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João Felinto Neto
Espinhos
Do
deserto
Poemas – 1ª Edição – Mossoró - 2008
2
2008 © Copyright by João Felinto Neto
F315e Felinto Neto, João.
Espinhos do deserto / João Felinto Neto. – Mossoró, 2008.
120p. ( 1ª Edição)
ISBN: 978-85-60656-17-2
1. Literatura brasileira 2. Poesia norte-rio-grandense
CDD: B867.1 CDU: 82 (813.1) - 1
João Felinto Neto Rua: Francisco de Assis Silva, 1001 - Santa Delmira I
– Mossoró, RN CEP: 59 615 – 790
Fone – (0XX84) 3318 4245 e-mail: [email protected] Site: joaofelintoneto.xpg.com.br Site: joaofelintoneto.xpg.com.br Site: joaofelintoneto.xpg.com.br Site: joaofelintoneto.xpg.com.br
Proibida a reprodução total ou parcial, por
quaisquer meios. A violação dos direitos do autor (Lei nº 9.610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do código
penal. Depósito legal na Biblioteca Nacional conforme Lei nº.
10994 de 14 de dezembro de 2004.
3
Índice
Dedicatória 09 Prefácio 11
Dados biográficos 13 Espinhos do deserto 15
Insanidade 16 O servo e a princesa 17
Não verdadeiro 18 Muitas histórias 19
Simplesmente sofrer 20 Possuído 21 Manibu 22
O segredo 23 Censura 24 Para trás 25
Urgência inesperada 26 Ao vento 27
Soneto da declaração 28 O fracasso 29
O palhaço estuprador 31 Sem alma 32
4
Fino vestido 33 Das respostas 34
Quadro da morte 35 Nas trevas 36 Sou solitário 37 De alguém 38
Outra opinião 39 Modernidade e desgraça 40
O líder 41 Madeira aproveitada 42
Vida breve 43 Atos proibidos 44 Dama ardente 46
Penúltima entidade 47 Histérica 48
Como outrora 49 Ofensa 50
Mulher amada 51 Sem par 53 Carona 54 Ofendido 55
5
Pela raiz 56 Natureza 57
A hora do orgasmo 58 Olhos de azulão 59
Como vê 60 Uma mão 61
Se fossem sãos 62 Entre corpos nos quintais 63 Em tom de brincadeira 64
Meu coração morre por mim 65 Aquela saudade 66 Paraíso anônimo 67
A inversão 68 A fantasia 70
Quando choro 72 A resposta é não 73 Minha geração 74 Tentativas 75
Exploração do medo 76 Remoinho 77
Os três poderes 78
6
O pedinte 81 Por ser louco 83
Romã 84 Tolos 85
Sonho especial 86 Sade 87
A centenária 88 O rosto 89
Em silêncio 90 Melito 91
No ponto 92 Uuh! 93
A pizzaria 94 O ambiente 95 Manhas 96
Todos vocês 97 Perturbador 98
Se não me dou 99 Porta aberta 100 Voa pra casa 102
O fruto proibido 103
7
Na raia 104 Entre flores e espinhos 105 Entre espada e poder 106
Trágica visão 107 O perdão 109 Complexo 110
Versos mórbidos 111 Até a morte 112 Desprezível 113 Vazio imenso 114
Para fugir de tudo 115 Vulto 116
No meu rosto 117 Pela calçada vazia 118
Imerecidos 120
8
9
Dedicatória
Aos que temem os espinhos da vida, talvez por desconhecer sua necessidade, ou simplesmente por medo de ferir-se.
10
11
Prefácio Aguilhoada por versos que como espinhos, chamam a minha atenção, prefacio Espinhos do deserto, com o mesmo entusiasmo que um biólogo analisaria um espécime rústico e ao mesmo tempo exuberante.
O poeta enveredou-se na solitária trilha de um deserto causticante para intitular sua mais recente criação, extraindo dos espinhos a beleza e a agudeza ao ferir para proteger sua sobrevivência. Espinhos do deserto realça em suas páginas, a temeridade ante o perigo de ferir-se e o deleite diante do colorido das composições poéticas. Os caminhos mais difíceis, muitas vezes, nos levam a lugares exuberantes. Espinhos do deserto é um deles.
Anita Hélida
12
13
Dados biográficos No dia 04 de outubro de 1966, nasce
João Felinto Neto, em Apodi, Rio Grande do Norte. São seus pais Maria Dália Pinto, natural de Apodi e Francisco Felinto Neto, natural de Pombal. São seus irmãos e irmãs, Francimar Felinto Pinto, Francisco Felinto Filho, Gilberto Felinto, Maria da Conceição Felinto e Maria de Fátima Felinto. Em 1969, parte com sua família para Tabuleiro do Norte no Ceará. No mesmo ano passa a residir em Limoeiro do Norte, sua pátria emotiva e ponto de partida de uma fase migratória que duraria toda a sua infância, e o levaria até Santa Isabel/PA (1971), Limoeiro do Norte/CE (1973), e Mossoró/RN (1974), onde ingressa, no Instituto Dom João Costa no ano de 1975. Retorna novamente a Limoeiro do Norte (1977), onde permanece até 1982, ano em que conclui o 1º grau no Liceu de Artes e Ofícios.
