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1 ST3 - Índios Citadinos de Altamira e Famílias Indígenas Ribeirinhas da Volta Grande do Xingu: Aspectos Demográficos, Socioeconômicos e Culturais Ana Corbisier, socióloga e Paulo Serpa, antropólogo A última parte dos estudos etnoecológicos do EIA do AHE Belo Monte foi dedicada aos indígenas “desaldeados”, ou seja, aqueles grupos indígenas moradores da cidade de Altamira e dos beiradõesda Volta Grande do Xingu. De fevereiro a agosto de 2009, uma equipe de 11 técnicos dedicou-se a levantar as condições de vida dessa população indígena. Não havia informação sobre esta população, visto que alguns setores regionais da Fundação Nacional do Índio Funai, e da Fundação Nacional de Saúde Funasa, não os reconhece como índios pelo fato de não viverem em Terras Indígenas. Mesmo o cartório do registro civil recusa a inclusão da etnia no nome dos recém nascidos. Enfim, observa-se uma situação de total invisibilidade dos indígenas citadinos e das famílias indígenas moradoras na Volta Grande do Xingu. Optou-se por reunir algumas lideranças e representações dessa população indígena, integrá-las à equipe e por meio delas, iniciar a identificação das famílias. À medida que eram localizadas, aplicavam-se questionários de caráter sócio- econômico, ao mesmo tempo em que eram entrevistados os mais velhos iniciando- se a construção da genealogia das famílias. Averiguou-se que além do movimento endógeno de recuperação cultural que motiva atualmente a população em estudo, alguns órgãos públicos, como a Defensoria Pública do Estado do Pará, apoiam os índios na busca de recuperação de sua identidade. Verificou-se que esta invisibilidade pode ser entendida também, como uma estratégia de sobrevivência e que, em lugar de constituir uma diáspora, fortaleceu a resistência cultural iniciada ainda na época da missão jesuítica Tawaquara, no século XVII. O estudo detectou 400 famílias indígenas, sendo 360 em Altamira e 40 moradoras às margens do rio Xingu, a jusante da cidade. As famílias entrevistadas pertencem a 17 etnias, sendo as mais numerosas os Xipaya, os Kuruaya e os Juruna. Todas essas etnias possuem Terras Indígenas com as quais se relacionam periodicamente. Portanto, apesar das grandes distâncias e da falta de meios de transporte mais rápidos, são estreitos os laços que mantêm entre si as várias comunidades. Essas relações inter e intra comunidades são permeadas pelos vínculos sagrados que essas etnias mantêm com o rio Xingu, com suas paisagens, cachoeiras e pedrais, onde residem e resistem as entidades mitológicas.

ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

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ST3 - Índios Citadinos de Altamira e Famílias Indígenas Ribeirinhas da Volta Grande do Xingu: Aspectos Demográficos, Socioeconômicos e Culturais Ana Corbisier, socióloga e Paulo Serpa, antropólogo

A última parte dos estudos etnoecológicos do EIA do AHE Belo Monte foi dedicada

aos indígenas “desaldeados”, ou seja, aqueles grupos indígenas moradores da

cidade de Altamira e dos “beiradões” da Volta Grande do Xingu. De fevereiro a

agosto de 2009, uma equipe de 11 técnicos dedicou-se a levantar as condições de

vida dessa população indígena.

Não havia informação sobre esta população, visto que alguns setores regionais da

Fundação Nacional do Índio – Funai, e da Fundação Nacional de Saúde – Funasa,

não os reconhece como índios pelo fato de não viverem em Terras Indígenas.

Mesmo o cartório do registro civil recusa a inclusão da etnia no nome dos recém

nascidos. Enfim, observa-se uma situação de total invisibilidade dos indígenas

citadinos e das famílias indígenas moradoras na Volta Grande do Xingu.

Optou-se por reunir algumas lideranças e representações dessa população

indígena, integrá-las à equipe e por meio delas, iniciar a identificação das famílias.

À medida que eram localizadas, aplicavam-se questionários de caráter sócio-

econômico, ao mesmo tempo em que eram entrevistados os mais velhos iniciando-

se a construção da genealogia das famílias.

Averiguou-se que além do movimento endógeno de recuperação cultural que

motiva atualmente a população em estudo, alguns órgãos públicos, como a

Defensoria Pública do Estado do Pará, apoiam os índios na busca de recuperação

de sua identidade. Verificou-se que esta invisibilidade pode ser entendida também,

como uma estratégia de sobrevivência e que, em lugar de constituir uma diáspora,

fortaleceu a resistência cultural iniciada ainda na época da missão jesuítica

Tawaquara, no século XVII.

O estudo detectou 400 famílias indígenas, sendo 360 em Altamira e 40 moradoras

às margens do rio Xingu, a jusante da cidade. As famílias entrevistadas pertencem

a 17 etnias, sendo as mais numerosas os Xipaya, os Kuruaya e os Juruna. Todas

essas etnias possuem Terras Indígenas com as quais se relacionam

periodicamente. Portanto, apesar das grandes distâncias e da falta de meios de

transporte mais rápidos, são estreitos os laços que mantêm entre si as várias

comunidades. Essas relações inter e intra comunidades são permeadas pelos

vínculos sagrados que essas etnias mantêm com o rio Xingu, com suas paisagens,

cachoeiras e pedrais, onde residem e resistem as entidades mitológicas.

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2

A segunda etapa do trabalho consistiu em inventariar os impactos que, caso seja

construída, a usina irá provocar sobre aquela população.

O objetivo desta comunicação é, portanto, trazer a público as informações sobre

essa população indígena, principalmente sobre a que vive na cidade de Altamira,

mas também, nos “beiradões” da Volta Grande do Xingu, suas condições de vida,

formas de inserção no mundo urbano, estratégias de sobrevivência e reprodução

social, demandas de políticas públicas diferenciadas a que têm direito,

reconhecimento étnico e, principalmente, o grau de interferência que a UHE Belo

Monte virá provocar caso a usina seja construída. Assim, esta comunicação vem

trazer elementos socioeconômicos e culturais, fundamentais para o debate sobre a

eficiência e eficácia dos programas de mitigação e de compensação previstos para

essa população indígena, historicamente abandonada a sua sorte e que, sem

dúvida, será o componente humano que sofrerá a maior incidência de impactos

negativos e irreversíveis caso o empreendimento seja implantado.

Pretende-se também contribuir para o debate sobre o fenômeno indígena no

espaço urbano, indicando as considerações que devem ser atendidas na

elaboração de políticas públicas específicas para esse segmento social.

Metodologia

O estudo sobre os índios citadinos de Altamira e da Volta Grande do Xingu incluiu a

busca de informações secundárias sobre o tema, além dos estudos ambientais já

realizados sobre o AHE Belo Monte. A coleta de dados primários realizou-se em

duas etapas – abril e maio de 2009 -, sendo a primeira interrompida pela enchente

que atingiu a população indígena que vive à beira dos igarapés Panelas, Altamira e

Ambé, ou próxima a eles. Durante essa campanha foi realizada reunião com os

movimentos da sociedade civil organizada e entidades indígenas e com instituições

competentes da estância municipal, estadual e federal para integrar o trabalho ao

universo local.

