Estudo Da MONASO Sobre Situacao Do HIV e SIDA Em Mocambique

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MONASO

REDEMOAMBICANADEORGANIZAESCONTRAOSIDA 0

Maputo, Outubro de 2007

ANLISEDASITUAODOHIVESIDA &ACESSOAOTARVEMMOAMBIQUE Relatrioproduzidoparaa1a.Conferncia daSociedadeCivil sobreoHIVeSIDAemMoambique

Maputo, Abrilde2008

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FICHA TCNICA

Travessa Da Azurara # 11, Bairro Sommerschield Maputo Moambique Tel/Fax: (+258) 21.485383 Cel: (+258) 826255794 [email protected]

EQUIPA DE PESQUISACRISTIANO MATSINHEJOEL SAMO GUDO

CARLOTA LUCAS HLDER NHAMAZE KTIA NGALE SANSO DUMANGANE HENRIQUETA TOJAIS CHAGAS LEVENE

GRUPO DE REFERNCIALUCIANO MACUMBE RAFAEL SHIKHANI

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NDICESUMRIO EXECUTIVO........................................................................................................................................ 6 I. INTRODUO ................................................................................................................................................. 8 II. METODOLOGIA ............................................................................................................................................ 11 III. PERFIL DO PAS E SITUAO DO HIV E SIDA EM MOAMBIQUE ................................................................... 15 III.1. BREVE PERFIL DO PAS ........................................................................................................................... 15 III.2. EVOLUO DAS PREVALNCIAS DO HIV EM MOAMBIQUE ........................................................................ 16 III.3. IMPACTO DEMOGRFICO DO HIV E SIDA.................................................................................................. 18 III.4. IMPACTO DO HIV E SIDA NA SADE ........................................................................................................ 20 IV. RESPOSTA NACIONAL AO HIV E SIDA ................................................................................................ 20

IV.1. PRINCIPAIS POLTICAS E ESTRATGIAS NA REA DO HIV E SIDA .............................................................. 20 IV.2. DIREITOS HUMANOS E HIV E SIDA.......................................................................................................... 21 IV.2.1. ACTORES ENVOLVIDOS NA PROMOO E DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS ........................................... 23 IV.2.1.1. PVHS COMO ACTORES NA LUTA DE COMBATE AO HIV E SIDA ........................................................... 23 IV.2.2. AS 12 DIRECTIVAS SOBRE O HIV E SIDA E DIREITOS HUMANOS EM PERSPECTIVA ................................ 25 IV.2.3.RESPOSTAS AO HIV E SIDA BASEADAS NOS DIREITOS HUMANOS .......................................................... 31 IV.2.3.1. HIV E SIDA E DIREITOS HUMANOS NO LOCAL DE TRABALHO EM MOAMBIQUE ................................... 31 IV.2.4.ACES NA REA DO HIV E SIDA E DIREITOS HUMANOS ....................................................................... 33 V. TARV E CUIDADOS RELACIONADOS AO HIV E SIDA EM MOAMBIQUE ......................................................... 34 V.1. PROCESSO DE INTRODUO E EXPANSO DO TARV ................................................................................ 34 V.2. TIPO E CARACTERSTICAS DO TARV DISPONVEL ..................................................................................... 38 V.2.1. LOGSTICA COMPLETA DO TARV ........................................................................................................... 39

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V.3. PREVENO DA TRANSMISSO VERTICAL (PTV) ....................................................................................... 40 V.4. ATENDIMENTO E TESTAGEM EM SADE (ATS) .......................................................................................... 43 V.5.1. PROPORO DE PVHS QUE TM ACESSO AO TARV .............................................................................. 49 V.5.2. FALTA DE CLAREZA E DIVULGAO DOS CRITRIOS DE ELEGIBILIDADE E ACESSO ..................................... 50 V.5.2.1. CRITRIOS CLNICOS ......................................................................................................................... 51 V.5.3. ADVOCACIA E MOVIMENTO DA SOCIEDADE CIVIL PARA O ACESSO AO TARV ............................................. 52 V.5.4. PARCERIA ENTRE O GOVERNO E SOCIEDADE CIVIL NA ADMINISTRAO DO TARV................................... 56 V.5.5. CONSTRANGIMENTOS PARA O ACESSO E ADESO AO TARV, E OUTROS SERVIOS DE SADE .................. 57 V.5.5.1. CONSTRANGIMENTOS INSTITUCIONAIS ................................................................................................ 57 V.5.5.2. CONSTRANGIMENTOS SOCIAIS E ECONMICOS ................................................................................... 58 V.5.5.3.. CONSTRANGIMENTOS DE NATUREZA INDIVIDUAL ................................................................................ 60 VI. INICIATIVAS DE PREVENO ............................................................................................................... 63

VI. 1. PRINCIPAIS ACTIVIDADES EM CURSO ....................................................................................................... 63 VI. 2. ACTORES, MODELOS E COBERTURA DAS INICIATIVAS DE PREVENO ....................................................... 64 A) PAPEL DA SOCIEDADE CIVIL NA PREVENO E MITIGAO DO HIV E SIDA................................................... 65B) COBERTURA DAS ACTIVIDADES DE PREVENO ........................................................................................... 67

VI. 3. CONSTRANGIMENTOS NA REA DE PREVENO ...................................................................................... 69 VI. 4. IMPORTNCIA DA RELAO ENTRE A PREVENO E O TRATAMENTO ......................................................... 71 VII. VIII. CONCLUSES ................................................................................................................................... 73 RECOMENDAES ............................................................................................................................ 77

REFERNCIAS................................................................................................................................................. 80 ANEXO1: DECLARAES INTERNACIONAIS SOBRE O HIV E SIDA RATIFICADAS POR MOAMBIQUE .................... 82 ANEXO 2: LISTA DE PESSOAS ENTREVISTADAS ................................................................................................ 84 KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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ABREVIATURASAMODEFA ARV CD CEP CHTM CNCS COV CPLP CPN DAM DPS DTS ECOSIDA FDC GATV GTM HAI HDD HIV INE IO ITS MATRAM MISAU MPF MSF NPCS NVP OCB ODM OMS ONG ONUSIDA ONU OUA PEN PES PNCS PTV PVHS SADC SIDA SNS TARV UEM UA Associao Moambicana para o Desenvolvimento da Famlia Antiretroviral Cuidados Domicilirios Centro dos Estudos da Populao Community Health Media Trust Comisso Nacional de Combate ao SIDA Criana rf e Vulnervel Comunidade de Pases de Lngua Oficial Portuguesa Consulta Pr-natal Direco de Assistncia Mdica Direco Provincial de Sade Doena de Transmisso Sexual Associao dos Empresrios contra o SIDA Fundao para o Desenvolvimento da Comunidade Gabinete de Aconselhamento e Testagem Voluntria Grupo Tcnico Multisectorial Health Aliance International Hospital de Dia Vrus de Imunodeficincia Humana Instituto Nacional de Estatstica Infeces Oportunistas Infeco de Transmisso Sexual Movimento de Acesso ao Tratamento Ministrio de Sade Ministrio do Plano e Finanas Mdicos sem Fronteiras Ncleo Provincial de Combate ao HIV e SIDA Nevirapina Organizao de Base Comunitria Objectivos do Desenvolvimento do Milnio Organizao Mundial da Sade Organizao No Governamental Programa Conjunto das Naes Unidas sobre o HIV e SIDA Organizao das Naes Unidas Organizao da Unidade Africana Plano Estratgico Nacional Plano Econmico e Social Plano Nacional de Combate ao SIDA Preveno de Transmisso Vertical Pessoas Vivendo com HIV e SIDA Conferncia para o Desenvolvimento da frica Austral Sindroma de Imunodeficincia Adquirida Sistema Nacional de Sade Terapia Antiretroviral Universidade Eduardo Mondlane Unio Africana

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US Unidades Sanitrias

SUMRIO EXECUTIVONo contexto de materializao da sua viso e misso, a MONASO idealizou a realizao da 1 Conferncia Nacional do HIV e SIDA em Moambique. Com esta conferncia, a organizao pretende criar um espao de discusso sobre a problemtica do HIV e SIDA no pas e, igualmente, advocar junto do Governo, Parceiros e Sociedade no geral para o melhoramento e universalizao do acesso ao tratamento no pas. Para consubstanciar o evento, foi solicitado um estudo sobre a situao do HIV e SIDA no pas, como forma de sistematizar dados e informaes que sirvam de base para debate de questes ligadas ao acesso universal ao tratamento, TARV, Direitos Humanos, Protocolos assinados, papel dos intervenientes e avaliao das actividades realizadas. O estudo denominado Anlise da Situao do HIV e TARV em Moambique, fornece informaes sistemticas sobre o quadro do HIV e SIDA no pas, com especial ateno para a componente de tratamento, tendo em conta aspectos relativos : disponibilidade de servios, grau de cobertura, critrios de acesso, assim como outros aspectos relativos aos compromissos assumidos, metas cumpridas e eventuais constrangimentos verificados nessa rea. Do ponto de vista metodolgico, a anlise da situao foi realizada seguindo e focalizando-se numa abordagem qualitativa, que combinou perspectivas scio antropolgicas e biomdicas de modo a abarcar as diferentes dimenses do fenmeno em anlise. A recolha de dados recorreu ao uso de entrevistas semi-estruturadas dirigidas a informantes chaves e beneficirios dos servios, realizao de grupos focais de discusso e observao directa estruturada, para alm da reviso bibliogrfica. Os resultados da pesquisa realam que o HIV e SIDA continua sendo um desafio com maiores potencialidades de condicionar o desenvolvimento do pas e com perspectivas de vir a limitar os efeitos positivos e sucessos resultantes do processo de pacificao nacional, dos investimentos para o relanamento da economia nacional e da sua actual tendncia crescente. Os mesmos dados elucidam que o sistema nacional de sade, apesar de estar a registar melhorias acentuadas na proviso dos servios de tratamento, tem sido fortemente limitado pela crescente quantidade de pessoas que ainda necessitam dos seus servios, situao que imprime maior presso na prestao de servios e limita a sua capacidade de resposta. Estes constrangimentos do sistema agem de forma conjugada com os constrangimentos do lado da demanda e tem efeitos no acesso e universalizao do tratamento na perspectiva dos direitos humanos.

