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Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos COLECÇÃO MELHORES PRÁTICAS DA ONUSIDA

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em ... · O estigma associado à SIDA tem impedido discussões francas tanto ... ausência de cura para a ... e a discriminação

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Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH

Estudos de casos de programas bem sucedidos

COLECÇÃO MELHORES PRÁTICAS DA ONUSIDA

ONUSIDA/05.05P (versão portuguesa, Setembro de 2005)

Dados do Catálogo de Publicações da Biblioteca da OMS

ONUSIDA. Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH: Estudos de casos de programas bem sucedidos(colecção Melhores Práticas da ONUSIDA)

1. Infecções por VIH – psicologia 2. Síndroma de imunodeficiência adquirida – psicologia 3. Prejuízo 4. Alienação social 5. Direitos Humanos 6. Relatórios de casos I. Título II. Séries ISBN 92 9 173440 3 (Classificação NLM: WC 503.7)

Preparado para ONUSIDApor

Peter Aggleton, Kate Wood e Anne MalcolmDepartamento de Investigação Thomas Coram,

Instituto de Educação, Universidade de Londres, Reino Unido

Richard ParkerDepartamento de Ciências Sociomédicas, Escola Mailman de Saúde Pública

Universidade Columbia, Nova Iorque, Estados Unidos da América

Fotografias da capa ONUSIDA/PANOS e ONUSIDA/L. Alyanak

Versão original inglesa, Abril de 2005HIV-Related Stigma, Discrimination and Human Rights Violations –

Case studies of successful programmesTradução – ONUSIDA

nenhum julgamento sobre o estatuto jurídico de qualquer país, território, cidade ou zona, nem de suas autoridades, nem tampouco questões de demarcação de suas fronteiras.

A menção de determinadas companhias ou do nome comercial de certos produtos não implica que a ONUSIDA os aprove ou recomende, dando-lhes preferência a outros análogos não mencionados. Com excepção de erros ou omissões, os nomes de especialidades farmacêuticas distinguem-se pela letra maiúscula inicial.

A ONUSIDA não garante que as informações contidas nesta publicação são completas e correctas e não pode ser responsável por qualquer dano resultante da sua utilização.

ONUSIDA – 20 avenue Appia - 1211 Genebra 27 - SuíçaTel: (+41) 22 791 3666 - Fax: (+41) 22 791 4187

E-mail: [email protected] – Internet: http://www.unaids.org

© Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o VIH/SIDA (ONUSIDA) 2005

Todos os direitos reservados. As publicações produzidas pela ONUSIDA podem ser pedidas ao Centro de Informações da ONUSIDA. Os pedidos para reprodução ou tradução das publicações da ONUSIDA – seja para venda ou para distribuição não comercial - devem ser endereçados ao Centro de Informações no endereço mais abaixo ou enviados por fax: +41 22 791 4187, ou E-mail: publicationpermissions @unaids.org.

As denominações utilizadas nesta publicação e a apresentação do material nela contido, não significam, por parte da ONUSIDA,

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH

Estudos de casos de programas bem sucedidos

COLECÇÃO MELHORES PRÁTICAS DA ONUSIDA

ÍndiceIntrodução 4

Compreender o que é o estigma e a discriminação: formas e contextos 7

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos: uma relação íntima 11

Trabalhar para ter êxito 13

Estudos de casos 14

Abordagens de redução do estigma 17

Abordagem: melhorar a qualidade de vida das pessoas vivendo com o VIH graças a cuidados integrados 17

Programa Integrado de Luta contra a SIDA, Diocese Católica de Ndola, Zâmbia 17

Programa conjunto Ministério da Saúde/organização não-governamental de cuidados a domicílio para pessoas com o VIH/SIDA no Camboja 21

Abordagem: mobilizar chefes religiosos para promover respeito e compaixão pelas pessoas que vivem com o VIH e a SIDA, e participar em actividades de prevenção 23

Projecto Sangha Metta, Tailândia 23

Acção Católica de Luta contra a SIDA, Namíbia 27

Abordagem: fornecer tratamento global contra a SIDA com base na comunidade, incluindo acesso a terapia anti-retroviral 29

Iniciativa para Equidade perante o VIH, Haiti 29

Abordagem: habilitar as pessoas vivendo com o VIH a dirigir diversas actividade de apoio e sensibilização 33

Participação de pessoas vivendo com o VIH em actividades de prevenção do VIH, Bielorrússia 33

Abordagem: aconselhamento e apoio a famílias afectadas, incluindo crianças, graças a ‘planeamento da sucessão’ 35

Planear a sucessão, Uganda 35

Abordagem: Procurar resolver grandes desigualdades graças a educação participativa 39

Centro para Estudo da SIDA (CSA) na Universidade de Pretória, África do Sul 39

Abordagem: Mobilizar líderes comunitários para encorajar maior franqueza dentro das comunidades sobre questões relacionadas com sexualidade e VIH, apoiando-se em normas sociais positivas 43

Programa de Saúde Integrado da Zâmbia (ZIHP), Zâmbia 43

Abordagem: Sensibilizar através dos media 47

‘Soul City’, África do Sul 47

Medidas antidiscriminatórias 50

Abordagem: Mobilizar o sector privado para implementação de políticas não-discriminatórias de luta contra a SIDA e promoção de conhecimentos sobre a SIDA 50

Aliança Tailandesa de Empresas contra a SIDA (TBCA), Tailândia 50

Abordagem: melhorar a qualidade de vida dos empregados graças a acesso a cuidados integrados e implementação de políticas não-discriminatórias 53

Volkswagen (VW) Brasil 53

Abordagem: Melhorar os cuidados clínicos destinados a pacientes que vivem com o VIH graças a actividades participativas com gestores e prestadores de cuidados de saúde 55

Melhorar o ambiente hospitalar para pacientes seropositivos na Índia 55

Direitos humanos e abordagens jurídicas 59

Abordagem: Promover os direitos humanos das pessoas vivendo com o VIH e fornecer reparação por violações desses direitos 59

Acción Ciudadana Contra el SIDA (ACCSI): Acção de Cidadões contra a SIDA, Venezuela 59

Departamento Legal para Casos de SIDA, Centro de Assistência Jurídica, Namíbia 63

Departamento de Luta contra o VIH/SIDA, Colectivo de Advogados, Índia 65

Abordagem: Preconizar acesso crescente a tratamento contra o VIH 67

Campanha de Acção para Tratamento (TAC), África do Sul 67

Discussão 70

Conclusões 77

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Introdução

Desde o início da epidemia de SIDA, o estigma e a discriminação fomentaram a transmissão do VIH e aumentaram enormemente o impacto negativo associado à epidemia. Em todos os países e regiões do mundo, o estigma e a discriminação associados ao VIH continuam a manifestar-se, criando barreiras importantes à prevenção de novas infecções, à atenuação do impacto e ao fornecimento de cuidados adequados, apoio e tratamento.

O estigma associado à SIDA tem impedido discussões francas tanto sobre as suas causas como sobre as respostas apropriadas. Clareza e franqueza sobre a SIDA são requisitos prévios à mobilização bem sucedida de governos, comunidades e indivíduos para responder à epidemia. A dissimulação não deixa ver que o problema existe e atrasa acção urgente. Faz com que as pessoas que vivem com o VIH sejam consideradas como um “problema” em vez de uma solução para conter e gerir a epidemia.

A estigmatização associada à SIDA apoia-se em muitos factores incluindo falta de conhe-cimentos sobre a doença, ideias erradas sobre a transmissão do VIH, falta de acesso a tratamento, informações irresponsáveis sobre a epidemia por parte dos media, ausência de cura para a SIDA, e preconceitos e receios relacionados com um certo número de questões socialmente sensíveis incluindo sexualidade, morbilidade e mortalidade, e uso de drogas.

O estigma pode levar a discriminação e outras violações dos direitos humanos que afectam de maneira fundamental o bem-estar de pessoas vivendo com o VIH. Em países em todo o mundo existem casos bem documentados de pessoas vivendo com o VIH a quem foi recusado o direito a, entre outros, cuidados de saúde, trabalho, educação e liberdade de movimentos.

A Declaração de Empenho, aprovada pela Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre o VIH/SIDA em Junho de 2001, realça o consenso mundial sobre a importância de enfrentar o estigma e a discriminação relacionados com a SIDA. A Declaração especifica que confrontar o estigma e a discriminação é um requisito prévio para prevenção e cuidados eficazes, e reafirma que a discriminação com base na serologia VIH de uma pessoa é uma violação dos direitos humanos.

A discriminação relacionada com o VIH é uma violação dos direitos humanos, mas é também necessário procurar resolver tal discriminação e estigma para atingir os objectivos de saúde pública e vencer a epidemia. As respostas ao VIH e à SIDA podem seguir-se numa continuidade de prevenção, cuidados e tratamento, e os efeitos negativos do estigma e da discriminação podem ser observados em cada um destes aspectos da resposta. O ideal seria que as pessoas pudessem procurar e receber aconselhamento e detecção voluntários e confidenciais para determinar a sua serologia VIH sem medo de repercussões. Aquelas cujos testes são negativos deveriam receber aconselha-mento sobre prevenção para puderem ser capazes de se manter seronegativas. As que são seroposi-tivas deveriam receber cuidados e o tratamento disponível, e aconselhamento sobre prevenção para proteger outras da infecção e se protegerem de nova infecção. As pessoas vivendo com o VIH e a SIDA devem poder viver sem se esconder e receber simpatia e apoio no seio das suas comunidades. O seu exemplo franco personaliza o risco e experiência para outras, ajudando assim os esforços de prevenção, cuidados e tratamento.

1 Ver http://www.un.org/ga/aids/coverage

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Prevenção Identificação da serologia

Redução do dano

Cuidados e apoio

Continuidade prevenção-cuidados

Um ambiente social de estigmatização põe entraves em todas as fases deste ciclo devido a ser, por definição, não favorável. O estigma e a discriminação relacionados com o VIH enfraquecem os esforços de prevenção pois, para não levantar suspeitas sobre a sua serologia VIH, as pessoas têm receio de saber se estão ou não infectadas, de procurar informações sobre a maneira de reduzir o risco de exposição ao VIH, e de alterar o seu comportamento para um mais seguro. Assim, o estigma e a discriminação enfraquecem a capacidade dos indivíduos e das comunidades a se proteger. O medo do estigma e da discriminação também faz com que as pessoas que vivem com o VIH não tenham coragem de revelar a sua infecção, mesmo a membros da família e parceiros sexuais. O segredo que rodeia a infecção por VIH e que resulta de estigma e discriminação leva as pessoas a imaginar não correrem perigo de infecção por VIH.

O estigma e a discriminação associados ao VIH e à SIDA também significam que as pessoas que vivem com o VIH e a SIDA têm muito menos probabilidades de receber cuidados e apoio. Mesmo as pessoas não infectadas mas que estão ligadas a outras infectadas, como esposas, filhos e prestadores de cuidados, sofrem estigma e discriminação. E tal estigma e discriminação aumentam desnecessariamente o sofrimento pessoal associado à doença.

A vergonha associada à SIDA – uma manifestação de estigma que tem sido descrita por certos autores como estigma ‘interiorizado’ – também pode impedir as pessoas que vivem com o VIH de procurar tratamento, cuidados e apoio e de exercer outros direitos tais como trabalhar, frequentar a escola, etc. Esta vergonha pode ter uma grande influência psicológica sobre a maneira como as pessoas seropositivas se consideram e se adaptam ao seu estado, tornando-as vulneráveis a culpa, depressão e isolamento auto-imposto.

2 McNeil J. and Anderson S. (1998) Beyond the dichotomy : linking HIV prevention and care. AIDS 12 (supplement 2)S19-S26; Busza J. (1990) Challenging HIV-related stigma and discrimination in Southeast Asia: past successes and future priorities. Population Council: Horizons Project. http://www.popcouncil.org/horizons/reports/book_report/default.html

Ilustração 1: A continuidade prevenção-cuidados-tratamento (Baseada em MacNeil e Anderson 1998, Busza 1999)2

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Isto pode ser exacerbado no caso de indivíduos de certos grupos já isolados e estigmatizados, tal como consumidores de drogas injectáveis, homens tendo relações sexuais com homens, e profissionais do sexo, ou migrantes. Em contextos dispondo de cuidados médicos, o estigma pode dificultar a adesão a esquemas terapêuticos.

A dissimulação e a dificuldade em procurar tratamento, cuidados e apoio alimentam o estigma e a discriminação, reforçando o ciclo. E isto porque os estereótipos e os receios são perpetuados quando muitas vezes as comunidades só reconhecem as pessoas vivendo com o VIH quando estas estão nas fases finais debilitantes e indicativas da SIDA, e o desmentido e o silêncio reforçam a discriminação de tais indivíduos já vulneráveis. No âmbito das famílias, o facto de manter o segredo sobre a infecção por VIH leva muitas vezes a uma falta de planeamento para o futuro, deixando órfãos e outros dependentes privados economicamente uma vez falecida a pessoa que era o ganha-pão, e muitas vezes marginalizados quando fica conhecida a sua relação com a SIDA.

Ilustração 2: Impactos do estigma e da discriminação relacionados com a SIDA sobre a continuidade prevenção-cuidados-tratamento (adaptado de Busza 1999)3

Pouca percepção do risco individual devido ao facto de só serem considerados como vulneráveis os grupos estigmatizadosRelutância em conhecer a sua serologia devido ao receio de repercussões negativasAumento da vulnerabilidade de outras pessoas

A estigmatização de comportamentos associados (consumo de drogas, comércio do sexo) limita a eficácia de intervenções de redução do danoFalta de planeamento para o futuro

Aconselhamento e apoio inadequados ou impróprios

Recusa de cuidados de saúde apropriados para quem vive com o VIH

Não procura de cuidados devido ao receio de reconhecimento público da serologia

Prevenção Identificação da serologia

Tratamento Cuidados e apoio

Continuidade prevenção-cuidados

3 Diagrama adaptado de: Busza J. (1999) Challenging HIV-related stigma and discrimination in Southeast Asia: past successes and future priorities. Population Council: Horizons Project. http://www>popcouncil.org/horizons/reports/book_report/default.html

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Compreender o que é o estigma e a discriminação: formas e contextos

Para poder identificar soluções possíveis ao estigma e à discriminação relacionados com o VIH, é necessário compreender o que estes conceitos querem dizer, descrever como se manifestam e analisar as relações entre eles4.

O que é o estigma?

O estigma tem sido descrito como um processo dinâmico de desvalorização que ‘desa-credita fortemente’ um indivíduo perante os outros.5 As características ligadas ao estigma podem ser muito arbitrárias, por exemplo, cor da pele, maneira de falar, ou preferência sexual. Em deter-minadas culturas ou contextos, certos atributos são considerados e definidos como vergonhosos ou indignos.

O estigma relacionado com o VIH tem múltiplas facetas, com tendência para se apoiar em conotações negativas, reforçando-as, através da associação do VIH e SIDA com comportamentos já marginalizados tais como comércio do sexo, consumo de drogas e hábitos homossexuais e tran-sexuais. Também reforça o receio de estranhos e de grupos já de si vulneráveis como prisioneiros e migrantes. Acredita-se muitas vezes que os indivíduos que vivem com o VIH merecem a sua seropositividade devido a terem feito algo ‘errado’. Deitando as culpas a certos indivíduos e grupos que são ‘diferentes’, outros se dispensam de reconhecer o seu próprio risco, enfrentar o problema e cuidar das pessoas afectadas.

As imagens publicadas e transmitidas pelos media de pessoas seropositivas podem reforçar a culpabilidade utilizando uma linguagem sugerindo que o VIH é uma ‘doença de mulher’, uma ‘doença de drogado’, uma ‘doença africana’ ou uma ‘praga homossexual’. As ideias religiosas de pecado também podem ajudar a manter e reforçar a percepção de que a infecção por VIH é um castigo por comportamento pervertido.

O estigma exprime-se através da linguagem e, desde o início da epidemia, as metáforas fortes associando o VIH a morte, culpa e castigo, crime, horror e ‘os outros’ exacerbaram e legiti-maram a estigmatização. Este tipo de linguagem resulta, e contribui para outro aspecto sustentando a culpa e a exclusão: o receio da doença potencialmente mortal. O estigma baseado no medo pode ser atribuído ao receio pelas consequências da infecção por VIH – em particular, as altas taxas de mortalidade (especialmente onde o tratamento não é largamente disponível), medo relacionado com a transmissão ou medo resultante da observação da debilitação visível no estado avançado da SIDA.

O estigma está profundamente enraizado, agindo dentro dos valores da vida de todos os dias. Embora as imagens associadas à SIDA variem, são modeladas de maneira a assegurar que o estigma com ela relacionado favorece e reforça as desigualdades sociais6. Tais desigualdades incluem especialmente as que estão ligadas ao sexo, raça e etnia, e sexualidade. Assim, por exemplo, o homem e a mulher não são muitas vezes tratados da mesma maneira quando infectados, ou se

4 Parker R. Aggleton P. (2002) HIV/AIDS-related stigma and discrimination: a conceptual framework and an agenda for action. Population Council: Horizons Project Disponível em: http://www.popcouncil.org/pdfs/horizons/sdcncptlfrmwrk.pdf Ver também: Maluwa M., Aggleton P., and Parker R. (2002) HIV/AIDS stigma, discrimination and human rights – a critical overview. Health and Human Rights, 6, 1: 1-15.5 Goffman E. (1963) Stigma: notes on the management of a spoiled identity. New York: Simon and Schuster 6 Para uma elaboração teórica das ligações entre estigma e a reprodução de diferenças sociais, ver Parker R. and Aggleton P. (2003) HIV and AIDS-related stigma and discrimination: a conceptual framework and implications for action. Social Science and Medicine, 57, 13-24.

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pensa estarem infectados pelo VIH: é mais provável que seja culpabilizada a mulher mesmo quando é o marido que está na origem da sua infecção, e as mulheres infectadas têm menos probabilidades de ser aceites nas suas comunidades.

Este processo está ligado a desigualdades de longa data entre os sexos, apoiadas por ideias sobre masculinidade e feminidade que, historicamente, tiveram como resultado tornar as mulheres responsáveis da transmissão de infecções sexualmente transmissíveis de todos os tipos, e imputar- -lhes a culpa devido a ‘promiscuidade” suposta. Da mesma maneira, a culpabilização de homossexuais e de transexuais apoia-se numa estigmatização de longa data relacionada com suposições sobre os seus estilos de vida e práticas sexuais. Os estereótipos raciais e étnicos também reforçam o estigma relacionado com a SIDA7. Por exemplo, a epidemia foi caracterizada por suposições racistas sobre ‘sexualidade africana’ e por ideias no mundo em desenvolvimento de ‘comportamento imoral’ do ocidente. Finalmente, a vulnerabilidade ao VIH das comunidades vivendo na pobreza reforçou a estigmatização existente de tais pessoas economicamente marginalizadas.

Através destas associações, o estigma está ligado a poder e influência na sociedade como um todo, criando e reforçando desigualdades pelo que certos grupos se sentem superiores e outros desvalorizados. A associação do VIH com grupos e práticas já estigmatizados intensifica estas desigualdades pré-existentes, reforçando a produção e reprodução de relações de poder não equita-tivas. O estigma já existente exacerba o estigma relacionado com o VIH, não unicamente pelo facto dos grupos já estigmatizados serem mais estigmatizados pela associação com o VIH, mas também por que se pode partir do princípio que os indivíduos que vivem com o VIH pertencem a grupos marginalizados.

Ilustração 3: Círculo de estigmatização e marginalização8

Assim, a estigmatização relacionada com o VIH é um processo pelo qual as pessoas que vivem com o VIH são desacreditadas. Pode afectar as pessoas infectadas ou suspeitas de estarem infectadas pelo VIH, assim como as afectadas pela SIDA por associação, tais como órfãos ou filhos e família de pessoas que vivem com o VIH.

VIH/SIDA

Pessoas vivendo com o VIH e a SIDA

Profissionais do sexo, consumidores de drogas injectáveis e outros grupos marginalizados são considerados

responsáveis por

são vistos como

7 Para um estudo das relações entre racismo, estigma e discriminação ver http://www.unhchr.ch/html/menu2/7/b/hivbpracism.doc8 Adaptado de Parker R. e Aggleton P. (2002) HIV/AIDS-related stigma and discrimination: a conceptual framework and an agenda for action. Population Council Horizons Project.

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A estigmatização também pode ocorrer a outro nível. As pessoas vivendo com o VIH podem interiorizar as respostas negativas e as reacções das outras, processo que pode resultar naquilo que certas pessoas chamaram auto-estigmatização ou estigmatização ‘introvertida’. A auto-estigma-tização está ligada com o que certos autores descreveram como estigma ‘sentido’, em oposição a estigma ‘estabelecido’, dado que afecta essencialmente o sentimento de orgulho e dignidade do indivíduo ou da comunidade afectada. Para pessoas vivendo com o VIH isto pode manifestar-se em sentimentos de vergonha, mea culpa, e inutilidade, que combinados com sentimentos de isolamento da sociedade podem levar a depressão, imposição a si próprio de afastamento e mesmo sentimentos suicidários.

O que é a discriminação?

A discriminação é a aplicação do estigma. A discriminação consiste em acções ou omissões que derivam de estigma e que são dirigidas contra os indivíduos que são estigmatizados. A discriminação, segundo o que foi definido pelo ONUSIDA (2000) no Protocolo para Identificação de Discriminação contra Pessoas Vivendo com o VIH, refere-se a qualquer forma de distinção arbi-trária, exclusão ou restrições afectando uma pessoa, devido, normalmente mas não só, a uma carac-terística pessoal inerente ou perceptível relacionada com um dado grupo – no caso do VIH e da SIDA, a seropositividade confirmada ou suspeita de uma pessoa – sejam tais medidas justificadas ou não.

A discriminação relacionada com a SIDA pode ocorrer a vários níveis9, como por exemplo em contextos familiares e comunitários, o que foi descrito por certos autores como ‘estigma insti-tuído’. Isto é o que certas pessoas fazem, deliberadamente ou por omissão, para prejudicar outras e recusar-lhes serviços ou direitos. Os exemplos deste tipo de discriminação contra pessoas vivendo com o VIH incluem: ostracismo, como forçar mulheres a voltar para as suas famílias quando são diagnosticadas seropositivas após os primeiros sinais da doença ou depois dos seus parceiros terem morrido com a SIDA; esquivar e evitar os contactos diários; molestar verbalmente; violência física; descrédito e culpabilização verbais; maledicência; e recusa de ritos funerários tradicionais.

Há também a discriminação que ocorre em contextos convencionais – em particular, em locais de trabalho, serviços de cuidados de saúde, prisões, instituições educativas e serviços de previdência social. Tal discriminação cristaliza estigma decretado em políticas e práticas convencio-nais que discriminam as pessoas vivendo com o VIH, ou na falta de políticas antidiscriminatórias ou de medidas de reparação. Exemplos deste tipo de discriminação contra pessoas vivendo com o VIH incluem:

• Serviços de cuidados de saúde: cuidados de qualidade inferior, recusa de acesso a cuidados e tratamento, detecção do VIH sem consentimento prévio, quebra de sigilo incluindo comunicação da seropositividade de alguém a familiares e agências externas, atitudes negativas e práticas degradantes de trabalhadores de saúde.

• Local de trabalho: recusa de emprego com base na seropositividade, detecção do VIH obrigatória, exclusão das pessoas seropositivas dos sistemas de pensão ou de assistência médica.

• Escolas: recusa de admissão a crianças afectadas pelo VIH, ou despedimento de profes-sores.

9 Para mais detalhes ver; UNAIDS (2000) HIV- and AIDS-related stigmatization, discrimination and denial: forms, contexts and determinats. Research studies from Uganda and India. UNAIDS, Geneva.Ver também Malcom A. et al. (1998) HIV-related stigmatisation and discrimination: its forms and contexts. Citical Public Health, 8(4): 347-370. Ver também Aggleton P, Parker R. e Maluwa M. (2002) Stigma discrimination and HIV/AIDS in Latin America and the Caribbean. Disponível em: http://www.iadb.org/sds/publication/publication_3362_e.htm.