14
Retorna definitivamente, com sua família à cidade de Mossoró. Conclui em 1985 o 2º grau na Escola Estadual Prof. Abel Freire Coelho.
Em 1986 ingressa no serviço público, como técnico de Laboratório do Hospital Regional Tancredo Neves, atual Tarcísio Maia.
Conclui o curso de Ciências Econômicas, pela UERN, em 1991, ano em que se casa com Lucineide Régis Felinto. O primeiro filho do casal, João Vítor Regis Felinto, nasce em 1997. Somente aos 34 anos, começa escrever e catalogar poemas e crônicas. Até então seu mundo literário se resumia à leitura e ao pensamento.
15
Espinhos do deserto
Vegetação que é rude pela vida. Sobrevivência e defesa; Espinhos do deserto,
Uma certeza Que lutar é o correto.
São versos
Que perfuram nosso anelo, Para não serem sozinhos.
Espinhos
Que são duros, porém, belos, Num deserto de carinhos.
Espinhos do deserto, Um oásis poético No caminho.
16
Insanidade
Arrebentar meu corpo Sob a mão querida,
Não seria Racional.
Minha insanidade mental Mentiria
Ao dizer que sou normal. Cansei de demonstrar um equilíbrio
Emocional, Enquanto o tal
É o meu desequilíbrio. Já não me interessa o bom senso.
Meu contra-senso É a loucura.
Esta é a minha conduta, A postura
De um mísero canibal.
17
O servo e a princesa
Eu diria que você É apenas uma escrava Que me tira as sandálias
Por prazer.
Lava os meus pés nas lágrimas Que seus olhos
Acabaram de verter.
Eu queria entender O que se passa;
Uma princesa que se agacha Para ao seu servo,
Atender.
18
Não verdadeiro
Amo esse teu jeito De manter-se à distância,
Mesmo quando minha mão alcança O seu leito.
Amo esse teu jeito
De criança, Onde a esperança
Tenta superar o meu defeito.
Amo Tanto quanto amaria,
Uma filha Ao seu pai não verdadeiro.
19
Muitas histórias
Talvez, por muitas histórias, Fosse a história perdida.
Um conto Que conta Um tanto Do quanto
Se escreveria.
20
Simplesmente sofrer
Aquela vontade de ver, De ter, de sentir.
Que não nos deixa dormir E muito menos comer.
Aquela vontade de querer Possuir.
Vontade de nos despir Para morrer.
Vontade que não se pode esconder. Aquela vontade,
Pode crer, É simplesmente sofrer.
21
Possuído
Tenho a sensação de que você me possuiu Tal uma virgem
Tem a alma exposta ao diabo. Tenho a impressão de um sacrifício
A um deus omisso Que condena os meus pecados.
Na satisfação, Fiquei perdido.
Na desilusão, Fui encontrado.
22
Manibu
Um senhor, uma senhora, O filho, o neto e a nora,
Sem importar-se com as horas, Desfrutam do bom humor.
Uma coberta de palha, Uma carnaúba pintada, Fincada à beira da água, Amenizando o calor.
Um lugar aconchegante,
Onde observo, um instante, O vento mover a água. Fica tão próximo à praia, Que a água meio salgada, Tem um estranho sabor.
Por que não darmos valor Às coisas de nossa terra? A vida parece eterna
No lugar onde eu estou.
23
O segredo
Não há esperança onde há medo, E nunca é cedo Para lutar.
Se queres desvendar O segredo,
Procura em si mesmo Que irás encontrar.
24
Censura
O que querem os homens Quando se censuram? Querem ser tão puros Quanto os seus mitos Ou ditarem os ritos De seu próprio culto?
Já somos adultos Para calar o riso,
Para deter as lágrimas Desse triste luto.
25
Para trás
Quão grande amor seria desfrutado, Não fosse eu, agora, Um eterno defunto
Que sob a lápide sente-se enojado Com seu caixão rachado, Com esse chão imundo.
Queria um espelho
Para olhar meus olhos fundos Por ter chorado tanto Pelo dia macabro.
Um noivo amado, Deixou para trás
O mundo.
26
Urgência inesperada
Sento-me Pela urgência inesperada,
Enquanto o corpo Arrepia-se de cólica.
Bucólica, A nudez que nos desarma E o gemido que se solta. O ar pútrido se espalha;
A face amarelada Se deforma.
Esdrúxula hora, A que o homem não controla
E desova Sua líquida e fecal massa.
27
Ao vento
Deuses sucumbiram ao silêncio; Sob eles, os pagãos.
O monoteísmo atravessa o tempo, Sob a égide dos cristãos.
Em meu ateísmo, Sacramento
É sinal que ao vento Voa, minha salvação.