Foram agregados à equipe seis colaboradores indígenas locais, com experiência

nesse tipo de levantamento, o que foi essencial para o pleno desenvolvimento do

trabalho, tanto pelo conhecimento que possuem da complicada organização

espacial da cidade de Altamira, como também, e mais importante, pelo

conhecimento e amizade que mantêm com as famílias indígenas objeto da

pesquisa.

Realizou-se um censo, restando 25 famílias, identificadas, mas não localizadas,

porque na época se encontravam nas aldeias ou na zona rural. As informações

foram obtidas por meio de entrevistas semi-estruturadas, de caráter qualitativo, e da

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aplicação de um questionário e de um cadastro. Priorizou-se sempre o cônjuge

indígena, mas, na falta deste, foram entrevistados os cônjuges não índios.

1. - De Tawaquara a Altamira - Apontamentos da etnohistória do Médio Xingu

O vale do Médio Xingu, área de influência regional do AHE Belo Monte, está

localizado entre os rios Tapajós e Tocantins. Essa região da Amazônia foi ocupada

muito lentamente, devido aos cursos d‟água serem interrompidos por corredeiras, o

que torna o rio Xingu e seus tributários um dos rios brasileiros mais dificultosos para

a navegação.

1.1. Área Cultural do Médio Xingu

Segundo Nimuendaju (1948), os povos indígenas originários1 dessa região podem

ser caracterizados em três grupos: povos canoeiros restritos aos rios Xingu, Iriri e

Curuá: Juruna, Xipaya e Arupaí (extinto); povos do centro da floresta: Kuruaya,

Arara2, Asurini e Tacunyape (extinto); povos das savanas, que eventualmente

invadem a zona de floresta: Kayapó do Norte3.

A agricultura da mandioca foi a base da subsistência de todos esses povos, com

exceção dos Arara, que eram menos propícios ao cultivo. A unidade sociopolítica

era a aldeia, e, aparentemente a descendência era patrilinear, principalmente para

as chefias. A poligamia era rara e os laços familiares eram muito fortes. As relações

interétnicas geralmente envolviam guerras com canibalismo.

Os Juruna4, grandes bebedores de cauim, hoje autodenominados Yudjá, são

conhecidos como exímios canoeiros e são antigos habitantes das ilhas e

penínsulas do baixo e médio Xingu. A história oral Yudjá delimita como território

original toda a região da Volta Grande até a desembocadura do rio Fresco e atribui

a extinção dos povos Takunyapé, Arupaia e Peapaia a sua própria ação guerreira e

a seus inimigos memoráveis, os Txukahamãe (Kayapó).

Os escritos de Nimuendaju (1981), com base em suas visitas de 1918 e 1919,

informam na região, além dos Xipaya, grupos indígenas como os Kuruaya.

1 Vale observar que o autor não faz referência aos Araweté e aos Parakanã. Os Araweté não eram conhecidos na época do estudo de

Nimuendaju; talvez fossem confundidos com os Asurini, porque também faziam uso abundante do urucum, costume que veio a

denominar os Asurini (os vermelhos). Quanto aos Parakanã a ausência de referência se deve ao fato de que, naquela época, ainda estavam unidos; a cisão que levou uma parte do povo para o Xingu só ocorreu depois dos anos cinquenta. 2 Segundo Melatti esses Arara são os mesmos que podem ser encontrados agora no baixo Iriri, afluente do rio Xingu. 3 Incluem-se aqui todos os grupos Kayapó originários das cisões históricas ocorridas nos últimos séculos e que, grosso modo, compreendem os grupos Kararaô, Xikrin, Megranoti, Txukahamãe, entre outros. 4 O etnônimo Juruna parece significar “boca preta” em Língua Geral (Nhengatu) devido à tatuagem que usavam quando o baixo

Xingu foi explorado pelo colonizador português.

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4

Nessa área onde predominam povos falantes do tronco Tupi, os Arara se destacam

por falar uma língua Karib5. Viviam no divisor que separa as águas que correm para

o Iriri, onde passa a Transamazônica. Hoje, após a atração, ocupam as Terras

Indígenas Arara e Cachoeira Seca6.

O mosaico etnográfico do Médio Xingu compreende também os Kararaô e os Xikrin,

povos Jê. Tal como os outros grupos Kayapó autodenominam-se Mebengokré, que

significa “gente do buraco d‟água” ou “gente da água grande”, em referência aos

rios Tocantins e Araguaia, cuja travessia marcou a separação do grupo ancestral

(VIDAL, 1977).

1.2. Apontamentos sobre a Etnohistória do Médio Xingu A reconstrução da etnohistória regional vem fornecer informações e subsídios para

compreender a situação atual dos povos indígenas do Médio Xingu, principalmente

daqueles grupos que lograram sobreviver em áreas urbanas para onde foram

empurrados pela violência dos ciclos histórico-econômicos. Portanto, o foco da

descrição são as etnias Xipaya, Kuruaya e Juruna, por compreenderem a grande

maioria dos indígenas citadinos e das famílias indígenas moradoras na Volta

Grande.

Os arranjos matrimoniais observados nas genealogias, os padrões de localização

de residências nas “palafitas”, os fluxos migratórios históricos dentro da bacia

hidrográfica do Xingu, a inserção dos grupos na cidade de Altamira, o

ressurgimento das etnias consideradas extintas, a re-construção da identidade e do

território no mundo urbano, a busca de visibilidade étnica constituem o “modus

vivendi” desenvolvido por cada etnia, principalmente no cenário urbano.

A colonização aliada à catequização católica realizou ao longo do século XVII

várias tentativas de escravizar e “aldear” os Juruna. Em 1655 os „convertidos‟ foram

estabelecidos na Missão Tawaquara, acima das cachoeiras da Volta Grande

(Oliveira, 1970) onde, em 1842, Adalberto da Prússia registrou a presença dos

Juruna na Missão restabelecida.

Os Juruna foram também observados por Von den Steinen (1884), Coudreau

(1896), Nimuendaju (1918); e, este último afirma que sempre mantiveram relações

de guerra e de paz com os Xipaya, Kuruaya e Arara do Iriri. Nessa época

realizaram uma aliança por meio de casamentos interétnicos, confirmada por

5 Nimuendaju menciona a dispersão do grupo Arara quando a aldeia no rio Iriri foi atacada pelos Kayapó-Gorotire em 1918. No mesmo relato conta que em 1934 este território foi tomado pelos Kayapó-Gorotire, obrigando os Kuruaya a se espalharem: “alguns

seguiram para o Tapajós, outros se dispersaram ao longo do rio Iriri e outros tantos se juntaram aos poucos Xipaia que viviam perto

do Gorgulho do Barbado” (Nimuendaju 1940). 6 Não devem ser confundidos com os Arara da Volta Grande que também são chamados de Arara do Maia. Esse é provavelmente

um subgrupo Arara de família lingüística Karib, que viveu na foz do rio Bacajá no século XIX e que pode ter se misturado com os

Juruna e outros não índios ao longo do processo de contato interétnico.

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Coudreau (1896) quando, em visita à aldeia da Cachoeira de Jurucuá, registra

vários casamentos entre Juruna e Xipaya (Oliveira, 1970).

