11
Anais do 15 O Encontro de Iniciação Científica e Pós-Graduação do ITA – XV ENCITA / 2009 Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, SP, Brasil, Outubro, 19 a 22, 2009. ESTUDO SOBRE A ACESSIBILIDADE DE AEROPORTOS NO BRASIL Diego Alexsander Mamede Instituto Tecnológico de Aeronáutica Praça Marechal Eduardo Gomes, 50 - Vila das Acácias CEP 12.228-971 – São José dos Campos – SP – Brasil Bolsista PIBIC-CNPq [email protected] Cláudio Jorge Pinto Alves Instituto Tecnológico de Aeronáutica Praça Marechal Eduardo Gomes, 50 - Vila das Acácias CEP 12.228-900 – São José dos Campos – SP – Brasil [email protected] Resumo.Um ponto crítico para a infra-estrutura do transporte aéreo é a integração dos complexos aeroportuários aos centros urbanos. O sistema aéreo nacional esteve em constante discussão nos últimos tempos. Entre a diversificada gama de problemas que se apresentaram recentemente ao administrador aeroportuário uma é a acessibilidade dos aeroportos. Essa é uma questão de difícil solução, pois, apesar de um bom acesso ser de interesse do administrador aeroportuário, os meios de acesso não estão sob sua responsabilidade. No Brasil, o caso mais crítico é o da cidade de São Paulo, uma vez que um terço dos passageiros que utilizam o serviço aéreo no Brasil passa por Congonhas ou Guarulhos. Através da análise de casos no mundo todo, em especial o de São Paulo, o presente trabalho analisa busca o delineamento de uma solução geral para o problema. Palavras chave: acessibilidade, aeroporto,Expresso Aeroporto, análise de perfil de acesso. 1. Introdução O sistema aéreo nacional esteve em constante discussão nos últimos tempos. Entre a diversificada gama de problemas que se apresentaram recentemente ao administrador aeroportuário uma é a acessibilidade dos aeroportos. Essa é uma questão de difícil solução, pois, apesar de um bom acesso ser de interesse do administrador aeroportuário, os meios de acesso não estão sob sua responsabilidade. Um acidente em uma via de acesso pode provocar atrasos em massa e, conseqüentemente, grandes filas no check-in, atraso no vôo e insatisfação dos clientes. Por isso, o acesso de um aeroporto deve estar em sua agenda e soluções em conjunto com o planejamento urbano devem ser buscadas. O transporte aéreo tem grande relevância estratégica para a infra-estrutura logística do país. Prevendo a crescente demanda por transporte aéreo, o governo federal incluiu no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) diversas obras relacionadas à infra-estrutura aeroportuária, desde ampliação de terminais de passageiros até obras nas vias de acesso a aeroportos. No total, estão previstos três bilhões de reais em obras. Ao mesmo tempo, o Brasil foi escolhido como sede da Copa de 2014, evento de porte internacional com enorme participação estrangeira. A opção do país em utilizar o evento para mostrar a diversidade do país através da escolha de doze cidades-sede buscando abranger todo o território terá como conseqüência inevitável a grande utilização dos aeroportos brasileiros. Nesse contexto, o acesso se torna ainda mais importante por se estar lidando com um público específico, exigente e que estará entrando em uma região desconhecida. E o Brasil terá cinco anos para se preparar. Nessa conjuntura de preparação rápida é importante a busca do apoio de investigações científicas para que sejam tomadas as melhores decisões. Dentre as obras previstas pelo PAC 1 , está o acesso viário ao aeroporto de Salvador, uma das cidades-sede. O planejamento de ações como esta deve buscar uma visão abrangente e integrada, e a preocupação com os modais de acesso é fundamental. 1 Portal do Governo Brasileiro – PAC. Disponível em <http://www.brasil.gov.br/pac/>. Acesso em 04/06/08.