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Nesta perspectiva a anlise revela que a questo do estigma e discriminao das PVHS pe o portador do HIV e SIDA numa posio social relativamente desfavorvel, manifestando-se muitas vezes pela negao da sua cidadania, excluso social e rejeio familiar. Este contexto de discriminao das pessoas em funo do seu sero status e violao os direitos humanos ou fundamentais das pessoas seropositivas, contribui para colocar o desafio do acesso ao tratamento, como direito universalmente exercido em Moambique, na lista das metas nacionais que ainda esto longe de serem alcanadas. A anlise mostra que no obstante o pas ter, desde o princpio da epidemia, se engajado na adopo de polticas e estratgias de combate ao HIV e SIDA, com nfase para uma abordagem multisectorial, que se materializou atravs da adopo do PEN I em 1999, PEN II e PEN Sade em 2004, o engajamento de todos os sectores, continua a constituir um desafio para Moambique. Esta situao est parcialmente relacionada com o baixo nvel de coordenao multisectorial observado em instituies com mandato para o efeito; e pelo facto de o cometimento pblico e explcito geralmente observado na sociedade no se traduzir em eficcia e impacto das aces de resposta pandemia que so operacionalizadas pelos vrios actores. Relativamente ao tratamento em Moambique, a anlise da situao sobre a terapia antiretroviral mostra que embora tenha sido introduzida por ONGs internacionais, actualmente todo o controlo do tratamento est sob tutela do MISAU, o que mostra que o Estado est gradualmente a apropriar-se do processo. Esta apropriao do processo reflecte investimentos feitos pelo MISAU e seus parceiros na abertura de novos centros de prestao de servios (HDD), reabilitao de outros, formao de novos profissionais para fazerem o tratamento e prestao de cuidados s PVHS, nos locais onde anteriormente o servio no chegava. De forma geral, o acesso ao tratamento condicionado por trs ordens de factores: os relativos aos sistemas e institucional; os relativos sociedade e os relativos dimenso individual. Os primeiros dizem respeito s dificuldades de oferta associado s barreiras como distncias e falta de quadros no sector de sade em nmero suficiente para responder a demanda que este servio tem observado. Os factores sociais referem-se essencialmente as condies de vida pobreza na qual est inserida a maioria dos beneficirios destes servios o que condiciona a capacidade de continuar a tomar os medicamentos, bem como elementos ligados ao problema derivado do estigma e discriminao das PVHS, que faz com que as pessoas prefiram no procurar pelo tratamento por terem receio de serem estigmatizadas e discriminadas na sociedade. Os factores individuais referem-se a um conjunto de elementos colaterais como o efeito dos medicamentos e a auto estigmatizao. A anlise fornece informao sistematizada que permite MONASO e seus parceiros informar e redimensionar as suas aces programticas e operacionais na resposta ao HIV e SIDA. Como principais recomendaes o estudo prope o desenvolvimento contnuo de competncias das instituies da sociedade civil, para o entendimento e uso dos dados relativos as prevalncias do HIV, impacto demogrfico do SIDA e nmero de pessoas que precisam ou esto em TARV; engajamento dos mesmos actores em programas de promoo de acesso aos servios de TARVKULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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com nfase para a questo da adeso e permanncia dos beneficirios nestes servios, observando critrios de qualidade; a intensificar iniciativas de promoo de direitos humanos, de combate ao estigma e descriminao e ao redimensionamento das aces de preveno, combinando com tratamento, desconcentrao dos centros urbanos e extenso periferia.

I. INTRODUOA MONASO Rede Moambicana de Organizaes contra o SIDA uma Organizao no Governamental de coordenao das aces da sociedade civil na luta contra o HIV e SIDA, no mbito da preparao da 1 Conferncia Nacional de HIV e SIDA realizou esta anlise da situao do HIV e SIDA e TARV com vista a fornecer subsdios que sirvam de base para debate de questes ligadas ao acesso universal ao tratamento, TARV, defesa dos Direitos Humanos, e observncia dos Protocolos assinados pelo pas nestas reas. A realizao da conferncia surge do reconhecimento de que o SIDA constitui uma das principais ameaas para o desenvolvimento social e econmico do pas e uma das principais causas de morte em Moambique, essencialmente para o grupo populacional na faixa dos 15-49 anos de idade, populao considerada sexual e economicamente activa. Dados da ltima ronda de Vigilncia Epidemiolgica realizada em 2007, indicam que a taxa de seroprevalncia nacional de 16%. A prevalncia nacional revela uma tendncia estabilizao da epidemia uma vez que esta foi estimada em 16.2% em 2004. No entanto a nvel regional, a regio norte, sofreu uma ligeira reduo das prevalncias de 9.3 para 9% de 2004 para 2007, a regio centro reduziu de 20.4 para 18% e a regio sul registou um aumento de 18.1 para 21%. A nvel provincial, as 4 provncias da regio sul registaram crescimento nas prevalncias, a provncia de Gaza continuando a manter as taxas mais elevadas da regio, passando, actualmente, de acordo com os novos dados divulgados, a ser a provncia com maior taxa de prevalncia do pas em substituio de Sofala, que o era de acordo com as taxas da ronda de vigilncia epidemiolgica de 2004. A regio centro registou uma ligeira reduo com a excepo da provncia da Zambzia que registou um ligeiro crescimento de 18.4 para 19%. A nvel da regio norte, as taxas de prevalncias provinciais de HIV decresceram ligeiramente, com a excepo de Cabo Delgado onde se registou um ligeiro crescimento de 8.6 para 10% (tabela 1). A realizao da 1 Conferncia Nacional da Sociedade Civil sobre o HIV e SIDA representa mais um esforo da organizao que procura garantir que se desenvolva uma resposta efectiva contra o HIV e SIDA em Moambique. Neste sentido, o evento um complemento s aces da MONASO de apoiar e conduzir a resposta da sociedade civil em termos de educao para preveno, cuidados ou atendimento, reduo das taxas de infeco, prevalncia do HIV e SIDA e alvio do sofrimento de pessoas infectadas e afectadas pelo vrus, ao mesmo tempo que se possa investir na melhoria da qualidade da sua vida.KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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O Governo de Moambique em resposta problemtica do HIV e SIDA no pas criou o Programa Nacional de Combate ao SIDA (PNCS) no Ministrio da Sade em 1988 no qual a MONASO desempenhou um papel preponderante no desenho do Plano Estratgico Nacional (PEN) 20002003. Em 2000 foi criado, pelo governo, o Conselho Nacional de Combate ao SIDA (CNCS), rgo coordenador da resposta multisectorial (Estado/Governo, Empresariado/Privados e Sociedade Civil) no combate ao HIV e SIDA, no qual a MONASO foi indicada representante da sociedade civil no CNCS, papel que desempenha coordenando as aces da sociedade civil e prestando assistncia s ONGs de luta contra o SIDA. Foi neste contexto de necessidade de continuar a materializar a sua viso e misso que a MONASO idealizou a realizao desta Conferncia Nacional de HIV e SIDA. Com ela, a organizao pretende criar um espao de discusso sobre a problemtica do HIV e SIDA no pas e igualmente advocar junto do Governo, Parceiros e Sociedade no geral para o melhoramento e universalizao do acesso e servios tratamento no pas. O estudo, cujos resultados se apresentam neste relatrio, um Diagnstico sobre a Situao do HIV e SIDA e TARV em Moambique. Para a realizao do estudo procedeu-se ao levantamento da situao da epidemia, mais concretamente, analisando a disponibilidade dos servios de preveno, tratamento e cuidados relacionados com o HIV e SIDA em Moambique, e os principais constrangimentos que concorrem para limitar um acesso a esses servios. De forma sucinta, a anlise da situao fornece informaes sistemticas sobre o quadro do HIV e SIDA no pas, com especial ateno para a componente de tratamento, tendo em conta aspectos relativos : disponibilidade de servios, grau de cobertura, critrios de acesso, assim como outros aspectos relativos aos compromissos assumidos, metas cumpridas e eventuais constrangimentos verificados nessa rea. Os resultados deste estudo, para alm de informar a conferncia existe a expectativa que sirva de base para orientao e programtica das intervenes da organizao e outros actores da sociedade civil que intervm na rea do HIV e SIDA. O presente relatrio est estruturado em oito captulos temticos. A primeira parte apresenta a metodologia adoptada no processo de realizao de estudo, onde se evidencia que o estudo centrou-se numa abordagem qualitativa, combinando perspectivas scio-antropolgicas e biomdicas tendo em conta o carcter multifacetado do fenmeno em anlise. Na segunda parte apresentado o perfil e a situao do HIV e SIDA em Moambique, no que concerne a magnitude da prevalncia da pandemia, as tendncias evolutivas das mesmas tendo em conta os contextos regionais e breve anlise do impacto demogrfico da mesma bem como os seus efeitos no sector da sade. Esta parte seguida pela descrio da resposta nacional para fazer face a pandemia focalizando-se nas polticas, estratgias, principais actores e uma abordagem na perspectiva dos direitos humanos, que est subjacente a dinmica do acesso e universalizao do tratamento. Os dados de ambas partes revelam que as tendncias de infeco

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so preocupantes, e que o acesso ao tratamento est ainda longe de constituir um direito universalmente exercido. A quarta parte constitui a anlise da situao propriamente dita em relao ao TARV e cuidados relacionados com o HIV e SIDA em Moambique. Nesta, faz-se uma incurso na dinmica da introduo e expanso do TARV, PTV, ATSs e cuidados relacionados com o HIV e SIDA em Moambique e abordam-se questes relativas a sua cobertura, disponibilidade, abrangncia e factores que condicionam o seu acesso. Os dados revelam que a situao actual fruto da confluncia de factores diversificados, nomeadamente, de carcter institucional e scio cultural, a maioria so a expresso de elementos de carcter estrutural que afectam a dinmica do acesso aos servios de sade em Moambique. Na sexta parte o estudo faz uma anlise da componente de preveno e mostra que embora tenham sido includos novos pilares de resposta no mbito do novo plano estratgico, esta e continua sendo o paradigma hegemnico das intervenes no combate ao HIV e SIDA; e coloca como desafio imediato a sua combinao holstica com a componente de tratamento. Na stima e oitava partes, o estudo apresenta as principais ilaes retiradas do estudo e apresenta recomendaes que informem as reas programticas e operacionais da resposta da sociedade civil com vista a fazer face s lacunas que a pesquisa identifica e documenta. No geral, as recomendaes postulam a necessidade de redimensionar algumas componentes estratgicas revistas e constantes no PEN II bem como a execuo de partes dessa estratgia que ainda no foram priorizadas em termos operacionais pelos diferentes intervenientes na dinmica da resposta ao HIV e SIDA.

