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Estudo da Formao de Poros na Membrana Durante a Eletroporao de Clulas Biolgicas
Lucenara S. Pereira1*, Guilherme B. Pintarelli1** e Daniela O. H. Suzuki1***
1. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis, SC, Brasil*[email protected], ** [email protected] , ***[email protected]
Resumo: Este artigo tem o intuito de estudar a
formao de poros na membrana plasmtica de
uma clula biolgica isolada durante o processo
de eletroporao. Neste intuito, esto sendo
estudados modelos matemticos de eletroporao
e caractersticas do pulso eltrico aplicado, a fim
de analisar a influncia das variaes da
amplitude e da durao do mesmo. Essa anlise
feita a partir de simulaes no software
COMSOL Multiphysics, que fornece resultados em termos de potencial
transmembrana e condutividade eltrica. O
potencial transmembrana serve como um
indicador de eletroporao, pois as faixas de
tenso em que ele se encontra apontam se ocorre
ou no eletroporao, e se esse processo vai ser
reversvel ou irreversvel.
Palvras-chave: eletroporao, clula biolgica,
potencial transmembrana, condutividade, pulso
eltrico.
1. Introduo e Teoria
Este trabalho tem como objetivo o estudo do fenmeno da eletroporao, que a aplicao de um campo eltrico em uma clula biolgica, provocando alteraes transitrias na permeabilidade e condutividade das membranas plasmtica e das organelas. Dessa forma, tem-se a formao de poros, que permitem a troca de material entre os meios interno e externo da clula.
A eletroporao composta por uma srie de processos com fases distintas. Inicialmente, um pulso com um dado valor de tenso aplicado na membrana por um determinado tempo, provocando um acmulo de cargas devido migrao de ons. Quando essa carga atinge um ponto crtico, a membrana lipdica sofre um rearranjo em sua morfologia, formando pr-poros, e na sequncia poros propriamente ditos. Alguns estudos sugerem que esses pr-poros so pequenas
deformaes, de cerca de 3 (0,3 nanmetro) de dimetro. Logo, a transio de um estado no condutor (pr-poros) para um condutor (poros) depende do rearranjo da extremidade do poro. Ao encerrar o pulso, os poros podem se fechar, e a estrutura retornar ao seu estado inicial, no caso da eletroporao ser reversvel. Ou ainda, para
eletroporao irreversvel, manterem-se abertos ou expandirem-se, levando eventualmente a ruptura da clula [1].
O que define o destino final do poro a tenso transmembrana (Vm), que a diferena depotencial induzida entre as camadas externa e interna da membrana. Quando esse potencial fica em torno de 0.2V < Vm < 1V, os poros gerados sefecham ao final do estmulo, restabelecendo a membrana. J para o caso de Vm ultrapassar 1V, osporos permanecero abertos, provocando desequilbrio inico, rompimento da membrana e morte celular [2].
A tcnica da eletroporao pode ser utilizada em diversas aplicaes em variadas reas, como biotecnologia e medicina. Por se tratar de uma ferramenta no qumica e no txica, ela pode ser utilizada para inserir ou retirar molculas de uma clula. E uma forma promissora para tratamento de cncer.
O tratamento de cncer aliando eletroporao e quimioterapia (eletroquimioterapia) uma das principais motivaes dos estudos atuais em eletroporao, devido a melhora na eficincia das drogas utilizadas, por meio do aumento da permeabilidade celular e facilitao da entrada das drogas, devido abertura de poros em uma regio. Isso provoca a reduo dos efeitos colaterais da quimioterapia, como nuseas, fadiga e queda de cabelo.
A Figura 1 mostra possveis respostas de uma clula entre dois eletrodos, exposta a um pulso eltrico, e sugere mltiplos aproveitamentos da eletroporao, como: a fuso celular, a insero de molculas grandes ou pequenas, que podem ser protenas, ons, drogas, DNA ou substncias impermeveis e at mesmo a destruio da clula. No entanto, o sucesso das aplicaes depende, sobretudo, das propriedades do pulso eltrico, esse deve ser controlado com preciso para a obteno de um dado resultado. De modo geral, os parmetros de controle de um pulso DC est na sua intensidade e durao, enquanto que de um pulso AC est na amplitude e frequncia. Alm desses fatores, tambm possvel controlar o nmero de pulsos aplicados e a distncia entre eletrodos.
Excerpt from the Proceedings of the 2015 COMSOL Conference in Curitiba
mailto:[email protected]:///C:/Users/Guilherme/Downloads/[email protected]:[email protected]
Figura 1. Aplicaes da eletroporao.
