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33 R. Fac. Odontol. Porto Alegre, Porto Alegre, v. 48, n. 1/3, p. 33-36, jan./dez. 2007 Estudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de Dentes Estudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de Dentes Estudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de Dentes Estudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de Dentes Estudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de Dentes Humanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas de Humanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas de Humanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas de Humanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas de Humanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas de Descalcificação Química. Descalcificação Química. Descalcificação Química. Descalcificação Química. Descalcificação Química. Comparative Study Of Dental Pulp Morphology From Human Teeth Submitted To Cutting Technique Or Chemistry Decalcification Technique. BERNARDI, Lisiane* BENTO, Letícia Westphalen** MATTUELLA, Leticia Grando*** ARAUJO, Fernando Borba de**** FOSSATI, Anna Christina Medeiros***** * Cirurgiã-dentista pela FO.UFRGS. Rua Ramiro Barcelos, 2491/62. Bairro Rio Branco. Cep: 90035-007. Porto Alegre, RS. E-mail: [email protected] ** Especialista e Mestranda em Odontopediatria pela FO.UFRGS *** Mestre em Odontopediatria pela FO.UFRGS ****Mestre e Doutor em Odontopediatria pela FO.USP. Coordenador do Curso de Especialização em Odontopediatria da FO.UFRGS. Professor Adjunto da Disciplina de Odontopediatria da FO.UFRGS. ***** Mestre em Odontopediatria pela FO.USP. Doutora em Biologia Celular e Tecidual pelo ICB.USP. Professora Adjunta das Discipli- nas Seminário de Integração I e II e Biologia dos Tecidos Bucais. Com a evolução nas últimas décadas da tecnologia de Bioengenharia de Tecidos, faz- se cada vez mais interessante e necessário à ciência odontológica, o conhecimento da dinâ- mica da biologia pulpar. Este interesse deve-se ao fato de o tecido pulpar não funcionar ape- nas como fornecedor de proteínas e de propri- edades sensoriais para a dentina, mas também por ser a ele atribuída a capacidade de regene- ração dentinária (GOLDBERG; SMITH, 2004; TSUKAMOTO-TANAKA et al, 2006). Para a compreensão deste processo e o esclarecimen- to da funcionalidade do tecido pulpar por com- pleto, é preciso analisar as sinalizações e ex- pressão de fatores de crescimento nele envol- vidos. Assim, para esta avaliação, a polpa deve passar por processamentos histológicos e vári- as técnicas laboratoriais. No entanto, cada estágio da técnica histo- lógica de rotina empregada, como fixação, de- RESUMO RESUMO RESUMO RESUMO RESUMO Os rápidos avanços do conhecimento acerca do reparo e regeneração tecidual, têm despertado o interesse pela biologia pulpar. Entretan- to, para avaliar microscopicamente a dinâmica do tecido pulpar, é necessário, inicialmente, que o dente seja submetido aos processamentos histológicos de fixação e descalcificação. A descalcificação pode afetar o grau de coloração e pode causar desnaturação de proteínas. Além disso, é um processo demorado, visto que o dente requer um longo período de desmineralização. Assim, a proposta deste trabalho foi de avaliar qualitativamente a matriz extracelular e as células da polpa dentária, comparando três grupos: dois em que o tecido dentário foi descalcificado e um em que a polpa foi removida dos tecidos duros, não necessitando do processo de descalcificação. Dez pré-molares foram fixados em formalina tamponada a 10% por 24 horas. Após, estes dentes foram divididos em três grupos: 4 dentes foram submetidos a processo de descalcificação por meio de solução de Morse, 3 por meio de solução de EDTA a 10% e; os 3 dentes restantes tiveram sua polpa separada dos tecidos duros dentários por meio da técnica de clivagem. Na seqüência, os três grupos foram processados por meio da técnica histológica de rotina e foram corados com H/E. Os resultados desta análise demonstraram que houve uma melhor conservação tanto da matriz extracelular, quanto das estruturas celulares no grupo da clivagem, seguido do grupo Morse e por fim, com a menor conservação das estruturas pelo grupo EDTA. PALAVRAS-CHAVE: PALAVRAS-CHAVE: PALAVRAS-CHAVE: PALAVRAS-CHAVE: PALAVRAS-CHAVE: Técnica de descalcificação. Polpa dentária. Processamento histológico. Morfologia pulpar. Introdução e Revisão de Literatura sidratação, imersão, seccionamento e seqüên- cia da coloração final podem induzir artefatos de distorções na célula e na arquitetura do te- cido (HEATH; YOUNG, 2000). Como exem- plo, o procedimento de descalcificação, etapa necessária para o processamento de tecidos duros, pode causar alterações nas estruturas dentárias, tais como esmalte, dentina e polpa. A descalcificação ou desmineralização de es- pécimes é encarregada de amolecer os tecidos duros, através da remoção dos cristais de hi- droxiapatita, para possibilitar a inclusão e pos- terior secção ou da parafina ou do plástico. Estes cortes podem então, ser analisados microsco- picamente (TINLING; GIBERSON; KULLAR, 2004). A descalcificação pode causar desnatura- ção de proteínas e com isso, promover uma redução na atividade enzimática e na imunore- atividade, podendo até mesmo afetar o grau de coloração, a perda e deslocamento do ma- terial dos sítios originais (HOSOYA et al, 2005). Além disso, a descalcificação é uma etapa de- morada que exige a substituição sistemática das soluções empregadas (RODE; FARIA; MON- TEIRO, 1996; PAGE, 1996). Essas soluções podem ser compostas de ácidos, como solução de ácido nítrico e a solução de Anna Morse e compostas de quelantes como o ácido etileno diamino tetracético (EDTA) (MORSE, 1945; KIERNAN, 1999; RODE; FARIA; MONTEI- RO, 1996; TINLING; GIBERSON; KULLAR, 2004). Outro fator negativo em relação à ne- cessidade de descalcificação do esmalte e den- tina, segundo Morse (1945) é de que uma rá- pida fixação de todos os elementos dentários é difícil de ser obtida, visto que a penetração do agente fixador através de estruturas como es- malte, dentina e osso é um processo lento. Nestes casos, algumas alterações podem ocor-

Estudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de

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R. Fac. Odontol. Porto Alegre, Porto Alegre, v. 48, n. 1/3, p. 33-36, jan./dez. 2007

Estudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de DentesEstudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de DentesEstudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de DentesEstudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de DentesEstudo Comparativo da Morfologia da Polpa Dentária de DentesHumanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas deHumanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas deHumanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas deHumanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas deHumanos Submetidos à Técnica de Clivagem e a Técnicas de

Descalcificação Química.Descalcificação Química.Descalcificação Química.Descalcificação Química.Descalcificação Química.Comparative Study Of Dental Pulp Morphology From Human Teeth

Submitted To Cutting Technique Or Chemistry Decalcification Technique.BERNARDI, Lisiane*

BENTO, Letícia Westphalen**MATTUELLA, Leticia Grando***

ARAUJO, Fernando Borba de****FOSSATI, Anna Christina Medeiros*****

* Cirurgiã-dentista pela FO.UFRGS. Rua Ramiro Barcelos, 2491/62. Bairro Rio Branco. Cep: 90035-007. Porto Alegre, RS. E-mail:[email protected]

** Especialista e Mestranda em Odontopediatria pela FO.UFRGS*** Mestre em Odontopediatria pela FO.UFRGS

****Mestre e Doutor em Odontopediatria pela FO.USP. Coordenador do Curso de Especialização em Odontopediatria da FO.UFRGS.Professor Adjunto da Disciplina de Odontopediatria da FO.UFRGS.

***** Mestre em Odontopediatria pela FO.USP. Doutora em Biologia Celular e Tecidual pelo ICB.USP. Professora Adjunta das Discipli-nas Seminário de Integração I e II e Biologia dos Tecidos Bucais.

