproveitamento maior ou igual ao mínimo (0,1) e esteja: abandonado, nos

termos da legislação federal; sem uso comprovado há mais de 3 anos; ou

trate-se de edificação caracterizada como obra paralisada, entendida como

aquela inacabada, que não apresente alvará de construção em vigor e não

possua Habite-se ou certidão similar.

A partir dessas propostas de alterações e inserção de conceitos, o

Quadro 1 foi repensado, assimilando as novas reflexões. Dessa forma, o

Quadro 6 resume as condições de classificam os lotes em Natal quanto às

categorias de vazios urbanos apresentadas, baseando-se na mesma estru-

tura de classificação. Assim, foram consideradas a permissão de ocupação

e utilização nas áreas em que os imóveis se inserem, bem como, as carac-

terísticas verificadas dessas ocupações e utilizações, resultando na catego-

rização dos vazios urbanos a partir da identificação das situações que não

cumprem com o que o PDN estabelece como função socioambiental da ci-

dade e da propriedade.

Em conformidade com o exposto, é preciso que se defina nas ma-

crozonas e nas áreas especiais, a destinação preferencial dos vazios urba-

nos, estabelecendo sobre ele a incidência de instrumentos urbanísticos que,

de forma associada, sejam utilizados para fazer com que esses imóveis pas-

sem a cumprir uma função social. Dessa maneira deve ser levada em consi-

deração a caracterização dessas macrozonas e, consequentemente, a oferta

de infraestrutura disponível nessas localidades, bem como os instrumentos

urbanísticos devem se sobrepor, de forma a dotar de maiores possibilidades

de ação o poder público municipal para reverter o estado de ociosidade des-

ses vazios, seja estabelecendo sanções aos seus proprietários, seja arreca-

dando imóveis para as devidas destinações.

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117

Quadro 6 Condições que classificam os lotes em Natal quanto às categorias de vazios urbanos a partir de conceitos propostos

CARACTERÍSTICAS DO IMÓVEL E DA ÁREA ONDE SE LOCALIZA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE

Ocupação Utilização Cumpri-

mento

Vazio Urbano

Permissão Características da ocupação Permissão Incidência de uso Caracterização Categoria

Permitida: lote sobre

o qual não incide le-

gislação proibitiva à

construção.

Área construída igual a 0 sem outras

formas de ocupação

Permitida Com uso Cumpre Não

Permitida Com uso (estacionamento) Não cumpre Sim Lote subutilizado

Permitida Sem uso Não cumpre Sim Lote não edificado

e sem uso

Área construída igual a 0 com ocupa-

ção exclusivamente transitória

Permitida Com ou sem uso Não cumpre Sim Lote subutilizado

Área construída maior que 0 e coefici-

ente de aproveitamento menor que 0,1

Permitida Com ou sem uso Não cumpre Sim Lote subutilizado

Coeficiente de aproveitamento maior

que ou igual a 0,1

Permitida Com uso Cumpre Não

Com uso em menos de 50% da área

construída por mais de 3 anos

Não cumpre Sim Edifício

subutilizado

Sem uso por mais de 3 anos Não cumpre Sim Edifício

não utilizado

Não permitida: lote

sobre o qual incide

legislação proibitiva

à construção, por ca-

racterísticas socio-

ambientais, de risco

ou outra.

Área construída igual a 0 sem outras

formas de ocupação

Permitida Com uso Cumpre Não

Sem uso por mais de 3 anos Não cumpre Sim Lote subutilizado

Não

permitida

Com uso Não cumpre Não

Sem uso Cumpre Não

Área construída superior a 0 ou com

ocupação móvel ou transitória

Permitida

ou não

Com ou sem uso Não cumpre Não

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007. 2019.

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118

Sendo assim, deve haver uma caracterização das ZAB e ZAd, com

o estabelecimento de objetivos e diretrizes para o combate aos vazios

urbanos em cada uma delas. Para tanto devem ser levados em conta os

aspectos socioeconômicos e de infraestrutura instalada e operante, uma vez

que, como abordamos nos dois primeiros capítulos, as localizações dos imó-

veis no tecido urbano propiciam a sua valorização mediante os diversos con-

dicionantes que atuam sobre eles, sendo a legislação urbanística um dos

mais importantes. A inserção de um imóvel em uma das macrozonas, esta-

belece o seu potencial construtivo e, consequentemente, o seu preço. Assim,

ao fazer essa caracterização, vislumbrando o processo de revisão do PDN,

é possível propor um redesenho dos limites dessas zonas, de modo a asse-

gurar o estímulo à ocupação em áreas verdadeiramente dotadas de suporte

para tal, restringindo parcialmente outras áreas ou mesmo proibindo a ocu-

pação, em situações onde as características socioambientais assim o indica-

rem.

A ZAB, atualmente, é definida pelo artigo 9º, o qual expressa que ela

é “aquela onde se aplica, estritamente, o coeficiente de aproveitamento bá-

sico” (NATAL, 2007). Trata-se de uma definição insuficiente para atender aos

objetivos do PDN e mesmo ao inciso XLVI do artigo 6º, o qual trata da con-

ceituação de zonas, expondo que são definidas como

“porções do território do Município delimitadas por lei e carac-terizadas por suas funções social e físico-ambiental diferenci-adas” (NATAL, 2007).

Dessa forma, sugere-se que a ZAB deve ser caracterizada:

Art. 9º – Zona de Adensamento Básico (ZAB) é aquela onde as par-

celas do tecido urbano cujos serviços de infraestrutura urbana atendam de

forma deficitária os seus habitantes, devendo o seu adensamento populaci-

onal não ser incentivado.

Sendo dois de seus objetivos:

§1º – São objetivos da ZAB:

I – Combater a formação e manutenção de grandes lotes em situa-

ção de vazio urbano;

II – Dotar de equipamentos e serviços públicos as áreas inseridas

nessa zona de forma proporcional à sua referente demanda populacional no

tocante aos aspectos de infraestrutura urbana, saúde, educação, lazer e

áreas verdes.

Para tanto, estabelecendo como algumas de suas diretrizes:

§2º – São diretrizes da ZAB:

I – Caracterização de lotes não edificados e sem uso cujas áreas

sejam maiores que 1.000,00m² como vazios urbanos passíveis de aplicação

dos instrumentos urbanísticos de PEUC, IPTU Progressivo no Tempo e Di-

reito de Preempção;

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119

II – Destinação dos imóveis caracterizados como vazios urbanos ad-

quiridos por meio do direito de preempção ou de posse do poder público,

obrigatoriamente, para a instalação de equipamentos e serviços públicos de

infraestrutura urbana, saúde, educação, lazer e áreas verdes.

Por sua vez, sugerimos que a ZAd deve ser caracterizada:

Art. 11 – Zona Adensável (ZAd) é aquela onde as condições do meio

físico e a disponibilidade de infraestrutura urbana operante possibilitam o

adensamento populacional através da concessão de coeficientes de aprovei-

tamento acima do básico.

Sendo três de seus objetivos:

§1º – São objetivos da ZAd:

I – Combater a formação e manutenção de vazios urbanos;

II – Dotar de equipamentos e serviços públicos as áreas inseridas

nessa zona de forma proporcional à sua referente demanda populacional no

tocante aos aspectos de infraestrutura urbana, saúde, educação e lazer;

III – Estimular o aumento da densidade populacional em sua exten-

são.

Para tanto, estabelecendo como algumas de suas diretrizes:

§2º – São diretrizes da ZAd:

I – Caracterização de lotes não edificados e sem uso cujas áreas

sejam maiores que 200,00m² como vazios urbanos passíveis de aplicação

dos instrumentos urbanísticos de PEUC, IPTU Progressivo no Tempo e Di-

reito de Preempção;

II – Destinação dos imóveis caracterizados como vazios urbanos ar-

recadados ou de posse do poder público, obrigatoriamente, para a instalação

de habitação de interesse social, equipamentos e serviços públicos de infra-

estrutura urbana, saúde, educação e lazer.