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• Prisões: segregação forçada de indivíduos seropositivos, exclusão de actividades colec-tivas.

A nível nacional, a discriminação pode reflectir estigma que foi oficialmente autorizado ou reconhecido como legítimo por meio de leis e políticas existentes, e aplicado em práticas e acções. Isto pode ter como resultado maior estigmatização das pessoas que vivem com o VIH e, por sua vez, legitimar a discriminação.

Por exemplo, um número importante de países decretaram leis com o objectivo de restringir os direitos de indivíduos e grupos afectados pelo VIH. Tais acções incluem:

• Rastreio e teste obrigatórios de grupos e indivíduos;

• exclusão de pessoas vivendo com o VIH de certas ocupações e tipos de emprego;

• isolamento, detenção e exame médico obrigatório, tratamento de pessoas infectadas; e

• restrições em viagens internacionais e migrações incluindo detecção obrigatória do VIH para quem pede autorização de trabalho, e deportação de estrangeiros seropositivos.

Também ocorre discriminação devido a omissão, como quando leis, políticas e acções oferecendo reparação e garantindo os direitos das pessoas vivendo com o VIH são inexistentes ou não são aplicadas.

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Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos: uma relação íntima

O estigma e a discriminação estão correlacionados, reforçando-se e legitimando-se mutu-amente. O estigma está na raiz de acções discriminatórias, levando as pessoas a participar em acções ou omissões que causam dano ou recusam serviços ou direitos a outras. Pode dizer-se que a discrimi-nação é a promulgação do estigma. Por sua vez, a discriminação encoraja e reforça o estigma.

A discriminação é uma violação dos direitos humanos. O princípio de não-discrimi-nação, baseado no reconhecimento da igualdade de todas as pessoas, está no centro da Declaração Universal dos Direitos Humanos e outros documentos sobre direitos humanos. Entre outras coisas, estes textos proíbem a discriminação baseada em raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra, riqueza, nascimento ou outras condições. Mais ainda, a Comissão das Nações Unidas sobre os Direitos Humanos decidiu que os termos ‘ou outras condições’ utilizados em vários docu-mentos sobre direitos humanos ‘devem ser interpretados de maneira a englobar condições de saúde, incluindo o VIH/SIDA’, e que a discriminação baseada numa seropositividade real ou suposta é proibida segundo os padrões de direitos humanos existentes.

Assim, as acções estigmatizantes e discriminatórias violam o direito humano fundamental a não-discriminação. Além de ser em si mesmo uma violação dos direitos humanos, a discriminação dirigida contra pessoas vivendo com o VIH ou que se acredita estarem infectadas pelo VIH, leva a violação de outros direitos humanos tais como direito a saúde, dignidade, segredo, igualdade perante a lei, e ausência de tratamento ou punição desumanos e degradantes.

Um ambiente social que promova violações de direitos humanos pode, por sua vez, legitimar o estigma e a discriminação.

Ilustração 4: O ciclo de estigma, discriminação e violações de direitos humanos10

Estigma

Violação dedireitos humanos Discriminação

Que legitima

Que leva a

Que causa

10 Diagrama elaborado por Miriam Maluwa e Peter Aggleton

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As relações directas e indirectas entre a epidemia de VIH e a falta de protecção dos direitos humanos são muitas. As violações dos direitos podem reforçar o impacto do VIH, aumentar a vulnerabilidade e impedir respostas positivas à epidemia11.

• Impacto. A violação de direitos humanos encastrada em discriminação aumenta o impacto da epidemia sobre as pessoas vivendo com o VIH e as supostas infectadas, assim como sobre as suas famílias e os seus companheiros. Por exemplo, uma pessoa que é despedida do trabalho devido ao facto de ser seropositiva, tem de enfrentar, além da doença, muitos outros problemas incluindo falta de recursos económicos para cuidados de saúde, assim como para sustentar qualquer familiar dependente;

• Vulnerabilidade. As pessoas são mais vulneráveis a infecção quando os seus direitos civis, políticos, económicos, sociais ou culturais não são respeitados. Por exemplo, a vulnerabilidade das mulheres à infecção por VIH aumenta onde estas não têm meios legais para fazer escolhas e recusar relações sexuais não desejadas; ou onde as crianças não podem compreender os seus direitos a educação e informação. Mais ainda, a falta de acesso a serviços apropriados de prevenção do VIH e de cuidados no caso de SIDA faz aumentar a vulnerabilidade de outros grupos marginalizados tais como consumidores de drogas injectáveis, refugiados, migrantes e prisioneiros.

• Resposta. Onde os direitos humanos não são respeitados, por exemplo, quando a liberdade de expressão ou de associação é abolida, é difícil ou impossível para a sociedade civil se mobilizar de maneira a responder eficazmente à epidemia. Em certos países, a educação por colegas é prejudicada por leis que recusam o registo oficial de organizações não- -governamentais ou grupos com certos membros (por exemplo, profissionais do sexo).

Uma maneira importante de combater o estigma e a discriminação relacionados com a SIDA é assegurar a protecção, respeitar e cumprir os direitos humanos. Utilizando os mecanismos existentes sobre direitos humanos é possível resolver o estigma e a discriminação relacionados com a SIDA e as consequentes violações desses direitos. Esta estrutura existente fornece uma base para assumir responsabilidades e abre o caminho para o reconhecimento e aplicação dos direitos das pessoas vivendo com o VIH que sofrem discriminação com base na sua seropositividade real ou suposta, de maneira a combater tais acções através de mecanismos administrativos, institucionais e de controlo para aplicar os direitos humanos, e graças a estes recorrer para enfrentar e corrigir acções discriminatórias.

Os princípios internacionais de direitos humanos fornecem uma estrutura coerente e normativa para analisar e corrigir a discriminação relacionada com a SIDA. Os estados são respon-sáveis e devem dar contas, não só pelas violações directas ou indirectas de direitos, mas também pela garantia de que os indivíduos podem exercer os seus direitos o mais completamente possível. As Directivas Internacionais sobre o VIH/SIDA e os Direitos Humanos12, publicadas em 1998 pelo ONUSIDA e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, esclarecem as obrigações dos estados incluídas em mecanismos existentes sobre direitos humanos13 e a sua aplicação no contexto da SIDA.

11 UNAIDS/IPU (1999) Handbook for legislators on HIV/AIDS, law and human rights: action to combat HIV/AIDS in view of its devastating human, economic and social impact. Geneva, Switzerland12 http://www.unaids.org/publications/documents/human/law/JC520-HumanRights-E.pdf13 Estes incluem: a Declaração Universal dos Direitos Humanos; a Convenção contra a Tortura e Tratamento Desumano e Degradante; a Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos; a Convenção Internacional sobre Direitos Económicos, Sociais e Culturais; a Convenção Internacional sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher; e a Convenção sobre os Direitos da Criança.

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Trabalhar para ter êxito

Como o estigma, a discriminação e a violação de direitos humanos estão intimamente ligados, e as pessoas vivendo com o VIH são estigmatizadas e discriminadas em muitos contextos diferentes, há necessidade de acção simultânea e em múltiplas frentes que deve ser mantida constan-temente. A fim de criar um meio ambiente no qual estigma, discriminação e violações dos direitos humanos não mais sejam tolerados ou exercidos, são precisas as seguintes acções:

• Implementação de programas que tratem do estigma a nível colectivo e comunitário. Para enfrentar o estigma, os programas precisam de agir antes que este se manifeste ou seja aplicado em vários tipos de acção discriminatória, em vez de responder simplesmente depois da sua ocorrência.

• Desenvolvimento e implementação de leis e políticas destinadas a proteger contra a discriminação e a proteger os direitos das pessoas vivendo com o VIH.

Estas abordagens são interdependentes e reforçam-se mutuamente. As respostas num dado contexto (por exemplo, em serviços sanitários ou local de trabalho) podem ter consequên-cias sobre a maneira como as pessoas reagem em outros contextos (por exemplo, em casa). As reformas legais e políticas, como um meio para procurar resolver o estigma e a discriminação, têm um impacto limitado se não forem apoiadas pelos valores e expectativas das comunidades e da sociedade como um todo. O facto de controlar as acções discriminatórias que são a consequência do estigma, sem abordar as condições e atitudes que provocam tais acções, resulta inevitavelmente numa resposta que não será adequada. A estigmatização ocorre frequentemente em contextos e casos que não são regidos por leis, tal como no âmbito familiar e em recontros sociais do dia-a-dia, e para estas situações há necessidade urgente de agir para combater a sua ocorrência.

As reformas legais e políticas têm um papel importante a desempenhar para ajudar a tornar os valores sociais mais tolerantes e para estabelecer padrões, o que pode levar a reduzir a estigmatização e a discriminação em contextos comunitários e institucionais. Por sua vez, uma reforma legal e política que proteja os direitos humanos fornece um meio favorável para o desen-volvimento e implementação de programas eficazes de prevenção do VIH e de cuidados a casos de SIDA. Globalmente, a ausência de discriminação permite a indivíduos e comunidades de agir, mobilizar os seus recursos e responder colectivamente e de maneira positiva à epidemia de VIH.

Por fim, estigma, discriminação e direitos humanos fornecem três elementos essenciais para trabalho bem sucedido:

• Prevenção do estigma;

• Luta contra a discriminação quando esta tem lugar; e

• Promoção e protecção dos direitos humanos, incluindo controlo e correcção de violações de direitos humanos.

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Estudos de casos

IntroduçãoProjectos, programas e actividades num certo número de países desafiaram de maneira

inovadora estigma, discriminação e violações dos direitos humanos relacionados com o VIH. Enquanto parte deste trabalho foi concebida para enfrentar directamente estigma e discriminação, outras abordagens trabalharam de maneira mais geral e indirecta, criando contextos favoráveis e propícios.

As provas do êxito destes programas e actividades provêm de uma série de fontes incluindo documentos publicados, relatórios de projectos não publicados, avaliações externas e estudos de programas. Algumas das actividades e programas aqui descritos estão em vias de expansão como resultado do seu êxito inicial.

É importante saber que muitos programas ainda não foram formalmente avaliados. As provas dos efeitos positivos de programas que lutam contra o estigma e a discriminação e que promovem os direitos humanos podem levar tempo, e há muitos factores que podem influenciar os resultados eventuais. Contudo, em diferentes projectos, programas e actividades, há impactos que são frequentemente observáveis e que podem ser utilizados como indicadores de uma associação feliz entre acções e resultados de programas14.

Por exemplo, no contexto de uma comunidade, podem incluir:

• familiares e membros da comunidade mais dispostos a cuidar de pessoas seropositivas;

• melhores cuidados resultando em melhor qualidade de vida para pessoas vivendo com o VIH;

• membros da comunidade mais dispostos a se oferecerem como voluntários em programas de prevenção do VIH e cuidados a casos de SIDA;

• aumento do número de pessoas vivendo com o VIH que revelam a sua seropositividade e aumento da sua participação e liderança em esforços de prevenção, cuidados e sensibili-zação;

• diminuição de auto-estigma e mais confiança entre pessoas vivendo com o VIH; e

• uma maior evidência de atitudes positivas dentro das comunidades em relação a pessoas que vivem e que são afectadas pelo VIH e a SIDA.

Em contextos de cuidados de saúde, os indicadores de êxito podem incluir:

• maior procura de aconselhamento e detecção do VIH;

• maior acesso e procura de tratamento;

• diminuição do número de queixas de discriminação por parte de pessoas vivendo com o VIH e suas famílias;

14 Para um estudo de intervenções essencialmente baseadas nos EUA para reduzir o estigma relacionado com o VIH, ver Brown L., Trujillo L., Macintyre K. (2001) Intervention to Reduce HIV/AIDS stigma: what have we learned? Population Council: Horizontal Project. Para uma descrição geral de programas de luta contra estigma e discriminação relacionados com o VIH na Ásia do Sudeste, ver Busza J. (1999) Challenging HIV-Related Stigma and Discrimination in Southeast Asia: Past Successes and Future Priorities. Population Council: Horizons Project. http://www.popcouncil.org/horizons/reports/book_report/default.html

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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• melhor qualidade de cuidados prestados a pacientes seropositivos, resultando em melhor qualidade de vida;

• melhor disposição por parte dos trabalhadores de saúde para se ocuparem de maneira construtiva das pessoas vivendo com o VIH; e

• maior evidência de atitudes positivas em relação a pessoas vivendo com o VIH por parte dos trabalhadores de saúde em contextos que não são de cuidados de saúde.

Em procura de emprego e no local de trabalho, os indicadores de êxito podem incluir:

• diminuição de queixas de discriminação;

• aumento do número de voluntários nos locais de trabalho que participam em programas específicos de luta contra a SIDA;

• maior franqueza dos empregados seropositivos sobre o seu estado;

• empregados mais dispostos a trabalhar juntamente com pessoas que se sabe viverem com o VIH;

• maior procura de aconselhamento e detecção do VIH;

• maior procura de serviços de tratamento oferecidos por locais de trabalho; e

• políticas e práticas de apoio em relação ao VIH no local de trabalho.

Entre os programas locais descritos nos estudos de casos, vários estão a ser alargados pois foi reconhecido o seu benefício para as pessoas vivendo com o VIH e as comunidades nas quais vivem.

As acções que ajudam a lutar contra o estigma e a discriminação relacionados com o VIH podem ser classificadas em três vastos capítulos:

Iniciativas para redução do estigma

Estas abordagens têm tendência para se basear na comunidade ou nela se concentrar, e foram determinadas segundo uma gama de actividades de prevenção e cuidados. Incluem esforços dirigidos para os media com o objectivo de tornar as pessoas mais tolerantes e compreensivas perante aquelas que vivem com o VIH e encorajar a compreensão das suas situações.

Muitas destas iniciativas tiveram por objectivo reduzir o estigma graças a múltiplas estra-tégias, incluindo:

• melhorar a qualidade de vida das pessoas vivendo com o VIH graças a cuidados combi-nados, incluindo cuidados a domicílio;

• mobilizar líderes religiosos para fomentar o respeito e a cordialidade para com as pessoas vivendo com o VIH;

• procurar superar grandes desigualdades graças a educação participativa;

• criar um espaço favorável e confidencial para discussão de tópicos sensíveis;

• fornecer tratamento completo para o VIH e cuidados para casos de SIDA, incluindo acesso a terapia anti-retroviral;

• habilitar as pessoas vivendo com o VIH para que possam dirigir diversas actividades de apoio e sensibilização;

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• mobilizar líderes comunitários para encorajar maior franqueza sobre questões relaciona-das com sexualidade e VIH no âmbito das comunidades apoiando-se em normas sociais positivas; e

• sensibilizar as pessoas através dos media.

Medidas contra a discriminação

As medidas contra a discriminação tenderam para ter lugar em contextos institucionais – especificamente locais de trabalho ou serviços de saúde – e têm por objectivo abolir o estigma e a discriminação.

As estratégias utilizadas para procurar solucionar o estigma e a discriminação em contextos institucionais incluem: mobilizar o sector privado para implementação de políticas não-discrimi-natórias; encorajar a tolerância sobre a SIDA instruindo gestores e empregados; melhorar a qualidade de vida de empregados vivendo com o VIH graças a acesso a cuidados completos e implementação de políticas de trabalho não-discriminatórias; assegurar reparação quando ocorrem casos de discrimi-nação; e melhorar a qualidade de cuidados em serviços de saúde para pacientes que vivem com o VIH, trabalhando em colaboração com gestores e dispensadores de cuidados de saúde.

Abordagens legais e de direitos humanos

As abordagens de direitos humanos incluem: instituir acções legais para lutar contra a discriminação e outras violações dos direitos humanos em vários campos; assegurar o acesso a reparação; organizar campanhas de sensibilização a direitos, incluindo fomentar entre pessoas vivendo com o VIH o conhecimento dos seus direitos.

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Abordagens de redução do estigma

Abordagem: melhorar a qualidade de vida das pessoas vivendo com o VIH graças a cuidados integrados

Nome do projecto e sua localização

Programa Integrado de Luta contra a SIDA, Diocese Católica de Ndola, Zâmbia15, 16

ContextoO Departamento de Luta contra a SIDA da Diocese de Ndola foi estabelecido em 1993. O

programa da Diocese de Ndola presta cuidados integrados e apoio a doentes crónicos que são quase exclusivamente adultos. A maior parte deles apresentam sintomas de SIDA e/ou tuberculose. O programa gere 11 programas de cuidados a domicílio baseados na comunidade em 26 bairros pobres situados nos arredores de cinco cidades da província de Copperbelt.

Em 2003, o programa cobria uma população de 350.000 a 400.000 pessoas, com uma cobertura avaliada em 73% de doentes crónicos. O programa combina cuidados médicos e de enfer-magem, apoio socioeconómico, apoio jurídico e em direitos humanos, e tratamento psicológico. Nas comunidades cobertas pelo programa de Ndola, tal como em toda a parte, os níveis de prevalência de estigma e discriminação são altos.

Objectivos intermédios e finais Fornecer cuidados completos a pessoas vivendo com o VIH e/ou a tuberculose reforçando

a capacidade das famílias e comunidades a cuidar de tais pessoas; dar a conhecer maneiras de evitar e lutar contra o VIH; e promover o desenvolvimento da comunidade.

Actores principaisO programa é financiado por um consórcio de doadores. O Departamento de Luta contra a

SIDA da Diocese de Ndola é responsável pelo programa, empregando 11 pessoas a tempo completo. O programa funciona em 26 localizações com um total de 34 enfermeiros.

O programa de cuidados a domicílio não funciona a partir de um hospital ou outra insti-tuição de saúde, mas como uma parceria implicando vários departamentos da Diocese Católica de Ndola, trabalhando com organizações não-governamentais/grupos comunitários locais, equipas distritais de gestão sanitária, hospitais públicos e privados, o Programa da Polícia da Zâmbia de Apoio a Vítimas e um pequeno número de empresas locais.

As actividades são implementadas por mais de 750 voluntários proveniente da comu-nidade – principalmente mulheres que na sua maioria formaram as suas próprias comissões para controlo dos seus assuntos. Os voluntários são coordenados e dirigidos por coordenadores espe-cificamente destinados a tal fim e ‘agências administradoras’ que também são responsáveis pela gestão de medicamentos, alimentos e outros artigos e desembolso de fundos. Estas agências, em colaboração com grupos de voluntários, gozam de grande flexibilidade para organizar actividades a nível comunitário.

15 15 Boswell D. e Banda I. (2002) Home and community care in Zambia: and external evaluation of the AIDS integrated programme, Catholic Diocese of Ndola. Family Health International. 16 Blinkhoff P. et al. (1999) Under the Mpundu tree: volunteers in home care for people with HIV/AIDS and TB in Zambia’s Copperbelt. Actionaid: Strategies for Hope series no. 4 http://www.e-alliance.ch/resources/documents/pdf/SFHBook14.pdf

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Medidas tomadas• As famílias de pessoas vivendo com o VIH recebem assistência social. Mais de metade

das pessoas actualmente registadas nos cuidados a domicílio recebem alimentos. Doentes com tuberculose, famílias com órfãos e pacientes indigentes e abandonados recebem alimentação gratuita. As famílias muito pobres também recebem outros artigos domés-ticos de base.

• A ajuda a órfãos é feita através de propinas escolares e complementos nutricionais assim como ligação e encaminhamento para outros programas de apoio a órfãos.

• Os cuidados médico gratuitos são prestados por um ou uma enfermeira na casa de um paciente ou num posto clínico instalado na casa de um voluntário ou na igreja. Os doentes são normalmente encaminhados por familiares ou vizinhos, ou apresentam-se eles mesmos. As enfermeiras têm fornecimentos de medicamentos essenciais, assim como vitaminas e artigos médicos como luvas de borracha. Os doentes necessitando de tratamento mais especializado são encaminhados para hospitais e a continuidade do tratamento é mantida. O programa de cuidados a domicílio presta os seguintes serviços: tratamento de infecções oportunistas; prevenção e diagnóstico da tuberculose e fornecimento de Tratamento de Curta Duração sob Observação Directa (DOTS); diagnóstico, gestão de casos e trata-mento de infecções sexualmente transmissíveis (IST); e tratamento antipalúdico.

• As pessoas vivendo com o VIH recebem cuidados de enfermagem, geralmente reali-zados por membros da família com ajuda de pessoas voluntárias e enfermeiras. Não havendo familiares presentes ou se estes são doentes crónicos, a tarefa é desempenhada por voluntários. Estes seguem um curso de duas semanas sobre cuidados a domicílio adaptado de um manual da Organização Mundial da Saúde.

• As pessoas voluntárias dão apoio afectivo e ajuda prática a famílias afectadas; enfer-meiras e voluntários formados em aconselhamento fornecem orientação.

• Os grupos de apoio são geridos conjuntamente com pessoas vivendo com o VIH em cada um dos bairros onde o programa opera. Isto tem ajudado as pessoas vivendo com o VIH a viver de maneira positiva e a implicar-se em planos de micro-crédito e em activi-dades geradoras de renda. Segundo os lugares, tais grupos variam em capacidade e nível de actividade. Quatro centros polivalentes oferecem uma série de serviços que variam segundo os sítios mas que incluem actividades geradoras de renda, promoção sanitária, apoio a órfãos, formação e serviços limitados e confidenciais de aconselhamento e detecção voluntários, e que são destinados a pessoas infectadas ou afectadas pelo VIH e a SIDA. Cerca de 100 indivíduos são preparados para formar grupos para ‘viver de maneira positiva’.

• As enfermeiras dão informações às famílias sobre a transmissão do VIH e da tubercu-lose, e corrigem ideias erradas. Também ajudam a sensibilizar para a necessidade que têm as pessoas vivendo com o VIH de receber amor e apoio por parte das suas famílias e amigos. Ajudam a diminuir a discriminação das pessoas vivendo com o VIH e pessoas tuberculosas, neutralizando as informações erradas e os rumores prejudiciais sobre certos indivíduos. Também realizam discussões educativas em igrejas e outras organizações. Orientam jovens (em clubes anti-SIDA nas escolas), professores, grupos de teatro e empregados de programas de prevenção do VIH.

• Fornecimento de orientação em direitos humanos e apoio jurídico. Isto inclui formação em direitos humanos e igualdade entre os sexos destinada a voluntários, líderes religiosos e Departamento da polícia da Zâmbia de Apoio a Vítimas. A parceria do programa de cuidados a domicílio com o Departamento de Apoio a Vítimas, estabelecida em 1997 para

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prestar protecção jurídica contra maus tratos a crianças, posse abusiva de bens e violência contra mulheres, ajuda as viúvas impedindo a confiscação dos seus bens pela família do seu defunto marido. Também se presta ajuda para fazer testamentos.

• Para encorajar as pessoas a se tornarem voluntárias estabeleceu-se um sistema de incen-tivos. Por exemplo, num dado sítio, adquiriu-se um terreno para as pessoas voluntárias cultivarem.

Resultados notificados• O número de pessoas que desejavam participar no programa aumentou rapidamente. O

registo tem actualmente mais de 8.160 pacientes e foram registados mais de 8.000 órfãos. O programa de luta contra a tuberculose tem conseguido bons resultados.

• Embora neste campo o estigma continue a ser um desafio, com provas de discriminação contra pessoas vivendo com o VIH, incluindo agressão verbal, acusações de exploração por parte de indivíduos da sua seropositividade para receber benefícios sociais, e a estig-matização ‘por associação’ de voluntários e educadores colegas, há sinais de progresso. A diminuição do estigma está a ser conseguida dando o exemplo e acentuando que as pessoas vivendo com o VIH necessitam de apoio e cuidados e que os contactos diários com tais pessoas não representam risco. Ensinando os membros da família a cuidar dos seus parentes doentes, reduz-se a negligência e o abandono.