28
Soneto da declaração
Quero declarar o meu amor De uma maneira não moderna; Com flores e recados à janela,
Com versos declamados ao sabor.
Eu quero por Seu rosto em aquarela;
À luz de velas, Beijar-lhe com pudor.
Quero ter o vento a meu favor
Para sentir o cheiro dela, Para saber aonde vou.
Quero para sempre, meu amor, Acreditar que a vida é bela
Enquanto ainda sinto seu calor.
29
O fracasso
Eu sei que a vida me leva em trapos. Caldeirões de barro De bruxos modernos. Favelas de inferno, Diversos buracos.
São armas de ferro. São balas de aço. Sou eu, o fracasso
De um programa sem sucesso.
Eu sei que a morte me olha de perto; Que chego a sentir o seu frio abraço.
Eu fumo, eu prego Minha mão no maço De notas sem eco.
São barras de ferro. Algemas de aço.
Eu sei que sou o fracasso De um programa sem sucesso.
30
Eu seu que caminham lado a lado, O errado e o certo,
A ira de Deus E a fama do diabo, Senhores e servos,
Patrões e empregados, Progresso e atraso.
São os mãos-de-ferro Em torres de aço.
Sendo eu, o fracasso De um programa sem sucesso.
31
O palhaço estuprador
Entre sorrisos, A ingenuidade aflora.
E o palhaço vê crianças irem embora. Mas o palhaço, quando sai do picadeiro,
Vê a si mesmo E se apavora.
Então oculta Sua culpa
Por trás de um nariz vermelho Tal o sangue de uma virgem que deflora.
E nessa hora, O seu crime é descoberto. A população, decerto,
O deplora. Ao ser linchado,
O palhaço é condenado Enquanto a morte o devora.
32
Sem alma
O que sou na verdade? Me pergunto.
Sou poeira em um mundo De migalhas Ou a gralha
Que voa sem ter rumo Para ser mera caça. O que faço da vida Que me culpa.
O que faço com a culpa Que me abraça.
Fujo para dentro de mim mesmo? Tenho medo
Desse corpo tão sem alma.
33
Fino vestido
Se eu falo de amor, Ela diz: - Que ridículo. Com o olhar inibido De quem ama.
Se a convido para a cama...
- Atrevido.
Se eu sair escondido? - Um sacana.
Se levanto o seu fino vestido,
Sou um velho enxerido Que se engana.
No entanto, se fico contido... Ela tira o seu fino vestido
E me ama.
34
Das respostas
Quando o homem necessita Busca respostas para a fome,
Para as doenças que o consome Todos os dias.
Quando tem em abundância,
O supera a ganância E o homem a si, basta.
Quando em desgraça,
Enlouquece. De sua existência esquece
E vive de melancolia.
Quando está em harmonia, O homem se questiona,
Busca respostas para a vida Que tanto o emociona.
35
Quadro da morte
Sonho que a morte É extremamente bela; Põe o rosto na janela E me diz: - Poeta, Não és de sorte. Vim buscar-te.
Sua voz não era grave. Era meiga e suave,
E um pouco acanhada.
Com a janela escancarada, Faço da morte uma arte
Na qual, ela não sustentava Uma adaga afiada De fino corte.
Pintei a morte cabisbaixa E em silêncio.
Acordei com o frio vento Que pela janela entrava.
36
Nas trevas
Agora, a vida não me espera. Agora, o tempo não me espera. E eu não espero mais nada.
Não há para mim Noites sem trevas.
Onde encontro luz na terra, Minha humanidade apaga.
37
Sou solitário
Não vivo só, Sou solitário
Tal um peixe no aquário Entre vários semelhantes
Da mesma espécie. Não me aborrece Ser diferente;
É que toda essa gente Não me esquece.
38
De alguém
Você não é só minha. Também não é sozinha. Jamais será de todos
Por não ser de ninguém. Talvez, pertença a si mesma
Ou simplesmente seja De alguém.
39
Outra opinião
Disse-me um dia, um senhor, Que quem vive de ilusão É um mero perdedor. Sou de outra opinião. Não importa a razão, O credo ou a condição, Para quem vive de amor. Pois, quem vive de amor Também vive de ilusão. Perdoe-me a conclusão: Mas quem vive de ilusão É um mero sonhador.
40
Modernidade e desgraça
Você pode até achar Que eu estou imaginando
Todavia, enquanto Um carro passa,
Um velho carneiro pasta E um urubu paira,
Voando. Modernidade e desgraça
Assolam o homem do campo.
41
O líder
Quando minhas palavras Não forem suficientes Para vos dar firmeza, Com atos e proezas Deveis ir em frente
Em formações coesas.
Quando nossas armas Ferirem o oponente Com a mais vil frieza, Seremos inocentes
Por sermos mais valentes, Podeis ter certeza.
Nossa vitória é a mesma. Oh! Bravos dissidentes,
O ideal presente Será nossa grandeza.
42
Madeira aproveitada
Sou uma árvore tombada Em silêncio, Pelo tempo
Que minha avó a plantara.