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II. METODOLOGIA

Este estudo foi desenvolvido com recurso a uma metodologia centrada na abordagem qualitativa. No entanto, a abordagem qualitativa privilegiada para este estudo incluiu uma componente quantitativa, que consistiu na recolha e sistematizao de informao quantitativa j disponvel, e que tenha um valor elucidativo sobre os aspectos relativos situao do HIV e SIDA em Moambique e disponibilidade de servios de TARV. As tcnicas usadas na recolha de dados para este estudo foram: a) ENTREVISTAS SEMI-ESTRUTURADAS As entrevistas constituram a principal tcnica de recolha de dados para esta pesquisa e permitiram obter informaes atravs de uma interaco directa com os actores envolvidos nas mltiplas intervenes na rea do HIV e SIDA. Esta tcnica foi usada atravs da administrao de um guio de entrevistas, previamente elaborado tendo em conta as diferentes categorias de actores e instituies envolvidas na resposta nacional ao HIV e SIDA, nas suas mltiplas facetas. A aplicao de guies de entrevista, por entrevistadores qualificados e treinados, permitiu o aprofundamento das questes previamente concebidas, ao mesmo tempo que deixava margens para a introduo e desenvolvimento de novas questes decorrentes do processo de entrevista com cada um dos entrevistados. b) DISCUSSES EM GRUPO As discusses em grupos focais foram realizadas com grupos de 6 a 10 pessoas, orientadas por um facilitador que lanava os tpicos e os participantes desenvolviam livre e espontaneamente tais tpicos de acordo com as suas percepes e experincias. Esta tcnica de recolha de dados constitui um valioso instrumento qualitativo para se aferir as percepes colectivas que uma determinada categoria de pessoas tem, sobre um tpico especfico. No caso deste estudo, esta tcnica permitiu recolher dados sobre os consensos e divergncias em torno de questes relativas s percepes sobre a eficcia e impacto dos programas de HIV e SIDA e os problemas e aspectos que intervm na componente de tratamento, bem como os principais constrangimentos para o acesso aos servios de sade, sob o ponto de vista dos beneficirios, provedores do servio e sociedade civil.KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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c) OBSERVAO DIRECTA ESTRUTURADA Com esta tcnica pretendeu-se recolher dados atravs da insero do pesquisador na comunidade e na sua interaco social com a populao que constitui o seu universo de pesquisa. Esta tcnica capital porque atravs dela fez-se o registo de informao que as outras tcnicas no poderiam colher. Este procedimento metodolgico foi complementado pelo estabelecimento de contactos de carcter informal e espontneo com diferentes categorias de sujeitos. A observao estruturada, partindo de uma lista pr-indicativa de aspectos a observar, tambm funcionou como uma tcnica de controlo de qualidade e verificao da fiabilidade da informao recolhida pelas outras tcnicas. d) REA DE COBERTURA DA AVALIAO O Estudo foi conduzido num perodo aproximado de trs semanas nas capitais provinciais das provncias de Cabo Delegado e Nampula no Norte, Zambzia e Sofala no Centro e Maputo e Gaza no Sul do pas. excepo de Maputo, em cada provncia abrangida pelo estudo, a recolha de dados durou um perodo aproximado de 1 semana, tendo sido visitada, pelo menos, uma Unidade Sanitria de referncia a nvel provincial que oferece cuidados de HIV e SIDA.

Figura 1- Ilustra provncias, pintadas a cor creme, que foram abrangidas pelo estudo.

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Em mdia, foram realizadas cerca de 15 entrevistas individuais profundas e 3 sesses de discusses em grupos focais, por provncia, o que representa um total de 102 entrevistas individuais e 18 sesses de discusso em grupos focais.1

DISTRIBUIO PERCENTUAL DA AMOSTRA POR PROVNCIA30 25 20 15 10 5 0 Cabo Delgado Figura 2- Distribuio percentual da amostra por provncia abrangida pelo estudo.

26.4% 16.5% 15.4% 16.5% 12.1%

13.2%

Nampula

Zambzia

Sofala

Gaza

Maputo

A provncia de Gaza, foi a que apresentou a amostra mais representativa, onde foram realizadas cerca de 24 entrevistas individuais, o que lhe confere 24.6% do total da amostra, enquanto que a provncia de Maputo foi menos representativa pois foram realizadas cerca de 11 entrevistas individuais, o que corresponde a 12.1% do total dos entrevistados. Todavia, a maior parte das referncias documentais e escritas foram recohidas na provncia e cidade de Maputo. e) GRUPOS ALVOS E ABRANGIDOS PELO ESTUDO As entrevistas e discusses em grupos focais realizadas abrangeram, primariamente, as seguintes categorias de actores: Responsveis provinciais do sector da sade; Representantes de ONGs com intervenes na rea do HIV e SIDA; Lderes de associaes locais e/ou organizaes de base;1 Das entrevistas inicialmente previstas cerca de 10 no foram realizadas devido a vrios constrangimentos relacionados com a disponibilidade dos potenciais entrevistados. As entrevistas no realizadas no representaram nenhum prejuzo para o entendimento dos aspectos que a pesquisa pretendia elucidar.

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Membros de Ncleos Provinciais de Combate ao HIV e SIDA; Responsveis e activistas de programas especficos; Lideranas e/ou notveis locais; Utentes e/ou Beneficirios de programas especficos de HIV e SIDA; Outros actores considerados relevantes na operacionalizao do estudo.

f) REVISO DA LITERATURA Atravs deste procedimento, foi possvel enriquecer a pesquisa com base na informao produzida por outros estudos da mesma natureza, com o mesmo objecto de estudo ou que apenas fazem referncia ao assunto em estudo. A reviso da literatura permitiu obter informao prvia sobre o assunto em estudo, evitando-se com isso uma sobreposio de esforos e duplicao do trabalho de investigao ou levantamento de dados. Em termos concretos, para este estudo, houve necessidade de se identificar, todo material sobre a situao do HIV e SIDA em Moambique, Polticas e Estratgias desta rea, os compromissos assumidos por Moambique na rea do HIV e SIDA e acesso aos servios de sade em Moambique. Sempre que possvel, foram recolhidos dados secundrios relativos s instituies activas na rea do HIV e SIDA, programas e projectos implementados, relatrios de progresso, balanos de actividades na rea do HIV e SIDA, junto as Delegaes da MONASO, CNCS e seus ncleos provinciais e outras instituies. g) ANLISE DOS DADOS Como j fora referido, para a elaborao deste documento, privilegiou-se a abordagem qualitativa, para a qual, o processo de tratamento de dados recolhidos foi caracterizada pela anlise das informaes adquiridas por meio dos guies de entrevistas individuais e colectivas e da observao directa estruturada, estes instrumentos permitiram recolher informao relativa s percepes quer individuais como colectivas, complementadas pelas percepes do pesquisador em relao aos assuntos em estudo e a confrontao dos dados fornecidos pelos entrevistados com a realidade no terreno. Os dados so, predominantemente descritivos e foram analisados tendo em conta as respostas dadas com maior frequncia para cada pergunta, no entanto, as respostas menos frequentes no foram postas de lado, uma vez que so importantes porque tambm correspondem aos pontos de vista e sensibilidades dos entrevistados, tendo bastado, para estes casos, deixar clara a frequncia com que foram dadas as respostas ou apresentados os diferentes pontos de vista.KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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Como resultado da reviso de literatura e das entrevistas com alguns informantes oficiais chaves, foi possvel ter informao estatstica que permitiu fazer anlise e descrio de dados quantitativos no documento para fundamentar parte da informao analisada na componente qualitativa, foi o caso, por exemplo, dos dados sobre as pessoas infectadas pelo HIV e os nmeros de pessoas com SIDA que so elegveis para receber o tratamento e destas quantas que tm acesso. Com os resultados obtidos foi possvel fundamentar algumas opinies dos entrevistados segundo as quais, o acesso ao TARV em Moambique muito baixo, o que leva a crer que persiste a necessidade de expandir esses servios para os distritos e localidades.

III. PERFIL DO PAS E SITUAO DO HIV E SIDA EM MOAMBIQUEIII.1. BREVE PERFIL DO PAS Desde a assinatura dos Acordos de Paz em 1992, Moambique tem sido visto como um pas de sucesso em frica em termos de reconstruo ps-guerra e recuperao da economia. O pas teve a terceira ronda de eleies legislativas e presidenciais em Dezembro 2004, como parte do processo da consolidao do compromisso nacional com a estabilidade poltica, governao democrtica e reconciliao nacional. Neste mesmo perodo, o Governo engajou-se numa ambiciosa agenda de reforma econmica, social e poltica, com resultados palpveis no processo de estabilizao macroeconmica. Todavia, apesar dos progressos alcanados at ao momento, Moambique ainda considerado um dos pases mais pobres do mundo, classificado, em termos de desenvolvimento humano, em 168 lugar num total de 177 pases (UNDP, 2005). Mais da metade da populao sustenta-se na base de uma economia informal, centrada na agricultura de subsistncia e no comrcio informal. Estimativas do Governo indicam que as desigualdades aumentam, o coeficiente Gini aumentou de 0.44 em 1997 para 0.52 em 2003, o nvel de consumo das pessoas pobres aumentou muito pouco em termos percentuais, relativamente ao das pessoas mais ricas. Apesar do aumento do acesso gua para o consumo nos ltimos 10 anos, 67% da populao urbana e 26% da populao rural no tem acesso gua potvel. O Relatrio do Progresso dos Objectivos do Desenvolvimento do Milnio de 2005 para Moambique indicou que dos 18 objectivos de desenvolvimento do milnio apenas 5 tem potencial para serem atingidos at 2015. As metas potencialmente atingveis so relativas reduo da pobreza, mortalidade infanto-juvenil, mortalidade materna, malria e o estabelecimento de um sistema financeiro e mercado aberto (UNDP, 2005). KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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III.2. EVOLUO DAS PREVALNCIAS DO HIV EM MOAMBIQUE Moambique um dos 10 pases mais afectados pelo HIV e SIDA no mundo. O sistema de recolha de dados sobre o HIV, em Moambique, registou uma evoluo significativa entre 1988 e 2007 (ltima ronda de vigilncia epidemiolgica). A prevalncia nacional revela uma tendncia estabilizao da epidemia uma vez que esta foi estimada em 16.2% em 2004. No entanto a nvel regional, a regio norte, sofreu uma ligeira reduo das prevalncias de 9.3 para 9% de 2004 para 2007, a regio centro reduziu de 20.4 para 18% e a regio sul registou um aumento de 18.1 para 21%. A nvel provincial, as 4 provncias da regio sul registaram crescimento nas prevalncias, a provncia de Gaza continuando a manter as taxas mais elevadas da regio, passando, actualmente, de acordo com os novos dados divulgados, a ser a provncia com maior taxa de prevalncia do pas em substituio de Sofala, que o era de acordo com as taxas da ronda de vigilncia epidemiolgica de 2004. A regio centro registou uma ligeira reduo com a excepo da provncia da Zambzia que registou um ligeiro crescimento de 18.4 para 19%. A nvel da regio norte, as taxas de prevalncias provinciais de HIV decresceram ligeiramente, com a excepo de Cabo Delgado onde se registou um ligeiro crescimento de 8.6 para 10% (tabela 1). A evoluo da epidemia demonstra diferenas regionais a nvel nacional com um avano marcadamente destacado na regio centro. A regio norte, actualmente, apresenta prevalncias similares s da regio sul de h 10 anos atrs, provavelmente por influncia dentre vrios factores do nvel de desenvolvimento e de circulao de pessoas. Tabela 1: TAXAS DE PREVALNCIA DE HIV POR PROVNCIA, REGIO E NACIONAL DE 2000 A 2007Provncia Maputo Cidade Maputo Provncia Gaza Inhambane Zona Sul Sofala Manica Tete Zambzia Zona Centro Ronda 2000 13.5% 14.4% 12.6% 7.8% 12.0% 20.6% 17.3% 16.3% 10.0% 14.4% Ronda 2001 15.5% 14.9% 19.4% 7.9% 14.4% 18.7% 18.8% 16.7% 15.4% 16.8% Ronda 2002 17.3% 17.4% 16.4% 8.6% 14.8% 26.5% 19.0% 14.2% 12.5% 16.7% Ronda 2004 20.7% 20.7% 19.9% 11.7% 18.1% 26.5% 19.7% 16.6% 18.4% 20.4% Ronda 2007 23% 26% 27% 12% 21% 23% 16% 13% 19% 18%

