137
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS. ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO BRASIL: UMA PROPOSTA DE SISTEMATIZAÇÃO. Kariny Cristina de Souza Raposo Belo Horizonte 2007

ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS.

ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO BRASIL: UMA

PROPOSTA DE SISTEMATIZAÇÃO.

Kariny Cristina de Souza Raposo

Belo Horizonte

2007

Page 2: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

2

KARINY CRISTINA DE SOUZA RAPOSO

ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO BRASIL: UMA

PROPOSTA DE SISTEMATIZAÇÃO.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em

Letras da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais,

como parte dos requisitos para a obtenção do grau de Mestre

em Língua Portuguesa, elaborada sob a orientação do

Professor Dr. Hugo Mari.

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Belo Horizonte

2007

Page 3: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

3

Dissertação defendida publicamente no Programa de Pós-graduação em Letras da

PUC-MINAS e aprovada pela seguinte Comissão Examinadora:

___________________________________________________________

Prof. Dr. Paulo Henrique Aguiar Mendes. PUC Minas

___________________________________________________________

Prof. Dr.Antônio Luiz Assunção. UFSJ

___________________________________________________________

Prof. Dr. Hugo Mari.

Orientador (PUC Minas)

Belo Horizonte, 26 de janeiro de 2007.

________________________________________________

Prof. Dr. Hugo Mari

Coordenador do programa de Pós-graduação em Letras

PUC - Minas

Page 4: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

4

"Procuro despir-me do que aprendi.

Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,

e raspar a tinta com que me pintaram os sentidos.

Desencaixotar minhas emoções verdadeiras.

Desembrulhar-me e ser eu, não Alberto Caeiro, mas um animal

humano que a natureza produziu.

Mas isso (triste de nós que trazemos a alma vestida!),

Isso exige um estudo profundo,

Uma aprendizagem de desaprender..."

Alberto Caeiro

Page 5: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

5

Agradecimentos sinceros,

aos meus pais, Vânia e Humberto. O que sou hoje é um reflexo

do amor e da confiança com que vocês sempre me

incentivaram. Por isso, coloco neste trabalho toda a minha

vontade de ver em seus olhos, o orgulho por mais esta nossa

conquista.

Page 6: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

6

Agradeço também,

ao CNPQ pelo financiamento deste trabalho;

ao Professor Hugo Mari, pelo incentivo e pelas valiosas orientações, mas, sobretudo,

pela confiança em mim depositada, pelo método , sutileza, e grandeza de mestre

que me fizeram chegar até aqui...

à minha irmã e amiga Karla, sempre orgulhosa pelas minhas conquistas... você sabe

o quanto lutei por este sonho, mas hoje tenho certeza que não estive sozinha. Sua

presença é muito intensa em tudo o que faço.

ao meu marido, Bruno, pelo companheirismo, atenção, apoio e compreensão

dispensados a mim (a nós) em cada instante.

Katy, minha amiga irmã. Você sempre foi exata e necessária nesta minha

caminhada.

aos professores do Mestrado, especialmente aos professores Paulo Henrique e

Marco Antônio pela disponibilidade e pelos incentivos diários.

aos colegas e sempre amigos do mestrado. Bruno, Darinka, Sílvia e Renata.

Maria Regina, o que a gentileza livremente oferece, agradecimentos não podem

pagar.Você foi o máximo.

Page 7: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

7

ao prof. Aderlande, por ter sido o primeiro a me abrir as portas deste universo que

tanto amo;

ao prof. Valdemar, pelo incentivo durante a graduação que me fez ter a coragem

necessária para apostar neste sonho que agora se concretiza;

à Martha Cortes pelas revisões dos textos em inglês;

A Deus... pela vida, pelo amor, pelas amizades, pelas pessoas que colocou em meu

Caminho...pelos sorrisos que ganhei, pelas noites que passei acordada, pelos

tropeços, pela família maravilhosa que tenho ... Por ter me dado tanto sem nada

pedir em troca.

A todos que, de alguma forma, contribuíram para a realização deste trabalho.

Agradecimento especial

Professor Hugo Mari,

querido mestre, Professor, Doutor Hugo Mari, grande educador, que com firmeza,

amizade e imensa sabedoria, orientou-me.

Page 8: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

8

RESUMO

“Quem tem frase de vidro

não joga crase na frase do vizinho”. Ferreira Gullar

Neste trabalho, apresento uma nova visão sobre as expressões idiomáticas do

português brasileiro e um quadro teórico para a sua análise que foi elaborado e

ilustrado no capítulo 2. Minha abordagem foi determinada pelos objetivos

estabelecidos no capítulo 1, na parte reservada para um estudo sistematizado sobre

as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais específicos

são propostos: a importância do desenvolvimento de estudos lingüísticos voltados

para a análise das expressões idiomáticas de um modo geral, e sua contribuição

para uma abordagem do uso específico dessas expressões em mensagens

publicitárias e nos enunciados proferidos por políticos e, por conseguinte, dos efeitos

de sentido produzidos em função desse uso. Os dois primeiros capítulos

identificaram algumas limitações em estudos anteriores, e o capítulo 3 foi escrito à

luz de tal discussão buscando preencher algumas lacunas existentes. Inicio esse

capítulo abordando o problema conceitual no qual as expressões idiomáticas se

inserem e, em seguida, proponho um novo conceito que engloba, além dos aspectos

sintático-semânticos, uma visão das expressões idiomáticas ligadas à prática

discursiva do falante. Essas dimensões de análise – sintática-semântica-discursiva –

são discutidas em detalhe. Concluo esta reflexão estabelecendo uma investigação

sobre o conceito cristalizado das expressões idiomáticas em sua relação com as

intenções enunciativas de quem fala, comprovando que há graus de

composicionalidade no seu significado.

Page 9: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

9

Palavras-chave: Expressões idiomáticas; Sentido; Metaforização; Linguagem;

Composicionalidade.

ABSTRACT

In this paper, I present a new vision on Brazilian Portuguese idiomatic

expressions and a theory for its analysis which was elaborated and illustrated in

chapter 2. My approach was determined by objectives established in chapter 1, in the

part reserved for a systematized study on idiomatic expressions in Brazilian

Portuguese. Two more specific objectives are proposed: the importance for the

development of the linguistic studies focused on the analysis of the idiomatic

expressions in general, and its contribution for an approach of the specific use of

those expressions in advertising messages and in statements uttered by politicians

and, consequently, the sense effects produced due to that use. The first two chapters

identify some limitations in previous studies, and chapter 3 is written in light of such

discussion looking for filling out some existing gaps. I begin that chapter approaching

the conceptual problem in which the idiomatic expressions are inserted and,

afterwards, I propose a new concept that includes not only syntactic-semantic

aspects but also a vision of idiomatic expressions linked to the speaker's discursive

practice. Those analysis dimensions - syntactic-semantics-discursive - are discussed

in detail. I conclude this reflection establishing an investigation on the crystallized

concept of idiomatic expressions in its relationship with the speaker’s enunciative

intentions, proving that its meaning can be compositional in different degrees.

Words-key: Idiomatic expressions; Sense; Metaphorization; Language;

Composicionality.

Page 10: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

10

LISTA DE ABREVIATURAS:

EI – EXPRESSÃO IDIOMÁTICA.

EPPS – ENUNCIADOS PROFERIDOS POR POLÍTICOS.

SN – SINTAGMA NOMINAL

SV – SINTAGMA VERBAL

SADV – SINTAGMA ADVERBIAL

SF – SINTAGMA FRASAL

SO – SIGNIFICADO

SE – SIGNIFICANTE

EX - EXEMPLO

Page 11: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

11

SUMÁRIO:

1 INTRODUÇÃO: 1.1 Tema...........................................................................................................13

1.2 Objetivos....................................................................................................17

1.3 Pressupostos.............................................................................................19

1.4 Procedimento.............................................................................................19

1.5 Organização do trabalho...........................................................................20

2 A CONDIÇÃO DOS ESTUDOS SOBRE AS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS:

2.1 O estado atual das expressões idiomáticas...........................................25

2.1.1 Introdução...............................................................................................25

2.1.2 As Expressões Idiomáticas na visão de alguns lingüistas................26

3 PROPOSTA DE CONCEITO:

3.1 O conceito: estruturas e análises...........................................................38

3.1.1 Introdução..............................................................................................38

3.1.2 EI: um problema conceitual..................................................................39

3.1.2.1 Natureza morfossintática das EIs.........................................................40

3.2 O conceito.................................................................................................42

3.2.1 As EIs e os provérbios...........................................................................48

3.2.1.1 Seção “Frases”: um gênero do discurso................................................54

3.2.1.2 Sobre os gêneros...................................................................................55

3.2.1.3 Descrição do gênero “Seção de Frases”...............................................57

3.3 EIs: uma abordagem discursiva...............................................................59

3.3.1 Introdução................................................................................................60

3.3.2 Por uma noção de enunciação e argumentação..................................60

3.3.3 A importância das EIs na construção do Ethos...................................63

Page 12: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

12

3.3.4 Orador e auditório...................................................................................65

3.3.5 Apontamentos práticos..........................................................................67

3.4 Síntese Parcial............................................................................................76

4 MÉTODO DE ANÁLISE DO CORPUS:

4.1 Análise do corpus: características sintático-semânticas........................79

4.1.1 Introdução................................................................................................79

4.1.1.1 A composicionalidade na construção do significado das EIs...................79

4.1.2 O conceito de cristalização das EIs.......................................................85

4.3 Metodologia..................................................................................................88

4.3.1Apontamentos práticos..............................................................................89

4.3.1.1 sintagmas verbais.....................................................................................89

4.3.1.2 sintagmas nominais..................................................................................99

4.3.1.3 sintagmas adverbiais..............................................................................103

4.3.1.4 sintagmas frasais....................................................................................105

4.4 Algumas considerações importantes.......................................................106

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................110

REFERÊNCIAS...................................................................................................113

ANEXO................................................................................................................116

Page 13: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

13

1. INTRODUÇÃO.

É fácil acusar a existência de um lugar-comum, mas nem todos sabem dizer em que consiste a verdade que o inspirou.

(Fernando Sabino)

1.1 Tema:

O processo de construção do sentido das expressões idiomáticas.

As expressões idiomáticas (doravante EIs) são construções metafóricas e

cristalizadas no uso freqüente da língua. Formadas por palavras que mantêm uma

relação de dependência entre si, podendo ser compreendidas somente quando

considerado todo o conjunto no qual estão inseridas. Formam grupos fraseológicos

que atendem às necessidades de expressão dos falantes, pois são formas simples

que conseguem transmitir uma idéia de maneira completa. As EIs são importantes

recursos discursivos tanto para os falantes quanto para os aprendizes da língua.

Constituindo seqüências de lexemas, tais expressões têm-se apresentado na forma

de várias estruturas sintagmáticas, exigindo do observador maior cuidado em sua

classificação tipológica.

Partindo de uma concepção de metáfora como um fenômeno cognitivo-social,

Lakoff e Johnson (1980) revelam que nosso sistema conceitual busca recursos

metafóricos para expressar uma infinidade de conceitos. Compreende-se esse

caráter metafórico da língua, quando se observa, no discurso, relações conceituais

estabelecidas na composição de expressões, de enunciados e endereçados a

referentes, na maioria das vezes decodificados. Tal fato se dá automaticamente e,

dificilmente, as pessoas se dão conta de que estão utilizando metáforas para auxiliá-

las a expressar suas idéias.

Ao dizermos, por exemplo, “João deu bola para Maria”, estamos expressando

metaforicamente que João está paquerando Maria. No entanto, acredita-se que, ao

Page 14: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

14

utilizar essa metáfora, o falante recorre automaticamente ao conceito metafórico

básico de que “no jogo de futebol só se dá a bola para o companheiro de equipe que

estiver em situação estratégica mais vantajosa para que se faça o gol”, conceito este

que já se encontra estruturado em sua mente. Vejamos esse outro exemplo: ao dizer

que “Maria é cheia de nove horas”, o falante expressa metaforicamente que Maria é

uma pessoa complicada. De acordo com o exemplo mostrado anteriormente

assumimos que o falante recorre a esse conceito metafórico, Maria é cheia de nove

horas, por meio de um conceito metafórico básico de que “a figura do cheio de nove

horas representa uma pessoa que dita regras de condutas, complicando as coisas

mais simples”. Enfim, a concepção de metáfora assumida neste trabalho é,

consoante Lakoff e Johnson, um processo cognitivo-social através do qual os

usuários da língua estruturam um domínio conceitual em função de outro domínio

conceitual.

No entanto, não se pode esperar que nenhuma expressão seja compreensível

em razão do contexto histórico que a produziu, isso não está ao alcance dos

falantes. Por isso, em termos gerais, torna-se oportuno considerar, consoante o

pensamento de Lakoff e Jonhson (1980) que a percepção humana é construída com

base em conceitos, ações e relações com outras pessoas. Ou seja, a produção ou a

identificação do significado de uma expressão metafórica parece ocorrer porque os

falantes de uma mesma língua possuem os conceitos metafóricos já estruturados

em suas mentes, sem se darem conta disso. Dessa forma, a compreensão destas

metáforas se dá devido ao fato de os conceitos metafóricos correspondentes terem

uma base social e cultural, sendo que seus significados são compartilhados pelos

membros de uma mesma sociedade. Por outro lado, Steen (1994) questiona se, no

caso de metáforas convencionais (aquelas cujos significados são automaticamente

ativados), os conceitos metafóricos referentes a estes significados são realmente

ativados na mente de cada indivíduo. Para esse autor, muitos significados

metafóricos passaram a ser acessíveis diretamente assim como se dá nos casos de

significados literais. Isso explicaria, talvez, o fato de um falante decodificar a

expressão “fazer das tripas coração”, pois mesmo depois de aprendê-la o

leitor/falante pode não encontrar relação alguma entre ela e a imagem aludida, ou

Page 15: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

15

melhor, acredita-se que ele não saiba por que “fazer das tripas coração” significa

“dar o máximo de si”.

Vimos então que, na sua origem, a motivação de todas as expressões é

metafórica e:

“No processo de metaforização, cada componente da expressão perde sua função nominativa própria e se dessemantiza, isto é, não adquire uma nova função nominativa, pois é a expressão idiomática vista como um todo que adquire essa nova função”. (Xatara, 1998:150).

Com base nisso, pode-se dizer que as EIs são fruto de um processo metafórico

de criação. A metáfora surge normalmente na evolução do léxico de um língua sobre

base de palavras já existentes tendo como propósito denominar novos fenômenos

ou objetos, ou renomear outros com algum propósito estilístico. Vejamos, então,

como a metáfora opera para criar uma EI.

Segundo Adam Makkai (1975:16), é mais fácil relacionar dois elementos já

existentes para formar uma expressão idiomática do que inventar novos termos. O

autor diz que há uma rima psicológica que une um significado original ao significado

idiomático. A rima psicológica foi definida por ele como uma série de combinações

pré-lógicas, baseadas nos graus de similaridade e extensão metafórica ou nos

significados associados. Vejamos as próprias palavras do autor:

“O que nos impede de fabricar novas séries de sons não é tanto a dificuldade que isto supõe, mas as convidativas e sedutoras possibilidades de rima psicológica, as latentes analogias que estão presentes em quase todas as esferas da vida humana” (Makkai, apud Roncolato,2001).1

Para nós, essas rimas psicológicas ou latentes analogias seriam o elo entre as

metáforas e as imagens mentais. Tentarei melhor esclarecer este conceito com o

exemplo 2 demonstrado abaixo:

1 Tradução livre de Roncolatto 2001.

2 Exemplo adaptado de Roncolatto 2001.

Page 16: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

16

Ação conseqüente 1: recolhe a lona, retirar as hastes.

Estado mental: racional.

Neste exemplo, há uma tentativa de captar o resultado final da ação: dar uma

solução desesperada para uma situação de impasse. Existe uma associação entre

os significados das palavras componentes da expressão que dão origem a imagem

mental. Esta imagem, por sua vez, gera uma metáfora graças a alguma semelhança

entre o objeto do contexto real, no caso, uma barraca montada sobre hastes de

sustentação, e a situação que se pretende assinalar, alguém com atitudes ríspidas e

grosseiras.

Assim, observa-se que o surgimento da imagem mental dá origem a metáfora

que, por sua vez, procede à expressão idiomática. Cada comunidade lingüística faz

um recorte escolhendo dentre os elementos da realidade social, da história, de

Imagem mental: alguém tem dificuldades para desmontar uma barraca e, por isso, chuta a haste que a sustenta.

Latente analogia: a pessoa está nervosa, apresenta comportamento agressivo.

Metaforização: alguém que chuta a haste de uma barraca demonstra ser agressiva/grosseira.

Expressão Idiomática: chutar o pau da barraca = mostrar-se ríspido, grosseiro.

Razão primária: desmontar uma barraca

Ação conseqüente 2: chutar as hastes Estado mental: desespero

Page 17: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

17

costumes, da religiosidade, da constituição física do ser humano, etc., aspectos que

considera relevantes para suprir suas necessidades expressivas em um

determinado momento. Os elementos escolhidos pela comunidade são reutilizados e

reinterpretados, adquirindo um novo significado, agora idiomático.

Então, de um lado temos o criador da metáfora, inserido em um contexto cultural.

Esse por sua vez, tem liberdade criativa para conceber uma metáfora, para,

subjetivamente, “corromper as regras da língua”. De outro lado, temos o receptor,

também inserido em um contexto cultural. Esse parece ter parcialmente limitada sua

liberdade subjetiva para compreender o significado metafórico. Cabe a ele captar,

identificar, e atribuir um dos sentidos adequados ao contexto cultural e referencial

em que o enunciado está inscrito.

Um outro aspecto que merece destaque, no que se refere às EIs, diz respeito ao

que Benveniste (1989, 1995), chama de competência lingüística ( processo de

construção das relações entre enunciador/enunciatário). O emprego das lexias

complexas em determinados contextos ou situações revela conhecimento e domínio

da língua por parte do falante. Além disso, segundo Rwet, (1983 apud Xatara) dizer

que o sentido de uma expressão reduzida é mais simples ou mais transparente que

o de uma expressão complexa – idiomática – é um preconceito. Em que, por

exemplo, o sentido de “paupérrimo”, principalmente se considerarmos um falante

sem escolaridade, que passou a vida no meio rural, seria mais simples ou

transparente que o de “estar com uma mão na frente e outra atrás?”.

1.2 Objetivos:

Esta dissertação tem por objetivo geral um “estudo sistemático das expressões

idiomáticas no português brasileiro” em função de dois objetivos mais específicos:

sua importância para o desenvolvimento dos estudos lingüísticos voltados para a

análise das EIs de um modo geral; e sua contribuição para uma abordagem do uso

específico dessas expressões em mensagens publicitárias3 e nos enunciados

3 É importante ressaltar que as peças publicitárias serão aqui analisadas apenas pelos seus textos

escritos. As imagens (fotos, desenhos, caricaturas, etc.), que comumente integram a peça publicitária,

Page 18: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

18

proferidos por políticos (doravante EPPs) e, por conseguinte, dos efeitos de sentido

produzidos em função desse uso.

Os estudos sobre as EIs apresentam uma grande divergência terminológica e

uma ausência de critérios de análises adequados, que fazem com que as mesmas

sejam consideradas como objetos excepcionais, não destacáveis nos estudos

gramaticais. Além disso, a meu ver, tal recurso expressivo vem sendo tratado, na

maioria das vezes, apenas como produto lexicográfico.

As EIs apresentam uma grande fixidez por definição, própria as unidades

lexicalizadas que aparecem, então, tendo uma existência própria como parte do

léxico e, como associações constantes elas traduzem um hábito verbal. Há,

portanto, dois estágios por que passam as expressões idiomáticas: 1º- o processo

de cristalização e 2º- a freqüência de seu emprego. Assim, num nível mais abstrato

da linguagem, consuma-se o processo de lexicalização categorizando-as como itens

lexicais de um dicionário da língua, porém, como já mencionado, não há um critério

que viabilize, a contento, essa categorização.

Além disso, adotando uma concepção de linguagem como atividade interativa, na

qual interlocutores se instituem como enunciadores/enunciatários, situando-se num

determinado tempo e espaço discursivos em função das condições de

produção/recepção de textos, esta pesquisa pretende trazer uma contribuição aos

estudos lingüísticos de maneira a evidenciar aspectos relevantes no que diz respeito

a um recurso expressivo (expressões idiomáticas) como um importante elemento do

processamento discursivo, bem como investigar os mecanismos léxico-sintático-

discursivos básicos instituintes do processo de formação e identificação das

mesmas.

Pretendo ainda, avaliar os efeitos de sentido resultantes do uso das EIs nos

enunciados proferidos por políticos que, a meu ver, apresentam uma extensão

considerável que possibilitará uma análise rigorosa e exaustiva.

constituindo parte da mensagem, não serão examinadas no presente trabalho, dada a delimitação do tema, que se atém à análise das expressões idiomáticas.

Page 19: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

19

1.3 Pressupostos:

Tentarei mostrar ao longo deste trabalho, como os estudos sobre EIs carecem de

uma maior adequação terminológica e sistematização no que diz respeito ao valor

léxico-semântico.

Ressalto ainda, que tendo a linguagem como base fundadora de todas as

atividades que desenvolvemos em nosso dia-a-dia, o uso de EIs dinamizam as

potencialidades discursivas, revelando, a contento, o perfil do enunciador.

A partir desses pressupostos, e diante de todas as implicações que subjazem a

eles, foram feitas análises que busquem confirmar que as EIs se constituem de um

conhecimento comum, compartilhado e, por isso, o uso das mesmas representa um

apoio essencial para desenvolver uma argumentação. Sua enunciação é em si

mesma um argumento que tem um alcance mais amplo e uma força de incitação

maior, pois se circunscreve em um saber comum.

1.4 Procedimento:

O procedimento adotado na pesquisa foi, primeiramente, a seleção do corpus.

Esse se constitui de um conjunto de EIs encontradas nas publicidades e nos

enunciados proferidos por políticos (EPPs) extraídos das edições semanais das

revistas Veja e Isto É. Das 168 (cento e sessenta e oito) expressões selecionados

no período de março de 2000 a julho de 2006, apenas 22 (vinte e duas) foram

usadas na análise. Tal seleção foi feita por amostragem. Todo material selecionado

é elencado no final da dissertação, visando às possíveis constatações.

A escolha dessas revistas, bem como, dos gêneros publicidade e Seção de

Frases4, justifica-se por alguns motivos: primeiro, pelo fato de se atestar que as EIs

são de uso corrente na língua. Além disso, tais revistas foram escolhidas por

lançarem mão de recursos idiomáticos da língua mantendo um registro semi-formal: 4 A justificativa para a classificação desse gênero será retomada à frente.

Page 20: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

20

portanto, corroboram a argumentação de que as EIs, de fato, não pertencem a um

escopo marginal da natureza lingüística; elas fazem parte do léxico corrente da

língua.

Ainda que assim não fosse, tal escolha é justificada porque os EPPs (sejam eles

de cunho informativo ou marcadamente político-ideológicos) “dialogam” com a

realidade contribuindo para a produção do sentido no contexto situacional em que

se inscreve a interação, envolvendo todas as relações comunicativas entre o Estado

e a sociedade, independente do sistema ou regime.

Dessa forma, a escolha dos EPPs como corpus, tendo em vista o interesse

fundamentalmente político, identificam o seu interlocutor como pertencente a algum

partido político ou a algum cargo na administração pública ou em instituições

privadas.

E nesse contexto, as EIs contribuem efetivamente para representar uma relação

dialética estabelecida entre a legitimidade e a credibilidade, no sentido de que esse

tipo de discurso se caracteriza exatamente pelo fato de o falante buscar se legitimar

através da construção de sua credibilidade. Sendo assim, o efeito de sentido

causado pelas EIs em tais discursos, confere ao mesmo um caráter de aproximação

ao discurso publicitário em geral, cujo único objetivo é o de vender o produto, nesse

caso, a idéia.

Então, pode-se postular que tanto a mensagem publicitária quanto os EPPs

“utilizam recursos estilísticos e argumentativos da linguagem cotidiana, ela própria

voltada para manipular e informar” (Carvalho, 2000:9).

Em segundo lugar, devido à concepção de linguagem que perpassa esta

pesquisa, sendo possível pressupor que este Corpus, devido suas condições de

produção e recepção, evidencia satisfatoriamente o caráter dialógico e interacional

da linguagem humana.

1.5 Organização do trabalho:

O trabalho se organiza em quatro capítulos. No primeiro capítulo apresento uma

introdução do trabalho que, como se pôde ver divide-se em: tema, objetivos,

Page 21: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

21

pressupostos e procedimento. O capítulo 2 constitui uma resenha crítica de estudos

que tratam do estado atual das EIs a partir do qual poderemos situar o problema a

ser abordado. Para tanto, apresento um estudo das EIs sob a ótica de algumas

teorias lingüísticas do século XX que, de alguma maneira, perceberam-nas como

elementos constitutivos dos estudos gramaticais. Pode-se, então, notar claramente

em Chafe (1979), Xatara (1998) e Biderman (2001), que as correntes ligadas à

sintaxe ocuparam-se desse assunto, fazendo cair por terra à tese da

excepcionalidade e irregularidade que sempre lhes foi atribuída. No entanto, a meu

ver, tal estudo ainda não abordou, a contento, aspectos relevantes 5 concernentes

às expressões idiomomáticas que serão, neste trabalho, discutidos.

Já o capítulo 3 estabelece um quadro teórico a ser utilizado na abordagem do

fenômeno em questão. Primeiramente, pretendo elucidar os caminhos que me

levaram a propor um conceito para as EIs que, até então, a meu ver, caracterizam-

se por sua subordinação e adaptação às EIs como produtos isolados. A partir do

conceito, pretendo apontar e justificar a existência de um gênero do discurso “Seção

de Frases”, bem como levantar algumas questões referentes ao funcionamento dos

provérbios, com base nos estudos de Mieder (1977) e Grsybek (1995), que os

diferem das lexias complexas. Posteriormente, as expressões serão apresentadas

como um fenômeno ligado ao processamento discursivo e, para isso, far-se-á

referência à Teoria da Enunciação (Benveniste, 1989), que discorre, grosso modo, a

respeito do processo de construção das relações entre enunciador/enunciatário. A

seguir, a essa teoria serão integrados alguns pressupostos da teoria da

Argumentação, Perelman (1987) e Perelman e Tyteca (2002). Segundo os autores,

a argumentação consiste na retomada da Arte Retórica aristotélica, com vistas a

estabelecer uma contraposição entre demonstração (lógica/formal) e argumentação

(persuasiva/informal). Tendo como parte do Corpus o discurso publicitário,6 meu

5 Tais aspectos serão explicitados no capitulo 3 que se dedica a esta questão. 6 “Na publicidade o emissor utiliza a manipulação disfarçada: para convencer e seduzir o receptor, não deixa transparecer suas verdadeiras intenções, idéias e sentimentos, podendo usar de vários recursos” [...] “O papel da publicidade é tão importante na sociedade atual, ocidentalizada e industrializada, que ela pode ser considerada a mola mestra das mudanças verificadas nas diversas esferas do comportamento e da mentalidade dos usuários/receptores” (Carvalho, 2000:10)

Page 22: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

22

objetivo diante desse quadro teórico, é identificar e sistematizar os recursos

lingüísticos e estilísticos usados como forma de convencimento do público-alvo. E,

diante da escolha dos EPPs como constituinte do Corpus, torna-se relevante apontar

em que dimensão estou considerando o discurso político. Para tanto, recorro às

palavras de Charaudeau (2006) em que lemos:

“O discurso político é, por excelência, o lugar de um jogo de máscaras [...] toda palavra pronunciada no campo político deve ser tomada ao mesmo tempo pelo que ela diz e pelo que ela não diz. Jamais deve ser entendida ao pé da letra”.

A partir desse pensamento, pretendo analisar os efeitos de sentido que as EIs

conferem aos EPPs, assumindo que o uso das EIs nos, já mencionados enunciados,

têm uma função estratégica na construção do Ethos dos atores políticos.

Finalmente, definida a linha teórico-metodológica, no capítulo 4, farei a análise do

Corpus de maneira a constatar que o modo como as partes de uma EI se relacionam

para formar seu significado global, permite em muitos casos trocas paradigmáticas e

conseqüente composicionalidade.7 Esse fato nos permite analisar e considerar uma

relativa gradiência referente ao significado cristalizado das EIs.

As conclusões decorrentes das análises feitas serão apresentadas ao final de

cada capítulo, e cabe ao quinto capítulo apresentar uma conclusão geral. Pretende-

se, através dela, fornecer subsídios para explicitar o funcionamento das EIs do

sistema lingüístico brasileiro, contribuindo, dessa forma, para sua sistematização.

7 Este conceito será explicitado no capítulo 4.

Page 23: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

23

“Lidar com expressões idiomáticas é lidar, de certa forma, com o espírito da língua em

estudo”.

Eliane Roncolatto.

Page 24: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

24

2. a condição dos estudos sobre as

expressões idiomáticas.

Page 25: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

25

2. A CONDIÇÃO DOS ESTUDOS SOBRE AS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS.

“Alguma coisa pôde nascer do nada, propuseram como princípio criador do mundo essa essência imaterial e soberana, a Palavra”.

(Benveniste, 1976: 27).

2.1 O estado atual das expressões idiomáticas.

2.1.1-Introdução:

Antigamente, as moças chamavam-se mademoiselles e eram todas mimosas e muito prendadas. Não faziam anos: completavam primaveras, em geral dezoito. Os janotas, mesmo não sendo rapagões, faziam-lhes pé-de-alferes, arrastando a asa, mas ficavam longos meses debaixo do balaio, e se levavam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em outra freguesia. As pessoas, quando corriam, antigamente, era para tirar o pai da forca, e não caíam de cavalo magro, algumas jogavam verde para colher maduro, e sabiam com quantos paus se faz uma canoa. O que não impedia que, nesses entrementes, esse ou aquele embarcasse em canoa furada. (Andrade, 1977:1183).

Nesse trecho da crônica Antigamente de Drummond (In: Poesia completa e

prosa) o poeta explora, com sabedoria, os efeitos do uso das “rebeldes ditas

expressões idiomáticas” (Xatara, 1998: 148).

Para tratar desse assunto, irei apresentar aquilo que de mais significativo foi

proposto por alguns autores acerca das expressões idiomáticas, sob a ótica de

algumas teorias lingüísticas do século XX. O critério para a seleção desses autores

se baseou na relevância que seus estudos tiveram para o avanço das pesquisas

Lingüísticas em relação ao Corpus deste trabalho. Para tanto, incluirei os

posicionamentos de Chafe (1979), Xatara (1998) e Biderman (2001), apontando

algumas considerações pessoais.