Os Xipaya permaneceram sem contato direto com o “mundo civilizado”, na região

dos rios Iriri e Curuá, apesar de terem feito contato, em 1750, com o jesuíta

Hundertpfund que visita Tawaquara e a seguir entra em contato com os Kuruaya

(Nimuendaju, 1948).

Os ataques dos Kayapó, em 1885, levaram os Xipaya a abandonar as aldeias

localizadas nas cachoeiras do Iriri, estabelecendo-se no Gorgulho do Barbado,

onde realizaram casamentos com os Kuruaya. Entre 1909 e 1913, os Xipaya são

visitados por Emília Snethlage que reencontra os Kuruaya em 1918 e registra uma

situação de extrema subordinação dos Xipaya e Kuruaya aos patrões seringalistas.

A partir de 1918 intensificam-se os ataques dos Kayapó que ficam mais intensos

durante a década de 1950, com o avanço do grupo sobre territórios dos Xipaya,

Kuruaya e Juruna.

Em síntese, a região do Médio Xingu experimentou ao longo dos últimos séculos as

fases da catequese jesuítica (1655 -1760), a administração pombalina e sua

continuidade no período imperial (1760– 1860), o boom da borracha (1880-1945), o

desenvolvimentismo e ampliação da fronteira de colonização (1950-1980) cujo

exemplo mais emblemático é a abertura da Transamazônica na década de 1970 e,

atualmente, a fase dos „mega projetos‟ de hidrelétricas, exploração de recursos

minerais e vegetais e empreendimentos de colonização privada.

A presença de famílias Juruna, Xipaya e Kuruaya no espaço urbano é consolidada

no século XX e está estreitamente relacionada ao auge e declínio do ciclo da

borracha e da formação da vila de Altamira que já era nessa época o principal

entreposto comercial do médio Xingu.

Na primeira metade do século XX as fontes etnohistóricas descrevem, para os

Xipaya e Kuruaya, uma migração pendular, entre os rios Iriri e Curuá e as margens

do Xingu, imediações do igarapé Panelas, local da antiga aldeia-missão

Tawaquara. As histórias de vida dos mais velhos Xipaya, Kuruaya e Juruna

evidenciam esse movimento e a posterior fixação das famílias na cidade, pois

alguns desses indivíduos nasceram nos seringais (“Malocas”) no Iriri-Curuá; outros

nasceram no “Moquiço”7 ou “Aldeinha”, assentamento indígena que posteriormente

foi incorporado pelo bairro São Sebastião, em Altamira.

7 Segundo Maria Helena (Juruna idosa da Ilha da Fazenda), o termo moquiço quer dizer “monte de mato”. O Dicionário Houaiss

define o termo como “habitação rústica, desprovida de conforto; casebre”.

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1.3. Índios Citadinos: “desaldeados” ou “ressurgidos”?

Entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX houve, portanto,

uma profunda compressão das etnias no Xingu, Iriri e Curuá, devido à expansão

dos Kayapó e os relatos dos indígenas mais idosos moradores de Altamira apontam

para as mudanças ocorridas desde então, as migrações dos grupos para outras

áreas do Médio Xingu e, principalmente, o deslocamento de aldeias inteiras para a

cidade de Altamira e imediações.

Por volta das décadas de 1940-50 as doenças, as epidemias, as mortes, os

casamentos entre Xipaya, Kuruaya, Juruna e com os nordestinos, vindos para a

região como "soldados da borracha", imprimiram um novo perfil à região; as

sucessivas mudanças forçadas e a dispersão do grupo passaram a idéia de que os

Xipaya haviam desaparecido como grupo étnico.

Nas décadas de 1970-80 os Kuruaya estavam espalhados ao longo do rio Curuá,

em pequenos núcleos familiares. A reorganização social só foi possível quando o

ouro aluvial atraiu indígenas e garimpeiros para as terras ocupadas; mas quando as

empresas mineradoras passaram a atuar, os Kuruaya começaram a sofrer violência

física8 e isso os levou a empenharam-se em sua reorganização social e territorial.

Em 2002 uma portaria do Ministério da Justiça declarou a TI Kuruaya de posse

indígena permanente.

Os Xipaya iniciaram na década de 1970 um movimento que resultou na

reunificação do grupo para a reconquista de seu antigo território. Atualmente a

situação jurídica da T.I. Xipaya é de “declarada em demarcação” segundo Portaria

2.362 (Funai) publicada em 18/12/2006.

Esse longo processo de “pacificação” e territorialização promovido pelo Estado

brasileiro gerou diversas transformações: fixação desses grupos em áreas restritas

enquanto seus modos de vida baseavam-se na exploração de grandes áreas. Esse

processo levou uma parcela significativa da população indígena a se fixar no

ambiente urbano, apesar de continuar mantendo relações com as terras indígenas.

Existe, atualmente, um movimento para identificação de uma área indígena no

bairro de São Sebastião, que além de comportar o território da antiga missão

jesuítica é uma área em que é evidente a ocupação indígena tradicional.

No século XX a antiga aldeia transformou-se em um bairro conhecido por Moquiço

ou “Aldeinha” (Patrício, 2003), que depois passou a ser conhecido como “bairro da

8 Nos anos 1980, os arquivos do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) mencionam as dificuldades enfrentadas pelos Kuruaya,

como a situação de pressão, agressão, invasão armada e risco de vida que estavam passando no rio Curuá, em razão da presença das empresas mineradoras: Espeng Minérios e Minerais LTDA, Brasinor Mineração e Comércio LTDA (garimpo Madalena). Nos anos

seguintes passaram a atuar outras empresas, como Andrade Gutierrez S/A, Mineradora Palanqueta, Minerador Souther Anaconda e

Madalena Gold Corporation.

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onça" por haver um barracão de comércio de peles do felídeo e, até recentemente,

chamava-se São Sebastião.

Os relatos indígenas informam que a área da Missão ia além dos limites do bairro

São Sebastião, que hoje equivale aos bairros Independente I, II e Recreio; aí habita

uma parte substancial da população indígena da cidade. As condições de

ocupação desta área foram agravadas, na segunda metade do século XX, pela

grilagem das terras. Por último, o crescimento urbano iniciado a partir da década de

1960 e o processo de colonização, levado a efeito na região pelo Instituto Nacional

de Colonização e Reforma Agrária (Incra) provocaram outros impactos negativos de

tal intensidade que muitas famílias migraram para outros lugares na região (Patrício

2003).

Nos primeiros anos do século XXI o movimento pela retomada de parte do território

urbano, que consideram seu de direito, tem sido mais presente no seio da

comunidade citadina e veementemente expresso em suas reuniões e nas ações

que desenvolveram com diferentes atores políticos locais (Cimi, ISA, Funai,

Prefeitura, entre outros). Vale destacar o movimento de recuperação de aspectos

da cultura material e imaterial, como por exemplo, o interesse em conhecer a

literatura sobre a etnia, detalhes dos grafismos usados na cerâmica e na pintura

corporal, os cantos tradicionais, a língua original, além do incentivo para recuperar

as celebrações do Kariá, ritual vinculado ao culto dos mortos.