Além dessas diretrizes, sugerimos que haja uma punição aos va-

zios urbanos que não são mantidos limpos e cercados, como prevê o

Código de Obras (NATAL, 2004). Como proposta, devem ser notificados to-

dos os imóveis que descumprem essa lei, sendo aqueles vazios que, em

passados 5 anos da primeira notificação – desde que se comprove por ima-

gens de satélite ou com base nos dados cadastrais da prefeitura o tempo de

ociosidade –, se mantenham com lixo e/ou não cercados impedidos de utili-

zar coeficientes de aproveitamento acima do básico por 2 anos, com acrés-

cimo de IPTU nesse período. Havendo a reversão da situação, passados os

2 anos, pode ser utilizado coeficiente maior, caso o terreno esteja em área

que o permita. Não havendo reversão da situação, a sanção permanecerá

por mais 2 anos e assim sucessivamente.

Deve haver a inserção da delimitação das AEIS de vazios no

PHLIS e nos PSs. As AEIS de vazios são definidas pelo artigo 22 do PDN,

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de forma que são compreendidas por lotes não edificados, subutilizados ou

não utilizados que possuam área maior que 400 m², os quais podem ser des-

tinados a programas de habitação de interesse social (NATAL, 2007). Assim,

o PHLIS deve identificar os vazios e destacar aqueles prioritários à aplicação

desse instrumento. Já o PS, como veremos a seguir, pode indicar em sua

área de abrangência a regulamentação de áreas especiais. Logo ambos os

instrumentos podem destacar vazios onde preferencialmente se queira ins-

talar habitação de interesse social.

No rol dos instrumentos não regulamentados previstos pelo PDN, há

dois que são especialmente caros ao bairro de Ponta Negra. O primeiro deles

é a AEIS Vila de Ponta Negra, a qual está delimitada, mas ainda não rece-

beu regulamentação específica. Ao fazê-lo, devem ser estabelecidos parâ-

metros de uso e ocupação do solo urbano, bem como devem ser delimitadas

áreas para a aplicação de instrumentos urbanísticos para que possibilitem

que os lotes vazios passem a cumprir uma função social. Para tanto, devem-

se estabelecer parâmetros que permitam a regularização fundiária do maior

número de lotes possível, visando sua utilização para receber habitações de

interesse social. Assim devem ser propostos parâmetros mais flexíveis, tais

como um lote padrão de 120,00 m². Da mesma forma, sobre a AEIS devem

incidir os instrumentos de PEUC, IPTU Progressivo no Tempo e Consórcio

Imobiliário, a fim de fazer com os imóveis ociosos sejam incentivados a ter

uma utilização.

O segundo instrumento que carece de regulamentação específica

é a ZPA 6. Apesar dessa zona estar fora da área de estudos, a presença das

dunas que a compõem é um dos principais monumentos paisagísticos da

cidade. A sua regulamentação poderia prever a utilização da área para estu-

dos, o que poderia ser de grande contribuição para a produção científica a

respeito de seu bioma.

Dois instrumentos que são aplicados de forma associada e estão

previstos no PDN são o PEUC e o IPTU Progressivo no Tempo. Ainda que

o plano determine a sua existência, estão ausentes os conceitos de imóveis

não edificados, subutilizados e não utilizados, como abordamos anterior-

mente, mas também não estão delimitadas as áreas em que eles podem in-

cidir. Portanto, a sua regulamentação deve ser feita de modo a tornar possí-

veis as demais diretrizes apontadas, estabelecendo a estrutura de gestão

necessária para implementação autoaplicável do instrumento.

Um outro importante instrumento para o cumprimento da função so-

cial dos vazios urbanos é o Consórcio Imobiliário. Apesar de já estar pre-

visto, sua regulamentação não é autoaplicável e difere do que é proposto

pelo Estatuto da Cidade. O Estatuto expressa que o Poder Público municipal

poderá facultar ao proprietário da área atingida pelas obrigações sanciona-

das pelo PEUC e IPTU Progressivo no Tempo, uma vez que o proprietário o

solicite, o estabelecimento do consórcio imobiliário como forma de viabiliza-

ção financeira do aproveitamento do imóvel; para tanto, o imóvel é transferido

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para o Poder Público, o qual deve realizar os planos de urbanização ou edi-

ficação, ressarcindo o proprietário, após a conclusão das obras, com unida-

des imobiliárias em valores equivalentes ao imóvel transferido inicialmente

(BRASIL, 2001).

Já no PDN, o consórcio imobiliário se aplica aos imóveis inseridos

em AEIS e em Zona Especial de Preservação Histórica sobre os quais se

queira viabilizar um plano de urbanização ou de recuperação de imóvel edi-

ficado para fins de habitação de interesse social (NATAL, 2007). Assim, as

duas proposições devem ser mescladas, no que toca à revisão da regula-

mentação do instrumento, acrescentando como áreas passíveis de sua apli-

cação aquelas marcadas pelo PEUC e IPTU Progressivo no Tempo.

Uma regulamentação existente que deve ser revista é a da ZET 1,

inserida na AECG. A lei que a regulamentada data de 1987 e está baseada

no PDN 84, utilizando-se de sua concepção de zoneamento funcional para

estabelecer parâmetros urbanísticos diferenciados para cada uso de solo

permitido. Assim, ao revisá-la, devem ser adequadas as prescrições hoje vi-

gentes, estabelecendo os mesmos valores de lote padrão, coeficientes e ta-

xas, mas mantendo a restrição de gabarito, visto que a sua existência se dá

em função da proteção à paisagem da orla de Ponta Negra. Entretanto, a

revisão dessa regulamentação não pode se dar através da revisão do PDN,

visto que é uma lei independente. Porém, a sua regulamentação é possível

através do estabelecimento do PS Ponta Negra, como veremos a seguir.

Por fim, deve haver o desenvolvimento do Plano setorial de Ponta

Negra. De acordo com o PDN, os PSs são instrumentos legais de planeja-

mento urbano e ambiental que têm como objetivo detalhar o ordenamento do

uso e ocupação do solo urbano de uma ou mais unidades territoriais, a de-

pender de sua complexidade, com vistas a otimizar a função socioambiental

da propriedade e compatibilizar o seu adensamento à respectiva infraestru-

tura de suporte (NATAL, 2007). Segundo o PDN:

Art. 92 - A partir dos estudos realizados na área, os PS devem indicar soluções urbanas, viárias, de transporte e trânsito, de infra-estrutura, localização e dimensionamento de equipamen-tos e serviços, levando em conta a população residente e usu-ária, a paisagem, o conforto ambiental urbano, a dinâmica do mercado, a implantação de grandes projetos públicos ou pri-vados já previstos, além de indicar, quando possível, as fontes de recursos disponíveis.

§1º - A norma destinada à instituição dos PS deve incluir as propostas de regulamentação e atualização das legislações específicas quando incluírem áreas especiais de interesse so-cial e zonas de interesse turístico ou de proteção ambiental.

§2º - Também deverão ser indicados na elaboração dos PS os imóveis passíveis de parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, de direito de preempção, de IPTU Progressivo e de consórcios imobiliários. (NATAL, 2007)

Com a definição do PS Ponta Negra, então, mesmo que passada a

revisão do PDN, é possível promover alterações e detalhamentos nas Áreas

Especiais e ZPAs inseridas no território do bairro, assim como podem ser

delimitadas manchas para a implementação de instrumentos urbanos. Dessa

forma, as diretrizes que seguem para cada tipo analisado devem ser

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incorporadas ao PS. Mesmo que algumas dessas propostas também sejam

da alçada do PDN, a sua inserção em um PS dedicado a uma unidade terri-

torial específica pode conter uma maior reflexão sobre as suas abrangências.

Sendo assim, agora passaremos a tratar das diretrizes pensadas para cada

tipo desenvolvido.