Page 26: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

26

2.1.2 As expressões idiomáticas na visão de alguns lingüistas.

Sabendo-se que escolhemos, dentre todas as possibilidades que a língua

oferece, em termos lexicais, semânticos e sintáticos, os elementos que nos

interessam e os combinamos em vista de transmitir determinado conteúdo, o autor

do discurso seleciona e ajusta as palavras tendo como meta, criar efeitos de

sentidos inesperados que possam atingir o interlocutor, dinamizando as

potencialidades discursivas. Parece-me oportuno, apontar em primeiro lugar, o

posicionamento de alguns lingüistas acerca das expressões idiomáticas, para que,

em seguida eu possa expor uma definição mais precisa sobre o tema,

estabelecendo os limites da presente pesquisa.

Chafe em “Significado e estrutura lingüística” postula que a língua é um sistema

que fica entre os universos do significado e do som. De acordo com esse autor, de

um lado temos “coisas para dizer”, e de outro produzimos ruídos, que, transmitem

essas coisas.

A origem dessa concepção encontra respaldo em lingüistas como Saussure em

que lemos: “o signo lingüístico une um conceito a uma imagem sonora8”. Sapir em

1921 disse que: “a essência da linguagem consiste na atribuição de sons

convencionais, voluntariamente articulados, ou de seus equivalentes, aos diversos

elementos da experiência”.9 Bloomfield advertiu que “na fala humana, sons

diferentes têm significados diferentes, e estudar essa coordenação é estudar a

língua10”. E em Chomsky vemos asserções como: “uma gramática gerativa...é um

sistema de regras que relacionam sinais a interpretações semânticas desses

sinais11”.

8 Saussure, apud Chafe 1979:15. 9 Sapir, apud Chafe 1979:15. 10 Bloomfield, apud Chafe 1979:15. 11 Chomsky, apud Chafe 1979:16.

Page 27: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

27

No entanto, o caminho que leva o significado ao som não é, de todo, direto. Os

tipos de divergência que se encontram entre o significado e a forma sonora que o

acolhe, são muito variados.12 Ainda, torna-se relevante lembrar que o fator

emocional interfere diretamente no som ou gesto do falante. Uma criança, por

exemplo, que esteja assustada pode chorar mais forte, por mais tempo, em um tom

mais alto de acordo com o seu grau de temor. Nessa concepção, assumindo as

palavras de Bastian (1965), Chafe afirmou que:

“A informação transmitida ao receptor refere-se principalmente à disposição emocional, em que o emissor dos signos se encontra no momento. As conseqüências de uma recepção efetiva são, em grande escala, modificações das disposições emocionais dos receptores”. (Bastian, 1965:598 apud Chafe, 1979:24)

De acordo com o pensamento de Chafe, e resgatando o propósito deste texto,

assume-se que, como nem sempre é possível um estudo histórico sobre a origem

das EIs que usamos, podemos afirmar que a motivação para a “criação” das

mesmas é, além de arbitrária, subjetiva. Os nomes escolhidos para integrarem um

idiomatismo manifestam valores expressivos relacionados com o falante e não

apenas uma identificação com o objeto.

Dessa forma, por meio da linguagem, o homem consegue transmitir suas

emoções, sutilezas de pensamentos, mensagens essenciais para o seu dia-a-dia,

além de inúmeros acontecimentos internos e externos a si próprio.

Chafe trata do efeito da idiomatização afirmando que um aumento na extensão

do inventário semântico era um dos principais fatores na evolução de uma língua, e

esse aumento causou a dualidade. O autor exemplifica a dualidade demonstrando

que no sistema primitivo de comunicação 13“cada unidade conceptual isolada era

simbolizada por sua própria unidade simbólica individual, e somente um conceito era

transmitido por vez”.(Chafe, 1979:25). Assim, eram emitidos ruídos que transmitiam 12 Não é objetivo deste trabalho abordar esta questão. Para maiores detalhes ver Chafe 1979. 13 De acordo com Chafe “a comunicação humana e a animal coincidem apenas num nível de generalidade que inclui também quase todos os outros comportamentos”, sendo plausível supor que nossos ancestrais remotos, muito antes de possuírem qualquer capacidade que se assemelhasse de perto à língua, possuíram, de fato, a capacidade de comunicar-se através do tipo de simbolização primitiva”. (1979:22)

Page 28: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

28

mensagens de um sistema nervoso a outro, e ao relacionarmos esse sistema de

simbolização primitiva com a língua, torna-se oportuno admitir que tanto os primatas

não humanos, como também outros animais e o homem moderno, possuem,

atualmente, tais sistemas. Esse último, também se comunica dessa maneira além de

usar a língua. No entanto, esse sistema apresentava-se precário para o crescente

desenvolvimento do inventário conceitual. “Algo tinha de acontecer, ou o sistema

cairia por seu próprio peso” (Chafe, 1979:25).

Houve então, uma pequena expansão no inventário dos símbolos através de

mudanças na laringe, na língua e no aparelho auditivo, o número de sons diferentes

disponíveis para a transmissão de mensagens ainda permaneceu pequeno.

Compare-se, para tanto, o limitado número de sons elementares que temos

disponíveis entre as línguas do mundo, para representarem as milhares de unidades

conceptuais que qualquer língua tem à sua disposição.

Na língua, o problema do inventário conceitual elástico que se esbarrava em um

inventário simbólico limitado foi resolvido da seguinte maneira: “ao invés da simples

junção de conceito a símbolo, a língua apresenta uma simbolização do tipo que se

segue, onde se entende que XYZ, WX, e TWYX sugerem várias combinações

arbitrárias de unidades simbólicas de ocorrência repetida” (Chafe, 1979:26).

Vejamos: 14

A XYZ

B WX

C TWXY

Nesse tipo de sistema, que possui dualidade, há conceitos como também há

diversas maneiras de combiná-los em configurações variadas. A língua oferece

meios para que determinadas estruturas semânticas se convertam em som.

Além disso, a dualidade fez com que não houvesse mais a necessidade da

ligação entre uma alteração semântica a uma alteração fonética, e vice-versa. Uma 14 Exemplo extraído de Chafe 1979: 27.

Page 29: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

29

nova unidade semântica passou a exigir apenas uma nova convenção da

simbolização por meio de uma configuração arbitrária construída a partir do

inventário já existente de unidades fonéticas.

Dessa forma, a dualidade tornou conceito e símbolo, livres um do outro, de

maneira que a alteração15 podia agora modificar um dos dois sem afetar o outro.

Chafe postula que há vários caminhos históricos pelos quais um significado novo

pode prover-se de um som. No entanto, estou interessada agora em esclarecer

como, na concepção desse autor, uma nova unidade semântica chega a existir.

Freqüentemente, devido às necessidades culturais, políticas, sociais e

expressivas de uma sociedade, um novo conceito é adquirido de um povo que fala

outra língua. Temos como exemplo, o caso da assimilação de sauerkraut (palavra

alemã que significa literalmente “erva azeda”, “couve azeda”) 16em inglês, e a

simbolização dada a esse conceito pode ser uma imitação da simbolização que lhe

fora dado na outra língua.

Então, o desenvolvimento de um novo significado a partir de um velho, em um

contexto determinado, caracteriza-se como um tipo de alteração semântica. “Tal

significado novo terá vitalidade e independência naquele contexto, mas não existirá

em outro lugar” (Chafe, 1979:42). Vejamos, nos enunciados abaixo, como isso se

processa:

� Considera-se o significante pneu (aro de borracha, inflado por ar comprimido,

com que se revestem rodas de veículos), no contexto Maria está com pneu

(excesso de gordura localizada na cintura);

� Suponhamos que denominemos o primeiro significado pneu 1, e o segundo

pneu 2;

� Assim, postula-se que quando um novo significado como pneu 2 se

desenvolve em um contexto determinado, ele não apaga completamente o

significado antigo, embora o novo seja, aí, de ocorrência mais provável;

15 É importante ressaltar que essa alteração independente, seja do conceito ou do símbolo, introduziu novas complicações na transformação de significado e som. Porém, não é objetivo deste trabalho esclarecer aspectos concernentes a essa questão. Para maiores detalhes ver Chafe, 1979. 16 Exemplo extraído de Chafe, 1979:41.

Page 30: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

30

� Isso quer dizer que, o significado novo é uma unidade semântica

discretamente diferente da antiga;

� Consoante as palavras de Chafe, o que se torna mais significativo é que, este

exemplo mostra como um significado novo como pneu 2 recebe a mesma

simbolização do antigo significado de pneu 1. Isso quer dizer que “um

significado novo que brota de um antigo permanece ligado à mesma

representação fonética desse antigo” (Chafe, 1979:42);

� Em suma, o desenvolvimento histórico vem de pneu 1 para pneu 2. Há

também que se notar, avaliando este exemplo, que pneu 1 tem mais liberdade

semântica do que pneu 2, porque o primeiro significado não é tão restrito

contextualmente. Já pneu 2 é muito limitado quanto a sua ocorrência. Para

Chafe, esse tipo de unidade semântica que se caracteriza por sua restrição a

contextos muito limitados e que não tem uma simbolização direta própria, mas

que se aproveita da simbolização de outra(s), podem ser chamados de

idiomatismos restritos. E as unidades semânticas que “dão origem” ao

idiomatismo restrito podem ser chamadas de literalizações.17

� Pode-se dizer também, tomando como base esse exemplo, que há duas

estruturas semânticas e uma delas contém um idiomatismo que diz respeito à

estética corporal. Acredito, que os falantes do português brasileiro “sabem”

que, pneu 2 é um desenvolvimento especial a partir de pneu 1; ninguém diria

que os significados são de condição igual.

Assim, esta minha exposição teve como propósito mostrar que para Chafe (1979)

os idiomatismos “são estruturas que representam combinações de morfemas sem

que esses, por si sós, constituam unidades semânticas, mas cujo conjunto constitui

uma nova unidade semântica da língua em questão”.

Xatara (1998) em seu artigo intitulado “O campo minado das expressões

idiomáticas”, apresenta questões teóricas e práticas relacionadas aos estudos

lexicológicos e ao tratamento lexicográfico das expressões idiomáticas, enfocando a

problemática do seu conceito. 17 “É característico das literalizações de idiomatismos restritos que elas sejam unidades do mesmo tipo que os próprios idiomatismos”. (Chafe, 1979:44). Assim, tanto o idiomatismo pneu 2 como sua literalização pneu 1 são unidades lexicais singulares do mesmo tipo especifico.

Page 31: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

31

A autora apresenta uma análise morfossintática e semântico-pragmática das

expressões, procurando mostrar que as mesmas são sistematizáveis e, por isso, não

deveriam continuar desconsideradas pelos dicionários comuns, pelas gramáticas e

no ensino de línguas.

Para Xatara, o primeiro passo a ser tomado em relação aos problemas que levam

as expressões idiomáticas à marginalidade, é delimitar e identificar o tipo de unidade

lexical que deve ser chamada expressão idiomática. Para tanto, a autora toma por

base, entre várias teorias lexicais, as de Biderman (1978), 18 Chafe (1979)19, Danlos

(1981)20, Gross (1982), 21 Rwet (1983)22, Tagnin (1988) 23 e Lodovici (1989)24, para

propor a seguinte definição: “Expressão idiomática é uma lexia complexa

indecomponível, conotativa e cristalizada em um idioma pela tradição cultural”

(Xatara, 1998:149).

De acordo com esse conceito, sincronicamente, em análise distribucional ou

funcional, as EIs são unidades locucionais ou frasais que constituem uma

combinatória fechada, de distribuição única ou bastante restrita, pois se apresentam

como sintagmas complexos que não têm paradigmas, ou de acordo com as próprias

palavras da autora: “quase nenhuma substituição característica das associações

paradigmáticas pode ser normalmente aplicada (Xatara, 1998:149).

Dessa forma, torna-se impossível, de acordo com a autora, operações como as

que demonstrarei abaixo:

� Ana bateu as botas = morreu

� 1- Ana bateu os sapatos (alteração do objeto direto)

� 2- Ana bateu suas botas (inserção de modificador)

� 3- Ana bateu as belas botas (inserção de modificador)

� 4- Ana bateu as botas da vida (inserção de ajunto adnominal)

18 Biderman , apud Xatara 1998: 149. 19 Chafe, apud Xatara 1998:149. 20 Danlos, apud Xatara 1998:149. 21 Gross, apud Xatara 1998:149. 22 Rwet, apud Xatara 1998:149. 23 Tagnin, apud Xatara 1998:149. 24 Lodovici, apud Xatara 1998:149.

Page 32: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

32

Acho oportuno, no entanto, apontar uma outra alternativa de leitura para essa

questão que será melhor explorada no capítulo 4.

Em (1), por exemplo, nada me impede de admitir que, ao substituirmos bota por

sapato, há uma estilização modalizadora da expressão que nesse caso específico

pode ser utilizado para destacar algum traço de caráter de Ana (Ana não bate as

botas e sim os sapatos). Isso se torna mais claro ao considerarmos as

características25 dos substantivos que estão em jogo: bota – calçado de couro ou

borracha que envolve o pé, a perna e às vezes a coxa; sapato – calçado que cobre o

pé. Já em (2) e em (3), os modificadores, suas e belas, respectivamente, podem

funcionar como um qualificativo metafórico para o enunciado. E finalmente em (4), a

inserção do adjunto adnominal da vida pode, a meu ver, funcionar como um reforço

de interpretação para a expressão idiomática que tem como significado morrer.

No entanto, é válido ressaltar que os exemplos modificados e/ou modalizados

não apresentam uma leitura tão automática quanto a forma original. A interpretação

dos mesmos depende do domínio de algum efeito de sentido adicional. Enfim, trata-

se de uma modalização para morrer.

E ainda, de acordo com a autora não são possíveis operações como as que se

seguem:

� 5- Ana cortou as botas.

� 6- Ana bateu as botas que João lhe mandou.

� 7- Não acredito que as botas sejam batidas ainda esta noite, por Ana.

� 8- As botas que Ana bateu nos trazem saudades.

Segundo Xatara, a interpretação da expressão se torna inviável, caso o verbo

mude como em (5), já que a distribuição do verbo (bater) na construção dessa

expressão limita-se apenas ao substantivo botas. Porém, vimos que é possível haver

uma substituição sinonímica do substantivo (botas por sapatos), que promove uma

estilização da expressão. Quanto a substituição do verbo arrisco uma hipótese de

análise que será melhor desenvolvida, adiante. Vejamos:

� Ana bateu as botas

Possibilidades de interpretação: 25 Dicionário Novo Aurélio século XXI, versão eletrônica.

Page 33: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

33

Composicional: Ana aplicou pancadas com as ‘botas’.

Idiomática: Ana morreu

� Ana cortou as botas (substituição do verbo)

Possibilidades de interpretação:

Composicional: Ana separou/dividiu a bota com instrumento cortante.

Idiomática: não existe.

Conclusão:

Esta expressão apresenta a seguinte tipologia: SV (V+SN). E como demonstrado

acima, a substituição do SN se torna possível (as botas por os sapatos)

considerando-se as restrições supracitadas. No entanto, ao substituirmos o verbo

temos um comprometimento quanto à interpretação da mesma. Assim:

a) Há uma composicionalidade fraca26 da EI quando substituímos as botas por

os sapatos, já que conseguimos uma aproximação estilizada com o

significado idiomático original.

b) Há composicionalidade forte da EI quando substituímos o verbo bater por

cortar, pois não conseguimos uma aproximação entre o significado da

expressão modificada e o significado da expressão original.

Ou seja, a EI bater as botas apresenta graus de composicionalidade, já que ao

substituirmos o verbo que compõe a expressão (bater por cortar) obtemos um

significado não compatível com o significado idiomático atribuído a expressão em

foco que é morrer. Por isso, assumo que tal EI apresenta uma escala que vai da

não-composicionalidade (Ana bateu as botas = Ana morreu), passa pela

composicionalidade fraca (EI estilizada = Ana bateu os sapatos) e vai até a

composicionalidade forte (Ana cortou as botas).

Ainda de acordo com esse enunciado, segundo a autora, temos outras restrições:

o complemento não aceita relativa como em (6), nem passiva como em (7) e nem

relativização como em (8). A meu ver, a interpretação idiomática em (6) realmente se

torna complicada, mas em (7) e em (8) ainda podemos ter uma interpretação na

dimensão da EI. Ou melhor, se o falante tiver o domínio da forma original da EI

26 Os aspectos referentes a composicionalidade fraca, composicionalidade forte e graus de composidionalidade serão discutidos no capítulo 4 que se dedica a esta questão.

Page 34: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

34

(bater as botas = morrer), é possível que o mesmo faça ajustes que o permita

reinterpretar tal expressão com as estruturas apontadas pela autora. E isso, se

estende, como tentarei demonstrar, a outros casos. Então nos enunciados abaixo,

� Não acredito que as botas sejam batidas ainda esta noite, por Ana.

� As botas que Ana bateu nos trazem saudades.

Pode haver uma interpretação idiomática caso o falante, tendo o domínio do

significado da EI bater as botas, faça adaptações que o permita extrair dos

enunciados o significado morrer. Poderíamos supor, no presente caso, que o falante

interpretaria tais expressões da seguinte maneira:

� Não acredito que Ana morra ainda esta noite.

� Ana morreu e isso nos traz saudades.

As possibilidades de variações, de acordo com Xatara 27, são:

� Sujeito: João e Maria bateram as botas

� Tempo verbal: Ontem, Ana bateu as botas.

� Modo verbal: Acredito que Ana baterá as botas.

� Advérbio de tempo: Ana bateu as botas há um mês.

� Inserção de advérbio entre o verbo e o complemento: João bateu também

as botas.

� Permuta lexical – Xatara afirma que nas EIs “quase nenhuma operação de

substituição característica das associações paradigmáticas pode ser

normalmente aplicada” (Xatara 1998:149). No entanto, a mesma autora diz

que “devido a certa produtividade dos componentes, o que não confirma, a

rigor essa tese de que as EIs são sintagmas sem paradigmas”(Xatara:1995),

podemos considerar que a mudança de itens lexicais se prestaria a

demonstrar uma estilização que, no presente caso, revela deboche, ironia,

etc. Então, afogar o ganso (o passarinho, o pardal), se prestaria a uma

estilização modalizadora que aqui diminui a importância do objeto em

questão.

� Modalidade de asserção: E aí, Ana já bateu as botas?

Da negativa para a afirmativa: Não ser flor que se cheire 27 Exemplo adaptado de Xatara, 1995:203-204.

Page 35: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

35

Ser flor que se cheire.

Presença facultativa de artigo ou a variação entre definido e indefinido:

Ana amarrou [0] o bode depois da discussão.

Ana amarrou um bode depois da discussão.

Ana amarrou o bode depois da discussão.

� Se o possessivo for admitido, sua variação co-referente ao sujeito é

obrigatória.

Ana pensa que João já deve estar de saco cheio do patrão.

Ana pensa que João não deve estar com seu saco cheio do patrão.

� Se a expressão vier no plural, o artigo pode desaparecer.

Ana está com a corda no pescoço.

Ana e João estão com cordas no pescoço.

Em síntese, Xatara apresenta questões teóricas e práticas relacionadas às EIs,

consideradas quanto à sua natureza estrutural e ao seu valor conotativo (conforme

pode se verificar no conceito proposto pela autora), e isso, a meu ver, evidencia

aspectos problemáticos concernentes as EIs que tentarei elucidar neste trabalho.

Biderman (2001) refere-se às lexias complexas quando discute a complicada

questão da segmentação das unidades léxicas no discurso. De acordo com a autora,

devido à inconsistência do código escrito, vocábulos como bom dia, boa tarde, dor

de cabeça, terça-feira, são chamados de lexias complexas, enquanto deveriam ser

chamados de lexias simples, pois já se encontram lexicalizados há muito tempo.

Para a autora, essa ambigüidade é resultado de uma ortografia inconsistente28 e

conservadora que não unificou os vocábulos acima como deveria.

Consoante as palavras da autora, além das lexias complexas, o português como

qualquer língua, possui um número muito grande de expressões idiomáticas ou

idiotismos, como são chamados pela gramática tradicional. “Tais idiotismos são

combinatórias de lexemas que o uso consagrou numa determinada seqüência e cujo

significado não é a somatória das suas partes”. (Biderman, 2001:173). Essa autora

define EIs como sintagmas lexicalizados com um sentido figurado, e não se pode 28 Para Biderman o hífen pode representar essa inconsistência ortográfica. O acento é usado em palavras como guarda-roupa, terça-feira, mas não é usado em antes de ontem e Santa casa, por exemplo.

Page 36: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

36

chegar ao significado da expressão completa, somando-se os significados de cada

um dos seus elementos constituintes. Então, uma análise de “queimar dinheiro” não

deve ser feita da seguinte maneira:

� “João queima dinheiro” = gasta desnecessariamente

� Queimar + dinheiro = reduzir cédulas a cinzas.

Uma análise fragmentada da expressão equivaleria a violentar o significado

idiomático da mesma.

Enfim, as considerações da autora se limitam as questões relativas à lexicografia.

A mesma aponta que os dicionários atuais são bastante incoerentes. “A lexicografia

não chegou ainda a um bom nível de reflexão sobre os seus métodos e o seu objeto

– descrição do léxico da língua”. (Biderman, 2001:178). Por essa razão, o estudo

que a autora apresenta sobre EIs revela questões discutíveis que, como já foi dito,

fazem com que as lexias complexas sejam vistas apenas como produtos

lexicográficos. Não que isso seja irrelevante, porém o estudo acerca dessas

expressões carece de uma maior reflexão sobre seus aspectos sintáticos,

semânticos e discursivos.

Em suma, este capítulo representa um esforço de síntese sobre o estado atual da

arte. As idéias sobre as expressões idiomáticas, que foram aqui esboçadas, abriram

um largo horizonte, redimensionando os estudos sobre esse tema da linguagem

humana. No entanto, a meu ver, esses estudos foram realizados de modo

incompleto, sobretudo no que tange às definições próprias as unidades lexicalizadas

que aparecem, então, como tendo uma existência própria como parte do léxico e por

isso, devem ser também analisadas em sua dimensão discursiva.

Page 37: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

37

3. proposta de conceito.

Page 38: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

38

3. PROPOSTA DE CONCEITO

“Os mundos humanos são construídos por meio de linguagem, preservados por ela, ensinados e transmitidos [...] pela conversação. Um mundo que deixa de ser falado deixa de existir”. (Alves, 1982)

3.1 O conceito: estruturas e análises

3.1.1 Introdução:

Neste capítulo, pretendo elucidar os caminhos que me levaram a propor um

conceito para as EIs a partir da premissa de que há equívocos terminológicos que

levaram as mesmas a serem consideradas como objetos excepcionais não

destacáveis nos estudos sintáticos, bem como aspectos morfossintáticos e

semânticos que convirjam para o conceito apresentado. A partir do conceito, tentarei

mostrar a existência de um gênero do discurso, “Seção de Frases” que abriga

elementos que fazem parte do corpus deste trabalho e ainda o funcionamento dos

provérbios que os diferem das EIs.

A partir de então, as expressões serão apresentadas como um fenômeno ligado

ao processamento discursivo tendo como base às palavras de Benveniste (1989:68):

“Todas as línguas têm em comum certas categorias de expressão que parecem corresponder a um modelo constante (...), mas suas funções não aparecem claramente senão quando se as estuda no exercício da linguagem e na produção do discurso”.

Diante disso, farei também considerações sobre a teoria da Argumentação com

base em Perelman (1987) e Perelman e Tyteca (2002) que, neste trabalho, se

encontra circunscrito ao discurso político.

Page 39: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

39

3.1.2 EI: um problema conceitual.

Conforme os conceitos citados no segundo capítulo, as expressões idiomáticas

são:

� “Estruturas que representam combinações de morfemas sem que esses, por

si sós, constituam unidades semânticas, mas cujo conjunto constitui uma

nova unidade semântica da língua em questão”. (Chafe: 1979).

Ou como disse Xatara (1998) com base em outros autores:

� “As EIs são lexias complexas, indecomponíveis, conotativas e cristalizadas

em um idioma pela tradição cultural”.

Para Biderman (2001) os idiomatismos são:

� “Combinatórias de lexemas que o uso consagrou numa determinada

seqüência e cujo significado não é a somatória das suas partes”.

Com base nesses conceitos torna-se relevante esclarecer algumas questões para

que em seguida eu possa apresentar um conceito que, a meu ver, representa

satisfatoriamente as EIs.

Acredito que os conceitos que foram apresentados pelos autores já referidos

apresentam, além de uma incompletude, uma divergência que não acolhe, a

contento, as características de uma EI.

Chafe (1979) e Biderman (2001), referem-se aos idiomatismos, dando relevância

ao aspecto que diz respeito à nova unidade semântica que as expressões

idiomáticas representam. Os autores destacam o caráter sintático-semântico das

lexias complexas ao apontarem que os significados delas não são obtidos por meio

dos significados de suas partes isoladas. Porém, não há destaque no que diz

respeito às restrições lexicais e sintáticas que, grosso modo, englobam combinações

entre os elementos que compõem uma EI, como também não há um apontamento

discursivo das lexias complexas. Outra característica que, a meu ver, também

necessita de uma nova leitura, diz respeito ao aspecto semântico que, de acordo

com Xatara (1998) e autores como Biderman (1978), Chafe (1979), Danlos (1981),

Page 40: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

40

Gross (1982), Ruwet (1983), Tagnin (1988) e Lodovici (1989), chegaram à definição

de que as EIs têm significado conotativo.

Enfim, os autores que estão sendo apontados neste trabalho se ocuparam dos

estudos acerca das EIs conferindo às mesmas uma produtiva regularidade estrutural.

No entanto, as considerações desses autores excluem aspectos relevantes sobre

as lexias complexas que não delimitam, satisfatoriamente, essa unidade lexical.

Por isso, torna-se relevante apontar uma definição mais precisa a respeito das EIs

para que eu possa formular novas propostas e comprovar a hipótese de que há,

realmente, uma carência nos critérios de análise sobre as EIs do português brasileiro.

Antes, porém, acho oportuno apontar aspectos que dizem respeito à natureza

morfossintática das mesmas que confirma o princípio de complexidade léxica.

3.1.2.1 Natureza morfossintática das EIs.

Xatara (1998) postula que as expressões idiomáticas são uma unidade lexical

indecomponível. Mas a relação que há entre as partes para formar o todo pode ser

analisada através dos aspectos morfossintáticos e semânticos. São sintagmas,

combinações de duas ou mais formas lingüísticas, em que uma delas funciona como

determinante e a outra como determinado. Há um elo de subordinação e, dessa

forma, estabelecem-se estruturas tipológicas de acordo com o elemento que pode ser

alterado na expressão idiomática. 29 Em outras palavras, os elementos que compõem

a expressão se subordinam a um termo que se caracteriza como sendo o núcleo da

lexia complexa e esse, por sua vez, é o elemento passível de transformação. No

entanto, as possibilidades de mudança dos elementos que compõem uma EI não

estão circunscritas apenas ao núcleo da estrutura, embora as mudanças no núcleo

sejam mais freqüentes.

29 Este critério torna-se preciso já que não há uma norma que me permita precisar o núcleo de uma EI. Nos dicionários, por exemplo, não há um princípio que regule a entrada de uma lexia complexa. Uma EI como “nascer em berço de ouro”, pode ser localizada no dicionário Houaiss versão eletrônica pelo nome “berço”, e no dicionário Michaelis versão eletrônica a mesma é localizada pelo verbo “nascer”.

Page 41: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

41

Em suma, o critério usado para a classificação se baseou na própria estrutura

sintática dos sintagmas e dessa forma, podemos identificar as EIs com as seguintes

estruturas:

a) Sintagma nominal (SN) - todas as palavras que compõem a expressão estão

subordinadas a um núcleo nominal.

*SN (N+prep+N) - “Todos deveríamos saber que os negócios com a China são cheios

de malícias, não há negócio da china 30 daqui pra lá. Há negócio da china de lá pra

cá”. Delfim Neto (ISTO É, 04/08/2002: 22).

*SN (N+adj)- “Montanha não é lugar de pé-frio”. Timberland. 100% à prova d’água“.

(VEJA, 05/06/ 2003: 89)

*Adj+N 31 - “Vovô enxuto e boa pinta. Procuro ninfetinha sarada para relacionamento

intenso e duradouro. Escolher o melhor é automático. Renault Scénic com câmbio

automático grátis”. (VEJA, 09/01/2002: 17).

*Prep+N+prep+N - “Dell é o seu único ponto de contato e responsável pelo serviço de

ponta a ponta. Dell líder mundial em Pcs”. (VEJA, 05/09/2002: 17).

b) Sintagma verbal (SV) – apresentam-se, em geral, com as seguintes estruturas:

*V+Art+N – “Vou ao plenário mostrar a cara senão vão dizer que estou morto”.

(Antônio Carlos Magalhães). (VEJA, 17/11/2004: 43).

* V+Art+Adj+N – “Ele sempre tem a última palavra” (VEJA, 02/11/2000: 14).

*V+Prep.+N – “... outro fator que levamos em conta, foi a vasta rede de

concessionárias Volkswagem/.../”. (VEJA, 05/06/2003: 85).

*V+Num+N+prep+N – “Chegou o novo Automania Serviço. É uma mão na roda”.

(ISTO É, 24/07/2002: 51).

30 Usarei o grifo para destacar às EIs nas mensagens publicitárias e nos EPPs. 31 Xatara (1988) classifica como Sintagma de função adjetiva (SFAdj) construções desse tipo. No entanto, acho compensatório tratá-las como SN para que toda a classificação fique na dimensão estrutural. Acho desnecessário introduzir um outro critério, o teor funcional, para classificar as expressões idiomáticas. O mesmo critério foi usado com os sintagmas adverbiais que, são classificados pela autora como sintagmas de função adverbial (SFAdv).

Page 42: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

42

c) Sintagma adverbial (SAdv) – A lexia complexa (expressão idiomática) exerce a

função de um advérbio e se subordina a um verbo ou advérbio.

* “Transplante capilar. Fique de bem com a vida. Derm”. (VEJA, 25/06/2003: 30).

* “Venha fazer o test-drive em primeira mão. Não é um carro. É Airtrek Mitsubishi

motors”.(VEJA, 25/06/ 2003:37).

* “O presidente vem seguindo à risca o regime dele, inclusive está abstêmio há

cerca de quarenta dias. Ele só toma Coca light e a gente tem de acompanhá-lo”.

Luiz Fernando Furlan, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior,

sobre a dieta que o presidente Lula vem fazendo. (VEJA, 15/02/06: 15).

d) Sintagma frasal (SF) – geralmente são frases exclamativas ou nominais.

* “Depois da saideira, vai ver se eu tô na esquina! Beber redondo é beber com

responsabilidade. Skol”. (VEJA, 11/09/2003: 81).

* “Ela que vá pentear macacos!”. Hugo Chávez, presidente da Venezuela, sobre a

organização Internacional do trabalho, que definiu como greve geral uma greve de

petroleiros ocorrida em 2002. (ISTO É, 07/04/2004: 22).

* “O PT ainda está muito em cima da crise política e tem de sair disso. Se não sair do

córner, a vaca vai pro brejo”. Jorge Viana, governador do Acre (PT). (VEJA,

18/01/2006: 42).