Uma vez que a abertura dos poros durante a
eletroporao ocorre em ordem nano mtrica e em
escala de nano segundos, torna-se fundamental o
uso de modelos matemticos e simulaes como
auxlio no estudo desse processo.
Dessa forma, esse trabalho tem como objetivo
o estudo da formao de poros na membrana
plasmtica, a fim de identificar previamente a
influncia de cada varivel ao longo do processo,
buscando configuraes que proporcionem
melhores resultados.
2. Modelo Numrico e Equaes
Governantes
No estgio atual desta pesquisa, adotou-se um modelo matemtico no-linear para o estudo dos parmetros da eletroporao. Ele baseado na equao diferencial parcial de Smoluchowski, que descreve a formao e expanso dos poros com diferentes raios, durante o processo de eletroporao. No entanto, para pulsos AC ou DC de curta durao ( ou ), esse modelo pode ser simplificado para uma equao diferencial ordinria, de menor custo computacional.
As simplificaes do modelo so feitas considerando-se que os poros no se expandem significativamente aps a sua criao. Essa considerao vlida quando os campos eltricos aplicados so de curta durao e alta intensidade. Os resultados obtidos em [3] e [4], usando a equao de Smoluchowski, demonstraram esse fato, pois os poros foram criados com tamanho mnimo de 0.8nm [3] e 0.5nm e expandiram-se lentamente at 0.83nm [3] e 0.75nm [4], equilibrando-se e assim permanecendo at a fase de fechamento.
De acordo com o modelo assinttico da eletroporao, a densidade de poros, (), dada por [5]:
()
=
(()
)
2
(1 ()
0
(()
)
2
) ,
onde () o potencial transmembrana, atenso caracterstica da eletroporao, 0 adensidade de poros de equilbrio quando = 0,e e so constantes.
A condutividade mdia da membrana nas regies onde os poros so formados [6]:
() = 0 + ()2,
onde 0 a condutividade da membrana antes daeletroporao, a condutividade do meiodentro do poro. O raio do poro e :
=1
00
0
00++
0+
,
em que 0 a barreira de energia dentro do poro, dado pela relao entre o raio do poro e a
espessura da membrana e =
o potencial
transmembrana adimensional.
3. Mtodos
Tendo como objetivo estudar a formao de poros na membrana plasmtica, definiu-se uma geometria celular conforme Figura 2. A partir de um eixo 2D axissimtrico, uma clula esfrica isolada recebe um campo eltrico uniforme aplicado por duas placas paralelas. Nesta configurao, o modelo matemtico aplicado na membrana plasmtica, a fim de se obter o potencial transmembrana (Vm) e a condutividade(c) nessa regio.
Como definies de parmetros, tem-se a condutividade inicial da membrana plasmtica (0), condutividade do citoplasma () econdutividade do meio extra-celular (). Almdos parmetros de condutividade, tm-se os parmetros geomtricos, como raio da clula ()e espessura da membrana plasmtica (). Osvalores destes parmetros e dos demais envolvidos no processo de modelagem esto descritos na Tabela 1.
As simulaes esto sendo realizadas utilizando o mdulo AC/DC do software COMSOL Multiphysics . A interface fsica
Excerpt from the Proceedings of the 2015 COMSOL Conference in Curitiba
empregada a Electric Currents (), que contm as equaes relacionadas a campo eltrico e densidade de corrente. Os estudos esto sendo feitos no domnio do tempo.
Para a composio da malha, foi definido elementos extremamente finos para as membranas e finos para o restante da clula e meio extra celular. Um Ground e um Terminal foram adicionados a fim de descrever os eletrodos que aplicam o pulso eltrico, a uma dada amplitude e durao.
Com a geometria e o modelo implementados no COMSOL, fez-se o estudo da formao de poros na membrana plasmtica, aplicando-se pulsos eltricos quadrticos com variaes em termos de amplitude e durao. Os efeitos foram analisados atravs do potencial transmembrana e condutividade celular.
Alm disso, foi verificada a distribuio de campo eltrico neste sistema, e encontra-se descrito na Figura 3.
Figura 2. Geometria celular.
4. Resultados Experimentais
Foi realizada uma srie de testes, com
variaes na amplitude e durao do pulso
eltrico, mantendo-se a distncia entre os
eletrodos. Logo, o campo eltrico aplicado varia
de acordo com a amplitude do pulso.
Tabela 1: Parmetros utilizados.
