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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO MESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAÇÃO SÉRGIO EUSTÁQUIO PIRES ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: UMA APLICAÇÃO DO MODELO FLEURIET ORIENTADOR: Prof. Dr. Luiz Alberto Bertucci BELO HORIZONTE 2002

ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

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Page 1: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO

MESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAÇÃO

SÉRGIO EUSTÁQUIO PIRES

ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: UMA APLICAÇÃO DO MODELO FLEURIET

ORIENTADOR: Prof. Dr. Luiz Alberto Bertucci

BELO HORIZONTE

2002

Page 2: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO

MESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAÇÃO

SÉRGIO EUSTÁQUIO PIRES

ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: UMA APLICAÇÃO DO MODELO FLEURIET

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Administração da PUC-Minas, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Administração.

ORIENTADOR: Prof. Dr. Luiz Alberto Bertucci

BELO HORIZONTE

2002

Page 3: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

Dissertação defendida e aprovada, em 19 de dezembro de 2002, pela banca

examinadora constituída pelos professores:

_______________________________________________

Prof. Dr. Luiz Alberto Bertucci - Orientador

_______________________________________________

Prof. Dr. Fábio Gallo Garcia

_______________________________________________

Prof. Dr. Dalton Jorge Teixeira

Page 4: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço a DEUS, princípio e fim de todas as coisas, pela vida e

por tudo que me é propiciado viver, especialmente por esta oportunidade de concluir

o mestrado.

Em segundo lugar, ao meu grande mestre e orientador, Prof. Dr. Luis Alberto

Bertucci, cuja convivência diária desfrutei nos últimos três ou quatro meses e com

quem tive a felicidade de aprender o verdadeiro significado da palavra mestre, pois

muito mais do que técnicas e teorias ele me ensinou, por seus exemplos cotidianos,

o que é profissionalismo e dedicação.

Agradeço, ainda, ao Prof. Dr. Dalton Jorge Teixeira, que, com seu incentivo e com

sua disponibilidade e generosidade, impulsionou-me a iniciar o mestrado.

Agradeço também a todos os colegas que contribuíram de alguma forma: lendo,

ouvindo, dando uma palavra de apoio, criticando, em especial a Fernando Antônio

Martins Aguiar, que esteve sempre ao meu lado nesta caminhada, especialmente

nos momentos mais difíceis.

À minha mãe, grande em sua simplicidade, que soube me transmitir tudo aquilo que

não se aprende na escola formal, mas no seio da família, meu reconhecimento,

gratidão e carinho.

Aos meus filhos, Fabiana e Rafael, peço desculpas pela ausência, pela falta de

tempo e agradeço-lhes a paciência e a compreensão. À Fabiana, que sacrificou

alguns finais de semana para me ajudar, um muito obrigado especial.

Por fim, à minha esposa Lourdes, que além da ausência suportou também o mau

humor dos momentos mais difíceis, ofereço este trabalho como símbolo do meu

reconhecimento, da minha eterna gratidão e do meu grande amor.

Page 5: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

RESUMO

Este trabalho teve por objetivo verificar em que medida os processos de aquisição

influenciaram a estrutura de capital das empresas brasileiras que se envolveram

nesses processos na condição de adquiridas. Com esse propósito, buscou-se

identificar empresas brasileiras que foram adquiridas por outras empresas (nacionais

ou estrangeiras) após a implantação do Plano Real, com o objetivo de comparar

estruturas de financiamento destas antes e depois do processo a que foram

submetidas. Partindo do pressuposto de que empresas que se envolvem em tais

processos na posição de adquiridas buscam crescimento e diversificação,

estabeleceu-se como parâmetros de avaliação os indicadores do modelo Fleuriet de

análise financeira, justamente por abordar a questão relativa à estrutura de capital

no ponto que mais interessava aos objetivos deste trabalho: o aspecto do

financiamento relacionado à dinâmica de funcionamento da empresa. Dessa forma,

buscou-se verificar se houve alteração dos seguintes indicadores no período pós-

aquisição em relação à situação pré-aquisição: Necessidade de Capital de Giro −

NCG, Capital de Giro – CDG e Saldo de Tesouraria – T. A hipótese principal deste

trabalho era a de que haveria alteração dos indicadores no período posterior à

fusão, com as seguintes tendências: Necessidade de Capital de Giro cresceria,

tornando-se maior do que na situação anterior, Capital de Giro seria reduzido e

Saldo de Tesouraria teria seu saldo negativo aumentado. Os resultados dos testes

estatísticos aplicados à base de dados mostraram que nossa hipótese se confirma

para a primeira variável – Necessidade de Capital de Giro −, que há indícios de que

a segunda variável se comporta de acordo com nosso pressuposto; e que, para a

terceira variável, não temos base estatística para afirmar que as mudanças ocorrem,

ainda que, nos poucos casos em que ela se confirma, a mudança se dê de acordo

com a nossa suposição. Naturalmente este trabalho não esgota o assunto e os

resultados da pesquisa apontam para a necessidade de ampliação do escopo deste

trabalho, possivelmente com uma base de dados maior e com a inclusão de

variáveis adicionais.

Page 6: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

ABSTRACT

This paper’s objective was to verify how acquisition processes influenced the capital

structure of Brazilian companies that got involved in these processes on the condition

of acquired. With this purpose, it was sought to identify Brazilian companies acquired

by other companies (national or foreign) after the implementation of Plano Real with

the objective of comparing financing structures used by them before and after the

process to which they were subjected. Taking as a start point that companies

involved in such processes in the position of acquired seek diversification and

growth, it was established as evaluation parameters and model indicators the Fleuriet

model of financial analysis, precisely for approaching the capital structure question in

exactly the way these papers’ objective is concerned: the financing aspect in

relationship to the dynamics of a company’s work environment. Thus, it was sought

to verify whether there was alteration on the following indicators in the period post-

acquisition (in relationship to the pre-acquisition period): need for working capital

(NCG); working capital (CDG) and treasury balance (T). This paper’s main

hypothesis was that there would be alteration in these indicators in the post-fusion

period, following these trends: need for working capital would grow, becoming greater

in the former situation; working capital would be reduced and treasury balance would

increase its negative value. The results of these statistical tests applied to the

database showed that our hypothesis was confirmed for the first variable – need for

working capital; there are indications that the second variable behaves according to

our assumption, and that for the third variable, we do not have the statistical basis to

affirm that changes occur, even if, in the few cases it actually does, the change

happens in accord to our supposition. Naturally, this work does not end the subject

and the results of the research point out the necessity of broadening this study’s

scope, possibly with the use of a larger database and the inclusion of additional

variables.

Page 7: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 9 1.1 Aspectos gerais .......................................................................................................... 9 1.2 A importância do estudo ............................................................................................. 12 1.3 Objetivos ..................................................................................................................... 13 1.3.1 Objetivo geral ........................................................................................................... 13 1.3.2 Objetivos específicos ............................................................................................... 13 CAPÍTULO 2 REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO ............................................................ 15 2.1 Aspectos iniciais ......................................................................................................... 16 2.2 O teorema de MM, fusões e aquisições e críticas ...................................................... 17 2.3 Teorias do balanceamento e fusões e aquisições ..................................................... 28 2.3.1 Custos de falência ................................................................................................... 30 2.4 Posições sob a Pecking Order Theory ....................................................................... 32 2.5 Questões relacionadas ao controle ............................................................................ 36 2.6 Estrutura de capital e estratégia ................................................................................. 40 2.7 O modelo de Fleuriet de análise financeira e os processos de fusão e aquisição ..... 61 2.8 Resumo crítico do referencial bibliográfico ................................................................. 66 CAPÍTULO 3 METODOLOGIA DE PESQUISA ............................................................... 69 3.1 Aspectos gerais .......................................................................................................... 70 3.2 Métodos e objetivos de pesquisa ............................................................................... 71 3.3 Delineamento da pesquisa ......................................................................................... 72 CAPÍTULO 4 RESULTADOS DA PESQUISA ................................................................. 80 4.1 Aspectos gerais .......................................................................................................... 81 4.2 Resultados da pesquisa ............................................................................................. 83 4.3 Resumo de aspectos críticos ...................................................................................... 106 CAPÍTULO 5 - CONCLUSÕES ......................................................................................... 108 5.1 Aspectos gerais .......................................................................................................... 109 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 112

Page 8: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

LISTA DE QUADROS QUADRO 1 - Resumo de situações na administração financeira ..................................... 64 QUADRO 2 - Resumo das operações de aquisição levantadas para a amostra .............. 74

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LISTA DE TABELAS TABELA 1 - Estatísticas de teste par as Lojas Renner ..................................................... 84 TABELA 2 - Estatísticas de teste para a empresa Arno .................................................... 86 TABELA 3 - Estatísticas de teste para a empresa Gradiente ............................................ 87 TABELA 4 - Estatísticas de teste para Cebractex ............................................................. 89 TABELA 5 - Estatísticas de teste para Coteminas ............................................................ 90 TABELA 6 - Estatísticas de teste para Chapecó ............................................................... 91 TABELA 7 - Estatísticas de teste para Elevadores Atlas .................................................. 92 TABELA 8 - Estatísticas de teste para Polipropileno ......................................................... 94 TABELA 9 - Estatísticas de teste para Suzano ................................................................. 95 TABELA 10 - Estatísticas de teste para COFAP ............................................................... 97 TABELA 11 - Estatísticas de teste para FRAS-LE ............................................................ 99 TABELA 12 - Estatísticas de teste para Metal Leve .......................................................... 100 TABELA 13 - Estatísticas de teste para Acesita ................................................................ 103 TABELA 14 - Estatísticas de teste para Cia. Vale do Rio Doce - CVRD ........................... 104 TABELA 15 - Estatísticas de teste para Cosipa ................................................................ 104

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CDG Capital de Giro CMPC Custo Médio Ponderado de Capitais IGPM-DI Índice Geral de Preços do Mercado - Disponibilidade Interna MM Monglian e Miller NCG Necessidade de Capital de Giro PL Capital Próprio POT Pecking Order Theory T Saldo de Tesouraria VPL Valor Presente Líquido

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ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: UMA APLICAÇÃO DO MODELO FLEURIET

SÉRGIO EUSTÁQUIO PIRES

2002

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DECLARAÇÃO

Declaro, para os devidos fins, que fiz a revisão da normalização da dissertação

Estrutura de capital após processos de aquisição: uma aplicação do modelo Fleuriet,

do mestrando Sérgio Eustáquio Pires, apresentada ao Instituto de Ciências

Econômicas e Gerenciais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, para

a obtenção do título de Mestre em Administração.

Belo Horizonte, 09 de dezembro de 2002

Regina Zélia Purri Alves de Souza Rua Caratinga, 187 / 202 - Anchieta - BH/MG

(31) 3284-6023 - 9112-3187

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CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO

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CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO 10

1.1 Aspectos gerais

No final da década de 80 e durante toda a década de 90, o Brasil experimentou um

movimento intenso de fusões e aquisições. Durante as décadas que precederam

esse movimento, a estratégia econômica dos governos no Brasil esteve

fundamentada em princípios nacionalistas, protecionismo, reserva de mercado,

estatização de atividades consideradas essenciais e/ou de "segurança nacional" e

em concessões de incentivos fiscais e subsídios a diversos setores produtivos.

Havia uma série de restrições ao capital internacional, sendo admitida a presença de

companhias estrangeiras apenas naqueles setores onde a capacitação tecnológica

nacional era considerada como insuficiente ou não competitiva, como, por exemplo,

nos setores automobilístico, farmacêutico, de eletro-eletrônicos e da química fina. A

vitória de Fernando Collor de Melo nas eleições presidenciais de 1989 foi o fato

político marcante que rompeu com esse passado e contribuiu de forma significativa

para a consolidação do movimento de fusões e aquisições, aliado a fatores internos

e externos, como a globalização dos mercados e a abertura econômica.

Em relação às fusões e aquisições, a década de 90 foi marcada por três períodos

distintos, que estabeleceram diferenças fundamentais entre o passado e o futuro:

1) Abertura da economia brasileira, de 1990 a 1993, com a posse de Fernando

Collor na presidência da República. Este período foi marcado pelos processos de

concentração e verticalização das nossas empresas e o início do processo de

privatização, que criou oportunidades de investimentos em muitos setores que nunca

haviam sido explorados pela iniciativa privada.

2) Implantação do Plano Real, de 1994 a 1997, ao mesmo tempo em que se

consolida em nível mundial o processo de globalização. Nesse cenário houve uma

concentração mais forte no segmento financeiro, com o socorro governamental aos

bancos em dificuldades financeiras e o acirramento da concorrência, provocando um

elevado número de fusões/aquisições nesse setor (107 operações em quatro anos).

Esse período foi o mais fértil em termos de fusões e aquisições no Brasil durante to-

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CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO 11

da a década, com 372 negócios realizados, principalmente nos setores

eletroeletrônico, químico e de autopeças, de acordo com pesquisas da KPMG.

3) Último período, de 1998 a 2000, marcado pela "era da tecnologia", com a

expansão dos negócios em telecomunicações, informática e internet, como definido

pela KPMG.

Muitas dessas operações de fusão e aquisição que ocorreram no país estavam

relacionadas a problemas decorrentes da estrutura de capital das empresas

adquiridas, que se encontravam numa situação caracterizada por falta de "fôlego

financeiro" para crescer ou até mesmo para sobreviver num ambiente mais

competitivo, bem como para impedir os "ataques" das firmas compradoras.

Uma estrutura de capital mais conservadora, como a adotada pela maioria das

empresas brasileiras, limita as suas ações, com prejuízos para a empresa, os

acionistas e o País. Toda atividade necessita de investimentos para se desenvolver

e manter o crescimento no longo prazo. No Brasil, como o mercado de capitais é

incipiente e ineficiente e as linhas de crédito de longo prazo são escassas e de difícil

acesso, a maioria das empresas encontra dificuldades para financiar novos projetos,

tanto para seu crescimento quanto para sua sobrevivência. Nesse contexto, as

empresas brasileiras são, de forma geral, mais conservadoras no que se refere a

endividamento do que empresas de outros países desenvolvidos, operando com

uma estrutura de capital em que predomina o capital próprio em relação a capital de

terceiros, até por falta de outras opções de financiamento mais favoráveis.

Nos processos de fusão e aquisição de empresas brasileiras por empresas

multinacionais, as primeiras passam a operar sob um novo controle, estabelecido

pelas compradoras. Nesse sentido, a pergunta que se coloca nesta dissertação é:

essa mudança de controle veio a alterar padrões de financiamento das empresas

adquiridas?

Page 16: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO 12

1.2 A importância do estudo

A relevância de um estudo como o que aqui se propõe está relacionada com o

momento pelo qual passa a maioria das empresas brasileiras, em que a

concorrência com empresas multinacionais é cada vez mais acirrada e a estrutura

de capital torna-se fator determinante do sucesso ou fracasso nessa competição. O

cenário atual faz com que as empresas busquem melhorias em todas as suas áreas

funcionais como forma de garantir seu poder de competitividade, e essas melhorias

só podem ser alcançadas por meio de constantes investimentos. Para muitas delas,

no entanto, não existe fonte de recursos disponíveis para financiar os investimentos,

não restando outra saída a não ser o processo de fusão ou aquisição. Exemplo

típico dessa situação é o caso da empresa Metal Leve S/A., que, apesar de ser, no

mercado brasileiro de autopeças, uma empresa tradicional, competente, moderna e

com domínio de tecnologia de ponta na fabricação de bronzinas e pistões, não teve

fôlego financeiro suficiente para efetuar os investimentos necessários ao seu

crescimento e reposicionamento no novo cenário que se desenhava, e para

enfrentar a abertura de mercado e a globalização da economia. Restrita ao mercado

de reposição, pois havia perdido para concorrentes internacionais o mercado das

montadoras, a empresa teve sua sentença decretada. Restaram aos acionistas

majoritários e fundadores da empresa as alternativas: continuar como minoritários

numa nova empresa que viesse a incorporar a sua ou, simplesmente, vender o

negócio. Optaram pela segunda hipótese e o venderam para a alemã Mahle, que

quatro décadas antes havia sido sua sócia minoritária e fornecedora de tecnologia.

A aquisição de empresas tornou-se, nos dias atuais, um importante instrumento para

organizações que necessitam atingir novos mercados, ganhar "expertise" ou atingir

escalas de produção e de custos compatíveis com seus concorrentes globalizados.

Entretanto, essa estratégia pode, por outro lado, redundar em fracasso para as

adquirentes, podendo levá-las, inclusive, a processos de insolvência. Estudos dessa

natureza são importantes na medida em que apontam alguns indicadores (no caso

específico deste estudo, aqueles relacionados ao modelo dinâmico de análise

financeira, desenvolvido por Michel Fleuriet) de comportamento do padrão de finan-

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CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO 13

ciamento das atividades das empresas adquiridas após o processo, podendo servir

como base de informações a serem analisadas por empresas que pretendem se

valer dessa estratégia.

O estudo ora proposto poderá contribuir no sentido de melhorar a compreensão

acerca do reposicionamento dessas empresas em relação às suas estruturas de

capital na busca de melhores estratégias para enfrentar estes novos tempos.

Nesse sentido, a literatura estrangeira sobre o tema é vasta e esclarecedora sobre

determinados aspectos inseridos nos processos de fusões e aquisições, mas

acreditamos que este estudo se justifica na medida em que possa contribuir

significativamente para uma melhor compreensão de como esse processo ocorre de

acordo com as características e especificidades da economia brasileira.

1.3 Objetivos

Tendo em vista a importância do assunto para o crescimento e sustentação das

empresas brasileiras, conforme relatada nos tópicos anteriores, estabelecemos os

objetivos geral e específicos relacionados abaixo.

1.3.1 Objetivo geral

Avaliar o comportamento de empresas que passaram por processos de fusões e

aquisições com relação a composição de suas estruturas de financiamento de

ativos, a ser feito através das categorias de análise do modelo Fleuriet de análise

financeira.

1.3.2 Objetivos específicos

• Levantar padrões de estrutura de capital de empresas que passaram por

Page 18: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO 14

processos de aquisições/fusões, na condição de adquiridas.

• Aferir a estrutura de capital destas empresas, antes e após o processo de

aquisição a que foram submetidas, de acordo com os indicadores do modelo

Fleuriet.

• Constatar as alterações dos indicadores de gerenciamento da liquidez de

curto prazo, de acordo com os parâmetros do modelo Fleuriet, que são:

capital de giro, necessidade de capital de giro e saldo de tesouraria.

• Levantar padrões de risco financeiro das empresas que tenham sido

adquiridas.

Page 19: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

Page 20: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

16

2.1 Aspectos Iniciais

O tema "Estrutura de Capitais" constitui-se ainda hoje um tema atual e atrativo para

pesquisadores da área de finanças. Quanto mais se estuda a respeito do assunto,

mais se revela o nível de profundidade e de complexidade com que ele se relaciona

com as demais áreas da organização, recebendo influências delas e, ao mesmo

tempo, influenciando-as também. Assim, a estrutura de capital das empresas não é

associada apenas aos seus aspectos econômicos e financeiros, mas ainda a

mercado, produto, estratégia, diversificação, agregação de valor e outros temas

mais.

Entretanto, não há como falar em Estrutura de Capitais sem mencionar Modigliani e

Miller (1958), cujo trabalho se constitui em divisor de águas para a teoria de

finanças, pois a partir dele é que se tem origem toda a moderna teoria de finanças.

O desenvolvimento do tema a partir desse teorema foi vertiginoso, até mesmo pela

crítica, pois vários estudiosos e pesquisadores procuraram demonstrar, com seus

trabalhos teóricos e empíricos, que o pressuposto de mercado perfeito implícito no

teorema, na prática, não se verifica. A partir desses estudos, várias linhas de

pensamento foram surgindo, com explicações e sugestões que, às vezes, se

complementam e outras vezes são divergentes, mas têm levado adiante a pesquisa

e os estudos nessa área, contribuindo, assim, para o seu desenvolvimento.

De nossa parte, vamos abordar primeiramente o já consagrado Teorema de

Modigliani e Miller e, na seqüência, os estudos e as pesquisas de diversos autores

que, ao criticá-lo, enveredaram por diferentes caminhos da organização e

encontraram correlação entre o tema estrutura de capital e outros aspectos a ele

relacionados, especialmente fusões e aquisições. A preocupação principal dos

investidores é a de maximizar o retorno de seus investimentos e a estrutura de

capital das empresas, portanto, a forma como elas se financiam, está diretamente

relacionada a tais retornos. Fusões e aquisições surgem, então, como uma forma de

entrada em novos negócios pela via indireta ou externa, o que equivale dizer que

Page 21: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

17

empresas podem diversificar suas atividades ou ampliar sua área de atuação por

meio de fusões e aquisições com empresas já estabelecidas, sem ter de esperar

pelo tempo necessário para o desenvolvimento interno de competências e

tecnologias, ou pela geração interna de recursos capaz de sustentar elevados

investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Há claras evidências de que

empresas com boa perfomance, que se traduz em maior capacidade de geração

interna de caixa e de endividamento, são as que se tornam compradoras de outras

empresas. Barreto e Famá (1996) colocam que, entre outras, a vantagem que uma

empresa nacional obtém ao ser fundida ou adquirida por um grupo multinacional

está na capitalização por parte do sócio estrangeiro.

Outro fator declarado como objetivo de fusões e aquisições é a diversificação do

risco, uma vez que o processo pode gerar uma maior capacidade de obtenção de

financiamentos, reduzindo dessa forma o risco da empresa e, por conseqüência, seu

custo de capital. Essa argumentação, no entanto, encontra muitas críticas na teoria

moderna de finanças, o que veremos no desenvolvimento deste trabalho.

2.2 O teorema de MM, fusões e aquisições e críticas

O pressuposto básico do teorema de MM é a idéia de que a forma de financiamento

das firmas não afeta o nível de investimento e o crescimento econômico das

mesmas. Por esse motivo ficou conhecido como o "teorema da irrelevância", uma

vez que supõe que todo projeto, sendo viável economicamente também o seria

financeiramente, partindo das seguintes premissas:

a) que a oferta de fundos é elástica, ou seja, o mercado de capitais é perfeito ;

b) que há uma perfeita simetria de informações na avaliação dos retornos dos

projetos de investimentos, entre aqueles que demandam os recursos e que vão

gerenciá-los e aqueles que emprestam estes recursos;

Page 22: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

18

c) que novos investimentos seriam realizados tanto através da captação de novos

recursos via mercado acionário, partindo do pressuposto de que o mercado

estaria sempre interessado nestes novos projetos, como de endividamento sem

risco;

d) que a estrutura de capital das firmas não seria fator restritivo à utilização das

fontes de financiamento (dívida e capital próprio), desde que a expectativa de

retorno de seus projetos fosse positiva;

e) que os agentes tomam e fazem empréstimos à taxa livre de risco;

f) que há ausência de impostos;

g) que todos os lucros são distribuídos como dividendos;

h) que há uma perpetuidade dos lucros futuros, ou seja, não há crescimento.

Essas premissas sugerem, então, que as decisões de investimento da firma seriam

ditadas apenas pelas variáveis "reais", ou seja, a demanda do mercado, a

produtividade, o avanço tecnológico e os preços relativos do processo produtivo. Os

financiamentos para esses projetos, no entanto, seriam uma variável passiva, não

condicionante, que apenas facilitaria a realização dos projetos. Baseados nessas

premissas do modelo, os autores formularam três proposições:

1) O valor de mercado de qualquer empresa independe de sua estrutura de capital e

pode ser mensurado pela capitalização de seus fluxos de caixa a uma taxa

constante apropriada para a sua classe de risco, assim como o seu custo médio

ponderado de capitais − CMPC − é igual ao de uma empresa sem débitos.