* “Lula é uma máquina de dizer bobagem”. José Thomaz Nonô, deputado federal

(PFL-AL).(VEJA, 04/05/2005: 46).

A partir da natureza morfossintática das EIs, irei expressar formalmente a minha

proposta de conceito. Porém, como a definição apresentada a seguir pode englobar

estruturas lingüísticas que vão das locuções aos provérbios, convém explicitar a sua

abrangência.

3.2 O conceito.

Apresento, agora, a minha proposta de conceito que me parece mais satisfatório. A

saber,

Page 43: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

43

As expressões idiomáticas são formadas por uma estrutura frásica que

apresenta algumas restrições lexicais e sintáticas. Contêm

combinações que não são distribucionalmente produtivas, havendo

uma tendência a interpretação não composicional, por essa razão

possuem sentido metafórico. Além disso, são recorrentes nos mais

diversos gêneros discursivos.

A partir desse conceito irei apresentar, nas seções seguintes, uma reinterpretação

sobre as EIs apresentando seus aspectos fundamentais.

Restrições lexicais e sintáticas – Do ponto de vista léxico-sintático uma EI não

admite que se altere ou substitua seus itens, sem que isso leve ou a uma

inaceitabilidade da expressão ou a uma interpretação completamente diferente.

Vejamos:

� “Agora que o Brasil está preparadinho, ajeitadinho, eles querem comer o filé

que colocamos na mesa. Não, vão ter de roer o osso, primeiro”. O presidente

Lula, falando da oposição. (VEJA, 02/08/2006: 41).

EI: roer o osso (= ficar com a pior parte, sem vantagens e/ou facilidades).

* Agora que o Brasil está preparadinho, ajeitadinho, eles querem comer o filé que

colocamos na mesa. Não, vão ter que triturar o osso, primeiro.

A princípio, esta alteração confere a EI (roer o osso) uma interpretação não

compatível com o significado idiomático da mesma: ficar com a pior parte, sem

vantagens, facilidades.

No entanto, há muito que se verificar acerca deste nível sintático da

convencionalidade32. Pode-se dizer que por nível sintático compreende-se a

combinação, a ordem e a gramaticalidade dos elementos que compõem uma

expressão. Assim, a única explicação possível para a combinação é a de que a

associação entre algumas palavras tenha sido consagrada pelo uso, ou seja, de que

ela seja convencional. É o caso, por exemplo, do substantivo velho (a) que sempre co-

32 Por convencionalidade entendemos “aquilo que é tacitamente aceito, por uso ou geral consentimento, como norma de proceder, de agir, no convívio social; costume; convenção social”. (Ferreira apud Tagnin, 1989).

Page 44: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

44

ocorre com gagá no sintagma velho (a) gagá. Quanto à ordem dos elementos em um

sintagma, essa pode ser o resultado de uma convenção canônica. Em português, por

exemplo, Nome + adjetivo é a ordenação direta para construções desse tipo, por isso,

dizemos sempre pé-frio e não frio-pé.

Outro fator que merece destaque, no que diz respeito às restrições lexicais e

sintáticas, encontra-se demonstrado nos exemplos abaixo:

EI: dar um empurrão (ajudar alguém)

� “É uma longa subida, mas estamos dando um bom empurrão na ciência.

Agilent Technologies”.( VEJA ,13/03/2000:4).

Neste exemplo temos a inserção do adjetivo bom que, neste caso, torna-se um

aliado positivo para expressar o fato em questão.

EI: por a mão no fogo por alguém (demonstrar confiança)

� “Eu não ponho a mão, ponho o corpo no fogo pelos meus filhos”. Antônia

Palocci, mãe do ministro Antônio Palocci e Ademar Palocci, diretor de

engenharia e planejamento da Eletronorte, acusado de tráfico de influência.

(VEJA, 28/09/2005: 52).

Aqui, temos uma modificação introduzida pelo locutor que aumenta a importância

do aliado (mão por corpo) usado para expressar sua confiança.

Vejamos outro exemplo:

Ex: a) “Com a Nestlé, você nunca erra. Afinal, ela já testou e aprovou tanto para a

gente, que é só confiar. Quanto a minha parte, confesso que é mais divertida: eu

arregaço as mangas e solto a imaginação”. (VEJA, 19/06/2001: 90).

b)[...]eu arregaço as mangas verdes e solto a imaginação.

c)[...]eu arregaço aquelas mangas e solto a imaginação.

O sentido idiomático da expressão arregaçar as mangas é trabalhar muito. Porém,

ao se analisar os exemplos (b) e (c) em que se tem a inserção do adjetivo verdes e

do pronome demonstrativo aquelas, respectivamente, percebe-se que há algo em

torno da idéia de contextos especiais que deve se levados em consideração ao se

analisar uma EI. Nada impede, por exemplo, que a expressão ilustrada na letra (b)

Page 45: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

45

seja proferida por um torcedor do América. E na frase representada na letra (c) o

pronome demonstrativo pode consistir essencialmente numa modificação introduzida

pelo locutor, como resultado das condições postas à sua realização e da relação

entre os elementos envolvidos na produção. Por isso, a meu ver, a palavra algumas

colocada na proposta de conceito supracitada, descreve bem a relação de restrição

lexical e sintática que envolve as EIs.

Não são distribucionalmente produtivas – A EI se torna, geralmente, inaceitável

quando a substituição entre seus elementos é feita de forma aleatória porque, sendo

assim, há um rompimento do domínio extensional do objeto em questão. Vejamos:

* “Não fico no cargo nem que a vaca tussa”. Roberto Rodrigues, ministro da agricultura

sobre uma atual reeleição de Lula. (ISTO É, 24/05/2003: 22).

* Não fico no cargo nem que o poste tussa.

Neste exemplo, a substituição aleatória do termo vaca por poste comprometeu o

sentido33 da EI que é de maneira alguma/de jeito nenhum. No entanto em:

* Não fico no cargo nem que o touro/cavalo/bezerro tussa. 34

Nada me impede de admitir que esta expressão adquiriu, neste contexto, um valor

compatível a partir do sentido cristalizado (nem que a vaca tussa = de maneira

alguma/de jeito nenhum), e sendo assim, a relação entre os termos se encontra

lexicalizada no momento de sua manifestação, ou seja, no instante em que o falante

pronuncia a expressão “Nem que o cavalo tussa”, por exemplo, supondo o

conhecimento da EI original “Nem que a vaca tussa” por parte dos envolvidos no

momento da enunciação, torna-se apropriado admitir que tal expressão modificada

não apresente problemas de decodificação.

33 Para o presente trabalho adotei a noção de sentido descrita em Mari, 1998 em que se lê: “a construção do sentido numa língua natural depende das condições que devemos reunir para a aplicação dessa função, ou seja, a existência de significantes e de significados disponíveis. 34 É relevante destacar que deve haver uma razão motivada para que o falante substitua vaca por cavalo, touro, etc. Além disso, deve-se postular que o mesmo conheça a EI original e por isso ‘cria’ um idiomatismo a partir de uma EI.

Page 46: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

46

Há uma tendência a interpretação não composicional – Neste aspecto observa-se

a convencionalidade na relação não motivada entre uma EI e seu significado. Como

mencionado anteriormente, o falante pode não conhecer a relação histórica que faz

com que esticar as canelas signifique morrer. Há também que se considerar que o

significado desta expressão pode35 se tornar imprevisível se se atender ao significado

de esticar e de as canelas. Em outros termos, não se identifica uma EI a partir do

conhecimento do significado individual dos itens que a compõem.

Desse modo, ao analisarmos esticar a canela como (V + SN) temos uma

estranheza quanto ao significado da lexia complexa, se considerarmos a soma de

suas partes componentes, isto é, [So: alongar a parte da perna que se localiza entre o

joelho e o pé].

No entanto, o conjunto dos segmentos da cadeia sintagmática, constituindo uma

EI, elimina essa estranheza, já que passa a representar um significado não previsto

pelas condições iniciais do significado de seus constituintes. Esse segundo significado

não previsto pelas condições iniciais do significado dos constituintes, seria, na

concepção de Barthes (1977) uma extensão do plano de significação que passa a ter

um significado conotativo.

Segundo esse autor “um sistema conotado é um sistema cujo plano de expressão

é, ele próprio, constituído por um sistema de significação”. E prossegue:

“Todavia, o futuro sem dúvida pertence a uma Lingüística da conotação, pois a sociedade desenvolve incessantemente, a partir do sistema primeiro que lhe fornece a linguagem humana, sistemas de segundos sentidos e essa elaboração, ora ostentada, ora mascarada, racionalizada, toca muito de perto uma verdadeira Antropologia Histórica”.(Barthes, 1977:52).

Consoante as palavras de Barthes, poderíamos admitir que a expressão em tela

tivesse sido construída, diacronicamente, através da expansão de um primeiro plano

de significação, aquele que teria existido a partir da combinação de suas partes

componentes. Mas, neste trabalho, a conotação, na perspectiva de Barthes, servirá

apenas para mostrar que não se pode falar de uma EI em termos de conotação, ou 35 Supostamente, um falante pode ser desafiado a explicar tal expressão e, a partir dos movimentos metafóricos e metonímicos, criar uma explicação causal para o movimento de esticar as canelas.

Page 47: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

47

seja, nem sempre o uso consagrado de uma EI traduz-se pela conotação, como

expansão de um primeiro sistema de significação.

Então, assumindo que a proposta de Barthes pudesse explicar parte dos

fenômenos associados à existência de um EI, teríamos a seguinte formulação: o

primeiro sistema de significação (a expressão considerada em suas partes

componentes) torna-se o plano de expressão ou significante para um segundo

sistema de significação (a expressão considerada em sua totalidade). Aquele constitui,

então, a denotação e o segundo, como extensão do primeiro, a conotação, que

podemos visualizar no esquema abaixo:

a) A estátua quebrou a cara = (1º sentido)

(Se/So)+ (Se/So)+ (Se/So) denotativo

b) “Quem estiver torcendo para o fracasso do Brasil vai quebrar a cara”. Luiz Inácio

Lula da Silva, presidente da República voltando do Oriente. (VEJA, 08/06/2005: 42).

[...] vai quebrar a cara = (2º sentido)36

((Se/So1)/So2: decepcionar-se)) conotativo

Este esquema nos mostra que quebrar a cara em (b) poderia ser uma conotação

para quebrar a cara em (a), admitida, ao menos, a expansão de quebrar como no

exemplo. Em (b) o constituinte quebrar, com a expansão proposta - ((Se/So1)/So2:

decepcionar-se)) - contribui para o sentido geral que a EI assumiu, isto é, [So:

decepção]. Então, embora a expansão tivesse sido proposta apenas para quebrar, já

que metonimicamente cara deve manter-se com algum traço de influência sobre o

sentido da EI, o segundo sentido referido no esquema deve se aplicar à EI como um

36 É relevante ressaltar que o processo de conotação proposto pelo autor está sendo usado, neste trabalho, apenas como uma justificativa hipotética na obtenção de EIs. Essa idéia de 2º sistema de significação não equivale à proposta de Barthes, a não ser enquanto uma reconstrução diacrônica da expressão.

1º sistema

de

significação

2º sistema de

significação.

Page 48: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

48

todo. Desse modo, ainda que (b) possa ter parte do seu sentido explicado pela

expansão de um dos seus signos, vale notar que às EIs se processam em nível

denotativo, porque estão convencionalmente previstas no próprio sistema lingüístico,

comportando também, provavelmente, traços de ‘teor’ enciclopédico. E o fato de ser

ela uma expressão de uso corrente neutraliza a possibilidade de a mesma ser

considerada uma conotação autêntica.

Este esquema do autor nos oferece a seguinte possibilidade de interpretação: o

que poderia ser apontado como uma condição de conotação para a EI seria aquilo

que assumimos, nesta pesquisa, como estilização. Por exemplo, caso o enunciador

(Presidente Lula, em ‘b’) dissesse que “Quem estiver torcendo para o fracasso do

Brasil vai quebrar o focinho”, teríamos além do valor denotativo da EI em seu

sentido primeiro, um efeito adicional de ironia e/ou deboche. Esse efeito adicional,

poderia ser considerado uma conotação a partir do sentido próprio da EI “quebrar a

cara”.

3.2.1 As EIs e os provérbios

“Amor com amor se paga”.

"Estamos todos na mesma canoa”.

“Deus dá o frio conforme o cobertor”.

A origem dos provérbios está, indiscutivelmente, na sabedoria popular. Eles são

parte do folclore dos povos, assim como as lendas, os mitos, as superstições e as

canções, uma vez que traduzem conhecimentos e crenças. São manifestações do

passado cristalizadas no presente. Sendo folclóricos, os provérbios são enunciados

anônimos37. São fruto da experiência cotidiana individual ou coletiva, de quem

vivenciou determinadas verdades.

37À exceção dos provérbios bíblicos, que se encontram no Livro dos Provérbios, no Antigo Testamento, assim chamados apesar de serem atribuídos ao Rei Salomão.

Page 49: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

49

Grzybek (1995) afirma que os provérbios têm a função de produzir um efeito

particular, uma mudança no estado de consciência nos ouvintes desejada pelo que

fala. Esta e outras funções estão de acordo com Mieder (1977) que resume:

"Os provérbios podem inclusive ter a função de cuidado, persuasão, admoestação, repreensão, depoimento, caracterização, explanação, descrição, justificação, resumo, etc, e é bem possível que um ou o mesmo provérbio tenha diferentes funções em diferentes contextos que sejam empregados”.

Um simples provérbio como “a voz do povo é a voz de Deus” pode ser usado tanto

como uma constatação, ou como justificativa de uma atitude.

Uma segunda função abordada por Peter Grzybek está relacionada com o que os

provérbios de uma determinada sociedade desempenham para o seu sistema de

normas e valores. Estas funções podem ter, por exemplo, a finalidade de

entretenimento ou educacional; transformando em instrumentos para criar ou

estabelecer certas normas sociais e comportamentais. Um provérbio português diz:

“antes só do que mal acompanhado”; e serve para exemplificar esta segunda função.

Como terceira função, os provérbios podem ser usados não para uma situação

interativa, mas para se referir a uma situação. Dois indivíduos podem lembrar de um

ditado após conversarem sobre um fato ocorrido com terceiro(s). Nestes casos os

provérbios funcionam como uma base para se fazer analogias entre os fatos ocorridos

e o próprio provérbio: “amigos certos nas horas incertas”.

O provérbio é a designação genérica dos ditos cristalizados que exprimem, em

geral metaforicamente, uma verdade ou resumem uma experiência. É uma sentença

independente e de sentido completo, que direta ou indiretamente expressa um

pensamento, uma experiência, uma regra, uma norma, uma advertência, um

conselho.

São características dos provérbios, quanto ao conteúdo, a sua formulação abstrata,

isto é, não referida a nenhum caso particular, e a sua validade é universal, sem

distinção de lugar e tempo. Quanto à forma, distinguem-se pela elaboração

Page 50: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

50

trabalhada, artificiosa, que utiliza os mais variados recursos de construção, como a

metrificação (em grande número redondilhas), a rima, a aliteração, a similicadência, a

repetição, o paralelismo, o dialogismo e outros sem excluir a deformação intencional

de palavras e da sintaxe.

Perante tais observações, é natural que haja dúvida sobre o que haverá de

excepcional neste tipo de construção que os diferem das EIs, já que tanto os

provérbios quanto as EIs possuem características sintáticas e semânticas bem

semelhantes.38

Há EIs que também se apresentam como unidades complexas e independentes:

“Ser Maria vai com as outras”, “Ser dono do próprio nariz”, por exemplo, são EIs que

não precisam, necessariamente, estarem em um contexto específico para que as

identifiquemos e as decodifiquemos. Ex: Ana é Maria vai com as outras/ é dona do

próprio nariz.

Porém, diferentemente das EIs, os provérbios possuem, comumente, na

conversação, uma função avaliativa e um tom didático. Essencialmente, o mesmo

efeito pode ser conseguido ao citar-se a Bíblia, autores famosos ou autoridades

relevantes em determinada área. Nós nos tornamos tão acostumados a ouvir os

provérbios citados como papéis avaliativos do comportamento, que a maioria deles

adquire o sabor didático. Por exemplo, o provérbio “água mole em pedra dura tanto

bate até que fura” embora possa significar “que uma pessoa deve insistir muito para

conseguir alcançar seus objetivos”, os ouvintes interpretam-no segundo as suas

crenças, o seu ponto de vista. Assim, torna-se óbvia a natureza didática dos

provérbios e há que se reconhecer a importância do momento didático no seu

significado interacional.

Possuem sentido metafórico – No que se refere ao seu valor metafórico, às EIs

podem ser classificadas como:

38 Este aspecto não será mostrado neste trabalho.

Page 51: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

51

a) fortemente metaforizadas – quando o sentido da EI não guarda uma relação

direta com o significado dos seus itens componentes.

Aqui, cabe lembrar o pensamento de Steen (1994). Para esse autor muitos

significados são automaticamente ativados na mente dos falantes, assim como os

significados literais, ou seja, em alguns casos não encontramos relação alguma entre

a EI e o seu significado idiomático. O falante decodifica a EI por ter em sua mente o

conceito metafórico referente ao significado da mesma. Então, expressões fortemente

metaforizadas podem ser chamadas de metáforas convencionais, pois têm seus

significados automaticamente ativados na mente de cada indivíduo. Vejamos:

� Tirar sarro = debochar

“Kaiser bock, Euclides e a comida da Fernanda. O Euclides era um namorado

atencioso com a Fernanda, mas tinha um defeito: tirava sarro da comida dela...”.

(VEJA, 12 /06/2002: 58).

Ao utilizar esta expressão, o falante pode não cogitar da compreensão histórica

que faz com que tirar sarro signifique debochar de algo ou alguém.

� Afogar a mágoa = beber exageradamente

“A cerveja fica para os Alemães afogarem as mágoas. Chandon Brasil. Vitória se

comemora com Chandon. Parabéns Brasil”. (VEJA, 09/07/ 2002:51).

O entendimento da EI acima só se torna possível porque o falante aprendeu que

afogar as mágoas significa consumir bebida alcoólica exageradamente. Não há

relação alguma entre a expressão e a imagem aludida. Dentre os possíveis

significados para afogar as mágoas, não se sabe por que foi convencionado consumir

bebida alcoólica exageradamente.

b) fracamente metaforizadas – quando o sentido da EI guarda alguma relação

aproximativa com o significado dos seus itens componentes.

� Enxugar o preço = reduzir o valor da mercadoria

“No lugar de reduzir a quantidade de tinta, enxugamos os preços. Cartuchos ink Jet

compatíveis. 100% novos e lacrados”.(VEJA, 20/02/2003: 83).

Page 52: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

52

Neste exemplo, há uma relação entre um dos constituintes, enxugar (tirar a

umidade, fazer cessar, diminuir a quantidade de moeda em circulação39), e o

significado idiomático da expressão. O mesmo pode ser visto em:

� Virar uma onça = ficar extremamente irritado/bravo.

“Eu não seria capaz, não, eu sou capaz. Se tocar em um filho meu, pode ser

senador, presidente da República, eu viro uma onça” Heloísa Helena, senadora

(PSOL-AL), fazendo coro com Virgílio e ACM neto. (VEJA, 09/11/2005: 50).

Essa expressão torna-se de fácil entendimento, porque há uma convenção

baseada na imagem da onça (animal valente, bravo). Por isso, a expressão

praticamente não apresenta problemas de decodificação.

Ainda no âmbito da tipologia, torna-se relevante apontar a formulação de Willians

(1994), que avança em relação a esse ponto. De acordo com o autor as expressões

idiomáticas “não seguem todas as regras; violam tanto regras sobre a forma (formal

idioms), como regras de interpretação (semantic idioms)”.

Dessa forma, em (a) “Os novos potes de Qualy estão mais bonitos e mais

resistentes. Tem de tampa amarela que é só bater o olho para bater aquela vontade”

= olhar repentinamente, (VEJA, 05/09/2002: última capa), a interpretação não é

simétrica ao seu processo sintático, isto é, ela não é interpretável como V +art+N. No

entanto, em (b) “João bateu o olho na maçaneta” (machucou o olho ao tentar olhar

pelo buraco da fechadura), há uma simetria entre a interpretação semântica e seu

processo sintático. Em outras palavras, o enunciado continua sendo interpretado

como V+art+N. Vejamos este exemplo representado no esquema abaixo:

39 Novo Aurélio Séc XXI, versão eletrônica.

Page 53: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

53

(b) João bateu o olho na maçaneta

Simetria composicional

V + art +N V + art +N

Em síntese, os enunciados (a) e (b) foram produzidos da mesma forma em termos

sintáticos. Porém, no enunciado “Os novos potes de Qualy estão mais bonitos e mais

resistentes. Tem de tampa amarela que é só bater o olho para bater aquela vontade”

(olhar repentinamente) a simetria está obliterada. A interpretação que fazemos dela

não é mais simétrica à sua geração sintática.

Ainda em relação à produção em termos sintáticos, torna-se relevante destacar

uma simetria parcial entre a EI e os itens que a compõem. Vejamos:

Subir na vida = melhorar as condições.

“Desafie a lei da gravidade: suba na vida. Vestibular UNA 2003” (VEJA, 26/09/2002:

63).

Ficar por cima = estar em melhores condições.

“Fique por cima. Faça Unicor vestibular 2004”. (VEJA, 15/10/ 2003: s/p).

Sintática Semântica.

Conclusão: bater o olho, nesse contexto é nulamente metaforizada, já que o seu

sentido decorre da associação direta do significado de bater, mais do significado

de o olho.

Page 54: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

54

Baixar a cabeça = demonstrar-se derrotado.

“Não vai ser a elite brasileira que vai fazer eu (sic) baixar a cabeça” Luiz Inácio Lula

da Silva, presidente da República. (VEJA, 03/08/2005: 52).

Considerando que em nossa cultura ocidental tudo que é “para cima” é “bom”,

enquanto o que for “para baixo” é “ruim”, as expressões em destaque não apresentam

dificuldade de entendimento, porque “subir” nos remete a algo positivo, isto é,

melhorar as condições de vida enquanto “baixar” denota uma atitude negativa.

Nestes exemplos, torna-se clara a relação intermediária entre a assimetria não

composicional e a simetria composicional destacadas anteriormente. Aqui,

percebemos uma simetria parcial, já que há uma herança de sentido de uma das

partes componentes da EI.

São recorrentes nos mais diversos gêneros discursivos – As EIs apresentam-se

de forma abundante nos mais diversos usos da língua.

Ex: “Não sou aquele príncipe da tevê. Vou a supermercados e sou muito pé no chão”

(Reynaldo Gianecchini, ator em entrevista a Marília Gabriela, no GNT).

“Uma parte do dinheiro foi roubada, retornando por baixo do pano às empresas

beneficiadas pelo subsídio fiscal”. (artigo de opinião da revista VEJA, 08/06/2005:

159).

Aqui, abro um parêntese para discutir uma hipótese que pretendo demonstrar ao

longo desta parte do trabalho.

Page 55: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

55

3.2.1.1 Seção de Frases: um gênero do discurso.

Cumpre ressaltar que neste trabalho abordarei apenas os gêneros publicidade40 e

“Seção de Frases41”, por possuírem elementos que constituem o Corpus deste

trabalho.

Sabendo-se que as marcas formais de um gênero apresentam correspondências

regulares com o mundo que ele evoca, tentarei com base na teoria dos gêneros do

discurso proposta por Bakhtin, comprovar, por meio da descrição de características, a

existência de um gênero do discurso que aqui se convenciona chamar de “Seção de

Frases”.

Hoje, a noção de gêneros discursivos se estende a todos os tipos de produções

verbais. São fenômenos históricos, ou seja, estão necessariamente atrelados ao

contexto cultural e social. Todavia, os gêneros discursivos não podem simplesmente

ser tomados como “estruturas” ou “roteiros” que se encontram disponíveis, para que o

locutor utilize-os como molduras para o seu enunciado.

Como fruto de um trabalho coletivo, os gêneros discursivos proporcionam o

ordenamento e a estabilização de todas as atividades comunicativas do cotidiano.

Trata-se, portanto, de formas discursivas que colaboram sobremaneira para a

instituição de qualquer situação comunicativa.

Contudo, mesmo evidenciando seu poder preditivo e interpretativo na formulação

dos discursos, os gêneros não impossibilitam ou inviabilizam o processo criativo do

enunciador. Mesmo que alinhados a um formato “padrão”, apresentam-se igualmente

maleáveis, versáteis, assumindo contornos, por diversas vezes, bem diferenciados.

Com base nisso, as referidas seções privilegiam, não somente a questão do

gênero, mas também abordam, a semântica e a expressividade, aspectos que serão

tratados no decorrer desta subseção.

40 Como o meu objeto não é a descrição da publicidade como gênero do discurso, não irei apontar questões sobre o gênero publicitário. 41

Na revista Veja a seção recebe o nome de “Veja Essa” e na revista “Isto É” recebe o nome de “Frases”.

Page 56: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

56

O interesse pelo estudo da linguagem como processo de interação, alicerce

fundamental do conceito de gênero, foi outro fator motivador para que eu discorresse

sobre esse assunto. É importante ressaltar, no entanto, que segui aqui os princípios

expostos por Bakhtin, uma vez que minha intenção é a descrição das características

do gênero que utilizo como Corpus. Considero irrelevante apresentar diferentes

posicionamentos acerca da questão da conceituação de gênero.

3.2.1.2 Sobre os gêneros.

Para conceituar gênero do discurso, de acordo com Bakhtin, torna-se fundamental

perceber a utilização da língua como um processo com variadas, heterogêneas e

múltiplas maneiras de realização. A estas diferentes formas de incidência dos

enunciados, o autor denomina gêneros do discurso, já que “[...] cada esfera de

utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados” (Bakhtin,

1992:277).

No entanto essa “relativa estabilidade” que é inerente a um dado gênero, chama a

atenção e deve ser compreendida como algo passível de aprimoramento ou alteração,

principalmente, em se tratando da linguagem, que é atividade verbal e tem relação

direta com outras culturas e com o desenvolvimento social.

Bakhtin com sua proposta de conceituação para os gêneros do discurso supriu a

necessidade de se compreender os enunciados como fenômenos sociais resultantes

da atividade humana, caracterizados por uma estrutura pilar básica suscetível a

determinadas modificações. Desse modo, só existe relacionado à sociedade que o

utiliza.

Devido à extrema heterogeneidade dos gêneros do discurso, resultado da

infinidade de relações sociais que se apresentam na vida humana, Bakhtin optou por

dividi-los em primário42 (simples) e secundário43 (complexo). Essa subdivisão é

determinada pela heterogeneidade lingüística.

42

Os chamados gêneros primários são aqueles que emanam das situações de comunicação verbal espontânea, não elaborada. Pela informalidade e espontaneidade dizemos que nos gêneros primários

Page 57: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

57

No entanto, esses gêneros chamados mais complexos absorvem e modificam os

gêneros primários:

“Os gêneros primários, ao se tornarem componentes dos gêneros secundários, transforman-se dentro destes e adquirem uma característica particular: perdem sua relação imediata com a realidade existente e com a realidade dos enunciados alheios44 [...]” (Bakhtin, 1992:281)

De acordo com esse autor, são três os elementos principais em que devemos nos

fundamentar para verificar o gênero a que pertence determinado enunciado:

� Conteúdo temático – é o assunto de que vai tratar o enunciado em questão;

� Plano composicional – alude à estrutura formal propriamente dita;

� Estilo – leva em conta questões individuais de seleção e opção: vocabulário,

estruturas frasais, preferências gramaticais.

Cumpre ressaltar que as três características aqui arroladas como principais nada

representam se o enunciado não for analisado levando-se em consideração todo um

contexto. Ou seja, os enunciados pertencem à determinada esfera da atividade

humana, são devidamente localizados em um tempo e espaço (condição sócio-

histórica) e dependem de um conjunto de participantes e suas vontades enunciativas

ou intenções.

A seguir, tentarei definir a minha proposta de gênero “Seções de Frases”,

descrevendo estas três categorias.

temos um uso mais imediato da linguagem. Ex: linguagem oral, diálogos entre familiares, reuniões de amigos, etc. 43 Nos gêneros secundários existe um meio para que seja configurado determinado gênero. Esse meio é normalmente a escrita. Logo, se há meio, dizemos que há relação mediata com a linguagem, se há meio, há uma instrumentalização. O gênero, então funciona como instrumento, uma forma de uso mais elaborada da linguagem para construir uma ação verbal em situações de comunicação mais complexas e relativamente mais evoluídas: artística, cultural, política. 44

Bakhtin usa o seguinte exemplo: uma carta ou um fragmento de conversação do dia-a-dia, quando inseridos em um romance se desvinculam da realidade comunicativa imediata, só conservando seus significados no plano de conteúdo do romance. Ou seja, não se trata mais de atividades verbais do cotidiano, e sim de uma atividade verbal artística, elaborada e complexa.

Page 58: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

58

3.2.1.3 Descrição do gênero “Seção de Frases”

Utilizei como corpus de análise duas seções veiculadas nas edições semanais das

revistas Veja e Isto É. Na revista Veja a seção recebe o nome de “Veja essa” e na Isto

É recebe o nome de “Frases”. O conteúdo temático encontrado nas referidas seções é

bem variado (enunciados de personalidades ligadas ao futebol, ao meio artístico, à

moda e à política). Além disso, torna-se relevante assumir que as seções, assim como

os demais atos de fala ali presentes, podem ser concebidas como gênero, pois

formata uma ação de linguagem cujo propósito é comunicar a ocorrência de um fato.

E nesse contexto, as seções contribuem efetivamente para representar uma

relação dialética estabelecida entre a legitimidade e a credibilidade, no sentido de que

o tipo de discurso que as compõem se caracteriza exatamente pelo fato de o falante

buscar se legitimar por meio da construção de sua credibilidade.

Com o propósito de iniciar a caracterização das “Seções de Frases”, convém

estabelecer quais foram os seus modos de produção, circulação e recepção.

Uma vez que estamos diante de textos que parecem representar um recorte de

falas e que são veiculados em revistas, sabemos que há todo um processo próprio de

elaboração: seleção dos enunciados, editoração, diagramação e revisão. Isso reforça

a idéia de que tais seções podem ser um gênero – um gênero que não é criado por

quem fala, mas por quem organiza os enunciados.

Todo esse processo já nos indica que se trata de um gênero secundário, mais

complexo e elaborado, cuja relação com a linguagem é mediata. O gênero é um meio,

um instrumento para a realização da situação comunicativa.

Em se tratando de circulação, as seções são parte constitutiva de duas das mais

importantes revistas de nosso país, embora saibamos que não são exclusividades das

mesmas. Tais seções são rotuladas de diferentes formas em diferentes veículos, mas

assumem nessas revistas uma certa regularidade - são apresentadas em forma de

recortes das falas dos políticos e personalidades ligadas a diferentes áreas. Assim

sendo, pode-se estabelecer uma relação do gênero como instrumento através do qual

a linguagem se presta a determinada situação de comunicação.