• Pelo seu exemplo, certas pessoas vivendo com o VIH têm ajudado a encorajar outras a procurar aconselhamento e detecção confidenciais e voluntários. Está planeado colocar a redução do estigma como uma questão geral em todas as áreas do programa, e intensificar o papel desempenhado pelas pessoas vivendo com o VIH na educação da comunidade e na redução do estigma.

• Voluntários disseram sentir menos receio da SIDA devido a uma melhor compreensão, alguns deles sentem-se menos estigmatizados e famílias de voluntários dizem haver nas suas próprias famílias maior franqueza sobre a SIDA e maior conhecimento devido ao facto de um dos seus membros ser agente de cuidados voluntário.

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Nome do projecto e sua localização

Programa conjunto Ministério da Saúde/organização não-governamental de cuidados a domicílio para pessoas com o VIH/SIDA no Camboja17

ContextoReconhecendo os limites dos serviços de saúde, as necessidades de números crescentes

de pessoas afectadas pelo VIH e um sector em expansão de organizações não-governamentais orientado para as comunidades no Camboja, iniciou-se em 1998 em Phnom Penh um programa piloto de cuidados a domicílio, sob a forma de uma parceria entre o Ministério da Saúde e um grupo de organizações não-governamentais. O trabalho principiou com uma rede piloto de equipas de cuidados a domicílio que empregava trabalhadores do governo e trabalhadores das organizações não-governamentais.

Esta rede tinha por objectivos dirigir e experimentar serviços de cuidados a domicílio apropriados para pessoas vivendo com o VIH, e desenvolver um modelo de cuidados de saúde no qual poderiam agir em parceria organizações não-governamentais e o governo. Segundo uma avaliação externa realizada em Junho de 2000 pela Aliança Internacional contra o VIH/SIDA, o programa estava a ter um impacto importante sobre a qualidade de vida das pessoas infectadas e afectadas pelo VIH, a cobertura era boa e os custos eram competitivos. O programa está agora em expansão.

A organização teórica do trabalho deriva da abordagem da OMS a planeamento de cuidados completos. Os quatro elementos correlacionados são tratamento clínico, cuidados de enfer-magem, aconselhamento e apoio social.

Objectivos intermédios e finaisFornecer serviços a domicílio integrados e apropriados para pessoas vivendo com o VIH

e outras afecções crónicas através de um modelo de cuidados de saúde segundo o qual organizações não-governamentais e o governo trabalham em parceria.

Actores principaisO Ministério da Saúde do Camboja, uma aliança de organizações não-governamentais

incluindo Aliança Khmer contra o VIH/SIDA, Visão Mundial e organizações não-governamentais locais, serviços de saúde locais, voluntários das comunidades, e pessoas vivendo com o VIH e a SIDA e suas famílias.

Medidas tomadas• Prestação de visitas a domicílio, aconselhamento e demonstração de cuidados e

tratamento sob formas locais, o que resulta em normalização de contactos estreitos com pessoas vivendo com o VIH. Há actualmente 20 equipas urbanas de cuidados a domicílio em Phnom Penh e outras em zonas rurais. Todas as equipas são compostas de duas enfermeiras do governo a tempo parcial, e entre um e dois funcionários de organizações não-governamentais a tempo completo, assim como vários voluntários da comunidade. As equipas urbanas estão instaladas em centros de saúde municipais em toda a cidade. Para as visitas aos pacientes, cada equipa de cuidados a domicílio separa-se em dois grupos que visitam os doentes uma a três vezes por semana. As equipas levam consigo medicamentos e fornecimentos em estojos de cuidados a domicílio especialmente concebidos, e prestam aconselhamento, educação e assistência. Os voluntários recrutados

17Wilkinson D. (2001) An evaluation of the MoH/NGO Home care programme for people with HIV/AIDS in Cambodia. Disponível em: http://www.aidsmap.com/en/docs/OFD10339-87FF-11D5-8D06-00508B9ACEB1.asp

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na comunidade passaram a ser elementos cada vez mais importantes do projecto. Cada equipa de cuidados a domicílio é auxiliada por cinco a dez voluntários, cada um dos quais trabalha cerca de 10 dias por mês com uma remuneração modesta. Alguns de tais voluntários são pessoas vivendo com o VIH.

• Os doentes crónicos, entre os quais as pessoas vivendo com o VIH representam cerca de 80%, recebem cuidados paliativos. Oferecer serviços a outros doentes crónicos significa que este projecto não é considerado como exclusivamente dedicado ou ‘identificado’ a pessoas vivendo com o VIH.

• A orientação é multissectorial. Fazem-se ligações e encaminhamento para outros serviços de saúde locais, do sector público ou tradicional. O pessoal do projecto comunica com chefes religiosos nos templos locais para assegurar serviços fúnebres tradicionais a pessoas vivendo com o VIH. Os voluntários desempenham um papel particularmente importante na apreciação de autoridades locais, chefes e curandeiros tradicionais.

Resultados notificados• O projecto resultou em menor sofrimento, maior confiança e melhor qualidade de vida

para as pessoas vivendo com o VIH. A avaliação18 notificou que 92% dos doentes sentiam que, sem as equipas de cuidados a domicílio, as suas vidas seriam muito mais difíceis em termos de isolamento, sentimentos de desespero e de perda de confiança, falta de apoio e ninguém para cuidar deles. A avaliação também descobriu que 63% dos doentes sentiam que a equipa de cuidados a domicílio os tinha ajudado a encarar o futuro de maneira mais positiva.

• Depois da participação da equipa de cuidados a domicílio, 79% de familiares sentiam que podiam enfrentar melhor o facto de ter uma pessoa seropositiva na família. Por exemplo, o marido de uma mulher seropositiva disse: “Costumava zangar-me com ela pois gastava todo o meu tempo e dinheiro a olhar por ela. A equipa de cuidados a domicílio deu-me coragem e apoio. Agora compreendo melhor e posso cuidar dela. Sem a equipa, teria sido impossível”.

• O projecto melhora a compreensão da SIDA reforçando os cuidados a domicílio e, graças à prestação de tais cuidados, ajuda a reduzir o estigma e a discriminação contra as pessoas vivendo com o VIH na comunidade. Embora algumas famílias tenham dito não terem sofrido discriminação antes do início do programa, 42% de membros da família e 33% de doentes comunicaram diminuição da discriminação nas suas comunidades como resultado das visitas de cuidados a domicílio. Além disso, 31% das pessoas vivendo com o VIH sentiam que tais visitas tinham melhorado a maneira como eram tratadas pelas suas famílias. Chefes comunitários disseram que, graças ao projecto, tinham observado na comunidade uma redução em discriminação, cólera e receio, e um aumento do apoio, compreensão e simpatia para com as pessoas vivendo com o VIH. Os níveis crescentes de encaminhamentos para o projecto originados na comunidade também são uma indicação do seu êxito. Em especial, o aumento do número de casos encaminhados por vizinhos e outros pacientes sugere uma diminuição da discriminação contra pessoas vivendo com o VIH e maior confiança nas equipas de cuidados a domicílio.

• O projecto desempenhou um papel importante em encorajar a revelação da seropo-sitividade. Embora metade das pessoas vivendo com o VIH que foram entrevistadas pela equipa de avaliação tenham dito guardar o segredo perante a sua comunidade, 45% disseram que as equipas de cuidados a domicílio lhes tinham dado confiança para partilhar as informações sobre a sua seropositividade com outras pessoas. Aumenta o número de pessoas dispostas a ‘tornar público’, depois de revelarem em grupos de apoio.

18 Ibid.

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Abordagem: mobilizar chefes religiosos para promover respeito e compaixão pelas pessoas que vivem com o VIH e a SIDA, e participar em actividades de prevenção

Nome do projecto e sua localização

Projecto Sangha Metta, Tailândia19

ContextoO Projecto Sangha Metta (Irmão Compassivo) foi iniciado em 1997 por um professor

budista leigo no campus Lanna da Universidade Budista Mahamakut em Chiang Mai, no norte da Tailândia. O seu objectivo era responder às necessidades comunitárias em relação com prevenção e cuidados em casos de VIH. O fundamento lógico era utilizar os recursos comunitários existentes para lutar contra a epidemia de SIDA e alargar o papel tradicional que os monges e monjas budistas desempenham em assistência social na região.

Objectivos intermédios e finaisMobilizar monges, monjas e noviços budistas para, através da sua participação em activi-

dades de prevenção e cuidados baseadas em compreensão, compaixão e solidariedade comunitária, desempenharem um papel nas respostas da comunidade à SIDA.

Actores principaisMonges e monjas budistas, pessoas vivendo com o VIH, comunidades locais.

Medidas tomadas• O projecto forma monges, monjas e noviços em questões relacionadas com a SIDA,

dá-lhes capacidades de gestão participativa e meios para trabalhar nas suas comunidades a fim de evitar a infecção por VIH e prestar apoio a famílias afectadas. Uma parte crucial da formação implica a promoção de atitudes positivas entre monges e monjas através de contacto estreito com pessoas vivendo com o VIH – por exemplo, comer alimentos por elas preparados. A doutrina budista e, em particular, os ensinamentos sobre o sofrimento e a compaixão contidos nas Quatro Verdades Nobres e os Quatro Estados Sublimes são utilizados para realçar a importância de compaixão e sensibilidade nas relações com pessoas vivendo com o VIH.

• Realizam-se seminários com chefes comunitários locais, monásticos e leigos, para chamar a atenção para o impacto da SIDA nas suas comunidades, motivar as comunidades a aceitar a prevenção e tratamento do VIH como parte das actividades de desenvolvimento comunitário, e ajudar a conceber estratégias para realizar actividades de prevenção do VIH e cuidados para casos de SIDA.

• Utilizando como directiva as éticas budistas como os Cinco Preceitos e o Nobre Caminho Óctuplo, os monges formados pelo projecto ensinam aos aldeões a reduzir os comporta-mentos de grande risco, a se tornar conscientes do VIH, e a evitar preconceitos e discrimi-nação.

• Os monges fazem visitas a domicílio e manifestam atenção pelas pessoas vivendo com o VIH, prestando aconselhamento com base no budismo e orientação sobre cuidados em casa.

19 http://www.buddhanet.net/sangha-metta/project.html

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• Os monges asseguram que as pessoas vivendo com o VIH podem manter uma vida espiritual, ensinando a meditar e organizando retiros de meditação diários ou semanais.

• Presta-se assistência às famílias para ajudar aos custos de funeral, assegurando-se que as pessoas que morrem devido à SIDA recebem os ritos funerários tradicionais. Mantém-se um banco de túnicas funerárias para utilização das famílias afectadas.

• A órfãos afectados pelo VIH, é oferecido apoio, incluindo um banco de leite, e ajuda para alojamento, alimentação e escolaridade.

• Grupos de apoio locais são dirigidos conjuntamente com pessoas vivendo com o VIH.

• Monges e monjas gerem um banco de medicamentos e a recolha de esmolas (incluindo artigos domésticos básicos tais como alimentos e artigos de limpeza) para distribuição a pessoas vivendo com o VIH.

• Num país onde muitas pessoas estão infectadas com o VIH devido a consumo de drogas injectáveis, os monges utilizam técnicas de debate tradicionais budistas para encorajar as crianças da rua e outros jovens a discutir e a reconhecer os perigos do abuso de substân-cias.

• Os monges realizam nas suas comunidades manifestações de sensibilização, anunciando ‘templos abertos às pessoas com o VIH’ para promover a integração de tais pessoas na comunidade, e anunciando apresentações por pessoas vivendo com o VIH e discussões nos templos para as comunidades locais.

Resultados notificados• Um número crescente de monges e monjas tailandêses (actualmente mais de 3.000) estão

a receber formação e apoio. Aplicando compaixão e sensibilizando, ajudaram a promover franqueza e aceitação das pessoas vivendo com o VIH e a dissipar mitos relacionados com a transmissão do VIH através de contactos casuais. Dado o respeito que os monges inspiram, gestos simples tal como aceitar e comer com alguém seropositivo têm ajudado a reduzir os receios e o estigma associados à doença. Para as pessoas vivendo com o VIH e suas famílias o que parece ser mais importante que o apoio material oferecido é a aceitação incondicional por parte das pessoas mais respeitadas da comunidade.

• Como a população local está habituada a contar aos monges as suas dificuldades, é a eles que se apoiam muitas pessoas seropositivas que não confessaram o seu estado a mais ninguém. Uma vez que os monges conhecem o segredo, e se tais pessoas estiverem de acordo, estes podem encaminhá-las para grupos de apoio e programas de assistência.

• As pessoas vivendo com o VIH estão agora a tomar uma parte mais activa em festivi-dades comunitárias e religiosas. Depois de tais manifestações públicas, certos indivíduos contactam a organização dispostos a confessar o seu estado ou a admitir que certos membros das suas famílias vivem com o VIH.

• O projecto Sangha Metta tem ajudado a estabelecer programas semelhantes em seis países vizinhos: Butão, Burma, Camboja, China, Laos e Vietname

O modelo de formação Sangha Metta também tem sido aplicado com êxito por líderes cristãos, hindus e islâmicos do Sri Lanka, Nepal, Paquistão e Afeganistão. Actividades semelhantes estão agora a ser realizadas nestes países e uma rede de trabalho entre religiões está a ser estabe-lecida.

• Eis exemplos específicos da maneira como se tem lutado contra o estigma nas comuni-dades:

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No Vietname, os monges falaram com membros da comunidade que tentavam fechar um posto que fornecia apoio a pessoas vivendo com o VIH. A comunidade alterou a sua decisão e agora ajuda no trabalho.

Mulheres seropositivas foram aceites em grupos femininos em aldeias do norte da Tailândia depois da intervenção dos monges.

Crianças seropositivas a quem tinha sido negada a admissão à escola foram agora admitidas.

Avós que tinham retirado os netos às suas mães seropositivas voltaram a entregá- -las depois de aconselhados e instruídos pelos monges.

Uma mulher jovem do nordeste da Tailândia que tinha sido rejeitada pela sua família, está agora de novo em casa recebendo apoio e cuidados da família depois da intervenção de monges.

Aumenta o número de membros das comunidades que assistem a funerais de pessoas mortas devido a doenças relacionadas com a SIDA.

Universidades budistas no norte e nordeste da Tailândia recrutaram pessoas sero-positivas como pessoas de recursos durante seminários e formações.

Uma universidade budista no nordeste da Tailândia atribuiu recentemente um diploma honorário de ciências sociais a uma mulher seropositiva em reconheci-mento do trabalho realizado em educação e sensibilização sobre a SIDA.

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Nome do projecto e sua localização

Acção Católica de Luta contra a SIDA, Namíbia20

ContextoEstabelecida em 1998, após aprovação da Conferência dos Bispos Católicos da Namíbia,

a Acção Católica de Luta contra a SIDA foi a primeira resposta nacional de base religiosa à epidemia de VIH na Namíbia. Com 13 escritórios em toda a Namíbia, o seu objectivo é inspirar e apoiar programas de prevenção do VIH, cuidados a domicílio, aconselhamento e detecção voluntários, espiritualidade e apoio a órfãos.

Objectivos intermédios e finaisLutar contra a epidemia de VIH tendo a ‘coragem de lutar e a força para cuidar’, apoiando-

-se no trabalho de grupos e instituições filiadas à igreja Católica Romana para inspirar e apoiar programas de prevenção e cuidados.

Actores principaisPessoas que vivem ou são afectadas pelo VIH, líderes religiosos, comunidades locais e

voluntários.

Medidas tomadas• A Acção Católica de Luta contra a SIDA participa em actividades de prevenção do VIH.

Voluntários formados fazem palestras sobre a SIDA em reuniões nas igrejas, escolas e manifestações em comunidades. Utilizam tais oportunidades para encorajar as comuni-dades a maior franqueza sobre a realidade relativa à SIDA, combater o estigma e dissipar informações erradas sobre a transmissão do VIH. Embora não distribuam preservativos, os voluntários dão informações concretas sobre preservativos e onde podem ser obtidos. Depois de muitos debates internos, a Acção Católica de Luta contra a SIDA decidiu adoptar uma abordagem à prevenção do VIH que promove os valores cristãos, e que ao mesmo tempo realça a importância de proteger a vida humana graças a comportamento sexual mais seguro. Eis os seus conselhos:

A representa abstinência de relações sexuais antes do casamento;

B significa ser fiel. Se acha que não pode seguir estes conselhos, escolher;

C para preservativos.

• O programa de cuidados a domicílio é apoiado por mais de 1.500 voluntários treinados, ajudando mais de 4.000 pessoas e mais de 18.500 órfãos. Agindo em grupos pequenos, os voluntários visitam a domicílio pessoas sofrendo de doenças crónicas (na sua maioria pessoas seropositivas), ajudando em tarefas práticas, fazendo encaminhamento para centros de saúde locais e hospitais, distribuindo medicamentos de base e vitaminas, e prestando apoio espiritual. Os voluntários recebem pequenos incentivos.

• A Acção Católica de Luta contra a SIDA tem em funcionamento três centros poliva-lentes onde as pessoas vivendo com o VIH ou por ele afectadas podem procurar infor-mação, orientação e conselhos jurídicos, actividades geradoras de renda, grupos de apoio, serviços de apoio a órfãos e géneros alimentícios. Dois destes centros oferecem acon-selhamento e detecção voluntários. Uma vez por semana, um médico voluntário está à

20 http://www.caa.org.na. Pour de plus amples informations, voir Byamugisha G. et al. (2002) Journeys of faith: church-based responses to HIV and AIDS in three southern African countries. TALC.

ONUSIDA

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disposição para consultas, encaminhamentos e distribuição de um número limitado de medicamentos gratuitos não exigindo receita. O centro tem uma pequena biblioteca de literatura e vídeos em relação com a SIDA que são utilizados em actividades de formação e no terreno. O Centro de Assistência Legal presta conselhos em questões legais uma vez por semana. Com base no êxito deste centro, foram abertos outros centros regionais. Dois deles oferecem aconselhamento e detecção voluntários, e estão a funcionar 10 centros de sopa dos pobres.

• Num esforço para quebrar o silêncio que rodeia a SIDA, a Acção Católica de Luta contra a SIDA realizou uma série de manifestações importantes, incluindo conferências sobre ‘Viver com a SIDA de maneira positiva’, uma marcha e reunião públicas, e uma mani-festação oficial de divulgação de um grupo de pessoas seropositivas da organização Lironga Eparu.

• A formação tem incluído trabalho com chefes religiosos sobre estigma e discriminação. Em 2002, seis reuniões de trabalho de três dias foram dirigidas por bispos, padres, freiras e diáconos. Uma tratou de estigma e discriminação, utilizando simulações e trabalho de grupo. Também se fez uma discussão sobre a maneira como a igreja oficial contribui para o estigma e o que pode ser feito para o reduzir. O Arcebispo Bonifatius, chefe da Igreja Católica Romana da Namíbia, participou à primeira reunião. Elogiou a franqueza da Acção Católica de Luta contra a SIDA em questões difíceis, incluindo o papel dos preservativos na prevenção do VIH.

• Os cursos de formação funcionam com líderes jovens, profissionais de cuidados de saúde e outros membros da comunidade sobre mobilização da comunidade, cuidados a domicílio e aconselhamento sobre o VIH. O trabalho com jovens inclui programas de formação entre colegas para alterações de comportamento – em especial, ‘Stepping Stones’ e ‘Adventure Unlimited’. Graças a estes programas conseguiu-se atingir mais de 8.000 jovens.

Resultados notificados• Os chefes religiosos que participaram às reuniões de formação sentiram que a experiência

era forte e que tinham adquiridos novos conhecimentos. Os bispos e a maior parte dos líderes paroquiais continuam a ser muito solidários, estando a maioria deles interessados em iniciar nas suas paróquias actividades de prevenção do VIH destinadas a jovens.

• Durante a inauguração do novo centro polivalente em Keetmanshoop, em Maio de 2003, realizou-se uma celebração eucarística com centenas de voluntários e pessoas vivendo com o VIH. Durante a cerimónia de abertura, uma pessoa seropositiva revelou o seu estado.

• O administrador da diocese do sul faz visitas semanais ao domicílio de pessoas vivendo com o VIH.

• O último acto oficial do arcebispo anterior Bonifatius Haushiku antes de falecer em Junho de 2002 foi a assinatura do prefácio da brochura Following in the Footsteps of Jesus, a qual era um resultado das reuniões de formação. Este trabalho era importante para ele e é o seu legado à organização.

• O centro pastoral em Doebra tem uma grande área dedicada a cruzes com fitas vermelhas. Durante o ano, especialmente na Sexta-Feira Santa, as pessoas trazem as suas cruzes com uma mensagem em lembrança dos mortos ou a favor dos doentes. Esta iniciativa foi lançada por um religioso e o seu superior depois de participar às reuniões de formação.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Abordagem: fornecer tratamento global contra a SIDA com base na comuni-dade, incluindo acesso a terapia anti-retroviral

Nome do projecto e sua localização

Iniciativa para Equidade perante o VIH, Haiti21, 22

ContextoDesde 1987, uma organização com fins não lucrativos ‘Parceiros em Saúde’ (filiada com

a Escola Médica de Harvard) e a organização irmã Zanmi Lasante (Parceiros em Saúde em crioulo de Haiti), têm vindo a prestar cuidados de saúde em Cange na região do Planalto Central de Haiti. Em conjunto, dirigem um certo número de programas, incluindo um hospital de serviços completos, um serviço de tratamento antituberculoso, um centro de saúde para mulheres, escolas, esforços de protecção da água e projectos geradores de renda. As actividades de prevenção do VIH principiaram em 1988 e incluíram a elaboração de brochuras, vídeos e programas culturalmente apropriados. O grupo também foi pioneiro em aconselhamento e detecção gratuitos e voluntários na região central de Haiti e foi o primeiro a introduzir a zidovudina (AZT) para a prevenção da transmissão do VIH de mãe para filho.

Em 1998, o programa registou os seus primeiros pacientes na Iniciativa para Equidade perante o VIH, um programa de tratamento de casos de VIH com base na comunidade, que fornece a pessoas vivendo com o VIH terapia anti-retroviral. Utilizando uma rede comunitária de saúde ligada a um centro médico denominado Clinique Bon Sauveur (estabelecido em 1985), a equipa implementou um dos primeiros programas de prevenção e cuidados integrados para casos de VIH num país de renda baixa.

Objectivos intermédios e finaisLevar os benefícios da ciência médica às pessoas que deles mais necessitam e servir como

um antídoto ao desespero, fornecendo cuidados de saúde de grande qualidade em contextos de poucos recursos e estabelecendo relações de solidariedade com organizações irmãs em tais contextos.

Actores principaisPessoas vivendo com o VIH, comunidades locais, trabalhadores de saúde comunitários e

profissionais de saúde.

Medidas tomadas• As equipas de trabalhadores de saúde comunitários prestam serviços a um milhão de

pessoas, incluindo rastreio da tuberculose e má nutrição, vacinação, educação em saúde, planeamento familiar, diagnósticos médicos de base e encaminhamento para serviços médicos onde se faz a despistagem e o tratamento das IST e da tuberculose. Actualmente, Zanmi Lasante e Parceiros em Saúde prestam diariamente cuidados médicos de grande qualidade a 200-300 doentes, a maioria dos quais não tem possibilidades para procurar tratamento em outros postos, incluindo serviços de saúde pública.

• Desde os meados dos anos 1990, as mulheres grávidas passaram a receber a terapia anti--retroviral para prevenção da transmissão vertical do VIH.

21 http://www.pih.org.22 Farmer P. et al. (2001) Community-based approaches to HIV treatment in resource-poor settings. Lancet 358:404-409.