5.1. Tipo 1 Quadro 7 Tipo 1

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 1 Qualquer área Áreas verdes 8

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Para o tipo 1, áreas verdes não qualificadas, por se tratarem de lotes

para os quais já está previsto um uso, mas cujo estado de conservação não

o permite, sugerimos que elas recebam a devida qualificação. A existência

desses espaços é muito importante para promover o lazer e o encontro entre

as comunidades, sendo, em muitas localidades, o espaço disponível para a

reunião de grande número de pessoas, logo devem ser dotados de mobiliário

e equipamentos que o permitam. Para tanto, essas áreas devem ser ratifica-

das como logradouros públicos e pensadas como elementos inseridos num

Sistema de Espaços Livres (SEL), sendo a sua qualificação pensada de

forma articulada entre os demais espaços. Para tal, o plano setorial de Ponta

Negra deve apontar os usos que essas áreas verdes devem ter a partir das

necessidades da população em seu entorno.

5.2. Tipo 2 Quadro 8 Tipo 2

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 2 Qualquer área ZPA 157

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Os vazios inseridos na ZPA 5, em função da finalidade da zona de

preservação de características ambientais, não devem receber estímulos à

sua ocupação. Para tal, devem ser respeitadas as prescrições da ZPA e suas

subzonas, porém estas precisam passar por uma revisão. A atual delimita-

ção das subzonas, prevista pela Lei nº 5.565, de 21 de junho de 2004

(NATAL, 2004), não considera a sobreposição da APP, que se trata de uma

legislação federal, assim, há trechos da APP que não estão inseridos na ZPA,

bem como ela não está contida exclusivamente na subzona de preservação.

Outra fragilidade é que o texto da lei associa as prescrições urbanísticas da

subzona 4 ao plano diretor de 1994, cujos valores de referência distam dos

atuais. Por fim, nessa regulamentação específica, a Transferência de Poten-

cial Construtivo (TPC) só é passível de aplicação na subzona 1, o que pode-

ria ser estendido às demais subzonas como forma de reduzir o potencial

construtivo dessas áreas.

Dessa forma sugerimos que a ZPA 5 tenha seus limites ampliados,

incorporando as delimitações da APP que a ela se sobrepõe. Também en-

tendemos que a sua regulamentação específica deve ser revisada, a fim de

vinculá-la ao PDN atual, delimitando toda a extensão da ZPA como passível

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123

de receber o instrumento da TPC como forma de desincentivar a ocupação

dessa área.

5.3. Tipo 3 Quadro 9 Tipo 3

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 3 Abaixo de 200,00m² ZAB e AECG 6

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Os lotes não edificados e sem uso cuja área é menor que 200,00 m²

inseridos na AECG e nas demais localidades da ZAB onde não há sobrepo-

sição de áreas especiais são um conjunto pequeno, mas que não podem ser

inseridos no mercado formal diretamente. Por suas áreas serem menores

que a do lote padrão, para que esses terrenos recebam edificações do mer-

cado formal, precisam passar por um processo de regularização. Após isso,

de acordo com o artigo 30 do PDN, esses lotes não apenas estarão aptos à

construção, mas também podem, desde que comprovem que são oriundos

de um parcelamento realizado há mais de 10 anos, poderão ter taxas de ocu-

pação acima de 80% (NATAL, 2007). Caso não sejam, deverão submeter-se

aos atuais parâmetros da taxa de ocupação.

5.4. Tipo 4 Quadro 10 Tipo 4

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 4 Abaixo de 200,00m² AEIS 10

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Os lotes inseridos na AEIS Vila de Ponta Negra cujas áreas são me-

nores que 200,00 m² são semelhantes aos do tipo 3, entretanto, por estarem

em uma área especial ainda não regulamentada há especificidades. A regu-

lamentação específica de áreas especiais pode estabelecer lotes padrões

com características diferenciadas em relação às demais localidades do mu-

nicípio. Dessa forma, sugerimos a AEIS Vila de Ponta Negra, que já está

delimitada, seja regulamentada, contemplando a adoção do lote padrão de

120,00 m², como recomendam Barros, Silva et al. (2019, p. 57-58). Tendo

em vista as características sociais da Vila, é possível prever uma taxa de

ocupação de até 100% do lote, desde que seja feita a infiltração de água da

chuva dentro do terreno.

Ainda assim, os lotes que estiverem abaixo do padrão nas AEIS, por

sua finalidade de proteção de comunidades socioeconomicamente vulnerá-

veis, devem receber regularização fundiária e devem ser destinados à

habitação de interesse social.

5.5. Tipo 5 Quadro 11 Tipo 5

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 5 De 400,00m² a 1.000,00m² Conjuntos 12

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Esses são os lotes não edificados e sem uso inseridos na área dos

conjuntos Ponta Negra e Alagamar cujas áreas são iguais ou superiores a

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400,00 m² e iguais ou inferiores a 1.000,00 m². Uma vez que as característi-

cas dessa área conferem ao território um uso predominantemente residencial

com edificações de baixo gabarito, entendemos que o uso residencial deve

ser estimulado. Do mesmo modo, segundo o PDN, sobre os lotes com mais

de 400,00 m² que abriguem imóveis ociosos, em áreas onde se pretenda

instalar habitações de interesse social, pode ser delimitada uma AEIS de va-

zios (NATAL, 2007).

Assim, recomendamos, pela compatibilidade com os usos já verifica-

dos no lugar e pelas características morfológicas dessa ocupação, que sobre

a área dos conjuntos Ponta Negra e Alagamar haja a delimitação do instru-

mento da AEIS de vazios. Dessa forma, os lotes do tipo 5 devem ser desti-

nados à implantação de habitação de interesse social.

5.6. Tipo 6 Quadro 12 Tipo 6

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 6 Acima de 1.000,00m² AEIS 19

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Sobre os vazios cujas áreas são maiores que 1.000,00 m² inseridos

na AEIS deve haver incidência dos instrumentos de PEUC e IPTU Pro-

gressivo no tempo, os quais já são previstos para imóveis não edificados,

subutilizados e não utilizados em todo o território do município (NATAL,

2007), assim como o Direito de Preempção também deve ser

regulamentado de forma a abarcar esses vazios urbanos. Dessa forma,

tendo em vista a carência que a comunidade da Vila possui quanto à oferta

de equipamentos e serviços públicos de moradia, educação, saúde, esporte,

cultura e lazer, esses lotes podem ser objeto de desapropriação ou aquisição

por meio da aplicação do direito de preempção para abrigar usos que apla-

quem essas necessidades ou, no mínimo, que a destinação adequada, ainda

que privada, desses imóveis mudem a condição atual de muitos desses ter-

renos, os quais são irregularmente utilizados para descarte de lixo.

5.7. Tipo 7 Quadro 13 Tipo 7

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 7 Acima de 1.000,00m² ZAB 92

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Sobre os lotes não edificados e sem uso inseridos na área da ZAB

onde não há sobreposição de áreas especiais cujas áreas são superiores a

1.000,00 m² há, segundo o PDN, a prescrição dos instrumentos de PEUC e

IPTU progressivo no tempo (NATAL, 2007). Ao mesmo tempo, devemos con-

siderar que não se tratam de lotes inseridos numa área plenamente dotada

de infraestrutura urbana que dê suporte à intensificação de sua ocupação.

Dessa forma, a indução à utilização desses imóveis deve ser comedida. Por

outro lado, há uma carência de equipamentos e de serviços urbanos na re-

gião que poderia ser aplacada com a adequada utilização desses terrenos.