Para fundamentar a proposição, MM demonstram que o valor de uma empresa

alavancada não pode ser diferente de uma sem dívidas, porque os investidores

podem, por sua própria vontade, reproduzir nesta empresa os efeitos da alavan-

Page 23: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

19

cagem verificados na outra empresa, através da combinação de dois tipos de

investimentos: ações de uma firma sem dívidas e empréstimos sem risco.

2) A rentabilidade esperada das ações de uma empresa com dívidas será igual à

taxa de uma empresa sem dívidas para determinada classe de risco, adicionada de

um prêmio de risco proporcional ao seu nível de endividamento.

O que os autores querem dizer, na realidade, é que o suposto aumento na

rentabilidade do capital próprio − PL −, conseguido através da alavancagem

financeira, não é nada mais do que um prêmio pago ao capital próprio em função do

risco assumido ao se fazer uma opção pelo endividamento, tratando-se, portanto,

apenas de uma representação da correlação positiva existente entre risco e retorno,

dogma da teoria de finanças.

3) A política de investimentos de uma empresa independe da forma e natureza de

seu financiamento. O que importa, segundo os autores, é que a rentabilidade

esperada dos projetos seja maior do que a taxa de capitalização da firma em sua

classe de risco, isto é, que os projetos tenham valor presente líquido − VPL positivo.

Como essa taxa não é afetada pelas decisões de financiamento (como prediz a

proposição 1), pode-se concluir que a aceitação de qualquer projeto não depende da

consideração da fonte que o financiará.

Os autores concluíram, então, que o valor de mercado da firma e seu custo de

capital são independentes da sua estrutura de capital, tornando independentes as

decisões de investimento e financiamento.

Mais tarde, Miller (1977) reconheceu que a incorporação do modelo de tributos

pessoais poderia afetar o valor da empresa, visto que a inclusão da tributação

pessoal diminui o benefício gerado pela alavancagem. Isso se passa devido ao fato

de que, pagando impostos sobre os seus ganhos, os credores exigirão maiores

taxas de retorno de forma a compensar a perda para o fisco, o que aumenta o custo

do endividamento. Esse reconhecimento de Miller teve importantes implicações so-

Page 24: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

20

bre a estrutura de capital das firmas, indicando que os benefícios do endividamento

poderiam não ser tão grandes como se imaginava até então.

Ainda no campo da teoria da irrelevância, Levine e Zervos (1996) colocam que

autores importantes na área de desenvolvimento da economia, sequer mencionam a

questão do padrão de financiamento das firmas. Lucas (1978), defende a teoria de

que os economistas geralmente exageram o papel do sistema financeiro para o

desenvolvimento econômico.

Muitas críticas foram dirigidas a esse Teorema de MM e a conseqüência natural foi o

surgimento de uma série de estudos empíricos que buscavam demonstrar que o

pressuposto de mercado perfeito não se verifica na prática. Nessa direção, linhas de

pesquisas exploram a imperfeição do mercado e são corretamente agrupadas sob

os termos de "assimetria de informações".

Akerlof (1970) demonstrou que mercados podem falhar quando os compradores

potenciais não podem verificar a qualidade dos produtos que lhes são oferecidos.

Frente ao risco de comprar um "limão", o comprador exigirá um desconto que, em

troca, desencoraja os vendedores potenciais que não estão ofertando "limões". Com

seu trabalho pioneiro, surgiu então o que se denomina de Assimetria de

Informações, uma teoria que se presta também a relacionar as decisões de

investimento e financiamento das empresas com as informações possuídas pelos

gerentes (aqueles que estão dentro da empresa, à frente de suas atividades e que,

por esse motivo, conhecem como ninguém aquele negócio) e as informações que

são repassadas e/ou percebidas pelos investidores, sejam eles credores ou

acionistas. Esta diferença em diversos e variados graus de informações é chamada

de "assimetria de informações" e, especificamente no campo de finanças, a lógica

entendida é de que as informações possuídas pelos administradores da organização

são determinantes para a projeção do fluxo de caixa da empresa (que, em última

instância, pode determinar o valor da empresa) e que muitas dessas informações

não são disponibilizadas para os outros agentes do mercado (acionistas,

investidores institucionais, instituições financeiras, fornecedores e público em geral).

Page 25: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

21

Essa linha de pesquisa em finanças começou, como citado em Harris e Raviv

(1991), com o trabalho de Ross (1977) e Leland e Pyle (1977) e foi desenvolvida

com os estudos de Myers (1984) e Myers e Majluf (1984), os quais partiram do

pressuposto de que a estrutura de capital da firma é projetada para mitigar

ineficiências nas decisões de investimento que são causadas pela assimetria de

informações.

Em seu trabalho pioneiro, Myers e Majluf (1984) mostram que se investidores estão

menos informados que os gerentes sobre o valor dos recursos da firma, então o

patrimônio líquido pode ser subavaliado pelo mercado. Se novos investimentos vão

exigir recursos pela via de emissão de ações, a subavaliação feita pelos novos

acionistas pode ser de tal ordem que eles acabam por capturar parcelas

substantivas do VPL do novo projeto, resultando em uma perda líquida para

acionistas existentes (antigos). Nesse caso, o projeto será rejeitado ainda que o VPL

seja positivo.

Nesse estudo, os autores consideram uma empresa que tenha de emitir ações para

captar recursos com a finalidade de empreender uma valiosa oportunidade de

investimento. Assume-se que os gerentes sabem mais sobre o valor da empresa

que os investidores potenciais e pressupõe-se também que os investidores

interpretam as ações da empresa racionalmente. A partir dessas premissas, é

desenvolvido um modelo de equilíbrio da decisão de emitir-investir, pelo qual as

empresas podem, em algumas situações, recusar emissões de ações e,

conseqüentemente, rejeitar valiosas oportunidades de investimento. O modelo

sugere ainda algumas explicações para vários aspectos do comportamento no

financiamento da empresa, inclusive a tendência para se sustentar em fontes

internas de fundos, e preferir dívida a patrimônio líquido, quando o financiamento

externo é requerido.

Fusões e aquisições podem ser encaradas à luz da teoria de Myers e Majluf quando

da ocorrência de uma oportunidade única para se realizar a operação e esse

investimento pode se tornar mais ou menos atraente em função das fontes de finan-

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

22

ciamento disponíveis. Empresas adquirentes com folgas financeiras tendem a

concretizar tais operações com maior facilidade do que empresas adquirentes que

necessitam buscar fontes externas de recursos, uma vez que uma emissão para

financiar tal operação poderia provocar um deságio de tal ordem que beneficiasse

mais os novos do que os antigos acionistas. No Brasil, no segmento de

supermercados, temos assistido a um processo de aquisições constantes de

empresas regionais de menor porte por hipermercados de grande porte, de atuação

nacional, tendo em vista os excedentes de caixa destes últimos.

Ainda como premissa do modelo, não se considera, nessa decisão, a existência de

impostos, custos de transação ou outras imperfeições do mercado de capitais. Em

um mercado de capitais eficiente, títulos podem ser sempre vendidos a um preço

justo: o valor presente líquido de se venderem títulos sempre é zero, porque o

dinheiro levantado exatamente equilibra o valor presente da obrigação criada.

Assim, a regra de decisão se restringe a assumir todo projeto com VPL positivo,

independentemente de serem usados fundos internos ou externos para pagá-lo.

O que acontece se os gerentes da empresa sabem mais sobre o valor de seus

ativos e oportunidades do que investidores de fora? Nada de fundamental é

mudado, desde que os gerentes invistam em todo projeto que eles sabem ter VPL

positivo. Se assim fizerem, as ações que os investidores compram, serão estimadas

corretamente na média, embora uma emissão particular possa terminar com preço

sub ou superavaliado. A informação insider do gerente cria uma aposta lateral entre

acionistas antigos e novos, mas o preço de equilíbrio da emissão não seria afetado.

Entretanto pode haver alguns casos nos quais aquela informação é tão favorável

que os gerentes, para atuar no interesse dos acionistas antigos, recusarão emitir

ações até mesmo quando isso significar a recusa de uma boa oportunidade de

investimento. Quer dizer, o custo para acionistas antigos de se emitirem ações a um

preço de pechincha (bargain price) pode retirar uma parcela substancial do VPL do

projeto, tornando-o nada atrativo. Enfim, essa possibilidade torna o problema

interessante: os investidores, sabedores de sua ignorância relativa, pensarão que

Page 27: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

23

uma decisão de não emitir ações sinaliza "boas notícias". As notícias canalizadas

por uma emissão são ruins ou, no mínimo, menos boas, o que afeta o preço que os

investidores estarão dispostos a pagar pela emissão e que influencia a decisão de

emitir-investir. Enfim, os autores analisam como a informação assimétrica afeta a

decisão de emitir-investir da empresa, assumindo que os gerentes atuam nos

interesses dos "antigos" (atuais) acionistas e que estes são "passivos", ou seja, não

ajustam seus portfólios em resposta à decisão de emitir-investir da empresa, exceto

possivelmente para comprar uma fração pré-determinada de qualquer nova emissão.

Essa suposição torna o financiamento preocupante, pois uma empresa com ampla

folga financeira (por exemplo, grandes quantias de dinheiro ou títulos negociáveis,

ou com capacidade de emitir títulos representativos de dívida a juros livres de risco)

aproveitaria todas as oportunidades de VPL positivos. Por essa lógica, a mesma

empresa, sem folga, recusaria alguns projetos na mesma situação. Ademais, com

essa suposição sobre o objetivo dos gerentes, o modelo prevê que as empresas

preferirão dívida a capital próprio, se precisarem de fundos externos. Os custos de

prover, absorver e verificar informações podem ser significativos e, além disso,

podem tornar públicas algumas informações para os competidores da empresa,

dando-lhes uma vantagem competitiva que não possuem.

Também pode haver assimetrias de informação quando não houver qualquer

necessidade para guardar informação proprietária. A educação de investidores toma

tempo e dinheiro, pois, afinal de contas, a vantagem informacional dos gerentes vai

além de ter mais dados do que os investidores. Gerentes, além de ter maior volume

de informações, sabem também como tratar melhor essas informações, ou seja,

sabem realmente o que elas significam para a empresa. Eles têm uma visão mais

interior da organização e o que se pode e não se pode fazer, e esse conhecimento

organizacional é parte do capital humano desses agentes, que é adquirido no

trabalho, através de esforço consciente, bem como também por tentativa e erro.

Um investidor externo que tentasse emparelhar-se igualmente com um inteligente

gerente, nessa dimensão, provavelmente fracassaria. Por esse argumento, a

separação da propriedade em relação aos gerentes profissionais naturalmente cria

Page 28: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

24

informação assimétrica.

Leland e Pyle (1977) desenvolveram um trabalho nesse sentido, cujo foco está

centrado no fato de que os mercados são caracterizados por diferenças nos níveis

de informação entre os agentes, com os dirigentes buscando financiar projetos sobre

os quais eles possuem mais informações do que os próprios acionistas que, por sua

vez, detêm informações em maior volume e qualidade do que os financiadores

externos desses projetos. Assim, os próprios dirigentes podem eventualmente

rejeitar a via da emissão de ações como alternativa ao financiamento de projetos

valiosos, caso os investidores imponham deságios sobre os preços das ações

quando de subscrições, que ocorrem por motivos que resultam justamente da posse

assimétrica de informações sobre a real situação da empresa.

Para os autores, a participação do administrador ou gerente com seu próprio capital

no financiamento do projeto sinalizaria para os investidores uma boa qualidade do

projeto, o que reduziria os níveis de percepção de posse assimétrica de informações

e aumentaria o nível de confiança de potenciais acionistas sobre os resultados

futuros da empresa. Ou seja, investidores assumem que gerentes são mais bem

informados a respeito de fluxos de caixas esperados e os investidores entendem,

ainda, que quanto maiores as frações do capital detido pelos gerentes, menor será o

interesse destes em agir contra os interesses de acionistas não-mandatários. A

absorção de recursos de acionistas (atuais e potenciais) é tratada na literatura de

finanças como conflito de interesses entre dirigentes e acionistas que têm relação

direta com a posse assimétrica de informações por parte dessas duas classes de

agentes. É, portanto, natural que, à luz desses conceitos, um processo de emissão

de ações, que representa a opção pelo aumento de participação de capital próprio

na estrutura de capital da empresa, revista-se de condicionantes e características

que favoreçam os interesses dos dirigentes em detrimento dos acionistas.

Da mesma forma, o modelo de Miller e Rock (1985) prevê impacto negativo sobre

preços de ações, independentemente do tipo de título emitido. Os autores

concordam com a postulação inicial de Modigliani e Miller (1958) em relação à irrele-

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

25

vância da estrutura de capital das empresas. Para eles, desde que haja uma

emissão de qualquer ativo financeiro na empresa, o mercado a interpretará como

incapacidade de geração interna de recursos, o que levará a uma queda do valor da

empresa. O ponto central desse trabalho está na premissa da igualdade de

informações entre gerentes e o mercado a respeito do valor dos ativos da empresa e

do nível de investimentos planejado. Dessa forma, uma nova emissão é interpretada

pelo mercado como incapacidade de geração interna de recursos, aceitando-se,

então, que as informações acerca do fluxo de caixa da empresa não são simétricas.

Portanto, tanto a emissão de ações quanto o financiamento por meio de dívida para

investimentos em novos projetos causariam retorno negativo das ações dessa

companhia, reduzindo o seu valor na razão direta do tamanho da emissão. A

mensagem principal do modelo é esta: dada a posse assimétrica de informações,

uma empresa com folga financeira insuficiente pode não empreender todas as

oportunidades valiosas de investimento. Assim, uma empresa que tenha pouca folga

financeira, aumenta seu valor se aumentar essa folga e, no que interessa aos

propósitos deste trabalho, um modo para se fazer isso é através de uma fusão, na

medida em que haveria geração de valor quando a folga em excesso de uma

empresa cobrisse completamente as deficiências da outra.

Enfim, uma das conclusões de Myers e Majluf (1984) é de que uma fusão de uma

empresa pobre em folga financeira com outra rica em folga financeira aumenta o

valor combinado de ambas. Entretanto a negociação de tais fusões estará perdida a

menos que os gerentes da empresa pobre em folga financeira possam canalizar

suas informações especiais aos compradores em perspectiva. Se essas informações

não puderem ser canalizadas (e verificadas), as empresas pobres em folga

financeira serão compradas por ofertas públicas feitas diretamente aos acionistas.

Há ainda outros estudos teóricos que exploram a assimetria de informações e como

as informações proprietárias de gerentes são sinalizadas para investidores. Dentre

eles, inclui-se o trabalho de Bhattacharya (1988) sobre política de dividendos;

Grossman e Hart (1982), que trabalham sobre ofertas de aquisições; e os estudos

de Ross (1977, 1978) sobre "sinalização a partir de incentivos financeiros", no qual o

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

26

contrato de trabalho de um gerente o conduz a canalizar informações sobre as

perspectivas da empresa por meio da escolha de sua estrutura de capital.

Narayanan (1988) e Heinkel e Zechner (1990), citados por Harris e Raviv (1991),

obtiveram resultados semelhantes aos de Myers e Majluf usando uma abordagem

ligeiramente diferente. Eles mostram que, quando a assimetria de informações

estiver relacionada apenas ao valor do novo projeto, pode haver superinvestimento e

alguns projetos de VPL negativo serão tomados. Narayanan (1988) mostra que,

quando firmas podem escolher entre dívida ou patrimônio líquido, vão preferir se

endividar, indicando que seus resultados são consistentes com a teoria que

preconiza a existência de uma ordem de "preferência" das empresas para financiar

seus projetos. Já que aceitação de projeto é associada com emissão de dívida,

anúncios de dívida são boas notícias, que resultam em um aumento no preço de

ação da firma. Esta implicação se confronta com o trabalho de Myers e Majluf

(1984).

Heinkel e Zechner (1990) defendem a tese de que as empresas deveriam manter

uma capacidade de reserva de endividamento em tempos normais, para ser utilizada

quando do surgimento de boas perspectivas de investimentos, como no caso de

aquisições de outras empresas. Isso vale dizer que, em tempos normais, as

empresas deveriam trabalhar menos alavancadas do que sugere a teoria do

balanceamento entre os benefícios fiscais do endividamento e os custos de falência.

Outro efeito desse fator é o aumento do custo de capital para a empresa, uma vez

que, além dos custos de transação e de lançamento dos papéis, tem-se o deságio

sobre o preço que leva à elevação do custo relativo do capital. De acordo com os

autores, esse é um dos pontos de maior dificuldade que as empresas enfrentam

para estabelecer a chamada "estrutura ótima de capital" e também deve medir os

efeitos da sua estrutura de capital sobre o custo de capital e sobre o valor da

empresa.

Nos casos de fusões e aquisições, foco deste trabalho, Weston e Brigham (2000)

observam que alguns pontos fundamentais devem ser considerados:

Page 31: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

27

1) a empresa adquirente assume, na maioria dos casos, a dívida da empresa

adquirida e emite dívida para financiar a compra das ações da empresa-alvo;

2) a nova dívida muda, efetivamente, a estrutura de capital da empresa;

3) a melhoria de valor resultante do uso do endividamento é suficiente para cobrir o

prêmio oferecido pela ação (já que, na grande maioria dos processos, os preços

efetivamente pagos superam os valores inicialmente estabelecidos pelas

empresas adquiridas) e, ainda assim, deixa lucro para a empresa compradora.

Na análise dos autores, as empresas buscam uma "reestruturação" financeira,

tentando encontrar um ponto "ótimo" de endividamento com o qual se tornem alvos

menos atraentes para aquisições. Por outro lado, gerentes e administradores estão

sempre em busca da manutenção de seus empregos e do controle da administração

da empresa e não hesitarão em utilizar mais capital próprio ou mais dívida, de

acordo com a situação do momento, o que os ajudará a manter o controle.

Ainda segundo Heinkel e Zechner (1990), dentre os principais motivos que levam as

empresas às fusões e aquisições, está a globalização (os negócios estão cada vez

mais globais), os altos custos (não só de produção como também e principalmente

de pesquisa e desenvolvimento) e a economia financeira, geralmente conseguida

por meio de redução de custo de endividamento ou de uma melhor/maior

capacidade de contrair empréstimos.

Gort (1969) argumentou que poderia ocorrer uma fusão no momento em que

proprietários de uma empresa atribuíssem a ela um valor mais baixo do que seus

prováveis compradores, pressupondo que os proprietários da empresa compradora

atribuíssem à empresa alvo um valor maior do que os seus proprietários, por

motivos oriundos da assimetria de informações. Em outra direção de pesquisa,

Keown e Pinkerton (1981) verificaram a atuação de insiders em 194 propostas de

fusões e aquisições que foram encerradas entre 1975 e 1978, concluindo que são

muitas as negociações que se baseiam em informações que não são de domínio pú-

Page 32: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

28

blico.

2.3 Teorias do balanceamento e fusões e aquisições

Dentre os diversos trabalhos alinhados à Teoria do Balanceamento, o de Jensen e

Meckling (1976) continua sendo hoje uma referência. Os autores iniciam o estudo

com o objetivo claro de demonstrar que há uma série de interesses em qualquer

organização, entre os vários agentes que com ela se relacionam e que esses

interesses e direitos individuais acabam por determinar como os custos e

recompensas serão alocados entre os participantes. Como a especificação de

direitos é geralmente efetuada através de contratos (implícitos ou explícitos), o

comportamento individual em organizações, inclusive o comportamento de gerentes,

dependerá da natureza desses contratos. O foco deste estudo se dá sobre as

implicações comportamentais dos direitos de propriedade especificados nos

contratos entre os proprietários e gerentes da empresa.

Jensen e Meckling (1976) definem uma relação de agência como sendo um contrato

sob o qual uma ou mais pessoas (o principal ou principais) contrata outra pessoa (o

agente) para executar algum serviço de seu interesse, o qual envolve delegação de

autoridade ao agente para tomada de decisões. Se ambas as partes na relação são

maximizadoras de utilidade, há uma forte razão para acreditar que o agente nem

sempre agirá no melhor interesse do principal. Este último pode limitar afastamentos

de seus interesses, estabelecendo incentivos apropriados para o agente e

incorrendo em custos de monitoramento, delineados para limitar as atividades do

agente que não são de interesse do principal. Além disso, em algumas situações,

valerá a pena para o agente gastar recursos (custos de comprometimento) de forma

a garantir que ele não tomará certas atitudes que prejudicariam o principal, ou para

assegurar ao principal de que este será compensado se ele (agente) tomar tais

atitudes. Entretanto, é geralmente impossível para o principal ou para o agente, a

custo zero, assegurar que este último tomará ótimas decisões do seu ponto de vista.

Na maioria das relações de agência, o principal e o agente incorrerão em monitora-

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

29

mento positivo e em custos de comprometimento (pecuniários ou não), e, além

disso, haverá alguma divergência entre as decisões do agente e aquelas decisões

que maximizariam o bem-estar do principal. O valor equivalente em dinheiro da

redução em bem-estar experimentada pelo principal devido a essa divergência é

também um custo da relação de agência, referido no texto como "perda residual".

Assim é que os autores definem custos de agência como a soma de:

(1) as despesas de monitoramento pelo principal,

(2) as despesas de comprometimento pelo agente,

(3) a perda residual.

Segundo eles, os custos de monitoramento incluem mais do que simplesmente

medir ou observar o comportamento do agente. Ele inclui os esforços da parte do

principal para "controlar" o comportamento do agente através de restrições

orçamentárias, políticas compensatórias, regras operacionais, etc.

Relações contratuais são, segundo eles, a essência da empresa, não só com

empregados mas também com fornecedores, clientes, credores e acionistas. O

problema dos custos de agência e de monitoramento existe para todos os contratos,

seja ele pecuniário ou não. A empresa é simplesmente uma forma de ficção legal

que serve como uma ligação para relações contratuais e que é também

caracterizada pela existência de reivindicações residuais divisíveis sobre os ativos e

fluxos de caixa da organização, as quais geralmente podem ser vendidas sem

permissão dos outros indivíduos contratantes. De um modo muito real, há uma teia

de relações complexas (i.e., contratos) entre a ficção legal (a empresa) e os

proprietários do trabalho, os insumos de material e de capital e os consumidores dos

produtos.

Quando a fração do patrimônio líquido do proprietário-gerente cai, seus direitos

fracionados sobre os resultados também caem e isso tenderá a encorajá-lo a se

apropriar de maiores vantagens pessoais sobre os recursos da empresa. Da mesma

forma, isso se torna desejável para os acionistas minoritários (ou aqueles que não

Page 34: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

30

participam da administração) gastarem mais recursos no monitoramento do

comportamento deste indivíduo.

O conflito de agência entre o proprietário-gerente e os acionistas externos reside,

portanto, na tendência do gerente em se apropriar de vantagens advindas dos

recursos da empresa para seu próprio consumo. Mas essa não é, segundo os

autores, a única ou mesmo a fonte mais importante do conflito. Realmente, é

provável que o conflito mais importante surja do fato de que, com as quedas de seus

direitos de propriedade, caia também o incentivo do proprietário-gerente para se

dedicar a atividades criativas, como a busca de oportunidades lucrativas. Ele pode

de fato evitar tais atitudes simplesmente porque isto requer muito trabalho ou esforço

de sua parte na administração ou no aprendizado de novas tecnologias.

