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Estudante brasileira relata Cuba através de experiências próprias e derruba mitos Postado em: 25 mai 2012 às 19:19 Luiza, estudante da UFSC, diz ter partido para Cuba com espírito aberto. “Vivi com eles e percebi como a falta de estrutura causada pelo bloqueio provoca, por exemplo, racionamento, falta de energia, limitação de medicamentos e falta de materiais escolares.” Havana, capital cubana, à noite. (Foto: Arquivo) Cursando a oitava fase do curso de licenciatura em Educação Física na Universidade Federal de Santa Catarina, a estudante participou da 19ª Brigada Sul-Americana de Solidariedade a Cuba, realizada pelo Instituto Cubano de Amizade com os Povos (ICAP) e organizada no Brasil através da Associação Cultural José Martí. Luiza, de 23 anos, participa do projeto Vitral Latino-Americano de Educação Física, Saúde e Esporte, fazendo um trabalho de pesquisa sobre a infância na América Latina. Também é bolsista do projeto “Corpo em Movimento”, no Núcleo de Desenvolvimento Infantil (NDI/UFSC). Nesta viagem pensa ter dado os primeiros passos para entender o processo político, social e educacional vivido pelo povo cubano. Após a conclusão das Brigadas, permaneceu mais cinco dias no país do Caribe, para visitar escolas e a Universidad de Ciencias de la Cultura Física y el Desportos Manuel Farjado, de Havana. Luiza afirma ter partido para Cuba com o espírito aberto. “Lá, vivi com eles, comi a mesma comida de que o povo se nutre. Descobri como os cubanos sofrem com o bloqueio, com a falta de infraestrutura e produtos, até de remédios. Tudo isso relatado por eles mesmos.”

Estudante Brasileira Relata Cuba Através de Experiências Próprias e Derruba Mitos _ Pragmatismo Político

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Estudante brasileira relata Cuba através de experiências próprias e derruba mitos

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  • Estudante brasileira relata Cuba atravs de experincias prprias e derruba mitos Postado em: 25 mai 2012 s 19:19

    Luiza, estudante da UFSC, diz ter partido para Cuba com esprito aberto. Vivi com eles e percebi como a falta de estrutura causada pelo bloqueio provoca, por exemplo, racionamento, falta de energia, limitao de medicamentos e falta de materiais escolares.

    Havana, capital cubana, noite. (Foto: Arquivo)

    Cursando a oitava fase do curso de licenciatura em Educao Fsica na Universidade Federal de Santa Catarina, a estudante participou da 19 Brigada Sul-Americana de Solidariedade a Cuba, realizada pelo Instituto Cubano de Amizade com os Povos (ICAP) e organizada no Brasil atravs da Associao Cultural Jos Mart.

    Luiza, de 23 anos, participa do projeto Vitral Latino-Americano de Educao Fsica, Sade e Esporte, fazendo um trabalho de pesquisa sobre a infncia na Amrica Latina. Tambm bolsista do projeto Corpo em Movimento, no Ncleo de Desenvolvimento Infantil (NDI/UFSC). Nesta viagem pensa ter dado os primeiros passos para entender o processo poltico, social e educacional vivido pelo povo cubano. Aps a concluso das Brigadas, permaneceu mais cinco dias no pas do Caribe, para visitar escolas e a Universidad de Ciencias de la Cultura Fsica y el Desportos Manuel Farjado, de Havana.

    Luiza afirma ter partido para Cuba com o esprito aberto. L, vivi com eles, comi a mesma comida de que o povo se nutre. Descobri como os cubanos sofrem com o bloqueio, com a falta de infraestrutura e produtos, at de remdios. Tudo isso relatado por eles mesmos.

  • Os brigadistas se alojaram no Campamento Internacional Julio Antonio Mella, na cidade de Caimito, provncia de Artemisa. Ali, assistiram a conferncias, a filmes cubanos e apresentaes artsticas, alm de visitarem museus e escolas. Participamos tambm de uma experincia de trabalho voluntrio agrcola, introduzido por Che Guevara, que os cubanos fazem questo de compartilhar como conceito, pois no se baseia em uma lgica de mercado, mas tem a proposta de formar uma conscincia coletiva que sustente o ideal socialista, diz a estudante.

    Assim, alm de conhecer cooperativas agrcolas, os participantes das Brigadas de Solidariedade trabalharam em um campo de feijo e uma plantao de manga. Visitamos tambm a ilha da Juventude, onde ficamos quatro dias, e uma cooperativa de artess que trabalham com argila. Foi bonito ver que elas mesmas determinam as horas de atividade, pois se trata de um trabalho artstico, que no depende de regras mecnicas de produo.