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• Nos fins de 1998, iniciou-se um programa piloto de tratamento contra o VIH fornecendo a terapia anti-retroviral a 50 doentes com SIDA em estado avançado e que já não reagiam a tratamento sindrómico de infecções oportunistas. Os pacientes são inscritos no programa de tratamento utilizando critérios clínicos, quando não se dispõe de dados sobre a carga viral e o teste de CD4. A terapia anti-retroviral só é fornecida a pacientes sintomáticos, mas nem todos são inscritos. (Muitos têm tuberculose activa e outras infecções oportunistas e reagem bem ao tratamento de tais infecções.)

Como resultado do êxito do programa piloto, a iniciativa foi alargada. Um sistema de terapia anti-retroviral de observação directa está actualmente a ser prestado a cerca de 1.150 pessoas vivendo com o VIH no planalto central de Haiti. Isto representa 15,3% da população avaliada de doentes seropositivos que totaliza aproximadamente 7.500 pessoas.

Este projecto foi formulado segundo o seu programa de base comunitária de tratamento da tuberculose lançado em 1988 e que tinha tido grande êxito. Uma abordagem semelhante produziu altas taxas de cura mesmo no caso de estirpes de tuberculose resistentes a terapia multimedicamen-tosa. O sucesso da Iniciativa para Equidade perante o VIH deve-se em grande parte à participação activa dos trabalhadores comunitários de saúde, alguns dos quais são seropositivos. Tal como no caso do Tratamento de Curta Duração sob Observação Directa (DOTS) para a tuberculose, cada paciente é atribuído a um companheiro que observa todos os dias a ingestão dos medicamentos e que dá apoio ao paciente e à sua família. Vários pacientes que são beneficiários de terapia anti-retroviral com observação directa tornaram-se por sua vez companheiros.

Durante os próximos anos, Zanmi Lasante irá expandir a prevenção e cuidados a casos de VIH com base na comunidade a todo o Planalto Central inferior. Desde Junho de 2003, quatro novos postos satélites, todos eles instituições públicas, têm trabalhado com Zanmi Lasante para formar muitos companheiros, iniciar aconselhamento e detecção voluntários e inscrever novos pacientes. Em cada sítio, o objectivo das equipas é melhorar não só a prevenção do VIH e os cuidados a casos de SIDA, mas também a detecção e tratamento de casos de tuberculose, saúde pré-natal e feminina, e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis.

Resultados notificados• Os efeitos secundários têm sido raros e imediatamente tratados. A adesão ao tratamento

medicamentoso tem sido excelente e a resposta clínica em pacientes espectacular. A mortalidade tem sido nula entre os primeiros 100 pacientes que receberam pelo menos um mês de terapia anti-retroviral sob observação directa como pacientes externos, o que teve um efeito espectacular na procura de tal tratamento.

• A procura de cuidados reflecte-se num aumento notável da procura de serviços de acon-selhamento e detecção confidenciais e voluntários. Sabendo que existe tratamento eficaz, mais pessoas se apresentam para fazer o teste do VIH. Desde 1998, a procura de serviços de aconselhamento e detecção voluntários nas zonas rurais de Haiti aumentou mais de cinco vezes. Isto sugere que o acesso a terapia anti-retroviral leva a maior franqueza em relação à SIDA ajudando as pessoas a compreender que esta é uma doença crónica que pode ser tratada. Este aumento importante no número de pessoas desejando fazer o teste foi primeiro observado depois da introdução de AZT (e terapia anti-retroviral em combinação) em serviços pré-natais, com mais de 90% das mulheres aceitando a oferta de detecção do VIH uma vez que os medicamentos de terapia anti-retroviral ficaram disponíveis gratuitamente. Ao mesmo tempo, tal aumento fornece oportunidades cres-centes para aconselhamento sobre prevenção do VIH. As hospitalizações associadas ao VIH diminuíram assim como a incidência de tuberculose.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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• Há provas de que o acesso a terapia anti-retroviral, transformando uma doença fatal e fisicamente debilitante em uma crónica e tratável, fez diminuir o impacto do estigma para as pessoas vivendo com o VIH e suas famílias. Isto permitiu que as pessoas se tornassem de novo membros activos das suas comunidades. Um exemplo é o caso de um homem de Haiti que, antes de principiar a terapia anti-retroviral, mostrava sinais evidentes de enfraquecimento e sofria estigma e discriminação na comunidade e na sua família. Depois de entrar para o programa de tratamento, ganhou quase 14 kg em dois meses. Segundo conta, “Antes de principiar a terapia eu era um esqueleto ambulante. Tinha medo de sair de casa e ninguém vinha comprar coisas à minha loja. Mas agora estou de novo bem … A minha mulher voltou para junto de mim e agora os meus filhos não têm vergonha de ser vistos na minha companhia.”

• Embora ainda não tenha sido feita investigação etnográfica cuidadosa, é evidente que o aparecimento dos medicamentos anti-retrovirais resultou em melhor moral tanto entre pacientes como entre fornecedores de cuidados de saúde. A fidelidade do pessoal tem sido excelente e muitas das enfermeiras e médicos de Zanmi Lasante consideram a prevenção do VIH e os cuidados contra a SIDA como trabalho gratificante.

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Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Abordagem: habilitar as pessoas vivendo com o VIH a dirigir diversas activi-dade de apoio e sensibilização

Nome do projecto e sua localização

Participação de pessoas vivendo com o VIH em actividades de prevenção do VIH, Bielorrússia

ContextoA organização não-governamental “Movimento Positivo’ foi fundada na Bielorrússia em

1999. Com a sua sede em Minsk, a organização tem por objectivo fornecer apoio a pessoas vivendo com o VIH e a SIDA e seus familiares. Pessoas vivendo com o VIH, suas famílias, assim como os seus médicos, psicólogos e sociólogos são membros da organização. O Movimento Positivo imple-menta actualmente dois projectos do PNUD: ‘Prestação de Serviços Globais de Qualidade para Prevenção do VIH Destinados a Consumidores de Drogas na Bielorrússia’ e ‘Participação de Pessoas Vivendo com o VIH em Actividades de Prevenção do VIH/SIDA’. A primeira fase deste segundo projecto, financiado pelo ONUSIDA e iniciado em Setembro de 2001, concentrou-se em prestar apoio psicológico a pessoas vivendo com o VIH. Actividades subsequentes alargaram a orientação para incluir a promoção da implicação de pessoas vivendo com o VIH em actividades de prevenção. De acordo com o tema da Campanha Mundial de Luta contra a SIDA de 2002-2003, o objectivo do projecto é alterar atitudes estigmatizantes para com as pessoas vivendo com o VIH.

Objectivos intermédios e finaisEvitar maior propagação do VIH na Bielorrússia graças à implicação de pessoas vivendo

com o VIH e seus familiares em actividades de prevenção baseadas na comunidade; e minimizar os efeitos negativos da epidemia sobre a sociedade como um todo, e sobre certos grupos e indivíduos, graças a apoio psicossocial e actividades anti-estigma.

Actores principaisPessoas vivendo com o VIH, seus familiares, outros indivíduos afectados (incluindo

médicos) e comunidades locais.

Medidas tomadas• Estabelecimento de um grupo de auto-ajuda semanal para pessoas vivendo com o VIH.

• Prestação de terapia de grupo e individual por psicólogos profissionais.

• Existência de uma linha de telefone hotline sobre questões relacionadas com o VIH, funcionando com consultores formados que incluem pessoas vivendo com o VIH e fornecendo informação e apoio afectivo. Os consultores convidam as pessoas que telefonam e que necessitam de apoio psicológico profissional a consultar psicólogos do projecto. No início, a linha só funcionava duas vezes por semana. Agora, funciona cinco dias por semana. Mensalmente, telefonam cerca de 30 a 40 pessoas.

• Prestação de aconselhamento jurídico para pessoas vivendo com o VIH.

• As pessoas vivendo com o VIH participam em diversas actividades que têm por objectivo evitar o VIH. Várias pessoas estão implicadas em recrutar novos membros para os grupos de apoio a casos de SIDA, consultar o Centro Nacional para Prevenção da SIDA e postos, e oferecer informação e apoio afectivo às pessoas que fazem o teste de detecção do VIH. Certos voluntários prestam aconselhamento sobre o VIH através da Internet. Dois voluntários correspondem-se com prisioneiros seropositivos. Outros voluntários vão ao encontro de crianças das escolas e estudantes universitários para discutir o consumo de

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drogas e o VIH com base na sua própria experiência. Os voluntários também distribuem folhetos entre jovens em Minsk.

• Está a decorrer uma campanha de informação pública e sensibilização tendo por base os direitos, destinada a chamar a atenção para, e a reduzir, o problema do estigma e da discriminação em relação ao VIH. Isto inclui uma exibição/montagem de fotografias “The Door’ (A porta) que explica de que maneira o VIH entra na vida da pessoa e como a altera. Esta campanha inclui comunicação permanente com os media e departamentos governamentais.

Resultados notificados• Com o apoio do pessoal do Centro Nacional de Luta contra a SIDA, as pessoas vivendo

com o VIH acedem a informação, apoio psicológico em grupo e individualmente, acon-selhamento jurídico e cuidados médicos. Membros dos grupos de apoio estabeleceram entre si relações informais de solidariedade fora das reuniões oficiais. As discussões nos grupos de apoio são muito variadas, podendo os temas passar do VIH, doença e morte, a questões mais vastas. Certos membros dos grupos sentiram-se habilitados a exprimir as suas necessidades e interesses de maneira mais global tal como escrevendo cartas ao governo e ao público em geral. Dez pessoas vivendo com o VIH participaram a um seminário em Maio de 2003 intitulado “Necessidades das pessoas que vivem com o VIH/SIDA’, e participaram a um diálogo com profissionais médicos. Foi a primeira vez que membros do projecto falaram abertamente sobre a sua seropositividade e as questões que os afectavam.

• Experiências do projecto sobre prestação de apoio social e psicológico foram divulgadas em todo o país graças a um seminário para pessoas vivendo com o VIH e profissionais participando aos seus cuidados. Durante o seminário, voluntários do projecto e especia-listas do Centro Nacional para Prevenção da SIDA estabeleceram um diálogo não só sobre aspectos clínicos do VIH, mas também sobre as consequências sociais da epidemia e as perspectivas de quem vive com o VIH.

• Entre as pessoas vivendo com o VIH e que participam no projecto, aumenta o número das que estão dispostas a revelar a sua seropositividade. No início do projecto, a grande maioria das pessoas seropositivas sentiam-se incapazes de tomar parte em acções impli-cando revelação, e poucas pediram aconselhamento jurídico. Contudo, durante 2002, foram organizadas em diferentes cadeias de televisão oito apresentações de pessoas vivendo com o VIH. Dois jovens foram entrevistados com toda a franqueza, e jornais e revistas publicaram cinco artigos com as histórias de pessoas vivendo com o VIH. Nesses artigos foram discutidas as dificuldades associadas a estigma e discriminação contra pessoas vivendo com o VIH. Porém, e apesar de provas evidentes de franqueza crescente entre as próprias pessoas vivendo com o VIH, os seus familiares e amigos continuam a mostrar relutância em participar em actividades do projecto. Implicar as famílias continua a ser mais difícil do que estabelecer contacto com pessoas vivendo com o VIH.

• Em Maio de 2003, todos os voluntários seropositivos e outros membros do Movimento Positivo participaram à organização de uma conferência regional ‘Aumentar as possibi-lidades de defesa de pessoas vivendo com o VIH e a SIDA em Estados Recentemente Independentes’ realizada em Minsk como parte do projecto e com o apoio financeiro de ONUSIDA, a Fundação Ford e a Fundação Tides. Participantes de 21 países tomaram parte em discussões e formação em relação a acções podendo ser tomadas para eliminar a discriminação da vida de pessoas vivendo com o VIH. Os doadores formaram um pequeno fundo para subvenções e os participantes puderam pedir apoio financeiro para actividades de defesa nos seus próprios países.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Abordagem: aconselhamento e apoio a famílias afectadas, incluindo crianças, graças a ‘planeamento da sucessão’

Nome do projecto e sua localização

Planear a sucessão, Uganda23

Contexto Serviços de cuidados e apoio para pessoas vivendo com o VIH raramente têm sido ligados

a apoio permanente para os seus filhos. Planear a sucessão oferece uma abordagem inovadora para apoiar crianças e suas famílias afectadas pela SIDA enquanto os pais ainda estão vivos e em posição de conseguir resultados para as vidas dos seus filhos. Foi elaborada reconhecendo vários factos essenciais. Primeiro de tudo, os filhos ficam vulneráveis muito antes da morte dos pais devido à SIDA. Apesar dos desejos dos filhos de comunicação franca, a maior parte dos pais hesitam em discutir a situação com eles. Em definitivo, o futuro é a preocupação de pais seropositivos, seus filhos e futuros tutores, contudo, raramente tomam verdadeiras disposições em relação a tutela, escolaridade e outras questões. Planear a sucessão ajuda-os a preparar e discutir o futuro.

Objectivos intermédios e finaisImplicar os pais seropositivos no planeamento do futuro dos seus filhos a fim de assegurar

o seu bem-estar a longo prazo, ajudando-os a nomear tutores; preparar testamentos; confessar a sua seropositividade; iniciar projectos geradores de renda; criar livros de recordações; ajudar futuros tutores a se prepararem para as suas responsabilidades futuras; e atenuar as preocupações e melhorar o bem-estar actual e a longo–prazo de crianças cujos pais são seropositivos.

Actores principaisFamílias afectadas pelo VIH e suas comunidades, Plano/Uganda, Conselho de População/

Projecto Horizontes, Departamento de Sociologia da Universidade Makerere.

Medidas tomadasO planeamento da sucessão está a ser realizado com pais seropositivos, seus filhos (de

cinco a 18 anos de idade) e futuros tutores. As actividades incluem:

• Aconselhamento para pais seropositivos sobre a revelação da sua seropositividade aos seus filhos através de livros de recordações e outros meios. Os livros de recordações foram lançados no Uganda por um programa destinado a mulheres seropositivas patrocinado pelo Conselho Nacional de Mulheres vivendo com a SIDA. Contêm fotografias, árvores genealógicas, histórias e outras informações sobre a família, e podem ser utilizados para revelar às crianças a seropositividade dos pais.

• Apoio a pais em relação à designação de futuros tutores. Os pais são encorajados a nomear como tutores familiares ou amigos de confiança que as crianças conhecem bem e de quem gostam, com meios para cuidar de mais dependentes. O ideal é que os tutores sejam da mesma comunidade que a família afectada pela SIDA para que as crianças não sejam arrancadas às suas raízes ou sejam levadas para um ambiente desconhecido quando os pais morrem.

23 Resumo de investigação disponível em http://www.popcouncil.org/pdfs/horizons/orphanssum.pdf Gilborn L. e al. (2002) Impact of a succession planning program in Uganda. Apresentado na XIV International AIDS Conference, Barcelona. Gilborn L. e al. (2002) Making a difference for children affected by AIDS: baseline findings from operations research in Uganda. Population Council: Horizons Project.

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• Preparação gratuita para fornecer conhecimentos legais de base e forte apoio de conselheiros para encorajar a escritura de testamentos. Espera-se que o facto de preparar pais seropositivos a redigir os seus testamentos reduzirá a posse indevida de bens que afecta muitos sobreviventes, especialmente mulheres e crianças.

• Ajuda com propinas escolares e fornecimentos para crianças.

• Formação para geração de renda e capital inicial para encorajar pequenas empresas comerciais.

• Sensibilização das comunidades para as necessidades de órfãos e crianças vulneráveis.

Resultados notificadosO Projecto Horizontes e o Departamento de Sociologia da Universidade de Makerere

fizeram investigações sobre o programa de planeamento da sucessão implementado por Plan/Uganda para explorar a sua aceitação e impacto, e para determinar se o facto de planear a sucessão (junta-mente com a prestação de serviços de cuidados a pessoas vivendo com o VIH) tinha ajudado pais seropositivos a fazer planos para o futuro dos seus filhos. O estudo incluiu grupos de intervenção e comparação com inquéritos realizados antes e dois anos depois do grupo de intervenção lançar o planeamento da sucessão. Os resultados preliminares indicam que:

• O planeamento da sucessão estava associado a um aumento do número de pais que nomeavam tutores para os filhos, e que confessavam a sua seropositividade aos filhos mais velhos. À partida, 56% dos pais tinham arranjado um tutor para os filhos. Dois anos depois do início do projecto de planeamento da sucessão, este valor tinha passado para 81%. Também à partida, e apesar do facto da maioria dos pais e filhos mais velhos (com mais de 13 anos) serem favoráveis à revelação de pais a filhos, só 51% dos pais (que deram depois entrada para o planeamento da sucessão) tinham confessado o seu estado. Dois anos depois, 75% dos inscritos no grupo de planeamento da sucessão tinham confessado.

• O planeamento da sucessão multiplicou por dois o número de pais que escreveram testamento, embora o número ainda continue a ser pequeno. Embora à partida, 21% de órfãos mais velhos e 28% de viúvas tenham sido despojados dos seus bens, só 10% de pais seropositivos tinham escrito testamentos. Esta proporção dobrou dois anos depois entre os pais que viviam na zona onde estava a funcionar o projecto de planeamento da sucessão. Contudo, subsistem barreiras incluindo o facto de testamentos escritos não serem um hábito tradicional, padrões correntes de herança desfavorecendo mulheres e crianças, baixos níveis de educação, e receios muito comuns de que ‘planear para o caso de morte’ causará má sorte ou desgraça. Líderes comunitários e responsáveis de políticas terão de fazer esforços combinados para fazer respeitar os direitos das mulheres a património. Nas comunidades continuam a existir muitos obstáculos à escritura de testamento.

• Há provas que algumas destas práticas se espalharam para outras zonas que não estavam a participar em planeamento da sucessão, possivelmente graças a difusão de ideias. A equipa do estudo estava perplexa ao descobrir que melhoramentos em certas variáveis de resultados relacionadas directamente com o programa de planeamento da sucessão também apareciam entre o grupo de comparação (embora muitas vezes a um menor grau de grandeza). Estes resultados inesperados foram discutidos com auxiliares de aconselhamento os quais explicaram que a notícia do programa se tinha espalhado para zonas de comparação onde as comunidades estavam a pedir os mesmos serviços. Como alguns membros das mesmas organizações e auxiliares de aconselhamento trabalham nas mesmas zonas de estudo, é possível que tenham respondido a tais pedidos de maneira ad hoc. Este efeito de derrame limita a capacidade do estudo para tirar conclusões estatísticas

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em relação ao impacto do programa. Contudo, também pode ser um prova da atracção e aceitação do programa de planeamento da sucessão.

• Fizeram-se sugestões para estender a toda a comunidade os serviços de planeamento da sucessão, incluindo os que estão explicitamente ligados a morte, como escritura de testamento e de livro de memórias. Houve como uma tomada de consciência de que toda a gente é mortal, vivendo ou não com o VIH, e de que seria benéfico tomar medidas para assegurar a protecção dos seres amados. Isto personalizou as questões que enfrentam as pessoas vivendo com o VIH, e colocou-as como exemplos.

• Os auxiliares de aconselhamento que estão a implementar o programa de planeamento da sucessão comunicam que este era associado a aceitação crescente de pessoas vivendo com o VIH na comunidade. Tinham observado como pais seropositivos se tinham tornado mais activos sobre a sua própria saúde e o bem-estar das suas famílias, mais confiantes e, em certos casos, mais saudáveis (talvez devido a maior confiança e acesso a renda e alimentação). Declararam que, antes do programa, as pessoas vivendo com o VIH eram vistas como incapazes, não-produtivas, membros passivos da comunidade. Vê-las agora empenhadas em conseguir resultados para si mesmas e suas famílias alterou completamente tal imagem.

• A existência de planeamento da sucessão resultou num aumento nítido da procura de aconselhamento e detecção voluntários na comunidade. Parece que os serviços eram suficientemente atraentes para levar muitas pessoas da comunidade a fazer o teste de detecção do VIH. Embora para além do alcance da investigação que estava em curso, o efeito preciso pode ser que uma maior proporção de pessoas vivendo com o VIH na comunidade estão a conhecer a sua serologia e a aceder a serviços de cuidados, incluindo planeamento da sucessão, e uma maior proporção de membros seronegativos da comunidade estão a compreender que ainda têm a oportunidade de evitar a exposição ao VIH. Esta experiência oferece um exemplo de cuidados comunitários de grande qualidade, favorecendo não só cuidados mas também prevenção, e a natureza de reforço mútuo de serviços de prevenção e cuidados de grande qualidade.

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Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Abordagem: Procurar resolver grandes desigualdades graças a educação participativa

Nome do projecto e sua localização

Centro para Estudo da SIDA (CSA) na Universidade de Pretória, África do Sul24

ContextoO Centro para Estudo da SIDA (CSA) foi estabelecido em 1999 para que a Universidade

de Pretória como um todo fosse capaz de planear, e enfrentar, o impacto que a SIDA está a ter no sector da instituição e educação superior como um todo. Tem estado activo a promover um clima de franqueza e debate para que os responsáveis de políticas e de tomada de decisões estejam conscientes das questões e sejam capazes de lutar contra a SIDA numa série de contextos, através de programas e serviços, e a lutar contra atitudes racistas e prejudiciais entre pessoal e estudantes.

Objectivos intermédios e finaisIntegrar na Universidade de Pretória actividades relacionadas com a SIDA para assegurar

que a universidade como um todo é capaz de planear e enfrentar o impacto do VIH e da SIDA. Através das suas actividades, o CSA tem por objectivo estabelecer a Universidade como um lugar onde se possam implementar as disposições essenciais da Política Nacional de Luta contra a SIDA, incluindo aconselhamento e detecção voluntários, educação, apoio, investigação, política e aplicação dos direitos humanos. Um outro objectivo é criar um ambiente onde pessoal e estudantes se sintam em segurança e apoiados caso desejem confessar a sua seropositividade.

Actores principaisAdministração, decanos da universidade e faculdades, pessoal, estudantes, uniões, comu-

nidades locais e pessoas vivendo com o VIH.

Medidas tomadas• Estabeleceu-se uma Comissão Interfaculdades com a participação de representantes de

todas as faculdades da universidade, para assegurar que a SIDA está na ordem do dia e está a ser abordada em todas as áreas de inovação, desenvolvimento e investigação do programa.

• Foi introduzido um programa intensivo ‘SIDA no Local de Trabalho’ destinado ao pessoal administrativo e académico para assegurar que este conhece bem a legislação, as boas práticas no local de trabalho, o estabelecimento de estruturas de apoio, os cuidados de saúde e educação e formação em relação à SIDA.

• Graças à implementação do princípio GIPA (maior participação das pessoas vivendo com ou afectadas pelo VIH), o CSA emprega pessoas que se sabe viverem com o VIH para dirigir grupos de apoio para pessoal e estudantes. Tais pessoas também participam activa-mente em formação e desenvolvimento de políticas.

• A colaboração com o Centro para Direitos Humanos da universidade realça os direitos e responsabilidades do pessoal e dos estudantes, assim como assegura o empenho contínuo da universidade pela luta contra o racismo, o estigma e os preconceitos onde quer que estes se manifestem.

24 http://www.csa.za.org

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• O programa de ensino para estudantes coloca a SIDA no âmbito de vastos e exigentes debates sobre raça e racismo, cultura, classe social e diferenças entre os sexos. Isto, junta-mente com trabalho de promoção de cidadania, responsabilidade e governação graças a formação em liderança, permite o aparecimento de novas interpretações e explicações sobre a SIDA, e cria uma nova compreensão e empenho por mudanças de comporta-mento.

