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Estudo e integração de sistemas de recuperação de energia na gestão térmica de motores de combustão interna de veículos pesados Tiago Rosa Henriques Dissertação para obtenção de Grau de Mestre em Engenharia Mecânica Júri Presidente: Professor Doutor João Rogério Caldas Pinto Orientador: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa Co-Orientador: Doutor Hélder Manuel Ferreira dos Santos Vogal: Doutor Gonçalo Nuno Antunes Gonçalves Outubro de 2013

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Estudo e integração de sistemas de recuperação de

energia na gestão térmica de motores de combustão

interna de veículos pesados

Tiago Rosa Henriques

Dissertação para obtenção de Grau de Mestre em

Engenharia Mecânica

Júri

Presidente: Professor Doutor João Rogério Caldas Pinto

Orientador: Professor Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa

Co-Orientador: Doutor Hélder Manuel Ferreira dos Santos

Vogal: Doutor Gonçalo Nuno Antunes Gonçalves

Outubro de 2013

Este trabalho reflecte as ideias dos seus

autores que, eventualmente, poderão não

coincidir com as do Instituto Superior Técnico.

i

Agradecimentos

Ao professor Mário Costa, na qualidade de orientador, agradeço o apoio e orientação

prestados durante a realização do presente trabalho.

Ao professor Hélder Santos, na qualidade de co-orientador, agradeço a sua disponibilidade e

a ajuda no acompanhamento do presente trabalho.

Agradeço no geral a todos os colegas de laboratório que contribuíram para um bom ambiente

de trabalho e em particular ao Ricardo Mateus que desenvolveu trabalho na mesma área do presente

trabalho.

Agradeço ainda a todos os meus amigos.

Por último quero agradecer e dedicar a tese à minha família pelo apoio prestado em todos os

momentos da minha vida.

ii

Resumo

O presente estudo focou-se na avaliação do potencial de recuperação de energia em motores

de combustão interna (MCI) diesel de veículos pesados. Estudaram-se 4 fontes de dissipação de

calor de um MCI representativo, identificando-se o sistema do EGR e dos gases de escape como as

melhores fontes de calor a recuperar. As duas fontes quentes do ciclo de Rankine (RC) estão em

paralelo e este utiliza ainda como fonte fria o próprio sistema de refrigeração do MCI. O expansor

escolhido para o RC é de pistão.

O RC mantém os parâmetros de pressão e temperatura estacionários utilizando

evaporadores de geometria variável no lado das fontes quentes e um condensador com bypass

variável do fluido de refrigeração. Conclui-se que o etanol é o fluido de trabalho a utilizar, trabalhando

o RC com uma pressão de evaporação de 49 bar, pressão de condensação de 2.3 bar e temperatura

de sobreaquecimento de 240ºC. Após optimização, a temperatura de arrefecimento do EGR é de

120ºC e a uma temperatura de arrefecimento dos gases de escape é variável de 110ºC a 230ºC,

consoante o regime do MCI.

Seleccionou-se o permutador de tubos alhetados para servir de evaporador nas duas fontes

quentes. O permutador de calor seleccionado para o condensador é de tubos concêntricos de

escoamento axial.

Consegue-se uma redução máxima de consumo de combustível e emissões de dióxido de

carbono (CO2) de 6.6% a elevada velocidade. Em termos de potência mecânica ocorre um aumento

máximo de 7%. O sistema de refrigeração original não fica subdimensionado.

Palavras-chave: recuperação de calor; ciclo de Rankine; veículos pesados; mapas de desempenho;

permutador de calor de geometria variável.

iii

Abstract

This study is focused on the evaluation of the potential energy recovery in internal combustion

engines (ICE) for heavy vehicles. We studied four sources of heat dissipation of an ICE

representative. We identified the EGR and the exhaust gas as the best sources of heat to recover.

The two hot sources selected are in parallel and the Rankine cycle (RC) also uses as heat sink the

cooling system of the ICE. The chosen RC expander is piston type.

The RC maintains the pressure and temperature stationary using evaporators of variable

geometry and a condenser with variable bypass coolant. It is concluded that ethanol is the working

fluid to be used, the RC working at a evaporation pressure of 49 bar, condensation pressure of 2.3 bar

and a overheating temperature of 240°C. After optimization, the EGR cooling temperature is 120°C

and the exhaust gases cooling temperature varies from 110°C to 230°C, depending on the regime of

the ICE.

Was selected the heat exchanger with finned tubes for evaporators. The heat exchanger

selected for the condenser has concentric tubes with axial flow.

The proposed system achieves a maximum reduction of fuel consumption and carbon dioxide

(CO2) emissions of 6.6% at high speed. Mechanical power achieves a maximum increase of 7%. The

original cooling system is not undersized.

Keywords: waste heat recovery; Rankine cycle; heavy vehicles; performance maps; variable

geometry heat exchanger.

iv

Índice

Agradecimentos ......................................................................................................................................... i

Resumo .................................................................................................................................................... ii

Abstract.................................................................................................................................................... iii

Índice ....................................................................................................................................................... iv

Lista de figuras ........................................................................................................................................ vi

Lista de tabelas ........................................................................................................................................ x

Nomenclatura .......................................................................................................................................... xi

1. Introdução ......................................................................................................................................... 1

1.1. Enquadramento ....................................................................................................................... 1

1.2. Objectivos................................................................................................................................ 5

1.3. Estrutura da dissertação ......................................................................................................... 6

2. Revisão bibliográfica ......................................................................................................................... 7

2.1. Introdução ............................................................................................................................... 7

2.2. Fundamentos teóricos ............................................................................................................. 7

2.3. Recuperação de energia térmica em MCI diesel de veículos pesados .................................. 8

2.3.1. Expansor .............................................................................................................................13

2.3.2. Bomba ................................................................................................................................16

2.3.3. Fluido de trabalho ...............................................................................................................16

2.3.4. Permutadores de calor .......................................................................................................18

2.3.5. Controlo do sistema e análise dinâmica .............................................................................21

3. Análise do MCI em estudo ..............................................................................................................23

3.1. Introdução .............................................................................................................................23

3.2. Características gerais ...........................................................................................................23

3.3. Sistema de combustível ........................................................................................................25

3.4. Análise energética e exergética das fontes de calor ...........................................................27

3.4.1. Intercooler ...........................................................................................................................27

3.4.2. Sistema do EGR .................................................................................................................29

v

3.4.3. Sistema de refrigeração .....................................................................................................31

3.4.4. Sistema de escape .............................................................................................................33

3.5. Circuito de recuperação de calor proposto ...........................................................................35

4. Modelo termodinâmico ....................................................................................................................38

4.1. Introdução .............................................................................................................................38

4.2. Modelação do ciclo de Rankine ............................................................................................38

4.3. Estratégia de funcionamento do RC .....................................................................................41

4.4. Selecção do fluido de trabalho ..............................................................................................42

4.5. Optimização termodinâmica..................................................................................................44

5. Modelação dos permutadores de calor ...........................................................................................46

5.1. Introdução .............................................................................................................................46

5.2. Evaporadores ........................................................................................................................46

5.4. Condensador .........................................................................................................................53

6. Análise de resultados ......................................................................................................................57

6.1. Introdução .............................................................................................................................57

6.2. Resultados da análise termodinâmica ..................................................................................58

6.3. Projecto dos evaporadores ...................................................................................................61

6.4. Projecto do condensador ......................................................................................................67

6.5. Estudo dinâmico simplificado ................................................................................................70

6.6. Resultados globais ................................................................................................................72

7. Fecho ..............................................................................................................................................75

7.1. Conclusões............................................................................................................................75

7.2. Sugestão de trabalhos futuros ..............................................................................................77

Referências ............................................................................................................................................78

Bibliografia ..............................................................................................................................................81

Anexos ....................................................................................................................................................83

A. Interface gráfica do software desenvolvido...…………………………………………………….... 83

vi

Lista de figuras

Figura 1.1 – Consumo de energia final petrolífera por sector (IEA 2009)….…………………………......2

Figura 1.2 – In “Behr Technical Press Day 2010”. Este recorte de uma publicação demonstra os

desafios futuros na área da melhoria de eficiência energética dos MCI…………………………………..3

Figura 1.3 – Sistema típico de um MCI diesel de um veículo pesado e sistemas de dissipação de

calor………………………………………………………………………………………………………………..4

Figura 2.1 – Circuito de recuperação de calor proposto por Teng, Park e Hunter, 2011 (AVL

Powertrain Eng. Inc.)…………………………………………………………………………………………...10

Figura 2.2 – Circuito de recuperação de calor proposto por Fezer e Ambros, 2011………………......10

Figura 2.3 – Circuito de recuperação de calor proposto por Vaja e Gambarotta. 2010……………….10

Figura 2.4 – Circuito de recuperação de calor proposto por Seher et al. 2012 (Robert Bosch

GmbH)……………………………………………………………………………………………………………11

Figura 2.5 – Circuito de recuperação de calor proposto por Hountalas et al. 2012……………...…….11

Figura 2.6 – Circuito de recuperação de calor proposto por Edwards, Eitel, Pantow e Geskes et

al.2012 (Behr GmbH)………………………………………………………………………………………......12

Figura 2.7 – Circuito de recuperação de calor proposto por Tahani et al.2013……………………...…12

Figura 2.8 – Circuito de recuperação de calor proposto por Zhang et al.2013 (MCI ligeiro, 2 ciclos em

cascata).………………………………………………………………………………………………………....12

Figura 2.9 – Expansor de lóbulos em desenvolvimento na Eaton Corp., Subramanian (2013)……....14

Figura 2.10 – Bomba de palhetas utilizada no estudo de Teng (2011)……………………………...…..16

Figura 2.11 – Representação esquemática de fluidos (a) isentrópicos, (b) húmidos e (c) secos……..17

Figura 2.12 – Representação esquemática das 5 geometrias de permutadores analisados por

Mavridou et al., (2010): (a) corpo e feixe tubular (tubos lisos); (b) corpo e feixe tubular (tubos com

alhetas circulares); (c) corpo e feixe tubular (tubos corrugados); (d) permutador compacto de placas;

(e) permutador de espuma metálica……………………………………………………………………….....19

Figura 2.13 – Permutador de tubos alhetados estudado por Horst et al. (2013)……………….............20

Figura 2.14 – Controlo da temperatura do vapor (em cima) e controlo da pressão de evaporação (em

baixo) (Endo et al. 2007)……………………………………………………………………………………….21

Figura 2.15 – Circuito de recuperação de calor proposto por Horst et al. (2013)…………………...…..22

Figura 3.1 – Mapa do consumo específico de combustível com a sobreposição de isolinhas da

potência efectiva (valores e linhas a negrito)……………………………………………………….............24

vii

Figura 3.2 – Definição dos pontos normalizados no ESC e frequência em percentagem da utilização

dos mesmos num percurso de auto-estrada (esquerda) e distribuição da probabilidade de utilização

dos modos no MCI em estudo (direita)………………………………………………………………………25

Figura 3.3 – Caudal de combustível (esquerda) e calor de combustão (direita)………………………..26

Figura 3.4 – Rendimento efectivo do MCI em estudo………………………………………………………26

Figura 3.5 – Razão ar combustível (esquerda) e caudal mássico de ar de admissão (direita)………..27

Figura 3.6 – Pressão no intercooler, temperatura de entrada e saída do ar de admissão,

respectivamente…………………………………………………………………………………………...……28

Figura 3.7– Calor dissipado no intercooler e exergia disponível neste processo de arrefecimento.….28

Figura 3.8 – Fracção de EGR (esquerda) e caudal mássico de EGR (direita)…………………………..29

Figura 3.9 – Pressão no arrefecedor do EGR, temperatura de entrada e saída do EGR,

respectivamente………………………………………………………………………………………………...30

Figura 3.10 – Calor dissipado no EGR e exergia disponível no processo de arrefecimento…………..30

Figura 3.11 – Calor libertado no bloco (esquerda) e temperatura do refrigerante à saída do EGR

(direita)…………………………………………………………………………………………………………...31

Figura 3.12 – Caudal de refrigerante e temperatura de entrada e saída do bloco, respectivamente…32

Figura 3.13 – Exergia disponível no processo de aquecimento do refrigerante no bloco do motor.....32

Figura 3.14 – Caudal de gases de escape (esquerda) e temperatura de saída dos gases (direita).…33

Figura 3.15 – Calor da componente conjunta (esquerda) e calor de convecção e radiação (direita)...34

Figura 3.16 – Exergia do processo de arrefecimento dos gases de escape até aos 220ºC….………..35

Figura 3.17 – Circuito de recuperação de calor proposto para o MCI em estudo, através de um RC..37

Figura 4.1 – Diagrama T-s para o RC real (linha a tracejado) e para o RC ideal (linha a cheio)……...39

Figura 4.2 – Variação de características do RC com etanol, variando a pressão de evaporação…….44

Figura 4.3 – Diagrama T-s do RC real com etanol e condições definidas para todo o estudo………. 45

Figura 5.1 – Conceito em corte do PCTA enclausurado de geometria variável desenvolvido: 2

situações extremas de funcionamento e uma situação intermédia…………………………….………...48

Figura 5.2 – Modelação de um evaporador para o RC em estudo com a divisão em 3 zonas e o

correspondente diagrama T-s. (Domingues et al. 2010)...…………………………………………………49

Figura 5.3 – Geometria base da alheta tipo seleccionada…………………………………………………51

Figura 5.4 – Composição dos gases de escape e do EGR…………………………………………...…...53

viii

Figura 5.5 – Secção transversal seleccionada para o condensador do RC. (dimensões em

milímetros)……………………………………………………………………………………………………….55

Figura 6.1 – Mapa da temperatura de arrefecimento dos gases de escape optimizada…………….....58

Figura 6.2 – Parâmetro 𝛥𝑇𝑝𝑝 obtido para os evaporadores do EGR (esquerda) e escape (direita). …58

Figura 6.3 – Mapa do calor recuperado do MCI no EGR (esquerda) e escape (direita)……………….59

Figura 6.4 – Caudal de etanol que atravessa o evaporador do EGR (esquerda) e do escape

(direita)…………………………………………………………………………………………………………...59

Figura 6.5 – Contribuição do EGR para o calor dissipado no condensador (esquerda) e calor total a

dissipar no condensador (direita)……………………………………………………………………...……...60

Figura 6.6 – Contribuição do ramo do EGR para a potência de bombagem (esquerda) e potência total

de bombagem do RC (direita)…………………………………………………………………………………60

Figura 6.7 – Contribuição do ramo do EGR (esquerda) e dos gases de escape (direita) para a

potência mecânica desenvolvida na expansão…...………………………………………………………...61

Figura 6.8 – Potência total desenvolvida na expansão (esquerda) e potência líquida desenvolvida pelo

RC antes da aplicação dos rendimentos mecânicos de conversão para o MCI e do próprio expansor

(direita)…………………………………………………………………………………………………………...61

Figura 6.9 – Eficiência de permuta de projecto requerida para as 3 zonas de cada um dos 2

evaporadores a projectar……………………………………………………………………………………....62

Figura 6.10 – Coeficiente global de transferência de calor de projecto requerido para as 3 zonas de

cada um dos 2 evaporadores a projectar…………………………………………………………………….63

Figura 6.11 – Perda de carga do fluido de trabalho nos tubos dos 2 permutadores (esquerda) e perda

de carga total dos gases térmicos nos 2 permutadores (direita)……………………………………….....66

Figura 6.12 – Detalhes geométricos do permutador do EGR projectado: banco de tubos (esquerda) e

conduta de enclausuramento do permutador com as gavetas das comportas (direita)…………… …67

Figura 6.13 – Eficiência de permuta de projecto requerida (esquerda) e coeficiente global de

transferência de calor de projecto (direita)……………….……………………………………………….....67

Figura 6.14 – Comprimento máximo necessário para o condensador (esquerda) e rearranjo dos

7.1metros de permutador em 7 secções (direita)…………………………………………………...………68

Figura 6.15 – Fracção de bypass do fluido de refrigeração obtida (esquerda) e correspondente

diferença mínima de temperaturas (direita)………………………………………………………………….69

Figura 6.16 – Temperatura do fluido de refrigeração à saída do condensador (esquerda) e

temperatura do fluido de refrigeração à entrada do bloco do motor (direita).………………………..….69

ix

Figura 6.17 – Simulação do permutador do EGR (esquerda) e do permutador do Escape (direita)…71

Figura 6.18 – Novo consumo específico do sistema conjunto MCI + RC e equação de cálculo……..72

Figura 6.19 – Redução do consumo de combustível e aumento de potência proporcionado por o

MCI+RC e equações de cálculo………………………………………………………………………..……..72

Figura 6.20 – Calor adicional no sistema de refrigeração relativamente à carga térmica original

(esquerda) e temperatura de saída do refrigerante do bloco do MCI (direita)…………..……………....73

Figura 6.21 – Veículo com sistema original (esquerda) e veículo com o RC aplicado ao MCI

(direita)……………………………………………………………………………………………………..…….74

Figura A.1 – Interface de arranque do software desenvolvido…………………………………...........…83

Figura A.2 – Interface de apresentação dos mapas característicos do motor actual………………..…83

Figura A.3 – Interface de apresentação dos mapas relativos a balanços energéticos e análises de

exergia das diversas fontes de dissipação de calor do MCI em estudo……………………………….…84

Figura A.4 – Algumas das interfaces que vão surgindo ao longo do projecto de gestão térmica……..84

x

Lista de tabelas

Tabela 2.1 - Resumo dos estudos considerados mais relevantes efectuados na aplicação de um RC a

um MCI diesel de um veículo pesado………………………………………………………………………….9

Tabela 2.2 – Comparação entre os expansores aplicáveis a RC de pequena dimensão…………...…13

Tabela 2.3 – Alguns protótipos de expansores identificados por Bao e Zhao (2013)…………………..14

Tabela 2.4 – Características dos expansores em fase comercial fabricados pela Bosch

GmbH…………………………………………………………………………………………………………….15

Tabela 2.5 – Rendimento mecânico e isentrópico do estudo efectuado por Seher (2012)…………….15

Tabela 2.6 – Resumo geral dos diferentes tipos de permutador de calor aplicáveis ao RC em

estudo……………………………………………………………………………………………………………20

Tabela 3.1 – Características do MCI utilizado no presente estudo (Q. Xin, 2011)……………...………24

Tabela 3.2 – Características do projecto de um sistema de arrefecimento de um MCI diesel

rápido………………………………………………………………………………………………...…………..31

Tabela 4.1 – Hipóteses assumidas no modelo termodinâmico do RC aplicado ao MCI…………...…..40

Tabela 4.2 – Resumo das propriedades termodinâmicas dos fluidos seleccionados. …………………42

Tabela 6.1- Minimização do desvio padrão do comprimento necessário para o evaporador do EGR.64

Tabela 6.2 – Minimização do desvio padrão do comprimento necessário para o evaporador do

escape……………………………………………………………………………………………………………64

Tabela 6.3 – Características e dimensões principais dos 2 evaporadores projectados…………...…...64

Tabela 6.4 – Número de canais não bloqueados dos 89 existentes no permutador do EGR………....65

Tabela 6.5 – Número de canais não bloqueados dos 149 existentes no permutador do escape.........65

Tabela 6.6 – Condições de fecho do problema de simulação dinâmica dos dois permutadores…..…71

xi

Nomenclatura

Caracteres romanos

A área [m2]

Be binário efectivo [N m-1

]

𝐶𝑒 consumo específico [g kW-1 h

-1]

𝐶𝑒 ′ consumo específico do MCI+RC [g kW-1

h-1

]

𝐶𝑅 razão das capacidades térmicas das correntes [-]

cp calor especifico [kJ kg-1

K-1

]

d diâmetro [m]

Ex exergia [kW]

fEGR fracção de gases recirculados [%]

h entalpia específica [kJ kg-1

]

h coeficiente de convecção [W m-2

K-1

]

k condutividade térmica [W m-1

K-1

]

𝑚 caudal mássico [kg s-1

]

n velocidade de rotação [r min-1

]

N número [-]

p pressão [Pa]

Pe potência efectiva [W]

PCI poder calorífico inferior [MJ kg-1

]

Q calor [W]

R resistência de sujamento [m2 K W

-1]

s entropia específica [kJ kg-1

K-1

]

T temperatura [K]

UA coeficiente global de transferência de calor [W K

-1]

W potência mecânica [W]

Caracteres gregos

𝜀 eficiência de permuta [-]

𝜂𝑒 rendimento efectivo [-]

𝜂 rendimento [-]

xii

Subscritos

0 referência

1,2,2s,3,4,4s processos no ciclo de Rankine

ar ar de admissão

b bomba

comb combustível

cond condensação

cr crítico

e externo

e expansor

EGR gases de escape recirculados

ESC gases de escape não recirculados

evap evaporação

f fluido de trabalho

fin alhetas

g gases térmicos

i interno

in entrada no sistema

Inter intercooler

liq líquido

out saída do sistema

pp pinch-point

refri fluido de refrigeração do motor

suj sujamento

tot total

xiii

Abreviaturas

DPF Diesel Particulate Filter, na literatura Inglesa

EGR Exhaust Gas Recirculation, na literatura Inglesa

ESC European Stationary Cycle, na literatura Inglesa

HC Hidrocarbonetos

IEA Agência Internacional da Energia

MCI Motores de Combustão Interna

NTU Number of Transfer Units, na literatura Inglesa

OPEP Organização dos Países Exportadores de Petróleo

ORC Organic Rankine Cycle, na literatura Inglesa

PCTA Permutador de Calor de Tubos Alhetados

PM Particulate Matter, na literatura Inglesa

RC Rankine Cycle, na literatura Inglesa

SCR Selective Catalytic Reduction, na literatura Inglesa

Espécies químicas

CO Monóxido de carbono

C12H23 Composição química média aproximada do diesel

CO2 Dióxido de carbono

H2O Água

N2 Nitrogénio

NOx Óxidos de azoto

O2 Oxigénio

1

Capítulo 1

1. Introdução

1.1. Enquadramento

A energia, as suas formas de conversão e o seu eficaz aproveitamento é um tema que cada

vez mais levanta um elevado interesse de discussão a nível mundial. Os impactos ambientais e as

características finitas associadas à utilização e exploração de recursos fósseis, que continuam como

base de sustentação do sistema energético a nível mundial, levantam cada vez mais preocupações e

desafios tecnológicos a superar.