Sem dividir meus frutos, Sem revelar minh’alma.
Os meus ossos corrutos,
Serão madeira aproveitada.
43
Vida breve
Por que a vida é tão breve Para os que tentam vivê-la, Enquanto outros vivem tanto Sem ao menos merecê-la?
Talvez viver o bastante,
Ainda seja Viver os poucos instantes, Da maneira que se deseja.
44
Atos proibidos
Um jovem urinou atrás de um carro, No mesmo ato Sofreu um tiro.
Um outro, seu irmão, ao seu lado, Também foi alvo.
Duas mortes sem sentido.
Quem nunca deu o dedo Quando se manda alguém tomar no C.?
Acredite você, Alguém se achou tão ofendido
Que disparou dois tiros. Mais duas mortes sem sentido,
Sem porquê.
Queria eu saber, Onde está escrito
Que um homem pode ser executado Por viver
E que os mais simples atos Levam-nos ao extremo, que é morrer?
45
Pretendo defender Que ninguém ande armado, Nem mesmo um soldado Cumprindo seu dever.
Nenhum dos assassinos, nesses casos,
Eram bandidos vis e procurados. Mas cidadãos armados Que estavam ofuscados Com o brilho do poder; Poder de tirar vidas,
Simplesmente por querer.
Está em nossas mãos. Na próxima eleição,
Vote em quem merecer. Talvez seja ilusão. O que vamos fazer?
Dá o dedo pra morrer.
46
Dama ardente
Eu adoro o seu nome, Mesmo que você não goste. Está bem o seu decote, Não requer o silicone. Não seja tão exigente
Consigo mesma; Você esbanja beleza,
Dama ardente. Sua boca é inocente
Quando fala. Mas peca cruelmente,
Quando beija.
47
Penúltima entidade
Deixo os meus pecados enterrados Nas profundezas do inferno.
Enquanto o verbo Alimenta-se de minha carne,
A minha alma parte Sob as asas do eterno.
Eu sou, decerto, A penúltima entidade.
48
Histérica
Tenho medo de sair às ruas, Não por temer as suas
Pretensões, Mas por razões
Diversas Que não me cabe às pressas,
Gritar a plenos pulmões. Não cabe a mim
Sermões E nem lições Ou regras.
E pouco me interessa Sua maneira histérica De ver as relações.
49
Como outrora
Os dias de hoje Não são como outrora; Não há mais senhora, Pois não, por favor, Com sua licença, Perdão, paciência, Palavras amenas De enorme valor. Os dias de hoje
Não são como outrora.
50
Ofensa
A minha felicidade, Após a sentença,
Não é pela promessa De sua crença,
Se eu fosse perdoado. Mas, pelo que eu fiz no meu passado,
Pelo sabor de minha inocência. E quando soam os sinos no campanário,
O meu veredicto de culpado: É pura ofensa.
51
Mulher amada
Sem os arroubos de minha juventude, Numa atitude Precipitada,
Eu daria minha própria vida Pela mulher amada.
Sem temer a tumba escancarada,
O ataúde Já de tampa aberta,
Eu trocaria de lugar, na certa, Com a mulher amada.
Eu fitaria seu rosto,
A envolveria com calma Com meu próprio corpo Que somente morto
Possuiria alma.
Meu corpo Antes vazio,
Só teria agora um desafio:
52
O de guardar para sempre, A alma tão presente Dessa mulher ausente Por ele tanto amada.
53
Sem par
Tentei matar Esse amor no coração Por inteiro, em solidão, Depois de nos separar.
Todavia, entre fazer e falar, Há uma enorme distância.
Você é bem mais que lembrança, É uma presença no ar.
Fugir para um outro lugar, Tentar esquecer é em vão; Você é uma estranha visão
Que não sai do olhar.
Quem sabe, eu possa encontrar Um jeito de silenciar
A voz que ainda grita em mim?
Talvez, seja também o fim De um louco sem par.
54
Carona
Despem-se sob a lona, Damas de saia. E cada uma,
Aranha Que suga o sangue
Das palavras. De mão vazia, anda
Tecendo a teia que agarra Os grãos de areia
Que o vento apanha E semeia
No chão da estrada.
55
Ofendido
Acreditou na ilusão De que o inferno se acabou.
Mas não queria ver Ninguém chorar no céu.
As próprias lágrimas, enxugou. No coração, se arrependeu.
Não perdoava Deus Por tê-lo feito ateu.
56
Pela raiz
Prefiro lamentar a vida toda, Por ter feito a escolha
De viver à toa E ser dono do nariz,
Do que acreditar que sou feliz De mãos atadas,
Como árvore desgalhada E imobilizada Pela raiz.
57
Natureza
Vejo o céu cerzido ao mar Pela linha do horizonte; Uma anciã a costurar
Com a luz do sol defronte, Tão sombria e tão distante. Talvez, seja a natureza Encoberta da tristeza
Que ainda lhe causa o homem.