• Durante três anos estará em funcionamento um ‘Projecto de Desenvolvimento de Novas Competências’, com o objectivo de fornecer a jovens marginalizados os conhecimentos e capacidades de que necessitam para se investir em cuidados, apoio e tratamento a casos de SIDA. Também visa promover a integração de jovens em projectos comunitários existentes e serviços de saúde e/ou criar novos projectos e prestação de cuidados de saúde dentro das comunidades. Os grupos alvo são: jovens de 17 a 26 anos de idade; jovens desempregados e não escolarizados; membros de organizações de jovens e de outras organizações; e jovens vindos dos bairros pobres de Mamelodi e Atteridgeville, e de Pretória central.

• A universidade procura agora maneiras de resolver as necessidades relacionadas com cuidados do pessoal e dos estudantes pela expansão dos serviços clínicos, prestação de cuidados paliativos e, possivelmente, estabelecimento de serviços de hospício. Existe também um programa importante de apoio a nutrição para estudantes.

• Foi elaborado um conjunto de cuidados a domicílio com a intenção de melhorar a qualidade de vida e cuidados para pessoas com doenças crónicas, incluindo a SIDA, e contribuir para tratamento sintomático eficaz no lar da pessoa doente.

• Um programa de formação é oferecido ao pessoal académico e não académico, estudantes de todas as faculdades, além de formação incorporada sobre modelos de educação entre colegas, aconselhamento e apoio, e política do local de trabalho. Uma vez terminada a formação inicial, os voluntários podem continuar a formação em áreas focais tais como educação/sensibilização, media/recursos, investigação, cobertura de comunidades, local de trabalho e ‘auxiliares’. Os estudantes do último grupo são submetidos a formação intensiva em aconselhamento.

• A cobertura de comunidades foi estabelecida com centros de luta contra a SIDA em três terrenos satélites da universidade situados em zonas rurais.

Resultados notificados• A introdução de problemas relacionados com a SIDA em elementos do programa de

educação superior, incluindo em assuntos tais como direito, agricultura e engenharia, resultou em melhor compreensão das questões, diminuição da estigmatização e discussão mais franca sobre questões relacionadas com a SIDA.

• O apoio forte fornecido pela administração significou que a SIDA é considerada como um aspecto essencial de todas as tomadas de decisões e políticas da universidade.

• A grande clareza do programa e o trabalho dos enviados do GIPA contribuíram de maneira importante para uma alteração das atitudes do pessoal e dos estudantes, e estão a ajudar a criar um meio ambiente no qual a abordagem à SIDA é reconhecida como parte integrante do trabalho da universidade. Muitas estruturas estão a mudar de maneira criativa para incorporar as necessidades do pessoal e dos estudantes que vivem com o VIH.

• O trabalho do CSA de luta contra o estigma e os preconceitos está ser benéfico para toda a universidade, permitindo educação e campanhas eficazes.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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• O número de estudantes implicados na formação aumentou espectacularmente e agora existe um núcleo importante de estudantes treinadores e conselheiros.

• O projecto piloto para o conjunto de cuidados a domicílio mostrou que a sua utilização está a ter um profundo efeito na maneira como os cuidados a pessoas vivendo com o VIH são aceites e prestados, na qualidade de vida da pessoa que recebe tais cuidados, e na capacidade das famílias para prestar cuidados em contextos com poucos recursos.

• Foi estabelecido um Departamento de Investigação sobre SIDA e Direitos Humanos. Este departamento é dirigido por um professor de SIDA e Direitos Humanos, e encoraja a investigação numa vasta gama de campos, incluindo sexualidade e direitos sexuais; acesso a tratamento; comércio e questões de economia internacional; e direitos sociais e económicos em relação à SIDA.

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Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Abordagem: Mobilizar líderes comunitários para encorajar maior franqueza dentro das comunidades sobre questões relacionadas com sexualidade e VIH, apoiando-se em normas sociais positivas

Nome do projecto e sua localização

Programa de Saúde Integrado da Zâmbia (ZIHP), Zâmbia

ContextoO Programa de Saúde Integrado da Zâmbia (ZIHP) é um programa de assistência técnica

funcionando de 1999 a 2004 e que foi concebido conjuntamente pelo Ministério da Saúde e USAID no contexto de descentralização do sistema de saúde. A assistência ao sector da saúde é prestada a níveis diferentes e segue uma abordagem integrada. Os tópicos abordados incluem SIDA, paludismo, saúde reprodutiva integrada, e saúde infantil e nutrição. ZIHP concentra-se geograficamente em 12 dos 72 distritos e tem um objectivo nacional dirigido em primeiro lugar (mas não unicamente) para desenvolvimento de sistemas e intervenções nos media. Um objectivo essencial tem sido ajudar o sector da saúde a experimentar novas metodologias e identificar estratégias bem sucedidas para obter impacto em saúde a nível comunitário, com o fim de as alargar a todo o país.

O projecto presta assistência técnica em:

• Comunicação e alteração de comportamentos;

• Parcerias na comunidade;

• Melhores resultados dos trabalhadores de saúde;

• Parcerias do sector privado e apoio a sistemas.

As audiências principais incluem toda a comunidade: mulheres, crianças e homens. Em relação à SIDA, o projecto tem por objectivo aumentar a prática de comportamentos e a utilização de serviços conhecidos por serem eficazes na prevenção da transmissão do VIH.

Objectivos intermédios e finaisO objectivo global do ZIHP é contribuir para a missão do Governo da Zâmbia de prestação

de cuidados de saúde de grande qualidade e economicamente acessíveis aos zambianos:

• aumentando a capacidade dos beneficiários a implementar, monitorizar e avaliar inter-venções de saúde;

• melhorando a qualidade e cobertura das intervenções de saúde nos distritos partici-pantes;

• aumentando a capacidade das equipas distritais de gestão sanitária a servir e responder às necessidades de comunidades de acesso difícil; e

• aumentando as capacidades dos beneficiários a participar em programas de saúde.

Actores principaisZIHP trabalha com o Conselho Central de Saúde, equipas distritais de gestão sanitária

do Ministério da Saúde, centros de saúde e comunidades e outras organizações locais e internacio-nais. Cada componente do trabalho do ZIHP é implementada de parceria com outras organizações, segundo:

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• A componente de comunicações e parceria comunitária é implementada pela Universidade Johns Hopkins/Centro para Programas de Comunicações (JHU/CCP).

• A prestação de serviços e reforço de organizações não-governamentais é implementada por John Snow, Inc.

• A componente reforço de políticas e sistema é implementada por Abt Associates.

• A componente de comercialização social do ZIHP é implementada pela Sociedade Internacional de Serviços de Saúde da Família e População.

Medidas tomadas• Os membros da comunidade têm localmente funções específicas. Certos membros da

comunidade têm poder em questões específicas. Tais indivíduos incluem chefes, curan-deiros tradicionais, professores e chefes de departamentos governamentais. As comu-nidades têm normas que são culturalmente respeitadas e partilhadas, e as acções do povo ocorrem dentro de contextos culturais. As pessoas em posição de liderança podem desempenhar um papel essencial para encorajar alterações de comportamento. Baseadas nisto, estratégias importantes de prevenção do VIH incluem promoção de alterações de comportamento graças a abordagens centradas na comunidade e entre pessoas, e apoio a investimentos em promoção e desenvolvimento de liderança para membros influentes da comunidade. Em relação a estigma e discriminação, estão a ser tomadas duas abordagens: criação de capacidades de animação entre pessoas essenciais para encorajar discussões mais francas sobre a SIDA, sexos e sexualidade; e apoio a iniciativas de aconselhamento e detecção voluntários.

Professores, directores de escola e responsáveis do escritório distrital da educação foram preparados para preconizar a redução de estigma e discriminação nas escolas em relação com a saúde sexual dos jovens.

O pessoal administrativo intermédio no Departamento Judiciário foi preparado para influenciar políticas e reduzir o estigma, a discriminação e a marginalização de mulheres e jovens durante a interpretação da cultura e das tradições locais nos tribunais.

A preparação de chefes de governo distritais e de departamentos do sector privado em distritos escolhidos foi realizada para dirigir e reforçar respostas ao VIH no local de trabalho. Ao mesmo tempo, agentes nos empregos têm procurado favorecer diálogo constante sobre práticas estigmatizantes.

Educadores comunitários sobre VIH foram preparados em quatro distritos como animadores neste diálogo constante.

A preparação de 21% de curandeiros tradicionais nos distritos alvo foi realizada para aumentar o diálogo sobre a SIDA. Os curandeiros tradicionais são pessoas com influência nas comunidades e são essenciais para reduzir o estigma e a discrimi-nação.

• Foi prestado apoio ao Projecto de Prevenção e Cuidados para o VIH/SIDA no distrito de Lundazi, que fornece serviços móveis de aconselhamento e detecção voluntários a nível comunitário. O projecto dirige uma campanha de aconselhamento e detecção voluntários ‘conheça o seu estado’, e serve uma população de 65.000 pessoas.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Resultados notificadosOs resultados obtidos até agora reflectem alterações em percepções, relações e práticas

nas comunidades alvo, tais como:

• No distrito de Lundazi, de 11 chefes seis mobilizaram as suas comunidades para lutar contra o estigma e a discriminação relacionados com o VIH e a SIDA. A prova é o facto de que mais de 10% dos membros da comunidade fizeram o teste de detecção do VIH. Além disto, há alterações positivas em algumas das práticas tradicionais que tornam as mulheres e as raparigas vulneráveis. Práticas do tipo heranças de viúvas, rituais de purifi-cação sexual e casamentos precoces foram desencorajados através de um decreto escrito. Três dos seis chefes fizeram o teste de detecção do VIH e uma chefe participou aos seus sujeitos os seus próprios resultados.

• As pessoas que fizeram o teste de detecção do VIH formaram grupos de apoio, que incluiem líderes comunitários, chefes de tribo responsáveis, líderes religiosos e conselheiros dos chefes. Os grupos incluem indivíduos seropositivos e seronegativos. Um grande número dos grupos de apoio comunitário são dirigidos por mulheres num contexto de uma sociedade dominada por homens. Organizam reuniões comunitárias para discutir questões relacionadas com as diferenças entre sexos. As mulheres lutam contra a dominação masculina em relações sexuais e contribuem para discussões comunitárias muito peremptoriamente. “Quando introduzimos a questão dos sexos tivemos realmente um problema mas, depois de discutir com os homens, vimos que eles começavam a aceitar o que tentávamos partilhar com eles,” conta uma responsável do programa. “Agora, não temos muitos problemas com a resistência masculina. As mulheres chegam a ir sozinhas buscar os preservativos em nome dos maridos. Isto é realmente uma grande mudança.”

• A procura de informações sobre a SIDA tem sido crescente assim como a disposição entre as comunidades para aprender. As comunidades alvo discutem mais abertamente questões de diferenças entre sexos e sexualidade e assim reduzem o estigma associado ao compor-tamento sexual das pessoas. As reuniões comunitárias sobre diferenças entre sexos, sexu-alidade e SIDA estão a lutar contra mensagens tradicionais sobre rapariga-criança, o que realça o papel das raparigas como objectos sexuais. Em vez disso, os conselheiros tradi-cionais são encorajados a passar mensagens mais apropriadas sobre sexo e sexualidade.

• Num distrito, as igrejas formaram uma aliança para apoiar a prevenção do VIH, activi-dades de cuidados e apoio para pessoas vivendo com o VIH e jovens.

• Os curandeiros tradicionais estão a mudar de ideias sobre a SIDA. A ideia de que uma pessoa contrai o VIH por ter agido ao contrário das normas comunitárias está a ser substituída por factos. Esta abordagem coloca a SIDA numa perspectiva mais realista e resulta em maior respeito pelos membros da comunidades que vivem com o VIH. Certos curandeiros tradicionais são membros de equipas de cuidados a domicílio e distribuem preservativos. Durante sessões de educação, chamam a atenção para questões de estigma e discriminação.

• Os líderes cívicos de um distrito têm um programa activo sobre sexualidade e SIDA, falando sobre estigma e discriminação na rádio local uma vez por semana.

• Na maior parte das escolas, as raparigas que ficam grávidas durante a escolaridade têm agora a possibilidade de se ausentar e de voltar depois para continuar os estudos.

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Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Abordagem: Sensibilizar através dos media

Nome do projecto e sua localização

‘Soul City’, África do Sul25

ContextoSoul City é uma organização não-governamental, um projecto nacional multimedia

‘educativo-recreativo’ que funciona desde 1992. O seu objectivo é conseguir exercer impacto positivo na qualidade de vida das pessoas integrando questões de saúde e desenvolvimento em peças apresentadas na televisão e na rádio nas horas de maior escuta, numa mistura de línguas da África do Sul. Soul City desenvolveu e apresentou cinco séries de televisão, cada uma com cerca de 13 episódios, nas quais vários tópicos são abordados, incluindo VIH e SIDA, tabaco, tuberculose, sexualidade de jovens, saúde infantil e violência contra mulheres. Soul City também tem um certo número de projectos derivados incluindo materiais de preparação para a vida activa e uma série ‘educativa-recreativa’ para a televisão destinada a crianças chamada Soul Buddyz.

Todas as séries da televisão abordaram questões em relação com a SIDA, incluindo viver de maneira positiva, e estigma e discriminação ligados à SIDA. A série radiofónica foi desenvolvida sobretudo para atingir audiências rurais e os textos e mensagens utilizados são semelhantes aos utilizados na televisão. O texto relativo à SIDA foi concebido para a apresentar como uma questão franca, mostrando-a como uma doença podendo afectar pessoas normais, vivendo de maneira normal num bairro ou zona rural típicos. Um dos objectivos de Soul City tem sido combater o estigma e encorajar apoio para pessoas vivendo com o VIH.

Objectivos intermédios e finaisExercer impacto positivo na qualidade de vida das pessoas integrando questões de saúde e

desenvolvimento em peças apresentadas na televisão e na rádio nas horas de maior escuta, apoiadas por brochuras de leitura fácil.

Actores principaisComunidades em toda a África do Sul – em especial, grupos historicamente em desvan-

tagem. Soul City atinge 79% da população alvo (16,2 milhões de pessoas).

Medidas tomadas• Desde as primeiras séries, apresentadas em 1994, Soul City abordou tópicos relacionados

com a SIDA. A segunda série da televisão (apresentada em 1996) abordava: viver com o VIH e a SIDA e grupos de apoio, mitos existentes sobre a transmissão do VIH, reacção das pessoas não informadas a pessoas vivendo com o VIH, enfrentar a seropositividade, e SIDA e morte. A terceira série acentuava o facto das pessoas vivendo com o VIH terem possibilidades de escolha e poderem escolher viver de maneira positiva, assim como os seus direitos. A quarta série de Soul City (apresentada em 1999) tinha dois episódios tratando de estigma e discriminação relacionados com a SIDA – um sobre discriminação no local de trabalho, e outro sobre revelação da seropositividade e reacções das pessoas. Os temas afins na quinta série (apresentada em 2000) incluíam um episódio sobre morte relacionada com o VIH e viver com o VIH de maneira positiva, um sobre apoio e cuidados a pessoas vivendo com o VIH e acção comunitária de assistência, e outro episódio sobre

25 http://www.soulcity.org.za

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preconceitos sobre a SIDA, a necessidade das pessoas serem informadas e instruídas a esse respeito e a importância de viver de maneira positiva.

• Numa série de televisão do mesmo tipo mas destinada a crianças, Soul Buddyz 1 (26 episódios de meia-hora, apresentados em 2000), cinco episódios abordavam as reacções e preconceitos perante as pessoas vivendo com o VIH.

• Concebeu-se uma série de emissões radiofónicas de 15 minutos com textos semelhantes aos da série da televisão.

• Soul City produziu uma série de brochuras, incluindo SIDA na nossa comunidade e Viver com o VIH/SIDA de maneira positiva. Material educativo para jovens e destinado ao grupo etário 12-18 inclui Escolher viver: viver com o VIH e a SIDA. Também está disponível um guia sobre a maneira de conceber e gerir um projecto ‘educativo-recre-ativo’ para desenvolvimento social. Soul Buddyz tem materiais destinados a crianças contendo factos sobre a SIDA, assim como maneiras de apoiar as pessoas vivendo com o VIH, com um capítulo especial sobre discriminação.

Resultados notificados• Uma avaliação interna26 da segunda série revelou que, de uma maneira geral, as atitudes

para com as pessoas vivendo com o VIH tinham melhorado devido ao trabalho de Soul City, e as dúvidas tinham sido reduzidas de maneira espectacular. Isto era especialmente impressionante entre os grupos etários mais jovens. Soul City forneceu às audiências conhecimentos sobre a doença, o que lhes permitiu formar opiniões esclarecidas.

Os resultados da avaliação da quarta série27 incluem o seguinte:

• Em termos de atitudes para com as pessoas vivendo com o VIH, a maior alteração quanti-tativamente observada não foi nas atitudes das próprias pessoas mas na sua percepção das atitudes de outras. Isto é, a norma social observada em relação a evitar e/ou afastar-se das pessoas vivendo com o VIH tinha-se alterado de maneira significativa para uma posição mais tolerante. Soul City, tanto na rádio como na televisão, teve um impacto importante na percepção desta norma social, e quanto mais a pessoa tinha sido exposta a Soul City, maior era a mudança para maior tolerância.

• Os temas que emergiram da investigação qualitativa sobre o impacto de Soul City sobre a SIDA foram: 1) casos de atitudes e valores pessoais mudando para maior aceitação, apoio e normalização de pessoas vivendo com o VIH; e 2) tomada de consciência do facto que uma pessoa, mesmo seropositiva, pode levar uma vida normal e saudável.

• Soul City foi fortemente associada à disposição declarada de certas pessoas a executar os seguintes actos que podem levar a práticas sexuais mais seguras ou maior aceitação e cuidados a pessoas vivendo com o VIH: telefonar para a linha SOS SIDA; ajudar uma pessoa seropositiva; pedir aos parceiros para utilizar preservativos; e fazer o teste de detecção do VIH. Contudo, em relação a estas acções, o impacto sobre comportamentos é menos aparente.

• Soul City foi fortemente associada a promoção de comunicação entre pessoas sobre o VIH e a criação de maior abertura e disposição para falar sobre assuntos sensíveis, incluindo sexualidade de jovens.

26 Disponível em http://www.soulcity.org.za/14.04.asp27 Ibid.

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Soul City ajuda a criar um ambiente propício no que diz respeito à SIDA. Em especial, existem provas de ter tido um impacto positivo sobre liderança comunitária (por exemplo, líderes tradicionais e religiosos, e conselheiros locais) e instituições fornecedoras de serviços (por exemplo, serviços de saúde e educação, assim como o sector das organizações de base comunitária e não- -governamentais). Soul City é conhecida como um mecanismo educativo competente em termos de SIDA por estas organizações e instituições, e pessoas em posições de liderança ou de apoio são influenciadas por Soul City cujas mensagens são activamente utilizadas durante a sua participação comunitária. Assim, as mensagens de Soul City são eficaz e activamente ‘amplificadas’ através de mecanismos, estruturas e serviços de base comunitária e foros comunitários mais vastos.

• A avaliação de Soul Buddyz28 concluiu que Soul Buddyz tinha atingido 67% das crianças entre oito e doze anos. Entre as crianças que viram as séries na televisão, 77% disseram ter falados com outras pessoas sobre o que tinham visto. Entre as crianças que tinham televisão mas que não tinham visto Soul Buddyz, 48% estavam dispostas a ser amigas com alguém vivendo com o VIH, contra 80% das que tinham visto Soul Buddyz na televisão.

28 Disponível em http://www.soulcity.org.za/14.04.asp

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Medidas antidiscriminatórias

Abordagem: Mobilizar o sector privado para implementação de políticas não-discriminatórias de luta contra a SIDA e promoção de conhecimentos sobre a SIDA

Nome do projecto e sua localização

Aliança Tailandesa de Empresas contra a SIDA (TBCA), Tailândia29

ContextoA Aliança Tailandesa de Empresas contra a SIDA (TBCA) é uma organização com

fins não-lucrativos estabelecida em 1993 com o objectivo de reunir empresas de todo o país para mobilizar o sector privado a responder eficazmente aos problemas postos pela SIDA, e ajudar a resolver a discriminação com que deparam os empregados que vivem com o VIH. Estabelecida com o apoio do Ministério da Saúde Pública da Tailândia, a Organização Mundial da Saúde e o sector empresarial em Banguecoque, a abordagem básica da TBCA tem sido considerar a SIDA como uma questão de gestão que deve e pode ser gerida a fim de evitar mais perdas de recursos valiosos, como capital humano e competências.

Em 1997 e 2001, a TBCA realizou estudos em, respectivamente, 404 e 125 companhias tailandesas. Tais estudos revelaram que campeava a discriminação, muitas companhias violavam o direitos dos empregados a sigilo submetendo candidatos ou empregados a testes de detecção do VIH obrigatórios, e muitas não forneciam ao pessoal informações sobre a SIDA através de programas de formação.

Objectivos intermédios e finaisMobilizar a comunidade económica para responder eficazmente aos problemas postos

pela SIDA promovendo políticas de trabalho coerentes e não-discriminatórias e programas de educação.

Actores principaisParceiros de TBCA com companhias multinacionais e nacionais, cobrindo todos os prin-

cipais sectores económicos como industrial, hospitalar, bancário e farmacêutico. Em tamanho, as companhias vão desde as que só têm sete empregados às que empregam mais de 10.000. Embora no princípio os membros de TBCA fossem principalmente internacionais, com o decorrer do tempo o interesse crescente de companhias tailandesas deu-lhe um carácter mais local. Agora, cerca de 43% das empresas são locais. Outros parceiros importantes incluem câmaras de comércio internacionais, assim como a Aliança Mundial de Empresas contra o VIH/SIDA e a Iniciativa a Favor da Saúde do Foro Económico Mundial.

Medidas tomadas• TBCA é a fundadora da Aliança Asiática de Empresas contra a SIDA (ABC contra a

SIDA), uma rede de organizações não-governamentais e empresas em 11 países asiáticos que tem por objectivo aumentar a resposta económica à SIDA a nível regional. Exploram--se duas estratégias principais: 1) reforço das capacidades dos parceiros económicos, tais como organizações não-governamentais locais e outras alianças de empresas contra a SIDA; e 2) extensão internacional de empresas para implementar no local de trabalho

29 http://www.abconaids.org

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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programas sobre o VIH na Ásia. ABC contra a SIDA coordena a implementação de políticas e de estratégias de intervenção e ajuda as companhias com informações através do seu sítio internet www.abconaids.org.

• O sítio internet de ABC contra a SIDA oferece muitos recursos, incluindo uma brochura identificando estratégias para uma resposta económica dentro e fora do local de trabalho; um manual dando uma descrição geral completa de intervenções relacionadas com a SIDA no local de trabalho; estudos de casos de programas em locais de trabalho; uma lista de organizações de luta contra a SIDA na região; exemplos de políticas sobre a SIDA e directivas para as formular; aconselhamento sobre instalações aceitáveis para empregados seropositivos para que possam continuar a trabalhar o maior tempo possível; informação sobre detecção e importância da ausência de discriminação e protecção dos direitos humanos; aconselhamento em resolução de problemas no local de trabalho; e linhas gerais de programas de formação elaboradas para evitar a discriminação no local de trabalho.

• TBCA fornece às empresas seis programas de formação destinados a evitar e controlar o VIH no local de trabalho. Os serviços incluem: instruções (sensibilização de respon-sáveis superiores); formação em gestão de recursos humanos; formação do pessoal em prevenção do VIH e trabalho com pessoas seropositivas; educação por colegas; formação de conselheiros; e formação de educadores.

• TBCA gere vários programas de base comunitária para ajudar a formar empregados que vivem com o VIH e para fornecer serviços de cuidados e aconselhamento às pessoas que necessitem. Como parte deste trabalho, TBCA opera um serviço telefónico automático (1645 AIDS Hotline).

• TBCA fornece serviços contínuos de consulta a empresas sobre desenvolvimento de políticas, questões legais e acesso a cuidados e apoio. TBCA elaborou e distribuiu um manual sobre a SIDA no local de trabalho como uma ajuda para gestores.

