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ESTUDO GEOAMBIENTAL DO CURSO MÉDIO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO VERDE – CAMPO LARGO/PR Maristela Moresco Mezzomo, UFPR, [email protected]; Andreia Quintão Soares, UFPR, [email protected]; Luis Roberto Halama, UFPR, [email protected]; Gerônimo Fabrício, UFPR, [email protected]. Resumo: A preocupação com questões ambientais tem crescido nos últimos anos motivada, principalmente, pela busca da sociedade por conhecimentos que apontem amenização e soluções de problemas tanto em áreas urbanas como rurais. Diante desta preocupação e utilizando como base teórico-metodológica a Geomorfologia Ambiental, este trabalho apresenta um estudo geoambiental do curso médio da bacia hidrográfica do rio Verde, localizado no município de Campo Largo-PR. O objetivo do trabalho foi compreender a dinâmica ambiental e antrópica deste segmento da bacia, a partir da análise das características físicas e de uso e ocupação do solo. Utilizando materiais como carta topográfica, mapas geológico, hipsométrico e clinográfico e uma ortofoto, a análise da área resultou em uma compartimentação geomorfológica apresentando três setores: Planície aluvial, Platôs intermediários e Blocos elevados. Os critérios para a compartimentação se referem a formação geológica e situação de relevo como dissecação e declividades. Verificou-se que os compartimentos caracterizam ambientes de formação e dinâmica diversificada, sendo resultado do trabalho de evolução do modelado ao longo de eventos geotectônicos e climáticos. Sobre a dinâmica antrópica a área se caracteriza como um bairro residencial com alguns pequenos comércios. Com base em dados do IBGE e da prefeitura municipal, verificou-se que há deficiência de infra-estrutura pública, principalmente, de saneamento básico. Como as ocupações estão em grande parte em áreas de forte declividade, com setores apresentando mais que 30% de declive, foram constatados problemas com erosão e assoreamento. Para evitar maior degradação ambiental e implicações para a população, uma vez que a geomorfologia da área apresenta características específicas, é necessário estabelecer parâmetros de ocupação preventiva com construções específicas, dissipadores de energia e drenagem das águas pluviais, estabilização das vertentes com obras de engenharia, preservação da vegetação, construções de terraços e/ou murundus nas áreas agrícolas e revitalização das matas ciliares. Palavras-chave: Bacia hidrográfica, Dinâmica ambiental, Uso e ocupação. Abstract: The concern with environmental issues has grown in recent years driven mainly by the pursuit of knowledge society by suggesting that alleviating the problems and solutions in both urban and rural areas. Given this concern, using as basis the theoretical and methodological Environmental Geomorphology, this work presents a study geoambiental the middle course of the river basin of the Verde River, located in Campo Largo-PR. The objective was to understand the environmental and human dynamics of this segment of the basin, from the analysis of physical characteristics and use and occupancy of the soil. Using materials such as topographic maps, geological maps, hypsometric and clinographic and orthophotos, the analysis of the area resulted in a subdivision with three geomorphological areas: flood plain, plateau intermediate and high blocks. The criteria for partitioning are related to geological formation and location of dissection as relief and slope. It was found that characterize the compartments of training environments and dynamic range, and the work of development of the model over geotectonic events and climate. On the human dynamic the area is characterized as a residential neighborhood with some small shops. Based on data from the IBGE and the municipality, it was found that lack of public infrastructure, especially in sanitation. As the occupations are largely in areas of high slope, with most sectors showing that 30% of slope, were found problems with erosion and siltation. To prevent further environmental degradation and the implications for the population as the geomorphology of the area has specific characteristics, it is necessary to establish parameters for preventive occupation with specific buildings, dissipate energy and drainage of rainwater, stabilization of slopes with engineering works, preservation of vegetation, construction of terraces and / or mounds in agricultural areas and revitalization of the riparian forests. Keywords: Hydrographic basin, environmental dynamics, using and occupation.