De acordo com os últimos indicadores, cerca de 80,9%1 da energia primária consumida

mundialmente é proveniente de combustíveis fósseis. Entre esta percentagem de recursos fósseis

atribui-se 32,8%1 ao sector do petróleo, fracção que é absorvida em 61,7%

1 pelo sector da

transportação a nível mundial. O sector do petróleo é ainda responsável por 36,7%1 da totalidade das

emissões de dióxido de carbono (CO2), gás de efeito de estufa, a nível mundial.

Assim grande parte dos investimentos que ocorrem no sector energético hoje em dia incidem

em investigação relacionada com desenvolvimentos tecnológicos que permitam reduzir e utilizar de

forma mais eficiente os combustíveis fósseis, diminuindo a dependência e os impactos ambientais

provocados pela utilização dos mesmos.

No entanto segundo as estimativas da OPEP (Organização dos Países Exportadores de

Petróleo) tudo indica que irá existir um aumento no consumo de petróleo, sendo o sector dos

transportes o grande responsável pela tendência de subida a nível mundial, como mostra a figura 1.1.

A utilização e procura de recursos energéticos está intimamente relacionada com o desenvolvimento

económico e humano dos países, sendo a tendência de aumento de procura e consumo de

combustíveis fósseis explicada pelo desenvolvimento económico acentuado das economias dos

países emergentes do Oriente, como são exemplo o caso da China e da Índia.

1Indicadores de 2009 retirados da International Energy Agency (IEA)

2

Figura 1.1 – Consumo de energia final petrolífera por sector (IEA 2009).

O sector da transportação envolve o transporte de mercadorias e de pessoas. A nível intra-

continental o transporte de mercadorias é feito em grande parte através da rodovia e através da

ferrovia. Na rodovia o transporte de mercadorias é efectuado através de veículos automóveis

pesados de mercadorias, normalmente denominados por camiões, que utilizam na quase totalidade

motores de combustão interna (MCI) diesel. As alternativas de propulsão eléctrica encontradas hoje

em dia para veículos automóveis ligeiros, não conseguem ainda tecnologicamente substituir a actual

forma de propulsão utilizada em veículos pesados de mercadorias, sendo então previsível que o MCI

continuará por muitas décadas a assegurar a propulsão neste tipo de veículos. Assim, grandes

esforços têm vindo a ser realizados no sentido de melhorar o desempenho energético e ambiental

dos MCI a nível mundial.

A poluição gerada pelos MCI tem uma componente local, afectando directamente a saúde

das populações quando expostas a níveis elevados de concentrações de substâncias poluentes, e

tem uma componente global, que dá origem aos chamados efeitos globais como por exemplo as

chuvas ácidas. Os quatro principais poluentes legislados em normas ambientais que regulamentam a

quantidade de poluentes emitidos por qualquer MCI são: o monóxido de carbono (CO), os óxidos de

azoto (NOx), os hidrocarbonetos (HC) e as partículas (PM). No caso dos MCI diesel, muito utilizados

em camiões, os principais poluentes gerados são as partículas e os óxidos de azoto.

Assim as normas ambientais que regulamentam os MCI diesel, têm vindo a exigir que estes

sejam projectados e equipados com novas soluções tecnológicas que limitem a quantidade de gases

poluentes emitidos por quilómetro percorrido ou por hora de funcionamento. Muitas destas soluções

tecnológicas têm conseguido reduzir a quantidade de determinados poluentes em várias ordens de

grandeza, levando no entanto algumas delas a ligeiros incrementos no consumo de combustível. Em

MCI diesel, são exemplo destas tecnologias, os filtros de partículas (DPF- Diesel Particulate Filter, na

literatura inglesa), a recirculação dos gases de escape (EGR- Exhaust Gas Recirculation, na literatura

inglesa) e os catalisadores de redução selectiva (SCR- Selective Catalytic Reduction, na literatura

inglesa). Por exemplo o SCR e o DPF impõem uma queda de pressão na linha dos gases de escape

que acabam por afectar negativamente de forma ligeira a eficiência energética do motor. O DPF,

3

devido aos diferentes modos de regeneração a que é sujeito, faz com que seja também necessário

utilizar combustível adicional neste processo.

Espera-se ainda que nas próximas versões das normas europeias (EUROVII) que

regulamentam as emissões de poluentes de motores de combustão interna venham a constar limites

para a emissão de dióxido de carbono. A figura 1.2 mostra um recorte de uma publicação de uma das

empresas mais importantes dos sistemas de gestão térmica de MCI. Este limite deverá ser fixado em

gramas de CO2 por tonelada transportada, por quilómetro percorrido. Por exemplo no Japão, existe a

intenção de que os veículos ligeiros novos que sejam vendidos a partir de 2015, deverão ter níveis de

emissões de CO2 12% inferiores aos veículos novos em 2002. O CO2, apesar de não ser considerado

um poluente directo, é considerado que o aumento das suas emissões para a atmosfera é

responsável pelo aumento do efeito de estufa, que por sua vez influencia o clima a nível global. Nos

MCI, a emissão de CO2 é uma medida directa do consumo de combustível, sendo impossível diminuir

as emissões deste gás sem diminuir o consumo de combustível. Para que seja assim possível

diminuir o consumo de combustível, efectuando o mesmo serviço que um MCI executava até aos dias

que correm, a única hipótese é melhorar a sua eficiência energética.

Figura 1.2 –In “Behr Technical Press Day 2010”. Este recorte de uma publicação demonstra os desafios futuros na área da melhoria de eficiência energética dos MCI.

Agrupando as preocupações e imposições ambientais agora referidas, às preocupações com

a escalada dos preços e à característica finita dos combustíveis fósseis, é então necessário

analisarmos os motores de combustão interna com vista a uma solução que consiga melhorar a sua

eficiência energética, não comprometendo o ambiente.

Independentemente do combustível utilizado, um veículo equipado com um MCI apresenta

geralmente uma baixa eficiência térmica. Na generalidade dos casos pode afirmar-se que a eficiência

térmica de um MCI não supera, num modo combinado de vários regimes, os 30%. Em geral, todos os

MCI rodoviários dissipam mais de 70% da energia química do combustível em calor, sendo apenas a

fracção restante transformada em energia mecânica para o movimento do veículo. Estas

características dos MCI rodoviários é algo que lhes é intrínseco devido às máquinas térmicas que

4

são, a limites construtivos e económicos e devido à variedade de regimes de funcionamento (rotação

e carga) em que são capaz de funcionar e variar rapidamente. Assim apresenta-se como única

solução o aproveitamento térmico do calor dissipado para fins de obtenção de trabalho adicional. A

figura 1.3 mostra o sistema típico de um MCI diesel de um veículo pesado, incluindo os sistemas nos

quais dissipa calor.

Figura 1.3 –Sistema típico de um MCI diesel de um veículo pesado e sistemas de dissipação de calor.

Observa-se a partir da figura 1.3 que o MCI dissipa calor principalmente através dos gases de

escape que deixam o sistema a elevada temperatura, através do intercooler onde o ar de admissão

comprimido pelo turbo-compressor é arrefecido, através do arrefecedor do EGR e através da energia

cedida pelo bloco do motor ao fluido de refrigeração. Neste caso o calor cedido pelo arrefecimento do

EGR e pelo bloco do motor são dissipados no radiador frontal do veículo, que faz parte do sistema de

refrigeração. Existem ainda outros MCI diesel de veículos pesados que têm permutadores de calor

dedicados ao arrefecimento do óleo do motor. O MCI perde ainda uma pequena parcela (entre 3% a

5% da energia do combustível) de calor por radiação e convecção através da superfície dos

componentes do motor.

Assim o principal objectivo do presente trabalho foca-se no estudo de uma solução de

aproveitamento da energia térmica contida nas diferentes fontes com a finalidade de a converter em

energia mecânica ou eléctrica útil ao sistema de propulsão e/ou sistemas auxiliares, melhorando a

eficiência térmica do sistema propulsor.

Esta recuperação de calor torna-se ainda mais importante e favorável em MCI diesel de

veículos pesados do que MCI de veículos ligeiros. As principais razões são:

1. Os veículos pesados toleram melhor o peso e volume adicionado pelo sistema de

recuperação de energia;

2. Os veículos pesados percorrem em geral maiores distâncias e em regimes de

funcionamento com variações mais suaves;

Sistema de Refrigeração

(Radiador)

Gases de Escape DPF e SCR

Turbo Intercooler

Ar

5

3. Os MCI diesel de veículos pesados utilizam elevadas fracções de EGR e exigem o

arrefecimento indirecto deste sistema;

4. A energia dissipada sobre a forma de calor apresenta grandezas apreciáveis.

Actualmente existem diversos sistemas de recuperação de energia térmica para o

aproveitamento de fontes de calor de baixa temperatura provenientes de áreas tão distintas como a

energia solar térmica, a energia geotérmica ou o calor residual de processos industriais. Para o caso

de MCI diesel de veículos pesados a solução, de aproveitamento de energia térmica para conversão

em energia mecânica, que apresenta à partida menor complexidade e com menores efeitos no

funcionamento normal do MCI, consiste na instalação de um ciclo de potência a vapor, normalmente

conhecido como ciclo de Rankine (RC, Rankine cycle, na literatura Inglesa). Para a produção de

trabalho um RC requer sempre a presença de uma fonte térmica quente, neste caso os diferentes

sistemas de dissipação de calor do MCI, e de uma fonte térmica fria, neste caso o ar atmosférico. Em

suma, com a instalação de um RC em um MCI, gera-se energia mecânica adicional a partir do calor

que era dissipado originalmente no MCI, diminuindo desta forma o consumo específico de

combustível e as emissões específicas de poluentes para uma mesma situação de funcionamento.

A energia mecânica produzida por o RC aplicado ao motor de um veículo pesado pode assim

ser utilizada sob a forma de energia mecânica, sendo transmitida directamente à cambota do MCI, ou

sob a forma de energia eléctrica para accionamento de sistemas auxiliares ou para o carregamento

da bateria.

Todas as melhorias de eficiência aplicadas a um MCI devem ainda ser acompanhadas de

hábitos de utilização mais eficientes, em que neste caso de veículos pesados se devem utilizar

sistemas de optimização de rotas de condução e posturas de condução com acelerações e

desacelerações suaves, de modo a minimizar o consumo de combustível.

1.2. Objectivos

O primeiro objectivo do presente trabalho consiste em efectuar uma revisão bibliográfica

aprofundada sobre os sistemas existentes para a gestão térmica de MCI diesel de veículos pesados,

aliando esta gestão ao conceito de recuperação de calor. Para além da revisão bibliográfica, o

presente trabalho tem os seguintes objectivos:

(i) Desenvolver um modelo termodinâmico para efectuar um balanço energético a um MCI

diesel de um veículo pesado com os sistemas apresentados na figura 1.3;

(ii) Quantificar a quantidade de calor disponível em cada subsistema do MCI e avaliar a sua

qualidade de aproveitamento através de uma análise exergética;

(iii) Seleccionar as fontes de calor a aproveitar, concebendo um circuito de recuperação de

energia térmica, em que um ciclo de Rankine é parte integrante de toda a gestão térmica

do MCI;

6

(iv) Desenvolver um modelo numérico (termodinâmico) que permita optimizar a selecção das

temperaturas e pressões do RC, maximize a recuperação de energia por parte do RC e

tenha em conta os limites e aspectos funcionais do MCI e os diferentes tipos de fluido de

trabalho utilizáveis;

(v) Seleccionar os tipos de permutadores de calor a utilizar na recuperação de calor das

fontes e efectuar o seu dimensionamento de modo a recuperar o calor sugerido pelo

modelo termodinâmico;

(vi) Efectuar simulações para vários regimes de funcionamento do motor, tentando encontrar

uma solução construtiva que permita utilizar os mesmos permutadores de calor para

todas as situações de funcionamento do motor;

(vii) Concluir e quantificar a melhoria da potência do conjunto, a redução do consumo de

combustível e avaliar qualitativamente os efeitos na gestão térmica do veículo.

1.3. Estrutura da dissertação

A presente dissertação encontra-se organizada em 7 capítulos. Neste primeiro capítulo é feita

uma breve introdução ao assunto em estudo, que inclui o enquadramento do tema e os objectivos do

trabalho. O capítulo 2 apresenta a revisão bibliográfica abordando os diferentes aspectos a ter em

conta na conjugação de um RC com um MCI. O capítulo 3 apresenta a análise e descrição do MCI

diesel de um veículo pesado que irá servir de base para o estudo. O capítulo 4 desenvolve o modelo

termodinâmico do RC e o modelo de optimização e selecção das fontes de calor e fluido de trabalho.

No capítulo 5 é apresentado o modelo numérico que permite o dimensionamento dos permutadores

seleccionados para o aproveitamento de calor no MCI para o RC. O capítulo 6 é dedicado à análise e

discussão dos resultados obtidos. Por fim, o capítulo 7 apresenta as principais conclusões resultantes

do presente trabalho e aponta para um conjunto de sugestões de trabalhos futuros.

7

Capítulo 2

2. Revisão bibliográfica

2.1. Introdução

O presente capítulo apresenta a revisão bibliográfica que resume as contribuições mais

significativas e necessárias para o desenvolvimento do presente trabalho.

O capítulo começa com uma introdução prévia ao ciclo de Rankine. Em seguida apresentam-

se informações recolhidas e trabalhos antecedentes acerca de componentes específicos que

constituem o RC ou que estudam a sua aplicabilidade à recuperação de calor. É de realçar que têm

sido necessários estudos de maior pormenor sobre os componentes que constituem um RC, devido a

estes não existirem muitas das vezes disponíveis à escala necessária para a recuperação de calor

em MCI.

2.2. Fundamentos teóricos

A par da energia hidroeléctrica, o desenvolvimento do ciclo de Rankine, por parte de William

Rankine, representou um dos grandes avanços da engenharia que permitiu a expansão da

electrificação a nível mundial. O RC é um ciclo termodinâmico que permite transformar parte do calor

recebido de uma fonte quente em trabalho, sendo o restante calor recebido da fonte quente libertado

numa fonte fria.

A constituição básica de um RC consiste num circuito fechado onde circula um fluído de

trabalho através da sequência dos quatro seguintes componentes chave: uma bomba, um

permutador que cede calor da fonte quente ao fluido de trabalho, um expansor acoplado a um

gerador e um permutador que rejeita calor do fluido de trabalho para a fonte fria. Nas instalações de

centrais a vapor onde o RC abastece a rede eléctrica, o fluido de trabalho utilizado é água e a fonte

quente de calor é constituída por uma caldeira onde se queima normalmente carvão e onde a água

passa ao estado de vapor, sendo depois este vapor expandido numa turbina que está acoplada a um

gerador. Os detalhes teóricos da termodinâmica de um RC serão aprofundados no capítulo 4.

8

2.3. Recuperação de energia térmica em MCI diesel de veículos

pesados

Desde a sua invenção, os MCI têm sofrido grandes alterações no sentido de melhorar a sua

eficiência energética e o seu desempenho ambiental. Nos últimos 5 anos tem surgido um interesse

geral na recuperação de calor em MCI de veículos, com vista à melhoria da sua eficiência energética,

e assim muitos estudos têm vindo a ser levados a cabo. Apesar das vantagens e da melhor

exequibilidade que apresenta a recuperação de calor em MCI diesel de veículos pesados,

relativamente a MCI de veículos ligeiros, muitos têm sido os estudos efectuados quer em MCI diesel

e de explosão de veículos ligeiros. Mais recentemente têm surgido estudos relativos a diferentes

circuitos de aproveitamento de energia térmica em MCI diesel de veículos pesados. Uma profunda

revisão bibliográfica acerca de trabalhos realizados em veículos ligeiros pode ser encontrada no

estudo efectuado por Domingues et al. (2013).

No presente capítulo apresentam-se assim apenas os trabalhos consultados e considerados

mais relevantes na área dos veículos pesados, apesar de numa revisão inicial efectuada terem sido

consultados trabalhos na área dos veículos ligeiros, energia geotérmica e recuperação de calor em

processos industriais. É de referir que alguns dos estudos consultados apresentam hipóteses que do

ponto de vista da exequibilidade técnica ou económica comprometem a aplicabilidade de um RC a

um MCI.

Durante a crise energética na década de 70 surgiu o primeiro estudo da integração de um RC

no MCI diesel de um veículo pesado. A empresa Mack Trucks criou em 1976 um protótipo com

alguns resultados significativos que poderiam chegar em condições laboratoriais a uma redução no

consumo de 10%. A tabela 2.1 apresenta um resumo das características principais dos estudos

consultados. As figuras de 2.1 a 2.8 mostram ainda alguns dos diferentes circuitos de recuperação de

energia térmica em MCI que já foram estudados.

9

Tabela 2.1 - Resumo dos estudos considerados mais relevantes efectuados na aplicação de um RC a um MCI diesel de um veículo pesado.

Autores Fontes Utilizadas Fluido

seleccionado Tcond[ºC] Tevap [ºC]

Redução máxima de consumo de

combustível

Circuito de recuperação

Eficiência considerada para o

expansor

Tipo de permutador

no evaporador

Teng, Park e Hunter, 2011 (AVL Powertrain

Eng. Inc.) EGR

c Etanol 80 120 5% Ver Figura 2.1 - -

Espinosa, Lemort e Quoilin (Renault Trucks

SAS) EGR R245fa - - - - - -

Kalina, 2011a,b

Escape e Refrigeração R123 e R245fa

- - 1.7% - - -

Fezer e Ambros, 2011 Escape e EGR - - - 5% Ver Figura 2.2 - -

Subramanian, 2013 (Eaton)

Escape e EGR Etanol - - 6% - - -

Vaja e Gambarotta. 2010

Escape e Refrigeração Benzeno 35 80 – 220 - Ver Figura 2.3 - Coaxial

Macián et al. 2013d Intercooler, EGR,

Escape e Refrigeração R245fa 50 - 10% - - -

Seher et al. 2012 (Robert Bosch GmbH)

Escape e EGR Etanol 100 - 4.5% Ver Figura 2.4 ~68% -

Katsanos, Hountalas e Pariotis, 2011

e Escape e EGR R245fa 44.2 - 10.7% - 85% Casca e

tubos

Hountalas et al. 2012e Escape e EGR R245ca - - 11.7% Ver Figura 2.5 85% -

Edwards, Eitel, Pantow e Geskes et al.2012

(Behr GmbH) Escape e EGR Etanol - - 6.9% Ver Figura 2.6 - -

Tahani et al.2013 Escape e Refrigeração R123 35 153 13.56% Ver Figura 2.7 80% -

aMotor estacionário a gás.

bDois ciclos de Rankine em Cascata.

cEstudo Experimental.

dPouco realista com permutadores com volumes muito superiores a 1 metro cúbico.

eNão cumpre o arrefecimento original do EGR e utiliza temperatura de condensação que em certos climas inviabiliza o sistema.

10

Figura 2.1 – Circuito de recuperação de calor proposto por Teng, Park e Hunter, 2011 (AVL Powertrain Eng. Inc).

Figura 2.2 – Circuito de recuperação de calor proposto por Fezer e Ambros, 2011.

Figura 2.3 – Circuito de recuperação de calor proposto por Vaja e Gambarotta 2010.

11

Figura 2.4 – Circuito de recuperação de calor proposto por Seher et al. 2012 (Robert Bosch GmbH).

Figura 2.5 – Circuito de recuperação de calor proposto por Hountalas et al. 2012.

12

Figura 2.6 – Circuito de recuperação de calor proposto por Edwards, Eitel, Pantow e Geskes et al.2012 (Behr

GmbH).

Figura 2.7 – Circuito de recuperação de calor proposto por Tahani et al.2013.

Figura 2.8 – Circuito de recuperação de calor proposto por Zhang et al. 2013 (MCI ligeiro, 2 ciclos em cascata)

13

2.3.1. Expansor

O expansor, a par do evaporador, é dos componentes mais importantes num ciclo de

Rankine, pois o seu desempenho condiciona directamente o desempenho do RC. É desejável que o

expansor seja adiabático e tenha um elevado rendimento isentrópico e mecânico. A função do

expansor é gerar trabalho através da expansão do vapor gerado no evaporador desde a pressão de

evaporação até à pressão de condensação. A selecção do expansor é normalmente efectuada tendo

em conta parâmetros como a gama de caudais do fluido de trabalho, as condições de pressão e

temperatura à entrada e saída e ainda como vai ser a energia gerada aproveitada (Quoilin e Lemort,

2008, 2009, 2010, 2011).

Em relação à pressão de trabalho, Chammas e Clodic (2005), afirmam que a maioria dos

expansores do tipo turbina a vapor só podem suportar uma pressão máxima para o fluido de trabalho

até 35 bar, o que limita bastante o rendimento térmico do RC, enquanto um expansor de pistão

alternativo pode operar até 100 bar.

A revisão bibliográfica de expansores aqui apresentada foca-se naqueles que possam ter

aplicabilidade em RC aplicados a MCI de veículos pesados, ou seja, expansores que tenham

potência de pelo menos 10 kW.

Bao e Zhao (2013) apresentam um trabalho profundo na catalogação dos diferentes tipos de

expansores que podem ser utilizados em RC de pequena dimensão, como é o caso dos aplicados na

recuperação de calor em MCI. Na tabela 2.2 apresentam-se as principais características dos

diferentes tipos de expansores identificados.