Jensen e Meckling (1976) direcionaram seu estudo para o conflito existente entre

gerentes e acionistas, mas a teoria de agência se verifica também nos processos de

fusões e aquisições. No caso das fusões e aquisições conglomeradas, definidas por

Weston e Brigham (2000) como sendo aquelas entre empresas que atuam em

setores totalmente distintos e que ocorreriam por motivos de diversificação (de

atividades e também de risco), o que está em jogo, na verdade, é a redução dos

riscos dos agentes envolvidos, muito mais do que qualquer outra intenção que possa

ser declarada. Naturalmente, isto pode ser contrário aos interesses, por exemplo, de

acionistas minoritários da empresa adquirente, os quais poderiam eles mesmos

diversificarem seus investimentos com a aquisição de títulos representativos do

capital de diferentes empresas no mercado.

2.3.1 Custos de falência

Em se tratando de estrutura de capital, não se pode avançar sobre o tema sem levar

em consideração a questão da dedutibilidade dos juros pagos sobre capitais de

terceiros (despesas financeiras) da base de cálculo do imposto de renda das

empresas. Existindo tal possibilidade, o custo efetivo de capital de terceiros para a

empresa passa a ser a taxa nominal contratada com os agentes financiadores multi-

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

31

plicada por (1-t), em que "t" é igual à alíquota do imposto de renda à qual a empresa

está sujeita. Quando a empresa deduz da sua base de cálculo do imposto de renda

(LAIR) o custo de capital de terceiros, ela está, na verdade, transferindo um custo

dos acionistas para o governo, conforme destacaram Simerly e Li (2000) em seu

trabalho.

Dessa forma, quanto maior a participação de capital de terceiros na estrutura de

capital da firma e quanto mais caro for este capital, mais vantajosa seria a situação

para os acionistas dessa firma, uma vez que estariam transferindo custos maiores

para o governo, em benefício próprio. Nessa direção, surge, então, o contraponto de

Myers (1984), que pergunta por que as empresas não se "afundam" em dívidas.

Uma resposta possível a essa colocação de Myers (1984) está no chamado "risco

de falência", que surge a partir de uma elevação substancial do risco financeiro da

empresa em função do seu endividamento crescente, o que levaria financiadores a

negar novos empréstimos ou a cobrar mais caro por eles, elevando

substantivamente as suas taxas de juros em função do aumento do risco destes

créditos.

As teorias de balanceamento demonstram que o "risco de falência" está diretamente

relacionado com o nível de endividamento da empresa, o qual, dentro de

determinada faixa, reduz o custo de capital, na medida em que os custos financeiros

do endividamento são transferidos para o governo. Assim é que as empresas devem

buscar um ponto de equilíbrio em relação à sua estrutura de capital para garantir sua

sustentabilidade no longo prazo, conseguindo obter financiamentos a um custo tal

que seja coberto pela rentabilidade dos ativos financiados.

Vários trabalhos empíricos foram desenvolvidos nesta linha: Marsh (1981), Bradley,

Jarrel e Kim (1984), Long e Malitz (1985) e Titman e Wessels (1988) que relataram

evidências que sustentam as premissas da teoria de trocas entre benefícios fiscais e

os chamados custos de falência. Em particular, Bradley, Jarrel e Kim (1984)

concluíram existir uma elevação de custos na empresa em função do endividamento,

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

32

tais como: os custos da própria dívida, os custos de administração/governança, que

tendem a subir, proporcionalmente ao endividamento da empresa, os custos de

falência, que estão associados ao risco e aos custos de agência.

Um dos fatores apontados como sendo causa de processos de aquisições e fusões

é a redução do risco de falência, uma vez que empresas mais arriscadas podem

diluir os seus riscos adquirindo ou sendo adquiridas por empresas com baixo grau

de risco financeiro, fazendo com que o risco de insolvência da empresa combinada

seja menor do que o risco de insolvência das empresas, quando consideradas em

separado. O declínio do risco de insolvência implica a redução do risco dos

financiadores, o que vai acarretar, por conseqüência, a diminuição do custo de

capital da empresa combinada, gerando uma vantagem no processo. A esse

propósito citamos novamente Weston e Brigham (2000), os quais observam que este

motivo, muitas vezes alegado/declarado ou observado nos processos de fusão e

aquisição, não pode ser considerado como justificativa para tal, já que esta

diversificação de risco pode ser feita apenas pela via financeira por meio da compra

pura e simples de ações de outras companhias.

2.4 Posições sob a Pecking Order Theory

O trabalho de Donaldson (1961) foi um dos primeiros a merecer destaque nesta

linha de pesquisa, tendo revelado que as empresas financiam seus projetos tendo

prioridades com relação a fontes de financiamento, as quais revelariam a seguinte

ordem de preferência:

a) as empresas se financiam, em primeiro lugar, através do uso de lucros retidos

(autofinanciamento) e de uma política de dividendos bem ajustada, de forma a

manter na empresa o máximo de recursos possível;

b) na falta de lucros retidos as empresas tendem a pagar dívidas, antes de

recomprar ações;

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

33

c) faltando recursos, elas tendem a buscar financiamentos externos, sendo o

endividamento a primeira fonte a ser utilizada, estando os títulos híbridos (como

dívidas conversíveis, por exemplo) em segundo lugar e, como último recurso, a

emissão de ações.

De acordo com a Pecking Order Theory, o grau de endividamento da firma passa a

ser uma conseqüência e não um objetivo pré-estabelecido de um processo, no qual

as necessidades de financiamento vão sendo supridas por capitais internos

(autofinanciamento) e externos (próprios ou de terceiros). Neste ponto, já se nota

uma vantagem dessa teoria em relação às demais preconizadas até então − a

diferenciação entre capitais próprios internos (lucros retidos) e externos (dinheiro

"novo" no negócio) – porque, em primeiro lugar, isso é um fato da vida, ou seja,

realmente acontece nas empresas e porque, em segundo lugar, os lucros retidos

são, sem dúvida alguma, uma importante fonte de capitalização das empresas e de

sua sustentação no longo prazo.

Uma importante conclusão do trabalho de Donaldson (1961) foi a de que empresas

não apresentam comportamento de financiamento e investimento homogêneo,

observando que empresas de atividades diferentes se comportavam de maneira

mais heterogênea do que aquelas pertencentes a um mesmo setor. Isso pode

explicar-se com relativa facilidade, pelo fato de que é esperado que empresas de um

mesmo setor tenham estruturas operacionais e práticas de mercado semelhantes e

com um risco de negócio semelhante. Dessa forma, o comportamento em relação às

formas e fontes de financiamento deve ser algo comum entre elas, com as empresas

tendendo a ter um "ponto ótimo" de estrutura de capital, o qual seria definido por

suas necessidades de financiamento, considerando-se os riscos e as

características do negócio, e não pelo equilíbrio entre os benefícios e custos de

agência ou pela transferência de custos financeiros para o governo (teoria do

balanceamento).

Um outro fator constatado como motivador a que empresas busquem dívidas como

fontes de recursos era a necessidade de fazerem investimentos de maior vulto, de

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

34

uma só vez, que não podiam ser realizados em etapas e em que a capacidade de

geração interna era insuficiente para cobrir a total necessidade. Os administradores

demonstraram haver, por parte deles, uma rejeição ao endividamento (ainda que o

considerassem de menor custo para a empresa) em função de uma provável

ingerência dos credores que acabassem por revelar incompetências ou má

administração.

HEAU (2001) coloca que a necessidade de elevadas somas de recursos para

investir de uma só vez e uma possível limitação no uso de dívidas podem fazer com

que uma empresa passe a pensar em fusão e/ou aquisição de forma estratégica,

buscando, através desse processo, uma saída para um impasse que, num dado

momento, se apresenta: crescer ou desaparecer. Tendo a expansão como única

alternativa de sobrevivência num mercado cada vez mais competitivo e globalizado,

e ainda pressionada pela escassez de recursos, uma fusão/aquisição ou formação

de aliança estratégica torna-se, além de crucial para o negócio, a única alternativa

para a empresa.

Outro ponto observado foi que o uso de lucros retidos como forma de financiamento

dos investimentos da firma causava aos acionistas a impressão de que os

administradores eram realmente competentes, à medida que qualquer retorno

obtido no projeto acarretaria num aumento do indicador "Lucro por Ação", com o

aspecto positivo adicional de que este retorno não seria dividido com novos

proprietários. Nessa mesma direção, Donaldson (1961) observou ainda que a

aversão à emissão de novas ações por parte dos gerentes estava associada à

queda de preços das ações da companhia, que resultavam em prejuízo para os

acionistas "atuais" em relação aos "novos" acionistas.

Diante dessas constatações, pode-se teorizar que, ao contrário do que apregoa a

teoria de finanças, pela qual os gerentes devem maximizar a riqueza dos acionistas,

as causas para a ocorrência dessa hierarquização das fontes de financiamento

estão ligadas ao comportamento dos administradores na defesa de seus próprios

interesses, concluindo-se pela importância e propriedade dos estudos que envereda-

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

35

ram pela teoria dos custos de agência.

O pressuposto teórico da POT foi muito bem aceito e vários autores desenvolveram

estudos teóricos e empíricos visando ratificar as suas premissas. Por exemplo,

Ross, Westerfield e Jaffe (2002) encontraram evidências de que empresas, dentro

de um mesmo setor, apresentam indicadores de estrutura de capital bem similares

umas com as outras, levando a uma conclusão de que existe um "padrão" que é

característico de cada setor e que, quando esses indicadores são confrontados com

os de firmas de setores diferentes, encontram-se maiores divergências entre eles.

Como exemplo, eles citam dois setores: o bancário e o farmacêutico. No caso

específico do setor bancário, encontra-se uma situação mais agressiva em relação à

alavancagem, enquanto que no setor farmacêutico, os níveis de endividamento das

empresas são mais baixos, o que pode ser explicado por ser este um setor

caracterizado por movimentos constantes de fusões e aquisições, sendo que os

mesmos não têm como objetivo a obtenção de ganhos financeiros, mas sim redução

de gastos com pesquisa e desenvolvimento. Os autores concluem que esse

comportamento demonstra que as empresas não parecem considerar as suas

estruturas de capital como sendo algo irrelevante.

Para Miller e Rock (1985), o mercado interpreta tanto uma emissão de débitos

quanto uma nova emissão de ações como uma incapacidade da empresa de gerar

recursos internamente, provocando queda no valor das ações desta empresa

proporcional ao tamanho da emissão, o que foi comprovado através dos resultados

de pesquisa de Bertucci e Garcia (2002), os quais confirmaram haver uma relação

negativa entre tamanho da emissão e variação de preços, indicando que quanto

menor a nova emissão, menor era a queda observada nos preços.

Como observado em diversos estudos, teóricos e empíricos, o tamanho da firma e o

seu controle são fatores que podem determinar a sua estrutura de capital. Assim

sendo, torna-se importante verificar alguns trabalhos nessa linha de pesquisa, que

buscam associação entre estrutura de capital e controle corporativo.

Page 40: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

36

2.5 Questões relacionadas ao controle

Uma firma que necessite de recursos para financiar seus investimentos pode optar

por obtê-los via emissão de novas ações ou contraindo dívidas. Na primeira

alternativa, os acionistas "antigos" estariam dividindo o controle com novos

acionistas, ainda que em proporções menores. Optando por financiamentos

bancários, os acionistas preservariam o controle mas, por outro lado, aumentariam o

risco de insolvência da empresa, o que levaria, em última análise, à transferência do

controle para os credores.

Jensen e Meckling (1976) têm seu trabalho reconhecido como sendo um dos

pioneiros nessa linha de pesquisa, sendo que eles identificaram dois tipos de conflito

em relação ao controle da firma:

a) conflitos entre acionistas e gerentes;

b) conflitos entre acionistas e credores.

Harris e Raviv (1991) fazem um resumo desse trabalho, o qual apresentamos a

seguir:

1) Os conflitos entre acionistas e gerentes surgem porque gerentes não conseguem

capturar 100% dos resultados gerados por suas atividades, mas são responsáveis

pelo "custo" inteiro destas atividades. Por exemplo, gerentes podem envidar

menos esforços e transferir recursos da firma para seu próprio benefício pessoal,

usufruindo "mordomias" como jatos corporativos, escritórios super-dimensionados

e imponentes, criando "áreas de influência, controle e poder". Esses conflitos são

caracterizados como custos de agência, já mencionados neste trabalho.

2) Os conflitos entre acionistas e credores surgem porque os contratos de dívida dão

aos primeiros um incentivo para investir em alguns projetos de viabilidade

duvidosa, uma vez que parte de um eventual insucesso dos projetos pode ser

transferida para os financiadores. Por outro lado, o contrato de dívida coloca que,

Page 41: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

37

se os retornos do investimento forem altos, bem acima do valor de face da dívida,

os acionistas capturam a maior parte do lucro. Como resultado, acionistas podem

se sentir estimulados a investir em projetos mais arriscados, já que eles capturam

mais lucros quando o projeto é bem sucedido e dividem os prejuízos quando o

projeto fracassa. Por sua vez, os financiadores acabam por receber menos pelo

empréstimo do que calcularam que iriam receber. Se eles não conseguem

antecipar com maior precisão os resultados do projeto, tendem a aumentar o

custo desse financiamento como forma de garantir uma maior participação em

seus resultados. Paradoxalmente, no entanto, se assim procedem, acabam por

encarecer o custo do capital aplicado, aumentando o risco de fracasso do

investimento.

Weston e Brigham (2000) abordam essa questão do controle afirmando que a

estrutura de capital das empresas é uma moeda de dupla face. De um lado, estão

todas as questões de âmbito interno, que sofrem as influências dos gerentes,

administradores e outros elementos da empresa. Do outro lado, há que se

considerar ainda a análise de quem está financiando os projetos da empresa. É

sabido que empresas mais alavancadas tendem a ser monitoradas com maior

atenção pelos financiadores e, num determinado limite de endividamento, podem ser

"forçadas" a se financiar com recursos próprios por limitações impostas pelos

credores ou a "abrir mão" do controle, ainda que parcialmente.

Jensen e Ruback (1983) definem "Controle Corporativo" como sendo o caminho que

determina o gerenciamento dos recursos corporativos utilizados para contratar,

demitir e ajustar compensações da alta gerência e, no particular deste trabalho,

estudam a questão do controle corporativo em relação aos processos de

aquisições/fusões. Uma observação interessante é que, em sua grande maioria,

fusões são negociadas diretamente com os gerentes da empresa-alvo para serem

aprovadas posteriormente pelo quadro de diretores da mesma, antes de serem

submetidas à apreciação, votação e aprovação dos acionistas. Já as ofertas de

compra da empresa adquirente são geralmente feitas diretamente aos acionistas da

empresa-alvo, que decidem, de maneira individual, quais as melhores propostas pa-

Page 42: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

38

ra venda.

Quando empresas investidoras/adquirentes conseguem comprar a firma-alvo,

procuram reter em seus quadros apenas aqueles diretores de nível mais alto da

última, delegando o gerenciamento dos recursos corporativos para os gerentes

internos, ficando a alta gerência da firma adquirente com o direito de administrar os

recursos da firma-alvo. Contestações surgem quando um grupo, geralmente liderado

por um gerente ou um grande acionista com direito a voto da empresa alvo, tenta

ganhar assento no quadro de diretores da empresa adquirente.

As evidências encontradas nesse estudo de Jensen e Ruback (1983) mostram que

os ganhos provenientes de um processo de aquisição e/ou fusão não se originam

da força da criação de produtos ou de mercado. Eles são, aparentemente, oriundos

do aumento da eficiência ou sinergia que estão relacionadas ao controle, mas as

evidências não foram suficientemente claras para identificar as fontes exatas.

Fusões e aquisições se resumem, na verdade, numa opção estratégica que a

empresa faz num determinado momento de sua existência, entre duas maneiras de

crescer ou mesmo de sobreviver. A primeira seria através do que se denomina de

via interna, ou seja, a própria empresa, tendo capacidade de geração de caixa ou de

contrair dívidas, desenvolve suas competências e tecnologias a partir desses

recursos. A segunda maneira se daria pelo que é chamado de via externa, qual seja,

associar-se de alguma forma a outras empresas que já possuem algumas ou todas

as expertises das quais ela necessita. Nesse sentido a empresa busca efeitos

sinérgicos que possam advir de economias de custos ou de gerenciamento ou da

expansão de mercado ou de canais de distribuição, o que levaria a um aumento de

sua rentabilidade. No campo financeiro, os ganhos sinérgicos surgiriam apenas em

função dos ganhos de natureza econômica, conforme coloca Bertucci (1993, p. 35):

"A existência de sinergias de ordem industrial e comercial é condição sine qua non

para que, por exemplo, uma ação de fusão ou aquisição vá ao encontro de elevar a

riqueza do acionista."

Page 43: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

39

Segundo ele, os ganhos sinérgicos financeiros, nesses processos, poderiam ser

verificados a partir de mudanças na política financeira da empresa compradora em

relação à sua situação antes do processo de fusão ou aquisição. A estrutura de

capital resultante do processo poderia trazer benefícios como a redução do risco de

falência (com conseqüente diminuição do custo de capital, já que o alto risco é um

fator de acréscimo nas taxas de juros) e o aumento da capacidade de endividamento

da nova empresa.

As evidências encontradas por Jensen e Ruback (1983) indicam que retornos

negativos estão associados a atitudes gerenciais relacionadas às fusões e

aquisições quando:

1) a oferta é retirada ou a reação dos agentes adquirentes causa o fracasso da

aquisição;

2) não requer aprovação formal dos acionistas com direito a voto, ainda que opinem

ou ofereçam sugestões.

Conflitos de interesse entre proprietários e gerentes nessas situações podem ser

reduzidos, já que os acionistas elegem o quadro de diretores e estes monitoram

diretamente os gerentes. Nesses casos, proprietários podem trocar gerentes,

elegendo um quadro de diretores diferente e definindo um novo processo de

controle.

O estudo de Dodd e Warner (1983) indica que há uma correlação positiva entre

aquisição bem sucedida e retornos normais positivos, ainda que se tenha uma

representação parcial de diretores insatisfeitos com o processo no quadro de

diretores da nova empresa. Por outro lado, tentativas fracassadas de dissidentes

em obter representação no quadro de diretores resultam em retornos anormais

negativos. Em 56 casos de sucesso na disputa, ou seja, dissidentes ganhando

assento no novo quadro de diretores, houve retorno anormal positivo entre o dia

anterior e a data efetiva do anúncio, de 1,1%.

Page 44: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

40

Em 40 casos em que houve fracasso na disputa, isto é, os dissidentes não obtiveram

êxito e ficaram fora do quadro de diretores, houve queda nos preços das ações da

empresa de 1,4%, considerando-se o mesmo período comparativo. Dodd e Warner

(1983) concluem que a contestação de controle aumenta o valor do patrimônio e

este aumento é maior quando os dissidentes ganham assento no quadro de

diretores.

Todas essas teorias a respeito de estrutura de capital, apesar de sua importância,

receberam várias críticas, segundo os autores, por não levarem em consideração o

dinamismo das organizações e os efeitos do meio ambiente. Os principais trabalhos

que correlacionam estrutura de capital com as estratégias da empresa e o ambiente

no qual ela está inserida, são apresentados a seguir.

2.6 Estrutura de capital e estratégia

Barton e Gordon (1988) realizaram uma investigação exploratória sob a premissa de

que estratégia corporativa pode complementar o paradigma financeiro tradicional,

explicando a estrutura de capital em grandes corporações americanas. Em outros

termos, a abordagem da estratégia corporativa, com ênfase na escolha gerencial,

pode sustentar uma base de entendimento da estrutura de capital em grandes firmas

americanas, que é complementar ao paradigma tradicional de finanças ao nível da

economia. O desenvolvimento conceitual foi baseado na perspectiva de uma

estratégia, na qual as decisões funcionais e financeiras da empresa são tomadas

por gerentes operando num meio ambiente dinâmico e complexo. Dessa forma,

refuta-se a premissa de que estes agiriam como se a cada decisão fosse necessário

apenas focar um determinado produto ou as forças externas do mercado, como

preconizam os paradigmas financeiros.

Utilizando a perspectiva estratégica e a pesquisa financeira no tema estrutura de

capital, os autores entendem que o bom gerenciamento da empresa nesse aspecto

deve consistir na formulação da estrutura de capital apropriada, que considere os ris-

Page 45: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

41

cos financeiros (que por sua vez estão associados com a manutenção do controle) e

a flexibilidade nas tomadas de decisões gerenciais. Utilizando os conceitos de

estratégia corporativa de Andrews (1971), eles propuseram que decisões de

estrutura de capital são baseadas nos valores e metas do gerenciamento,

combinando com fatores contextuais internos e externos, os quais impactam a base

concernente ao risco e controle.

Andrews (1971) aponta que as decisões estratégicas da firma deveriam servir de

suporte para as suas metas de gerenciamento e classifica estrutura de capital como

uma dessas estratégias, propondo que ela deveria facilitar a consecução das metas

de gerenciamento. Dessa forma, gerentes teriam uma preferência por financiar as

necessidades da firma com fundos internos (lucros retidos) em vez de dívidas ou

emissão de ações, o que evita a sujeição a interferências externas no seu

gerenciamento, pois desejam obter o maior controle e flexibilidade possíveis nas

tomadas de decisão. Ainda mais, o grau de risco a que a empresa está submetida e

o contexto financeiro no qual está inserida determinam a quantidade de

financiadores que estarão dispostos a emprestar, bem como os prazos que esses se

dispõem a conceder. Tudo isso se reflete na reação dos investidores externos, tanto

em relação ao risco da empresa quanto ao enfoque gerencial que é dado para a

administração do risco.

Os resultados obtidos sugerem que a perspectiva de escolha gerencial pode ajudar

a explicar a escolha da estrutura de capital na análise da firma, mas a evidência

mais significativa da pesquisa, no entanto, vem da relação entre rentabilidade e

financiamento. Em todas as categorias de empresas pesquisadas, ficou evidenciado

que o lucro tem relação significativamente negativa em face de níveis de

endividamento. Isso foi colocado como a mais notória evidência de que a escolha

gerencial está operando em decisões de estrutura de capital, pois as teorias

financeiras sugerem que deveria ocorrer um resultado oposto, ou seja, maior

alavancagem deveria estar relacionada a maior lucro. O fato de que o lucro é

significativamente relacionado com o nível de endividamento, sugere que fatores

puramente econômicos não são o único mecanismo para se estabelecer a estrutura

Page 46: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

42

de capital da firma. Certamente, esse resultado é consistente com a proposição

comportamental, pela qual os gerentes desejam flexibilidade e liberdade, o que é

propiciado pela rentabilidade. Constata-se, dessa forma, a preferência por evitar

débitos, utilizando fundos gerados pela própria firma para financiar o negócio,

fugindo das restrições de financiamentos excessivos sempre que possível. Esses

resultados sugerem que uma possível razão para instabilidade de descobertas

anteriores em termos de pesquisa financeira empírica com respeito à estrutura de

capital é a omissão da estratégia da firma nesses testes.