ESTUDO GEOAMBIENTAL DO CURSO MÉDIO DA BACIA … · abrange parte dos municípios de Araucária e Campo Largo. O rio se destaca, pois é utilizado pela Petrobrás a partir de um reservatório

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ESTUDO GEOAMBIENTAL DO CURSO MÉDIO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO VERDE – CAMPO LARGO/PR

Maristela Moresco Mezzomo, UFPR, [email protected]; Andreia Quintão Soares, UFPR, [email protected]; Luis Roberto Halama, UFPR, [email protected]; Gerônimo Fabrício, UFPR, [email protected].

Resumo: A preocupação com questões ambientais tem crescido nos últimos anos motivada, principalmente, pela busca da sociedade por conhecimentos que apontem amenização e soluções de problemas tanto em áreas urbanas como rurais. Diante desta preocupação e utilizando como base teórico-metodológica a Geomorfologia Ambiental, este trabalho apresenta um estudo geoambiental do curso médio da bacia hidrográfica do rio Verde, localizado no município de Campo Largo-PR. O objetivo do trabalho foi compreender a dinâmica ambiental e antrópica deste segmento da bacia, a partir da análise das características físicas e de uso e ocupação do solo. Utilizando materiais como carta topográfica, mapas geológico, hipsométrico e clinográfico e uma ortofoto, a análise da área resultou em uma compartimentação geomorfológica apresentando três setores: Planície aluvial, Platôs intermediários e Blocos elevados. Os critérios para a compartimentação se referem a formação geológica e situação de relevo como dissecação e declividades. Verificou-se que os compartimentos caracterizam ambientes de formação e dinâmica diversificada, sendo resultado do trabalho de evolução do modelado ao longo de eventos geotectônicos e climáticos. Sobre a dinâmica antrópica a área se caracteriza como um bairro residencial com alguns pequenos comércios. Com base em dados do IBGE e da prefeitura municipal, verificou-se que há deficiência de infra-estrutura pública, principalmente, de saneamento básico. Como as ocupações estão em grande parte em áreas de forte declividade, com setores apresentando mais que 30% de declive, foram constatados problemas com erosão e assoreamento. Para evitar maior degradação ambiental e implicações para a população, uma vez que a geomorfologia da área apresenta características específicas, é necessário estabelecer parâmetros de ocupação preventiva com construções específicas, dissipadores de energia e drenagem das águas pluviais, estabilização das vertentes com obras de engenharia, preservação da vegetação, construções de terraços e/ou murundus nas áreas agrícolas e revitalização das matas ciliares. Palavras-chave: Bacia hidrográfica, Dinâmica ambiental, Uso e ocupação. Abstract: The concern with environmental issues has grown in recent years driven mainly by the pursuit of knowledge society by suggesting that alleviating the problems and solutions in both urban and rural areas. Given this concern, using as basis the theoretical and methodological Environmental Geomorphology, this work presents a study geoambiental the middle course of the river basin of the Verde River, located in Campo Largo-PR. The objective was to understand the environmental and human dynamics of this segment of the basin, from the analysis of physical characteristics and use and occupancy of the soil. Using materials such as topographic maps, geological maps, hypsometric and clinographic and orthophotos, the analysis of the area resulted in a subdivision with three geomorphological areas: flood plain, plateau intermediate and high blocks. The criteria for partitioning are related to geological formation and location of dissection as relief and slope. It was found that characterize the compartments of training environments and dynamic range, and the work of development of the model over geotectonic events and climate. On the human dynamic the area is characterized as a residential neighborhood with some small shops. Based on data from the IBGE and the municipality, it was found that lack of public infrastructure, especially in sanitation. As the occupations are largely in areas of high slope, with most sectors showing that 30% of slope, were found problems with erosion and siltation. To prevent further environmental degradation and the implications for the population as the geomorphology of the area has specific characteristics, it is necessary to establish parameters for preventive occupation with specific buildings, dissipate energy and drainage of rainwater, stabilization of slopes with engineering works, preservation of vegetation, construction of terraces and / or mounds in agricultural areas and revitalization of the riparian forests. Keywords: Hydrographic basin, environmental dynamics, using and occupation.

ESTUDO GEOAMBIENTAL DO CURSO MÉDIO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO VERDE – CAMPO LARGO/PR

Maristela Moresco Mezzomo, UFPR, [email protected]; Andreia Quintão Soares, UFPR, [email protected]; Luis Roberto Halama, UFPR, [email protected]; Gerônimo Fabrício, UFPR, [email protected].