Com a evolução nas últimas décadas datecnologia de Bioengenharia de Tecidos, faz-se cada vez mais interessante e necessário àciência odontológica, o conhecimento da dinâ-mica da biologia pulpar. Este interesse deve-seao fato de o tecido pulpar não funcionar ape-nas como fornecedor de proteínas e de propri-edades sensoriais para a dentina, mas tambémpor ser a ele atribuída a capacidade de regene-ração dentinária (GOLDBERG; SMITH, 2004;TSUKAMOTO-TANAKA et al, 2006). Para acompreensão deste processo e o esclarecimen-to da funcionalidade do tecido pulpar por com-pleto, é preciso analisar as sinalizações e ex-pressão de fatores de crescimento nele envol-vidos. Assim, para esta avaliação, a polpa devepassar por processamentos histológicos e vári-as técnicas laboratoriais.

No entanto, cada estágio da técnica histo-lógica de rotina empregada, como fixação, de-

RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMOOs rápidos avanços do conhecimento acerca do reparo e regeneração tecidual, têm despertado o interesse pela biologia pulpar. Entretan-

to, para avaliar microscopicamente a dinâmica do tecido pulpar, é necessário, inicialmente, que o dente seja submetido aos processamentoshistológicos de fixação e descalcificação. A descalcificação pode afetar o grau de coloração e pode causar desnaturação de proteínas. Alémdisso, é um processo demorado, visto que o dente requer um longo período de desmineralização. Assim, a proposta deste trabalho foi deavaliar qualitativamente a matriz extracelular e as células da polpa dentária, comparando três grupos: dois em que o tecido dentário foidescalcificado e um em que a polpa foi removida dos tecidos duros, não necessitando do processo de descalcificação. Dez pré-molares foramfixados em formalina tamponada a 10% por 24 horas. Após, estes dentes foram divididos em três grupos: 4 dentes foram submetidos aprocesso de descalcificação por meio de solução de Morse, 3 por meio de solução de EDTA a 10% e; os 3 dentes restantes tiveram sua polpaseparada dos tecidos duros dentários por meio da técnica de clivagem. Na seqüência, os três grupos foram processados por meio da técnicahistológica de rotina e foram corados com H/E. Os resultados desta análise demonstraram que houve uma melhor conservação tanto damatriz extracelular, quanto das estruturas celulares no grupo da clivagem, seguido do grupo Morse e por fim, com a menor conservação dasestruturas pelo grupo EDTA.

PALAVRAS-CHAVE:PALAVRAS-CHAVE:PALAVRAS-CHAVE:PALAVRAS-CHAVE:PALAVRAS-CHAVE:Técnica de descalcificação. Polpa dentária. Processamento histológico. Morfologia pulpar.

Introdução e Revisão de Literatura

sidratação, imersão, seccionamento e seqüên-cia da coloração final podem induzir artefatosde distorções na célula e na arquitetura do te-cido (HEATH; YOUNG, 2000). Como exem-plo, o procedimento de descalcificação, etapanecessária para o processamento de tecidosduros, pode causar alterações nas estruturasdentárias, tais como esmalte, dentina e polpa.A descalcificação ou desmineralização de es-pécimes é encarregada de amolecer os tecidosduros, através da remoção dos cristais de hi-droxiapatita, para possibilitar a inclusão e pos-terior secção ou da parafina ou do plástico. Estescortes podem então, ser analisados microsco-picamente (TINLING; GIBERSON; KULLAR,2004).