Parmetro Smbolo Valor
Condutividade
do meio extra-
celular 1.2 S/m
Raio celular 10
Espessura da
membrana
plasmtica 5
Condutividade
do citoplasma 0.3 S/m
Condutividade
inicial da
membrana
plasmtica
0 9.5 109 /
Condutividade
da soluo
dentro do poro
1.2 /
Raio do poro 0.8
Densidade da
taxa de criao
dos poros 1 10921
Tenso
caracterstica da
eletroporao
224
Densidade dos
poros de
equilbrio 0 3.3 10
62
Constante de
eletroporao 1
Barreira de
energia do poro 0 3.2
Relao entre o
raio do poro e a
espessura da
membrana
0.15
Carga eltrica
de um eltron 1.65 10
19
Constante de
Boltzmamn 1.38 1023 /
Temperatura 295
H
Vt
Isolamento
GND Referncia
Vt
Eixo de simetria
Ground
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Figura 3. Distribuio de campo eltrico.
Inicialmente, mantendo-se a amplitude do
pulso eltrico em 200V, variou-se a durao do pulso em 100, 100 e 15. As curvas para o potencial transmembrana nos trs casos encontram-se nas Figuras 4, 5 e 6, respectivamente. As condutividades correspondentes esto nas Figuras 7, 8 e 9, respectivamente.
Num segundo momento, tendo como foco a anlise da influncia da amplitude do pulso, manteve-se a durao do pulso em 100, e variou-se para amplitudes de 100V e 400V, valores abaixo e acima dos 200V analisados. O potencial transmembrana para ambos os casos encontra-se nas Figuras 10 e 11, respectivamente.
Os grficos que representam a tenso transmembrana foram plotados em relao ao ngulo de varredura da membrana celular, sendo que em cada figura esto as curvas para os tempos inicial e final do pulso eltrico. Por sua vez, os grficos de condutividade foram plotados ao longo do tempo, a fim de demonstrar o aumento causado neste parmetro, no intervalo de durao do pulso.
Analisando os resultados, observa-se o quanto o pulso eltrico perturba a membrana celular, em maior ou menor intensidade. No primeiro caso, para uma amplitude de 200V e duraes de 100, 100 e 15, observa-se trs fenmenos distintos: para 100 tem-se > 1, para 100 tem-se 0.2 < < 1 e para 15 tem-se < 0.2. Logo, pode-se dizer que no primeiro caso ocorreria apoptose celular, no segundo caso eletroporao reversvel e no ltimo caso no ocorreria eletroporao.
No segundo experimento, mantendo-se a durao do pulso em 100, pode-se analisar as
amplitudes de 100, 200 e 300. Observa-se que para 100V, os valores de atingiram um potencial mximo de 0.65. Esse valor suficiente para transformar poros hidrofbicos em hidroflicos, conforme a teoria da permeabilizao da membrana, permitindo que determinadas substncias ou plasmdeos do meio extra-celular penetrem no citoplasma. Porm, como foi inferior a 1V, no ocorre apoptose da clula, como foi verificado no primeiro experimento com mesma durao porm amplitude superior. Por fim, tem-se um pulso com durao de 100 e amplitude ainda mais elevada: 300V. Com isso, pode-se verificar que o potencial transmembrana eleva-se ainda mais, atingindo valores da ordem de 1.6V, que certamente romperiam a estrutura celular.
Alm dessas observaes, de modo geral pode-se verificar a queda do potencial transmembrana a medida que se afasta do ponto central da membrana plasmtica ( = 00). Esse fato ocorre porque a predominncia de abertura dos poros est na regio dos polos da clula, que so os pontos onde a membrana celular est mais prxima dos eletrodos. Inclusive pode-se definir que existe uma linha do equador na clula, formada por uma linha imaginria traada em torno da clula igualmente distante de ambos os polos, dividindo-a em hemisfrios norte e sul. Assim, pode-se dizer que o nmero de nanoporos criados diminui a medida que o ngulo de anlise se movimenta dos polos para o equador, ou seja, de 0 para 90, no caso do intervalo das curvas analisadas neste trabalho.
Em relao a condutividade, nota-se que ela aumenta ao longo do tempo, atingindo mximos ao final do pulso que acompanham o potencial transmembrana. No primeiro experimento, para uma amplitude de 200, no pulso de durao de 100, a condutividade mxima ficou em torno de 70 107. J para uma durao de 100, a condutividade foi reduzida para um mximo em torno de 22 1010. Quando o pulso aplicado foi configurado para 15, a condutividade ficou em torno de 32 1010. Observa-se que a curva para o terceiro caso difere das demais, uma vez que no ocorre eletroporao, e no h troca de ons atravs dos poros. No segundo experimento, para um pulso de 100, nos pulsos de 300, 200 e 100, as condutividades mximas ficaram em 45 106, 70 107 e 12 107, respectivamente, reduzindo-se de forma proporcional a .