1. INTRODUÇÃO

A Geomorfologia está cada vez mais empenhada com a questão ambiental e desenvolve-se a

partir de uma demanda crescente da sociedade, com relação à necessidade de se buscarem

conhecimentos que apontem na direção de inúmeras possibilidades de soluções ou amenizações que os

impactos ambientais exercem, tanta em áreas urbanas como rurais.

Segundo Guerra e Marçal (2006), grande parte das catástrofes causadas ao meio ambiente

poderia ser evitada ou pelo menos ter seus efeitos minimizados, reduzindo bastante o número de

vítimas humanas fatais, bem como o número de danos aos bens materiais, recursos hídricos, flora e

fauna, caso a Geomorfologia Ambiental fosse compreendida e adotada como um importante

instrumento no planejamento.

A Geomorfologia Ambiental surge a partir do reconhecimento do papel da ação do homem

nos processos geomorfológicos e na evolução das formas de relevo, ou seja, o homem agindo como

um agente geomorfológico. Como destaca Hart (1986), na medida em que o homem usa uma porção

da superfície terrestre, ele tem que conhecer as formas de relevo, solos, rochas, recursos hídricos etc.

Além disso, esse conhecimento pode possibilitar um melhor aproveitamento dos recursos existentes,

bem como evitar que catástrofes venham a ocorrer na área ocupada.

Lima-e-Silva et al. (2002) e Guerra e Guerra (2003) conceituam Geomorfologia Ambiental

como sendo a aplicação dos conhecimentos geomorfológicos ao planejamento e ao manejo ambiental.

Ela inclui levantamento dos recursos naturais, a análise do terreno, a avaliação das formas de relevo, a

determinação das propriedades químicas e físicas do relevo, o monitoramento dos processos

geomorfológicos, as análises de laboratório, o diagnóstico ambiental e a elaboração dos mapas de

riscos. Os referidos autores destacam ainda que esta abordagem tem crescido muito nos últimos anos,

devido à necessidade de se ocuparem novas áreas na superfície terrestre, onde o planejamento

ambiental torna-se indispensável, para que sejam evitadas catástrofes. Desta forma, a Geomorfologia

Ambiental procura entender a superfície terrestre, levando em conta uma abordagem integradora, onde

o ambiente (natural e transformado pelo homem) seja o ponto de partida, bem como o objeto desse

ramo do conhecimento.

Os estudos geomorfológicos contribuem de forma efetiva como subsídio para projetos de

ordenamento territorial (planejamento urbano e regional) e de natureza geoambiental, pois evidenciam

uma estreita relação com a Geografia e Geologia. O objeto desses estudos corresponde às formas de

relevo, porém estas só existem, pois foram esculpidas pela ação de determinados processos pretéritos e

atuais. Neste sentido, os estudos geomorfológicos buscam explicar como os processos se articulam,

como evoluem os grandes conjuntos de relevo, qual o significado do relevo no contexto ambiental,

como interferir ou controlar o funcionamento dos processos geomorfológicos, como conviver com os

processos catastróficos e como projetar o comportamento dos processos e as formas de relevo.

Diante da temática sobre a Geomorfologia Ambiental o presente trabalho apresenta um estudo

geoambiental desenvolvido por alunos do programa de pós-graduação (Mestrado e Doutorado) da

Universidade Federal do Paraná na disciplina de Geomorfologia Ambiental ministrada pelo professor

Everton Passos no ano de 2008. A área de estudo se refere ao curso médio da bacia hidrográfica do rio

Verde, localizado no município de Campo Largo, região Metropolitana de Curitiba-PR. A bacia

abrange parte dos municípios de Araucária e Campo Largo. O rio se destaca, pois é utilizado pela

Petrobrás a partir de um reservatório de água. Este uso tem gerando uma grande quantidade de

questões no que se refere o viés ambiental como eutrofização, assoreamentos, poluição, etc.

O objetivo do trabalho foi compreender a dinâmica deste trecho da bacia, a partir do

conhecimento das características físicas e de uso e ocupação do solo, para então realizar uma

compartimentação geomorfológica da área.