ESTUDO SOBRE A ACESSIBILIDADE DE … do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009 , Figura 2 – Ligações entre Hong Kong e o aeroporto Chep Lap Kok. Porém, o problema de acessibilidade

  • Upload
    lyminh

  • View
    214

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Anais do 15O Encontro de Iniciação Científica e Pós-Graduação do ITA – XV ENCITA / 2009

Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, SP, Brasil, Outubro, 19 a 22, 2009.

ESTUDO SOBRE A ACESSIBILIDADE DE AEROPORTOS NO BRASIL

Diego Alexsander Mamede

Instituto Tecnológico de Aeronáutica Praça Marechal Eduardo Gomes, 50 - Vila das Acácias CEP 12.228-971 – São José dos Campos – SP – Brasil Bolsista PIBIC-CNPq [email protected] Cláudio Jorge Pinto Alves Instituto Tecnológico de Aeronáutica Praça Marechal Eduardo Gomes, 50 - Vila das Acácias CEP 12.228-900 – São José dos Campos – SP – Brasil [email protected]

Resumo.Um ponto crítico para a infra-estrutura do transporte aéreo é a integração dos complexos aeroportuários aos

centros urbanos. O sistema aéreo nacional esteve em constante discussão nos últimos tempos. Entre a diversificada

gama de problemas que se apresentaram recentemente ao administrador aeroportuário uma é a acessibilidade dos

aeroportos. Essa é uma questão de difícil solução, pois, apesar de um bom acesso ser de interesse do administrador

aeroportuário, os meios de acesso não estão sob sua responsabilidade. No Brasil, o caso mais crítico é o da cidade de

São Paulo, uma vez que um terço dos passageiros que utilizam o serviço aéreo no Brasil passa por Congonhas ou

Guarulhos. Através da análise de casos no mundo todo, em especial o de São Paulo, o presente trabalho analisa busca

o delineamento de uma solução geral para o problema.

Palavras chave: acessibilidade, aeroporto,Expresso Aeroporto, análise de perfil de acesso.

1. Introdução

O sistema aéreo nacional esteve em constante discussão nos últimos tempos. Entre a diversificada gama de

problemas que se apresentaram recentemente ao administrador aeroportuário uma é a acessibilidade dos aeroportos. Essa é uma questão de difícil solução, pois, apesar de um bom acesso ser de interesse do administrador aeroportuário, os meios de acesso não estão sob sua responsabilidade. Um acidente em uma via de acesso pode provocar atrasos em massa e, conseqüentemente, grandes filas no check-in, atraso no vôo e insatisfação dos clientes. Por isso, o acesso de um aeroporto deve estar em sua agenda e soluções em conjunto com o planejamento urbano devem ser buscadas.

O transporte aéreo tem grande relevância estratégica para a infra-estrutura logística do país. Prevendo a crescente demanda por transporte aéreo, o governo federal incluiu no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) diversas obras relacionadas à infra-estrutura aeroportuária, desde ampliação de terminais de passageiros até obras nas vias de acesso a aeroportos. No total, estão previstos três bilhões de reais em obras.

Ao mesmo tempo, o Brasil foi escolhido como sede da Copa de 2014, evento de porte internacional com enorme participação estrangeira. A opção do país em utilizar o evento para mostrar a diversidade do país através da escolha de doze cidades-sede buscando abranger todo o território terá como conseqüência inevitável a grande utilização dos aeroportos brasileiros. Nesse contexto, o acesso se torna ainda mais importante por se estar lidando com um público específico, exigente e que estará entrando em uma região desconhecida. E o Brasil terá cinco anos para se preparar.

Nessa conjuntura de preparação rápida é importante a busca do apoio de investigações científicas para que sejam tomadas as melhores decisões. Dentre as obras previstas pelo PAC1, está o acesso viário ao aeroporto de Salvador, uma das cidades-sede. O planejamento de ações como esta deve buscar uma visão abrangente e integrada, e a preocupação com os modais de acesso é fundamental.

1 Portal do Governo Brasileiro – PAC. Disponível em <http://www.brasil.gov.br/pac/>. Acesso em 04/06/08.

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

Gráfico 1 – Relação entre tráfego no acesso e movimento de passageiros no aeroporto.