Balakrishnan e Fox (1993) realizaram uma investigação empírica sobre a

importância de bens especializados e outras características únicas que explicam a

variação da estrutura de capital das firmas, indicando que firmas de produtos únicos

efetivamente contribuem mais para a variação da alavancagem, o que sugere forte

ligação entre estratégia e estrutura de capital. A firma investe em bens específicos

para ressaltar as vantagens de ser única e competitiva, mas tais bens afetam

adversamente a habilidade da firma de tomar empréstimos. Muitas firmas cujos bens

específicos são intangíveis, como aquelas que dependem muito de pesquisa e

desenvolvimento (a indústria farmacêutica, empresas de publicidade e propaganda

(criação) e outras do gênero) encontram dificuldades para mensurar a sua

valorização. Para firmas de bens especializados, criam-se um problema e uma

oportunidade: o problema é que a habilidade em financiar esses bens com débitos

pode ser limitada por eles mesmos, por sua própria natureza, mas, por outro lado, a

firma de bens especializados ganha também uma oportunidade, que é a de

desenhar uma estrutura de governança de tal modo que tais relacionamentos podem

atenuar esse problema.

A habilidade da firma em gerenciar o relacionamento com credores pode se tornar a

chave de uma fonte de vantagem competitiva. Nesse sentido, Balakrishnan e Fox

(1993) estudaram simultaneamente as características de firmas de bens únicos e

específicos e as características de indústrias diversificadas, determinando a

estrutura de capital das mesmas. Os resultados indicaram que a habilidade da

firma em contrair empréstimos está ligada à estratégia de seus negócios e à nature-

Page 47: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

43

za dos bens e técnicas que são requeridas para a sua implementação, influenciando

sua estrutura de capital. Quando há queda na demanda, emprestadores podem

acreditar que essa situação vai ser percebida de maneira similar entre indústrias

menores que não possuem capacidade de diferenciação competitiva e que, por esse

motivo, vão se ver mais pressionadas e terão aumentado consideravelmente seus

custos de falência. Aliás, pontuam os autores, esse problema se mantém ainda que

as firmas produzam produtos similares utilizando tecnologias semelhantes.

Os autores pesquisaram 295 empresas de negócios únicos, no período de 1978 a

1987, concluindo que firmas de produtos únicos que utilizam técnicas específicas de

produção tendem a ser mais conservadoras em relação ao uso de dívidas, ou seja,

suas características de produção atuam como fatores determinantes da sua

estrutura de capital. Tal fato pode ser explicado pelo risco concentrado do negócio,

no qual a empresa se expõe aos riscos naturais do mercado de forma mais intensa

do que as empresas que possuem negócios/produtos diversificados.

Williamson (1985) argumenta que débitos e capital próprio têm que ser vistos como

formas diferentes de estrutura de governança, sendo, portanto, uma questão

estratégica da empresa. Segundo ele, financiamentos através de débitos são menos

intervencionistas e os credores só vão obter o controle sobre os bens da firma se a

mesma quebrar/violar as regras do contrato de empréstimo. Já o capital próprio está

relacionado ao controle hierárquico, pois os direitos dos detentores desse capital são

muito mais amplos do que os dos credores/financiadores. Ainda mais, esses direitos

podem ser exercidos na mesa de diretores, monitorando a conduta de gerentes e

intervindo nas decisões estratégicas quando julgarem necessário. O autor

argumenta que o tipo de governança escolhido vai depender das características dos

bens empregados no empreendimento e que o relacionamento entre a natureza dos

bens e seu controle deriva do tipo de financiamento, provendo ligação com a

estratégia de negócios da firma.

Taylor e Lowe (1995) realizaram um estudo comparativo sobre dados de empresas

dos Estados Unidos e da Austrália, partindo do pressuposto em que a definição da

Page 48: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

44

estrutura de capital das empresas considera as diferentes relações funcionais

observadas nas mesmas. Eles observaram que a relação entre estratégia e estrutura

de capital demonstrou ser menos intensa do que eles inicialmente imaginavam,

concluindo que o valor da firma não depende essencialmente da sua estrutura de

capital, nem tampouco de dados observados no passado, mas sim de suas

perspectivas futuras. De acordo com os autores, muitas vezes essas perspectivas

futuras não são assim tão claras para a empresa, mas são captadas e valorizadas

pelo mercado.

No que diz respeito a aquisições e fusões, Kochhart e Hitt (1998) desenvolveram um

estudo na mesma linha de pesquisa, ou seja, examinaram a relação existente entre

estratégia corporativa e estrutura de capital, apontando que diversificações

relacionadas (que eles definiram como sendo aquelas em que há uma similaridade

de negócios, produtos ou mercados com o objetivo da empresa) estão associadas a

financiamentos com capital próprio, enquanto que as diversificações não

relacionadas (aquelas em que há uma entrada em novos negócios, novos mercados,

novos produtos, ou seja, negócios diferentes daqueles originalmente operados pela

firma) estão associadas a financiamentos com débitos. Enfim, ficou evidenciado

ainda existir uma relação recíproca entre estratégias de diversificação e estratégias

de financiamento das empresas, sendo necessário considerar nesta relação a

natureza da diversificação, pois eles estão também reciprocamente inter-

relacionados. Esses resultados sustentam as teorias a respeito dos custos de

transação e estrutura de capital, de acordo com os trabalhos de Kochhar

(1996/1997) e Williamson (1985), como também vão ao encontro ao estudo de

Balakrishman e Fox (1993), a respeito de firmas de uma só atividade, ou não

diversificadas.

Os resultados indicam também que a natureza da diversificação afeta a estrutura de

capital, na medida em que altera o perfil dos recursos naturais originais da firma e

que, da mesma forma, a estrutura de capital afeta a natureza da diversificação

perseguida ou desejada, do que se pode concluir que existe uma relação direta e

recíproca entre a estratégia de financiamento da firma e sua estratégia corporativa

Page 49: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

45

de diversificação. A fonte de financiamento da firma é também uma decisão

importante a ser tomada pelos gerentes quando da necessidade de obtenção de

fundos, já que ela pode entrar em novos negócios através de

aquisições/fusões/alianças estratégicas com firmas já existentes ou através de

entradas "diretas", via desenvolvimento interno. Os resultados dessa pesquisa

indicam haver uma relação significativa entre o modo de diversificação (entrada

direta versus aquisição/fusão) e a sua fonte de financiamento, mostrando que firmas

que utilizam a via da "entrada direta" para diversificar preferem utilizar capital próprio

como fonte de financiamento, enquanto que firmas que escolhem a via de fusões e

aquisições priorizam os débitos para o seu financiamento.

Nesta linha de estudos, em que se procura correlacionar estrutura de capital com

estratégia, Simerly e Li (2000), buscaram evidências de relacionamento entre

estrutura de capital e ambiente das empresas. Para tanto, os autores direcionaram

seu trabalho para a conexão existente entre dinamismo do ambiente e estrutura de

capital, associando-os com a performance econômica das empresas. Do ponto de

vista teórico, estas descobertas dão suporte a uma outra conexão: estrutura de

capital e estratégia corporativa.

Os autores discutem as limitações trazidas pelas teorias que abordam os riscos de

financiamento e a incorporação dos conceitos de estratégia de decisão, o que gera

incertezas na aplicação prática dessas descobertas. Para eles, o gerenciamento

estratégico deveria ser capaz de prover uma perspectiva teórica a respeito de

implicações estratégicas e de escolha entre fontes de financiamentos. Parte do custo

de capital financiado é transferido dos proprietários para o governo, por meio do

benefício fiscal da dívida mas, por outro lado, aumento de dívida eleva o risco e

reduz a disposição das empresas em investir em pesquisa e desenvolvimento, o que

se torna um fator crítico para a manutenção da competitividade.

Quando se leva em consideração o benefício fiscal do endividamento, a tendência

dos acionistas é incrementar o débito, já que eles podem "manipular" as escolhas

dos gerentes. Entretanto, esse comportamento se confronta com a ameaça de com-

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

46

petitividade e oportunidade, especialmente quando as empresas dependem de

estratégias criativas e inovadoras para serem bem sucedidas. O grupo dos

"emprestadores" tem a capacidade de limitar a liberdade de escolha dos gerentes na

seleção de estratégias para crescer, especialmente quando a firma necessita e se

torna dependente de escolhas criativas e novas estratégias para prosperar e ser

bem sucedida.

Diante de todas essas considerações, o estudo de Simerly e Li (2000) oferece uma

avaliação empírica para o argumento de que as decisões em torno da escolha da

estrutura de capital necessitam ser ligadas ao ambiente competitivo da firma, mais

especificamente com o dinamismo do ambiente e o grau de instabilidade das

mudanças. A idéia é que uma estrutura de capital adequada seria uma decisão

crítica para qualquer negócio e que essa decisão é importante não somente pela

necessidade de maximizar retornos para os acionistas, mas também em função do

impacto que ela tem na habilidade da organização em lidar com um ambiente

competitivo.

A Teoria do Balanceamento preconiza que a firma pode atingir a sua "estrutura

ótima" de capital quando consegue atingir o ponto em que ela contrabalança o risco

de falência com o benefício fiscal do endividamento. Uma vez estabelecida, a

estrutura de capital deveria gerar retornos para os acionistas numa proporção maior

do que se tivessem financiando os negócios apenas com capital próprio. Entretanto,

apesar dos aparentes benefícios da alavancagem, há muitas firmas que evitam

níveis significativos de débitos e a explicação para isso tem provado ser um grande

desafio, com vários estudos sobre gerenciamento financeiro e estratégia

investigando as causas e sugerindo a importância dos fatores do ambiente como

sendo capazes de afetar a decisão de estrutura de capital.

Os autores se voltam, então, para o gerenciamento estratégico, visando desenvolver

uma ligação teórica entre esses elementos de economia organizacional e a

habilidade das firmas em competir, onde a teoria indica que o grau de dinamismo

do ambiente deverá ser um determinante significativo na escolha da estrutura de ca-

Page 51: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

47

pital da firma. Consoante com o trabalho teórico pioneiro nessa área, os autores

constataram que o dinamismo do ambiente existe em uma extensão contínua, de

estável para dinâmica. Equivale dizer que firmas operando num ambiente cujo

dinamismo possa ser classificado como relativamente baixo, deverão considerar o

uso de financiamentos em detrimento ao uso de capital próprio. A consideração

primordial é a de baixo custo de débitos e a habilidade de emprestadores em

apreciar a mudança da competitividade iniciada pelos gerentes de topo da

organização, bem como para controle de problemas de agência.

A situação é outra quando o dinamismo do ambiente aumenta, pois capital próprio

deve ser usado para reduzir os custos de transação, surgidos de riscos que vão

sendo aumentados. O uso de capital próprio também pode ter a vantagem de retirar

a pressão do mercado de capitais, associada com a inabilidade dos gerentes em

transportar informações completas, considerando a mudança de competitividade.

Isso vai permitir aos gerentes exercer uma variedade de estratégias que são vistas

como necessárias para a sobrevivência e o sucesso em ambientes de mais alto

dinamismo. A habilidade das firmas em se adaptar às mudanças do ambiente e aos

sinais do mercado, produz eficiências organizacionais que acrescentam performance

econômica à firma. Se a teoria estiver correta, deveria ser possível demonstrar que,

num determinado ambiente, vão existir diferenças nas estruturas de capital da firma

e essas diferenças vão ter implicações na sua performance.

Para comprovar essa teoria, Simerly e Li (2000) formularam as seguintes hipóteses:

1) Para firmas que atuam num ambiente estável, boa performance econômica vai

estar associada a maior alavancagem.

2) Para firmas que operam num ambiente mais dinâmico, alavancagem mais baixa

vai estar relacionada com a firma que tiver melhor performance econômica.

Os autores pesquisaram 700 empresas, selecionadas pela empresa de consultoria

americana Stern Stewart, e os resultados indicaram que, em ambientes mais com-

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

48

petitivos e dinâmicos, empresas com BAIXA alavancagem apresentam ALTA

performance e, ao contrário, empresas com ALTA alavancagem apresentam BAIXA

performance. Já em ambientes que eles classificaram como sendo MÉDIOS, as

empresas atuam com média alavancagem e obtêm média performance, enquanto,

em ambientes menos competitivos ou mais estáveis, empresas com ALTA

alavancagem apresentam ALTA performance, enquanto aquelas com BAIXA

alavancagem apresentam BAIXA performance. Os resultados obtidos comprovam,

então, que ambientes modelam a relação entre estrutura de capital e performance

econômica das empresas e que há impactos do dinamismo do ambiente e da

alavancagem na performance da firma. Concluem os autores que:

a) quando aumenta o nível de endividamento da empresa, a governança pode

mudar de controle, de interno para externo, por meio de ingerências dos credores;

b) existe uma relação positiva entre alavancagem e performance econômica apenas

em ambientes de relativa estabilidade.

A relação entre estrutura de capital e a capacidade de competição da empresa

consiste em que o uso de débitos introduz na organização um elemento externo que

tem uma orientação de curto prazo e essa orientação pode impor compromissos que

venham limitar a estratégia de escolha dos gerentes, afetando, dessa maneira, a

capacidade de cumprir as decisões estratégicas mais críticas. Simerly e Li (2000)

colocam que o estudo de estratégia é importante na medida em que se integra com

elementos das teorias de agência e de custos de transação, mensurando impactos

da alavancagem na performance em relação aos vários graus de dinamismo do

ambiente em que a firma opera. Eles acreditam que haverá cada vez mais

integração entre as teorias econômicas e as de gerenciamento estratégico, para

sondar melhor como as fontes de financiamento e investimentos podem influenciar a

performance da firma, à luz das teorias de agência e de custo de transação.

Nos processos de fusões e aquisições, a correlação existente entre estratégia e

estrutura de capital pode ser verificada a todo o momento. Ross, Westerfield e Jaffe

Page 53: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

49

(2002) assim como Weston e Brigham (2000) observaram que as empresas utilizam

sua estrutura de capital de forma estratégica para se proteger de eventuais

"ataques" de firmas potencialmente adquirentes. Isso pode ser feito por meio do que

se chama de "fusões defensivas", quando empresas de menor porte se juntam com

o objetivo de se protegerem de um "ataque hostil" de uma empresa de maior porte.

Outra forma de defesa utilizada é o endividamento intensivo da empresa, o que pode

torná-la menos atraente para eventuais compradoras. As empresas utilizam ainda

outra estratégia para se tornarem menos atraentes, a qual que é conhecida como

"estratégia da terra arrasada" e que consiste na venda de ativos que seriam o alvo

principal de seus potenciais compradores.

Weston e Brigham (2000) observaram que empresas voltadas para pesquisa e

desenvolvimento (como, por exemplo, indústrias farmacêuticas e empresas de

informática) tendem a trabalhar com maior participação de capital próprio em sua

estrutura de capital, fato este decorrente da incerteza acerca do sucesso de seus

novos produtos/pesquisas, o que causa desconforto em assumir dívidas de maneira

mais intensiva.

Kloeckner (1994) observa que um dos motivos para fusões e aquisições está na

economia de escala e de escopo e que essas economias tendem a surgir com maior

intensidade nos processos que envolvam empresas cujo custo de pesquisa e

desenvolvimento e atualização tecnológica é elevado. Nesses casos, a troca ou

incorporação de conhecimentos e tecnologias pode gerar ganhos sinérgicos em alta

escala.

Já as empresas comerciais varejistas ou aquelas que trabalham com produtos com

características de "commodities", utilizam maior volume de capitais de terceiros,

principalmente de curto prazo, para financiar clientes e estoques. Empresas

concessionárias de serviços públicos (água, energia elétrica, telefone, gás) trabalham

com maior volume de capital de terceiros e este endividamento se concentra no longo

prazo, pois a situação de patrimônio (ativos) dessas empresas e as vendas

praticamente estáveis diminuem sensivelmente os riscos de endividamento.

Page 54: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

50

De acordo com Ross, Westerfield e Jaffe (2002) o aumento de receitas é uma das

principais fontes de sinergia observadas nos processos de fusões e aquisições.

Empresas concorrentes que se fundem, garantem uma maior estabilidade nas

vendas e essa estabilidade possibilita uma atuação mais agressiva em relação à

alavancagem da empresa. No Brasil temos o caso ainda recente das duas maiores

companhias de cerveja do País que se fundiram, ficando a nova empresa detentora

da maioria absoluta do mercado, garantindo-lhe, assim, menores oscilações na

receita.

Existem ainda grandes variações na estrutura de capital de empresas que

pertencem a um mesmo setor de atividades, o que pode ser explicado pela Teoria

do Balanceamento, já revisada neste trabalho. Ainda de acordo com os autores,

outros fatores relacionados ao ambiente em que a empresa opera ou ainda à sua

própria estrutura influenciam o dimensionamento de sua estrutura de capital. Eles

citam como exemplo empresas que possuem vendas mais estáveis, como as

concessionárias de serviço público (energia, água, gás), que possuem capacidade

de assumir custos fixos mais altos e endividamento maior com maior grau de

segurança. Têm-se ainda empresas cujos ativos são elevados como as empresas

imobiliárias, por exemplo, que podem operar com maior nível de endividamento uma

vez que os ativos podem se constituir em garantia para os emprestadores. Por outro

lado, empresas de tecnologia, cujos ativos são mais voláteis, tendem a trabalhar

com maior parcela de capital próprio.

Empresas de crescimento rápido tendem a utilizar mais endividamento do que

empresas de crescimento mais lento e empresas com altas taxas de retorno tendem

a trabalhar com níveis menores de endividamento, uma vez que, obtendo altas

margens de lucro, elas não necessitam contrair dívidas, pois o próprio retorno

gerado financia suas necessidades de investimentos, de acordo com o que

preconiza a teoria da POT. Os autores observam, ainda, que condições temporárias

de mercado podem levar empresas a se afastarem de sua estrutura-alvo, na medida

em que essas condições façam com que as projeções consideradas como ideais

pela empresa sejam efetivamente inviáveis naquele momento. Além disso, há que se

Page 55: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

51

considerar ainda as estratégias corporativas da empresa, que influenciarão também

sua estrutura de capital. Seguindo nessa linha de pesquisa, Titman e Wessels

(1988) concluíram que firmas de "produtos únicos" também se relacionavam

negativamente com alavancagem, ou seja, seriam mais propensas a financiar suas

atividades com maiores parcelas de capital próprio.

Chung (1993) relata que a volatilidade da demanda se relaciona de forma negativa

com alavancagem, concluindo que fatores de ambiente podem realmente causar

impactos na decisão de estrutura de capital das firmas.

Tais considerações, que relacionam ambiente com estrutura de capital, vão ao

encontro dos fatores observados no Brasil, na década de 90, que fundamentam o

"boom" de fusões e aquisições que aconteceu no País. De acordo com pesquisas da

KPMG (2001) a "onda" de fusões e aquisições está diretamente relacionada com as

mudanças ocorridas não só no cenário nacional como também no mercado mundial.

O estudo identifica três momentos marcantes de mudanças dentro da década de 90,

os quais impulsionaram os negócios de fusões e aquisições, sendo que o primeiro

seria o da abertura da economia brasileira e, em paralelo, o movimento de

privatização, quando se registraram grandes processos de fusões e aquisições em

setores considerados até então como essenciais pelo governo: siderurgia,

metalurgia, química e petroquímica. O segundo momento é representado pela

ênfase na estabilização da economia, que veio acompanhada por um número

expressivo de fusões e aquisições no setor financeiro. O terceiro e último momento

teria sido desencadeado pelos dois primeiros e os processos de fusões e aquisições

chegam aos setores de telecomunicações (como desdobramento do processo de

privatizações), tecnologia e eletroeletrônicos.

De acordo com Simerly e Li (2000), vários autores relacionaram estratégia e

estrutura de capital, mas não focalizaram a questão dos fatores externos do

ambiente, ponto central de seu trabalho. Segundo eles, os gerentes têm que

conciliar os interesses dos acionistas, dos emprestadores e deles próprios, além de

manter as habilidades competitivas da firma com um certo grau de controle, bem

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

52

como a capacidade da firma de responder às demandas do ambiente. Eles relatam

estar afinados com as afirmativas de Kochhar (1996) e de Rumelt, Schendel e Teece

(1994), que colocam a teoria de agência (Fama e Jensen, 1983) e de custos de

transação (Williamson, 1985) como dois argumentos teóricos distintos e que as

decisões em torno da escolha da estrutura de capital precisam ser apropriadas para

o ambiente competitivo da firma.

Harris e Raviv (1991) observam que os modelos de estrutura de capital que utilizam

características da teoria de organização industrial, começaram a surgir na literatura e

passam a investigar a relação existente entre estrutura de capital de uma firma e as

características de seu produto. Segundo os autores, até a data em que elaboraram

seu trabalho, a literatura de organização industrial assumiu que, ao escolher sua

estratégia competitiva, a firma tinha como objetivo principal a maximização de lucros.

A literatura de finanças, por outro lado, focou a maximização do patrimônio líquido,

ignorando, de modo geral, as questões de produtos e de estratégia da organização.

A nova literatura estabelece um elo de ligação entre estrutura de capital e estratégia

(incluindo-se aí os tipos de produtos da firma), com a área de finanças passando a

observar que gerentes geralmente têm incentivos para maximizar lucros em vez de

patrimônio líquido. Nesses estudos, a alavancagem das empresas vai depender dos

produtos que ela comercializa e de suas estratégias, com preocupação mais

acentuada para o longo prazo (aumento gradativo do patrimônio líquido) do que para

o curto prazo (geração de lucros anuais). As pesquisas e os estudos que são

desenvolvidos sob esta perspectiva buscam identificar produtos e suas

características que interagem de maneira significativa com o nível de dívida.

Titman (1984) observa que a liquidação de uma firma pode impor custos a seus

clientes (ou provedores), como incapacidade para obter o produto, peças e/ou os

serviços prestados, indicando que a estrutura de capital de uma empresa pode ser

usada pelos acionistas como uma estratégia para liquidação do negócio num

momento que lhes pareça ser esta uma solução que lhes seja favorável, em

detrimento a clientes e fornecedores. Geralmente, a estrutura de capital da maioria

das empresas é organizada de forma a que acionistas nunca pensem em liquidá-las,

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

53

ao contrário dos credores, que, para receber de volta o que emprestaram, estão

sempre levando em consideração esta possibilidade, principalmente quando a firma

estiver em dificuldades financeiras. Segundo ele, produtoras de automóveis e

computadores, por exemplo, tenderão a ter menos dívida do que hotéis e

restaurantes, pois, no caso de produtos duráveis, o custo imposto a clientes, quando

um produtor sai do negócio, é bem mais alto que para produtos não duráveis.

Allen (1993) tem os custos de falência que emanam de produto como foco de seu

trabalho, assinalando que firmas em dificuldades financeiras podem adiar

investimentos, oferecendo, dessa forma, vantagens aos seus competidores. Esses

custos são transferidos para os acionistas na forma de preços mais baixos, com

consequente redução dos ganhos (dividendos) e ainda redução do valor da

empresa.

Harris e Raviv (1991) apontam que firmas que operam num mesmo segmento

possuem estruturas de capital mais semelhantes do que aquelas que atuam em

segmentos diferentes. Os níveis de alavancagem de indústrias de bens específicos

foram pesquisados/estudados por Bowen et al. (1982), Bradley et al. (1984), Long e

Malitz (1985) e Kester (1986), cujos resultados vão ao encontro dessa observação

de Harris e Raviv, mostrando que empresas que atuam com produtos farmacêuticos,

instrumentos e aparelhos eletrônicos e alimentos possuem baixo nível de

alavancagem, ao passo que empresas dos segmentos de papel e celulose, têxtil,

aço, transportes aéreos e cimento têm, geralmente, alto nível de alavancagem.

