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ESTUDOS DE CASO EM ENGENHARIA E GESTÃO INDUSTRIAL Coordenação João C. Oliveira Matias Susana Garrido Azevedo 2014

Estudos de Caso em Engenharia e Gestão Industrial · engenharia e gestão industrial, nomeadamente as atividades de conceção de processos, planeamento industrial, organização

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ESTUDOS DE CASO EM ENGENHARIA E GESTÃO

INDUSTRIAL

Coordenação

João C. Oliveira Matias

Susana Garrido Azevedo

2014

2

EDIÇÃO, DISTRIBUIÇÃO E VENDAS

SÍLABAS & DESAFIOS - UNIPESSOAL LDA.

NIF: 510212891

www.silabas-e-desafios.pt

[email protected]

Sede:

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Fax: 289805399

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TÍTULO

ESTUDOS DE CASO EM ENGENHARIA E GESTÃO INDUSTRIAL

COORDENADORES

Prof. Doutor João C. Oliveira Matias, Prof. Doutora Susana Garrido

Azevedo

1ª edição

300 Exemplares

Copyright @ Outubro 2014

Sílabas & Desafios, Unipessoal Lda.

ISBN: 978-989-99114-2-0

Depósito legal:

Pré-edição, edição, composição gráfica e revisão: Sílabas & Desafios Unipessoal, Lda.

Pré-impressão, impressão e acabamentos: Gráfica Comercial, Loulé

Capa: Joana Guita Pinto; http://www.ladybug-ctrlc.com/

Reservados todos os direitos. Reprodução proibida. A utilização de todo, ou partes,

do texto, figuras, quadros, ilustrações e gráficos, deverá ter a autorização expressa

do autor.

3

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 7 A Engenharia e Gestão Industrial 8 Estudos de Caso em Engenharia e Gestão Industrial 9

CASO 1 PROPOSTA DE DESENVOLVIMENTO DE UM ÍNDICE LEAN EM CONTEXTOS ORGANIZACIONAIS 13

1.1 INTRODUÇÃO 14 1.2 METODOLOGIA 16

1.2.1. Definição das áreas a avaliar 16 1.2.2. Definição dos indicadores 22 1.2.3. Determinação dos pesos 28

1.3 ESTUDO DE CASO 30 1.3.1. Introdução 30 1.3.2. Metodologia 30 1.3.3. Caracterização da amostra 32 1.3.4. Apresentação e análise dos resultados 34

1.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 41 NOTAS BIOGRÁFICAS 42

CASO 2 DESENVOLVIMENTO DE UMA FERRAMENTA DE SUPORTE À IMPLEMENTAÇÃO DO LEAN MANUFACTURING EM AMBIENTES DE PRODUÇÃO INTERMITENTES 45

2.1 INTRODUÇÃO 46 2.2 TIPOLOGIAS DE PRODUÇÃO 48 2.3 LEAN MANUFACTURING 49

2.3.1 Estado da arte – Lean Manufacturing em processos produtivos 54 2.4 PROPOSTA DE UMA FERRAMENTA DE SUPORTE À APLICAÇÃO DO LEAN MANUFACTURING EM AMBIENTES PRODUTIVOS INTERMITENTES 56

2.4.1 ETAPA 1 - Análise dos produtos 57 2.4.2 ETAPA 2 - Análise do estado atual 59 2.4.3 ETAPA 3 - Meios a aplicar 62 2.4.4 ETAPA 4 - Estado futuro 63 2.4.5 ETAPA 5 - Aplicar estado futuro 64

2.5 ESTUDO DE CASO 64 2.5.1 Práticas Lean na empresa 66

2.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 75 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 77 NOTAS BIOGRÁFICAS 78

4

CASO 3 CONTROLO ESTATÍSTICO DO PROCESSO: UM ESTUDO DE CASO NUMA EMPRESA NA ÁREA DA INDÚSTRIA AUTOMÓVEL 81

3.1 INTRODUÇÃO 82 3.2 METODOLOGIA 86 3.3 A UNIDADE INDUSTRIAL E O PROCESSO 86

3.3.1 O Processo 88 3.3.2 A medição e a recolha de dados 92 3.3.3 As cartas de controlo 93 3.3.4 Os resultados obtidos para a carta (𝐱, 𝐑) 100 3.3.5 Os resultados obtidos para a carta p 103