A perspectiva da implantação da usina de Belo Monte vem impor uma nova

situação crítica para a população indígena, como o remanejamento de centenas de

famílias indígenas residentes nas palafitas, além da possibilidade de outros

impactos ambientais que fatalmente irão interferir no cotidiano das famílias

citadinas e da Volta Grande do Xingu.

2. A Terceira Margem do Xingu

2.1. Ser ou não ser índio?

Um fenômeno observável em toda a Amazônia é o estreitamento das relações entre

comunidades indígenas e centros urbanos. Nessa articulação, que ocorre desde o

período colonial, a cidade, a vila, a missão, o entreposto ou o posto militar

sustentaram e sustentam as atividades ligadas ao comércio dos produtos florestais

ou dos produtos agrícolas.

Na área em estudo, os deslocamentos forçados por contingências históricas

acabaram, mas observa-se que há uma intensa mobilidade, contínua e

permanente, entre as terras indígenas situadas na região e a cidade de Altamira.

Esse fluxo observado quando dos levantamentos de campo indica que, há vários

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anos, famílias indígenas Xipaya e Kuruaya deslocam-se da região do “Alto”9, para

reencontrar os parentes instalados a jusante, na “rua”10. A recíproca é verdadeira:

os Xipaya e Kuruaya citadinos, assim como os Juruna, também mantêm fluxo

contínuo para as terras indígenas.

À margem desses deslocamentos observa-se, desde os anos 1980, outro

movimento de confluência para as cidades. O fator escolar se sobrepõe a outros,

levando ao deslocamento do centro de gravidade da família da floresta para a

cidade. O acesso aos serviços públicos (aposentadoria, saúde) e ao comércio, a

remota possibilidade de um emprego na cidade e a perspectiva de outro modo de

vida fazem com que se diluam os limites entre o urbano e o rural, ou florestal, o

“indígena” e o “globalizado” (Andrello, 2006).

O surgimento da categoria “índio citadino” é cada vez mais visível na cidade a partir

de 1988, com as conquistas da democracia, que fomentaram esse fenômeno em

todo o país.

A população indígena em questão é composta por uma grande quantidade de

casamentos interétnicos com não índios e, simultaneamente, boa parte dela é

residente há décadas na cidade de Altamira, tendo seus filhos nascido e sido

criados no ambiente urbano.

Estas duas características - “índios misturados” e “índios citadinos”- que, no caso

em foco se sobrepõem, têm em comum o contraste com a imagem do “índio” que

persiste na consciência nacional: vivendo na “selva” e com hábitos de vida

“primitivos” e promíscuos; andando nus ou com vestimentas rudes; fenotipicamente

marcados como exóticos; praticando economia de subsistência ou mesmo

“preguiçosos”; religiões mágicas e ausência de ordem política.

A antropologia acabou por reafirmar este perfil exótico ao afirmar que uma vez que

os povos indígenas entrassem em contato com a sociedade nacional, a tendência

seria a perda estrutural da sua condição de “índio”.

No entanto, a própria representação popular sobre a condição do índio reafirma, de

maneira contraditória que, apesar de não poderem ser classificados como “índios

de verdade” (Patrício, 2000), apresentam persistências sociológicas que lhes dão

uma condição diferenciada no cenário regional.

Os critérios de indianidade definidos pela antropologia, como a continuidade

histórica entre a população originária e a que atualmente se identifica como

indígena, já não se sustentam em termos genéticos e culturais, pois sofreu muitas

9 Expressão que se refere às terras indígenas localizadas a montante de Altamira, entre os rios Iriri e Curuá. 10 A expressão “rua” se refere à cidade propriamente dita em contraposição à “aldeia”.

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mudanças com as mesclas ocorridas ao longo dos anos, e não é tão simples de ser

documentada.

No Brasil, a antropologia só vai superar os conceitos de “assimilação” e

“aculturação” nos anos 1970, quando incorpora as idéias de F. Barth de que grupo

étnico é “tipo organizacional” e não “unidade portadora de cultura”, e que o código

essencial da identidade que orienta as relações interétnicas se exprime por

contraste. Nas décadas seguintes, essas idéias de etnicidade continuaram fortes.

Definitivamente, uma cultura indígena não é estática, mas se transforma, perde e

ganha, esconde e mostra, conforme as relações interétnicas. Assim, índio é aquele

indivíduo que se auto-identifica enquanto tal e é identificado da mesma maneira

pela comunidade a que pertence (OIT – convenção 169).

Pioneiro nesse campo de estudo, foi o clássico “Urbanismo ou Tribalismo” de

Roberto Cardoso de Oliveira sobre os Terena nas cidades do Mato Grosso do Sul.

Reflexões inovadoras sobre este tema foram elaboradas recentemente por

pesquisadores como Patrício (2000), Saraiva (2005), Andrello (2006) entre outros.

Diante do contexto político favorável à mobilização por direitos indígenas, a partir

da promulgação da Constituição de 1988, e indo ao encontro desta nova

abordagem dinâmica de definição do que é ser índio, um fenômeno sociológico se

alastrou por várias partes do país, particularmente na região nordeste e, mais

recentemente, em estados que compõem a Amazônia Legal: é o surgimento dos

“índios emergentes”, ou, na linguagem acadêmica, de processos de etnogênese.

Os “índios emergentes” conformam um conjunto de pessoas, fruto de processos de

miscigenação históricos, que ligadas por laços de parentesco a populações pré-

colombianas e também de mesma origem territorial, buscam revitalizar suas

tradições culturais e linguísticas colocadas em situação de invisibilidade histórica e

política, e reivindicam suas identidades coletivas de maneira oficial diante do

Estado nacional.

O caso dos Xipaya, Kuruaya e Juruna citadinos e moradores da Volta Grande do

Xingu se encaixa perfeitamente nestas características, como demonstraram as

pesquisadoras Marlinda Patrício (2000) e Márcia Saraiva (2004).

Além dessa condição de “índios misturados”, os três grupos em foco têm sobre si o

preconceito generalizado e arraigado na consciência nacional e regional (inclusive,

em segmentos da própria Funai) de serem, em sua maior parte, moradores da

cidade, carregando o estigma de “índios desaldeados”, portanto, não sujeitos aos

direitos coletivos garantidos para aqueles que vivem em situação de aldeia.

O conceito “índio citadino” é também aplicado aos indígenas “beiradeiros”, ou seja,

às famílias indígenas moradoras na região da Volta Grande do Xingu, que mesmo

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morando fora das terras indígenas reservadas têm reivindicado, junto à Funai e

Funasa regionais, sua condição étnica e, portanto, os mesmos direitos especiais de

assistência.

Os quadros genealógicos dão conta da relação de parentesco entre os “índios

citadinos” e grupos que residem em terras indígenas. Essas informações

genealógicas fornecerão subsídios para que as famílias Xipaya, Kuruaya, Juruna,

entre outras – “citadinas” e “misturadas” – possam acessar seus direitos

constitucionais, a começar pelo reconhecimento formal de sua condição indígena.

2.2. Aldeias e Indígenas invisíveis emergem dos igarapés – padrões de

ocupação urbana e espaços de resistência indígena.