FONTE: Ashford, 1984.

O Gráfico 1 mostra a relação íntima entre o tráfego no aeroporto internacional de São Francisco, SFO (barras), e o tráfego nas vias de acesso nas proximidades da baía (tracejado). Para eliminar essa dependência das vias rodoviárias, grandes aeroportos já foram projetados pensando em um ou mais modais de acesso. O aeroporto de Zurique (ZRH) foi um dos primeiros a ter um terminal de passageiros de fato integrado com a linha ferroviária da cidade. Inicialmente, as autoridades suíças imaginavam que entre 50 e 60% do acesso seria realizado por este modal; no entanto, essa taxa não foi alcançada e a acessibilidade começou a se mostrar mais problemática que o imaginado.

Os trabalhos em torno dos problemas de acessibilidade são recentes e ainda não apresentam uma solução clara. Trabalhos da década passada aparecem apenas delineando um perfil da acessibilidade dos principais aeroportos. É o caso do trabalho de Lehrer e Feeman (1998), que traça o perfil do acesso dos passageiros dos vinte maiores aeroportos dos EUA. Estudo parecido foi feito por Gelhausen e Wilken (2006) para os aeroportos da Alemanha. No Brasil, Braga e Guedes (2008) criaram um método usando um sistema de informações geográficas para cálculo e ranqueamento da acessibilidade dos principais aeroportos do Brasil.

Esses trabalhos ainda não se preocupam em apontar uma solução para os problemas de acessibilidade. No Brasil, Bianca Alves (2005) inova apresentando um detalhado estudo para o Aeroporto de Congonhas que consegue traçar um perfil dos usuários e aponta diversas questões e soluções para a acessibilidade. Por outro caminho, estudos de mobilidade urbana já vislumbravam os problemas do crescimento urbano desordenado e da escassez de recursos nos países em desenvolvimento aliados à dependência do poder público. É o caso do estudo de Martins, Bodmer, Porto e Porto (1999) sobre os transtornos no trânsito causados pela instalação de um shopping no âmbito do município do Rio de Janeiro. Por fim, o trabalho de Menezes Caldas (2008) aponta a solução para o desafio da integração urbana de aeroportos: planejamento. Porém apenas aponta os desafios a serem enfrentados sem apresentar uma solução geral para o problema.

A partir do estudo desses artigos, de técnicas de pesquisa e análise de casos, o presente trabalho busca iniciar a delineação de uma solução para a acessibilidade de aeroportos.

2. A Acessibilidade de alguns aeroportos no mundo

A princípio, a grande distância dos centros urbanos parece ser o principal problema de acessibilidade. Tendo isso

em vista, foram analisados os aeroportos de Hong Kong e de Belo Horizonte, Aeroporto Internacional Tancredo Neves, que apresentam como distancia de seus centros urbanos, respectivamente, 40 e 38 km. Ambos foram construídos para substituir o aeroporto principal. Em Belo Horizonte, há pouco, o aeroporto da Pampulha operava com o dobro da sua capacidade enquanto Confins era subutilizado desde a década de 70 pelas péssimas condições de acessibilidade.

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

Gráfico 1: Evolução do número de passageiros nos aeroportos mineiros. Dados: Infraero

Apenas em 2004 o governo de Minas Gerais redirecionou a maioria dos vôos domésticos para Confins (Gráfico 2),

e apresentou como solução de acessibilidade a Linha Verde (vide Figura 1), intervenção urbana que, além de aumentar a tendência de expansão da capital mineira para o norte, criou uma ligação direta do centro da cidade ao aeroporto internacional. Além do acesso rodoviário, estão previstos investimentos na malha ferroviária da cidade para ligar o centro ao aeroporto.