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125

Sendo assim, o desenvolvimento do instrumento do Plano Setorial

de Ponta Negra deve apontar as necessidades de equipamentos de moradia,

esporte, educação, saúde, cultura e lazer para o bairro, tendo como um de

seus objetivos a instalação desses equipamentos e como diretriz a destina-

ção preferencial desses vazios a essas finalidades. Para tanto, uma vez de-

marcados esses vazios como passíveis de PEUC e IPTU Progressivo no

tempo, o Poder Público municipal deve sinalizar os imóveis que tem interesse

de estabelecer Consórcio Imobiliário, promovendo a adequada urbaniza-

ção da área, em acordo com as necessidades apontadas. O PDN deve tam-

bém assinalar os vazios desse tipo como passíveis do instrumento do di-

reito de preempção, com o objetivo de o Poder Público municipal adquirir

os imóveis por meio de compra para dar a devida destinação, de acordo com

as necessidades verificadas e diretrizes estabelecidas para a macrozona.

5.8. Tipo 8 Quadro 14 Tipo 8

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 8 De 200,00m² a 1.000,00m² AEIS 90

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Os vazios cujas áreas são iguais ou superiores a 200,00 m² e iguais

ou inferiores a 1.000,00 m² e que estejam inseridos na AEIS, assim como o

tipo 4, devem ser destinados à habitação de interesse social e devem receber

regularização fundiária, visto que se tratam, em sua maioria, de lotes origi-

nados por parcelamentos informais. Entretanto, em virtude de suas

dimensões serem superiores às do lote mínimo, suas respectivas taxas de

ocupação não devem ultrapassar 80% ou aquelas estabelecidas para a

AEIS, em caso de sua regulamentação.

5.9. Tipo 9 Quadro 15 Tipo 9

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 9 Acima de 200,00m² AECG 111

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Os lotes não edificados e sem uso inseridos na AECG cuja área é

maior ou igual a 200,00 m² estão submetidos à regulamentação da ZET 1.

Essa legislação, aprovada antes do atual PDN, prevê suas prescrições ba-

seando-se no uso do solo ao qual a edificação se destinará, não permitindo

alguns usos (NATAL, 1987). Assim entendemos que essa regulamentação

deva ser revista, permitindo todos os usos, e alinhando os parâmetros com

os atualmente utilizados pelo PDN.

Nesse conjunto de vazios também estão inseridos lotes que são in-

feriores aos atuais parâmetros de lote padrão para a AECG, que é igual a

360,00 m². Por entender que essa área especial se constitui como forma de

manutenção do potencial cênico-paisagístico da área e que suas prescrições

são meios para restringir a ocupação verticalizada da região, uma prescrição

de lote padrão semelhante às demais áreas da cidade possibilitaria a regula-

rização de lotes com baixo potencial construtivo, logo, em conformidade com

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126

os princípios da AECG. Dessa maneira, recomendamos que, na revisão da

sua regulamentação, o lote padrão seja o mesmo da ZAB: lotes com área

mínima de 200,00 m² e testada de 8,00 m.

5.10. Tipo 10 Quadro 16 Tipo 10

Tipos Área Localização Nº de vazios

Tipo 10 De 200,00m² a 1.000,00m² ZAB

289 De 200,00m² a 400,00m² Conjuntos

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

Os vazios inseridos na área da ZAB onde não há sobreposição de

áreas especiais cujas áreas são iguais ou superiores a 200,00 m² e iguais ou

inferiores a 1.000,00 m² e os vazios inseridos na área dos conjuntos habita-

cionais cujas áreas são iguais ou superiores a 200,00 m² e inferiores a 400,00

m² não devem ter sua ocupação estimulada. Uma vez que esses lotes estão

inseridos em uma área onde não há infraestrutura em condições que supor-

tem grandes adensamentos populacionais, não devem receber incentivos

de qualquer forma à sua ocupação.

A partir da proposição dessas diretrizes gerais e específicas, elabo-

ramos um quadro síntese dessas elaborações. Dessa forma, como se vê no

Quadro 17, as listamos e dispomos de acordo com a sua proposição e des-

crição, destacando os tipos aos quais correspondem.

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127

Quadro 17 Síntese das diretrizes

Tipos Diretriz Descrição

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erai

s

Com

bate

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va-

zios

urb

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com

o um

a di

retr

iz

do P

DN

;

Art. 4º (...)

XV – a prevenção da formação e consolidação de vazios urbanos ao longo do território, estabelecendo instrumentos para o seu com-

bate e definindo áreas prioritárias para a transformação desses vazios em imóveis com usos adequados ao cumprimento da função soci-

oambiental da propriedade.

Inse

rção

do

conc

eito

de

vazi

o ur

bano

no

PD

N;

Art. 6º - Para os fins desta Lei são adotadas as seguintes definições: (...)

XXIX – lote subutilizado – aquele lote cujo coeficiente aproveitamento seja inferior ao coeficiente de aproveitamento mínimo (0,1), que

apresente exclusivamente ocupação transitória, ou que não apresente ocupação, mas apresente uso em desconformidade com o artigo

3º, descumprindo a função socioambiental da propriedade; considerando-se os lotes cujo uso seja exclusivamente de estacionamentos

como subutilizados, excetuando-se edifícios garagem. (...)

XLVII – vazio urbano - o imóvel – lote ou edificação – situado numa parcela do município passível de uso e/ou ocupação que não exerce

a sua função social/socioambiental da propriedade, podendo ele estar: não edificado, subutilizado ou não utilizado.

XLVIII – lote não edificado – aquele cuja área construída é igual a zero.

XLIX – edifícios subutilizados – devem ser entendidos como sendo as edificações cuja utilização em conformidade com o cumprimento

da função socioambiental da propriedade seja inferior à metade da área construída ou cujos usos verificados descumpram a função so-

cioambiental da propriedade.

L – edifício não utilizado – é aquele onde não se verifica quaisquer tipos de utilização.

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128

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urba

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ada

uma

dela

s;

Art. 9º – Zona de Adensamento Básico (ZAB) é aquela onde as parcelas do tecido urbano cujos serviços de infraestrutura urbana aten-

dam de forma deficitária os seus habitantes, devendo o seu adensamento populacional não ser incentivado.

§1º – São objetivos da ZAB:

I – Combater a formação e manutenção de grandes terrenos em situação de vazio urbano;

II – Dotar de equipamentos e serviços públicos as áreas inseridas nessa zona de forma proporcional à sua referente demanda populaci-

onal no tocante aos aspectos de infraestrutura urbana, saúde, educação, lazer e áreas verdes. (...)

§2º – São diretrizes da ZAB:

I – Caracterização de lotes não edificados e sem uso cujas áreas sejam maiores que 1.000,00m² como vazios urbanos passíveis de

aplicação dos instrumentos urbanísticos de PEUC, IPTU Progressivo no Tempo e Direito de Preempção;

II – Destinação dos imóveis caracterizados como vazios urbanos adquiridos por meio do direito de preempção ou de posse do poder

público, obrigatoriamente, para a instalação de equipamentos e serviços públicos de infraestrutura urbana, saúde, educação, lazer e

áreas verdes.

Art. 11 – Zona Adensável (ZAd) é aquela onde as condições do meio físico e a disponibilidade de infraestrutura urbana operante possi-

bilitam o adensamento populacional através da concessão de coeficientes de aproveitamento acima do básico.

§1º – São objetivos da ZAd:

I – Combater a formação e manutenção de vazios urbanos;

II – Dotar de equipamentos e serviços públicos as áreas inseridas nessa zona de forma proporcional à sua referente demanda populaci-

onal no tocante aos aspectos de infraestrutura urbana, saúde, educação e lazer;

III – Estimular o aumento da densidade populacional em sua extensão. (...)

§2º – São diretrizes da ZAd:

I – Caracterização de lotes não edificados e sem uso cujas áreas sejam maiores que 200,00m² como vazios urbanos passíveis de apli-

cação dos instrumentos urbanísticos de PEUC, IPTU Progressivo no Tempo e Direito de Preempção;

II – Destinação dos imóveis caracterizados como vazios urbanos arrecadados ou de posse do poder público, obrigatoriamente, para a

instalação de habitação de interesse social, equipamentos e serviços públicos de infraestrutura urbana, saúde, educação e lazer.