Empurrada para as zonas mais insalubres da cidade de Altamira, a maioria das

famílias indígenas vive hoje à beira dos igarapés Altamira, Ambé e Panelas e em

suas proximidades, em condições extremamente precárias e sujeita, todos os anos,

às enchentes que as levam para abrigos provisórios em estádios, escolas etc.

Entre as etnias residentes na cidade predominam os Xipaya, com 38,24%, seguidos

pelos Kuruaya, com 25,58% e pelos Juruna, com 13,83%. O total das outras etnias

soma 22,35%. (ver em anexo o quadro 2.2.1)

Gráfico 2.2.1 – Percentual de etnias das famílias indígenas entrevistadas em Altamira

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte, 2009

Essas etnias estão espalhadas por vários bairros da cidade, mas Açaizal e

Independente II são aqueles em que há mais famílias Xipaya e Kuruaya, seguidos

por Boa Esperança, Aparecida, Independente I, próximos aos igarapés Altamira e

Panelas. Essas aglomerações parecem reproduzir a espacialidade das aldeias no

espaço urbano.

Quanto à pirâmide etária, como se vê no gráfico, predominam as pessoas em idade

produtiva, o que é muito favorável à reprodução física e cultural daquelas famílias:

Page 11: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

11

Gráfico 2.2.2- Faixa etária e sexo dos entrevistados (%)

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte, 2009; (homens / mulheres)

Entre os “índios citadinos”, são muito frequentes os casamentos, tanto entre etnias

como entre índios e não índios. Os quadros 2.2.2 e 2.2.3 em anexo mostram estes

casamentos interetnicos – 222 em 248 casais. Não parece haver qualquer restrição

à exogamia. Pelo contrário, os casamentos com não índios já ocorriam no ciclo da

borracha, quando os seringueiros recebiam ou tomavam índias em troca do apoio a

determinado povo indígena acossado por outros povos. Tais casamentos, que

continuam acontecendo, parecem representar, hoje ainda, uma estratégia de

sobrevivência, não mais como sobrevivência física, mas como busca de

reconhecimento social.

Na Volta Grande, esta situação se repete: os casamentos mistos, principalmente

entre índios e não índios também são frequentes. De 38 casais, 34 estão neste

caso, como mostra o quadro 2.2.4 em anexo.

Confirma-se a estreita relação entre a “rua”, as aldeias e a Volta Grande:

aproximadamente 2/3 da população indígena de Altamira (72%) tem parentes nas

aldeias, assim como em outros locais, como a beira do Xingu, ou, mais

especificamente, na Volta Grande.

Na Volta Grande, quase a metade das famílias afirmou ter parentes morando nas

terras indígenas (48%); outros tantos afirmaram ter parentes em outras localidades.

E, como em Altamira, também na Volta Grande a relação com as aldeias, a “rua” e

outras localidades da região é bastante intensa, transitando a população nas

“voadeiras” pelo rio Xingu e igarapés.

Reforçando a demanda por terra indígena urbana na área da antiga missão

Tawaquara, protocolada pelos índios na Funai, 76,8% dos entrevistados respondeu

que é favorável a esta reivindicação, 3,5% que não e 19,7% não souberam

responder.

Page 12: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

12

2.3. Guia de sobrevivência na anti-cidade – Condições de vida e aspectos da

saúde e educação.

As condições de vida em Altamira são precárias para quase toda a população, no

que se refere a infraestrutura, serviços públicos, emprego e renda. Mas, para a

população indígena são muito piores. Embora a legislação não faça nenhuma

distinção entre índios “citadinos” e “aldeados”, principalmente com relação à saúde

(Lei nº 9.836/99), as famílias indígenas de Altamira não são atendidas pela Funasa.

Além de não se beneficiarem do atendimento da Funai e Funasa, as famílias

citadinas, em sua maioria, não são beneficiadas pelos programas destinados à

população de baixa renda, como o Bolsa Família (27,94%). E, das pessoas com

mais de 60 anos, apenas 10% recebe aposentadoria.

As moradias indígenas são feitas de madeira e sobre pontais, estilo palafita, e não

têm sanitários ou fossas. Cada domicílio tem em média três cômodos, havendo

uma grande concentração de pessoas no mesmo espaço. A ausência de

saneamento básico, especialmente de sistemas de abastecimento de água tratada

e de esgotamento sanitário, é geral e faz com que os moradores, especialmente as

crianças, sejam acometidos por diarréia e gripe. Devido à inexistência de rede de

esgotamento sanitário, há um montante significativo de esgotos lançados

diretamente nos igarapés e no rio Xingu.

A precariedade da infra-estrutura urbana favorece a ocorrência anual de

inundações em vários pontos da cidade no período chuvoso. Estas inundações,

associadas à falta de saneamento básico, potencializam a ocorrência de doenças

veiculadas pela água, por exemplo, a esquistossomose e a dengue. O grau de

degradação ambiental dos espaços urbanos é particularmente sensível para a

população indígena devido a sua condição de extrema vulnerabilidade social.

Gráfico 2.3.1 – Condições de moradia da população indígena em Altamira (%)

Page 13: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

13

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte 2009.

A situação de vulnerabilidade se repete na Volta Grande, embora a vizinhança do

rio Xingu, com seu grande volume de água, e o menor adensamento populacional

atenuem um pouco a falta de infraestrutura. Por outro lado, a situação se agrava

devido à distância das cidades. A estrutura de saúde nestas localidades é precária,

e a maioria da população recorre a Altamira, num deslocamento que leva horas,

sendo que muitas vezes paga pelo transporte.

A vulnerabilidade social é agravada tanto pela alta taxa de analfabetismo entre os

chefes de família – Altamira: 25% e Volta Grande: 23,8% - quanto pelas condições

da educação escolar, uma vez que o direito à educação diferenciada não é

respeitado e que o alto grau de preconceito discrimina os alunos indígenas,

aumentando a evasão escolar devido à introjeção do sentimento de inferioridade

(BOGÉA, 1997). Acresce que cerca de um terço dos chefes de família (53,53% em

Altamira e quase 60% na Volta Grande) tem só até a 4ª série do curso fundamental.

Gráfico 2.3.2 - Escolaridade dos chefes de famílias indígenas residentes em Altamira (%)

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte, 2009; *EJA: Educação de Jovens e Adultos

Já a nova geração, em Altamira, está alcançando um grau de escolaridade maior,

porém não de forma homogênea: há estudantes universitários, enquanto outros têm

até a quarta série, mas são analfabetos funcionais.

Page 14: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

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Na Volta Grande as escolas situam-se nas localidades de maior concentração

populacional, como Ilha da Fazenda, Garimpo do Galo e Ressaca, e atendem toda

a população destas comunidades, sem que haja educação diferenciada para os

indígenas. Os jovens, apesar da insistência dos pais e devido às grandes

distancias, tentam completar o primeiro grau, porém a grande maioria acaba

abandonando a escola, o que mantém a pobreza das famílias, e não permite

perspectivas de mudança.