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Niassa Nampula Cabo Delgado Zona Norte Nacional Fonte: MISAU, 2007 6.2% 4.8% 7.5% 5.7% 11.0% 5.9% 7.9% 5.0% 6.8% 12.7% 11.1% 8.1% 7.5% 8.4% 13.6% 11.1% 9.2% 8.6% 9.3% 16.2% 8% 8% 10% 9% 16%

Em termos globais, estimava-se que em 2004, 16.2% da populao com idade compreendida entre os 15 e 49 anos, o que representa 1.6 milhes de Moambicanos, viviam com o HIV e SIDA. As provncias da regio centro do pas, atravessadas pelo corredor comercial da Beira que liga esta regio Zmbia, Zimbabu e Malawi, eram as mais afectadas com prevalncias rondando volta dos 20% (MISAU, 2005). Em Moambique, a distribuio da prevalncia do HIV e SIDA por sexo e idade indica uma elevada taxa de infeco precoce em raparigas e mulheres (15-29 anos) assim como taxas elevadas em homens com idade superior a 30 anos. Esta situao reflecte uma estrutura social na qual a actividade sexual ocorre entre raparigas muito jovens e homens mais velhos com poder econmico e social (CNCS, 2004). A situao actual caracterizada por uma tendncia de a epidemia parecer estar a atingir o seu pico e a estabilizar nas regies centro e norte do pas, na regio sul as estimativas indicam que a prevalncia do HIV continua a aumentar, no h indicaes de que haja diminuio da prevalncia em qualquer regio do pas. Este mtodo de vigilncia no permite estimar com grande preciso a prevalncia de HIV a nvel provincial, as estimativas provinciais apresentam limites de plausibilidade relativamente largos e devem ser tratadas com a devida cautela. (Grupo Tcnico Multisectorial de Apoio a Luta contra o HIV e SIDA em Moambique, 2007) Com o apoio do relatrio anual do SE-CNCS (2006), que agrupava as provncias do pas de acordo com as taxas de prevalncias que se observavam e com a sua respectiva evoluo, foi possvel, com base nos dados da Ronda de 2007, agrupar as provncias de acordo com trs grandes perfis a saber: Perfil 1: das provncias de Maputo, Gaza e Cidade de Maputo que mostram taxas de prevalncias em crescimento num ritmo relativamente acelerado, com taxas acrescidas em mais de 2%, havendo um caso de um aumento de 7.1% na provncia de Gaza. Perfil 2: das provncias de Inhambane, Zambzia e Cabo Delgado que tambm mostram taxas de prevalncias crescentes, mas estas crescem num ritmo, relativamente, menor em relao s do perfil anterior, sendo o maior crescimento registado de 1.4% em Cabo Delgado, estando as restantes duas com crescimentos inferiores a 1%.KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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Perfil 3: das provncias de Sofala, Manica, Tete, Niassa e Nampula que mostram taxas de prevalncias com uma tendncia decrescente em ritmos diferentes, havendo descidas acentuadas nas provncias de Sofala, Manica, Niassa e Tete, com pelo menos 3% de reduo, e uma descida relativamente fraca em Nampula com um decrscimo de 1.2%.

III.3. IMPACTO DEMOGRFICO DO HIV E SIDA Em Moambique, tal como nos outros pases do continente africano, as consequncias da epidemia do HIV j se tem vindo a sentir. Esta calamidade afecta todo o processo de desenvolvimento, na medida em que atinge, fundamentalmente, a populao sexualmente activa, que representa a estrutura de suporte produtivo dos pases. De acordo com o INE (2004), as projeces indicavam que at finais de 2006:~180

~200 ~130

Ocorreram diariamente mais de 500 novas infeces, facto que fez com que at ao final do ano, houvesse mais de 1.600.000 pessoas vivendo com o HIV e SIDA, das quais mais de 98 mil eram crianas menores de 15 anos, 645 mil eram homens e 911 mil eram mulheres; Tenham ocorrido mais de 135 mil novos casos de SIDA; Aproximadamente 100.000 pessoas com mais de 15 anos morreram de SIDA e at ao final de 2010 iro morrer aproximadamente 140.000 pessoas.

Segundo as mesmas projeces o nmero de novos casos de SIDA poder atingir mais de 170 mil em 2010, caso no haja nenhuma interveno imediata e eficaz, prevendo-se a morte acumulada de mais de 1 milho de pessoas at ao final de 2010. Os bitos causados pelo SIDA podero, at 2010, dar origem a 626 mil rfos maternos e/ou paternos de 0-17 anos de idade. as mesmas projeces tambm indicam que em 2010, a esperana mdia de vida no pas, baixar de 50,3 anos para 36,5 anos, ou seja, diminuir aproximadamente 14 anos, em decorrncia do HIV e SIDA.

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Esperana de vida, 1999-2010

60

50.350 40 30 20 10 0

43.5 41.3Sem SIDA Com SIDA

36.5

1999

2000

2005

2010

CompromissosAssumidospor Moambique Moambique subscritor de alguns compromissos assumidos pelos lderes Africanos em vrias sesses de trabalho, tais como: Declarao de Abuja e o Plano de Aco para HIV e SIDA, Tuberculose e Outras doenas infecciosas relacionadas de Abril de 2001; Declarao de Maputo em Malria, HIV e SIDA, Tuberculose e Outras doenas infecciosas relacionadas, em Julho de 2003; Estratgia de Sade da Unio Africana/NEPAD de 2003; Deciso N 55 da IV Sesso Ordinria da Assembleia da Unio Africana, no seu Relatrio Interino sobre HIV e SIDA, Tuberculose e Plio, de Abuja em Janeiro de 2005. Objectivos de Desenvolvimento do Milnio, estabelecidos na Conferncia do Milnio das Naes Unidas em Setembro de 2000 pelos lderes mundiais.

De acordo com o PEN 2005-2009, estimativas indicam que em 2007, a incidncia do HIV em adultos para o ano de 2007 de 2,400 novas infeces por 100 mil habitantes, e 30% de casos de morte so devidos ao SIDA. E ainda em 2007, o SIDA vai originar cerca de 400,000 rfos. O SIDA tornou-se uma das principais causas de morte em Moambique. Em apenas cinco anos, de 1999 a 2003, estima-se que mais de 300 mil pessoas tenham morrido em decorrncia do SIDA. Nos Prximos 7 anos, o nmero de bitos devido ao SIDA poder triplicar, caso no sejam implementadas intervenes eficazes (INE, 2004). Segundo a literatura disponvel sobre o HIV e SIDA, esta epidemia constitui uma das principais ameaas para o combate da pobreza e de um modo geral, para o desenvolvimento social e econmico, pois o grupo populacional mais afectado encontra-se na faixa dos 15-49 anos de idade, populao considerada sexual e economicamente activa. Dada as suas caractersticas, a maior parte desta encontra-se empregada ou desenvolvendo alguma actividade produtiva.

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III.4. IMPACTO DO HIV E SIDA NA SADE Segundo o PEN ITS/HIV e SIDA-Sector Sade 2004-2008, em 2004, os mais de 100.000 novos doentes anuais de SIDA iriam gerar cerca de um milho e meio de consultas externas e cerca de 3 milhes de dias de internamento, mais do que o dobro do volume desta actividade, para aquele ano. A mesma fonte estima que cerca de 15% dos trabalhadores do sector ou 1.500 profissionais de sade venham a morrer de SIDA durante a dcada, reduzindo a capacidade de reaco perante os desafios da epidemia, aumentando as limitaes estruturais da rede. E por fim, alerta que a oferta de cuidados mdicos paliativos aos doentes de SIDA pode representar encargos financeiros estimados em dezenas de milhes de dlares americanos. O TARV para um nmero significativo de doentes elegveis pode praticamente duplicar a despesa pblica com a sade.

IV.

RESPOSTA NACIONAL AO HIV E SIDA

IV.1. PRINCIPAIS POLTICAS E ESTRATGIAS NA REA DO HIV E SIDA Em 1999, sob liderana do Ministrio da Sade, a sociedade civil elaborou o primeiro documento estratgico para o combate ao SIDA com uma dimenso multisectorial, o Plano Estratgico Nacional de Combate s DTS/HIV e SIDA 2000-2002 (PEN I). A aprovao do PEN I pelo Conselho de Ministros levou criao do Conselho Nacional de Combate ao SIDA (CNCS), com o objectivo de coordenar a implementao da estratgia nacional de combate ao HIV e SIDA. O CNCS presidido pela Primeira Ministra e integra os ministros dos sectores da Sade (VicePresidente), das Relaes Exteriores e Cooperao, da Educao, do Plano e Finanas, da Juventude e Desportos e o da Mulher e Aco Social. Em 2004 foi elaborado o actual Plano Estratgico Nacional de Combate s ITS, HIV e SIDA 2005-2009 (PEN II). Aps a elaborao do PEN I, o sector da Sade assim como vrios sectores iniciaram a formulao dos seus planos estratgicos, no mbito do processo de operacionalizao do PEN I. Cabia ento ao sector da sade a responsabilidade e garantia da bio-segurana nas suas actividades, o diagnstico e tratamento das infeces de transmisso sexual, diagnstico e tratamento das infeces oportunistas incluindo a tuberculose, vigilncia epidemiolgica e monitorizao da resposta nacional. Durante o perodo de vigncia do PEN I, o tratamento