2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA

De acordo com o Mapeamento Geomorfológico do Estado do Paraná (Santos et al., 2006), a

área de estudo está classificada da seguinte forma: Unidade Morfoestrutural: Cinturão Orogênico do

Atlântico; Unidade Morfoescultural: Primeiro Planalto Paranaense; Sub-Unidade Morfoescultural:

Planalto de Curitiba. Os solos da área são classificados como Argissolos Vermelho-amarelos

Distrófico, Gleissolos Melânicos, Latossolos Vermelhos Distróficos. A vegetação apresenta-se

classificada como Floresta Ombrófila Mista subdividida em Floresta Subtropical Perene, Floresta

Subtropical de várzea e Campo Subtropical.

No que se refere à Geologia a área é dividida em quatro formações (Figura 1), sendo elas:

- Formação Complexo Metamórfico Indiferenciado: composta por biotita-muscovita xistos e

clorita-biotita-muscovita xistos, com ocorrências locais de quartzo xistos e quartzitos, sendo datada do

Arqueano-Proterozóico Inferior;

- Formação Complexo Gnáissico Migmatítico: composta por migmatitos oftálmicos, com

paleosoma de biotita gnaisse, biotita-horoblenda gnaisse e horoblenda gnaisse, localmente com

quartzitos, sendo datada do Arqueano-Proterozóico Inferior;

- Formação Sedimentos Recentes: composta por sedimentos de deposição fluvial (aluviões),

com areias, siltes, argilas e cascalhos, depositados em canais, barras e planícies de inundação, sendo

datada do Quaternário / Holoceno;

- Formação Guabirotuba: composta por argilas, arcósios, areias e cascalhos, sendo datada do

Quartenário / Pleistoceno.

Figura 1: Mapa Geológico da área de estudo. Organizado por Soares, A. Q. (2008).

3. METODOLOGIA

3.1. Pressupostos Metológicos

É de suma importância ter claro que o relevo é apenas um dos componentes da litosfera e que

está intrinsecamente relacionado com as rochas que o sustenta e com os solos e a cobertura vegetal que

o recobre. É também de absoluta importância, ter como noção básica que as formas diferenciadas do

relevo decorrem, portanto da atuação simultânea e desigual das atividades climáticas de um lado e da

estrutura da litosfera de outro, bem como a clareza de que tanto o clima, quanto à estrutura, não se

comporta sempre igual, ou seja, ao longo do tempo e no espaço ambos continuamente se modificam.

Estes elementos nos permitem considerar que o relevo, como os demais componentes da natureza são

dinâmicos, portanto em constante estado de evolução (SOARES, 2007).

Assim, segundo Ross (2005), interpretar o relevo não é simplesmente saber identificar

padrões de formas ou tipos de vertentes e vales, não é simplesmente saber descrever o comportamento

geométrico das formas, mas saber identificá-las e correlacioná-las com os processos atuais e pretéritos,

responsáveis por tais modelados, e com isso estabelecer não só a gênese, mas também sua cronologia,

ainda que relativa. Desse modo, uma cartografia geomorfológica eficiente deve indicar todos estes

elementos levantados como essenciais para o entendimento do relevo.

A fundamentação teórico-metodológica, que se propõe para trabalhar a pesquisa

geomorfológica tem suas raízes na concepção de Walter Penck (1953) que definiu com clareza as

forças geradoras das formas do relevo terrestre. Penck (1953) percebeu que o entendimento das atuais

formas de relevo da superfície da Terra são produtos do antagonismo das forças motoras dos processos

endógenos e exógenos, ou seja, da ação das forças emanadas do interior da crosta terrestre de um lado

e das forças impulsionadas através da atmosfera pela ação climática, atual e do passado, de outro

(ROSS, 1992).

Para a realização do estudo geoambiental ordenou-se o trabalho em diferentes níveis escalares

espaciais e temporais com base na análise geomorfológica idealizada por Ab'Saber (1969). Esses

níveis de tratamento permitem um ordenamento nos estudos geomorfológicos em três etapas, que são:

Compartimentação do Relevo; Estruturação Superficial da Paisagem e Fisiologia da Paisagem.