2.4. Bases materiais para a reprodução sociocultural – renda e trabalho.

Com relação ao mercado de trabalho, a situação da população indígena não é

muito diferente do que ocorre com o conjunto da população de Altamira. Os poucos

anos de estudo e a falta de qualificação profissional adequada ao mercado de

trabalho da cidade, visto que os índios da região, tradicionalmente, estão ligados às

atividades de pesca e extrativismo, limita suas oportunidades de emprego e mesmo

de trabalho. São muitos os desempregados e aqueles que trabalham fazem, em

sua maioria, serviços que exigem pouca qualificação e proporcionam parcos

rendimentos.

A aposentadoria é importante fonte de recursos das famílias, sendo a “ocupação”

principal do maior número (22,35% das famílias), tendo-se tornado uma importante

estratégia de sobrevivência das famílias extensas. Em seguida, vem a construção

civil, com cerca de 20% das pessoas em funções sem qualificação e de baixa

remuneração. A pesca profissional ocupa cerca de 10% dos chefes de família; esta

atividade é também praticada pelos aposentados, desempregados e pelas

mulheres, como forma de complementação da dieta familiar. O trabalho em casa de

família é o que mais ocupa as mulheres. Há cerca de 5% desempregados e 5% são

agricultores. Apenas três chefes de família têm profissões qualificadas. Não foi

registrada a ocorrência de trabalho infantil.

Depreende-se que a inserção da população indígena no mercado de trabalho de

Altamira é precária, representando um contingente mal remunerado, e apenas

disponível para qualquer atividade que não exija qualificação.

Page 15: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

15

Gráfico 2.4.1 – Renda das famílias indígenas de Altamira (%)11

Fonte: EIA / Rima do AHE Belo Monte, 2009.

Mais de 10% dos entrevistados declarou não ter nenhuma fonte de renda. À

pergunta: mas, de que vivem? As respostas eram: “É, minha mãe ajuda”, ou, “ele

vai pescar”. Ou seja, explicitavam o papel dos mais velhos na família, assim como a

importância da pesca em sua dieta alimentar. Mesmo somando-se o rendimento de

todos os membros da família que estão trabalhando, 83% delas dispõem de, no

máximo, R$ 930,00 por mês. Considerando-se que as famílias têm, em média 5

pessoas cada uma, verifica-se que esta é uma renda muito baixa.

Na Volta Grande, 27% dos chefes de família são garimpeiros, 21% pequenos

produtores rurais e as aposentadorias sustentam um pouco mais de 16% das

famílias. A maioria das famílias, à semelhança das que vivem em Altamira, tem até

um salário mínimo de renda mensal e apenas 30% recebe o “Bolsa Família”.

Gráfico 2.4.2 - Renda dos chefes de família na Volta Grande (%)

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte, 2009.

3. Inverno e verão permanentes – construção de um mito pan-xinguano?

“Dos três céus que formavam com a terra um cosmos dotado de quatro andares, já

caíram dois e periga cair o último, derrubados por Selã‟ã em represália ao

extermínio dos povos indígenas do rio Xingu. Segundo um mito, “Selã‟ã ficou

furioso e derrubou o céu, queria exterminar os Brancos. O rio havia desaparecido.

Foi no tempo em que os Yudjá foram extintos, estavam à beira da extinção, e

quando Selã‟ã tentou avistar o rio, não havia mais rio, e ele ficou furioso e derrubou

o céu (…). O sol apagou, tudo ficou escuro. Os Juruna ficaram apreensivos, os

11

A renda foi calculada somando-se o rendimento de todos os membros de cada família.

Page 16: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

16

poucos Juruna sobreviventes. (…) Os que se abrigaram ao pé de um grande

rochedo, somente eles se salvaram; os que se encontravam alhures morreram,

todos os Brancos, os Brancos todos morreram, os Índios morreram, os Juruna

morreram. Os que estavam abrigados sob um rochedo escavaram o céu espesso

com um pedaço de pau(…). Os sobreviventes reproduziram-se. “Selã‟ã disse (a um

Juruna, no passado recente): „É assim que hei de fazer: quando os Índios

desaparecerem, quando os Índios desaparecerem das ilhas, eu desmoronarei o

céu, o último céu”. (Lima, 2001)

Este mito Juruna parece prever o que vai acontecer caso a usina de Belo Monte

seja de fato construída. Na Volta Grande – que é parte do território tradicional

Juruna - as águas do Xingu ficarão distantes das margens em que vivem as

famílias, ou muito reduzidas com o desvio do rio. De fato, esse trecho do médio

Xingu terá sua vazão reduzida no inverno, devido ao desvio do curso normal para

os canais artificiais previstos no projeto de engenharia.

Das 16 localidades da Volta Grande onde vivem famílias indígenas, quatro (24

famílias) encontram-se na margem esquerda ou na Ilha da Fazenda, e sofrerão

ensecamento. Outras nove localidades (19 famílias) situam-se na margem direita, à

beira do canal de vazão reduzida. E quatro localidades (4 famílias) situam-se a

montante do eixo da barragem, onde o nível do rio ficará permanentemente alto,

caso a barragem seja construída. O mesmo ocorrerá nas imediações e no

perímetro da cidade de Altamira, onde as águas permanecerão sempre altas, como

no verão, na época das enchentes.

Em Altamira verificou-se que, das 340 famílias indígenas cadastradas, 76 residem

abaixo da cota 97 msnm que é a cota de formação do reservatório previsto para a

UHE Belo Monte, ou seja, que deverão ser obrigatoriamente remanejadas, caso a

usina seja construida. A cota 100 msnm é a chamada cota de segurança do

reservatório. Em principio as famílias que moram até esta cota também deverão ser

remanejadas, embora a água não venha a atingir suas moradias. No total, cerca de

200 famílias serão transferidas. Entretanto, devido à topografia urbana e à situação

precária dos sistemas de escoamento das águas pluviais e de esgotamento

sanitário e como já ocorrem hoje, afloramentos pontuais em áreas onde não se

verificam inundações, é de prever que o número de famílias indígenas remanejadas

será mais elevado.

Esta radical transformação ambiental, aliada ao impacto provocado pelo grande

afluxo de pessoas de fora, afetará a dinâmica sociocultural e econômica de toda a

região; no caso dos povos indígenas uma possível resposta a essas

transformações será a criação de um novo mito apocalíptico, desta vez, com um

Page 17: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

17

caráter pan-xinguano.

Como solução alternativa, caso a usina venha a ser construida, além das políticas

públicas relativas ao atendimento à saúde e à educação, qualificação profissional,

melhoria de renda monetária e ao reconhecimento de sua identidade étnica a que

têm direito todos, tanto os moradores de Altamira como os da Volta Grande, os

índios “citadinos”, por intermédio de suas lideranças, pleitearam um bairro indígena,

com atendimento à saúde e à educação diferenciadas, além de melhores condições

de acesso ao rio Xingu para atividades domésticas, econômicas e de lazer.

Em seu projeto de bairro, os índios incluiram instalações para receber os parentes

moradores nas terras indígenas, seja para tratamento de saúde, seja para continuar

os estudos, seja por outras necessidades.

Vale dizer que a decisão das famílias pela implementação de um bairro indígena

em Altamira não elimina e nem se confunde com a demanda pela área indígena

Tawaquara, conforme deixaram claro suas lideranças. Segundo elas, trata-se de

uma reivindicação histórica que continuará a fazer parte da agenda política dos

índios Xipaya e Kuruaya, independentemente de Belo Monte.

