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PESQUISA S AÚDE NAS F RONTEIRAS : ESTUDO DO ACESSO AOS SERVIÇOS DE SAÚDE NAS CIDADES DE FRONTEIRA COM PAÍSES DO MERCOSUL Sumário executivo RIO DE JANEIRO 2007 Lígia Giovanella Luisa Guimarães Lenaura de Vasconcelos Costa Lobato Vera Maria Ribeiro Nogueira Giseli Nogueira Damacena Marcela Cunha DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO EM SAÚDE NÚCLEO DE ESTUDOS POLÍTICO-SOCIAIS EM SAÚDE

ESTUDO DO ACESSO AOS SERVIÇOS DE SAÚDE NAS …...O Mercosul é um dos mais importantes mo-vimentos de integração econômica regional nas Américas. Com o projeto de articular e

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PESQUISA SAÚDE NAS FRONTEIRAS

P E S Q U I S A

SAÚDE NAS FRONTEIRAS:ESTUDO DO ACESSO AOS SERVIÇOS DE SAÚDE NAS

CIDADES DE FRONTEIRA COM PAÍSES DO MERCOSUL

Sumário executivo

RIO DE JANEIRO

2007

Lígia GiovanellaLuisa Guimarães

Lenaura de Vasconcelos Costa LobatoVera Maria Ribeiro NogueiraGiseli Nogueira Damacena

Marcela Cunha

DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃOE PLANEJAMENTO EM SAÚDE

NÚCLEO DE ESTUDOSPOLÍTICO-SOCIAIS EM SAÚDE

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Equipe de pesquisa

Lígia Giovanella – coordenadora – pesquisadora titular doNúcleo de Estudos Político-Sociais em Saúde,Departamento de Planejamento e Administração em Saúdeda Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação OswaldoCruz, NUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ

Luisa Guimarães – doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública Ensp/Fiocruz, funcionária doMinistério da Saúde

Lenaura de Vasconcelos Costa Lobato – coordenadora doNúcleo de Avaliação de Políticas, professora do Programade Estudos Pós-graduados da Escola de Serviço Social daUniversidade Federal Fluminense (UFF)

Vera Maria Ribeiro Nogueira – professora do Mestradoem Política Social do Departamento de Serviço Social daUniversidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e da Escolade Serviço Social, Programa de Mestrado em Política Socialda Universidade Católica de Pelotas

Pesquisadoras de campo

Daniela Castamann – mestranda do Programa de Pós-Graduação da Universidade Estadual de Londrina,professora do Curso de Serviço Social da Faculdade doNoroeste Paranaense

Keli Regina Dal Prá – doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Pontifícia UniversidadeCatólica do Rio Grande do Sul (PUCRS)

Patty Fidelis de Almeida – doutoranda do Programa dePós-Graduação em Saúde Pública da ENSP/FIOCRUZ

Rafaela Brustolin Hellmann – mestranda do Programa dePós-Graduação em Serviço Social da UFSC, membro donúcleo Estado, Sociedade Civil, Políticas Públicas e ServiçoSocial da UFSC

Rosângela da Silva Almeida – doutoranda em ServiçoSocial na PUCRS e professora do Curso de Serviço Social daUniversidade de Santa Cruz do Sul

Assessoria estatística

Giseli Nogueira Damacena – mestre pela Escola Nacionalde Ciências Estatísticas (ENCE) e pesquisadora colaboradorado Instituto de Comunicação e Informação Científica eTecnológica em Saúde – ICICT/ FIOCRUZ

Auxiliares de pesquisa

Marcela Silva da Cunha – psicóloga, bolsista FAPERJ doNUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ

Carina Pacheco Teixeira – historiadora, bolsista FIOTEC doNUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ

Auxiliares administrativos

Lincoln Xavier da Silva – estudante de pedagogia UERJ,auxiliar administrativo do NUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ

Luis Cláudio Guimarães da Silva – técnico emadministração, auxiliar administrativo do NUPES/DAPS/ENSP/

Catalogação na fonteCentro de Informação Científica e TecnológicaBiblioteca da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca

G512s Giovanella, Lígia (coord.)Saúde nas fronteiras: estudo do acesso aos serviços de saúde nas

cidades de fronteira com países do MERCOSUL.Rio de Janeiro :ENSP / Fiocruz , 2007. 70 p., tab.

1. Acesso aos Serviços de Saúde. 2. Cooperação Internacional. 3.Saúde na Fronteira. 4. Sistema Único de Saúde. 5. União Européia. 6.Política de Saúde. 7. América Latina. 8. Brasil.

CDD - 22.ed. – 337.1098

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A realização da pesquisa contou com o apoio de diversas instituições e profissionais aos quais gostaría-mos de agradecer. As parcerias com o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS) ecom o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) foram imprescindíveis para a realiza-ção da pesquisa. A colaboração do CONASEMS foi fundamental na facilitação do acesso aos secretários desaúde dos municípios brasileiros da linha de fronteira para a realização do trabalho de campo, e ainda nolevantamento de dados iniciais dos municípios brasileiros da linha de fronteira. O apoio do ConselhoNacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) permitiu contato com os secretários nos estados.

Em especial, agradecemos a todos os sujeitos de nossa pesquisa, atores-chave dos sistemas de saúde nasfronteiras e dos processos de integração no Mercosul, pela disponibilidade de seu conhecimento, experiên-cia e tempo para realização das entrevistas. Nossos agradecimentos aos 67 secretários municipais entrevis-tados no inquérito pela adesão e interesse no debate dos temas da pesquisa; às autoridades das localidadesestrangeiras de Rivera, Pedro Juan Caballero, Bernardo Irigoyen, Puerto Iguazú e Ciudad del Este pelasinformações sobre os sistemas de saúde de seus países e suas perspectivas sobre demandas em saúde nasfronteiras; aos secretários estaduais de saúde dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná eMato Grosso do Sul pelo compartilhamento de suas percepções sobre os temas da pesquisa; aos coordena-dores nacionais do SGT 11 Saúde Mercosul da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai pelas informaçõessobre o funcionamento destes fóruns nos países e perspectivas para o desenvolvimento de temas de saúdee acordos específicos no Mercosul.

Às pesquisadoras de campo, profissionais competentes que visitaram as 69 localidades de fronteira,muitas delas de difícil acesso, agradecemos a dedicação e a competência que possibilitou entrevistar 67secretários municipais de saúde viabilizando a realização do inquérito.

Ao Grupo de Trabalho para Integração das Ações de Saúde na Área de Influência da Itaipu e à ItaipuBinacional agradecemos o apoio nas visitas à região. A secretaria do MERCOSUL em Montevidéu colaboroucom a apresentação de sua estrutura, organização e funcionamento na visita à sua sede. Ao Núcleo deRepresentação Estadual do Ministério da Saúde no Rio Grande do Sul agradecemos o suporte e participaçãonas visitas na fronteira do estado. Aos técnicos do Ministério da Saúde pelo apoio com informações sobreos municípios estudados e suporte em algumas viagens.

Finalmente, agradecemos a todos os profissionais de cada uma das instituições visitadas pelas informa-ções prestadas e apoio na realização das entrevistas. Ao grupo de profissionais técnicos e administrativosdo NUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ agradecemos todo o apoio logístico para realização da pesquisa e elaboração derelatórios.

Ao CNPq pelo apoio financeiro, sem o qual não teria sido possível a realização desta pesquisa.

Equipe de coordenação

Agredecimentos

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Apresentação 7

Introdução 9

I. Objetivos 11

II. Metodologia 13

II.1 Inquérito com secretários municipais de saúde dos municípios da linha de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai 13

II.2 Visitas e entrevistas semi-estruturadas em 4 casos de cidades-gêmeas 15

II.3 Entrevistas com atores-chave nacionais e estaduais 16

II.4 Revisão bibliográfica sobre repercussões nas políticas de saúde da integração regional entre países na União Européia 16

III. Características da fronteira e dos municípios de fronteira estudados 17

III.1 Os municípios estudados 19

IV. Fluxos e trânsitos transfronteiriços 23

V. Acesso e demanda de estrangeiros no SUS 25

VI. Motivos de busca e dificuldades para a gestão decorrentes da demandade estrangeiros 31

VII. Presença de estratégias locais para a cooperação internacional em saúde 35

VIII. Desafios para garantia de acesso aos serviços de saúde aos cidadãosde fronteira 39

IX. Integração regional e direito à saúde 43

X. A experiência da União Européia: repercussões do mercado internoeuropeu sobre as políticas de saúde 45

X.1 Constituição, desenvolvimento e alargamento da União Européia 45

X.2 Institucionalização e organismos comunitários da União Européia 46

X.3 A formação do mercado único europeu e repercussões sobre as políticas de saúde 47

X.4 A saúde nos Tratados da União Européia: ações de saúde pública 48

X.5 Repercussões da livre circulação sobre as políticas de saúde 48

X.6 A regulamentação do acesso à saúde em outro Estado-Membro 49

X.7 A interpretação do direito comunitário de acesso aos serviços de saúde 50

X.8 Cuidados integrados entre países e nas regiões de fronteira 51

XI. Síntese das principais repercussões do mercado interno europeu sobreas políticas de saúde e lições para o Mercosul 53

XII. Mapas com resultados selecionados do inquérito 55

XIII. Perfil sócio-demográfico e assistencial dos municípios brasileirosde fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai 65

XIV. Referências bibliográficas 79

Sumário

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Apresentação

O Mercosul é um dos mais importantes mo-vimentos de integração econômica regional

nas Américas. Com o projeto de articular e formarmercados, busca integrar territórios para alcançara livre circulação de pessoas, de produtos, de capi-tal e de serviços. A integração regional faz parte deconjunto de fenômenos geopolíticos recentes re-sultantes de esforços governamentais, com moti-vações econômicas, nos quais ocorrem impactossobre as políticas de saúde, inesperados – decorren-tes de política macroeconômicas, ou esperados de-vido às maiores facilidades da circulação de pesso-as bens e serviços no território. Ainda que não este-ja presente nos fundamentos das motivações deprocessos de integração econômica regional, a ten-dência é de que a saúde ocupe gradualmente espa-ço na agenda e nas instituições.

A experiência de meio século da União Euro-péia indica que quando compõe a agenda regional,a saúde é potencializada como fator de desenvolvi-mento e de integração. Assim, é fundamental co-nhecer de que modo os avanços do Mercosul vemrepercutindo nas políticas e no acesso aos serviçosde saúde para os Países fundadores: Argentina, Bra-sil, Paraguay e Uruguay.

Para observar as repercussões de processos deintegração econômica as fronteiras são espaços pri-vilegiados, pois são territórios de convivência coti-diana entre diferentes sistemas legais, culturais esociais onde primeiro e com mais intensidade ocor-rem as interações e se manifestam tendências. Alémdisso, nas fronteiras as comunidades exibem tro-cas e intercâmbios constantes anteriores à forma-ção de mercados que ao representar movimentosvivos de integração trazem elementos para a com-preensão e análise da realidade das repercussões dosavanços do Mercosul na saúde.

Para o Brasil, o avanço do Mercosul é de interes-se geográfico estratégico considerando a extensalinha de fronteira, cujo privilégio é a proximidadecom o território de quase todas as Nações Sul-

Americanas. Distantes dos centros, as comunida-des fronteiriças brasileiras são os primeiros espaçosterritoriais a viverem os efeitos da integração eco-nômica regional no Mercosul. Com relações histó-ricas anteriores ao Mercosul, as comunidadesfronteiriças exibem variáveis perfis de transaçõessócio-culturais e econômicas e demonstram a ex-pectativa de benefícios com a integração territorial.

A presente publicação apresenta as reflexõesnesse campo construídas a partir de pesquisa sobreacesso à saúde nos municípios brasileiros fronteiri-ços na perspectiva das autoridades sanitárias locais,regionais e nacionais, concluída em 2007 e realiza-da com o apoio financeiro do CNPq. O acervo in-clui: seleção de informações e análises que confor-mam descrição exploratória da realidade das fron-teiras internas do Mercosul, com caracterizaçãosócio-demográfica e assistencial do municípios bra-sileiros de fronteira, resultados de inquérito comsecretários municipais de saúde e análise da expe-riência da União Européia quanto às repercussõesdo mercado interno europeu sobre políticas de saúdee acesso a serviços de saúde em outro Estado-mem-bro. Trata-se de um documento de trabalho paraapoiar estudos, propostas e políticas voltadas paraa situação de fronteira com ênfase na saúde. Dadose informações completas da pesquisa estão dis-ponibilizados no site www.ensp.fiocruz.br/saudenasfronteiras.

Esperamos contribuir com essa publicação paraa formação de uma agenda regional de saúde, naqual o processo de integração econômica regionalpossa ser aliado da redução de desigualdades. Naperspectiva de que com a liberdade de movimentoo comércio prospera, a cultura e os costumes sãorespeitados e a vida se enriquece.

Luisa Guimaraes

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Processos de integração regional entre países paraa implementação de mercados comuns foram in-

tensificados no contexto de globalização e lentamenteuma agenda social da integração é construída acom-panhando a regulamentação da livre circulação depessoas, mercadorias, serviços e capital, fundamen-tos econômicos de um mercado único. No MercadoComum do Sul (MERCOSUL), criado em 1991 – e inte-grando, à época, a Argentina, o Brasil, o Paraguai e oUruguai – paralelamente à sua ampliação com a in-corporação de outros países, questões sociais e aspec-tos de cooperação no campo dos sistemas de saúdeprogressivamente tem sido incorporadas à agendapolítica dos governantes da região.

A partir de 1997, a saúde passou a ser tratada emdois fóruns específicos do MERCOSUL: a reunião de Mi-nistros de Saúde e o Subgrupo de Trabalho 11 Saúde.As atividades desses fóruns estão orientadas princi-palmente à negociação entre países para harmo-nização de normas que possibilitem a circulação deprodutos e serviços. Como União Aduaneira, a inclu-são de temas relacionados à saúde no Mercosul vemsendo gradual, vinculada predominantemente às vi-gilâncias sanitária e epidemiológica, relacionadas àcirculação de produtos e a ações de saúde pública dealta externalidade. Mais recentemente, despontoucom força a questão da circulação de profissionais desaúde, indicando a preocupação com a regulação domercado de trabalho e a formação neste campo.

No contexto de formação de mercados comuns,as regiões de fronteira adquirem especial atenção, poisantecipam possíveis efeitos dos processos de inte-gração. Nas fronteiras, convivem cotidianamente sis-temas políticos, monetários, de segurança e de prote-ção social diferentes; e a intensificação de fluxos deprodutos, serviços e pessoas, decorrentes da integração(Bolis, 1999) gera tensões e novos desafios para ossistemas de saúde das cidades fronteiriças (Guima-rães, Giovanella, 2005), exigindo políticas específi-cas direcionadas à garantia do direito universal à saú-de nestas regiões.

Introdução

No debate atual sobre fronteira encontram-se re-ferências a distintos significados e duas perspectivasprincipais: uma tradicional e outra crítica. Na primei-ra, atribui-se à fronteira um sentido mais relacionadoà demarcação do solo, do limite do território e suaapropriação pelo homem. A visão crítica concebe afronteira, não somente como um fato geográfico ouuma representação cartográfica, mas um fato histó-rico e social de grande riqueza (Raffestin, 2005) e comoespaço social que incorpora a territorialidade, enquantocerto tipo de interação entre o homem e o espaçomediatizada pelo espaço (Souza, 2000). A territorialidadecorresponde aos processos relacionados ao poder so-bre o território afetando e controlando o uso do es-paço físico por sujeitos políticos que constroem umasociabilidade própria a este espaço particular que é afronteira. A noção de territorialidade não separa quemestá dentro de quem está fora, correspondendo aoespaço vivido, e em geral não coincide com o ele-mento geográfico (Machado,1998; Ministério daIntegração Nacional, 2005).

A fronteira, não pode ser apreendida apenas comoum limite, um “para cá” e outro “para lá”, pois essasduas categorias congregam diferenças essenciais. En-quanto a fronteira é orientada para fora caracterizan-do uma zona de contato e de integração, os limitessão orientados para dentro, ou seja, se apresentamcomo uma linha de separação por processos históri-cos e jurídicos (Machado,1998; Peiter, 2005). Destaforma, as “paisagens fronteiriças”, configuram-secomo áreas singulares marcadas por uma dualidadeintrínseca de contato e separação. As fronteiras emgeral são também áreas periféricas, que engendramdesigualdades, portanto, a fronteira dispõe de umconjunto de instituições, de práticas, de sujeitos e demodos de vida que se dão de forma particular naque-le lugar e não em outro (Peiter, 2005). É um elementode equilíbrio dinâmico e assume função reguladoraem um processo que se constitui em quatro momen-tos: diferenciação, tradução, relação e regulação(Raffestin, 2005).

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Na fronteira processos locais integram o regionalcom o nacional, assim é necessário olhar o espaço defronteira e apreendê-lo no movimento histórico, tantodiacrônico (espaço) quanto sincrônico (paisagem), afim de reconhecer concomitantemente as distintasescalas de relação entre o local, o regional, o nacio-nal, transfronteira e transnacional (Cammarata,2006).