Page 135: ESPECULAÇÃO, SOL E MAR · 2020. 5. 17. · Especulação, sol e mar: os vazios urbanos de Ponta Negra / Saulo Matheus de Oliveira Lima Cavalcante. - Natal, RN, 2019. 156f.: il

129

Pun

ição

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va-

zios

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são

man

tidos

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-

pos

e ce

rcad

os Devem ser notificados os vazios nessas condições, sendo aqueles que assim se mantiverem por até 5 anos da primeira notificação im-

pedidos de utilizar coeficientes de aproveitamento acima do básico por 2 anos, com acréscimo de IPTU nesse período. Havendo a rever-

são da situação, elimina-se a restrição. Não havendo reversão, a sanção permanecerá por mais 2 anos e assim sucessivamente.

inse

rção

da

de-

limita

ção

das

AE

IS d

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zios

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HLI

S e

nos

PS

s.

O PHLIS deve identificar os vazios e destacar aqueles prioritários à caracterização como AEIS de vazios de forma geral em todo o mu-

nicípio. Já o PS pode indicar, na unidade de planejamento territorial à qual se aplica, a regulamentação dessas áreas especiais, desta-

cando vazios onde preferencialmente se queira instalar habitação de interesse social.

Reg

ula-

men

ta-

ção

da

AE

IS;

Propõe-se o estabelecimento de lote padrão de 120,00 m² e a incidência dos instrumentos de PEUC, IPTU Progressivo no Tempo e

Consórcio Imobiliário.

Reg

ula-

men

ta-

ção

da

ZP

A 6

; A sua regulamentação poderia prever a utilização da área para estudos, contribuindo para a produção científica a respeito de seu bi-

oma.

Reg

ula-

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taçã

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ro-

gres

sivo

no T

empo

;

Conceituas os imóveis não edificados, subutilizados e não utilizados, de modo a tornar possíveis as demais diretrizes apon-

tadas, estabelecendo a estrutura de gestão necessária para implementação autoaplicável do instrumento.

Reg

ula-

men

taçã

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cio

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ili-

ário

;

Acrescentar como áreas passíveis de sua aplicação aquelas marcadas pelo PEUC e IPTU Progressivo no Tempo

Rev

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Adequar às prescrições hoje vigentes, estabelecendo os mesmos valores de lote padrão, coeficientes e taxas, mas mantendo a restri-

ção de gabarito.

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Alterar e detalhar as Áreas Especiais e ZPAs inseridas no território do bairro, delimitando manchas para a implementação de instrumen-

tos urbanos e incorporando as diretrizes específicas para cada tipo, expostas a seguir, ao PS.

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130

Tipo 1 Qualificação O PS Ponta Negra deve apontar os usos que essas áreas verdes devem ter a partir das necessidades da população em seu entorno.

Tipo 2 Revisão da Regula-

mentação da ZPA 5

A ZPA 5 deve ter seus limites ampliados, incorporando as delimitações da APP que a ela se sobrepõe. As suas prescrições urbanísticas

devem estar vinculadas ao atual PDN e toda a extensão da ZPA deve ser passível de receber o instrumento da TPC.

Tipo 3 Regularização

Tornar os lotes com áreas menores que a do lote padrão passíveis de receber edificações do mercado formal. Desde que comprovem

que são oriundos de um parcelamento realizado há mais de 10 anos, poderão ter taxas de ocupação acima de 80%, salvo do contrário,

deverão submeter-se aos atuais parâmetros da taxa de ocupação.

Tipo 4 Regularização

fundiária

Na regulamentação da AEIS, deve adotar-se o lote padrão de 120,00 m², sendo possível uma taxa de ocupação de até 100% do lote,

desde que seja feita a infiltração de água da chuva dentro do terreno. Ainda assim, os lotes que estiverem abaixo do padrão nas AEIS

devem receber regularização fundiária e devem ser destinados à habitação de interesse social.

Tipo 5 AEIS de vazios Sobre esses vazios deve ser delimitado o instrumento, destinando essas áreas à implantação de habitação de interesse social.

Tipo 6

PEUC e IPTU Pro-

gressivo no tempo

Estimular a destinação adequada, ainda que privada, desses imóveis de forma compatível com o cumprimento da função social da pro-

priedade, os quais são irregularmente utilizados para descarte de lixo.

Aplicação do Direito

de Preempção

Tendo em vista as carências que comunidade da Vila possui, esses lotes podem ser objetos de desapropriação ou aquisição por meio

da aplicação do direito de preempção para abrigar usos que aplaquem essas necessidades.

Tipo 7

Estabelecimento de

Consórcio Imobiliário

Sinalizar os imóveis em que o Poder Público municipal tem interesse de estabelecer Consórcio Imobiliário, promovendo a adequada

urbanização da área, em acordo com as necessidades apontadas.

Aplicação do Direito

de Preempção

Aquisição pelo Poder Público municipal dos vazios por meio de compra para dar a devida destinação, de acordo com as necessidades

verificadas e diretrizes estabelecidas para a macrozona.

Tipo 8 Regularização

fundiária

Destinação dos imóveis à habitação de interesse social e regularização fundiária, visto que se tratam, em sua maioria, de lotes origina-

dos por parcelamentos informais

Tipo 9 Revisão da regula-

mentação da ZET 1

Devem ser permitidos todos os usos, e os parâmetros devem ser alinhados com os atualmente utilizados pelo PDN.

Tipo 10 não incentivo à

ocupação

Uma vez que esses lotes estão inseridos em uma área onde não há infraestrutura em condições que suportem grandes adensamentos

populacionais, sua ocupação não deve ser estimulada.

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, GOOGLE EARTH, 2019. 2019

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131

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os vazios urbanos são produtos da produção capitalista do espaço.

Quando o foco da construção das edificações e dos espaços da cidade é o

valor de troca, a acumulação dos excedentes e a retenção especulativa do

solo urbano, isso se sobrepõe à função social que esses espaços deveriam

desempenhar. Assim, como consequência, observamos que a valorização

não homogênea da terra dota parcelas do tecido urbano de preços variados

que tendem a ser maiores mediante a oferta de infraestrutura e serviços ur-

banos. Dessa forma, nessas parcelas valorizadas as elites se instalam, apro-

priando-se das estruturas de suporte coletivamente financiadas e relegando

a maior parte da população, a mais pobre, às periferias, áreas informais e

aos centros propositadamente feitos decadentes. Entretanto, a ocupação

dessas áreas valorizadas também não acontece de forma homogênea, pois

as oscilações do mercado, da economia e variados outros fatores fazem com

que, mesmo em parcelas do território de alto preço, haja uma retenção es-

peculativa. Um período de latência em que os vazios expectantes aguardam

mudanças legislativas ou de situação do mercado em que a sua venda possa

render algum lucro. Enquanto isso, há necessidades de variadas naturezas

sobre a utilização dos imóveis urbanos que também esperam serem aplaca-

das pela adequada destinação desses lotes e edificações. Mas enquanto não

há um esforço, uma obrigação ou uma legislação que imponha sobre esses

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vazios urbanos a exigência do cumprimento de sua função social, eles per-

manecem sob especulação, ainda que, pela lei, não o devessem. Foi no sen-

tido de estabelecer as diretrizes para tal cumprimento que esse trabalho foi

desenvolvido.

Na primeira parte do trabalho: Vazios Urbanos e o Direito à Cidade

em Natal, expomos os conceitos e reflexões que nortearam a pesquisa. No

capítulo 1, A Produção Capitalista do Espaço e o Direito à Cidade na Con-

temporaneidade, discutimos como esse sistema socioeconômico estabelece

um modo de produzir o espaço urbano que, norteado pela lógica da acumu-

lação capitalista, subjuga o seu valor de uso ao valor de troca, transformando

a terra em uma mercadoria de alto preço. Desse modo, as localizações dos

elementos do tecido urbano se valorizam uns em relação aos outros, ha-

vendo, portanto, áreas do território com preços mais altos e acessíveis a ape-

nas uma parcela da sociedade. Em seguida, dissertamos sobre como essa

produção interfere na efetivação do direito à cidade na contemporaneidade.