3.2. Procedimentos Operacionais

A partir de dados fornecidos na disciplina de “Geomorfologia Ambiental” do Programa de

Pós-Graduação em Geografia da UFPR, foi mapeada a área de estudo, a partir da carta topográfica

número 393 com escala 1:10.000, do Instituto de Terras, Cartografia e Geociências (ITCG).

Com a aquisição da base cartográfica (hidrografia, estradas, curvas de nível, pontos cotados,

limite da área) foram elaborados, através do software ArcGis 9.2 os mapas hipsométrico, clinográfico

e o mapa da área de estudo.

Os mapas hipsométrico e clinográfico foram gerados utilizando-se a estrutura de grade

triangular, mais conhecida como TIN “Triangular Irregular Network”, que é uma estrutura do tipo

vetorial com topologia do tipo nó-arco possibilitando representar uma superfície por meio de um

conjunto de faces triangulares interligadas.

O mapa hipsométrico permite uma melhor avaliação do comportamento do relevo, observar

os limites e a distribuição das altitudes encontradas na área de estudo. A declividade pode ser

conceituada como a inclinação do terreno em relação ao plano horizontal e esta pode ser expressa em

percentual ou em graus. Ela é calculada pela variação de altitude entre dois pontos do terreno (curvas

de nível) em relação à distância que os separa.

Através de um arquivo em formato digital fornecido pelo Instituto de Terras, Cartografia e

Geociências (ITCG) do Mapa Geológico do Paraná, pode-se analisar as formações geológicas

presentes na área de estudo, e assim gerar o Mapa Geológico.

Duas saídas de campo foram realizadas, percorrendo alguns trechos da área de estudo.

Durante todo o trajeto percorrido foram feitas paradas para fotografar, analisar as formas de relevo, a

litologia, a hidrografia e a vegetação, para que posteriormente fosse possível dividir a área em

compartimentos de formas semelhantes.

Em seguida, realizou-se a análise e interpretação de todo o material existente que viabiliza a

construção do Mapa de Compartimentos Geomorfológicos. O mapa refere-se a um produto

cartográfico de síntese, no qual está representado as formas de relevo e as informações relativas a

morfologia, morfometria e morfogênese. Sua construção apoia-se em todos os documentos

anteriormente descritos, que são: revisão cartográfica; elaboração dos mapas hipsométrico,

declividade, geológico e das observações realizadas durante os trabalhos de campo.

4. RESULTADOS

Com base na carta topográfica número 393 com escala 1:10.000, do Instituto de Terras,

Cartografia e Geociências (ITCG), nos mapas geológico (Figura 1), hipsométrico e clinográfico

(Figuras 2 e 3) e uma ortofoto, realizou-se uma análise geoambiental da área, tendo como resultado a

compartimentação geomorfológica em 3 unidades distintas (Figura 4).

Os critérios para esta compartimentação se referem, principalmente, a situação de altitude,

declividade e forma de relevo, que foram divididos em três compartimentos, sendo eles: Planície

Aluvial, Platôs Intermediários e Blocos Elevados.

Figura 2: Mapa Hipsométrico da área de estudo. Organizado por Soares, A. Q. (2008).

Figura 3: Mapa Clinográfico da área de estudo. Organizado por Soares, A. Q. (2008).

Figura 4: Compartimentação Geomorfológica da área de estudo. Organizado por Soares, A. Q. (2008).

4.1 – Caracterização do Compartimento Planície Aluvial

Este compartimento se refere à parte rebaixada da carta onde se encontra o rio Verde, com

altitudes médias variando de 890 a 900 metros. A área de entorno do rio apresenta uma planície de

inundação bem marcada com vale em calha, sedimentos inconsolidados e vegetação típica de várzea.

A formação geológica apresenta sedimentos recentes (Quaternário - Holoceno), com deposição fluvial

(aluviões), com areias, siltes, argilas e cascalhos na planície de inundação.

O canal é estreito com a presença de mata e capoeira ciliar. Em direção a jusante o rio se

encontra retilinizado aparentemente a mais de 30 anos, pois na carta topográfica de 1976 já pode ser

percebido esta canalização que se torna evidenciada atualmente a partir da localização de meandros

abandonados (Foto 1). A montante do rio apresenta mata e capoeira ciliar, mais representativa na

margem direita. Também ocorre o uso agrícola em algumas porções deste compartimento e granjas. A

ocupação urbana apresenta-se em alguns trechos ao longo deste compartimento, sendo construções

residenciais, comerciais e industriais.