A zona de fronteira, enquanto produto deinterações econômicas, culturais e políticas, apresen-ta territorialidades heterogêneas. É “espaço-teste depolíticas públicas de integração e cooperação, espaço-exemplo das diferenças de expectativas e transaçõesdo local e do internacional, e espaço-limite do desejode homogeneizar a geografia dos espaços nacionais”(MIN, 2005:21). Neste sentido é importante estudarestas regiões para melhor conhecer obstáculos àintegração, prospectar resultados negativos e subsi-diar a formulação de políticas para a melhoria da vidae garantia de direitos sociais e de saúde da populaçãofronteiriça.

Os distintos desenhos dos sistemas e das políticasde saúde que exibem os países membros do MERCOSUL,sejam nos aspectos físicos, financeiros e humanos;sejam nas abordagens organizacionais da assistência;aliados às variedades dos perfis das cidades fronteiriçasintensificam dificuldades já presentes nos sistemasde saúde nestes territórios tanto nos aspectos sanitá-rios e epidemiológicos quanto no acesso às ações e,finalmente, conlevam à complexificação de impac-tos inesperados do processo de integração regionalnos serviços de saúde (Draibe, 2003; Figueras et all,2002).

Nesse sentido, o esforço do SUS para consolidar adescentralização e organizar serviços de saúde locaiscom vistas a melhorar o acesso integral pode ser afe-tado pela ausência de linhas e diretrizes específicaspara as situações de fronteiras. A dimensão dessa ques-tão assume proporções variadas considerando o mo-

saico de relações e laços das populações fronteiriças,e os intercâmbios econômicos e as facilidades de aces-so. Embora a busca por serviços de saúde por popula-ções de outros países seja realidade nos serviços desaúde de municípios de fronteira, não existem estu-dos suficientes para dar a dimensão dessa demandaespontânea que exerce pressão crescente à medidaque os sistemas municipais de saúde se organizam.

Ainda que os sistemas de informação tenhamavançado consideravelmente nos últimos anos apri-morando e qualificando os dados sobre utilização dosserviços de saúde, são escassos os dados primários quepossibilitem conhecer e analisar as condições de aces-so e demandas por serviços no SUS por estrangeiros ebrasileiros não residentes nas localidades de frontei-ra. Pouco se conhece também das estratégias locaisde respostas às pressões específicas por atenção à saú-de nas regiões de fronteira. No caso, das cidadesfronteiriças com o MERCOSUL essa situação exibe mai-or complexidade considerando outros fatorescondicionantes do perfil de utilização associados àsdiferenças no desenho dos sistemas de saúde de cadaEstado-parte.

Assim, a pesquisa realizada teve como objetivoanalisar condições de acesso e demandas por serviçosde saúde em cidades fronteiriças do MERCOSUL e discu-tir repercussões dos processos de integração regionalsobre os sistemas de serviços de saúde dos países mem-bros.

Ademais de conhecer dinâmicas de acesso e estra-tégias locais de cooperação entre gestores nos muni-cípios brasileiros de fronteira com países do MERCOSUL

o estudo teve por propósito produzir conhecimentosque subsidiem a análise de impactos no acesso às açõese aos serviços de saúde do SUS associados aos proces-sos de avanço do MERCOSUL que apóiem a formulaçãode programas e políticas públicas específicas para asregiões de fronteira.

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I. Objetivos

Objetivo geral

Analisar condições de acesso e demandas por ser-viços de saúde em cidades fronteiriças do MERCOSUL ediscutir repercussões dos processos de integração re-gional sobre os sistemas de serviços de saúde dos paí-ses membros.

Objetivos específicos

Identificar e analisar as ações demandadas pelapopulação fronteiriça nos serviços de saúde locais,mecanismos utilizados para o acesso, fluxos formaise informais entre os serviços na região e estratégiasde resposta de gestores locais às pressões por atendi-mento.

Caracterizar repercussões do avanço do movi-mento de integração regional na demanda de acessoàs ações e aos serviços de saúde em cidades fronteiriçasdo MERCOSUL.

Analisar semelhanças e diversidades da orga-nização dos sistemas e modelos de atenção à saúdede países do MERCOSUL e as suas implicações para oacesso aos serviços de saúde em cidades de fronteira.

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II. Metodologia

Por tratar-se de pesquisa sobre condições de aces-so e demandas por ações e serviços de saúde em cida-des situadas nas fronteiras físicas do MERCOSUL, associ-ada ao estudo de interfaces com o processo deintegração regional entre países e constituição domercado comum do Sul, com vistas a contribuir paraa formulação de políticas públicas que melhorem ascondições de acesso das populações fronteiriças e su-perem as desigualdades regionais, buscou-se fortale-cer a interação entre pesquisa e serviços de saúde pormeio da estratégia de ação de parceria interinsti-tucional com CONASEMS e CONASS. Estas instituiçõesforam fundamentais para adesão à pesquisa de seusassociados (nossos informantes-chave) e facilitaçãodo acesso aos secretários estaduais e municipais desaúde.

Com metodologia quali-quantitativa a pesquisaprivilegia percepções de atores-chave como fontes pri-márias de informação, e lança mão de dados de siste-mas de informação oficiais como fontes secundárias.

Este estudo baseia-se em experiências e percepçõesde atores políticos, representantes governamentais na-cionais, regionais e locais, quanto aos temas do aces-so a serviços de saúde em regiões de fronteira e àsimplicações da integração regional vis a vis as políti-cas nacionais, regionais e locais, no acesso as ações eserviços de saúde. Fundamenta-se em revisão de lite-ratura sobre repercussões dos processos de constitui-ção de mercados comuns sobre políticas e sistemasde saúde.

Foram realizados: i) inquérito com secretáriosmunicipais de saúde dos municípios da linha de fron-teira com Argentina, Paraguai e Uruguai; ii) visitas eentrevistas semi-estruturadas em 4 cidades-gêmeascaso; iii) entrevistas semi-estruturadas com secretári-os estaduais de saúde da região (Rio Grande do Sul,Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul); iv) vi-sitas e entrevistas semi-estruturadas com autoridadesgovernamentais em níveis correspondentes aos en-trevistados no Brasil e com gerentes de unidades desaúde em uma localidade fronteiriça gêmea estran-

geira das 4 cidades-caso brasileiras, envolvendo duaslocalidades da Argentina, uma do Uruguai e duas doParaguai; v) entrevistas semi-estruturadas com coor-denadores nacionais do Subgrupo de Trabalho SGT11 Saúde do MERCOSUL da Argentina, Brasil, Paraguaie Uruguai; vi) levantamento de dados sócio-demo-gráficos, de gestão do sistema de saúde, de redeassistencial e financiamento do SUS dos municípiosda linha de fronteira; vi) revisão bibliográfica e docu-mental sobre políticas de saúde nos países envolvi-dos; vii) revisão de literatura sobre repercussões demercados comuns sobre políticas e sistemas nacio-nais de saúde e, sobre regulamentação do acessotransfronteiriço na União Européia.

II.1 Inquérito com secretáriosmunicipais de saúde dos municípios dalinha de fronteira com Argentina,Paraguai e Uruguai

Com o objetivo de identificar e analisar as açõesdemandadas pela população fronteiriça aos serviçosde saúde, mecanismos utilizados para o acesso, flu-xos formais e informais entre os serviços na região eestratégias de resposta de gestores locais às pressõespor atendimento foi realizado inquérito com os se-cretários municipais de saúde dos municípios brasi-leiros da linha de fronteira com Uruguai, Argentina eParaguai. O universo da pesquisa foram os SMSs dos69 municípios localizados na linha de fronteira comUruguai, Argentina e Paraguai.

Para tanto foi elaborado pela equipe de pesquisaquestionário organizado em 11 módulos com 73 per-guntas fechadas e 30 parcialmente abertas, de formaa atender aos objetivos da pesquisa e à revisão da lite-ratura sobre o assunto estudado. O questionário foielaborado em processo reiterativo, iniciado em ofici-na metodológica passou por discussão por correioeletrônico entre a equipe de pesquisa. Sua primeiraversão foi completada em segunda oficina meto-dológica com a participação de todas as pesquisado-

II. METODOLOGIA

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ras no segundo semestre de 2005. O questionárioelaborado foi submetido a pré teste para validação deconteúdos e verificação de tempo de aplicação emdois municípios de fronteira quando da primeira vi-sita a cidade gêmeas-caso e participação no lançamen-to do Programa SIS Fronteira do Ministério da Saúdeem Uruguaiana em 10 e 11 de novembro de 2005.Após o pré-teste, o instrumento foi reformulado demodo a tornar algumas perguntas mais claras, ser maisconciso, e principalmente reduzir o tempo de aplica-ção, facilitando adesão e levantamento completo deinformações.

O questionário foi composto por 11 módulos de-nominados pelas letras de A até K. Os três primeirosmódulos referem-se a informações sobre a aplicaçãodo questionário, dados da Secretaria e perfil do(a)Secretário(a) Municipal de Saúde (SMS). O MóduloD trabalha características da fronteira no município.No Módulo E as perguntas buscam apreender as per-cepções do SMS sobre os serviços públicos de saúdena cidade estrangeira de fronteira (Seção E.1) e doSistema Único de Saúde (SUS) no município e região(Seção E.2). O Módulo F aborda a busca e atendimen-to de estrangeiros pelo SUS no município quanto aoperfil dos estrangeiros que buscam o SUS (Seção F.1) etipos de atendimento demandados (Seção F.2). Omódulo G coleta informações sobre ações de saúderelacionadas com a situação de fronteira. O conheci-mento do SMS sobre a busca e atendimento de brasi-leiros nos serviços públicos de saúde das cidades es-trangeiras de fronteira vizinhas ao seu município éinquirido no Módulo H, e no módulo I indaga-se so-bre atuação de profissionais de saúde estrangeiros. Osdois últimos módulos foram destinados a anotaçõesdo pesquisador de campo sobre a fronteira e a reali-zação da entrevista.

O projeto previa o envio dos questionários aos 69secretários municipais de saúde por correio, acompa-nhados de cartas do CONASEMS, auto-preenchido pe-los SMSs, e que sua devolução seria monitorada pormeio de telefone. Contudo, o teste piloto dos instru-mentos de pesquisa mostrou a complexidade do ques-tionário e experiências anteriores das pesquisadorasindicavam dificuldade de retorno. Assim, para evitarperdas foi decidida a aplicação dos questionários porentrevistadoras treinadas em visita a todas as 69 loca-lidades de fronteira. Esta estratégia mostrou-s exitosa,pois alcançou-se resposta da grande maioria dos su-

jeitos da pesquisa: 67 em universo 69 SMSs de muni-cípios brasileiros da linha de fronteira com Uruguai,Argentina e Paraguai.

A equipe de campo da Pesquisa Saúde na Frontei-ra foi composta por cinco entrevistadoras, profissio-nais de nível superior ligadas a cursos de pós-gradua-ção em saúde pública e/ou serviço social, quatro de-las residentes nos estados do sul do país e com expe-riência em pesquisa na fronteira, o que facilitou mui-to o reconhecimento de campo e deslocamentos. Aspesquisadoras de campo receberam treinamento cominstruções específicas para abordagem dos SMS’s, com-preensão das perguntas, estratégia de aplicação doquestionário, bem como para revisão e crítica do seupreenchimento, e posterior digitação dos dados. Otrabalho de campo realizado entre novembro e de-zembro de 2005 foi supervisionado pelas coordena-doras da pesquisa e a profissional de estatística comacompanhamento à distância por meio de contatostelefônicos diários e correios eletrônicos.

Como estratégia para entrada no campo, inicial-mente, os SMS foram contatados por telefone e porcorreio eletrônico com mensagem da coordenaçãoda pesquisa informando objetivos do estudo e futuravisita de pesquisadora. Na etapa de trabalho de cam-po propriamente dita a entrevistadora responsávelentrou em contato por telefone com o SMS e a entre-vista foi agendada. No momento da entrevista, emvisita à localidade de fronteira, competia aoentrevistador apresentar de forma sucinta os objeti-vos da pesquisa, entregar o termo de consentimentolivre e esclarecido e após aceitação e assinatura apli-car o questionário.

Os questionários aplicados foram revisados peloentrevistador e por supervisor. Para orientar a entra-da de dados foi elaborado instrumento com informa-ções específicas e dicionário de variáveis. A digitaçãode dados foi feita pelas pesquisadoras de campo emdois instrumentos de entrada de dados: uma planilhaexcel para dados quantitativos (com variáveis deno-minadas por letra do módulo do questionário e nú-mero da pergunta) e um documento word para res-postas abertas/dados qualitativos. Depois da digitaçãofoi realizada crítica dos dados com verificação dacodificação e consistência entre variáveis com corre-ção dos erros pontuais. A entrada de dados foi feitapor meio do programa Excel e os dados posterior-mente transportados para o SPSS para a realização da

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descrição e análise estatística. O tratamento estatísti-co dos dados do inquérito foi realizado com apoio deprofissional de estatística. Foi elaborada tabulaçãocom freqüências simples com resultados para o con-junto dos municípios e por segmento de fronteira(estado e país). Para a análise de associação entre va-riáveis selecionadas foi utilizado o teste do qui-qua-drado de Pearson e para a comparação entre segmen-tos de fronteira foi utilizado o teste não paramétricode correlação de Spearman, mais adequado para aná-lise de pequeno número de casos. O valor crítico donível de significância pré-estabelecido foi de 0,05 (p-valor).

II.2 Visitas e entrevistassemi-estruturadas em 4 casos decidades-gêmeas

Em quatro cidades brasileiras da linha de frontei-ra, consideradas pólos regionais, e gêmeas de locali-dade fronteiriça de país vizinho, foi realizado estudomais detalhado para compreender melhor as deman-das e as estratégias dos secretários municipais de saú-de para enfrentar pressões de acesso por estrangeiros,bem como conhecer alguma repercussão do avançodo processo de integração regional e constituição doMERCOSUL nas localidades de fronteira.

Cidades-gêmeas correspondem à situação de mu-nicípios lindeiros que apresentam uma conurbaçãoou semi-conurbação com localidade do país vizinho,conformando a zona de fronteira (área geográfica queinclui as faixas de fronteira brasileira e do país estran-geiro). As cidades-gêmeas caracterizam-se por fluxostransfronteiriços mais intensos e têm sido alvosprioritários de políticas públicas (MIR, 2005). Nessaslocalidades é possível observar melhor tanto simetri-as como assimetrias de sistemas de saúde, bem comoestratégias de enfrentamento das demandas e inicia-tivas de cooperação entre autoridades locais brasilei-ras e estrangeiras, uma vez que há maior tradição deintercâmbio, dada maior intensidade de fluxos e trân-sitos nestas fronteiras e, potencialmente maiores pres-sões de demanda por acesso a serviços de saúde.

A seleção dos municípios/cidades gêmeas para osestudos de caso foi definida em conjunto com os par-ceiros da pesquisa, a partir da identificação de muni-cípios prioritários em políticas nacionais de desen-volvimento regional e, de experiência de duas pes-

quisadoras do grupo de pesquisa em estudos de fron-teira e no acompanhamento de fóruns em saúde emregião de fronteira. Foram selecionados quatro ca-sos: i) na fronteira do Rio Grande do Sul, as cidades-gêmeas de Santana do Livramento com Rivera doUruguai; ii) em Santa Catarina, Dionísio Cerqueira,contígua a Barracão do Paraná ambas gêmeas deBernardo Irigoyen da Argentina; iii) no Paraná, a ci-dade de Foz do Iguaçu que faz fronteira com a Argen-tina e com o Paraguai gêmea das localidades de PuertoIguazu e Ciudad del Este, respectivamente, regiãodenominada de “tríplice fronteira”; iv) no Mato Gros-so do Sul, Ponta Porã, gêmea de Pedro Juan Caballero,localidade da fronteira do Paraguai.

Em cada uma destas localidades, entre novembroe dezembro de 2005, foi feita visita de campo pelaequipe de coordenação da pesquisa para realizar en-trevistas com autoridades sanitárias locais e regionais,de ambos os lados, de modo a conhecer as percep-ções sobre a situação fronteiriça e impactos doMERCOSUL na organização da saúde. Foram entrevista-dos além dos secretários municipais de saúde, geren-tes de unidades de saúde brasileiros, autoridades go-vernamentais estrangeiras em níveis corresponden-tes aos entrevistados no Brasil e gerentes de unidadesde saúde de localidades fronteiriças gêmeas estran-geiras, e realizadas visitas e observação a unidades desaúde nas localidades brasileiras e estrangeiras em cadacaso.

As entrevistas semi-estruturadas realizadas pelaspesquisadoras com autoridades locais e gerentes deunidades de saúde brasileiras e estrangeiras foram gra-vadas e posteriormente transcritas. Uma análise pre-liminar das entrevistas, juntamente com as observa-ções anotadas em cadernos de campo foi base para aelaboração dos relatórios de caso.

As informações obtidas trouxeram subsídios paraanálise dos dados do inquérito e permitiram ilustrarsituações específicas de barreiras de acesso estipula-das por gestores locais, bem como detalhar experiên-cias de cooperação e possibilidades de acordos com alocalidade gêmea vizinha.