• TBCA organiza programas de ligação profissional para representantes comerciais e não-comerciais sobre estratégias de intervenção no local de trabalho em relação ao VIH e sensibilização do sector privado.

• TBCA concebe e implementa projectos de intervenção em relação ao VIH visando certas indústrias tais como a indústria da pesca (o seu ‘Programa para Marinheiros’ é gerido de parceria com o UNICEF e o Ministério da Trabalho) e as companhias de seguros. TBCA ajudou a estabelecer um plano de credenciais que dá às companhias que trabalham junta-mente com American International Assurance (AIA) um bónus financeiro no caso da implementação de actividades de prevenção e luta contra o VIH no local de trabalho.

• TBCA também presta formação interna para empregados sob a forma de programas adaptados de prevenção e educação sobre o VIH. Isto inclui formação em aconselha-mento básico e outras competências para que os empregados possam continuar a dirigir programas contra a SIDA nos seus locais de trabalho.

• Nos próximos cinco anos, com o apoio do Fundo Mundial de Luta contra a SIDA, a Tuberculose e o Paludismo, a TBCA, o Ministério da Saúde Pública, o Ministério do Trabalho e 34 organizações não-governamentais colaboradoras trabalharão em conjunto num projecto intitulado: ‘Prevenção e Gestão de Casos de VIH/SIDA no Local de Trabalho’.

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Resultados notificados• Companhias parceiras produziram políticas explicitas sobre a SIDA no lugar de trabalho.

As questões abordadas incluem: medidas não-discriminatórias, confidencialidade sobre a serologia VIH (não detecção do VIH), acesso dos empregados a informações precisas sobre a SIDA graças a formação e sensibilização, e acesso a cuidados e apoio.

• Implementação numa base anual de programas de formação do pessoal e de administra-dores.

• Os programas no local de trabalho foram expandidos para incluir outras companhias e/ou indústrias pela introdução de redes de influência por colegas e promoção numa escala nacional.

• Tem sido prestada assistência a antigos empregados e dependentes vivendo com o VIH, o que ajudou a melhorar a sua qualidade de vida.

• A promoção entre departamentos governamentais, câmaras de comércio e organizações profissionais tem sensibilizado para programas sobre a SIDA no local de trabalho.

• Empregados tornaram-se voluntários para participar e ajudar organizações não-governa-mentais que lutam contra a SIDA ou projectos específicos com o mesmo fim.

• Empregados seropositivos comunicaram níveis crescentes de aceitação e apoio em relação ao seu estado.

• Desde a criação da linha de telefone hotline em 2000, foram recebidas mais de 80.000 chamadas de toda a Tailândia.

• Com a assistência da TBCA, foram estabelecidos, em outros países asiáticos, programas piloto promovendo a não-discriminação e a aplicação dos direitos humanos de empre-gados vivendo com o VIH.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Abordagem: melhorar a qualidade de vida dos empregados graças a acesso a cuidados integrados e implementação de políticas não-discriminatórias

Nome do projecto e sua localização

Volkswagen (VW) Brasil

ContextoVolkswagen do Brasil, com 30.000 empregados, é uma companhia subsidiária do Grupo

Volkswagen, o quarto maior fabricante de automóveis do mundo. O Programa de Cuidados a Casos de SIDA de VW do Brasil, iniciado em 1996, é uma iniciativa que tem por objectivo a prevenção do VIH e cuidados e tratamento de empregados que vivem com o VIH. Na década anterior, tinha havido 115 casos conhecidos de infecção por VIH entre os empregados e, nesse grupo, havia uma grande incidência de doenças relacionadas com o VIH, altos custos com os cuidados com internamentos repetidos em hospital e taxas altas de abandono do trabalho.

De um ponto de vista económico, a experiência de VW do Brasil demonstra a eficácia e as economias em custos para as companhias que resultam do fornecimento de tratamento e cuidados coordenados e especializados à sua força de trabalho. As economias resultantes da redução do absentismo e da perda de empregados estão no centro desta abordagem. Como resultado da decisão, em Agosto de 2000, do governo brasileiro de fornecer tratamento a todos os brasileiros seroposi-tivos, o custo deste programa de cuidados baixou de maneira espectacular.

Objectivos intermédios e finaisEstabelecer um programa de cuidados para casos de SIDA capaz de criar um serviço

eficaz e eficiente para empregados e de impedir o aumento dos custos relacionados com a SIDA; promover políticas antidiscriminatórias com respeito a empregados vivendo com o VIH; e organizar um programa paralelo de prevenção do VIH.

Actores principaisEmpregados de VW, administração, serviços de saúde.

Medidas tomadas• O programa de prevenção no local de trabalho concentra-se em informação, educação

e aconselhamento, utilizando apresentações e vídeos educativos e disseminando infor-mações através do serviço radiofónico da companhia, jornais internos e internet, quadros de afixar boletins e brochuras sobre a SIDA. Nos próprios edifícios do trabalho foram instaladas máquinas distribuidoras de preservativos. Os membros do pessoal de VW participam em actividades organizadas pelo Conselho Nacional do Comércio para Prevenção do VIH/SIDA do qual VW é membro.

• O programa de cuidados para pessoas vivendo com o VIH principiou com a elaboração de um Protocolo Técnico que procurou uniformizar os cuidados e a assistência fornecida no âmbito do programa, permitindo ao mesmo tempo uma certa flexibilidade para necessidades individuais. Presta-se tratamento e aconselhamento, o que inclui acesso a especialistas de doenças infecciosas, trabalhadores sociais, nutricionistas, psicólogos, e encaminhamento para hospitais especializados e agências fornecendo cuidados a domicílio. As pessoas vivendo com o VIH têm acesso a medicamentos anti-retrovirais e testes clínicos tais como contagem das células CD4/CD8 e medidas da carga viral.

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• Como parte da política não-discriminatória da companhia, os empregados que vivem com o VIH recebem assistência para poderem ser reintegrados no trabalho. As medidas antidiscriminatórias incluem a proibição de detecção do VIH obrigatória, o não despedi-mento de empregados seropositivos, e o direito dos empregados que vivem com o VIH a confidencialidade.

Resultados notificados• Nos fins de 2002, a companhia comunicava que desde o início do programa de cuidados o

seu sistema de análise tinha mostrado uma redução de 90% em hospitalizações e de 40% em custos de tratamento e cuidados. Além disso, 90% das pessoas vivendo com o VIH eram activas.

• Notou-se uma melhor qualidade de vida no local de trabalho para pessoas vivendo com o VIH, assim como um aumento distinto do nível de satisfação dos empregados pela companhia.

• Houve uma redução nos períodos de ausência do trabalho devido a prevenção e luta contra doenças relacionadas com o VIH.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Abordagem: Melhorar os cuidados clínicos destinados a pacientes que vivem com o VIH graças a actividades participativas com gestores e presta-dores de cuidados de saúde

Nome do projecto e sua localização

Melhorar o ambiente hospitalar para pacientes seropositivos na Índia30

ContextoEstudos anteriores realizados na Índia mostraram que, tal como em qualquer outro lugar,

as atitudes do pessoal hospitalar em relação a pessoas vivendo com o VIH são influenciadas por receios e ideias erradas sobre a transmissão do VIH, e que a tomada de consciência e as práticas e acções destinadas a assegurar a segurança do pessoal são insuficientes. Os altos níveis de estigma e discriminação a que as pessoas vivendo com o VIH são confrontadas em contextos de prestação de cuidados podem ser atribuídos, não só a preconceitos entre trabalhadores de saúde, mas também a escassez de fornecimentos e formação necessários pata lutar contra a infecção. Para procurar resolver tais questões, o Projecto Horizontes e SHARAN (Sociedade para Serviços à Pobreza Urbana) tem vindo a experimentar abordagens inovadoras para criar, em colaboração com três hospitais de Nova Deli, hospitais ‘cordiais’ para os pacientes.

Objectivos intermédios e finaisMelhorar os serviços baseados em hospital destinados a pessoas vivendo com o VIH em

Nova Deli.

Actores principaisHospitais participantes, o Projecto Horizontes, SHARAN, pessoas vivendo com o VIH,

trabalhadores de saúde, e a Organização Nacional de Luta contra a SIDA (NACO) da Índia.

Medidas tomadas• Primeiro, procurou-se identificar os pontos fortes e as limitações dos serviços destinados

a pessoas vivendo com o VIH em três hospitais de Nova Deli. A equipa do projecto entrevistou trabalhadores de saúde, superintendentes médicos, e pacientes e seus provedores de cuidados para estudar manifestações e causas de estigma e discriminação em contextos clínicos, e elaborar uma estrutura e indicadores para planeamento e avaliação da intervenção. A isto seguiu-se investigação de base durante a qual os investigadores observaram práticas hospitalares, documentaram políticas e realizaram um inquérito entre médicos, enfermeiros, pessoal de enfermaria (de limpeza) e pacientes (N=884). Além disso, fizeram-se discussões de grupo e entrevistas com pessoas vivendo com o VIH e seus provedores de cuidados.

Os investigadores descobriram que as pessoas vivendo com o VIH e seus provedores de cuidados se queixavam de tratamento diferente e discriminatório por parte dos trabalhadores de saúde. Isto limitava o seu acesso a cuidados e incluía isolamento em enfermaria, alta do hospital precoce, atrasos em cirurgia, e faltas graves de confidencialidade – o que efectivamente limita o acesso a cuidados. Havia poucas ligações com cuidados comunitários e serviços de apoio. A equipa do estudo também descobriu que, dentro do contexto de cuidados de saúde, ideias erradas sobre transmissão do VIH, atitudes negativas e críticas para com as pessoas vivendo com o VIH, formação e fornecimentos inadequados

30 Mahendra V., George B., Gilborn L. (2002) Reducing stigma by promoting PLHA-friendly hospitals. XIVa Conferência internacional sobre a SIDA, Barcelona, Espanha, Julho de 2002.

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para lutar contra a infecção, e falta de políticas estabelecidas sobre confidencialidade e detecção do VIH tudo contribuía para desigualdade em tratamento.

• Com base nestes resultados, a equipa do projecto elaborou um instrumento designado ‘Lista de resultados agradáveis para pacientes/pessoas que vivem com o VIH’31. Isto ajuda os gestores a verificar de que maneira os seus serviços atingem, servem e tratam pessoas seropositivas, em especial os pontos fortes e os pontos fracos, e ajuda-os a esta-belecer objectivos para melhorar os serviços destinados a pessoas vivendo com o VIH.

A lista foi elaborada de uma maneira simples que pode ser rapidamente adaptada para cada contexto. Pode ser utilizada por gestores (individualmente ou em grupo) e/ou pessoal, e pode ser aplicada em grandes hospitais, dispensários ou departamentos específicos. Para classificar a sua própria instituição, os utilizadores da lista podem consultar registos de hospitais, dados de estudos, observação ou simplesmente ‘estimação aproximativa’.

Para a elaboração da lista de controlo, compilaram-se ‘padrões de ouro’ de directivas e políticas nacionais e internacionais sobre os direitos humanos das pessoas vivendo com o VIH, detecção do VIH e aconselhamento, luta contra a infecção e cuidados e tratamento de casos de SIDA. Estes padrões, depois de uma série de discussões consultivas, foram estudados e aprovados pela Organização Nacional de Luta contra a SIDA (NACO) e hospitais participando ao estudo. Depois, foram adaptados sob a forma de uma lista de controlo. Tal lista tem as seguintes secções:

1. Acesso a serviços de cuidados

2. Detecção e aconselhamento

3. Confidencialidade

4. Luta contra a infecção.

5. Qualidade dos cuidados.

Em cada um destes domínios, há quatro subdivisões:

• Prática (práticas e comportamentos do pessoal)

• Formação (criar e manter a capacidade do pessoal a praticar tais padrões)

• Garantia de qualidade (mecanismos estruturados para monitorizar e assegurar a prática de padrões de ouro); e

• Política (regulamentos estabelecidos estipulando ou aplicando os padrões de ouro).

Em cada uma destas subdivisões, há entre um e cinco pontos da lista de controlo sob a forma de declaração “verdadeira/falsa’ que representam padrões de ouro.

• Utilizando um processo participativo que incluiu discussão sobre os dados de referência e os meios de auto-avaliação, os administradores em cada hospital trabalharam com a equipa do projecto na elaboração de um plano de acção para melhorar os serviços destinados a pessoas vivendo com o VIH e as condições de trabalho do pessoal. Graças a tal lista de controlo, os administradores de hospitais puderam desenvolver e estabelecer prioridades para actividades destinadas a resolver as lacunas identificadas. Embora os planos de acção variem de um hospital para outro, incluem certas acções tais como desenvolvimento e afixação de materiais com imagens claras sobre precauções universais

31 Patient/PLHA-friendly Achievement Checklist – a self assessment tool for hospitals and institutions caring for people living with HIV and AIDS. Ver: www.popcouncil.org/horizons/pfechklst.html.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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para atingir todo o pessoal, formação de trabalhadores de saúde designados de cada hospital em aconselhamento sobre detecção do VIH (antes e depois do teste), e formação participativa de sensibilização do pessoal, elaborada e implementada por organizações locais de luta contra a SIDA. Os administradores de hospitais também se implicaram em desenvolver directivas de políticas sobre cuidados e gestão de casos de SIDA que foram então bem distribuídas ao pessoal.

• O módulo de formação interactiva foi orientado para sensibilizar os trabalhadores de saúde para várias questões relacionadas com a SIDA. Os objectivos são:

• melhorar os conhecimentos básicos sobre a transmissão do VIH e medidas para combater a infecção a fim de acalmar os receios e as ideias erradas dos trabalhadores de saúde;

• introduzir conceitos de confidencialidade, direitos dos pacientes, aconselhamento e detecção voluntários, e assistência social e apoio para sensibilizar os trabalhadores de saúde às necessidades e direitos das pessoas vivendo com o VIH;

• alterar as atitudes negativas de trabalhadores de saúde para assegurar a prestação de cuidados e tratamento humanos e equitativos; e

• experimentar a viabilidade e eficácia da implementação de um módulo inovador de formação participativa entre um grupo de trabalhadores de saúde.

Resultados notificados• A lista de controlo permite que gestores de serviços de saúde identifiquem problemas e

reconheçam questões de estigma e discriminação e de qualidade de cuidados quando, inicialmente, não estavam inclinados a reconhecer a existência de problemas em tais áreas.

• Pelo facto de desenvolverem soluções graças à produção de um plano de acção adaptado ao seu próprio contexto, os hospitais estão a cooperar activamente e parecem estar em perfeito controlo do projecto.

• Após a experiência com o módulo de formação interactiva, os resultados notificados incluem alterações positivas em atitudes e comportamentos entre todas as categorias de trabalhadores de saúde imediatamente depois da formação. Depois de um seguimento de dois meses, as atitudes entre médicos continuavam a mostrar melhorias, enquanto entre pessoal de enfermagem e de enfermaria mostravam um ligeiro declínio32.

• Depois da intervenção, utilizou-se um estudo de seguimento (N=885) e pontos da lista de controlo para medir o progresso conseguido para ambientes hospitalares ‘agradáveis para pacientes/pessoas vivendo com o VIH’. Globalmente, registaram-se melhorias impor-tantes em conhecimentos, atitudes e práticas dos trabalhadores de saúde. Apresentam-se a seguir alguns exemplos baseados numa comparação de dados anteriores e ulteriores à intervenção compilados dos três hospitais participantes33.

Os conhecimentos sobre transmissão do VIH e prevenção aumentaram imenso, espe-cialmente entre pessoal de enfermaria. Este pessoal sabe que o VIH não pode ser transmitido compartilhando utensílios com pessoas vivendo com o VIH (67% no

32 George B., Jadhav S., Mahendra VS., Mudoi R., Gilborn L. e Samson L. (2002) Implementing a participatory and interactive training module to sensitise health care workers on HIV/AIDS issues: experiences from India. XIV International AIDS Conference Barcelona, Spain, July 2002.33 Mahendra V.S., Gilborn L., Mudoi R., Jadav S., Gupta I., Bharat S., Prasad R., Upadhyay D. et Raman V. (2004) Making hospitals more PLHA-friendly: findings from operations research in New Delhi, India. 132nd Annual Meeting of the American Publich Health Association (APHA), Washington, DC. November 2004.

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início contra 83% no fim), tocando alguém que tenha a SIDA (81% contra 96%), e compartilhando roupas com pessoas vivendo com o VIH (63% contra 86%).

Observaram-se em todos os trabalhadores de saúde melhores atitudes em relação a conhecimentos gerais sobre pessoas vivendo com o VIH, assim como a questões rela-cionadas com cuidados a prestar em contextos hospitalares. Aumentou o número dos trabalhadores de saúde que não estão de acordo com a ideia de que o VIH se espalha devido a comportamento imoral (29% contra 51%), assim como o dos que se dizem dispostos a partilhar uma refeição com uma pessoa com SIDA (42% contra 72%), comprar alimentos a um comerciante com SIDA (54% contra 88%), e ir viver para uma casa com um vizinho com SIDA (73% contra 94%). Em relação a cuidados clínicos, aumentou a proporção de trabalhadores de saúde que não concordavam com declarações discriminatórias do tipo ‘os pacientes seropositivos devem ser mantidos a distância de outros pacientes’ (44% contra 57%) e ‘roupas interiores, de cama e toalhas de pacientes seropositivos devem ser queimadas ou eliminadas’ (32% contra 46%).

Observou-se maior compreensão e melhores práticas em relação a prestação de aconselhamento e detecção voluntários, medidas de luta contra infecção e confidencialidade. Aumentou o número de médicos que concordam que o sangue de um paciente nunca deve ser analisado sem o consentimento do mesmo (39% contra 67%) assim como os que pediram o consentimento com conhecimento de causa na última vez que receitaram um teste de detecção do VIH (40% contra 59%). Além disso, mais médicos notificam ter arranjado aconselhamento para pacientes que tinham feito um teste de detecção do VIH (31% contra 46%). Aumentou o número de trabalhadores de saúde que comunicaram ter utilizado luvas em actos a risco assim como conhecer como aceder a profilaxia pós-exposição. Depois da intervenção, as notificações do pessoal hospitalar por falta de fornecimentos para precauções universais e luta contra infecções também diminuíram de maneira importante. Há menos médicos (51% contra 29%) que dizem informar o pessoal de enfermaria dos hospitais sobre pacientes seropositivos internados no departamento, assim como há menos enfermeiros (43% contra 28%) notificando segregação de pacientes seropositivos de outros pacientes.

• Apesar dos resultados positivos, havia certas áreas necessitando atenção para melhorar. Enquanto os trabalhadores de saúde mostram respeito crescente pela importância do consentimento com conhecimento de causa, também continuam a apoiar a necessidade de detecção corrente e troca de informações sobre o estado serológico do paciente em relação ao VIH. Além disso, embora tenha havido uma melhoria global em conhecimentos sobre a transmissão e prevenção do VIH, ainda persistem algumas informações erradas.

ConclusõesMétodos participativos, acesso a dados específicos a serviços e a lista de verificação

serviram de meios vitais para mobilizar gestores de hospitais a agir de maneira a tornar os hospitais ‘agradáveis para pacientes/pessoas vivendo com o VIH’. Além disso, a escolha de uma abordagem de colaboração por parte do governo, de grupos sem fins lucrativos e de investigadores foi eficaz contribuindo para a redução de estigma e discriminação em hospitais. Mais ainda, a tentativa para alterações em cada contexto não foi de cima para baixo mas implicou todos os níveis de trabalhadores de saúde, desde o pessoal de enfermaria aos gestores e administradores dos hospitais. Ao mesmo tempo, há necessidade de mais investigação para determinar se os melhoramentos reflectem verdadeiras reduções em estigma e discriminação tal como sentem as pessoas vivendo com o VIH, e se com o decorrer do tempo se mantêm.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Direitos humanos e abordagens jurídicas

Abordagem: Promover os direitos humanos das pessoas vivendo com o VIH e fornecer reparação por violações desses direitos

Nome do projecto e sua localização

Acción Ciudadana Contra el SIDA (ACCSI): Acção de Cidadões contra a SIDA, Venezuela

ContextoACCSI é uma organização com fins não lucrativos estabelecida em 1987 perante as

frequentes violações dos direitos humanos de pessoas vivendo com o VIH, e que presta assistência jurídica gratuita a tais pessoas e suas famílias. Os advogados ocupam-se de casos e recursos como no campo de discriminação em emprego, incompetência ou negligência médica, ou problemas com os serviços sociais. ACCSI trabalha estreitamente com sectores pertinentes incluindo departamentos governamentais, grupos comunitários de luta contra a SIDA, organizações de direitos humanos e o sector privado.

Objectivos intermédios e finaisPromover e proteger os direitos humanos das pessoas vivendo com o VIH e outras pessoas

vulneráveis.

Actores principaisPessoas vivendo com o VIH e suas famílias, departamentos governamentais, organizações

de luta contra a SIDA e pelos direitos humanos.

Medidas tomadas• Educação sobre direitos humanos e prevenção do VIH.

• Defesa dos direitos humanos das pessoas vivendo com o VIH e outras pessoas vulneráveis graças a acção jurídica. Também se presta aconselhamento jurídico a pessoas vivendo com o VIH, suas famílias e seus associados.

• Aconselhamento ao sector privado e ao sector público sobre questões de local de trabalho e de segurança social em relação com a SIDA.

• Investigação sobre assuntos relacionados com os direitos humanos, saúde sexual e reprodutiva e ética.

• Em 1994, ACCSI desempenhou um papel essencial influenciando uma resolução do Ministério da Saúde e da Assistência Social para regulamentar a utilização do teste de detecção do VIH. A resolução tinha por objectivo reduzir a discriminação no local de trabalho, em hospitais e centros médicos, e instituições de ensino. O grupo também participou em comissões de reforma jurídica com respeito à Lei Sanitária Nacional e à Lei de Protecção contra Doenças Venéreas.

• Encorajamento de uma maior participação das pessoas vivendo com o VIH ou afectadas pela SIDA (GIPA).

• Gerência de um centro de documentação.

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Em relação ao exposto, e como um primeiro passo para acção jurídica, a ACCSI identi-ficou os serviços que estavam à disposição das pessoas vivendo com o VIH e descobriu que o acesso a tratamento era limitado. Na Venezuela, só 30% da força de trabalho estava coberta pelo sistema de segurança social. Embora o sistema fornecesse certos tratamentos a pessoas vivendo com o VIH, os serviços eram deficientes e os medicamentos eram fornecidos de maneira irregular. O sistema de saúde pública tinha alguns programas de assistência e serviços hospitalares, mas não fornecia terapia anti-retroviral, não fazia testes médicos pertinentes, nem tratamento para infecções oportunistas (com excepção da tuberculose).

Para lutar contra o acesso muito limitado a tratamento das pessoas vivendo com o VIH, a ACCSI lançou uma série de processos legais contra os Ministérios da Saúde, Defesa e Segurança Social em nome de vários indivíduos vivendo com o VIH. A ACCSI decidiu concentrar inicialmente a sua atenção no sistema de segurança social como a área com maiores probabilidades de produzir resultados. Em 1997, a ACCSI, juntamente com um certo número de profissionais da saúde, advogados e militantes contra a SIDA, apresentaram uma acção em nome de 11 pessoas vivendo com o VIH, sob a alegação que os reclamantes não estavam a receber os cuidados médicos devidos. O processo legal baseava-se nos direitos das pessoas vivendo com o VIH a não-discriminação, saúde, igualdade, acesso a ciência e tecnologias, e acesso a segurança social tal como garantidos pela Constituição Nacional, a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre Direitos Económicos, Sociais e Culturais, e outras convenções assinadas e ratificadas pela Venezuela. O processo legal também fazia referência à Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Seguiram-se mais outros cinco processos. Encorajada pelo êxito das acções em tribunal contra o sistema de segurança social, a ACCSI apresentou um processo contra o Ministério da Defesa em nome de quatro soldados vivendo com o VIH e que foram licenciados pelas Forças Armadas Nacionais quando descobertos como seropositivos. O processo argumentava que os soldados tinham direito a terapia anti-retroviral e cuidados médicos adequados, pelo menos durante o período de serviço obrigatório. Este processo também se baseava em princípios consagrados na constituição nacional e em tratados internacionais.