Segundo Harris e Raviv (1991), vários outros estudos procuraram elucidar

características específicas de firmas que determinam o seu nível de alavancagem,

tais como os de Bradley et al. (1984), Castanias (1983), Long e Malitz (1985), Kester

(1986), Marsh (1981) e Titman e Wessels (1988). Esses estudos convergem para

conclusões em que o financiamento das firmas e, por conseqüência, a sua

alavancagem e estrutura de capital são geralmente determinadas em função de

vários mecanismos e situações que se verificam, tais como aumentos de recursos

próprios (em função de boa lucratividade), benefícios fiscais para endividamento,

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

54

oportunidades de crescimento, tamanho de firma, volatilidade, investimentos em

publicidade, pesquisa e desenvolvimento, probabilidade de bancarrota, rentabilidade

e singularidade do produto.

Seth (1990) desenvolve estudo focado num embasamento conceitual e numa

metodologia empírica para avaliar a importância relativa de diferentes fontes de

criação de valor em fusões e aquisições, com os resultados empíricos indicando que

a criação de valor em tais processos está associada a uma hipotética eficiência

econômica, que surge a partir de economias de escala, da eficiência das operações

e da força de mercado.

Em princípio, acredita-se que fusões e aquisições criam valor econômico, embora

persista uma grande dificuldade em se testar empiricamente tais argumentos, uma

vez que as metodologias utilizadas não têm sido suficientes para distinguir, dentre as

fontes possíveis de ganhos nos processos, quais seriam aquelas que realmente

criam valor.

Sob o enfoque do campo de estratégia corporativa, são sugeridas várias fontes de

criação de valor que podem ser associadas a diferentes estratégias de aquisição,

que se originariam de economias de escala, força de mercado e competência das

economias. No entanto não há nenhuma evidência empírica direta e concreta para

confirmar essa hipótese e, de acordo com Seth (1990), estudos empíricos anteriores

que tinham como objetivo examinar as fontes de criação de valor em fusões e

aquisições de tipos específicos (como aquisições horizontais, por exemplo) testaram

as possíveis origens de criação de valor nesses processos. As evidências

encontradas, considerando que seriam várias as fontes de criação de valor e

diversos os processos de fusão e aquisição, foram:

1) Nos casos de aquisições horizontais, os trabalhos de Eckbo (1983) e Stillman

(1983) não dão sustentação ao argumento de mercado como fonte plausível de

criação de valor, ou seja, de maior participação no mercado por parte da nova

empresa do que a soma da participação que as duas empresas já possuíam antes

Page 59: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

55

do processo.

2) Não se constatou evidências de associação significativa no tocante a economias

de escala.

3) Com relação à diversificação do risco, Haugen e Langetieg (1975) e Firth (1978)

levantam que o risco sistemático de firmas combinadas não muda significativamente

em decorrência do processo, enquanto que Haugen e Lemma (1987) mostram que

a fusão tende a aumentar o risco sistemático com a consolidação da nova firma, sem

considerar em suas análises, no entanto, os diversos tipos de fusão existentes. Choi

e Philippatos (1983) observaram que o risco sistemático não muda

significativamente nas fusões de qualquer tipo.

Entretanto, nenhum desses estudos verificou de forma simultânea os diferentes tipos

de aquisições e as várias fontes de criação de valor existentes. Assim é que Seth

(1990) procura examinar precisamente esses pontos, com a finalidade de gerar um

provável entendimento de como e por que existiria criação de valor por meio de

diferentes tipos de fusão e aquisição, investigando especificamente as seguintes

questões:

1) Formas diferentes de fusões e aquisições geram diferentes fontes de criação de

valor?

2) Quais seriam, nos diferentes tipos de fusões e aquisições, as fontes de criação de

valor vinculadas ao tipo de processo?

O autor utiliza uma nova abordagem para tratar esses temas, tornando possível

discriminar empiricamente as diferentes fontes de criação de valor, a partir de

pressupostos existentes sobre como e por que duas firmas combinadas criam valor.

Um deles é que a firma pode mudar radicalmente sua maneira de operar e, nesta

situação, são inseridos dois tipos diferentes e intrínsecos de decisão estratégica:

decisões operacionais e decisões financeiras. Alternativamente, as firmas podem

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

56

não adotar qualquer tipo de mudança mas o simples fato de atuarem juntas pode ser

suficiente para criar valor, como resultado da diversificação do risco. Dessa forma,

espera-se que aquisições motivadas por objetivos distintos possam gerar diferentes

fontes de criação de valor.

O autor estabelece medidas de criação de valor total e de quais fontes ele viria, com

base em uma amostra de 102 casos, ocorridos entre 1962 e 1979, definindo criação

de valor como sinônimo de sinergia. Existe sinergia em processos de fusões e

aquisições quando o valor das empresas combinadas excede o valor total das firmas

combinadas, tomadas de forma individual. Ademais, esses ganhos sinérgicos podem

ser avaliados numericamente, de acordo com o autor, estabelecendo-se o

percentual de ganhos obtidos a partir da comparação entre os preços das ações das

empresas antes do processo e o preço da ação da nova empresa combinada. A

comparação de valores das ações das empresas foi feita com base no período de 40

dias antes do anúncio e 15 dias depois da concretização do evento. Utilizando

modelos matemáticos e estatísticos, o autor calculou a expectativa de retorno

anormal para essas ações, considerando-o ganho de sinergia.

Para constatar a influência de decisões operacionais e financeiras, Seth (1990)

utilizou três variáveis:

a) economia de escala com reflexos no custo de produção;

b) força de mercado;

c) nível de alavancagem financeira.

Para verificar se o processo gerou economia de escala, o autor considerou que esta

se verificaria quando houvesse queda no custo médio da produção no período pós-

aquisição. Já para a verificação da ocorrência de ganho de mercado, Seth

considerou que o compartilhamento de bens intangíveis poderia contribuir para a

diferenciação do produto, gerando economias de escala ou de escopo tais como sis-

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

57

temas ou canais de distribuição, marca e nova imagem no mercado. Segundo ele, os

bens intangíveis são transferidos de maneira mais fácil quando a aquisição se dá

entre firmas similares, no que diz respeito a mercado consumidor e estratégias de

vendas. Seth (1990) cita Porter (1980), que sugere uma tipologia de firmas que

contam com esses fatores, afirmando que aquelas primariamente boas produtoras

vendem bem para outras indústrias, governo e instituições. Ainda de acordo com

Porter (1980), o comportamento de compra desses consumidores é dependente das

características técnicas dos produtos e que empresas classificadas como boas

consumidoras vendem bem para consumidores finais. Por fim, nessa seqüência, o

comportamento de compra dos consumidores finais é influenciado mais diretamente

por propaganda e outras técnicas de venda.

Seth (1990) procurou então classificar, com base na data de publicação do evento

(processo de fusão e/ou aquisição), cada uma das firmas envolvidas no processo de

acordo com a tipologia de Porter (1980), estabelecendo ainda uma variável binária

de mercado: igual a 1 (um) se ambas (adquirente e adquirida) eram identificadas

como sendo do mesmo tipo e 0 (zero) se as empresas eram classificadas como

sendo de tipos diferentes. O autor observou, ainda, que o tamanho de uma das

empresas (compradora ou alvo) poderia exercer influência sobre essa questão de

força de mercado, já que processos envolvendo empresas-alvo de tamanhos

relativos significativos geram expectativas de maior sucesso na aquisição no sentido

de criarem uma sinergia maior, incrementando com mais efetividade o poder de

mercado das empresas combinadas.

Já para analisar a variável de alavancagem financeira, o autor estabeleceu que

ganhos sinérgicos advindos de mudanças das decisões de financiamento

dependem da expectativa de aumento no endividamento, que, em conjunto com os

benefícios fiscais do endividamento, podem levar à geração de vantagens para os

acionistas. Duas medidas de alavancagem foram calculadas para cada item

combinado:

1) endividamento total (de curto e longo prazos) comparado com os ativos da empresa;

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

58

2) endividamento apenas de longo prazo comparado com o valor dos ativos.

Sob os três aspectos (economia de escala com reflexos no custo de produção, força

de mercado, nível de alavancagem financeira) foram analisados 63 processos, com

o autor encontrando consistência nos seguintes pontos: consideradas em conjunto,

o aumento de valor está associado a mudanças nas decisões operacionais e de

financiamento, tanto para as aquisições de firmas relacionadas (fusões e aquisições

horizontais ou verticais entre empresas que se unem para expandir produção ou

mercado) como para as não relacionadas (fusões e aquisições entre empresas de

segmentos diferentes).

Em relação às variáveis de economia de escala (redução de custos) e força de

mercado, apesar de não terem sido encontradas correlações significativamente

relevantes, seus efeitos caminham na direção da teoria hipotetizada pelo autor, uma

vez que criação de valor foi associada positivamente com força de mercado e com

declínio do custo operacional nos casos de aquisições entre firmas não

relacionadas. Para esses casos, o autor observou existir uma associação positiva

para a variável de economia de escala mas, contrariando sua hipótese, a variável

força de mercado não apresentou correlação significativa com criação de valor.

A variável alavancagem financeira foi positivamente relacionada com criação de

valor, sendo que aumento de endividamento foi altamente significativo nos casos de

aquisições "não relacionadas", o que vai ao encontro da tese do autor. No entanto,

como foi observado aumento da utilização de débitos nos dois tipos de processos

(entre relacionadas e não relacionadas) e esse aumento na alavancagem só estava

positivamente associado com criação de valor no caso das "não relacionadas",

foram realizados testes não paramétricos com o objetivo de se tentar averiguar onde

o aumento de débitos seria significativo nos dois casos e onde ele seria diferente

entre eles. Os resultados dos testes levaram à seguinte conclusão: nos casos de

aquisições relacionadas, o aumento de débitos seria interpretado pelo mercado

como sendo meramente um reflexo do financiamento da própria aquisição, o que

demonstra uma situação de caráter temporário, até que o impacto financeiro inicial

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

59

da aquisição seja amortizado. Já nos casos de aquisições não relacionadas, o

aumento de débitos seria percebido pelos investidores como sendo consistente com

o objetivo da aquisição, qual seja o de diversificação de risco e maior "proteção

conjunta", ainda que o aumento de débitos vá gerar maior valor para a empresa.

O autor conclui que:

a) a diversificação do risco não aparece como principal fator determinante na criação

de valor;

b) a criação de valor resulta, em ambos os tipos de aquisição (relacionadas e não

relacionadas), em um aumento esperado do fluxo de caixa;

c) o aumento de débitos indica maior associação com criação de valor nos casos de

aquisições não relacionadas. Nesses casos, os gerentes deveriam analisar de

maneira cuidadosa o potencial do aumento de endividamento, uma vez que os

custos e benefícios desse aumento podem determinar previamente o quanto de

valor pode ser criado a partir da aquisição;

d) não há uma forte ligação das variáveis sinérgicas alinhadas com criação de valor

nos casos de aquisições relacionadas, o que sustenta a hipótese de que, nesses

casos, a fonte de criação de valor está mais voltada para os efeitos de "seguro" e

"proteção";

e) nos casos de aquisições relacionadas, o tamanho das empresas envolvidas no

processo, tanto da empresa ofertante quanto da empresa alvo, está associado

positivamente aos ganhos sinérgicos, sendo que as variáveis das fontes de criação

de valor estão mais voltadas para as decisões operacionais. Assim, os gerentes

dessas empresas deveriam concentrar suas análises no potencial de aumento do

fluxo de caixa da empresa combinada, projetando as reduções de custos

operacionais e aumentos da receita advindos de ganhos de mercado, de forma a

estimar antecipadamente o valor que pode ser criado através desse processo.

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

60

Seth (1990) finaliza afirmando que esse trabalho tem uma importância gerencial

significativa e gera implicações de natureza estratégica, na medida em que é

necessário examinar cuidadosamente o potencial de fontes específicas na criação

de valor e que a correta estimativa de potencial para isso representa o prêmio

máximo que a empresa ofertante pagaria pela empresa-alvo.

Bieshaar, Knight e Wassenaer (2001), consultores da Mckinsey & Company,

realizaram uma pesquisa, na qual analisaram 231 transações (151 aquisições, 16

fusões, 18 joint-ventures, 18 alianças de tipos diversos e 28 vendas de subsidiárias

de empresas), durante 5 anos, efetuadas por 36 empresas pertencentes a três

setores de atividades: telecomunicações mundiais, petróleo e negócios bancários na

Europa. Eles procuraram verificar as mudanças ocorridas nos preços das ações

dessas empresas, imediatamente antes e depois do anúncio do evento (nos cinco

dias anteriores, no dia e nos cinco dias posteriores ao anúncio, totalizando 11 dias

de acompanhamento) e reconheceram que conclusões mais definitivas estariam na

dependência do acompanhamento dessas variações num espaço de tempo maior, o

que não foi feito. Ainda assim, com a ressalva da reação de curto prazo, eles

chegaram às seguintes conclusões:

1) que o mercado avalia melhor as transações de cunho "expansionista", que

tenham como objetivo o aumento de mercado, seja por meio de consolidação, de

expansão de regiões geográficas, de incorporação de novos canais de

distribuição ou, ainda, de ampliação dos já existentes;

2) que as operações que tenham por objetivo introduzir ou eliminar ramos de

atividades nas empresas não são bem aceitas pelo mercado;

3) que o mercado acredita mais nas aquisições do que nas outras modalidades de

aliança existentes como fusões, joint-ventures, alianças estratégicas e parcerias.

Os autores classificaram as operações em cinco tipos estratégicos diferentes:

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

61

a) consolidação de mercado;

b) expansão geográfica;

c) ampliação do sistema empresarial;

d) mudança de segmento;

e) diversificação de atividades.

Os resultados indicaram que as transações enquadradas nas alíneas "a", "b" e "c",

denominadas "expansionistas", geraram valorização das ações, com variações de

1,1% a 4,2%, em média, atingindo um pico de 6% num caso específico (Banco

Santander). Já nos casos das operações classificadas nos itens "d" e "e", houve

uma queda média de 5,3% nos preços das ações.

2.7 O modelo Fleuriet de análise financeira e os processos de fusão e aquisição

O modelo Fleuriet constitui-se em importante instrumento de análise e

gerenciamento da liquidez das empresas no curto prazo, o que propicia estreita

relação com os processos de fusões e aquisições no Brasil, especialmente se

levarmos em consideração que grande parte das empresas nacionais adquiridas

entraram nesse processo por incapacidade de financiar seu crescimento, necessário

à manutenção da competitividade com suas congêneres globalizadas. No que

interessa aos propósitos desta dissertação, procedemos a seguir com breve resumo

do modelo calcado nos textos de Fleuriet, Kehdy e Blanc (1980), Braga (1991), além

de Brasil e Brasil (1993).

O crescimento geralmente conduz à necessidade de novos investimentos para

financiar o aumento da necessidade de capital de giro das empresas, que se torna

crescente nessas situações. Não tendo capital de giro suficiente para tal, as empresas

recorrem a empréstimos bancários, geralmente de curto prazo, para financiar essa

necessidade. A conseqüência é a ampliação dos riscos financeiros de curto prazo das

empresas (saldo de tesouraria negativo) e alteração de suas estruturas de capital,

trazendo maior parcela de recursos de terceiros para o negócio.

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

62

Portanto a verificação dos indicadores do modelo Fleuriet nas empresas adquiridas,

antes e depois dos processos de aquisição a que foram submetidas, torna-se um

importante instrumento de análise e pode, de alguma forma, justificar as alterações

ocorridas em sua estrutura de capital.

O modelo Fleuriet representa um avanço em relação ao modelo tradicional de

análise financeira, na medida em que separa tanto as fontes quanto as aplicações

de curto prazo em cíclicas e erráticas, evidenciando a real necessidade de capital de

giro das empresas para financiar suas atividades operacionais e estabelece vínculos

entre essa necessidade e as suas condições de operação (relacionamento com

clientes e fornecedores, níveis e prazos de estocagem, processos produtivos e

outros fatores relacionados), enquanto o modelo tradicional de análise tem seu foco

voltado apenas para a situação de solvência da empresa.

No modelo Fleuriet, as contas do Ativo Circulante são reclassificadas em cíclicas e

erráticas. Como contas cíclicas, são consideradas aquelas que expressam

investimentos constantes, de acordo com as suas condições de operação, e um

exemplo disso são as inversões para o financiamento de clientes. De acordo com as

premissas desse modelo, a empresa financia o cliente, resgata o investimento

quando o mesmo quita seu débito e novamente investe para financiar o mesmo

cliente ou outro qualquer, em um ciclo sem fim. Geralmente, o ato de investir e

resgatar é realizado em curto espaço de tempo, transformando-se em ato contínuo,

constante, efetuado de forma cíclica. O mesmo exemplo aplica-se também, por

exemplo, aos investimentos em estoques.

Por outro lado, a empresa efetua investimentos de natureza circunstancial e não

intencional, que não se caracterizam pelo ciclo contínuo (e que guardam relação

direta com a sua operação), como, por exemplo, as aplicações financeiras. Estes

investimentos se diferenciam dos anteriores por não serem feitos de forma

cíclica e, principalmente, por não terem nenhum tipo de vínculo direto com a sua

atividade básica.

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

63

Da mesma forma, as fontes de recursos de curto prazo – passivo circulante – são

reclassificadas em cíclicas e erráticas, seguindo a mesma filosofia. Assim, nesse

grupo, as fontes consideradas como cíclicas são os financiamentos de fornecedores,

de funcionários, de impostos operacionais e de adiantamentos de clientes. Já as

erráticas são os financiamentos bancários, os empréstimos de pessoas físicas ou

jurídicas, os dividendos a pagar e o imposto de renda a pagar, já que este,

diferentemente dos impostos operacionais, não guarda relação direta com a

operação da empresa, mas com o seu resultado.

Essa reclassificação é importante para se determinar qual a real necessidade de

capital de giro da empresa, ou seja, o volume de recursos necessários para financiar

suas atividades operacionais, enquanto, no modelo tradicional, não se consegue

distinguir o que está sendo investido na operação e fora dela. A necessidade de

capital de giro é determinada pela diferença entre os ativos circulantes cíclicos e os

passivos circulantes cíclicos, indicando qual o volume de recursos que deve ser

aportado pela empresa, quando o volume necessário para financiar estoques e

clientes é superior ao financiamento concedido pelas fontes cíclicas. Numa situação

inversa, indica qual o volume de recursos que se torna fonte de recursos para a

empresa, quando o montante de recursos oferecido pelas fontes cíclicas é superior

às necessidades da empresa para financiar estoques e clientes.

A determinação do capital de giro da empresa, de acordo com o modelo Fleuriet, é

calculada pela diferença entre as fontes de longo prazo (exigível de longo prazo +

patrimônio líquido) e as aplicações de longo prazo (realizável a longo prazo + ativo

permanente). Dito de outra forma, uma empresa tem capital de giro quando possui

mais fontes do que aplicações de longo prazo, sendo essa diferença aplicada no

curto prazo e, portanto, funcionando como margem de segurança, de modo a

estabelecer uma situação de solvência em relação a seu passivo circulante. Quando,

no entanto, as aplicações de longo prazo são maiores do que as fontes de longo

prazo, a empresa apresenta uma falta de capital de giro, necessitando, portanto, de

recursos para "cobrir" a diferença.

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

64

O Saldo de Tesouraria, T, é calculado pela diferença entre o Ativo Circulante Errático

e o Passivo Circulante Errático. Quando positivo, representa a margem de

segurança financeira da empresa no curto prazo, pois indica uma posição de

aplicações financeiras superiores ao endividamento oneroso. Por outro lado, quando

negativo, indica uma medida de risco financeiro no curto prazo, na medida em que

os financiamentos onerosos são superiores às aplicações fora da operação.

Enfim, os três elementos (Capital de Giro, Necessidade de Capital de Giro e Saldo

de Tesouraria) estão interligados e o quadro abaixo resume as situações possíveis

de ocorrência, as quais serão observadas no capítulo de resultados quando das

análises sobre as empresas adquiridas.

Quadro 1 Resumo de situações na administração financeira

SITUAÇÃO Capital de Giro Necessidade de Capital

de Giro

Saldo de Tesouraria

I Positivo – Fonte Positivo – Aplicação Positivo – Aplicação

II Positivo – Fonte Positivo – Aplicação Negativo - Fonte

III Positivo – Fonte Negativo – Fonte Positivo – Aplicação

IV Negativo – Aplicação Positivo – Aplicação Negativo – Fonte

V Negativo – Aplicação Negativo – Fonte Negativo – Fonte

VI Negativo – Aplicação Negativo – Fonte Positivo – Aplicação

FONTE - Elaborado pelo autor da dissertação.

Na primeira situação, a empresa apresenta capital de giro suficiente para cobrir toda

a sua necessidade de capital de giro e ainda aplicar parte dele fora do negócio. A

situação é considerada como sólida, uma vez que os recursos de longo prazo

investidos no circulante tendem a garanti-la estável, mantidas as condições

operacionais da empresa.

Na segunda, apesar da empresa manter recursos de longo prazo aplicados no curto

prazo, esses não são suficientes para cobrir toda a sua necessidade de capital de

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CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

65

giro, tendo a mesma que recorrer a recursos financeiros de curto prazo para

financiar parte das suas operações. A situação é considerada como insatisfatória,

pois, de acordo com a teoria preconizada pelo modelo Fleuriet, a necessidade de

capital de giro da empresa deveria tender a zero, ou seja, o financiamento das

atividades cíclicas viria das fontes cíclicas de financiamento e, quando positiva, a

necessidade de capital de giro deveria ser igual ou inferior ao seu capital de giro.

Na terceira situação, a empresa encontra-se numa posição bastante confortável,

uma vez que, além de possuir capital de giro, as fontes cíclicas são superiores às

aplicações cíclicas, caracterizando uma necessidade de capital de giro negativa, ou

seja, a necessidade de capital de giro da empresa passa a ser fonte de recursos

(trabalha com capitais de terceiros não onerosos) e a empresa aplica esses recursos

excedentes fora da sua atividade.

A quarta situação reflete uma posição oposta à terceira, quando a empresa tem falta

de capital de giro (as aplicações de longo prazo são superiores às fontes de longo

prazo) e apresenta ainda uma necessidade de capital de giro positiva, o que a faz

recorrer a financiamentos de curto prazo para financiar não apenas as suas

atividades operacionais como também investimentos de longo prazo, expondo-se a

um risco financeiro de curto prazo elevado. É uma situação bastante desconfortável

do ponto de vista do gerenciamento da liquidez no curto prazo.

Na quinta situação, a empresa apresenta um quadro de falta de capital de giro,

como na anterior, mas a situação é atenuada pela necessidade de capital de giro

negativa, ou seja, ela recebe de suas fontes operacionais (não onerosas) mais

financiamentos do que necessita para manter suas atividades e esses recursos

excedentes "cobrem" parcialmente a falta de capital de giro. No entanto os recursos

operacionais de terceiros não são suficientes para tanto, levando a empresa a

buscar parte dos recursos em fontes não operacionais ou erráticas. Esta situação

também é insatisfatória, uma vez que a empresa está na dependência de recursos

onerosos de curto prazo para financiar ativos de longo prazo, o que pode vir a

comprometer a liquidez de curto e médio prazo.

Page 70: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

66

A última situação colocada pode revelar uma posição de gerenciamento operacional

inadequado, uma vez que a empresa aplica recursos de fornecedores operacionais

para financiar sua falta de capital de giro e ainda fora do negócio. Mudanças nas

relações com fornecedores e clientes podem provocar uma inversão nesse quadro,

levando a empresa a uma situação financeira de curto prazo desfavorável.

O modelo Fleuriet de análise financeira pode, nesse sentido, auxiliar na identificação

do tipo de estrutura financeira utilizada pelas empresas, antes e depois de serem

submetidas ao processo de aquisição. É importante verificar a variação desses

elementos e a relação que eles guardam com a alteração na estrutura de capital das

empresas.