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antiretroviral no foi considerado uma opo, quer pelo seu custo elevado, quer pelas dificuldades tcnicas inerentes sua implementao no contexto duma rede sanitria com graves carncias. A necessidade de actualizao do PEN Sade acentuou-se com a publicao das projeces de impacto demogrfico do HIV e SIDA, que apresentava um aumento rpido da prevalncia, modelando efeitos dramticos a mdio prazo. Por outro lado, o sector da sade comeou a sofrer o impacto de vrias formas, desde a afeco dos seus trabalhadores at o aumento da procura de servios paliativos. Desde a produo do primeiro PEN Sade at ento j haviam se registado inovaes substanciais no tocante s possibilidades de interveno; a reduo dos preos do TARV, e o aparecimento de iniciativas que disponibilizam financiamento para esta interveno tornaram, pela primeira vez, o tratamento dos doentes com SIDA, uma opo possvel em larga escala. Nesta perspectiva foi desenvolvido o Plano Estratgico Nacional de Combate s ITS/HIV e SIDA 2004-2008 do Sector Sade. O Diploma Ministerial n 01/PLS/GM/2001, de 17 de Dezembro de 2001, que introduz o Tratamento Anti-retroviral (TARV) e normaliza o atendimento de Pessoas Vivendo com HIV e SIDA (PVHS) veio criar condies para que o TARV tivesse enquadramento legal dentro PEN ITS/HIV e SIDA-Sector Sade 2004-2008. A reduo da pobreza absoluta prioridade do governo, reflectida nos documentos das polticas e estratgias do governo. Como parte do processo de formulao dos documentos para reduo da pobreza absoluta (PRSP), Moambique desenvolveu o Plano de Aco para a Reduo da Pobreza Absoluta (PARPA) que cobriu o perodo de 2000 a 2004. O segundo plano finalizado em Maio de 2006, cobre o perodo 2006 a 2009 (PARPA II). A prioridade conferida reduo da pobreza encontra-se tambm reflectida no Plano Quinquenal do Governo para 2005-2009. O PARPA e o Plano Quinquenal do Governo so os principais documentos do Governo onde se encontram estabelecidas as prioridades para o combate ao HIV e SIDA. As prioridades de combate estabelecidas no PEN II, assim como no PEN ITS/HIV e SIDA-Sector Sade 2004-2008, reflectem o estabelecido no PARPA e o Plano Quinquenal do Governo. Par e passo com o desenvolvimento das grandes polticas e estratgias nacionais de combate ao HIV e SIDA, as instituies da sociedade civil, vem crescendo em nmero, tamanho e capacidades tendo se tornado em importantes interlocutores do governo e da comunidade internacional, sobretudo no processo de implementao de actividades ao nvel da comunidade. IV.2. DIREITOS HUMANOS E HIV E SIDA Ao longo de sculos, as sociedades desenvolveram um conceito de direitos to fundamentais que nenhum governo poder retir-los os Direitos Humanos. Vrios documentos internacionais tentam definir esses direitos, entre eles a "Declarao Universal dos Direitos do Homem" de 10 de Dezembro de 1948 e a "Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos" de Junho de 1981.KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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Moambique no foge a regra, a constituio, denominada "lei me", criada em 1990, estabelece as regras bsicas e fundamentais luz das quais deve ser governado o pas. Estes conceitos, estabelecem a todos os moambicanos, o direito a liberdade de expresso, participao, religio, a integridade fsica, a fixao de residncia, a circulao e outros.2 Em Moambique, apesar da existncia da Constituio da Repblica, instrumento atravs do qual garante-se o direito sade e a justia social aos seus cidados, o Estado no tem assumido o seu papel activo nesta rea pelo facto de as leis no serem divulgadas aos diferentes sectores da sociedade civil e tambm porque a pobreza tem trazido situaes desoladoras relacionadas aos direitos humanos (aumento de crianas na prostituio, propagao do HIV e SIDA, grandes diferenas de status sociais, etc.), e elevado ndice de analfabetismo e ignorncia. O surgimento do HIV e SIDA despertou medo e intensificou preconceitos pr-existentes na sociedade e no mundo. As primeiras vtimas foram os homossexuais, posteriormente, com a propagao da doena, prostitutas, usurios de drogas, moradores de rua ou qualquer pessoa que adoptasse um comportamento considerado inadequado pelos modelos predominantes na sociedade passaram a ser tambm apontados como potenciais portadores. 3 Alm da associao com a promiscuidade, o HIV e SIDA, desde o seu surgimento esteve sempre associado morte e fatalidade. Atravs dessas associaes, o portador do HIV e SIDA tem a sua cidadania negada, excludo socialmente e renegado pelas pessoas, at pela sua prpria famlia. Neste contexto de discriminao do seropositivo, vrias vezes tm sido violados os direitos humanos ou fundamentais das pessoas.. A discriminao tem consequncia para/na pandemia do HIV e SIDA, com implicaes na emergncia de obstculos aos programas de preveno e controle da doena. Um elevado nmero de pessoas, devido discriminao e estigmatizao decorrente do HIV e SIDA, tm medo de procurar ajuda e acabam por se afastar dos programas sociais criados para esse fim, preferindo ficar com a dvida e ignorar o fato de poder ter o vrus a ter que enfrentar o estigma e os preconceitos relacionados com a doena. Esta situao frequente nas reas cobertas por este estudo, conforme pode-se constatar nos depoimentos dos entrevistados expostos neste relatrio no captulo referente aos constrangimentos sociais para a adeso ao tratamento. As violaes dos direitos humanos, praticadas contra as PVHS, ocorrem principalmente contra aqueles que possuem menos condies de reivindicar e proteger os seus direitos. Essas pessoas tornaram-se o alvo de medidas restritivas e compulsrias de controle do HIV e SIDA, gerando uma urgente necessidade de associar o HIV e SIDA a um amplo trabalho sobre direitos humanos. semelhana do pargrafo anterior, este igualmente composto por situaes apresentadas pelos entrevistados que afirmaram que muitas das vezes essa violao tem sido feita por uma entidade superior em relao aos seus subordinados no local de trabalho.42 3 4

http://www.amoproc.org.mz/objectivos_sub.htm#top www.arasa.info www.arasa.info

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Alm do problema da discriminao para a sade pblica, o ser humano e sua dignidade so intensivamente afectados. Ao contrair o vrus, a morte associada ao portador, de modo que a sua cidadania comea a desaparecer. Casos como, demisso no emprego, proibio de frequentar determinados lugares, desprezo, omisso no atendimento mdico, abandono da famlia e amigos so as principais consequncias que atingem a pessoa que contrai o vrus do HIV. Com uma resposta nacional atenta questo dos direitos humanos, todas essas atrocidades podem ser combatidas e evitadas. IV.2.1. ACTORES ENVOLVIDOS NA PROMOO E DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS Embora os direitos humanos sejam de carcter de cumprimento universal, existem actores directamente envolvidos no processo de luta em sua defesa. As entidades governamentais jurdicas e sanitrias devem ser as pioneiras no movimento da luta em defesa dos direitos humanos das PVHS, seguidas pelas organizaes no governamentais que actuam nesta rea. Vrias ONGs foram criadas em defesa do portador do HIV e SIDA, destacando-se as Associaes de PVHS que pautam as suas actuaes na solidariedade em relao as outras PVHS necessitando de ajuda, desde aconselhamento para ter acesso aos servios, acompanhamento s US que disponibilizam o servio, at a prestao dos cuidados domicilirios, alm das variadas aces levadas a cabo com vista a advocar para o melhoramento do acesso ao tratamento a nvel nacional e luta contra o estigma e a discriminao das PVHS. IV.2.1.1. PVHS COMO ACTORES NA LUTA DE COMBATE AO HIV E SIDA Segundo o PEN I em 1998, constituram-se as primeiras Associaes de pessoas vivendo com HIV e SIDA, Kindlimuka em Maputo, e Kubatana em Manica. Em 1999 apenas seis projectos desenvolviam actividades relevantes para as categorias de reduo do impacto do HIV e SIDA em benefcio de Pessoas Vivendo com HIV e SIDA. As organizaes como a Kindlimuka em Maputo, Kubatana e Kubatsirana no Chimoio, Projecto Esperana na Zambzia e os Hospitais de Dia em Maputo e Chimoio prestam apoio psicolgico e mdico a PVHS e seus familiares, com vista a reduo da rejeio familiar, disponibilizao do tratamento das doenas oportunistas, e apoio econmico a PVHS. Dentre estas associaes, apenas um projecto no Chimoio, Kubatsirana, implementava actividades geradoras de rendimentos e dava apoio aos rfos. O evoluir da epidemia e a necessidade duma resposta mais efectiva e coordenada trouxe a necessidade de se criar uma estrutura mais slida, que pudesse resolver vrias questes que as associaes individualmente no tinham capacidade de resolver, tais como a mobilizao de recursos, capacidade de advocar para mudana ou criao de polticas favorveis s PVHS. Assim as associaes de PVHS uniram-se e fundaram a RENSIDA que significa Rede Nacional de Associaes de Pessoas Vivendo com HIV e SIDA. A rede foi criada em Maio de 2002, para dar conta da ausncia de uma coordenao nacional das actividades que visam promover a melhoria da qualidade de vida das PVHS, bem como exercer o papel de presso e responsabilizao do governo.KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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As organizaes membro, na sua maioria desenvolvem trabalhos de mitigao do impacto do HIV e SIDA como visitas e cuidados domicilirios, cuidados e assistncia a rfos, bem como oferecer servios de aconselhamento comunidade e tambm de grupos dinmicos de convivncia entre os seropositivos. As PVHS tm desempenhado cada vez mais um papel activo na sociedade, como mostram alguns trechos das entrevistas com estas e com outras entidades que acompanham as suas actividades. As associaes de PVHSs enviam os seus activistas que tem a misso de fazer chegar a informao sobre a importncia do TARV, e que a sua distribuio gratuita alm de que estes activistas prestam testemunhos na primeira pessoa sobre a capacidade do TARV regenerar o doente, prestamos cuidados domicilirios aos doentes e COVs, fazemos aconselhamento, levantamento de medicamentos e marcamos as consultas para os doente. (Associao KEWA, Zambzia). as PVHS fazem o encaminhamento e educao de outras PVHS; apoiam os trabalhos do HdD e ainda fazem a prestao de cuidados domicilirios. (ECOSIDA, Maputo) A associao tem feito acompanhamento dos doentes, sensibilizao na comunidade, quando existem casos de pessoas que desistiram do tratamento procuramos saber os motivos, e sensibilizamos para a pessoa voltar ao tratamento (Associao Niwanane, Nampula). Entre as vrias actividades desenvolvidas pela RENSIDA, destacam-se: Apoio criao, consolidao e reconhecimento jurdico das Associaes de PVHS em todo o pas; Cursos de formao e seminrios; Campanhas contra a discriminao e estigmatizao das PVHS; Acordos e contactos de parceria, com organismos nacionais e internacionais.5 As suas aces esto voltadas para quatro reas a saber: a) Capacitao e Coordenao dos Membros, b) Advocacia, c) Projecto de Informao e Comunicao e d) Mobilizao de Parceiros. a) Na rea de Capacitao e Coordenao dos Membros: A rede tem a misso de ajudar aos membros dotando-os de conhecimentos especficos relacionados com a gesto geral das suas instituies (advocacia, busca de fundos, parceiros, sade, e comunicao). b) Na rea de Advocacia: A RENSIDA trabalhou com o Burnet Institute no sentido de criar um departamento de advocacia. Para o efeito est em vista em 2005, um curso de capacitao aos membros sobre a referida matria.5