Também expusemos como as legislações que versam sobre a política ur-

bana submetem a propriedade privada a prescrições, visando o cumprimento

de sua função social. Ao final, mostramos como Natal incorpora esses con-

ceitos em sua legislação e como o município se desenvolveu ao longo do

tempo e como se deu o seu regramento urbanístico.

Em seguida, no capítulo 2, Os Vazios Urbanos, discutimos esse con-

ceito a partir dos instrumentos urbanísticos previstos pela legislação, bem

como analisamos o modo como esses vazios se valorizam a partir das loca-

lizações. Dessa forma, compreendemos que vazio urbano é o imóvel – lote

ou edificação – situado numa parcela do município passível de uso e/ou ocu-

pação que não exerce a sua função social/socioambiental da propriedade,

podendo ele estar: não edificado, subutilizado ou não utilizado. Em seguida,

apresentamos como eles são tratados pelo quadro normativo municipal, que

os divide em duas grandes e conceitualmente confusas categorias: 1 – os

lotes não edificados e sem uso e 2 – os lotes e edifícios subutilizados. Essa

classificação difere do que estabelecem os instrumentos do Estatuto da Ci-

dade, o qual prevê uma terceira categoria, edifícios não utilizados. Porém, o

PDN trata os imóveis não utilizados como pertencentes à categoria de subu-

tilizados.

Na segunda parte, O Caso de Ponta Negra, investigamos como a

realidade do bairro pode ser analisada sob a perspectiva do cumprimento da

função socioambiental da propriedade, destacando os seus vazios urbanos

e estabelecendo diretrizes para que cumpram tal função. No capítulo 3, Ponta

Negra, abordamos os aspectos históricos, morfológicos, sociais e legislativos

do nosso universo de estudo. Dessa forma, apontamos o processo de evolu-

ção histórica do território, destacando como o advento da atividade turística

de sol e mar mudou as características do bairro, introduzindo-o no cenário

turístico internacional e fazendo valorizar suas terras. Na sequência, analisa-

mos como o bairro se insere nas Áreas de Grande Concentração das Cama-

das de Alta Renda (AGCCAR) de Natal, mostrando que se tornou um espaço

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de elites locais, ainda que mantenha em seu território a Vila de Ponta Negra,

comunidade originária do lugar. Ao final, expusemos as legislações urbanís-

ticas que incidem sobre o território nas esferas federais e municipais, desta-

cando as APPs, ZPAs, instrumentos e áreas especiais nele inseridas.

No Capítulo 4, Os Vazios Urbanos de Ponta Negra, realizamos a

identificação dos lotes não edificados e sem utilização na área de estudo,

excetuando da análise aquelas lotes inseridos em áreas que não estavam

passíveis de ocupação, tais como as Áreas Non Aedificandi, a ZPA 6, a

subzona de preservação da ZPA 5 e a extensão da APP no entorno da La-

goinha. Assim, foram verificados a partir de imagens de satélite o estado de

ocupação e ociosidade dos lotes integralmente inseridos na mancha onde

essa ocupação e utilização eram passíveis. Com o feito, identificamos 794

vazios urbanos, os quais foram analisados e classificados de acordo com sua

área e sua localização em relação à sobreposição de legislação de áreas

especiais e da ZPA 5 em 10 tipos.

Por fim, no capítulo 5, As Diretrizes, estabelecemos as diretrizes ge-

rais e específicas para cada tipo elaborado a fim de que esses vazios urba-

nos pudessem cumprir a função socioambiental da propriedade.

O sentido da contribuição desse estudo se dá, pois, ainda que o mu-

nicípio preveja, em seu Plano Diretor, instrumentos para coibir a retenção

fundiária especulativa, há obstáculos à efetividade desse combate. Ao reali-

zarmos a pesquisa, observamos inicialmente a inexistência de alguns

conceitos importantes no corpo do regramento urbanístico, bem como a de-

finição confusa e imprecisa de outros conceitos. Também ficou evidente que

a desatualização de algumas legislações e a ausência de regulamentação

específica para alguns dos instrumentos urbanísticos previstos no plano im-

possibilitam a sua aplicação, o que poderia auxiliar na exigência do cumpri-

mento da função socioambiental da propriedade. Assim, áreas especiais,

ZPAs e instrumentos de indução do crescimento poderiam ter um papel mais

incisivo, ao estabelecer na política urbana municipal o objetivo do combate a

esses vazios, contendo o aumento do preço da terra e, consequentemente,

o espraiamento urbano.

Outro aspecto que traz importância à discussão é a realização de

poucas investigações recentes sobre o tema em Natal. Ainda que isso tam-

bém tenha sido um desafio, possibilitou uma reflexão mais concentrada na

conceituação desses vazios sob a ótica da realidade local, bem como a dis-

cussão sobre o que significa para essa realidade marcada pelo contraste en-

tre classes e a segregação socioespacial o cumprimento da função social da

propriedade.

É importante destacar também que o processo de revisão do PDN

colocou a discussão sobre o direito à cidade e os instrumentos da política

urbana na ordem do dia. Projetos de extensão como o Fórum Direito à Ci-

dade, na UFRN, e mobilizações da sociedade civil organizada reaqueceram

o debate do planejamento urbano com vistas ao cumprimento da função

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social da propriedade. Ao longo do desenvolvimento deste trabalho, partici-

pamos das oficinas, audiências e sistematizações do processo revisor. Com

base nas trocas de saberes ocorridas ao longo dessa experiência, pudemos

refletir sobre a extensão de nossas proposições, avaliar ideias para as dire-

trizes que pretendíamos propor e consultar a opinião de pessoas que esta-

vam envolvidas no calor do debate.

Realizar esse Trabalho Final de Graduação foi uma experiência de

aprendizado acadêmico, mas também de crescimento pessoal. Este trabalho

é o terceiro de uma sequência de estudos realizados que se iniciou ainda

durante a disciplina da graduação Projeto e Planejamento Urbano e Territo-

rial 6, com a pesquisa intitulada “Vazios urbanos: estudos morfológicos no

bairro de Capim Macio, em Natal, Rio Grande Do Norte, entre 2007 e 2018”.

Em seguida foi desenvolvido um artigo chamado “Vazios urbanos em Natal:

um estudo para categorização das áreas ociosas e subutilizadas”. Desse

modo, ainda que o período de TFG seja oficialmente de 6 meses, essas re-

flexões começaram há um ano e meio e não pretendem – nem devem – parar

por aqui. Como experiência pessoal, a investigação sobre os vazios urbanos

despertou interesse para um lado do mundo acadêmico até então pouco ex-

plorado, em que foram estabelecidos contatos com a produção e o modo de

produzir conhecimento científico.

Ao longo do trabalho, encontramos uma série de dificuldades que

tiveram de ser encaradas para dar seguimento à investigação, desde

conceituações de formulação confusa na legislação à escassez de dados for-

necidos pelos órgãos reguladores. Ao nos debruçarmos sobre as leis que

embasam a política urbana da esfera federal à esfera municipal, observamos

uma descontinuidade nos conceitos, objetivos e nomenclaturas adotadas.

Em função da elaboração dessas leis se dar em instâncias e temporalidades

diferentes, muitas carregam consigo diferenças, de modo que, apesar de es-

tar hierarquicamente subordinado ao Estatuto da Cidade, o PDN não incor-

pora integralmente sua estrutura e diretrizes, apresentando também algumas

lacunas indevidas quanto à definição e aplicação dos instrumentos urbanís-

ticos.