Page 59: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

59

Com relação à recepção, que entendo como a relação do leitor/ouvinte com o

enunciado, pode-se deduzir que haja uma expectativa de obtenção de informação,

uma vez que é um texto de revista, ou melhor, as seções tornam-se um espaço de

confluência entre discursos, que se comportam em estreita consonância com os

modos de dizer da época atual. Os discursos veiculados nessas seções são

institucionalmente legitimados e possuem suas normas. Para ‘vender’ uma idéia, os

mesmos possuem entrelaçamentos e estruturas lingüísticas afinadas com uma

espécie de tendência geral reinante, nas atuais sociedades de consumo ocidentais:

pouco texto, imagens arrojadas, cores, legendas ou frases instigantes aludindo

sempre a uma realidade que, parece dizer respeito ao real.

Por isso, ao deparar-se com os referidos enunciados, o leitor espera receber as

informações de forma rápida, pois é essa a característica mais marcante dos

enunciados que analisei nas referidas seções.

Delimitados esses aspectos, passo a descrever, de modo geral e seguindo a teoria

bakhtiniana, as três características que compõem o processo de análise e definição de

um gênero.

Com relação à estrutura, ou plano composicional, alguns aspectos das seções

supracitadas são fundamentais para defini-las como gênero específico.

Os textos que compõem as seções, como mencionado acima, são pequenos

(recortes) e trazem grande conteúdo informacional e essa forma de apresentação,

aliada, às vezes, a algumas fotografias dos enunciadores, provoca interesse no leitor.

Os enunciados ocupam posições bem destacadas e quase sempre são

evidenciados com um fundo colorido. Os textos são concisos, o que implica

diretamente outra característica observada: esses enunciados conferem uma rápida

decodificação por parte dos leitores.O conteúdo informacional é passado de forma

rápida e eficaz.

Quanto ao conteúdo temático, esse se evidencia no título que dei ao gênero

“Seção de Frases”. Os enunciados versam sobre assuntos que estão em voga no

momento e que corrobore com a intenção primordial das revistas.45

45 Este aspecto será abordado no tópico 3.3.5.

Page 60: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

60

A última característica proposta por Bakhtin para descrever um gênero seria o

estilo. Desprezando questões pessoais e individuais, e considerando seu valor

universal que, dificulta a classificação de um gênero de um ponto de vista estrutural,

um dos aspectos que desejo ressaltar sobre o estilo é a questão que evidencia o

caráter de desabafo e/ou ofensa dos enunciadores. Além disso, o próprio formato

dos enunciados, vêm sempre entre aspas seguidos de um comentário da revista,

são uma importante característica estilística que compõem o gênero em questão.

Então, uma vez estando diante das “Seções de Frases”, o leitor já relaciona em

sua memória lingüística e comunicativa, um modelo pré-concebido, assim, já espera

encontrar informação, desabafo e/ou ofensa. Além disso, os gêneros discursivos

surgem, situam-se e integram-se de maneira funcional nas culturas em que se

desencadeiam. Neste contexto, acabam por caracterizar-se por suas funções

comunicativas, cognitivas e institucionais no processo comunicativo, transcendendo,

conseqüentemente, seus formatos lingüísticos e estruturais. Assim sendo, torna-se

difícil uma definição formal e limitada.

Enfim, o efeito de sentido causado pelos enunciados nas seções, conferem as

mesmas um caráter de aproximação com o leitor que, cada vez mais, vem

procurando informações com eficácia e rapidez.

3.3 EIs: uma abordagem discursiva.

...o discurso [...] é também, e sobretudo,

um produtor da cena (DIAS, 1995: 70).

3.3.1 Introdução.

Devido à concepção de linguagem que perpassa esta pesquisa, sendo possível

pressupor que este Corpus, devido suas condições de produção e recepção,

evidencia satisfatoriamente o caráter dialógico e interacional da linguagem humana,

pretendo avaliar os efeitos de sentido resultantes do uso das EIs nos EPPs.

Page 61: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

61

Para tanto, a preocupação deste estudo será a de mostrar como construímos

lingüisticamente a argumentação usando EIs, tomando como ponto de partida as

perspectivas de diferentes enunciações, e como o autor, ao proceder à organização

textual desse discurso, faz prevalecer a orientação no sentido de determinada

conclusão.

Considero que é no trabalho da enunciação que os sujeitos produzem discursos.

E é no interior do próprio processo discursivo, por meio de múltiplas operações

articuladas pelos processos da própria linguagem, que a audiência é construída

antecipadamente.

Por isso, antes de entrar na análise propriamente dita, procuro contextualizar, em

linhas gerais, 46 a questão da enunciação, por considerar que essa teoria é muito

importante para sustentar, numa dimensão discursiva, o Corpus deste trabalho.

Parto do princípio que a teoria da enunciação ganhou um impulso na França com a

obra do lingüista Benveniste, que propôs estudar a subjetividade na língua: o

aparelho formal da enunciação.

3.3.2 Por uma noção de enunciação e argumentação.

Benveniste (1989) propôs estudar a subjetividade na língua, vinculando-a a

noção de enunciação, tratada como ato produtor do enunciado. Esse autor postulou

que se considerasse, como objeto de estudo, a atividade lingüística dos falantes,

que evidenciasse os constituintes do aparelho formal da enunciação, sendo eles: um

locutor; um alocutário; uma referência e outras "entidades lingüísticas", aquelas

criadas na e pela enunciação, tais como tempo, lugar e elementos dêiticos.

Ressalta-se, ainda, que a referência é um aspecto fundamental a ser considerado

no processo de enunciação. Segundo Benveniste, “a referência é parte integrante da

enunciação”. E, sendo assim, a mesma não está contida, pronta e acabada nas

46 As questões referentes à enunciação e argumentação serão apresentadas neste trabalho de maneira geral por não ser este o objetivo principal em foco.

Page 62: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

62

formas lingüísticas, pois ela é co-construída no/pelo discurso - o significado é

construído dialogicamente no curso de uma interação.

Por sua natureza de troca, o ato de enunciação insere-se também dentro de uma

categoria de atos que coloca em relação dois sujeitos: um sujeito que produz, o "eu",

e um sujeito para quem se destina o enunciado produzido, o "tu": "(...) Toda a

enunciação é, explicita ou implicitamente, uma alocução, ela postula um alocutário"

(Benveniste, 1989: 84). Sendo assim, a enunciação é caracterizada como uma

atividade em processo - um processo que estabelece um diálogo entre locutor e

alocutário.

Como mostrou Benveniste, o único modo de fazer o discurso funcionar é pela

intervenção do sujeito47, que nele investe sua subjetividade: “A enunciação é este

colocar em funcionamento a língua por um ato individual de utilização’’ (1989:82)”.

No entanto, no ato enunciativo, o sujeito não constitui apenas a si, sujeito locutor,

mas também o sujeito-alocutário, isto é, define não só a posição do eu, mas também

a do tu:

``...ele implanta o outro diante de si, qualquer que seja o grau de presença que ele atribua a este outro. Toda a enunciação é, explicita ou implicitamente, uma alocução, ela postula um alocutário'' (Benveniste, 1989:84).

Para o autor, o que, em geral, caracteriza a enunciação é a acentuação da

relação discursiva, ou seja, a enunciação manifesta a linguagem como um modo de

ação e para realizar essa ação, o locutor dispõe de um aparelho de funções para

influenciar de algum modo o comportamento do alocutário.

47

Orlandi (1996) critica a concepção de sujeito de Benveniste como ser único, central, origem e fonte do sentido. Ducrot (1987) define a enunciação independentemente do autor da palavra como o acontecimento constituído pela aparição do enunciado. Apesar de admitir que a enunciação trouxe contribuições, Mainguenau (1997, p.40) faz algumas restrições ao uso da enunciação na análise do discurso: a) não deve ser concebida com a apropriação do sistema da língua por parte de um indivíduo, o sujeito só chega à enunciação através de múltiplas regras do gênero de discurso; b) não reside num único enunciador, é a interação que está em primeiro lugar; c) o indivíduo que fala não é necessariamente a instância que se encarrega da enunciação. No entanto, não é objetivo deste trabalho aprofundar essas questões.

Page 63: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

63

Nesse contexto, o discurso político é normalmente marcado por processos de

persuasão e manipulação. Os sujeitos enunciadores valem-se de vários mecanismos

discursivos para atingir seus objetivos. Mudam os temas, as situações políticas, os

contextos sociais e os sujeitos, mas alguns recursos discursivos se mantêm.

Consoante Benveniste (1989:68),

“Todas as línguas têm em comum certas categorias de expressão que parecem corresponder a um modelo constante(...), mas suas funções não aparecem claramente senão quando se as estuda no exercício da linguagem e na produção do discurso”.

Então, ao assumir os pressupostos que subjazem a essa teoria, pretendo

estabelecer uma ligação entre a teoria da Enunciação e a teoria da Argumentação,

uma vez que entendo não haver argumentação sem enunciação.

Assim sendo, ao mencionar argumentação, devo levar em consideração que, a

partir do estudo prospectivo do corpus em pauta, o mesmo será caracterizado como

um discurso argumentativo. Em outras palavras, o locutor do texto terá como meta

convencer seus alocutários, conduzindo-os a certa conclusão, e para tal, utiliza-se

de uma marca enunciativa (EIs), com o intuito de facilitar a produção dos sentidos e

conseqüentemente a interlocução.

Falar sobre argumentação/argumentatividade recai, necessariamente, no campo

da adesão e do convencimento do ouvinte ou, antes, sabe-se que, por meio do

discurso, pretende o enunciador obter “[...] uma ação eficaz sobre os espíritos”

(Perelman & Olbrechts-Tyteca, 2002: 10), convencendo-o, persuadindo-o.

Na perspectiva de Perelman e Tyteca (2002), a argumentação consiste na

retomada da Arte Retórica aristotélica, com vistas a estabelecer uma contraposição

entre demonstração (lógica/formal) e argumentação (persuasiva/informal). Em seu

texto “Argumentação”, Perelman (1987) postula que:

“A argumentação é essencialmente comunicação, diálogo, discussão. Enquanto a demonstração é independente de qualquer sujeito, até mesmo do orador, uma vez que um cálculo pode ser efetuado por uma máquina, a argumentação por sua vez necessita

Page 64: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

64

que se estabeleça um contacto entre o orador que deseja convencer e o auditório disposto a escutar” (p.235).

Acrescenta-se, a essa concepção, o pressuposto de que, “enquanto um sistema

dedutivo se apresenta como isolado de todo o contexto, uma argumentação é

necessariamente situada”. (p.234).

Dessa forma, assumo como objeto de estudo da Teoria de Argumentação as

técnicas discursivas que visam a provocar ou a aumentar a adesão das mentes às

teses que se apresentam ao seu assentimento, tendo-se em vista que na

argumentação não se separa a razão da vontade, nem a teoria da prática.

Diante disso, e do quadro teórico de Perelman (1987) e de Perelman e Tyteca

(2002), interessa, a este estudo, a visão de que o ato de argumentar implica sempre

a adesão do interlocutor, seu consentimento, seu engajamento discursivo; sendo

importante considerar nesse processo o que é presumidamente admitido pelos

ouvintes, o que constrói a relação entre enunciador e enunciatário, condição para a

argumentação, ainda que consideremos a argumentação como fundamentada pelos

objetos do acordo (fatos, verdades, presunções, valores, lugares-comuns) expressos

discursivamente de modo estratégico.

3.3.3 A importância das EIs na construção do Ethos.

Assumi, até aqui, que a linguagem é a base fundadora de todas as atividades

que desenvolvemos em nosso dia-a-dia, pois vivemos em uma sociedade em que

nos vemos obrigados a exprimir e a defender, da melhor forma possível, nossas

idéias. Temos que debater, agradar, seduzir, convencer, persuadir. Dentro desse

contexto, foi resgatado um campo do conhecimento humano legado pelos gregos da

Antiguidade Clássica, que poderia responder convenientemente a essas

necessidades da modernidade: a Retórica. Essa pode ser definida como a faculdade

de ver teoricamente o que, em cada caso, pode ser capaz de gerar a persuasão,

sendo entendida também como a capacidade de descobrir o que é adequado a cada

caso em específico, cuja finalidade seja persuadir.

Page 65: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

65

No plano discursivo, os papéis de ethos e pathos alternam-se na medida em que

a voz – o logos – passa de uma para outra pessoa do diálogo. É durante essa

movimentação que os três elementos retóricos se constituem e se fortalecem,

concomitantemente ao próprio ato discursivo em si.

Aristóteles afirmou que a persuasão buscada através do discurso se fundamenta

em provas48 independentes e dependentes do próprio discurso. Entre as provas

dependentes destacam-se três espécies: a que reside no caráter moral do orador, ou

seja, no ethos, a que reside nas disposições criadas no ouvinte, ou seja, focalizadas

no pathos; e, finalmente, a centrada no próprio discurso devido àquilo que este

demonstra ou parece demonstrar, ou seja, no logos. Cada um desses elementos

(ethos, logos e pathos), desempenha um papel fundamental, que se complementa

com o dos outros numa articulação complexa.

Neste trabalho, darei atenção especial apenas a primeira dessas provas

argumentativas 49 . Para se conseguir persuadir pelo caráter, o discurso deve ser

“fabricado”, ou melhor, proferido de tal forma a construir uma imagem de

credibilidade do orador, como digno e confiável. Aristóteles acreditava que “o ethos

constitui praticamente a mais importante das três provas engendradas pelo discurso

– logos, ethos e pathos”.(Aristóteles, Ret. I 1356a 13 apud Amossy 2005).

E nesse contexto, o ethos pode ser visto como o ponto de partida de uma

avaliação da subjetividade do enunciador construída por meio do discurso. O homem

está sempre mais propenso a acreditar com maior firmeza e convicção, e de maneira

mais rápida, em pessoas tidas como de bem e honestas, ou seja, um dos segredos

48 Provas independentes: testemunhos, confissões obtidas pela tortura, convenções escritas, etc. Provas dependentes: residem (i) no caráter moral do orador (ethos); (ii) nas disposições criadas no ouvinte (pathos); (iii) no próprio discurso (logos). “Obtém-se a persuasão por efeito do caráter moral, quando o discurso procede de maneira que deixa a impressão de o orador ser digno de confiança (...) O caráter moral deste constitui, por assim dizer, a prova determinante por excelência. Obtém-se a persuasão nos ouvintes, quando o discurso o leva a sentir uma paixão (...) Enfim, é pelo discurso que persuadimos, sempre que demonstramos a verdade ou o que parece ser a verdade, de acordo com o que, sobre dado assunto, é suscetível de persuadir (p.24-5). (...) A confiança que os oradores inspiram provém de três causas, além das demonstrações; e são as únicas que obtêm a nossa confiança. Ei-las: a prudência, a virtude e a benevolência (p.102)”. 49 Cabe ressaltar, no entanto, que não há construção do ethos sem considerações do pathos e do logos.

Page 66: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

66

da persuasão está no orador passar uma imagem favorável de si mesmo, imagem

essa que deve seduzir o auditório e captar a benevolência e a simpatia deste, o que

estabelece uma relação entre o ethos e o pathos.

Esta representação do orador, do enunciador, é o próprio ethos, equivalendo ao

caráter que atribui a si mesmo pelo modo como exerce sua atividade retórica. Não

se trata de fazer afirmações auto-elogiosas no conteúdo do seu discurso, mas

declarações que, por meio da fluência, da entonação50, da escolha das palavras e

dos argumentos (a escolha de um argumento em detrimento de outro pode parecer

sintomático de uma qualidade ou de um defeito), confiram-lhe credibilidade. O ethos

funcionaria como um elemento que reforçaria a importância da argumentação

exposta. Assim, a confiança atribuída ao orador é um “efeito” do seu próprio

discurso.

3.3.4 Orador e auditório.

Assumindo-se que “o auditório é o conjunto daqueles que o orador quer

influenciar mediante o seu discurso” (Perelman, 1987), torna-se indispensável que o

orador conheça o auditório sobre o qual queira exercer alguma ação, porém, diante

de um auditório heterogêneo o orador se destaca como um grande enunciador,

adaptando o seu texto às diferenças sociais, psicológicas e lingüísticas de quem o

recebe. Aristóteles (1964) mostrou que, na fala do orador, não é relevante apenas o

conteúdo da mensagem; o que importa também é a sua fala como uma forma de

persuadir, já que “é pelo discurso que persuadimos, sempre que demonstramos a

verdade ou o que parece ser a verdade” (p.23).

A partir dessa concepção, adotando como postulado a idéia de que o discurso

manifesta-se lingüisticamente por meio de textos, torna-se relevante apontar o

objetivo da Análise do Discurso para que melhor se abarque o entendimento sobre

um discurso/texto.

Assim, segundo Charaudeau:

50 Não é pretensão deste trabalho aprofundar nos estudos prosódicos.

Page 67: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

67

“A análise do discurso tem por objetivo analisar a linguagem em ação, os efeitos produzidos por meio de seu uso, o sentido social construído(...). Assim, ela contribui para mostrar como se estrutura discursivamente o social, como o discurso é, ao mesmo tempo, portador de normas que sobredeterminam o indivíduo vivendo em coletividade e as possíveis estratégias que lhe permitem singularizar-se”(Charauderau, 1996:3)

Esse segmento social que entra na composição da linguagem significa, em outras

palavras, que “o discurso se realiza nos textos. Os textos realizam discursos em

situações institucionais, históricas sociais e ideológicas” (Marcuschi, 2002:24).

Nessa perspectiva, fazendo-se um retrospecto, pode-se dizer que foi com Pêcheux,

em Análise automática do discurso (1997), que o texto se tornou novamente 51

objeto em discussões lingüísticas. O autor introduziu uma proposta mostrando que o

texto pressupõe condições de produção discursivas ligadas, basicamente, à

situação, aos interlocutores envolvidos, ao tema do discurso e às imagens

psicossociais de todos esses elementos. Com isso, há um deslocamento do objeto

língua (lingüística saussuriana), para o objeto discurso (na visão de Pêcheux). Esse

deslocamento se coloca em relação às análises textuais dos comparativistas-

históricos. Pêcheux toma o texto não como produto, mas como processo discursivo.

Então, os sujeitos discursivos, os produtores e receptores textuais, são

articuladores, configuradores (Geraldi, 1995) de mundos discursivos variados

(Bronckart, 1999). Nesses mundos discursivos cujas coordenadas se encontram no

mundo real estão envolvidos uma complexa rede de fatores de textualidade,

relacionados, basicamente, à situação, ao jogo de imagens recíprocas que são,

grosso modo, as representações sociais, culturais, ideológicas; as convicções, as

atitudes dos interagentes, e os conhecimentos partilhados, dentre outros.

51 Com o advento da lingüística moderna, a partir de Ferdinand de Saussure e de sua obra, Curso de Lingüística Geral a relação entre “língua(gem)” e “texto” é deslocada, em relação à perspectiva anterior, histórico-comparativista, em que o texto se sobrepunha à língua. Nesta obra, a definição da langue como objeto da lingüística – e não o texto, que estaria no campo da parole (lugar de idiossincrasias, de heterogeneidade, de supostas irregularidades) – opõe uma Lingüística da Língua, que interessa a Saussure (1977), a uma Lingüística da Fala, que não o interessa, dada uma certa obscuridade teórica de seus objetos (no caso, a parole). Desse modo, o texto ficou relegado dentro da disciplina devido à definição saussureana do objeto da lingüística.

Page 68: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

68

Enfim, a argumentação é uma das formas mais profícuas da própria atividade

filosófica, na medida que ela envolve a capacidade de dialogar, de pensar, de

analisar, de escolher e que implica no comprometimento de alguém com os seus

próprios argumentos.

3.3.5: Análise:

A língua de madeira (língua dura e hermética) do direito e da política relaciona-se intimamente com a língua de vento (língua flexível, cotidiana, mas quase referencial ou substanciosa) das propagandas e das publicidades.(Michel Pêcheux).

Por acreditar que o homem público, ao dirigir-se ao seu ouvinte, confere à fala

uma força persuasiva, que instaura um processo de fascínio extremamente eficaz,

aponto ainda a sedução que, por meio do emprego de certas construções (no caso

EIs), surpreendem os interlocutores. Esta forma de argumentação aproxima-se do

discurso publicitário em geral, que busca recursos expressivos na elaboração dos

textos no intuito de oferecer ao possível consumidor um mundo ‘fechado’, levando-o

a uma única atitude/leitura - consumir, sem que o mesmo se sinta ‘forçado’ a isso:

“Os conceitos de publicidade e informação econômica não se recobrem exatamente porque o objeto publicitário ultrapassa, de modo característico, a própria racionalidade econômica. No anúncio e pelo anúncio, o valor econômico é procurado e dito em filigranas, através da mediação obrigatória da cultura, isto é, pela manipulação simbólica do sistema de costumes” (Lagneau apud Carvalho: 2000:12)

Pode-se considerar, então, que a formação do ethos não se constrói no discurso

em si, mas na maneira como ele é dito, ou seja, trata-se mais da forma como o

orador apresenta seu discurso diante do público do que do que ele representa, já

que o discurso “se firma nas marcas da enunciação” (Monnerat, 2003:106).

Assumindo as palavras de Charaudeau (2006):

Page 69: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

69

“No campo político, a credibilidade dos atores é freqüentemente afetada tanto por fatos que contradizem as intenções declaradas, quanto, como afirmado, por adversários que não se furtam a questioná-la. O político é, então, levado a produzir um discurso de justificação de seus atos ou a emitir declarações para se inocentar das críticas ou das acusações que lhe são dirigidas. Isso pode ser feito a priori, por antecipação, ou a posteriori”.(p.126)

Nessa perspectiva, na enunciação política, deve predominar o valor referencial.

Há que se pressupor a veracidade dos fatos a que se refere e a autenticidade do

seu relato. O pressuposto dessa veracidade institui um autêntico contrato entre o

político, por um lado, e a audiência, por outro.

Assim, a organização de um discurso deve ser guiada por duas noções

específicas da argumentação: a pertinência e a força dos argumentos. Isso decorre

do fato de um tema suscitar uma gama infinita de assuntos e para ser

compreendido, o orador deve lançar mão de recursos que dão realce à ‘idéia’ que

quer defender. Por isso, essa escolha deve levar em conta, também, o grau de

sustentação e entendimento que o público tem com relação ao assunto.

Considerando que o discurso político fundamenta-se numa decisão sobre o

futuro, o estadista, objetivando alcançar o bem comum, vale-se, dentre outros, da

eloqüência por acreditar que a mente humana condiciona-se melhor à afetividade.

Tentando obter a adesão de um público heterogêneo, o mesmo deve ter do seu

auditório uma idéia, tanto quanto possível, próxima da realidade, uma vez que um

erro sobre esse ponto pode ser fatal para o efeito que ele quer produzir.

Com base nisso, pode-se assumir, de modo geral, que um fato lingüístico assume

caráter discursivo a partir do momento em que há interação – no presente caso a

interação se dá entre os enunciadores, que têm como suporte as revistas, e o

público leitor e, sendo assim, as EIs, como fato lingüístico, assumem nos enunciados

que serão analisados a seguir, um valor argumentativo que confere ao orador um

ethos que passa pelo critério da aproximação com o auditório. As EIs conseguem

traduzir um conceito mais elaborado de forma efetiva. E assim, essa ferramenta (EI)

se torna adequada para provocar o resultado pretendido, mesmo que esse resultado

seja um efeito irônico, autoritário ou uma exposição ostentatória.

Page 70: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

70

Enfim, o ethos construído, nos enunciados que serão analisados é o de um

representante político que, grosso modo, constrói uma imagem de enunciador

indignado com uma dada situação e ciente da sua responsabilidade junto ao povo.

Observar-se-á como essa construção se processa em nível argumentativo, como

uma estratégia utilizada para persuadir o público-alvo.

Passemos a análise de alguns exemplos de EPPs.

Enunciados extraídos da revista VEJA:

1) “Política é olho no olho. Como se diz no Brasil é no Tête-à-tête.”Lula, presidente

da República, ao ser batizado como chefe de tribo em sua visita a Gana, na África.

Esbanjando o seu francês. (VEJA, 20/04/2005: 48).

� Neste enunciado, há uma definição de política que confere um ethos de

autoridade ao enunciador. O mesmo tenta sustentar este ethos baseando-se em

princípios de honestidade e sinceridade. Percebemos então, um certo “jogo” que

revela um locutor preocupado em influenciar, positivamente, seus possíveis

eleitores. Essa pretensão pode ser recuperada pelo significado da EI em destaque

(demonstrar honestidade/sinceridade). Assim, há uma tentativa do mesmo, em

exercer uma ação psicológica nos possíveis eleitores sem que esses se sintam

coagidos por tal ato.

2) “Queremos que vocês nos ajudem, porque tenho levado cacete”. Severino

Cavalcanti, presidente da Câmara dos Deputados, pedindo o apoio de empresários

e sindicalistas, reunidos em evento na Câmara contra a MP 322. (VEJA, 06/04/2005:

43).

� Aqui, o locutor revela sua indignação ao enunciar a EI “levar cacete” (ser

recriminado). Ao pedir ajuda usando essa expressão, o enunciador exprime seu

desagrado diante da atual situação vivida. Podemos inferir, com base nas pistas do

enunciado em questão, que o locutor se sente o único castigado pelos erros

Page 71: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

71

cometidos por vários parlamentares, e a EI “levar cacete” indicia de forma simples e

eficaz, toda sua aversão à referida situação, ou seja, há um desabafo expressivo

que cria um ethos de uma pessoa injustiçada.

3) “Tirando a prefeitura de Porto Alegre, não boto a minha mão no fogo por nenhuma

prefeitura do PT”. Milton Temer, ex-petista fundador do PSOL. (VEJA, 31/08/2005:

38).

� Para analisar esse discurso/texto recorro a Câmara Cascudo (1968) que nos

fornece informações suficientes para esclarecer a história da expressão destacada:

colocar a mão no fogo. Esse autor nos faz recordar que:

"... uma das justificações nos ordálios da Idade Média era a prova do ferro caldo. Quem

alegava inocência submetia-se a pegar numa barra de ferro aquecida ao rubro e caminhar

com ela na mão por alguns metros. Envolvia-se a mão em estopa, selada com cera, e três

dias depois se abria a atadura. Se a mão estivesse ilesa, sem sinal de queimadura, era

evidente e provada a inocência. Se estivesse queimada, provada estava a culpabilidade e

era imediata a punição pela forca”.

Botar a mão no fogo por alguém, portanto, é jurar pela sua inocência, demonstrar

confiança.

� Nesse caso, supõe-se que a EI em destaque introduza no texto um valor de

superioridade atribuído ao enunciador, já que há por parte do mesmo, uma tentativa

de desmoralização das demais prefeituras do PT. O enunciador se compromete

apenas com a prefeitura de Porto Alegre e por isso, encontramos uma

recomendação que deprecia as demais prefeituras do referido partido.

4) “Não estamos puxando a barba do bode. Temos de puxar a barba do bode para

mostrar onde está o DNA da corrupção.”Roberto Jefferson, deputado federal (PTB-

RJ), em discurso proferido momentos antes da cassação de seu mandato. (VEJA,

21/09/2005: 43)

Page 72: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

72

� Ao se analisar esse enunciado, percebe-se que o locutor usa as EI puxar a

barba do bode para dizer que as investigações estão muito “tranqüilas” e que, por

isso, ainda não se sabe (aqui, implicitamente, o mesmo se diz inocente) quem são

os verdadeiros responsáveis pela atual crise política. O recurso à EI, nesse

enunciado, confere ao enunciador o perfil de um político que está realmente

preocupado em descobrir quem são as pessoas responsáveis por toda a corrupção

presente. O enunciador tenta sustentar um ethos “politicamente correto” realçando a

importância de uma investigação mais eficaz, e para que isso ocorra é preciso,

segundo o mesmo, puxar a barba do bode (provocar confusão, desafiar a atual

investigação). Há também que se apontar que, pode haver aqui, uma alusão

metafórica ao presidente Lula e esse fato confere ao enunciador um ethos irônico.

Assim, o interesse pela argumentação desenvolvida pelo enunciador ao sugerir

uma investigação mais rígida é referenciada pela EI em tela.

5) “Meus adversários podem fazer quantas denúncias quiserem. Eu não moverei

uma palha, porque sei que vocês moverão o paiol inteiro contra eles “. O presidente

Lula, que não quer botar fogo no palheiro da campanha para não explodir o paiol da

reeleição. (VEJA, 30/08/2006: 54).

� Ao se expressar usando a EI mover uma palha, pode-se postular que o

presidente Lula tem como pretensão construir uma opinião pública com base em um

valor argumentativo que promova um ethos que oriente o interlocutor para um

comportamento voltado para a justiça, já que o mesmo tenta se preservar de

qualquer ação que possa passar uma imagem negativa de sua pessoa (candidato).

A EI em destaque neste enunciado significa não fazer coisa alguma e o enunciador

tem a possibilidade de apresentar um argumento ao público que se vincula a uma

pessoa que não quer tomar para si o encargo de julgar e/ou punir.

Vejamos agora alguns enunciados da revista ISTO É:

Page 73: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

73

6) “Não é possível mudar abanando moscas. Tem de remover o lixo “. Aloizio

Mercadante, senador, defendendo uma rígida investigação dentro do seu próprio

partido, o PT, na questão do mensalão.( ISTO É, 17/07/2005: 22).

� Neste enunciado percebemos que o orador, assim como no enunciado de nº

4, pretende dizer que as investigações estão muito tranqüilas. Ao dizer que “Não é

possível mudar abanando moscas,,,” o mesmo defende uma rígida investigação,

deixando pistas de sua inocência. Há uma recusa a atual investigação e dessa

forma o ethos construído é de um político honesto.

7) “Não acho que o Lula seja diferente de um líder sindical normal do Brasil, desse

ponto de vista de tomar umas e outras”. Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente

do Brasil, em entrevista à revista Playboy. (VEJA, 02/08/2006: 41).

� O ethos construído neste enunciado se efetiva de uma forma que leva o

enunciador (FHC) a comprometer o atual presidente com o hábito que a ele é

atribuído (consumir muita bebida alcoólica). Há uma tentativa, talvez um tanto

irônica, por parte do enunciador, de considerar tal fato normal. No entanto, devido às

circunstâncias que estão por traz desse fato, o ethos construído pelo locutor é de

uma pessoa dissimulada.

8) “Ela que vá pentear macacos!”. Hugo Chávez, presidente da Venezuela, sobre a

organização Internacional do trabalho, que definiu como greve geral uma greve de

petroleiros ocorrida em 2002. (ISTO É, 07/04/04: 22.)

� Aqui, o enunciador usa a EI “vá pentear macaco” (Ir para longe, afastar-se

para deixar de importunar) na tentativa de demonstrar toda sua insatisfação diante

do fato em questão, ou seja, ele usa esse xingamento para exprimir sua indignação

em relação a organização Internacional do trabalho. Além disso, essa expressão

caracteriza o descaso do enunciador em relação ao problema, o mesmo se mostra

autoritário e agressivo. Há um ethos que se firma numa atitude revestida de uma

imposição que revela um enunciador dominador.