58
A hora do orgasmo
A hora do orgasmo É a hora em que eu encontro
Deus e o Diabo Sentados,
Frente a frente, Olhos nos olhos
E em completo silêncio. Então, eu quebro este silêncio Com meu grito de prazer.
59
Olhos de azulão
O que busca essa mulher Pela qual minto,
Senão A mesma solidão
Que sinto Quando longe de seus olhos de azulão?
Os mesmos olhos
Que me olham da gaiola Quando eu abro a porta E eles vêem a imensidão.
60
Como vê
Por que o mundo vê meu rosto Como vê,
Enquanto não consigo enxergar nada?
Talvez, minha pergunta Esteja errada Ou jamais haja
Alguém pra responder.
Será que meu semblante Só não retrata minha alma
Para o meu ser?
61
Uma mão
Quero reter Minha vida nos seus braços.
Quero viver De orgias e orgasmos.
Todas as noites que eu passo
Só, em claro, Aumenta minha aflição.
Sob a nudez e o fracasso,
Apelo desesperado Por uma ajuda,
Uma mão.
62
Se fossem sãos
A rima É mera aflição
Dos versos que me espelham Naquilo que são.
De forma nenhuma dirão
Do que são feitos.
Meus versos Seriam perfeitos Se fossem sãos. Mas nada são,
Senão Defeitos.
63
Entre corpos nos quintais
Os que lutam pela liberdade Estão atrás das grades.
Estão em guerra, Os que lutam pela paz.
O que faz Aquele que os menospreza?
Será na certa, Destaque nos jornais.
Estão loucos, Os que buscam ideais.
Talvez mortos, Entre corpos, Nos quintais.
64
Em tom de brincadeira
Pensei que teria a vida inteira Para consolidar meu compromisso.
Mas, tua ironia foi preciso, Para a percepção de minha asneira.
Se minha condição não é aceita, Não quero mais correr tal risco,
E tudo acaba aqui, em um sorriso, Em tom de brincadeira.
65
Meu coração morre por mim
Meu coração Não diz que não, Nem diz que sim, Talvez, por que,
Quem sabe, então, Quando está em solidão,
Quando já não está em mim.
Meu coração Pede perdão,
Na ilusão que não tem fim. Na mais esdrúxula compaixão,
Meu coração Morre por mim.
66
Aquela saudade
Sinceramente, o que sinto É na verdade uma queixa, Como quem parte sozinho
E mesmo indo Se deixa
Ficar ali, à vontade; No peito, aquela saudade De quem há muito deseja Voltar no mesmo caminho.
67
Paraíso anônimo
Nesta solidão em que me encontro, O mundo ficaria pronto
Em um só dia. Pois tudo que existe eu deixaria, Menos, claro, o ser humano.
Por tudo que vem dele ser profano,
A natureza me agradeceria. Jamais ia querer tal companhia.
Nem mesmo eu, existiria Nesse paraíso anônimo.
68
A inversão
Dizem que sou um louco Por inverter minha vida.
O meu cotidiano, o dia-a-dia, É para mim, um mero sonho. E tudo aquilo que componho
Em meus sonhos, Não considero utopia, Mas sim, a realidade.
Eu sou assim, um animal noturno, Por viver durante a noite.
Passo o dia todo de olhos abertos Num sonho, desperto, irreal; Sendo um homem normal, Com problemas, com tédio
E uma falsa moral. Considero que quando fecho Meus olhos e adormeço,
Eis aí o começo Do mundo real,
Onde sou bem e mal, Um herói, um bandido
69
Ou um deus imortal E não corro perigo.
Não há dor Que eu não possa sanar.
Não há mal Que eu não possa curar.
Sou capaz de voar, De fazer com que algo aconteça. Que ninguém nunca esqueça
Que viver, na verdade, é sonhar. Vem o sol, me desperta
Para o sonho que é a vida real; Sou agora um mortal, Um completo pateta
Que trabalha e tem pressa De chegar.
Eu prefiro voltar Para o mundo ideal. Adormeço, e afinal Volto à realidade
Do que chamam sonhar.
70
A fantasia
Amo você Com o mesmo ardor da juventude,
Na quietude De minha atual idade. Amo-a na ausência
Como num dia de saudade, Detenho-me a cada ínfima lembrança,
Com a mesma paz Que traz
Aquela esperança Após uma guerra. Amo-a em terra
Com a cabeça pelas nuvens. Amo atitudes
Que jamais seriam minhas, Como entre linhas, Leio uma poesia.
Amo como se ama o alvorecer De cada dia,
Como o sorriso Na inocente alegria
71
De um bebê. E ter você,
Ainda parece utopia. Mas, quis a vida
Que eu vivesse a fantasia De meu ser,
Que é para sempre, Você.
72
Quando choro
Onde andam os meus olhos Quando choro,
Se não consigo encontrar As minhas lágrimas?
Nas migalhas, Além de meus remorsos?
Nos meus ossos, Aquém de minha alma?
73
A resposta é não
Quero a resposta Pra meu corpo que ainda pede
O toque de tua pele Na imprecisão imposta. Ao ver as tuas costas,
Eu entendo que me negue. A vontade que espere
Por ser não, tua resposta.