www.ntwanano.org/sida/sida

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c) Na rea de Informao e Comunicao: Trabalhou na criao de um banco de dados que contm toda a informao da rede e das organizaes membros, publicao da revista trimestral Ecos de Vida Positiva, boletim mensal, promoo dos feitos da rede usando os meios de comunicao de massa e usando o prprio website. d) Na rea de Mobilizao de Parceiros: Nesta vertente, a RENSIDA responsvel em apoiar os seus membros no desenvolvimento de propostas de projectos, buscar doadores ou parceiros para as associaes e no geral ajudar ou dar a conhecer as actividades de cada associao.6 Alm destas actividades directamente ligadas ao combate ao HIV e SIDA, outras actividades de gerao de renda, para a melhoria da vida das PVHS, tm sido levadas a cabo, estas aces acabam reflectindo-se no combate ao HIV e SIDA uma vez que tiram o doente da posio, a que vulgarmente associado, de necessitado e incapaz de produzir para o seu sustento, como exemplo a colaborao inovadora do Kindlimuka com o sector privado, que teve como uma das suas maiores realizaes em 2000, a produo de uniformes para trabalhadores afectos nas bombas de abastecimento ao longo do pas. Assim, com a formao desses grupos, um importante problema da epidemia comea a ser atacado, atravs da luta pelo fim da discriminao e do preconceito. Nessa luta, a solidariedade, mas tambm a responsabilizao e a reposio legal dos direitos violados considerada a nica resposta eficiente contra a epidemia do HIV e SIDA. Entretanto, a materializao dos direitos humanos no contexto do HIV e SIDA passa tambm pela materializao de uma srie de outros direitos e compromissos sociais assumidos, que devem ser implementados pelo Estados e pelo cidado, como o caso das 12 directivas que constituem as Normas Internacionais sobre o HIV e SIDA e Direitos Humanos, que sero escrutinadas, uma a uma no tpico que se segue. IV.2.2. AS 12 DIRECTIVAS SOBRE O HIV E SIDA E DIREITOS HUMANOS EM PERSPECTIVA O Alto Comissariado das Naes Unidas para os Direitos Humanos e a ONUSIDA, publicaram o documento do Terceiro Encontro Consultivo para o HIV e SIDA e Direitos Humanos decorrido em Genebra entre os dias 25 e 26 de Julho de 2002, as Normas Internacionais sobre o HIV e SIDA e Direitos Humanos. Este documento estabelece 12 directivas, que de seguida se apresentam: A Directiva 1 recomenda que para a sua resposta ao HIV e SIDA os estados devem criar uma estrutura nacional que seja efectiva e que assegure uma abordagem coordenada, participativa e transparente, integrando as polticas sobre o HIV e SIDA nos programas de todos os ramos do governo.6

www.rensida.org/index.php

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A elaborao do Plano Estratgico Nacional de Combate s DTS/HIV e SIDA, e a criao, pelo Conselho de Ministros, da respectiva estrutura de implementao, o Conselho Nacional de Combate ao SIDA (Decreto 10/2000, de 23 de Maio), enquadram-se no cumprimento desta directiva. A Directiva 2 recomenda que os estados devem assegurar que, atravs de apoio poltico e financeiro, a consulta comunitria acontea em todas as fases da elaborao da poltica sobre o HIV e SIDA, programas de implementao e avaliao, e que as organizaes comunitrias tenham capacidade para realizarem as suas actividades, efectivamente, incluindo nas reas de tica, leis e direitos humanos. O Governo tem estado a observar esta directiva, atravs da criao de um ambiente facultativo para o estabelecimento e financiamento de redes de organizaes, organizaes e associaes, no obstante os constrangimentos que sero referidos mais adiante. A Directiva 3 estabelece que os Estados devem rever e reformar as suas leis de sade pblica de modo a assegurar que elas cubram de forma adequada as vrias questes de sade pblica suscitadas pela HIV e SIDA, harmonizando os procedimentos correntes com princpios e obrigaes internacionalmente definidos no que respeita aos direitos humanos e evitando que as suas provises sejam indistintamente aplicadas a casos comuns de doenas transmissveis e ao HIV e SIDA. O MISAU no seu relatrio da reflexo sobre o programa nacional do tratamento anti-retroviral (TARV) de 2005, j apresenta como principal obstculo para o aumento dos servios de TARV quer nos adultos assim como em crianas a falta de pessoal qualificado. Este documento tambm traa recomendaes para o aumento da cobertura dos servios de TARV, tais como a integrao dos servios existentes em cuidados de sade primrios e expanso do TARV peditrico a nvel nacional, pois das 34 unidades sanitrias que faziam TARV apenas 10 tinham capacidade para administrar o TARV peditrico. Este documento tambm chama ateno da necessidade da expanso se fazer acompanhar de qualidade, e para o efeito estabelece aces de formao, reforo da capacidade laboratorial e logstica (MISAU, 2005) A Directiva 4 estabelece que os Estados devem rever e reestruturar as leis criminais e dos sistemas correccionais para assegurar que eles sejam consistentes com as obrigaes internacionais sobre direitos humanos e que no sejam mal usadas no contexto do HIV e SIDA ou no sejam dirigidas contra os grupos vulnerveis. Embora restrita ao mundo do trabalho, a Lei 5/2002 de 5 de Fevereiro a primeira aco legislativa de vulto no sentido de proteger o direito ao trabalho, de combater o estigma e a discriminao de que so vtimas as PVHS e ainda de assegurar a confidencialidade do estatuto de seropositividade. Este diploma tambm ilegaliza o teste seropositividade como pr-condio para a admisso a um emprego ou a perda de um emprego por se revelar a situao de seropositivo do seu detentor. Para a definio e aprovao desta lei, os actores e instituio daKULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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sociedade civil, desempenharam um papel importante com um movimento de advocacia sem precedentes ao nvel nacional. A Directiva 5 recomenda que os pases devem aprovar ou reforar as leis contra a descriminao e outras protectoras que protejam os grupos vulnerveis, Pessoas Vivendo com HIV e SIDA e pessoas deficientes da descriminao em ambos sectores pblico e privado, assegurar o respeito pela privacidade, pela confidencialidade e pelas questes ticas em pesquisa envolvendo sujeitos humanos, enfatizando a educao e conciliao, e prover a subsistncia de aces remediais civis rpidas e administrativamente efectivas. A Lei 5/2002 de 5 de Fevereiro acima mencionada e a criao e operacionalizao do Comit de tica do MISAU prova do esforo do Governo de Moambique, no sentido de dar resposta a esta directiva. No obstante a grande lacuna que se verifica, entre a aprovao da lei e a sua instrumentalizao efectiva e exemplar. A Directiva 6 recomenda que os Estados devem produzir legislao que regulamente o fornecimento de bens, servios e informao que se relacionem com HIV e SIDA, de modo a assegurar total disponibilidade de medidas e servios qualitativos de preveno, informao adequada sobre preveno do HIV e cuidados, medicao efectiva e segura, a preo acessvel. A terapia anti-retroviral no pas gratuita. Entretanto, o grande desafio que se impe em relao ao tratamento das infeces oportunistas, feito na rede sanitria do Estado e que fornecido a preos subsidiados, mas que sofre frequentes roturas de stock forando os doentes a recorrerem rede privada onde o custo insuportvel. No obstante o facto de o TARV ser gratuito a nvel nacional, lacunas operacionais, limitaes no acesso e custos indirectos adicionais so persistentes e representam um grande obstculo para o acesso a esses servios, como ser problematizado mais adiante. A Directiva 7 estabelece que os Estados devem implementar e apoiar servios de apoio legal que possam educar as pessoas afectadas pelo HIV e SIDA sobre os seus direitos, prover servios legais gratuitos que imponham o respeito de tais direitos, desenvolver capacidades em questes legais relacionadas com o HIV e SIDA e instituir meios de proteco para alm dos tribunais, tais como gabinetes de justia, protectores pblicos, unidades de reclamaes sobre sade e comisses de direitos humanos. Segundo o PEN II, j em 2004, de todos os projectos relacionados com HIV e SIDA do CNCS, 29 incluam uma componente de apoio jurdico. E tais projectos so da responsabilidade de ONGs nacionais e estrangeiras, estruturas governamentais a nvel central e provincial, empresas e organizaes religiosas, e cobrem diferentes populaes-alvo, desde PVHS a ncleos comunitrios, vivas e rfos de SIDA. Todavia, a eficcia desses projectos e ou a sua visibilidade

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como uma boa prtica ainda questionvel, havendo ainda muito espao para melhoria e aperfeioamento da sua eficcia como instrumentos e mecanismos de interveno social. A Directiva 8 recomenda que os Estados, em colaborao e atravs das comunidades, devem promover um ambiente de suporte e facultativo para a mulher, criana e outros grupos vulnerveis, atravs da resoluo dos preconceitos subjacentes e reduo das desigualdades atravs do dilogo comunitrio, criao de servios sociais e de sade especficos, e apoio aos grupos comunitrios. O Governo de Moambique ao criar o Ministrio da Mulher e da Coordenao da Aco Social tinha em vista dar resposta a esta directiva que cria condies para a proteco dos grupos populacionais mais vulnerveis. O estabelecimento do atestado de pobreza, por exemplo, contribui sem dvida para atenuar as dificuldades sentidas por estes grupos especficos. No entanto, o alcance destas medidas ainda muito reduzido, sendo por isso necessrio criar formas de agilizar os mecanismos de atribuio e a cobertura geogrfica, em termos quantitativos e qualitativos. A Directiva 9 estabelece que os Estados devem promover de forma permanente uma vasta distribuio de material educativo criativo, programas de formao e informao pblica abertamente concebidos para a mudana de atitudes de discriminao e estigmatizao associados ao HIV e SIDA para o favorecimento da compreenso e aceitao. O CNCS aprovou em 2006 a Estratgia Nacional de Comunicao, o que est em linha com esta directiva, embora o processo de sua implementao ainda esteja longe de ser efectiva ou abrangente. A Directiva 10 estabelece que os Estados devem assegurar que o governo e o sector privado desenvolvem cdigos de conduta relacionados com as questes de HIV e SIDA que traduzem princpios de direitos humanos em cdigos de responsabilidade e prtica profissional, com mecanismos de acompanhamento para implementao e cumprimentos desses cdigos. O Diploma Ministerial n 40/2003 de 2 de Abril, o qual define os mecanismos de parceria entre o Servio Nacional de Sade e o Sector Privado de fins no lucrativos, e o compromisso de Kaya Kwanga, que determina um cdigo de conduta para orientar a parceria para o desenvolvimento da Sade em Moambique, so alguns dos instrumentos que o governo j estabeleceu e que esto em linha com esta directiva, mas muito ainda tem que ser feito para abranger a maior parte das reas de actividade. A Directiva 11 estabelece que os estados devem assegurar a monitoria e mecanismos de cumprimento para garantir a proteco de direitos humanos relacionados com o HIV e SIDA, incluindo os das pessoas vivendo com o HIV e SIDA, suas famlias e comunidades.