Page 74: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

74

9) “Não fico no cargo nem que a vaca tussa”. Roberto Rodrigues, ministro da

agricultura sobre uma atual reeleição de Lula. (ISTO É, 24/05/2003: 22).

� Nem que a vaca tussa significa de jeito nenhum. Dessa forma, o enunciador

consegue transmitir seu sentimento diante da possibilidade de uma possível

reeleição do presidente da República. Há uma recusa enfática que gera um ethos de

insatisfação em relação ao governo do qual ele participa.

Após esta breve análise, nota-se que esses enunciados na sua totalidade

constroem o discurso do homem público mesclado com o cidadão. O primeiro vem

como suporte que comprova a indignação, a revolta ou a honestidade do segundo.

Parece haver um detalhe nessa relação entre o uso das EIs e a presença do seu

autor nas seções em foco. Pode-se postular que haveria uma estratégia dos

enunciadores para que os mesmos se tornem ‘visíveis’ na comunidade. Por estarem

inseridos nas dimensões midiáticas da sociedade contemporânea, seus interesses

orientam-se para a instância do discurso publicitário, marcadamente

institucionalizado e legitimamente aceito em todas as sociedades urbanas

ocidentais. Partindo da premissa de que a publicidade pertence ao conjunto de

práticas sociodiscursivas que instauram e expõem matrizes de sentido de uma

época, percebemos, nos enunciados analisados, marcas discursivas identificadas

com essa noção de colocar-se/estar em evidência. Além disso, o fato de os EPPs

possuírem a presença de um contorno de linguagem que se fortalece pelo uso das

EIs, e o destaque dado ao locutor podem ser vistos como um procedimento eficaz

usado como estratégia de marketing pessoal.

Dessa forma, o ethos adquire o tom de um político com nuances de cidadão e o

caráter de alguém preocupado com aquilo que o seu auditório (povo brasileiro) está

recebendo como notícia. Nesta perspectiva, foi observado, por meio dos fragmentos

dos discursos selecionados, que as revistas, também, constroem um ethos

institucional, revelando sua posição diante dos fatos ocorridos, (pois, está por trás do

Page 75: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

75

discurso apresentado nos enunciados em questão), cujo traço predominante seria a

preocupação com o seu público/leitor (enunciatários), proporcionando o acesso

destes às informações, por meio de uma forma de comunicação que a equipe de

profissionais, das referidas revistas, julga ser a melhor maneira para atingir

eficazmente o objetivo pretendido. Os enunciados seriam, portanto, uma maneira

simples e rápida de construir uma leitura que forneça ao leitor (enunciador) subsídios

que revelem o que vêm acontecendo na atual administração pública brasileira.

Ressalto ainda que a escassez de EPPs 52 na revista ISTO É (dos 50 enunciados

selecionados como corpus apenas 4 são da revista ISTO É), demonstra que a

mesma pretende se manter neutra (embora a neutralidade discursiva seja

impossível, como diz Koch,2002) diante da atual conjuntura brasileira. Ou ainda,

acho relevante chamar atenção para a possibilidade de uma certa resistência aos

enunciadores, com um comportamento contrário ao seu acolhimento. Pode-se

pressupor que a revista ISTO É, desconfiada das reais intenções dos políticos

brasileiros (enunciadores) ao proferirem tais enunciados a fim de se promoverem,

deseje exercer um papel contrário.

Já a revista VEJA, além de publicar um número bem maior dos, já apontados,

enunciados, quase sempre manifesta, de forma irônica, a sua opinião sobre o

conteúdo expresso por eles. Este fato pode ser observado nos enunciados de n º 1 e

5, demonstrados anteriormente em que a revista diz, respectivamente, (1) que o

Presidente Lula está esbanjando o seu francês, (2) e que o mesmo não quer botar

fogo no palheiro da campanha para não explodir o paiol da reeleição. Nota-se,

portanto, qual é a posição adotada por esta instituição no que se refere ao

presidente e o seu governo.

O discurso assume, então, uma polifonia baseada em um saber popular, e esse

saber trivial faz com que o povo se reconheça nessa simultaneidade de vozes. E

salvo nos poucos casos em que pode acontecer uma interpretação literal da EI, a

convenção permite uma economia durante o processo de interação verbal.

52 Refiro-me aos EPPs que contenham EIs.

Page 76: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

76

Além disso, pode-se dizer que o enunciador se apóia em princípios preexistentes

no próprio auditório, seus enunciatários, baseando-se em uma “idéia” já aceita,

prestando-se assim apenas a reativar o circuito de pontos de vista53 já aprovados,

uma vez que as pessoas em geral já conhecem o significado idiomático das

expressões.

Assim, este conhecimento comum, compartilhado (EI) constitui um apoio

essencial para desenvolver uma argumentação. Sua enunciação é em si mesma um

argumento que tem um alcance mais amplo e uma força de incitação maior, pois se

circunscreve em um saber comum.

Com isso, o enunciador pretende conduzir os seus enunciatários, num processo

interativo, à adesão às suas teses. Essa é uma estratégia que vem sendo muito

utilizada – adequar o discurso a diferentes tipos de auditório. E isso é conseguido ao

se usar EIs que conferem ao enunciado, além de um caráter mais familiar ao

receptor, um tom de jocosidade e ironia, mesmo que seja só em nível de discurso e,

conseqüentemente, o ethos construído pelos enunciadores se torna mais adequado

e voltado para os seus “interesses” .

Em suma, as EIs, nos enunciados aqui analisados, têm como função conferir aos

mesmos uma autoridade que permite ao enunciador construir, implicitamente, um

ethos voltado aos seus próprios interesses. E, por isso, a EI é, assim, o lugar em que

o discurso/texto se faz língua54, em que o social se faz representar e/ou indicar de

forma convencional um elemento importante para o esclarecimento do discurso

(embora não seja o único).

53 Adotei este termo com a seguinte concepção: maneira de considerar ou de entender um assunto ou uma questão; óptica, perspectiva. (Dicionário Aurélio – Século XXI. Versão eletrônica). 54 Adotei o termo “língua” como um sistema de comunicação intra/interpessoal e intra/intercultural, compartilhado por membros de comunidades, através de variedades individuais, geográficas e sociais, ou seja, língua como fato social.

Page 77: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

77

3.4 Síntese Parcial

Esta parte do trabalho teve como objetivo situar as EIs em uma abordagem

discursiva considerando que as mesmas são uma estratégia de construção da

imagem do ‘Eu’ discursivo. Um ponto fundamental para a construção de um suporte

teórico capaz de situar as EIs na perspectiva por mim assumida foi explicitar o

conceito de enunciação que permeia toda linha de pensamento aqui desenvolvida .

Trata-se, nas palavras de Benveniste (1989:82), do processo da transformação da

língua em discurso por um ato individual de utilização, em que o locutor mobiliza a

língua por sua conta mediante o conhecimento que tem da mesma, supondo a

interação entre o sujeito falante (locutor) e aquele a quem se dirige o discurso

(alocutário).

Apresento ainda, as “Seções de Frases” como uma atividade de construção de

sentidos que possuem uma estruturação mais ou menos estável, e por assim serem,

podem se constituir um gênero textual.

A interação lingüística se dá no momento presente da enunciação, aqui e agora,

e constitui-se numa experiência singular, incapaz de se repetir novamente porque

em momento algum as condições de produção do enunciado serão as mesmas. Isso

implica dizer que o conhecimento/domínio que o locutor tem da língua determina os

caracteres lingüísticos da enunciação. Nesse contexto, a competência lingüística

sobre a qual incide a preocupação pragmática, se traduz na capacidade do locutor,

de fazer escolhas que o levem a: a) recolher um conteúdo para um enunciado de

acordo com as pressuposições de existência do estado de coisas que pretende levar

ao conhecimento do ouvinte, a fim de partilhar com ele o saber que possui; b)

exprimir as suas intenções mediante uma emissão que reproduza o que realmente

pensa, de modo a merecer a confiança do ouvinte; c) realizar um discurso que,

respeitando a heterogeneidade do auditório vigente, permita-o chegar com o ouvinte

a um acordo sobre os valores em causa.

Também foi possível observar que, adotando uma concepção de linguagem como

atividade interativa, as EIs desempenham um papel importante no processamento

Page 78: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

78

discursivo por serem um recurso expressivo que traduz hábitos verbais de maneira

rápida e eficiente.

Utilizei-me também de algumas proposições teóricas de Mieder (1977) e Grsybek

(1995) relativas ao funcionamento dos provérbios com o objetivo de caracterizar

aspectos importantes referentes ao conteúdo semântico dos provérbios que os

diferem das EIs.

Nesta perspectiva, o objetivo desta parte do trabalho consiste em reapresentar as

EIs de maneira a mostrar que elas não são, como geralmente se considera, um

fenômeno apenas a ser estudado no âmbito da lexicologia e da lexicografia ou como

itens de enunciados, mas algo que permeia toda a enunciação.

Page 79: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

79

4. método de análise do corpus.

Page 80: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

80

4. MÉTODO DE ANÁLISE DO CORPUS

“O brasileiro é senhor de uma habilidade verbal impressionante! Inventa palavras e expressões, dá novo significado para vocábulos antigos, diverte-se, comunica, pensa e sabe ‘lutar com palavras’”.

Deonísio da Silva.

4.1 Análise do corpus: características sintático-semânticas.

4.1.1 Introdução:

Depois de definidos os conceitos centrais desta pesquisa, torna-se possível fazer

uma breve apresentação da formulação que norteará minha investigação. O

propósito aqui é meramente situar o leitor dentro dos passos mais gerais, para que

ele possa seguir a discussão com mais clareza.

4.1.1.1 A composicionalidade na construção do significado de EIs.

Pode-se dizer que a análise da produção e compreensão do significado das Els,

ou seja, o modo como as partes de uma EI se relacionam para formar seu

significado global, foi visto, até hoje de uma maneira bem constante. Sabe-se que o

significado de uma EI não é obtido por meio da soma dos significados de suas

partes isoladas, mas é o resultado de uma interpretação da EI vista como um todo.

Assume-se, também, que o significado de uma EI é cristalizado (fixo) em um

idioma e é justamente essa característica das expressões que permite aos falantes

de uma mesma língua usarem-nas de forma eficiente.

Nessa perspectiva, as EIs são vistas como uma estrutura lingüística ‘fechada’,

em que não há espaço para uma intervenção do sujeito, ou seja, por terem o

significado fixo, o sujeito não deveria figurar, a princípio, no processo de construção

Page 81: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

81

de ‘novos’ significados das expressões e, como conseqüência disso, a enunciação

que , como veremos quebra o caráter rígido das EIs, fica esquecida.

Segundo o princípio da composicionalidade o significado sentencial seria

resultante da “seleção” de um significado dentro de um leque pré-definido de

significados possíveis das palavras que formam a sentença quando consideradas

isoladamente. De acordo com Mari,1998:

“O significado que atribuímos a objetos, em geral, não representa uma totalidade a priori, mas decorre de um processo de aglutinação de unidades, resultando em matrizes conceituais, com graus diferentes de especificidade, mas capazes de selecionar aspectos da realidade[...]. Dessa forma, a composicionalidade é um instrumento formal, através do qual podemos definir parte da nossa atividade de perceber e de pensar”. (Mari, 1998: 51 - 65)

Esses termos exemplificam, grosso modo, o padrão de raciocínio da

composicionalidade: a construção de conceitos complexos a partir de conceitos mais

simples. A partir da aplicação de critérios formais às seqüências pode-se afirmar que

uma seqüência de palavras é composicional quando, naturalmente, cada elemento

deve poder ser substituído por outros e “quando, normalmente, o significado da

expressão total resulta do significado de suas partes componentes – computadas aí

relações sintagmáticas e propriedades lexicais” (Mari: 2006).

A noção de composicionalidade tem a ver com a possibilidade de “deduzir” o

significado de uma seqüência a partir dos significados dos componentes. Deduzir

quer dizer calcular por um processo que pode ser formalizado. No caso da

composicionalidade das seqüências lingüísticas, trata-se de um processo que deve

ser associado a uma construção sintática.

Assim, para que uma seqüência seja composicional deve haver transparência

semântica. Pode-se entender transparência semântica como a proximidade do

significado total da expressão com o significado dos seus componentes isolados,

enquanto que a opacidade seria a total impossibilidade da proximidade do

significado total da expressão com o significado dos seus componentes isolados.

Este processo pode ser visualizado no esquema abaixo:

Page 82: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

82

Ou seja, o sentido proposto (não idiomático, representado por (1)) é obtido

fazendo-se acionar os elementos individuais da expressão. Isso faz com que haja

uma transparência semântica, já que os valores da mesma se voltam para os

valores individuais dos elementos que a compõem, chutar + o + balde. Do contrário,

a expressão funciona como um bloco (2) e passa a ter seu significado reconhecido

através dos valores da unidade “chutar o balde”. Nesse caso, há uma opacidade

semântica entre as partes que compõem a expressão e seu significado total.

Outro exemplo: uma seqüência como bolsa de maquiagem denota uma bolsa que

contém objetos para maquiagem. O que a seqüência expressa é uma relação de

objeto-conteúdo. Essa regra também descreve a regularidade de todas as

seqüências que expressam essa mesma relação – objeto-conteúdo. A partir dessa

regra, portanto, pode-se explicar seqüências como bolsa de sapatos, bolsa de jóias,

bolsa de roupas, etc.

Nesse sentido, as EIs apresentam um grau de fixidez, e uma “opacidade” que

fazem com que elas não se prestem à composicionalidade, ou melhor, a princípio

não derivamos de uma EI construções paralelas. As EIs em português, teriam como

regra geral a impossibilidade de substituições paradigmáticas de suas unidades, ou

(1) Transparência semântica. (2) Desistir de algo, abandonar. Opacidade semântica.

chutar o balde

Aplicar chute ou pontapé

Recipiente com alça que serve para tirar ou carregar líquidos, areia, etc.

Page 83: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

83

de alguma de suas unidades. Tais substituições resultariam em um sentido próprio

não-correspondente com as unidades de composição. Vejamos:

(a) “Tenha a cabeça nas nuvens e os pés no chão. Timberland for the jouney”.

(VEJA 19/06/2002: 9.)

Significado idiomático = ser sonhador

Nota-se, que o significado da EI sublinhada -[So: ser sonhador]-, não é obtido a

partir da soma de suas partes componentes, por isso ela é não-composicional.

(b) Tenha o pescoço nas nuvens e os pés nos chão.

Em (b), a substituição do SN (a cabeça por o pescoço) levaria a um

comprometimento do significado da EI demonstrado em (a), ou seja, o sentido em

(b) não é o mesmo, nem é paralelo ao demonstrado em (a). Aqui, pode-se dizer que

o significado da expressão alterada é obtido por meio da soma de suas partes

componentes ter + o +pescoço + nas + nuvens – para algum contexto em que esta

leitura fosse aceitável - e isso provaria, a princípio, que uma EI não aceita trocas

paradigmáticas. No exemplo (b) a expressão torna-se composicional.

No entanto, a fim de demonstrar que podemos analisar muitas EIs em um

sentido onde a composicionalidade não é de todo excluída, ou seja, em que se

preserva parte do sentido idiomático, já que o falante constrói sentenças que

expressem, em contextos específicos , de forma tão direta quanto possível aquilo

que deseja comunicar, pretendo demonstrar que o princípio da composicionalidade

pode ser aplicado em grande parte destas construções que se fazem presentes na

vida dos usuários da língua. Não há, pois, como negar que as expressões

idiomáticas, como outros recursos lingüísticos, contribuem para a diversidade

discursiva tornando-se assim um aspecto importante para os estudos lingüísticos.

Como a composicionalidade assume que o todo é a soma das partes

componentes da expressão, ela não abarca as variadas construções de sentidos

existentes na linguagem, visto que, o sentido nem sempre é previsível, já que o

falante tem a seu favor a possibilidade de manipulá-lo no intuito de gerar um efeito

desejado.

Page 84: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

84

Por isso, para o presente trabalho, aponto uma alternativa de conceber a

composicionalidade nas EIs. Para tanto, as noções de transparência semântica e

opacidade semântica que, como vistos anteriormente, eram aplicadas às unidades

componentes da expressão, são agora deslocados para o significado global da EI.

Considero que há graus de composicionalidade quando a partir do signinificado

fixo da EI há estilização55. Assim, temos uma escala que vai da não-

composicionalidade, passa pela composicionalidade fraca e vai até a

composicionalidade forte. Em outras palavras, para que haja composicionalidade

fraca em uma EI, deve haver transparência semântica entre o significado da EI e o

significado da expressão resultante da substituição de algum de seus itens. Essa

transparência deve ser entendida como a possibilidade de importarmos do

significado da EI valores, com cargas variadas de efeitos de sentido, para o

significado da expressão modificada.

Ao contrário disso, considero que há composicionalidade forte quando, devido às

alterações feitas na EI, temos uma opacidade entre o significado desta e o

significado da EI ‘original’. Nesse caso, postulo que tal seqüência que foi modificada

e que não expressa a mesma idéia contida na EI ‘original’, é uma nova manifestação

lexical resultante da composição de suas unidades lexicais. Vejamos:

55 A saber: manutenção do sentido com o acréscimo de algum efeito de sentido.

Há composicionalidade fraca quando: Há composicionalidade forte quando:

X: [So EI original]

Substituição paradigmática: item lexical

X’: [So de X com algum tipo de efeito de

sentido, proveniente da troca do item

lexical.]

X: [So EI original]

Substituição paradigmática: item lexical

Y: [So de X, resultante da composição de

suas unidades lexicais].

Page 85: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

85

Em suma, antes os conceitos de transparência semântica e opacidade semântica

se aplicavam aos itens componentes da expressão em relação ao significado da

mesma: chutar + o + balde = [So: dar pontapés em um recipiente] (transparência

semântica), “chutar o balde” = [So: desistir de algo, abandonar] (opacidade

semântica).

Agora, os conceitos de transparência semântica e opacidade semântica foram

deslocados para o significado da expressão que teve algum de seus itens

modificados em relação ao significado da EI ‘original’:

Ex: X = “chutar o balde” = [So: desistir de algo/abandonar]

“Chutar o barril” = desistir de algo/abandonar com algum efeito de sentido (X’)

Ou seja, entre (X) e (X’) há transparência semântica.

Ex: X = “Chutar o balde” = [So: desistir de algo/abandonar]

“Chutar a caneca” = dar pontapé em um recipiente destinado a ingestão de líquidos

(Y).

Ou seja, entre (X) e (Y) há opacidade semântica.

Um outro aspecto que merece destaque em relação à composicionalidade das

EIs, diz respeito a dimensão gradual desse conceito. Postulo que há graus de

composicionalidade que podem ser visualizados no exemplo abaixo:

Ex: “Rivaldo deu um show de futebol arte. Ele mostrou o futebol e a Mizuno a arte”.

(VEJA, 09/07/2002: 61).

� EI = dar um show (não-composicional)

Sentido idiomático da expressão – exibir-se de forma magistral.

Quanto à composicionalidade

(a) Rivaldo promoveu um show [...] = (substituição do verbo) = preserva o So

idiomático. Composicionalidade fraca.

Page 86: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

86

(b) Rivaldo deu um comício [...] = (substituição do nome) = causa impossibilidade de

proximidade com o So idiomático. Composicionalidade forte.

Nota-se que há uma escala de gradiência entre os significados dos enunciados

acima. A EI “original” é não-composicional, no entanto, ao alterarmos o verbo que a

compõe preservamos o sentido idiomático da mesma em alguma extensão. Há

então uma composicionalidade fraca, pois o sentido de (a) ainda é interpretado na

mesma dimensão do sentido da EI original. Já, ao substituirmos o nome que compõe

a expressão, notamos que há uma opacidade entre o sentido obtido por meio da

troca do nome em (b) e o sentido da EI original. Nesse caso, postulo que há

composicionalidade forte.

4.1.2 O conceito de cristalização das EIs:

A presente discussão põe em foco exatamente o aspecto da cristalização das EIs

que, segundo parece, ainda não foi objeto de uma investigação que descrevesse

propriedades semânticas e sintáticas desses sintagmas. Pretendo avaliar até que

ponto se pode afirmar que uma unidade é cristalizada na mente dos falantes, além

de tentar descrever que o conceito cristalizado não pode, às vezes, ser determinado

com precisão. O significado ‘cristalizado’ apresenta, em alguns casos, uma escala

de gradiência de sentido, obtida por meio de trocas entre os elementos pertencentes

a uma mesma esfera semântica (trocas paradigmáticas), cujos significados, a partir

do significado cristalizado, preservam-se ou se mantém com o acréscimo de algum

tipo de efeito de sentido.

Desse modo, acho relevante retomar, aqui, o conceito que foi por mim proposto

em 3.2:

As expressões idiomáticas são formadas por uma estrutura frásica

que apresenta algumas restrições lexicais e sintáticas.Contêm

combinações que não são distribucionalmente produtivas, havendo

uma tendência a interpretação não composicional, por essa razão

Page 87: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

87

possuem sentido metafórico. Além disso, são recorrentes nos mais

diversos gêneros discursivos.

O que importa para esta análise é o valor dado à característica da cristalização

das EIs. Por isso, passo a me ater à particularidade do conceito destacada acima.

As EIs tendem a uma interpretação não composicional – E é justamente a

característica da composicionalidade que me permite pensar em um modelo onde o

significado que importamos dos itens lexicais que fazem parte do paradigma tem

uma contribuição fundamental na composição do significado global de uma unidade

que esteja acima (em grau de complexidade) de uma unidade isolada. Retomando a

formulação de Willians (1994) “as expressões idiomáticas não seguem todas as

regras; violam tanto regras sobre a forma (formal idioms), como regras de

interpretação (semantic idioms)”. Torna-se importante dizer que para o autor, a

violação se dá devido apenas ao fato de a relação entre os componentes da

expressão não está sendo computada diretamente no significado total da mesma.

Não há, a rigor, violação de nenhum princípio sintático.

Desse modo, a violação de uma regra sintática se define, grosso modo, pela

impossibilidade de se reconstruir o caminho SV > V+art+N (no caso do exemplo que

será citado abaixo). E uma violação da regra de interpretação é a impossibilidade de

se ter So / V +So / Sp (prep+N).

Assim, em “A cerveja fica para os Alemães afogarem as mágoas. Chandon

Brasil. Vitória se comemora com Chandon. Parabéns Brasil” (VEJA, 09/07/ 2002:

51), a interpretação não é simétrica ao seu processo sintático, isto é, ela não é

interpretada como V+art+N. A expressão passa a assumir, neste contexto, um So

que não é adquirido a partir da soma das suas partes isoladas. Assim, temos um SV

(afogar as mágoas) a partir da nova interpretação atribuída à expressão.

Essa é uma demonstração de um So idiomático cristalizado na mente dos

falantes. Ao ler/ouvir esta expressão, acredita-se, que um falante não terá problemas

quanto a sua decodificação, ou seja, ele fará a interpretação da EI abandonando sua

dimensão referencial (a de ser um verbo que denote: morrer ou matar ‘alguém’ por

Page 88: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

88

submersão) e fará sua interpretação se fixando em um segundo significado

(embebedar-se para extinguir, eliminar desgosto, amargura, tristeza).

Torna-se de fundamental importância dizer que, em uma expressão dita

convencional percebemos, com certa facilidade, uma relação paradigmática para

seus itens componentes que têm uma contribuição fundamental na composição do

significado global da mesma. Exemplificando: ao analisarmos o enunciado “Ana

comeu pão duro no café da manha”, torna-se claro que recorremos ao paradigma

onde está pão, que deve concorrer com biscoito, broa, bolo, etc., como também ao

paradigma onde está duro que deve concorrer com mole, macio, etc. E esta relação

paradigmática nos permite importar dos itens lexicais que compõem a expressão,

valores que serão fundamentais para a significação, há uma herança conceitual.

Isso seria, a princípio, impossível de acontecer em uma EI já que, como

mencionado, abandonamos sua dimensão referencial e a ajustamos a um segundo

significado.

No entanto, pretendo demonstrar, que algumas EIs permitem trocas

paradigmáticas entre seus constituintes que não comprometem o So idiomático das

mesmas. E é justamente essa característica de algumas EIs que me permite pensar

que o significado deve ser considerado cristalizado em alguma extensão, pois há

possibilidades de importarmos dos itens lexicais que fazem parte da EI valores que

contribuirão para uma expansão do significado, mantendo uma herança conceitual, a

partir do significado cristalizado. Vejamos:

“Criatividade vale ouro". 14º festival de Gramado. Fórum mundial de publicidade.

(ISTO É, 04/06/2002: 58).

� EI = valer ouro - (ter ótimas qualidades)

Composicionalidade da expressão:

(a) Criatividade vale bronze/prata/diamante [...].

Ao analisarmos o enunciado (a), nada nos impede de admitir que recorremos ao

paradigma onde está ouro, que deve concorrer com bronze, prata, diamante, etc. E

esta relação paradigmática nos permite importar dos itens lexicais que compõem a

EI, valores que contribuirão, a partir do significado cristalizado, para uma oscilação

do sentido da mesma sem prejuízo para o significado idiomático (ter ótimas

Page 89: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

89

qualidades). Pode-se postular que, nesse caso, a dimensão referencial a que nos

ligamos para importarmos os valores que farão parte da gradiência dos significados,

advém dos itens componentes da expressão, vistos como um todo. Em outras

palavras, a EI valer ouro recobre todos os valores que são estilizados em (a). As

demais construções demonstradas são usos “paralelos” que se pode atribuir à EI

valer ouro em função de uma enunciação motivada.

4.3 Metodologia:

Apresento agora um conjunto de informações que servirão de base para a

análise que proponho.

� Foram selecionadas 22 EIs do corpus em questão para a realização da

análise;

� As EIs serão separadas em grupos de acordo com a tipologia. Assim,

apresento primeiro a análise dos sintagmas verbais, em seguida dos sintagmas

nominais, na seqüência os sintagmas adverbiais e sintagmas frasais;

� Recorri às versões eletrônicas dos dicionários Novo Aurélio séc XXI,

Michaelis e Houaiss, para comprovar a constituição das EIs;

� As trocas entre os elementos das EIs foram feitas, ad hoc, por termos

pertencentes à mesma esfera semântica;

� Chamo de EI original aquela que tem o significado difundido e estável, e de EI

derivada construções feitas a partir da EI original, mas que preservam a mesma

idéia contida naquela;

� Estilização: implica a manutenção do sentido idiomático com o acréscimo de

algum tipo de efeito de sentido;

� A análise da composicionalidade nas EIs serve de indicação para mostrar que

uma EI não pode ter o teor composicional absoluto, mas apenas circunstancial;

� Para que haja modificações nos enunciados e conseqüente

composicionalidade, torna-se pertinente supor que o falante conheça a EI original e

Page 90: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

90

a partir dela faça modificações motivadas. Vejamos esse fato representado no

exemplo abaixo:

Ex: “Meus adversários podem fazer quantas denúncias quiserem. Eu não moverei

uma palha, porque sei que vocês moverão o paiol inteiro contra eles”. (O

presidente Lula, que não quer botar fogo no palheiro da campanha para não

explodir o paiol da reeleição. VEJA, 30/08/2006: 54).

Neste exemplo, o próprio enunciador, em função de uma motivação pessoal,

modifica a EI mover uma palha, estilizando-a, ou seja: ao querer enfatizar o evento o

presidente Lula substitui palha por paiol e, dessa forma, mantém o significado

idiomático (não fazer coisa alguma) com um efeito de sentido que aumenta a

importância do evento em questão.

� Considero que há composicionalidade fraca quando existe uma certa

transparência semântica, ou seja, uma proximidade entre o significado da EI original

e o significado da EI que teve algum de seus itens substituídos;

� Considero que há composicionalidade forte quando todos os elementos

atuam no significado da EI e, a partir disso, há uma certa opacidade semântica, ou

seja, uma impossibilidade de aplicar um ‘cálculo’ de proximidade entre a EI que

sofreu variação e o significado da EI original (como demonstrado anteriormente).

Nesse caso, a EI que sofreu variação e que não denota, em alguma extensão, o

mesmo significado da EI original seria uma outra manifestação lexical;

� Quando se fala de composicionalidade forte, o significado que está em jogo

advém do resultado da soma das partes componentes da expressão que teve algum

de seus itens modificados.

Passo então, a análise do corpus avaliando o aspecto sintático-semântico das

EIs.

4.3.1 Análise:

A partir das formulações acima, procederei à análise do Corpus.

Page 91: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

91

4.3.1.1 Sintagmas verbais:

(1) “O clube do bacalhau da Noruega, está com uma promoção de dar água na

boca”. (VEJA, 09/07/2002: 97).

� EI= dar água na boca. (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V +N + prep+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: despertar muita vontade

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a)[...] de dar água nos olhos (substituição do advérbio altera o So idiomático da

expressão já que, dar água nos olhos não está na mesma dimensão semântica (de

prazer) que dar água na boca)

(b)[...] de dar saliva na boca (substituição do nome) – estilização motivada pelo

próprio evento.

� Neste exemplo, a alteração feita em (a) invalida a EI em análise: dar água na

boca. Há uma opacidade (impossibilidade de recuperação ou de aproximação do

significado da EI original). Postulo que, nesse caso há composicionalidade forte, pois

a expressão em (a) assume uma interpretação que não denota: despertar muita

vontade. Na verdade, o exemplo (a) é uma outra expressão, visto que não podemos

associar seu significado ao significado da seqüência dar água na boca. Já em (b),

podemos assumir uma estilização decorrente da associação direta entre dar água e

dar saliva. Aqui, há uma composicionalidade fraca, já que há uma transparência

semântica entre o significado da EI original e a expressão ilustrada em (b).

(2) “Tenha os pés no chão. Timberland. For the jouney”. (VEJA, 19/06/2002)

� EI = ter os pés no chão. (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+ art+N+ adv)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: ser realista/objetivo

Page 92: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

92

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Tenha os pés no solo/na terra (substituição do advérbio) – (em um contexto em

que estivéssemos nos dirigindo aos sem-terra, tal enunciação torna-se aceitável).

(b) Tenha as mãos no chão (substituição do nome) – causa impossibilidade de

proximidade com o So idiomático.

� Em (a) temos uma composicionalidade fraca da EI em tela, já que, como

mencionado, tal variação se torna possível em função de um contexto motivado. No

entanto, em (b) há composicionalidade forte, pois a substituição do nome causa uma

opacidade que inviabiliza um cálculo de proximidade com o significado em foco: ser

realista/objetivo.

(3) “Grande leilão de imóveis locados para agências. Este é pra bater o martelo.

Grupo Santander Banespa” (ISTO É, 20/11/2002: 13).

� EI = bater o martelo (não-composicional)56

TIPOLOGIA DA EI: SV (V +art. +N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: tomar decisão final.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) [...] este é pra bater a marreta (substituição do nome) = estilização (aumenta a

importância do aliado específico).

(b) [...] este é pra golpear o martelo. (substituição do verbo) = causa impossibilidade

de proximidade com o So idiomático.