74
Minha geração
Essa amargura Que me faz um homem rude,
É mera atitude De defesa.
Odeio a pobreza Que aos pés de Deus se ilude;
Enquanto a juventude, Nada almeja.
Desprezo a mania de grandeza Que o rico tem com tudo. Não sou um carrancudo
Por frieza; Somente faço uso
Da tristeza De um sisudo, Por ser fruto
De uma geração que aceita.
75
Tentativas
Tento, tento, Não me engano.
A cada dia morrendo; É o mal de ser humano, A paga de estar vivendo.
Tento, tento, Não reclamo
Por estar envelhecendo; É sinal de muitos anos.
Nas rugas, espelho o tempo.
Tento, tento, Tento tanto.
Talvez, a morte sem pranto Seja o melhor acalento.
76
Exploração do medo
O que está preso Em meu peito
E que à noite, me apavora, Que não controlo e me dá medo,
É a violência de agora. Está dentro de mim mesmo E se espalha em segredo Pelos corações lá fora. O que ainda me controla É saber que morre cedo, Todo aquele que explora Com violência, o medo.
77
Remoinho
Surpreende-me o vento Que atravessa o meu caminho,
Elevando a poeira, E joga um punhado de areia, Em meus olhos desatentos; Cobrindo o meu pensamento Que faz um redemoinho De idéias e asneiras.
78
Os três poderes
Quantos poderes nós temos? Temos poderes demais. Os quais, não funcionam.
Seriam três? Talvez,
Se não me engano. Vamos citá-los um de cada vez:
O executivo,
À beira do lixo, Nada executa. É só desculpa E embromação.
Enquanto à nação? Uma enorme estação
De corrupção E filhos da culpa.
O legislativo
Já está no lixo, Só tem ladrão.
79
Há exceção? Sim, lá tem bandido,
Cara de pau E mercenário.
O judiciário
É um triste cenário. Mas teatral. Gente do mal Fingindo bem. Que porcaria, A hipocrisia
Manda tão bem.
Bem, na verdade, Não há poderes, Há poderosos
Que sobre os ossos De nosso ofício, Erguem o vício Da impunidade.
80
Põem a justiça na contramão E atrás das grades,
O cidadão.
81
O pedinte
À mesa ainda bem posta, Uma jovem meiga, inocente,
Tão fina e sorridente, De uma beleza espantosa.
A observo da porta.
Sinto-me tão impotente, Que não escuto a resposta
Do homem que toma a frente.
Com uma voz insistente, Obriga-me a dar-lhe as costas. Vagueio por longas horas, Com a sacola pendente. Estava alheio ao presente, Já não pedia esmolas.
Pensava: Que faço agora
Que descobri que ser gente É coisa bem diferente
Do que acreditava outrora?
82
Eu sou aquele que chora, Em meio aos indiferentes. Talvez, eu seja descrente
Com o mundo que me explora.
Não estou sozinho; embora Não tenha amigos presentes. Sei que a miséria é crescente,
Que em si, é paciente, Morre à míngua sob a glória.
83
Por ser louco
Teus olhos negros me espiam Dentre as trevas, Pelas frestas
De tábuas velhas E úmidas.
Enquanto ouço teus gemidos
Sob a terra, Negocio o teu preço,
Sem apreço Pela vida em minhas unhas.
Cravei teu corpo
E selei a tua morte; Não por ser forte. Mas, por ser louco.
84
Romã
Com a graça de Deus, Encontrei o inferno. E lá estavam os anjos
Ao lado de satã. Era uma bela manhã
De inverno. Uma jovem pagã,
Que tentava decerto, Colher uma maçã; Exibia seu sexo
A um velho perverso Que a chamava
Romã.
85
Tolos
O mais tolo de nós dois É o que se acha mais esperto.
Que decerto, É você.
Pois, se eu dissesse o ser, Estaria me gabando.
Dessa forma, condenando A ser tolo sem querer.
86
Sonho especial
Tive um sonho especial, No qual,
Um talento musical Dedilhava bons versos.
Nesse universo
Cultural, O valor estético
Era a essência musical, Não o voltívolo sucesso.
Mas, ao inverso, Na vida real,
O cenário habitual De letra sem muito nexo,
De melodia banal, É a mídia, É o sucesso.
87
Sade
E com meu sangue Nas paredes, eu faria Como o marquês.
Escreveria, Por minha vez,
Poemas obscenos. Em meus acenos,
Investiria contra deus E seus
Pretensos mandamentos.
88
A centenária
Eram paredes largas. De uma altura imensa, O teto desta casa.
Cem anos de existência.
Dos ancestrais, a falta Da eterna insistência De mantê-la habitada.
Dos herdeiros, a mágoa Por tê-la exposto à venda.
Casa,
Casarão da fazenda. Mato seco molhado Pelo tempo esperado Na saudade expenda.