Assim, o PDN atual não tem em seu corpo, como estabelece o Esta-

tuto da Cidade, que a ordenação e controle do uso do solo devem evitar a

retenção especulativa do imóvel urbano, apesar de algumas versões anteri-

ores terem o preenchimento dos vazios como objetivo. Além disso, ao esta-

belecer os instrumentos de PEUC e IPTU Progressivo no Tempo, o plano

indica sua aplicação a áreas, não especificando se são imóveis como um

todo ou apenas lotes, bem como não apresenta a conceituação de imóveis

não edificados e não utilizados, impossibilitando a sua caracterização. O

único conceito que define é o de lotes ou glebas subutilizados, que confun-

dem aproveitamento com utilização e incorporam à essa categoria os edifí-

cios não utilizados.

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Quando superamos a discussão sobre a legislação e entramos na

análise territorial, nos deparamos com uma base cartográfica desatualizada

e incompleta. Para realizar este trabalho, solicitamos junto à SEMURB a sua

base cartográfica referente aos lotes do bairro. Ao analisarmos esse material,

observamos que havia uma série de lotes sem informações preenchidas e

uma grande parte com informações desatualizadas quanto ao uso da edifi-

cação. Em função disso, os vazios urbanos precisaram ser identificados um

a um, utilizando a base recebida apenas como referência geográfica dos li-

mites dos lotes. Essa situação ilustra como a falta de uma adequada siste-

matização de informações pode ser obstáculo para a implementação de po-

líticas públicas de combate à retenção especulativa, por exemplo. Se o órgão

planejador não consegue sequer identificar os vazios a partir de seu cadas-

tro, não tem condições de formular a utilização de instrumentos para reverter

a sua ociosidade, muito menos de garantir que passem a cumprir a sua fun-

ção socioambiental.

Uma vez que tivemos de identificar os lotes não edificados e sem

uso, a extensão do bairro se mostrou uma dificuldade para a verificação in

loco, assim como o fato de muitos vazios se encontrarem fechados por muros

altos, o que impede a sua completa visualização a partir de um ponto de

observação externo ao lote. Dessa forma, a visualização a partir de uma ob-

servação aérea se mostrava mais eficiente para identificar e atestar que os

lotes estavam de fato sem construções ou utilização. Diante dessa necessi-

dade, a obtenção de fotografias aéreas retificadas se mostrou necessário, o

que se propôs, a princípio, ser resolvido com imagens de drone. Todavia, a

dificuldade de obtenção do serviço e o pouco tempo disponível para tanto

levaram à adoção do procedimento de avaliação de imagens de satélite ob-

tidas pelo Google Earth. Tal decisão deu celeridade ao processo, entretanto

comprometeu a precisão da informação, visto que, no intervalo de tempo das

imagens, os lotes podem ter sofrido mudanças em seu estado de uso ou

terem sido edificados.

Por não termos feito o levantamento desses vazios in loco, algumas

informações não puderam ser coletadas. Uma vez que utilizamos como refe-

rência geográfica dos lotes a base da SEMURB, que consiste em polígonos

definidos a partir da projeção dos limites do terreno em um plano – descon-

siderando as variações do relevo do solo –, não pudemos atestar as dimen-

sões desses lotes em verdadeira grandeza. Assim, a obtenção de suas áreas

e tamanho de testadas não correspondem com as dimensões registradas por

esses imóveis em seus cadastros. Entretanto, parte dos cadastros com tais

informações estavam preenchidos de forma incorreta, ao ponto de haver re-

gistros de lotes com áreas negativas. Dessa forma, a nossa análise foi restrita

às dimensões dessa projeção, o que implicou na avaliação parcial dos lotes

considerados abaixo do padrão, uma vez que eles são definidos como aque-

les com área igual ou superior a 200,00 m² e com, no mínimo, 8,00 m de

testada. Assim, tivemos de desconsiderar na identificação dos tipos o com-

primento da testada e avaliamos somente a área desses lotes.

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Outra informação que não pode ser avaliada pela investigação foi a

titularidade dos lotes. Ao identificarmos os vazios, observamos que muitos

deles se apresentam de forma contígua no território, o que poderia reclassi-

ficá-los quanto ao tipo pertencente, caso se verificassem que têm o mesmo

proprietário. Entretanto, uma vez que não conseguimos essas informações,

optamos por considera-los lotes individuais, mesmo que muitos deles não

apresentem quaisquer elementos divisórios com os vazios lindeiros. Essa é

uma informação que poderia ser buscada em uma investigação futura, pro-

pondo uma reclassificação dos lotes quanto aos tipos elaborados, ou mesmo

no ato da aplicação dos instrumentos indutores do desenvolvimento.

Após concluídas as etapas de desenvolvimento do trabalho, pude-

mos avaliar o cumprimento dos objetivos do trabalho. O primeiro objetivo era

“compreender conceitualmente os vazios urbanos sob a ótica da função so-

cioambiental da propriedade” e acreditamos que, ao desenvolver os dois pri-

meiros capítulos, o atingimos. No primeiro, A Produção Capitalista e o Direito

à Cidade na Contemporaneidade, discorremos sobre como o conceito de fun-

ção social da propriedade é incorporado à legislação como uma forma de

dotar os espaços de um uso em compatibilidade com as atividades urbanas

desenvolvidas, limitando o direito de propriedade em detrimento dos direitos

coletivos e difusos. No segundo capítulo, Os Vazios Urbanos, entendemos,

sob o ponto de vista legislativo que os vazios são um descumprimento da

função social que os imóveis devem exercer, podendo estes se encontrar

não edificados, subutilizados ou não utilizados. Assim, o primeiro objetivo foi

atingido.

O segundo objetivo era “investigar quais são as características dos

elementos constituintes da forma urbana que classificam os lotes não edifi-

cados e sem uso como vazios urbanos”, o que pode ser alcançado com o

desenvolvimento dos capítulos 2 e 3, “Os Vazios Urbanos” e “Ponta Negra”,

respectivamente. No capítulo 2, explanamos o conceito de vazios urbanos e

sua relação com a localização da terra, abordando as formas como são clas-

sificados pela legislação, expondo assim quais são os aspectos considerados

para a caracterização de um imóvel como vazio. No capítulo 3, abordamos

os aspectos históricos, morfológicos, sociais e legislativos de Ponta Negra,

destacando as suas particularidades e elementos que possibilitam a identifi-

cação dos seus vazios.

Para alcançar o terceiro objetivo específico – “caracterizar tipologi-

camente os vazios urbanos identificados” – desenvolvemos o capítulo 4: Os

Vazios Urbanos de Ponta Negra. Nele, foi realizada uma análise tipológica

em quatro etapas, iniciando pela definição da abrangência, quando destaca-

mos as áreas que eram passíveis de ocupação e uso no território de Ponta

Negra e os lotes não edificados e sem uso nelas contidas. Em seguida, fize-

mos uma classificação prévia, agrupando os vazios em famílias, de acordo

com o cruzamento das variáveis de localização e área dos lotes, mediante

intervalos estabelecidos pelos instrumentos incidentes sobre o território do

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bairro. Na sequência, as famílias foram agrupadas de acordo com as suas

semelhanças no aspecto dos instrumentos incidentes para o cumprimento da

função socioambiental da propriedade, formando 10 tipos. Por fim, os tipos

foram analisados, destacando os exemplo-tipo, os lotes que melhor repre-

sentam o grupo.

Ao fim dessas etapas, o objetivo geral do trabalho, “propor diretrizes

de uso e ocupação do solo para os vazios urbanos do bairro de Ponta Negra

a partir da análise dos elementos constituintes da forma urbana com vistas

ao cumprimento da função socioambiental da propriedade”, foi alcançado e

sintetizado no capítulo 5, As Diretrizes. Nele foram estabelecidas diretrizes

gerais para os instrumentos urbanísticos incidentes sobre o bairro, assim

como diretrizes específicas para cada tipo identificado. Assim, entendemos

que o trabalho foi concluído de forma satisfatória dentro daquilo que se pro-

pôs.