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Ao criar o CNCS, o Governo tinha em vista garantir o respeito e o cumprimento desta directiva. Em 2003 na Conferncia Internacional sobre HIV e SIDA em frica (ICASA) foi estabelecido um princpio de coordenao que veio a ser conhecido por Three Ones. Este estabelece a existncia e reconhecimento dum nico processo de planificao, dum nico rgo de coordenao e dum nico sistema nacional de monitoria e avaliao. Moambique aderiu tambm a este princpio e j iniciou a sua implementao desde 2005. Directiva 12 recomenda que os Estados devem cooperar atravs de todos os programas relevantes e agncias do sistema das Naes Unidas, incluindo a ONUSIDA, para partilhar conhecimentos e experincias relacionados com questes de direitos humanos e HIV e devem assegurar mecanismos efectivos de proteco dos direitos humanos no contexto de HIV e SIDA a nvel internacional.

O processo de administrao do TARV em Moambique teve incio com a interveno de algumas organizaes no governamentais, em parceria estreita com o MISAU. Desde a altura da sua introduo, vrias entidades tm desenvolvido aces com vista a providenciar este servio, sendo de destacar as seguintes organizaes: Columbia University - est presente nas provncias de Maputo, Gaza, Inhambane, Zambzia e Nampula; HAI - cobre as provncias de Manica e Sofala; Elizabeth Glaser Pediatric AIDS Foundation - opera nas provncias de Maputo, Gaza, Nampula e Cabo Delgado; Vanderbilt University - trabalha na provncia da Zambzia; Comunidade do Santo Egdio - opera nas provncias da Maputo, Sofala e Zambzia. Apoiam ainda algumas ONGs pequenas na administrao deste servio; Mdicos Del Mundo - est representada e a trabalhar em Maputo e Cabo Delgado; MSF da Blgica - est em Maputo e Tete; e MSF da Sua - trabalha em Maputo e Lichinga. Viso mundial FHI

O sistema das Naes Unidas em Moambique, atravs do seu programa de trabalho, o Quadro das Naes Unidas para Assistncia ao Desenvolvimento (UNDAF) 2007-2009, tem aces concretas de apoio ao governo na resoluo dos problemas sociais e define trs rea de cooperao nomeadamente: Governao, Capital Humano e HIV e SIDA. Para alm dessas doze directrizes consistentes, a organizao das Naes Unidas (ONU), a Conferncia para o Desenvolvimento da frica Austral (SADC) a Organizao da Unidade Africana (OUA) e mais tarde a Unio Africana (UA), a Comunidade de Pases de LnguaKULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

A Columbia University, a HAI e a Elizabeth Glaser Pediatric AIDS Foundation so as maiores ONGs que trabalham nesta rea da sade, atravs de parcerias com as OCBs, fazem chegar no somente o TARV, mas tambm a assistncia domiciliria at as pessoas que necessitam destes servios. O sector de sade, atravs das DPSs coordena as actividades de tratamento do HIV e SIDA em todas as provncias do pas implementadas pelas ONGs ou CBOs.

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Portuguesa(CPLP) emitiram vrias declaraes, cdigos entre outros documentos, sobre o HIV e SIDA e direitos humanos s quais Moambique aderiu. No obstante estes documentos no serem to pormenorizados como as Directivas Internacionais, tm sua importncia que merece destaque, por reafirmarem a luta contra o HIV e SIDA, tendo como base os direitos humanos. Nos pargrafos seguintes , esto listados alguns desses documentos, e em anexo ao presente relatrio encontram-se uma tabela contendo outros acordos assinados neste mbito. Em 1997 foi aprovado pela SADC, o Cdigo sobre o HIV e SIDA e Emprego, que visa consolidar os cdigos nacionais de emprego, sobre as questes relacionadas com o HIV e SIDA e, sensibilizar os empregadores sobre estas questes. Em 2001 a ONU aprovou a declarao da vigsima sexta Sesso Especial da Assembleia Geral das Naes Unidas sobre HIV e SIDA, UNGASS, que visa uma aco global contra o HIV e SIDA e combate e de outras doenas transmissveis, como a Malria e a Tuberculose. Existem outros documentes importantes, como a Conveno sobre a eliminao de todas as Formas de discriminao, a Conveno Internacional sobre os Direitos, Civis e Polticos entre outros, que no abordam especificamente o HIV e SIDA, por terem sido adoptadas antes da sua existncia, mas sublinham aspectos como a igualdade, dignidade, privao, proibio de experincia mdica ou cientfica sem o consentimento livre e informado e o direito sade. Em 2003 a SADC aprovou a Declarao de Maseru sobre o HIV e SIDA, que enfatiza o cometimento em relao a declarao de Abuja. Sublinha o papel social da desigualdade do gnero, na disseminao do HIV e SIDA. Reala a importncia de fortalecer as capacidades da mulher e criana providenciando servios de sade, para alm de focar a preveno e remoo do estigma e descriminao (UNDP, 2007:9). Conferncia Internacional sobre o SIDA e Infeces de Transmisso Sexual (ICASA), realizada em Setembro de 2003 no Qunia, envolvendo funcionrio que trabalham no campo sobre HIV e SIDA junto com representantes de organismos multilaterais e bilaterais como ONGs, sector privado que culminou com a adopo de trs princpios fundamentais tambm conhecidos como trs uns, a serem aplicadas por todas as partes interessadas na resposta ao HIV e SIDA a nvel nacional: Um s marco de aco contra o SIDA que proporcione a base para coordenar o trabalho de todos. Uma autoridade nacional de coordenao da luta conta o SIDA com um comando multisectorial amplo Um sistema de vigilncia e avaliao em todo o pas (ONUSIDA, s/d:1). Declarao de Brazzaville emitida em 2006, pela UA, com apoio da OMS, ONUSIDA; EGA e DFID, para o cometimento em relao a preveno, acesso universal, tratamento e cuidados em frica. Subscrito por chefes de Estado e governo, parlamentares, sociedade civil, pessoas vivendo com HIV e SIDA, mulheres, jovens, organizaes religiosas, com a qual sadam a contribuio vital das comunidades e governos para lutarem contra o HIV e SIDA.KULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

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IV.2.3.RESPOSTAS AO HIV E SIDA BASEADAS NOS DIREITOS HUMANOS As abordagens ao HIV e SIDA baseadas nos direitos humanos so reais. Pases como o Brasil, que colocaram os direitos humanos no centro das suas respostas ao SIDA conseguiram reduzir a epidemia. Exemplos das respostas ao HIV e SIDA baseadas em direitos humanos incluem as seguintes componentes: 1) Assegurar que os programas nacionais de resposta ao HIV e SIDA incluam medidas visando combater a discriminao e violncia contra as pessoas vivendo com o HIV ou SIDA e pessoas em risco de infeco; 2) Assegurar que os jovens tenham pleno acesso informao sobre o HIV e SIDA, educao sexual e sobre habilidades para a vida, bem como aos preservativos e servios para ITS e planeamento familiar; 3) Investir na potenciao de pessoas vivendo com HIV ou SIDA, para que conheam os seus direitos e se mobilizem; 4) Introduo de alteraes de polticas com vista a reduzir a superlotao das prises, para que as pessoas sejam menos vulnerveis ao HIV, a violncia sexual e a partilha de seringas enquanto estiverem presas; 5) Eliminao das barreiras legais e de outra natureza preveno e tratamento do HIV para as pessoas que usam drogas ilegais; 6) Estabelecimento de medidas legais contra a violncia e discriminao para com os trabalhadores de sexo, homens que mantm relaes sexuais com outros homens e outros grupos marginalizados; e 6) Providenciar para as mulheres, medidas eficazes contra todas as formas de violncia baseada no gnero dentro e fora do casamento, bem como fazer frente discriminao permitida legalmente no acesso s oportunidades econmicas de propriedade e herana (Reunio de Alto Nvel das Naes Unidas sobre o HIV e SIDA, 2006). IV.2.3.1. HIV E SIDA E DIREITOS HUMANOS NO LOCAL DE TRABALHO EM MOAMBIQUE

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As directivas acima indicadas contriburam para que os Estados criassem leis voltadas para a preservao dos direitos das PVHS, ento oportuno detalhar a lei aprovada pelo governo de Moambique com esse propsito. A Lei 5/2002 de 5 de Fevereiro, que protege trabalhadores ou candidatos a emprego por serem suspeitos ou portadores do HIV e SIDA, na sua nota introdutria, reconhece que o HIV e SIDA, e os seus efeitos na sociedade, vem assumindo propores considerveis, constituindo deste modo uma ameaa objectiva ao exerccio dos direitos fundamentais do cidado, a harmonia social e ao desenvolvimento do pas. Este reconhecimento do estado moambicano objectiva a criao de medidas de defesa do ser humano, face excluso, estigmatizao, discriminao e outras formas tendentes proteco social e emocional dos trabalhadores e candidatos a emprego vivendo com HIV e SIDA. A Lei 5/2002 de 5 de Fevereiro tem uma ligao com os direitos humanos, ao consagrar direitos de proteco de trabalhadores e candidatos a emprego suspeitos ou portadores do HIV e SIDA. Desta maneira, este instrumento jurdico-legal mostra claramente que a melhor maneira de respeitarmos os direitos humanos reconhecer a dignidade da pessoa humana, com particular destaque para aquelas pessoas cuja condio social seja socialmente vulnervel. Portanto, sem reconhecer a dignidade de trabalhadores e candidatos a emprego vivendo com HIV e SIDA, no possvel falar de direitos humanos. A clareza desta lei est fundada ainda na consagrao dos direitos a um grupo especfico face vulnerabilidade e coercibilidade scio-laborais a que estejam sujeitos, nos sectores pblicos e privados, incluindo os trabalhadores domsticos. No seu artigo quarto, a lei em referncia advoga a proteco dos direitos humanos deste grupo, ao consagrar a "proibio de testes de HIV e SIDA aos trabalhadores ou a candidatos a emprego, sem o consentimento do trabalhador ou candidato a emprego". Os artigos quinto e sexto falam da privacidade, confidencialidade e consentimento do trabalhador em prestar ou no informaes sobre a sua condio de seropositividade.7 Um outro artigo importante dessa lei o stimo, referente a igualdade de oportunidades, que assume que "os trabalhadores no devem ser discriminados nos seus direitos de trabalho, formao, promoo e progresso na carreira por serem portadores de HIV e SIDA". E que "a todos os trabalhadores deve ser assegurado o princpio de igualdade de direitos de oportunidades em funo do seu mrito e capacidade de desempenhar a sua funo laboral". Deixando claro que, qualquer tentativa de discriminar e excluir trabalhadores portadores de HIV e SIDA no tem

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http://port.pravda.ru/cplp/mocambique/20031-1/

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fundamento legal nem moral e deve ser combatida, com vista a proteger-se a dignidade do ser humano.8 Assim, a Lei 5/2002 de 5 de Fevereiro baseia-se no princpio de que todos os trabalhadores vivendo com HIV e SIDA tm direitos iguais e a um tratamento igual, no que concerne aos direitos humanos.