A descalcificação pode causar desnatura-ção de proteínas e com isso, promover umaredução na atividade enzimática e na imunore-atividade, podendo até mesmo afetar o grau

de coloração, a perda e deslocamento do ma-terial dos sítios originais (HOSOYA et al, 2005).Além disso, a descalcificação é uma etapa de-morada que exige a substituição sistemática dassoluções empregadas (RODE; FARIA; MON-TEIRO, 1996; PAGE, 1996). Essas soluçõespodem ser compostas de ácidos, como soluçãode ácido nítrico e a solução de Anna Morse ecompostas de quelantes como o ácido etilenodiamino tetracético (EDTA) (MORSE, 1945;KIERNAN, 1999; RODE; FARIA; MONTEI-RO, 1996; TINLING; GIBERSON; KULLAR,2004). Outro fator negativo em relação à ne-cessidade de descalcificação do esmalte e den-tina, segundo Morse (1945) é de que uma rá-pida fixação de todos os elementos dentários édifícil de ser obtida, visto que a penetração doagente fixador através de estruturas como es-malte, dentina e osso é um processo lento.Nestes casos, algumas alterações podem ocor-

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rer no tecido localizado no centro da amostra,antes que a fixação seja obtida. Provavelmen-te, o tecido mais seriamente afetado seria apolpa dental.

A polpa dental é um tecido conjuntivo frou-xo especializado originado a partir das célu-las da papila dental do órgão do esmalte. Umavez completa a formação do dente, a polpaestará completamente circundada por umambiente mineralizado (ARANA; KATCHBU-RIAN, 1999; BERKOVITZ; HOLLAND;MOXHAM, 2004; GOLDBERG; SMITH,2004). A polpa adulta contém células que sãoresponsáveis pela formação e turnover da suamatriz extracelular (MEC), sendo que a maio-ria das células são fibroblastos, mas são tam-bém observados macrófagos e estruturas comonervos e capilares. A MEC é composta poruma porção fibrosa colagenosa, e por umamatriz não fibrosa, onde estão presentes gli-cosaminoglicanas, proteoglicanas e moléculasde adesão. Quanto à parte celular, são identi-ficadas células de defesa, mesmo em polpasaudável, incluindo células dentríticas, histió-citos e uns poucos linfócitos e células forma-doras de dentina, os odontoblastos (BERKO-VITZ; HOLLAND; MOXHAM, 2004; GOL-DBERG; SMITH, 2004). Na camada subo-dontoblástica, pesquisas recentes têm identi-ficado uma população de células mesenqui-mais indiferenciadas, com capacidade de auto-renovação, de diferenciação em múltiplas li-nhagens e com potencial clonogênico (GRON-THOS et al, 2000; GRONTHOS et al, 2003;MASAKO et al, 2003; BATOULI et al, 2003).A evidência da existência destas células plu-ripotentes tem despertado o interesse peloestudo da polpa dentária.

Assim, para amenizar os artefatos produ-zidos na polpa, decorridos da descalcificaçãoda estrutura dentária, se tem buscado novosprotocolos de processamento, como o uso deenergia de microondas associado ao EDTA ea separação da polpa por meio de clivagem(RODE; FARIA; MONTEIRO, 1996; PEN-NA; RODE, 2000). O uso da técnica de cli-vagem do dente visa à remoção prévia da pol-pa, eliminando, portanto, a etapa de descalci-ficação dos tecidos duros dentários. O objeti-vo deste trabalho foi avaliar qualitativamente,utilizando a técnica histológica de hematoxili-na e eosina (H/E), a preservação das estrutu-ras da polpa dentária de três grupos de den-tes. Dois grupos onde se utilizou a descalcifi-cação química das estruturas mineralizadaspor soluções de Anna Morse ou EDTA e umgrupo sem descalcificação, em que os dentesforam clivados.

MATERIAIS E MÉTODOSMATERIAIS E MÉTODOSMATERIAIS E MÉTODOSMATERIAIS E MÉTODOSMATERIAIS E MÉTODOSA amostra deste trabalho foi proveniente

de arquivo do laboratório de Biologia Bucalda FO.UFRGS. Fez parte do trabalho intitu-lado “Estudo da expressão do VEGFR2 em

polpas humanas de dentes permanentes hí-gidos”, aprovado pelo Comitê de Ética emPesquisa da Universidade Federal do RioGrande do Sul, de acordo com a Resolução196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