� Este exemplo nos mostra que em (b) há um comprometimento do significado

idiomático da expressão, ou seja, a expressão não é mais interpretada na dimensão

da EI bater o martelo. Há, então, uma variação lexical da EI em tela e isso altera o

significado da EI que é tomar decisão final, por isso, há em (b) composicionalidade

forte. Já em (a), conseguimos admitir uma transparência semântica entre o

56

Aqui, pode-se postular alguma restrição quanto a não-composicionalidade da expressão em foco, já que ainda é possível a existência de leilões em que se usa um martelo para fechar lances.

Page 93: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

93

significado da expressão alterada e o significado da EI original. Existe uma

proximidade do significado da EI bater o martelo com a variação bater a marreta e,

por isso, há composicionalidade fraca.

(4) “Tem gente que acha que você nasceu em berço de ouro. Eles não sabem como

você deu duro pelo seu dinheiro. Sudameris”. (ISTO É, 12/03/2003: contra capa).

� EI = nascer em berço de ouro (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+prep+N+prep+adj)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: nascer em família de alto poder aquisitivo.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Tem gente que acha que você nasceu em berço de diamante. [...] (substituição

do adjetivo) = estilização que aumenta a importância do objeto em questão.

(b) Tem gente que acha que você nasceu em leito de ouro. [...] (substituição do

nome) = preserva o So idiomático.

(c) tem gente que acha que você cresceu em berço de ouro [...] (substituição do

verbo) = preserva o So idiomático.

� Nos exemplos demonstrados em (a), (b) e (c), podemos admitir que as

modificações introduzidas são interpretáveis na dimensão da EI original: nascer em

berço de ouro. Isso prova a composicionalidade fraca da expressão, pois mesmo

depois de feitas as substituições, a EI continua preservando, guardadas as devidas

proporções, o sentido idiomático nascer em família de alto poder aquisitivo. No

entanto, torna-se pertinente ressaltar que o teor fraco da composicionalidade não

deve ser visto aqui de maneira simultânea, ou seja, a expressão comporta

mudanças em três lugares diferentes, mas isso acontece em momentos distintos.

(5) “Sabe aquela história com a volkswagem que ninguém acreditava? Agora ela

pode cair na boca do povo. Concurso nacional de contos” meu caso com um

volkswagem”. (ISTO É, 12/02/ 2003:29).

� EI = cair na boca do povo (não-composicional)

Page 94: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

94

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+prep+N+prep+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: tornar-se muito falado/comentado.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) [...] agora ela pode cair na boca da multidão. [...] (substituição do nome) =

estilização que aumenta a importância do evento.

(b) [...] agora ela pode correr na boca do povo.[...] (substituição do verbo) = preserva

o So idiomático.

(c) [...] agora ela pode cair na língua do povo. [...] (substituição do advérbio) =

preserva o So idiomático.

� Aqui, também se torna possível admitir que há uma certa transparência

semântica e conseqüente produtividade entre a EI original e suas modificações.

Momentaneamente a EI se torna composicionalmente fraca sendo interpretada de

acordo com os elementos que a compõem sem que isso invalide a proximidade

entre os significados admitidos em (a), (b) e (c) na dimensão do significado em jogo:

tornar-se muito falado/comentado. Aqui, como no exemplo anterior, as mudanças

não são simultâneas.

(6) “Curso In company-Educação Executiva. O único que veste a camisa da sua

empresa. Instituto Trevisan”.(ISTO É, 07/05/2002: 53).

� EI = vestir a camisa (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+art+ N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: dedicar-se integralmente

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) [...] o único que veste a camiseta/jaleco da sua empresa [...] (substituição do

nome) = estilização.

(b) [...] o único que coloca a camisa da sua empresa [...] (substituição do verbo) =

preserva o So idiomático.

Page 95: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

95

� Neste exemplo, a transparência semântica é percebida entre o significado da

EI original e suas modificações. Então, há composicionalidade fraca, pois os

significados são alterados, porém interpretados na mesma dimensão do significado

dedicar-se integralmente.

(7) “Quem compra isqueiro falsificado está queimando dinheiro. E se bobear queima

a mão também. Isqueiros Bic”. (VEJA, 12/11/2003: 29).

� EI = queimar dinheiro (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: esbanjar dinheiro.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Quem compra isqueiro falsificado está torrando dinheiro [...]. (substituição do

verbo) = preserva o So idiomático.

(b) Quem compra isqueiro falsificado está queimando cheque [...]. (substituição do

nome) = causa impossibilidade de proximidade com o So idiomático.

� Aqui, pode-se admitir que há uma transparência entre o significado de (a) com

o significado idiomático em destaque. Há uma certa familiaridade entre tal sentido

que permite um ‘cálculo’, de proximidade com o significado da EI original. Há uma

composicionalidade fraca. Já em (b) existe uma certa opacidade entre o significado

adquirido após a alteração com o significado idiomático. O significado adquirido com

a modificação introduzida em (b) não denota esbanjar dinheiro. Assim, essa

modificação faz com que a expressão ilustrada em (b) não possa ser interpretada na

dimensão da EI queimar dinheiro. Há, então, composicionalidade forte.

(8) “Prepare-se para ganhar o mundo. Cursos no exterior. Editora abril. Já nas

bancas “. (VEJA, 29/05/2003: 28).

� EI = ganhar o mundo (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+art+N)

Page 96: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

96

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: viajar por vários países.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Prepare-se para ganhar o país [...] (substituição do nome) = estilização que,

neste caso, diminui a importância do evento.

(b) Prepare-se para conquistar o mundo [...] (substituição do verbo) = preserva o So

idiomático.

� As variações em (a) e (b) conferem uma composicionalidade fraca aos

enunciados em foco. No presente caso, a EI ganhar o mundo vai ser reinterpretada

de acordo com os elementos que compõem as modificações assumidas em (a) e (b).

E isso, não impossibilita uma aproximação entre o So idiomático viajar por vários

países e o que pode ser interpretável para as modificações introduzidas.

(9) “Agora o que era bom ficou melhor. Maxigarantia Volkswagem. Você não fica

chupando o dedo se o seu veiculo der algum problema”. (VEJA, 19/06/2002: 34).

� EI = chupando o dedo (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: Ficar sem ação/ sem alcançar o intento.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:57

(a) [...] Você não fica chupando a mão se o seu veículo der algum problema

(substituição do nome) = preserva o So idiomático.

(b) [...] Você não fica lambendo o dedo se o seu veículo der algum problema.

(substituição do verbo) = preserva o So idiomático.

57 Há um fato que merece ser registrado: para que o falante atribua o significado cristalizado a uma EI o mesmo não tem que saber o porquê sincrônico ou diacrônico do processo. Basta que ele saiba que tal expressão se identifica com um determinado valor. No entanto, suponho que o falante parte sempre do pressuposto de que haverá (ou houve) uma razão para ser assim e tenta encontrar na interpretabilidade, que, a meu ver, não lhe impõe limites, as conexões que lhe pareçam justificáveis. A prova disso torna-se visível quando os falantes reinventam construções nas EIs que originariamente não existiam, manipulando-as para gerar um efeito de surpresa, inovação, etc.

Page 97: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

97

� Os significados adquiridos com as modificações introduzidas em (a) e (b)

podem ser deduzidos a partir do significado da EI chupando dedo. Há uma

transparência semântica que torna tais expressões modificadas,

composicionalmente fracas.

(10) “Para sua família ter uma educação com qualidade extra, você não precisa abrir

mão do sabor. Produtos Extra”. (VEJA, 29/05/2003: 47).

� EI = abrir mão (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: Desinteressar-se, ou abdicar-se de algo ou

alguém. Mudar de idéia, ceder.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) [...] Você não precisa abrir pé [...] (substituição do nome) = causa impossibilidade

de proximidade com o So idiomático.

(b)[...] Você não precisa fechar mão [...] (substituição do verbo) = causa

impossibilidade de proximidade com o So idiomático.

� Os significados obtidos com as substituições em (a) e (b), fazem com que

essas expressões tenham composicionalidade forte. Os significados em (a) e (b) não

expressam a mesma relação do significado da EI abrir mão. Há uma opacidade

semântica que inviabiliza a proximidade de tais construções com o significado

desinteressar-se, ou abdicar-se de algo ou alguém. Mudar de idéia, ceder.

(11) “Não estamos puxando a barba do bode. Temos de puxar a barba do bode para

mostrar onde está o DNA da corrupção”. Roberto Jefferson, deputado federal (PTB

– RJ), em discurso proferido momentos antes da cassação de seu mandato. (VEJA,

21/09/2005: 43).

� EI = puxar a barba do bode (não-composicional)

Page 98: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

98

Esta expressão não se encontra dicionarizada. No entanto torna-se clara a

relação da mesma com a expressão “dar bode” (resultar em uma situação infernal,

indesejável, confusa). Há uma associação entre o termo bode e o verbo puxar que

compõe a EI. A partir disso, torna-se possível uma aproximação entre a EI puxar a

barba do bode e seu significado provocar/instigar confusão.

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+art+N+prep+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: provocar/instigar confusão.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Não estamos puxando a barba do cabrito [...] (substituição do nome) =

estilização.

(b) Não estamos puxando o bigode do bode [...] (substituição do nome) = estilização

que diminui a importância do evento em questão (barba – pêlos que nascem no

queixo e nas faces dos homens; bigode – parte da barba que nasce sobre os

lábios).58

(c) Não estamos esticando a barba do bode [...] (substituição do verbo) = preserva o

So idiomático.

� Dos significados obtidos com as modificações introduzidas em (a), (b) e (c),

podemos fazer uma associação com o significado da produção puxar a barba do

bode. Há uma composicionalidade fraca entre tais significados, pois os mesmos

podem ser interpretados na mesma dimensão da seqüência provocar/instigar

confusão.

(12) “Fernando Henrique é movido pelo rancor e pela inveja. Ele deveria pensar

duas vezes antes de falar. Os padrões éticos no governo dele não resistem a uma

comparação, se o critério for o grau de lesão aos cofres públicos”. Ciro Gomes,

ministro da Integração Nacional, sobre afirmação de FHC de que a ética do PT é

roubar. (VEJA, 15/02/2006: 38). 58 Novo Aurélio Séc. XXI. Versão eletrônica.

Page 99: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

99

� EI = pensar duas vezes (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+numeral+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: agir com cautela.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) [...] Ele deveria pensar três vezes antes de falar [...] (substituição do advérbio) =

estilização que aumenta a importância do evento.

(b) [...] Ele deveria refletir duas vezes antes de falar [...] (substituição do verbo) =

preserva o So idiomático.

� Torna-se possível perceber que as EIs ilustradas em (a) e (b) comportam

variações em sua estrutura, levando a uma alteração no sentido, sem que isso a

invalide. No momento em que as variações se realizam a EI se torna

composicionalmente fraca, pois as modificações se fazem interpretáveis em função

de um contexto específico. Há uma transparência semântica (proximidade do So da

EI original) e uma produtividade que faz com que o significado estilizado denote agir

com cautela em maior ou menor grau.

(13) “Vamos sentar o sarrafo no Garotinho”. Orestes Quércia, ex-governador de são

Paulo, apostando tudo na derrota do ex-governador fluminense nas prévias do

PMDB. (VEJA, 01/03/2006: 34).

� EI = sentar o sarrafo (o mesmo que descer a lenha) (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SV (V+art+ N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: ser surrado/derrotado (no presente caso, nas

eleições).

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Vamos meter o sarrafo no Garotinho. (substituição do verbo) = preserva o So

idiomático.

Page 100: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

100

(b) Vamos sentar o ferro no Garotinho. (substituição do nome) = estilização que

aumenta a importância do aliado em questão.

� Percebemos, também, nesses casos, que as substituições feitas em (a) e (b)

expressam a mesma relação semântica do significado da EI original. Há, então, uma

composicionalidade fraca já que, os significados estilizados e/ou modificados

denotam o mesmo que ser surrado/derrotado (no presente caso, nas eleições).

4.3.1.2 Sintagmas nominais

(14) “Exame é seu braço direito na hora de tomar decisões e destacar-se na

carreira”. (ISTO É, 04/06/2002: 58).

� EI= braço direito. (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SN (N+adj)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: auxiliar principal e eficaz.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Exame é seu braço esquerdo [...] (substituição do adjetivo) = estilização

(considerando a conotação atribuída ao adjetivo esquerdo – mal jeitoso,

desastrado59-, podemos considerar que houve uma diminuição na importância dada

ao evento).

(b) Exame é sua perna direita [...] (substituição do nome) – nesse contexto, há um

comprometimento do sentido idiomático, já que não há uma convenção ligada a

importância da perna direita como algo que facilita/ajuda.

� Este exemplo nos permite visualizar um aspecto importante no que diz

respeito à composicionalidade das EIs. Pode-se postular, de modo geral, que quase

toda palavra de uma EI pode ser substituída e interpretada em função de um

contexto específico. Por exemplo, nos enunciados demonstrados em (a) e (b) temos

59 Dicionário Novo Aurélio séc XXI. Versão eletrônica.

Page 101: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

101

que: em (a) há uma estilização e conseqüente composicionalidade fraca do

significado em foco, já em (b) isso, a princípio, não acontece. Não percebemos

nesse último caso uma transparência semântica entre o significado obtido com a

substituição (braço por perna) e o significado da EI original, por isso, há

composicionalidade forte neste último caso.

No entanto, em uma enunciação especial onde estivéssemos nos referindo a

um maratonista, por exemplo, tal enunciado [...] é sua perna direita, poderia ser uma

estilização da EI braço direito.

(15) “Para preservar o mar e quem depende dele, a Shell foi ouvir algumas histórias

de pescador”. (VEJA, 01/05/2002: 84).

� EI = história de pescador (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SN (N+prep+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: história exagerada/mentirosa.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a)[...] a Shell foi ouvir algumas histórias de marinheiro (substituição do nome) =

estilização em função de um contexto especial.

(b)[...] a Shell foi ouvir alguns contos de pescador (substituição do nome) = causa

impossibilidade de proximidade com o So idiomático.

� Como no exemplo anterior, em (a) podemos admitir uma estilização em

função de uma motivação para tal enunciação. Porém em (b), torna-se mais difícil

perceber uma certa proximidade entre o enunciado e o significado: história

exagerada/mentirosa. Em outras palavras, há em (a) uma composicionalidade fraca

e em (b) uma composicionalidade forte.

Torna-se necessário abrir um espaço para discutir, em linhas gerais, a questão

da naturalidade ou não-naturalidade de algumas expressões em razão da presença

de certos itens lexicais, cuja troca está sendo proposta para algumas expressões. A

escolha de um item em detrimento de outro pode fazer uma grande diferença em

Page 102: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

102

torno da expectativa de interpretação. Logo, a escolha do item contos no enunciado

(b) supracitado, torna a expressão composicionalmente forte. Porém, se ao invés de

contos de pescador fosse usado causos de pescador, o enunciado se tornaria

interpretável na dimensão da EI em destaque, tornando-se composicionalmente

fraco.

Dessa forma, os efeitos de sentido são particularmente representativos de um

processo consciente para os falantes. O mesmo seleciona os itens visando o que se

deseja alcançar. Daí pode-se compreender o uso tão reiterado deste processo de

selecionar, inverter e violar os percursos semânticos que uma dada expressão já

tinha fixado na língua. Isso pode, às vezes, causar uma novidade semântico-

interpretativa, ou seja, ser não-natural e outras vezes apresentar uma naturalidade

interpretativa em relação à expressão original.

(16) “Montanha não é lugar de pé frio. Timberland. 100% à prova de água”. (VEJA,

05/06/2003: 89).

� EI = pé frio (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SN (N+adj)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: pessoa de má sorte

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Montanha não é lugar de pé gelado [...] (substituição do adjetivo) = estilização

que, no presente caso, aumenta a importância do fato.

(b) Montanha não é lugar de mão fria [...] (substituição do nome) = causa

impossibilidade de proximidade com o So idiomático.

� Em (a) temos uma transparência semântica do enunciado em questão que

admite uma interpretação compatível com o significado da EI para a modificação

introduzida – há composicionalidade fraca. Em (b), no entanto, isso não acontece.

Há uma opacidade semântica que impossibilita a interpretação desse enunciado na

mesma dimensão do significado, pessoa de má sorte – há composicionalidade forte.

Page 103: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

103

(17) “Se você precisa de uma máquina fotográfica com jogo de cintura. Escolha a

Olympus Trip”. (VEJA, 13/03/2000: 70).

� EI = jogo de cintura (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SN (N+prep+N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: ter flexibilidade na solução de problemas ou

situações difíceis.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Se você precisa de uma máquina fotográfica com jogo de quadril [...]

(substituição do nome) = causa impossibilidade de proximidade com o So idiomático.

(b) Se você precisa de uma máquina fotográfica com competição de cintura [...]

(substituição do nome) = causa impossibilidade de proximidade com o So idiomático.

� Neste exemplo, tanto em (a) quanto em (b) não conseguimos calcular uma

proximidade entre os significados obtidos com as modificações e o significado da EI

original, por isso, há composicionalidade forte. Os significados de (a) e (b) não

denotam ter flexibilidade na solução de problemas ou situações difíceis.

(18) “Tá difícil de engolir a programação da sua TV? Assine HBO. O melhor canal de

filmes do mundo”.(ISTO É, 07/08/2002: 99).

� EI = difícil de engolir (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SN (adj+prep+V)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: inaceitável

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Tá difícil de mastigar a programação da sua TV? [...] (substituição do verbo) =

podemos supor que tal modificação possa ser usada para manifestar um grau

primário de inaceitabilidade do significado (1º mastiga, depois engole), ou seja, a

Page 104: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

104

expressão representada em (a) pode ser uma forma usada para “traduzir” um evento

que antecede ao significado da EI original e, sendo assim, tal modificação torna-se

um equivalente semântico para a EI original.

(b) Tá complicado engolir a programação da sua TV? [...] (substituição do verbo) =

preserva o So idiomático.

� Tanto em (a) quanto em (b), percebemos uma certa transparência semântica

que permite que as variações aplicadas sejam composicionalmente fracas. Os

significados adquiridos em (a) e (b) ainda denotam inaceitável.

4.3.1.3 Sintagmas adverbiais.

(19) “Sua receita é guardada a sete chaves. Passa de mestre cervejeiro para mestre

cervejeiro como segredo de família. Graças a esse cuidado, desde 1853 ninguém

conseguiu imitar a Bohemia”. (Veja, 09/07/2001: 19).

� EI = a sete chaves (não-composicional)

Embora o objetivo não seja fazer uma descrição histórica das EIs acho

conveniente esclarecer em que lugar da expressão em tela a metáfora opera de

forma mais direta. Sete é um número indefinido, um número que indica grande

quantidade e que sempre seduziu a imaginação popular. A expressão fechado a

chave ou simplesmente a chave já significa bem fechado. Com o determinante

quantitativo (sete), intensificou-se o ato em questão. Como fato real, existiram arcas

fechadas a quatro chaves, como a que se encontra no Instituto Histórico e

Geográfico do Rio Grande do Norte. Cada uma das chaves ficava com um alto

funcionário, e isso era a garantia da total reserva na responsabilidade do segredo

guardado.

TIPOLOGIA DA EI: Sadv (prep + numeral + N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: muito bem guardado.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

Page 105: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

105

(a) Sua receita é guardada a oito chaves [...] (substituição do numeral) = estilização,

aumenta a importância do evento em questão.

(b) Sua receita é guardada a sete trancas [...] (substituição do nome) = estilização.

Consideradas as características físicas 60 dos objetos em questão (chave – utensílio

de ferro ou de metal que se introduz na fechadura, e tranca – viga de madeira ou

ferro usado para efeito de segurança), pode-se considerar que há uma estilização

que aumenta a importância do aliado especifico.

Neste exemplo há composicionalidade fraca nos enunciados (a) e (b). Torna-se

possível resgatar dos mesmos o sentido presente na EI a sete chaves. Tais

enunciados serão reinterpretados, agora, de acordo com os elementos que os

compõem sem, no entanto, assumir uma opacidade semântica em relação ao

significado muito bem guardado.

(20) “O Brasil vai crescer pra chuchu, nós vamos ter emprego pra chuchu, e vai ser

um governo que é um chuchuzinho. Geraldo Alckmin, governador de São Paulo,

que para a campanha à sucessão de Lula pretende capitalizar o legume – isso se o

tucanato não passar a serra no chuchuzeiro. (VEJA, 01/03/2006: 34)”.

� EI= pra chuchu (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: Sadv (prep + N)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: com intensidade.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) O Brasil vai crescer pra tomate/abóbora/cebola [...] (substituição do nome) =

causa impossibilidade de proximidade com o So idiomático.

� O significado da EI pra chuchu está relacionado ao fato de essa trepadeira

ser de cultivo fácil, rápido e abundante. Não conseguimos no exemplo modificado

60 Dicionário eletrônico Houaiss .

Page 106: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

106

em (a) resgatar ou ter uma proximidade com o significado idiomático da EI original.

Por isso, há composicionalidade forte na modificação introduzida em (a).

4.3.1.4 Sintagmas frasais:

(21) “Ela que vá pentear macacos!”. Hugo Chávez, presidente da Venezuela, sobre

a organização Internacional do trabalho, que definiu como greve geral uma greve de

petroleiros ocorrida em 2002. (ISTO É, 07/04/2004: 22).

� EI= vá pentear macaco! (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SF (sintagma frasal)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: Ir para longe, afastar-se para deixar de

importunar.

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) Ela que vá escovar macaco! (substituição do verbo) = preserva o So idiomático.

(b) Ela que vá pentear gorila! (substituição do nome) = estilização que aumenta a

importância do evento em questão.

� As modificações feitas em (a) e (b) produzem sentidos compatíveis com o

significado da EI vá pentear macaco, ou seja, tais alterações funcionam em um

contexto especial em que o falante queira fazer tais mudanças. Há, então, uma

composicionalidade fraca nos enunciados (a) e (b).

(22) “O PT ainda está muito em cima da crise política e tem de sair disso. Se não

sair do córner, a vaca vai pro brejo”. Jorge Viana, governador do Acre (PT). (VEJA,

18/01/2006: 42).

� EI = a vaca vai pro brejo (não-composicional)

TIPOLOGIA DA EI: SF (sintagma frasal)

SENTIDO IDIOMÁTICO DA EXPRESSÃO: dar tudo errado.

Page 107: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

107

QUANTO À COMPOSICIONALIDADE DA EI:

(a) [...] se não sair do córner, o touro vai pro brejo. (substituição do nome) =

estilização.

(b) [...] se não sair do córner, a vaca vai pro pântano.(substituição do advérbio) =

causa impossibilidade de proximidade com o So idiomático.

� Em (a) há uma estilização que nos possibilita deduzir o significado da

seqüência dar tudo errado com um grau diferente de especificidade. Este enunciado

variado é composicionalmente fraco. Já em (b) não conseguimos deduzir o

significado da seqüência alterada do significado idiomático. A alteração feita causa

impossibilidade de proximidade com o significado da EI a vaca foi pro brejo e por

isso, há composicionalidade forte.

Há também que se ressaltar que em casos como o descrito acima, existe a

possibilidade de certas operações paradigmáticas gerarem expressões que

requerem uma maior atenção no seu processo de decodificação. Talvez, o falante

não atribua um valor semântico imediato a tais modificações (a) e (b), porém há uma

condição de que tal valor seja compreensível dentro de um contexto muito

específico.

4.4 Algumas considerações importantes.

Após as análises que foram feitas, podemos verificar que:

a- Embora esta análise não se preste a um estudo histórico sobre as EIs, pudemos

observar que o uso atual de uma lexia complexa envolve a sua história durante toda

a sua existência no passado, sem que o uso das mesmas suponha o conhecimento

dos fatos que as geraram;

b- Atrás de uma EI, embora deva haver exceções, há uma torrente de expressões

paralelas ou variantes, há uma história ou um fato literário marcante e há a

participação ativa do povo que a divulgou através da língua oral;

Page 108: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

108

c- As variantes de uma EI podem levar o pesquisador, através da comparação, a

descobrir a sua origem e o seu sentido etimológico. Temos como exemplo, entre

outros, a EI puxar a barba do bode (nº 11), que mantém uma estreita relação com a

expressão dar bode;

d- Pode-se considerar também que as variantes podem ter formas semelhantes e

sentidos bem diferentes (a), assim como podem ter sentidos semelhantes (às vezes,

estilizados) e formas diferentes (b). Vejamos:

(a) “Quem compra isqueiro falsificado está queimando dinheiro. E se bobear queima

a mão também”. Isqueiros Bic. (VEJA, 12/11/2003: 29). = [So: gastar

desnecessariamente].

Quem compra isqueiro falsificado está queimando cheque. (compromete o

significado idiomático da EI).

(b) “Vamos sentar o sarrafo no Garotinho”. Orestes Quércia, ex-governador de São

Paulo, apostando tudo na derrota do ex-governador fluminense nas prévias do

PMDB. (VEJA, 01/03/2006: 34). = [So:ser surrado/derrotado].

Vamos descer a lenha no Garotinho. = (ser surrado/derrotado).

e- A grande maioria das EIs guarda alguma relação aproximativa entre alguns de

seus itens componentes e o significado da expressão, tornando-se de fácil

entendimento. No entanto, há EIs que não guardam relações entre seus itens

componentes e o significado idiomático das mesmas. Neste caso, retomando o

pensamento de Steen (1994) dizemos que expressões como “afogar as mágoas”

são metáforas convencionais, pois têm seus significados automaticamente ativados

na mente dos falantes.

f. Após esta análise, percebe-se que há uma possível gradiência entre os

significados das EIs. Essa gradiência, em alguns casos, não compromete o So

idiomático da EI, mas em outros, há alteração do So idiomático das lexias

complexas;

g. O sentido de uma EI é não-composicional. Isso é que justifica sua fixidez. No

entanto, em função de uma enunciação motivada, variações podem ser introduzidas

Page 109: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

109

e momentaneamente as EIs que sofreram variações se tornam composicionalmente

fracas, assumindo o caráter idiossincrático da língua;

h.Quando, após as modificações, não há comprometimento do significado, pode-se

dizer que a EI original funciona como uma matriz onde figuram diferentes tipos de

construções idiomáticas. Essas seriam construções derivadas;

i. Nesses casos, o valor pragmático da EI derivada se altera e/ou estiliza. Isso

funciona, a meu ver, como uma alternativa polissêmica para a EI original;

j Então, podemos assumir que há uma motivação interacional, a partir da qual os

sentidos são reiterados possibilitando a formação de novas formas, herdeiras de

formas anteriores. Essas ‘novas’ formas assumem uma composicionalidade fraca,

pois as mesmas mantêm uma estreita relação de significado com a EI original.

Quando isso não acontece, assumo que há uma composicionalidade forte. Podemos

ter, dessa forma, uma escala de gradiência – que vai da não-composicionalidade (EI

original), até a composicionalidade forte (outra manifestação lexical).Devido a essa

possibilidade de gradiência do significado de algumas EIs, tenho como objetivo

avaliar, em trabalho futuro, como os elementos se arranjam dentro de uma escala

([0] a [1]), sem dizer/supor que já exista uma escala prévia para tais significados;

k- Nesse sentido, a utilização de uma lógica que permita uma maior proximidade

com a mente humana e sua linguagem natural será, para tal estudo, de grande valia.

Em particular uma lógica que permita estados intermediários entre o significado

verdadeiro (EI original) e o menos verdadeiro (composicionalidade forte) das EIs. É

com esse pensamento que, pretendo analisar em que dimensão o significado das

EIs do português brasileiro se torna difuso, ou seja, tentarei esclarecer como o

falante o percebe e até que ponto se pode afirmar que um significado é cristalizado

na mente dos falantes.

l- Enfim, percebe-se através das análises que foram feitas que, o significado não

reside na forma, temos o poder de alcançá-lo por meio de grandes ‘redes’ que

envolvem vários aspectos de nosso conhecimento cultural e social. As EIs podem

ser vertidas segundo soluções contextualizadas e conforme a necessidade do

falante.

Page 110: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

110

5. considerações finais

Page 111: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

111

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Tem horas em que, de repente, o mundo vira pequenininho, mas noutro de repente ele já torna a ser demais de grande.A gente deve de esperar o terceiro pensamento.

Guimarães Rosa

Este trabalho de pesquisa iniciou-se na busca por compreender aspectos relativos

à natureza e à função das EIs no processamento discursivo. Essa problematização

partiu do pressuposto de que as EIs têm sido um fenômeno tipicamente estudado no

âmbito da lexicologia e da lexicografia ou apenas como itens lexicais isolados. A meu

ver, mais que uma preciosidade e/ou curiosidade lingüística, às EIs devem ser

compreendidas como uma manifestação lingüística que resulta de operações

cognitivas e, ao mesmo tempo, como um fenômeno que precisa ser observado na

dinâmica e complexa relação estabelecida entre os elementos que constituem o

processamento discursivo.

Nessa ótica, para que eu pudesse iniciar a minha análise e propor novas

abordagens sobre as EIs, construí um panorama que me permitiu visualizar algumas

lacunas existentes nos estudos acerca das lexias complexas do português brasileiro,

principalmente no que diz respeito a sua dimensão discursiva. Esse quadro

autenticou a hipótese de que as EIs necessitavam de uma nova interpretação no que

diz respeito aos seus aspectos sintático-semântico-discursivos.

A partir desse estudo, a operacionalização de EIs como um fenômeno ligado ao

processamento discursivo, pôde-se construir uma argumentação a favor dos

seguintes fundamentos:

� as EIs podem ser usadas como uma estratégia na construção da imagem do

“Eu” discursivo;

� as EIs traduzem hábitos verbais de maneira rápida e eficaz;

� O corpus que serviu de apoio à pesquisa forneceu marcas discursivas que

permitiram reconhecer e situar, dentro dos estudos gramaticais e enunciativos

as EIs, vendo-nas como um fenômeno que interfere na produção dos

Page 112: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

112

enunciados tomados em seu todo, em seu caráter multidimensional. Em outras

palavras, as EIs devem ser vistas como um fenômeno que permeia toda a

enunciação.

Acresce que, para validar empiricamente os aspectos supracitados, e por assumir

que na raiz deste trabalho estava a preocupação com a descrição do uso das EIs

como um fenômeno lingüístico de grande importância, o não tratamento sistemático

dessas expressões acarretava uma visão maquiada do uso da língua,

comprometendo diretamente alguns domínios da lingüística como, por exemplo, o

estudo do significado e todas as implicações que subjazem a ele.

Desse modo, para que eu pudesse avaliar as condições de significação das EIs do

português brasileiro, optei pela abordagem composicional de acordo com a qual os

significados das sentenças são vistos como dependentes dos significados de suas

partes componentes. Nos casos que foram analisados neste trabalho, tive como

objetivo principal propor uma abordagem alternativa para o princípio da

composicionalidade, abrindo mão do ‘conforto’ de uma visão convencional.