2.8 Resumo crítico do referencial bibliográfico

No apanhado que fizemos da literatura, partimos do já consagrado teorema de

Modigliani e Miller (1958) acerca do tema estrutura de capital, que consiste na

decisão de financiar-investir da empresa, para chegarmos a um melhor

entendimento de como esta decisão e as várias circunstâncias inerentes a este

processo permeiam os processos de fusões e aquisições.

A teoria da posse assimétrica de informações estabelecida pelo trabalho de Akerlof

(1970), em contraponto à hipótese de mercado perfeito pressuposta no teorema de

MM, coloca que mercados podem falhar quando os potenciais compradores não

puderem verificar a qualidade dos produtos que lhes estão sendo oferecidos. Aliás,

isto pode ser observado nos processos de fusões e aquisições, especialmente

naqueles originários de privatizações, quando geralmente nem a própria empresa

adquirida detém informações qualitativamente suficientes. O trabalho de Akerlof deu

origem a uma linha de pesquisa sobre assimetria de informações e o estudo de

Leland e Pyle (1977) ainda se constitui em um dos mais importantes, com sua

conclusão de que em vista da assimetria de informações entre agentes do mercado,

quando as empresas buscam financiamentos para seus investimentos, leva-as a

Page 71: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

67

preferir recursos gerados internamente do que realizar emissões de novas ações

para esse fim. Ainda mais, para eles, a solução de tais sentimentos antagônicos

estaria na maior participação dos administradores da empresa no capital social da

mesma.

Weston e Brigham (2000) colocam que empresas participantes em processos de

fusões e aquisições, tanto como adquirentes quanto como alvos, têm o objetivo

estratégico de alcançar um "ponto ótimo" em sua estrutura de capital, o qual lhes

assegure menor risco ou possibilite aumentar sua capacidade de endividamento. Por

outro lado, gerentes buscam manter seus empregos e o controle dos negócios, e

estratégias específicas no campo de fusões e aquisições podem se prestar ao

atendimento desses objetivos, como no caso de aquisições relacionadas ou

conglomerais.

Jensen e Meckling (1976) chegam à conclusão de que a empresa é um conjunto de

contratos estabelecidos entre o principal (acionistas) e os diversos agentes

(gerentes, clientes, fornecedores, financiadores e outros) que atuam de acordo com

os seus diversos interesses, muitas vezes conflitantes entre si. Nesse sentido e de

acordo com Weston e Brigham (2000), nos casos de fusões conglomeradas (entre

empresas do mesmo setor), gerentes e acionistas majoritários estão de fato agindo

contrariamente aos interesses dos minoritários, dos quais poderiam, eles próprios,

proceder à diversificação com a compra de ações no mercado.

Donaldson (1961) concluiu que as empresas priorizam os lucros retidos dentre suas

fontes de financiamento, seguindo-se o endividamento e, em último lugar, a emissão

de ações. Essa hierarquização das fontes ficou conhecida como POT – Pecking

Order Theory. Miller e Rock (1985) no entanto, observaram que tanto dívida quanto

emissão de ações eram interpretados pelo mercado como um sinal de incapacidade

de geração interna de recursos, levando à queda nos preços das ações da empresa,

o que pode levar empresas a se envolver em processos de fusões e aquisições, a

ter que se expor a uma desvalorização do mercado quando necessitarem emitir

ações para financiar seu crescimento.

Page 72: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 2 - REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

68

Simerly e Li (2000) relatam que não só a estratégia é fator determinante da estrutura

de capital como também o dinamismo do ambiente em que as empresas operam,

conduzindo suas análises sobre o tripé: dinamismo do ambiente x estrutura de

capital x performance econômica das empresas.

Por fim, Seth (1990) estuda as fontes de criação de valor nos processos de fusões e

aquisições, identificando como as três mais prováveis, a economia de escala

(através da redução de custos), a força de mercado (através do aumento de

receitas) e a alavancagem financeira, variável esta intimamente ligada ao tema

estrutura de capital.

Dessa forma, procuramos percorrer a literatura recente que contempla o tema

estrutura de capital alinhado aos processos de fusões e aquisições, como forma de

sustentar teoricamente a pesquisa a que nos propomos realizar.

Page 73: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 3 METODOLOGIA DA PESQUISA

Page 74: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 70

3.1 Aspectos gerais

O objetivo geral desta pesquisa é o de verificar o comportamento de empresas

participantes de processos de aquisições no tocante a suas estruturas de

financiamentos, na condição de adquiridas, abordando os aspectos relacionados ao

gerenciamento da liquidez no curto prazo, através dos indicadores do modelo

Fleuriet.

Este estudo adota um enfoque quantitativo, baseado em dados secundários, com os

quais levantamos o comportamento dos indicadores básicos do modelo Fleuriet

(Capital de Giro, Necessidade de Capital de Giro e Saldo de Tesouraria) destas

empresas, em períodos anteriores e posteriores às datas de ocorrência dos

processos de aquisição a que foram submetidas.

A este propósito, Key (1995) coloca que, com freqüência, as aquisições exercem

impactos significativos, positivos ou negativos, sobre a lucratividade e a saúde

financeira das empresas. Objetivando verificar quais os impactos causados no

gerenciamento da liquidez de curto prazo das empresas, nos aspectos específicos

que são captados pelo modelo Fleuriet, analisamos as variações ocorridas na

necessidade de capital de giro e na forma de financiá-la.

Quanto à amostra selecionada para análise, optamos por trabalhar com empresas

que passaram por processos de fusões e aquisições a partir da implantação do

Plano Real de Estabilização Econômica, em função do grande número de processos

ocorridos a partir deste fato, comparando dados trimestrais anteriores e posteriores

ao processo, utilizando o mesmo número de observações para as duas situações.

As informações foram coletadas no banco de dados da Economática e foi utilizado o

parâmetro "Ajustado por Inflação", que corresponde à correção dos valores pelo

índice IGP-DI, já que trabalhamos com informações anteriores ao Plano Real,

quando houve uma troca de moeda, não permitindo comparações de valores

nominais antes e depois dessa data.

Page 75: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 71

3.2 Métodos e objetivos de pesquisa

Este estudo classifica-se como de pesquisa exploratória e descritiva, utilizando

modelos estatísticos como ferramentas de análise.

Gil (1991) coloca que a pesquisa exploratória se presta a esclarecer e modificar

conceitos e idéias em função de formulação de problemas mais precisos ou

hipóteses para pesquisas e estudos posteriores, a serem desenvolvidos com o

objetivo de proporcionar uma visão geral acerca de determinado fato. Já com

relação à pesquisa descritiva, o autor coloca que elas se prestam a descrever

características de populações ou fenômenos, bem como a estabelecer relações

entre as diversas variáveis estudadas.

Outro ponto em que este estudo se alinha à descrição de Gil (1991, p. 55) é a de

utilização da técnica de pesquisa definida por ele como "ex-post-facto", que se refere

a um experimento que se realiza depois do fato acontecido. De acordo com o autor: na pesquisa ex-post-facto tem-se um "experimento" que se realiza depois dos fatos. Não se trata rigorosamente de um experimento, posto que o pesquisador não tem controle sobre as variáveis. Todavia, os procedimentos lógicos de delineamento ex-post-facto são semelhantes aos dos experimentos propriamente ditos.

O autor coloca ainda que as ciências sociais valem-se muito deste tipo de pesquisa. Quase todos os trabalhos destinados à investigação de determinantes econômicos e sociais do comportamento de grandes aglomerados sociais fundamentam-se numa lógica deste tipo (GIL, 1991, p. 56).

Mattar (1996) postula que o tipo de pesquisa – exploratória – ajuda o pesquisador a

aumentar o seu grau de conhecimento sobre o tema pesquisado e que tal fato se dá

à medida que o pesquisador coleta e agrupa as diferentes teorias, visões e perspec-

Page 76: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 72

tivas já desenvolvidas sobre o tema. Ele diz que este tipo de pesquisa é particularmente útil quando se tem uma noção muito vaga do problema de pesquisa. Nos primeiros estágios da pesquisa o pesquisador não tem conhecimento suficiente para formular questões e (ou) hipóteses específicas (uma hipótese é uma afirmação que especifica como duas variáveis devem estar relacionadas) (MATTAR, 1996, p. 18).

Mattar (1996, p. 19) coloca ainda que mesmo quando já existam conhecimentos do pesquisador sobre o assunto, a pesquisa exploratória também se faz útil, pois normalmente para um mesmo fato poderá haver inúmeras explicações alternativas, e sua utilização permitirá ao pesquisador tomar conhecimento, senão de todas, da maioria delas.

Vergara (2000) qualifica as pesquisas em relação aos aspectos de fins e de meios e,

de acordo a isso, quanto aos fins, elas podem ser interpretadas tanto como de

natureza exploratória como descritiva. Exploratória, porque os dados analisados são

de origem secundária, visando prover critérios para a compreensão da realidade;

descritiva, porque relata como as empresas adquiridas por meio de processos de

fusões e aquisições, após a implantação do Plano Real, gerenciavam a sua liquidez

de curto prazo, antes e depois de serem adquiridas. Além disso, visa-se descrever

como se dava o comportamento das variáveis próprias ao modelo Fleuriet. Com

relação aos meios, esta pesquisa classifica-se como bibliográfica, visto que os dados

foram coletados a partir de material acessível ao público em geral, como

demonstrativos contábeis publicados e disponíveis em bancos de dados como

ECONOMÁTICA e LAFIS.

3.3 Delineamento da pesquisa

Conforme explicitado no item 3.1, o objetivo principal deste trabalho é o de verificar o

comportamento de indicadores financeiros de empresas adquiridas por meio de

processos de fusões e aquisições a partir de julho de 1994, promovendo análises

comparativas desses indicadores antes e após a data da aquisição.

Page 77: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 73

Com a finalidade de tornar claro o processo de pesquisa e análise, passamos a

delinear as etapas da pesquisa, a saber: identificação das empresas; aferições

sobre dados contábeis; definição das variáveis; aplicação dos testes estatísticos.

a) Identificação das Empresas Nesta etapa, buscamos identificar as empresas que se envolveram em processos de

fusões e aquisições a partir de julho de 1994, data da implantação do Plano Real e

também referencial do início do boom de fusões de aquisições no Brasil.

Para tanto, empregamos dados que a empresa KPMG publica periodicamente sobre

o tema, descrevendo os processos de maneira detalhada, com informações acerca

do número de transações totais, transações por setores de atividades, distribuição

geográfica das transações, países de origem das empresas adquirentes e

adquiridas, além de outros dados. No entanto, não temos a mesma facilidade em

coletar os nomes das empresas envolvidas e as datas exatas das transações, o que

dificulta sobremaneira este tipo de estudo.

Consultando as várias e raras fontes nas quais pudéssemos encontrar os nomes das

empresas envolvidas nesses processos (como jornais e revistas especializadas),

percebe-se que os casos relatados são poucos, havendo uma grande diferença

entre os dados gerais disponíveis (sobre o total de transações) e os casos

claramente identificados. Outrossim, levando-se em consideração a necessidade de

obter os demonstrativos contábeis dessas empresas, esse universo fica ainda mais

limitado, pois o restringimos apenas às empresas obrigadas pela legislação à

publicação de seus demonstrativos econômico-financeiros.

Como nos processos de fusões e aquisições é mais comum as empresas de menor

porte serem adquiridas pelas de maior porte, boa parte das empresas adquiridas,

foco do nosso estudo, é formada por empresas constituídas por meio de cotas

deresponsabilidade limitada ou por sociedades anônimas de capital fechado, que

não publicam demonstrativos contábeis, os quais são as fontes básicas de dados

Page 78: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 74

necessários ao atendimento dos objetivos estabelecidos para este estudo.

Assim é que, apesar de muitas informações a respeito de fusões e aquisições no

Brasil, constatamos uma dificuldade real em relatar os casos e identificar datas dos

processos, o que prejudica sobremaneira este tipo de pesquisa, em especial, pela

restrição do tamanho da amostra pela qual possamos obter conclusões acerca de

nossas indagações.

Cruzando informações de jornais, revistas e outras publicações especializadas sobre

o tema com os dados sobre controle acionário disponíveis no banco de dados da

Economática e da LAFIS, conseguimos identificar os seguintes processos de

aquisição e fusão de empresas que publicam demonstrativos contábeis:

QUADRO 2 Resumo das operações de aquisição levantadas para a amostra

ADQUIRIDAS ADQUIRENTES DATA

ACESITA GRUPO USINOR Maio/98 ARNO SEB INTERNATIONALE S/A Fevereiro/98

CIA VALE DO RIO DOCE VALEPAR Setembro/97 CEBRACTEX COTEMINAS Junho/97

CHAPECÓ GRUPO MACRI - ALIMBRÁS

Janeiro/98

COFAP MAGNETTI MARELLI Outubro/97 COSIPA USIMINAS Fevereiro/99

ELEVADORES ATLAS SCHINDLER Maio/99 FRAS-LE RANDOPAR S/A Janeiro/96

GRADIENTE NOKIA Maio/97 LOJAS RENNER J.C.PENNEY BRAZIL Dezembro/98

METAL LEVE MAHLE PISTÕES S/A Setembro/98 POLIPROPILENO CIA. SUZANO PAPEL E

CELULOSE Fevereiro/96

FONTE - Elaborado pelo autor da dissertação. b) Aferições sobre dados contábeis Identificadas as empresas adquiridas, bem como as datas de aquisição, passamos

ao levantamento das informações contábeis acerca das mesmas. Para tanto, vimos-

Page 79: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 75

nos restritos ao uso de informações trimestrais, pois esse é o menor intervalo de

tempo com que são publicados os indicadores selecionados. Enfim, a composição

desses indicadores para cada empresa da amostra se fez sobre os dados trimestrais

expostos abaixo, relativos a períodos antes e após a data da aquisição, encontrados

na base de dados da empresa Economática, que os cedeu gentilmente.

• Ativo Circulante Cíclico

• Ativo Circulante Errático

• Passivo Circulante Cíclico

• Passivo Circulante Errático

• Exigível de Longo Prazo

• Patrimônio Líquido

• Realizável a Longo Prazo

• Ativo Permanente

c) Definição das variáveis A partir destes dados, fez-se a composição dos seguintes indicadores, que se

constituem nas variáveis a serem comparadas antes e depois da data da aquisição:

• Capital de Giro: ([Exigível de Longo Prazo + Patrimônio Líquido] – [Realizável

de Longo Prazo + Ativo Permanente])

• Necessidade de Capital de Giro: (Ativo Circulante Cíclico – Passivo Circulante

Cíclico)

• Saldo de Tesouraria: (Ativo Circulante Errático – Passivo Circulante Errático)

d) O modelo Fleuriet

Julgamos ser importante avaliar as empresas que passaram por processos de

aquisição de acordo com o modelo Fleuriet de análise financeira, uma vez que a

falta de capital de giro e/ou a necessidade de capital de giro levam a empresa a

buscar outras fontes de recursos para financiar suas atividades, alterando a compo-

Page 80: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 76

sição de sua estrutura de capital.

Através do modelo Fleuriet, podemos calcular qual o capital de giro da empresa,

bem como a sua real necessidade de capital de giro e, ainda, como ela é financiada,

se pelo próprio capital de giro ou por fontes não vinculadas ao negócio, como

financiamentos bancários.

Conhecendo os três indicadores (Capital de Giro ou CDG, Necessidade de Capital

de Giro ou NCG e Saldo de Tesouraria ou simplesmente T), a empresa ganha

elementos de gerenciamento que podem ser utilizados para melhorar a sua

performance de liquidez no curto prazo, administrando as variáveis que causam

impactos positivos e negativos sobre esses elementos.

De acordo com o modelo Fleuriet, para se determinar o capital de giro de uma

empresa, basta calcular a diferença entre as suas fontes de recursos de longo prazo

(exigível de longo prazo + patrimônio líquido) e as suas aplicações de longo prazo

(realizável de longo prazo + ativo permanente). Uma empresa possui capital de giro

quando consegue captar mais recursos de longo prazo do que aplicar. Essa "sobra"

fica aplicada no curto prazo, como uma margem de segurança. Por outro lado,

quando as aplicações de longo prazo são superiores às fontes de recursos de longo

prazo, a empresa apresenta-se com falta de capital de giro, necessitando buscar

recursos em outras fontes para "cobrir" a diferença.

Assim, CDG = Fontes de Longo Prazo (ELP + PL) – Aplicações de Longo Prazo

(RLP + AP).

Quando positivo, o CDG torna-se fonte de recursos para a empresa e, quando

negativo, torna-se uma necessidade de aplicação.

A NCG é calculada pela diferença entre o Ativo Circulante Cíclico (investimentos

para financiar, básicamente, estoques e clientes) e Passivo Circulante Cíclico

(financiamentos obtidos com as fontes que mantêm vínculo direto com a operação

Page 81: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 77

da empresa, também chamadas de fontes não onerosas, como fornecedores,

funcionários, prestadores de serviços, impostos operacionais a recolher e outras).

NCG = Ativo Circulante Cíclico (Clientes + Estoques) – Passivo Circulante Cíclico

(Fornecedores, Salários a Pagar, Impostos a Recolher).

Quando positiva, a NCG torna-se uma necessidade de aplicação para a empresa e,

quando negativa, torna-se para ela fonte de recursos não onerosos, isto é, que não

oneram a empresa financeiramente.

Já o Saldo de Tesouraria – T – é calculado pela diferença entre o Ativo Circulante

Errático (Caixa, Bancos, Aplicações Financeiras) e o Passivo Circulante Errático

(Empréstimos Bancários, Financiamentos em Geral, Dividendos a Pagar).

T = Ativo Circulante Errático – Passivo Circulante Errático

Quando positivo, T representa uma aplicação de recursos fora da atividade básica

da empresa, expressando uma margem de segurança de curto prazo em relação

aos seus financiamentos de curto prazo.

Quando T é negativo, ele representa o risco financeiro de curto prazo, ao qual a

empresa está submetida, em função do volume de financiamentos provenientes de

fontes onerosas ser superior às aplicações que ela mantém fora da atividade.

Esses indicadores do modelo Fleuriet, portanto, podem ajudar a explicar as

oscilações nos financiamentos e na estrutura de capital das empresas, o que vem ao

encontro dos objetivos deste trabalho.

e) Métodos estatísticos

Nosso objetivo central de levantar indicadores de gerenciamento de liquidez de curto

prazo de empresas adquiridas em processos abertos de aquisição, comparando-os

Page 82: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 78

com a situação antes de tais processos, é atendido por meio de testes não

paramétricos de Mann-Whitney. Nesse sentido, é forçoso esclarecer acerca da

pertinência desses testes, na medida em que a base de dados de que dispomos não

é extensa o suficiente para podermos recorrer ao Teorema do Limite Central e

utilizarmos a distribuição normal (com seus parâmetros de média e desvio padrão).

Além disso, não sabemos qual a distribuição obedecida pelo tipo de dados com que

trabalhamos e, portanto, temos aí novo motivo para recorrer a testes não

paramétricos.

Conforme colocado logo acima, empregamos o método de Mann-Whitney, o qual

tem características bastante atraentes para proceder a comparações de amostras e

concluir se as mesmas provêm de mesma população ou de populações distintas. No

que interessa aos propósitos deste estudo, buscamos também comparar dois grupos

de dados financeiros, a saber: aqueles relativos ao período antes da aquisição e os

do período posterior, buscando verificar se podemos ou não admitir se eles são de

mesma "população". Em outros termos, esse processo estatístico permite verificar

se hábitos financeiros da empresa adquirida são mantidos ou alterados após a

compra. Por exemplo, se a interpretação dos resultados de um teste for a de que as

populações são diferentes, ela servirá como evidência de que o processo de

aquisição de fato levou a mudanças no gerenciamento de liquidez de curto prazo da

empresa sob análise.

O teste é operado a partir da estatística de teste U dada por: ,

( )

111

21 21 RnnnnU −

++=

em que e são os números de observações de cada população e a soma

dos "rankings" da primeira população. 1n 2n 1R

Além disso, a hipótese nula do teste é de que as posições centrais das duas

populações analisadas em conjunto são idênticas, com o que assumimos que

também idênticas são suas distribuições. Dessa forma, a hipótese nula é:

Page 83: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPITULO 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA 79

210 : µµ =H

ou seja, as médias das duas populações são iguais. Por sua vez, a hipótese

alternativa será de que tais médias são diferentes, ou:

211 : µµ ≠H

Para tanto, temos como oposto à estatística U o seu próprio valor esperado, dado

por:

( )2

21nnUE u == µ

e sua variância por:

( )12

121212 ++=

nnnnuσ

Com isso e dada a observação de que a distribuição U se aproxima da Normal à

medida em que aumentam os números de observações de cada amostra, segue-se

daí podermos utilizar o procedimento corrente de testes de hipóteses sobre a

estatística dada por: ,Z

u

uUZσ

µ−=

com o qual levantamos p-values que nos expressem margens de erro com que

rejeitamos a hipótese nula e, conseqüentemente, aceitamos a hipótese alternativa

de que de fato as populações são diferentes.

Page 84: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 RESULTADOS DA PESQUISA

Page 85: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

81

4.1 Aspectos gerais

Nossa proposta para este estudo era o de verificar o comportamento dos indicadores

de gerenciamento da liquidez de curto prazo, de acordo com as definições do

modelo Fleuriet de análise financeira, de empresas que foram submetidas a

processos de fusão ou aquisição após o Plano Real.

Dada a dificuldade em se obter informações precisas a respeito da data da aquisição

ou fusão e ainda sobre os nomes da empresas envolvidas, recorremos a

levantamentos efetuados através de notícias veiculadas na imprensa e também por

publicações especializadas, cruzando essas informações com bancos de dados da

Economática e da LAFIS, em um verdadeiro trabalho de "garimpagem". Como nosso

objetivo era o de comparar esses indicadores, antes e depois do processo de

aquisição, nossa amostra ficou ainda mais restrita em função de só podermos

trabalhar com empresas que publicam seus demonstrativos contábeis.

Neste processo e tendo em conta tais restrições, logramos identificar treze empresas

que foram adquiridas e que atendiam também às nossas condições de pesquisa,

conforme relação colocada no capítulo anterior. O levantamento dos dados

contábeis das empresas, de acordo com as informações disponibilizadas na

Economática, permitiu-nos calcular as principais categorias de análise do modelo

Fleuriet, a saber: Capital de Giro (CDG), Necessidade de Capital de Giro (NCG) e

Saldo de Tesouraria (T), para cada uma das empresas selecionadas e relativas aos

períodos anteriores e posteriores ao processo de aquisição em que se viram

envolvidas. Ainda mais, a experiência adquirida ao longo do trabalho, levou-nos a

adotar o critério de proceder às comparações com igual número de observações

para cada um dos períodos. A razão crítica para tanto foi o fato de que, em especial,

um prazo excessivamente longo para o período pré-aquisição viesava os resultados

por naturalmente apontar valores baixos para as variáveis selecionadas, dado o

processo de crescimento em que elas se envolviam. Já o período pós-aquisição, de

amplitude tempo menor, as empresas já estão no seu tamanho máximo e, portanto,

as variáveis analisadas são naturalmente maiores do que no período anterior, pré-

Page 86: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

82

aquisição.

Enfim, com a análise conjunta dos indicadores de capital de giro, necessidade de

capital de giro e saldo de tesouraria, é possível estabelecer uma relação de como as

empresas financiam suas necessidade correntes: se através do próprio capital de

giro ou através de fontes não operacionais, como os financiamentos bancários de

curto prazo.