Os casos das cidades-gêmeas do MERCOSUL foramanalisados, em capítulo que compôs a tese de douto-rado de Luisa Guimarães. O artigo analisa e ilustranos casos específicos as condições de acesso aos ser-viços, identificar ações demandadas, fluxos entre ser-viços e, estratégias governamentais de resposta às pres-

II. METODOLOGIA

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sões por assistência à saúde. Os resultados contribu-em para o debate de como processos de integraçãoeconômica regional repercutem nos sistemas de saú-de e delineamento de estratégias de enfrentamento(Guimarães, 2007).

II.3 Entrevistas com atores-chavenacionais e estaduais

Para obter informações e reflexões sobre a proble-mática da integração regional e questões de saúde deacordo com as prioridades das políticas nacionais eregionais foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com atores nacionais dos quatro paísese de quatro estados brasileiros.

De modo a incluir informações dos governos cen-trais e nacionais dos Estados-parte do MERCOSUL, fo-ram entrevistados os coordenadores nacionais da Ar-gentina, do Brasil, do Paraguai e do Uruguai doSubgrupo de Trabalho Saúde (SGT-11) do Grupo doMercado Comum (GMC) do MERCOSUL, enfocandoregulamentações sobre acesso aos serviços, acordospolíticos vislumbrados como possíveis, e percepçõescom relação às implicações nas políticas públicas desaúde do processo de integração no MERCOSUL.

Foi elaborado roteiro semi-estruturado para entre-vista com perguntas organizadas em três dimensões:i) debate da saúde nos órgãos do MERCOSUL, dinâmi-cas, consensos, divergências e desafios, com ênfasenas questões de acesso transfronteiriço aos serviços eàs ações de saúde; ii) políticas de saúde, estratégias eperspectivas do país para o MERCOSUL; iii) repercussõespositivas e negativas da integração regional noMERCOSUL sobre as políticas e sistema de saúde do seupaís (roteiro em anexo no volume 3).

As entrevistas com os coordenadores nacionais doSGT 11 foram realizadas pelas pesquisadoras da equi-pe de coordenação em Montevidéu, Assunção eBrasília em distintas datas nos anos de 2006 e 2007,uma vez que o agendamento com estes atores foi maisdifícil. A viagem a Montevidéu possibilitou tambémvisita à sede da Secretaria do Mercosul com levanta-mento de informações sobre estrutura administrati-va e modo de funcionamento e visita a diversos orga-nismos do Mercosul. Em Assunção, foi visitado tam-bém o Tribunal Permanente de Revisão do MERCOSUL.Três entrevistas foram gravadas e transcritas. A entre-vista com o representante argentino foi realizada via

correio eletrônico ao coordenador suplente do SGT11 Saúde. Foi solicitada aos atores-chave a permissãopara divulgação das entrevistas. As entrevistas forameditadas e encontram-se disponíveis no site da pes-quisa www.ensp.fiocruz.br/saudenasfronteiras.Foram fonte para elaboração de capítulo sobre Políti-cas de Saúde e Mercosul, que compôs tese de douto-rado de Luisa Guimaraes, uma das pesquisadoras daequipe (Guimarães, 2007).

No lado brasileiro, objetivando captar a visão re-gional da temática da pesquisa foram realizadas entre-vistas semi-estruturadas com secretários estaduais desaúde dos 4 estados que bordeiam a fronteira físicacom os países integrantes do MERCOSUL: Rio Grande doSul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul. Asentrevistas versaram sobre temas de saúde na frontei-ra desde a perspectiva de secretários de saúde de esta-dos de fronteira e suas estratégias para enfrentamentoe apoio às autoridades locais em saúde.

As entrevistas realizadas em 2005 e 2006 foramgravadas, transcritas e editadas e estão também dis-poníveis no site www.ensp.fiocruz.br/saudenasfronteiras. As perspectivas dos secretáriosapontam para as repercussões de demandas de acessopara além da localidade de fronteira, e as informa-ções levantadas agregam detalhes às característicasespecíficas de cada segmento de fronteira estudado.Sua análise subsidiou o capítulo de tese com resulta-dos dos estudos de caso das cidades gêmeas, agregan-do perspectivas locais e regionais (Guimaraes, 2007).

II.4 Revisão bibliográfica sobrerepercussões nas políticas de saúde daintegração regional entre países naUnião Européia

Foi realizada revisão de literatura internacional erevistas especializadas sobre repercussões nas políti-cas de saúde da integração regional entre países e re-gulamentação do acesso à saúde transfronteiriço naUnião Européia. Esta revisão foi complementada porpesquisas documentais em sítios na internet sobre oprocesso de integração europeu e instâncias de deci-são em saúde. Os resultados desta revisão foram pu-blicados em artigo nos Cadernos de Saúde Pública22(9):1795-1807, 2006 s são apresentados na parte Xdo presente sumário executivo.

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III. Características da fronteira e dos municípios defronteira estudados1

O Brasil tem uma faixa de fronteira extensa (15.719quilômetros) tradicionalmente tratada como local deisolamento que configura-se hoje como uma regiãode baixo desenvolvimento socioeconômico marcadapor profundas iniqüidades sociais (Gadelha, Costa,2005). Contudo, é faixa não homogênea apresentan-do em sua linha espaços diferenciados em aspectoshistóricos, culturais, étnicos, econômicos, sociais quepodem ser agrupados em três grandes arcos: ArcoNorte (fronteiras dos estados de Amapá, Pará, Ama-zonas, Roraima e Acre), Arco Central (Rondônia, MatoGrosso e Mato Grosso do Sul) e o Arco Sul (Paraná,Santa Catarina e Rio Grande do Sul) (Machado,1998).

Na presente pesquisa, o universo de estudo estácomposto pelos 69 municípios brasileiros localizadosna linha de fronteira, isto é lindeiros – seu territóriofaz divisa – com os quatro países fundadores doMercosul: Argentina (1.263km de divisa), Paraguai(1.339km) e Uruguai (1.003) e corresponde ao ArcoSul e a alguns municípios do Arco Central (Fronteirado Mato Grosso do Sul com Paraguai.).

A maior parte dos municípios estudados, portan-to, localiza-se na faixa de fronteira denominada ArcoSul correspondente à área mais meridional do paísque compreende os estados do Paraná, Santa Catarinae Rio Grande do Sul. Trata-se de espaço com influên-cia socioeconômica e cultural européia e é mais in-tensamente afetado pela dinâmica transfronteiriçadecorrente do projeto de integração econômica pro-movida pelo Mercosul. São três sub-regiões principais:o Portal do Paraná, no noroeste paranaense; os ValesColoniais Sulinos, subdivididos em três segmentos,sudoeste do Paraná, Oeste de Santa Catarina e Noro-este do Rio Grande do Sul; e o segmento de fronteira

1 Uma versão deste texto foi originalmente publicada nosCadernos de Saúde Pública em 2006. Giovanella L, Guima-rães L, Nogueira VMR, Lobato LVC, Damacena G. Saúde nasfronteiras: acesso e demandas de estrangeiros e brasileirosnão residentes ao SUS nas cidades de fronteira com paísesdo MERCOSUL na perspectiva dos secretários municipaisde saúde. Cadernos de Saúde Pública; 2007, 23(2):251-266.

da Mesorregião Metade Sul do Rio Grande do Sul (seg-mento de fronteira conhecido culturalmente comoCampanha Gaúcha) (MIN, 2005:59).

No Arco Sul, os imigrantes europeus, “colonos”,realizaram a ocupação das áreas de mata subtropicalem férteis terrenos de terra roxa, dando origem a umapróspera e relativamente diversificada base produti-va aos Vales Colônias Sulinos. A estrutura fundiáriacaracterizada por forte presença de pequenas e médi-as propriedades baseadas no trabalho familiar,dedicadas à criação de aves, suínos, cultivo do milhoe fruticultura deu origem a uma base produtiva rela-tivamente diversificada. Nas últimas décadas, expan-são do cultivo da soja, o arrendamento de terras porgrandes empresas agroindustriais e o desenvolvimen-to de rede urbana conectada por malha rodoviáriaproduziram forte imigração da população do campopara as pequenas cidades.

No Oeste Catarinense também domina a estrutu-ra fundiária moldada por pequenas e médias proprie-dades, contudo apresenta menor diversificação pro-dutiva e produtos de menor valor (milho e fumo). Aintrodução da soja em algumas áreas e a difusão deunidades industriais do setor de alimentos permiti-ram a manutenção de uma economia regional sus-tentável e situação social invejável. A CampanhaGaúcha tem como base produtiva, médias e grandespropriedades de criação de gado bovino e ovino, emais recentemente a expansão da rizicultura (MIN,2005:60).

O Arco Sul não constitui um espaço culturalmen-te homogêneo. Enquanto nos Vales Coloniais – sub-região mais populosa e densamente povoada – há umclaro predomínio da cultura italiana e alemã, na Cam-panha Gaúcha os traços culturalmente dominantessão referentes à “cultura gaúcha” e suas raízes lusas eindígenas. No Portal do Paraná observa-se pluralismocultural: com influências italiana, alemã, japonesa emigração nordestina (MIN, 2005:61).

As situações de fronteira ao longo do extenso li-mite internacional do país não são as mesmas devido

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às diferenças geográficas, ao tratamento diferenciadoque recebem dos órgãos do Estado e ao tipo de rela-ção estabelecida com os povos vizinhos. Segundo ogrupo de pesquisa RETIS da geografia da UFRJ, os mo-delos que fundamentam a tipologia de interaçõestransfronteiriças são: margem, zona-tampão, frentes,capilar e sinapse (MIN, 2005: 144).

Denomina-se margem o tipo de interação em quea população fronteiriça de cada lado do limite inter-nacional mantém pouco contato entre si. Há Ausên-cia de infra-estrutura conectando os principais nú-cleos de povoamento dos dois lados da fronteira, au-sência de projetos de cooperação transfronteira e apresença intermitente e não sustentada do Estado (fe-deral, estadual) (MIN, 2005: 144).

A zona tampão corresponde a áreas estratégicasonde o Estado central restringe ou interdita o acessoà faixa e à zona de fronteira, criando parques natu-rais nacionais, áreas protegidas ou áreas de reserva,como é o caso das terras indígenas. Vários fatores ins-piram esse tipo de política, entre eles: presença derecursos naturais próximos das fronteiras; impedir oudificultar o avanço de frentes pioneiras que, no casodo Brasil, são majoritariamente frentes de povoamen-to ou de exploração de nacionais; existência de áreasde tensão militar; diminuir os custos da infra-estru-tura de defesa e vigilância; reconhecimento da ocu-pação do território por grupos locais. O termo “zona-tampão” é valido no sentido de coibir movimentosmigratórios não indígenas e dar coberturainstitucional às áreas culturais indígenas e está pre-sente principalmente no Arco Norte (MIN, 2005: 145).No Arco Sul, as interações tipo zona tampão são me-nos freqüentes e estão presentes principalmente nafronteira com Argentina.

As interações fronteiriças denominadas frentes ca-racterizam-se por dinâmicas espaciais de povoamen-to, como a frente indígena ou frente militar e podemser identificadas em momentos diferentes da históriaterritorial (MIN, 2005: 146).

As interações capilares são observadas no nível lo-cal, através de trocas difusas entre vizinhos fronteiri-ços com limitadas redes de comunicação, e resultamde zonas de integração espontânea. O Estado inter-vém pouco, não patrocinando a construção de infra-estrutura de articulação transfronteira. Destacam-seneste tipo de interação: a fronteira entre o Mato Gros-so do Sul e o Paraguai; entre Santa Catarina e o extre-

mo-noroeste do Rio Grande do Sul com a Argentina;e entre o extremo-sudeste do Rio Grande do Sul e oUruguai (MIN, 2005: 146).

Na interação transfronteiriça tipo sinapse há pre-sença de alto grau de troca entre as populaçõesfronteiriças. É ativamente apoiada pelos Estados con-tíguos, que geralmente constroem em certos lugaresde comunicação e trânsito, infra-estrutura especiali-zada e operacional de suporte, mecanismos de apoioao intercâmbio e regulamentação de dinâmicas, prin-cipalmente mercantis. Na sinapses, os fluxos comer-ciais internacionais se justapõem aos locais (MIR,2005: 147).

Outro conceito muito utilizado em se tratando deregiões de fronteira é o de cidades-gêmeas. Na escalalocal/regional, as cidades-gêmeas referem-se à situa-ção de municípios lindeiros que apresentam umaconurbação ou semi-conurbação com localidade dopaís vizinho. Correspondem ao meio geográfico quemelhor caracteriza a zona de fronteira (inclui as faixasde fronteira brasileira e do país estrangeiro) e são osalvos principais prioritários das políticas públicas. Assimetrias e assimetrias entre as cidades-gêmeas nemsempre decorrem de diferenças no nível de desenvol-vimento dos países e sim de sua própria dinâmica eda função que exercem para os respectivos países(MIN, 2005: 152).

As cidades gêmeas na fronteira estudada são 16:a) na Fronteira RS-Uruguai: Chuí, Jaguarão, Santanado Livramento, Quarai; b) na fronteira RS-Argentina:Barra do Quarai, Uruguaiana, Itaqui, São Borja e Por-to Xavier; c) na fronteira SC-Argentina: DionísioCerqueira; d) na fronteira PR-Paraguai: Foz do Iguaçu,Guairá; e) na fronteira MS-Paraguai: Paranhos, PontaPorã, Bela Vista e Porto Murtinho.

Laços históricos de longa data estão presentes es-pecialmente na fronteira com Uruguai e Argentina(ocupação de campos naturais por estâncias de cria-ção de gado e a influência guarani e missões jesuíticasdo século XVIII). O Arco Sul possui fronteiras maispermeáveis e de interações mais intensas com os pa-íses vizinhos, caracterizadas como de tipo sinapsescom segmentos de interação capilar, que estão sendoreestruturadas desde a criação do MERCOSUL. Atual-mente, as interações com os países vizinhos são fun-dadas na expansão de interesses comerciais e de imi-grantes brasileiros nos países limítrofes. No Paraguaivivem cerca de 350 mil brasileiros e seus descenden-

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tes. Na Argentina tal relação é menos intensa devidoà implantação pelos argentinos de reservas naturaiscomo zonas-tampão para dificultar a imigração e acompra de terras por brasileiros. Tal defesa é quebra-da por algumas cidades-gêmeas e por iniciativas deintegração rodoviária no âmbito do Mercosul (MIN,2005:62). O Uruguai tem uma fronteira das mais in-tegradas com presença de várias cidades-gêmeas e forteinteração, com diversas iniciativas de acordos bilate-rais. Desde 1989, vigora acordo para o desenvolvi-mento das zonas de fronteira. Recentemente (abrilde 2004), foi assinado acordo para permissão de resi-dência estudo e trabalho a nacionais fronteiriços bra-sileiros e uruguaios.

Ainda que em termos populacionais, os municí-pios da linha de fronteira não tenham grande rele-vância, sua presença é mais importante nos Arcos Sule Central, que abrigam também o maior número decidades gêmeas e é neles que ocorrem as principaisinterações transfronteiriças (Machado,1998). Poten-cialmente, estes municípios de divisa internacionalsão os espaços de maior procura por serviços de saú-de por estrangeiros e brasileiros não residentes e porisso constituíram o universo de municípios da pes-quisa.

III.1 Os municípios estudados

O universo da pesquisa foram os 69 municípiosbrasileiros localizados na linha de fronteira comUruguai, Paraguai e Argentina países membros doMERCOSUL na época de sua fundação. Destes, 29 per-tencem ao Estado do Rio Grande do Sul (RS), sen-do 18 municípios de fronteira com a Argentina e11 municípios de fronteira com o Uruguai, 10 mu-nicípios pertencem ao Estado de Santa Catarina (SC)fazendo fronteira com a Argentina, 19 municípiospertencem ao Estado do Paraná (PR), sendo 8 defronteira com a Argentina e 11 com o Paraguai e,11 municípios pertencem ao Estado do Mato Gros-so do Sul (MS) fazendo fronteira com o Paraguai.

Delineiam-se assim três segmentos de fronteirase considerados os países, e, seis segmentos de fron-teira se considerados países e estados. A lista dos 69municípios por fronteira pesquisados é apresenta-da no quadro 1. Os resultados aqui analisados refe-rem-se às respostas dos secretários municipais desaúde de 67 localidades: 36 (54%) fazendo frontei-ra com Argentina, 21 (31%) com Paraguai e 10(15%) com Uruguai e estão apresentados por seg-mentos de fronteira por países e/ou estados

As localidades brasileiras da linha de fronteira doMERCOSUL pesquisadas apresentam variados perfispopulacionais, contudo, na maioria, são municípiosde pequeno porte. Mais da metade dos municípios(55%) tem até de 10 mil habitantes e 91% até 50 milhabitantes. A distribuição dos municípios por porteao longo da fronteira é similar, destacando-se, contu-do o segmento de fronteira com a Argentina comproporção de municípios lindeiros menores de 10 milhabitantes acima da média: 67% (tabela 1) (mapa 1).