Não sem razão, optei por ‘deslocar’ os conceitos de opacidade e transparência

semânticas que se aplicam às partes componentes das sentenças, para os

significados das EIs vistos como um todo. Essa alternativa de conceber a

composicionalidade esteve apoiada em uma hipótese que remete a minha análise a

uma perspectiva teórica ligada à intenção e/ou à necessidade do falante.

Devido a todas as posições acima mencionadas e tendo como base o princípio da

composicionalidade, procedi à análise do corpus da seguinte maneira:

� Minha abordagem empírica teve como objetivo analisar alterações quanto à

forma lingüística das expressões. Tal análise se apoiou em uma suposição

sobre um uso não regular, bem como de variedades possíveis para as EIs;

� Com base nisso, admito, a título de hipótese, que há um investimento, por

parte dos falantes, nas substituições entre as palavras que compõem as EIs

em função de uma enunciação específica;

� Ao realizar as substituições, ad hoc, tornou-se possível propor uma medida de

composicionalidade semântica que passa por uma escala que vai da não-

Page 113: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

113

composicionalidade, passa pela composicionalidade fraca e vai até a

composicionalidade forte;

� Percebeu-se, também, que, embora as EIs tenham o significado cristalizado,

não se deve analisar a questão deste significado apenas através da análise

isolada e descontextualizada ou mesmo sem levar em consideração o

conhecimento e as intenções dos participantes do discurso.

� Ao analisar a questão da composicionalidade dos significados das EIs,

constatou-se que ‘novos’ significados podem ser atribuídos a uma expressão

fixa por meio de uma ‘rede’ de sentidos coerentemente construída em um

momento especial. Em adendo, pode-se postular que o falante utiliza recursos

extralingüísticos, tais como o contexto situacional, o conhecimento cultural e

compartilhado e as pistas pragmáticas, para atribuir um valor social às EIs em

contextos específicos.

Nesse sentido, é certo que a atribuição de sentidos é uma tarefa que requer algo

mais do que o conhecimento da estrutura da língua, visto que se constitui em um

acontecimento que abrange as condições de produção e o contexto que envolve cada

ato de enunciação. Em outras palavras, os sentidos das EIs não devem ser vistos

apenas como uma estrutura pronta (fixa), visto que os sentidos são ocorrências

históricas e, como tal, variáveis e inapreensíveis em sua totalidade. O falante tem o

poder de verter as EIs de acordo com suas necessidades revelando um efeito de

sentido ou uma estilização, visando buscar o resultado pretendido.

Como pudemos observar, as EIs apresentam aspectos sintático-semântico-

discursivos, que as fazem merecer um papel de destaque no centro dos estudos

lingüísticos, por formarem uma linguagem própria que manifesta satisfatoriamente o

caráter dialógico e interacional da linguagem humana.

É, portanto, dentro desse quadro de análise que julgo relevante pensar uma

proposta de extensão e de especificação destes fatos, numa investigação posterior.

Page 114: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

114

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

AMOSSY, R. (ORG.) Imagens de si no discurso: a construção do ethos. São Paulo: Contexto, 2005, p. 30-53. ARISTÓTELES. Arte retórica e Arte poética. São Paulo: Clássicos Garnier, 1959. BAKHTIN, M. (1953/1979) Os gêneros do discurso. In M. Bakhtin (1979) Estética da Criação Verbal, pp. 277-326. SP: Martins Fontes, 1992. BARTHES, R. Elementos de Semiologia. 2ª ed. São Paulo: Cultrix, 1977. pp.50-54. BENVENISTE, E. Problemas de lingüística geral I. Trad.: Maria da Glória Novak e Maria Luisa Neri. 4. ed. Campinas, SP: Pontes, 1995. BENVENISTE, E. Problemas de lingüística geral II. Trad.: Eduardo Guimarães.../et al./, Campinas, SP: Pontes, 1989.

BIDERMAN, M. T. Teoria lingüística. 2º ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p.169-178.

BRONCKART, J. P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999, p.24-30. CARVALHO, N. Publicidade. A linguagem da Sedução. São Paulo: Ática, 2000. CASCUDO, L. C. Coisas que o povo diz. Rio de Janeiro: Bloch, 1968.

CHAFE, W. L. Significado e Estrutura Lingüística. Trad. de Maria Helena de Moura Neves, Odette Gertrudes Luiza Altmann de Souza Campos e Sonia Veasey Rodrigues. Rio de Janeiro: Livros técnicos e científicos, 1979, p. 40-50.

CHARAUDEAU, P. Discurso Político. Trad. Fabiana Komesu e Dilson Ferreira da Cruz. São Paulo: Contexto, 2006, p.113-127.

DUCROT, O. O dizer e o dito. Rev. Tec. Trad. Eduardo Guimarães. Campinas(SP): Pontes, 1987 in CARDOSO, Marta. Editorial: construído ethos e situação enunciativa. In: Revista Inventário. 4. ed., jul/2005. Disponível no web world wide em: http://www.inventario.ufba.br/04/04mcardoso.htm.

GERALDI, J.W. Portos de Passagem. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995. 252 p.

Page 115: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

115

GROSS, M. Une Classification des phrases ‘figées’ en français. Revue Québecoise de Linguistique, 151-185. 1982.

GRZYBEK, P. Foundations of semiotic proverb study: The investigation of proverbs in their semiotic aspect is one of the most gratifying tasks for a folklorist. De Proverbio, v.1, n.1 1995.(O presente texto foi originalmente publicado na Alemanha como introdução ao Semiotische Studien zum Sprichwort - Simple Forms Reconsidered I (Grzybek, ed. 1984). Uma versão atualizada deste texto foi então publicada em inglês no Proverbium. An International Yearbook of Proverb Scholarship, v.4, p.39-85, 1987) URL http://www. deproverbio.com/DPjournal/DP,1,1,95/ GRZYBEK.html 4 de maio de 1998.

HOLANDA FERREIRA, A. B. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 1986. (versão eletrônica)

HOUAISS, A. e VILLAR, M. S. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001. (versão eletrônica) JACKENDOFF, R. The Architecture of the Language Faculty. Cambridge, Massachusetts: MIT Press. 1997. KOCH, I. G. V. Argumentação e Linguagem. São Paulo: Cortez, 2002. p.17-23. LAKOFF, G. & JOHNSON, M. (1980) Metaphors we live by. London: The University of Chicago Press.

MAINGUENEAU, D. Novas tendências em Análise do Discurso. 3ª ed. Campinas: Pontes / UNICAMP, 1997. p.70.

MARI, H. Os Sentidos do significado. In: Correio. Revista da Escola Brasileira de Psicanálise do Campo Freudiano, nº 18/19. Belo Horizonte, jan. 1998, p. 20-49.

MARI, H. A segundidade como formação conceitual (2º cap. tese de doutorado) “Entre o conhecer e o representar: para uma fundamentação das práticas semióticas e das práticas lingüísticas”. UFMG, 1998.

MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, Angela; MACHADO, Anna; BEZERRA, Maria Auxiliadora (Orgs.). Gêneros textuais & ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002. p. 19-36.

Page 116: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

116

MICHAELIS. Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, 1998. (versão eletrônica).

MIEDER, W. International Bibliography of new and reprinted proverb collections, 1994. De Proverbio, v.1, n.1, 1995. URL http://www. deproverbio.com/DPjournal/DP,1,195/bibc94.html em 4 de maio de 2006.

PÊCHEUX, M. Semântica e discurso. Uma crítica à afirmação do óbvio. 3ª ed.Campinas: Unicamp, 1997.

PERELMAN, C. Argumentação. Enciclopédia Einaudi. v. 11. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1987, p.234-265. PERELMAN, C. & OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado da Argumentação – A Nova Retórica. São Paulo: Martins fontes, 2002. PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS. Pró-Reitoria de Graduação. Sistema de Bibliotecas. Padrão PUC Minas de normalização: normas da ABNT para apresentação de trabalhos científicos, teses, dissertações e monografias. Belo Horizonte, 2006. Disponível em http://www.pucminas.br/biblioteca/

RONCOLATTO, E. A formação de imagens mentais e metáforas em uma análise das expressões idiomáticas do português e do espanhol. 2º cap. Tese de doutorado. UNESP/ASSIS, 2001.

STEEN, G. (1994) Understanding Metaphor in Literature: an empirical approach. New York, Longman Publishing, 263 p.

TAGNIN, S.O. Expressões idiomáticas e convencionais. São Paulo: Ática, Série Princípios, 1989, pp. 88.

XATARA, C. M. O campo minado das expressões idiomáticas. Alfa. São Paulo, 42 (nº especial): 147-159, 1998. XATARA, C.M. Tipologia das expressões idiomáticas. Alfa. São Paulo, 42:169-176, 1998. XATARA, C.M. O Resgate das expressões idiomáticas. Alfa. São Paulo, 39: 175-194, 1995. WILLIANS, E. Remarks on lexical knowledge. In: GLEITMAN, L. LANDAU,B. (Eds.) The acquisition of the lexicon. Cambridge, Mass. The MTT Press, 7-35.1994.

Page 117: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

117

ANEXO:

Apresento o corpus da minha pesquisa que se compõe de 168 (cento e sessenta e

oito) expressões idiomáticas (EIs) retiradas das edições semanais das revistas Veja e

Isto É. Essas expressões foram organizadas da seguinte forma:

� Apresento as EIs em ordem alfabética na primeira coluna;

� Na segunda coluna exponho os significados correspondentes que se

apresentam formatados em itálico, quando extraídos de dicionários61 e, sem grifo

especial, quando o significado é uma codificação pessoal;

� A terceira coluna se reserva à classificação tipológica das EIs;

� Tanto as EIs extraídas dos discursos publicitários quanto a dos

Enunciados Proferidos por Políticos (EPPs) serão expostas na tabela abaixo. A

coluna que se reserva ao contexto permite identificar a qual gênero a EI pertence.

� E, finalmente, na quarta coluna apresento a fonte da qual a EI foi retirada.

Expressão

Idioma-tica

Significado

Tipologia

Contexto

Fonte. (Revista, nº,

data, página).

01

Abanar moscas

Fazer algo superficialmente.

SV (V+N)

“Não é possível mudar abanando moscas. Tem de remover o lixo”. Aloizio Mercadante, senador, defendendo uma rígida investigação dentro do seu próprio partido, o PT, na questão do mensalão.

ISTO Ë nº 1870, 17/07/2005: 22.

02

Abrir mão

Desinteressar-se, ou abdicar-se de algo ou alguém.Mudar de idéia, ceder.

SV(V+N)

* “Para sua família ter uma educação com qualidade extra, você não precisa abrir mão do sabor. Produtos Extra”. ** “No final das contas, uma HP Laserjet é a impressora ideal para quem não abre mão de estar impecável”.

*VEJA, n.º21,29/05/2003:47. ** ISTO É, n.º1717,28/08/2002:17.

03

Abrir portas

Ampliar o número de estabelecimen-tos.

SV(V+N)

“É a rede bancaria que mais cresce no brasil. E vai crescer cada vez mais, porque o Banco Postal não pára de abrir portas”.

VEJA, nº29,23/07/2003: 35.

61

Os dicionários consultados foram: Novo Aurélio, Houaiss e Michaelis, todos em versão eletrônica.

Page 118: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

118

04

Abrir a mão

Gastar dinheiro

SV(V+art. +N)

“Pai é tudo igual: não abre a mão nem pra falar no telefone. Planos de tarifas do 21. O 21 tem sempre um plano adequado para você falar mais e pagar bem menos ainda. Embratel

VEJA, nº 42, 23/10/2002: 69.

05

Abrir os olhos

Estar atento

SV(V+art+N)

* “Cartuchos e toners falsificados comprometem a qualidade da impressão do seu trabalho. Abra os olhos. Cartuchos hp têm selo de garantia que muda de cor”. **“Unibanco. Quem enxerga longe investe aqui. Abra os olhos e comece a investir’”.

*ISTO É, nº1712, 24/07/2002: 18. ** VEJA, nº 22, 4/06/2003: 1.

06

Afogar as má-goas

Embebedar-se, extinguir, eliminar desgosto, amargura, tristeza.

SV(V+art+N)

“A cerveja fica para os Alemães afogarem as mágoas. Chandon Brasil. Vitória se comemora com Chandon. Parabéns Brasil”.

VEJA, nº26,09/07/2002: 51.

07

A perder de vista

Com enorme

prazo

Sadv(Prep+V+Prep+N)

“No Banco do Brasil tem crédito fácil para você fazer tudo ao mesmo tempo agora e pagar um pouquinho de cada vez a perder de vista /.../”.

VEJA, nº 3, 25/01/2006: 27.

08

Arrega-çar as man-gas

Trabalhar muito

SV(V+art+N)

“Com a Nestlé, você nunca erra. Afinal, ela já testou e aprovou tanto para a gente, que é só confiar. Quanto a minha parte, confesso que é mais divertida: eu arregaço as mangas e solto a imaginação”. “É por tudo isso que os maranhenses recebem orgulhosos, o investimento de mais de 1 bilhão e 200 milhões de dólares no novo polo siderúrgico, e arregaçam as mangas para assumir seus mais de 12 mil novos empregos. Governo do Maranhão”.

VEJA, nº 24,19/06/2001: 90. VEJA, nº 26 09/06/2003: 106 (ed. especial).

09

À risca

Com rigor/exatidão.

Sadv(prep+N)

“O presidente vem seguindo à risca o regime dele, inclusive está abstêmio há cerca de quarenta dias. Ele só toma Coca light e a gente tem de acompanha-lo”. Luiz Fernando Furlan, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; sobre a dieta que o presidente Lula vem fazendo.

VEJA, nº 6, 15/02/2006: 15.

10

a sete chaves

Muito bem guardado.

SAdv “Sua receita é guardada a sete chaves. Passa de mestre cervejeiro para mestre cervejeiro como segredo de família. Graças a esse cuidado, desde 1853

VEJA, nº 26,09/07/2001: 19.

Page 119: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

119

ninguém conseguiu imitar a Bohemia”.

11 Assinar embai-xo

Apoiar uma atitude ou decisão.

SV(V+adv) “Linha HT 22 da Helios Carbex. Se não fosse assim, a gente não assinava embaixo”.

VEJA, nº 22,

05/06/2001:

127.

12

A vaca vai pro brejo

Dar tudo errado SN(Art+N+V+adv)

“O PT ainda está muito em cima da crise política e tem de sair disso. Se não sair do córner, a vaca vai pro brejo”. Jorge Viana, governador do Acre (PT).

VEJA, nº2, 18/01/2006: 42.

13

Baixar a cabeça

Sentir-se

derrotado.

SV(V+art+N)

“Não vai ser a elite brasileira que vai fazer eu (sic) baixar a cabeça”. Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da Republica.

VEJA, nº31, 03/08/2005:52.

14

Bater boca

discutir

SV (V+N) “Não vou bater boca com empregadinho do presidente. Eu só quero debater com o patrão dele, sua majestade barbuda. Lula é um incompetente, pois manda seus ministros se comportarem como moleques” Heloísa Helena, respondendo às críticas de Tarso Genro.

VEJA, nº29, 26/07/2006: 52.

15

Bater de frente

Entrar em conflito com alguém.

SV(V+prep+adj)

“Olha com quem a concorrência bateu de frente. Pickup do Ano Ford 250”.

VEJA, nº 50,13/12/2000: 26.

16

Bem de vida

Estar em ótima situação financeira

SN (adj+ nome)

“Procuro homem bem de vida e de preferência médico, para matrimônio, morar com meus pais, filhos e 5 enteados. Escolher é o melhor é automático. Renault Scénic com câmbio automático grátis”.

VEJA, nº26, 09/07/2002: 17.

17

Bater o martelo

Decisão final

SV(V+art.+ N)

“Grande leilão de imóveis locados para agências. Este é pra bater o martelo. Grupo Santander Banespa”

ISTO É, nº1729,20/11/2002: 13.

18

Bater o olho

Olhar

repentinamente

SV(V+art+N)

“Os novos potes de Qualy estão mais bonitos e mais resistentes. Tem de tampa amarela que é só bater o olho para bater aquela vontade”.

VEJA, nº35,05/09/2002: última capa.

19

Braço direito

Auxiliar principal

e eficaz

SN (N+ adj)

“Ele é o braço direito da máfia”. Filhos da máfia. Alugue hoje. “Exame é seu braço direito na hora de tomar decisões e destacar-se na carreira”.

*ISTO É, nº 1756, 28/05/2003: 97. *ISTO É, n º 1757,04/06/2002: 58.

Page 120: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

120

20

Boa pinta

Pessoa com boa

aparência

SN(adj+N) “Vovô enxuto e boa pinta. Procuro ninfetinha sarada para relacionamento intenso e duradouro. Escolher o melhor é automático. Renault Scénic com câmbio automático grátis”.

VEJA, nº 27,09/07/2002: 17.

21

Cair como uma luva

Algo ou alguém que se encaixa perfeitamente em determinada situação.

SV(V+conj.+num. +N)

“O titan tractor caiu como uma luva para as nossas operações”.

VEJA, nº 18,07/05/2003: 47.

22

Cair do céu

Vir em boa

hora/algo fácil,

oportuno.

SV(V+prep+N)

*“Não é todo dia que 500 computadores caem do céu. Se você é assinante do ZAZ, já está concorrendo a 500 Pcs.”. **“Carequinha falante, fala em dinheiro assim como se fosse uma coisa que caísse do céu”. Roberto Jefferson, descrevendo o publicitário Marcos Valério aos parlamentares do Conselho.

*VEJA, nº 4, 26/01/2000: 153. **VEJA nº52, 28/12/2005:164.

23

Cair na boca do povo.

Tornar-se falado. Estar sendo muito comentado

SV(V+adv. +prep+N)

*“Sabe aquela história com a volkswagem que ninguém acreditava? Agora ela pode cair na boca do povo. Concurso nacional de contos “ meu caso com um volkswagem”. **“A história da Ypióca é a história do maior produtor de aguardente de origem do país e que está onde qualquer bebida deseja estar: na boca do povo”.

* ISTO É, 1740,12/02/2003: 29. ** VEJA, nº 18,07/05/2003: 113.

24 Cair o queixo

Ficar Surpreso

SV (V+adv)

“Novidades para deixar a concorrência de queixo caído. Motor show. Informação com emoção”.

ISTO É, 1715, 14/08/2002: 94.

25

Cair no conto do vigário

Ser enganado

SV(V+prep+N+ prep+N)

“A oposição não vai cair no conto da vigarice e não aceita a pecha de golpista. O Brasil não é a Venezuela de Hugo Chávez”. Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado.

VEJA, nº 26, 29/06/2005: 53.

26

Centrar fogo

mirar

SV(V+N)

“Centrei fogo no José Dirceu, centrei fogo no Luiz Gushiken. Hoje está vindo à baila a ação do ministro Pallocci. O núcleo duro sabia. Os três mosqueteiros do rei sabiam. Será que o rei não sabia?”. Roberto Jefferson, ex-deputado (PTB-RJ), dizendo que

VEJA, nº47,23/11/2005: 38.

Page 121: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

121

poupou Pallocci em suas denúncias para preservar a estabilidade econômica.

27

Céu de brigadeiro

Algo sereno que apresenta ótimas condições.

SN(N+prep+N)

“A Gol comunica que o seu plano de vôo tem céu de brigadeiro”.

VEJA, nº50, 15/12/2002: 34.

28

Chupando dedo.

Ficar sem ação/ sem alcançar o intento.

SV(V+V+ art.+ N)

“Agora o que era bom ficou melhor. Maxigarantia volkswagem. Você não fica chupando o dedo se o seu veículo der algum problema”.

VEJA, nº 24, 19/06/2002: 34.

29

Correr solto

Estar muito livre

SV(V+N)

“Não pode deixar a coisa correr solta. Folha de São Paulo. Folha 80 anos. Você por dentro da coisa”.

ISTO É, nº1774, 07/08/2002: 74-75.

30

Contar os minu-tos

Desejar que alguma situação acabe ou comece depressa.

SV(V+art+N)

“Plano parcelado American Express.Vai ter gente contando os minutos para aproveitar esta facilidade”.

VEJA, nº 18, 09/05/2001: 95.

31

Colocar a faca no pesco-ço

pressionar

SV(V+art+N+prep+N)

“O PT não pode ter aliados que o tempo todo estão colocando a faca no seu pescoço. Aliado que só apóia em troca de cargo não é aliado”. Luizianne Lins, prefeita eleita de Fortaleza.

VEJA nº 49, 08/12/2004: 38.

32

Colocar a mão no fogo

Demonstrar

confiança

SV (V+art+N+prep+N)

“Tirando a prefeitura de Porto Alegre, não boto a minha mão no fogo por nenhuma prefeitura do PT”. Roberto Jefferson, deputado federal (PTB-RJ), em discurso proferido momentos antes da cassação de seu mandato.

VEJA nº 38, 21/09/2005: 43.

33

Cortar na própria carne

Auto punição. SV (V+prep+adj+N)

“Cortaremos na própria carne, se necessário. (...) Quem tem culpa no cartório que pague o preço” Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República, tentando isolar o governo dos escândalos de corrupção.

VEJA nº 24, 15/06/2005: 48.

34

Dar asas a...

Deixar fluir sem restrições.

SV(V+N+ art.)

“A Vasp e a Vaspex desejam que neste natal você dê asas a todos os seus sonhos”.

ISTO É nº 1734,25/12/2002: 43.

Page 122: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

122

35

Dar duro

Trabalhar muito

SV(V+N)

“Tem gente que acha que você nasceu em berço de ouro. Eles não sabem como você deu duro pelo seu dinheiro. Sudameris”.

ISTO É nº 1745,12/03/ 2003: contra capa.

36

Dar um show

Apresentar-se excepcionalmen-te bem.

SV(V+num+N)

“Rivaldo deu um show de futebol arte. Ele mostrou o futebol e a Mizuno a arte’”.

VEJA, nº26, 09/07/2002: 61.

37

Dar rumo

Assumir o controle da situação.

SV(V+N)

“Ele (Lula) está muito encolhido. Gostaria de vê-lo mais ativo. O presidente, nessas horas, tem de dar o rumo”. Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da Republica.

VEJA, nº27, 06/07/2005: 46.

38

Dá uma força

Ajudar alguém

SV(V+num+N)

“Se a sua memória não é boa para números, a gente dá uma força. 31 Telemar 100% brasileira”.

VEJA, nº27, 09/07/2003: 29.

39

Dar a mão

Oferecer ajuda

SV(V+art+N)

“O pior de ficar boiando é que quanto mais você afunda, menos as pessoas te dão a mão. Leia Isto É dinheiro”.

ISTO E, nº 1712,24/07/2002: 53.

40

Dar a volta por cima

Recuperar-se

SV(V+art. +N +prep. + adj)

“Quem diria Brasil, que sua indústria textil daria a volta por cima e colocaria nossos tecidos na frança, berço da moda? Governo do Brasil. Ministério do desenvolvimento”.

VEJA nº 26, 09/07/2002: 37.

41

Dar água na boca

Despertar muita vontade

SV (V+N+adv)

*“O clube do bacalhau da Noruega, está com uma promoção de dar água na boca”. **“Sopas congeladas Sadia. Preparar é sopa. E dão água na boca e não na colher...”.

*VEJA, nº26,09/07/2002: 97. **VEJA, nº 28,17/07/2002: 21.

42

Dar ares de sua graça

Mostrar-se

presente

SV (V+N+prep+pron+N)

“Neste natal dê o ar de sua graça com aerogramas. São de vários modelos e você pode comprar diretamente do carteiro, por telefone, pela internet ou em qualquer agência dos correios. Escolha um e mande o seu”.

ISTO É, 1729, 20/11/2003: 82.

43 Dar conta do recado

Realizar uma atividade com sucesso.

SV(V+N+prep+N)

“Enquanto processadores menos potentes podem não dar conta do recado, o Processador Intel Pentium 4 foi especialmente construído para isso”

VEJA, nº13, 03/04/2001: 1.

Page 123: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

123

44 Dar os primei-ros passos

Iniciar uma atividade

SV(V+art+num+N)

“Quando entrou na Petrobrás, Heitor viu a empresa dar seus primeiros passos na exploração de petróleo no mar, ainda em águas rasas, no litoral de Sergipe

VEJA nº43,29/10/2003: 42

45 Dar rumo

Ter direção certa

SV(V+N) “Para dar rumo a sua comunicação regional, utilize um instrumento de confiança nacional. Veja especiais regionais”.

VEJA nº 22, 05/06/2003: 96.

46 Dar samba

Situação confusa

SV(V+N) “Esta promoção de carnaval vai dar samba. Intercontinental Rio”.

VEJA, nº 7, 20/02/2003: 24.

47 Dar sopa

Facilitar algo SV(V+N) “Terra plus. Mais vídeos e shows, mais músicas, mais games. Menos computador dando sopa”.

VEJA, nº 15,17/04/2002: última capa.

48 Dar um empur-rão

Incentivar

alguém.

SV(V+num+n)

“É uma longa subida, mas estamos dando um bom empurrão na ciência. Agilent Technologies”.

VEJA nº 10,13/03/2000: 4.

49

Dar um pulo

Maneira de pedir a alguém que compareça em algum lugar.

SV(V+num+N)

“Queriamos tirar fotos de alguns ganhadores da poupança da caixa, então pedimos para eles darem um pulinho no estúdio”.

VEJA, nº 7, 20/02/2001: 91

50

Dar um salto

Melhorar condições.

SV (V+num+ N)

*“Os investimentos cresceram e a confiança depositada deu um salto” **“Dê um salto na qualidade do seu trabalho multimídia. Pule para um Dell Dimension com processador Intel Pentium 4”.

*ISTO É, nº 261, 124/05/2003: 7. **VEJA, nº 35, 05/09/2002: 17.

51

Dar uma virada.

Mudar completamente uma situação.

SV(V+num+N)

“Eu vou aproveitar a virada do século para dar uma virada na minha vida. Niquitin. Mantém você calmo, no controle e sem fumar”.

VEJA, nº52, 27/12/2000: 5.

52

De ponta a ponta

Do início ao fim

SAdv(prep+N+ Prep+N)

*“Nova Ford caminhões, o melhor negócio de ponta a ponta”. **“Dell é o seu único ponto de contato e responsável pelo serviço de ponta a ponta. Dell líder mundial em Pcs”.

* VEJA, nº 42, 23/10/2002: 62-63. ** VEJA, nº35, 05/09/2002: 17.

53

De mãos

Apoiar alguém.

SN(prep+N+adv)

“Ao completar 50 anos, o jornal o dia reafirma o compromisso que sempre pautou as suas páginas desde a 1º

VEJA, nº20,23/05/2001: 142.

Page 124: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

124

dadas

edição: o de ser um veículo de mãos dadas com o leitor”.

54

De olhos fecha-dos

Ter plena

confiança

Sadv(prep+N+adj)

“Nos pontos onde você encontra esta faixa pode entrar de olhos fechados. Texaco”.

VEJA, nº9, 06/03/2001: 40.

55

De bem com a vida

Estar feliz.

SAdv.(prep+adj+conj+art+N)

“Transplante capilar. Fique de bem com a vida. Derm”.

VEJA, nº25, 25/06/2003: 30.

56

De salto alto

Mostrar-se arrogante/superior.

Sadv (prep+N+adj)

“Pesquisas têm de ser recebidas com humildade. Sandália da humildade para todo mundo. Já vi muita gente perder eleição porque colocou salto alto”. Geraldo Alckmin, governador paulista, comentando a pesquisa CNT/Sensus, que dá folgada vitória a Lula no segundo turno contra José Serra.

VEJA, nº7, 22/02/2006: 40.

57 Deitar e rolar

Aproveitar-se de alguma situação.

SV(V+conj+V)

“Deite e role na rede. O transglode com Processador Intel Celeron tem mais performance para navegar na internet:”.

VEJA nº 41, 16/10/2002: 9.

58

De boca aberta

Surpreender alguém.

Sadv (prep+N+adj)

“Os roteiros turísticos vão deixar você de boca aberta. E os gastronômicos, de boca aberta e fechada e aberta e fechada e aberta e fechada”. Veja. O melhor do Brasil. Guia 2006.

VEJA, nº52, 28/12/2005: 160.

59

Deixar para os 45’ do 2º tempo

Deixar para a última hora

SV(V+prep+art+num+prep+num+N)

“Participe logo da promoção LG. Não deixe para os 45’do 2º tempo”.

VEJA, nº6, 15/02/2006: 10.

60

Dizer lorota

Conversa fiada, mentirosa.

SV (V+N) “Essa história de punição é lorota”. Virgílio Guimarães, candidato dissidente do PT à presidência da Câmara dos Deputados, ironizando as ameaças de punição pela direção do partido.

VEJA, nº7, 16/02/2005: 36.

61

Difícil de engolir

inaceitável SN(adj+prep+V)

“Tá difícil de engolir a programação da sua TV? Assine HBO. O melhor canal de filmes do mundo”.

ISTO É, nº 1714,07/08/2002: 99.

62

Em primei-ra mão

Ser o primeiro a realizar algo

SAdv.(prep. +num+N)

“Venha fazer o test-drive em primeira mão. Não é um carro. É Airtrek Mitsubishi motors.”.

VEJA, nº25,25/06/2003: 37.

63

Entrar pelas

Receber ajuda

SV (V+ prep+N

“Foi um péssimo negócio entrar na política pelas mãos de Paulo Maluf. Isso

ISTO É nº1874,

Page 125: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

125

mãos de alguém.

+prep+Pronome)

custou o meu casamento”. Celso Pitta, ex-prefeito de São Paulo, sobre a sua separação de Nicéa Camargo

14/09/2005: 22.

64

Enxu-gar os preços

Reduzir o valor das mercadorias.

SV(V+art+N)

“No lugar de reduzir a quantidade de tinta, enxugamos os preços. Cartuchos ink Jet compatíveis. 100% novos e lacrados”

VEJA, nº 7,20/02/2003: 83.

65

É pra ontem

Diz-se quando se tem urgência

SV(V+prep+adv)

“Sedex 10. A solução do ‘é pra ontem’do seu chefe”.

VEJA, nº38,26/09/2001: 7.

66

Está em suas mãos.

Estar dependente.

SV(V+prep+pron. +N)

“O futuro do planeta está em suas mãos. Ecolatina. 5ª conferência Latino-Americana sobre o meio Ambiente”.

ISTO É, 1720, 18/09/2002: contra capa.

67

Está em boas mãos

Ser bem

orientado

SV(V+prep+adj+N)

“Quem investe na Petrobrás, sabe que o dinheiro está em boas mãos”

VEJA, nº 26, ed. especial, ano 36, 09/ 2003.:81.

68 Está na mira

Ser observado SV(V+prep.+N)

“Você está na mira. Lasik Excimer Laser o mais avançado Laser para correção de Miopia, Astigmatismo e Hipermetropia”.

VEJA, nº 20,02/11/2000: 19.

69

Estar a um passo

Estar próximo a realizar algo.

SV(V+art+num+N)

“Cada dia mais e mais brasileiros estão a um passo do próprio telefone. Embratel”.

VEJA, nº50,13/12/2000: 172.