Foto 1: Meandros abandonados do rio Verde a montante da barragem da Petrobrás. Fonte Google Earth, 2008.

4.2 – Caracterização do Compartimento Platôs Intermediários

Este compartimento corresponde as áreas com altimetria que varia de 900 a 970 metros. A

formação geológica classifica-se como Complexo Metamórfico Indiferenciado, com ocorrências locais

de quartzo xistos e Complexo Gnáissico Migmatítico com quartzitos, ambos do Arqueano-

Proterozóico Inferior.

A dissecação apresenta-se com grau médio a alto, em que as vertentes apresentam forte

declividade (maior que 30%), sendo os maiores valores entre os demais compartimentos. Apresenta

algumas rupturas de declive nas médias e altas vertentes.

Os topos apresentam-se curtos e aplainados, com alguns levemente angulosos. Os vales estão

em V encaixado com alta drenagem que apresenta padrão dendrítico, com vários afluentes e tributários

do Rio Verde. A vegetação se encontra ao longo dos cursos d’água e em algumas rupturas de declive.

O uso do solo é feito, predominantemente por agricultura (milho, feijão, batata), que estão

localizados em setores menos declivosos, principalmente na porção sudeste e sudoeste, sendo

aparentemente, de pequena e média propriedade. Outro uso bastante verificado neste compartimento se

refere às lagoas que são utilizadas para pesca comercial e doméstica (Foto 2).

Em relação a ocupação urbana, a maior concentração de toda área de estudo ocorre neste

compartimento, com destaque para residências, comércios e indústrias, representados pela Vila Santo

Onofre no bairro Caratuva (Foto 3). Foi verificado que há um grande número de ocupações por

residências em áreas com declividades superiores a 30%. Estas ocupações são consideradas irregulares

uma vez que contrariam a lei que indica ocupação em encostas inferior a esta porcentagem.

Foto 2: Uso do solo com lagoas. Foto: Luis Roberto Halama, 2008.

Foto 3: Ocupação urbana em áreas declivosas no Bairro Caratuva. Foto: Luis Roberto Halama, 2008.

Embora esta área apresente fortes declividades, pode ser considerada estável sob o ponto de

vista geológico, pois apresenta migmatito com manto de intemperismo bastante profundo, com solo

poroso e sem a presença de plano de cisalhamento, o que oferece à área certa estabilidade diante dos

movimentos de massa. Porém, com a impermeabilização por meio do asfalto, que está sendo

construído atualmente no bairro, além das calçadas, outros problemas surgem e estão relacionados com

as águas pluviais. Devido as ruas estarem em vertentes com forte declividade (Foto 4), ocorre maior

concentração e aumento da velocidade do escoamento, que sem medidas planejadas (dissipadores de

energia e desvios da água) poderá promover problemas na baixa vertente como erosão e contaminação

dos córregos (tributários e afluentes do rio Verde).

Ainda sobre o uso deste compartimento, o mesmo é cortado por uma rodovia de trânsito

intenso (BR 277), sendo um atrativo para a ocupação urbana de uso comercial, industrial e residencial

em suas margens, caracterizando fragmentos urbanos ao longo da rodovia.

Foto 4: Relevo íngreme com impermeabilização recente, evidenciando possível concentração

de escoamento superficial. Foto: Luis Roberto Halama, 2008.

4.3 – Caracterização do Compartimento Blocos Elevados

Este compartimento ocupa a porção mais elevada da área de estudo, com altimetria que

variam de 970 a 1000 metros. A geologia se refere a Formação Guabirotuba com argilas, arcósios,

areias e cascalhos do período Quaternário/Pleistoceno. A dissecação é mais suave se comparada com o

compartimento de Platôs Intermediários, tendo topos alongados e relevo suave ondulado. As vertentes

não apresentam declividades acentuadas apenas em rupturas de declives bem marcadas em alguns

setores de alta vertente.