Foram utilizados 10 pré-molares hígi-dos, coletados na Disciplina de Odontope-diatria da FO.UFRGS, extraídos por razõesortodônticas mediante solicitação, por es-crito, do ortodontista responsável pelo tra-tamento da criança. Todos os dentes foramfixados em formalina tamponada a 10% por24 horas. Seguida a fixação, 3 dentes fo-ram submetidos ao processo de descalcifi-cação em EDTA a 10% e 4 em solução deAnna Morse. O processo de descalcificaçãofoi realizado até o momento em que as pe-ças tivessem uma consistência macia ao cor-te (aspecto borrachóide), o que ocorreu emcerca de 8 meses para os dentes do grupoEDTA e em média de 5 meses para os dogrupo Anna Morse. As amostras imersas emEDTA foram agitadas aproximadamente 12horas por dia, com o auxílio de um agitadormagnético. Em ambos os casos, as soluçõesforam renovadas duas vezes por semana.Seqüencialmente à lavagem em água cor-rente por 12 horas, os espécimes foramsubmetidos a trocas crescentes de álcoois,diafanizados em xilol, submersos em para-fina líquida e, posteriormente, incluídos emparafina fundida. Em cada um dos 3 den-tes restantes, após as 24 horas de fixação,foi realizada a técnica de clivagem. Paratanto, foram preparadas três canaletas, uti-lizando-se peça de mão de alta rotação, sobrefrigeração. Destas canaletas, duas foramparalelas ao longo eixo do dente, sendo umana face vestibular e uma na face lingual,abrangendo toda a extensão da coroa atéatingir a junção amelocementária. A tercei-ra canaleta foi feita transversalmente à co-roa, de forma a unir as outras duas longitu-dinais. A profundidade das canaletas foideterminada pelo aparecimento de tecidodentinário. Os dentes foram apreendidoscom auxílio de um alicate 121 pela regiãoradicular e clivados com o auxílio de umdiscoide cleoide e de uma enxada apical.Após a clivagem, estes dentes tiveram suapolpa separada cuidadosamente do tecidodentário por uma colher de dentina, e apósseguiram seqüencialmente os processo depreparo para a inclusão em parafina, sec-ção e coloração de igual maneira aos den-tes descalcificados. Obtiveram-se cortes se-riados de 5 mm de espessura a partir dasamostras emblocadas, com o auxílio de ummicrótomo rotatório. Os mesmos foram co-letados em lâminas histológicas e posterior-mente corados com H/E. A morfologia dascélulas e da MEC dos três grupos foi avali-ada qualitativamente, por dois examinado-res treinados.

RESULTADOSRESULTADOSRESULTADOSRESULTADOSRESULTADOSTodos os grupos permitiram a coloração

por H/E, no entanto esta foi mais evidentenos grupos da clivagem e no descalcificadocom Anna Morse. No grupo em que foi utili-zado o EDTA, verificou-se uma menor afini-dade tintorial.

A MEC da polpa proveniente do dentesubmetido à clivagem foi a que apresentoumaior integridade, com um aspecto maishomogêneo, enquanto que a do grupo EDTAteve a menor conservação, chegando a apre-sentar um aspecto mixomatoso (fig. 1a,d; fig.1c,f respectivamente). Resultado semelhan-te foi observado quanto à morfologia celu-lar. As células do grupo de EDTA não pre-servaram sua morfologia e, sendo assim, nemsempre possibilitaram a definição de seu fe-nótipo. Ainda, alguns dos seus núcleos apre-sentaram-se picnóticos, enquanto outrosapresentaram aspecto vacuolar (fig. 1c,f). Ascélulas do grupo Anna Morse, apesar de es-tarem mais bem conservadas que as doEDTA, apresentaram núcleos reduzidos, comformato alongado e não bem delimitados(fig.1b,c,e,f). O grupo em que o dente foiclivado evidenciou a melhor manutenção damorfologia celular. Suas células continhamnúcleos bem definidos e evidentes, podendoser observada uma granulação suave no seuinterior. A preservação estrutural obtida per-mitiu que vários tipos celulares fossem iden-tificados, tais como macrófagos, linfócitos efibroblastos (fig. 1a,d).