    Na ilha, como observou a estudante, h uma boa produo de frutas e outros produtos agrcolas, mas o modo de produo ainda no est mecanizado como no Brasil, embora o processo de irrigao tenha lhe parecido bem eficiente. As vacas so destinadas produo de leite, por isso, em Cuba, come-se principalmente carne suna. A alimentao para a populao barata e de boa qualidade. Cada famlia recebe de acordo com o que necessita. Se h mais crianas em casa, recebem mais leite. Se h mais adultos, uma quantidade maior de mantimentos. O transporte tambm praticamente gratuito, paga-se simbolicamente. E se a pessoa no tiver dinheiro, no h problema, ela pode embarcar no nibus do mesmo jeito. Isso para todos.

    Cerco ilha

    Luiza tambm se surpreendeu com a reao do povo diante do bloqueio que a economista Nidia Alfonso Cuevas, do Instituto Superior de Relaes Internacionais, define como uma barbrie. O pas perdeu parceiros comerciais. No contexto mundial, o princpio da extraterritorialidade imposto pelos Estados Unidos impede qualquer empresa norte-americana que se encontre em outro pas de ter relaes com Cuba, comenta a estudante.

    A estudante viu as consequncias geradas por este cerco absurdo ilha ao visitar hospitais e escolas. A falta de estrutura causada pelo bloqueio provoca, por exemplo, racionamento, falta de energia, limitao de medicamentos e falta de materiais escolares. O acesso internet (que via satlite e muito caro), est disponvel principalmente em universidades, centros de pesquisa, setores do governo e em hotis.

    Mas, mesmo com toda a dificuldade do dia a dia, as pessoas manifestam alegria e espontaneidade. As crianas se divertem, parecem felizes e protegidas nos ptios das escolas, nas ruas. Isto foi o que vi em Havana, um grande centro, que a capital, quando visitei algumas escolas. No posso generalizar, mas as pessoas que eu conheci esto sintonizadas com a revoluo, defendem o governo e sabem o que acontece fora de Cuba.

    Luiza comenta que os cubanos demonstram conhecer muito bem a realidade do mundo. Pensei que por causa do bloqueio eles no soubessem dos acontecimentos, mas os documentrios na TV aberta informam muito bem sobre a situao mundial. Alunos bem pequenos sabiam, por exemplo, muitos fatos relacionados ao Brasil, e queriam conhecer mais.

  • Em relao educao Luiza constatou que realmente para todos, e totalmente gratuita, desde o Crculo Infantil at a Universidade. Na sade o acesso tambm universal. Fui atendida no posto de sade, pois me faltou um remdio, e paguei um preo simblico. Se no tivesse dinheiro, seria de graa. Tambm no percebi nos mdicos uma postura arrogante de quem diz eu sou o doutor.

    L, existe o mdico de famlia e h, em cada quadra da cidade, ncleos de atendimento famlia, com profissionais da psicologia, servio social, entre outros. visvel a humanidade no atendimento sade, mas tambm no geral, com as pessoas com quem relacionei. Ouvi relatos de quem tinha doena grave e recebe todo auxlio. Conversei com uma senhora diabtica, que teve que amputar as pernas, e ela me disse que recebe todo o atendimento de que necessita.

    Teoria na prtica

    O acesso dos cubanos ao mundo da arte, da cultura, da literatura tambm impressiona. A vida cultural riqussima, com muitas atividades de acesso gratuito para a populao. H numerosas feiras de livros, que realmente so bem baratos. L se nota que h a prtica da teoria deles. Eles entendem o conhecimento como algo integral. E se voc conhece, tem a obrigao de compartilhar com o outro. Uma das paixes nacionais a novela brasileira. Mas os cubanos no se enganam com a fico, tm conscincia de que fantasia, que a realidade social brasileira no como mostram as novelas.

    Vrias conferncias que Luiza assistiu despertaram seu interesse, uma delas, da Federacin de Mujeres Cubanas. H muitos ncleos desta federao no pas, que atuam na preveno, esclarecimento e proteo das mulheres acerca da sexualidade e violncia, por exemplo. Em Cuba, conta a estudante, as grvidas condenadas por algum delito tm direito a acompanhamento mdico idntico ao de uma mulher em liberdade, pois o beb um cidado cubano como todos os demais, e no vai para a priso com a me. Aps o nascimento, ela e o beb recebem atendimento at o fim da amamentao, quando ento a mulher volta a cumprir a pena. A licena maternidade em Cuba, vale dizer, tem a durao de um ano. Los hijos de la ptria (os filhos da ptria), crianas e adolescentes que perderam os pais, so acolhidos pela sociedade, com todo atendimento de educao, sade, at a universidade.

    A vida poltica na nao caribenha intensa, como notou Luiza. Os deputados no recebem salrio de poltico, somente a remunerao da profisso em que atuam enquanto tambm cumprem o mandato. Os polticos entendem que trabalhar no governo uma extenso de seu papel social, um dever. Eles tm que prestar contas do trabalho sociedade, de modo rigoroso.