Tabela 2.2 – Comparação entre os expansores aplicáveis a RC de pequena dimensão.

Tipo Capacidade

(kW)

Velocidade de rotação

(rpm)

Custo relativo

Vantagens Desvantagens

Turbina de Admissão

Radial 50 - 500 8000 - 80000 Elevado

Leve, fabricação desenvolvida (devido aos turbos), muito eficiente em

condições nominais

Elevado custo, rendimento muito baixo

em condições não nominais e não funciona em condições bifásicas

Scroll (caracol

volumétrico) 1-10 <6000 Baixo

Eficiência elevada, fabricação simples, leve, baixa rotação e tolerância

de 2 fases

Baixa capacidade, lubrificação complexa e necessita de arranque

auxiliar

Expansor de Parafuso

15 – 200 <6000 Médio

Boa tolerância a 2 fases, baixa rotação e boa

eficiência mesmo em condições não nominais

Requer lubrificação, fabricação complexa e

dificuldades de estanquicidade

Êmbolo Alternativo 20 – 100 - Médio

Admite elevadas razões de pressão, fabricação

desenvolvida, adaptável a diferentes condições de funcionamento e tolera 2

fases

Muitas peças em movimento e

relativamente pesado

Expansor de palhetas

1 - 10 <6000 Baixo

Tolerante a 2 fases, binário estável, simples estruturalmente, baixo

custo e baixo ruído

Requer lubrificação e tem baixa capacidade

14

O trabalho de Bao e Zhao (2013) identifica também estudos de alguns investigadores que

desenvolvem diferentes protótipos de expansores para RC de pequena dimensão. A tabela 2.3

apresenta alguns desses protótipos e as suas características.

Tabela 2.3 – Alguns protótipos de expansores identificados por Bao e Zhao (2013).

Investigador Tipo Fluido Rendimento

isentrópico (%) Potência

(kW) Velocidade de rotação (rpm)

Razão de pressão

Kang et al. 2012

Turbina de Admissão

Radial R245fa 78.7 32.7 63000 4.11

Kim et al. 2007

Scroll (caracol volumétrico)

Água 33.8 11- 12 1000 - 1400 10.54 –

11.5

Smith et al. 2010

Expansor de Parafuso

R113 48 - 76 6 – 15.5 1300 - 3600 2.11

Baek et al. 2005

Êmbolo Alternativo

CO2 10.5 24.35 114 2.1

Subramanian (2013) da Eaton Corporation encontra-se também a desenvolver um protótipo

de um expansor de lóbulos especialmente dedicado a RC aplicados em MCI de veículos pesados.

Este expansor apresenta características semelhantes aos expansores de parafuso. A figura 2.9

mostra algumas características deste expansor.

Figura 2.9 – Expansor de lóbulos em desenvolvimento na Eaton Corporation, Subramanian (2013).

Teng et al. (2011), da AVL Powertrain Engineering Inc., sugere também que se podem

converter turbinas, e as suas volutas, de turbo-compressores de MCI em expansores, utilizando por

exemplo como expansor um turbo-compressor Garret GT25.

Um dos principais marcos que condicionou o presente estudo, de modo a fornecer-lhe a

maior exequibilidade possível, foi a identificação no decorrer da revisão bibliográfica de dois

expansores que se encontram já na fase comercial e que foram especificamente desenvolvidos para

o sector da recuperação de calor em MCI diesel de veículos pesados. Estes dois expansores são

ambos fabricados pela Bosch GmbH e apresentam características técnicas muito semelhantes,

apesar de serem de diferentes tipos, pois um consiste num expansor de êmbolos alternativos e o

outro numa turbina de admissão radial. Na tabela 2.4 são apresentadas as características principais

destes dois expansores comerciais.

15

Tabela 2.4 – Características dos expansores em fase comercial fabricados pela Bosch GmbH.

Expansor Êmbolos alternativos Turbina de admissão radial

Geometria

Cilindrada=0.9 l; Curso=81 mm; Diâmetro=87 mm;

Fluidos Recomendado:[Água; Etanol] Admissível:[R245fa] Recomendado:[Água]

Admissível:[Etanol; R245fa]

Geral Peso=40 kg; Potência max.=25kW;

Tmax.Serviço=300ºC (240ºC com etanol); pmax.Serviço=50bar;

Peso=25 kg; Potência max.=25kW;

Tmax.Serviço=300ºC (240ºC com etanol;

pmax.Serviço=50bar;

Vida útil 1600000 km 1600000 km

Amortização 2 anos (estimam poupança de 2500 litros de combustível por ano o que supõe um custo do

equipamento de cerca de 7500 euros)

Rendimentos Mecânico=[71.4;88.1]%

Isentrópico=[73.7;79.5]% (detalhes tabela 2.5)

Mecânico=[84;85.5]% Isentrópico=[44.7;67.7]%

(detalhes tabela 2.5)

Num estudo desenvolvido por Seher (2012), os expansores apresentados na tabela 2.4 foram

submetidos a testes experimentais e foram feitas simulações numéricas. A maioria dos resultados

deste estudo foram obtidos utilizando água como fluido de trabalho. Este estudo permitiu avaliar o

rendimento isentrópico e o rendimento mecânico dos expansores. Uma síntese dos resultados

obtidos neste estudo é apresentada na tabela 2.5.

Tabela 2.5 – Rendimento mecânico e isentrópico do estudo efectuado por Seher (2012).

Condição de funcionamento do motor

Rendimento (%) A100

a B25

a B50

a B75

a B100

a

Turbina de

admissão

radial

Experimental Mecânico - 84.0 85.5 84.9 -

Isentrópico - 49.0 54.4 57.0 -

Simulação

Numérica

Mecânico 84.4 85.7 84.0 84.9 84.3

Isentrópico 65.3 44.7 61.6 65.7 67.7

Êmbolo

alternativo

Experimental Mecânico

Resultados semelhantes aos da Simulação Numérica Isentrópico

Simulação

Numérica

Mecânico 88.1 71.4 82.0 86.3 87.9

Isentrópico 73.7 76.4 79.5 77.7 73.9

aDesignações normalizadas de condições de funcionamento específicas de um MCI de um veículo pesado,

utilizadas em testes de certificação de emissões de poluentes.

16

2.3.2. Bomba

A bomba é um dos 4 componentes chave de um RC. A função da bomba é elevar a pressão

do fluido de trabalho desde a pressão de condensação até à pressão de evaporação. Esta elevação

de pressão deve ser efectuada com o fluido no estado líquido para que o processo seja o mais

eficiente possível. A bomba pode receber o fluido directamente do condensador do RC ou pode

receber o fluído através de um reservatório de controlo ou segurança que recebe o fluído do

condensador. A selecção da bomba é normalmente efectuada tendo em conta parâmetros como a

gama de caudais do fluido de trabalho e as condições de pressão à entrada e saída da mesma. Os

RC aplicados a MCI de veículos pesados apresentam caudais relativamente baixos, enquanto que a

razão de pressão é muito condicionada pelo projecto e a selecção do fluído de trabalho do RC.

Nestas condições são normalmente escolhidas bombas volumétricas com princípios de

funcionamento e arquitecturas semelhantes às apresentadas pelos expansores na tabela 2.2. A

maioria dos estudos na área dos RC aplicados a MCI assumem eficiências isentrópicas para a bomba

iguais ou superiores a 80%, o que também é acompanhado e confirmado por bombas existentes no

mercado.

Apenas como exemplo, apresenta-se em seguida na figura 2.10 as características de uma

bomba de palhetas utilizadas no estudo de Teng (2011). A curva característica apresentada na figura

2.10 representa o funcionamento da bomba com etanol e a funcionar com um rendimento volumétrico

de 50%.

Figura 2.10 – Bomba de palhetas utilizadas no estudo de Teng (2011).

2.3.3. Fluido de trabalho

O fluido de trabalho num RC é o elemento fundamental do ciclo, pois é sobre ele que irão

ocorrer todos os processos termodinâmicos de compressão, expansão, aquecimento e arrefecimento.

Para aplicações de elevada dimensão (>1MW) e elevada temperatura da fonte quente (>800ºC) o

fluído de trabalho indiscutível é a água. Já em aplicações de RC de dimensão pequena e

temperaturas da fonte quente inferiores a 800ºC a selecção do fluído de trabalho já não é tão

consensual. A selecção do fluído de trabalho acaba por condicionar todo o projecto do RC, pois para

a recuperação de determinada quantidade de calor, diferentes caudais de fluido de trabalho são

17

necessários, diferentes dimensões de permutadores de calor são necessárias e pode ainda

determinar o tipo de bomba e expansor a seleccionar.

Assim, em RC aplicados a MCI, devem seguir-se alguns procedimentos na selecção do fluido

de trabalho. Deve ter-se em atenção que tipo de redução de consumo de combustível se deseja

atingir e efectuar alguns cálculos prévios. A selecção do fluido tem ainda uma interacção directa com

a selecção das fontes de dissipação de calor a recuperar do MCI, pois são obrigatórios

arrefecimentos de determinadas fontes para a vitalidade do motor e existem ainda limitações de

espaço e peso a adicionar ao veículo.

Bao et al. (2013) apresentam uma revisão profunda dos principais candidatos a fluidos de

trabalho de RC de baixa temperatura. Quando os fluidos são orgânicos, muitos autores, denominam o

ciclo termodinâmico de ciclo de Rankine orgânico (ORC, na literatura inglesa). Na selecção do fluido

de trabalho devem ser tidos em conta os seguintes parâmetros: temperatura da fonte fria,

temperatura da fonte quente, pressão que se pode atingir com determinado evaporador e expansor

seleccionado, a resistência à fadiga térmica do fluido, o impacto ambiental do fluido e a relação custo/

eficiência térmica que permite o RC atingir.

Mago et al. (2008) e Liu et al. (2004) sugerem que um dos factores que influencia mais a

eficiência térmica do RC é a temperatura de evaporação, pelo que a temperatura e pressão crítica do

fluído é bastante importante. Liu et al. (2004) verificou que a temperatura de evaporação óptima

depende da temperatura de entrada dos gases de escape e da temperatura de condensação.

Outra característica da maior importância na selecção do fluído de trabalho foca-se no tipo de

expansão que permite idealmente, estando este facto relacionado directamente com o declive da

linha de vapor saturado no diagrama de Temperatura vs Entropia (T-s). Os fluidos de trabalho podem

assim apresentar 3 tipos de classificação, consoante o tipo de expansão proporcionado: fluido

isentrópico, húmido e seco. A figura 2.11 apresenta o diagrama T-s típico destes 3 tipos de fluidos.

Figura 2.11 – Representação esquemática de fluidos (a) isentrópicos, (b) húmidos e (c) secos.

A maioria dos fluidos inorgânicos pode ser classificada com a classificação de húmidos. São

exemplos deste tipo de fluidos a água, etanol e o amoníaco. Os fluidos húmidos exigem o

sobreaquecimento do vapor de modo a evitar o risco do expansor funcionar em condições bifásicas e

poder sofrer danos e percas de eficiência.

18

A maioria dos fluidos orgânicos são fluidos secos ou isentrópicos, com excepção de alguns

fluidos de pequenas moléculas, como metano e etano. O benzeno, o R113 e R245fa apresentam-se

como fluidos secos. Para este tipo de fluidos, o processo de expansão no RC termina no estado de

vapor sobreaquecido, região seca.

Como exemplo de fluidos isentrópicos temos o R11, R12 e R134a, que apresentam a

inclinação quase vertical da curva de saturação de vapor no diagrama T-s para a maior parte da

gama de temperaturas de operação. Num processo de expansão isentrópica o estado do fluido de

trabalho acompanha a curva de vapor saturado.

Para a maioria dos fluidos orgânicos, a instabilidade térmica ocorre para temperaturas

relativamente baixas, portanto, estes fluidos sofrem decomposição química e deterioração a altas

temperaturas e pressões, não sendo recomendável o seu sobreaquecimento (Chammas e Clodic,

2005).

Conclui-se que a selecção do fluído de trabalho dependerá sempre da aplicação em causa,

dos seus regimes de funcionamento e da interacção com a escolha dos outros componentes do RC.

2.3.4. Permutadores de calor

Qualquer que seja a dimensão ou particularidades de um ciclo de Rankine, este possui

sempre dois permutadores de calor chave: um evaporador e um condensador.

O evaporador é no caso dos RC aplicados a MCI um dos componentes mais importantes para

a eficiência do sistema e para a redução efectiva do consumo de combustível que se pretende

efectuar. Escolhido o fluido de trabalho, o expansor e a bomba, o rendimento térmico do RC é

determinado directamente através das condições de pressão e temperaturas impostas no

funcionamento do ciclo. O rendimento térmico do RC representa directamente a fracção de calor

introduzida no ciclo através do evaporador que se transformará em trabalho útil. Assim, fixas as

condições e a constituição do RC, quanto mais calor e melhor for o projecto e a selecção do

permutador de calor para o evaporador, maiores serão os ganhos de eficiência energética e redução

de poluentes alcançados com a aplicação do RC a um MCI.

O projecto do permutador de calor que constituirá o evaporador deverá ter em conta

parâmetros como a pressão de evaporação, as temperaturas envolvidas e os caudais mássicos do

fluído de trabalho e do fluido térmico da fonte ou fontes térmicas a serem recuperadas. A nível de

exequibilidade técnica devem ser definidos como objectivos e restrições do projecto questões

relacionadas com a minimização de peso e volume do permutador, maximização da área de permuta

e coeficientes de convecção, e minimização das perdas de carga que possam afectar o

funcionamento do motor ou o funcionamento do RC (Mavridou et al., 2010).

A selecção do condensador do RC é também fundamental no aspecto de exequibilidade

técnica do sistema. A selecção do permutador de calor que constituirá o condensador deve ter em

conta limitações de volume e peso, a pressão de condensação, os caudais dos fluidos envolvidos e

19

as temperaturas climatéricas no caso da permuta de calor ser efectuada directamente com a

atmosfera local. O condensador, dependendo do circuito de recuperação desenhado para o RC

aplicado a um MCI, tem ainda uma influência fulcral na gestão térmica do motor, podendo no caso de

este estar associado ao sistema de refrigeração, permitir o arranque e aquecimento do motor mais

rapidamente, diminuindo a emissão de poluentes que é bastante gravosa no arranque a frio do motor.

Devido à variedade de condições que podem ser encontradas na recuperação das mais

diversas fontes de dissipação de calor de um MCI, grande variedade pode ser também encontrada

para os permutadores de calor candidatos a evaporador ou condensador no RC. Alguns estudos têm

sido efectuados no sentido de tentar definir quais os tipos de permutador de calor mais indicados para

os RC aplicados a MCI [Lee et al.(2008), Wipplinger et al. (2006), Mavridou et al. (2010)]. Existe

também na literatura da especialidade de permutadores de calor muita informação essencial

[Azevedo et al. (2005), Heat Atlas (2ª edição, 2010)].

Cascales et al. (2007) apresentam um estudo relativo a correlações de transferência de calor

de condensação e evaporação em permutadores de placas.

Mavridou et al. (2010) apresentam uma análise comparativa entre diferentes tipos de

permutador de calor candidatos a evaporador no RC aplicado a um MCI. Estudam e comparam as

geometrias de permutadores de corpo e feixe tubular com tubos lisos, tubos corrugados e tubos com

alhetas circulares, permutadores compactos de placas e permutadores de espuma metálica. Nos

permutadores de espuma metálica são analisadas duas dimensões específicas para a espuma

metálica. A figura 2.12 mostra uma representação esquemática das 5 geometrias de permutadores de

calor analisados por Mavridou et al. (2010).

Figura 2.12 – Representação esquemática das 5 geometrias de permutadores analisados por Mavridou et al.,

(2010): (a) corpo e feixe tubular (tubos lisos); (b) corpo e feixe tubular (tubos com alhetas circulares); (c) corpo e

feixe tubular (tubos corrugados); (d) permutador compacto de placas; (e) permutador de espuma metálica.

(a) (b) (c)

(d) (e)

20

Os resultados de Mavridou et al. (2010) indicam que os permutadores de espuma metálica e

o permutador de corpo e feixe tubular com alhetas circulares permitem aproveitar mais do dobro do

calor, para o mesmo volume de permutador, do que os permutadores de corpo e feixe tubular de

tubos lisos e corrugados e do que os permutadores compactos de placas. Já a perda de carga que se

origina na configuração dos permutadores de espuma metálica é algumas ordens de grandeza

superiores às registadas nos outros tipos de permutadores, o que pode levar à impossibilidade de

aplicação em RC aplicados a MCI.

Horst et al. (2013), representando a BMW, apresentam um estudo de um RC aplicado a um

MCI de um veículo ligeiro. Neste estudo recuperam calor dos gases de escape utilizando um

permutador de tubos alhetados no interior de uma conduta fechada, representado na figura 2.13.

Figura 2.13 – Permutador de tubos alhetados estudado por Horst et al. (2013).

A tabela 2.6 apresenta um resumo geral dos diferentes tipos de permutador candidatos a

evaporador ou condensador no RC em estudo.

Tabela 2.6 – Resumo geral dos diferentes tipos de permutador de calor aplicáveis ao RC em estudo.

Tipo Pressão máxima

(bar)

Temperatura máxima (ºC)

Vantagens Desvantagens

Permutador de corpo e

feixe tubular

300 (corpo)

1400 (feixe) 600

Facilidade de limpeza, versátil, limites de pressão e

temperatura elevados.

Peso, volume, vibrações no feixe e percas de calor para o

ambiente elevadas.

Permutador de placas

25

(60 soldado)

150

(400 soldado)

Construção modular e facilidade de limpeza.

Limite na diferença de pressão das correntes. (Limpeza difícilse

for soldado)

Permutador compacto

Depende da construção e

material

Depende da construção e

material

Peso, volume, elevados coeficientes de transferência

de calor

Limite de pressão e temperatura baixo e dificuldade de limpeza

Permutador de tubos alhetados

500 (tubos) 600

Peso, volume, elevados coeficientes de t. cal. facilidade de limpeza

Custo inicial elevado

Permutador de espuma

metálica

Depende da construção e

material

Depende da construção e

material

Peso e volume relativo muito baixo.

Custo inicial muito elevado, quedas de pressão elevadas,

deformação por acção da pressão e dificuldade de fabrico.

21

2.3.5. Controlo do sistema e análise dinâmica

Um motor de combustão interna tem a capacidade de funcionar numa ampla gama de

regimes de carga e velocidade de rotação. A variabilidade no tempo destes regimes depende da

utilização específica do MCI. É de esperar que os MCI de veículos ligeiros, que fazem percursos

maioritariamente urbanos, apresentem transientes mais drásticos do que os MCI de veículos

pesados, que fazem percursos maioritariamente em auto-estradas e estradas nacionais. Assim ao

associar-se um RC na recuperação de diversas fontes de calor de um MCI, devem de existir

estratégias de controlo do RC e que ao mesmo tempo asseguram o contínuo regular funcionamento

do MCI. Relativamente ao RC deve ser conseguido manter as condições de funcionamento de

pressão e temperatura definidas num projecto estacionário a determinado regime de funcionamento

do MCI. No MCI, dependendo das fontes de calor que são abrangidas pelo circuito de recuperação de

calor desenvolvido, devem ser asseguradas funções vitais ao motor como por exemplo: controlo

adequado da temperatura do refrigerante, arrefecimento adequado do ar comprimido no turbo-

compressor, arrefecimento adequado do EGR e garantir que o sistema de tratamento dos gases de

escape não é afectado.

Assim, mais importante do que efectuar análises transientes no decorrer do projecto do

sistema, é necessário que seja contemplada e desenvolvida uma estratégia de controlo do sistema

para qualquer regime estacionário de funcionamento do motor, ou para os regimes de funcionamento

mais frequentes.

Endo et al. (2007), em representação da Honda, apresentam um estudo de um RC aplicado a

um MCI de um veículo ligeiro. Neste estudo propõem estratégias de controlo da pressão de

evaporação e da temperatura do fluido de trabalho à entrada do expansor. Estas estratégias são

apresentadas na forma de diagrama de blocos na figura 2.14.

Figura 2.14 – Controlo da temperatura do vapor (em cima) e controlo da pressão de evaporação (em baixo)

(Endo et al. 2007).

22

Horst et al. (2013) apresentam uma série de sistemas suplementares ao circuito de

recuperação de calor que constituem o RC. O circuito de recuperação é apresentado na figura 2.15.

Tal como Seher et al. (2012) na figura 2.4, o estudo de Horst et al. (2013) apresenta um bypass ao

expansor, o que pode ser útil numa situação de paragem ou arranque do sistema em que o vapor

vindo do evaporador poderá ainda não apresentar as condições requeridas à expansão. Na figura 2.4

é possível ainda ver um depósito de segurança, uma bomba para auxiliar o escoamento do

condensado, uma série de sensores de temperatura e pressão e um distribuidor de caudal, que

permitirão o controlo e actuação do sistema através de uma unidade de comando. Na figura 2.15 é

ainda possível visualizar um bypass ao evaporador dos gases de escape que permite, em conjunto

com o controlo de velocidade da bomba e um difusor regulável na entrada do expansor, controlar as

condições de funcionamento do RC.

Figura 2.15 – Circuito de recuperação de calor proposto por Horst et al. (2013).

23

Capítulo 3

3. Análise do MCI em estudo

3.1. Introdução

O presente capítulo apresenta o motor de combustão interna que irá servir de base ao

presente estudo de aplicação de um RC a um MCI. Os vários sistemas térmicos do motor são

analisados e é feita a caracterização energética e exergética de cada fonte de dissipação de calor. É

apresentado e discutido por fim o circuito de recuperação de calor a estudar e projectar. A

temperatura de referência utilizada nos cálculos de exergia é 25ºC.