70

Estar na cara

Evidenciar algo

SV(V+Prep +N)

“Neste natal dê o ar de sua graça com aerogramas. São de vários modelos e você pode comprar diretamente do carteiro, por telefone, pela internet ou em qualquer agência dos correios. Escolha um e mande o seu”.Tá na cara que todo mundo vai gostar”.

ISTO É, 1729,20/11/2003: 82.

71

Estar na mesa

Estar a vista de

todos

SV (V+prep+ N)

“Está na mesa o deputado Ciro Nogueira, que hoje será sacramentado pelo presidente da República, porque, se o presidente não assinar sua indicação, amanha o PP poderá ser o aliado do PFL”. Severino Cavalcanti, presidente da Câmara dos Deputados, no domingo, em Curitiba, encostando o governo contra a parede para que seu candidato fosse indicado.

VEJA, nº13, 30/03/2005: 38.

Page 126: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

126

72

Falar sua língua

Diz-se quando há um bom entendimento entre duas pessoas.

SV (V+pron+N)

“Meu dinheiro. Onde o dinheiro fala sua língua. Meu dinheiro. Guia financeiro”.

VEJA, nº 18,09/05/2002: 117.

73 Fazer história

Tornar-se marcante

SV(V+N) “Mas já fizemos história no transporte aéreo. Gol linhas aéreas inteligentes”.

VEJA, nº 39, 01/10/2003: 3.

74

Feijão com arroz

Algo comum, corriqueiro.

SN(N+conj+N)

“Cartão Renda Cidadã: o cartão mais feijão com arroz que existe”.

VEJA, nº 15,17/04/2002: 101.

75

Ficar boian-do

Não entender determinada situação.

SV(V+N) “Se você não quer ficar boiando. Leia Isto É dinheiro”. “O pior de ficar boiando é que quanto mais você afunda menos as pessoas te dão a mão”.

* ISTO É, nº 1684, 09/01/2002: 32. * ISTO É, nº1712, 24/07/2002: 53.

76 Ficar ligado

Estar atento SV (V+adj)

“Dicionário da TV Globo. Fique ligado, compre já o seu”.

VEJA, nº 29,23/07/2003: 89.

77

Ficar no verme-lho.

Ficar sem dinheiro

S(V+prep+adj)

“Com a Fininvest, nem o Papai Noel fica no vermelho”.

VEJA, nº 52, 27/12/2000: 115.

78

Ficar por cima

Estar em boas

condições

SV(V+ prep+adj)

“Fique por cima. Faça Unicor vestibular 2004.”.

VEJA, nº41, 15/10/. 2003. (não tem nº pag.)

79

Ficar por dentro

Inteirar-se sobre determinado assunto.

SV(V+ prep.+ adj.)

“Leia Isto É dinheiro, e fique por dentro das mais importantes notícias e tendências da economia e-business, finanças e negócios”. “Fique por dentro do mercado de trabalho. Guia do estudante 2001”.

* ISTO É, 1729, 20/11/2002: 57. * VEJA, nº 15, 17/04/2001: 128.

80

Ficar sem pala-vras

Admirar-se.

SV(V+ prep.+N)

“Diante dele, muitos ficam sem palavras. Por isso o nome é um número. Peugeot 307”.

VEJA, nº 23,12/06/2002: 38.

81

Ficar só no papel

Algo que não se concretiza

SV (V+adv+prep+N)

“Sem aço o mundo fica só no papel. CST-líder mundial na produção de aço”

VEJA nº 42,23/10/2002: 79.

Page 127: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

127

82

Ganhar o mundo

Viajar por vários

países

SV (V+art+ N)

“Prepare-se para ganhar o mundo. Cursos no exterior. Editora abril. Já nas bancas”.

VEJA, nº 21, 29/05/2003: 28.

83

História de pesca-dor

História exagerada, mentirosa.

SN (N+prep. +N)

“Para preservar o mar e quem depende dele, a Shell foi ouvir algumas histórias de pescador”.

VEJA nº 17,01/05/2002: 84.

84

Ir a luta

Tentar alcançar seus objetivos

SV (V+art. +N)

“Fiat Stilo vai a luta e enfrenta seus adversários”

ISTO É, 1720,18/09/ 2002: 14.

85

Invadir a área

Entrar sem permissão.

SV (V+art+N)

VARIG. Agora com 3 vôos diretos para Munique. É como nos gramados: os brasileiros invadindo a área sem parar.

VEJA, nº 4, 01/02/2006. última capa

86 Ir longe progredir SV (V+adj)

“O Banco Postal está indo longe. Pergunte para quem estava longe de abrir uma conta”.

VEJA, nº 29, 23/07/2003: 34.

87

Ir para o pare-dão

Ser julgado

SV (V+prep+art+n)

“Ainda bem que o governo Lula está dando errado. Se desse certo, iríamos todos para o paredão”. Geddel Vieira Lima, deputado federal (PMDB-BA), comentando a decisão do governo de expulsar o correspondente Larry Rohter, do jornal The New York Times (maio).

VEJA, nº51, 22/12/2004: 38.

88

Jogo de cintura

Ter flexibilidade na solução de problemas ou situações difíceis.

SN (N+ prep+N)

“Se você precisa de uma máquina fotográfica com jogo de cintura. Escolha a Olympus Trip”.

VEJA nº 10, 13/03/2000: 70.

89

Levar a melhor

Sair-se melhor que os concorrentes

SV (V+art. +adj. )

“O Astra leva a melhor em desempenho” “Citroen C3 leva a melhor em confronto com Volkswagem Polo”.

*VEJA, nº 2, 15/01/2003: contra capa.

90

Levar em conta

Considerar algo

SV (V+prep.+N)

“... outro fator que levamos em conta, foi à vasta rede de concessionárias Volkswagem. Cesa logística. Mais uma empresa que optou por caminhões sob medida Volkswagem”.

VEJA, nº 22, 05/06/2003: 85.

91

Levan-tar a bandei- ra

Defender uma causa

SV (V+art+ N)

“É inacreditável que o presidente da República ainda tenha coragem de levantar a bandeira da ética e seja capaz de ignorar que seu período de governo é tido como o mais antiético e

VEJA, nº8, 01/03/2006: 34.

Page 128: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

128

corrupto da história do Brasil”. Antônio Carlos Magalhães, senador (PFL-BA)

92 Levar cacete

Ser recriminado SV (V+N)

“Queremos que vocês nos ajudem porque tenho levado cacete”. Severino Cavalcanti, presidente da Câmara dos Deputados, pedindo o apoio de empresários e sindicalistas, reunidos em evento na Câmara contra a MP 232.

VEJA, nº14, 06/04/2005: 43.

93

Máquina de fazer dinheiro

Negócio rentável, lucrativo.

SN (N+prep.+ V+N)

“Máquina de fazer dinheiro e café expresso. Italian coffee. Locação e venda”.

VEJA nº42, 23/10/2002: 66.

94

Maqui-na de dizer boba-gem

Pessoa que só fala Coisas insignificantes.

SN (N+prep+V+N)

“Lula é uma máquina de dizer bobagem”. José Thomaz Nonô, deputado federal (PFL-AL).

VEJA, nº18, 04/05/2005:46.

95

Marcar época

Tornar-se inesquecível em determinado período

SV (V+N)

“A Shell marcou época. Shell, 90 anos no Brasil”.

VEJA nº32,13/08/2003: 55.

96

Mergu-lhar de cabeça

Não ter cautela

SV (V+prep+N)

“HTH. A confiança da marca líder em produtos para o tratamento da água de piscinas no mundo inteiro. Não arrisque a saúde da sua família mergulhando de cabeça, em tudo o que aparece por aí”.

VEJA, nº 41, 15/10/2003:29.

97

Meter a mão

Cobrar com exagero.

SV (V+art+N)

“Na hora da revisão, andam metendo a mão no seu bolso? Só a Peugeot tem pacotes de peças e revisões com preços fixos”

VEJA, nº15,17/04/2001: 116..

98

Mostrar a cara

Aparecer em público

SV(V+art+N)

*“Nós mostramos a cara do Brasil” Brasmarket. Análise e investigação de mercado **“Vou ao plenário mostrar a cara senão vão dizer que estou morto”. Antonio Carlos Magalhães, senador (PFL-BA),chegando ao Senado, depois de passar o fim de semana internado num hospital de Salvador.

*VEJA nº 43,29/10/2003: 75. **VEJA, nº46, 17/11/2004: 42.

99

Mover uma palha

Não fazer coisa alguma, ser preguiçoso, não ajudar ninguém.

SV (V+num+N)

“Meus adversários podem fazer quantas denúncias quiserem. Eu não moverei uma palha, porque sei que vocês moverão o paiol inteiro contra eles”.

VEJA, nº34, 30/08/2006: 54.

Page 129: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

129

O presidente Lula, que não quer botar fogo no palheiro da campanha para não explodir o paiol da reeleição

100 Mudar a cara.

Modificar-se SV (V+art+N)

“/.../ esses alunos estão capacitados a se tornarem verdadeiros empreendedores, e isso é o reconhecimento de um projeto moderno que está mudando a cara do ensino superior no Brasil. Faculdade Trevisan”.

ISTO É nº 09, 07/03/2003: 35

101

Mudar de ares.

Mudar de ambiente

SV (V+prep+N)

“Tem horas em que você quer trocar de carro, tem horas em que você quer mudar de ares”.

VEJA, nº 26,02/07/2003: 90.

102

62

Não deixar na mão

Ser abandonado

SV (V+prep+ Art+N)

“... o Honda civic não deixa você na mão e tem um atendimento pós-venda diferenciado”.

ISTO É nº 202, 01/04/2002: 18.

103

Não sair do pé.

Diz-se de pessoa pegajosa.

SV (V+prep+ Art+N)

“Calçados Freeway: uma tática infalível para ele não sair do seu pé”.

VEJA nº20,23/05/2002: 17.

104

63

Não sobrar pedra sobre pedra

Estar tudo destruído.

SV (Adv+V+N+prep+N)

“Você pega os jornais e não sobra pedra sobre pedra no cenário político, pinta um clima de fim de feira moral, de desesperança, de indignação, de salve-se-quem-puder, tudo ao mesmo tempo”. Ricardo Kotscho, ex-secretário de Imprensa da Presidência e amigo do presidente Lula.

VEJA, nº 22, 01/06/2005: 47.

105

Nascer em berço de ouro

Nascer em família de alto poder aquisitivo

SV(V+prep+N+prep+ adj)

“Tem gente que acha que você nasceu em berço de ouro. Eles não sabem como você deu duro pelo seu dinheiro. Sudameris”.

ISTO É, 1745, 12/03/2003: contra capa.

106

Nego-cio da China

Negócio lucrativo, vantajoso.

SN (N+prep+ N)

*“Todos deveríamos saber que os negócios com a China são cheios de malicias. Não há negócio da china daqui para lá. Há negócio da China de lá para cá”. Delfim Netto, deputado federal (PP-SP), sobre o embargo chinês à soja brasileira, no UOL, Notícias. **“Negócio da china. Você ganha

*VEJA nº25, 23/06/2004: 36.

62 As EIs de números 102 e 103 podem ser classificadas como SV pela possibilidade de uso na afirmativa. 63 Esta EI pode ser classificada como um SV com uma negação precedente.

Page 130: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

130

quando compra, quando usa e quando vende. Promoção Volkswagem”.

**VEJA nº 20,23/05/2001: 33.

107

Nem que a vaca tussa

De maneira alguma

SF (Conj+Art+N+V)

“Não fico no cargo nem que a vaca tussa”. Roberto Rodrigues, ministro da agricultura sobre uma atual reeleição de Lula.

ISTO É, nº 1909. 24/05/2003: 22.

108

Olhar para frente

Almejar um bom futuro

SV (V+prep. +adv)

“Aos 60 anos, a gente percebe que a vida pode ser muito mais simples e adquire a virtude de olhar para frente. Mercantil do Brasil. 60 anos”.

VEJA, n.º21,28/05/2003:28.

109

Para dar e vender

Possuir algo em abundância.

SN (prep+V+V)

“Seat Cordoba com bônus de R$3.000. Emoção para dar e vender...”

VEJA, nº 27,15/07/2001: 60.

110

Pão duro

Diz-se de pessoa avarenta

SN (N+adj)

*“Como dizem que sou pão duro, estou tentando fazer uma economiazinha. Embratel”. **“O Serra abria a geladeira na minha casa em Brasília e dizia: ‘Isto aqui é uma natureza-morta’. Hoje sou menos pão-duro”. Fernando Henrique Cardoso, idem.

*VEJA, nº16,24/04/2000: 122. **VEJA nº30, 02/08/2006: 41.

111

Parar no tempo

Diz-se de alguém que não progride

SV (V+prep+N)

“Tecnologia para pais que não param no tempo. No dia dos pais, dê um transglode baseado no Bradesco Intel Celeron ”.

VEJA, nº 31,06/08/2003: 10.

112

Passar em branco

Deixar que algo ou alguém, seja esquecido.

SV (V+prep+adj)

“Claro que não poderia passar em branco, e por isso mesmo a volkswagem está lançando uma edição comemorativa do Gol”.

VEJA, nº 50,13/12/2000: 33.

113

Pé direito

Diz-se quando se tem sorte.

SN (N+adj)

“Com o pé direito. Chegou Palio Citymatic, o primeiro 1.0 sem pedal de embreagem”.

VEJA, nº 1, 05/01/2000: 67.

114

Pé frio Pessoa azarenta, sem sorte.

SN (N+adj)

“Montanha não é lugar de pé frio. Timberland. 100% à prova de àgua”.

VEJA, nº 22, 05/06/2003: 89.

115

Pegar a estrada

viajar

SV (V+art+N)

“Pegue este guia antes de pegar a estrada. Guia quatro rodas 2003”.

VEJA nº 7, 20/02/2003: 24.

116

Pegar pesado

Ultrapassar os limites

SV (V+N)

. Frontier Titanium. Era só para fazer uma série especial, mas, de novo a Nissan pegou pesado”.

VEJA, nº 43, 30/10/2002: 48..

117

Pensar duas

SV (V+ +adv)

“Fernando Henrique é movido pelo rancor e pela inveja. Ele deveria pensar

VEJA, nº6, 15/02/2006:

Page 131: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

131

vezes Agir com cautela duas vezes antes de falar. Os padrões éticos no governo dele não resistem a uma comparação, se o critério for o grau de lesão aos cofres públicos”. Ciro Gomes, ministro da Integração Nacional, sobre afirmação de FHC de que a ética do PT é roubar.

38.

118

Pensar grande

Ter ambição. SV (V+adj)

“Pense grande. Abra a conta de sua empresa no Unibanco”.

VEJA nº 41,16/10/2002: 4.

119

Pôr no papel.

Concretizar algo.Firmar compromisso, contrato.

SV (V+prep+N)

“Você sempre teve idéias sobre Dutos. Só faltava colocar no papel.Conheça os vencedores do 3º prêmio Petrobrás de tecnologia de Dutos”

*VEJA nº23,12/06/2001: 152.

120

Pular a cerca

Ser infiel

SV V+art+N)

“Uma pequena adaptação no nosso grito de guerra para você que continua fiel à outra cerveja: pule a cerca, pule a cerca. Nova Schin”.

Veja, nº43, 29/10/2003: 60. cad. especial

121

Puxar a barba do bode

Provocar confusão.

SV (V+art+N+prep+N)

“Não estamos puxando a barba do bode. Temos de puxar a barba do bode para mostrar onde está o DNA da corrupção”. Roberto Jefferson, deputado federal (PTB-RJ), em discurso proferido momentos antes da cassação de seu mandato

VEJA, nº 38, 21/09/05: 43.

122

Pra chuchu

Em grande quantidade ou intensidade

SN (prep+adj)

“O Brasil vai crescer pra chuchu, nós vamos ter emprego pra chuchu, e vai ser um governo que é um chuchuzinho”. Geraldo Alckimin, governador de São Paulo, que para a campanha à sucessão de Lula pretende capitalizar o legume – isso se o tucanato não passar a serra no chuchuzeiro

VEJA, nº8, 01/03/2006: 34.

123

Prínci-pe encan-tado.

Homem ideal, perfeito.

SN (N+adj)

“E no meio de tanto romance, está sempre procurando seu príncipe encantado. Não perca a estréia de Miss Match. Para comemorar os 10 anos da Fox”.

VEJA, nº 39, 01/10/2003: 21.

124

Que-brar a cara

Decepcionar-se

SV(V+art+N)

“Quem estiver torcendo para o fracasso do Brasil vai quebrar a cara”. Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República voltando do Oriente.

VEJA, nº23, 08/06/2005: 42.

125

Querer o pesco-ço

Perseguir.

SV (V+art+N.)

“Querem o pescoço de Saddam, peguem. Não tenho medo da execução. Você responderá por seus atos quando a revolução vier”. Saddam Hussein, desafiando o tribunal

VEJA, nº50, 14/12/2005: 42.

Page 132: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

132

durante seu julgamento e ameaçando o juiz.

126

Quei-mar dinhei-ro

Gastar sem controle/ esbanjar

SV(V+N) Quem compra isqueiro falsificado está queimando dinheiro. E se bobear queima a mão também. Isqueiros Bic

VEJA nº 45, 12/11/2003: 29

127

Rece-ber de braços abertos

Receber alguém com muita satisfação

SV(V+prep.+N+adj)

“O Banco Real convida a todos a receber de braços abertos um dos nossos cartões postais mais queridos”.

VEJA, nº 5, 02/02/2003: 11.

128

Rece-ber uma facada

Ser traído.

SV (V+adv)

“Foi como se ele recebesse uma facada. O presidente chorou, se levantou, me deu um abraço e me mandou embora, vi um inocente desabar, um homem de bem, simples, correto, que se sentiu traído”. Roberto Jefferson, contando qual teria sido a reação de Lula depois de Jefferson lhe relatar o funcionamento do esquema do mensalão (junho).

VEJA nº52, 28/12/2005: 165.

129

Roubar a cena .

Destacar-se SV(V+art+N)

“Talentos Brilhantes. Crianças sem nenhuma experiência surpreendem e roubam a cena, portanto, todos terão uma chance real de ingressar na carreira artística”.

VEJA, nº 28,17/06/2002: 26.

130

Roer o osso

Ficar com a pior parte

SV(V+ art+N)

“Agora que o Brasil está preparadinho, ajeitadinho, eles querem comer o filé que colocamos na mesa. Não, vão ter de roer o osso, primeiro’”. O presidente Lula, falando da oposição.

VEJA, nº30, 02/08/2006: 41.

131

Sair do papel

Concretizar algo SV(V+prep+N)

Promoção a Abril banca seu sonho: a casa e o carro dos seus sonhos vão sair do papel. Editora Abril

Veja nº 42, 22/10/2003: capa.

132

Sanguequente

Diz-se de pessoa que se irrita facilmente.

SN(N+adj) “Novo SEAT cordoba Vario. A marca dos europeus de sangue quente”

VEJA, nº1, 05/01/2000: 78.

133

Sair do córner

Parar de se esconder

SV (V+prep+ N)

“O PT ainda está muito em cima da crise política e tem de sair disso. Se não sair do córner, a vaca vai pro brejo”. Jorge Viana, governador do Acre (PT).

VEJA nº 2, 18/01/2006: 48.

134

Sandá-lia da humi-ldade

Ser/mostrar-se humilde

SN(N+prep+adj)

*“Pesquisas têm de ser recebidas com humildade. Sandália da humildade para todo mundo. Já vi muita gente perder eleição porque colocou salto alto”.

VEJA nº7, 22/02/2006: 40.

Page 133: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

133

** “Política é convencimento. É amor ao próximo. Vou até o fim com as sandálias da humildade” *Geraldo Alckmin, governador paulista, comentando a pesquisa CNT/Sensus, que dá folgada vitória a Lula no segundo turno contra José Serra. **Geraldo Alckmim, candidato tucano a papa.

135

Ser fogo

Ser difícil/complicado/trabalhoso/ complexo

SV(V+N) Os verdadeiros isqueiros Bic vêm com selo do Inmetro que garante sua origem e qualidade. Isqueiro falsificado é fogo. Não caia nessa armadilha. Isqueiros Bic.

VEJA nº 45,12/11/2003: 30.

136

Ser o palco

Lugar que será sede de grandes eventos.

SV(V+art+N)

“Blumenau se prepara para ser o palco da maior festa Alemã do Brasil. Oktoberfest 2002”.

VEJA, nº 38,26/09/2002: 70.

137

Ser sopa

Considerar algo muito fácil.

SV(V+N) “Sopas congeladas Sadia. Preparar é sopa”

VEJA, nº28,17/07/2002: 21.

138

Ser uma caixa de surpre-sas.

Diz-se de algo ou alguém que vive surpreendendo os outros

SV (V+num+N+prep+N)

“O computador é uma caixinha de surpresas. Só tem quem tem Uol”

VEJA, nº 26,02/07/2002: 82.

139

Ser uma mão na roda

Algo que facilita

SV(V+num.+N+prep+N)

“Chegou o novo Automania Serviço. É uma mão na roda”.

ISTO É, nº 1712,24/07/2002: 51.

140

Sentar o sarrafo * O mesmo que descer a lenha.

Ser surrado derrotado

SV (V+art+ N)

“Vamos sentar o sarrafo no Garotinho” Orestes Quércia, ex-governador de São Paulo, apostando tudo na derrota de ex-governador fluminense nas prévias do PMDB.

VEJA, nº8, 01/03/2006: 34.

141

Ser do mesmo time.

Ter os mesmos objetivos.

SV(V+ prep+adj+N)

“Dirceu entregou o Lula. Aliás, não tem feito outra coisa. Já disse que Delúbio não era do time dele. De quem é? Agora, não nega que o PT se comprometeu com os 20 milhões de reais do PTB. Mais que uma entrevista, foi uma delação não premiada”

VEJA, nº 40, 05/10/2005: 46.

Page 134: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

134

César Maia, prefeito do Rio, sobre a entrevista de José Dirceu (PT) à Folha de S. Paulo

142

Ser dono da bola

Ter controle sobre determinada situação.

SV(V+N+prep+N)

“Eles são donos do campo, da bola e das camisas. Estão levando o time para a segunda divisão. Ainda assim, querem escolher o juiz”. Geraldo Magela, membro do PT do Distrito Federal, sobre as pressões dos atuais caciques do anarcossindicalismo para continuar controlando o partido.

VEJA, nº36, 07/09/2005: 49.

143

Ser olho no olho

Demonstrar confiança

SV (V+N+ prep+N)

“Política é olho no olho. Como se diz no Brasil é no tête-à-tête”. Lula, presidente da Republica, ao ser batizado como chefe de tribo em sua visita a Gana, na África. Esbanjando seu francês.

VEJA, nº 16, 20/04/2005: 48.

144

Ser pombo-correio

Ser alguém que traz e leva notícias

SV (V+N+ adj)

“Desde agosto de 2003, é voz corrente em cada canto desta Casa que o senhor Delúbio, com o conhecimento do senhor José Genoíno, tendo como pombo-correio o senhor Marcos Valério (...), repassa dinheiro a partidos que compõem a base de sustentação do governo, num negócio chamado mensalão”. Roberto Jefferson, em seu primeiro depoimento ao conselho de Ética (junho).

VEJA nº52, 28/12/2005: 164.

145

Suar a camisa

Trabalhar muito

SV(V+art+N)

“Muita gente suou a camisa, o jaleco, e o macacão, para atingir este impressionante marco na história da Daimler Chrysler do Brasil”.

VEJA, nº39,01/10/2003: última capa.

146 Subir na vida

Melhorar condições financeiras

SV(V+prep+N)

“Desafie a lei da gravidade: suba na vida. Vestibular UNA 2003”.

VEJA, nº38,26/09/2002: 63.

147 Ter os pés no chão

Ser realista SV (V+art+ adv)

*“No Instituto da criança, o ensino é super pé no chão”. **“Tenha os pés no chão. Timberland. For the jouney”.

* VEJA, nº3, 23/01/2003:51. **VEJA, nº24,19/06/2002: 48.

Page 135: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

135

148

Ter a cabeça nas nuvens

Ser sonhador

SV(V+art. +N+ prep.+adv.)

“Tenha a cabeça nas nuvens e os pés no chão. Timberland for the jouney”.

VEJA, nº 24, 19/06/2002: 9.

149

Ter culpa no cartório

Ser culpado

Sv(V+N+prep+N)

“Cortaremos na própria carne, se necessário. (...) Quem tem culpa no cartório que pague o preço” Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República, tentando isolar o governo dos escândalos de corrupção.

VEJA, nº24, 15/06/2005: 48.

150

Tirar a prova

Confirmar

SV (V+art+N)

“O Gol mostrou para o mundo inteiro que é mesmo o mais resistente e confiável que existe. Coisa que todo mundo já sabia, mas que a FIA fez questão de tirar a prova”.

VEJA, nº3, 23/01/2003: 67.

151

Tirar a roupa do rei

Mostrar-se verdadeiro

SV (V+art+N+prep+N)

“Tirei a roupa do rei. Mostrei ao Brasil o que é o governo Lula, mostrei ao Brasil o que é o Campo Majoritário do PT”. Roberto Jefferson, em sua defesa no plenário, antes de ter o mandato cassado (setembro).

VEJA nº52, 28/12/2005 :16.

152

Tirar casquinha

Tirar proveito de algo ou alguém

SV(V+N) “A gripe não vai mais tirar casquinha do seu verão. Use Cebion”

VEJA, nº4,26/01/2000: 159.

153

Tirar sarro

Debochar de algo ou alguém

SV(V+N) “Kaiser bock, Euclides e a comida da Fernanda. O Euclides era um namorado atencioso com a Fernanda, mas tinha um defeito: tirava sarro da comida dela...”.

VEJA, nº23,12/06/2002: 58.

154

Tomar umas e outras

Consumir bebida alcoólica

SV(V+ “Não acho que o Lula seja diferente de um líder sindical normal do Brasil, desse ponto de vista de tomar umas e outras” Fernando Henrique Cardoso, em entrevista a Playboy.

VEJA, nº30, 02/08/2006: 41.

155

Vai ver se eu tô na esqui-na!

Deixe-me em paz.

Sintagma frasal

“Depois da saideira, vai ver se eu tô na esquina. Beber redondo é beber com responsabilidade. Skol”.

VEJA nº26, 26/09/2003: 58.

156

Vaca de presé-pio

Não ter opinião própria, deixar-se levar pela ocasião.

SN (N+prep+N)

* “Embora a gente esteja perto do natal, o PT não pode se comportar como vaca de presépio”. ** “Vaca de presépio? O PT está mais é para raposa no galinheiro”. *Marco Aurélio Garcia, assessor

VEJA nº51, 21/12/2005: 42.

Page 136: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

136

especial para assuntos internacionais da presidência da república, comentando a critica aberta do PT à política econômica do próprio governo. **Antonio Carlos Pannunzio, deputado federal (PSDB-SP

157

Vá pentear maca-cos!

Ir para longe, afastar-se para deixar de importunar.

Sintagma

frasal

“Ela que vá pentear macacos!”. Hugo Chávez, presidente da Venezuela, sobre a organização Internacional do trabalho, que definiu como greve geral uma greve de petroleiros ocorrida em 2002

ISTO É nº 1800, 07/04/2004: 22.

158

Valer ouro

Ter grande valor, de ótimas qualidades.

SV(V+N)

*“Ïnformação que vale ouro”. Jornal do comércio. **“Criatividade vale ouro". 14º festival de Gramado. Fórum mundial de publicidade.

*ISTO É, nº 1756,28/05/2003: 83. **ISTO É, nº1757,04/06/2002: 58.

159

Ver estre-las

Sentir muita dor

SV (V+N)

“Até agora estou vendo estrelas, graças à virulência do médico. Se fazem isso com um deputado, imagine com um sem-terra ou um desempregado. Eu me senti deflorado”. Manoel Izidório de Santana, deputado estadual (PT-BA), em discurso na tribuna da Assembléia Legislativa da Bahia contra o toque retal no exame de próstata a que se submetera pela manha.

VEJA nº 14, 06/04/2005: 43.

160 Vestir a camisa

Dedicar-se integralmente.

SV(V+art+N)

“Curso In company-Educação Executiva. O único que veste a camisa da sua empresa. Instituto Trevisan”.

ISTO É, nº 1753, 07/05/2002:53.

161

Virar o jogo

Tornar a situação favorável

SV (V+art. +N)

“Não importa qual a modalidade do esporte: o importante é virar o jogo”.Ministério do esporte e do turismo. **“O Brasil começa a virar o jogo”.Ultragaz

*VEJA, nº26, 09/07/2002: 115. **VEJA, nº32,13/08/2003: 49.

162

Virar a cabeça.

Mudar de idéia

SV(V+art+N)

“Nestas férias a maior diversão do Brasil vai virar sua cabeça. Beach Park Fortaleza”.

ISTO É, nº 1743,18/02/2003: 35.

163 Virar notícia

Tornar-se muito comentado.

SV(V+N) “Desta vez foi o jornalismo da Record que virou notícia”. Record

VEJA, nº52, 28/12/2005: 191.

Page 137: ESTUDO DAS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS DO PORTUGUÊS DO …server05.pucminas.br/teses/Letras_RaposoKC_1.pdf · as expressões idiomáticas no português brasileiro. Dois objetivos mais

137

164

Vir à baila

aparecer

SV(V+art+prep+N)

“Centrei fogo no José Dirceu, centrei fogo no Luiz Gushiken. Hoje está vindo à baila a ação do ministro Pallocci. O núcleo duro sabia. Os três mosqueteiros do rei sabiam. Será que o rei não sabia?”. Roberto Jefferson, ex-deputado (PTB-RJ), dizendo que poupou Pallocci em suas denúncias para preservar a estabilidade econômica

VEJA nº47,23/11/2005: 38.

165

Virar piada de salão.

Ser motivo de chacota

SV(V+N+prep+N)

“Em três ou quatro anos, tudo será esclarecido e esquecido, e acabará virando piada de salão”. Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, referindo-se ao esquema ilegal de arrecadação de dinheiro para campanhas eleitorais e financiamento de parlamentares que resultou na maior crise da democracia brasileira.

VEJA nº 43, 26/10/2005: 48.

166

Virar uma onça

Ficar extremamente irritado/bravo

SV(V+num+N)

“Eu não seria capaz, não, eu sou capaz. Se tocar em um filho meu, pode ser senador, presidente da República, eu viro uma onça” Heloísa Helena, senadora (PSOL-AL), fazendo coro com Virgílio e ACM neto.

VEJA nº45, 09/11/2005: 50.

167

Vocês vão ter que me engolir

Aceitar de qualquer maneira

“Se eu for candidato, com ódio ou sem ódio, eles vão ter que me engolir outra vez, porque o povo brasileiro vai querer”. Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República, discursando em palanque na sua cidade natal, Garanhuns, em Pernanbuco.

VEJA nº32, 10/08/2005: 54.

168

Voltar atrás

Desistir de algo SV(V+adj) “Samsung. Depois do primeiro contato, não tem como voltar atrás”.

VEJA, nº 27,09/07/2003: 63.