    Ao final das brigadas, nos cinco dias em que ainda ficou na ilha, Luiza teve contato com alguns jovens que reclamaram por no poder viajar, Eles disseram que difcil passear no prprio pas, pela falta de dinheiro, pois recebem em peso cubano. Falaram tambm que so poucos os que conseguem viajar para fora, pois isso s acontece se for para realizar uma pesquisa, uma palestra ou para fazer um curso.

    Educao para todos

    Ao visitar a Universidad de la Cultura Fsica y el Desporto Manuel Farjado, acompanhada pelo professor Pedro Martinez, diretor da Radio Havana Club, Luiza pde

  • conversar com o reitor Antonio Becalli Garrido, Ele me explicou que em Cuba o conhecimento parte da sociedade, sendo assim, fcil de adquiri-lo. Todos que querem frequentar a universidade podem ter acesso a ela, pois ali se investe em educao para todos. Em outros pases, muitas vezes, pode-se ter talento mas, se no h dinheiro, no possvel estudar ou praticar esportes.

    Em Cuba h 14 escolas de Educao Fsica e todas so de graduao e ps, e os estudantes incentivados a prosseguir estudos. O curso fundamentado por trs eixos: regular diurno, regular para atletas de alto rendimento e o de universalizao. Entende-se que a vida do atleta diferenciada, com rotina de treinos e preparao para competio. Por isso necessria uma adaptao estrutura do currculo, para que siga sua vida acadmica, com uma boa formao e uma profisso, pois a vida do atleta relativamente curta por fatores como o intenso desgaste fsico.

    O curso de universalizao foi implantado por Fidel para levar a universidade em todos os cantos do interior, dando oportunidade de estudos para todos os cubanos. So 500 os professores que ensinam nesta rea, sendo 68% mulheres. Na ilha h 23 mil estudantes de educao fsica e a universidade que Luiza conheceu conta com 2.200 alunos. Os mestrados mais importantes so em treinamento desportivo e cultura fsica teraputica, formao professores de educao fsica, atividade fsica na comunidade e esporte de combate.

    Luiza cita que o reitor Antonio Garrido, durante a entrevista, afirmou: A essncia do desporte cubano parte da universidade. Quando falamos das nossas medalhas olmpicas e poucos pases podem falar disso como ns essas fundamentalmente surgem dos professores da universidade, porque a cincia assume um papel muito importante no desporte; pois estamos falando de biologia, fisiologia e metodologia do desporte. Tratamos o alto rendimento em forma de sistema, temos que ter uma equipe muito disciplinada para trabalhar com o atleta, sendo assim a universidade tem um papel de protagonista.

    Inspirao para lutar

    Luiza tambm teve contato com a Federao dos Estudantes Universitrios, entidade estudantil que trabalha com uma atuao poltica organizada. Alguns estudantes disseram que a classe estudantil tem o privilgio de manter uma boa relao com as reitorias, pois o entendimento em Cuba de que a universidade dos estudantes.

    Para Luiza, a viagem foi uma oportunidade de conhecer a realidade de um pas que apresenta um sentido avanado de humanidade, mas vive boicotado por uma grande potncia, que no lana um olhar humano sobre este povo. Mas os cubanos, como ela diz ter percebido, no tm raiva dos americanos. Falam deles como irmos. Nunca queimaram uma bandeira dos EUA em Cuba, tanto que muitos turistas estadunidenses vo conhecer a ilha, onde so bem acolhidos.

    A estudante, que veio de Lages, interior de Santa Catarina, para estudar em Florianpolis, mora em uma repblica com outras quatro estudantes. Ela perdeu o pai em 2009, tem dois irmos e para estudar conta com o apoio da me, que trabalha como auxiliar de contabilidade em uma empresa. Para continuar seu trabalho de pesquisa, ela agora espera poder viajar para o Chile e, se tudo correr como sonha, pretende aprofundar as pesquisas sobre infncia e educao fsica na Venezuela, Equador e Argentina. Esta primeira viagem de estudos contou com o apoio da Pr-Reitoria de

  • Assuntos Estudantis, e ela frisa que no teria se concretizado sem a ateno e orientao do professor Paulo Capela, do curso de Educao Fsica da UFSC.

    Luiza de Liz pensa que a o incio de sua caminhada pela Amrica Latina foi emblemtico. Cuba um exemplo de que muitos tiveram que morrer para que houvesse a mudana. uma inspirao para grandes lutas. Mas penso que apenas espelhar-se no modelo cubano seria um engano, pois cada pas tem que encontrar seu prprio modo de fazer a sua revoluo transformadora.

    Fonte: Iela UFSC