3.2. Características gerais

O motor utilizado no presente estudo representa o motor típico encontrado num veículo

pesado diesel que é capaz de cumprir as últimas normas de certificação ambiental EUROV e

EUROVI. As informações relativas ao motor foram retiradas do livro “Diesel EngineSystem Design”

(Xin Q., 2011).

As análises do motor e a apresentação dos resultados do projecto de aplicação do RC serão

feitos maioritariamente, ao longo do presente estudo, recorrendo a mapas de Binário efectivo do

motor vs Velocidade de rotação do motor (Be-N). Estes mapas, também conhecidos por diagramas de

colinas ou performance maps na literatura inglesa, permitem visualizar o comportamento do

parâmetro em estudo ao longo dos diferentes regimes de carga e velocidade de rotação de um MCI.

Ao longo de todo o presente estudo, incluindo a análise das diversas fontes de calor, as

propriedades termofísicas dos fluidos são calculadas recorrendo ao software Refprop 9.0. Todos os

cálculos efectuados no presente estudo foram efectuados recorrendo a um software implementado

em Matlab.

A tabela 3.1 apresenta as principais características do MCI em estudo.

24

Tabela 3.1 – Características do MCI utilizado no presente estudo (Q. Xin, 2011).

Item Parâmetro Unidade

Ciclo de funcionamento 4 tempos - Cilindrada 15999 cm

3

Nº de cilindros 6 - Válvulas/ cilindro 4 - Combustível Diesel - Injecção de combustível Common rail - Gama de velocidade de rotação [800 ; 2000] r/min Potência máxima 384 (515) kW (cv) Binário máximo 2292 às 1200 N.m às r/min Normas ambientais respeitadas EUROVI -

O esquema dos diversos sistemas do MCI do veículo pesado em estudo já foi apresentado na

figura 1.3. O motor é sobrealimentado, tem um arrefecedor do EGR e um intercooler, possui filtro de

partículas e sistema de SCR. A figura 3.1 apresenta o mapa do consumo específico de combustível

sobreposto com as isolinhas da potência efectiva. Este tipo de mapa é o mapa que mais

frequentemente se encontra disponível acerca de um MCI. O motor em estudo apresenta uma

potência efectiva máxima de 384 kW e um binário efectivo máximo de 2292 N.m às 1200 r/min. O

valor mínimo do consumo específico é de cerca de 200 g/kW.h, que representa o valor típico

encontrado para um MCI diesel sobrealimentado (Lopes J., 2003).

Figura 3.1 – Mapa do consumo específico de combustível com a sobreposição de isolinhas da potência efectiva

(valores e linhas a negrito).

É também importante conhecer o tipo de utilização do MCI, ou seja, os regimes de

funcionamento mais frequentemente utilizados. Por exemplo os MCI estacionários acoplados a

geradores eléctricos funcionam a velocidades de rotação constantes, com binários variados. MCI de

veículos ligeiros em utilização urbana são caracterizados por utilização de regimes de velocidade de

rotação e binário muito variados. Já os MCI de veículos pesados são caracterizados por usos de

auto-estrada e variação entre regimes de forma suave.

25

Edwards et al. (2012) apresentam a frequência de utilização dos regimes de funcionamento

de um MCI diesel de um veículo pesado, num percurso de auto-estrada/ estrada nacional. Esta

distribuição de frequências é feita utilizando pontos de funcionamento normalizados, que são

provenientes do teste de certificação ambiental ESC (European Stationary Cycle) e têm classes de

velocidade (A, B e C) e regimes de carga (25%, 50%, 75% e 100%). O modo de definição destes

pontos de funcionamento e a frequência de utilização dos mesmos num percurso de auto-estrada,

com o MCI em estudo, é dado na figura 3.2.

Figura 3.2 – Definição dos pontos normalizados no ESC e frequência em percentagem da utilização dos

mesmos num percurso de auto-estrada (esquerda) e distribuição da probabilidade de utilização dos modos no

MCI em estudo (direita).

A distribuição de probabilidade apresentada na figura 3.2 permite definir as zonas onde

prioritariamente o ciclo de Rankine a projectar deve ter um bom desempenho.

3.3. Sistema de combustível

Como já referido na tabela 3.1, o MCI em estudo utiliza diesel como combustível e apresenta

um sistema de injecção Common rail, onde o combustível parte de uma régua de injecção comum

para todos os injectores. A partir da figura 3.1 é possível calcular o mapa do caudal de combustível

através da equação (3.1). Para calcular a energia química, ou calor de combustão, inserida no MCI

através do combustível, basta multiplicar o caudal de combustível pelo PCI (poder calor inferior) do

diesel (42,8 MJ /kg). A figura 3.3 apresenta o caudal de combustível e o calor de combustão.

𝒎 𝒄𝒐𝒎𝒃 =𝑪𝒆𝑷𝒆

𝟑𝟔𝟎𝟎𝟎𝟎𝟎 (3.1)

26

Figura 3.3 – Caudal de combustível (esquerda) e calor de combustão (direita).

Um dos parâmetros mais importantes de um MCI é o seu rendimento efectivo, também

denominado de eficiência térmica. Este parâmetro relaciona a quantidade de trabalho efectivo

disponibilizado pelo motor, relativamente à energia introduzida no mesmo através do combustível. O

rendimento efectivo do motor pode ser calculado através da equação (3.2) e o seu mapa é

apresentado na figura 3.4. O valor máximo do rendimento efectivo é 43,2%, o que é um valor normal

para um motor diesel sobrealimentado de um veículo pesado.

𝜼𝒆 =𝑷𝒆

𝑸𝒄𝒐𝒎𝒃 (3.2)

Figura 3.4 – Rendimento efectivo do MCI em estudo.

27

3.4. Análise energética e exergética das fontes de calor

No presente subcapítulo serão analisadas individualmente as 4 fontes de dissipação de calor

do MCI diesel em estudo. A análise do ponto de vista energético e exergético permitirá avaliar a

viabilidade técnica e económica da recuperação e utilização das fontes de calor no circuito de

recuperação utilizado no RC.

3.4.1. Intercooler

A primeira fonte de dissipação de calor a ser analisada é o intercooler, que neste MCI

consiste num radiador onde o ar de admissão, proveniente do turbo-compressor, é arrefecido pelo ar

atmosférico. A sobrealimentação de um motor através da compressão do ar de admissão permite

aumentar significativamente o rendimento efectivo de um MCI. No entanto a potência efectiva de um

MCI decresce com o inverso da raiz quadrada da temperatura de admissão, pelo que se torna

essencial o arrefecimento do ar proveniente do turbo-compressor. Para o MCI em estudo é fornecido

o mapa da razão ar/combustível, pelo que é possível obter o mapa do caudal de ar de admissão a

partir deste. Para obter o mapa do caudal de ar de admissão basta multiplicar a razão ar/combustível

pelo caudal de combustível apresentado na figura 3.3. A razão ar/combustível e o caudal de ar de

admissão são apresentados na figura 3.5. Os valores apresentados para a razão ar combustível

comprovam uma das características principais dos MCI diesel, o funcionamento com excesso de ar,

pois a razão ar/combustível estequiométrica para o combustível diesel é 14,42.

Figura 3.5 – Razão ar combustível (esquerda) e caudal mássico de ar de admissão (direita).

Para analisar termodinamicamente a dissipação de calor no intercooler são ainda

disponibilizados os mapas da pressão do intercooler e a temperatura de entrada e de saída do ar de

admissão. Estes mapas são apresentados na figura 3.6.

28

Figura 3.6 – Pressão no intercooler, temperatura de entrada e saída do ar de admissão, respectivamente.

Na figura 3.6 é possível verificar que a razão máxima de sobrealimentação é cerca de 3, o

que é habitual para MCI diesel de grandes dimensões. É de referir ainda que as temperaturas

apresentadas podem variar ligeiramente com o clima local e com a velocidade do veículo. O cálculo

do calor dissipado e a exergia disponível em cada uma das fontes de calor do MCI são calculados

recorrendo às equações genéricas 3.3 e 3.4, respectivamente.

𝑸 = 𝒎 (𝒉𝒊𝒏 − 𝒉𝒐𝒖𝒕) (3.3)

𝑬𝒙 = 𝒎 𝒉𝒊𝒏 − 𝒉𝒐𝒖𝒕 − 𝑻𝟎 𝒔𝒊𝒏 − 𝒔𝒐𝒖𝒕 (3.4)

Figura 3.7 – Calor dissipado no intercooler e exergia disponível neste processo de arrefecimento.

A partir da figura 3.7 é possível verificar que tanto o calor como a exergia no intercooler

aumentam com a carga e a velocidade de rotação do motor. Verifica-se ainda que no ponto onde o

calor dissipado é máximo, este representa cerca de 7% da energia do combustível. A exergia, no seu

máximo de 14,6kW, pode representar cerca de 3,7% da potência efectiva.

29

3.4.2. Sistema do EGR

A segunda fonte de dissipação de calor a ser analisada é o arrefecedor do EGR que, no MCI

em estudo, consiste num permutador de calor, onde os gases de escape recirculados são arrefecidos

pelo líquido de refrigeração que vêm do bloco do motor, ou seja, que já arrefeceu o bloco do motor. O

sistema do EGR permite uma redução significativa do poluente NOx através da diminuição da

temperatura da combustão. O sistema do EGR é de alta pressão, ou seja, os gases recirculados são

admitidos após o turbo-compressor. No entanto estudam-se actualmente sistemas de EGR de baixa

pressão, em que os gases recirculados são tratados no sistema de tratamento dos gases de escape e

são admitidos antes do turbo-compressor. Os sistemas de EGR de baixa pressão permitirão assim

deixar de limitar a razão de sobrealimentação e levarão a menos deposição de partículas no

arrefecedor do EGR.

Para o MCI em estudo é fornecido o mapa da fracção de gases recirculados, pelo que é

possível obter o mapa do caudal de EGR a partir deste. Para obter o mapa do caudal de EGR basta

multiplicar a fracção de EGR pela soma do caudal de ar de admissão com o caudal de combustível. A

fracção de EGR e o caudal de EGR são apresentados na figura 3.8. Como já tinha sido referido no

Enquadramento do presente trabalho, os MCI diesel de veículos pesados apresentam elevadas

fracções de EGR, relativamente aos MCI diesel de veículos ligeiros.

Figura 3.8 – Fracção de EGR (esquerda) e caudal mássico de EGR (direita).

Para analisar termodinamicamente a dissipação de calor no arrefecedor do EGR são ainda

disponibilizados os mapas da pressão do EGR e a temperatura de entrada e de saída do EGR no

arrefecedor. Estes mapas são apresentados na figura 3.9.

30

Figura 3.9 – Pressão no arrefecedor do EGR, temperatura de entrada e saída do EGR, respectivamente.

Na figura 3.9 é possível verificar que a pressão do EGR é superior à da corrente do ar de

admissão, o que demonstra que nos sistemas de EGR de alta pressão, o caudal de EGR esteja

limitado pela diferença de pressão entre o colector de escape e o colector de admissão do MCI.

Observa-se ainda que a temperatura de entrada no arrefecedor é em grande parte função da binário

requerido ao motor. É da maior relevância ainda frisar o facto de que para que o sistema de EGR

desempenhe correctamente a sua função será necessário, no caso de se utilizar esta fonte como

fonte quente num RC, que o arrefecimento seja sempre feito até temperaturas de cerca de 100ºC. O

cálculo do calor dissipado e a exergia disponível são calculados recorrendo às equações 3.3 e 3.4,

respectivamente.

Figura 3.10 – Calor dissipado no EGR e exergia disponível no processo de arrefecimento.

A partir da figura 3.10 é possível verificar que no ponto onde o calor dissipado é máximo, este

representa cerca de 7,6% da energia do combustível, o que em termos energéticos é semelhante ao

valor encontrado para o intercooler. A exergia, no seu máximo de 33,5kW, pode representar cerca de

8,7% da potência efectiva do motor. Verifica-se então desde já que a recuperação do calor do EGR

apresenta um potencial muito superior ao do intercooler.

31

3.4.3. Sistema de refrigeração

A terceira fonte de dissipação de calor a ser analisada é o sistema de refrigeração, em

particular o arrefecimento do bloco do motor. O arrefecimento do bloco do motor é absolutamente

essencial para vitalidade do motor, visto que existem bastantes limitações nas temperaturas que

determinados componentes podem atingir. É também no arrefecimento do bloco do motor que, neste

MCI em estudo, é efectuado o arrefecimento do óleo de lubrificação do próprio motor. O sistema de

refrigeração recolhe o calor do arrefecimento do bloco do motor, em seguida o calor do arrefecimento

do EGR e por fim liberta esta quantidade de calor através de um radiador onde o calor é dissipado no

ar atmosférico. Para o MCI em estudo é fornecido o mapa do calor do arrefecimento do bloco e o

mapa da temperatura de saída do fluido de refrigeração do arrefecedor do EGR, ambos

representados na figura 3.11. Verifica-se que o calor máximo libertado pelo bloco, 180kW, representa

19% da energia do combustível.

Figura 3.11 – Calor libertado no bloco (esquerda) e temperatura do refrigerante à saída do EGR (direita).

Na secção anterior foi já calculado o calor cedido ao fluido de refrigeração através do

arrefecimento do EGR. No entanto para a análise energética e exergética do sistema de refrigeração

falta, na informação do MCI em estudo, a temperatura do fluido de refrigeração à entrada e saída do

bloco e o caudal mássico do fluido. Para colmatar a falta de informação foi consultado o livro

“Handbook of Diesel Engines”, onde se apontam técnicas para colmatar as faltas de informação. A

tabela 3.2 resume as principais características que os sistemas de refrigeração de MCI diesel de

veículos pesados apresentam.

Tabela 3.2 – Características do projecto de um sistema de arrefecimento de um MCI diesel rápido.

Item Parâmetro Unidade

Aumento de temperatura do fluido de refrigeração [4 ; 8] ºC

Temperatura de entrada no bloco [76 ; 87] ºC

Temperatura de saída do bloco [80 ; 95] ºC

Caudal específico [50 ; 90] l/kW.h

Pressão do circuito [1 ; 2.7] bar

Quantidade de glicol presente na água [0 ; 50] %

32

É então assumido o valor de 70 l/kW.h que garanta que, à potência máxima efectiva do

motor, a temperatura de entrada do refrigerante do bloco é inferior a 87ºC. Para o restante mapa do

MCI assume-se que o caudal do fluido de refrigeração é directamente proporcional à velocidade de

rotação da bomba de água (assumindo rendimento volumétrico const.), que por sua vez é

directamente proporcional à velocidade de rotação do motor. É seleccionada ainda como pressão

para o circuito 1.5 bar e os cálculos são efectuados considerando que o fluido de refrigeração é

maioritariamente composto por água. Estimado o valor do caudal do fluido, a determinação da

temperatura de entrada e saída do bloco do motor passa por a resolução de um sistema de duas

equações semelhantes à equação 3.3, em que uma representa o calor de arrefecimento do bloco e

outra do EGR. O mapa do caudal de refrigerante e das temperaturas do refrigerante de entrada e

saída do bloco são apresentados na figura 3.12.

Figura 3.12 – Caudal de refrigerante e temperatura de entrada e saída do bloco, respectivamente.

O cálculo da exergia disponível no processo de aquecimento do fluido de refrigeração no

bloco do motor é efectuado recorrendo ao simétrico da equação 3.4.

Figura 3.13 – Exergia disponível no processo de aquecimento do refrigerante no bloco do motor.

A partir da figura 3.13 é possível verificar que a exergia, no seu máximo de 31.7kW, pode

representar cerca de 8.2% da potência efectiva do motor. Verifica-se então desde já que apesar da

quantidade de calor a recuperar no bloco ser muito superior à do EGR e à do intercooler, a

quantidade de exergia disponível é semelhante à do EGR.

33

3.4.4. Sistema de escape

A quarta e última fonte de dissipação de calor a ser analisada no MCI em estudo é o sistema

de exaustão dos gases de escape. O sistema de exaustão dos gases de escape inicia-se no colector

de escape, onde a fracção não recirculada passa através da turbina do turbo-compressor, gerando

trabalho necessário ao compressor de ar de admissão. A seguir à turbina, os gases de escape,

entram no sistema de tratamento. O sistema de tratamento dos gases de escape, obrigatório devido à

legislação ambiental, é neste MCI composto pelo filtro de partículas, seguido do catalisador selectivo

de redução. O sistema de tratamento dos gases de escape requer temperaturas elevadas, pelo que

na eventualidade de recuperação desta fonte de calor, o permutador de recuperação de calor terá de

ser colocado a jusante do sistema de tratamento dos gases de escape. Através de estudos e

optimizações acústicas será possível utilizar o possível permutador de calor como silenciador do

sistema de exaustão dos gases de escape. O silenciador do sistema de exaustão limita o ruído do

funcionamento do motor e está geralmente a jusante do sistema de tratamento dos gases de escape.

Apesar da temperatura dos gases de escape subir ligeiramente após o sistema de

tratamento, dependente do funcionamento do próprio sistema, apenas é fornecido o mapa da

temperatura dos gases de escape à saída da turbina do turbo-compressor, pelo que esta temperatura

será a utilizada na avaliação do potencial de recuperação de calor. Para obter o mapa do caudal dos

gases de escape basta subtrair o caudal do EGR à soma do caudal do ar de admissão com o caudal

do combustível. O mapa do caudal de gases de escape e a temperatura de saída dos gases de

escape é apresentado na figura 3.14.

Figura 3.14 – Caudal de gases de escape (esquerda) e temperatura de saída dos gases (direita).

Verifica-se que como seria de esperar, a temperatura dos gases de escape é inferior à

temperatura de entrada dos gases no arrefecedor do EGR, visto que estes gases já foram

expandidos na turbina do turbo-compressor. Como não é dado o valor do calor dissipado pelo

sistema de escape, e como não se sabe a temperatura até à qual um eventual sistema de

recuperação de calor levará os gases de escape, torna-se então necessário efectuar um balanço de

34

energia ao MCI em estudo. As únicas componentes do balanço de energia que são actualmente

desconhecidas são: o calor dissipado nos gases de escape, o calor dissipado através de convecção e

radiação nos componentes do motor e as perdas mecânicas. Na equação 3.5 de balanço de energia

ao motor encontram-se entre parênteses rectos as três componentes desconhecidas.

𝑸𝒄𝒐𝒎𝒃 + 𝒎 𝒂𝒓𝒉𝒂𝒓 = 𝑷𝒆 + 𝑸𝒓𝒆𝒇𝒓𝒊,𝑩𝒍𝒐𝒄𝒐 + 𝑸𝑬𝑮𝑹 + 𝑸𝑰𝒏𝒕𝒆𝒓 + 𝑸𝒗á𝒓𝒊𝒐𝒔 + 𝑸𝑬𝑺𝑪 + 𝑾𝒎𝒆𝒄â𝒏𝒊𝒄𝒂𝒔 (3.5)

Grande parte da literatura sobre MCI diesel refere que a componente do calor dissipado por

convecção e radiação pode geralmente representar no máximo 3% da energia do combustível. As

perdas mecânicas, na definição abordada neste estudo, incluem o trabalho necessário para accionar

os orgãos auxiliares indispensáveis ao funcionamento do motor, os atritos nos componentes móveis e

as perdas por bombagem na expulsão e admissão de gás fresco. As perdas mecânicas dependem do

rendimento mecânico do motor, que é definido como a razão entre a potência efectiva e a potência

criada na expansão dos gases no interior dos cilindros do MCI. Nos MCI diesel de veículos pesados,

numa utilização a carga elevada, o rendimento mecânico pode ser ligeiramente superior a 50%, o que

permite afirmar que neste caso as perdas mecânicas são de grandeza igual ou inferior à potência

efectiva do motor. No entanto o rendimento mecânico de um motor varia bastante com a carga, o que

no caso de não se conhecer o mapa desta grandeza, torna muito complicada a tentativa de estimar

as perdas mecânicas. Assim, na figura 3.15 apresenta-se a componente conjunta calculada através

da equação 3.5 e apresenta-se a estimativa para a componente Qvários como 3% de Qcomb.

Figura 3.15 – Calor da componente conjunta (esquerda) e calor de convecção e radiação (direita).

A partir da figura 3.15 é possível verificar que a componente de calor por convecção e

radiação é inferior a qualquer uma das componentes anteriormente estudadas.

O cálculo da exergia disponível num eventual processo de recuperação de calor dos gases de

escape, com o arrefecimento dos mesmos até cerca dos 220ºC, é efectuado recorrendo à equação

3.4. O mapa da exergia deste processo é apresentado na figura 3.16.

Wmecânicas+

35

Figura 3.16 – Exergia do processo de arrefecimento dos gases de escape até aos 220ºC.

A partir da figura 3.16 é possível verificar que a exergia, no seu máximo de 48,7kW, pode

representar cerca de 12,7% da potência efectiva do motor. A recuperação de calor nos gases de

escape apresenta-se assim como a fonte de calor de melhor qualidade.

3.5. Circuito de recuperação de calor proposto

A definição do circuito de recuperação de energia a aplicar na introdução de um RC no MCI

em estudo é fundamental. O objectivo fundamental do presente estudo é reduzir o consumo de

combustível, especialmente nos regimes mais utilizados. A implementação do sistema num veículo

pesado deve estar sujeito a restrições técnicas condicionantes do normal funcionamento do MCI e

restrições de volume, peso e custo do sistema.

No presente estudo é efectuado um elevado esforço no sentido de tornar a implementação do

sistema o mais exequível e realista possível num futuro bastante próximo, tendo como panorama de

fundo os componentes actuais disponíveis no mercado para a construção do sistema e a constituição

actual dos grupos moto-propulsores de veículos pesados.