Resultados notificados• O resultado da acção jurídica da ACCSI durante um certo número de anos foi os tribunais

ordenarem ao governo para tratar todas as pessoas vivendo com o VIH na Venezuela. Isto foi feito por etapas. Em Agosto de 1998, o sistema de segurança social tinha estabe-lecido um programa de cuidados e tratamento para 2.200 pessoas vivendo com o VIH. Os processos feitos ao Ministério da Saúde resultaram em mais 1.500 mulheres, crianças e homens recebendo terapia anti-retroviral. Em Janeiro de 1998, o tribunal decidiu em favor dos quatro militares e ordenou ao Ministério da Defesa para lhes fornecer terapia anti-retroviral e serviços médicos completos. A decisão obrigava o Ministério da Defesa a prestar aos pacientes cuidados confidenciais e pensões. O veredicto em favor dos quatro membros do exército estabeleceu que os indivíduos seropositivos tinham direito a trabalho, vida privada, ausência de discriminação, dignidade e apoio psicológico e económico, assim como a cuidados de saúde. O resultado é que, durante o serviço militar obrigatório, as Forças Armadas estão a fornecer cuidados médicos apropriados aos soldados que vivem com o VIH.

• Até essa altura, todas as decisões dos tribunais só tinham sido aplicadas aos indivíduos que tinham requerido e cujos nomes apareciam no processo. Contudo, em Julho de 1999, o Supremo Tribunal ordenou que o Ministério da Saúde fornecesse, gratuitamente, medicamentos anti-retrovirais, tratamento para infecções oportunistas e teste de diagnóstico a todos os cidadões da Venezuela e estrangeiros residentes no país vivendo com o VIH. Era a primeira vez que o Tribunal tinha decidido no interesse colectivo. O Supremo Tribunal disse que o direito à saúde e o direito à vida estavam, neste caso,

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estreitamente ligados ao direito a acesso a benefícios da ciência e da tecnologia. Citou desenvolvimentos recentes no campo da terapia anti-retroviral como exemplos dos êxitos da ciência e da tecnologia, e disse que tais progressos permitem que as pessoas vivendo com o VIH tenham a vida prolongada e melhor qualidade de vida. Para garantir a implementação das decisões do tribunal, a ACCSI estabeleceu comissões de pessoas vivendo com o VIH que se ofereceram como voluntárias para observar e facilitar o processo entre ministérios, pessoas vivendo com o VIH e a indústria farmacêutica, e ajudar a assegurar fornecimentos adequados. Apesar dos problemas relacionados com orçamentos insuficientes e falhas em fornecimentos, o programa ajuda cerca de 15.000 pessoas vivendo com o VIH.

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Nome do projecto e sua localização

Departamento Legal para Casos de SIDA, Centro de Assistência Jurídica, Namíbia

ContextoO Departamento Legal para Casos de SIDA faz parte do Centro de Assistência Jurídica

que tem uma sede em Windhock e dois escritórios regionais de consulta. É um centro jurídico de interesse público e sem fins lucrativos, estabelecido em 1988 com o objectivo de proteger os direitos humanos de todos os namibianos agindo em três vastas áreas: litígio e aconselhamento, educação e formação, e investigação e sensibilização. O centro procura dar um verdadeiro significado aos direitos constitucionais civis e políticos de base, assim como fazer progredir os objectivos de desen-volvimento socioeconómico da Namíbia.

Objectivos intermédios e finaisO objectivo global do Departamento Legal para Casos de SIDA é promover uma resposta

à SIDA na Namíbia apoiada nos direitos humanos. O Departamento procura resolver questões de discriminação baseada em seropositividade e fornece uma possibilidade de reparação a pessoas vivendo com o VIH que sofreram discriminação devido ao seu estado de seropositivos.

Actores principaisPessoas que vivem com e que são afectadas pelo VIH; sectores salariais públicos e

privados.

Medidas tomadas• Um serviço gratuito de aconselhamento jurídico e litígios à disposição das pessoas que

vivem ou que são afectadas pelo VIH. O Departamento ocupou-se de vários casos de discriminação baseada em seropositividade em relação a acesso a emprego e a seguro. Também dirige um posto de aconselhamento jurídico para essas mesmas pessoas. As questões tratadas incluem: formulação de testamentos, reclamações de subsistência e de segurança social, seguros, e comportamento não profissional por parte de profissionais médicos. O posto também serve de agência de encaminhamento para problemas que não são de natureza jurídica.

• O departamento realiza investigação sobre questões de discriminação existente e emergente, assim como sobre respostas políticas e jurídicas adequadas. Por exemplo, o Departamento fez um estudo sobre a maneira como as pessoas vivendo com o VIH são tratadas no sector do trabalho na Namíbia. Um dos objectivos do estudo foi deter-minar o efeito no ambiente de trabalho do país das Directivas Governamentais para a Implementação de um Código Nacional sobre o VIH/SIDA no Emprego.

• Formulação de políticas e legislação apropriadas para abordar questões de discriminação baseada na seropositividade ao VIH. O Departamento presta assistência a patrões e sindi-catos para desenvolvimento de políticas apropriadas sobre a SIDA no local de trabalho. Em 1999, por exemplo, o Departamento coordenou um processo de consultação para uma política sobre notificação, relato e confidencialidade no caso de VIH/SIDA, que foi pedida pelo Ministério da Saúde e Serviços Sociais.

• Em 2000, o Departamento trabalhou com a Polícia da Namíbia na elaboração de uma política sobre VIH e presos à espera de julgamento. Também coordenou uma comissão para preparar um decreto sobre a protecção dos direitos humanos das pessoas vivendo

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com o VIH na Namíbia. O decreto foi lançado nos fins de 2000. Em 2002, o Departamento desenvolveu uma política sobre a SIDA para o sector da educação, pedida pelo Ministério da Educação (Básica e Superior), e em 2004 finalizou a política nacional sobre órfãos e outras crianças vulneráveis pedida pelo Ministério das Questões Femininas e Bem- -Estar das Crianças. O Departamento está actualmente a ajudar o Escritório do Primeiro Ministro a elaborar um decreto sobre o VIH e a SIDA para o sector do serviço público.

• Ο Departamento dirige programas com pessoas vivendo com o VIH para desenvolver capacidades de sensibilização em organizações não-governamentais e de base comunitária representando tais pessoas. Também procura sensibilizar e influenciar em questões rela-cionadas com estigma e discriminação, e exerce pressão sobre o governo para reformas legais apropriadas.

• Programas e materiais de educação e formação apropriados sobre SIDA e discriminação são elaborados e apresentados.

• Em 2000, o Departamento lançou um Foro sobre Acesso a Tratamento composto de médicos e representantes do sector farmacêutico, o Programa Nacional de Coordenação sobre a SIDA e Organizações de Serviços Relacionados com a SIDA para exercer pressão para prestação de tratamento abordável para todos os namibianos que dele necessitem.

Resultados notificados• O Departamento lutou com êxito contra a política das Forças de Defesa da Namíbia

(NDF) de detecção pré-emprego e de exclusão de emprego das pessoas vivendo com o VIH. O Tribunal do Trabalho decretou em Maio de 2000 que uma entidade empregadora como o NDF não tem o direito de excluir pessoas de emprego apoiando-se na sua seropo-sitividade pois tal estado não significa necessariamente que a pessoa infectada não esteja apta para trabalhar.

• O Departamento contribuiu para o desenvolvimento de políticas apropriadas sobre a SIDA no local de trabalho nos sectores público e privado, assim como para o quadro nacional de políticas sobre a SIDA. Tem influenciado com êxito o governo para reformas legais destinadas a abordar o estigma e a discriminação relacionados com a SIDA. Por exemplo, a legislatura aceitou recentemente as apresentações do Departamento com respeito à inclusão da serologia VIH como uma base proibida para discriminação no novo Projecto de Lei do Trabalho.

• O Departamento produziu uma série de brochuras sobre questões do tipo testamento e herança, VIH e gravidez, acesso a tratamento abordável e SIDA no local de trabalho.

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Nome do projecto e sua localização

Departamento de Luta contra o VIH/SIDA, Colectivo de Advogados, Índia

ContextoO Colectivo de Advogados é uma organização com fins não-lucrativos sediada na Índia

e que foi estabelecida em 1981 para prestar auxílio jurídico a grupos marginalizados em litígios de interesse público. O Colectivo é um grupo de interesse público formado de advogados, estudantes de direito e outros filiados jurídicos, cujo objectivo é satisfazer as necessidades legais não satisfeitas da sociedade e especialmente das secções desfavorecidas da sociedade graças a ajuda jurídica, acon-selhamento e litígios de interesse público. O trabalho de interesse público no qual a colectividade como um todo está empenhada inclui ajuda jurídica, aconselhamento e litígios de interesse público sobre questões de direitos das mulheres, direitos das pessoas sem abrigo e alojamento, protecção e valorização do meio ambiente, questões de saúde incluindo SIDA, direitos a reprodução, e direitos do sector não organizado de trabalhadores, especialmente mão-de-obra contratada.

Em resposta à epidemia de SIDA, o Colectivo estabeleceu um Departamento de VIH e SIDA em Mumbai, com ajuda financeira da Comissão Europeia, para prestar ajuda jurídica, acon-selhamento e serviços afins a pessoas vivendo com o VIH.

Objectivos intermédios e finaisProteger e promover os direitos fundamentais das pessoas afectadas pelo VIH que lhes

têm sido recusados em certas áreas como em cuidados de saúde, alojamento, educação, segurança, emprego, direitos em relação a pensões, informação e outros serviços, direitos a sigilo e confiden-cialidade, e direitos maritais em relação a sustento e custódia.

Actores principaisPessoas que vivem com o VIH.

Medidas tomadas• O Departamento de VIH e SIDA instaurou processos de interesse público sobre as seguintes

questões de saúde pública: acesso a tratamento e serviços; testes de detecção do VIH; sigilo e confidencialidade; consentimento para o teste; fornecimento de sangue inócuo; discriminação da homossexualidade; protecção dos profissionais do sexo; discriminação em emprego e serviços; e direitos das mulheres seropositivas na família e no lar, assim como fora destes domínios.

• O Departamento tem procurado sensibilizar para as implicações legais e éticas da epidemia de SIDA, incluindo diálogo sobre reforma da lei, formação de redes nacionais de advogados sobre questões ligadas à SIDA, e realização de reuniões de trabalho sobre questões legais e éticas relacionadas com a SIDA para pessoas vivendo com o VIH, a comunidade jurídica, planeadores de políticas, militantes, organizações não- -governamentais e outras organizações trabalhando sobre problemas relacionados com a SIDA. O Colectivo também sensibilizou o público para o problema da SIDA graças a comícios públicos e mobiliza a opinião pública contra o estigma e a discriminação defendendo os direitos de grupos marginalizados.

Resultados notificados• O Departamento de VIH e SIDA tem defendido com êxito trabalhadores que sofreram

discriminação e que perderam o emprego devido à sua seropositividade. Nesta área,

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um dos seus resultados mais importantes foi a confirmação da cláusula de “ocultação da identidade’, a qual permite que uma pessoa vivendo com o VIH se registe sob um pseudónimo. Isto é importante pois as pessoas vivendo com o VIH não estão muitas vezes inclinadas a fazer processos com medo que a sua seropositividade seja revelada publicamente e que venham a sofrer discriminação. O Departamento também ganhou um caso relacionado com quebra de confidencialidade no qual um hospital revelou a seropositividade de um paciente ao seu patrão.

• O Departamento ganhou casos na área de direitos humanos de grupos marginalizados. O caso das profissionais do sexo de Mumbai foi um exemplo notável. Com base num artigo de jornal sobre o facto de haver muitas raparigas menores no comércio do sexo em Mumbai, muitas das quais eram seropositivas, o Supremo Tribunal de Bombay ordenou à polícia a sua captura. Foram presas e colocadas em lares de protecção do governo. Uma grande parte delas não eram menores e por isso estavam detidas ilegalmente. Por ordem do tribunal, todas foram submetidas a testes de detecção do VIH sem consentimento. O Colectivo de Advogados interveio então e obteve uma ordem interina para tratamento médico correcto das pessoas e restrição de qualquer teste de detecção do VIH. Contudo, uma petição apresentada pelo Colectivo para libertar as profissionais com mais de 18 anos de idade foi rejeitada.

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Abordagem: Preconizar acesso crescente a tratamento contra o VIH

Nome do projecto e sua localização

Campanha de Acção para Tratamento (TAC), África do Sul

ContextoA Campanha de Acção para Tratamento (TAC) foi lançada a 10 de Dezembro de 1998

– Dia Internacional dos Direitos Humanos. É uma organização de base local que trabalha para sensibilizar o público e fazê-lo compreender as questões ligadas a disponibilidade, possibilidade económica e utilização de tratamentos contra o VIH. TAC é uma tribuna vocal e visível no mundo em desenvolvimento para os direitos das pessoas vivendo com o VIH a tratamento, justiça e ausência de discriminação.

O lançamento de TAC abriu um novo capítulo na luta contra a SIDA na África do Sul. Teve lugar numa altura em que muitas organizações anti-SIDA existentes estavam a lutar com problemas internos perante uma epidemia crescente. A população estava muito indiferente, os sul- -africanos estavam cansados de mensagens de morte e desgraça. Não queriam ouvir que a SIDA ia matar milhões de pessoas, destruir a economia e submergir os serviços de saúde, e que não havia nada a fazer para o evitar. Através das suas acções, a TAC tem procurado alterar a natureza do debate sobre a SIDA. Procurando estimular junto do público uma tomada de consciência e de conheci-mentos sobre questões relacionadas com disponibilidade, possibilidade económica e utilização de tratamentos contra o VIH e a SIDA, as suas campanhas procuram obter maior acesso a tratamento para todos os sul-africanos. A organização mobiliza pessoas vivendo com o VIH e a SIDA a lutar pelos seus direitos.

Objectivos intermédios e finaisO primeiro objectivo da TAC é dar a todas as pessoas com o VIH e a SIDA acesso a

medicamentos essenciais; realçar disparidades e problemas em acesso a tratamento; fazer campanhas para melhorar o custo financeiro e a qualidade do acesso a cuidados de saúde incluindo tratamento para todos, com realce especial para o VIH e a SIDA; sublinhar os problemas existentes na infra- -estrutura de cuidados de saúde e lutar pela sua eliminação; e instruir pessoas vivendo com o VIH e a SIDA, trabalhadores de saúde especialmente de enfermagem e o público sobre a maneira de tratar o VIH e a SIDA, e de trabalhar com medicamentos anti-retrovirais, e como viver com o VIH e a SIDA com melhor saúde.

Actores principaisPessoas que vivem com o VIH.

Medidas tomadas• Graças ao fornecimento de informações, a Tac tem sensibilizado para tratamento e

conhecimentos afins. Torna estas questões mais claras por meio de cartazes, panfletos, reuniões, operações de rua e envio de cartas. Também organiza reuniões de trabalho para médicos, enfermeiros e outros agentes, e tem distribuído numerosos cartazes, panfletos, brochuras e anúncios em jornais sobre questões de tratamento e prevenção.

• O Programa da TAC de Educação sobre Tratamento procura resolver mitos perigosos relacionados com a transmissão do VIH e causas da SIDA, e fornece os conhecimentos essenciais sobre a doença que as comunidades necessitam para impor os seus direitos. Os Trabalhadores em Educação sobre Tratamento (TLP) trabalham em comunidades, postos

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de saúde, grupos de apoio, organizações não-governamentais, organizações comunitárias, organizações religiosas, igrejas e sucursais da TAC.

• A TAC tem exercido influência sobre as companhias farmacêuticas para fazer baixar o custo de todos os medicamentos contra o VIH e a SIDA, e mantém a pressão sobre o governo para que este cumpra as suas obrigações para lutar contra o VIH e a SIDA.

• A TAC tem feito campanha a favor do acesso a AZT e Nevirapina para as mulheres grávidas seropositivas no âmbito do sistema de saúde pública com o fim de impedir a transmissão do VIH de mãe para filho. Isto ocasionou processos jurídicos bem sucedidos apresentados perante o Tribunal Constitucional, com um caso baseado nos direitos a igualdade, dignidade, autonomia reprodutiva, e acesso a serviços de saúde, incluindo cuidados de saúde reprodutiva.

• A TAC tem lutado contra o estigma relacionado com a SIDA nas comunidades promovendo a utilização de camisolas impressas com as palavras seropositivo (sancionadas por Nelson Mandela, cuja fotografia estava impressa nas camisolas). O objectivo é realçar que a SIDA é uma preocupação colectiva e não unicamente o problema de quem está infectado.

• A TAC realizou um trabalho considerável a nível internacional incluindo o envio de uma delegação à Conferência Internacional sobre a SIDA realizada na Tailândia onde encontrou Kofi Annan e ajudou a estabelecer uma agenda para tratamento e prevenção em todo o mundo. Os seus membros principais exprimiram-se em muitas tribunas inter-nacionais e participaram numa campanha para acesso a medicamentos genéricos.

• A TAC lançou o Programa TAC de Tratamento (TAC TP) como um modelo inovador destinado a fornecer cuidados médicos completos e medicamentos a militantes com a SIDA, que estão a salvar outras vidas, e a outras tantas pessoas nas comunidades onde trabalham.

• Em Julho de 2004, a TAC acolheu conjuntamente uma conferência de alto nível, a Cimeira da Saúde Pública, que se concentrou sobre o sistema de saúde e os desafios da implemen-tação do tratamento anti-retroviral. A conferência estudou os principais desafios restantes para melhorar o serviço de saúde e recrutar mais trabalhadores de saúde para criar uma participação significativa das comunidades nos serviços de saúde, e assegurar a confor-midade dos governos nacional, provincial e local com as obrigações constitucionais que estipulam o acesso de todo o povo da África do Sul a serviços de cuidados de saúde respeitosos da sua autonomia e dignidade.

Resultados notificados• A TAC tem ajudado a criar no público uma tomada de consciência da existência de trata-

mento para o VIH e a SIDA que deve estar à disposição de todas as pessoas, ricas ou pobres. Antes da TAC iniciar os seus esforços, a maioria dos sul-africanos não conhecia a existência de tal tratamento, acreditando que a infecção significava morte certa. A TAC insiste que todas as pessoas têm o direito a medicamentos essenciais e que é simples-mente inaceitável que tais medicamentos estejam fora do alcance de milhões de pessoas pobres.

• Uma sentença do tribunal de 14 de Dezembro de 2001 estipula que um programa nacional de prevenção da transmissão de mãe para filho é uma obrigação do estado. O governo apresentou recurso e anunciou uma consulta nacional sobre prevenção da transmissão de mãe para filho. O Tribunal Constitucional que julgou o recurso ordenou ao governo a remoção de restrições que impedem a disponibilidade de Nevirapina em hospitais e postos de saúde públicos para evitar a transmissão de mãe para filho.

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• A TAC, em colaboração com Médecins Sans Frontières, importou do Brasil medicamentos anti-retrovirais genéricos, incluindo AZT, Lamivudina e Nevirapina. TAC continua a importar fluconazola genérica em oposição à patente de Pfizer. Muitas pessoas seroposi-tivas foram beneficiadas.

• A 19 de Novembro de 2003, o Gabinete Sul-Africano aprovou o Plano de Funcionamento para Tratamento e Cuidados Globais para casos de VIH/SIDA. A decisão tornou-se possível graças a uma campanha de cinco anos da Campanha de Acção para Tratamento e seus aliados.

• A TAC tem trabalhado com êxito com as organizações parceiras, especialmente o Projecto de Lei sobre a SIDA (ALP). TAC e ALP trabalharam em conjunto para assegurar a formação do Foro Conjunto de Controlo da Sociedade Civil que produziu agora dois relatórios sobre o desenrolar do plano de funcionamento global.

• A TAC ajudou a que as mentalidades que aceitavam a falta de disponibilidade de trata-mento para as pessoas em países pobres passassem a compreender que o tratamento é essencial para prevenção e cuidados, direitos humanos e, em última análise, para conter e vencer a epidemia.

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Discussão

Tal como discutido anteriormente, os programas que abordaram o estigma e a discriminação relacionados com o VIH foram de três tipos:

• Abordagens de redução do estigma – consistindo frequentemente de programas comu-nitários de prevenção e cuidados a casos de VIH e SIDA, mobilizando uma vasta gama de participantes.

• Medidas especificamente anti-discriminação – iniciativas muitas vezes centradas em contextos convencionais tais como locais de trabalho ou centros de cuidados de saúde; e

• Mecanismos de correcção – utilizando meios legais para lutar contra a discriminação e procurar corrigir e promover os direitos humanos das pessoas vivendo com o VIH.

O que é importante, e tal como já vimos, os programas da vida real utilizam frequentemente uma combinação de abordagens, agindo a um ou mais de tais níveis simultaneamente. Isto é importante pois aumenta a sinergia ou força do trabalho que é realizado. Também permite a implicação de uma vasta gama de indivíduos - de conselheiros e trabalhadores de saúde a advogados, trabalhadores comunitários e militantes de direitos humanos. Estratégias de grande base com múltiplos ramos estão no centro do êxito do combate contra o estigma e a discriminação a que a SIDA deu origem, e da promoção dos direitos das pessoas vivendo com o VIH, suas famílias e pessoas vulneráveis à infecção por VIH.

Os estudos de casos resumidos atrás demonstram haver muitas aberturas potenciais para redução do estigma e da discriminação relacionados com a SIDA, e promoção dos direitos humanos das pessoas vivendo com o VIH.

Estudando atentamente o trabalho realizado, e procurando em projectos e actividades elementos comuns, é possível identificar um certo número de princípios essenciais de êxito. Cada um deles oferece uma abertura para trabalho inovador e potencialmente eficaz.

Aberturas essenciais

1. Promoção de solidariedade através de cuidados integradosProgramas de cuidados a domicílio oferecendo apoio médico e social integrado a

famílias e agregados familiares afectados pelo VIH podem melhorar a qualidade de vida de maneira espectacular. Tais programas podem reduzir o sofrimento moral e físico associado a doenças ligadas ao VIH, intensificando o interesse e a capacidade das famílias a cuidar de familiares que vivem com o VIH.

Além de melhorar a qualidade dos cuidados prestados a indivíduos afectados, os programas de cuidados a domicílio também podem ajudar a reduzir a discriminação nas suas comunidades motivando para uma mais larga mudança de atitudes. Observar ou experimentar a prestação de cuidados pode encorajar responsabilidade compartilhada por líderes comunitários em reconhecer a realidade da SIDA. Também pode alterar as percepções do que pode ser uma resposta indicada para pessoas afectadas pelo VIH.

O recrutamento e a formação de voluntários locais para auxiliar a prestação de cuidados podem ajudar a reforçar a mensagem de que a SIDA é um problema comum. A demonstração de cuidados e atenções por voluntários formados, especialmente se complementada com informações, pode reforçar a mensagem de que um contacto íntimo e prolongado com pessoas vivendo com o VIH não representa risco de infecção. Isto pode atenuar o estigma resultante do medo da transmissão do VIH através de contactos da vida de todos os dias.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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2. Promoção de uma maior participação das pessoas que vivem ou que são afectadas pelo VIH

Este princípio encoraja a participação activa de pessoas vivendo com o VIH na formulação de políticas e no desenvolvimento e implementação de programas34. Tal participação em programas de prevenção e cuidados tem o potencial para reduzir o estigma e a discriminação relacionados com a SIDA. Pode fazê-lo, promovendo a habilitação de pessoas vivendo com o VIH e reforçando a capacidade de comunidades afectadas a aceitar indivíduos afectados. Mais especificamente, implicar pessoas vivendo com o VIH em actividades de prevenção e cuidados pode:

• Encorajar uma maior aceitação das pessoas vivendo com o VIH pelas comunidades graças à promoção de uma melhor compreensão da sua situação;

• Reduzir a auto-estigmatização aumentando a confiança das pessoas vivendo com o VIH; e

• Encorajar mais confissões de estados seropositivos promovendo franqueza e discussões sobre a SIDA.