Em todos os grupos foi possível identifi-car a existência de nervos e vasos, sendo queas células endoteliais foram mais bem iden-tificadas no grupo clivado (fig.1d). O AnnaMorse foi o que demonstrou melhor conser-vação da topografia normal da polpa, poden-do ser definidas a camada rica em células, azona acelular e a camada odontoblástica(fig.1b). Já no grupo clivado, os odontoblas-tos nem sempre estiveram presentes em todaa extensão pulpar.

DISCUSSÃO E CONCLUSÕESDISCUSSÃO E CONCLUSÕESDISCUSSÃO E CONCLUSÕESDISCUSSÃO E CONCLUSÕESDISCUSSÃO E CONCLUSÕESA remoção dos cristais de hidroxiapati-

ta, constituintes dos tecidos mineralizadosque circundam a polpa dentária, é essencialpara o preparo histológico, que permitirá aanálise detalhada da estrutura normal oupatológica do órgão pulpar. Atualmente, re-corre-se à aplicação de substâncias quími-cas que atuam sobre a estrutura dentária,promovendo a desmineralização dos tecidosduros do dente. O principal objetivo destassubstâncias é tornar os tecidos dentários ca-pazes de serem reduzidos a espessuras mi-crométricas e então serem observados sobmicroscopia de luz. Esta condição deve seralcançada com um mínimo de alteração daestrutura tecidual. Em vista deste propósito,estratégias têm sido propostas com a finali-

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Figura 1 - Figura 1 - Figura 1 - Figura 1 - Figura 1 - Fotomicrografia em H/E de dentes pré-molares, submetidos à clivagem de seustecidos mineralizados (a,d), submetidos à descalcificação com solução de Anna Morse (b,e) esubmetidos à descalcificação por EDTA (c,f). Em (a), visualiza-se a MEC compacta (*) e célu-las com núcleos definidos (setas); d) maior aumento da região anterior: observa-se vasoneoformado (seta branca); presença de granulações suaves no interior dos núcleos (setas pretas);MEC (*); b) observa-se a manutenção da topografia pulpar. A MEC está menos compacta (*),contendo células com núcleos não bem definidos (setas); e) maior aumento da região anterior,permitindo melhor visualização da MEC (*), bem como a observação da redução do tamanhocelular (setas); c) são vistas alterações na MEC e algumas células apresentam núcleos picnóticos(setas pretas) e vacuolizados (setas brancas); f) no maior aumento as células aparecem comnúcleos mais indefinidos (seta) e evidencia-se o aspecto mixomatoso da MEC (*). Aumento de400x (a-c) e de 1000x (d-f). Zoom 1.4

se da polpa dentária de dentes humanos pelatécnica de H/E, a clivagem da peça dentá-ria parece ser a que menos alteração deter-mina à integridade do órgão. No entanto,há necessidade de mais estudos laboratori-ais que venham a utilizar outros tipos deprocedimentos, para então confirmar os re-sultados obtidos. Faz-se importante ressal-tar que previamente à escolha do procedi-mento a ser empregado, para a análise doórgão pulpar, a estrutura a ser analisadadeve ser bem determinada, a fim de que atécnica mais apropriada seja selecionada.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTThe rapid advances of the knowledge of

repair and regeneration tissues had provedto be an exciting time for pulp biology. Ho-wever, to study the dynamic of pulp tissue,it is necessary, initially, that the tooth besubmitted to histological fixation and decal-cification processing. Decalcification mayaffect the degree of staining and it may causedenaturation of proteins. Furthermore, it isa slow process, demanding long deminera-lization times for a tooth. Thus, the purposeof the present study was to compare, quali-tatively, the pulp extracellular matrix andthe pulp cells, submitted to different tech-niques: EDTA solution decalcification, AnnaMorse solution decalcification and a lastgroup which pulp was removed from toothwithout decalcification. Ten premolar teethwere fixed in 10% buffered formalin for 24hours. After this, the teeth were divided inthree groups: 4 teeth underwent decalcifi-cation with Morse solution; 3, decalcificati-on with 10% EDTA solution and; 3, weresectioned and their pulps were gently re-moved. Subsequently, the groups followedthe routine histological technique and stai-ning with H/E. The results demonstratedthat both conservation of pulp cells and ex-tracellular matrix were better in the groupwithout decalcification, followed by theMorse group and, the last, with the worststructures conservation for the EDTA group.