Como é apresentado no capítulo 2, existem estudos nos quais algumas das restrições e

hipóteses apresentadas agora não foram tidas em conta. Existem estudos que consideram

expansores com elevadas eficiências isentrópicas e com potências não disponíveis no mercado.

Existem também estudos que utilizam temperaturas de condensação bastante baixas (<50ºC) no RC,

que invalidam à partida a utilização do sistema na maioria dos climas mundiais e requereriam

condensadores de dimensões impraticáveis. Existem ainda estudos onde fontes de calor vitais para o

funcionamento do MCI, como por exemplo o EGR, são parcialmente recuperadas deixando então em

aberta a necessidade de continuar a ter outro permutador de calor que termine o arrefecimento até às

temperaturas requeridas para o bom funcionamento do MCI. Por fim existem ainda estudos que

36

utilizam até 2 RC em cascata, com fluidos de trabalho diferentes, que apesar de poderem apresentar

resultados ligeiramente melhores que um RC sozinho, tornam inviável a aplicação do sistema devido

à restrição de custo, peso ou espaço, visto que quase todos os componentes do RC são necessários

a duplicar. Todas as fraquezas agora apontadas de outros estudos são tidas em conta na definição

do circuito de recuperação de calor.

Relativamente ao sistema do intercooler, a recuperação de calor tem como vantagem a

libertação de espaço na parte frontal do veículo pesado. No entanto a recuperação desta fonte de

calor apresenta um potencial inferior, relativamente às outras fontes.

Relativamente à recuperação de calor no sistema do EGR, esta tem como grande vantagem

retirar carga térmica do sistema de arrefecimento, que ao necessitar de menos arrefecimento, permite

poupança de combustível adicional, pois em MCI diesel, em determinados regimes, o ventilador de

assistência do sistema de refrigeração pode requerer potências de 30kW e a bomba de água de 6kW.

Relativamente ao sistema de refrigeração, apresenta-se tecnicamente pouco viável a

recuperação de calor no interior dos actuais blocos do motor. Substituir o fluido de refrigeração por

um fluido de trabalho a funcionar a uma pressão de evaporação elevada, para obter um aceitável

rendimento térmico do RC, pode levar a problemas estruturais dos actuais blocos e ao

sobreaquecimento do motor, devido a zonas isoladas do bloco onde se concentrem bolsas de vapor.

A utilização do circuito de refrigeração no circuito de recuperação de calor, aplicado a um MCI, torna-

se no entanto bastante atractivo como fonte fria para o processo de condensação do RC. A utilização

do circuito de refrigeração como fonte fria permite colocar o condensador do RC em qualquer

localização disponível no veículo pesado e permite o RC operar em qualquer clima. A sobrecarga a

que se sujeita assim o circuito de refrigeração pode ser compensada pelo calor do EGR que não é

enviado para este sistema, no caso do calor do EGR ser recuperado.

Relativamente ao sistema de escape, a fonte com maior potencial, o projecto de recuperação

de calor necessita apenas de não introduzir uma perda de carga significativa na linha de escape e

não deverá afectar o desempenho do sistema de tratamento dos gases de escape. A temperatura a

que está limitado o arrefecimento dos gases é a temperatura de cerca de 100ºC, para que não ocorra

a condensação do vapor de água dos produtos de combustão.

Após a exposição de argumentos apresentada, o circuito proposto para a recuperação de

calor no MCI em estudo exclui o sistema do intercooler, propõe o sistema do EGR e dos gases de

escape como fontes quentes do RC e sugerem o sistema de refrigeração como fonte fria do RC. A

disposição das fontes quentes poderia ser em série ou em paralelo, optando-se por a solução em

paralelo, pois permite maior controlo sobre o sistema e maximiza o diferencial de temperaturas

encontrado pelo fluido de trabalho. O maior controlo das fontes quentes deve-se ao facto de ao

contrário do que acontece no EGR, o arrefecimento dos gases de escape é livre do ponto de vista do

funcionamento do motor. A maximização do diferencial de temperaturas permite que os permutadores

de calor requeridos tenham menor dimensão. Quanto ao posicionamento da fonte fria no circuito de

refrigeração, ou seja, o permutador que executará o papel de condensador no RC, este é posicionado

37

a montante da entrada no bloco, pois o refrigerante apresenta menor temperatura, o que permite

diminuir a dimensão do condensador a projectar. Como se verá no capítulo 5, executa-se um bypass

do refrigerante ao condensador para fins de controlo do sistema. O circuito de recuperação de calor

proposto para o MCI em estudo, através de um RC, é apresentado na figura 3.17.

Figura 3.17 – Circuito de recuperação de calor proposto para o MCI em estudo, através de um RC.

Como é possível verificar na figura 3.17, a energia eléctrica gerada no alternador acoplado ao

expansor do RC poderá ser injectada no MCI através do seu alternador modificado para que possa

funcionar enquanto motor também. O circuito de recuperação proposto é ainda assente em cálculos

preliminares que foram efectuados com diferentes fluidos de trabalho e com os expansores existentes

no mercado.

Sistema de Refrigeração

(Radiador)

DPF e SCR

Turbo

Ar

Gases de Escape

Distribuidor de caudal

Distribuidor de caudal

Bomba RC

Expansor RC

Condensador RC

Evaporador do Escape

RC

Evap

ora

do

r

do

EG

R

RC

---Fluido de trabalho

---Gases de escape

---Fluido de refrigeração

---EGR

Intercooler

Ar de arrefecimento

38

Capítulo 4

4. Modelo termodinâmico

4.1. Introdução

No presente capítulo é dada ênfase à modelação termodinâmica do ciclo de Rankine e é

apresentada a estratégia definida para o seu funcionamento nos diversos regimes de funcionamento

do MCI.

É ainda apresentada a selecção do fluido de trabalho e os seus critérios, bem como o

algoritmo de optimização e selecção das temperaturas até que são arrefecidos os fluidos térmicos

das fontes de calor a recuperar.

4.2. Modelação do ciclo de Rankine

O ciclo de Rankine apresenta-se como um dos maiores avanços tecnológicos na área da

energia desde a revolução industrial. O RC é um ciclo termodinâmico onde, com a injecção de calor

no ciclo, através de uma fonte quente, se realiza trabalho mecânico e se expulsa calor para uma fonte

fria. Um RC, na sua forma mais básica, consiste numa bomba, um evaporador, um expansor e um

condensador, onde circula em circuito fechado um fluido de trabalho.

Num RC ideal considera-se que o fluído de trabalho fluí através de todos os componentes do

ciclo na ausência de irreversibilidades, sendo assim os processos no expansor e na bomba

considerados isentrópicos e os processos nos permutadores de calor considerados sem perdas de

carga. No entanto, os efeitos das irreversibilidades introduzidos por bombas e expansores reais não

são desprezáveis e acabam por afectar significativamente o rendimento térmico do RC. Na figura 4.1

apresenta-se um diagrama T-s com um RC real (linha a tracejado) e um RC ideal (linha a cheio).

Existem ainda outras perdas menos significativas para a análise termodinâmica, como por exemplo

as perdas de carga nas tubagens e permutadores de calor e as perdas de calor por convecção e

radiação na superfície dos componentes.

39

Figura 4.1 – Diagrama T-s para o RC real (linha a tracejado) e para o RC ideal (linha a cheio).

O processo de 1 a 2s representa uma compressão isentrópica do fluido de trabalho, desde a

pressão de condensação até à pressão de evaporação. No entanto, como as irreversibilidades que

ocorrem numa bomba real não são desprezáveis, o estado real do fluido de trabalho após a bomba é

representado por 2, estado de maior entropia, mas mesma pressão do que 2s. O trabalho real

específico requerido na bomba é dado pela equação 4.1 e o rendimento isentrópico de uma bomba é

definido pela equação 4.2.

𝑾𝒃/𝒎 𝒇 = 𝜼𝒃(𝒉𝟐𝒔 − 𝒉𝟏) (4.1)

𝜼𝒃 =𝑾𝒃𝑰𝒔𝒆𝒏𝒕𝒓ó𝒑𝒊𝒄𝒐

𝑾𝒃𝒓𝒆𝒂𝒍

=𝒉𝟐𝒔−𝒉𝟏

𝒉𝟐−𝒉𝟏 (4.2)

O processo de 2 a 3 representa a injecção de calor no ciclo através da fonte quente, que

neste caso são as fontes de calor a recuperar, mais precisamente o calor dos gases de escape e do

EGR. Este processo dá-se em paralelo em dois permutadores de calor. O calor específico injectado

no ciclo é calculado através da equação 4.3.

𝑸𝒊𝒏/𝒎 𝒇 = 𝒉𝟑 − 𝒉𝟐 (4.3)

O processo de 3 a 4s representa uma expansão isentrópica do fluido de trabalho desde a

pressão de evaporação até à pressão de condensação. No entanto, como as irreversibilidades que

ocorrem num expansor real não são desprezáveis, o estado real do fluido de trabalho após o

expansor é representado por 4, estado de maior entropia, mas mesma pressão do que 4s. O trabalho

real específico fornecido pelo expansor é dado pela equação 4.4 e o rendimento isentrópico de um

expansor é definido pela equação 4.5.

𝑾𝒆/𝒎 𝒇 = 𝜼𝒆(𝒉𝟑 − 𝒉𝟒𝒔) (4.4)

𝜼𝒆 =𝑾𝒆𝒓𝒆𝒂𝒍

𝑾𝒆𝑰𝒔𝒆𝒏𝒕𝒓ó𝒑𝒊𝒄𝒐

=𝒉𝟑−𝒉𝟒

𝒉𝟑−𝒉𝟒𝒔 (4.5)

40

O processo de 4 a 1 representa a rejeição de calor pelo ciclo através da fonte fria, que no

caso em estudo apresentado no capítulo 3 é o circuito de refrigeração. O calor específico rejeitado

pelo ciclo é calculado através da equação 4.6.

𝑸𝒐𝒖𝒕/𝒎 𝒇 = 𝒉𝟒 − 𝒉𝟏 (4.6)

Um dos parâmetros mais importantes do RC é o rendimento térmico do ciclo, ou seja, que

fracção do calor injectado pela fonte quente é que é convertido em trabalho liquido. O rendimento

térmico de um RC pode ser calculado através da equação 4.7.

𝜼𝑹𝑪 =𝑾𝒆−𝑾𝒃

𝑸𝒊𝒏 (4.7)

É desejável que tanto a turbina como a bomba funcionem com o fluido de trabalho num

estado monofásico. A bomba deverá funcionar com líquido comprimido, evitando a ocorrência de

cavitação. O expansor deve funcionar com vapor sobreaquecido, numa situação extrema com vapor

saturado, dependendo das características de expansão do fluído ser necessário ou não realizar um

sobreaquecimento do vapor.

As equações de (4.1) a (4.7) são obtidas a partir da 1ª lei da termodinâmica e onde foram

consideradas desprezáveis as variações de energia cinética e de energia potencial.

Na modelação termodinâmica do RC, integrado no aproveitamento de calor de um MCI,

várias são as hipóteses que devem ser aplicadas de modo a tornar o problema mais simples de

modelar.

Tabela 4.1 – Hipóteses assumidas no modelo termodinâmico do RC aplicado ao MCI.

𝑻𝒄𝒐𝒏𝒅 = 𝟏𝟎𝟎 ℃ (garante o funcionamento do ciclo em qualquer clima, permite colocar o condensador

do RC em qualquer local e permite que a fonte fria de condensação seja o circuito de refrigeração;

𝒑𝒄𝒐𝒏𝒅 ≥ 𝟏𝟎𝟏, 𝟑𝟐𝟓 𝒌𝑷𝒂 (evita a inclusão de ar nos componentes do RC);

𝜼𝒆 = 𝟎, 𝟕𝟎 (o expansor seleccionado para o projecto do actual estudo é o expansor de embolo

alternativo desenvolvido pela Bosch, já no mercado, e com as características apresentadas na tabela

2.5 da revisão bibliográfica) e 𝜼𝒑 = 𝟎, 𝟖𝟎;

Arrefecimento mínimo dos gases de escape até aos 230ºC e arrefecimento do EGR até aos 120ºC

(temperatura admissível no arrefecimento original da figura 3.9, diminui problemas de deposição de

partículas que pode evitar o efeito de aumento de perda de carga)

Perdas de carga desprezáveis nos permutadores de calor e tubagens;

Expansão seca para todos os fluidos de trabalho.

Diferença mínima de temperaturas entre fonte quente e o fluido em evaporação de 20ºC (conceito de

pinch point) e limitação da eficiência de permuta dos evaporadores através de Tg,out

As hipóteses propostas, apresentadas na tabela 4.1, assentam na revisão bibliográfica

efectuada e nos constrangimentos e características do circuito de recuperação proposto, tendo como

objectivo principal projectar um sistema com total exequibilidade técnica e económica.

41

4.3. Estratégia de funcionamento do RC

Os RC utilizados em centrais termoeléctricas funcionam normalmente em regimes nominais

para os quais foram projectados e para os quais apresentam maior eficiência térmica. Num MCI, que

é caracterizado por bastantes regimes de funcionamento possíveis, a gestão do funcionamento do

RC, aplicado na recuperação de calor no MCI, deve seguir alguma estratégia de funcionamento.

Tendo em conta aspectos construtivos, restrições de volume, espaço e dinheiro, a selecção dos

componentes do RC, a selecção do fluido de trabalho e as temperaturas e caudais das fontes

quentes, podem definir-se as condições óptimas de funcionamento do RC. Sabe-se por exemplo que

o aumento da pressão de evaporação aumenta o rendimento térmico do RC, podendo esta no

entanto estar limitada por razões construtivas dos permutadores de calor, por a pressão crítica do

próprio fluido ou por a temperatura da fonte quente. Outro exemplo é o aumento do

sobreaquecimento do vapor no evaporador, que pode aumentar o rendimento térmico do ciclo, mas

que pode estar condicionado pela temperatura suportada pelo expansor, pela temperatura crítica ou

por a temperatura da fonte fria.

Na conjunção dos problemas de controlo e complexidade gerados pela solução de selecção

de uma só geometria rígida para os componentes do RC e no facto de para diferentes regimes de

funcionamento do MCI existirem diferentes condições óptimas do RC, devido à interligação com a

variabilidade da temperatura das fontes quentes, surgiram os contributos mais importantes do

presente trabalho. A utilização das fontes quentes em paralelo (circuito proposto, figura 3.17),

juntamente com o conceito de um evaporador de geometria variável inovador e inventado pelo autor

do presente estudo, é possível definir para todo o mapa de funcionamento do motor uma única

condição de funcionamento do RC, mantendo este a funcionar sempre às mesmas pressões e

temperaturas, variando apenas o caudal do fluído de trabalho. Devido aos constrangimentos que

existiam até agora quanto à geometria fixa dos componentes do RC e quanto à variabilidade das

temperaturas das fontes quentes, muitos autores propunham soluções bastante complexas em que a

pressão de evaporação e a temperatura de sobreaquecimento do vapor deveria ser alterada para

outros valores óptimos, consoante o regime de funcionamento do MCI.

Juntando os argumentos até agora apresentados com o facto de os MCI diesel de veículos

pesados variarem maioritariamente de forma suave entre regimes de funcionamento, faz com que as

soluções apresentadas em regime estacionário sirvam de soluções para transientes que se podem

aproximar a uma sequência de vários regimes estacionários.

Em suma e respeitando todos os constrangimentos de projecto, a estratégia apresentada no

presente estudo consiste em encontrar um único valor óptimo para a temperatura de

sobreaquecimento do vapor, da pressão de evaporação e da pressão de condensação, que permitam

optimizar o RC em todos os regimes do MCI. Auxiliando esta estratégia está a geometria em paralelo

das fontes quentes, os evaporadores de geometria variável desenvolvidos pelo autor, o controlo de

divisão de caudal pelas fontes quentes, um bypass do fluido de refrigeração ao condensador e um

tanque após a bomba (não representado explicitamente na figura 3.17) que permite acumular fluido à

42

pressão de evaporação e tornar todo o funcionamento do RC mais suave. A alteração de caudal

absoluto do fluido de trabalho é efectuada através da variação da velocidade de rotação da bomba. O

arrefecimento dos fluidos térmicos das fontes quentes é criteriosamente seleccionado para melhorar

a controlabilidade do sistema.

4.4. Selecção do fluido de trabalho

Na revisão bibliográfica já foram referenciadas as principais interacções que existem entre a

selecção do fluído de trabalho e o restante projecto de um RC. Existem inúmeros fluidos de trabalho

candidatos à recuperação de calor às mais diversas fontes de um MCI. No entanto, num MCI diesel

de veiculo pesado, atendendo à geometria em paralelo das duas fontes quentes seleccionadas e

ainda atendendo ao facto do expansor da Bosch ter sido seleccionado como peça essencial à

demonstração de plena exequibilidade do projecto, surgiram como candidatos os fluidos

apresentados na tabela 4.2.

Tabela 4.2 – Resumo das propriedades termodinâmicas dos fluidos seleccionados.

Fluido de trabalho

𝑝𝑐𝑟

[Mpa] 𝑇𝑐𝑟

[℃] 𝐸𝑣𝑎𝑝𝑜𝑟𝑎çã𝑜 𝑛𝑜𝑟𝑚𝑎𝑙 [℃]

𝑝 𝑐𝑜𝑛𝑑 , 𝑇=100℃

[bar]

Tipo de Expansão

Preço [eur/l]

Riscos

Água 22,06 473,95 100,0 0,123 Húmida - Corrosivo

Etanol 6,14 240,6 78,4 2,3 Húmida 4

Inflamável (temp. de

auto-ignição de 363ºC)

R245fa 3,64 154,15 14,9 12,5 Seca 27 -

Verifica-se, através da tabela 4.2, que a água tem como vantagens uma temperatura e

pressão criticas bastante elevadas. A água e o etanol apresentam grande facilidade em condensar à

pressão atmosférica, isto perante a maioria dos climas no nosso planeta, e apresentam expansões

húmidas, o que obriga a efectuar o sobreaquecimento do vapor. O R245fa tem como vantagens uma

temperatura de evaporação baixa, o que permite fazer recuperação de calor com fontes quentes de

baixa temperatura, e apresenta uma expansão seca, o que permite não sobreaquecer o vapor.

Como o circuito de recuperação proposto utiliza o sistema de refrigeração como fonte fria, e a

temperatura deste sistema está compreendida entre os 80 e os 90ºC, é necessário utilizar uma

pressão de condensação para o fluído de trabalho que faça com que este tenha uma temperatura de

condensação de pelo menos 100ºC, isto para que haja uma diferença finita de temperaturas e seja

possível minimizar o tamanho do condensador projectado.

O expansor comercial seleccionado para o presente estudo permite pressões de evaporação

até 50 bar. Relativamente à água e ao etanol, e explorando toda a capacidade do expansor, o R245fa

não consegue ser competitivo, pois apresenta rendimentos térmicos do RC muito baixos devido à

pressão crítica ter o valor de 36,4bar e a pressão de condensação para uma temperatura de

43

condensação de pelo menos 100ºC ser 12,5 bar. Para efectuar uma melhoria a um RC implementado

com R245fa, o sistema requer um regenerador de calor que permita melhorar o rendimento do ciclo, o

que trás mais custos e mais espaço ocupado no veículo pesado. Através de alguns cálculos

preliminares é possível observar que o R245fa só se torna competitivo, relativamente à água e ao

etanol, caso a temperatura de condensação seja igual ou inferior a cerca de 50ºC, o que inviabilizaria

o funcionamento do sistema na maioria dos climas mundiais e necessitaria de um arrefecimento

directo com ar atmosférico, que iria ocupar bastante espaço com o condensador na frente do veiculo,

espaço esse já bastante escasso nas configurações actuais.

A água é geralmente utilizada como fluido de trabalho para fontes quentes com temperaturas

superiores a 800ºC, facto que não ocorre nas fontes de calor de um MCI diesel de um veículo

pesado, como se comprova na figura 3.9 e figura 3.14. Para que exista uma diferença mínima de

temperaturas de pelo menos 20ºC entre a fonte quente e o processo que ocorre ao fluido de trabalho

no evaporador, são testados preliminarmente diferentes pressões de evaporação e com o respectivo

sobreaquecimento do vapor para que o resultado da expansão seja vapor saturado, quer para o caso

da água, quer para o caso do etanol. Estes testes foram efectuados utilizando um arrefecimento fixo

do EGR até aos 120ºC, condição vital ao funcionamento do motor, e os gases de escape até aos

230ºC. Respeitando a diferença mínima de temperatura de projecto, levando a cabo os

arrefecimentos estimados anteriormente, e ao longo de todos os regimes de funcionamento do MCI

em estudo, observa-se que o etanol apresenta melhores rendimentos térmicos do RC, relativamente

à água, pois permite com estes arrefecimentos funcionar em todos os regimes do MCI à pressão

máxima admitida pelo expansor de 50 bar. A desvantagem da água, relativamente ao etanol, verifica-

se devido a esta apresentar maiores entropias de vaporização, ou seja, a curva de saturação num

diagrama T-s é mais “larga” e apresenta linhas isobáricas no lado do líquido comprimido com maior

declive, o que impossibilita o cumprimento das condições de diferença de temperatura mínima de

projecto em grande parte dos regimes do MCI e obriga a baixar a pressão de evaporação, fazendo

com que o RC com água tenha rendimentos térmicos inferiores aos do etanol. Assim o fluido de

trabalho utilizado no estudo é o etanol, tal como acontece em muitos outros estudos de RC aplicados

a MCI diesel de veículos pesados. Alguns dos resultados dos testes com etanol são apresentados na

figura 4.2, mais precisamente são observadas as variações do rendimento térmico do RC, da razão

de volumes no expansor, da temperatura de sobreaquecimento mínima do vapor e da temperatura de

evaporação do etanol, todos em função da pressão de evaporação, e para diferentes rendimentos

isentrópicos do expansor.