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Figura 4. Potencial transmembrana para um pulso
de 200V e 100.
Figura 5. Potencial transmembrana para um pulso
de 200V e 100.
Figura 6. Potencial transmembrana para um pulso
de 200V e 15.
Figura 7. Condutividade da membrana para um
pulso de 200V e 100.
Figura 8. Condutividade da membrana para um
pulso de 200V e 100.
Figura 9. Condutividade da membrana para um
pulso de 200V e 15.
Excerpt from the Proceedings of the 2015 COMSOL Conference in Curitiba
Figura 10. Potencial transmembrana para um
pulso de 100V e 100.
Figura 11. Potencial transmembrana para um
pulso de 300V e 100.
5. Discusso
Os resultados demonstram que os pulsos
podem ser configurados em uma determinada faixa de acordo com a aplicao do processo de eletroporao. Se o objetivo for a abertura dos poros de forma reversvel, os pulsos devem ter duraes maiores e amplitudes mdias. Enquanto que para se obter a apoptose da clula os pulsos devem ser de amplitudes elevadas e duraes na faixa de microssegundos.
Um fato que merece destaque a ausncia da
eletroporao em pulsos de poucos nano segundos
e amplitudes elevadas, onde no ocorre a
eletroporao na membrana plasmtica, pois o
tempo de carregamento da membrana superior a
durao do pulso.
Figura 12. Condutividade da membrana para um
pulso de 100V e 100.
Figura 13. Condutividade da membrana para um
pulso de 300V e 100.
Essa caracterstica ser estudada em trabalhos
futuros, a fim de analisar a viabilidade da
aplicao de pulsos de nano segundos para
eletroporar o ncleo e as organelas de uma clula,
cujos tempos de carregamento so
significativamente menores do que o da
membrana plasmtica. Uma aplicao
interessante nesse caso a transferncia gentica,
onde necessria a abertura de poros no ncleo
celular.
6. Concluses
A eletroporao uma tcnica que vem sendo
estudada em inmeras aplicaes na rea da sade, tanto em nvel celular quanto em suspenso em tecidos. Este trabalho aborda o nvel celular, estudando a formao de poros na membrana
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plasmtica, a partir de modelos matemticos que so resolvidos utilizando o software COMSOL.
Tendo em vista que essa dinmica de abertura de poros extremamente dependente das caractersticas do pulso eltrico aplicado, analisou-se a influncia da durao e amplitude de um pulso DC, dado por uma onda quadrada com largura variante.
Assim sendo, inicialmente manteve-se a amplitude do pulso em 200V e variou-se a durao para 100, 100 e 15, verificando-se que a medida que a durao do pulso era reduzida, o potencial transmembrana e a condutividade eltrica tambm eram reduzidos, desde o nvel de apoptose at no ocorrncia da eletroporao no ltimo caso.
A seguir, analisou-se a influncia da amplitude do pulso para uma mesma durao. Logo, mantendo-se o pulso em 100, que havia sido analisado para uma amplitude de 200V, fez-se duas novas anlises: para 100V e para 300V. Os resultados demonstraram que medida que a amplitude foi reduzida, o potencial transmembrana e a condutividade tambm se reduziram.
Esse estudo indica que o pulso pode ser controlado para qualquer tipo de aplicao, seja ela reversvel ou irreversvel. Alm disso, de acordo com as caractersticas de potncia e chaveamento do dispositivo eletrnico utilizado para a aplicao do pulso eltrico, esse controle pode ser tanto em nvel de amplitude quanto de durao.
Como continuao deste trabalho, pretende-se
analisar a viabilidade da aplicao de pulsos de
nano segundos para eletroporar as organelas e o
ncleo de uma clula biolgica, com foco em
aplicaes de transferncia gentica.
7. Referncias
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3. Vasilkoski, Esser, Gowrishankar, Weaver, "Membrane electroporation: The absolute rate
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5. Neu and Krassowska, "Asymptotic model of electroporation," Physical Review, vol. 59, pp.
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6. Pucihar, Miklavcic, Kotnik, "A Time-Dependent Numerical Model of Transmembrane
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1491 -1501, 2009.
Excerpt from the Proceedings of the 2015 COMSOL Conference in Curitiba