O uso é predominantemente agrícola com fragmentos de mata residuais ao longo dos cursos

d’água. Esta condição de uso finalidade agrícola vem acelerando os processos erosivos, fato

perceptível pela coloração do solo que evidencia que horizonte orgânico foi desgastado.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise desta área de estudo a partir da perspectiva da Geomorfologia Ambiental,

possibilitou verificar diferentes compartimentos geomorfológicos que caracterizam ambientes de

formação, evolução e dinâmica diversificada, sendo resultado do trabalho de evolução do modelado ao

longo de eventos geotectônicos e climáticos, sendo estes últimos os mais representativos.

No que tange os problemas ambientais, á área apresenta várias situações de fragilidade que

envolve problemas erosivos devido ao escoamento superficial laminar nas áreas de agricultura

mecanizada, que é acelerado com a exposição do solo e declividades acentuadas. Também ocorrem

problemas erosivos como sulcos e ravinas oriundos do escoamento superficial linear. A ocorrência

destes escoamentos em vertentes íngremes pode promover a contaminação por agrotóxicos e/ou

assoreamentos. Estes problemas por sua vez, parecem ter origem tanto dentro da área estudada, se

prolongando para a jusante do rio Verde, como também são originadas a montante, chegando neste

setor da bacia como conseqüências.

Outros problemas evidenciados se referem a ocupação de áreas de APP (Área de Preservação

Permanente) por construções irregulares. Estas construções se referem às residências e comércios que

se instalaram em áreas de vertentes íngremes. Conforme o Código Florestal (Lei nº. 4.771/65) e a Lei

de Parcelamento do Solo Urbano (Lei nº. 6.766/79) em declividades maiores do que 45º não deve

haver ocupação para evitar problemas ambientais e danos sócio-econômicos.

Neste sentido, questiona-se como mesmo diante de tais legislações ocorreu a ocupação das

áreas íngremes do bairro Caratuva de forma intensa e rápida (menos de 20 anos), uma vez que nas

proximidades deste bairro há situações de relevo menos íngremes que poderiam ter sido aproveitados

para a construção do bairro. Porém, várias questões parecem envolver a ocupação deste bairro como:

especulação imobiliária; proximidade com a BR 277; proximidade com o município de Curitiba (que

atrai mão-de-obra caracterizando este bairro como ‘cidade dormitório’); indústrias já instaladas

anteriormente, entre outros.

Estas ocupações acabam por potencializar a fragilidade natural do ambiente físico devido ao

fato de ocupar áreas muito declivosas. Para evitar maiores problemas a este ambiente, se torna

necessário estabelecer parâmetros de ocupação preventiva tanto para a população como para o

ambiente natural como construções reforçadas, dissipadores de energia das águas pluviais, drenagem

das águas superficiais por meio de bocas de lobo específicas, estabilização de vertentes não ocupadas

com obras de engenharia, manutenção da vegetação, construções de terraços e/ou murundus nas áreas

agrícolas e manutenção e revitalização das matas ciliares.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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LIMA-e-SILVA, P.P., GUERRA, A.J.T., MOUSINHO, P., BUENO, C., ALMEIDA, F.G., MALHEIROS, T. & SOUZA Jr., A.B. (2002). Dicionário Brasileiro de Ciências Ambientais. Rio de Janeiro, Editora Thex, 2a Edição, 251p. PENCK, W. Morphological Analysis of Land Forms. Mamillan and Co., London. 1953

ROSS, J. L. S. O Registro Cartográfico dos Fatos Geomórficos e a Questão da Taxonomia do Relevo. Revista da Pós-Graduação de USP, n.6. São Paulo; 1992, 17-29p.

ROSS, J. L. S. Geomorfologia, Ambiente e Planejamento. São Paulo, Editora Contexto, 2005, 85p. SANTOS, L. J. C. S.; Oka-Fior, C.; Canali, N. E.; Fiori, A. P.; Silveira, C. T.; Silva, J. M. F. da; Ross, J. L. S. Mapeamento geomorfológico do estado do Paraná. Revista Brasileira de Geomorfologia. Ano 7, nº 2. 2006. p. 3-12.

SOARES, A. Q. Mapeamento geomorfológico da bacia hidrográfica do rio do Silveira - São José dos Ausentes – RS. Trabalho de Graduação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2007. 73p.