44

Figura 4.2 – Variação de características do RC com etanol, variando a pressão de evaporação.

4.5. Optimização termodinâmica

No decorrer dos testes de selecção do fluido de trabalho, referidos na secção anterior, foi

definido que o fluído de trabalho a utilizar é o etanol. Para que seja possível cumprir as condições de

projecto previstas na tabela 4.1 e tendo em conta a informação da tabela 4.2, no caso de a escolha

ser o etanol, é possível definir as condições de pressão e temperatura do RC com etanol, condições

estas apresentadas na figura 4.3.

45

Figura 4.3 – Diagrama T-s do RC real com etanol e condições definidas para todo o estudo.

Como foi referido na tabela 4.1, é definido um valor mínimo de arrefecimento para os gases

de escape e é fixo o valor de temperatura de arrefecimento do EGR. A definição de um arrefecimento

mínimo dos gases de escape até 230ºC prende-se com o facto de em alguns regimes de

funcionamento do MCI serem possíveis arrefecimentos até temperaturas mais baixas, como é

possível verificar na figura 3.14. Assim a temperatura de arrefecimento dos gases de escape é alvo

de optimização em torno dos diferentes regimes de funcionamento do MCI. A condição adicional

aplicada ao projecto na optimização é o arrefecimento máximo dos gases de escape até aos 110ºC, o

que evita a condensação do vapor de água dos produtos de combustão.

Em suma, o calor dissipado no arrefecedor do EGR do motor original continua a ser

aproveitado na quase totalidade para o RC, sendo que a temperatura de arrefecimento é fixa nos

120ºC, temperatura média no MCI original, e que é vital ao mesmo que se mantenha dentro deste

valor. Já os gases de escape são arrefecidos desde a temperatura apresentada na figura 3.14,

temperatura aproximada após o sistema de tratamento dos gases de escape, até uma temperatura

que é optimizada segundo os constrangimentos apresentados atrás.

Estado Pressão

[bar] Temperatura

[ºC]

1 2,3 100

2 49 102

3 49 227

4 49 227

5 49 240

6 2,3 100

ηe= 70%

ηb= 80%

ηRC= 13,75%

46

Capítulo 5

5. Modelação dos permutadores de calor

5.1. Introdução

No presente capítulo apresenta-se a selecção e modelação dos permutadores de calor que

fazem parte da instalação do RC aplicado ao MCI em estudo.

Apresenta-se o método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 que permite modelar qualquer tipo de permutador de calor.

É seleccionado o tipo de permutador de calor a aplicar na linha de escape e no circuito do

EGR, de modo a evaporar o etanol e recuperar calor do MCI para o RC. Na selecção do tipo de

permutador a aplicar nas fontes quentes, é desenvolvido um dos maiores contributos do presente

trabalho, com o desenvolvimento de um permutador de calor de geometria variável.

É ainda apresentado o trabalho elaborado na selecção do tipo de permutador de calor que

servirá de condensador do RC.

5.2. Evaporadores

Na revisão bibliográfica já foi evidenciada a importância da escolha correcta do permutador

de calor que servirá de evaporador num RC. Tal como foi justificado no capítulo anterior, a pressão

no evaporador é de 49 bar e através de cálculos preliminares é possível verificar que o caudal de

etanol, o fluido de trabalho, é da ordem de grandeza do caudal dos fluidos das fontes quentes

seleccionadas, factos que devem ser tidos em conta na selecção do tipo de permutador. É possível

verificar ainda, através das figuras 3.9 e 3.14, que os permutadores a seleccionar funcionarão com

temperaturas máximas de aproximadamente 600ºC.

Num veículo pesado, e no actual circuito de recuperação em estudo, os evaporadores das

duas fontes quentes a recuperar devem respeitar os seguintes requisitos de projecto:

i) Como os fluidos térmicos das fontes quentes são gases, deve promover-se a área de

contacto dos gases com o permutador, maximizando-a;

ii) Minimização do peso;

iii) Limitar o volume do permutador, no caso do EGR, ao volume do arrefecedor do EGR

original do motor (~0.025m3), e no caso do escape, limitar o volume do permutador ao

volume do silenciador original do veículo pesado (~1m3);

47

iv) Facilidade de fabrico e limpeza;

v) Controlabilidade de modo a ser possível controlar a eficiência de permuta que permita

manter as condições de temperatura e pressão apresentadas na figura 4.3, perante as

condições de temperatura de entrada e caudais mássicos dados na figura 3.8, 3.9 e 3.14,

e perante as temperaturas de arrefecimento consideradas óptimas para o EGR e para os

gases de escape;

vi) Para que não ocorram efeitos significativos no motor, devido à perda de carga introduzida

por os evaporadores introduzidos nestes subsistemas, a perda de carga deve ser

minimizada e limitada ao valor de 0.2 bar do lado dos gases das fontes quentes.

No capítulo 2, a tabela 2.6 apresenta um resumo e comparação entre os diferentes tipos de

permutadores de calor que existem no mercado vulgarmente. Perante os requisitos de projecto

apresentados acima, o permutador de calor que apresenta maior potencial de aplicação na

recuperação de calor do EGR e dos gases de escape é o permutador de calor de tubos alhetados

(PCTA). Num PCTA, com o fluido de trabalho a passar no interior dos tubos e os gases de escape e

do EGR por o exterior desses tubos, propicia-se o incremento da área de permuta dos gases. O tipo

de permutador seleccionado para os dois evaporadores a aplicar nas duas fontes, apresenta ainda

uma construção modular e simples, e consoante a selecção da geometria, é possível cumprir a

minimização de peso, do volume e da perda de carga no lado dos gases. O PCTA permite ainda uma

relativa fácil limpeza quer do circuito dos gases, quer do circuito do fluido de trabalho. Todos os

restantes tipos de permutadores de calor apresentados na tabela 2.6 não evidenciam a diferenciação

entre a área de permuta dos gases térmicos e a área de permuta do fluido de trabalho líquido. Um

permutador de placas não soldadas não permitia ainda atingir os níveis de pressão de evaporação

requeridos, enquanto que se soldado fosse, não permitia a limpeza necessária. Os permutadores de

espuma metálica e os permutadores compactos apresentavam as limitações na limpeza, na

simplicidade de fabrico e nas pressões de evaporação.

O PCTA seleccionado é de alhetas contínuas, com serpentinas em série na longitudinal do

permutador e o permutador encontra-se enclausurado numa conduta, para que haja estanquicidade

do circuito dos gases e estes não contornem o permutador. O permutador de calor assim escolhido

para a recuperação de calor nas fontes quentes é geometricamente semelhante ao permutador de

calor estudado por Horst et al. (2013) e que se pode visualizar na figura 2.13. As correlações

empíricas que permitem calcular os coeficientes de convecção e a perda de carga neste tipo de

permutador de calor podem ser consultadas em Heat Atlas (2ª edição, 2010)].

Uma das principais lacunas que surge nos estudos mais recentes acerca da aplicação do RC

na recuperação de calor de fontes de calor do MCI de veículos é a questão da controlabilidade da

eficiência de permuta do evaporador do RC. Muitos dos estudos mais completos, em que é estudado

o evaporador do RC em torno de diferentes regimes de funcionamento do MCI, apenas se chega à

conclusão de que para diferentes regimes de funcionamento, são requeridas diferentes áreas de

permuta. Seriam assim necessários diferentes permutadores de calor para que se mantivessem as

condições consideradas óptimas para o RC, perante os limites do fluido de trabalho e componentes

48

seleccionados. Algumas das soluções apresentadas envolvem um bypass variável dos gases

térmicos ao evaporador, variando consoante o regime do MCI, tendo esta solução como

consequência negativa a não recuperação total do calor que era possível recuperar da fonte. Outra

das soluções encontradas para controlar o funcionamento do RC, perante a variabilidade de regimes

do MCI, é alterar sempre que necessário as condições de temperatura e pressão de evaporação no

ciclo, o que traz problemas adicionais de controlo, exequibilidade e complexidade do sistema. No

deparar destas limitações de soluções para lidar com a necessidade de se precisar de uma área de

permuta variável, para efectuar um aproveitamento óptimo das fontes do MCI e um controlo óptimo

do funcionamento do RC, foi desenvolvido um dos maiores contributos do presente trabalho.

Desenvolveu-se um conceito com 2 comportas verticais inseridas na conduta onde o PCTA se

encontra enclausurado, que permite, de uma forma simples e eficaz, variar artificialmente a área de

permuta dos gases térmicos com o permutador, o que permite controlar a eficiência de permuta do

evaporador e controlar o RC com os seus parâmetros de funcionamento determinados como óptimos,

perante os componentes e fluido de trabalho seleccionados. O conceito descrito é apresentado na

figura 5.1.

Figura 5.1 – Conceito em corte do PCTA enclausurado de geometria variável desenvolvido: 2 situações

extremas de funcionamento e uma situação intermédia.

Na figura 5.1 é possível verificar o conceito desenvolvido de PCTA enclausurado e de

geometria variável. O fluído de trabalho, a cinzento na figura 5.1, circula em contracorrente com os

gases térmicos de modo a minimizar as dimensões máximas do permutador. As duas comportas, a

verde na figura 5.1, introduzidas na conduta que encerra o PCTA permitem bloquear o escoamento

dos gases térmicos em parte do permutador, devido ao permutador ser de alhetas contínuas

Carga máxima de recuperação de calor. Utilização total da área de permuta dos gases

térmicos. Comporta inactiva.

Carga mínima de recuperação de calor. Utilização mínima da área de permuta dos gases térmicos. Comporta na menor cota com

obstrução máxima do número de canais formados no banco de

tubos alhetados.

Carga intermédia de recuperação de calor. Utilização intermédia da área de permuta

disponível para os gases térmicos. Comporta a cota

intermédia, com obstrução de apenas alguns canais.

49

horizontais, o que permite ter uma zona onde o escoamento dos gases térmicos está estagnado, a

azul, e onde as trocas de calor com o permutador são desprezáveis. Devido à obstrução imposta

pelas duas comportas, o escoamento dos gases térmicos, de onde se pretende recuperar calor, é

obrigado a efectuar-se por as zonas desobstruídas, a vermelho na figura 5.1, tendo-se os efeitos

contrários, mas de evolução diferente com a movimentação da comporta, da variação do coeficiente

de convecção dos gases térmicos e da variação da sua área de permuta, o que permite controlar o

coeficiente global de transferência do permutador e por conseguinte a sua eficiência de permuta.

Com as condições óptimas definidas para o RC no capítulo 4, as condições de caudal e

temperatura de entrada das fontes térmicas ditadas pelo regime do MCI e as condições de

temperatura de arrefecimento das fontes térmicas seleccionadas como óptimas, é possível definir a

eficiência de permuta de projecto que o permutador de calor utilizado como evaporador deve ter. Com

o método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 é possível converter o valor da eficiência de permuta no coeficiente global de

transferência de calor de projecto, que o permutador de calor de determinada fonte deve ter, em

determinado regime de funcionamento do MCI, perante as condições consideradas óptimas. O

método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 é apresentado em seguida.

Como o fluído de trabalho sofre um pré-aquecimento, uma evaporação e um

sobreaquecimento, a modelação do permutador denominado de evaporador pode ser efectuada

como se de 3 permutadores em série se tratasse, tal como é possível verificar na figura 5.2.

Tg,inTg,PP Tg,PP2

EvaporadorAquecedor SA

T3T2x T3xT2

Tg,out

Gases de escape

Fluido de trabalho

Te

mp

era

tura

Tg,out

Tg,PP

T2x

Tg,in

T2

T3

∆Tpp

T3x

Balanço energético relativo0% 100%

Sobre

aqueci

mento

Evaporação

Aqueci

mento

Figura 5.2– Modelação de um evaporador para o RC em estudo com a divisão em 3 zonas e o

correspondente diagrama T-s. (Domingues et al. 2010)

s

50

A partir das temperaturas definidas para o RC, os dados do motor e o arrefecimento

considerado para as fontes, as temperaturas assinaladas na figura 5.2 são conhecidas. A eficiência

de permuta de projecto pode ser assim definida através da equação 5.1.

𝜺𝒑𝒓𝒐𝒋𝒆𝒄𝒕𝒐 =𝒕𝒐𝒖𝒕−𝒕𝒊𝒏

𝑻𝒊𝒏−𝒕𝒊𝒏 (5.1)

A capacidade térmica de uma corrente é dada pelo produto do calor específico do fluído com

o caudal dessa corrente. Na equação 5.1, no membro direito, todos os parâmetros representam

temperaturas, sendo a indexação das temperaturas representadas por letras minúsculas à corrente

com menor capacidade térmica. Consoante os caudais e temperaturas do fluido de trabalho e dos

gases térmicos, pode concluir-se que nuns casos uma corrente apresenta menor capacidade térmica

que a outra e noutros casos vice-versa, pelo que a atribuição das temperaturas representadas na

figura 5.2 às apresentadas na equação 5.1 dependem de regime do MCI e da fonte térmica

considerada.

Através de cálculos preliminares é possível saber que os evaporadores das duas fontes

deverão possuir muito mais do que 4 tubos verticais em série na longitudinal pelo que, segundo a

literatura da especialidade, se pode considerar que a distribuição de temperaturas ao longo do PCTA

é semelhante à que um permutador puramente em contracorrente apresenta. Para um permutador

em contracorrente, o método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 permite converter a eficiência de permuta de projecto no

número de unidades de transferência de projecto através da equação 5.2 ou 5.3, consoante a zona

do permutador a modelar.

𝑁𝑇𝑈𝑝𝑟𝑜𝑗𝑒𝑐𝑡𝑜 =1

𝐶𝑅−1ln

𝜀𝑝𝑟𝑜𝑗𝑒𝑐𝑡𝑜 −1

𝐶𝑅 ∙𝜀𝑝𝑟𝑜𝑗𝑒𝑐𝑡𝑜 −1 , para a zona de pré-aquecimento e sobreaquecimento (5.2)

𝑁𝑇𝑈𝑝𝑟𝑜𝑗𝑒𝑐𝑡𝑜 = −ln(1 − 𝜀𝑝𝑟𝑜𝑗𝑒𝑐𝑡𝑜 ), para a zona de mudança de fase (5.3)

Na equação 5.2, 𝐶𝑅 representa a razão entre a capacidade térmica mínima e a capacidade

térmica máxima das correntes do permutador. O coeficiente global de transferência de calor de

projecto pode assim ser obtido através da equação 5.4.

𝑈𝐴𝑝𝑟𝑜𝑗𝑒𝑐𝑡𝑜 = 𝑁𝑇𝑈𝑝𝑟𝑜𝑗 𝑒𝑐𝑡𝑜 ∙ 𝑚 ∙ 𝑐𝑝 𝑚𝑖𝑛 (5.4)

Nesta fase surge a necessidade de implementação de um processo iterativo, em que

variando a geometria do banco de tubos do permutador se tenta encontrar uma geometria que

permita ter um coeficiente global de transferência de calor real o mais próximo possível do de

projecto. Para a geometria de PCTA o coeficiente global de transferência de calor real pode ser

calculado através da equação 5.5.

𝑈𝐴𝑟𝑒𝑎𝑙 = 1

𝑕𝑓𝐴𝑖𝑛+ 𝑅𝑠𝑢𝑗 ,𝑓 +

𝑙𝑛(𝑑𝑒/𝑑𝑖)

𝑁𝑇𝑢𝑏𝑜𝑠𝑉𝑒𝑟𝑡𝑖𝑐𝑖𝑎𝑖𝑠 𝜋𝑘𝑚𝑎𝑡𝑒𝑟𝑖𝑎𝑙+ 𝑅𝑠𝑢𝑗 ,𝑔 +

1

𝑕𝑔(𝐴𝑡𝑜𝑡 +ƞ𝑓𝑖𝑛 𝐴𝑓𝑖𝑛 ) −1

(5.5)

Antes do inicio do processo iterativo é definida uma geometria base para a alheta tipo que

constituirá e se repetirá nas 3 dimensões do espaço e que formará os dois evaporadores. Foi

seleccionada uma geometria semelhante à de alguns bancos de tubos alhetados normalizados,

51

aplicando-se um passo longitudinal e transversal de 25mm de modo a minimizar a perda de carga

dos gases térmicos e afectar ao mínimo o desempenho do MCI. A geometria base da alheta

seleccionada é apresenta na figura 5.3.

Figura 5.3 – Geometria base da alheta tipo seleccionada.

Seleccionando o aço AISI 1006 HR como material para o permutador, típico aço de

construção, e sabendo que a pressão de evaporação é de 49 bar, obtém-se um factor de segurança

de 7.7, pelo que a geometria seleccionada para o tubo da alheta tipo é adequada em termos

estruturais e de resistência mecânica.

Segue-se o processo iterativo onde se testam diferentes alturas e larguras do permutador.

Neste processo acompanham-se dois parâmetros do projecto: verifica-se se o volume máximo do

permutador não excede o valor definido como máximo e calcula-se o desvio padrão do comprimento

do permutador necessário, para uma dada altura e largura de permutador, em redor dos diferentes

regimes do MCI. O objectivo deste processo iterativo é, não ultrapassando o volume máximo

admissível, experimentar diferentes alturas e larguras de modo a minimizar o desvio padrão do

comprimento necessário para o permutador nos vários regimes do MCI, pois isto significará que

perante a dimensão máxima de comprimento necessária, para uma dada largura e altura de

permutador, as comportas apenas precisarão de pequenos ajustes para que se controle a eficiência

de permuta do modo que se deseja. O objectivo de se querer que sejam necessários apenas

pequenos ajustes nas comportas deve-se ao facto de se conseguir diminuir a perda de carga abrupta

dos gases térmicos na obstrução dos canais alhetados.

Após encontrar a altura e largura do permutador que permite obter o valor mínimo do desvio

padrão do comprimento necessário para o evaporador de determinada fonte quente, em redor dos

diferentes regimes do MCI, obtém-se o comprimento máximo para o permutador, que será dado pelo

regime do MCI onde foi definido uma maior recuperação de calor para essa determinada fonte. A

geometria final do permutador, em que se definem as dimensões globais, o número de alhetas

empilhadas, o número de serpentinas paralelas na longitudinal, entre outros parâmetros geométricos,

é encontrada assim que se obtêm o comprimento máximo do permutador.

A comporta a jusante dos gases térmicos serve apenas para evitar a recirculação destes para

os canais que estão a montante bloqueados. Para que se encontre o número de canais que são

52

necessários bloquear com as 2 comportas, para um determinado regime do MCI, onde foi nos

capítulos anteriores definido um determinado arrefecimento, para determinada fonte (Escape ou

EGR), basta apenas lançar um processo iterativo onde sequencialmente se bloqueia um canal em

cada iteração e se compara o valor do coeficiente global de transferência de calor real obtido com o

que era necessário de projecto. Este processo iterativo é definido para cada uma das duas fontes

quentes a recuperar, para cada um dos regimes de funcionamento do MCI, até se encontrar o

bloqueamento necessário para controlar a eficiência de permuta do permutador. Devido ao elevado

número de alhetas empilhadas que se obtêm como necessárias, demonstra-se que apesar do

número de canais bloqueados ser uma variável discreta, é possível ajustar e aproximar o coeficiente

global de transferência de calor real ao de projecto.

Após definida a geometria de cada um dos evaporadores das fontes quentes a recuperar e

após definir o bloqueamento necessário para cada permutador em cada regime do MCI, calculam-se

as perdas de carga no banco de tubos do permutador em conjunto com as perdas de carga abruptas

provocadas pelas duas comportas em cada permutador.

Devido ao isolamento que se espera envolver o banco de tubos na construção do permutador

e devido ainda à ordem de grandeza do calor trocado entre os fluidos no permutador, são

desprezadas as perdas de calor para o ambiente, considerando-se o permutador idealmente

adiabático nas simulações.

O valor considerado para as resistências de sujamento é 1.761×10-3

m2 K W

-1 para o exterior

dos tubos e 3.2×10-4

m2 K W

-1 para o interior dos mesmos [Azevedo et al. (2005)].

No projecto dos evaporadores é ainda necessário conhecer as propriedades termofisicas quer

dos gases de escape, quer do EGR. Considerando os gases térmicos como gases ideais, as suas

propriedades termofísicas em cada regime de funcionamento do MCI apenas dependem da sua

composição e da sua temperatura. As temperaturas dos gases térmicos podem ser consultadas no

capítulo 3. No presente caso a composição dos gases de escape e do EGR é igual e pode ser obtida

cruzando os dados do MCI do capitulo 3 com a equação 5.6.

𝑥 𝐶12𝐻23 + 𝑦 𝑂2 + 3.76 𝑁2 −→ 12 𝑥 𝐶𝑂2 + 11.5 𝑥 𝐻2𝑂 + 3.76 𝑦 𝑁2 + 𝑦 − 17.75 𝑥 𝑂2 (5.6)

Na determinação da fracção de cada uma das espécies presentes nos gases térmicos foram

desprezadas as espécies com fracções habitualmente minoritárias como o CO, HC e o NOx. A

composição dos gases térmicos é apresentada na figura 5.4.

53

Figura 5.4– Composição dos gases de escape e do EGR.

5.3. Condensador

Na revisão bibliográfica já foi evidenciada a importância da escolha correcta do permutador

de calor que servirá de condensador no RC. No capítulo anterior definiu-se a pressão no

condensador como 2.3 bar, o que para o etanol permite ter uma temperatura de condensação de

100ºC e permite que a fonte fria do RC seja o circuito de refrigeração do MCI. Como a troca de calor

do RC se faz com o circuito de arrefecimento, como já foi justificado, é possível colocar o

condensador em qualquer local onde haja espaço no veículo pesado. Através da informação

apresentada no capítulo 3 e alguns cálculos preliminares é possível verificar que o caudal de etanol, o

fluido de trabalho, é de ordem de grandeza bastante inferior ao caudal do fluido refrigerante do

circuito de arrefecimento do MCI, facto que deve ser tido em conta na selecção do tipo de

permutador.