3.4 INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS 105 3.4.1 Análise dos resultados obtidos para a carta (𝒙, 𝑹) 105 3.4.2 Análise dos resultados obtidos para a carta p 109

3.5 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES GERAIS 110 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 111 NOTAS BIOGRÁFICAS: 114

CASO 4 INTEGRAÇÃO DOS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO NO PROCESSO PRODUTIVO: ESTUDO DE CASO 117

4.1 INTRODUÇÃO 117 4.2 ERP’s 119

4.2.1 Características de implementação de um sistema ERP 122 4.3 INTEGRAÇÃO DE UM ERP NA PRODUÇÃO 123

4.3.1 Considerações 124 4.3.2 Funcionalidades implementadas 124 4.3.3 Processos produtivos 130 5.3.4 Dificuldades encontradas no desenvolvimento e na implementação 137 4.3.4 Melhorias obtidas com a implementação 140

4.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES 141 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 144 NOTAS BIOGRÁFICAS 145

CASO 5 AVALIAÇÃO DE RISCOS PROFISSIONAIS - ESTUDO DE CASO NUMA INDÚSTRIA TÊXTIL 147

5.1 INTRODUÇÃO 148 5.2 METODOLOGIA 150

5.2.1 Avaliação de riscos 150 5.2.2 Planos de ações corretivas 157

5.3 ESTUDO DE CASO 159 5.3.1 Descrição do processo produtivo 159 5.3.2 Análise de sinistralidade 161 5.3.3 Análise por secção/setor/posto de trabalho dos índices de sinistralidade laboral (IF, IG e IAG) 165

5

5.3.4 Caracterização das situações de trabalho 166 5.4 ANÁLISE DA AVALIAÇÃO DE RISCOS 175 5.5 ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DE HIGIENE E SEGURANÇA NO TRABALHO IDENTIFICADAS NA EMPRESA 176

5.5.1 Iluminação 176 5.5.2 Agentes químicos 180 5.5.3 Poeiras 182 5.5.4 Incêndio 184 5.5.5 Condições de temperatura e humidade 186 5.5.6 Ruído 188

5.6 CONCLUSÃO/TRABALHO FUTURO 192 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 194 NOTAS BIOGRÁFICAS 195

CASO 6 IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA HACCP NUMA PANIFICADORA 197 6.1 INTRODUÇÃO 197 6.2 METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO 200 6.3 CASO PRÁTICO 203

6.3.1 Equipa HACCP 203 6.3.2 Descrição do produto e do uso pretendido 204 6.3.3 Descrição do processo produtivo 204 6.3.4 Análise de perigos e identificação de PCC’s e PPRO 206 6.3.5 Análise de resultados 215

6.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 216 REFERÊNCIAS 217 NOTAS BIOGRÁFICAS 218

CASO 7 VISÃO ESTRATÉGICA DA MANUTENÇÃO NUMA EMPRESA DE ABASTECIMENTO DE ÁGUAS PÚBLICAS 219

7.1 INTRODUÇÃO 220 7.2 METODOLOGIA 224 7.3 ESTUDO DE CASO 225

7.3.1 Organização do setor de manutenção 226 7.3.2 Planeamento da manutenção 226 7.3.3 Organização e estrutura das políticas de manutenção 228 7.3.4 Prioridades na atividade da manutenção 235 7.3.5 Processos e equipamentos instalados em ETA 236

7.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 246 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 251 NOTAS BIOGRÁFICAS 252

CASO 8 CAUSAS DE PARAGENS NA INDÚSTRIA DE MOLDES: ESTUDO DE CASO 255

8.1 INTRODUÇÃO 256

6

8.2 METODOLOGIA 256 8.2.1 Esboço da investigação 257 8.2.2 Estudo de caso – justificação 259 8.2.3 Metodologia de recolha de dados 260