Figura 1 – Linha verde na cidade de Belo Horizonte. Fonte: Governo de Minas Gerais

O caso de Hong Kong teve plano diferente. Com a saturação do aeroporto Kai Tak e as crescentes preocupações

com a segurança, foi construído o novo aeroporto Chep Lap Kok. A grande diferença é que o acesso rodoviário e ferroviário foram planejados juntamente ao projeto do complexo aeroportuário (Vide Figura 2). A desativação do antigo aeroporto foi imediata à inauguração de Chek Lap Kok.

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

Figura 2 – Ligações entre Hong Kong e o aeroporto Chep Lap Kok.

Porém, o problema de acessibilidade não se apresenta apenas em aeroportos distantes dos centros urbanos, mas é

comum a todos os aeroportos e é reflexo de problemas de planejamento. É o caso do Aeroporto Internacional de Los Angeles, a 24 km do centro da cidade. Foi inaugurado em 1930 ao sul de Winchester, na época praticamente desabitada. O rápido crescimento da cidade criou uma intrincada rede rodoviária (na Figura 3 em amarelo) às portas do aeroporto.

Figura 2: Acesso ao Aeroporto de Los Angeles

Caso parecido de falta de planejamento é o do Aeroporto de Heathrow, em Londres (Figura 4). Não há via de

acesso rodoviário especial para o terminal e as vias vizinhas praticamente “ilham” o TPS, contornando-o sem oferecer fácil acesso.

Aeroporto de Los Angeles

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

Figura 3: Acesso ao Aeroporto de Heathrow

Por outro lado, o sistema ferroviário de acesso a esse aeroporto é exemplo de sucesso, pois, além de criar uma

linha de acesso direto do centro ao aeroporto, ainda integrou essa linha ao sistema de metrô já existente, o que garantiu maior abrangência. O mesmo não foi feito, por exemplo, com a linha ferroviária que liga o Aeroporto Internacional de Narita ao centro de Tókio. Porém, esse fator não prejudicou tanto sua acessibilidade pois ele está a 65 km do centro e, já no momento de projeto, buscou-se instalá-lo em um local com uma boa malha rodoviária (na Figura 5 em amarelo) e ainda foi feita uma ligação de trem direto com o centro da cidade.

Figura 4: Acesso ao Aeroporto Internacional de Narita, Tókio

O Aeroporto Internacional de Florianópolis é um exemplo nacional de graves problemas de acessibilidade.

Para melhorar o acesso, ficou pronta em 2004 a “Via Expressa Sul”, que interliga o centro da cidade ao aeroporto. Na região conhecida como “Saco dos Limões” foi aberto um túnel, depois foi feito um aterro do túnel até a Avenida Deputado Domiciano Freitas, que atravessa o manguezal do rio Tavares. Porém, essa avenida não foi duplicada, continuando com apenas duas vias (vide Figura 7). Qualquer acidente nessa via pode ocasionar sérios problemas de atraso. Ainda há o agravante de que, próximo ao aeroporto, fica o estádio da cidade: dois pólos geradores de tráfego compartilhando um único acesso (vide Figura 6).

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

Figura 5: Acesso ao Aeroporto Internacional de Florianópolis

Figura 6: Imagem da Avenida Deputado Domiciano, Florianópolis-SC

3. Pesquisa sobre preferência declarada X escolha real

Por esses casos é possível perceber a complexidade em que se apresentam os problemas de acessibilidade. Não é

possível encontrar uma solução específica e geral, mas existem soluções possíveis para casos específicos. Ou mesmo uma gama de soluções. O primeiro passo é buscar uma parceria forte e continuada com o planejamento urbano para que não ocorram problemas como os de Florianópolis, Los Angeles e Londres. Ou mesmo se inspirar na parceria entre o Aeroporto Heathrow e a companhia de metrô de Londres, que gerou uma boa solução. Também tomar cuidado com exemplos como o do Aeroporto de Zurique, que fez grande investimento em acesso ferroviário, esperando que por volta de 50 a 60% optassem por este meio. Porém, atualmente, 59% do acesso é feito por táxi ou carro particular.2