KEYWORDSKEYWORDSKEYWORDSKEYWORDSKEYWORDSDecalcification technique. Dental pulp.

Histological processing. Pulp morphology.

REFERÊNCIASREFERÊNCIASREFERÊNCIASREFERÊNCIASREFERÊNCIASARANA, V; KATCHBURIAN, E.Complexo Dentina-Polpa. In: ______.His to log ia e Embr io log ia Ora l :His to log ia e Embr io log ia Ora l :His to log ia e Embr io log ia Ora l :His to log ia e Embr io log ia Ora l :His to log ia e Embr io log ia Ora l :Texto – Atlas – Correlações Clínicas.São Paulo: Panamericana, 1999. P.181-236.

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dade de capacitar os pesquisadores a anali-sar estes tecidos, bem como as estruturas aeles relacionadas, sem submetê-los a proces-sos longos químicos de descalcificação (HO-SOYA et al, 2005).

O presente estudo mostrou que a me-lhor conservação tecidual foi obtida com ouso da clivagem dentária. O uso do EDTAcausou uma profunda alteração da MEC,bem como dos diversos tipos celulares. Estacondição observada está em desacordo comos resultados obtidos por Vier-Pelisser(2005) em seu trabalho, quando utilizou oEDTA como meio descalcificador, obtendoótimos resultados. Esta diferença de resul-tados se deve provavelmente à natureza domaterial utilizado. O autor utilizou em seutrabalho estruturas mineralizadas proveni-entes de roedores, quando o tempo utiliza-do para desmineralização foi de poucos dias.No atual estudo, em que foram utilizadosdentes humanos, o tempo para descalcifi-cação das estruturas dentárias, em algunscasos, atingiu 10 meses. O tempo transcor-rido no qual as estruturas ficaram sujeitasàs soluções químicas pareceu ser crítico paraa conservação tecidual. Este aspecto foiconfirmado pela MEC da polpa do gruponão submetido à ação química. Esta se apre-

sentou mais homogênea do que as demais,com seus tipos celulares e núcleos bem des-tacados. A conservação tecidual foi superi-or aos outros dois grupos, permitindo umaobservação mais detalhada dos diversos ele-mentos. Em contrapartida, a remoção dapolpa determinou como inconveniente aperda da relação espacial do tecido, já quetoda estrutura que a circunda foi elimina-da. A camada de odontoblastos apresentou-se, às vezes, distorcida e, em algumas regi-ões, ausente. Observou-se, ao mesmo tem-po, que houve uma perda na topografiapulpar habitual, o que pode representar umempecilho para alguns tipos de pesquisa. Otecido pulpar dos dentes em que a soluçãode Anna Morse foi empregada como agentedescalcificador, mostrou-se mais íntegro doque aquele submetido ao EDTA, porém,mais alterado do que aquele obtido pelaclivagem dentária. Mais uma vez, o tempodespendido nas descalcificações parece terinfluenciado. Apesar da evidência da qua-lidade tecidual ser inferior em relação àque-la obtida quando da remoção direta, verifi-cou-se que a topografia habitual do órgãopulpar foi mantida.

Nas condições observadas neste estudo,pode-se concluir que no processo de análi-

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Endereço para correspondência:Endereço para correspondência:Endereço para correspondência:Endereço para correspondência:Endereço para correspondência:Fernando Borba de AraújoFaculdade de OdontologiaRua Ramiro Barcelos, 2492Porto Alegre - RSCEP: 90035-003