8.3 ESTUDO DE CASO 261 8.3.1 Introdução 261 8.3.2 Apresentação da empresa 262 8.3.3 O Produto – molde e componentes 263 8.3.4 Levantamento de dados 273

8.4 ANÁLISE DE DADOS 286 8.4.1 Análise de dados na bancada 286 8.4.2 Análise de dados na maquinação CNC 293

8.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 297 Principal causa de paragem durante a produção de moldes 297 Onde acontece a principal causa de paragem durante produção de moldes, ou seja onde se encontra o “Gargalo” 297 É possível minimizar as paragens durante a produção do molde 298 Otimizar as paragens durante produção do molde 298

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 299 NOTAS BIOGRÁFICAS 299

7

INTRODUÇÃO A adesão à União Europeia por parte de Portugal influenciou claramente as

condições de competitividade da oferta empresarial portuguesa, em geral, e

da indústria portuguesa, em particular, tendo em conta um mercado

europeu alargado, numa primeira fase, e posteriormente com a entrada de

novos concorrentes exteriores à europa nos mercados europeus. Para

complicar o défice comercial, não bastou uma redução das exportações

industriais, como também um aumento das importações.

Nos últimos anos, face aos constrangimentos conhecidos, o tecido

empresarial “meteu mãos” à obra para sobreviver num mercado

completamente global, apesar de as políticas serem mais ou menos locais. O

estado Português, em linha com os programas de financiamento europeus,

criou diversos mecanismos de apoio.

Segundo dados do Fórum Económico Mundial, recentemente divulgados em

Setembro de 2014, Portugal subiu 15 lugares no ranking anual de

competitividade, ocupando o 36º lugar em 144 países. No entanto, o nosso

país tem uma presença muito vulnerável no mercado global, em virtude da

forte concorrência das economias emergentes, em grande

desenvolvimento. Daí que os desafios sejam enormes.

Por consequência, é preciso que a nossa atividade empresarial esteja virada

para a internacionalização, e seja alicerçada em elevados padrões de

produtividade, relevando todos os seus fatores condicionantes, tais como

equipamentos, tecnologia, energia, organização e recursos humanos.

Quando falamos em produtividade falamos em competitividade sistémica,

que depende de diversos fatores, não devendo ser explicada isoladamente.

Para tal, não contribuirão apenas as grandes empresas, alguma delas já bem

colocadas na cadeia de abastecimento, mas também as PME’s. Daí que,

independentemente do seu tamanho, as empresas em geral, e as industriais

em particular, devem continuar a investir na inovação, seja ela

organizacional, de processo, de produto, ou até de marketing. Isso passa

Introdução

8

obviamente pela melhoria dos seus processos produtivos e aquisição das

competências que necessitam.

A Engenharia e Gestão Industrial

A ação da Engenharia e Gestão Industrial (EGI) é, cada vez mais, reconhecida

como constituindo um fator fundamental para a sustentabilidade da

sociedade, em geral, e das empresas em particular, tendo em conta que

assenta os seus pressupostos na gestão eficiente de recursos, i.e., tem por

base a análise, o projeto, o desempenho e o controlo de sistemas integrados

de processos, pessoas, materiais, equipamentos e energia.

Em termos gerais, e no nosso contexto educativo e empresarial, os cursos

de mestrado em Engenharia e Gestão Industrial têm por objetivos

educacionais desenvolver nos alunos competências tais como: adquirir

saber para gerir pessoas, equipamentos e bens, normalmente em ambientes

de escassez, procurando a otimização dos recursos e aumentos de

produtividade; estabelecer uma integração entre os conhecimentos

científicos, tecnológicos e de gestão; desenvolver competências multi, inter

e transdisciplinares que suportem a função do especialista na área da

engenharia e gestão industrial, nomeadamente as atividades de conceção

de processos, planeamento industrial, organização do trabalho, gestão de

recursos, gestão de sistemas, entre outras, por forma a mudar o modo de

agir das organizações; desenvolver competências para desempenhar uma

gama alargada de funções técnicas de engenharia e de gestão no que

concerne às atividades económico-financeiras; desenvolver aptidões com

vista ao trabalho em equipa e coordenação de equipas multi e

interdisciplinares; desenvolver competências para incorporar as mais

recentes inovações tecnológicas e novas metodologias de gestão no

desempenho das tarefas profissionais; estimular o espírito empreendedor e

auto-motivador para a criação de novas empresas, entre outras.