89
O rosto
A dor do silêncio, Por abafar um grito
De morte. O mesmo silêncio
Que não me permite gritar Mais forte.
Na expressão de cada olhar, Vê-se o medo De um segredo
Pelo mundo ocultado. Em um retrato,
Vê-se um rosto tão perfeito, Que não se nota
As feridas do passado.
90
Em silêncio
Eu não fico em silêncio. Talvez, o burburinho
Faça-me pensar melhor.
Na garganta, Um nó
Desatado.
Assim, se engana Um homem acostumado
A ficar só.
91
Melito
Vejo tantos Procurando um artifício
Que é difícil Encontrar uma saída
Em uma luta persistente pela vida.
Ainda corre-se o risco De herdar tal precipício,
A diabetes melito, Um eterno sofrimento.
São picadas, Insulina,
Uma luta que não finda, Luta árdua, de lamento. Jamais, se sai vencedor. Mas, pode com ardor, Controlar tal inimigo.
92
No ponto
Ponto de pontuação. De entrada e de saída. Onde está a condução Para a hora da partida.
Ponto para união Na costura e cirurgia. Na disputa, a emoção.
Em cada ponto, a conquista. Ponto para aprovação, Na matéria pretendida.
Para a localização Da embarcação perdida. Eis o meu ponto de vista (Ponto como opinião).
No ponto, está minha pizza; Ponto aqui é perfeição.
93
Uuh!
O que chama a atenção Num velho trem ou navio
É a sonorização. Em nossa boca,
O assovio. Uma mera interjeição:
Uuh! Teria a mesma função. Nesse caso, então,
Quer dizer o melhor pão Que esta cidade já viu.
94
A pizzaria
Venha, você mesmo, veja! Esse lugar é demais. Enquanto o pedido sai, Podemos tomar cerveja Ou mesmo ficar à mesa, Entre conversas banais. Entre gestos casuais,
Mantemos a idéia acesa. A espera, não nos deixa Perder a calma e a paz, Por termos plena certeza Que sorriso e gentileza
São ingredientes adicionais.
95
O ambiente
Qual seria seu segredo? Seria a massa, o queijo, O presunto, o tempero, O calor do forno aceso Ou a mera dedicação?
Não há fórmula, nem segredo.
O que faço é o mesmo Que faz cada parceiro Numa longa relação.
Na verdade, meu desejo É a sua satisfação.
Sei que o sabor vem primeiro; Mas, o ambiente inteiro, Além de muito aconchego, Tem que ter animação.
96
Manhas
As manhas De um tempo de ressaca,
Onde a cachaça Alcançava as manhãs,
Eram tantas, Que ainda deixam embriagadas,
As noitadas Que são agora, vãs.
E permanecem em mim, Tão abraçadas,
Que chego a sentir n’alma, Seu afã.
97
Todos vocês
Talvez, A lucidez
Não me acolha, E ao não ter escolha,
Serei louco de uma vez. Se à estupidez, Ninguém perdoa; Que vá à porra, Todos vocês.
98
Perturbador
O amor nos regenera Das feridas Que a vida Nos flagela.
Eu diria isso a ela, Se aceitasse me escutar. É estranho a gente amar Quem não nos preza.
É perturbador, Você querer alguém
Que está além De seu amor.
99
Se não me dou
Eu saberia me dar Se soubesse ser. Por não saber
Se sou, Não saberia
Se sei, Se me daria,
Se dei, Se não me dou.
100
Porta aberta
A porta está aberta. O mundo está lá fora.
Aqui dentro, a espera me devora. Aonde iria a esta hora?
A qual lugar? O que faria,
Se viesse a me encontrar? Há escuridão
Por trás das últimas luzes. Há desilusão
Por trás das últimas cruzes. Vozes que dizem amém.
Eu irei também. É noite,
As estrelas me intrigam. Há curiosidade
Ao que é real de fato. Estou fora.
Estou descalço. Estou farto De retórica.
101
Minha vista não alcança o infinito. O meu grito
Não se escuta em alto mar. Vou entrar;
Já que em casa, Eu me conformo que a vida
É um véu sob medida Para a ilusão contida
Em meu pesar.
102
Voa pra casa
Volta no tempo, Batendo asas. Voa pra casa. Volta pra mim. Não há um fim Para quem casa, Só a desgraça
De achar que sim.
103
O fruto proibido
Você é o fruto proibido Que ousei tocar.
Um amor que só se dá Sem receber.
Quanto mais perto está, Eu posso ver
A distância que separa O céu e o mar,
E que teima em separar, Eu e você.
104
Na raia
Se você me beija, Me deseja.
Desejar, que eu saiba, É querer.
Eu quero dizer, Antes que saia, Que cair na raia
É perder.
105
Entre espinhos e flores
Como posso Abandoná-la no caminho,
Se sozinho, Eu jamais irei chegar? Eu teria que voltar
Entre flores e espinhos, Para lhe acompanhar.
106
Entre espada e poder
Linda criatura, Os teus olhos são a cura
Para o meu ser. Nem tento viver Sem tua ajuda, Minha armadura.