Correspondendo ao pequeno porte dos municí-pios, a estrutura assistencial do SUS é predominante-mente de atenção básica com unidades presentes emquase todos os municípios (97%). Em geral, o núme-ro de unidades básicas de saúde (UBS) é pequeno: 40%dos municípios dispõem de apenas até duas UBS e80% de até 5 UBS segundo informações prestadaspelos secretários municipais de saúde (SMS). Um ter-ço dos municípios estudados não possui hospital eoutros 31% tem menos de 50 leitos do SUS. A aten-ção especializada prestada por policlínicas está pre-sente em apenas 15% (tabela 1).

O Programa de Saúde da Família está implantadoem 80% dos municípios e a cobertura populacional éelevada. Mais da metade (54%) dos municípios cobreentre 81 e 100% da sua população, ainda que o nú-mero de ESF seja pequeno: em 46% dos municípiosatuam uma a duas ESF e em 27% atuam 3 a 5 ESF.

III. CARACTERÍSTICAS DA FRONTEIRA E DOS MUNICÍPIOS DE FRONTEIRA ESTUDADOS

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Paraná fronteira com Argentina

BarracãoBom Jesus do SulSanto Antônio do SudoestePranchitaPérola D´OestePlanaltoCapanemaSerranópolis do Iguaçu

Paraná fronteira com Paraguai

Foz do IguaçuSanta Terezinha de ItaipuSão Miguel do IguaçuItaipulândiaMissalSanta HelenaEntre Rios do OesteMarechal Cândido RondonPato BragadoMercedesGuaíra

Mato Grosso do Sul fronteira com Paraguai

Mundo NovoJaporãSete QuedasParanhosCoronel SapucaiaAral MoreiraPonta PorãAntonio JoãoBela VistaCaracolPorto Murtinho

Rio Grande do Sul fronteira com Uruguai

ChuíSanta Vitória do PalmarJaguarãoHervalPedras Altas (9)Aceguá (10)BagéDom PedritoSantana do LivramentoQuaraíBarra do Quaraí

Rio Grande do Sul fronteira com Argentina

UruguaianaItaquiSão BorjaGarruchosSão NicolauRoque GonzalesPirapóPorto XavierPorto LucenaPorto Vera CruzAlecrimPorto MauáNovo MachadoDr. Maurício CardosoCrissiumalTiradentes do SulEsperança do SulDerrubadas

Santa Catarina fronteira com a Argentina

ItapirangaTunápolisSanta HelenaBelmonteBandeiranteGuaraciabaParaísoSão José do CedroPrincesaDionísio Cerqueira

Municípios brasileiros de linha de fronteiracom Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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Tabela 1. Caracterização dos municípios brasileiros pesquisados da linha de fronteiracom Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

Países de FronteiraArgentina

n = 36Paraguain = 21

Uruguain = 10

Totaln = 67Variáveis

n % n % n % n %

Porte populacional (1) 36 53,7 21 31,3 10 14,9 67 100,00 a 10 mil 24 66,7 9 42,9 4 40,0 37 55,210.001 a 50 mil 10 27,8 10 47,6 4 40,0 24 35,850.001 e mais 2 5,6 2 9,5 2 20,0 6 9,0

Índice de Desenvolvimento Humano (2)

Até 0,700 1 2,8 3 14,3 0 0,0 4 6,00,701 a 0,800 28 77,8 14 66,7 7 70,0 49 73,1Acima de 0,800 7 19,4 4 19,0 2 20,0 13 19,4

Estrutura Assistencial do SUSNúmero de leitos (3)

0 17 47,0 2 9,5 2 20,0 21 30,31 a 49 9 25,0 9 42,9 3 30,0 21 31,350 e mais 10 27,8 10 47,6 5 50,0 25 37,3

Possui Policlínica (3) 3 8,3 4 19,0 3 30,0 10 14,9Número de Unidades Básicas de Saúde (3)

0 1 2,8 1 4,8 0 0,0 2 3,01 a 2 15 41,7 6 28,6 4 40,0 25 37,33 a 5 15 41,7 10 47,6 2 20,0 27 40,36 e mais 5 13,9 4 19,0 4 40,0 13 19,4

Cobertura PSF (4)

0% 4 11,1 2 9,5 6 60,0 12 17,91 a 50% 4 11,1 6 28,6 2 20,0 12 17,951 a 80% 2 5,6 5 23,8 0 0,0 7 10,581 a 100% 26 72,2 8 38,1 2 20,0 36 53,7

Perfil do secretário municipal de saúde (3)

Experiência prévia mínima de 2 anos emgestão pública

22 61,1 7 33,3 10 100,0 39 58,2

Formação de nível superior 19 52,8 13 61,9 9 90,0 41 61,2Tem ou teve cargo político eletivo 15 41,7 5 23,8 4 40,0 24 35,8

Fonte: (1) Contagem populacional para os anos intercensitários, IBGE, 2004(2) Índice de Desenvolvimento Humano no Brasil , Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, 2003. N=66 - ummunicípio sem informação(3) NUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ – Pesquisa Saúde na Fronteira(4) Departamento de Atenção Básica DAB/SAS/ Ministério da Saúde – dados de dezembro de 2005

III. CARACTERÍSTICAS DA FRONTEIRA E DOS MUNICÍPIOS DE FRONTEIRA ESTUDADOS

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IV. Fluxos e trânsitos transfronteiriços

Para se conhecer facilidades de acesso e deman-das potenciais foram investigadas algumas caracte-rísticas dos fluxos transfronteiriços. Por se trataremde municípios lindeiros, a distância entre o centrodo município brasileiro e a principal localidade es-trangeira de fronteira é de até 20km para a maioria(55%) dos municípios estudadas, sendo mais próxi-mos na fronteira com Uruguai (tabela 2).

Na grande maioria (84%) dos municípios estuda-dos ocorre algum tipo de fluxo e trânsito na frontei-ra. Os fluxos e trânsitos na fronteira são mais inten-sos nas divisas com Paraguai e Uruguai do que com aArgentina. Em apenas 11 (16%) municípios, os SMSinformaram não existir qualquer trânsito, sendo quea maior parte destes municípios (8) localiza-se na di-visa de Santa Catarina com Argentina, fronteira comcaracterísticas de zona-tampão pela presença de re-servas florestais. Entre os segmentos de maior fluxotransfronteiriço destacam-se os segmentos do Paranáe do Mato Grosso do Sul fronteira com Paraguai,ambos com 100% dos municípios apresentando al-gum fluxo ou trânsito. Contudo somente em 28%das localidades estudadas existe transporte públicoregular (ônibus) entre o município e a localidade es-trangeira de fronteira, o que facilitaria a circulação depessoas (tabela 2) (mapa 2).

Entre os diversos tipos de fluxo e trânsitostransfronteiriço apontados pelos SMSs, os de maiorintensidade são aqueles de pessoas com familiaresresidentes do outro lado da fronteira consideradosfreqüente ou muito freqüente por 64% dos SMSs. Osfluxos de trabalhadores que moram de um lado dafronteira e trabalham em outro; de mercadorias emcaminhões; de comprista, sacoleiro ou chibeiro; e deturistas em trânsito ou em visita estão presentes namaior parte dos municípios (60% ou mais) e são fre-qüentes ou muito freqüentes em 40% ou mais dosmunicípios. A fronteira com o Uruguai é a mais per-meável sendo todos os tipos de trânsito assinaladoscomo freqüente ou muito freqüente por 70% ou maisdos secretários municipais de saúde, concernente comhistóricas interações presentes na região do pampagaúcho (tabela 2).

Na percepção de cerca da metade dos SMS (46%),o fluxo de pessoas é mais importante da cidade es-trangeira de fronteira em direção ao seu município,do que do município para a localidade estrangeira(18%). Para um terço dos SMS o fluxo é igualmenteimportante nas duas direções.

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Tabela 2. Características da fronteira, fluxos e trânsitos transfronteiriços segundo secretários municipais de saúde.Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

Países de FronteiraTotaln=67Variáveis Argentina

n = 36Paraguain = 21

Uruguain = 10

n %Distância de até 20 km do centro do município aocentro da cidade estrangeira de fronteira 47,2 61,9 70,0 37 55,2

Existência de fluxo e trânsito com cidades estrangeiras 72,2 100,0 90,0 56 83,6

Existência de transporte público regular entre omunicípio e a cidade estrangeira de fronteira 8,3 52,4 50,0 19 28,4

Tipos de fluxo e trânsito freqüente e muito freqüentena passagem de fronteira

Pessoa com familiares residentes do outro lado dafronteira

80,5 90,4 70,0 43 64,2

Turista em trânsito ou em visita 44,4 57,1 80,0 36 53,7Trabalhador que mora de um lado da fronteira etrabalha em outro

27,8 61,9 80,0 31 46,3

Mercadoria em caminhões ou outro meio detransporte de cargas

30,5 61,9 70,0 31 46,3

Comprista / sacoleiro / chibeiro 44,5 33,3 70,0 30 44,8Estudante que mora de um lado da fronteira e estudaem outro 11,1 47,6 80,0 22 32,8

Direção do fluxo de pessoas entre o município e acidade estrangeira de fronteira*

Da cidade estrangeira de fronteira para o município 38,5 47,6 66,7 26 46,4Igualmente importante nas duas direções 34,6 42,9 22,2 20 35,7Do município para a cidade estrangeira de fronteira 26,9 9,5 11,1 10 17,9

Fonte: NUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ – Pesquisa Saúde na Fronteira.* Nos 56 municípios que há fluxo transfronteiriço.

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A busca de atendimento por estrangeiros no SUSvaria conforme região, tipo de fronteira e país fron-teiriço. Os secretários municipais de saúde informa-ram existência de demanda de estrangeiros para aten-dimento no SUS em 75% dos municípios (50) sendofreqüente ou muito freqüente em 36% (24) das loca-lidades. Esta demanda é mais importante nos segmen-tos de fronteira do RS com Uruguai, e do MS comParaguai (tabela 3) (mapa 3).

Na percepção dos SMS, a busca de brasileiros resi-dentes nas cidades estrangeiras de fronteira por aten-dimento no SUS é ainda mais elevada do que a de-manda de estrangeiros: 87% (58) dos gestores infor-maram demanda de brasileiros não residentes no Bra-sil em seus municípios, sendo freqüente ou muitofreqüente em 67% (45 localidades) (Tabela 3) (mapa4). Nas fronteiras do Paraná (com Paraguai e Argenti-na) e do Mato Grosso do Sul com Paraguai, a deman-da de brasileiros não residentes é mais intensa, sendofreqüente e ou muito freqüente em 80 a 90% dosmunicípios. Nestes dois últimos segmentos, municí-pios brasileiros fazem fronteira com propriedades ru-rais em território paraguaio arrendadadas ou perten-centes a brasileiros (cultivo de soja e criação de gado),estimando-se em 350 mil os brasileiros e descenden-tes de brasileiros residentes no Paraguai (“brasiguaios”)(Machado,1998). Estes brasileiros moradores em ter-ras paraguaias da faixa de fronteira procuram comfreqüência pelos serviços de saúde dos municípiosbrasileiros, informaram os SMSs.

Perguntados quanto ao direito dos estrangeiros aatendimento no SUS municipal, 70% dos SMSs afir-maram que todos os estrangeiros têm direito ao aten-dimento. Do mesmo modo, todos secretários infor-maram que prestam algum tipo de atendimento aosestrangeiros que buscam os serviços do SUS munici-pal. Todavia em 28% dos municípios, os estrangeirossão atendidos apenas em situações de emergência, in-dicando-se o retorno ao país de origem após o primei-ro atendimento. Um terço (36%) dos SMS informouque presta atendimento a estrangeiros para outros ser-

V. Acesso e demanda de estrangeiros no SUS

viços além da emergência, mas depende do tipo deação necessitada, e outro terço (36%) que presta aten-dimento para todos os serviços disponíveis (tabela 3).

A positividade destas respostas encontra umcontraponto com as barreiras de acesso estabelecidaspara o atendimento no SUS existentes em parte daslocalidades. Em 69% é exigido documento de identi-dade e em 49% dos municípios comprovante de resi-dência e documento de identidade. Estas barreirasburocráticas dificultam o acesso de estrangeiros e bra-sileiros não residentes ao SUS e os obrigam a recorrera subterfúgios para acessar ao tratamento necessita-do, como a apresentação de comprovante de residên-cia de parentes ou amigos brasileiros. Para controlarestas estratégias individuais de acesso, em algumaslocalidades foi implantado um cartão municipal desaúde – de apresentação obrigatória no ato da con-sulta. O cartão é periodicamente atualizado em visi-tas domiciliares dos agentes comunitários de saúdepara comprovar a presença do estrangeiro na residên-cia. Para novos moradores, estabelece-se um períodode carência de 30 dias para atendimento pela UBS.Ilustrativo das barreiras de acesso a não residentes nomunicípio são os dizeres de cartazes fixados na re-cepção de unidades de saúde visitadas em clara viola-ção a direito dos pacientes: “Favor trazer conta de águaou luz para comprovar endereço ao consultar. A Direção”.Ou “Pacientes internados somente receberão visitas coma entrega do comprovante de endereço para enfermagem,recepção ou administração”. Note-se que estes obstácu-los ao atendimento vigoram para qualquer pacientenão munícipe, seja ele estrangeiro ou brasileiro resi-dente em outro município.

Para os 53 secretários municipais de saúde queinformaram a existência de procura por atendimen-to no SUS por parte de estrangeiros e ou brasileirosnão residentes foram perguntadas características des-ta demanda quanto à nacionalidade, vínculos com opaís e tipos de procura.

Guardando alguma correspondência com a dis-tribuição dos municípios ao longo das fronteiras dos

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países, em sua maioria (54%) localizados na divisacom a Argentina, é esta a nacionalidade dos estran-geiros atendidos em maior proporção de municípios(43%), segue-se 36% dos municípios com demandapredominante de paraguaios e 19% dos municípioscom maior procura por uruguaios (tabela 4).

A presença de famílias binacionais nas localida-des lindeiras é comum. Perguntados sobre quais asrelações dos estrangeiros que procuram o SUS com oBrasil, os SMS indicaram predominantemente maiorbusca de estrangeiros com familiares no Brasil, infor-mada como freqüente ou muito freqüente em 66%

Tabela 3. Acesso e demanda de estrangeiros e brasileiros não residentes ao SUS segundo os secretários de saúde.Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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dos municípios em que ocorre alguma demanda deestrangeiros ao SUS (n=53) (tabela 4). Já a demandade estrangeiros residentes no município é freqüenteou muito freqüente em mais da metade dos municí-pios (53%) e em cerca da um terço dos municípios háprocura de serviços do SUS por parte de estrangeiro

trabalhador no Brasil e residente nas cidades estran-geiras (36%), e, de estrangeiro em trânsito ou de pas-sagem (34%)

Na maior parte dos municípios (87%) a demandaé espontânea, e em 13% ocorre também por encami-nhamento pelos profissionais de saúde da cidade deorigem, políticos brasileiros ou estrangeiros ou peloconsulado do país de origem.

Ainda que na percepção dos gestores locais a pro-cura de estrangeiros por serviços do SUS seja elevada,gerando dificuldades para a oferta e financiamentodos serviços, esta demanda não é dimensionada. Amaioria dos municípios (69%) não registra os atendi-mentos como prestado a estrangeiros (Tabela 4).Apenas 40% (21 em 53) dos SMSs de municípios queatendem estrangeiros apresentou estimativa mensalde atendimentos a estrangeiros e somente três mu-nicípios informaram os números registrados de aten-dimentos. Vinte e um secretários municipais conse-guiram indicar estimativas de médias mensais de aten-dimentos a estrangeiros que variaram entre poucoscasos a 500 atendimentos mensais. Oito SMSs esti-maram realizar em média até 10 atendimentos men-sais a estrangeiros; sete informaram estimativas entre11 e 100 casos, e seis SMS estimaram entre 100 e 500casos atendidos por mês.

Aos 53 secretários que informaram existir procu-ra de atendimento no SUS por parte de estrangeiros,foi perguntado quais ações estrangeiros buscam e comque freqüência. Em cerca da metade ou mais dos mu-nicípios é freqüente ou muito freqüente a busca pormedicamentos (62%), consulta médica de atençãobásica (60%), imunização (50%) e parto (50%), exa-mes patologia clínica (49%); emergência e pré-natal(45%) (tabela 5) (mapas 5 e 6). Menores proporçõesde SMS indicaram como freqüente ou muito freqüentea demanda de estrangeiros por serviços maisespecializados tais como internação hospitalar (40%),atenção odontológica (38%), serviços de radiodiag-nóstico e imagem (38%). A busca por consulta médi-ca especializada (28%) e procedimentos de alta com-plexidade (13%) foram as demandas menos mencio-nadas, o que é condizente com o pequeno portepopulacional e a baixa oferta de atenção especializa-da nos municípios estudados (tabela 5).