IV.2.4.ACES NA REA DO HIV E SIDA E DIREITOS HUMANOS No papel, o lugar dos direitos humanos na resposta ao HIV esto bem definidos. Os governos signatrios Declarao de Compromisso sobre o HIV e SIDA de 2001 acordaram tomar medidas sobre o HIV e direitos humanos, e reconfirmaram este compromisso cinco anos mais tarde. Todavia, na prtica, poucos esforos foram envidados para financiar, incluir no oramento e implementar os programas nacionais que poderiam garantir a proteco legal e dos direitos humanos para as pessoas vivendo com, afectadas por ou vulnerveis ao HIV e SIDA. At 2003, quase metade dos governos da frica Subsahariana ainda no haviam adoptado legislao bsica especificamente criminalizando a discriminao contra as pessoas vivendo com HIV ou SIDA. Somente 1/3 dos pases em todo o mundo haviam adoptado medidas legais especificamente criminalizando a discriminao contra as pessoas especialmente vulnerveis ao HIV. Apesar do grande aumento do financiamento para programas globais de HIV e SIDA, houve pouco investimento em iniciativas bsicas de direitos humanos, tais como: 1) Campanhas "Know Your Rights"9 e servios legais para pessoas vivendo com e afectadas pelo HIV; 2) Auditorias relacionadas com o HIV da legislao nacional e aplicao da lei; 3) Formao em no discriminao, confidencialidade e consentimento informado para os trabalhadores da sade, polcia, juzes, e assistentes sociais; e 4) Auto-advocacia e participao por mulheres, jovens, pessoas vivendo com HIV, pessoas que usam drogas, trabalhadores de sexo, homens que tm sexo com homens, prisioneiros, e emigrantes/imigrantes nos quadros nacionais de aco sobre o SIDA, autoridades coordenadoras e sistemas de monitoria e avaliao (Reunio de Alto Nvel das Naes Unidas sobre o HIV e SIDA, 2006).8 9

http://port.pravda.ru/cplp/mocambique/20031-1/ Em Portugus, "Conhea os seus direitos".

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Uma avaliao da implementao da Declarao de Compromisso sobre o HIV e SIDA realizada em 2006 em 14 pases concluiu que "os abusos de direitos humanos das populaes vulnerveis continuam sendo srios, recusando-lhes o acesso aos servios e instrumentos para a preveno da infeco do HIV e aos medicamentos contra o SIDA que as mantm vivas" (Reunio de Alto Nvel das Naes Unidas sobre o HIV e SIDA, 2006). Em 2003, o ento secretrio-geral das Naes Unidas, Kofi Annan, afirmou que "os direitos humanos associados ao HIV no so suficientemente altos entre as prioridades dos governos nacionais, doadores, ou organizaes de direitos humanos" (Reunio de Alto Nvel das Naes Unidas sobre o HIV e SIDA, 2006). "A realizao dos direitos humanos e liberdades fundamentais para todos essencial para reduzir a vulnerabilidade ao HIV e SIDA" 10

V. TARV E CUIDADOS RELACIONADOS AO HIV E SIDA EM MOAMBIQUEV.1. PROCESSO DE INTRODUO E EXPANSO DO TARV A situao que a frica Sub-Sahariana enfrenta em relao epidemia do HIV e SIDA sugere a adopo de medidas urgentes, mais abrangentes, para alm da abordagem preventiva: entre estas, tambm a introduo do tratamento anti-retroviral (TARV) em grande escala. At ao ano 2001, Moambique manteve uma posio oficialmente contrria incluso da TARV na campanha de luta contra a SIDA, com o argumento do elevado custo associado, limitaes laboratoriais, de recursos humanos e at dvidas sobre a capacidade dos infectados aderirem de foram integral a um programa de tratamento anti-retroviral, descrito como altamente complexo. A maioria dos doadores, incluindo os grandes contribuintes na campanha contra a SIDA (Banco Mundial, Unio Europeia, USAID e outros) tambm manteve uma posio contrria introduo dos anti-retrovirais sob os mesmos argumentos. Entretanto, mesmo com as restries e reservas oficialmente apresentadas at 2001, em relao aos anti-retrovirais, algumas ONGs internacionais11 esforaram-se em demonstrar a viabilidade da possibilidade de introduo da TARV. O prprio MISAU investia em trabalhos preparatrios para a introduo de anti-retrovirais. Alguns mdicos associados ao sector privado, mas com algum vnculo com o Programa Nacional de Combate s ITS, HIV e SIDA, foram pioneiros na introduo da TARV nas clnicas privadas, num esquema complexo que inclua o transporte de amostras para anlises laboratoriais na vizinha frica do Sul (a custos que chegavam a 500 dlares americanos por ms por paciente). Algumas farmcias privadas tambm tomaram a dianteira na importao10

Reunio de Alto Nvel das Naes Unidas sobre o HIV e SIDA (2006) citando a Sesso Especial da Assembleia Geral das Naes Unidas sobre o HIV e SIDA, Declarao de Compromisso sobre o HIV e SIDA. Comunidade Santo Egdio, Mdicos Sem Fronteiras e Health Alliance International.

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de algumas drogas anti-retrovirais que alimentavam o sector privado que j havia iniciado a administrao da terapiaantiretroviral. Estes canais de introduo do TARV em Moambique demonstram a posio de vanguarda que algumas instituies da sociedade civil, sejam ONGs ou Clnicas privadas tomaram de modo a torna-se o TARV disponvel em Moambique. Entretanto, esta forma de actuao acarretava certos riscos, que incluam: 1) A perda da oportunidade de reforar o sector de sade em geral, atravs da injeco de recursos proporcionados pelos programas de combate epidemia do HIV e SIDA; 2) Em casos extremos, enfraquecimento do Sector Sade por distores impulsionadas pelas prprias intervenes (drenagem interna de recursos, como por exemplo pessoal, queda de ateno sobre outros programas de grande impacto sobre a morbimortalidade, etc.); 3) No sustentabilidade financeira, tcnica e institucional de intervenes marcadas por um excessivo grau de dependncia dos parceiros. Os esforos at aqui empreendidos para tornar disponvel o TARV traduziam-se em intervenes aparentemente verticais, de eficcia e eficincia variveis, e caracterizadas por uma fraca integrao com o sector pblico de sade existente. Reconhecendo que a terapia antiretroviral j havia sido introduzida em Moambique, atravs de iniciativas do sector privado e algumas ONGs, a ttuloKULA: Estudos & Pesquisas Aplicadas, Lda.

O Plano Estratgico Nacional de Combate s ITS, HIV e SIDA Sector Sade 2004-2008 sublinha-se a necessidade de integrar os programas de combate epidemia no Sector Pblico de Sade. Em particular, no captulo IV.1 do Plano Estratgico (Princpios de Base), so mencionados os seguintes pontos: 1. Favorecer as intervenes da responsabilidade do MISAU, de comprovado custo-eficcia e abordagem de direitos humanos; O PEN ITS, HIV e SIDA-Sector Sade articula-se dentro do quadro legal e institucional existente no MISAU (...); Reforo do sistema no seu todo, e no apenas das componentes ligadas ao HIV e SIDA; Prioridade aos servios preventivos a todos os nveis, segundo o quadro princpio de priorizao das componentes e dos servios de apoio; Prioridade na implementao das componentes em funo de a) zona de alta prevalncia e b) reas com potencial deficincia (...); As novas componentes (GTV, PTV, TARV, CD, SAAJ) tm um conceito funcional mais do que fsico e devem integrar-se nas estruturas existentes; A expanso do programa faseada, assegurando a existncia dum sistema de referencia (...); A qualidade do atendimento e dos servios oferecidos fundamental (...); O PEN ITS, HIV e SIDA - Sector

2.

3.

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5.

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7.

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9.

Sadeaspectos

toma em considerao osinerentes ao gnero;

10. O perodo 2004-2005 corresponde a uma fase piloto, a partir da qual adaptaes sero realizadas. A fase 2006-2008 ser caracterizada pela expanso, tendo como base as lies aprendidas durante a fase piloto; 11. As estratgias desenvolvidas dentro do PEN ITS, HIV E SIDA - Sector Sade servem para reforar o processo de descentralizao da planificao e gesto provincial. Por outras palavras, o PEN do MISAU tem conscincia dos riscos duma TARV no integrada no sistema e sublinha que deve ser garantida a equidade.

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piloto, e com muito baixo grau de cobertura, o MISAU avanou na procura de sadas oficiais e formais sobre a problemtica do tratamento anti-retroviral em Moambique. O MISAU consolidou o seu Comit de Especialistas para estudar os custos da introduo de anti-retrovirais e argumentou diante dos seus pares governamentais (cpula do CNCS) em favor do incio oficial e regulamentado do uso de anti-retrovirais em Moambique. Os estudos de viabilidade para a introduo de anti-retrovirais e evitar a transmisso vertical j haviam iniciado antes com apoio de organizaes que trabalham na rea da criana como o UNICEF e outras, que apoiavam programas de preveno da transmisso vertical. Essa e outras aces em prol da introduo dos anti-retrovirais (como a disposio de alguns doadores e ONGs em investir na rea, bem como a nfase no discurso de que a TARV devia ser vista como parte complementar dos esforos de preveno) culminaram com a aprovao do Diploma Ministerial n 183-A/2001, de 18 de Dezembro, regulamentado o processo de introduo oficial dos anti-retrovirais no pas. O Diploma considera a ressalva de que a introduo da TARV deveria ter em conta que as instituies de sade somente cobrem 30 a 40% da populao e que no seria possvel cobrir nos prximos anos toda a populao infectada reunindo os critrios clnicos para o incio da terapia. O Boletim que regulamenta a introduo dos anti-retrovirais prev que, numa primeira fase, a terapia venha a ser administrada nos hospitais centrais e provinciais com mdicos habilitados que possam ser indicados como referncia, assim como a continuao do que j era feito nas clnicas privadas com o acrscimo das credenciais do MISAU para a administrao da terapia antiretroviral. O mesmo Diploma Ministerial tambm regulamenta a introduo da preveno da transmisso vertical, estimada em cerca de 26% de ocorrncias, incluindo o acompanhamento pr-natal, durante o parto e o perodo ps-parto, incluindo a administrao da Niverapina. Os programas de preveno da transmisso vertical comearam por ser introduzidos em 4 unidades sanitrias como parte das iniciativas piloto para a sua introduo mais generalizada. Em 2003, j existiam 23 unidades sanitrias em 6 provncias do pas a prestar servios de preveno da transmisso vertical. O MISAU desenvolveu normas e protocolos para a preveno da transmisso vertical, administrao da TARV nos hospitais pblicos e clnicas privadas, bem como a regulamentao do sector farmacutico, tendo seleccionado algumas unidades farmacuticas para a venda de anti-retrovirais, dentro de um sistema rigoroso de registro de receitas e nomes de mdicos autorizados. Em 2002, a TARV j estava a ser administrada no Hospital Central de Maputo e Hospital Central da Beira, que dispem de uma nova estrutura de suporte laboratorial para o efeito, havendo a perspectiva de expanso para Zambzia e Nampula, com o recurso aos trs laboratrios existentes na