Face ao exposto, observa-se claramente o papel da Engenharia e Gestão

Industrial na melhoria da produtividade do nosso tecido empresarial, não

apenas nas grandes empresas mas também nas PME’s, cuja estratégia

Introdução

9

assenta na internacionalização, relevando todos os seus fatores

condicionantes da competitividade. Tal como foi referido atrás, quando

falamos em produtividade falamos em competitividade sistémica, que

depende de diversos fatores.

Estudos de Caso em Engenharia e Gestão Industrial

Este livro pretende ser um manual de referência, tanto para profissionais da

área da Engenharia e Gestão Industrial como para académicos que lecionam

nestas áreas e mesmo alunos de pós-graduações que investigam nesta área

específica e afins. Assim sendo, em termos metodológicos optou-se por uma

abordagem mais qualitativa, assente em estudos de caso que ilustrem

muitas das ferramentas e metodologias da área da Engenharia e Gestão

Industrial, usadas em contextos empresariais.

Um estudo de investigação subentende um processo lógico e um conjunto

de ferramentas que permitam atingir os objetivos que os mesmos

pretendem alcançar. Dentro dessas metodologias, existe a metodologia

quantitativa e a metodologia qualitativa. Estas metodologias devem estar de

acordo com diferentes pressupostos que sustentam uma investigação.

A abordagem quantitativa é baseada na observação de factos, de

acontecimentos e de fenómenos objetivos e comporta um processo

sistemático de recolha de dados observáveis e mensuráveis, sendo a

objetividade, o controlo e a generalização características desta metodologia.

Normalmente, neste tipo de metodologia, são definidas as variáveis de

forma operacional, recolhendo-se metodicamente dados variáveis junto dos

participantes, sendo posteriormente analisados com recurso a técnicas

estatísticas.

Por sua vez, a abordagem qualitativa faz uso do raciocínio indutivo e tem

como finalidade chegar a uma compreensão alargada dos factos. É feita uma

observação, com posterior descrição, interpretação dos factos tais como se

apresentam, sem realizar medições nem controlos. Digamos que o objetivo

é descrever o que é observado e contribuir para a sua otimização. Note-se

que deve ser garantido que os dados e os pontos de vista recolhidos

Introdução

10

refletem a realidade em estudo e não uma distorção influenciada pelo

ponto de vista do investigador.

O estudo de caso é um dos métodos mais comuns na investigação

qualitativa. Este consiste num exame detalhado de uma situação ou

acontecimento. Existem distintas modalidades de estudo de casos, podendo

ser diferenciadas pelas características e procedimentos que adotam para a

sua pesquisa. Contudo, todas elas constituem uma metodologia válida, dado

que propiciam descrições da realidade que se pretende estudar.

Espera-se através deste livro realçar a importância da investigação aplicada

em EGI, que através da aplicação dos conhecimentos teóricos, baseados no

pensamento construtivo, se apresentam como soluções técnicas e

economicamente viáveis.

Assim, o caso 1 propõe o desenvolvimento de um índice Lean para aferir o

nível de proximidade do sistema de gestão de qualquer organização ao

sistema Lean. Com base em critérios previamente definidos, pretende-se

avaliar se a filosofia Lean é a mais adequada para que uma determinada

organização alcance os seus objetivos estratégicos. Ainda dentro da

temática Lean, o caso 2 desenvolve uma metodologia que reúne e organiza

ferramentas como o Value Stream Mapping, diagrama de esparguete ou até

a análise de Pareto.

Por sua vez, o caso 3 apresenta um estudo de caso numa indústria

automóvel, onde a qualidade é melhorada através da aplicação do Controlo

Estatístico do Processo, demonstrando-se as vantagens associadas à sua

utilização, como forma de melhoria de qualidade e redução de desperdícios.