Observam-se diferenças nas demandas entre ossegmentos de fronteira por país. As maiores procurasocorrem em localidades que fazem divisa com o

V. ACESSO E DEMANDA DE ESTRANGEIROS NO SUS

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Tabela 4. Características da demanda de estrangeiros e brasileiros não residentes ao SUS segundo os secretáriosde saúde. Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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Paraguai, nas quais 70% ou mais dos secretários mu-nicipais informaram demanda de estrangeiros fre-qüente ou muito freqüente para nove dos doze servi-ços listados na pergunta (tabela 5). Nesta fronteira,os serviços mais procurados são parto, emergência,medicamentos e consultas de AB. Segue-se a frontei-ra com Uruguai, na qual a proporção de municípioscom procura freqüente é inferior: metade dos SMSinformou demanda freqüente ou muito freqüentepara apenas três das ações listadas. Na fronteira comArgentina, as proporções de secretários brasileiros queinformaram procura freqüente para os serviçoslistados foram em geral as menores em comparaçãocom os municípios de fronteira com Paraguai e Uru-guai. Todavia, é necessário destacar que ainda que asproporções de municípios em que há procura sejammais elevadas na fronteira com Uruguai, em compa-ração com Argentina, o número absoluto de municí-pios com demanda por ações de saúde é maior nafronteira com a Argentina (Tabela 5). Medicamentos,consulta AB, imunização, pré-natal e atenção odon-tológica são os serviços procurados em maior núme-ro de municípios da fronteira com Argentina.

A busca de estrangeiros por atendimento no SUSestá relacionada a características da fronteira e da ofer-ta de serviços de saúde dos municípios lindeiros.Municípios mais próximos e de maior portepopulacional tendem a atrair maior demanda de es-trangeiros. A presença de hospital do SUS está asso-ciada a uma busca freqüente e muito freqüente porestrangeiros (p-valor=0,005), por brasileiros não resi-dentes (p-valor=0,044) e por serviços de internação(p-valor=0,043) e parto (p-valor=0,034). Os municí-pios que dispõem de três ou mais UBS apresentamtambém uma procura mais freqüente por consultamédica de atenção básica (p-valor=0,033) (tabela 6).

Vale lembrar que a situação do Arco Sul é diferen-ciada, apresentando maior intensidade das interaçõestransfronteiriças e melhor oferta de serviços de saúdedo que nos Arcos Norte e Central da fronteira brasi-leira, conforme aponta Peiter em seu estudo panorâ-mico sobre condições de vida e disponibilidade deserviços de saúde nos 569 municípios da faixa de fron-teira brasileira (Peiter, 2007).

V. ACESSO E DEMANDA DE ESTRANGEIROS NO SUS

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Tabela 6. Busca de atendimento por estrangeiros no SUS municipal segundo características da fronteira e oferta de serviços desaúde. Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

Município possui hospitalSim Não Total

Busca de Atendimento no SUSfreqüente e muito freqüente

n % n % n %p-valor

Por estrangeiros 17 70,8 7 29,2 24 100,0 0,005Por brasileiros residentes na cidade estrangeira defronteira

31 68,9 14 31,1 45 100,0 0,044

Por internação 17 81,0 4 19,0 21 100,0 0,043Por parto 21 77,8 6 22,2 27 100,0 0,034

Município possui 3 ou mais UBSSim Não Total

Busca de Atendimento no SUSfreqüente e muito freqüente

n % n % n %p-valor

Por consulta médica de Atenção Básica 20 62,5 12 37,5 32 100,0 0,033Por medicamento 22 66,7 11 33,3 33 100,0 1,004

Fonte: NUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ – Pesquisa Saúde na Fronteira

Tabela 5. Tipo de atendimento buscado freqüente e muito freqüentemente por estrangeiros no SUS do município por país defronteira, segundo secretários municipais de saúde. Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

Argentina n = 24

Paraguain = 19

Uruguain = 10

Totaln=53*

Ações demandadas

n % n % n % n %

Medicamentos 13 54,2 15 78,9 5 55,6 33 62,3Consulta médica de atenção básica 11 45,8 15 78,9 6 66,7 32 60,3Imunização 9 37,5 14 77,8 4 44,4 27 50,1Parto 8 40,0 16 88,9 3 33,3 27 50,1Exame de patologia clínica 6 30,0 14 73,7 6 60,0 26 49,1Emergência 6 26,1 15 78,9 3 30,0 24 45,3Pré-natal 9 37,5 12 63,2 3 30,0 24 45,3Internação hospitalar 6 33,3 13 72,2 2 22,2 21 39,6Atenção odontológica 9 37,5 7 38,9 4 44,4 20 37,7Radiodiagnóstico e imagem (médiacomplexidade)

4 28,6 12 80,0 4 40,0 20 37,7

Consulta médica especializada 5 25,0 6 42,9 4 40,0 15 28,3Procedimentos de alta complexidade 3 20,0 2 28,6 2 25,0 7 13,2

Fonte: NUPES/DAPS/ENSP/FIOCRUZ – Pesquisa Saúde na Fronteira* 53 municípios que informaram a existência de procura por atendimento no SUS por parte de estrangeiros e ou brasileiros nãoresidentes.

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Foi solicitado aos SMSs que indicassem, de acor-do com sua percepção e experiência, os motivos quelevam estrangeiros a buscar atendimento pelo SUSno município a partir de uma lista de possíveis moti-vos. A proximidade geográfica com o município(68%), a ausência ou insuficiência de serviços públi-cos de saúde no país de origem (66%), a facilidade deser atendido (60%), a urgência ou gravidade do caso(60%), e, a qualidade da atenção à saúde no SUS (58%)foram motivos de procura apontados pela maioriados SMSs entrevistados (tabela 7).

A busca de estrangeiros por atenção à saúde trazdificuldades para a gestão do SUS com repercussõessobre o financiamento das ações e serviços de saúde,uma vez que parte dos repasses federais é alocada namodalidade per capita não sendo contabilizada apopulação itinerante. Esta foi a principal dificuldade,apontada por 74% dos SMS: “a demanda estrangeirasobrecarrega os serviços de saúde e os recursos não sãosuficientes para atender a todos”, como expressou umdos SMSs entrevistados.

A busca de atendimento pelo SUS por parte dosestrangeiros resulta também em dificuldades na ga-rantia da referência regional e na continuidade dotratamento no país de origem, apontadas por 68%dos SMSs (tabela7). Como o atendimento ao estran-geiro não está regulamentado é difícil garantir, apóso primeiro atendimento no município, a continui-dade do tratamento, seja para os necessários encami-nhamentos para atenção mais especializada em ou-tras cidades brasileiras – dificuldade apontada por 90%dos SMS de localidades de fronteira com Uruguai eMS com Paraguai –, seja para a continuidade da aten-ção no país de origem. Este foi problema apontadopela totalidade dos SMSs de localidades de fronteiracom o Paraguai, destacando empecilhos ao acessonaquele país e indicando interesse na prestação de

VI. Motivos de busca e dificuldades para a gestãodecorrentes da demanda de estrangeiros

atenção de qualidade (tabela 7). O retorno dos pacien-tes é por vezes causa de conflito. Nas palavras de umdos secretários entrevistados na fronteira com oParaguai, “a solicitação de alguma contrapartida paraatendimento de pacientes do Paraguai, como o auxiliopara o transporte de retorno nem sempre é atendida pelasautoridades do país vizinho, ainda que a demanda deestrangeiros seja freqüente, causando aumento das filas einclusive conflitos com pacientes brasileiros”.

Por outro lado, a cooperação entre países pode serimprescindível para garantia do cuidado integral aosbrasileiros. Muitos municípios de fronteira são isola-dos dos grandes centros sendo necessário percorrerlongas distâncias para acessar serviços especializados,o que para pacientes crônicos pode ser uma via crucis.Esta foi uma das implicações do fato do municípioestar localizado na fronteira para a gestão do SUS,apontada pelos SMSs. A formalização de acordos defronteira poderia facilitar a continuidade de cuida-dos também para brasileiros, pois como enfatizou umSMS, “muitas vezes o serviço de saúde necessitado maispróximo está em território estrangeiro”.

Outras implicações explicitadas pelos gestores,dados os fluxos transfronteiriços, foram a dificulda-de para vigilância e controle epidemiológicos de de-terminadas doenças, para a programação de imuni-zação e para cálculo de estimativas de coberturapopulacional, pois bebês de mães que vieram parausufruir de parto hospitalar no Brasil podem serregistrados como brasileiros e depois retornam ao paísde origem não sendo vacinados no município. “Oque acaba prejudicando alguns indicadores como, porexemplo, de cobertura vacinal e pré-natal. Há mulheresque chegam à cidade apenas no momento do parto, sem arealização do pré-natal no município,” comentou umdos SMSs.

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Tabela 7. Motivos de busca por atendimento no SUS por estrangeiros e dificuldades causadas para gestão segundosecretários de saúde. Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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PESQUISA SAÚDE NAS FRONTEIRASVI. MOTIVOS DE BUSCA E DIFICULDADES PARA A GESTÃO CAUSADAS PELA DEMANDA DE ESTRANGEIROS

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Buscando enfrentar as dificuldades apontadas pararesponder as demandas, iniciativas locais de coope-ração entre gestores brasileiros e estrangeiros sãoempreendidas na região de fronteira, tendo sido ob-servada a presença de algum tipo de cooperação emsaúde em cerca da metade dos municípios pesquisados(48%).

Relações formais ou informais entre o SUS muni-cipal e os serviços públicos de saúde da cidade estran-geira de fronteira e iniciativas relativas a questões desaúde na fronteira são mais presentes nos segmentosde fronteira do RS com Uruguai, do Paraná comParaguai e MS com Paraguai (tabela 8 e mapa 7). Ostipos de cooperação mais freqüentes são fórum ougrupo internacional no município ou região sobresaúde na fronteira (apontado por 25% dos SMSs), re-alização de ações conjuntas de controle de vetores(23%), troca regular de informações epidemiológicas(16%) e ações conjuntas de vigilância ambiental (16%)(tabela 8). Muitas vezes os contatos são informais,ocorrendo colaboração no atendimento a pedido daautoridade de um outro país ou contatos diretos en-tre profissionais de saúde com escambo de serviçosnão existindo iniciativas formalmente estabelecidas(18%).

São exemplos dessas iniciativas de cooperação como outro país especificadas pelos SMSs: atividades con-juntas para prevenção do dengue, Aids e febre ama-rela, preparação de calendário unificado de imuniza-ção, campanhas de vacinação, cursos de capacitaçãoprofissional em programas de saúde pública, seminá-rios binacionais em saúde co-financiados, reuniõesconjuntas de conselhos locais de saúde, remoção depacientes em urgências, permuta e cessão de materiale equipamentos.

Entre os fóruns de discussão sobre a saúde nas fron-teiras destacam-se: i) a atuação do Grupo de Trabalho

VII. Presença de estratégias locais para a cooperaçãointernacional em saúde

para a Integração das Ações em Saúde, coordenadopela empresa pública Itaipu Binacional na fronteiraBrasil/Paraguai, integrado por representantes de go-verno locais, departamentais e nacionais com plane-jamento e execução conjunta de ações nas áreas deserviços de saúde, vigilância em saúde, informaçõesem saúde e formação profissional; ii) e a ComissãoBinacional Assessora de Saúde da Fronteira Brasil-Uru-guai com participação de representantes dos gover-nos nacionais e do estadual do RS com atuação emáreas de vigilância epidemiológica e ambiental, saú-de do trabalhador integração assistencial e hidatidose(Guimarães & Giovanella, 2005).

Os SMSs reconhecem a insuficiência de iniciati-vas e propõem temas prioritários de cooperação. Doisterços dos SMSs (70%) consideram necessário firmaracordos entre o município brasileiro e a cidade es-trangeira vizinha para tratar de questões de saúde nafronteira, principalmente nas áreas de: i) vigilânciaepidemiológica de diversos agravos como dengue,malária, AIDS, tuberculose, hepatites; ii) de prestaçãode serviços bilateral e circulação de pacientes paraatenção básica, pré-natal, parto, hospitalares eespecializados; e iii) de exercício profissional. Na fron-teira com Uruguai, a ênfase esteve no estabelecimen-to de acordos para prestação de serviços de saúde,principalmente para possibilitar atendimento espe-cializado de usuários do SUS no Uruguai e, para apermissão da atuação dos profissionais de saúde dasduas nacionalidades em ambos os territórios. Na fron-teira com Paraguai, SMSs apontaram a necessidadede acordos para contrapartidas ou ressarcimento fi-nanceiro, dada a percebida elevada demanda de po-pulação paraguaia no SUS. Na fronteira com a Argen-tina, o destaque foi para calendário único de imuni-zações e ações de vigilância epidemiológica.

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Tabela 8. Presença de ações em saúde relacionadas com a situação de fronteira e de estratégias de cooperaçãocom cidade estrangeira de fronteira. Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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PESQUISA SAÚDE NAS FRONTEIRASVII. PRESENÇA DE ESTRATÉGIAS LOCAIS PARA A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL EM SAÚDE

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A busca de atendimento por populações de ou-tros países é uma realidade nos serviços de saúde demunicípios de fronteira, e exerce pressão crescente àmedida que os sistemas municipais de saúde se orga-nizam. Por outro lado, os territórios dinâmicos daszonas de fronteira constituem unidadesepidemiológicas e os problemas de saúde comparti-lhados impõem cada vez mais a realização conjuntade atividades para alcançar o efetivo controle de agra-vos e a garantia de acesso da atenção à saúde. Os dis-tintos desenhos dos sistemas e das políticas de saúdedos países membros do MERCOSUL, sejam nos aspectosfísicos, financeiros e humanos; sejam nas abordagensorganizacionais da assistência; aliados às estratégiasindividuais para garantia de acesso intensificam difi-culdades já presentes nos sistemas de saúde nestesterritórios tanto no campo da vigilância em saúdecomo para o acesso aos serviços e, conlevam àcomplexificação de impactos inesperados do proces-so de integração regional nos serviços de saúde.

As dificuldades para garantia do direito à saúdenestas circunstâncias apresentam novas facetas edubiedade quanto à interpretação do deste direito.Constatou-se durante a realização da pesquisa di-versidade de concepções de “estrangeiro”. Nas en-trevistas, parte dos SMS considerou como estran-geiros: brasileiros não residentes no país, brasilei-ros com dupla nacionalidade, e por vezes filhos debrasileiros, nascidos no outro país, ou filhos de es-trangeiros nascidos no Brasil, sem documentaçãobrasileira por insuficiência de renda familiar pararegularizar a cidadania.

Ainda que a maioria dos SMSs tenha consideradoque estrangeiros têm direito ao atendimento no SUS,barreiras de acesso restritivas deste direito foramidentificadas, ferindo a legislação nacional. No Bra-sil, a Constituição Federal de 1988 ao afirmar a saúdecomo “direito de todos e dever do Estado” e garantiro “acesso universal e igualitário às ações e serviçospara sua promoção, proteção e recuperação” amplioudireitos sociais e a saúde foi consagrada como direito

VIII. Desafios para garantia de acesso aos serviços desaúde aos cidadãos de fronteira

social universal. A Lei 8080 regulamenta o texto cons-titucional, reiterando que “saúde é um direito funda-mental do ser humano, devendo o Estado prover ascondições indispensáveis para seu pleno exercício”.Assim, ainda que a legislação em saúde não se refiraespecificamente ao acesso de estrangeiros ao SUSdepreende-se do texto legal que o direito universal àsaúde transcende aos cidadãos brasileiros natos ounaturalizados, pois se refere a todos os seres huma-nos e que o acesso universal ao SUS deve ser garanti-do às pessoas independente de nacionalidade. Deoutra parte, o artigo 5º da Constituição reza que “To-dos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquernatureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estran-geiros residentes no país a inviolabilidade do direito àvida, à liberdade, à igualdade...”; donde se conclui queestrangeiros residentes têm os mesmos direitos soci-ais dos brasileiros. O que é também afirmado peloEstatuto do Estrangeiro (Lei 6.815 de 19 de agosto de1980) que em seu artigo 95 rege: “O estrangeiro resi-dente no Brasil goza de todos os direitos reconhecidos aosbrasileiros, nos termos da Constituição e das leis.”

Ainda que a legislação para estrangeiros em vigorno país seja retrógrada, anterior à Constituição Fede-ral de 1988 e à criação do SUS e do MERCOSUL – encon-trando-se em processo de reformulação no legislativofederal –, aponta para a garantia de iguais direitos aosestrangeiros residentes com permanência regulamen-tada. Para estrangeiros de cidades fronteiriças toda-via, não há referência no Estatuto do Estrangeiro aoacesso à atenção à saúde, ficando a garantia deste di-reito dependente do poder discricionário da autori-dade local, ainda que seja permitido aos estrangeirosfronteiriços exercer função remunerada, freqüentarescolas e obtenção de Carteira de Trabalho e de Previ-dência Social brasileiras. De outra parte, há dificulda-des burocráticas e financeiras para regularização dasituação de residência ou de cidadania, com presençafreqüente de indocumentados nas localidadesfronteiriças, ficando esta população sem possibilida-des de exigir seus direitos.