Depois do caso de Zurique, reduziu-se o otimismo em torno do acesso por meio ferroviário. Quando Heathrow criou sua via de acesso ferroviário estimou que por volta de 30% dos passageiros acessariam o aeroporto por ele. Depois de pronto, as estatísticas mostraram em torno de 20% utilizando o trem como acesso.3 O mesmo otimismo se pode ver atualmente em São Paulo com o projeto “Expresso Aeroporto”, que pretende ligar a Estação da Luz ao 2 ASHFORD, N., Stanton, H. P. M. e Moore, C. A. Airport Operations. 2a Edição, McGraw-Hill. Nova Iorque, 1997. 3 ASHFORD, N., Stanton, H. P. M. e Moore, C. A. Airport Operations. 2a Edição, McGraw-Hill. Nova Iorque, 1997.

Av. Dep. Domiciano

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

Aeroporto de Cumbica. Em pesquisa de prospecção realizada pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) avaliaram que 67% dos passageiros certamente utilizariam esse trem.4

Em outro trabalho de pesquisa da acessibilidade do Aeroporto Internacional Franco Montoro (Congonhas), 46% dos entrevistados declararam que o Trem seria sua primeira opção. Entretanto, nessa mesma entrevista foi observado que essa declaração direta poderia não representar o comportamento real dos consumidores. Foi observado que, ao se perguntar qual a ordem de opção de acesso para situações de Lazer e Trabalho, apenas 25% trocaram a ordem de preferência. Para explicar o fenômeno a pesquisadora declarou:

Outra Razão para que as escolhas tenham se mantido as mesmas nos

três blocos do experimento é a provável ocorrência de escolhas

lexicográficas em relação a um único atributo. Estes indivíduos elegem um

atributo (por exemplo, o custo) como o principal fator a ser analisado, seja

porque ele o considera realmente o mais importante entre os três atributos,

seja porque ele tem dificuldade de estabelecer trocas compensatórias entre

eles.5

Para essa pesquisa, os fatores considerados foram “tempos médios de viagem”, “custos de acesso” e

“confiabilidade do serviço”. De fato a escolha do modo de acesso não é uma escolha simples, para ser feita em segundos, como é feito no caso de uma pesquisa de opinião. Também não é uma decisão que necessite de grande reflexão, mas geralmente ela é feita em situação completamente diferente de uma pesquisa: é feita em casa, geralmente conversando-se com parentes e com muito mais calma, sendo possível pensar em mais de um atributo. E, ainda considerando fatores subjetivos e fatores que são específicos de cada situação, que podem se tornar mais importantes que os considerados.

Em um TPS, onde um atraso pode sair caro, é natural que no momento de uma tomada de decisão rápida o fator “tempo” se sobressaia. Isso pode explicar a enorme preferência dada ao modo de acesso trem, reconhecidamente um meio rápido e com baixíssima variabilidade em seu tempo de acesso. Porém, por exemplo, quando um jovem faz sua primeira viagem internacional, no momento da escolha do modo de acesso o fator subjetivo da despedida da família pode se tornar mais importante que qualquer outro fator. Portanto, devemos ter consciência que, em uma pesquisa conforme foi feita pela CPTM, é possível que haja distorção com relação à realidade.

Com esse conhecimento, a pesquisa realizada dentre os alunos (com ficha de perguntas e base de dados em anexo) buscou avaliar o nível de confiança de uma pesquisa de preferência declarada. Para isso, buscou-se avaliar a importância relativa de cada aspecto envolvido na escolha.

Tabela 1: Perfil da amostra

Idade

Média 21,3 Desv.Padrão 2,5

Sexo

Masculino 96%

Feminino 4% Número de Entrevistados 90

Mesmo sendo uma amostra viciada, com maioria de jovens do sexo masculino, foi considerada satisfatória para o

objetivo real da pesquisa: analisar a migração na escolha dos meios em diferentes situações. Os aspectos considerados foram os mesmos da pesquisa de Congonhas, com a diferença de que o aspecto

“confiabilidade do serviço” foi desmembrado em “segurança” e “conforto”. É claro que o conforto para um passageiro que está carregando uma mala pesada é de grande importância. Também é sabido que, no contexto violento do Brasil, o 4 Portal da CPTM. Disponível em <http://www.cptm.sp.gov.br/e_projetos/Aeroporto_viajantes.pdf>. Pesquisa realizada em 10 de junho de 2009. 5 ALVES, Bianca Bianchi; A importância da variabilidade do tempo de viagem no acesso terrestre a aeroportos: estudo de caso do Aeroporto Internacional André Franco Montoro. São Paulo, 2005.