Para o efeito, foi estudada a metodologia do CEP nesse mesmo processo,

adaptada à realidade da empresa, após ter sido efetuada a recolha de

amostras e as interpretações das cartas de controlo.

Segue-se no caso 4 a implementação de um ERP – Enterprise Resource

Planning num processo produtivo e as consequentes alterações e ou adap-

tações daí decorrentes. Esta implementação difere dos padrões normais de

uma implementação vertical, uma vez que a sua aplicação não foi direta.

Introdução

11

Posteriormente, o caso 5 apresenta uma Avaliação de Riscos Profissionais

numa empresa têxtil, focando-se na análise das condições de trabalho e de

segurança da empresa. Ainda dentro da segurança, mas no caso concreto da

alimentar, o caso 6 fornece dados técnicos relativos ao desenvolvimento e

implementação do sistema Hazard Analysis and Critical Control Point

(HACCP) numa panificadora.

Dada a importância da manutenção na eficiência de uma empresa, o caso 7

demonstra a influência do setor e da atividade de manutenção numa

Empresa que se dedica ao tratamento e abastecimento de águas públicas,

para que esta consiga garantir o abastecimento de água em quantidade e

qualidade à população servida, dentro do serviço público a que se destina.

Por último, o caso 8 apresenta o Diagnóstico das Causas de Paragem

durante a produção do molde numa Empresa de Moldes, para que, desta

forma, seja possível melhorar o tempo da sua produção, bem como a

diminuição de paragens nesse processo.

Introdução

12

13

CASO 1 PROPOSTA DE DESENVOLVIMENTO DE UM

ÍNDICE LEAN EM CONTEXTOS ORGANIZACIONAIS

Maria Madalena Faria Carvalhosa

[email protected]

Universidade da Beira Interior

Susana Garrido Azevedo

[email protected]

Universidade da Beira Interior

Fernando Santos

[email protected]

Universidade da Beira Interior

Resumo: O objetivo deste estudo de caso é propor o desenvolvimento de um índice Lean para aferir o

nível de proximidade do sistema de gestão de qualquer organização ao sistema Lean. Com base

em critérios previamente definidos, pretende-se avaliar se a filosofia Lean é a mais adequada

para que uma determinada organização alcance os seus objetivos estratégicos.

Este trabalho utiliza como procedimentos técnicos a pesquisa bibliográfica e o estudo de caso. A

revisão de literatura é levada a cabo com o intuito de identificar os aspetos considerados como

os mais caracterizadores do pensamento Lean e os que mais influenciam o seu progresso e

sucesso.

Desenvolve-se um índice Lean composto por noventa indicadores distribuídos por oito áreas as

quais foram criteriosamente selecionadas, agrupadas e pontuadas por forma a assegurar uma

relação fiável entre o índice obtido e o nível Lean efetivo das organizações avaliadas. O índice

Lean foi testado e validado através de um estudo de caso realizado em quatro empresas do

setor automóvel localizadas em Portugal.

Concluiu-se que o índice Lean, desenvolvido neste trabalho, pode ser utilizado por qualquer

organização e permite avaliar, quer o número, quer o nível de implementação de uma ampla

gama de princípios, práticas e indicadores Lean. Constata-se que a cultura organizacional, os

processos de melhoria contínua e a relação com os clientes são as três áreas em que, as

organizações avaliadas, mais se aproximam do pensamento Lean. Verifica-se a existência de

uma relação direta entre o índice Lean e o índice da área dos indicadores de desempenho,

demostrando-se a importância desta área para o desenvolvimento de índices Lean por forma a

Caso 1 Proposta de desenvolvimento de um índice Lean em contextos organizacionais

14

atestar a sua eficácia. Fundamenta-se ainda que o índice Lean pode constituir uma importante

ferramenta de suporte no processo de tomada de decisão relativo à adoção da filosofia Lean

como programa para a obtenção de vantagens competitivas e sustentáveis.

Palavras-chave: Cultura organizacional, Estudo de caso, Índice Lean, Pensamento Lean.