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A pesquisa de campo também permitiu observarque na falta de legislação especifica para atendimen-tos a estrangeiros, paradoxalmente, uma melhor or-ganização do sistema de saúde municipal, como porexemplo, a implantação do Programa Saúde da Fa-mília ou a implementação do cartão SUS, pode difi-cultar o atendimento aos estrangeiros ao organizar ademanda e restringir o atendimento aos usuários ca-dastrados. Por outro lado, como apontado por No-gueira, Dal Prá, Fermiano (2007), a inexistência deregras para a atenção, do lado brasileiro favorece de-cisões pessoais dos gestores e profissionais de saúde,dificultando o planejamento de ações integradas efazendo com que usuários não brasileiros permane-çam em incerteza constante quanto ao tipo de aten-dimento que receberão.

As iniciativas de ações conjuntas e os temas deacordos de cooperação apontados pelos SMSs indi-cam ser as fronteiras laboratórios do enfrentamentode dilemas da integração antecipando repercussõesda criação de mercados comuns sobre os sistemas desaúde. Os resultados do estudo ratificam a necessida-de de uma legislação específica para municípios dalinha de fronteira, de modo que a população nelesresidente tenha direitos diferenciados para garantiade acesso integral e humanitário aos serviços de saú-de. A diversidade dos sistemas de saúde nos países dafronteira estudada aponta para acordos binacionaisque considerem a experiência e tradição local de co-operação na fronteira e as especificidades dos siste-mas de saúde dos países.

A realização e implementação de acordos especí-ficos, como o acordo bilateral Brasil-Uruguai além dofortalecimento de instituições supranacionais volta-das para a integração fronteiriça, são fundamentaispara a promoção da cidadania da populaçãofronteiriça (Gadelha, Costa, 2005).

Ainda que perspectivas econômicas tenham ocu-pado lugar de destaque nas negociações entre os pa-íses nos processo de integração, questões sociais têmestado cada vez mais presentes nas agendas daintegração do MERCOSUL. O caso da União Européia éilustrativo das possibilidades de acordos necessáriospara garantia do direito universal à saúde. A UniãoEuropéia reconhece a heterogeneidade dos sistemasde saúde dos países e a garantia de acesso universala serviços de saúde de qualidade. A organização dosistema de serviços e o financiamento (seja por con-

tribuições sociais ou impostos gerais) permanecemuma competência nacional, não estando previstauma uniformização dos sistemas de serviços de saú-de e ainda nos dias atuais, a maior parte dos cida-dãos europeus concorda que as políticas sociais sãoatribuição principalmente dos Estados nacionais(Heien, 2006). Todavia, desde os anos de 1970, su-cessivas legislações ampliaram progressivamente agarantia de atenção à saúde em outro país da União(Guimarães, Giovanella, 2006; Busse, Wismar,Berman, 2002; Leidl, 1998). Atualmente a UE ga-rante acesso transfronteiriço, tendo estabelecidomecanismos de cooperação e compensação. A regu-lamentação garante que o paciente seja tratado comos mesmos direitos dos nativos, isto é, como se fos-se coberto pelo esquema de proteção social em saú-de do país no qual recebe tratamento. A compensa-ção financeira entre os Estados-Membros pelos tra-tamentos prestados é realizada mediante pagamen-tos de despesas individuais, ou por meio de uma taxabásica (flat-rate) relativa ao conjunto de tratamen-tos realizados durante um ano. Outros Estados re-nunciam mutuamente a reclamar ressarcimento tra-tando os pacientes sem solicitar compensação(Bertinato, et all., 2005).

A experiência européia mostra que as decisões depolítica social permanecem uma atribuição dos paí-ses e que as pessoas preferem receber tratamento emseu local de residência, não tendo ocorrido fluxosintensos de pacientes mesmo com acesso liberado.Mostra também a importância da atuação dos Esta-dos nacionais na garantia do direito à saúde e na cons-trução de acordos para enfrentar assimetrias entrepaíses na garantia deste direito. Aponta para necessi-dade de que os mecanismos para acesso devem serfacilitados e uniformes, dando pouca margem a dife-rentes interpretações, pois obstáculos burocráticospodem incidir negativamente sobre o direito do pa-ciente ser tratado em outro país (Hermans, Brouwer,2003). Neste sentido, as iniciativas locais de coopera-ção entre gestores identificadas na pesquisa podemorientar a formulação de diretrizes específicas parasituações de fronteira que possibilitem a melhoria doacesso, integral e humanitário às ações de saúde noMercosul. Por outro lado, nos processos de integraçãoé necessário criar novas institucionalidades e méto-dos de regulação supranacional com participação deatores sociais capazes de gerar consensos e dar legiti-

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midade a instrumentos de decisão em nível regionalna construção da cidadania social, reduzindo desi-gualdades sociais e assimetrias entre países.

A tarefa é das mais complexas e a garantia do di-reito à saúde para além das fronteiras insere-se em

movimento supranacional. É necessário somar vozescom movimentos pela cidadania global, de uni-versalização de direitos, em um mundo sem frontei-ras não apenas para mercados e capitais, mas princi-palmente para as pessoas.

VIII. DESAFIOS PARA GARANTIA DE ACESSO AOS SERVIÇOS DE SAÚDE AOS CIDADÃOS DE FRONTEIRA

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Atualmente, os desenhos políticos assumidos pe-las sociedades ocidentais, resultados dos processos deglobalização, descortinam a exigência de se repensaros direitos sociais, de modo a acompanhar a expan-são dos direitos econômicos em espaços internacio-nais. Significa reconhecê-los e reafirmá-los como con-quistas, enquanto direito humano fundamental e basede todos os demais direitos (Espada, 1997). Todavia,a concretização dos direitos sociais, entre eles o direi-to à saúde, via políticas sociais, não pode ser isoladadas relações econômicas que lhes dãosustentabilidade, desempenhando o Estado um pa-pel crucial na sua implementação, favorecendo ounegando a cidadania social.

O debate, hoje, sobre o tema dos direitos sociais ede saúde não se restringe aos limites dos Estados-Na-ção, mas alarga-se para os blocos regionais, na esteiradas exigências econômicas, conformando novos es-paços de regulação. Dal Prá, Mendes e Mioto (2007)destacam que os processos de integração entre paísestencionam uma mudança do conceito de cidadanianacional para o de cidadania regional ou global. Estanova cidadania regional seria uma cidadaniasuperposta e complementar, como se fora uma duplacidadania, pois não substitui a cidadania nacional dosEstados-membros.

De um lado entende-se que a transposição datitularidade de direitos dos espaços nacionais onde en-contram, em tese, as condições plenas de sua realiza-ção, para espaços internacionais, tem um longo cami-nho a percorrer, ou seja, o tempo necessário para seconstruir institucionalidades que garantam seu efeti-vo exercício. Por outro lado, devido aos processos deglobalização ou em espaços fronteiriços há tendênciade dissociação da cidadania nacional como fonte ge-radora de direitos, isto é, o enfraquecimento da associ-ação entre cidadania e Estado-nação, ampliando-se aspossibilidades de construção de um novo referencialsobre a questão dos direitos e da própria cidadania.

Neste processo, vão se constituindo regras inter-nacionais, sendo que mesmo no cenário suprana-

IX. Integração regional e direito à saúde

cional o principal ator político capaz de interferir naconstrução de um novo patamar de cidadania e degarantia de direitos supranacionais é ainda o Estado-nação. Essa possibilidade compensa a inexistência,até o momento de uma estrutura que possa garantirdireitos, por exemplo, no âmbito do MERCOSUL. Lem-brando que movimentos internacionais no âmbitoda sociedade civil vêm assumindo um papel relevan-te na busca da garantia e defesa dos direitos no planointernacional.

Outro aspecto crucial quando se debate a cidada-nia social e o direito à saúde, especialmente em épo-cas de mundialização e em regiões fronteiriças, é ocritério de atribuição de nacionalidade. A cidadania,tradicionalmente é atributo dos nacionais de um país,conseqüência da filiação, de laços consangüíneosentre os membros de uma mesma nação, sendo ex-cluídos dessa condição os estrangeiros e migrantes. Aesta visão nacionalista de cidadania opõe-se a visãorepublicana, sendo a cidadania atribuída pela aceita-ção do contrato entre as partes, inaugurada pela re-volução francesa. Transpondo a questão para o planojurídico se encontram os critérios de jus sanguinis e ode jus soli. No Brasil, juridicamente o estatuto de ci-dadania é atribuído a partir do jus soli, sendo consi-derados brasileiros natos os nascidos em territóriobrasileiro, ainda que de pais estrangeiros. No caso dejus sanguinis, a atribuição da cidadania ocorre atravésdos laços consangüíneos e vinculada ao conceito denação e, no caso de jus soli, vincula-se à idéia do terri-tório, favorecendo a inclusão de migrantes e estran-geiros residentes (Vieira, 1999).

Assim o critério de atribuição de nacionalidadeno Brasil facilita a inclusão de estrangeiros, poisfilhos de estrangeiros, nascidos no Brasil são consi-derados brasileiros, condição que deveria ser reco-nhecida em nossas fronteiras para o conjunto decidadãos fronteiriços, com facilitação da documen-tação de dupla cidadania.

A construção da cidadania social nos processosde integração regional entre países é processo ain-

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da mais complexo, pois depende da construção denovas institucionalidades e métodos de regulaçãosupranacionais com participação de atores sociaiscapazes de gerar consensos e dar legitimidade às

decisões para garantir direitos sociais, entre estes ode acesso a serviços de saúde, como mostra o exem-plo da União Européia, apresentado a seguir.

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Processos de integração regional entre países são,em geral, motivados por questões econômicas egeopolíticas e se realizam em ritmo mais veloz do queo desenvolvimento de mecanismos de harmonizaçãosocial (Chavez, 2003). Acordos comerciais preferen-ciais estão muito difundidos entre países (Godue,1998; Altvater e Mahnkopf, 1996) e devido ao carátereconômico, processos de integração regional são re-gulados, no âmbito mundial, pela Organização Mun-dial do Comércio (OMS/OMC, 2002).

Acordos econômicos operam transformações pro-gressivas internas nos países para capacitá-los à aber-tura comercial mais ampla (Godue, 1998). Os proces-sos de integração envolvem procedimentos de con-vergências, aproximações e harmonizações de políti-cas e de regulamentações que resultam em aboliçãode barreiras tarifárias legais e institucionais, facilita-ção do acesso às instituições comuns e permissão doconsumo de serviços sociais em outros países. Assim,no campo social significam que direitos e garantiasde cidadania ultrapassam os limites geográficos e le-gais das instituições e práticas de cada país e passam aser compartilhados em todo o bloco. A integraçãonão é, todavia, um fim em si mesma, é antes um pro-cesso em diversos domínios, com diferentes passos,multidimensional e com múltiplos níveis (Threfall,2003).

Os objetivos dos acordos multilaterais firmadosdefinem, o grau da integração entre os países (Bolis,1999), o qual apresenta cinco estágios principais. Oprimeiro denomina-se área de livre comércio e carac-teriza-se pela eliminação de tarifas alfandegárias ecotas entre os países membros. A união alfandegária,por sua vez, significa a adoção de sistema de tarifas ecotas comuns para relações comerciais externas. Omercado comum define-se pela eliminação de restri-

2 Uma versão deste texto foi publicada nos Cadernos de Saú-de Pública em 2006. Guimarães L, Giovanella L Integraçãoeuropéia e políticas de saúde: repercussões do mercado in-terno europeu no acesso aos serviços de saúde. Cadernos deSaúde Pública; 2006, 22(9): 1795-1808.

X. A experiência da União Européia: repercussões domercado interno europeu sobre as políticas de saúde2

ções de circulação de mercadorias, pessoas e capital.A união monetária decorre da harmonização e unifi-cação de políticas e instituições econômicas. A con-federação ou união política formaliza o mais profun-do estágio de integração (Basso, 1998:411).

Os acordos comerciais influem nas políticas desaúde, entretanto, estudos indicam que falta explo-rar em profundidade as relações entre mercado e saú-de (Wismar, Busse, Berman, 2002). A União Européiarepresenta a modalidade mais profunda de integraçãoentre países considerando o estágio dos acordos fir-mados, e demonstra capacidade de resolver tensõesderivadas de disparidades de desenvolvimento entreregiões e países. A experiência européia ilustra a ado-ção de fundos estruturais de desenvolvimento, quesão necessários em processos de integração para re-duzir desigualdades territoriais e sociais, as quais po-dem se configurar como barreiras não tarifárias àintegração (Theofilatou, Maarse, 1998).

X.1 Constituição, desenvolvimento ealargamento da União Européia

A União Européia vem se constituindo há mais demeio século, ao longo do qual incorporou novos Esta-dos-Membros, e em 2004 alcançou o centro e o lesteeuropeu, o Mediterrâneo e o Mar Báltico, totalizando25 países. Os acordos europeus constam de Tratadosgradualmente revisados (Quadro 2). O início ocorreunos anos 1950 quando seis países que na primeira esegunda guerra mundiais tiveram posições antagôni-cas, acordaram questões de infra-estrutura energética,tendo o tema da promoção da paz como pano defundo. Acordos a seguir tiveram por base o mercadode produtos e serviços, a facilitação alfandegária epolíticas comuns de comércio e de agricultura. Nosanos 1970, foi criado o Fundo Europeu de Desenvol-vimento Regional com recursos para executar políti-cas comuns nos campos social, regional e ambiental,e instituído o Sistema Monetário Europeu que pas-sou a disciplinar as economias dos Estados-Membros.

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Nos anos 1980, novas adesões levaram à introduçãode programas estruturais com objetivo de reduzirdisparidades de desenvolvimento econômico entre aEuropa dos 12 (União Européia, 2005a).

Nos anos 1990 foram firmados importantes Tra-tados: Maastrich em 1992 e Amsterdã em 1995. OTratado de Maastrich —Tratado da União Européia—criou estruturas políticas e econômicas, previu a uniãomonetária e a cidadania européia e instituiu políticasexterna e de segurança comuns (União Européia,2005a). Continha bases do mercado único europeucuja regulamentação veio a ter impactos nos siste-mas e serviços de saúde dos Estados-Membros (UniãoEuropéia, 2005b; Mossialos, et al. 2001; Wismar, Busse,2002:43). O Tratado de Amsterdã adaptou e reforçouo mercado único e a garantia da livre circulação demercadorias, serviços, pessoas e capital. Em 2001, aEuropa dos 15 assinou o Tratado de Nice que alterouo funcionamento das instituições e critérios de vota-ção. Em 2002, as moedas nacionais foram substituí-das pela moeda única, o euro. Em fins de 2004, aUnião Européia somou 25 Estados-Membros que jun-tamente com três países candidatos (Bulgária,Romênia e Turquia) assinaram o Tratado que insti-tuiu uma Constituição para a Europa com previsão

de entrada em vigor em dois anos, após referendodos Estados-Membros (União Européia, 2005a).

A adesão gradual de países e a revisão incrementaldos Tratados levaram à formulação de políticas pú-blicas para além dos limites dos Estados-Nação. E parapromover a coesão econômica e social européia, aintegração impôs a implantação de esquemasinstitucionais supranacionais e mecanismos de redu-ção de desigualdades territoriais e sociais.

X.2 Institucionalização e organismoscomunitários da União Européia

Para efetivar os acordos europeus foram constitu-ídos organismos que conformam espaço institucionalsupranacional de integração. Na União Européia, osarranjos institucionais realizados pressupõem aomesmo tempo a migração de responsabilidades naci-onais para aparato transnacional, a promoção de con-sensos e a superação de conflitos (Medeiros, 2003;Draibe, 2003). As instâncias supranacionais tratamde assuntos de políticas, de regulação e econômicoscom delegação para decidir sobre questões de inte-resse comum e representar cidadãos, Estados-Mem-bros e a União Européia. A instância decisória mais

Quadro 2 – Cronologia da Adesão de Países e dos Tratados da União Européia

Ano Adesão de Estados-Membros e Assinatura de Tratados1951 Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e Holanda1951 Tratado da Comunidade Européia do Carvão e do Aço, entrada em vigor 1952 (Paris)1957 Tratado da Comunidade Econômica Européia, entrada em vigor 1958 (Roma)

Tratado da Comunidade Européia de Energia Atômica, entrada em vigor 1958 (Roma)1973 Dinamarca, Irlanda e Reino Unido1981 Grécia1986 Espanha e Portugal1986 Ato Único Europeu, entrada em vigor 1987 (Luxemburgo e Haia)1992 Tratado de Maastricht ou Tratado da União Européia, entrada em vigor 19931995 Áustria, Finlândia e Suécia1997 Tratado de Amsterdã, entrada em vigor em 19992001 Tratado de Nice, entrada em vigor em 20032002 O Euro entra em circulação2004 Chipre, Eslováquia, Eslovênia, Estônia, Hungria, Letônia, Lituânia, Malta, Polônia e República Tcheca2004 Tratado de uma Constituição para a EuropaFonte: Elaborado com base nas informações contidas em União Européia (União Européia, 2005a).

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elevada é o Conselho Europeu integrado pelos Chefesdos Estados-Membros e pelo Presidente da ComissãoEuropéia. A Comissão Européia é órgão executivo in-tegrado por membros indicados pelos países que de-fende os interesses comuns, zela pelo cumprimentodo acordado e acompanha as decisões do Conselho deMinistros da União Européia. O Conselho de Ministrosrepresenta os governos nos debates comunitários. OParlamento Europeu formado por deputados eleitos nospaíses, exerce controle democrático (União Européia,2005a).