De acordo com o modelo Fleuriet de análise financeira, o capital de giro, quando

positivo, torna-se fonte de recursos para a empresa, os quais podem ser utilizados

para financiar sua necessidade de capital de giro ou ainda para aplicações fora da

operação. Quando negativo, o capital de giro torna-se uma necessidade de

aplicação, devendo a empresa buscar fontes de recursos para tal.

Já a categoria de análise da NCG, quando positiva, torna-se uma necessidade de

financiamento, devendo a empresa supri-la com seu capital de giro ou buscando

fontes de recursos onerosas para tanto. Quando negativa, a NCG torna-se uma

fonte de recursos para a empresa, uma vez que ela passa a trabalhar com recursos

de terceiros não onerosos, que podem ser aplicados para "cobrir" uma eventual falta

de capital de giro ou, ainda, ser usada em aplicações fora da atividade básica da

empresa.

Com relação ao Saldo de Tesouraria, T, quando positivo, ele indica que a empresa

mantém uma margem de segurança financeira de curto prazo, pois as aplicações

que ela mantém fora de sua atividade são superiores aos financiamentos obtidos

com fontes não operacionais. Quando negativo, esse indicador mostra que a

empresa está necessitando buscar recursos fora da sua operação para financiar

suas atividades, tanto para cobrir a necessidade de capital de giro, como para suprir

uma falta de capital de giro. Nesse caso, T representa uma medida de risco

financeiro da empresa no curto prazo.

O tratamento estatístico dessas observações foi feito por meio de testes não para-

Page 87: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

83

métricos, já que a nossa amostra não apresentou tamanho suficiente para nos

"socorrermos" com o Teorema do Limite Central, pelo qual admitiríamos a ocorrência

da distribuição normal das variáveis selecionadas. Nesse sentido, utilizamos o

método de Mann-Whitney, que possui características que se adequam ao tipo de

estudo que realizamos, no qual o número reduzido de observações impede-nos de

utilizar os parâmetros de média e de desvio padrão.

Dessa forma, cada um dos três elementos do modelo Fleuriet (CDG, NCG e T)

recebeu tratamento estatístico isolado, com comparações de valores para cada

empresa, antes e depois do processo de aquisição. Se os resultados dos testes

indicam que as populações (valores anteriores e valores posteriores) são diferentes,

significa dizer que há evidências de que o processo de aquisição realmente levou a

mudanças na forma de financiamento e de gerenciamento da liquidez de curto prazo

da empresa analisada.

Além disso, a análise dos p-values encontrados permite determinar com que

margem de erro estaremos rejeitando ou aceitando a hipótese de que as populações

são diferentes ou, em outras palavras, que os processos de aquisição de fato

determinam mudanças no comportamento das empresas, no que diz respeito ao

gerenciamento da liquidez no curto prazo.

4.2 Resultados da pesquisa

Como a amostra sobre a qual trabalhamos, apesar de pequena, é diversificada em

relação ao segmento das empresas, faremos uma análise individual, procurando

estabelecer relações entre as poucas empresas pertencentes a um mesmo ramo de

atividades.

Page 88: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

84

CASO 1: LOJAS RENNER

Observação: adquirida em dezembro de 1998 pela J.C.PENNEY BRAZIL.

Nossa análise se deu sobre 28 observações, sendo 14 para o período antes da

aquisição e outras 14 para o período após o evento. Quanto às estatísticas obtidas

pela aplicação do teste U de Mann-Whitney, estas foram:

TABELA 1 Estatísticas de teste para as Lojas Renner

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 2,6879 4,0204 3,2852 Mediana Anterior 50.567,00 41.899,00 25.487,00 Mediana Posterior 80.830,00 111.445,50 -7.958,00 p-value 0,0072 0,0000 0,0010 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação.

Análise

Os resultados indicam forte evidência de ter havido aumento da necessidade de

capital de giro – NCG - da empresa, o que se confirma pelas medianas obtidas:

anterior de R$50567 e posterior de R$80830. Em se tratando de loja de

departamentos, existe uma forte correlação entre elevação do nível de atividades

com aumento da necessidade de capital de giro, visto que tais aumentos, nesse

segmento geralmente implicam maiores volumes de vendas, o que normalmente

acarreta acréscimos de estoques e mais financiamentos a clientes, o que aumenta a

necessidade de recursos para tais aplicações.

Os resultados para a variável Capital de Giro – CDG – apontam na mesma direção,

indicando com grau de certeza superior a 99% ter havido aumento do capital de giro

da empresa após a aquisição. Como o capital de giro é obtido pela diferença entre

as fontes de recursos de longo prazo (Exigíveis de Longo Prazo + Patrimônio Líqui-

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

85

do) e as aplicações de longo prazo (Realizáveis a Longo Prazo + Ativo Permanente),

o aumento mostra-se compatível com a situação, pelos seguintes motivos:

• Em processos de aquisição, é comum haver injeção de recursos próprios na

empresa adquirida (o que aumenta o patrimônio líquido);

• Aumento do nível de atividades normalmente leva a aumento de lucros, o que

gera incremento no patrimônio líquido;

• Investimentos realizados em empresas adquiridas (a própria aquisição ou a

sua expansão) podem ser feitos com recursos de longo prazo, especialmente

quando a adquirente é empresa multinacional (como, aqui, é o caso),

originária de países onde se encontram linhas de financiamento de longo

prazo em maior abundância quando comparada à situação no Brasil, o que

aumenta o exigível a longo prazo.

Com relação ao Saldo de Tesouraria – T -, pode-se afirmar, com mais de 99% de

certeza, que existem fortes indícios de mudança de uma situação para outra, o que

pode ser corroborado pela análise de diferenças de medianas. No caso específico,

os resultados dos testes vão ao encontro da teoria, uma vez que na situação anterior

ao processo, a empresa trabalhava com capital de giro suficiente para financiar a

sua necessidade de capital de giro e ainda sobrava para aplicações não vinculadas

às suas operações (saldo de tesouraria positivo). Com o provável aumento do nível

de atividades, a empresa passou a demandar mais recursos para financiá-las

(aumento da NCG) e, mesmo havendo aumento do capital de giro, este se mostrou

insuficiente para supri-la, tendo a empresa que recorrer a fontes de recursos

onerosos (não operacionais) para fazer a complementação. Dessa forma, o saldo de

tesouraria passou de aplicação (positivo) a fonte de recursos (negativo).

Pode-se concluir, então, que a empresa, após a aquisição, passou a trabalhar com

maior participação de capitais de terceiros em sua estrutura, aumentando seu risco

financeiro, especialmente o de curto prazo, em relação à situação anterior.

Page 90: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

86

CASO 2: ARNO

Observação: adquirida em fevereiro de 1998 pela SEB Internationale S/A.

Nossa análise se deu sobre 16 observações e os resultados do teste U de Mann-

Whitney foram os seguintes:

TABELA 2 Estatísticas de teste para a empresa Arno

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 1,9428 1,4177 1,5228 Mediana Anterior 81.226,50 155.683,50 104.309,50 Mediana Posterior 55.953,50 166.259,00 86.279,00 p-value 0,0520 0,1562 0,1278 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. Nesse caso, os resultados para a variável NCG apontam, com 95% de confiança,

para uma redução da necessidade de capital de giro da empresa. Tal redução

acontece quando há variações significativas na operação, como redução do nível de

atividades, melhores negociações com fornecedores, conseguindo-se maiores

prazos para pagamento, diminuição dos volumes de estoques ou ainda

encolhimento dos prazos concedidos aos clientes. A aquisição por uma empresa

estrangeira, com cultura diferente, pode ter levado a Arno à adoção de novas

práticas operacionais e comerciais que justifiquem a diminuição da NCG.

Já para a variável capital de giro, os resultados dos testes indicam um incremento na

situação pós-aquisição, que poderia advir de injeção de recursos, mas não há base

estatística suficiente para se fazer tal afirmação, tendo em vista que o nível de

confiabilidade encontra-se abaixo de 85%.

A variável Saldo de Tesouraria, T, indica ter havido também uma redução dos

volumes de recursos aplicados fora da operação da empresa, indo ao encontro da

Page 91: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

87

hipótese de uma possível redução de atividades, apesar de tal afirmativa poder ser

colocada somente com grau de certeza de 87,22% (= 1 – 0,1278).

Dentro do que nos é permitido avaliar, em função dos testes e do nível de

confiabilidade dos mesmos, podemos inferir que esta empresa reduziu o seu nível

de atividades, atuando de forma mais conservadora no que diz respeito aos

aspectos de gerenciamento da liquidez de curto prazo, passando a operar com baixo

risco financeiro no período pós-aquisição.

CASO 3: GRADIENTE

Observação: adquirida em maio de 1997 pela Nokia.

Coletamos 40 observações, chegando aos seguintes resultados para o teste U de

Mann-Whitney:

TABELA 3 Estatísticas de teste para a empresa Gradiente

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 3,2865 1,2848 0,6627 Mediana Anterior -2.374,50 48.944,50 7.169,50 Mediana Posterior 42.543,00 -17.914,50 -9.402,00 p-value 0,0010 0,1988 0,5075 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. No caso da Gradiente, há fortes evidências de aumento da necessidade de capital

de giro da empresa. Podemos afirmar, com 99,90% de certeza (= 1 - 0,0010), que

houve um crescimento acentuado da NCG, que passou de fonte de recursos no

período pré-aquisição (NCG negativa) para uma necessidade significativa de

aplicação de recursos no período pós aquisição (NCG positiva).

Page 92: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

88

Apesar do grau de confiabilidade para a variável CDG situar-se no patamar de

80,12%, os resultados dos testes para esta variável encontram-se consoantes com

os encontrados para NCG, indicando uma possível inversão de recursos em ativos

permanentes (CDG passou de positivo para negativo, indicando ter havido mais

investimentos de longo prazo do que fontes de recursos de longo prazo). Pode-se

inferir daí, ter havido aporte de investimentos para elevação do volume de

operações da empresa, o que a levaria a demandar por mais recursos para financiar

suas atividades operacionais (aumento da NCG) e também para os ativos fixos,

consumindo todo o capital de giro existente anteriormente.

Com relação à variável T, apesar do elevado grau de incerteza – 50% −, pode-se

verificar que os resultados apontam no sentido de corroborarmos a hipótese acima

levantada, pois T deixa de ser aplicação de recursos para tornar-se fonte.

Finalizando, a empresa estaria passando de uma situação (pré-aquisição) em que o

CDG financiava toda a NCG e mais as aplicações fora da sua atividade básica para

uma outra (pós-aquisição), em que são realizados investimentos em ativos fixos, que

levam naturalmente a aumento do volume de operações que, por sua vez, implicam

a ampliação da necessidade de capital de giro. A falta de capital de giro e o

crescimento da necessidade de capital de giro passam a ser financiados por

recursos de terceiros de curto prazo, o que eleva o risco financeiro da empresa, vis-

à-vis o saldo de tesouraria negativo.

Vale destacar que os baixos níveis de confiabilidade para as variáveis CDG e T não

permitem corroborar tais afirmativas de forma definitiva, mas, por outro lado, a

diferença de medianas em si ratifica a hipótese levantada.

CASO 4: CEBRACTEX

Observação: adquirida em junho de 1997 pela Coteminas – Cia. de Tecidos do

Norte de Minas S/A .

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

89

Foram coletadas 24 observações, com o teste U de Mann-Whitney apontando os

seguintes resultados:

TABELA 4 Estatísticas de teste para Cebractex

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 0,8948 0,0866 1,1258

Mediana Anterior 18.983,00 15.217,00 4.244,00

Mediana Posterior 10.698,50 18.507,50 8.826,50

p-value 0,3708 0,9309 0,2602 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação.

No caso da Cebractex, não obtivemos bases estatísticas para fazer afirmativas

definitivas acerca dos resultados para todas as variáveis estudadas, uma vez que os

níveis de confiabilidade foram muito baixos. Em especial, o aumento para a variável

de saldo de tesouraria somente pode ser referendado em 73,98% de certeza (= 1 –

0,2602), em que pese o aumento substancial de medianas de um período para

outro.

Também para as demais variáveis, as medianas encontradas apontam em uma

direção na qual é possível vislumbrar a hipótese de redução da necessidade de

capital de giro por meio de melhores práticas operacionais (melhor gerenciamento

de estoques, aumento de produtividade, redução do tempo de permanência do

produto acabado em estoque), já que a empresa, de menor porte, foi adquirida por

uma das grandes do setor. Esses fatores, aliados ao maior poder de barganha junto

a fornecedores e clientes, podem contribuir para redução da necessidade de capital

de giro e, ainda, para aumento do capital de giro, em decorrência de melhores

resultados. Existindo maiores sobras de recursos operacionais, estes tendem a ser

aplicados fora da operação, o que leva a um saldo de tesouraria – T − positivo maior.

Page 94: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

90

A situação descrita se configura como sendo confortável sob os aspectos de risco,

na medida em que há redução tanto do risco financeiro (aumento do T positivo),

como ainda do risco operacional (melhor controle de custos e ampliação de

resultados).

CASO 5: COTEMINAS

Observação: adquiriu a Cebractex em junho de 1997.

As observações, em número de 42, foram submetidas ao teste U de Mann-Whitney,

com os seguintes resultados:

TABELA 5

Estatísticas de teste para Coteminas

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 5,5342 5,5091 1,3332

Mediana Anterior 29.778,00 337.440,00 28.748,00 Mediana Posterior 251.141,00 71.119,00 58.072,00 p-value 0,0000 0,0000 0,1824 Fonte: Elaborada pelo autor da dissertação. Logramos êxito em também coletar os dados desta empresa, adquirente da

Cebractex. Há fortes evidências de ter havido aumento acentuado na NCG e, em

contrapartida, com o mesmo nível de confiabilidade, que o capital de giro da

empresa foi reduzido substancialmente.

Esta empresa, como de resto várias outras empresas do setor têxtil brasileiro,

passou por enormes dificuldades em relação à entrada de produtos estrangeiros no

mercado brasileiro a preços mais baixos. Para enfrentar a concorrência, as

empresas que não sucumbiram ao "ataque", tiveram que modernizar o parque

industrial, fazendo investimentos vultosos em máquinas e equipamentos,

comprometendo o capital de giro. Em decorrência dessas inversões operacionais,

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

91

estas empresas aumentaram substancialmente sua capacidade produtiva, gerando

maior necessidade de recursos para financiamento das operações (forte aumento na

necessidade de capital de giro), pois elevaram-se os níveis de estoques e o volume

de recursos aplicados no financiamento aos clientes.

O fato da variável T apresentar-se em crescimento, apesar do baixo nível de

significância indicado pelo p-value de 0,1824 (ou certeza de 8176%), parece indicar

que os investimentos foram realizados com recursos de longo prazo, o que deixa a

empresa em uma situação de risco de curto prazo relativamente confortável, com

saldo de Tesouraria positivo.

CASO 6: CHAPECÓ

Observação: adquirida em janeiro de 1998 pelo Grupo Macri/Alimbrás.

Coletadas 32 observações, cujo teste U de Mann-Whitney, apontou os seguintes

resultados:

TABELA 6 Estatísticas de teste para Chapecó

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 1,3002 0.8856 0,35805 Mediana Anterior -98,00 -2.751,00 -3.754,00 Mediana Posterior -1.317,50 -4.170,00 -2.746,00 p-value 0,1935 0,3557 0,7203 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. No caso da Chapecó, os testes indicam que não temos bases estatísticas

suficientemente amplas para afirmar ter havido mudanças na estrutura de

financiamento da mesma após o processo de aquisição. Tal fato é corroborado pelas

medianas relativas a cada uma das variáveis, indicando uma situação de continuida-

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

92

de da política de gerenciamento da liquidez de curto prazo da empresa.

De acordo com essa hipótese, a empresa estaria operando em situação de risco

financeiro elevado, na medida em que a falta de capital de giro seria financiada em

parte por capitais operacionais (NCG negativa) e ainda por fontes onerosas sem

vínculo com a operação da empresa (T negativo).

CASO 7: ELEVADORES ATLAS

Observação: adquirida em maio de 1999 pela Schindler.

A aplicação do teste U de Mann-Whitney às 24 observações coletadas propiciou os

resultados a seguir: TABELA 7

Estatísticas de teste para Elevadores Atlas

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 3,7239 3,6084 3,9548 Mediana Anterior 123563,50 49473,00 -90255,50 Mediana Posterior 190838,00 -64517,00 -252569,50 p-value 0,0001 0,0003 0,0000 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. No caso da empresa Elevadores Atlas, os p-values indicam evidências significativas

para conclusões acerca de todas as variáveis, permitindo afirmar que houve

mudanças na situação de liquidez da empresa no curto prazo após a aquisição e

que essas mudanças ratificam plenamente a teoria do modelo Fleuriet de análise

financeira.

Assim é que, sendo uma empresa de menor porte, adquirida por um concorrente

maior, é normal se esperar que a empresa passe por processos de reestruturação,

principalmente na área produtiva, com objetivo de aumentar a capacidade produtiva.

Page 97: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

93

A hipótese estaria configurada pelos resultados mostrados para a variável Capital de

Giro – CDG - , que passa de fonte de recursos para a empresa (positivo) para

necessidade de aplicação (negativo), o que se explicaria por elevados investimentos

em ativos de longo prazo.

Na maioria das vezes, o aumento de produção leva à elevação do volume de

recursos necessários para financiar aumentos de estoques e financiar novos

clientes, o que acarreta em aumento da necessidade de capital de giro – NCG -, o

que se configura plenamente nesta situação. Portanto, necessitando de mais capital

de giro para bancar as suas operações e não sendo possível obtê-lo, a empresa se

vê obrigada a financiar a necessidade com recursos de terceiros de curto prazo,

elevando o saldo negativo de tesouraria e aumentando o risco financeiro da

empresa no curto prazo, situação esta que os resultados para a variável T vêm

ratificar.

Esta empresa, então, estaria elevando seu risco financeiro após o processo de

aquisição para financiar sua falta de capital de giro (que provavelmente foi

imobilizado) e o aumento da sua necessidade de capital de giro, decorrente do

acréscimo no volume de operações. Enfim, temos aqui uma situação caracterizada

no modelo Fleuriet como sendo de alto risco e evidenciada pela mudança radical

nos indicadores propiciados pelas medianas e confirmada pelos baixos p-values.

CASO 8: POLIPROPILENO

Observação: adquirida em fevereiro de 1996 pela Suzano.

Os resultados a seguir foram obtidos da aplicação do teste U de Mann-Whitney a 48

observações para esta empresa.

Page 98: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

94

TABELA 8 Estatísticas de teste para Polipropileno

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 4,2888 1,2062 2,7114

Mediana Anterior -49,50 -3.162,00 -3.110,50 Mediana Posterior 0,00 -5.042,50 -5.211,50 p-value 0,0000 0,2277 0,0066 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. No caso acima, pode-se afirmar, com elevado grau de certeza, que houve mudança

sensível para a variável NCG. Na situação pré-aquisição, a posição da empresa era

confortável em relação à necessidade de capital de giro, pois, sendo ela negativa,

isso implicava que a empresa dispunha de recursos não onerosos de terceiros em

volume superior ao demandado para financiar suas atividades operacionais. Após o

processo de aquisição, a disponibilidade deixa de existir, não mais se constituindo

em fonte de recursos para a empresa.

Para a variável CDG, o baixo nível de confiabilidade sugerido pelo p-value de 0,2277

não permite concluir pela mudança no seu rumo pós processo de aquisição. No

entanto, as medianas das situações pré e pós aquisição nos levam a inferir que a

empresa possa ter realizado mais investimentos em ativos fixos, uma vez que a falta

de capital de giro (mais aplicações de longo prazo do que fontes de recursos de

longo prazo) se acentua. Deve-se realçar que essa falta de capital de giro era

atenuada na situação anterior ao processo de aquisição pela necessidade de capital

de giro negativa, que se tornava fonte de recursos no sentido de, ao menos

parcialmente, poder "cobrir" a falta de capital de giro.

A variação ocorrida no saldo de tesouraria vem ao encontro dessa hipótese e se

comporta de acordo com os preceitos do modelo Fleuriet. Antes do processo de

aquisição, o saldo negativo de tesouraria era menor, porque a necessidade de

financiamentos por fontes não vinculadas à operação da empresa se restringia à

cobertura parcial da falta de capital de giro, uma vez que uma outra parcela era su-

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

95

prida pela necessidade de capital de giro negativa. Após o processo de aquisição, a

maior demanda por recursos para financiamento do crescimento das operações leva

a que essa fonte de recursos deixe de existir. Ainda mais, temos o fato de a falta de

capital de giro ter se acentuado, possivelmente em decorrência de maiores

investimentos operacionais. Tudo isso somado, temos, como conseqüência, que a

falta de capital de giro passa a ser maior, ao mesmo tempo em que a necessidade

de capital de giro deixa de ser fonte de recursos. Enfim, a empresa se vê obrigada a

buscar maior volume de financiamentos onerosos de terceiros no curto prazo,

elevando o saldo negativo de tesouraria.

Sob o enfoque da liquidez e do risco de curto prazo, a empresa, no período pós

aquisição, passa para uma situação de maior risco e, consequentemente, menor

liquidez.

CASO 9: SUZANO

Observação: adquiriu a Polipropileno em fevereiro de 1996.

A análise do processo de aquisição da Polipropileno e conseqüentemente

direcionamento de sua administração financeira pode ser melhor entendida a partir

das 52 observações coletadas para a empresa adquirente, a Suzano, cujos

resultados em termos do teste U de Mann-Whitney, são apresentados abaixo.

TABELA 9 Estatísticas de teste para Suzano

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 1,6196 5,3530 5,5544 Mediana Anterior 168.535,50 228.529,00 17.585,00 Mediana Posterior 218.031,00 -13.738,50 -224.700,00 p-value 0,1053 0,0000 0,0000 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação.

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

96

As mudanças ocorridas para as três variáveis estão de acordo com o esperado, a

partir das formulações do modelo Fleuriet, para o qual processos de aquisição como

a efetuada pela Suzano levam naturalmente a maiores níveis de investimentos

operacionais. A partir disso, temos geralmente aumento no volume de negócios e

conseqüente ampliação na necessidade de recursos para financiamento dessa

expansão, tanto da capacidade produtiva quanto do acréscimo de negócios.

Os resultados dos testes caminham na mesma direção desta teoria, visto que a

necessidade de capital de giro – NCG – eleva-se após a aquisição, indicando,

possivelmente, aumento do volume de operações e maior demanda de recursos

para financiar estoques e clientes. Quanto à estatística do p-value, seu valor de

0,1053 para esta variável implica grau de certeza de 89,47% quanto às conclusões

expostas, o que não pode ser interpretado como suporte inteiramente satisfatório

para tanto.

Por sua vez, as conclusões sobre o capital de giro se fazem sobre bases estatísticas

sólidas, a par do p-values que se aproximam muito do zero absoluto. Assim é que o

capital de giro deixa de ser fonte de recursos para a empresa (CDG positivo na

situação anterior ao processo) para se tornar uma necessidade de aplicação (CDG

negativo), levando-nos a inferir que, no período posterior ao processo de aquisição,

a empresa realizou investimentos elevados no sentido de expandir sua capacidade

produtiva, configurando uma situação de falta de capital de giro.