1.1 INTRODUÇÃO

Apesar de, após a II Guerra Mundial, a Toyota estar muito atrás dos

construtores americanos de automóveis, conseguiu crescer e tornar-se não

somente a maior construtora de automóveis do mundo mas também a mais

rentável. Este facto levou muitos investigadores a estudarem o seu sistema

de produção para conseguirem alcançar a sua atual posição no mercado

(Jimmerson, 2010). Este sistema de produção foi “batizado” de Lean em

1988 pelo investigador Krafcik do IMVP (International Motor Vehicle

Program) e popularizado posteriormente em 1990 pelos investigadores

Womack, Jones e Roos através da obra The machine that changed the world

(Shetty et al., 2010).

O sucesso da Toyota inspirou também milhares de organizações industriais,

de serviços e governamentais a adotarem o pensamento Lean com vista a

adquirir a flexibilidade necessária para alcançar novos desafios

competitivos. O foco do Lean está no cliente e na cadeia de valor.

Caracteriza-se pela perseguição da perfeição por meio da constante

eliminação de desperdício, melhoria contínua e promoção da inovação

(Shetty et al., 2010). Os investigadores Liker e Rother (2011) afirmam

estarem certos que uma organização que se dedique verdadeiramente em

tornar-se Lean está no caminho em direção à excelência.

Contudo, um amplo inquérito efetuado em 2007 pela Industry week

concluiu que apenas 2% das empresas que implementaram programas Lean

alcançaram os resultados inicialmente previstos. O comité Shingo Prize, que

atribui prémios de excelência em Lean, constatou também que muitas

organizações, que tinham ganho o prémio, não conseguiram sustentar o

Caso 1 Proposta de desenvolvimento de um índice Lean em

contextos organizacionais

15

seu progresso (Liker e Rother, 2011). No mesmo ano um outro inquérito

levado a cabo pelo Lean Enterprise Institute apurou que a resistência dos

gestores à mudança (36,1%), a falta de know-how (31%) e a resistência dos

colaboradores (27,7%) foram considerados os três principais obstáculos à

implementação do Lean (Marchwinski, 2007).

Esta pesquisa foi motivada pela necessidade de averiguar o paradoxo

constatado atualmente entre a enorme popularidade do pensamento Lean

e o elevado índice de insucesso da sua implementação como programa e

metodologia para o progresso.

Muitos gestores, na expectativa de resolverem os seus problemas de

competitividade, tentam aderir à filosofia Lean impulsivamente, muitas

vezes sem planeamento e conhecimento da realidade das suas próprias

empresas. Embarcam cegamente na viagem sem avaliarem previamente se

o Lean é o programa mais adequado às características e objetivos das

organizações que lideram.

A grande maioria das pesquisas disponíveis na literatura aborda o desen-

volvimento de métodos para medir o índice Lean de organizações que já

iniciaram a jornada Lean. Estão vocacionadas para avaliar o progresso do

processo de implementação, aferindo se e os princípios e práticas Lean

estão a ser implementados corretamente e qual o respetivo índice de ado-

ção e desempenho. Não dão resposta às organizações que têm outros sis-

temas de gestão e que pretendem avaliar previamente se, tendo em consi-

deração as suas especificidades, enveredar pelo Lean é a opção estratégica

mais acertada. A presente pesquisa pretende contribuir para o preenchi-

mento desta lacuna, apresentando uma proposta de desenvolvimento de

um índice Lean que possa ser utilizado por qualquer organização inde-

pendentemente do seu sistema de gestão. Justifica-se pela necessidade

de estabelecer critérios para a avaliação do grau de ajustamento de uma

organização ao sistema Lean e se este é o mais adequado para garantir os

desejados progressos sustentáveis e a competitividade.

Caso 1 Proposta de desenvolvimento de um índice Lean em contextos organizacionais

16

1.2 METODOLOGIA

O método utilizado é do tipo teórico conceptual, em que se realiza uma

pesquisa bibliográfica entre os mais referenciados autores e métodos de

avaliação do índice Lean, com o objetivo de identificar os princípios, práticas

e indicadores consensualmente considerados como essenciais e

caracterizadores de uma organização Lean.