Dois organismos completam as principais insti-tuições comunitárias: um de controle financeiro eoutro de defesa dos direitos comunitários. O Tribunalde Contas da União Européia, composto por indicadospelos Estados-Membros após consulta ao Parlamen-to Europeu, verifica a legalidade e regularidade dereceitas e despesas da União Européia e a gestão fi-nanceira dos recursos comuns. A Corte de Justiça Eu-ropéia, integrada por um juiz de cada Estado-Membroe advogados indicados de comum acordo, garante ocumprimento do direito comunitário mediante a in-terpretação e exame da aplicação dos Tratados. A exis-tência deste órgão único de decisão sobre a interpre-tação da legislação comunitária é garantia da aplica-ção homogênea dos acordos, inclusive aqueles querepercutem nas políticas de saúde. Existem ainda or-ganismos consultivos integrados por representantesde segmentos socioeconômicos e da sociedade civil,o Comitê Econômico e Social Europeu e o Comitê dasRegiões, este último com representantes governamen-tais regionais e locais. As instituições financeiras eu-ropéias são o Banco Central Europeu responsável pelagestão do euro e da política monetária da União, e oBanco Europeu de Investimentos que financia projetosde desenvolvimento. Por fim, um Promotor de Justiçaeleito pelo Parlamento Europeu acolhe queixas quan-to à administração das instituições européias (UniãoEuropéia, 2005a).

A União Européia representa longo processo his-tórico de transferência de competências nacionaispara o nível supranacional, mediante cooperação eintegração econômica. Significa união de esforços paraconceber a integração regional com exercício de so-berania dividida onde primam estratégias de coope-ração — práticas intergovernamentais e tomada dedecisão consensual — e estratégias de integração —práticas supranacionais e tomada de decisão por maio-

ria. A consolidação européia afirma a integração comoalternativa viável de redução de diferenças regionais,na qual a noção de fronteira assume aspecto maispermeável (Medeiros, 2003:152). Nesse sentido, aotornar-se Estado-Membro cada país transfere deter-minadas competências e prerrogativas para organis-mos supranacionais, reduzindo a própria soberania.“A soberania ainda que fortemente enraizada no Estado-nação começa a migrar (...) rumo ao aparelhotransnacional” (Medeiros, 2003:166). Essa transposi-ção é típica dos processos de integração regional quepara se efetivarem necessitam criar foros multilate-rais de harmonização, de apoio à superação de con-flitos e promotores de acordos (Draibe, 2003).

X.3 A formação do mercado únicoeuropeu e repercussões sobre aspolíticas de saúde

Os países da União Européia têm tradição na ga-rantia de proteção social caracterizando-se comoamplos sistemas de bem-estar os quais, embora sediferenciem quanto à organização dos sistemas deatenção à saúde, guardam em comum o caráter pú-blico, a solidariedade social e a cobertura universal(Mossialos, 2001). Os modelos de atenção variamentre dois tipos, com predomínio do primeiro:bismarkiano —seguro social financiado por contri-buições do empregador e do trabalhador—, ebeveridgiano —serviço nacional de saúde financiadocom recursos fiscais. Princípios de justiça social sãocompartilhados entre os Estados-Membros e se ex-pressam em diversas diretivas dos Tratados, afirmati-vas de compromisso com a proteção social. Entretan-to, devido ao reconhecimento das heterogeneidadesinternas e históricas de configuração dos sistemas desaúde na União Européia, a garantia de proteção so-cial à saúde permanece responsabilidade de cada Es-tado-Membro. Contudo diversas diretivas estiveramrelacionadas à atenção à saúde. Entre 1958 a 1998,segundo Mossialos et al (2001) 233 regulamentos daUnião Européia afetaram os serviços de saúde.

As repercussões da integração européia na saúdesão analisadas a seguir nos Tratados, no tocante àsações de saúde pública, e nos sistemas nacionais desaúde quanto à regulamentação da livre circulação.

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X.4 A saúde nos Tratados da UniãoEuropéia: ações de saúde pública

O Tratado de Maastricht, que estabeleceu a estrutu-ra política e econômica do mercado único europeu,teve importância para a saúde ao estabelecer que aorganização e a prestação de serviços de saúde sãoresponsabilidades dos Estados-Membros.

Para assegurar alto nível de proteção à saúde nomercado comum com a livre circulação, o artigo 152ºeleva a saúde pública ao caráter comunitário e defineque “a ação da Comunidade, que será complementar daspolíticas nacionais, incidirá na melhoria da saúde públi-ca e na prevenção das doenças e afecções humanas e naredução das causas de perigo para a saúde humana”(União Européia, 2005c). A proteção à saúde comoobjetivo comunitário se manifestou em medidas desaúde pública cooperativas, subsidiadas e complemen-tares às ações dos Estados-Membros nos domínios daprevenção, investigação, informação e educação. Omesmo artigo desse Tratado reforçou o caráter detransversalidade da proteção da saúde a ser assegura-da “na definição e execução de todas as políticas e açõesda Comunidade” (União Européia, 2005c). A Consti-tuição Européia, em processo de ratificação, mantémo disposto no Tratado da União Européia: reafirma ocaráter comunitário complementar da saúde públicae a soberania nacional para a organização da assis-tência

Em cumprimento ao acordado, na União Euro-péia o domínio da saúde pública é atividade comuni-tária, institucionalizada em comissões, comitês, agên-cias e programas específicos. A política comunitáriade saúde pública está orientada para a melhoria dainformação, resposta rápida às ameaças e abordagemde fatores determinantes, perpassando o ambiente, aeducação e os tratamentos médicos seguros (medica-mentos, tecnologias, sangue e órgãos). Para o perío-do de 2003-2008 foi acordado o Programa Comunitá-rio de Ação em Saúde que reforça a articulação entrepolíticas públicas, promove a participação social eestimula o trabalho em redes de informação, deregulação, de intercâmbios e de avaliação. A infor-mação e consulta ampliada em saúde pública ocorreem por meio do Fórum de Saúde da União Européia(União Européia, 2005a).

Enquanto na saúde pública houve tendência paraa harmonização, as políticas de atenção à saúde decada Estado-Membro sofreram, por sua vez, efeitos

complexos e diversos, intencionais e não intencio-nais com a unificação econômica frente às modalida-des distintas de financiamento, de organização e decobertura dos serviços de saúde (Leidl, 1998:1-2;Wismar, Busse, 2002; Paton, et all.2002:10; Wismar,Gobrecht, Busse, 2002). O Tratado de Maastricht com-pleta a formação do mercado único europeu com alivre circulação, a qual impõe ajustes macro-econô-micos e gera novas dinâmicas com impactos nos sis-temas de saúde dos Estados-Membros. Esses implica-ram em restrições importantes para a ação nas políti-cas sociais, já que gastos públicos em saúde e possí-veis déficits dos seguros sociais influem no cumpri-mento ou não dos critérios econômicos acordados(De Vos, Dewitte, Stuyft, 2004). Por outro lado, a re-gulamentação da livre circulação afeta as políticas desaúde em diversos âmbitos (Busse, Wismar, Berman,2002; União Européia, 2005b; Mossialos, et all., 2001;União Européia, 2005d).

X.5 Repercussões da livre circulaçãosobre as políticas de saúde

A constituição do mercado único europeu se con-cretiza na garantia e no exercício da livre circulaçãode mercadorias, serviços, pessoas e capital entre osEstados-Membros. Na perspectiva do mercado mer-cadorias, serviços e capital são objeto de regulação demodo a adaptá-los às regras comunitárias, para quecomo as pessoas circulem livremente entre os Esta-dos-Membros. A liberdade de circulação tem impac-tos específicos nos sistemas de saúde (União Euro-péia, 2005b; Wismar, Busse, 2002; Busse, Drews,Wismar, 2002; Schmucker, 2003).

A livre circulação de pessoas tem repercussões maissignificativas na saúde, seja quanto à garantia dosdireitos sociais ou quanto à oferta de profissionais desaúde (Busse, Drews, Wismar, 2002). No mercado detrabalho foram regulamentados o reconhecimentomútuo de diplomas e a adaptação de currículos parafacilitar a mobilidade de profissionais de saúde. Pelolado da demanda, os direitos sociais e de saúde detrabalhadores foram regulamentados para a coorde-nação de sistemas de previdência e cobertura de se-guros, de modo a facilitar a movimentação destes ci-dadãos e garantir o exercício de direitos adquiridos.A segurança, a saúde do trabalhador e as condiçõesde trabalho são harmonizadas desde o início da União

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Européia de modo a não impedir a livre circulação detrabalhadores. O acesso aos serviços de saúde seráabordado com mais detalhe na próxima secção.

A regulamentação da livre circulação de mercado-rias na saúde afetou principalmente a distribuição eoferta de medicamentos, insumos e equipamentos, aassistência farmacêutica e aspectos da vigilância sa-nitária relacionados à fabricação e circulação de pro-dutos. A política de equipamentos médicos passou aincluir processo de licitação internacional. De modoa regular a produção e distribuição de medicamentosfoi criada a Agência Européia de Medicamentos com fun-ções de registro, certificação e licenciamento. Foramfirmados acordos comunitários para controle de subs-tâncias perigosas e radioativas e padrões sanitárioscomuns para a circulação de produtos.

A livre circulação de serviços na saúde repercutiuapenas sobre a oferta de seguros privados. Isso devi-do à decisão da Corte de Justiça Européia que não sub-meteu os seguros sociais aos ditames da livre circula-ção, pois estes se fundamentam em princípios de so-lidariedade e, portanto, se organizam por regulamen-tação nacional. Entretanto, o fato de prestadores pri-vados poderem oferecer serviços de saúde em qual-quer país poderá repercutir sobre a prestaçãoambulatorial e hospitalar dos Estados-Membros. Alivre circulação de capitais exibe, por sua vez, efeitossobre investimentos hospitalares, e pode vir a difi-cultar a regulação e o planejamento da oferta hospi-talar em países nos quais estes serviços são predomi-nantemente públicos.

X.6 A regulamentação do acesso àsaúde em outro Estado-Membro

Na União Européia apenas as ações de saúde pú-blica são objeto de regulamentação comunitária, jáque os Tratados reservam ao Estado-Membro a res-ponsabilidade pela organização da oferta de serviçosde saúde. Contudo, a livre circulação de pessoas, in-clusive trabalhadores, no interior do território euro-peu integrado gerou situações onde o acesso aos ser-viços de saúde em outro Estado-Membro passou a serobjeto de regulamentação específica, posteriormenteampliado por jurisprudências da Corte de Justiça Eu-ropéia (Busse, Drews, Wismar, 2002). Além disso, emregiões de fronteira desenvolve-se projetos que bus-cam garantir cuidado integrado de saúde benefi-

ciando-se dos avanços da integração econômica(Hermans, Brouwer,2005).

O acesso aos serviços de saúde em outro Estado-Membro foi regulamentado ainda nos anos 1970, paragarantir aos trabalhadores migrantes direitos deseguridade social. Em 1971, a Comunidade Econô-mica Européia (CEE) emitiu o Regulamento CEE N°1408/71 relativo à aplicação dos regimes de seguridadesocial aos trabalhadores e familiares que se desloca-vam no interior do mercado. Posteriormente, qual-quer pessoa durante estada temporária passou a terdireito a aceder aos cuidados de saúde imediatamen-te necessários, nas mesmas condições que os cida-dãos nacionais (União Européia, 2005f; Hermans,Berman 1998). Em seguida foi introduzido o desloca-mento para tratamento pré-autorizado. Fundamen-tado nos objetivos de garantia dos direitos de prote-ção social, este Regulamento teve efeitos não inten-cionais entre os quais de estender para fora do país aescolha do cidadão em consumir mercadorias e ser-viços médicos, e de autorizar a importação e exporta-ção de serviços de saúde (Busse, Drews, Wismar,2002:231; Wismar, Gobrecht, Busse, 2002:227).

Para instrumentar os direitos previstos no Regula-mento CEE N° 1408/71 foram criados diferentes for-mulários, de modo a atender variadas categorias debeneficiários —trabalhadores, turistas, estudantes—cujo acesso à assistência era distinto. Os formuláriosatendiam situações específicas como a prestação deassistência durante estada por motivos de trabalho(E106, usuário de duplo sistema), nos casos de turis-mo e viagens (E111, garante apenas emergências), nabusca de emprego (E119), para estudantes e trabalha-dores enviados a outro país (E128). O formulário E112autoriza viagem para tratamento médico pré-defini-do por motivos específicos de falta ou dificuldade deprestação do serviço, tais como lista de espera, acessoàs novas tecnologias, proximidade geográfica (HealthService Executive, 2005). Em todos esses casos, osbeneficiários deviam portar o formulário respectivoao buscarem o serviço no outro país, o que na práticanem sempre ocorria (Avilés, Villamil, Rodríguez,2002:100).

A mobilidade de pacientes na União Européia sobo abrigo do Regulamento CEE Nº. 1408/71 teve pe-queno impacto numérico e financeiro (Busse, Drews,Wismar, 2002:236). Dados de 1998 demonstram queo fluxo de pacientes entre os Estados-Membros

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correspondeu a apenas 0,1% dos gastos públicos emsaúde na União Européia (2 euros per capita). O me-nor fluxo de pacientes (14%) e o maior gasto (60%)foi nos casos de cuidados previamente autorizados(E112). O maior fluxo de pacientes (53%) foi de tra-balhadores (E106) ajustado a 16% dos gastos. Os ca-sos de curta estadia (E111) e atendimento em emer-gência corresponderam a 33% dos fluxos de pacien-tes e a 26% dos gastos.

Em dezembro de 2003, a União Européia aprovounovas recomendações sobre a mobilidade de pacien-tes que explicitam direitos e deveres destes e eviden-ciam a preocupação com a utilização de recursos e apartilha de capacidade nos cuidados transnacionais.Nesse sentido, instituem sistema para acompanharmobilidade de profissionais de saúde e rede de cen-tros de referência e de avaliação das tecnologias dasaúde. Os Estados-Membros, por seu turno, se com-prometeram a melhorar a informação sobre cuida-dos transnacionais e a integração dos objetivos desaúde em todas as políticas. Em busca do desenvolvi-mento de visão européia comum dos sistemas de saú-de, os Estados-Membros firmaram compromisso commecanismos de cooperação em serviços e assistência(União Européia, 2005e).

Em 2004, entrou em circulação o cartão europeude seguro de doença que substituirá gradualmente osformulários “E”, exceto o E112 (autorização de via-gem para tratamento). O cartão não altera direitosou obrigações regulamentados anteriormente, masalmeja eliminar obstáculos à mobilidade geográfi-ca por motivo de busca de emprego, transferênciade trabalho e turismo (União Européia, 2005g). Temainda função de simplificar o acesso, agilizar o re-embolso e confirmar os direitos. Secundariamente,pode auxiliar o alinhamento de benefícios face àscompetências dos Estados-Membros na organizaçãodos sistemas de saúde.

Frente à diversidade da organização, da coberturae do financiamento dos sistemas nacionais de saúdeesses diversos instrumentos têm utilidade para via-bilizar e facilitar as relações entre os países, na garan-tia da prestação de serviços prevista em um país e aser prestada nos termos do sistema de saúde de ou-tro. A garantia do direito à saúde é reconhecida comofundamental para a livre circulação de pessoas nomercado europeu, de modo que não se constitua umabarreira não tarifária ao processo de integração

(Theofilatou, Maarse, 1998), ainda que o acesso aosserviços esteja disciplinado sob algumas condições.

X.7 A interpretação do direitocomunitário de acesso aos serviços desaúde

Com o avanço do mercado único, os cidadãoseuropeus manifestam interesse em consumir produ-tos e serviços de saúde em outro Estado-Membro,como exercício da livre circulação. A interpretaçãodesse direito tem sido objeto de jurisprudência pelaCorte de Justiça Européia compatibilizando o Regula-mento CEE Nº. 1408/71, às regras do mercado e reco-nhecendo a responsabilidade dos Estados-Membrosna organização dos sistemas nacionais de saúde. Asdecisões da Corte na solução de controvérsias de di-reitos em saúde vêm influenciando a dimensão euro-péia dos sistemas de saúde. Tais pronunciamentoscausam repercussões distintas nos Estados-Membros,contudo, as possibilidades de acesso à saúde em ou-tro país ficam ampliadas por essas decisões.