Actividades do tipo formação e apoio a pessoas vivendo com o VIH como oradores públicos, educadores e conselheiros, ajudaram a reduzir a estigmatização. Por exemplo, formar pessoas vivendo com o VIH para que possam dar testemunho pessoal em sessões pedagógicas participativas pode encorajar outras pessoas a avaliar a injustiça de acções de discriminação pondo--se no lugar de alguém que delas tenha sofrido. Personalizando o risco do VIH, também pode ter um impacto positivo em esforços de prevenção. A compreensão subsequente de que a SIDA é um problema comum pode resultar em diminuição da estigmatização das pessoas vivendo com o VIH.

Além de promover uma melhor compreensão das circunstâncias das pessoas afectadas, aumentar a transparência e a integração de pessoas vivendo com o VIH em programas comunitários pode reduzir ainda mais a estigmatização reforçando implicitamente a mensagem de que as pessoas vivendo com o VIH têm o potencial para levar vidas produtivas e contribuir de maneira construtiva para as suas comunidades. Esta participação também pode ajudar a reduzir a auto-estigmatização criando nas pessoas vivendo com o VIH confiança em si mesmas e reduzindo os seus sentimentos de isolamento e incapacidade35. Isto é especialmente o caso onde indivíduos afectados são apoiados por associações de pessoas vivendo com o VIH para participar em actividades geradoras de renda e desenvolvimento de capacidades.

3. Mobilização de líderes comunitários e, em especial, líderes religiosos para prevenção e cuidados

Liderança e fé formam uma parte importante da vida da maior parte das pessoas, e a religião desempenha um papel importante por influenciar identidades, práticas e posições morais. Como os líderes religiosos são normalmente muito respeitados, têm um papel importante a desempenhar na luta contra o estigma e a discriminação relacionados com a SIDA. Embora organizações religiosas tenham algumas vezes reforçado o estigma por terem, com demasiada facilidade, associado a SIDA a ensinamentos religiosos sobre ‘pecado’, existem exemplos notáveis onde trabalharam para promover tolerança e solidariedade social utilizando abordagens não críticas e não baseadas em medos.

Os programas que lutaram contra o estigma e a discriminação mobilizaram liderança religiosa das seguintes duas maneiras que estão relacionadas.

34 UNAIDS (1999) From principle to practice: greater involvement of people living with or affected by HIV/AIDS. UNAIDS, Geneva. http://www.unaids.org/publications/documents/persons/una9943e.pdf 35 Ver: Positive, Engaged, Involved: the participation of people living with HIV/AIDS in community-based organizations. http://www.popcouncil.org/horizons/ressum/plha_burkina.html

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• Primeiro, em actividades de cuidados. Mostrar cuidados atenciosos e apropriados a pessoas vivendo com o VIH por parte de líderes religiosos respeitados pode ser um instru-mento formidável para lutar contra a estigmatização a nível comunitário pois promove respeito e compaixão para quem vive com o VIH.

• Segundo, em trabalho de prevenção. Empreendendo de maneira construtiva esforços de prevenção do VIH, os líderes religiosos podem reforçar, e acrescentar a sua autoridade, mensagens encorajando a redução de risco e (quando indicado) mudanças de comporta-mento.

Por exemplo, no projecto Sangha Metta iniciado na Tailândia, os monges budistas são bem preparados para prestar uma série de serviços de prevenção e cuidados às suas comunidades locais. As suas actividades, de múltiplas facetas mas localmente aceitáveis, estão a ajudar a lutar realmente contra o estigma. Graças aos cuidados que prestam, os monges estão a dar às suas comunidades modelos de ‘compaixão na prática’. A sua boa-vontade em ter contactos íntimos e contínuos com pessoas vivendo com o VIH, e os seus esforços para as ajudar a integrar manifestações religiosas na comunidade, reforçam a mensagem de que indivíduos afectados e suas famílias devem ser respeitados e apoiados.

Esta resposta compassiva manifesta, além de ajudar a reduzir a discriminação, também quebra parte do silêncio que rodeia a SIDA. Isto encoraja confissões pois as pessoas têm confiança em receber uma resposta apropriada ao reconhecimento de um estado de seropositividade.

Os líderes religiosos também podem incorporar textos religiosos e símbolos culturais na sua luta contra o estigma com grande efeito. Estes programas mostram que a SIDA é um problema comum e encorajam uma resposta comunitária positiva às pessoas vivendo com o VIH. Os monges de Sangha Metta na Tailândia tiveram a ideia inovadora de patrocinar uma alegoria ao VIH com carros de pessoas vivendo com o VIH como parte do cortejo de Loy Krathong, um festival tailandês tradicional. Isto transformou um símbolo cultural numa declaração importante de tolerância, mostrando ao mesmo tempo que o VIH é um problema comum e não uma questão ‘especial’ sem relação com a vida de todos os dias. Notícias deste acontecimento indicaram que a inclusão das pessoas vivendo com o VIH tinha sido aceite pela comunidade. Foram relatados casos de pessoas seropositivas que confessaram o seu estado e que se juntaram ao cortejo36.

4. Luta contra o estigma graças a formação participativaAbordagens de formação participativa são essenciais para habilitar as comunidades de

maneira que possam construir a partir dos seus conhecimentos e experiências já existentes. No passado, aconteceu demasiadas vezes que a redução de estigma foi comparada a um modelo de esclarecimento, segundo o qual especialistas de intervenção e quem ‘sabe’ intervêm para corrigir as atitudes e acções negativas de outras pessoas.

A formação participativa a nível comunitário pode encorajar as pessoas a lutar contra as crenças acumuladas e muitas vezes não discutidas que reforçam o estigma. Estas incluem a crença de que as pessoas vivendo com o VIH fizeram algo errado, a crença de que merecem ser evitadas e tratadas de maneira diferente, e a crença de que o VIH se transmite facilmente através de contactos sociais da vida de todos os dias.

Nestes casos, o objectivo não deve ser unicamente de inspirar alterações de comportamento individual, mas sim de criar mudanças positivas em práticas e opiniões colectivas. A investigação realizada sugere que as pessoas nem sempre dão conta de estarem a comportar-se de maneira estigmatizante37. Isto realça a importância de sensibilização participativa para chamar a atenção das

36 Visto na lista : [email protected] 12/11/9837 International Centre for Research on Women (2002) Understanding HIV-related stigma and resulting discrimination in sub-Saharan Africa: emerging themes from early data collection in Ethiopia, Tanzania and Zambia. Research Update. Ver http://www.icrw.org

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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pessoas para os efeitos não intencionais dos seus actos e lutar contra a utilização de linguagem e idiomas locais que perpetuam o estigma.

A existência conjunta de conhecimentos relacionados com a SIDA aparentemente contraditórios, de atitudes estigmatizantes e de simpatia, e de actos discriminatórios e de carinho, oferece um campo para lançamento de discussão. Se implementada de maneira não ameaçadora, a educação participativa pode promover diálogo para desenvolver nas comunidades a compreensão da epidemia e abordar as raízes da ansiedade – medos relacionados com contágio e doença grave, ambivalência sobre diferença sexual, etc. Neste tipo de trabalho os educadores-colegas podem desempenhar um papel importante.

5. Criação de alianças e acção multissectorialOs indivíduos sofrem de estigma em muitos contextos diferentes. Os programas

multissectoriais que visam contextos múltiplos de estigma e discriminação e que criam alianças entre vários sectores da sociedade civil podem assim promover a oportunidade e a sustentabilidade da resposta.

O estigma e a discriminação precisam de ser combatidos, não só em relação à SIDA, mas também com respeito a outras formas de desigualdade e exclusão que enfraquecem as pessoas mais vulneráveis a infecção. O estigma relacionado com a SIDA favorece e reforça as desigualdades existentes. Há necessidade de alianças de base geral entre tais indivíduos e organizações activas em prevenção da transmissão do VIH e promoção de cuidados aos infectados e os que trabalham em outros campos tais como igualdade entre sexos, direitos sexuais e reprodutivos, desenvolvimento sustentável e igualdade entre raças.

Ilustração 5: Tratar a superfície não chega. As causas na raiz do estigma relacionado com a SIDA também precisam de ser abordadas38

Por exemplo, é preciso prestar mais atenção à natureza do estigma relacionado com o VIH segundo o sexo. Há necessidade de abordar não só os riscos de infecção da mulher, mas a sua

Estigma relacionado com a SIDA

Certas causas de raiz

Desigualdade social

Desigualdades de sexualidade

Desigualdade entre sexos

Desigualdades de riqueza

38 Este diagrama foi elaborado por Miriam Maluwa e Peter Aggleton.

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elevada vulnerabilidade a estigmatização e acções discriminatórias. O estigma e a discriminação em relação com a SIDA contra mulheres estão relacionados com desigualdades maiores, incluindo padrões duplos com impacto sobre a saúde e o bem-estar, o acesso inadequado das mulheres a direito de propriedade e de custódia de crianças. O projecto da Diocese de Ndola na Zâmbia é um exemplo de um projecto que funciona de maneira integrada para enfrentar estas vulnerabilidades gerais, trabalhando com (entre outras organizações) o Departamento de Apoio a Vítimas da polícia da Zâmbia.

Esta intercepção do estigma relacionado com a SIDA com questões mais gerais de iden-tidade e prática sublinham a importância da integração de programação da SIDA em acção mais geral. Os programas precisam de ‘integrar’ a SIDA. Por exemplo, o Centro para Estudo da SIDA da Universidade de Pretória na África do Sul está a encorajar discussão sobre estigma relacionado com a SIDA no âmbito de um programa de educação participativa para estudantes que coloca a SIDA em debates gerais e vitais sobre raça e racismo, cultura, classe e sexos. Isto, juntamente com discussões sobre cidadania, responsabilidade financeira e governo, leva a nova compreensão e está a criar um novo empenho por alterações de comportamento. Integrando os problemas relacionados com a SIDA nos principais elementos do programa de educação superior, incluindo temas como direito, agricultura e engenharia, poderá ter como resultado a emergência de melhor compreensão das questões, discussão de eliminação da estigmatização da SIDA, e chamar a atenção para o facto que o VIH diz respeito a toda a gente.

6. Sensibilização através dos mediaOs media, especialmente através de peças radiofónicas e televisivas, podem ser utilizados

com grande efeito para fomentar atitudes positivas para com as pessoas vivendo com o VIH. A iniciativa Soul City na África do Sul, por exemplo, que tem uma audiência alvo de milhões de pessoas, tem consistentemente incluído nas suas séries temas relativos a estigma e discriminação relacionados com a SIDA, as dificuldade de confissão num ambiente não favorável, e a necessidade de tratar as pessoas vivendo com o VIH com compaixão e respeito. Há indicações que o trabalho de Soul City está a contribuir para maior franqueza quando se fala sobre questões ligadas a sexu-alidade, com maior tomada de consciência de que as pessoas que vivem com o VIH podem viver vidas saudáveis e produtivas, e que está a ter um efeito ‘de acordeão’ por permitir que líderes comu-nitários, professores e fornecedores de serviços de saúde utilizem as mensagens em outras arenas. Em todo o mundo tem havido iniciativas semelhantes utilizando tanto a rádio como a televisão para sensibilizar e oferecer às pessoas modelos positivos perante a epidemia.

7. Criação de um espaço de apoio e confidência para discutir tópicos sensíveis

Em contextos onde a discussão pública de assuntos relativos à SIDA e sexualidade é uma questão sensível ou ‘tabu’, a possibilidade de aceder a informações e de discutir problemas num espaço seguro e confidencial pode encorajar maior franqueza e sensibilidade. Em contextos onde a infiltração de estigma e medos ligados à SIDA desencorajam discussões francas sobre questões relacionadas com o VIH e prevenção, maior franqueza é um requisito prévio para vencer o estigma. Linhas telefónicas especiais, centros de aconselhamento, grupos de apoio e centros de acolhimento têm oferecido a centenas de milhares de pessoas uma possibilidade de falar mais francamente sobre as suas experiências, medos e ansiedades.

8. Aconselhamento e apoio a famílias, incluindo crianças afectadasPrestar aconselhamento e apoio a famílias de pessoas vivendo com o VIH é uma compo-

nente importante dos programas de cuidados pois pode fazer imenso para reduzir o estigma e a discriminação. Pode fazê-lo não só reduzindo o medo e a estigmatização das famílias perante indi-víduos afectados, mas também facilitando maior franqueza e estimulando diálogo sobre o modo de

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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vida da família dentro e fora do lar. O segredo sobre a seropositividade pode limitar a capacidade das pessoas vivendo com o VIH de fazer planos para o futuro dos seus filhos. O planeamento da sucessão é um exemplo de uma abordagem que procura reduzir as probabilidades dos membros sobreviventes da família, incluindo crianças, sofrerem de discriminação e marginalização. Tal abordagem procura encorajar as pessoas vivendo com o VIH e suas famílias a fazer planos de maneira construtiva para o caso da morte de um parente, para que as crianças fiquem ao abrigo. Planear a sucessão procura não só incentivar o diálogo sobre a SIDA nas famílias, mas também desenvolver maneiras práticas das crianças obterem apoio de outros parentes e da comunidade.

9. Adopção de políticas e legislação baseadas em direitos contra a discriminação

Contextos institucionais, incluindo locais de trabalho e centros de saúde, fornecem uma oportunidade excelente para estabelecer padrões de protecção de direitos humanos e um ambiente solidário para quem vive com o VIH. As políticas de luta contra a SIDA baseadas em direitos oferecem meios poderosos com os quais combater a discriminação em contextos institucionais. As Directivas Práticas sobre o VIH/SIDA e o Mundo do Trabalho da OIT fornecem princípios básicos para orientar a elaboração de políticas, assim como directivas para programação prática39. Além disto, formações nacionais de grupos de empregados, tal como a Coalizão de Luta contra a SIDA das Empresas da Tailândia, podem ajudar a uniformizar abordagens nos locais de trabalho contra discriminação e a consolidar a capacidade das empresas a responder à epidemia dentro de uma estrutura de direitos humanos.

Nos serviços de cuidados de saúde, é preciso que existam e sejam respeitados códigos de ética e de comportamento profissional e a sua aplicação no campo da SIDA ensinada no âmbito dos programas de formação profissional. Além disso, há necessidade de processos internos em serviços de saúde específicos que permitam a gestores e trabalhadores de saúde a formulação de planos de acção que ajudem a garantir um sentimento de controlo e orgulho compartilhado pelo facto de conseguir alterar atitudes negativas perante pessoas vivendo com o VIH e melhorar a sua qualidade de vida. Um exemplo deste tipo de iniciativa é o projecto ‘fácil para pacientes’ em implementação em alguns hospitais da Índia.

Em vários contextos de cuidados de saúde há necessidade de medidas práticas e simples, como directivas normalizadas e aplicadas universalmente, relacionadas com a luta contra a infecção, para reduzir qualquer ansiedade ligada a estigma que os trabalhadores de saúde possam ter sobre a transmissão do VIH. Precauções universais utilizadas de maneira consistente ajudarão a proteger as identidades e direitos de pacientes infectados.

10. Luta contra a discriminação e possibilidade de reparação no caso de violação de leis e de direitos humanos

Leis, políticas e códigos de éticas profissionais contra a discriminação continuarão sem efeito não havendo mecanismos para reparação em circunstâncias onde ocorra violação.

Instituições de auxílio legal e colectivos de advogados especialistas no campo da SIDA, tal como o Colectivo de Advogados na Índia e o Centro de Assistência Legal na Namíbia, desem-penham um papel vital assegurando a monitorização e a aplicação dos direitos humanos, e atacando casos de discriminação e violação desses mesmos direitos. Para desenvolver tais organizações e suas abordagens de direitos humanos e SIDA, poderá haver necessidade de formação e apoio.

Também é necessário apoio para estabelecer e alargar serviços jurídicos de base comu-nitária para atacar casos de discriminação e violações de direitos humanos. Uma maneira de ajudar

39 http://www.ilo.org/public/english/protection/trav/aids/code/codemain.htm

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a desenvolver confiança entre as pessoas que sofreram discriminação poderá ser basear tais orga-nizações em organizações já existentes de serviços a casos de SIDA ou em associações de pessoas vivendo com o VIH, especialmente onde tais organizações já são apreciadas e respeitadas pelas suas comunidades. Planos de formação para desenvolver a capacidade de tais organizações a prestar internamente aconselhamento e orientação paralegais vão provavelmente aumentar o acesso de pessoas vivendo com o VIH a protecção jurídica.

11. Promoção do acesso a tratamento do VIH e da SIDAEmbora muitos países sejam signatários de convenções internacionais sobre direitos

humanos que especificam o direito de todas as pessoas ao nível mais alto possível de cuidados de saúde, milhões de pessoas vivendo com o VIH não têm acesso a tratamentos de base eficazes contra o VIH. O acesso a tratamento, a medicamentos para tratar doenças oportunistas e terapia anti-retroviral, pode ajudar a reduzir o estigma permitindo que pessoas vivendo com o VIH possam viver de maneira positiva e produtiva durante mais tempo. É provável que tal intervenção melhore a qualidade de vida de maneira notável, assim como diminua os receios de outras pessoas em relação à SIDA, ajudando-as a compreender que é possível tratar e viver com a doença. O programa de cuidados no local de trabalho em VW no Brasil e a Iniciativa para Equidade perante o VIH em Haiti são exemplos de programas onde foram notificados resultados desse tipo.

A disponibilidade de cuidados de saúde pública completos e gratuitos e de tratamento eficaz, seja em contextos comunitários ou em locais de trabalho, também pode encorajar mais pessoas a se apresentarem para aconselhamento e detecção voluntários e confidenciais e a cuidados de seguimento. Isto foi observado no âmbito da Iniciativa para Equidade perante o VIH em Haiti, onde o fornecimento de terapia anti-retroviral gratuita em cuidados pré-natais e para a população em geral resultou num aumento espectacular do número de pessoas que queriam fazer o teste. Isto, por sua vez, forneceu maior oportunidade para trabalho de aconselhamento e prevenção.

Estigma, discriminação e violação dos direitos humanos em relação ao VIH Estudos de casos de programas bem sucedidos

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Conclusões

• Lutar contra estigma, discriminação e violações de direitos humanos em relação com o VIH é vital para diminuir o impacto da epidemia. O estigma e a discriminação têm um impacto negativo em qualquer aspecto da continuidade prevenção-cuidados-tratamento, assim como aumentam enormemente o sofrimento associado ao facto de viver com o VIH.

• Estigma, discriminação e violações de direitos humanos estão intimamente ligados, reforçando-se e justificando-se reciprocamente. Para evitar o estigma, lutar contra a discriminação quando esta ocorre em contextos específicos, e promover e proteger os direitos humanos em relação com o VIH é preciso agir continuamente e em várias frentes.

• Os estudos de casos apresentados demonstram certos êxitos da luta contra o estigma, a discriminação e as violações de direitos humanos. Também revelam provas de verdadeira inovação adaptada a circunstâncias e necessidades locais. Avaliação constante e docu-mentação são sempre importantes.

• Mesmo se a redução do estigma não é muitas vezes o único nem mesmo o principal foco de certos programas, são numerosas as actividades de prevenção e cuidados do VIH que produzem efeitos positivos sobre o estigma e a discriminação como produtos derivados dos seus objectivos principais. Contudo, na programação da SIDA poderiam integrar-se elementos contra o estigma e a discriminação, de maneira mais consistente e explícita do que actualmente.

• São muitos os pontos de entrada para programação destinada a lutar contra o estigma, a discriminação e as violações de direitos humanos. Muitos dos programas aqui apresentados utilizam estratégias múltiplas para lutar contra o estigma, a discriminação e as violações de direitos humanos.

Notas

Notas

O Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o VIH/SIDA (ONUSIDA) reúne dez organizações das Nações Unidas num esforço comum para lutar contra a epidemia: o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (UNHCR), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Programa Mundial para a Alimentação (PMA), o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA), o Escritório das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC), a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Banco Mundial.

O ONUSIDA, como um programa co-patrocinado, reúne as respostas à epidemia das suas dez organizações co-patrocinadoras e junta a tais esforços iniciativas especiais. O seu objectivo é conduzir e apoiar o alargamento das acções internacionais contra o VIH/SIDA em todas as frentes. O ONUSIDA trabalha com uma vasta gama de parceiros – governos e ONG, especialistas/cientistas e não especialistas – com o fim de partilhar conhecimentos, competências e melhores práticas à escala mundial.

A Colecção de Melhores Práticas do ONUSIDA é uma série de materiais de informação do ONUSIDA que promove a procura de conhecimentos,

troca experiências e habilita pessoas e parceiros (pessoas vivendo com o VIH/SIDA, comunidades afectadas, sociedade civil, governos, o sector privado e organizações internacionais) empenhados numa resposta alargada à epidemia de VIH/SIDA e seu impacto;

permite que se exprima quem trabalha para combater a epidemia e atenuar os seus efeitos;

fornece informações sobre o que dá resultado em contextos específicos para benefício de quem enfrenta desafios semelhantes;

preenche uma lacuna em áreas essenciais de política e de programa fornecendo orientação técnica e estratégica assim como conhecimentos sobre prevenção, cuidados e atenuação do impacto em contextos múltiplos;

tem por objectivo estimular novas iniciativas para expandir a resposta a nível nacional à epidemia de VIH/SIDA; e

é um esforço entre agências de ONUSIDA em parceria com outras organizações e grupos.

Conheça melhor a Colecção Melhores Práticas e outras publicações do ONUSIDA através de www.unaids.org. Os leitores são encorajados a enviar os seus comentários e sugestões ao Secretariado de ONUSIDA à atenção do Gestor de Melhores Práticas, ONUSIDA, 20 Avenue Appia, 1211 Genebra 27, Suíça.

Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o VIH/SIDA – 20 avenue Appia - 1211 Genebra 27 - Suíça Tél.: (+41) 22 791 36 66 – fax: (+41) 22 791 41 87 – E-mail: [email protected] – Internet: http://www.unaids.org

O estigma e a discriminação relacionados com o VIH e as violações de direitos humanos constituem grandes obstáculos à prevenção da infecção por VIH; prestação de cuidados, apoio e tratamento; e atenuação do impacto da epidemia.

Esta publicação apresenta estudos de casos de acções bem sucedidas para lutar contra violações de direitos humanos, estigma e discriminação em relação com o VIH.

Embora haja necessidade de mais esforços, programas numa série de países estão a lutar, de maneira inovadora e com êxito, contra estigma, discriminação e violações de direitos humanos em relação com o VIH. As acções têm sido de três grandes tipos:

Abordagens de redução do estigma – consistindo frequentemente de programas comunitários de prevenção do VIH e de cuidados a casos de SIDA, mobilizando uma vasta gama de participantes.

Medidas específicas antidiscriminação – concentradas muitas vezes em contextos institucionais tais como locais de trabalho ou serviços de saúde, e

Mecanismos jurídicos e de direitos humanos – utilizando meios legais para promover os direitos humanos assim como para lutar contra e procurar corrigir discriminação contra pessoas vivendo com o VIH.

Estes programas demonstram haver muitos pontos de entrada potenciais para redução do estigma e da discriminação em relação com a SIDA, e promoção dos direitos humanos das pessoas que vivem com o VIH.

COLECÇÃO MELHORES PRÁTICAS DA ONUSIDA