O presente trabalho foi desenvolvido de acordo com as seguintes etapas:

1. Escolha do tema e definição dos objetivos;

2. Revisão de literatura;

3. Construção do índice Lean:

4. Definição das áreas das organizações a avaliar; definição dos

indicadores por área;

5. Determinação dos pesos; desenvolvimento dos questionários para as

entrevistas;

6. Validação dos indicadores e questionários junto de académicos

especialistas no Lean;

7. Definição da amostra para o estudo de caso;

8. Realização de um estudo de caso para ilustrar a aplicação do método;

9. Compilação dos dados recolhidos;

10. Apresentação e análise dos resultados obtidos.

A Figura 1.1 apresenta esquematicamente o delineamento da pesquisa.

1.2.1. Definição das áreas a avaliar

Os princípios e práticas Lean não devem ficar restritos ao sistema de

produção, sendo essencial que sejam disseminados por todas as áreas da

organização, tais como vendas, compras, contabilidade, logística, recursos

humanos e desenvolvimento do produto (Saurin e Ferreira, 2008). Uma

empresa Lean é definida como uma organização que usa os princípios e os

conceitos Lean em tudo o que faz (Doolen et. Hacker, 2005). A

Caso 1 Proposta de desenvolvimento de um índice Lean em

contextos organizacionais

17

implementação do Lean implica uma revolução pois trata-se da alteração de

todo o negócio (Melton, 2005).

Figura 1.1. Etapas da pesquisa

De acordo com Ferreira (1988), um sistema é o conjunto de partes

coordenadas entre si e que concorrem para um resultado de interesse

comum. É imprescindível ter uma visão e uma interpretação sistémica da

filosofia Lean. Segundo Ghinato (1996) e Picchi (2003), as implementações

Lean bem-sucedidas devem-se mais às sinergias entre os diversos

elementos do que ao somatório das contribuições isoladas de cada um.

Womack e Jones (2003) recomendam que os gestores e executivos, antes

de iniciarem a transformação Lean, devem pensar sobre três questões

fundamentais que devem nortear a transformação de toda a organização:

i. Propósito: Que problema dos clientes a organização irá resolver para

alcançar o seu próprio propósito de prosperar?

Definição de objetivos

Revisão da literatura

Construção do Índice Lean

Validação dos indicadores

Definição da amostra

Estudo de caso

Compilação dos dados recolhidos

Apresentação dos resultados

Análise dos resultados

Caso 1 Proposta de desenvolvimento de um índice Lean em contextos organizacionais

18

ii. Processo: Como é que a organização irá avaliar cada fluxo de valor para

ter a certeza que cada passo é imprescindível, capaz, disponível,

adequado, flexível e que todas as etapas estão ligadas por um fluxo

puxado e nivelado?

iii. Pessoas: Como é que a organização poderá garantir que cada processo

importante tem alguém responsável por avaliar continuamente o fluxo

de valor em termos do objetivo comercial e do processo Lean? Como é

que todos os que estão ligados ao fluxo de valor serão ativamente

comprometidos em operá-lo corretamente e a melhora-lo

continuamente?

"Assim como um carpinteiro precisa de uma visão do que construir, a fim de

obter o pleno benefício de um martelo, os pensadores Lean precisam de

uma visão antes de pegar nas ferramentas Lean". "Pensar profundamente

sobre o propósito, processo e as pessoas é a chave para fazer isso"

(Womack e Jones, 2003).

A implementação de uma cultura Lean não é a mera implementação de um

conjunto de ferramentas operacionais. É um processo complexo de

mudança cultural que requer o compromisso absoluto da liderança e uma

visão consistente a longo prazo. A cultura Lean tem que ser interiorizada por

todos os níveis da organização (Rentes et al., 2009). Os gestores e líderes de

topo, para além de terem que demonstrar o seu compromisso, devem

também trabalhar para criar interesse na implementação e comunicar a

mudança a todos dentro da organização (Rentes et al., 2009).

Para o presidente da Toyota Gary Convis, citado por Larman e Vodde

(2009), o sistema da Toyota pode ser explicado resumidamente através dos

dois pilares que o suportam:

i) Melhoria contínua; ii) Respeito pelas pessoas.