Entre espada e poder, És minha jura
De novamente nascer.
107
Trágica visão
Minha vida tão sem cor, Não tem matiz. E por um triz,
Eu não conheci o amor.
Minha alma não tem par; Meu falar
Não tem razão E minha mão
Não consegue alcançar.
Minha cama tem lugar Para mais dois. Mas, e depois?
Só o tempo me dirá.
É preciso emergir Da solidão, Um coração
Que não pára de sonhar.
108
Minha cabeça Ainda teima Em pensar, Ao mergulhar
Para a eterna escuridão, Onde a emoção
Sopra a tenra luz que há, Iluminando sutilmente, meu pesar,
Numa trágica visão.
109
O perdão
O que seria o perdão, Senão
Uma esdrúxula fraqueza?
Para um erro grave, O perdão quem sabe,
Só burrice, seja.
Perdoar a todo custo, Não seria justo
Para a vítima indefesa.
O perdão, talvez Seja, mera estupidez De quem o deseja.
110
Complexo
Enquanto todos se lembram, Eu sou o único esquecido. Nunca estou em foco Por ser imprevisível.
Enquanto todos se tocam, Eu me afasto e evito.
Talvez, por que não suporto Esse ato presumível.
Nem mesmo a mão de um amigo, Serve de apoio.
Num vasto campo de trigo, Eu sou o joio.
Estou um tanto perplexo Que ninguém veja a verdade.
Não é apenas complexo, A minha inferioridade.
111
Versos mórbidos
Em meio a tantos pensamentos tortos, Meus anjos
Nasciam mortos. Entre seus corpos,
Eu nasci. Tão só,
Que não ouvi Nem o meu choro.
Tão louco, Que não sabia chorar. Tiveram que arrancar Os meus dois olhos, Pra meu remorso,
Entre lágrimas, jorrar. Tentaram me escutar Ao som de ossos
Que teimavam me quebrar. Em seu lugar,
Puseram um velho relógio, Que em versos mórbidos,
Parecia minhas horas não marcar.
112
Até a morte
Sei que meu amor Valeria minha vida. Sem dúvida, lutaria
Até a morte.
Não seria por grandeza; Mas por ter plena certeza, Que meu amor mereceria
Minha sorte.
113
Desprezível
Aos poucos, que percebem que eu existo, Insisto
Que esqueçam quem eu sou. Eu quero ser apenas desafeto,
O inseto Que uma bota esmagou. Um véu tão transparente
E sem cor, Que a toda gente, Se torne invisível.
Desejo ser um homem desprezível, Que o mundo não me dê nenhum valor. Que o meu nome cause tanto horror,
Que seja evitado se falar. Desejo para sempre, me ocultar, Por ser considerado um maldito. Espero que ao ter me esquecido,
O mundo nunca mais volte a lembrar.
114
Vazio imenso
Faz pouco tempo Que sai de casa; A deixei deitada, Junto ao rebento.
O dia é lento,
A hora não passa, A saudade agasta
O meu pensamento.
Já não agüento Esse sentimento, Um vazio imenso
Dentro de minh’alma.
115
Para fugir de tudo
Fujo Da melancolia,
Para não cortar meus pulsos. Quando a pele arrepia, Sinto calafrios, impulsos De trocar a minha pele,
Pela agonia Que me fere, Que me alicia A deixar a vida
Para fugir de tudo.
116
Vulto
Sob a lua, quis chorar, Meu ser confuso.
Um intruso Na vontade de pensar.
Já não canta, Por querer manter-me mudo
No absurdo De nem mesmo me falar.
Se eu não moro em seu lugar, Serei só vulto
Desse ser, que em mim oculto, Quer ficar.
117
No meu rosto
Pelos meus olhos, Não sei se sou louco
Ou serei outro Que não quer se achar.
Perdi meu ar De bom moço. Perdi meu gosto
De amar.
Pelos meus olhos, Não sei se sofro; Se, é de desgosto, Esse meu pesar.
Eu tento ver no meu rosto, Se ainda é pouco,
O que há.
118
Pela calçada vazia
Pela calçada vazia, Perambulava.
Meu peito aberto, fazia Papel de escudo Ao vento e a tudo Que ele trazia Da noite fria
Que me queimava. Meu corpo ardia, Alheio e mudo Eu insistia,
Ainda teimava. Chegasse a noite, Chegasse o dia,
Eu estaria Perambulando Pela calçada Quase vazia
Da madrugada. Pela rua movimentada, De vez em quando,
119
Esbarraria Com o rosto humano Que eu já não via Quando o espelho Me espelhava.
Enquanto perambulava Pela calçada vazia,
Ao esquecer que existia, Perdia A alma.
120
Imerecidos
Andei perdido Por diversos pensamentos, Atrelados ao momento Que dividi com você, Que duvido viver Mais uma vez. Era uma vez
Nós dois, talvez, Como amantes.
Nunca será como antes. Eu e você, Bons amigos Imerecidos
De uma noite de prazer.