Segundo o desejo expresso pelos índios, o bairro deverá abrigar as famílias

afetadas diretamente pelo enchimento do reservatório do Xingu (cerca de 200) ou

mesmo todas aquelas que vivem na cidade (estimadas em 340, mais as cerca de

25 ainda não cadastradas). Para eles, o bairro deverá situar-se a não menos de 3,5

km e não mais de 5,0 km da cidade e dispor de acesso ao rio Xingu.

Grosso modo, deve-se prever uma área de cerca de 40 hectares, com lotes de

1.000 m² que permitirão às famílias, além de morar, plantar e criar pequenos

animais. É desejo das famílias que o bairro indígena seja organizado por quadras

de acordo com as diversas etnias e que haja documento único de forma a evitar

que os lotes sejam vendidos, garantindo assim a moradia das futuras gerações.

No projeto expresso pelos índios nos encontros realizados, o bairro indígena deverá

contar com: escola diferenciada, segurança indígena, hospital, moradias

adequadas, asfalto, saneamento, transporte público, telefone, praças, energia com

taxa social, espaço cultural (oficina para artesanato, biblioteca viva, manifestações

culturais), correio, caixa eletrônico, igrejas católica e evangélica, hospedagem para

os índios em trânsito e para os estudantes das aldeias e da Volta Grande.

A efetivação dessas reivindicações permitirá a re-significação da categoria “índio

citadino” para cidadão indígena.

Page 18: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

18

4. Conclusão

Paradoxalmente, os estudos etnoambientais necessários ao licenciamento do AHE

Belo Monte tornaram possível a produção, sistematização e análise de um

conhecimento até então inexistente sobre os índios citadinos e residentes na Volta

Grande do Xingu, o que tende a fortalecer o movimento indígena de recuperação

da identidade étnica hoje marcada pela invisibilidade.

Para que este conhecimento seja complementado, torna-se necessário estudar as

terras indígenas Xipaya e Kuruaya e, também, as famílias indígenas que vivem

isoladas às margens do rio Xingu, a montante de Altamira. E, até onde se sabe,

estes dois estudos são parte das condições para a continuação do processo de

licenciamento ambiental da usina.

Como demonstraram os resultados da pesquisa, a população indígena que vive em

Altamira caracteriza-se como um contingente de baixa renda, com escasso acesso

a serviços públicos básicos. Portanto, independentemente da construção de Belo

Monte, deveria ser objeto de uma atenção especial por parte do poder público em

suas diversas esferas, municipal, estadual e federal.

A impressão que fica da análise de todos os dados recolhidos em campo é que os

entrevistados que moram na cidade de Altamira gostariam de unir a aldeia e a

cidade – a solidariedade que encontram na primeira, assim como o acesso à terra,

à caça e à pesca, ao extrativismo mineral e vegetal -, ao atendimento à saúde e à

educação e ao acesso aos bens de consumo e aos serviços que a cidade,

teoricamente, proporciona.

Considera-se que o projeto de um bairro indígena, tal como foi proposto pelos

índios “citadinos”, é a forma mais adequada de compensar o remanejamento, mas

principalmente de resgatar o passivo histórico que foi a perda da área da antiga

missão e dessa forma também proporcionar-lhes, além de condições de vida mais

salubres e dignas, condições de continuar e aprofundar seu movimento de resgate

de identidade étnica e cultural.

As comunidades ribeirinhas da Volta Grande são também altamente vulneráveis do

ponto de vista físico-espacial, dada a precariedade e/ou insuficiência de infra-

estrutura. Também, quanto ao aspecto sócio-econômico, uma vez que sua

produção não ultrapassa o nível da subsistência.

É notável e uterina a relação de dependência dessas famílias indígenas para com o

rio Xingu e seu emaranhado de igarapés. O rio, além de ser desde tempos

imemoriais uma referência simbólica sempre presente, na mitologia Juruna e

Xipaya, é por excelência o principal ecossistema de exploração e uso e é também o

principal meio de deslocamento para as terras indígenas e as cidades.

Page 19: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

19

No caso da Volta Grande, o resgate do passivo histórico compreende, além da

implementação das políticas públicas a que os indígenas têm direito – educação e

saúde diferenciadas e etnodesenvolvimento – a identificação das áreas ocupadas

pelas famílias e, consequentemente, sua regularização fundiária.

5. Agradecimentos

Os autores agradecem especialmente à socióloga Mayra Pascuet, pela ajuda na

finalização do artigo e à equipe multidisciplinar que, com eles, elaborou o estudo

etnoecológico do componente indígena sobre os índios citadinos e ribeirinhos da

Volta Grande do Xingu para os estudos ambientais do AHE Belo Monte: Sonia

Lorenz, Mirella Poccia, Luis Roberto de Paula, Fabio Ribeiro, Humberto Kzure-

Cerquera, João Pavese, André Michiles, Mayra Pascuet e Samuel Medeiros Luna.

E muito, e principalmente, aos colaboradores indígenas que integraram a equipe de

trabalho: Elza Maria Xipaia de Carvalho, Raimundo Veriano Ferreira, Marilene

Carvalho Ferreira, Darilene Xipaya Santana, Antonio Xipaya e Marly Nascimento da

Silva

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Page 20: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

20

- Fragmentos de religião e tradição dos índios Sipáia: contribuições ao conhecimento das tribos de índios da região do Xingu, Brasil Central. Religião e Sociedade, Rio de Janeiro: Tempo e Presença Ed.; São Paulo: Cortez, n. 7, p.3-47, jul. 1981. OLIVEIRA, A.E. – “Os Juruna do Alto Xingu” in Dédalo. Ano VI, nº11-12, São Paulo, 1970. OLIVEIRA FILHO, João Pacheco. A Problemática dos “Índios Misturados” e os Limites dos Estudos Americanistas: um Encontro entre Antropologia e História. In: Ensaios em Antropologia Histórica. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1999. PATRÍCIO, Marlinda Melo. Índios de Verdade – O caso dos Xipaia e Curuaia em Altamira – Pará. Dissertação em Antropologia Social na Universidade Federal do Pará. Belém/PA – 2000. - “Kuruaya”, Verbete para a Enciclopédia Povos Indígenas no Brasil. São Paulo: Instituto Socioambiental. www.socioambiental.org. 2003 - “Xipaya”, Verbete para a Enciclopédia Povos Indígenas no Brasil. São Paulo: Instituto Socioambiental. www.socioambiental.org. 2003 RIBEIRO, Fabio Nogueira. Etnodesenvolvimento e o mercado verde na Amazônia indígena: os Asuriní no Médio Xingu. Dissertação de mestrado. São Paulo: Procam/USP, 2009. SANTOS, Leinad e ANDRADE, Lucia, org. As hidrelétricas do Xingu e os Povos Indígenas. Comissão Pró Índio, São Paulo, 1988. SARAIVA, Márcia Pires. Identidade multifacetada: a reconstrução do "ser indígena" entre os Juruna do Médio Xingu. Dissertação de Mestrado - Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Universidade Federal do Pará, Belém, 2005 SNETHLAGE, Emília. A travessia entre o Xingu e o Tapajós. Manaus : Governo do Estado do Amazonas ; SEC, 2002. 72 p. (Documentos da Amazônia, 98) STAVENHAGEN, Rodolfo. Los Derechos Indígenas. In: ZAMBRANO, Carlos Vladimir (Ed.). Etnopolíticas y Racismo: Conflictividad y Desafios Interculturales em América Latina. 2ª ed. Bogotá: Universidad Nacional de Colômbia, 2003. STEINEN, Karl von den. O Brasil Central: expedição em 1884 para a exploração do rio Xingu. Rio de Janeiro : Companhia Editora Nacional, 1942. VIDAL, LUX – Morte e Vida de Uma Sociedade Indígena Brasileira. São Paulo, Hucitec/EDUSP, 1977 VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo & Lúcia M. M. de ANDRADE. "Os povos indígenas do médio Xingu". Em As hidrelétricas do Xingu e os povos indígenas (Leinad Ayer O. Santos & Lúcia M. M. de Andrade, orgs.). São Paulo: Comissão Pró-Índio de São Paulo, 1988. WILHERLAN, Adalbert Heinrich (Príncipe Adlaberto da Prússia). Brasil : Amazonas-Xingu 1811-1873. Belo Horizonte : Itatiaia, 1977.