Com a elevação do nível de operações e a falta de capital de giro, a empresa passa

a buscar maiores volumes de recursos nas fontes onerosas, o que se explica pela

elevação substancial do saldo de tesouraria, T. No período de pré-aquisição, o valor

era positivo, indicando uma margem de segurança financeira de curto prazo, ou seja,

a empresa dispunha de aplicações fora da sua atividade em volume superior às

fontes de recursos sem vínculo com o negócio. Entretanto, a partir do período em

que se processa a aquisição, a NCG passa a crescer e o CDG deixa de ser fonte de

recursos, como que obrigando a empresa a suprir suas carências com

financiamentos de curto prazo, o que torna T negativo.

Page 101: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

97

Em resumo, constatamos que, em relação ao risco de curto prazo, a empresa passa

de uma situação confortável, na qual a NCG era totalmente financiada pelo CDG e

ainda havia sobra de recursos para serem aplicados fora da operação, para uma

situação oposta de risco elevado. Assim é que a NCG é maior, não há mais capital

de giro positivo e o saldo de tesouraria deixa de se constituir em margem de

segurança para se tornar uma representação do risco financeiro da empresa no

curto prazo.

CASO 10: COFAP

Observação: adquirida em outubro de 1997 pela Magnetti Marelli.

Foram coletadas 34 observações, às quais aplicou-se o teste U de Mann-Whitney,

cujos resultados são os seguintes:

TABELA 10 Estatísticas de teste para COFAP

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 2,6521 0,6199 1,5155 Mediana Anterior 25.304,00 -1.611,00 -19.466,00 Mediana Posterior -16.407,00 -5.729,00 11.163,00 p-value 0,0079 0,5352 0,1296 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. Em se tratando de uma empresa do setor de autopeças, os resultados dos testes

para a variável NCG chegam a ser surpreendentes, uma vez que este segmento

caracteriza-se por apresentar a necessidade de capital de giro positiva, visto que

geralmente suas empresas trabalham com um volume razoável de estoques e saldo

de elevados volumes de recursos para financiamento de clientes. Assim é que

estoques e financiamento a clientes são essenciais nesse tipo de atividade, pois o

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

98

mercado consumidor dessas empresas é formado por montadoras e grandes

distribuidores para o mercado de reposição, ambos bastante exigentes quanto a

prazos de entrega e pagamento.

Sendo assim, a mudança para a variável NCG, de positiva na situação pré-

aquisição, para negativa no período posterior, não deixa de ser uma surpresa. Para

as outras duas variáveis – CDG e T – o nível de confiabilidade, para se afirmar

acerca de mudanças nos processos de financiamentos de empresas, é muito baixo,

o que prejudica a análise. De qualquer forma, isso não nos impede de formular a

ilação de que a empresa, após ser adquirida, tenha passado a fabricar apenas para

a sua adquirente, a qual passa a se responsabilizar pelo processo de

comercialização. Diante do exposto, é possível justificar as variações apresentadas

pelas medianas das três variáveis:

• A NCG deixa de ser positiva e passa a ser negativa em função de acordo de

fornecimento com condições de recebimento mais vantajosas para a

adquirida em relação à situação anterior, por se tratar de um fornecimento

"interno";

• O CDG passa de positivo a negativo, evidenciando maiores investimentos em

ativo fixo, o que normalmente se torna presente nesses processos de

aquisição, pois um dos principais motivos para que uma empresa se envolva

nesses processos, é a expansão de seus negócios.

• T deixa de ser negativo, numa situação em que o volume de recursos para

financiar as operações era elevado, para uma posição confortável,

expressando margem de segurança financeira no curto prazo. A mudança é

justificável em função da NCG passar a ser fonte de recursos capaz de

financiar a falta de capital de giro e ainda haver sobras para serem aplicadas

fora da operação.

Assim é que as estatísticas de teste levantadas apontam para a situação em que a

Page 103: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

99

empresa passa de uma situação de risco financeiro a curto prazo para uma outra

bem mais tranqüila, com razoável margem de segurança financeira.

CASO 11: FRAS-LE

Observação: adquirida em janeiro de 1996 pela Randopar.

As 50 observações coletadas foram tratadas estatisticamente com base no teste U

de Mann-Whitney, e os resultados são mostrados abaixo:

TABELA 11 Estatísticas de teste para FRAS-LE

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 0,9507 0,3104 1,6880 Mediana Anterior 21.410,00 15.897,00 -5.102,00 Mediana Posterior 20.030,00 11.304,00 -9.861,00 p-value 0,3417 0,7562 0,0914 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação.

Para as variáveis NCG e CDG, não temos base estatística suficiente para afirmar

acerca de mudanças em patamares de riscos financeiros, uma vez de o grau de

certeza é bastante baixo e as medianas obtidas não apresentam mudança de sinal.

Em outros termos, pode-se dizer que o gerenciamento financeiro da empresa

manteve-se inalterado nas situações pré e pós-aquisição.

No que se refere à variável T – Saldo de Tesouraria -, pode-se afirmar, com 90,96%

de certeza (= 1 – 0,0914), que houve recrudescimento da sua política de

gerenciamento após o processo de aquisição, o que se mostra coerente com uma

característica do setor que é a de financiar suas necessidades de recursos, tanto

para as operações cíclicas quanto para cobertura de eventual falta de capital de giro,

Page 104: ESTRUTURA DE CAPITAL APÓS PROCESSOS DE AQUISIÇÃO: …

CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

100

com fontes onerosas de curto prazo, acarretando saldo de tesouraria

crescentemente negativo. Naturalmente, isso se configura em uma situação de risco

no curto prazo para a empresa.

CASO 12: METAL LEVE

Observação: adquirida em setembro de 1998 pela Mahle Pistões S/A.

Os resultados do teste U de Mann-Whitney, sobre 50 observações coletadas, são

mostrados abaixo:

TABELA 12 Estatísticas de teste para Metal Leve

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 3,7745 3,5671 0,2903 Mediana Anterior 60.180,00 14.155,00 -38.454,00 Mediana Posterior 119.721,00 73.186,00 -40.185,00 p-value 0,0001 0,0003 0,7715 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação.

Os resultados dos testes para o caso da Metal Leve ratificam a dinâmica do modelo

Fleuriet e se apresentam de acordo com o que normalmente é esperado para

processos de aquisição, apesar de, estatisticamente, não termos condições de

apresentarmos conclusões acerca dos movimentos da variável T, em função do grau

de certeza de apenas 22,85%, explicitada pelo p-value de 0,7715.

Ainda assim, em função do observado para as outras duas variáveis – NCG e CDG

– é possível inferir que o comportamento da variável T de fato tenha sido o que é

mostrado pelas medianas, ou seja, que tenha havido um acréscimo no volume de fi-

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

101

nanciamentos onerosos de curto prazo, provocando um aumento do seu saldo

negativo.

Esse fato pode ser explicado pelo aumento significativo da NCG (que se explica por

elevação do nível de operações da empresa, normal em períodos pós-aquisição)

que requer maior volume de recursos financeiros para financiar este incremento de

atividades, fazendo com que a empresa passe a buscá-los em fontes financeiras,

elevando seu risco financeiro de curto prazo.

A variação positiva e sensível do CDG pode ser explicada pelo autofinanciamento,

isto é, o aumento de geração de lucros em decorrência do incremento das

atividades. No entanto, esse acréscimo de capital de giro parece ter sido suficiente

apenas para cobrir o aumento da necessidade de capital de giro, o que não a livra

de recorrer ao mercado financeiro.

Enfim, o caso da Metal Leve parece em linha com os da COFAP e FRAS-LE, para

as quais ficamos com o sentimento de que os aspectos de gerenciamento da

liquidez de curto prazo guardam relação entre empresas congêneres. Assim é que

como o modelo Fleuriet trabalha as variáveis de NCG, CDG e T, baseado tanto no

nível de operação da empresa, como a partir da classificação dos ativos e passivos

circulantes em cíclicos (vinculados diretamente à atividade básica da empresa) e

erráticos (sem vínculo com a atividade), é natural se esperar que empresas de

determinado setor tenham um comportamento semelhante no que diz respeito a

essas variáveis.

Apesar de contarmos com apenas três empresas desse segmento em nossa

amostra, os testes mostraram, com maior ou menor nível de confiabilidade, que as

mesmas apresentam similaridades quanto a NCG positiva sendo financiada por T

e/ou CDG. Da mesma forma, notamos que o saldo de tesouraria negativo financia a

NCG e/ou o CDG.

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

102

CASO 13: Empresas estatais privatizadas (ACESITA, CVRD E COSIPA)

Optamos por agrupar estas três últimas empresas presentes em nossa amostra,

visto terem todas elas passado por processos de privatização. Com isto, atendemos

o objetivo de verificar se haveria um comportamento padrão no que se refere à

administração da liquidez por parte de tais empresas no contexto de análise do

modelo Fleuriet.

De acordo com as premissas desse modelo, empresas desse segmento (mineração

e siderurgia) operam normalmente com necessidade de capital de giro positiva, em

função de um ciclo operacional mais longo. Elas experimentam falta de capital de

giro em razão de realizarem investimentos vultosos e constantes (empresas do setor

são também chamadas de empresas de capital intensivo), além de se verem

obrigadas a financiar a falta de capital de giro e a necessidade de capital de giro

com um saldo de tesouraria negativo, evidenciando o financiamento de suas

operações por meio de financiamentos do sistema financeiro.

A par de tais características e levando-se em consideração a tendência de expansão

das atividades quando uma empresa pública é privatizada, seria de se esperar que

os resultados dos testes para essas empresas viessem comprovar o incremento das

três variáveis na mesma direção, ou seja, que após o processo de privatização

pudéssemos verificar:

• Aumento da NCG, que se manteria positiva;

• Aumento do CDG, que se manteria negativo;

• Aumento de T, que se manteria negativo.

Com vista às análises pretendidas, temos os quadros de resultados para as três

empresas, os quais são apresentados isoladamente para cada uma delas.

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

103

CASO 13.A: ACESITA

Observação: privatizada em maio de 1998, passando a ser controlada pelo grupo

Acelor/Usinor.

A aplicação do teste U de Mann-Whitney se deu sobre 34 observações, obtendo-se

os resultados abaixo:

TABELA 13 Estatísticas de teste para Acesita

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 1,4810 2,4454 2,5832 Mediana Anterior 127.462,00 -469.226,00 --538.749,00 Mediana Posterior 156.779,00 -667.453,00 -802.998,00 p-value 0,1385 0,0144 0,0097 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. CASO 13.B: COMPANHIA VALE DO RIO DOCE - CVRD

Observação: privatizada em maio de 1997, tendo sido adquirida por um consórcio

de empresas e fundos de pensão nacionais.

O teste U de Mann-Whitney revelou os resultados abaixo, os quais se deram sobre

38 observações trimestrais.

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

104

Tabela 14 Estatísticas de teste para Cia. Vale do Rio Doce - CVRD

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 2,3063 1,8976 0,1167

Mediana Anterior 1.349.300,00 671.669,00 -787.793,00

Mediana Posterior 1.593.168,00 994.863,00 -729.224,00

p-value 0,0210 0,0577 0,9070

FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. CASO 13.C: COSIPA

Observação: privatizada em fevereiro de 1999, passando a ser controlada pela

USIMINAS.

A aplicação do teste U de Mann-Whitney sobre 30 observações trimestrais de dados

financeiros levou aos resultados a seguir:

TABELA 15 Estatísticas de teste para Cosipa

INDICADORES NCG CDG T

Estatística – t 3,9404 0,9125 0,8295 Mediana Anterior 538.935,00 -799.869,00 -991.997,00 Mediana Posterior 286.230,00 -567.168,00 -1.097.291,00 p-value 0,0000 0,3614 0,4067 FONTE - Elaborada pelo autor da dissertação. No caso da variável NCG, observamos a concordância com a postulação acima para

as empresas Acesita e CVRD, embora o aumento constatado para a primeira

somente possa ser referendado estatisticamente a um grau de certeza de 86,15% (=

1- 0,1385). Entretanto, o caso da Cosipa revela conclusão oposta e estatisticamente

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

105

significativa de queda da NCG. Nesse sentido, nossa ilação é que Cosipa logrou

reduzir sua necessidade de capital de giro por causa de ter passado a ser controlada

por uma empresa maior, a Usiminas, o que lhe permitiu maior poder de barganha

junto a clientes e fornecedores. Ainda mais, podemos creditar esse melhor

desempenho à possível absorção de melhores práticas operacionais de sua

controladora.

Em relação à variável CDG, os resultados dos testes não corroboram inteiramente

os postulados do modelo Fleuriet, pois apenas no caso da Acesita é que os

resultados vão ao seu encontro, com o CDG negativo antes do processo de

privatização tornando-se ainda mais negativo após a venda da empresa.

Naturalmente, as evidências são de elevação no nível de investimentos em ativos

fixos. Ainda mais, tal conclusão se revela estatisticamente significativa, a 98,56% de

certeza (= 1 – 0,0144).

No caso da Cosipa, o valor também é negativo, mas a mediana encontrada após o

processo de privatização aponta para uma redução no valor da variável de NCG,

ainda que, em termos estatísticos, esse dado não possa ser levado em

consideração, o que é evidenciado pelo p-value de 0,3614 (ou grau de certeza de

64,86%). Ainda assim é possível a ilação de que a redução possa ter sido promovida

pelos resultados positivos (lucros) no período pós-privatização, vis-à-vis análises

suplementares que fizemos sobre os números da empresa na base de dados da

Economática.

Já para o caso da Vale do Rio Doce, a constatação empírica vai de encontro a

teoria, pois a empresa apresenta CDG positivo antes da privatização e, após o

processo, há evidências significativas (p-value de 0,0577) de que esse valor tenha

aumentado, o que parece se justificar pelos lucros crescentes no período posterior

ao processo de venda da estatal.

Já em relação à variável de saldo de tesouraria, T, constatamos obediência aos

postulados do modelo Fleuriet, com todas as medianas revelando valores negativos.

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

106

Claro, isso confirma a hipótese de que elas financiam suas atividades por meio de

empréstimos onerosos, visto que as necessidades operacionais são bem

superiores às fontes cíclicas de financiamento.

No entanto, nosso estudo comparativo entre a situação antes e depois da

privatização ficou prejudicado neste quesito, uma vez que os testes para a Vale do

Rio Doce e Cosipa não nos permitem afirmar ter havido obediência aos ditames do

modelo, visto os baixos níveis de confiabilidade levantados, com p-values de 0,9070

para CVRD e 0,4067 para Cosipa.

Assim é que um comportamento de acordo aos preceitos do modelo Fleuriet

somente foi constatado para Acesita, a qual passa a operar com nível superior de

risco financeiro no curto prazo quando comparado com o período anterior à sua

venda. Nesse sentido, constatamos que o saldo negativo de tesouraria se eleva

fortemente e que a conclusão de mudança se dá a nível estatístico bastante amplo,

dado que o p-value de 0,0097 implica grau de certeza de 99,03% na afirmação.

4.3 Resumo de aspectos críticos

Dentre os resultados obtidos da análise sobre as 15 empresas selecionadas,

destaca-se a regularidade encontrada para a variável NCG - Necessidade de Capital

de Giro -, para a qual é possível afirmar haver indícios significativos de alteração na

situação pós-aquisição em relação à situação anterior. Esse comportamento foi

observado em 11 das 15 empresas analisadas, sendo que em 7 delas a situação

posterior foi de necessidade de capital de giro maior do que a anterior. Esses

resultados mostraram-se coerentes com as teorias que se prestam a levantar

motivos para aquisições e fusões de empresas, as quais apontam que as empresas

se envolvem nesses processos com objetivo de crescimento e de expansão. Como o

modelo Fleuriet preconiza que elevação do nível de atividades da empresa gera

maior necessidade de capital de giro, os resultados encontrados para essa variável

corroboram a teoria.

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CAPÍTULO 4 - RESULTADOS DA PESQUISA

107

Para a variável CDG − Capital de Giro −, os resultados se apresentaram com o

mesmo e elevado nível de confiabilidade, também sugerindo indícios significativos

de mudança da situação anterior para o período pós-aquisição. A propósito, tal

alteração foi constatada em 7 dos 15 casos estudados. No entanto, anotamos

alterações positivas e negativas, com quatro delas denotando redução do capital de

giro e três apontando para aumento do mesmo. Tal fato encontra explicação no

modelo Fleuriet, na medida em que este pontua que, quando cresce a necessidade

de capital de giro, também cresce a tendência de que a empresa utilize,

prioritariamente, o capital de giro para financiá-la. Ademais, é certo que as empresas

recorrem a recursos onerosos de terceiros para complementação de financiamento

nos casos em que elas se encontram numa situação de falta de capital de giro.

No entanto, no que diz respeito à variável saldo de tesouraria – T −, que nos

indicaria elevação ou redução nos níveis de risco financeiro das empresas no curto

prazo, os resultados mostraram-se surpreendentes, uma vez que, ao nível mínimo

de certeza de 90%, só temos bases estatísticas para afirmar ter havido mudança em

apenas 6 das 15 empresas analisadas. Quanto a isso, pode-se argumentar que

seria de se esperar que, com o aumento da necessidade de capital de giro

(decorrente do aumento do nível de atividades) e com a redução do próprio capital

de giro (em função de novos investimentos), fosse constatada uma mudança nesta

variável T no período pós-aquisição, exatamente em função da maior necessidade

de financiamento. Entretanto devemos realçar que, nos seis casos em que tal fato se

verificou, os resultados foram coerentes com o modelo Fleuriet, pois em todos eles a

variação ocorrida foi de aumento do risco financeiro da empresa, com o saldo de

tesouraria tornando-se cada vez mais negativo. Naturalmente, isso evidencia que o

crescimento das empresas estudadas se deu pela via do endividamento, o que

confirma nossas expectativas iniciais e ratifica a teoria de Michel Fleuriet, ao menos

nesses casos.

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CAPÍTULO 5 CONCLUSÕES

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CAPÍTULO 5 - CONCLUSÕES 109

5.1 Aspectos gerais

Nosso trabalho foi desenvolvido com o objetivo de verificar se as empresas

envolvidas em processos de aquisição e/ou privatização, na qualidade de

adquiridas, sofreram alterações em suas estruturas de capital após a consecução de

tais processos, tendo em vista que um dos fatores que geralmente levam uma

empresa a tal decisão é a necessidade de crescimento ou manutenção da sua

competitividade, o que normalmente acarreta em necessidade de maior volume de

recursos. Nesse sentido, procuramos identificar o maior número possível de

empresas adquiridas ou privatizadas, que tivessem seus dados contábeis e

financeiros disponibilizados nos bancos de dados da Economática, a partir dos quais

pudéssemos analisar a estrutura de financiamento de suas operações em períodos

trimestrais anteriores e posteriores ao processo de compra e/ou privatização. Tal

comparação, por meio de análises estatísticas calcadas em termos estatísticos não

paramétricos, permitiu aferir as mudanças ocorridas nas variáveis de liquidez de

curto prazo segundo o modelo Fleuriet de análise financeira: capital de giro (CDG),

necessidade de capital de giro (NCG) e saldo de tesouraria (T). A partir de tais

categorias de análise, pudemos levantar como as empresas financiam suas

necessidades de recursos, tanto operacionais quanto de investimentos em ativos

fixos.

Desde o início de nossa pesquisa, tínhamos a idéia de que o boom de fusões e

aquisições iniciado no país após o advento do Plano Real se deveu, em boa parte, à

necessidade das empresas brasileiras continuarem sendo competitivas em um

mercado cada vez inserido na cena global, com limitações creditícias e a par de um

mercado bursátil sensivelmente aquém das necessidades das empresas. Com tudo

isso e visando à sua sobrevivência, nossas empresas se viram na situação de se

aliar de alguma forma a congêneres, estrangeiras na maioria dos casos. Tal

expectativa se dava pelo fato de que o endividamento é a maior fonte de

financiamento das empresas nos países industrializados, sendo considerado como

alternativa viável para se alcançar o crescimento necessário para se enfrentar a

concorrência a nível global. Diante desse quadro, esperávamos encontrar indícios

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CAPÍTULO 5 - CONCLUSÕES 110

significativos da influência desses processos no nível de endividamento das

empresas adquiridas, dado que tal fato se enquadraria perfeitamente dentre as

teorias vigentes.

No que se refere à pesquisa teórica, apresentamos e contrastamos teorias que

buscam justificar ou explicar níveis de endividamento de empresas e as correlações

existentes com crescimento e riscos. De acordo com Miller (1999), gestores

baseiam-se em modelos delineados em termos basicamente quantitativos, para

otimizar funções definidas em torno de variáveis como custo de capital, retorno de

ativos e geração de valor para o acionista. Por sua vez, a idéia básica da Teoria da

Agência (Agency Theory) é de que os custos de agência são custos associados a

conflitos de interesse entre acionistas, credores e administradores. Assim é que os

credores, ao reconhecerem a existência de tais custos de agência, exigem maiores

taxas de juros, o que compromete ainda mais as empresas demandantes deste tipo

de financiamento. Um trabalho consagrado nessa linha de pesquisa é o de Myers e

Majluf (1984), que mostra como a posse assimétrica de informações entre gerentes,

acionistas e credores pode elevar o custo dos financiamentos (quando a

necessidade de recursos da empresa é coberta por empréstimos) ou ainda depreciar

o valor das ações da companhia (quando a necessidade de recursos é suprida via

emissão de novas ações).

Apresentamos, ainda, uma outra linha de pesquisa que relaciona estrutura de

financiamento com características dos produtos e estratégia da empresa, num

trabalho de Simerly e Li (2000), que se atém sobre motivos que levam empresas a

se envolverem em processos de fusões e aquisições, no sentido de que a estrutura

de capital define a estratégia da empresa, mas, por outro lado, a estratégia pode

também determinar a estrutura de capital.

Já no campo da pesquisa empírica, um trabalho de realce foi o de Seth (1990), o

qual pesquisou possíveis fontes de criação de valor em processos de fusão e

aquisição, relacionando variáveis de endividamento e alavancagem financeira a

aspectos de economias de escala, como redução de custos e ganhos de mercado. A

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CAPÍTULO 5 - CONCLUSÕES 111

partir disso, o autor pode promover um estudo comparativo das situações das

empresas antes e após tais processos, concluindo haver indícios estatísticos

significativos de que processos de fusão e aquisição alteram o comportamento das

empresas nesses aspectos de gerenciamento financeiro.

De nossa parte, também percebemos haver correlação entre estrutura de capital e

processos de aquisição de empresas, e buscamos justificar a influência desse

processo no endividamento das empresas. Assim sendo, realçamos que nosso

estudo teve natureza exploratória e descritiva e se deu através dos indicadores do

modelo Fleuriet, com a utilização concomitante de ferramentas analíticas baseadas

em testes não paramétricos, particularmente o teste U de Mann-Whitney. Quanto à

escolha deste método, realçamos que se deveu aos problemas relacionados à

montagem da amostra para análise, vis-à–vis problemas relacionadas à falta de

informações disponíveis sobre as companhias envolvidas em tais processos.

Naturalmente, estamos cientes das limitações de nossa pesquisa, pois um estudo

completo acerca dos assuntos aqui tratados demandaria um volume maior de dados,

além da seleção de novas variáveis explicativas. No entanto, o sigilo que envolve

boa parte das transações de fusões e aquisições e a falta de uma legislação mais

abrangente no que se refere à publicação dos demonstrativos contábeis e

financeiros das empresas brasileiras nos impediu de obter maiores informações

acerca dos fatos. Enfim, entendemos que o assunto,, aqui tratado, de estruturas de

financiamento de empresas envolvidas em processos de fusões e aquisições se

constitui em campo bastante extenso para pesquisa e acreditamos ter contribuído

para acrescentar conhecimentos úteis e necessários sobre o mesmo na economia

brasileira.

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