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

passageiro pensa com bastante cuidado o fator “segurança”, analisando a possibilidade de furto de sua bagagem ou mesmo da carteira com documentos, o que pode impossibilitar sua viagem.

Para representar cada atributo foi buscada uma palavra que fosse entendida rapidamente pelos entrevistados. Daí eles tiveram liberdade para dar a cada atributo um peso de 1 a 4 de acordo com sua escolha. Com os dados em mãos, primeiramente os pesos atribuídos foram normalizados para que os pesos de cada um dos entrevistados somassem dez. Depois foi calculada a média e o desvio padrão desses valores. De fato podemos perceber pela Tabela 2 que o atributo com maior valor é a “rapidez”. Ou seja, deve se ressaltar em uma pesquisa de opinião o meio considerado o mais rápido.

Tabela 2: Pesos médios e desvio padrão de cada atributo avaliado

Conforto Custo

Rapidez

Segurança Total

Peso médio 1,86 2,64 2,84 2,66 10,0 Desv.Padrão 0,6 0,7 0,6 0,8

Para saber-se a opinião sobre cada meio, os entrevistados avaliaram cada meio de acesso (automóvel, ônibus, táxi e

metrô) com relação a cada atributo avaliado.

Figura 7: Avaliação de aspectos de cada modo de acesso

Foi aproximadamente o mesmo grupo que não soube opinar sobre o metrô nos quatro atributos, revelando que há

um grupo que ainda não conhece bem esse modo de acesso. Também é possível perceber que o metrô apresenta vantagem no tempo de viagem com relação aos demais (considerando apenas os que souberam opinar), porém não apresenta grande vantagem com relação ao automóvel e ao táxi.

Também pode-se perceber, pelas diversas situações, que há fatores que podem intensificar a busca pelo metrô. Observando a Figura 8, podemos ver que o item em que o metrô teve pior avaliação foi o conforto. Seria interessante o administrador aeroportuário buscar os fatores que causam desconforto a seus clientes e encaminhar proposta de melhoria ao metrô. Ou ainda, como também é sugerido no trabalho sobre o aeroporto de Congonhas, buscar uma maior integração entre o aeroporto e metrô. O trabalho ressalta o aspecto afetivo da despedida para viagens aéreas internacionais e sugere que o terminal de metrô se torne o próprio local da despedida. Para o caso do Cumbica, pode-se fazer com que, ao entrar na área do expresso, o passageiro já se sinta como que entrando na sala de embarque. Para isso, pode-se trabalhar para que a identidade visual e o ambiente do expresso sejam os mesmos do aeroporto. Ainda podem-se instalar balcões de check-in já no expresso para se eliminar o desconforto de se carregar a bagagem dentro do trem.

Da mesma forma que nas pesquisas estudadas, foi questionada qual a preferência dos entrevistados em uma situação ideal, ou seja, tendo disponíveis os meios de acesso automóvel, ônibus, táxi e metrô. Depois, ainda foram apresentadas quatro situações reais comuns (na Tabela 3) para se observar as migrações. Buscou-se através do texto da

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

questão apresentar bem a situação (com o máximo de imparcialidade) para dar tempo de o entrevistado observar as nuances envolvidas na escolha e poder avaliar melhor. Também foi indagado qual o meio de acesso utilizado na última viagem.

Tabela 3: Situações apresentadas na pesquisa

Situação Ideal

Em uma situação ideal, saindo de sua casa ao aeroporto para uma viagem, com os seguintes meios disponíveis, qual escolheria?