Anexos

Quadro 2.2.1 – Famílias indígenas entrevistadas em Altamira, segundo etnia e bairro

Bairro Xipaya Kuruaya Juruna Xipaya-Kuruaya Outras Etnias

Total

Independente I 23 13 1 0 1 Munduruku 38

Açaizal 15 7 13 1 Kayapó 36 Invasão dos Padres 6 7 2 0

1 Guajajara, 1 Tipiniquim , 2 Munduruku 19

Brasília 5 4 3 1 Kayapó, 1 Munduruku, 1

Carajá, 1 Arara 16

Independente II 20 14 2 3 1 Munduruku 40

Sudam I 8 2 1 1 Kayapó 12

São Sebastião 4 0 4 1 2 Arara, 2 Kayapó 13

Olarias 0 3 1 2 Kayapó 6

Mutirão 8 4 3 0 2 Munduruku, 5 Arara 22

Primavera 1 Kayapó 1

Colina 3 2 0 5

Centro 10 4 0 0 4 Munduruku, 2 Kayapó, 1 Arara 21

Page 21: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

21

Bela Vista 6 3 1 1 Munduruku 11

Jd. Oriente 1 1 0 2

Liberdade 2 1 2 0 5

Boa Esperança 4 7 1 2 Munduruku, 2 Kayapó, 5 Baré,

1 Mocorongo, 1 Anambé 23

São Domingos 0 1 2 0 2 Munduruku, 2 Kayapó, 1

Wapixana 8

Premem 1 0 1

Aparecida 15 12 9

2 Guarani, 7 Kayapó, 2 Tupiniquim, 5 Arara, 4 Canela, 1

Mumduruku, 1 Carajá 58 Esplanada do Xingu 1 1 0 2

Ivalândia 1 0 1

Total 130 87 47 4 72 340

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte, 2009

Quadro 2.2.2– Casamentos interétnicos

Etnias/Bairros

Inde

pen

dente

I

Açaiz

al

Invasão d

os

Padre

s

Bra

sília

Inde

pen

dente

II

Sud

am

I

São S

ebastião

Ola

rias

Mutirã

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Prim

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Espla

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da d

o

Xin

gu

Ivalâ

ndia

tota

l

índio/não índio 21 26 13 14 29 8 9 4 12 1 3 8 8 1 4 13 6 1 38 2 1 222

Xipaya/Xipaya 3 1 1 1 6

Kuruaya/Kuruaya 1 1

Xipaya/Juruna 1 1 2

Xipaya/Kuruaya 1 1 1 3

Canela/Kuruaya 1 1

Guajajara/Guajajara 1 1

Munduruku/Xipaya 1 1 1 3

Mund./Munduruku 1 1

Kayapó/Arara 1 1

Kayapó/Xicrim 1 1

Xipaya/Canela 1 1

Arara/Xipaya 1 1

Kayapó/Kayapó 1 1

Kayapó/Juruna 1 1

Arara/Arara 1 1

Kuruaya/Kayapó 1 1

Total de casados 26 28 14 14 30 9 12 4 14 1 4 12 8 1 4 15 7 1 41 2 1 248

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte, 2009.

Page 22: ESTUDOS DE VIABILIDADE ÍNDIOS CITADINOS UHE BELO MONTE-Mirella Poccia 2009

22

Quadro 2.2.3 - Distribuição por etnia e sexo dos casamentos entre índios e não índios

Bairro

Índios casados com não índios, por sexo Casados

entrevistados

Xipaya Kuruaya Juruna Xipaya/ Kuruaya outros

índios e ñ

índios

Total dos

casados M H M H M H M H M H

Independente I 7 4 7 2 0 1 0 0 0 0 21 26

Açaizal 8 4 4 2 4 3 0 0 1 0 26 28 Invasão dos Padres 4 2 2 1 2 0 0 0 2 0 13 14

Brasília 3 1 3 1 1 1 0 0 2 2 14 14

Independente II 11 5 6 4 1 0 2 0 0 0 29 30

Sudam I 5 0 1 1 1 0 0 0 0 0 8 9

São Sebastião 0 3 0 0 3 1 1 0 0 1 9 12

Olarias 0 0 1 1 1 0 0 0 0 1 4 4

Mutirão 1 4 2 0 1 1 0 0 2 1 12 14

Primavera 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 1 1

Colina 0 1 2 0 0 0 0 0 0 0 3 4

Centro 2 2 1 1 0 0 0 0 2 0 8 12

Bela Vista 3 1 2 0 1 0 0 0 1 0 8 8

Jd. Oriente 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 1

Liberdade 2 0 1 0 1 0 0 0 0 0 4 4

Boa Esperança 0 2 3 1 0 0 0 0 2 5 13 15

São Domingos 0 0 1 0 1 1 0 0 3 0 6 7

Premem 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 1

Aparecida 5 7 2 6 2 0 0 0 7 9 38 41 Esplanada do Xingu 0 1 0 0 1 0 0 0 0 0 2 2

Ivalândia 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1 1

Total 51 37 39 22 20 8 3 0 23 19 222 248

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte, 2009.

Quadro 2.2.4 – Casamentos interétnicos na Volta Grande do Xingu

Etnias/Bairros

Arr

oz C

ru

Coto

ve

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Fazenda B

aca

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Ilha

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Itatá

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(Bacajá

)

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tizin

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Ressaca

Ressacão

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Sitio

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rancis

co

sem

resposta

tota

l

Índio/não índio 3 0 2 4 11 2 1 1 1 1 1 0 0 4 0 0 1 1 33

Xipaya/Xipaya 0 0 2 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 3

Arara/Xipaya 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1

Juruna/Arara 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 1

Total de casados 3 0 4 4 13 2 1 1 1 1 1 0 0 4 0 1 1 1 38

Fonte: EIA/Rima do AHE Belo Monte, 2009.