A melhoria contínua frequentemente designada por Kaizen define a

abordagem básica da Toyota para gerir o negócio. Mais importante do

Caso 1 Proposta de desenvolvimento de um índice Lean em

contextos organizacionais

19

que a melhoria atual, conseguida pelo contributo individual de cada

colaborador, é a criação de uma atmosfera de aprendizagem contínua e de

um ambiente que não só aceita mas verdadeiramente abraça a mudança.

Este tipo de ambiente só pode ser criado quando há respeito pelas pessoas.

As organizações Lean respeitam e desenvolvem as pessoas através da

promoção dos seus próprios líderes que conhecem completamente o seu

trabalho, desenvolvem pessoas excecionais que seguem a filosofia da

empresa, e respeitam a rede de parceiros e fornecedores. Os gestores

fornecem a direção e o conhecimento através do treino e do ensino da

filosofia da empresa. As empresas contratam e treinam pessoas que tenham

iniciativa e participem tanto na produção como na resolução de problemas

(Lacksonen et al.,2010).

De acordo com Kennedy et al. (2007), os indicadores de desempenho ser-

vem múltiplos propósitos. Comunicam, clarificam, avaliam e fornecem uma

direção específica para as decisões. Os indicadores mostram a trajetória do

progresso de uma organização na direção às suas metas e objetivos.

Basicamente os indicadores de desempenho fornecem informação e

feedback de suporte às tomadas de decisão necessárias para atingir os

objetivos estratégicos. Portanto, é essencial alinhar os indicadores de

desempenho com a estratégia escolhida pela empresa. Muitos indicadores

de desempenho tradicionais são anti-Lean. Se por exemplo uma empresa

utiliza a taxa de utilização das máquinas como indicador, os gestores vão ter

interesse em manter as máquinas a trabalhar nem que isso leve à criação de

excesso de inventário. Esta atitude é completamente oposta aos princípios

Lean de fluxo e pull desencadeado pelas encomendas dos clientes. Para

alcançarem todo o potencial do Lean, as empresas têm que substituir os

tradicionais indicadores de desempenho por aqueles que refletem as

estratégias Lean e que motivem os colaboradores a alcança-las.

De acordo com Pinto (2010), os indicadores de desempenho fundamentais

ao Lean são:

Caso 1 Proposta de desenvolvimento de um índice Lean em contextos organizacionais

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i. Eficiência global; ii. Disponibilidade; iii. Ocupação; iv. Lead-time; v. Build to

order; vi. Tempo de ciclo e takt-time; vii. FTQ (First Time Quality); viii.

Rotação de stocks;

Na opinião de James Womack, citado por Marchwinski (2011), para obter o

comprometimento dos quadros médios no processo de transformação Lean,

as organizações têm que transformar as métricas e o comportamento de

avaliação das suas performances.

O método desenvolvido neste trabalho é uma estrutura global que integra e

sintetiza as múltiplas dimensões de uma organização. Dentro desta

estrutura, foram definidas oito áreas de impacto que são usadas como a

base para o desenvolvimento de perguntas para a pesquisa sobre a adoção

de determinados princípios, práticas e indicadores Lean. As oito áreas

incorporadas são:

i. Cultura organizacional;

ii. Gestão dos recursos humanos;

iii. Processos e controlo da produção;

iv. Processos de melhoria contínua;

v. Desenvolvimento de novos produtos;

vi. Relação com os fornecedores;

vii. Relação com os clientes;

viii. Indicadores de desempenho.

A escolha destas oito áreas foi efetuada a partir de modelos como o da roda

Gestão do Pensamento Lean (Figura 1.2.), Shingo (Figura 1.3.), e da

informação recolhida a partir de recursos conceituados anteriormente

perfilados.

A roda Gestão do Pensamento Lean foi concebida pelos primeiros

investigadores Lean para ilustrar visualmente a pensamento Lean e

constitui o primeiro protótipo concreto no desenvolvimento deste tipo de

pesquisas (Shetty et al., 2010).O modelo Shingo é baseado na abordagem da