Ao final do trabalho, pudemos observar que o combate aos vazios

urbanos é possível com a utilização dos instrumentos urbanísticos já previs-

tos pelo PDN, porém com alguns ajustes. O próprio plano precisa da incor-

poração de conceitos e mudanças na redação de artigos que instrumentali-

zem o combate à retenção especulativa, possibilitando a identificação dos

vazios na cidade e sua categorização. Alguns instrumentos precisam de re-

gulamentações específicas que dotem de efetividade sua aplicação, delimi-

tando áreas especiais e ZPAs com os devidos parâmetros de uso e

ocupação, de modo a estabelecer áreas prioritárias da aplicação de PEUC,

IPTU Progressivo no Tempo, Direito de Preempção, Consórcio Imobiliário e

AEIS de Vazios.

Para tanto, além do aparato legal, é importante que o órgão gestor

da política urbana, orientada pelo Poder Executivo, tenha como objetivo fazer

com que os imóveis da cidade cumpram a sua função socioambiental. É pre-

ciso, para isso, que gestores que não estejam comprometidos com o capital

especulativo-imobiliário sejam eleitos e possam exigir dos proprietários de

tais imóveis a sua adequada utilização. Porém, entre a nossa realidade atual

e o cenário ideal para o planejamento urbano de nossa cidade, há uma dis-

tância a ser percorrida. A diferença entre o ideal e o real é caracterizada pelo

acumulado histórico de legislações avançadas, mas gestões em descom-

passo com tais avanços, presas ao retrocesso de um fazer político que não

vislumbra a emancipação da população ou o valor de uso dos espaços, mas,

sim, gestões comprometidas com a manutenção e fortalecimento de um es-

tado patrimonialista e patriarcal.

Todavia, ainda que seja um grande desafio o estabelecimento de

gestões progressistas, as mudanças nos rumos da política urbana municipal

estão na ordem do dia com o processo de revisão do Plano Diretor. Dessa

forma, é preciso que sejam realizados cada vez mais estudos que contribuam

com melhorias ao plano e a seus instrumentos urbanísticos correlatos. Do

mesmo modo que é preciso que os acadêmicos que os propõem assumam

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a sua função social e sejam protagonistas nos processos decisórios que en-

volvem o tema. São esses estudantes e profissionais que podem associar às

reivindicações populares os conhecimentos técnicos que devem embasar

suas lutas.

É dever dos estudantes, pesquisadores e profissionais que tiveram

acesso à formação acadêmica, sobretudo nas universidades públicas, o rom-

pimento dos limites físicos institucionais. Urge na cidade a necessidade de

que essas pessoas sejam agentes-chave nos processos de mudança social,

em busca de sociedades mais democráticas e orientadas pelo direito à ci-

dade. Devemos somar forças àqueles que, de forma hercúlea, têm feito re-

sistência aos avanços do mercado especulativo-imobiliário e à paulatina ex-

pulsão de comunidades tradicionais de seus territórios.

Lutar contra os vazios urbanos é lutar por justiça socioespacial. É

defender a ideia de que uma nova cidade é possível e que uma nova socie-

dade é necessária. Uma sociedade onde o valor de troca seja superado pelo

valor de uso. Onde a terra não seja entendida como uma propriedade de

preço inalcançável e uma mercadoria restrita às elites, mas como o substrato

de uma sociedade democrática, onde habitar de forma digna seja um direito

de todos, sem distinção de classe. Superar a retenção especulativa e a eliti-

zação da terra significa superar o modo capitalista de produção do espaço.

Significa romper com a divisão de classes. Significa construir uma utopia.

Essa utopia está fixa no horizonte de nossos atos. Cada passo dado

orientado pela justiça socioespacial é um passo que se dá em direção ao

horizonte revolucionário do direito à cidade. São passos dados os posiciona-

mentos pessoais em defesa dos direitos difusos e coletivos de todos, os atos

de enfrentamento ao cotidiano alienante, a produção de conhecimento que

embase as lutas. Portanto, há uma tarefa ininterrupta de prosseguir o cami-

nho e aprofundar os passos.

Sendo assim, recomendamos que os estudos no tema dos vazios

urbanos sejam ampliados. É preciso entender as dinâmicas de outras parce-

las da cidade, assim como os de outros tipos de vazios – os subutilizados e

os não utilizados. É preciso continuar. As pesquisas e as utopias.

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7. REFERÊNCIAS

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APÊNDICES

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APÊNDICE A: Mapa dos vazios urbanos de Ponta Negra classificados por localização

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

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APÊNDICE B: Mapa dos vazios urbanos de Ponta Negra classificados por área

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

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APÊNDICE C: Mapa dos tipos elaborados

Fonte: Produzido pelo autor com base em SEMURB, 2007, IBGE, 2010, QUAPÁ-SEL 2015, GOOGLE EARTH, 2019. 2019.

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ANEXOS

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ANEXO 1: CAPÍTULO DA POLÍTICA URBANA

DA CONSTITUIÇÃO (BRASIL, 1988)

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Po-

der Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por ob-

jetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e ga-

rantir o bem-estar de seus habitantes.

§ 1o O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório

para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da

política de desenvolvimento e de expansão urbana.

§ 2o A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende

às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano di-

retor.

§ 3o As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia

e justa indenização em dinheiro.

§ 4o É facultado ao poder público municipal, mediante lei específica

para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do pro-

prietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que pro-

mova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I – parcelamento ou edificação compulsórios;

II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progres-

sivo no tempo;

III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pú-

blica de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de

resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegura-

dos o valor real da indenização e os juros legais.

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos

e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem opo-

sição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domí-

nio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao

homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2o Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de

uma vez.

§ 3o Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

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ANEXO 2 – ARTIGO 2º DO ESTATUTO DA CI-

DADE

Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvi-mento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:

I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura ur-bana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;

II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formu-lação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de de-senvolvimento urbano;

III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais se-tores da sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao inte-resse social;

IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição es-pacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do cres-cimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;

V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e servi-ços públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais;

VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:

a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;

b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;

c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inade-quados em relação à infra-estrutura urbana;

d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcio-nar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura cor-respondente;

e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subu-tilização ou não utilização;

f) a deterioração das áreas urbanizadas;

g) a poluição e a degradação ambiental;

h) a exposição da população a riscos de desastres natu-rais; (Incluído pela Medida Provisória nº 547, de 2011).

h) a exposição da população a riscos de desastres. (Incluído dada pela Lei nº 12.608, de 2012)

VII – integração e complementaridade entre as atividades urbanas e ru-rais, tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do território sob sua área de influência;

VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambien-tal, social e econômica do Município e do território sob sua área de influência;

IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;

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X – adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e fi-nanceira e dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo a privilegiar os investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos bens pelos diferentes segmentos sociais;

XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha re-sultado a valorização de imóveis urbanos;

XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueo-lógico;

XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efei-tos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população;

XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por po-pulação de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais;

XV – simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais;

XVI – isonomia de condições para os agentes públicos e privados na promoção de empreendimentos e atividades relativos ao processo de urba-nização, atendido o interesse social.

XVII - estímulo à utilização, nos parcelamentos do solo e nas edifica-ções urbanas, de sistemas operacionais, padrões construtivos e aportes tec-nológicos que objetivem a redução de impactos ambientais e a economia de recursos naturais. (Incluído pela Lei nº 12.836, de 2013)

XVIII - tratamento prioritário às obras e edificações de infraestrutura de energia, telecomunicações, abastecimento de água e saneamento. (Incluído pela Lei nº 13.116, de 2015)

XIX – garantia de condições condignas de acessibilidade, utilização e conforto nas dependências internas das edificações urbanas, inclusive nas destinadas à moradia e ao serviço dos trabalhadores domésticos, observa-dos requisitos mínimos de dimensionamento, ventilação, iluminação, ergono-mia, privacidade e qualidade dos materiais empregados. (Incluído pela Lei nº 13.699, de 2018)