Os casos julgados pela Corte de Justiça Européiase referem às dúvidas de direitos de acesso aos servi-ços e produtos de saúde no mercado único europeu(Wismar, Gobrecht, Busse, 2002:222 Busse, Drews,Wismar, 2002:238). São casos de cidadãos que medi-ante argumento do exercício da livre circulação bus-cam em outro Estado-Membro serviços ou produtosde saúde e, posteriormente, recorrem à Corte parasolicitar a garantia de reembolso destas despesas, rea-lizadas sem a prévia autorização (E112). Os pronun-ciamentos da Corte de Justiça Européia em relaçãoaos casos Kohll e Decker (1998) e Smits/Peerbooms eVanbraekel (2001) perpassam questões da interpreta-ção da extensão do direito ao acesso aos serviços eprodutos de saúde no mercado único, bem como alivre circulação de pessoas e consumo de saúde(Wismar, Busse, Berman, 2002:22). Frente às distin-tas modalidades dos sistemas de saúde dos Estados-Membros, nos aspectos organizacionais e financei-ros, as decisões da Corte repercutem de modo distin-to no planejamento e na entrega destas ações (Busse,Wismar, 2002:254).

As decisões confirmam que pessoas têm liberdadede buscar serviços de saúde em outro Estado-Mem-bro sob certas condições. Ao cidadão é garantido odireito ao reembolso, sem autorização prévia e com

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fundamento na livre circulação, correspondente aosvalores gastos no outro Estado-Membro. O atendi-mento prestado, por sua vez, deve ser nas mesmascondições que ao cidadão residente e de acordo coma legislação do Estado-Membro onde foi realizado.Os Estados-Membros devem cumprir a regulação co-munitária ao organizar os sistemas nacionais de saú-de e ao criar esquemas de autorizações prévias. Res-trições devem estar amparadas por justificativas demanutenção de equilíbrio financeiro setorial. Em casode recusa da autorização prévia (E112), a disponibili-dade de tratamento igual ou equivalente sem espera,deve ser garantida (De Vos, Dewitte, Stuyft, 2004:216;Busse, Wismar, 2002:256-7).

As jurisprudências da Corte foram tornando claropara os Estados-Membros que mecanismos do mer-cado único se aplicam ao setor saúde independente-mente da forma de organização deste. E para a UniãoEuropéia que qualquer discussão futura do mercadode serviços de saúde há que considerar os arranjos daseguridade social dos Estados-Membros. Embora sejareconhecido que os sistemas nacionais observam eadaptam sistemáticas às regras da Corte de Justiça Eu-ropéia e do mercado único, a situação desejada não éa garantia de escolha máxima pelo cidadão, comoconsumidor de serviços de saúde, pois isto compro-meteria o planejamento e a organização dos serviçose ações de saúde nacionais (União Européia, 2005b;Paton, et all.2002; União Européia, 2005d Busse,Drews, Wismar, 2002:231).

As repercussões das jurisprudências da Corte naspolíticas de saúde provocaram intensivos debates egeraram controvérsias nos domínios financeiro,organizacional e de acesso. Há posicionamentos deque fundamentar decisões sobre acesso à saúde noimperativo do mercado prioriza a lógica individualdo consumo em detrimento da coletiva de proteçãosocial a ser garantida pelo Estado (União Européia,2005b; Mossialos, et al., 2001). Existe a preocupaçãoda conformação de cesta européia de cuidados de saú-de (Nickless, 2001), com impacto variável na compo-sição interna do sistema de cada país. Atualmente,policy makers europeus reconhecem a contribuiçãodestas jurisprudências na transparência do direito àsaúde, nas possibilidades de acesso em outro Estado-Membro de serviços não disponíveis (Nickless, 2001)e no consenso de que nenhum sistema nacional desaúde está isento das obrigações acordadas e regula-

mentadas (Wismar, 2001). Na perspectiva territorial,as jurisprudências fortalecem o esforço comunitáriode romper fronteiras, garantir a aplicação do direitoem outro Estado-Membro e resguardar a soberaniada responsabilidade pelos cuidados de saúde a cadapaís (Nickless, 2001).

X.8 Cuidados integrados entre países enas regiões de fronteira

Embora os registros sejam insuficientes e o im-pacto financeiro pequeno, o fluxo de pacientes entrepaíses na União Européia concentra-se nas fronteiras(Busse, Drews, Wismar, 2002:236). Nessas regiões, omovimento de trabalhadores é intenso e há pressãoem busca de cuidados de saúde (Coheur, 2001). Nasfronteiras internas da União Européia se manifestacontradição importante para o acesso aos serviços desaúde: integração de espaços territoriais vis a vis siste-mas de saúde limitados ao território do país (Wismar,Busse, Berman, 2002:20). Nas fronteiras a garantia deacesso aos serviços de saúde é importante para quedisparidades territoriais e dos sistemas de saúde nãorepresentem obstáculos não tarifários à integração eà coesão econômica e social (Theofilatou, Maarse,1998). Fronteiras são territórios vinculados à identi-dade nacional que se dilui, onde se manifestam situ-ações de dubiedade ¾diferença versus integração¾,onde além de contrastes de língua e de cultura, dá-seconvivência cotidiana entre sistemas políticos, mo-netários, de segurança, de proteção social distintos, oque gera tensões e evidencia contradições entre asrealidades local, regional e do conjunto de institui-ções, normas e políticas (Ciccolella,1994).

A partir do Tratado de Maastricht foram desenvol-vidos projetos estruturais com atividades dirigidas paraas fronteiras européias (União Européia, 2005h). Em1994, foi criado o Comitê das Regiões, órgão consulti-vo integrado por representantes dos poderes locais eregionais que subsidia nas fronteiras a aplicação dalegislação européia nos domínios da saúde, educa-ção, cultura, política de emprego, política social,ambiente, formação profissional e transportes (Busse,Drews, Wismar, 2002:244).

A revisão de projetos de cooperação e assistênciaem saúde entre regiões ou Estados-Membros, váriosdestes localizados nas fronteiras, demonstra queobjetivam melhorar possibilidades de acesso e am-

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pliar serviços ofertados. Além disso, facilitar relaçõesentre agências governamentais e prestadores de ser-viços e solucionar tensões entre direitos do pacientee regras de autorização. As principais ações de coope-ração são em emergências (ambulâncias, equipes deresgate, equipamentos), assistência (serviços comple-mentares), telemedicina (consulta, diagnóstico,compartilhamento de dados e troca de experiência),compra e utilização de equipamentos, pesquisa, recur-sos humanos, rede de boas práticas, e estabelecimentode estruturas comuns (Hermans, Brouwer, 2005).

Embora essas experiências apresentem grande di-versidade de ações, exibem motivações e resultadosbastante semelhantes. Os projetos predominantesbuscam atender problemas de capacidade e de escalade serviços especializados, e vinculam-se aos hospi-tais universitários. Muitos envolvem localidades depaíses onde os julgamentos da Corte de Justiça Euro-

péia tiveram maiores repercussões (Bélgica, Holanda,Alemanha) e buscam auxiliar o controle de custos edo atendimento (Hermans, Brouwer, 2005).

O fluxo de pacientes entre países relaciona-se afatores de ordem pessoal, social, financeiro, clínico,gerencial e político. Para os pacientes os fatores maisimportantes são o tempo de espera, nível de cuidado,distância, amizades ou parentescos. Enquanto quepara os profissionais de saúde contatos com o siste-ma do outro país e a falta de recursos locais são fato-res mais mencionados para encaminhar paciente aoutro país. Tanto para os pacientes quanto para osprofissionais as barreiras mais evidentes para a buscade serviços de saúde em outro país são a língua, acultura, aspectos legais e administrativos. Entretan-to, nas regiões com projetos mais organizados obser-vou-se tendência para o aumento de fluxo (Hermans,Brouwer, 2005).

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A construção da União Européia tem fundamen-tos econômicos, entretanto, ilustra processo gradualde aprofundamento e alargamento que almeja a tran-sição da Europa econômica para a Europa política com aadoção da Constituição Européia, cujos valores de-vem influenciar todas as políticas. A saúde teve papelmenor na integração, ainda que desde os primeirosacordos a garantia e a proteção da saúde e a seguran-ça do trabalhador tenham sido objetos de regulamen-tação. A partir de 1993, a saúde é incluída na agendacomo tema específico, mediante ações comunitáriasde saúde pública. Embora a responsabilidade pelaorganização dos serviços de saúde seja de cada Esta-do-Membro, princípios de proteção social comparti-lhados garantem ao cidadão acesso regulado à saúdeem outro Estado-Membro. À medida que avança aconsolidação da livre circulação, os Estados-Membrosreconhecem efeitos do mercado único nas políticasde saúde. Os resultados acumulados pela União Eu-ropéia evidenciam que processos de integração sãoexercícios de conciliação de interesses e que emborao fator motivador seja o econômico, as repercussõesque causam na saúde impõem interação entre as po-líticas econômicas e sanitárias.

A revisão de literatura mostra que a integraçãoeuropéia repercutiu sobre os sistemas nacionais desaúde não tanto por legislação específica, mas comoconseqüência dos esforços de implementação domercado único europeu, nos aspectos econômicos eda livre circulação. A garantia do acesso aos serviços eprodutos de saúde no interior do mercado europeufoi utilizada para romper barreiras de circulação. Namodalidade de integração assumida, a queda de bar-reiras à circulação de pessoas, produtos, serviços ecapital significou na saúde a livre movimentação deprofissionais, pacientes, trabalhadores, fármacos,tecnologias e serviços. Na saúde, a livre circulação depessoas teve maior impacto sobre a oferta de profissio-nais e na demanda de migrantes pela garantia de aces-so. Acordos comunitários buscaram tanto regular omercado de trabalho para facilitar o reconhecimento

XI. Síntese das principais repercussões do mercadointerno europeu sobre as políticas de saúde e lições para

o Mercosul

de profissões quanto a compensação financeira entreos sistemas para a garantia de direitos. Por sua vez,projetos em desenvolvimento nas regiões fronteiriçasda União Européia, motivados pela integração, exi-bem melhoria da capacidade de garantir cuidadosintegrais de saúde mediante articulação de serviços,formação conjunta de profissionais e novos arranjosorganizacionais.

Ainda que as repercussões da legislação comuni-tária tenham afetado os Estados-Membros indepen-dentemente do modelo de política de saúde adota-do, os impactos foram distintos frente às característi-cas de organização e financiamento de cada sistemanacional de saúde. Nesse sentido, a integração euro-péia repercutiu de modo intencional e não intencio-nal nas políticas de saúde, em aspectos de regulação,financiamento, oferta, acesso e distribuição de servi-ços em cada Estado-Membro. Os efeitos intencionaisresultaram em acordos no domínio da saúde pública,facilitação da mobilidade de profissionais, regulamen-tação para aquisição pública de mercadorias e servi-ços de saúde, sistema comum para licenciamento,produção e distribuição de fármacos e insumos mé-dicos, e sistemáticas para garantir a cobertura e aces-so aos serviços de saúde no interior da Comunidade.Os efeitos não-intencionais são derivados de metaseconômicas comunitárias e, em parte, resultam dainsuficiente abordagem da saúde na regulamentaçãodo mercado único gerando impactos na compra, pro-visão e entrega dos serviços de saúde. Para construiro mercado único europeu foram impostos critérios emetas econômicas aos Estados-Membros com o obje-tivo de garantir a estabilidade econômica. Os Esta-dos-Membros frente às regras acordadas têm que rea-lizar adaptações internas para cumpri-las, confron-tando objetivos sociais com os de mercado e, em de-corrência, as políticas sociais e de saúde terminampor subordinar-se aos imperativos das políticas eco-nômicas. Assim, na integração européia permaneceutensão não resolvida entre os objetivos do mercadoúnico e as políticas nacionais de saúde.

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Entre MERCOSUL e União Européia existem seme-lhanças e diferenças. Na atualidade, o MERCOSUL seconforma como união alfandegária, entretanto, ob-jetiva alcançar a livre circulação de pessoas, produ-tos, serviços e capitais. Mesmo em nível de integraçãoanterior ao da União Européia, a reflexão sobre esta,antecipa desafios a enfrentar na consolidação do blo-co do cone sul que ao caminhar para o mercado co-mum tem como exemplo bem sucedido a União Eu-ropéia. Assim o ponto fundamental de simetria entreambos é alcançar a integração regional, conquanto ohistórico de relações e heterogeneidades entre os in-tegrantes, além de aspectos jurídicos sejam diferen-ças entre os dois blocos.

Na saúde, a União Européia reforçou objetivoscomuns de combinar solidariedade comsustentabilidade financeira, de introduzir diretrizesde mercado mantendo o papel de responsabilidadedo Estado-Membro. Embora a titularidade do direitoà saúde permaneça ligada à nacionalidade, os Esta-dos-Membros adotaram inovações na organização eprodução de serviços para a garantia do acesso emoutro país. No MERCOSUL, os Estados-Parte possuemdistintos desenhos de políticas de saúde tanto nosaspectos organizacionais e financeiros quanto de co-bertura. Ainda que exista contigüidade no territórioepidemiológico e sanitário para além das fronteiras,os países têm perfis populacionais, de infra-estruturae de responsabilidades sanitárias variados.

É reconhecido, que a saúde é política pública re-sultante de consensos sócio-políticos em cada país.Nesse sentido, as variações significativas entre dese-nhos dos sistemas e das políticas dos Estados-Partesno MERCOSUL denotam que há pouco consenso regio-nal sobre o escopo da proteção social, diferentemen-te do observado na União Européia. O Brasil vemconsolidando sistema de saúde público, de base uni-versal, descentralizado e com participação social e têmatraído atenção e interesse de outros governos. Em-bora longe de uma ação de regulação dos serviços desaúde para a integração regional, essa situação favo-rece acordos de cooperação e oferece paradigmas paraa harmonização no campo da saúde no MERCOSUL.

Na União Européia a saúde foi subordinada aoprocesso de integração e a garantia do direito de aces-

so no mercado interno foi uma forma de evitar bar-reiras não tarifárias à livre circulação, assim como aação comunitária de saúde pública. O MERCOSUL se-gue trilha semelhante ao realizar a inclusão gradual eincipiente de questões de vigilância sanitárias eepidemiológicas, relacionadas à circulação de produ-tos e às ações de saúde pública de alta externalidade.Essa discussão ocorre em subgrupo de trabalho espe-cífico (SGT-11) que busca harmonização normativaentre Estados-Partes.

Traçando paralelos com a União Européia, em umcenário futuro do MERCOSUL no qual a integração seaprofunda, as diversidades das políticas de saúde de-vem ser superadas para garantir o direito ao acessoem outro país de modo que a ausência de acesso nãose configure como barreira à livre circulação das pes-soas no interior do Bloco. Nesse sentido, Estados-Par-tes acordariam regras e mecanismos de garantia des-se acesso, e, implantariam instrumentos intergover-namentais à semelhança dos formulários “E” ou oCartão de Saúde MERCOSUL. Em etapa intermediária, aadoção de procedimentos de troca de serviços, emações cooperativas locais de fronteira com apoio dosgovernos nacionais, pode contribuir para a integraçãoregional. Considerando a experiência européia, aopção menos indicada é a restrição de acesso, que emprocessos de integração regional se configura comobarreira não-tarifária. Além disso, no caso do SUS onão atendimento pode comprometer princípios cons-titucionais, considerando a mobilidade histórica defamílias nas fronteiras.

As garantias dos direitos sociais são fatores impor-tantes em processos de integração como demonstra aUnião Européia. A problemática do acesso aos servi-ços de saúde no MERCOSUL, contudo, não é de simplesabordagem seja no aspecto institucional seja no polí-tico. Avançar na reflexão das repercussões daintegração regional sobre os sistemas de serviços desaúde a partir da perspectiva das regiões de fronteirascomo os resultados da pesquisa aqui apresentadosantecipam questões na plena vigência do MERCOSUL eapontam caminhos a trilhar.

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XII. Mapas com resultados selecionadosdo inquérito

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Mapa 1Municípios brasileiros da Linha de Fronteira por porte populacional com

Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

XII. MAPAS COM RESULTADOS SELECIONADOS DO INQUÉRITO

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Mapa 2Presença de transporte coletivo regular entre o município e a cidade estrangeira de fronteira.

Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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PESQUISA SAÚDE NAS FRONTEIRASXII. MAPAS COM RESULTADOS SELECIONADOS DO INQUÉRITO

Mapa 3Busca de estrangeiros residentes em cidades estrangeiras de fronteira por atendimento no SUS.

Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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Mapa 4Busca de brasileiros residentes em cidades estrangeiras de fronteira por atendimento no SUS.

Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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PESQUISA SAÚDE NAS FRONTEIRASXII. MAPAS COM RESULTADOS SELECIONADOS DO INQUÉRITO

Mapa 5Busca de consulta médica de atenção básica por estrangeiros e oferta de unidades básicas do SUS.

Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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Mapa 6Busca da internação hospitalar no SUS por estrangeiros e oferta de leitos hospitalaresSUS. Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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PESQUISA SAÚDE NAS FRONTEIRASXII. MAPAS COM RESULTADOS SELECIONADOS DO INQUÉRITO

Mapa 7Iniciativas de cooperação e ações em saúde relacionadas à situação de fronteira.

Municípios brasileiros de fronteira com Argentina, Paraguai e Uruguai, 2005

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XIII. Perfil sócio-demográfico e assistencial dosmunicípios brasileiros de fronteira com Argentina,

Paraguai e Uruguai

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PESQUISA SAÚDE NAS FRONTEIRASXIII. PERFIL SÓCIO-DEMOGRÁFICO E ASSISTENCIAL DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS DE FRONTEIRA ...

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