Num veículo pesado, e no actual circuito de recuperação em estudo, o condensador do RC

deve respeitar os seguintes requisitos de projecto:

i) Deve promover-se o contacto entre os dois fluidos que será maioritariamente entre dois

líquidos;

fCO2

fN2 fO2

fH2O

54

ii) Devido à grande diferença entre os caudais, deve promover-se o aumento da área de

contacto do fluido de trabalho e, se possível, aumentar simultaneamente o coeficiente de

transferência de calor do lado do fluido de trabalho;

iii) Minimização do peso e volume;

iv) Facilidade de fabrico;

v) Controlabilidade da eficiência de permuta em cada regime do MCI que permita retirar

apenas a quantidade de calor necessária à condensação do caudal de fluido de trabalho;

vi) Minimização da perda de carga imposta ao circuito de refrigeração.

No capítulo 2, a tabela 2.6 apresenta um resumo e comparação entre os diferentes tipos de

permutadores de calor que existem no mercado vulgarmente. Perante os requisitos de projecto

apresentados acima, o permutador de calor que apresenta maior potencial de aplicação no

condensador do RC é o permutador de calor axial de tubos concêntricos com diversas passagens do

fluido de trabalho no interior dos tubos. Com um elevado número de passagens do fluido de trabalho

no interior dos tubos envolvidos por a casca externa, onde circula o fluido de refrigeração, consegue-

se aumentar a área de contacto do fluido de trabalho e o coeficiente de convecção, compensando

assim a diferença de grandeza dos caudais. Este tipo de permutador apresenta uma construção

modular e simples. Poderia ser seleccionado um permutador de corpo e feixe tubular com os típicos

deflectores no feixe, que apesar de ocupar menor volume, teria uma construção muito mais complexa

e delicada. Os permutadores de placas, espuma metálica e compactos não são adequados devido à

elevada diferença entre a grandeza dos caudais das duas correntes.

O permutador de calor assim escolhido para o condensador é geometricamente semelhante

ao simulado por Domingues et al. (2013)

A forma que foi desenvolvida no presente estudo para o controlo da eficiência de permuta do

condensador foi aplicar um bypass variável do fluido de refrigeração à casca externa do permutador.

Assim a fracção de fluido de refrigeração que não entra no condensador segue imediatamente para

uma união com o fluido de refrigeração que sai do condensador, e ambos seguem para o bloco do

motor, tal como é possível verificar na figura 3.17. O bypass do fluido de refrigeração ao condensador

diminui o coeficiente de convecção na casca externa e ao mesmo tempo aumenta a temperatura a

que sairá o fluido de refrigeração do condensador, que acaba por influenciar a própria eficiência de

permuta requerida para dado regime do MCI.

Fixa-se a geometria da secção transversal do condensador, que apresenta espaçamentos

semelhantes aos normalizados para permutadores deste tipo e que é apresentada na figura 5.5. Para

a compensação da diferença de caudais, como já foi explicado, o fluido de trabalho é inserido no tubo

central interior e quando chega à extremidade do permutador inicia uma nova passagem no mesmo

permutador, em sentido inverso por um dos tubos equidistantes do tubo central. Assim o fluido de

trabalho efectua no permutador 37 passagens, pois existem 37 tubos interiores. O fluido de

refrigeração efectua apenas uma passagem axial ao longo da casca que contem o feixe tubular do

fluido de trabalho.

55

Figura 5.5 – Secção transversal seleccionada para o condensador do RC. (dimensões em milímetros)

O processo iterativo que se segue do projecto do condensador é semelhante ao aplicado no

projecto dos dois evaporadores do RC. Com a secção transversal do permutador seleccionada

calcula-se a eficiência de permuta necessária no caso de não existir bypass para todos os regimes de

funcionamento do MCI. Utiliza-se o método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 apresentado anteriormente para converter a

eficiência de permuta de projecto necessária no coeficiente global de transferência de calor de

projecto necessário, através das equações 5.1, 5.3 e 5.4. Para cada regime do MCI encontra-se o

comprimento necessário para o condensador, tendo em conta a secção transversal apresentada na

figura 5.5 e a equação 5.7, equação que permite comparar o coeficiente global de transferência de

calor real com o de projecto.

𝑈𝐴𝑟𝑒𝑎𝑙 = 𝐴𝑒𝑥𝑡 1

𝑕𝑟𝑒𝑓𝑟𝑖+ 𝑅𝑠𝑢𝑗 ,𝑟𝑒𝑓𝑟𝑖 +

𝑑𝑒 𝑙𝑛(𝑑𝑒/𝑑𝑖)

𝑘𝑚𝑎𝑡𝑒𝑟𝑖𝑎𝑙+

𝑑𝑒

𝑑𝑖 𝑅𝑠𝑢𝑗 ,𝑓 +

1

𝑕𝑓

−1

(5.7)

As correlações empíricas que permitem calcular os coeficientes de convecção da equação

5.7 e a perda de carga neste tipo de permutador de calor podem ser consultadas em Heat Atlas (2ª

edição, 2010). O valor considerado para as resistências de sujamento é 8.8×10-5

m2 K W

-1 para o

exterior dos tubos e 1.8×10-4

m2 K W

-1 para o interior dos mesmos.

Encontrado o comprimento necessário para o condensador, para cada regime do MCI, obtém-

se um comprimento máximo para o condensador. Assim para os regimes do MCI diferentes do que

requereu o comprimento máximo, o permutador encontra-se sobredimensionado, pelo que necessita

de se alterar artificialmente a sua eficiência de permuta. Através do bypass é possível controlar a

eficiência de permuta e assim lança-se um processo iterativo em que para cada regime de

funcionamento do MCI se aumenta gradualmente a fracção de bypass e se vai comparando o

coeficiente global de transferência de calor real com o de projecto actualizado, devido à alteração da

temperatura de saída do fluido de refrigeração.

Devido ao isolamento que se espera envolver a casca externa na construção do permutador,

é considerado que o condensador é idealmente adiabático.

No projecto do condensador aproximam-se as propriedades do fluido de refrigeração às

propriedades termofísicas da água.

56

Como já foi referido, o condensador do RC aplicado no circuito de refrigeração do MCI pode

ter uma influência fulcral na gestão térmica do motor, podendo permitir o arranque e aquecimento do

motor a frio mais rapidamente, diminuindo as emissões de poluentes que é bastante gravosa no

arranque a frio do motor.

57

Capítulo 6

6. Análise de resultados

6.1. Introdução

No presente capítulo são apresentados os principais resultados da modelação e do projecto

do circuito de recuperação de calor proposto através de um RC a um MCI de um veículo pesado. Os

resultados são mais uma vez apresentados na forma de mapas e tabelas.

São apresentados os resultados da modelação termodinâmica e da optimização da

temperatura de arrefecimento dos gases de escape. Apresentam-se os resultados da aplicação do

método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 em subcapítulos separados, onde se analisa o dimensionamento dos dois

evaporadores e do condensador. Apresenta-se ainda uma análise simplificada de um transiente do

comportamento dos dois evaporadores.

Por fim apresenta-se uma análise global do desempenho do RC aplicado ao MCI e as

melhorias introduzidas no sistema.

A informação dada acerca do MCI em estudo no capítulo 3 compreendia o domínio de

velocidade do motor de 800 a 2000 r/min e de carga nula até ao limite definido pela carga máxima

que o motor consegue desenvolver a cada velocidade de rotação. No entanto como é possível

verificar apartir da figura 3.2, o MCI em estudo não é utilizado nem a baixas cargas (inferior de 800

N.m), nem a baixa velocidade (inferior a 1000 r/min), e nestas situações o circuito de recuperação

proposto e os seus componentes encontram-se sobredimensionados, pelo que se considera que esta

zona definida como não utilizada não tem interesse para o estudo actual. Assim define-se esta zona

não utilizada como inactiva e neste caso devido às baixas cargas e temperaturas que não

apresentam interesse de recuperação de energia, o sistema do RC deve abrir as comportas de

controlo dos evaporadores e deve ser desviado o caudal de fluido de trabalho apenas necessário à

realização do arrefecimento dos gases do EGR, arrefecimento obrigatório para o correcto

funcionamento do motor. Já nas zonas de maior carga e maior velocidade de rotação, onde é

também pouco provável que o MCI funcione, convém que os componentes do RC estejam

dimensionados para suportar estas elevadas cargas térmicas e não estejam assim

subdimensionados, pois mesmo que seja pouco provável que o MCI funcione nestas condições,

existe um grande interesse na recuperação de calor nestes regimes. Assim os resultados

apresentados na forma de mapas apresentam um domínio diferente dos apresentados no capítulo 3,

pelo que o seu domínio de carga mínimo são os 800 N.m e o valor mínimo representado de

velocidade de rotação é 1000 r/min.

58

6.2. Resultados da análise termodinâmica

Nesta secção são apresentados os resultados da modelação termodinâmica do RC aplicado

ao MCI e é apresentado o resultado da optimização do arrefecimento da temperatura dos gases de

escape.

A temperatura de arrefecimento dos gases de escape optimizada, calculada segundo as

restrições apresentadas no capítulo 4 é apresentada na figura 6.1.

Figura 6.1 – Mapa da temperatura de arrefecimento dos gases de escape optimizada.

Como é possível verificar a partir da figura 6.1, a temperatura optimizada de arrefecimento

dos gases de escape encontra-se na gama dos 110 aos 230ºC. Como já foi referido e explicado

anteriormente, a temperatura de arrefecimento do EGR é fixa nos 120ºC.

Após a definição da temperatura de arrefecimento das duas fontes térmicas do MCI a

recuperar, a definição dos parâmetros estacionários do RC apresentados na figura 4.3 e as

temperaturas de entrada dos gases térmicos nos evaporadores, apresentadas no capítulo 3, é

possível definir para os dois permutados a diferença de temperaturas 𝛥𝑇𝑝𝑝 explicada na figura 5.2. Os

resultados deste parâmetro são apresentados na figura 6.2 para os dois permutadores.

Figura 6.2 – Parâmetro 𝛥𝑇𝑝𝑝 obtido para os evaporadores do EGR (esquerda) e escape (direita).

A partir da figura 6.2 verifica-se que o parâmetro 𝛥𝑇𝑝𝑝 apenas se aproxima do valor mínimo de

projecto, fixado no capítulo 4, a baixas cargas, o que poderia dar a entender uma não optimização

59

das temperaturas de arrefecimento das fontes quentes. No entanto tal não é verdade, pois a

optimização das temperaturas de arrefecimento tem em conta uma série de aspectos de

funcionamento do MCI e dos evaporadores. Um dos principais motivos pelos quais não é possível

arrefecer mais as fontes quentes é o facto da temperatura do fluido de trabalho à saída da bomba, ou

seja à entrada do evaporador, ter o valor de 102ºC.

Na figura 6.3 apresenta-se o calor recuperado dos gases de escape e do sistema do EGR. A

soma destes dois calores representa a carga térmica injectada no RC.

Figura 6.3 – Mapa do calor recuperado do MCI no EGR (esquerda) e escape (direita).

Na figura 6.4 apresenta-se o caudal de fluido de trabalho que percorre cada um dos

evaporadores. Existirá uma unidade de controlo do sistema que, através da leitura da carga e

velocidade de rotação do motor, comandará a velocidade de rotação da bomba do RC que permita

debitar a soma dos caudais de etanol para os dois permutadores. A unidade de comando irá ainda

controlar o divisor de caudal que enviará a quantidade de caudal de etanol definida na figura 6.4 para

cada um dos evaporadores.

Figura 6.4 – Caudal de etanol que atravessa o evaporador do EGR (esquerda) e do escape (direita).

Na figura 6.5 apresenta-se o exemplo da contribuição do calor que irá ser debitado no

condensador por parte do ciclo do RC que utiliza o EGR como fonte quente, e o calor total a ser

dissipado no condensador do RC.

60

Figura 6.5 – Contribuição do EGR para o calor dissipado no condensador (esquerda) e calor total a dissipar no

condensador (direita).

Na figura 6.6 apresenta-se a contribuição do ramo do EGR do RC para a potência de

bombagem, e a potência total de bombagem do RC relativa aos dois ramos.

Figura 6.6 – Contribuição do ramo do EGR para a potência de bombagem (esquerda) e potência total de

bombagem do RC (direita).

Na figura 6.7 apresenta-se a contribuição do ramo do EGR e do ramo dos gases de escape

do RC para a potência desenvolvida na expansão, ou seja, antes de ser aplicado o rendimento

mecânico do próprio expansor e da conversão de energia do expansor para o MCI. O rendimento

mecânico aproximado do expansor da Bosch seleccionado, em conjunto com o rendimento mecânico

de conversão de energia eléctrica do expansor para o motor, é cerca de 85%, independentemente do

regime do MCI. Na figura 6.8 apresenta-se a contribuição dos dois ramos para a potência mecânica

gerada na expansão no expansor e esta mesma potência subtraindo-lhe a potência total de

bombagem do RC.

61

Figura 6.7 – Contribuição do ramo do EGR (esquerda) e dos gases de escape (direita) para a potência mecânica

desenvolvida na expansão.

A partir da figura 6.7 é possível verificar que o ramo do RC relativo aos gases de escape

apresenta uma contribuição maior para a potência mecânica gerada pelo expansor.

Figura 6.8 – Potência total desenvolvida na expansão(esquerda) e potência líquida desenvolvida pelo RC antes

da aplicação dos rendimentos mecânicos de conversão para o MCI e do próprio expansor (direita).

6.3. Projecto dos evaporadores

Nesta secção são apresentados os resultados da aplicação do método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 no projecto

do evaporador a aplicar na linha dos gases de escape e no sistema do EGR. Apresenta-se ainda o

dimensionamento e os resultados do projecto dos dois evaporadores.

Na figura 6.9 apresentam-se as eficiências de permuta de projecto necessárias para as 3

zonas de cada um dos 2 evaporadores a projectar. Na figura 6.10 apresenta-se a conversão da

eficiência de permuta de projecto no coeficiente global de transferência de calor de projecto, através

do método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 , para as 3 zonas de cada um dos 2 permutadores. Como é possível

compreender, a partir do diagrama T-s da figura 4.3 e das temperaturas de arrefecimento das duas

fontes quentes, os aquecedores são as zonas mais exigentes em termos de tamanho dos dois

evaporadores a projectar.

62

Figura 6.9 – Eficiência de permuta de projecto requerida para as 3 zonas de cada um dos 2 evaporadores a

projectar.

EGR

63

Figura 6.10 – Coeficiente global de transferência de calor de projecto requerido para as 3 zonas de cada um dos

2 evaporadores a projectar.

Tal como foi referido no capítulo 5, após a selecção da alheta tipo segue-se um processo

iterativo em que se seleccionam diferentes conjuntos de alturas e larguras para cada um dos dois

evaporadores e se tenta minimizar o desvio padrão do comprimento necessário para cada

permutador, de modo a ser menor a influência da aplicação das comportas de controlo. As tabelas

6.1 e 6.2 apresentam alguns dos pares de altura e largura que levaram à minimização do desvio

padrão para o evaporador do EGR e do escape, respectivamente.

64

Tabela 6.1 – Minimização do desvio padrão do comprimento necessário para o evaporador do EGR.

Altura [m]

0.15 0.150 0.20 0.176 0.25 0.10 0.126 0.126 0.150 0.15 0.182 0.176 0.18

Largura [m]

0.25 0.175 0.25 0.175 0.25 0.15 0.125 0.150 0.125 0.15 0.150 0.150 0.15

Comp. máximo

[m] 1.775 1.675 1.375 1.450 1.125 1.175 1.050 0.975 0.925 0.875 0.750 0.750 0.75

Volume [m

3]

0.067 0.044 0.069 0.045 0.070 0.0176 0.017 0.018 0.0165 0.0197 0.0205 0.0198 0.02

Desvio padrão

do Comp.

9.974 7.515 7.496 6.442 5.950 5.244 4.933 4.483 4.398 3.919 3.430 3.388 3.343

Tabela 6.2 – Minimização do desvio padrão do comprimento necessário para o evaporador do escape.

Altura [m] 0.248 0.25 0.25 0.25 0.254 0.26 0.25 0.27 0.27 0.275 0.3

Largura [m] 0.225 0.225 0.25 0.275 0.275 0.275 0.3 0.275 0.3 0.325 0.3

Comp. máximo [m]

1.550 1.525 1.475 1.375 1.375 1.350 1.325 1.325 1.275 1.175 1.175

Volume [m

3]

0.087 0.086 0.092 0.095 0.096 0.097 0.099 0.098 0.103 0.105 0.106

Desvio padrão do

Comp. 11.329 11.169 10.703 9.946 9.914 9.613 9.458 9.446 8.973 8.369 8.273

Ao encontrar-se o par largura/ altura que permite minimizar o desvio padrão do comprimento

de cada permutador, é possível definir-se logo as dimensões e características finais dos dois

evaporadores. A tabela 6.3 apresenta as dimensões e características principais dos dois

evaporadores projectados.

Tabela 6.3 – Características e dimensões principais dos 2 evaporadores projectados.

Evaporador Altura

[m] Largura

[m] Comp.

[m] Volume

[m3]

Massa [kg]

Tubos Série

Tubos Paralelos

Nº de Placas

Desvio Padrão

EGR 0.18 0.15 0.75 0.02 ~41 30 6 90 3.343 Escape 0.3 0.3 1.17 0.11 ~213 47 12 150 8.273

Após a definição das dimensões globais dos dois permutadores que servirão de

evaporadores para o RC, segue-se o processo de afinação da posição das comportas de controlo

que permitem o controlo da eficiência de permuta. Neste processo de afinação a variável que se

controla é mais uma vez o desvio padrão, ou seja, neste processo deseja-se que o desvio padrão do

comprimento do permutador seja nulo, garantindo-se assim que a eficiência de permuta é apenas a

necessária de projecto e que em qualquer regime do MCI é necessário o mesmo comprimento para o

permutador, comprimento apresentado na tabela 6.3.

Na tabela 6.4 e 6.5 apresentam-se os resultados da calibração das comportas para o

permutador do EGR e do escape, respectivamente. Cada permutador tem no máximo n-1 canais

disponíveis para o escoamento dos gases térmicos, sendo que n é o número de placas de cada

permutador. Nestas duas tabelas apresenta-se o número de canais não bloqueados para alguns

regimes de utilização do MCI.

65

Tabela 6.4 – Número de canais não bloqueados dos 89 existentes no permutador do EGR.

Velocidade de Rotação [r/min]

1000 1200 1400 1600 1800 2000

Binário Efectivo

[N.m]

2292 - 59 64 61 - -

2037 42 56 65 68 67 -

1783 42 57 67 73 74 84

1528 42 55 67 75 77 74

1273 48 52 67 79 79 74

1019 54 54 68 76 82 79

800 67 72 75 85 89 81

Tabela 6.5 – Número de canais não bloqueados dos 149 existentes no permutador do escape.

Velocidade de Rotação [r/min]

1000 1200 1400 1600 1800 2000

Binário Efectivo

[N.m]

2292 - 79 99 103 - -

2037 55 72 97 107 99 -

1783 57 75 97 119 121 149

1528 58 75 97 123 131 137

1273 58 73 97 122 138 145

1019 60 75 65 45 76 69

800 75 96 66 45 43 49

Após a definição do número de canais a bloquear por parte das comportas, para cada um dos

permutadores, para cada um dos regimes do MCI, é possível calcular a perda de carga dos gases

térmicos ao longo do banco de tubos e adicionar os efeitos pontuais produzidos pelo bloqueamento

das comportas a montante e a jusante de cada permutador. A figura 6.11 apresenta os mapas das

perdas de carga nos dois permutadores para o escoamento dos gases térmicos e para o fluido de

trabalho.

66

Figura 6.11 – Perda de carga do fluido de trabalho nos tubos dos 2 permutadores (esquerda) e perda de carga

total dos gases térmicos nos 2 permutadores (direita).

A partir da figura 6.11 verifica-se que a restrição de projecto para a perda de carga dos gases

térmicos não ultrapassa o valor máximo limite de 0.2 bar em nenhum dos dois permutadores, o que

permite afirmar que os efeitos de perda de carga, devido à presença dos permutadores de calor, são

desprezáveis e não afectam o desempenho original do MCI em estudo. A baixa perda de carga para

os gases térmicos deve-se em grande parte à selecção adequada da alheta tipo do permutador. No

entanto os resultados obtidos para a perda de carga do fluido de trabalho ao longo dos tubos dos dois

permutadores apresentam valores elevados para elevadas cargas e velocidades de rotação, o que

num estudo mais aprofundado do projecto dos permutadores deverá levar à modelação dos mesmos

com perda de carga não desprezável no escoamento do fluido de trabalho. A elevada perda de carga

do fluido de trabalho nos tubos dos permutadores deve-se essencialmente ao elevado número de

cotovelos de 180 graus que cada permutador tem e devido ao reduzido diâmetro interno dos tubos,

para os actuais caudais de fluido de trabalho.

A figura 6.12 apresenta os detalhes geométricos do permutador projectado para o EGR. É

apresentada a geometria do banco de tubos e o aspecto da conduta onde irá ficar o mesmo

enclausurado.

67

Figura 6.12 – Detalhes geométricos do permutador do EGR projectado: banco de tubos (esquerda) e conduta de

enclausuramento do permutador com as gavetas das comportas (direita).

6.4. Projecto do condensador

Nesta secção são apresentados os resultados da aplicação do método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈 no projecto

do condensador a aplicar no RC em estudo. Apresenta-se ainda o dimensionamento e os resultados

do projecto do condensador.