Situação 1

Para realizar sua primeira viagem internacional sozinho, no translado de sua casa até o aeroporto, qual meio escolheria?

Situação 2

Na mesma situação, voltando das férias para o ITA, no translado de sua casa até o aeroporto e sabendo que o preço do estacionamento no

aeroporto está muito elevado, qual meio escolheria?

Situação 3

Saindo de sua casa com amigos em direção ao aeroporto para viagem por um jogo da Copa de 2014 (no Brasil), qual meio escolheria?

Situação 4

Sabendo que não há terminal de metrô dentro do aeroporto (ou seja, ainda haveria um trecho de caminhada), qual meio escolheria?

Situação Real Nessa última viagem, qual meio utilizou? De fato foi observado que há bastante variação com relação à situação ideal, sendo que apenas sete

entrevistados mantiveram a mesma resposta nas quatro situações e, desses, apenas dois mantiveram coerência de escolha com relação à situação real.

Figura 8: Utilização de meios declarada para diversas situações

Na situação real houve pessoas que declaram ter ido a pé ou então se utilizando de dois meios. Estes foram

computados em “outros”. Também foi introduzida a preferência de acesso declarada pelos passageiros de Congonhas6 (na Figura 9, coluna Cong.) para comparação. É importante ressaltar que muitos alunos do ITA na volta das férias utilizam sempre algum dos aeroportos de São Paulo (Congonhas ou Cumbica). É interessante observar que, apesar de a pesquisa ter sido realizada com um público viciado (maioria jovem e do sexo masculino) apresentaram uma preferência 6 ALVES, Bianca Bianchi; Op. Cit.

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

declarada bem próxima à da pesquisa realizada em Congonhas, o que indica algum possível grau de homogeneidade na ação dos clientes dos aeroportos de São Paulo.

Outro fato importante é que procura pelo metrô reduz muito na situação 4, quando não há integração entre o terminal ferroviário e o aeroportuário. Isso mostra o quanto o simples detalhe da integração poderia impactar na decisão do passageiro. Ainda mais curiosa é a redução da procura do metrô na situação real. Porém, isso pode ser explicado por um fator limitante: a disponibilidade do meio. A Figura 10 apresenta a porcentagem dos entrevistados que tinham cada um dos meios disponíveis em sua última viagem.

Temos como resultado positivo da pesquisa para o metrô que, na situação 3 (típica durante os jogos da Copa), a procura por este transporte se intensificou com relação à situação ideal. Ou seja, o investimento nas linhas de metrô trará benefícios de conforto para o evento.

Figura 9: Disponibilidade de cada meio de transporte (em %)

Podemos ver pela Figura 11 que o número de pessoas que mantiveram sua escolha na situação real é baixo para

todos os quatro meios. Esta fuga poderia ser explicada pela disponibilidade, mas, se isso realmente fosse verdadeiro, por volta de 88% (índice de disponibilidade do táxi) dos que declararam preferência pelo táxi deveriam ter usado esse meio ou então 11% deveria ter utilizado o metrô. Podemos ver que não há uma relação direta entre a preferência declarada (aliada à disponibilidade de um meio) e seu uso, o que indica que a declaração direta de preferência não dá boa previsão da real utilização do meio.

Figura 10: Preferência declarada versus situação real

Anais do XV ENCITA 2009, ITA, Outubro, 19-22, 2009

,

4. Conclusões Os aeroportos são a interface entre modalidades de transporte terrestre e transporte aéreo. Estudar e planejar as

formas efetivas de acesso é imprescindível para permitir um bom relacionamento urbano. A partir da análise de dados e casos particulares, como os aeroportos de Hong Kong, Confins, Londres, Los Angeles e Tóquio, pudemos ver claramente a importância de planejar o acesso ao aeroporto juntamente com o planejamento do terminal. Também foi possível observar a complexidade envolvida na busca de uma solução de acessibilidade. Assim, planejar um aeroporto envolve muito mais que uma ação regional, e sim, uma grande intervenção urbana. Essa pesquisa revela um pouco da variedade dos problemas envolvendo o acesso, coloca luz sobre a análise dos dados de pesquisa de opinião e sugere algumas medidas a serem tomadas no momento do planejamento da solução de acessibilidade.