Na figura 6.13 apresenta-se a eficiência de permuta de projecto necessária para que apenas

ocorra o processo de condensação do fluido de trabalho e a sua conversão para o coeficiente global

de transferência de calor de projecto, através do método 𝜀 − 𝑁𝑇𝑈.

Figura 6.13 – Eficiência de permuta de projecto requerida (esquerda) e coeficiente global de transferência de

calor de projecto (direita).

Saída

Gases

Térmicos

Entrada

Fluido de

Trabalho

Saída Fluido

de Trabalho

Gavetas guias

das comportas

Entrada

Gases

Térmicos

68

Tal como foi referido no capítulo 5, após a selecção da geometria da secção transversal do

condensador, segue-se o processo de cálculo do comprimento máximo necessário para o

condensador, em que com a secção transversal seleccionada se calcula para cada regime do MCI o

comprimento necessário para o condensador do RC. A figura 6.14 apresenta o cálculo do

comprimento necessário para o condensador, de onde se conclui que o comprimento necessário para

o permutador é de 7.1m, e apresenta ainda a forma como este comprimento é rearranjado de modo a

tornar o condensador mais compacto. O condensador ficará assim fixo na parede traseira da cabine

do veículo pesado.

Figura 6.14 – Comprimento máximo necessário para o condensador (esquerda) e rearranjo dos 7.1 metros de

permutador em 7 secções (direita).

As 7 secções tubulares que constituem os 7.1 metros requeridos para o condensador do RC

encontram-se ligadas por falanges quer na zona da casca, quer na zona dos tubos interiores, pelo

que o arranjo do escoamento é semelhante ao que o permutador teria caso fosse constituído por

apenas uma secção tubular de 7.1 metros de comprimento.

Após a definição das dimensões globais do condensador segue-se o processo iterativo de

aumento da fracção de bypass do fluido de refrigeração, que por sua vez altera a temperatura de

saída do permutador deste fluido, e que acaba por alterar ligeiramente a eficiência e o coeficiente

global de transferência de calor apresentados na figura 6.13. A variável que controla o processo

iterativo é o comprimento necessário para o condensador, em que se irá aumentar a fracção de

bypass até que se obtenha para qualquer regime do MCI 7.1 metros de permutador necessários.

A figura 6.15 apresenta a fracção de bypass do fluido de refrigeração ao condensador, obtida

no processo iterativo, e a correspondente diferença mínima de temperaturas.

Saída Fluido de

Refrigeração

Entrada Fluido

de Refrigeração

Saída Fluido de Trabalho

Entrada Fluido de Trabalho

Bypass

1014mm

69

Figura 6.15 – Fracção de bypass do fluido de refrigeração obtida (esquerda) e correspondente diferença mínima

de temperaturas (direita).

A partir da figura 6.15 é possível verificar que a afectação da temperatura de saída do fluido

de refrigeração, devido ao bypass, leva a baixas diferenças mínimas de temperaturas o que por sua

vez faz com que na maioria dos regimes do MCI a fracção a efectuar bypass seja relativamente

baixa.

A figura 6.16 apresenta a temperatura de saída do fluido de refrigeração do condensador e a

temperatura do fluido de refrigeração à entrada do bloco do motor, ou seja, a temperatura resultante

da corrente de fluido de refrigeração que sai do condensador e a corrente de fluido de refrigeração

que faz um bypass ao condensador e vem à temperatura de saída do radiador.

Figura 6.16 – Temperatura do fluido de refrigeração à saída do condensador (esquerda) e temperatura do fluido

de refrigeração à entrada do bloco do motor (direita).

70

6.5. Estudo dinâmico simplificado

Nesta secção é apresentado um estudo simplificado do comportamento dinâmico dos dois

evaporadores projectados para o EGR e para o escape. A análise dinâmica do RC projectado não era

à partida um dos objectivos do actual estudo, pois a sua relativa baixa importância já tinha sido

referida devido ao tipo de utilização suave que os MCI diesel de veículos pesados têm, sendo mais

importante a questão da estratégia de gestão dos componentes do ciclo em conjunto com o motor.

Assume-se assim à partida que o estudo é simplificado, pois um estudo aprofundado da dinâmica do

RC aplicado ao MCI exigiria a modelação dinâmica do MCI, os seus componentes e sistemas

auxiliares, a dinâmica do próprio veículo, a dinâmica do expansor e da bomba do RC, a dinâmica do

sistema de conversão de energia do expansor para o motor, a dinâmica dos permutadores de calor

do ciclo e a dinâmica de algum tanque de armazenamento de fluido de trabalho. Um estudo bastante

aprofundado de uma análise dinâmica de um RC aplicado a um MCI estacionário pode ser

encontrado em Vaja et. al (2010), apesar do facto dos permutadores modelados serem coaxiais e os

volumes que requerem serem apenas aplicáveis em instalações estacionárias sem limitações de

peso e volume. A análise que aqui se apresenta foca-se assim apenas na dinâmica dos

evaporadores, pois foram os componentes do RC que receberam especial atenção no presente

estudo, pois são os componentes do RC que podem mais inviabilizar a aplicação de um RC a um

MCI em termos de espaço, peso e complexidade.

A análise dinâmica apresentada dos PCTA baseia-se no trabalho de Taler et. al (2011), onde

se utiliza um modelo discreto das equações adimensionalizadas de conservação de energia do

escoamento dos gases térmicos, do material sólido constituinte do banco de tubos e alhetas e do

escoamento do fluido de trabalho.

A análise apresentada apenas mostra os resultados de uma simulação para cada um dos

dois evaporadores. Cada uma das simulações efectuadas em cada permutador tem como condição

inicial todos os fluidos e sólidos à temperatura de 25ºC, ou seja, aproximadamente à temperatura

ambiente. As condições de fronteira para a solução do sistema de equações passam por a imposição

a partir do instante inicial da temperatura de 102ºC na entrada do fluido de trabalho em cada

permutador, ou seja, a temperatura à saída da bomba definida no capítulo 4. Já as condições de

fronteira a partir do instante inicial para a temperatura dos gases térmicos são as condições de maior

carga em cada permutador, ou seja, os regimes do MCI onde as comportas dos permutadores se

encontram inactivas. Já as condições de fronteira de caudal são para ambos os fluidos, em cada um

dos dois permutadores, as condições definidas para a situação de carga máxima. As condições de

resolução da actual simulação dinâmica dos permutadores são resumidas na tabela 6.6.

71

050

100150200250300

0 5 10Tem

pera

tura

[ºC

]

tempo [s]

050

100150200250300

0 50 100Tem

pera

tura

[ºC

]

tempo [s]

Tabela 6.6 – Condições de fecho do problema de simulação dinâmica dos dois permutadores.

Condições iniciais para os

fluidos e sólido

Condições fronteira de entrada do fluido de

trabalho

Condições de fronteira de entrada dos gases

térmicos

Regime do MCI correspondente à condição

fronteira

Temperatura ºC

Caudal kg/s

Temperatura ºC

Caudal kg/s

Binário N.m

Velocidade r/min

EGR 25ºC 102 0.031 426 0.091 800 1800

Escape 25ºC 102 0.141 407 0.370 1783 2000

Supondo que o arranque do motor já se encontra efectuado ou que a dinâmica desse

processo é muito mais rápida do que a do arranque e estabilização das condições do RC, as

simulações descritas atrás conseguem dar uma ideia da dimensão temporal do arranque do RC

projectado, considerando que os evaporadores são os componentes com a dinâmica mais lenta do

sistema. Assim apenas se testa a situação de arranque de cada permutador desde a temperatura

ambiente quando sujeito repentinamente às condições de carga máxima da fonte que recupera,

condições em que as comportas se encontram inactivas. Optou-se apenas por estudar a situação em

que as comportas se encontram inactivas, pois a inclusão na modelação efectuada do efeito da

comporta iria complicar substancialmente a modelação e implementação do código computacional de

cálculo. No entanto pode considerar-se que este teste em cada um dos dois evaporadores serve para

determinar a ordem de grandeza do tempo de arranque do sistema. Os resultados das simulações

descritas na tabela 6.6 são apresentados na figura 6.17.

Figura 6.17 – Simulação do permutador do EGR (esquerda) e do permutador do Escape (direita).

A partir da figura 6.17 é possível verificar que a dinâmica do permutador do EGR é mais

rápida do que a dinâmica do permutador do escape, o que pode dever-se à significativa diferença de

massas entre os dois permutadores, apesar da semelhança, em termos de ordem de grandeza, da

carga térmica a que estão submetidos. Observa-se por a figura 6.17 que o sistema poderá ter um

tempo de arranque de cerca de 2 minutos (120 segundos) e que o sistema pode ser monitorizado e

controlados os caudais de fluido de trabalho e a posição da comporta em intervalos de tempo de 1

segundo. Pela dinâmica dos permutadores pode ainda supor-se que situações transitórias de cerca

de 2 a 3 segundos em que o MCI passe por a zona do RC declarada como inactiva no estudo, pode

continuar-se com o sistema activo, existindo ainda a hipótese de continuar utilizar o sistema por mais

alguns segundos só com o escape, que tem uma dinâmica mais lenta, e fazer um bypass do fluido de

trabalho do ramo do EGR ao expansor. Um estudo mais aprofundado nesta área é sugerido como

trabalho futuro.

72

6.6. Resultados globais

Nesta secção são apresentados os resultados globais da aplicação do RC a um MCI diesel

de um veículo pesado, como forma de recuperação de calor, diminuição das emissões de poluentes e

diminuição do consumo de combustível e consequentemente dos custos de utilização do veículo.

A figura 6.18 apresenta o novo consumo específico do sistema conjunto do MCI e RC, e

apresenta em anexo a equação que permite o cálculo do novo consumo específico.

Figura 6.18 – Novo consumo específico do sistema conjunto MCI + RC e equação de cálculo.

A figura 6.19 apresenta a redução do consumo específico do MCI e o aumento de potência

mecânica proporcionado pelo conjunto MCI+RC. As equações de cálculo destes parâmetros vêm em

anexo na mesma figura.

Figura 6.19 – Redução do consumo específico e aumento de potência do MCI + RC e equações de cálculo.

A partir da figura 6.19 é possível verificar que o sistema projectado consegue reduções de

consumo de combustível de cerca de 5.5% em grande parte dos regimes do MCI, conseguindo atingir

a elevadas cargas e velocidade de rotação o valor de 6.6%, o que representa uma significativa

poupança de combustível e custos de operação. É ainda de frisar o facto de que a redução das

𝑪𝒆′ =𝒎 𝒄𝒐𝒎𝒃

(𝑷𝒆 + 𝑾 𝒍𝒊𝒒)𝟑𝟔𝟎𝟎

Nota: o valor de 𝑾 𝒍𝒊𝒒 é obtido

aplicando o rendimento de conversão

mecânica de 85% energia gerada na

expansão no expansor.

𝑪𝒆,𝒓𝒆𝒅𝒖çã𝒐[%] =𝑪𝒆 − 𝑪𝒆′

𝑪𝒆

× 𝟏𝟎𝟎 𝑷𝒆,𝒂𝒖𝒎𝒆𝒏𝒕𝒐[%] =𝑷𝒆 − 𝑾

𝒍𝒊𝒒

𝑷𝒆

× 𝟏𝟎𝟎

73

emissões de CO2 diminuem na mesma proporção da redução do consumo de combustível, pelo que é

possível também atingir reduções de 6.6%. O aumento de potência mecânica do conjunto MCI+RC

apresenta um valor de cerca de 6% em grande parte dos regimes do MCI, podendo atingir nas zonas

de maior carga e maior velocidade de rotação cerca de 7%.

Dois dos resultados globais mais importantes que faltam revelar e discutir são a carga térmica

adicional colocada no sistema de refrigeração do motor, ou seja, no radiador, e a temperatura do

fluido de refrigeração à saída do bloco do motor/ entrada no radiador. Estes dois parâmetros são

apresentados na figura 6.20.

Figura 6.20 – Calor adicional no sistema de refrigeração relativamente à carga térmica original (esquerda) e

temperatura de saída do refrigerante do bloco do MCI (direita).

A discussão dos parâmetros apresentados na figura 6.20 é essencial para avaliar se a

implementação do RC na recuperação de energia do MCI não torna o sistema de arrefecimento

original num sistema subdimensionado, mais propriamente a bomba de água e o radiador. Como é

possível verificar a partir da figura 6.20, apesar da quantidade elevada de calor adicionada no circuito

de refrigeração a altas cargas e velocidades de rotação, a temperatura máxima do fluido de

refrigeração contínua abaixo dos 100ºC em qualquer regime do MCI. Como a água de refrigeração se

encontra aditivada com glicol e o circuito se encontra pressurizado com cerca de 1.5 bar, o fluido de

refrigeração apresenta uma temperatura de evaporação de cerca de 115ºC, pelo que mesmo com a

aplicação do RC ao MCI se continua a poder utilizar o sistema original de refrigeração em segurança.

Devido ao que é acabado de referir, o sistema do RC aplicado ao MCI de um veículo pesado torna-se

ainda mais exequível do ponto de vista técnico e económico, visto que não é necessário mais espaço

na parte frontal do veículo para o radiador e pode usar-se o mesmo que era utilizado no veículo

original. Algo que importa ainda realçar é o aparecimento de novos componentes para os sistemas de

refrigeração de MCI que permitem efectuar um arrefecimento de maior precisão, relativamente aos

sistemas tradicionais, o que permite ganhos de eficiência energética e menores consumos nos

ventiladores de auxilio ao arrefecimento e nas bombas de água. São exemplos de componentes para

sistema de arrefecimento de precisão as embraiagens hidráulicas e controladas electronicamente

para as bombas de água e para os ventiladores auxiliares. A integração de todos os sistemas de

arrefecimento de precisão, em conjunto com a aplicação do RC ao MCI em estudo, permite o

74

aquecimento a frio mais rápido do motor, o que permite diminuir as emissões de gases poluentes a

frio. A ordem da colocação do condensador do RC a montante do bloco do motor tem o propósito da

minimização do volume máximo do condensador, pois permite maximizar a diferença de temperatura

entre o fluido de refrigeração e a temperatura de condensação de 100ºC seleccionada para o fluido

de trabalho.

A figura 6.21 apresenta o tractor de um veículo pesado do tipo Europeu desenhado à escala,

onde se apresenta o sistema original e o sistema onde foram colocados os dois evaporadores e o

condensador projectados e onde se coloca ainda a possível localização do módulo

bomba+expansor+gerador. Tal como já tinha sido referido, o evaporador do EGR substitui o

arrefecedor original do EGR e o evaporador do escape substitui o silenciador original do escape.

Figura 6.21 – Veículo com sistema original (esquerda) e veículo com o RC aplicado ao MCI (direita).

Sistema MCI + RC

Bomba, Expansor e

Gerador

Evaporador do Escape

(na horizontal)

Condensador

Evaporador do EGR

75

Capítulo 7

7. Fecho

7.1. Conclusões

O presente estudo focou-se na avaliação do potencial de recuperação de energia em motores

de combustão interna diesel de veículos pesados. Após a análise de quatro fontes de dissipação de

calor do MCI representativo em estudo e analisando os diversos componentes existentes no mercado

e as diferentes restrições de exequibilidade técnica e económica do sistema, identificou-se o sistema

do EGR e os gases de escape como as melhores fontes de calor a recuperar. O circuito de

recuperação de calor proposto possui estas duas fontes quentes do RC em paralelo e utiliza ainda

como fonte fria o próprio sistema de refrigeração do MCI. Durante o projecto foram efectuadas

simulações termodinâmicas, com diferentes fluidos de trabalho e parâmetros de operação. Foram

ainda optimizados diversos parâmetros e levados outros até aos limites de exequibilidade técnica do

sistema. Foram alvos de estudo os principais permutadores que constituem o RC.

Foi seleccionado como expansor para o projecto o expansor comercial desenvolvido pela

Bosch de pistão, e que apresenta um rendimento isentrópico de cerca de 70% numa vasta gama de

regimes. O expansor admite como fluidos de trabalho a água, etanol e R245fa. A bomba utilizada

para o RC é uma bomba de palhetas e possui um rendimento isentrópico de cerca de 80% numa

vasta gama de regimes. A energia eléctrica desenvolvida pelo gerador do expansor é convertida a

partir da energia de expansão com um rendimento global de 85% e é injectada no MCI através do seu

alternador alterado para poder funcionar como motor eléctrico.

No estudo actual é ainda desenvolvida uma estratégia de controlo do RC com os parâmetros

de pressão e temperatura estacionários, desenvolvendo para tal evaporadores de geometria variável

no lado das fontes quentes e um condensador com controlo de eficiência de permuta efectuado por

bypass variável. Perante a estratégia de controlo do RC desenvolvida e as restrições técnicas e

económicas, é seleccionado o etanol como fluido de trabalho, trabalhando o RC com uma pressão de

evaporação de 49 bar, pressão de condensação de 2.3 bar, temperatura de sobreaquecimento de

240ºC e um rendimento térmico de 13.75%. As restrições de volume dos evaporadores, e por

conseguinte da eficiência de permuta atingível, e as restantes restrições de projecto levaram à

temperatura optimizada de arrefecimento do EGR de 120ºC e a uma temperatura optimizada de

arrefecimento dos gases de escape variável entre 110ºC e 230ºC, consoante o regime do MCI.

Devido ao baixo interesse energético e reduzida utilização do MCI a carga inferior a 800 N.m e

76

velocidade inferior a 1000 r/min, definiu-se esta zona como inactiva, desempenhando apenas o

sistema a função vital de arrefecimento do EGR.

Perante as restrições de massa, volume e perda de carga impostas pelo projecto dos dois

evaporadores do RC, seleccionou-se o permutador de tubos alhetados com alhetas contínuas e

enclausurado em conduta para servir de evaporador. Foi desenvolvido um conceito de geometria

variável em que se bloqueia a montante e a jusante do banco de tubos o escoamento dos gases

térmicos. O bloqueamento variável é efectuado por duas comportas que permitem bloquear diferente

número de canais do banco de tubos alhetados, o que permite variar artificialmente a área de

permuta e o coeficiente de convecção dos gases térmicos, permitindo assim controlar a eficiência de

permuta dos evaporadores. As duas comportas encontram-se sempre à mesma cota. O evaporador

projectado para recuperar calor no EGR foi colocado no local do arrefecedor original do EGR do MCI

e o evaporador projectado para recuperar calor do escape substituiu o silenciador original do MCI do

veículo. A perda de carga máxima dos gases térmicos ocorre no evaporador do escape a cargas

muito baixas e toma o valor de 0.043 bar, o que é um valor muito reduzido para se considerar que o

funcionamento do MCI é afectado pela presença dos evaporadores.

O permutador de calor seleccionado para o condensador é um permutador de tubos

concêntricos de escoamento axial. No dimensionamento chegou-se a um diâmetro de 71mm e um

comprimento de 7.1m, pelo que se dividiu o permutador em sete troços iguais, de modo a permitir

uma maior arrumação no veículo pesado. O condensador como é de troca indirecta foi colocado na

vertical na parede traseira da cabine, não requerendo espaço adicional na frente do veículo. O

condensador ficou a montante do bloco do motor, o que permite minimizar as dimensões do mesmo.

Globalmente conseguiu atingir-se uma redução do consumo de combustível de cerca de 5.5%

na maioria dos regimes do MCI, podendo a elevadas velocidades de rotação atingir uma redução de

6.6%. Devido ao processo de combustão, a redução de emissões de CO2 é semelhante à redução de

combustível. O conjunto MCI+RC representa um aumento de potência de cerca de 6% na maioria dos

regimes do MCI, podendo a elevadas velocidades de rotação atingir um aumento de 7%. O sistema

de refrigeração original não fica subdimensionado, pois a temperatura da água de refrigeração nem

chega a atingir os 100ºC, sendo que a 1.5 bar e com o glicol como aditivo, a água pode ter uma

temperatura de evaporação de 115ºC.

O sistema projectado representa uma massa adicional para um veículo pesado de cerca de

400kg, o que é tolerável para o tipo de veículo. Uma estimativa grosseira do preço do sistema é de

cerca de 10000€, o que dependente do preço do combustível e da utilização do veículo, pode ter um

período de retorno do investimento inferior a 5 anos. O sistema é adaptável a veículos usados, bem

como se pensa que será obrigatório para os novos modelos dentro de alguns anos.

77

7.2. Sugestão de trabalhos futuros

Após a análise do presente estudo sugerem-se um conjunto de trabalhos futuros que

contemplem os seguintes aspectos:

Desenvolvimento de uma ferramenta de simulação dinâmica da troca de calor nos

evaporadores com o conceito de comportas desenvolvido;

Fazer a avaliação de potencial real junto de uma empresa rodoviária de transporte de carga

de elevada dimensão. Simulação do desempenho de um sistema MCI+RC cruzando o

software desenvolvido com rotas reais e informação real do perfil de utilização dos regimes

dos MCI;

Encontrar uma parceria que permita adquirir os mapas de desempenho reais do MCI de um

dado veículo pesado, permita projectar e conceber um sistema protótipo, e permita

desenvolver um sistema de controlo e um circuito de recuperação pormenorizado para um

RC. Grande parte dos dados e informações de entrada necessários para o controlo do

sistema podem ser lidos a partir da porta OBD do veículo.

78

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APPEEC 2009. Asia-Pacific.

83

Anexos

A. Interface gráfica do software desenvolvido

Nesta secção apresentam-se algumas das janelas de interface do software desenvolvido no

MatLab no decorrer do presente trabalho.

Figura A.1 – Interface de arranque do software desenvolvido.

Figura A.2 – Interface de apresentação dos mapas característicos do motor actual.

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Figura A.3 – Interface de apresentação dos mapas relativos a balanços energéticos e análises de exergia das

diversas fontes de dissipação de calor do MCI em estudo.

Figura A.4 – Algumas das interfaces que vão surgindo ao longo do projecto de gestão térmica.