A acessibilidade de um aeroporto é uma questão muito importante, mas também muito específica a cada aeroporto. Uma simples pesquisa de opinião pode gerar resultados distorcidos e atrapalhar na solução a ser buscada. Por isso, é importante tomar cuidado com previsões de comportamento de acesso dadas por pesquisa de opinião, conforme foi mostrado neste trabalho.

Ainda há questões geográficas e urbanísticas envolvidas na busca de uma solução. Não há uma panacéia que vai acabar com os problemas de acessibilidade para qualquer aeroporto, como já se pensou que ocorreria com o metrô. O recomendado é que os administradores aeroportuários se envolvam mais com as questões de acessibilidade e busquem a melhor solução para seu aeroporto propriamente. A melhor solução não é o melhor modo de acesso e sim a busca por uma maior diversidade de acesso com maior qualidade. Para atingir essa meta é importante um estudo minucioso do aeroporto, suas vias de acesso, o perfil de seus passageiros e dos meios disponíveis e/ou pretendidos. Se possível, com a mesma agudez de análise do estudo realizado sobre Congonhas citado neste trabalho. Caso haja dificuldades para se realizar uma pesquisa de opinião com os passageiros, uma pesquisa usando um mailing list de clientes do aeroporto pode fornecer um resultado razoável, caso atinja um bom número de resposta.

O acesso não está sob domínio direto do aeroporto, mas é de seu interesse. O grande desafio a ser enfrentado é o processo de negociação com os diversos atores evolvidos para serem colocadas em prática as melhores decisões. Porém, essa dura tarefa cabe apenas ao engajamento do administrador aeroportuário.

5. Agradecimentos Agradeço primeiramente a todos meus os mestres pelos quais eu passei e que ajudaram a abrir caminho até aqui.

Em especial agradeço ao profesor Cláudio Jorge, que me orientou neste trabalho e sempre se apresentou disponível, empolgado e compreensivo. Também à professora Giovanna Ronzani, pelas conversas e material de estudo oferecidos.

Muito obrigado ainda ao CNPq pela oportunidade e apoio para realização deste projeto de Iniciação Científica e a tantos outros projetos que só aperfeiçoam o saber científico e as pessoas em nosso país.

6. Referências ALVES, Bianca Bianchi; A importância da variabilidade do tempo de viagem no acesso terrestre a aeroportos:

estudo de caso do Aeroporto Internacional André Franco Montoro. São Paulo, 2005 ASHFORD, N., Stanton, H. P. M. e Moore, C. A. Airport Operations. 2a Edição, McGraw-Hill. Nova Iorque, 1997. BRAGA, A. F. ; Nassi, C. D. ; Silva, F. S. P. ; Lins, F. J. P. ; Aguiar, H. P. . Adaptação gráfica de uma base

cartográfica voltada para os problemas de transportes. In: Primeira Semana Estadual de Geoprocessamento, 1996, Rio de Janerio. Primeira Semana Estadual de Geoprocessamento, 1996.

MARTINS, Jorge A. ; BODMER, Milena ; PORTO, D. R. M. . A gestão da mobilidade para um pólo gerador de tráfego. In: PANAMXII - Congresso Panamericano de Eng. de Transporte, 2002, Quito, 2002.

GUEDES, E. P. ; BRAGA, A. F. . PROPOSTA DE CÁLCULO DA ACESSIBILIDADE EM AEROPORTOS COM O USO DE SISTEMAS DE INFORMAÇÕES GEOGRÁFICAS. In: XXII ANPET, 2008.

Portal da CPTM. Disponível em <http://www.cptm.sp.gov.br/e_projetos/Aeroporto_viajantes.pdf>. Pesquisa realizada em 10 de junho de 2009.